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Plano de Estudo - 2º Bimestre Valor: 10,0 Média: 6,0 Nota:

Componente Curricular: Psicologia Carga Horária: Data: / /2023

Professor (a):

Aluno (a): Turma: CN2001 /1001

JOGO, BRINQUEDO, BRINCADEIRA E A EDUCAÇÃO

O brincar como uma ação metafórica, contribui para o desenvolvimento integral da criança e propicia a construção do
conhecimento. Por tais razões, o brincar passa a fazer parte de programas de formação de professores.

. O Jogo e a Educação Infantil

Pesquisadores do Laboratoire de Recherche sur lê Jeu et lê Jouet, da Université Paris-Nord, como Gilles Brougère (1981,
1993) e Jaques Henriot (1983, 1989), começam a desatar o nó deste conglomerado de significados atribuídos ao termo
jogo ao apontar três níveis de diferenciações. O jogo pode ser visto como:

1. o resultado de um sistema linguístico que funciona dentro de um contexto social;

2. um sistema de regras;

3. um objeto. No primeiro caso, o sentido do jogo depende da linguagem de cada contexto social.

As línguas funcionam como fontes disponíveis de expressão. Elas exigem o respeito a certas regras de construção que
nada têm a ver com a ordem do mundo. A noção de jogo não nos remete à língua particular de uma ciência, mas a um
uso cotidiano. Assim, o essencial não é obedecer à lógica de uma designação científica dos fenômenos e, sim, respeitar
o uso cotidiano e social da linguagem, pressupondo interpretações e projeções sociais. Considerar que o jogo tem um
sentido dentro de um contexto significa a emissão de uma hipótese, a aplicação de uma experiência ou de uma
categoria fornecida pela sociedade, veiculada pela língua enquanto instrumento de cultura dessa sociedade. Toda
denominação pressupõe um quadro sociocultural transmitido pela linguagem e aplicado ao real. Dependendo do lugar e
da época, os jogos assumem significações distintas.

Se o arco e a flecha hoje aparecem como brinquedos, em certas culturas indígenas representavam instrumentos para a
arte da caça e da pesca. Em tempos passados, o jogo era visto como inútil, como coisa não séria. Já nos tempos do
Romantismo, o jogo aparece como algo sério e destinado a educar a criança. No Brasil, termos como jogo, brinquedo e
brincadeira ainda são empregados de forma indistinta, demonstrando um nível baixo de conceituação deste campo.
Cada contexto social constrói uma imagem de jogo conforme seus valores e modo de vida, que se expressa por meio da
linguagem. No segundo caso, um sistema de regras permite identificar em qualquer jogo, uma estrutura sequencial que
especifica sua modalidade.

Tais estruturas sequenciais de regras permitem diferenciar cada jogo, permitindo superposição com a situação lúdica,
ou seja, quando alguém joga, está executando as regras do jogo e, ao mesmo tempo, desenvolvendo uma atividade
lúdica. O terceiro sentido refere-se ao jogo enquanto objeto. O xadrez materializa-se no tabuleiro e nas peças que
podem ser fabricadas com papelão, madeira, plástico, pedra ou metais. O pião, confeccionado de madeira, casca de
fruta ou plástico, representa o objeto empregado na brincadeira de rodar pião. Brinquedo é outro termo indispensável
para compreender esse campo. Diferindo do jogo, o brinquedo supõe uma relação íntima com a criança e uma
indeterminação quanto ao uso, ou seja, a ausência de um sistema de regras que organizam sua utilização.

O brinquedo estimula a representação, a expressão de imagens que evocam aspectos da realidade. Ao contrário, jogos,
com xadrez e jogos de construção exigem, de modo explícito ou implícito, o desempenho de certas habilidades definidas
por uma estrutura preexistente no próprio objeto e suas regras. Pode-se dizer que um dos objetivos do brinquedo é dar
à criança um substituto dos objetos reais, para que possa manipula-los.

Os brinquedos podem incorporar, também, um imaginário preexistente criado pelos desenhos animados, seriados
televisivos, mundo da ficção científica com motores e robôs, mundo encantado dos contos de fada, estórias de piratas,
índios e bandidos. Ao representar realidades imaginárias, os brinquedos expressam, preferencialmente, personagens
sob forma de bonecos, como manequins articulados ou super-heróis, misto de homens, animais, máquinas e monstros.

O brinquedo propõe um mundo imaginário da criança e do adulto, criador do objeto lúdico. No caso da criança, o
imaginário varia conforme a idade: para o pré-escolar de 3 anos, está carregado de animismo; de 5 a 6 anos, integra
predominantemente elementos da realidade. A infância é a idade do possível. Pode-se projetar sobre ela a esperança de
mudança, de transformação social e renovação moral.

A imagem de infância é reconstituída pelo adulto por meio de um duplo processo: de um lado, ela está associada a todo
um contexto de valores e aspirações da sociedade, e, de outro, depende de percepções próprias do adulto, que
incorporam memórias de seu tempo de criança. Assim, se a imagem de infância reflete o contexto atual, ela é
carregada, também, de uma visão idealizada do passado do adulto, que contempla sua própria infância.

A infância expressa no brinquedo contém o mundo real, com seus valores, modos de pensar e agir e o imaginário do
criador do objeto. Assim como a poesia, os jogos infantis despertam em nós o imaginário, a memória dos tempos
passados. Em Infância (1984), Graciliano Ramos recorda seu cotidiano de criança pobre, que construía brinquedos de
barro e invejava os meninos que possuíam brinquedos mecânicos. Em contraposição, Baudelaire, em “Curiosités
esthétiques” (apud Brougère, 1993), relembra o menino burguês que deixa seus brinquedos sofisticados para olhar
interessado o brinquedo vivo (rato) do menino maltrapilho.

O brinquedo contém sempre uma referência ao tempo de infância do adulto com representações veiculadas pela
memória e imaginação. O vocábulo “brinquedo” não pode ser reduzido à pluralidade de sentidos do jogo, pois conota
criança e tem uma dimensão material, cultural e técnica. Enquanto objeto, é sempre suporte de brincadeira. É o
estimulante material para fazer fluir o imaginário infantil. E a brincadeira? É a ação que a criança desempenha ao
concretizar as regras do jogo, ao mergulhar na ação lúdica. Pode-se dizer que é o lúdico em ação. Desta forma,
brinquedo e brincadeira relacionam-se diretamente com a criança e não se confundem com o jogo. Hoje, a imagem de
infância é enriquecida, também, com o auxílio de concepções psicológicas e pedagógicas, que reconhecem o papel de
brinquedos e brincadeiras no desenvolvimento e na construção do conhecimento infantil.

Características do Jogo
Ao descrever o jogo como elemento da cultura, Huizinga (1951: 3-31) omite os jogos de animais e analisa apenas os
produzidos pelo meio social, apontando as características: o prazer, o caráter “não sério”, a liberdade, a separação dos
fenômenos do cotidiano, as regras, o caráter fictício ou representativo e sua limitação no tempo e no espaço. Há casos
em que o desprazer é o elemento que o caracteriza. Vygotsky é um dos que afirmam que nem sempre o jogo possui a
característica do prazer, porque, em certos casos, há esforço e desprazer na busca do objetivo da brincadeira.

