Você está na página 1de 5

Universidade Federal da Bahia

Ecopolítica Mundial
Professora: Diana Aguiar
Aluno: Silas Bandeira da Silva

Soluções para a questão ambiental

Durante maior parte dos séculos XIX e XX, o ambientalismo se mantém com cunho
de resistência política, ou, de caráter estritamente científico. Grupos menores, advogando pela
preservação do meio ambiente e o direito de povos originários e grupos minoritários por seus
direitos ambientais. O único momento que altera a situação da relação humana com o meio
ambiente, no período, é a chamada Revolução Verde, iniciada na década de 60, após a
Revolução Chinesa. Um projeto de desenvolvimento tecnológico de caráter ambientalista,
com a intenção de acabar com a fome do mundo, mas também servindo como contraponto a
ascensão dos regimes socialistas pelo globo, a revolução verde para contrapor a revolução
vermelha.
A visão generalizada do ambientalismo só começa a ser modificada em uma das mais
importantes reuniões da ONU, a Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente
Humano, realizada em 1972. Ou da forma como se tornou melhor conhecida, a Conferência
de Estocolmo.
Antes de tratar diretamente da Conferência, é de suma importância entender os
antecedentes que tornaram possível uma mudança tão brusca no entendimento global de
ambientalismo. A expansão econômica do pós-segunda guerra, tido por muitas pessoas como
a era de ouro do capitalismo, foi marcada por um rápido crescimento econômico,
acompanhada pela formação de um Estado de Bem-Estar Social na maior parte do “primeiro
mundo”. Justamente para fazer frente ao também rápido crescimento do chamado “segundo
mundo”, o bloco socialista. O Estado de Bem-Estar Social possibilitou a ascensão de uma
classe média estável, nos países do bloco ocidental, o que está intrinsicamente ligada ao
crescimento do interesse pela questão ambiental. Já que, com suas necessidades básicas
supridas, passam a questionar os problemas causados pelo crescimento rápido e desenfreado
da economia (Lago, 2006).
A volta de pensamentos neomalthusianos, com trabalhos que se tornam populares na
Europa como “The Limits of Growth” e “Blueprint for survival”, que advogam por um
extensivo controle populacional, e ainda postulam que o desenvolvimento de países do Sul
Global, seria mais danoso para a questão climática que os já altos níveis de poluição dos
países do Norte. A ideia de Crescimento Zero, foi considerada como viável para salvar o meio
ambiente. Portanto, a resistência inicial por parte dos países em desenvolvimento em
embarcarem nessa “onda ambientalista”, torna-se compreensível, já que o ambientalismo era
mais entendido como um “luxo” dos países ricos que uma questão verdadeiramente global
que atingiria todos igualmente (Lago, 2006).
A conferência foi em primeira instância uma oportunidade de questionar os padrões de
desenvolvimento, tanto dos países capitalistas, quanto dos socialistas. Marca a entrada em
definitivo da pauta ambiental no cenário multilateral e mais importante, oficializa o
ambientalismo como questão, também, político-econômica, não mais puramente científica
(Lago, 2006).
Ao todo 115 países participaram da conferência, nela foram discutidas noções de
desenvolvimento sustentável, a prioridade na eliminação da pobreza e a necessidade de
diferenciação entre os problemas ambientais nos países ricos e naqueles que estão em
desenvolvimento. Foi também responsável por associar a própria existência das Nações
Unidas com a pauta ambiental, que voltará a ser discutida 20 anos depois na Rio 92. O
sucesso da Conferência se deve majoritariamente pelo trabalho do então Secretário-Geral das
nações unidas, Maurice Strong, responsável por modificar o que era esperado como uma
sessão de relações públicas pelos países desenvolvidos, num palco de compromissos reais,
mesmo que não vinculantes, para a relação dos países com o desenvolvimento sustentável e a
construção do Meio Ambiente Humano (Lago,2006).
Os países Ricos saem derrotados da conferência de Estocolmo. E a luta entre o Sul e o
Norte Global é marcada na definição das medidas acordadas durante a conferência como não
vinculantes. A resposta do Norte Globo virá aos poucos, a cada nova conferência, mais e mais
os países em desenvolvimento são postos na defensiva e não mais como autores, como foi
feito sob a liderança de Strong durante a Conferência de Estocolmo.
O Rio de Janeiro foi escolhido para abrigar a conferência que sucedeu a da Estocolmo
20 anos antes. A Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente e Desenvolvimento,
e como a versão popularizada de seu nome sugere, foi realizada em 1992. Carrega em seu
nome a vitória do Sul Global, associando suas preocupações com crescimento econômico e
