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Hear the Screams of the Butterfly

Troy Camplin
Ed. Trad. Thiago Willy

Préfacio
O ano passado foi difícil. Não para mim. Para Patric. Tive dificuldade
em entender o que estava acontecendo com meu amigo, por que ele começou
a agir de forma irracional, distante, mal-humorado, hostil de forma passivo-
agressiva até que, de repente, ele explodiu.
Embora eu seja seu amigo mais próximo – desde a escola primária –
Patric sempre foi um mistério para mim. Ele era tão reservado que ninguém
sabia que ele tinha problemas – seus amigos e eu pensávamos que Patric
estava simplesmente se tornando mais parecido com ele mesmo, embora da
pior maneira possível.
Agora percebo porque nenhum de nós conhecia Patric. Ele enterrou
tudo. Patric, o patológico contador da verdade, não poderia viver a verdade.
Mas você só pode enterrar seus problemas por tanto tempo até que algo tenha
que ceder. E algo cedeu. Infelizmente, foi o autocontrole de Patric – a coisa
mais irônica que ele poderia perder.
Patric era um maníaco por controle – não sobre os outros, já que ele é
muito antiautoritário, mas sobre si mesmo. Sobre as circunstâncias. Ele tinha
que controlar tudo. Ele não entendia que o mundo está além do controle de
qualquer pessoa, que para sobreviver é preciso deixar as coisas fluírem,
aceitar o mundo, com defeitos e tudo. Ele também não entendia que só
porque não podia controlar o mundo, isso não significava que não pudesse
afetá-lo, mesmo que fosse de maneiras que ele nunca veria ou entenderia
completamente. Talvez sua mente tenha decidido mostrá-lo que ele estava
errado, que nem sempre podia controlar sua vida – algo entrou em curto-
circuito e a mente e o corpo de Patric ficaram presos. É uma pena ver uma
mente tão brilhante reduzida a um balanço estupido [mindless] em um
hospital psiquiátrico.
É por isso que eu compilei este livro. Convenci Patric a escrever tudo o
que aconteceu, esperando que ele se abrisse para melhorar. Admito que
tornar seus problemas públicos é uma maneira radical de se abrir, mas
acredito que essa é a única maneira de Patric se abrir – total e publicamente.
Ele sempre foi um homem de extremos. Eu conheço Patric bem o suficiente
para saber que, se isso funcionar e ele sair do hospital psiquiátrico, veremos
outros livros dele, romances do tipo roman-á-clef que irá expor seus
sentimentos mais íntimos sobre o que ele está fazendo ou qualquer
relacionamento que ele possa estar. Também o conheço bem o suficiente
para saber que é no espaço seguro da ficção que ele poderá expor seus
sentimentos mais íntimos. Na ficção, ele pode dizer a verdade enquanto nega
os fatos a seus amigos, familiares ou amantes, que sem dúvida ficarão
surpresos ao se encontrarem em seus romances.
Um aviso, no entanto, para aqueles que esperam que Patric tenha escrito
algo que se assemelhe a um romance ou que tenha escrito em qualquer tipo
de estilo romanesco padrão. Ele não poderia fazer isso no estado em que está.
Nem é seu propósito ter escrito um romance. Estes são os escritos de um
louco, e é assim que devem ser interpretados. Às vezes, Patric se explica por
meio de cenas, mas há outras vezes em que ele apenas explica. O objetivo de
sua escrita é explicar o que aconteceu – tanto para si mesmo quanto para
qualquer pessoa.
Mas estou me adiantando. Patric ainda está no hospital psiquiátrico,
mesmo enquanto estou compilando suas obras em algum tipo de ordem e
escrevendo este prefácio, e até que ele saia, duvido que ele esteja escrevendo
algum romance. Esse relato pode ser a única coisa que podemos esperar dele.
Considerando como as coisas se desenrolaram, eu não ficaria nem um pouco
surpreso se fosse.
Algumas palavras sobre os detalhes de como compilei este livro: depois
de discutirmos sua escrita, sempre que eu visitava Patric, ele me dava tudo o
que havia escrito durante a semana. Ele me deu páginas e seções que
preservei como capítulos, então alguns capítulos são curtos, enquanto outros
parecem começar no meio de um pensamento ou cena. Patric às vezes
escrevia várias seções antes que eu pudesse vê-lo cada fim de semana. Os
problemas mais difíceis surgiram quando ele insistiu que eu inserisse no livro
(pois concordamos desde o início que deveríamos publicar o que ele
escreveu como um livro) fragmentos que ele havia escrito antes de sua
hospitalização e tinha salvado no disco do computador. Ele me deu
descrições verbais e manuscritas das peças – prosa e poesia – e tentei
encontrar as peças sobre as quais ele me falou, mas não posso ter cem por
