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"Numa manhã você estava em nossa porta, enrolada com lençol fino e dentro de um cesto,

talvez por isso deixaram também uma tocha ao seu lado"

Essa era a história do meu nascimento, uma criança deixada às portas de um convento.
Nunca soube o porque nem me interessei em procurar saber, tinha mães o bastante para
me preocupar com quem havia me deixado. Tive uma vida simples e regrada, estudava e
frequentava as missas pela manhã, ajudava em casa durante a tarde e algumas noites
fazíamos vigília de oração. Eu não entendia muito bem a necessidade daquilo no começo,
mas me dei conta recentemente que preciso da luz para enfrentar os terrores da noite.
Na minha adolescência as mães tentaram me indicar rapazes como pretendentes, mas eu
não entendia porque não indicavam garotas também, as explicações delas não faziam
sentido pra mim. Mas uma garota me entendia, uma meia elfa de família nobre que conheci
no mercado, ela partilhava do meu pensamento e logo nos tornamos amigas. Essa amizade
com Irene evoluiu rápido, nos apaixonamos e, para minha surpresa naquela época, as
mães apoiaram.
Aos 20 anos eu e Irene havíamos juntado ouro o bastante das nossas mesadas para um
plano louco que ela tinha; compramos uma máquina fotográfica e saímos pelo país em uma
longa viagem. Voltamos dois anos depois, cheias de memórias, a maioria registradas nas
fotos que Irene fazia questão de tirar, inclusive os registros de nosso casamento; ela fez o
sacerdote registrar nossas poses bobas.
Vivi muitos anos felizes com Irene, os mais felizes da minha vida, mas já fazem dois anos
que ela não está mais aqui para iluminar meus dias. Certa noite, após um jantar na casa
dos pais dela, minha companheira simplesmente desapareceu. Procuramos pela casa e
nenhum sinal de que alguém havia entrado e levado minha amada. De volta a nossa casa,
uma pequena que havíamos conseguido comprar com a ajuda de nossas famílias, me
deparei com gavetas vazias; quase todas as roupas de Irene haviam sumido e nossas
coisas estavam reviradas. No meio da bagunça, a única coisa útil que pude encontrar foi
uma foto, mas que estava com a imagem queimada e pouco se podia ver além de algo que
parecia um desenho no canto. Apesar de parecer um roubo, nosso dinheiro é, o mais
importante, a máquina fotográfica, ainda estavam lá. Obviamente que procurei por Irene,
saía todos os dias com fotos dela e perguntava às pessoas, mas sem sucesso durante o
primeiro ano.
No último ano me dediquei ao convento, uma de minhas mães havia falecido e elas
estavam precisando de ajuda. Ainda estava triste e com saudade de Irene, mas começando
a aceitar que ela não voltaria. Uma das mães, Alina, percebeu isso e sugeriu me ajudar;
pegou a foto queimada e, por meio de uma magia, conseguiu consertar parte da imagem.
Para nosso espanto Irene estava na foto, junto com outras pessoas que pareciam fazer
roda em volta de um círculo desenhado no chão. Então decidi voltar a minha busca, dessa
vez focando nos poucos símbolos daquela foto. Alina também pediu por algo que fosse de
Irene e que ela tivesse usado muito e a única coisa que pude pensar foi nossa máquina
fotográfica. Embora as coisas parecessem estar caminhando para um resultado depois de
tanto tempo, quando fui buscar a máquina me perdi em pensamentos com as fotos da
viagem com Irene; as lembranças daqueles momentos, a dúvida do porquê tudo aquilo
aconteceu e agora a possibilidade de encontrá-la… Quando me dei conta da hora já havia
escurecido, mas eu estava determinada demais para lembrar dos avisos das mães sobre a
noite e fui direto ao convento. No caminho um grupo me abordou na rua e levou meu
dinheiro e a máquina, além de me baterem por tentar resistir. Cheguei ao convento com
rasgos na roupa e um pouco de sangue, infelizmente mais meu do que deles.
Daquele dia em diante busquei me ligar mais a Lumalia, santa padroeira do convento e
pedi por seu auxílio para lutar contra o mal e encontrar minha amada. Para minha surpresa
ela respondeu, nem imagino como Irene reagiria se dissesse que a própria Santa Lumalia
falou diretamente comigo, nem eu mesma acreditei no começo, mas acabamos por selar
uma espécie de pacto e consegui habilidades para me ajudar, em troca de servir como seu
arauto contra injustiças.
Já fazem algumas semanas desde que consegui o pacto com Santa Lumalia, Alina me
disse que eu encontraria ajuda em Legalia, então estou viajando até lá na esperança de
uma pista sobre o paradeiro da Polaroid de Irene.

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