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M I S T I C I S M O l C I Ê N C I A l A R T E l C U L T U R A

INVERNO 2013
Nº 285 – R$ 10,00

O Espaço Sagrado | Eternos princípios do ocultismo | O poder da palavra


Por uma visão cavaleiresca da existência | Paracelso, o rosacruz
n MENSAGEM

Prezados Fratres e Sorores,


© AMORC

Saudações em todas as pontas do nosso Sagrado Triângulo!

Estamos em fase de planejamento na GLP para o


Encontro de Artesãos, a Reunião Anual dos Grandes
Conselheiros, o Congresso da URCI e a Convenção
Nacional para 2014. A sequência de eventos e o
andamento regular da Grande Loja é sustentado por
trabalho em equipe que gosto sempre de lembrar.

Como é comum nos artigos do nosso Imperator, Frater Christian Bernard, eles vêm pre-
enchidos de profunda reflexão mística e nos ensinam a ver aspectos que até então não
nos pareciam tão claros. Nesta edição ele fala do Espaço Sagrado, ressaltando a impor-
tância do corpo, da doação de si mesmo, do nosso planeta, do nosso Sanctum particular
e nos convida a sermos canalizadores das forças do Bem. Diz: “o templo do Universo,
o templo da Terra e o templo da Vida são uma e só coisa – o Templo do Homem.”

Diálogo imaginário com Sócrates, do Frater Ademir Vieira dos Santos, supõe uma
entrevista com o filósofo ateniense abordando temas antropológicos em busca da
Sofia. Leve e agradável, nos leva à reflexão de um pensador ímpar.

Eternos princípios do ocultismo são lições explicadas e comentadas com objetividade


e clareza sobre um assunto nem sempre aceito ou compreendido. Sob a visão
criteriosa do filósofo e ex-Imperator Frater Ralph M. Lewis, o ocultismo, sem ser
uma ciência ou religião, teve grande influência no pensamento humano. Desde
Manetho (280 AC) até os tempos modernos existe um legado que precisa ser mais
bem conhecido.

Números – ponte de acesso à realidade numênica, da Soror Cecília Erthal, é uma


breve reflexão sobre as realidades numênica e fenomênica. Destaca o pensamento
pitagórico: “… Deus atua através de Suas leis e Suas leis atuam através dos números”.

Compatibilidades – A Soror Judy Child nos traz neste artigo ideias e informações
para melhor conduzir nossos relacionamentos, com benefícios imediatos e
de natureza prática. Recomenda: “Conscientize-se de que à medida que seus
relacionamentos se harmonizam, você cresce e se modifica”.

INVERNO 2013 · O ROSACRUZ


1
n MENSAGEM

O Frater Raymund Andrea nos apresenta Paracelso, o rosacruz, uma biografia


fascinante do homem que, em princípio, queria ser apenas um alquimista, mas
convenceu-se da utilidade de “… Fazer as essências supremas e dirigi-las contra as
doenças”. Tornou-se médico e cirurgião intensamente ativo. Curou ricos e pobres,
escreveu vários livros e ainda dedicou-se ao trabalho de evangelizar. Dele se
afirma ter sido um místico no verdadeiro sentido do termo.

Sentinelas de bem-aventurança nos remete a três atributos que todo o místico


procura: Revelação-Imaginação-Iluminação. Neste texto, o Frater Hilton Neves
Filho sugere como chegar até eles para “vislumbrar o propósito divino”.

É possível a igualdade entre os seres humanos? Serge Toussaint, Grande Mestre da


Língua Francesa nos fala de uma realidade social e política em que a igualdade é
quase uma utopia e, sobretudo, que “a evolução se assenta na diversidade e não na
uniformidade e que a fraternidade é um ideal mais viável que a igualdade” e nos
diz o porquê.

O verdadeiro cavaleirismo místico implica numa postura especial diante da vida,


do outro e da ação de Deus através de nós. O artigo Por uma visão cavaleiresca
da existência, do Frater Mario Serrano, equipara a cavalaria a uma via iniciática,
na medida em que revela nossa capacidade latente e nossas aptidões para
solucionar problemas. Para tanto, é preciso vencer o medo e a sensação de nossa
incompletude. Os místicos são potencialmente cavaleiros espirituais com o poder
de captar do Alto a força para o dia-a-dia. E o conto sufi nos convida a uma
reflexão para que façamos jus ao título de Cavaleiro.

Crianças e brinquedos. Este artigo, do Frater Jean Berry Kosht, embora date de
1930, está atualíssimo e serve de orientação para pais, mães e professores.

Como controlar o mau humor – foi perguntado ao Fórum Rosacruz, que respondeu
advertindo: “Nunca se entregue a um momento de mau humor. Cultive uma
vibrante força de tranquilidade e irradie bondade e compreensão, mesmo em
meio à agitação. Quando estiver prestes a perder o autocontrole, recolha-se ao seu
âmago, diga e repita, com convicção: paz, paz, paz…

Sobre mim mesmo, do Frater Moacir Correia, é o depoimento de um sincero


buscador que se dá conta que o caminho é construído por pensamentos, palavras

2 O ROSACRUZ · INVERNO 2013


e ações. Alegoricamente, compara seu estado de imperfeição com as águas turvas.
Só a partir da tomada de consciência, ação e determinação as “águas” vão se
tornando limpas, vivas e transparentes. É o caminho e o cadinho da transmutação.

Afirmando que a linguagem é uma característica do homem, a Soror Cristina


Maria Pompeu Pumar diz em O poder da palavra que antes da palavra os
primitivos emitiam sons, gritos e exclamações para expressar sentimentos.
Aprimorada com o passar do tempo, a palavra tem hoje um valor incontestável.
Cita o Talmude: “A palavra falada é como a abelha: tem mel e tem ferrão”.

Quero lembrar que as Monografias da OGG – Ordem Guias do Graal, nome


atual da anterior Ordem Rosacruz Juvenil, será a primeira experiência da língua
portuguesa em Monografias pela Internet e, então, será seguida pelas Monografias
dos adultos. Ainda neste segundo semestre já teremos concluído esta possibilidade.

Por fim, comunico aos nossos Fratres, Sorores e visitantes que o Portal da
AMORC na Internet está em fase de acabamento e, portanto, ainda contém muitas
coisas para serem ajustadas, mas isto faz parte do processo. Contamos com a
compreensão de todos.

Desejo aos nossos membros muita Paz, Alegria e Harmonia para a consecução dos
seus mais acalentados projetos de natureza espiritual e material.

Sincera e Fraternalmente!
AMORC-GLP

Hélio de Moraes e Marques


Grande Mestre

INVERNO 2013 · O ROSACRUZ


3
n SUMÁRIO

nesta edição
06 O espaço sagrado
Por CHRISTIAN BERNARD, FRC – Imperator da AMORC

14 diálogo imaginário com sócrates


06
Por ADEMIR V. DOS SANTOS, FRC

16 eternos princípios do ocultismo – Lição 1


Por RALPH M. LEWIS, FRC

24 números – ponte de acesso à realidade numênica


Por CECÍLIA ERTHAL, SRC

26 Compatibilidades
Por JUDY CHILD, SRC

28 Paracelso, o rosacruz
Por RAYMUND ANDREA, FRC
16
35 eterna busca
Por PEDRO HENRIQUE ASSUNÇÃO DA SILVA MARTINS, FRC

36 sentinelas de bem-aventurança
Por HILTON NEVES FILHO, FRC

38 É possível a igualdade entre os seres humanos?