social com a questão ambiental (Lago, 2006).
A viabilidade da realização de nova conferência deu-se por convenções e protocolos
que enumeram quais questões se colocavam no centro do debate. Primeiramente a Convenção
de Viena (1985) e o Protocolo de Montreal (1989), ambos sobre a destruição da camada de
ozônio. Além do Relatório de Brundtland ou Relatório da Comissão Mundial sobre o Meio
Ambiente e Desenvolvimento (1987), que tanto distribuía melhor a “culpa” pela questão
climática entre países desenvolvidos e em desenvolvimento. Já que até o momento estava-se
convencionada a creditação das alterações ambientais aos países pertencentes ao bloco
socialista, liderados pela União Soviética, e aos países em desenvolvimento. O relatório
também é responsável por apontar diferentes esferas em que era possível ser feita melhora na
relação com o Meio Ambiente, por custos baixos, já que o momento de estagnação econômica
que assolava as economias desenvolvidas, faziam-nas considerar a questão climática como
não urgentes e demasiadamente custosas (Lago, 2006).
Um dos pontos mais expressivos da Rio 92, foi a demonstração de como mesmo 20
anos após Estocolmo, a questão ambiental ainda possuía relevância o suficiente para contar
com representantes de 172 países, dentre os quais estavam presentes líderes de 108 para
discuti-la em uma conferência. Outros fatores importantes foram a realização da conferência
em um país do Sul Global, o Brasil, que demarcava como as pautas ambientais deixam de ser
um “luxo” dos países ricos e tornavam-se cada vez mais questões globais em comum. Num
país que recentemente reconquistara sua democracia, como muitos outros, a Rio 92 foi palco
de um otimismo pautado por um retorno da liberalização política e econômica ao redor do
mundo (Lago, 2006).
Os dois principais pontos da conferência foram o Desenvolvimento e a
Sustentabilidade. O Desenvolvimento, ligado à rápida ascensão de países de médio porte
como os tigres asiáticos e o Chile. A Sustentabilidade que recentemente havia-se batido
martelo em qual sua melhor definição. Gerando uma melhor noção de desenvolvimento
sustentável com base em três diferentes pilares: econômico, social e ambiental. Com um
pensamento ecológico tecnocêntrico otimista, uma noção de que através de uma nova
revolução tecnológica haverá um incremento no uso da informática em detrimento da
industrialização clássica, o que diminuirá o consumo de recursos naturais (Lago, 2006).
Outro fator importante foi a participação do Brasil como liderança de um grupo de
países em desenvolvimento que muda o foco da discussão do cientificismo mais presente na
Conferência de Estocolmo (1972), para um âmbito mais político e econômico (Lago, 2006).
Como principais resultados da Rio 92, tivemos a assinatura de diversos documentos,
entre eles a “Agenda 21”, um programa de ação em perspectiva internacional que foi dividida
em quatro seções: dimensão social e econômica, gestão de recursos naturais, fortalecimento
dos grupos sociais na implementação do objetivo do desenvolvimento sustentável e os meios
de implementação. Posteriormente, em mais um dos capítulos da batalha entre o Sul e Norte
Global, transformaria a Agenda 21 em objetivos genéricos, sem o mesmo peso ou grau de
impacto que possuía sua versão original. A “Declaração do Rio” que resumia os interesses e
preocupações dos países envolvidos, além dos princípios sobre as florestas (Lago 2006).
Também em 1992, foi assinado a Convenção sobre a Diversidade Biológica. Reflexos
de mudanças no entendimento da possibilidade de propriedade intelectual de recursos
genéticos. Tornando agricultores tradicionais em “Guardiões” da biodiversidade e não como
agentes de inovação como sempre foram entendidos. Levando em consideração que caso
houvesse reconhecimento de que o melhoramento de sementes e mudas é fruto de uma
história de constante inovação realizada pelas comunidades agricultoras, a agrobiodiversidade
tornaria-se patrimônio público (Aguiar, 2023).
Quase que em paralelo à agenda ambiental da ONU, estava em movimento sua agenda
econômica. A Organização Mundial do Comércio (OMC) foi oficialmente fundada em 1995,
apenas três anos após a Rio 92. A expansão da OMC levou consigo, parâmetros que tornam
viáveis a privatização de patentes ambientais. Somado ao grande investimento já realizado na
modificação de espécies para facilitar a lucratividade da produção, impulsionados pela
Revolução Verde, há um movimento de desgarrar a propriedade da evolução genética de
espécies dos produtores tradicionais. Pautando que apenas melhoramento genético que tenha
possibilidade de gerar lucro, ou seja com investimento direto feito em laboratório, são
passíveis de serem patenteáveis (Aguiar, 2023).