A psicanálise também apresenta o desprazer como constitutivo do jogo, especialmente ao demonstrar como a criança
representa, em processos catárticos, situações extremamente dolorosas. O caráter “não-sério” apontado por Huizinga
não implica que a brincadeira infantil deixe de ser séria. Quando a criança brinca, ela o faz de modo bastante
compenetrado. A pouca seriedade a que faz referência está mais relacionada ao cômico, ao riso, que acompanha, na
maioria das vezes, o ato lúdico e se contrapõe ao trabalho, considerado atividade séria.

Quando brinca, a criança toma certa distância da vida cotidiana, entra no mundo imaginário. Embora Huizinga não
aprofunde essa questão, ela merecerá atenção de psicólogos que discutem o papel do jogo na construção da
representação mental e da realidade. A existência de regras em todos os jogos é uma característica marcante. Há regras
explícitas, como no xadrez ou amarelinha, regras implícitas como na brincadeira de faz-de-conta, em que a menina se
faz passar pela mãe que cuida da filha. São regras internas, ocultas, que ordenam e conduzem a brincadeira.
Finalmente, todo jogo acontece em um tempo e espaço, com uma seqüência própria da brincadeira.

Seguindo quase a mesma orientação de Huizinga, Caillois (1958: 42-3) aponta como características do jogo: a liberdade
de ação do jogador, a separação do jogo em limites de espaço e tempo, a incerteza que predomina, o caráter
improdutivo de não criar nem bens nem riqueza e suas regras. Um novo elemento introduzido pelo autor é a natureza
improdutiva do jogo. O que importa é o processo em si de brincar que a criança se impõe. Quando ela brinca, não está
preocupada com a aquisição de conhecimento ou desenvolvimento de qualquer habilidade mental ou física.

A incerteza presente em toda conduta lúdica é outro ponto que merece destaque. No jogo, nunca se sabem os rumos da
ação do jogador, que dependerá, sempre, de fatores internos, de motivações pessoais e de estímulos externos, como a
conduta de outros parceiros. É preciso estar em perfeita simbiose com o jogador para identificar, em sua atitude, o
envolvimento no jogo. O jogo inclui sempre uma intenção lúdica do jogador. Mais recentemente, Chrestie (1991b: 4)
rediscute as características do jogo infantil, apontando pesquisas atuais que o distinguem de outros tipos de
comportamentos. Utilizando estudos de Garvey (1977), King (1979), Rubin e outros (1983), Smith e Vollstedt (1985), a
autora elabora os critérios para identificar seus traços:

1. a não-literalidade: o sentido habitual é substituído por um novo: o ursinho de pelúcia servir como filhinho e a criança
imitar o irmão que chora;

2. efeito positivo: quando brinca livremente e se satisfaz, a criança o demonstra por meio do sorriso;

3. flexibilidade: as crianças estão mais dispostas e ensaiar novas combinações de idéias e de comportamentos em
situações de brincadeira que em outras atividades não recreativas. Brincar leva a criança a tornar-se mais flexível e
buscar alternativas de ação;

4. prioridade do processo de brincar: enquanto a criança brinca, sua atenção está concentrada na atividade em si e não
em seus resultados e efeitos. O jogo educativo, utilizado em sala de aula, muitas vezes desvirtua esse conceito ao dar
prioridade ao produto, à aprendizagem de noções e habilidades;

5. livre escolha: o jogo infantil só pode ser jogado quando escolhido livre e espontaneamente pela criança. Caso
contrário é trabalho ou ensino;

6. controle interno: no jogo infantil, são os próprios jogadores que determinam o desenvolvimento dos
acontecimentos. Quando o professor utiliza um jogo educativo em sala de aula, de modo coercitivo, não oportuniza aos
alunos liberdade e controle interno. Predomina, neste caso, o ensino, a direção do professor.

Se a atividade não for de livre escolha e seu desenvolvimento não depender da própria criança, não se terá jogo, mas
trabalho. As crianças concebem como jogo somente as atividades iniciadas e mantidas por elas. Em síntese os autores
assinalam pontos comuns como elementos que interligam a grande família dos jogos:
1.liberdade de ação do jogador ou o caráter voluntário, de motivação interna e episódica da ação lúdica; prazer (ou
desprazer), futilidade, o “não-sério” ou efeito positivo;

2.regras (implícitas ou explícitas); 3.relevância do processo de brincar (o caráter improdutivo), incerteza de resultados;
4.não-literalidade, reflexão de segundo grau, representação da realidade, imaginação; 5.contextualização no tempo e
no espaço.

. As Relações entre o Jogo Infantil e a Educação

O jogo visto como recreação, desde a antiguidade greco-romana, aparece como relaxamento necessário a atividades
que exigem esforço físico, intelectual e escolar (Aristóteles, Tomás de Aquino, Sêneca, Sócrates). Durante a Idade
Média, o jogo foi considerado “não-sério”, por sua associação ao jogo de azar. O jogo serviu para divulgar princípios de
moral, ética e conteúdos de história, geografia e outros, a partir do Renascimento, o período de “compulsão lúdica”.
Para se contrapor aos processos verbalistas de ensino, à palmatória vigente, o pedagogo deveria dar forma lúdica aos
conteúdos.

É Vives – Traité de L’enseignement, 1612, apud Brougère (1993;108) – que completa o sentido do jogo, veiculado nos
tempos atuais, como um meio de expressão de qualidades espontâneas ou naturais da criança, como recriação,
momento adequado para observar a criança, que expressa através dele sua natureza psicológica e inclinações.

Uma tal concepção mantém o jogo à margem da atividade educativa, mas sublinha sua espontaneidade. Tal forma de
perceber o jogo está relacionada com a nova percepção da infância que começa a construir-se no Renascimento: a
criança dotada de valor positivo, de uma natureza boa, que se expressa espontaneamente por meio do jogo,
perspectiva que irá fixar-se com o Romantismo.

O Romantismo constrói no pensamento da época um novo lugar para a criança e seu jogo, tendo como representantes
filósofos e educadores como Jean-Paul Richter, Hoffmann e Fröebel, que consideram o jogo como conduta espontânea e
livre de instrumento de educação da pequena infância. Supondo existir uma equivalência entre povos primitivos e a
infância, poder-se-ia entender a infância como idade do imaginário, da poesia, à semelhança dos povos dos tempos da
mitologia.

Daí ter sentido a afirmação de que o jogo é uma conduta espontânea, livre, de expressão de tendências infantis. Groos
adota o pressuposto biológico da necessidade da espécie e acrescenta a vontade e a consciência infantil em busca do
prazer para justificar os processos psicológicos. Para Claperède (1956), o jogo infantil desempenha papel importante
como o motor do autodesenvolvimento e, em conseqüência, método natural de educação e instrumento de
desenvolvimento. Na teoria piagetiana, a brincadeira aparece como forma de expressão da conduta, dotada de
características matafóricas como espontânea, prazerosa, semelhantes às do Romantismo e da biologia.