40
Por SERGE TOUSSAINT – Grande Mestre da Jurisdição de Língua Francesa

40 Por uma visão cavaleiresca da existência


Por MARIO SERRANO, FRC

46 Crianças e brinquedos
Por JEAN BERRY KOSHT, FRC

48 Como controlar o mau humor


FÓRUM ROSACRUZ

50 sobre mim mesmo


Por MOACIR CORREIA, FRC

52 O poder da palavra
Por CRISTINA MARIA POMPEU PUMAR, SRC
52
4 O ROSACRUZ · INVERNO 2013
O Rosacruz é uma publicação trimestral
Propósito da da Jurisdição de Língua Portuguesa da
Antiga e Mística Ordem Rosae Crucis. As
Ordem Rosacruz demais jurisdições da Ordem Rosacruz
editam uma revista do mesmo gênero:
A Ordem Rosacruz, AMORC é El Rosacruz, em espanhol; Rosicrucian
uma organização internacional de Digest e Rosicrucian Beacon, em inglês;
caráter templário, místico, cultural
Rose+Croix, em francês; Crux Rosae, em
alemão; De Rooz, em holandês; Ricerca
e fraternal, de homens e mulheres
Rosacroce, em italiano; Barajuji, em
dedicados ao estudo e aplicação japonês e Rosenkorset, em línguas nórdicas.
prática das leis naturais que regem Seus textos não representam a palavra oficial da AMORC,
o universo e a vida. salvo quando indicado neste sentido.
O conteúdo dos artigos representa a palavra e o pensamento dos pró-
Seu objetivo é promover a evolu- prios autores e são de sua inteira responsabilidade os aspectos legais e
ção da humanidade através do de- jurídicos que possam estar interrelacionados com sua publicação.
senvolvimento das potencialidades Esta publicação foi compilada, redigida, composta e impressa na Ordem
de cada indivíduo e propiciar ao Rosacruz, AMORC – Grande Loja da Jurisdição de Língua Portuguesa.
seu estudante uma vida harmo- Todos os direitos de publicação e reprodução são reservados à
Antiga e Mística Ordem Rosae Crucis, AMORC – Grande Loja da
niosa que lhe permita alcançar
Jurisdição de Língua Portuguesa. Proibida a reprodução parcial ou
saúde, felicidade e paz. total por qualquer meio.
Neste mister, a Ordem Rosacruz n Coordenação e supervisão: Hélio de Moraes e Marques, FRC
oferece um sistema eficaz e com- n editor: Mercedes Palma Parucker, SRC – MTb-580
provado de instrução e orientação n Colaboração: Estudantes Rosacruzes e Amigos da AMORC
para um profundo autoconheci- n assinaturas: Ligue para (0xx41) 3351-3060

mento e compreensão dos proces- 1 ano: R$ 44,00 – 2 anos: R$ 77,00 – exemplar: R$ 10,00
sos que conduzem à Iluminação.
Essa antiga e especial sabedoria
foi cuidadosamente preservada
desde o seu desenvolvimento pelas
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n Todas as colaborações devem estar acompanhadas pela declaração
possui, além do aspecto filosófico
do autor cedendo os direitos ou autorizando a publicação.
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sincera, disposta a aprender, de não serão devolvidos.
mente aberta e motivação positiva n No caso de fotografias ou ilustrações, o autor do artigo deverá

e construtiva. providenciar a autorização necessária para publicação perante as


autoridades pertinentes ou autores respectivos.
n Os temas dos artigos devem estar relacionados com os estudos e

práticas rosacruzes, misticismo, arte, ciências e cultura geral.

nossa capa
Rua Nicarágua 2620 – Bacacheri Paracelso, pseudônimo de Phillipus Aureolus Theophrastus Bombastus
82515-260 Curitiba, PR – Brasil von Hohenheim (Einsiedeln, 1493 – 1541), médico, alquimista, físico,
Tel (41) 3351-3000 / Fax (41) 3351-3020
www.amorc.org.br astrólogo e ocultista. Ilustração de autoria de Peter Paul Rubens.

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n MISTICISMO ROSACRUZ

Por CHrIstIan Bernard, FrC – Imperator da AMORC

O
espaço, tal como é definido na maioria dos livros de consulta, é a extensão infinita
que separa e envolve os objetos. Essa extensão é a origem das três dimensões que
o homem pode perceber e que, como sabemos, são o comprimento, a largura e a
altura, que por vezes comparamos com a espessura. Do ponto de vista místico, o
espaço não é verdadeiramente um dado material. Antes, é produto da consciência humana,
mais particularmente de sua fase objetiva. Ora, a consciência é um atributo da alma. Por
consequência, tem natureza imaterial. Em vista disso, somos obrigados a reconhecer que o
mesmo se aplica ao espaço, ou seja, que ele é imaterial no absoluto. O erro dos homens é tentar
dominá-lo por meio de instrumentos materiais.
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Como o homem jamais poderá dominar
designaçãO da aLMa eM Línguas antigas
o espaço por meio da matéria, e como esse
espaço é produto do pensamento humano, idiOMa de
PALAVRA SIGNIFICADO
deve ser evidente para nós que só por meio ORigeM

da consciência poderemos exercer esse domí- ANITI SÂNSCRITO SOPRO


nio. A consciência humana, como concebem
ANEMOS GREGO VENTO
os rosacruzes, opera em dois mundos: o de
nosso ambiente objetivo e o de nosso uni- ANIMUS LATIM SOPRO VITAL

verso interior. Nossa consciência objetiva se


aplica à substância das coisas, ou seja, às três
primeiras dimensões do espaço. Quanto à misteriosa alquimia cósmica, a criança, no
nossa consciência interior, relaciona-se mais momento de seu nascimento, inspira a alma
particularmente com sua essência, ou seja, que Deus expira para ela e que, no instante de
com a quarta dimensão do espaço. Sabendo- sua morte, o homem a expira para o universo
-se que este último não pode ser dominado a fim de que Deus novamente a inspire. Isso
por meios materiais, não é nossa consciência levou os sábios do passado a dizerem que a
objetiva que pode nos permitir dominá-lo e, vida é uma respiração universal que o ho-
sim, nossa consciência interior. E o que vem mem compartilha desde a noite dos tempos
a ser exatamente essa consciência interior? com seu Criador. Na linguagem mística, o
Para responder esta pergunta, precisamos termo “sopro” assumiu uma significação par-
abordar uma segunda noção, a do sagrado. ticularmente sagrada, porque constitui em si
Como eu disse anteriormente, os rosa- mesmo e por si mesmo o veículo que Deus
cruzes consideram que a consciência é um escolheu para dar a vida e a consciência aos
atributo da alma. Ela penetra no corpo junto homens e, em geral, a todos os seres viventes.
com a alma no momento em que o recém-
-nascido inspira o ar pela primeira vez, e o
abandona com o último suspiro. Por isso a
Ontologia rosacruz afirma que Deus fez o
homem com o pó da terra e lhe insuflou o
sopro da vida para que ele se tornasse uma
alma vivente, ou seja, uma personalidade
encarnada consciente. Quando consultamos
o Zend Avesta, o sânscrito, o grego, o latim, e
em geral a maioria das línguas antigas, cons-
tatamos que a mesma palavra designa simul-
taneamente a alma, o espírito e o sopro da
vida. Temos, por exemplo, a palavra sânscrita
“aniti”, que significa “sopro”, a palavra grega
© SVJO/WIKIPEDIA

“anemos”, que quer dizer “vento”, e a palavra


latina “animus”, cujo sentido é “sopro vital”.
Vemos então que os místicos do passado,
desde os mais remotos tempos, sempre asso- Representação do espaço tridimensional através do
Sistema Cartesiano, sendo a altura representada
ciaram a essência espiritual do homem à Res- pelo eixo Z, a profundidade pelo eixo X e o
piração Divina. Eles pensavam que, por uma comprimento pelo eixo Y

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n MISTICISMO ROSACRUZ

“ terra humanitas
que una sunt.

“Terra e humanidade são apenas uma”
– Extraído da “Exortação Rosacruz
para uma Ecologia Espiritual”

Nas línguas mais antigas, a mesma pala-


vra designava alma e espírito. Pois bem, há
séculos os Rosacruzes designam pela palavra
“Espírito” a energia que é a essência da ma-
téria. Devemos ver nessa designação uma
escolha deliberada, pois sugere que a essência
espiritual que infunde o universo e a substân-
cia material que a manifesta são realmente
as duas expressões complementares de uma
mesma energia cósmica. A realidade cotidiana
nos confirma isso, pois o próprio ser humano
é substância e essência, em outras palavras,
corpo e alma. Cada um de nós é, portanto, o
duplo reflexo de um mesmo Sopro Divino,
pois, como o Sopro foi em todos os tempos

© PHOTOS.COM
considerado o que existe de mais sagrado,
podemos deduzir que o homem é na Terra a
manifestação mais nobre desse sagrado.
Assim, o misticismo e a lógica nos im- Digo “menos impassíveis” porque, além do
pelem a afirmar que o espaço sagrado é, de caos aparente que ultimamente perturba nos-
início e acima de qualquer coisa, o próprio so mundo, as obras humanitárias em prol dos
homem. Mas ser sagrado não significa ter mais carentes nunca foram tão numerosas.
consciência do sagrado. Para nos convencer- Isso acontece porque as influências cósmicas
mos disso, basta ver a que ponto o homem da Era de Aquário se fazem sentir cada vez
é pouco cuidadoso com seu corpo e pouco mais. Essa Era deve testemunhar a idade de
respeitoso com o corpo dos outros. A maio- ouro do Conhecimento, da fraternidade e
ria das doenças é a prova viva dessa falta de da paz entre os povos. Devemos todos nos
cuidado e respeito. Se todos os homens de interessar por essa perspectiva e oferecer nos-
nossa Terra estivessem plenamente conscien- so apoio espiritual a todos os caminhos que
tes de que o corpo é o templo da alma e de nossos contemporâneos escolham para acor-
que, por isso, é o que eles possuem de mais rer em auxílio dos que têm necessidade e que
sagrado, eles o respeitariam muito mais e sofrem no corpo de uma ausência que sua
ficariam menos impassíveis diante daqueles alma busca preencher, orando mais ao Deus
que nada têm para comer, beber e se aquecer. da morte que ao Deus da vida. É verdade que

