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Autores
Eduardo Soares de Macedo *
Luciana Pascarelli Santos **
Kátia Canil *
Fabiana Checchinato Silva *
Rafaela Bonfante Lançone **
Fabrício Araujo Mirandola *
Rodrigo Nery e Costa **
RESUMO
O município de São Paulo, SP, conta hoje com quase 11 milhões de habitantes, dos quais quase
dois milhões vivem em cerca de 1600 assentamentos urbanos precários (favelas). Essas áreas
ocupam a periferia da cidade, carente de infraestrutura. Além disso, situam-se em terrenos de
encostas e margens de córregos que apresentam fragilidade frente a processos de
escorregamento e inundações. O problema é tão amplo e complexo que não é possível resolver
tudo em curto prazo e, para tanto, deve ser sistematizado um plano de gestão para áreas de risco.
Sendo assim, entende-se que o reconhecimento das áreas e o mapeamento das situações de
risco, com base em critérios pré-definidos, constituem a base inicial dos trabalhos. Procurando
atender essa demanda, a Prefeitura de São Paulo contratou o Instituto de Pesquisas Tecnológicas
do Estado de São Paulo (IPT), para realizar o mapeamento de risco em 407 áreas de encostas e
margens de córregos sujeitas a escorregamentos e a processos de solapamento de margens em
assentamentos precários do Município de São Paulo, atendendo 26 das 31 subprefeituras do
município, quais sejam, 07 na Zona Norte (com 107 áreas), 07 na Zona Sul (com 176 áreas), 02
na Zona Oeste (com 24 áreas) e 10 na Zona Leste (com 100 áreas). O zoneamento de risco
executado permitiu a identificação de 1.179 setores de risco. Os resultados obtidos permitiram à
administração municipal elaborar um plano estratégico de intervenções para redução e controle
dos riscos mapeados.
ABSTRACT
The city of São Paulo, SP, has almost 11 million inhabitants, of which nearly two million live in
about 1600 urban squatter settlements (slums). These areas occupy the outskirts of the city, which
lack infrastructure. Additionally, they are subject to landslides and flooding. The problem is so vast
and complex that it cannot be completely resolved in the short term, and a management plan for
hazardous areas has to be implemented. For it to be accomplished, it is understood that the
identification and mapping of the risk areas, based on predefined criteria, constitute the basis of
the initial work. To meet this demand, the São Paulo city council appointed the Institute for
Technological Research of São Paulo (IPT) to perform the risk mapping in 407 areas of slopes and
banks of streams, subject to landslides and river bank erosion. Such areas are located in the slums
of São Paulo, comprising 26 of the 31 sub districts of the city, which are: 07 in the North Zone (with
107 areas), 07 in the South Zone (with 176 areas), 02 in the West Zone (with 24 areas) and 10 in
the East Zone (with 100 areas). The results allowed the municipal government to elaborate a
strategic plan of interventions to reduce and control the mapped risks.
Key Words: Risk Mapping, São Paulo, landslide, erosion river bank, IPT
O município de São Paulo, SP, conta hoje com quase 11 milhões de habitantes, dos quais quase
dois milhões vivem em cerca de 1600 assentamentos urbanos precários (favelas). Essas áreas
ocupam a periferia da cidade carente de infraestrutura no que diz respeito ao ordenamento do uso
do solo, saneamento (distribuição de água, coleta e tratamento de esgoto), sistemas de
drenagem, pavimentação de vias de acesso, transporte urbano, dentre outros. Além disso, situam-
se em terrenos de encostas e margens de córregos que apresentam fragilidade frente aos
processos do meio físico, com predominância de ocorrência de escorregamentos de solo, erosões
e inundações. Como resultado tem-se nas últimas décadas o aumento significativo em tamanho e
número dessas áreas de risco, resultante do processo de expansão urbana desordenada e
políticas habitacionais ineficientes.
O problema é tão amplo e complexo que não é possível resolver tudo em curto prazo e para tanto,
deve ser sistematizado um plano de gestão para áreas de risco. De acordo com o modelo de
abordagem do Office of the United Nations Disasters Relief Co-Ordinator (UNDRO, 1991), que
define cinco passos para o gerenciamento de riscos (Identificação dos Riscos, Análise dos Riscos,
Medidas de Prevenção, Planejamento para Situações de Emergência, e Informações Públicas e
Treinamento); entende-se que o reconhecimento das áreas e o mapeamento das situações de
risco, com base em critérios pré-definidos, constituem a base inicial dos trabalhos. Desta forma, o
primeiro mapeamento sistemático de áreas de risco, com base na metodologia desenvolvida pelo
IPT, Unesp e Ministério das Cidades, foi realizado para a cidade de São Paulo, no ano de 2003.