A brincadeira, enquanto processo assimilativo, participa do conteúdo da inteligência, à semelhança da aprendizagem.


Para o autor, ao manifestar a conduta lúdica, a criança demonstra o nível de seus estágios cognitivos e constrói
conhecimentos. Para Vygotsky (1988, 1987, 1982), toda conduta do ser humano, incluindo suas brincadeiras, é
construída como resultado de processos sociais.

Considerada situação imaginária, a brincadeira de desempenho de papéis é conduta predominante a partir de três anos
e resulta de influências sociais recebidas ao longo dos anos anteriores. Para Chomsky a compreensão de que as regras
geram as sentenças a partir de outras regras é a chave para a compreensão da linguagem e de sua teoria sobre as
brincadeiras infantis. Para Bruner (1978, 1986, 1983, 1976) é a ação comunicativa que se desenrola nas brincadeiras
entre mãe e filho, que dá significado aos gestos e que permite à criança decodificar contextos e aprender a falar. Ao
descobrir as regras, nos episódios altamente circunstanciados, a criança aprende ao mesmo tempo a falar, a iniciar a
brincadeira e altera-la.

A aprendizagem da língua materna é mais rápida, quando se inscreve no campo lúdico. Os paradigmas sobre o jogo
infantil parecem equiparar o jogo ao espontâneo, “não-sério”, à futilidade ou reivindicar o sério e associa-lo à utilidade
educativa, em sua grande maioria, referenciais dos tempos do Romantismo. O aparecimento de novos paradigmas
como os de Bruner e de Vygotsky, partindo de pressupostos sociais e da lingüística, oferece novos fundamentos teóricos
ao papel dos brinquedos e brincadeiras na educação pré-escolar.
TIPOS DE BRINQUEDOS E BRINCADEIRAS

Brinquedo Educativo (Jogo Educativos)

Entendido como recurso que ensina, desenvolve e educa de forma prazerosa, o brinquedo educativo materializa-se no
quebra-cabeça, destinado a ensinar formas ou cores, nos brinquedos de tabuleiro que exigem a compreensão do
número e das operações matemáticas, nos brinquedos de encaixe, que trabalham noções de sequência de tamanho e
de forma, nos múltiplos brinquedos e brincadeiras, cuja concepção exigiu um olhar para o desenvolvimento infantil e a
materialização da função psicopedagógica: móbiles destinados à percepção visual, sonora ou motora; carrinhos
munidos de pinos que se encaixam para desenvolver a coordenação motora, parlendas para a expressão da linguagem,
brincadeiras envolvendo músicas, danças, expressão motora, gráfica e simbólica.

Ao permitir a ação intencional (afetividade), a construção de representações mentais (cognição), a manipulação de


objetos e o desempenho de ações sensório-motoras (físico) e as trocas nas interações (social), o jogo contempla várias
formas de representação da criança ou suas múltiplas inteligências, contribuindo para a aprendizagem e o
desenvolvimento infantil. Quando as situações lúdicas são intencionalmente criadas pelo adulto com vistas a estimular
certos tipos de aprendizagem, surge a dimensão educativa.

Utilizar o jogo na educação infantil significa transportar para o campo do ensino-aprendizagem condições para
maximizar a construção do conhecimento, introduzindo as propriedades do lúdico, do prazer, da capacidade de
iniciação e ação ativa e motivadora. Ao assumir a função lúdica e educativa, o brinquedo educativo merece algumas
considerações: 1.função lúdica: o brinquedo propicia diversão, prazer e até desprazer, quando escolhido
voluntariamente;
2.função educativa: o brinquedo ensina qualquer coisa que complete o indivíduo em seu saber, seus conhecimentos e
sua apreensão do mundo. Apesar da riqueza de situações de aprendizagens que propicia, nunca se tem a certeza de que
a construção do conhecimento efetuado pela criança será exatamente a mesma desejada pelo professor.

A utilização do jogo potencializa e exploração e a construção do conhecimento, por contar com a motivação interna,
típica do lúdico, mas o trabalho pedagógico requer a oferta de estímulos externos e a influência de parceiros bem como
a sistematização de conceitos em outras situações que não jogos. Ao utilizar de modo metafórico a forma lúdica (objeto
suporte de brincadeira) para estimular a construção do conhecimento, o brinquedo educativo conquistou espaço
definitivo na educação infantil.

. Brincadeiras Tradicionais Infantis

Por ser um elemento folclórico, a brincadeira tradicional infantil assume características de anonimato, tradicionalidade,
transmissão oral, conservação, mudança e universalidade. Sabe-se, apenas, que provêm de práticas abandonadas por
adultos, de fragmentos de romances, poesias, mitos e rituais religiosos. Tais brincadeiras foram transmitidas de geração
em geração através de conhecimentos empíricos e permanecem na memória infantil. A brincadeira tradicional tem a
função de perpetuar a cultura infantil, desenvolver formas de convivência social e permitir o prazer de brincar. A
brincadeira tradicional infantil garante a presença do lúdico, da situação imaginária.

Brincadeiras de Faz-De-Conta

A brincadeira de faz-de-conta, também conhecida como simbólica, de representação de papéis ou socio dramática, é a
que deixa mais evidente a presença da situação imaginária. Ela surge com o aparecimento da representação e da
linguagem, em torno de 2/3 anos, quando a criança começa a alterar o significado dos objetos, dos eventos, a expressar
seus sonhos e fantasias e a assumir papéis presentes no contexto social. Permite a expressão de regras implícitas que se
materializam nos temas das brincadeiras. Os conteúdos veiculados durante as brincadeiras infantis bem como os temas
de brincadeiras, os materiais para brincar, as oportunidades para interações sociais e o tempo disponível são todos
fatores que dependem basicamente do currículo proposto pela escola. É alterando o significado de objetos, de
situações, é criando novos significados que se desenvolve a função simbólica, o elemento que garante a racionalidade
ao ser humano. Ao brincar de faz-de-conta a criança está aprendendo a criar símbolos.

Brincadeiras de Construção

Os jogos de construção são considerados de grande importância por enriquecer a experiência sensorial, estimular a
criatividade e desenvolver habilidades da criança. Fröebel, o criador dos jogos de construção, oportunizou a muitos
fabricantes a duplicação de seus tijolinhos para a alegria da criançada que constrói cidades e bairros que estimulam a
imaginação infantil. Construindo, transformando e destruindo, a criança expressa seu imaginário, seus problemas e
permite aos terapeutas o diagnóstico de dificuldades de adaptação bem como a educadores o estímulo da imaginação
infantil e o desenvolvimento afetivo e intelectual. O jogo de construção tem uma estreita relação com o de faz-de-
conta. As construções se transformam em temas de brincadeiras e evoluem em complexidade conforme o
desenvolvimento da criança.