Na verdade, desde 1961, o conceito de “Recursos Genéticos” é consolidado pela
Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura (FAO, em inglês), o que abre
margem para criação de parâmetros, nacionais e internacionais para proteger essas patentes,
como por exemplo ocorre com a União para Proteção das obtenções vegetais (UPOV),
também em 1961. A busca pelo melhoramento genético com base no lucro é um dos reflexos
da Revolução Verde, com ela, se vê a expansão dos monocultivos que por fim contribuirá para
perda de mais de 75% da diversidade genética de plantas foi completamente perdida, junto
com 90% das variedades de cultivo. Além de uma perda biológica sem precedentes, devemos
também prestar atenção na perda de todo conhecimento tradicional ligado as comunidades
que eram responsáveis pelo cultivo dessas espécies (Aguiar, 2023).
A formação de patentes deslegitima todo trabalho dos povos tradicionais, responsáveis
por um trabalho intergeracional de melhoramento genético. O direito coletivo dos
agricultores é posto como subordinado ao direito das corporações “melhoristas”, com povos
tradicionais sendo proibidos de fazer uso de seus objetos tradicionais de sobrevivência, já que
estes agora são entendidos como propriedade intelectual de grandes conglomerados
internacionais (Aguiar, 2023).
A Revolução Verde é apenas o primeiro movimento que visa tornar o ambientalismo
rentável. A privatização de bens comuns que ocorre em ondas ao redor de todo o globo é o
primeiro passo num projeto que torna a questão ambiental em mais uma das pastas
econômicas. A Economia verde é o caso mais flagrante desse projeto.
A Economia Verde propriamente dita, só vai tomar corpo formalmente como uma
alternativa para sair da crise de 2008. Os diversos fracassos alcançados pelas tentativas
prévias de regulação pura, são a principal pauta de crítica à ecologia tradicional por meio dos
formuladores da Economia Verde. Para tentar combater esse tipo de falha, buscam inserir a
proteção ambiental por meio de incentivos econômicos baseados na quantificação de natureza
que deixa de ser devastada por essas empresas. Contudo, sua base numa quantificação
material do uso de recursos naturais vem de 1997 e o Protocolo de Quioto. Este que surge
com objetivo de metrificar a emissão de gases responsáveis pelo efeito estufa, desde o dióxido
de carbono até os fluorocarbonetos. Com seu enfoque principal permanecendo no dióxido de
carbono (Fatheuer, 2016).
O conceito de “Economia Verde” traz em seu nome o projeto de retirar de foco os
países menos desenvolvidos, já que a nomenclatura viria para substituir a noção de
“Desenvolvimento Sustentável” (Fatheuer, 2016).
Da mesma forma que opera a medição do Produto Interno Bruto (PIB) de um país, a
métrica do carbono foi formulada justamente para permitir a contabilização do gasto de
carbono, ou seja, um projeto de quantificação do natural, tornando-o mercadoria passível de
troca. E é essa troca a problemática da Economia Verde. Durante eventos preparatórios para a
Conferência das Nações Unidas para o Desenvolvimento Sustentável (2012), ou Rio+20,
lideranças da PNUMA, OCDE e do Banco Mundial buscam formular uma nova abordagem
econômica da qual o meio ambiente também será contabilizado. Esse projeto tomou forma no
“Green New Deal”, que com base neokeynesiana de maior participação do Estado na
economia e da inserção de investimentos no ambiente como forma de recuperar o crescimento
econômico, com a racionalidade econômica incorporando a política ambiental e não mais
fazendo frente a ela (Fatheuer, 2016).
Em 2008 foi o ano que entrou em vigor a Métrica do Carbono que foi acordada em
1997 no Protocolo de Quioto.
O plano inicial era utilizar a Rio+20, como palco de apresentação ao mundo da
Economia Verde, o que foi um redondo fracasso. Houve uma rejeição majoritária por países
do Sul Global, e também por parte da cúpula dos povos, evento paralelo à conferência. Um
dos pontos mais marcantes das discordâncias é a diferença de propostas ambientais pautados
pelos dois grupos, países do sul, como Bolívia e Equador, trazem projetos sobre Direito ao
Bem Viver e sobre o reconhecimento dos direitos à natureza, enquanto que idealizadores da
Economia verde buscam a construção de um “capital natural” dentre os cálculos econômicos,
num projeto de mercantilizar a natureza (Fatheuer, 2016).
O entendimento básico da economia verde, e o institucionalizado atualmente é o de
que a única forma de valorizar o meio ambiente é precificando-o. Garantindo prêmios pela
não distribuição de patrimônio comum da humanidade, até que em algum momento no futuro
uma nova descoberta tecnológica torne possível que salvemos o planeta. Sem mencionar