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nesse campo é nosso dever nos mostrar pru- a saber, um veículo de matéria a serviço da
dentes e não agir levianamente, com incons- Evolução Cósmica.
ciência e ingenuidade. Infelizmente, também nesse caso a atuali-
Se for verdade que nosso corpo é o templo dade cotidiana nos mostra a que ponto vai a
da alma que está em nós, cada um de nós é, falta de respeito do homem pelo seu planeta.
enquanto personalidade terrestre, o santuário Por razões ilegítimas que não poderei de-
de um templo ainda maior, o da própria Ter- senvolver neste capítulo, há os que poluem,
ra. Isto significa que o homem não constitui destroem e desfiguram o que ele tem de mais
por si só o Espaço Sagrado, mas é apenas um belo a nos oferecer. Em suma, eles profa-
seu elemento. Com efeito, que seríamos nós nam o Templo que foi consagrado à nossa
sem o ambiente natural que serve de suporte humanidade. É verdade, como é o caso do
para nossa evolução espiritual? Quando a auxílio humanitário, que um número cada
Inteligência, o Pensamento Divino, concebeu vez maior de pessoas toma consciência do
o universo e criou-o por meio de seu Ver- perigo que todos corremos, por fazermos de
bo, sabia que ele seria o palco da vida e da nossa Terra a escrava de nossos caprichos
consciência. O planeta onde vive atualmente mais loucos. Os movimentos ambientalistas
a nossa humanidade e ao qual os antigos mundiais estão aí para testemunhar esse
deram o nome de “Terra”, não foge à regra. fato e, fora de qualquer concepção política,
Ele é o laboratório que o Cósmico confiou devemos apoiar as ideias mais puras que eles
aos homens para que encontrem a fórmula defendem para as gerações vindouras. Esta é
que deve torná-los Mestres da matéria. Para uma necessidade vital para a sobrevivência
usar a terminologia rosacruz, este planeta é da espécie humana, como
o cadinho com o qual a Alma Universal deve se manifesta em nosso
espiritualizar o Espírito. Por isso devemos globo, e todos os que
considerar que ele é para a coletividade hu- desprezam o bem-
mana o que o corpo é para cada um de nós, -estar físico e moral
dos outros, ou que
exploram a Terra

“ se todos os sem consideração


pelos danos a que a
homens de nossa submetem, são cul-
pados de fazer guerra
terra estivessem contra Deus e contra
a humanidade.
plenamente
conscientes de que
o corpo é o templo
da alma… eles
o respeitariam


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muito mais…

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n MISTICISMO ROSACRUZ

para resolver. Ao contrário, esse é um espaço


sagrado a partir do qual devemos ajustar
regularmente as linhas mestras de nosso
comportamento místico. A maioria das
pessoas tem a tendência de solicitar a ajuda
de Deus quando está com problemas e de
esquecer de agradecer-Lhe quando desfruta
de felicidade. Não deve ser essa a nossa atitu-
© AMORC

de, pois a meditação deve ser utilizada tanto

Seu carma terá a mesma proporção de sua


inconsciência ou, melhor dizendo, de sua
“ Penso que é de
muito mais valia
persistência em ignorar o direito dos outros orar ao deus de
à vida, e de sua sanha em destruir o que não
lhes pertence e nunca lhes pertencerá. nosso coração para
De tudo que foi dito acima, conclui-se
que nossa tomada de consciência do sagrado que preste auxílio à
e do espaço onde ele se manifesta é o refle-
xo do respeito que mostramos pelo próprio
criança sequestrada
homem e seu meio de evolução. Mas entre
o homem e o meio em que ele evolui há
e solicitar para ela
um terceiro espaço a que o rosacruz deve o apoio das forças
dar particular atenção; falo de seu próprio
Sanctum, que é um recinto de sua casa que espirituais que
ele reserva para os estudos místicos. Para
ele, esse local é verdadeiramente a câmara
só esperam ser
intermediária entre seu Santuário interior e
o Templo terrestre no qual deve trabalhar.
É um meio intermediário entre o mundo
visível e invisível. Por quê? Porque enquanto
canalizadas.

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formos incapazes de pensar por Deus, falar a


Deus e agir em nome de Deus, precisaremos
de um suporte que nos lembre diariamente
que esse é o nosso objetivo. Por isso o Sanc-
tum do rosacruz é o laboratório interior
onde ele estuda misticismo para aplicá-lo em
seguida no laboratório exterior que constitui
o mundo.
O Sanctum não é um lugar para onde
devemos nos dirigir a fim de meditar oca-
sionalmente quando temos um problema

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© AMORC

“ Para os
rosacruzes, o
sanctum é sem
dúvida o espaço
mais apropriado
para criar no
invisível causas
Sanctum que terão os
do Dr.
Harvey
Spencer
efeitos mais
Lewis
positivos no
visível.

para irradiarmos as alegrias interiores que experimentos regulares que a AMORC pro-
recebemos quanto para rogar ao Cósmico a põe aos seus Membros lhes dá a cada dia a
ajuda necessária para a resolução de todos oportunidade de se retirarem para seu Sanc-
os problemas. Ora, o Sanctum é um lugar tum em proveito de outrem. Seja como for,
privilegiado em ambos os casos, pois, devido se admitimos que o respeito pelos outros é
ao que ele representa, favorece a projeção de sagrado, o mesmo respeito deve provir deles.
nossos pensamentos e a recepção das ideias Em outros termos, não podemos, não temos
mais inspiradoras. o direito de permanecer insensíveis ao sofri-
Mas nossa presença no Sanctum não deve mento físico ou moral de outros.
se limitar a agradecer a Deus pelas bênçãos As sociedades modernas, em sua maneira
que nos concede, a buscar a solução de nos- de tratar a atualidade, banalizaram os dra-
sos problemas ou aperfeiçoar nossa própria mas da existência humana. Em virtude deste
evolução intelectual e espiritual. Ela também fato, as pessoas ficaram habituadas a ver e
se impõe no sentido do bem-estar dos ou- ouvir o sofrimento de seus irmãos. Quando
tros. Em outras palavras, devemos nos diri- o sequestro de um avião provoca a execução
gir ao Sanctum regularmente, para meditar de vários passageiros, quando um atentado
e orar por todos que sofrem em seu corpo causa a morte de dezenas de pessoas, quando
ou em sua alma e que têm necessidade de ser fanáticos assassinam centenas de cidadãos
cosmicamente auxiliados. Neste sentido, os em nome de Deus, quando guerras de in-

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n MISTICISMO ROSACRUZ


Deus de nosso coração para que preste auxí-
… o espaço lio à criança sequestrada e solicitar para ela
sagrado do homem o apoio das forças espirituais que só esperam
ser canalizadas. Imaginemos o poder consi-
se dimensiona pela derável que podem representar milhares de
pessoas, num mesmo lapso de tempo, foca-
visão que ele tem lizando pensamentos positivos nesse aconte-
cimento! O dever dos místicos, nosso dever,
de sua própria é exatamente o de agir dessa forma, cada
natureza e do vez que uma tragédia acontece em qualquer
parte do mundo. Quero dizer com isso que,
papel que ele deve a partir do momento em que sejamos infor-
mados de uma situação em que a integridade
desempenhar no física ou moral de alguém esteja ameaçada,
devemos imediatamente agir espiritualmen-
plano do conjunto te, apelando para as forças do Bem, a fim de

da Criação…

que neutralizem a causa e a expressão do mal
de que somos testemunhas.
É comum ouvirmos as pessoas dizerem
que, se Deus existisse, não permitiria os
teresse fazem milhares de mortos, quando horrores que diariamente acontecem. O que
o apocalipse nuclear pesa sobre milhões de elas não compreendem é que Deus, como
pessoas, quando as forças das trevas preva- essência e energia que é, tem uma natureza
lecem sobre as forças da Luz, que faz a maio- fundamentalmente construtiva, mas cabe ao
ria? Assiste e escuta as notícias, indigna-se homem manifestar os seus poderes. Por ana-
momentaneamente e depois volta a pensar logia, a Terra contém em potencial todos os
em seus próprios problemas. Comportam- elementos que permitem a germinação dos
-se todos como espectadores da informação vegetais. Mas numa horta os legumes não po-
e consideram que são impotentes diante dos dem crescer a não ser que os plantemos, eli-
acontecimentos trágicos que são reportados. minemos as ervas daninhas para que não os
Nada disso é verdadeiro. sufoquem, e cuidemos de seu crescimento. O
Estou certo de que muitos dramas da atu- mesmo acontece nos assuntos humanos. De-
alidade poderiam ser evitados, ou pelo me- vemos agir para canalizar o potencial positi-
nos ter uma solução melhor, se todos os que vo que o Cósmico coloca à nossa disposição,
recebem essas informações se permitissem pois se nada fizermos ou permanecermos
assumir uma atitude mental positiva com impassíveis, a ausência do bem é que se ma-
relação ao acontecimento em questão. Por nifestará. É por esta razão que a passividade e
exemplo, quando uma criança é sequestrada, a omissão são os melhores servidores do mal.
de nada adianta nos indignarmos, especu- Para os rosacruzes, o Sanctum é sem
larmos sobre a identidade do sequestrador dúvida o espaço mais apropriado para criar
ou imaginarmos hipóteses sobre o desfecho. no invisível causas que terão os efeitos mais
Esse tipo de atitude serve apenas para nutrir positivos no visível. É verdade que pode-
o processo invisível que tornou possível o mos invocar, visualizar, meditar e orar em
fato. Penso que é de muito mais valia orar ao qualquer outro lugar, mas é na atmosfera