A BRINCADEIRA DE FAZ-DE-CONTA: LUGAR DO SIMBOLISMO, DA REPRESENTAÇÃO, DO

IMAGINÁRIO

“Cada criança em suas brincadeiras comporta-se como um poeta,


enquanto cria seu mundo próprio ou, dizendo melhor,
enquanto transpõe os elementos formadores
de seu mundo para uma nova ordem,
mais agradável e conveniente para ela.”
Freud. O poeta e a fantasia

Referências Literárias e Teóricas

Para Piaget (1981), quando brinca, a criança assimila o mundo à sua maneira, sem compromisso com a realidade, pois
sua interação com o objeto não depende da natureza do objeto, mas da função que a criança lhe atribui. É o que Piaget
chama de jogo simbólico, o qual se apresenta inicialmente solitário, evoluindo para o estágio de jogo sociodramático,
isto é, para a representação de papéis, como brincar de médico, de casinha, de mãe etc. O apogeu do jogo simbólico
situa-se entre 2 e 4 anos de idade, declinando a partir daí. Uma criança de 4 anos num balanço age “como se” estivesse
em um avião e precisasse mudar os planos de vôo porque tem pouca gasolina. Há um contraste entre esse tipo de jogo
de faz-de-conta e o brincar de uma criança que simplesmente, se balança o mais alto que pode em um balanço.

A primeira criança, de acordo com Piaget, estaria introduzindo elementos de “como se” e graus de fantasia, os quais
estariam modificando a situação, enquanto a outra, na sua brincadeira, estaria apenas, procurando dominar
dificuldades. De acordo com Singer (1973), a maior parte dos jogos de faz-de-conta envolve transações interpessoais,
eventos e aventuras que englobam outras características e situações no espaço e no tempo. O jogo imaginativo
acontece com pares ou grupos de crianças que introduzem objetos inanimados, pessoas e animais que não estão no
momento. Para Vygotsky (1984), brincar preenche necessidades que mudam de acordo com a idade. Exemplo: o
brinquedo que interessa a um bebê deixa de interessar a uma criança mais velha. As crianças querem satisfazer certos
desejos que muitas vezes não podem ser satisfeitos imediatamente.

Como a criança pequena não tem a capacidade de esperar, cria um mundo ilusório, onde os desejos irrealizáveis podem
ser realizados. Esse mundo é que Vygotsky chama de brincadeira. À medida que a criança vai desenvolvendo, há uma
modificação: primeiro predomina a situação e as regras estão ocultas (não explícitas); quando ela vai ficando mais velha
predominam as regras (explícitas) e a situação imaginária fica oculta.

Ação e Significado no Brinquedo

Só brincando é que a criança vai começar a perceber o objeto não da maneira que ele é, mas como desejaria que fosse.
Na aprendizagem formal isso não é possível, mas no brinquedo isso acontece, porque é onde os objetos perdem a sua
força determinadora. A criança não vê o objeto como ele é, mas lhe confere um novo significado. Para Vygotsky, o mais
importante não é a similaridade do objeto com a coisa imaginada, mas o gesto. No brinquedo, o significado conferido ao
objeto não é mais importante que o próprio objeto. Vygotsky chama a atenção para o fato de que, para a criança com
menos de 3 anos, o brinquedo é coisa muito séria, pois ela não separa a situação imaginária da real. Já na idade escolar,
o brincar torna-se uma forma de atividade mais limitada que preenche um papel específico em seu desenvolvimento,
tendo um significado diferente do que tem para uma criança em idade pré-escolar.

Brinquedo e Desenvolvimento Simbólico

A simbolização através dos objetos funciona como pré-condição para o aparecimento de jogo de papéis propriamente
dito. A separação ação/objeto só ocorre quando á criança reproduz a situação na qual os objetos estão ausentes. Por
exemplo: dar banho na boneca com água imaginária ou dar de comer um alimento que não existe. Simultaneamente,
alguns objetos começam a ser usados como substitutos de outros. Exemplo: um pedaço de pau e um bloco funcionam
como sabão e termômetro para a boneca.

A criança só consegue nomeá-los sozinha, sem a interferência do adulto, mais ou menos aos 3 anos de idade. A partir
desse momento, a criança não só substitui um objeto por outros ou reproduz aspectos de sua vida diária, mas passa a
representar papéis de vida dos adultos como brincar de mãe, de médico, de enfermeira etc. A interpretação do papel do
adulto pela criança é uma forma original de simbolização. A criança passa do brinquedo cujo conteúdo básico é a
reprodução das atividades dos adultos com objetos para o brinquedo cujo conteúdo básico torna-se a reprodução das
relações de adultos entre si ou crianças.

O jogo simbólico constitui, assim, mais do que um objeto da própria atividade, um expressivo gesto acompanhado pela
fala (Elkonin, 1971). De acordo com Vygotsky, jogo simbólico é um mecanismo comportamental que possibilita da
transição de coisas como objetos de ação para coisas como objetos do pensamento(Vygotsky, 1984:122-3). O brincar
tem sua origem na situação imaginária criada pela criança, em que desejos irrealizáveis podem ser realizados, com a
função de reduzir a tenção e, ao mesmo tempo, para constituir uma maneira de acomodações a conflitos e frustrações
da vida real; (2) para Piaget, o brincar represente um fase no desenvolvimento da inteligência, marcada pelo domínio da
assimilação sobre a acomodação , tendo como função consolidar a experiência passada
. O Faz-De-Conta: Ponte Entre a Realidade e a Fantasia

Em seu livro uma vida para seu filho, bettelheim (1988) afirma que, através das fantasias imaginativas e nas brincadeiras
baseadas nelas, as crianças podem começar a compensar as pressões que sofrem na realidade no cotidiano. Assim,
enquanto representam fantasias de ira e hostilidade em jogos de guerra ou preenchem seus desejos de grandeza,
imaginando ser o Super-man, o Hulk,o Batiman ou um rei, estão procurando a satisfação indireta através de devaneios
irreais, ao mesmo tempo que procuram livrar-se do controle dos adultos, especialmente dos pais. Salum e Morais
(1980), em um estudo sobre o faz-de-conta com crianças pré-escolares, chegam à conclusão de que kostelnik e
colaboradores (1986) citam algumas características dos super herois e heroínas:

1- bondade, sabedoria, inteligência e força;


2- 2- solucionar qualquer problema e ultrapassar obstáculos.
3- 3- os super-heróis não tem de se preocupar com os compromissos que caracterizam o mundo real e suas soluções
são sempre aceitas;
4- 4- as pessoas os procuram para que os guiem e resolvam suas dúvidas, enquanto eles não recebem ordens de
ninguém;
5- 5- sabem sempre o que é certo, nunca se enganam, não estão sujeitos a dúvidas, frustrações ou fraquezas como a
maioria das pessoas.