Na ocasião, foram mapeadas 205 áreas. Após este mapeamento, foi definida a prioridade de
intervenção, com o estabelecimento de projetos de obras de recuperação e remoção de moradias.
Considerando a dinâmica do crescimento populacional das áreas de risco e as políticas
habitacionais que não conseguem atender toda demanda existente; a Prefeitura de São Paulo
contratou o Laboratório de Riscos Ambientais do Centro de Tecnologias Ambientais e Energéticas
do Instituto de Pesquisas Tecnológicas do Estado de São Paulo (IPT), para realizar o
mapeamento de risco em 407 áreas sujeitas a escorregamentos e a processos de solapamento de
margens de córregos em assentamentos precários do Município de São Paulo. O mapeamento,
realizado entre setembro de 2009 e dezembro de 2010 contemplou a reavaliação das 205 áreas
mapeadas em 2003, 47 áreas mapeadas por geólogos da prefeitura e 155 novas áreas. Somadas,
as áreas compreendem 13,5 km2, o que corresponde a 0,9% da área total do município. Trata-se
do maior levantamento de risco já realizado no Brasil, considerando a grande quantidade de áreas
mapeadas e os profissionais envolvidos e teve por objetivo subsidiar a elaboração de planos de
intervenção voltados a controlar os riscos existentes. Neste sentido, o presente artigo descreve os
métodos, critérios e procedimentos adotados neste mapeamento de risco, bem como os
resultados obtidos.
Em geral, a identificação e análise de riscos de natureza geológica são realizadas por meio de
investigações geológico-geotécnicas de superfície, executadas em trabalhos de campo. Tais
investigações requerem que seja considerada tanto a possibilidade de ocorrência dos processos
adversos, quanto as consequências sociais e/ou econômicas associadas.
Carvalho (2000) afirma que a avaliação das conseqüências “... envolve sempre um julgamento a
respeito dos elementos em risco e de sua vulnerabilidade. É comum que, nas análises de risco em
favelas, apenas as moradias sejam consideradas como elementos em risco”.
Já em relação à ocorrência do processo adverso, Carvalho (2000) descreve que “... a maneira
mais simples de se tratar a probabilidade em análises de risco consiste em se atribuir, à
possibilidade de ocorrência do processo de instabilização, níveis definidos de forma literal
(possibilidade de ocorrência baixa, média ou alta, por exemplo). Esta é a base para as análises de
risco de caráter qualitativo, em que um profissional experiente avalia o quadro de condicionantes e
indícios da ocorrência do processo de instabilização, compara as situações encontradas com
modelos de comportamento e, baseado em sua experiência, hierarquiza as situações de risco em
função da possibilidade de ocorrência do processo num determinado período de tempo
(geralmente um ano)”.
A estimativa de risco dos setores analisados foi elaborada de forma qualitativa, a partir de
observações de campo integrando os parâmetros de análise contidos numa ficha de avaliação de
risco, com o apoio de imagens aéreas. Os graus de risco considerados foram R1 - Baixo, R2 -
Médio, R3 - Alto e R4 - Muito Alto, descritos a seguir:
INTERVENÇÕES
1 – Limpeza e Manutenção (serviços de limpeza de lixo e entulho; limpeza no sistema de
drenagem - águas pluviais, servidas e/ou esgoto; limpeza - desassoreamento, lixo, entulho- do
canal de drenagem).
2 – Manutenção nas obras observadas no setor.
3 - Drenagem superficial (sistema de drenagem superficial de topo e base no talude; sistemas
de drenagem superficial no setor).
4 - Drenagens de subsuperfície (sistema de drenagem de subsuperfície).
5 - Proteção Superficial Encosta
6 - Proteção Superficial Marginal
7 – Acesso (calçadas, escadarias, ruas, integrando-os com o sistema de drenagem no setor).
8 - Contenções de encosta (estruturas de contenção localizadas de pequeno porte; estruturas
de contenção de médio a grande porte).
9 - Contenções de margem (obras de retificação e contenção de margem de canal).
10 - Blocos (desmonte de bloco rochoso; contenção de bloco rochoso).
11 - Obras de terraplenagem
12 – Remoções (definitiva ou temporária).
QUADRO 1– Resumo das tipologias de intervenções indicadas para as áreas mapeadas.
Cabe ressaltar alguns aspectos metodológicos específicos utilizados nos trabalhos desenvolvidos
pelo IPT:
a) Os limites de análise de cada área foram estabelecidos com base nos logradouros
limítrofes fornecidos pela Prefeitura (ruas, avenidas, estradas, etc.); nas observações
coletadas na vistoria técnica e em comum acordo com as equipes da Prefeitura; e
b) A contagem das edificações foi realizada principalmente com base nas fotos de
helicóptero, considerando como edificação as áreas construídas contíguas sendo,
portanto, aproximadas. Essa observação vale principalmente nas áreas caracterizadas
como de graus de probabilidades média e baixa.