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harmoniosa das vibrações do Sanctum Ro- junto da Criação. Para o Rosacruz, esse es-
sacruz que encontramos as condições mais paço cobre um domínio tão vasto quanto a
favoráveis a qualquer trabalho metafísico. dimensão visível e invisível que ele empresta
Além disso, o fato de nos retirarmos para ao universo, e este é o reflexo do Deus que
o Sanctum para canalizar as forças do Bem ele ama e compreende. No espelho de seu
cria uma associação de ideias entre o seu sanctum interior, todas as estrelas, todos os
simbolismo e o que ali devemos cumprir planetas, todos os países de nossa Terra, to-
regularmente. Isto significa que quanto dos os seus habitantes, tudo que vive em sua
mais tivermos superfície, são
o hábito de tão sagrados
nos dirigirmos quanto o são,
para esse lugar aos seus olhos,
para trabalhar o próprio cor-
a serviço das po e a alma
forças da Luz, que faz dele
mais criaremos um ser vivo
em nós a neces- e consciente.
sidade interior O Templo do
desse serviço. universo, o
Por outro lado, Templo da
quanto mais sa- Terra e o Tem-
tisfizermos essa plo da vida são
necessidade uma só coisa
interior, tanto no Templo do
mais criaremos Homem. Por
nesse santuário isso são chega-
as condições dos os tempos
vibratórias que de trabalhar-
tornarão ainda mos por sua
mais eficazes reconstrução,
as atividades pois é da Jeru-
místicas que ali salém Celeste
podemos reali- que vibra em
zar. O Sanctum “O Templo do Homem – O Conhece-te a Ti Mesmo”, nós que deve
é, portanto, por Nicomedes Gomez vir a Luz mes-
um dos lugares siânica. A hora
mais sagrados para colocarmos em movi- não é de nos contentarmos com discursos
mento as virtudes que atribuímos à consci- teóricos sobre a espiritualidade. É chegado
ência da alma e os poderes que sabemos que o momento de concretizarmos pela ação a
estão ligados à Inteligência Divina. compreensão que temos do Deus de nosso
Em conclusão, direi que o espaço sagra- coração, pois um espaço só é sagrado se é
do do homem se dimensiona pela visão que útil à rosa que busca desabrochar na cruz
ele tem de sua própria natureza e do papel que todos nós carregamos.
que ele deve desempenhar no plano do con- Assim seja! 4

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n LEITURA COMPLEMENTAR

adeMIr V. dOs santOs, FrC

sr. sócrates, filósofo ateniense, fale-nos sobre o seu nascimento…


Nasci em Alopeke, subúrbio de Atenas, na Grécia, por volta de 470-469 antes de Cristo.

e seus pais?
Meu pai chamava-se Sofronisco, era escultor e trabalhou com Fídias, decorador de
edifícios em Atenas.
A minha mãe chamava-se Fenarete, reconhecida por ser hábil parteira da cidade. A
nossa casa situava-se num distrito sossegado e confortável, tínhamos uma horta com
muitas árvores frutíferas e muitas oliveiras.
Tínhamos como vizinhos Aristides, Tucídides e Críton, que foi um grande amigo.

Como eram os tempos antigos da sua Grécia?


Quando nasci, Atenas se tornava uma potência política, econômica e militar. Tempos de
ouro para os gregos; Em pouco tempo, várias personalidades marcaram a história da hu-
manidade no campo das artes, da filosofia, da oratória, da política e das ciências naturais.

sócrates, como foi a sua juventude?


Minha família tinha modestos recursos, mas recebi boa educação, me relacionei com no-
táveis inteligências da época, frequentei o Liceu onde se cultivava o físico e o intelectual.
Frequentei a escola de música de Cosmos, para me aperfeiçoar no bailado e na cítara.

do que gostava nessa época?


Tinha muitos amigos, mas minha beleza física não era das melhores… familiarizei-me com
os antigos filósofos, Anaxágoras… apreciava andar sempre descalço e amava conversar a
respeito dos problemas cosmológicos…

e Xantipa?
Minha esposa… casamos quando eu tinha 56 anos, já gordo e corpulento. Era um
© PHOTOS.COM

bonachão… e Xantipa uma garota ateniense aristocrática, de 20 anos de idade, alta e


magra. No dia do nosso casamento não encontramos um carro puxado a bois. Seguimos a

14 O ROSACRUZ · INVERNO 2013


pé com um cortejo reduzido… Amo Xantipa, apesar dos nossos temperamentos diferentes.
Tivemos três filhos: Lamprocles, Sofronisco e Menexeno. No dia em que recebi a sentença
de condenação… Xantipa chorava muito e então lhe disse: – Por que choras por teu
marido ser condenado injustamente? Deverias chorar se fosse condenado justamente!

sr. sócrates, ocorre-lhe a lembrança de algum fato inusitado ou muito importante que
influenciou nas suas escolhas?
Sim. Por volta dos 38 anos de idade passei por uma crise interior… Certo dia fui visitar o
templo de Apolo, em Delfos, onde estava escrito a máxima: “Conhece-te a ti mesmo”…

e…
A partir daí centrei meu pensamento e pesquisas no homem e não mais no cosmo.

Por quê?
O conhecimento de si mesmo e a dúvida, o questionamento, preparam-nos para o nosso
encontro maior, no qual encontramos o caos doloroso ou a felicidade…

O senhor Criou a teodicéia – a descoberta de deus pela razão?


Sim. O diálogo é o meu
método. Possui três fases:
a ironia, a maiêutica e a
indução. Na ironia levo meus
interlocutores através de
perguntas a conhecerem-
se mais… Na maiêutica
procuro extrair as verdades…
e na indução buscamos a
essência universal contida no
particular…

O senhor percebe ainda hoje, em nossos tempos modernos, a influência das suas
pesquisas e descobertas?
Talvez no Direito, na Filosofia, na Psicanálise, na Psicologia, na Psiquiatria, nos livres
pensadores… Outros?

sr. sócrates, desejaria dizer mais alguma coisa?


Neste momento recordo de meus pais… Sofronisco, escultor de estátuas… eu de pensamentos…
Fenarete, parteira, da arte da
obstetrícia… eu procuro sempre não
dar minha opinião sobre qualquer
assunto, não tenho a autoridade, *O Frater Ademir Vieira dos Santos é Psicólogo.

tampouco a verdade… como a parteira Referência: Brazil, Stella Telles Vital – A Divina
Filosofia Grega, Curitiba, AMORC, 1989; Claret,
ajudo, mas é você quem deve dar à luz Martin – O Pensamento Vivo de Sócrates, São Paulo.
os seus desejos… 4