São aprovados e reconhecidos pelos adultos e todos querem ser seus amigos. Portanto, as crianças desejariam ter os
poderes que eles tem, como força, velocidade e resistência, além do poder de voar, nadar em baixo d’água em longas
distâncias ou mudar a forma do corpo. As crianças têm pouco poder num mundo dominado pelos adultos, e elas tem
consciência disso. Brincando, portanto, a criança coloca-se num papel de poder, em que elas podem dominar os vilões
ou as situações que provocariam medo ou que fariam se sentir vulnerável ou insegura.

A brincadeira leva-a a superar obstáculos da vida real, como vestir-se, comer um alimento sem deixar cair, fazer
amigos, enfim, corresponder as expectativas dos padrões adultos (Levinson, 1989). Como muito bem afirmam Kostelnik
e colaboradores (1986), o que acontece com outros tipos de jogos dramáticos aparece também na brincadeira de super-
herói, pois as crianças aumentam suas habilidades linguísticas, são levadas a solucionar melhor os problemas e
desenvolvem a cooperação.

A Brincadeira, os Brinquedos e a Realidade

No jogo simbólico as crianças constroem uma ponte entre a fantasia e a realidade. As crianças são capazes com
complexas dificuldades psicológicas através do brincar. Elas procuram integrar experiências de dor, medo e perda.
Lutam com conceitos de bom e mal. Crianças que vivem em ambientes perigosos repetem suas experiências de perigo
em suas brincadeiras. Quando a criança assume o papel de alguém que teme, a personificação é determinada por
ansiedade ou frustração. Escolhendo o papel do médico ou do fantasma, a criança pode passar do papel passivo para o
ativo e aplicar a uma outra pessoa, a uma criança ou a uma boneca o que foi feito com ela. A passagem de um papel
passivo para um papel ativo é o mecanismo básico de muitas atividades lúdicas. Reduz o efeito traumático de uma
experiência recente e deixa o indivíduo melhor preparado para ser submetido novamente ao papel passivo, quando
necessário. Isso explica, em grande parte, o efeito benéfico da brincadeira. O brinquedo aparece como um pedaço de
cultura colocado ao alcance da criança. É seu parceiro na brincadeira. A manipulação do brinquedo leve a criança à ação
e à representação, a agir e a imaginar. O mundo representado é mais desejável que o mundo real.

A brincadeira aparece, assim, como um meio de sair do mundo real para descobrir outros mundos. O brincar da criança
não está somente ancorado no presente, mas também tenta resolver problemas do passado ao mesmo tempo que se
projeta para o futuro. Brincar com bonecas numa infinidades de formas está intimamente ligado à relação da menina
com a mãe. Melanie Klein afirma que brincar com bonecas revela a necessidade que a criança tem de ser consolada e
tranquilizada.

Alimentar e vestir bonecas com as quais se identifica funciona como uma prova de que sua mãe a ama e isso diminui o
medo de ser abandonada e de ficar ao desamparo, sem lar e sem mãe. É através de seus brinquedos e brincadeiras que
a criança tem oportunidade de desenvolver um canal de comunicação, uma abertura para o diálogo com o mundo dos
adultos, onde “ela restabelece seu controle interior, sua auto-estima e desenvolve relações de confiança consigo mesma
e com os outros. No sonho, na fantasia, na brincadeira de faz-de-conta desejos que pareciam irrealizáveis podem ser
realizados.

JOGAR E BRINCAR
Representando Papéis, a Criança Constrói o Próprio Conhecimento
A pergunta feita pelo professor: _ Vamos brincar? ou ainda: _ Vamos jogar? pode surtir o mesmo efeito em seus alunos
por se tratar , afinal, de duas palavras com o mesmo significado, ou ele está propondo duas atividades que, por serem
distintas, podem dividir o grupo entre os que responderão: eu prefiro brincar e os que dirão eu prefiro jogar?

Certamente encontraremos professores que utilizam as palavras jogo, brinquedo e brincadeira como sinônimos.
Outros, no entanto, marcam uma diferença entre elas que remonta a sua própria história de vida. Se pegarmos um
dicionário de 50 anos atrás, certamente a acepção das palavras jogo, brinquedo e brincadeira estarão impregnadas de
uma visão da época. Nos dias de hoje, observamos que há uma clara diferença entre jogo e brinquedo. No entanto, quer
a palavra jogo quanto a palavra brincadeira podem ser sinônimos de divertimento.

A ambiguidade entre os termos se consolida com o uso que as pessoas fazem dela. A primeira e talvez a mais forte
imagem que vem à mente a quase todos, quando se fala em jogo, consiste em duas pessoas sentadas jogando (xadrez,
cartas, damas etc). Ou seja, dentro dessa idéia não há movimento. No entanto, o jogo, por si só, se constitui em ação e,
assim, associado ao movimento. Esses conceitos também possuem pontos em comum.

Um deles ó o de que tanto o jogo quanto a brincadeira são culturais. É difícil encontrarmos exemplos de um jogo ou de
uma brincadeira que, sendo originário de uma cultura, tenha sido assimilado por outra. Não fosse assim, de tanto
assistirmos a filmes norte-americanos e convivermos com pessoas que viajam constantemente aos Estados Unidos
trazendo novidades de lá, nós já estaríamos hoje jogando beisebol e nossas criança estariam brincando de doces ou
travessuras nas noites de Halloween.

No Mundo do Faz-De-Conta, a Criança Aprende a Lidar com a Realidade

O jogo simbólico tem uma natureza imitativa e não significa intenção de comunicação com os outros. A criança constrói
símbolos, inventa, transforma o que é real naquilo que é desejado. É comum, nas brincadeiras, a criança se transformar
em um adulto no mundo do faz-de-conta e imitar situações já vivenciadas. Brincando de bonecas, imitando sua mãe, a
criança passa a repetir situações vividas, talvez buscando a resolução de um conflito entre ela e sua mãe ou criando uma
solução para um qualquer situação.

A brincadeira infantil permite que a criança reviva suas alegrias, seus conflitos e seus medos, resolvendo-os a sua
maneira e transformando a realidade naquilo que ela quer. Com isso, internaliza regras de conduta, desenvolvendo o
sistema de valores que irá orientar seu comportamento. O uso de jogos de construção é uma das atividades mais
desejadas. É preciso deixar que elas explorem e criem situações através de jogos de encaixe, sucatas, fantasias,
fantoches, máscaras... Todo e qualquer material posto ao alcance da criança faz com que ela vá criando e imaginando
uma forma diferente de brincar com esse objeto. Como nos informa Winnicot, “ a brincadeira fornece uma organização
para a iniciação de relações emocionais e assim propicia o desenvolvimento de contatos sociais”.