3 RESULTADOS
O mapeamento foi executado em 407 áreas em 26 das 31 subprefeituras do município quais
sejam: 07 na Zona Norte (com 107 áreas): Perus, Pirituba, Freguesia do Ó, Casa Verde, Santana,
Tremembé e Vila Maria; 07 na Zona Sul (com 176 áreas): Ipiranga, Jabaquara, Cidade Ademar,
Campo Limpo, M’Boi Mirim, Capela do Socorro e Parelheiros; 02 na Zona Oeste (com 24 áreas):
Butantã e Jaguaré e 10 na Zona Leste (100 áreas): Penha, Ermelino Matarazzo, São Miguel, Itaim
Paulista, Aricanduva, Itaquera, Guaianazes, Vila Prudente, São Mateus e Cidade Tiradentes
(Figura 1) e (Tabela 1).
Dos 1.179 setores de risco identificados, 57% correspondem a encostas enquanto os demais 43%
correspondem a margens de córregos ocupadas. Deste total, 161 setores (14%) apresentaram
probabilidade muito alta (R4) de ocorrência de processos destrutivos, 446 setores (38%) com
probabilidade alta (R3), enquanto os setores com probabilidade média (R2) e baixa (R1)
totalizaram 572 (49%). No conjunto de setores de risco identificados foram contabilizadas 105.816
moradias, das quais 28.933 classificadas em situação de risco muito alto (R4) e alto (R3), sendo
1.132 moradias indicadas para remoção definitiva. A Figura 2 mostra a distribuição do número de
setores de risco (1) e da quantidade de moradias (2) estimadas de acordo com o grau de
probabilidade de ocorrência de instabilizações.
Em muitos dos setores de risco identificados no mapeamento executado, as informações sobre a
probabilidade de ocorrência de processos destrutivos, a caracterização destes processos e a
indicação de alternativas de intervenção permitiu a definição das medidas adequadas para a
redução dos riscos.
(1) (2)
Figura 2: Distribuição dos setores de risco e quantidade de moradias por grau de risco.
Para os setores de probabilidade muito alta e alta foi proposta a implantação de sistemas de
monitoramento, até a efetivação das medidas preventivas pertinentes.
O exemplo de mapeamento de uma área com a ficha de um setor de risco e respectivas fotos de
sobrevôo e campo pode ser observada no Quadro 2 que apresenta o resumo da avaliação do
risco de um dos setores de área mapeada. A Foto 1 apresenta um exemplo de foto de helicóptero
na qual foram delimitados setores de risco identificados no mapeamento. As Fotos 2 e 3
apresentam características de setores de risco obtidas durante os trabalhos de campo.
Por meio deste recurso, os técnicos da PMSP vêm identificando e readequando as ações
municipais desenvolvidas pelas Secretarias permitindo uma abordagem multidisciplinar e,
portanto, mais eficaz. Dentre as principais ações em andamento estão o Programa de
Urbanização de Favelas e Mananciais que incluem obras de infraestrutura e saneamento, bem
como a transferência de famílias para novas moradias, além de contribuírem para a preservação
das águas das principais represas que abastecem a cidade. O desassoreamento de córregos e a
implantação de obras de pequeno a médio porte, também vem sendo realizados como parte do
Programa de Intervenções em Áreas de Risco, assim como a manutenção das ações de zeladoria
para evitar o agravamento de situações de perigo potencial. A implantação dos Parques Lineares
ao longo de rios e córregos, antes ocupados por moradias irregulares, devolveu suas margens e
ampliou as áreas verdes e permeáveis de São Paulo. Cabe ressaltar que, integradas, essas ações
possibilitaram a redução do risco para áreas tidas como críticas, a exemplo das favelas
Paraisópolis e Nova Jaguaré.
Além das obras de infra-estrutura e do reassentamento de famílias, um sistema de gerenciamento
de risco eficaz deve contar também com ações locais preventivas, emergenciais e recuperativas.
Por esta razão, a Secretaria das Subprefeituras e as 31 Subprefeituras, definiram e vem adotando
CONSIDERAÇÕES FINAIS
O tratamento multidisciplinar e abrangente envolvendo desde o aprimoramento das técnicas de
mapeamento das áreas de risco, até a cuidadosa seleção de áreas passíveis de intervenção,
passando pela orientação e capacitação do poder público, visando à consolidação das ações de
prevenção de acidentes geológicos mostram a importância do trabalho integrado tanto do poder
público como da sociedade na construção de uma política eficaz de redução de desastres.
REFERÊNCIAS
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