INVERNO 2013 · O ROSACRUZ


15
n OCULTISMO

Eternos princípios do
ocultismo
Lição 1
raLPH M. LewIs, FrC*

16 O ROSACRUZ · INVERNO 2013


t
eria o ocultismo um real valor nestes hoje. Em verdade, da ciência oculta da astro-
dias e nesta era? O ocultismo tem logia, vieram os rudimentos da astronomia.
tido uma reputação má em muitos Da alquimia, com a sua experimentação com
círculos públicos. Consequentemen- ervas, de sua busca da quinta-essência e de
te, o ocultismo consiste de crenças e práticas elixires, vieram aqueles fundamentos, aqueles
supersticiosas, que têm que ser abandonadas elementos e propriedades físicas, que se de-
nos tempos modernos, na condição de coisas senvolveram, chegando à ciência da química.
sem nenhum valor, ou então consiste de uma Por outro lado, foi o ocultismo que favoreceu
nobre busca da verdade, da qual abusaram os os experimentos de Franz Mesmer, quando
charlatães, e de onde fraudes foram usadas este surpreendeu o mundo ao proclamar
para se tirar vantagens. que o corpo humano tinha um fluir e um
No sentido popular, o termo ‘ocultismo’ refluir de energia que podia emanar através
se aplica a coisas que estão escondidas ou das pontas dos dedos, que era curativa em
encobertas. Ele sugere, à mente, aquilo que sua natureza, e que podia ser detectada por
diz respeito à magia e ao misterioso. Na re- outros e influenciar a outros. Suas alegações,
alidade, o verdadeiro ocultista não é um di- naturalmente, eram sensacionais. Elas che-
letante do sobrenatural; para ele, nada existe gavam aos limites do reino do sobrenatural,
que seja “sobrenatural”. Todos os fenômenos quando consideradas pela média das pessoas;
estão dentro da categoria da lei natural. Ele Mesmer foi caluniado como sendo um char-
não ama aquilo que é fantástico, aquilo que latão e, por causa disto, foi perseguido.
amedronta, aquilo que é estranho, e ele não
é um buscador do sensacional. O ocultista é

“ O ocultista é
alguém que tem uma convicção íntima que
existem princípios construtivos no universo,
que são as causas de muitas das assim chama-
das coisas misteriosas, que existem além do
alguém que tem uma
raio de ação de nossos sentidos normais. Ele convicção íntima que
crê que nós não podemos discerni-las de ma-
neira objetiva e que elas devem ser buscadas existem princípios
em outros reinos da experiência humana.
Através dos séculos, o ocultismo desen-
construtivos no
volveu suas próprias ciências. É – digamos universo, que são
– obrigatório que o ocultismo assim o fizesse,
pois ele estava procurando algo com o que a as causas de muitas
ciência física não poderia ajudar a esclarecer,
ou realizar. As ciências ocultas, portanto,
das assim chamadas
foram, a princípio, ridicularizadas pelos cien- coisas misteriosas,
tistas físicos. Elas foram consideradas fantás-
ticas, absurdas; seus resultados, como estan- que existem além
do fora dos limites da razão; e elas, então, não
deveriam ser levadas em conta. Acontece,
do raio de ação
entretanto, que as próprias ciências ocultas, de nossos sentidos

© PHOTOS.COM

com o tempo, chegaram a se tornar os pais


de muitas das ciências físicas reputadas de normais.

INVERNO 2013 · O ROSACRUZ


17
n OCULTISMO

picos eram absolutamente tabus em círculos


© WEB

de inteligência e nas universidades. Hoje, há


cadeiras de pesquisa psíquica em muitas das
principais universidades, com apreciáveis
investimentos naquele reino de fenômenos,
e diversas universidades conservadoras têm
efetivamente editado monografias a respeito
de sua experimentação.
As perguntas, naturalmente, se fazem pre-
sentes: “Quais foram os primeiros ocultistas?
Como vieram eles a existir como um grupo
de pessoas ou um tipo de pessoas?” O mundo
jamais saberá, talvez, os nomes dos primeiros
ocultistas. Podemos dizer, geralmente, que
eles eram aqueles homens e aquelas mulhe-
res, que conseguiam ver além dos limites da
visão objetiva dos olhos, e eram aqueles que
conseguiam ouvir além do limite audível
de seus ouvidos. Em outras palavras, eram
os homens e as mulheres que não estavam
contentes com as limitações de seus sentidos
objetivos. Eles não queriam aceitar a mera
aparência das coisas.
Experimento de hipnotismo de James Braid

Os primeiros
O ocultista procurava investigar a verdade
de suas afirmações, não importando quão ocultistas
heterodoxas pudessem ser. O ocultismo, Talvez a história mais antiga do Egito, uma
além do mais, proporcionou os experimen- história escrita por aquele povo, e tomada das
tos de hipnotismo de Mesmer, numa época traduções dos hieróglifos, em suas próprias
em que isto era considerado magia negra. fontes secretas, é a história escrita por Ma-
As demonstrações de sucesso por um perío- netho. Ele era um homem de grande cultura,
do de tempo, por parte dos ocultistas, em de grande poder, e com um acesso ilimitado
hipnotismo, finalmente compeliram a uma ao conhecimento arcano e aos ensinamentos
investigação do fenômeno pela ciência física, dos egípcios. Ele era o supremo sacerdote de
e à descoberta resultante dos princípios fun- Heliópolis, da grande Escola de Mistérios,
damentais da psicologia. A ciência oculta, do localizada naquela cidade, que era dedicada
mesmo modo, explorou a telepatia mental, a ao sol, símbolo da força positiva, criativa do
hiperestesia, a comunicação da inteligência universo, de acordo com a concepção comum
sem o uso de meios físicos, e outros aspectos de então. Manetho viveu aproximadamente
de fenômenos psíquicos, quando estas coisas por volta de 280 AC. Ele é geralmente mais
eram proclamadas como sendo nada menos conhecido porque foi o primeiro a tentar fa-
do que práticas diabólicas, e quando tais tó- zer um registro completo, ou procurar desco-

18 O ROSACRUZ · INVERNO 2013


brir a linhagem dos reis e dinastias egípcios,

© PHOTOS.COM
desde os mais antigos tempos. Mesmo hoje,
com o avanço da arqueologia, sua cronologia
das dinastias é muitas vezes utilizada para re-
ferências. O que nos importa é que em algu-
mas de suas obras, encontramos que os mais
antigos egípcios devem ter sido ocultistas, e
que, portanto, são os mais antigos ocultistas,
em termos de tempo, no mundo inteiro.
De acordo com Manetho, os antigos egíp-
cios procuravam descobrir quando apareceu
o primeiro mortal sobre a Terra. O fato é
que eles queriam ver além do imediato. Eles
não estavam contentes em aceitar as coisas,
como eles assumiam que pudessem ser;
não queriam que o que fosse desconhecido
continuasse a sê-lo. De acordo com suas
conclusões, o primeiro mortal sobre a terra
era alguém conhecido como Hephaestus, e
eles calcularam que seu aparecimento sobre a
terra foi aproximadamente 24.000 anos antes Hephaestus
da época deles, ou por volta de 30.000 anos
de nosso tempo, hoje. Desde estas primeiras
investigações ocultas, muita matéria foi acu- Deste acervo de material emergiram sete
mulada através dos séculos, que mostrava, e princípios fundamentais do ocultismo. Es-
ainda mostra, o título de oculta. tes perduraram, porquanto são práticos e
têm um valor moral, como sendo aceitáveis
e úteis aos povos de hoje, do mesmo modo
© PHOTOS.COM

como o eram aos povos, no meio dos quais


eles foram concebidos. O primeiro destes
princípios ocultos pode ser chamado a uni-
dade de todo ser. Em outras palavras, foi uma
tentativa para encontrar alguma força, princí-
pio básico, ou fundamento, pelo qual poderia
ser provado que havia uma unidade em toda
a existência. Este foi um pensamento ousado,
indicando uma extraordinária abertura da
mente, num mundo de aparente diversifi-
cação. Mesmo hoje, com o conhecimento e
acesso a fontes de conhecimento, conforme
olhamos em torno e vemos as miríades de
realidades, o grande número de diferentes
coisas, que compreendem nosso mundo, pa-
Heliópolis rece quase impossível conceber que poderia

INVERNO 2013 · O ROSACRUZ


19
n OCULTISMO


haver qualquer base para
… entre os adeptos das uma relação entre estas
escolas de mistério e entre coisas, extremamente di-
ferentes na aparência e na
os verdadeiros ocultistas, função. Para homens tão
distantes de nosso tempo,
ísis, o aspecto maternal, fazer uma busca por uma
unidade em tal mundo de
sempre foi como um atributo variedade mostra uma séria
fundamental do ser, do qual contemplação.


consiste o universo. O Princípio
da unidade
© PHOTOS.COM

De acordo com o Livro


Sagrado, que era o nome
de uma das obras de Mane-
tho, preparada por ele para
um dos Ptolomeus e para
ser colocada na biblioteca
de Alexandria, os antigos
egípcios contemplaram, há
longo tempo, esta unidade
da existência. Para eles, a
deusa Ísis era o aspecto ma-
terno do universo. Além do
mais, de acordo com a obra
de Manetho, o nome Ísis
significava “Eu venho de
mim mesma”. Isto indicaria
que Ísis foi um movimento
que se auto-originou; ela,
portanto, perpetuou sua
própria existência, não
teve criador; ela continuou
partindo da natureza de
sua própria existência. Foi,
além do mais, indicado
que aquilo que é, sempre
é, em essência. Agora, há,
naturalmente, numerosas
lendas entre os egípcios
para mostrar que Ísis, como