Existem atividades que oportunizam situações de jogo simbólico, dando chance às crianças de criarem os personagens,
como os Jogos Motores. As brincadeiras de sessão historiada proporcionam à criança o desenvolvimento da imaginação
sobre os personagens. O professor deve deixar que a criança crie movimentos e sons. Assim ela estará trazendo a sua
realidade para essa brincadeira. Usando a hora do conto, o professor pode contar às crianças histórias infantis
(Chapeuzinho Vermelho, Branca de Neve, Cinderela, Peter Pan...) e propor que dêem vida a esses personagens através
de dramatizações. Outra maneira de reproduzir histórias, a partir da brincadeira é com a utilização de fantoches, que
podem ser confeccionados pelos próprios alunos, aproveitando-se sucata, restos de papéis coloridos, bolinhas de
isopor, papel machê e ou outros materiais. A imaginação e a fantasia são tão presentes e expansivas que, se
oferecermos apenas fantoches ou fantasias, a própria criança cria a sua história partindo de uma experiência vivida,
realizando uma verdadeira brincadeira simbólica.

REVISÃO CONCEITUAL QUANTO AO JOGO,


À BRINCADEIRA E AO BRINQUEDO,
NAS VISÕES DE PIAGET,
VIGOTSKY E WINNICOTT
PIAGET

Piaget estrutura o jogo em três categorias: o jogo de exercício – onde o objetivo é exercitar a função em si; o jogo
simbólico – onde o indivíduo se coloca independente das características do objeto, funcionando em esquema de
assimilação, e o jogo de regra, no qual está implícita uma relação interindividual que exige a resignação por parte do
sujeito. Piaget cita ainda uma quarta modalidade, que é o jogo de construção, em que a criança cria algo. Para ele, a
origem do jogo está na imitação que surge da preparação reflexa. Imitar consiste em reproduzir um objeto na presença
do mesmo. A imitação passa por várias etapas até que, com o passar do tempo, a criança é capaz de representar um
objeto na ausência do mesmo. É uma ligação entre a imagem (significante) e o conceito (significado), capaz de originar o
jogo simbólico, também, chamado de faz-de-conta. Paulatinamente, o jogo simbólico vai cedendo lugar ao jogo de
regras, porque a criança passa do exercício simples às combinações sem finalidade e depois com finalidade, tornando-se
coletivo, tendendo a evoluir para o aparecimento de regras que constituem a base do contrato moral. As regras
pressupõem relações sociais ou interpessoais. Elas substituem o símbolo, enquadrando o exercício nas relações sociais.
As regras são, para Piaget, a prova concreta do desenvolvimento da criança.

VIGOTSKY
O jogo traz oportunidade para o preenchimento de necessidades irrealizáveis e também a possibilidade para exercitar-
se no domínio do simbolismo. Quando a criança é pequena, o jogo é o objeto que determina sua ação, traz vantagens
sociais, cognitivas e afetivas. A brincadeira possui três características: a imaginação, a imitação e a regra. Elas estão
presentes em todos os tipos de brincadeiras infantis, tanto nas tradicionais, naquelas de faz-de-conta, como ainda nas
que exigem regras. Podem aparecer também no desenho, como atividade lúdica. Do ponto de vista psicológico, Vigotsky
atribui ao brinquedo um papel importante: aquele de preencher uma atividade básica da criança, ou seja, ele é um
motivo para a ação. No pré-escolar há uma grande quantidade de tendências e desejos não possíveis de serem
realizados de imediato, e é nesse momento que os brinquedos são inventados, justamente para que a criança possa
experimentar tendências irrealizáveis. A impossibilidade de realização imediata dos desejos cria tensão e a criança se
envolve com o ilusório e o imaginário, onde seus desejos podem ser realizados. É o mundo dos brinquedos. A
imaginação surge da ação e é a primeira manifestação da emancipação da criança em relação às restrições situacionais.
Isso não significa necessariamente que todos os desejos não-satisfeitos dão origem aos brinquedos.

WINNICOTT
A brincadeira é universal e própria da saúde: o brincar facilita o crescimento e, portanto, a saúde. O brincar conduz aos
relacionamentos grupais, podendo ser uma forma de comunicação na psicoterapia: traz a oportunidade para o exercício
da simbolização e é também uma característica humana. O trabalho de Winnicott apresenta algumas motivações da
atividade lúdica: para buscar prazer, para expressar agressão, para controlar a ansiedade, para estabelecer contatos
sociais, para realizar a integração da personalidade e, por fim, para comunicar-se com as pessoas. Na obra A Criança e
seu Mundo, Winnicott faz colocações

fundamentais sobre a brincadeira:

As crianças têm prazer em todas


as experiências de brincadeira física e
emocional (...)
(...) Deve-se aceitar a presença da
agressividade, na brincadeira da
criança (...)
A angústia é sempre um fator na
brincadeira infantil e, freqüentemente,
um fator dominante.
(...) A brincadeira é a prova evidente
e constante da capacidade criadora,
que quer dizer vivência.
(...) As brincadeiras servem de elo
entre, por um lado, a relação do indivíduo
com a realidade interior, e por outro
lado, a relação do indivíduo com a realidade
externa ou compartilhada.
Os adultos contribuem, neste ponto,
pelo reconhecimento do grande lugar
que cabe à brincadeira e pelo ensino
de brincadeiras tradicionais, mas
sem obstruir nem adulterar a
iniciativa própria da criança.

Com base em tais teorias, ao brincar e ao jogar, a criança constrói o conhecimento. E, para isso, uma das qualidades
mais importantes do jogo e do brinquedo é a confiança que a criança tem quanto à própria capacidade de encontrar
soluções. Tanto o jogo quanto a brincadeira como o brinquedo podem ser englobados em um universo maior chamado
de ato de brincar. Nesse brincar está o pensamento, a verbalização, o movimento, gerando canais de comunicação. A
linguagem cultural própria da criança é o lúdico. A criança comunica-se através dele e, por meio dele, irá ser agente
transformador, sendo o brincar um aspecto fundamental para chegar ao seu próprio desenvolvimento integral.

O ato de brincar é importante, é terapêutico, é prazeroso, e o prazer é ponto fundamental da essência do equilíbrio
humano. A partir do brincar e do jogar, ela constrói os conhecimentos através dos papéis que representa, desenvolve ao
mesmo tempo dois vocabulários – o linguístico e o psicomotor – além do ajustamento afetivo emocional que atinge na
representação desses papéis. A criança brinca porque tem um papel, um lugar específico na sociedade, e não apenas
porque o faz-de-conta – como o brincar de cavalo, em que a criança se utiliza do cabo de vassoura – faz parte da
natureza de tal criança.

O jogo é a forma que as crianças encontram para representar o contexto em que estão inseridas. O ato de brincar pode
incorporar valores morais e culturais em que as atividades lúdicas devem visar à autoimagem, à autoestima, ao
autoconhecimento, à cooperação, porque estes conduzem à imaginação, à fantasia, à criatividade, à criticidade e a uma
porção de vantagens que ajudam a moldar suas vidas, como crianças e como adultos.

Desde os primeiros anos da infância, encontram-se processos criativos que se refletem, sobretudo nos jogos. É através
deles que as crianças reelaboram, criativamente, combinando fatos entre si e construindo novas realidades de acordo
com seus gostos e necessidades. Também nestes jogos e brincadeiras aparece toda a experiência acumulada da criança.