todos os problemas de natureza teórica da Economia Verde, sua prática é igualmente falha. Já
que pode facilmente ser utilizada para justificar investimentos econômicos ambientais em
larga escala altamente danosos para a natureza. Como por exemplo, uma plantação de
eucalipto, já que uma floresta secundária é capaz de capturar uma quantidade maior de
dióxido de carbono que uma floresta em equilíbrio (Fatheuer, 2016).
Outro exemplo negativo da Economia Verde na prática é a possibilidade de abuso do
Pagamento por Serviços Ambientais (PSA), fundando a noção do “direito de emitir”, ou seja,
uma empresa agora é capaz de custear algum projeto ambiental para “compensar” sua
poluição, o que é chamado de “Greenwashing” (Furtado, 2021). A criação do mercado do
carbono basicamente servo como uma autorização para poluição, já que, analisando pela
lógica da Economia Verde, não é mais necessário não poluir, apenas compensá-la, e ainda
nem ao menos é necessário que a compensação seja feita no bioma sendo atacado, uma
empresa que realiza exploração de gás natural na Sibéria pode facilmente compensar sua
emissão de gases do efeito estufa contribuindo com uma ação de proteção à Mata Atlântica no
Brasil (Fatheuer, 2016).
O momento atual do ambientalismo não é dos melhores. O movimento deixa de ser
marginal, em defesa da preservação do meio ambiente e comunidades tradicionais, e passa a
ser usado por via de regra para justificar a destruição do Meio Ambiente. A agenda ambiental
moderna pode ser interpretada como parte do movimento de institucionalização do
neoliberalismo que ocorre desde a década de 1990. É durante essa década que entra em cena a
OMC, e a internacionalização da privatização do que deveria ser patrimônio público. É
também durante a época em que se começa a discutir as diferentes formas sobre como
contabilizar o meio ambiente, o Protocolo de Quioto abre caminho para “mercadorização” da
pauta ambiental.
A questão ambiental é vista como um empecilho ao crescimento, sendo assim, toda
vez que a questão ambiental é posta em discussão, seus resultados são baseados em acordos
voluntários, não vinculantes, não obrigatórios. Como ocorrem em 2015 com os acordos de
Paris. Retornamos ao compromisso que os países do Norte possuíam antes da Conferência de
Estocolmo, a questão ambiental torna-se palco de relações públicas, são prometidos centenas
de bilhões de dólares para sanar os problemas do meio ambiente, mas de concreto é visto
pouco. Como Fabrina Furtado (2021) nomeia, a era do “ambientalismo de espetáculo”
Os povos indígenas sempre foram a Vanguarda da luta pela preservação ambiental.
Para eles, a preservação do meio ambiente é também proteção da sua forma de vida. E com a
institucionalização da Economia Verde, seu modo de vida tornou-se cada vez mais ameaçado.
Atualmente, por conta da Redução de Emissão por Desmatamento e Degradação Florestal
(REDD), os povos indígenas tornaram-se verdadeiros “comerciantes de carbono”. Os
incentivos oferecidos pela não derrubada de mata, nem mesmo para o plantio itinerário
característico de muitas comunidades indígenas, os indígenas mantêm as florestas de pé, em
troca de créditos de carbono, os quais eles trocam para manutenção de sua sobrevivência
(Fatheuer, 2016).
Não somente o ambientalismo, mas todo sistema econômico contemporâneo, está
baseado na noção de crescimento ilimitado dentro de um planeta limitado. Dentro da
medicina isso é conhecido como câncer. De acordo com Philip Alston (2020), a eliminação da
pobreza, de acordo com os parâmetros atuais de crescimento e desconsiderando recessões e
efeitos negativos do agravamento da crise ambienta, poderia levar até 200 anos e necessitaria
de um crescimento da economia global em 173 vezes. Algo que simplesmente não é viável
dada a condição limitada de nosso planeta.

Referências:

LAGO, André Aranha Corrêa do. Estocolmo, Rio, Joanesburgo: O Brasil e as três
conferências ambientais das Nações Unidas. Brasília: IRBr e Funag, 2006, p. 25-68.

AGUIAR, Diana; PACKER, Larissa; PACHECO, Maria Emília; BITTENCOURT, Naiara. A


privatização dos bens comuns dos povos do Cerrado e suas lutas contra a erosão do
patrimônio genético e cultural. In: Dossiê Sociobiodiversidade e Soberania Alimentar no
Cerrado, 2023, p. 1-20.

FATHEUER, Thomas; FUHR, Lili; UNMÜBIG, Barbara. Crítica à economia verde. Rio de
Janeiro: Fundação Heinrich Böll, 2016, p. 51-85.

FURTADO, Fabrina. O clima do negócio e o negócio do clima COP – 26: o paraíso das
corporações. Fundação Rosa Luxemburgo, 17/11/2021, p. 1-17.

ALSTON, Philip, The parlous state of poverty eradication: report of the Special
Rapporteur on extreme poverty and human rights. Report submitted to the Human Rights
Council, 2020.

Você também pode gostar