20 O ROSACRUZ · INVERNO 2013


uma deusa, veio de alguma outra fonte, po-

© WEB
rém entre os adeptos das Escolas de Mistério
e entre os verdadeiros ocultistas, Ísis, o aspec-
to maternal, sempre foi, como um atributo
fundamental do ser, do qual consiste o uni-
verso. Além do mais, nesta obra, a pedra-ímã,
o minério magnético, foi chamado ‘ossos de
Hórus’. Horus era um dos deuses do Egito. De
acordo com a teogonia, ele era o filho de Ra
– este sendo o sol e o símbolo do poder posi-
tivo criativo, emanando através do universo.
O minério de ferro era chamado Typhon, um
outro deus, simbolizando o poder destrutivo
e negativo do universo, e estes dois poderes
atuavam um sobre o outro, na mesma manei-
ra como o ferro é, tanto atraído como repelido
pela pedra-ímã. Os egípcios tentaram explicar
que, da mesma maneira, o bem, o movimen-
to racional do mundo, muitas vezes atrai
Typhon, ou o aspecto negativo, e este movi-
Mestre Eckhart
mento bom, racional, persuade e suaviza o
poder negativo e mau; assim, de acordo com
este antigo escrito, há no mundo um contínuo de Heráclito e Empédocles, por exemplo, foi
confronto entre estes dois grandes opostos. declarado, por estes ocultistas, que a essência
O Livro Sagrado pondera, mostrando que de cada coisa é a mesma, significando que,
todo o ser, em seu estado primário, sempre no seu fundo, todas as coisas são, primaria-
existiu. Ele nunca teve um princípio. Nunca mente, relacionadas. Foi declarado, também,
houve quaisquer partes dele, como nos pare- que nada, portanto, no mundo, apesar da sua
ce discernir em nosso mundo. Havia apenas complexidade ou de sua aparente importân-
um eterno movimento, a atração e a repulsão cia, é independente destas forças primárias da
entre os dois poderes opostos, assim que um natureza e nada pode elevar-se acima delas.
percebe a relação entre a pedra-ímã e o mi- Mestre Eckhart, famoso místico e ocul-
nério de ferro. De acordo com Livro Sagrado, tista alemão, muitas vezes chamado como
esta oscilação, ou este movimento contínuo, o Pai do Misticismo Alemão, argumentava
fez surgir os quatro princípios. Estes quatro que Deus está em toda a parte. Deus é o
princípios eram realmente quatro expressões mesmo, em qualquer forma ou aspecto, para
da natureza; em outras palavras, o fogo, o ar, a aqueles que podem vê-Lo e que O vêem. Ele
água e a terra. E as quatro expressões cruzam exorta o ser humano a não procurar Deus
o mundo inteiro, existem e se movem em como uma luz reluzente em trevas remotas
toda parte e, assim fazendo, transformam a ou em algum canto do universo, mas pro-
si próprios; mudam para a infinita variedade curar e encontrar Deus em toda e qualquer
das criações e formas, dos quais somos cons- manifestação da natureza.
cientes, como realidades. Naquele antigo tem- O ocultista diz que Deus é um dispensa-
po, séculos antes dos atomistas gregos, antes dor da mente, através do inteiro universo. Ele

INVERNO 2013 · O ROSACRUZ


21
n OCULTISMO


que ter uma ordem, e tem se afirmado, neste
O segundo segundo princípio, que o número é a chave
princípio oculto, para o entendimento e a direção, pelo ser
humano, desta ordem, conforme ele se rela-
honrado através dos ciona consigo mesmo. O número é o compri-
mento, entre o mundo material e o imaterial.
tempos, diz respeito O ocultista compreende, naturalmente, que


não há uma separação entre o microcosmo e
ao número. o macrocosmo; caso contrário, não haveria
uma unidade do ser. Num todo, entretanto,
o microcosmo é mais discernível pelo ser
chega a esta conclusão, não porque isto satis- humano. Seus sentidos objetivos podem per-
faz seu capricho ou sua fantasia, mas porque, ceber mais o microcosmo e o assim chamado
após suas investigações, aquela explicação imaterial, ou intangível é, para ele, mais difí-
parece confirmar mais rapidamente aquilo de cil compreender. Número é o comprimento,
que ele teve a experiência. é a distância entre os mundos, o material e o
Portanto, é preciso que o ser humano imaterial. O ocultista entende, naturalmente,
estude o self e a natureza, para que possa que não há uma separação entre o microcos-
utilizar plenamente o poder de Deus. O ocul- mo e o macrocosmo; se assim não fosse, não
tista, além do mais, advoga que não é sufi- haveria a unidade do ser. Como num todo,
ciente apenas satisfazer a nós mesmos, com a entretanto, o microcosmo é mais discernível
crença num Deus, ou conhecer Deus e ter a pelo ser humano. Seus sentidos objetivos po-
convicção de que Ele é. Nós temos, também, dem perceber mais o microcosmo e os assim
que usá-Lo, em toda a parte, pois somente no chamados imaterial e intangível são mais di-
uso de Deus, podemos nos beneficiar de Seu fíceis para sua compreensão e para que possa
poder e de Sua natureza. dar-se conta de seu relacionamento com eles.
O número se torna a chave

O Mistério pela qual a verdadeira natu-


© PHOTOS.COM

reza do mundo imaterial nos

do número é revelada, e o homem então


consegue ver a maneira pela
O segundo princípio oculto, qual este mundo imaterial
honrado através dos tempos, é contíguo à sua existência
diz respeito ao número. Den- material e seu ser.
tro desta grande unidade O princípio oculto do
do ser, que o ocultista esta- número foi primeiramente
beleceu como seu princípio expresso na antiga Cabala
necessário, tem que haver hebraica. A palavra Caba-
um plano de operação. Não la, literalmente traduzida,
pode haver apenas um eter- significa ensinamentos tra-
no movimento, ou oscilação dicionais secretos. De acordo
de forças através de todo com a tradição da Cabala,
o universo, que seja capri- sua origem é por nós identi-
choso. Este movimento tem Pitágoras ficada como sendo da época

22 O ROSACRUZ · INVERNO 2013


de Moisés, quando esteve no Monte Sinai

© COMMONS.WIKIMEDIA.ORG
e quando, segundo a lenda e a tradição nos
dizem, foi testemunha daquela manifestação
teofânica. A tradição, além disto, diz que,
naquela ocasião, ele recebeu dois tipos de
conhecimento canônico – isto é, um conhe-
cimento que foi transformado em escrita,
sobre tabuletas ou placas, coisa que, segundo
se diz, ele trouxe com ele em sua descida
da montanha – e também o conhecimento
de coisas maravilhosas. Este conhecimento
de “coisas maravilhosas”, entretanto, não foi
transformado por ele em escrita, pois se diz
que ouviu do Senhor, naquela ocasião: “Estas
palavras tu divulgarás, e estas palavras tu es-
conderás.” Foi o segundo item que constituiu
o conhecimento das coisas maravilhosas. De
acordo com a tradição cabalística, o cabalista
estava proibido de divulgar, ou explicar, o ca-
pítulo da criação perante mais do que um ou-
vinte de cada vez. Do mesmo modo, não lhe
era permitido falar com mais de uma pessoa,
por vez, a respeito da carruagem celeste – no
caso, referindo-se à natureza de Deus. Estes
tópicos eram para ser discutidos, ou falados,
somente com sábios, ou seja, com pessoas de
profunda compreensão. Consequentemente,
a cosmogonia e a teosofia, o estudo de Deus,
foram tratados como estudos esotéricos, isto
é, como os ensinamentos internos da Cabala.
Poderíamos dizer que, tradicionalmente, a
Cabala consistia de uma contemplação do
“A Árvore da Cabala” (1985),
ser de Deus, se Deus havia originado a Si óleo sobre tela por Davide Tonato
próprio, se Ele havia tido um começo, se
Sua natureza poderia um dia acabar; além
disto, os ensinamentos consistiam de uma ta livros da Cabala que estavam escondidos,
contemplação da origem do universo, e seu ocultos, indisponíveis aos profanos; eram,
relacionamento para com a natureza de Deus. porém, disponíveis somente àqueles que
Havia vinte e quatro livros do Cânone, a lei eram sábios e àqueles que faziam jus a isto
da Cabala, publicados – isto é, reduzidos, pelo seu próprio merecimento. (Continua) 4
transformados em escrita, que podiam ser
usados pelo profano, por aqueles que eram
meramente curiosos, bem como por aqueles
*Publicado no Rosicrucian Digest, outubro 1946.
que eram estudantes. Havia, entretanto, seten-