Neles as lideranças são desenvolvidas, e aí ela aprende a obedecer a regras e normas e a respeita-las. No brincar,
ocorre um processo de troca, partilha, confronto e negociação, gerando momentos de desequilíbrio e equilíbrio, e
propiciando novas conquistas individuais e coletivas. A criança tem a chance de dar vazão a uma afetividade que,
freqüentemente, é tolhida na difícil luta pela sobrevivência enfrentada dia-a-dia por seus pais. É através da atividade
lúdica que a criança se prepara para a vida, assimilando a cultura do meio em que vive, a ele se integrando, adaptando-
se às condições que o mundo lhe oferece e aprendendo a competir, cooperar com seus semelhantes e conviver como
um ser social.

Além de proporcionar prazer e diversão, o jogo, o brinquedo e a brincadeira podem representar um desafio e provocar
o pensamento reflexivo da criança.

METÁFORA E PENSAMENTO: CONSIDERAÇÕES SOBRE A IMPORTÂNCIA DO JOGO NA AQUISIÇÃO


DO CONHECIMENTO E IMPLICAÇÕES PARA A EDUCAÇÃO PRÉ-ESCOLAR.

Nada é lixo para aquele que alternadamente pensa e sonha.


Gaston Bachelard
Se procurar bem, você acaba encontrando
não a explicação (duvidosa) da vida
mas a poesia (inexplicável) da vida.
Drumond de Andrade
Na luta da tirania do lógica (cartesiana)
quem vem em nosso auxílio é a poesia,
paradigma de uma lógica analógica...
Na poesia o logocentrismo foi sempre
em maior ou menor grau contestado
pela prática da linguagem.
Haroldo de Campos

Um dos caminhos para fazer frente à realidade congelada e opressiva de muitas escolas e trazer a vida à tona é a busca
de uma educação político-estética, que tenha como cerne a visão do homem como ser simbólico, que se constrói
coletivamente e cuja capacidade de pensar está ligada à capacidade de sonhar, imaginar, jogar com a realidade. Uma
das tarefas centrais do desenvolvimento nos primeiros anos de vida é a construção dos sistemas de representação
tendo papel-chave neste processo a capacidade de “jogar com a realidade”.

É neste sentido que podemos dizer que o jogo simbólico constitui a gênese da metáfora, possibilitando a própria
construção do pensamento e a aquisição do conhecimento.

A Metáfora e o Símbolo como Chaves da Natureza do Homem


O ser humano é um ser sensível que, diante do mundo, busca significações, o que torna seu pensamento dinâmico por
excelência; e é a metáfora, com suas múltiplas possibilidades de combinação, que possibilita a mediação entre realidade
e pensamento.

O pensamento (metafórico por sua própria constituição) é formado por uma rede de relações simbólicas apropriadas
culturalmente, mas elaboradas e recriadas pelo sujeito a partir de condições internas próprias. Também metafórica é a
linguagem; seu uso baseia-se não em definições precisas, mas na utilização de esquemas (não necessariamente
conscientes) que resultam de interações ricas e complexas com a realidade física e social.

8.2. A Conquista da Dimensão Simbólica do Pensamento: o Jogo como Gênese da Metáfora

Poesia é brincar com palavras


Como se brinca
Com bola, papagaio e pião

Só que
Bola, papagaio e pião de
tanto brincar se gastam

As palavras não:
Quanto mais se brinca com elas
Mais novas ficam

Como a água do rio


que é água sempre nova

Como cada dia


que é sempre um novo dia

“Convite”
José Paulo Paes

Para Cassirer, a chave para a compreensão da verdadeira natureza do homem é o símbolo. Hoje se faz necessário
resgatar o caráter simbólico do homem, quanto à percepção consciente, que se vê cada dia mais reprimida, enrijecida e
massificada, numa sociedade cuja filosofia de vida é racionalista e reducionista e que, muitas vezes, leva à alienação do
próprio processo de criação e simbolização do sujeito, em que as crianças não têm mais espaço para viver a infância de
maneira plena e enriquecedora. O que distingue o homem dos animais é que aquele possui uma imaginação e uma
inteligência simbólicas que vão além de uma inteligência e imaginação práticas. No desenvolvimento das crianças, é
evidente a transição de uma forma para outra através do jogo, que é a imaginação em ação. A criança precisa de tempo
e de espaço para trabalhar a construção do real pelo exercício da fantasia.

Lili vive no mundo do faz-de-conta.


Faz de conta que isto é um avião, zum...
Depois aterrizou em pique e virou trem
Tuc, tuc, tuc, tuc...
Entrou pelo túnel chispando.
Ma debaixo da mesa havia bandidos.
Pum! Pum! Pum! Pum!
O trem descarrilou. E o mocinho? Meu Deus!

No auge da confusão, levaram Lili para a cama a força.


E o trem ficou tristemente derribado no chão,
fazendo de conta que era mesmo uma lata de sardinha.

Lili inventa o mundo


Mário Quintana

A imaginação é um processo psicológico novo para a criança; representa uma forma especificamente humana de
atividade consciente que não está presente na consciência das crianças muito pequenas e está ausente nos animais. Ela
surge primeiro em forma de jogo, que é a imaginação em ação. (Vygotsky) Para Vygotsky, a imaginação em ação ou
brinquedo é a primeira possibilidade de ação da criança numa esfera cognitiva que lhe permite ultrapassar a dimensão
perceptiva motora do comportamento.

.
“Como todas as funções da consciência
ela surge originalmente da ação.
O velho adágio de que o brincar de criança
é a imaginação em ação
deve ser invertido; podemos dizer que
a imaginação nos adolescentes
e nos adultos é o brinquedo sem ação”. (Vigotsky)

Para Piaget, também é a representação em atos, através do jogo simbólico, a primeira possibilidade de pensamento
propriamente dito. Na criança a imaginação criadora, surge em forma de jogo, instrumento primeiro de pensamento no
enfrentamento da realidade. Jogo sensório-motor que se transforma em jogo simbólico, ampliando as possibilidades de
ação e compreensão do mundo. O imaginário não se confunde com o real, ele é um instrumento para a compreensão e
a tomada de consciência do real. A realização da imaginação material, criadora, potencial inerente ao homem, é uma
necessidade.
“O homem não cria apenas porque quer ou porque gosta,
mas, porque precisa; ele só pode crescer enquanto
ser humano coerentemente, ordenando, dando formas,
criando... . A própria consciência nunca é algo
acabado ou definitivo. Ela vai se formando
no exercício de si mesma, num desenvolvimento
dinâmico em que o ser humano, procurando sobreviver e
agindo, transforma a natureza e se transforma também.
E ele somente percebe as transformações
como sobretudo nelas se percebe...”
(Ostrower, 1984)