cento de certeza de que incluí a peça exata que ele queria. Fiz anotações
sobre tudo o que tinha que inserir, para mostrar onde eu estava adivinhando.
Não mostrei ao Patric o livro finalizado – ele disse que confiava em mim e
não estava interessado em detalhes como a construção do livro. Ele havia
escrito e me dado as instruções, e isso era o suficiente. Espero que ele esteja
certo.
Mas deixe-me ficar de lado. Você não comprou este livro para me ouvir
falar sem parar sobre meu amigo e esses detalhes que, tenho certeza, lhe
interessam tão pouco quanto a Patric. Não, você está aqui para ler a história
de Patric – como apenas Patric pode contá-la. Quanto ao meu envolvimento,
apenas transcrevi o que ele escreveu, sem alterar nada, exceto os raros erros
ortográficos. Deixei até os pontos de exclamação. Estas são as palavras de
Patric. Eu não pensaria em impor as minhas, em limpar nada de forma
alguma, em tentar colocar isso em algum tipo de narrativa padrão, como seria
de esperar de um romance escrito com pleno domínio de suas faculdades. É
o que é, como Patric escreveu. Os poemas também são dele e foram escritos
no hospital psiquiátrico e sugeridos por Patric como o início de cada um dos
últimos quatro livros. Houve um poema que ele escreveu para o qual não
conseguimos encontrar um lugar, embora eu ache que é apropriado para este
livro. É um haiku intitulado “O Romântico”,
Não há realmente nada
Mais triste que um romântico
Sem um amante.
Achei que deveria incluí-lo, uma vez que declara claramente a situação
de Patric. Mas agora é hora de me afastar e deixar Patric falar por si mesmo.
LIVRO I
Capítulo 1
Quando o amor se torna dor, apenas os masoquistas permanecem
apaixonados. Que é o que eu sou. Um masoquista. De que outra forma posso
explicar minhas ações? De que outra forma posso explicar por que estou
aqui? O que há para dizer? Eu a amava. Sandi. Eu ainda a amo. A questão é,
ela me ama?
Como você pode saber? Porque dizem que te amam? Por causa de como
agem? Tem uma música que diz, “Está no beijo dele, é lá que está”, mas
como você sabe se já não chegou ao ponto de beijar? Ou se você não tiver a
chance? A verdade é que você só pode ter certeza de seus próprios
sentimentos, uma dolorosa restrição da realidade. Uma dor que eu trocaria
com prazer pelos chicotes de de Sade. Uma dor que me ensinou a verdade
das duas primeiras asas do Amor. Uma dor que deixou as duas últimas asas
do Amor perdidas para mim – já que Sandi poderia ou não retribuir meu
amor.
Onde está meu de Sade para me açoitar como eu mereço? Tragam os
chicotes! Tire o sangue das minhas costas, rios vermelhos brotando de listras
abertas em minha carne. Essa dor não pode ser pior do que isso. Essa dor eu
mereço muito mais do que essa dor insuportável, inescapável e inseparável
que se recusa a diminuir e agora faz parte de mim.
Eu não quero ser injusto com você. Eu deveria começar pelo começo.
Isso, suponho, é uma coisa boba de se dizer. Onde mais alguém poderia
começar? De que outra forma eu poderia fazer você entender minha mente,
por que vejo em vão um conforto ametístico, uma paz de espírito que não
sentia há anos?
Você pode se perguntar por que alguém considerado louco (ou doente
mental, ou algum outro termo que eles têm para meu estado de sentar,
balançar, braços na frente do peito – felizmente pontuado por momentos em
que não é tão ruim, quando consigo até escrever – algum tipo de regressão,
esqueci como se chama. Isso importa? Pode ser importante para você, mas
você terá que se contentar com o que quer que eu diga, com o que eu
conseguir lembrar ou superar a barreira que meu cérebro estabeleceu,
permitindo que apenas certas coisas passem para você ver) tentaria lhe contar
sua história.
Primeiro, você não é meu psiquiatra. Em segundo lugar, não vou me
desculpar pela minha loucura. Aprendi em minha estadia no hospital a amá-
la. Vejo que Sócrates estava certo – a loucura é superior a uma mente sã. A
mente sã é apenas humana, mas a loucura é divina. As Musas gregas
inspiraram um frenesi, despertaram uma lírica nesta alma delicada e virgem.
Eu vim na minha loucura para resgatar aqueles que precisam, que não podem
ver como eu aprendi a ver. Eu busco e não busco libertação desta calamidade
que me aflige.
Então, por que contar minha história? Por que peço que me empreste
seu olho? Meu médico e enfermeiras dizem que se importam, mas eu sei que
não. Não realmente. Não do jeito que eu preciso. Em você espero encontrar
alguém que possa entender o que aconteceu do único jeito que importa.

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