INVERNO 2013 · O ROSACRUZ


23
n PESQUISA

números
ponte de acesso à
realidade numênica*
Por CeCÍLIa ertHaL, srC

t
odos aceitamos que o mundo tem uma série de exercícios de abstrações, que
dois aspectos: um absoluto, reco- vão percebendo na realidade material o
nhecido como mundo divino; e um que é irrelevante, o que é acidental, o que
relativo, reconhecido como mundo é impertinente e chegando cada vez mais
material. Immanuel Kant traduziu essa perto da realidade divina, do que de
divisão em duas realidades: a rea- fato é essencial.
lidade numênica e a realidade Nesse exercício, usando a lin-
fenomênica, respectivamente. guagem dos números, vamos
A realidade numênica é a percebendo o que é im-
realidade das essências, de portante, o que é perti-
tudo o que não se altera nente, o que é essencial e
nem com o tempo, nem deixamos de lado o que
com o espaço, nem por é acidental, irrelevante,
influência do sujeito impertinente.
M

observador. A realidade Kant, em Fundamen-


© PHOTOS.CO

fenomênica é a que se tação da Metafísica dos


altera com o tempo, com Costumes, afirma também
o espaço e por influência que a natureza humana
de um sujeito observador. é numênica e fenomênica
A primeira não se afeta Immanuel Kant
mas, como consta dos Manus-
por elementos externos a ela critos de Nodin, “O homem, em
enquanto que a segunda é levada, seu estado de exílio, ficou insensível
moldada, alterada por elementos externos. aos númenos da Realidade Divina”. “Ao longo
Entre essas duas realidades existe um de sua encarnação, sua consciência é subme-
abismo que só pode ser transposto por tida aos fenômenos da atualidade terrena”.

24 O ROSACRUZ · INVERNO 2013



Por isso, o objetivo de toda a
O número é uma busca mística é elevar-se ao mundo
forma de se conhecer a dos númenos, onde habitam os
deuses. É apenas através dos nú-
essência das coisas…
” meros que podemos nos desligar
da matéria e nos tornarmos cons-
cientes das grandes leis divinas.
Nodin, em seu manuscrito, defi-
ne o conceito de número da seguin-
te forma: “Como nosso venerável
Pitágoras tão bem ensinou, Deus
atua através de suas leis, e Suas leis
atuam através dos números”.
Os Cabalistas foram muito
longe na ciência dos números, pois
esquematizaram o conjunto da
Criação pela uma série de dez sefi-
rás, sendo que o singular sefirá tem
significado literal de “emanação
numérica”. Segundo os Cabalistas,
é possível compreender o Plano
Divino penetrando-se o segredo
das correspondências que se estabe-
lecem entre a posição dessas sefirás
na árvore cabalística, sua natureza,
seu valor numérico e os símbolos
universais que lhe são associados.
O número é uma forma de se
conhecer a essência das coisas, in-
dependentemente do tempo ou do
espaço ou do sujeito observador.
O advento dos números revela
que o homem evoluiu de uma for-
ma fenomênica, irracional, para
uma forma numênica, racional,
capaz de entender o mundo através
de elementos e relações.
Se não tivéssemos os números
ainda seríamos apenas animais. 4

*Reflexão Martinista de uma Irmã da TOM.

Árvore da Vida

INVERNO 2013 · O ROSACRUZ


25
n VIDA PRÁTICA

OM
TOS.C
© PHO

Por JUdY CHILd, srC

a
compatibilidade começa em nós as contas, de obter o controle, de manipular?
mesmos. Relacionamentos harmo- Você não estará evitando a outra pessoa, ou
niosos são resultado da harmonia sentindo-se combativo, ressentido ou com
interior criada pela nossa disposi- raiva? Ou estará você sentindo-se na defen-
ção de encarar os desafios neste campo como siva, inferior, impotente? O relacionamento
oportunidades de crescimento pessoal. Quase permanecerá num impasse até que você se
sempre nos é exigido que modifiquemos liberte de seu antigo modo de ver e sentir.
nossa percepção do Eu e nossa percepção Você deverá estar disposto a ouvir a peque-
do outro, para resolvermos dificuldades de na e silente voz interior e aceitar a verdade
relacionamento. Este é um processo gradual daquilo que está em seu coração. Isto requer
que envolve atitudes fundamentais e padrões um autoexame honesto e depois a capacidade
de vida, coisas que representam nossas rea- de perdoar-se e perdoar o outro. O perdão
lidades mais queridas. À medida que apren- nos permite aprender à custa de nossos erros,
demos a nos harmonizar com o Eu Interior, de modo a podermos agir com um renovado
aprendemos a enxergar mais claramente e sentimento de responsabilidade e integridade
a estabilizar nossas emoções. A tarefa não é moral, no sentido de fazermos o que nos for
fácil, mas justifica plenamente o esforço. possível para ajudar a resolver a situação.
Comecemos por um período de medita- Segundo, é importante avaliar o rela-
ção sobre um relacionamento em particular, cionamento com base nas necessidades e
no qual estamos envolvidos, e que é de algu- expectativas a ele ligadas. Nós todos temos
ma forma desarmonioso. Primeiro, é impor- certas necessidades que são satisfeitas através
tante examinar nossos próprios motivos na de relacionamentos harmoniosos, como, por
situação. Você quer verdadeiramente criar exemplo, a necessidade de companheirismo,
um relacionamento mais pacifico e harmo- do receber e dar amor, de compaixão, reco-
nioso, ou está buscando um meio de ajustar nhecimento e aceitação. Sabemos todos que,

26 O ROSACRUZ · INVERNO 2013


quando vivemos e trabalhamos em harmo- modifica. Quanto mais objetivo você se tor-
nia com outras pessoas, liberamos energias nar (quanto mais livre você estiver do medo),
criativas no sentido de alcançar metas mais mais perceptivos e criativos se tornarão seus
elevadas do que poderíamos alcançar so- pensamentos. Gradualmente, você se sentirá
zinhos. Os relacionamentos são colocados apto a substituir o medo por sentimentos de
em situação de perigo quando traduzimos autovalorização, amor e compaixão
nossas necessidades como expectativas não Finalmente, é importante que você encare
realísticas. Como adultos, deparamos com as sua própria solidão. É somente quando esta-
duas distorções mais comuns que resultam mos dispostos a ficar sós, a nos comprometer-
de esperarmos que tomem conta de nós, ou mos com um relacionamento com o Mestre
então esperarmos que outra pessoa seja tudo Interior, é que descobrimos a capacidade de
para nós. A confiança mútua, o respeito e a amar plenamente. A certeza de que pertence-
aceitação são mais enriquecidos quando es- mos a algo maior nos traz a verdadeira estabi-
tamos dispostos a assumir a responsabilidade lidade emocional. Enquanto não colocarmos
por nossas necessidades pessoais, quando nos nossos relacionamentos no contexto de nos-
dispomos a nos preocupar com as necessida- sos ideais mais elevados, enquanto não dedi-
des da outra pessoa, e também quando nos carmos nossa vida a serviço desses ideais, não
dispomos a aceitar o risco da vulnerabilidade. teremos capacidade de criar relacionamentos
É comum fecharmos todas as possibilida- harmoniosos e verdadeiramente afetivos com
des de relacionamentos verdadeiramente afe- outras pessoas. A paz começa no interior de
tivos por permitirmos que o medo domine cada um de nós e se expande numa rede sem-
os nossos pensamentos, sentimentos e com- pre crescente de relacionamentos, que só de-
portamentos. Por exemplo, imagine a outra pendem da força de nosso compromisso com
pessoa em sua tela mental e comece a conver- as realidades espirituais. 4
sar com ela. Como você imagina a reação da


mesma? Estará um de vocês dois magoado,
zangado, na defensiva, temeroso? Haverá É comum
algum meio de falar com ela de modo que
reaja de um modo mais positivo? Ou que o fecharmos todas as
ajude a encará-la de modo mais compassivo?
Não estará um de vocês esperando demais do
possibilidades de
outro? Como seria sua vida sem essa pessoa? relacionamentos
Como a vida dessa pessoa seria sem você?
De que forma estão suas vidas ligadas? Qual verdadeiramente
o contexto desse relacionamento? Haverá
um ponto particular causando tensão entre
afetivos por
ambos? Poderá você visualizar uma solução permitirmos que o
que venha suavizar essa tensão? Estará você
pronto a encontrar uma solução? medo domine os
Explore o relacionamento com a visão
mental de diferentes perspectivas, tantas
nossos pensamentos,
quantas possa encontrar. Conscientize-se de sentimentos e

que seus relacionamentos crescem e se mo-
dificam da mesma forma que você cresce e se comportamentos.