A capacidade de simbolizar e de jogar com a realidade através da fantasia e dos próprios símbolos coletivamente
estruturados – a linguagem verbal (oral e escrita), os mitos, a religião, a ciência – é que permite ao homem viver numa
nova dimensão da realidade: o universo simbólico. É a representação/simbolização que possibilita a interiorização do
mundo. Infelizmente, nossas crianças, na maioria das escolas, recebem regras prontas, não significações. Elas devem
aceita-las para poder se transformar num “bom adulto”. E o mesmo acontece com os professores. A força da
manipulação autoritária faz sombra à força da vida instintiva da criança e à possibilidade de construção do
conhecimento significativo. No entanto, o jogo está presente na escola, quer o professor permita quer não. Mas é um
jogo de regras marcadas, predeterminadas, em que a única ação permitida à criança é a obediência, ou melhor, a
submissão. Por isso, é preciso resgatar o direito da criança a uma educação que respeite seu processo de construção do
pensamento, que lhe permita desenvolver-se nas linguagens expressivas do jogo, do desenho e da música. Estes, como
instrumentos simbólicos de leitura e escrita de mundo, articulam-se ao sistema de representação da linguagem escrita,
cuja elaboração mais complexa exige formas de pensamento mais sofisticadas para sua plena utilização

AVALIAÇÃO

01.(VUNESP/2012) Segundo Kishimoto (1997), “cada contexto social constrói uma imagem de jogo conforme seus
valores e modos de vida, que se expressa __________________.”
Assinale a alternativa que completa corretamente a frase.

(A) pela literatura

(B) pela escrita

(C) pela dança

(D) por meio das obras de arte

(E) por meio da linguagem

02.(VUNESP/2012) Ao abordar a grande família dos jogos, os autores, destacados por Kishimoto (1997), assinalam
pontos comuns entre eles:

I. Certeza do resultado.

II. Regras (implícitas ou explícitas).

III. Contextualização no tempo e espaço.

IV. Liberdade de ação do jogador.

Está correto o contido apenas em

(A) I.

(B) I e II.

(C) II e III.

(D) III e IV.

(E) II, III e IV.

03- Sobre os objetivos dos jogos e brincadeiras, assinale a alternativa INCORRETA:

a) Estimular no aluno o espírito de competição.

b) Oportunizar à criança formas de solucionar problemas práticos, que as situações dos jogos e brincadeiras oferecem.

c) Favorecer a autoexpressão.

d) Despertar na criança o sentido de grupo, ensinando-a a conviver com outras crianças, praticando cooperação,
lealdade, cortesia e respeito aos semelhantes.

e) Promover a socialização e a autoconfiança.

04-Na história do brinquedo na Educação, dizemos corretamente que:

a) os jogos têm função de lazer e na escola melhor se adequam como auxiliares ao trabalho docente e por isso só
acontecem nos recreios.

b) os jogos e brinquedos nunca foram aceitos nas escolas, dada a função social dessa instituição e seu caráter instrutivo.

c) os jogos e brinquedos são práticas culturais que não precisam ser aceitas nas escolas, pois são bem vivenciadas fora
dela.

d) os brinquedos podem estar integrados ao ensino, uma vez que são auxiliares e integrados ao desenvolvimento
humano.
e) Os brinquedos não deveriam existir e não são importantes.

05. “A _______________ não é encontrada apenas em jogos ou brincadeiras, podemos encontrá-la nas atividades que
propiciem a vivência plena do aqui agora, integrando a ação, o pensamento e o sentimento. São aquelas que
possibilitam que se instaure um estado de inteireza e de entrega: dinâmicas de integração grupal ou de sensibilização,
de relaxamento e respiração, cirandas ou atividades diversas de expressão." Observe a afirmação acima, complete a
lacuna e marque a alternativa correspondente:

a) Ludicidade

b) Diversidade

c) Problematização de valores estéticos

d) Exclusão

e) Desunião

06- Jogos populares são aqueles que foram passados de geração a geração, isto é, aprendemos com nossa família.
Alguns brinquedos, jogos e brincadeiras conhecidos pelos adultos e crianças brasileiras têm origens surpreendentes.
Vêm tanto dos povos que deram origem à nossa civilização: o índio, o europeu e o africano; como até mesmo do
longínquo Oriente. Assinale a questão que NÃO apresenta jogos e brincadeiras tradicionais:

a) Peteca, taco, pular corda e esconde-esconde.

b) Natação, atletismo, tênis e basquetebol.

c) Bambolê, esgrima, futebol e bolinha de gude.

d) Amarelinha, passa anel, pega-pega e queimada.

e) Karatê, bambolê, tirolesa e mímica.

07. A música folclórica pode ser usada na Educação como instrumento de valor próprio e significativo. Diverge-se dessa
concepção quando se afirma que esse tipo de música:

a) ativa a erotização e permite à criança transformar-se em um instrumento vivo, com sua voz e seu corpo.

b) estimula a imaginação e a criatividade, através do brincar e do caráter lúdico das letras.

c) Propicia experiencia musical carregada de conhecimento culturalmente construído pelas gerações anteriores.

d) oportuniza grande contribuição para o desenvolvimento social, cultural, e emocional da criança.

e) Contribui para o desenvolvimento de importantes habilidades de todos que a praticam.

08-A utilização de jogos e brincadeiras auxiliam no processo ensino aprendizagem, inclusive gerando mudança positiva
nas atitudes de alguns estudantes. O uso de jogos no processo educativo pode promover, EXCETO:

a) Integração

b) Socialização

c) Autoconfiança

d) Apatia

e) Motivação
09-Identifique abaixo as afirmativas verdadeiras ( V ) e as falsas ( F ), considerando que a brincadeira é a principal
atividade da infância.

( ) Por ser pequena e vulnerável a criança não sabe muitas coisas e, por não saber tomar decisões ou escolher o que
fazer, então, sempre precisa ser direcionada em suas brincadeiras.

( ) A criança poder escolher e ter acesso aos brinquedos e às brincadeiras é um de seus direitos como cidadã.

( ) Brincar é repetir e recriar ações prazerosas, é expressar situações imaginárias, criativas onde a individualidade e a
identidade podem ser exploradas. Assinale a alternativa que indica a sequência correta, de cima para baixo.

A) V•V•V

B) V•F•F

C) F•V•V

D) F•V•F

E) F•F•F

10-As práticas pedagógicas desenvolvidas pelas instituições de Educação Infantil devem garantir experiências que
contemplem uma multiplicidade de linguagens e narrativas. Assim, a prática de “contação de histórias” se encerra em
uma ferramenta significativa para o desenvolvimento infantil. Assinale a alternativa correta em relação ao assunto.

A) As crianças pequenas devem ouvir sempre a mesma história para auxiliar o seu processo de interesse e memorização.

B) As histórias precisam ser contadas sucessivamente em um mesmo local a fim de garantir o silêncio das crianças.

C) Os contos de fadas, o universo dos reis, princesas e bruxas não são recomendados para as crianças, pois podem
provocar ansiedade e medo.

D) Criar rituais para o momento de contar histórias pode auxiliar o processo de construção do envolvimento e da
atenção das crianças em relação às narrativas.

E) Às crianças é desaconselhável recontar histórias do seu jeito, visto que, ao criar suas próprias narrativas, podem
aprender a mentir.

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