INVERNO 2013 · O ROSACRUZ


27
n PERSONALIDADE ROSACRUZ

© PHOTOS.COM

Paracelso
o rosacruz
Por raYMUnd andrea, FrC*

28 O ROSACRUZ · INVERNO 2013


u “ Paracelso é
ma edição inglesa da vida de Para-
celso, de A M Stoddart, foi publi-
cada em 1911. Durante anos, ela
devotou sua vida e suas energias
o observador
à preparação dessa obra. Ela faleceu poucas perspicaz da
horas depois de entregar as últimas páginas
do seu livro para impressão. realidade; um
Seu amplo estudo e sua erudição bem
equilibrada, além de seu conhecimento de maravilhoso viaduto
línguas, tornaram-na especialmente apta
para essa tarefa, e ela passou um tempo na
estendido na
Alemanha e na Itália a fim de investigar in
loco a carreira do seu notável objeto de estu-
travessia para uma
do. Vamos, então, dar uma espiada em seu nova humanidade:
a Renascença.

livro e obter pelo menos uma ideia do tipo
de “propaganda oculta” de que esse “ocultista
profissional” foi acusado.
A Renascença é um período de absorven-
te interesse para o estudante em muitas áreas poucos anos de pesquisa febril, nos segredos
da vida: religião, arte, letras e ciências natu- das filosofias antigas e em muitas das línguas
rais. Foi um período fecundo de grandes per- orientais e, por fim, indo para Roma, ofere-
sonalidades que estavam destinadas a alterar ceu-se para defender novecentos paradoxos
o mundo. Como disse um escritor: audaciosos, extraídos de fontes opostas, con-
tra todos que o confrontassem.
“Era o novo nascimento para a liberdade Esses e muitos outros foram as vozes
[…], o espírito da humanidade recobrando a inspiradas que deram nova expressão à
consciência e o poder de autodeterminação; religião, à ciência e às artes, enfrentando
reconhecendo a beleza do mundo externo e todo tipo de oposição, escárnio, desprezo e
do corpo através da arte, libertando a razão perseguição cruel. E Paracelso deu-se igual-
na ciência e a consciência na religião, res- mente mal, talvez até muitíssimo pior do
taurando cultura para a inteligência e esta- que a maioria deles.
belecendo o princípio da liberdade política.” Não precisamos nos ocupar dos detalhes
de seu nascimento e de como transcorreu
No ano de 1493, ano em que nasceu sua juventude. Somos informados que ele
Paracelso, Savonarola, o pregador e refor- foi aluno do Abade Trithemius, homem de
mador italiano, censurava príncipes e clero grande renome em pesquisa oculta e douto
em discursos denunciadores e proféticos, no conhecimento do seu tempo, um amante
em São Marco, Florença. Lutero tinha ape- de arte e poesia, alquimista, historiador e
nas dez anos de idade e frequentava a escola médico. Existe até hoje uma reprodução de
em Magdeburg, inconscientemente se pre- um raro clássico de literatura alquímica cha-
parando para a sua guerra contra o Papa e mado Splendour Solis, contendo os tratados
as doutrinas da Igreja de Roma. Pico Della alquímicos de um certo Solomon Trismosin,
Mirandola, que nasceu em 1463 e morreu que, segundo se diz ali, foi um Adepto e pro-
prematuramente em 1494, penetrou, nesses fessor de Paracelso.

INVERNO 2013 · O ROSACRUZ


29
n PERSONALIDADE ROSACRUZ

Entretanto, não há nenhuma razão para Dez meses em Schwatz o conduziram à


se pensar que seu biógrafo está enganado conclusão de que sua experiência numa uni-
nesse ponto específico, uma vez que um versidade tinha sido infecunda de resultados
homem como Paracelso pode muito bem e que ele iria estudar na universidade do
ter sido pupilo, em diferentes estágios de mundo. Ele gastou nove anos em viagens.
seu desenvolvimento, de mais de um gran-
de professor. Em todo caso, mal parecia ter “Um doutor”, disse, “não pode se tornar
atingido a maturidade, quando ele fez uma eficiente na universidade. Como é possível
viagem até Trithemius, depois de ler um ma- compreender em três ou quatro anos a na-
nuscrito redigido por este professor, e com tureza, a astronomia, a alquimia ou a físi-
ele estudou ocultismo. ca? Um doutor deve ser um viajante, porque
Esse homem era versado nos segredos do deve indagar diretamente ao mundo. Expe-
magnetismo e da telepatia e, em seus expe- rimentos não são suficientes. A experiência
rimentos místicos, conseguia ler os pensa- deve comprovar o que pode ser aceito ou
mentos dos outros à distância. Mas, acima de não. Conhecimento é experiência”.
tudo, ele insistia no estudo da Bíblia e, nisto,
influenciou Paracelso para a vida toda. Sua Desgostoso com uma universidade, contu-
pupilagem com Trithemius determinou sua do não evitou outras. Ele as experimentou em
carreira. Ele renunciou a todas as coisas que cada país que visitou, na esperança de encon-
levavam às glórias mundanas e entregou sua trar um espírito afim. Viena e Colônia, Paris e
vida à busca da sabedoria. Montpellier, depois Bolonha, Pádua e Ferrara.
Tinha cerca de 22 anos quando foi Todos os grandes centros de aprendizagem
trabalhar nas minas de prata e nos labora- figuraram em seu programa: entretanto, nem
tórios de Schwatz. Provavelmente, a curio- na Alemanha, nem na França ou na Itália, ele
sidade o levou para lá, pois havia lido muito conseguiu encontrar a verdade que buscava.
sobre a transmutação dos metais comuns Ele não se sujeitaria aos ensinamentos e es-
em ouro. Lá, ele encontrou dois grupos de critos das universidades, e prosseguiu viagem
trabalhadores: os mineiros e os químicos. para a Espanha e, mais tarde, para a Inglater-
Estes últimos eram alquimistas e suas aná- ra, onde passou um tempo nas minas princi-
lises e combinações eram aliadas do experi- pais e menores de Cumberland e Cornwall.
mento oculto. Enquanto estava na Inglaterra, ele recebeu
Paracelso trabalhou nos dois grupos, notícias de guerra nos Países Baixos, e se ins-
pois era propenso à experiência direta na creveu e obteve o posto de barbeiro-médico
fonte. Ele aprendeu os riscos e as durezas da do exército alemão. Isso não era um movi-
mineração e estudou os veios dos minérios mento errático, mas, definitivamente, parte
preciosos. Frequentou os laboratórios dos de um plano estabelecido para ampliar seus
alquimistas e logo depois os abandonou, con- conhecimentos de cirurgia de ferimentos,
vencido da futilidade da “culinária do ouro”. que ele praticara anteriormente com o seu
O resultado de suas pesquisas em Schwatz pai, que era cirurgião. Avidamente, procu-
está condensado neste axioma: rou ocupações numa série de campanhas e
prosseguiu seus estudos sobre a cura entre os
“A alquimia não é para fazer ouro nem soldados, com infatigável empenho.
prata; sua utilidade é para fazer as essências Tempos depois, vamos localizá-lo entre os
supremas e dirigi-las contra as doenças”. turcos e os tártaros, aumentando continua-

30 O ROSACRUZ · INVERNO 2013


mente seus estoques de conhecimento posi- Paracelso voltara havia muito tempo à
tivo. Perambulando com nômades orientais, Europa ocidental, quando recebeu um pe-
ele aprendeu com os sarracenos e os turcos dido para viajar até Basel (Suíça) a fim de
a erudição de seus homens santos; com os curar o famoso editor Froben, que machuca-
médicos e os astrólogos judeus, aprendeu os ra o pé numa queda.
segredos da Cabala e acabou se convencendo Froben possuía considerável reputação
da realidade daquele poder oculto que, entre em Basel. Fora educado em sua universidade
as nações da antiguidade, era o dom mais e fundara uma editora nessa mesma cidade,
elevado do sacerdócio. tendo publicado cerca de trezentos livros, in-
Aos 32 anos, era um cirurgião experien- clusive um Novo Testamento em grego, que
te e médico renomado, tendo se diplomado foi usado posteriormente por Lutero, além
em ambas as artes. Onde quer que fosse, de obras dos Patriarcas da Igreja. Foi ampla-
tinha a reputação de um curador e era com mente graças a Froben que Basel tornou-se o
frequência chamado por principal centro alemão de
homens de altas posições, comércio de livros no sécu-
© COMMONS.WIKIMEDIA.ORG

dos quais ele tratava com lo dezesseis. Paracelso ficou


sucesso de doenças que ou- morando na casa desse
tros médicos consideravam homem e, em poucas sema-
incuráveis. Estudantes se nas, efetuou a cura dele.
agrupavam em volta dele Por intermédio de Fro-
para ver suas análises e ou- ben, Paracelso ficou conhe-
vir seus ensinamentos. cendo Erasmo, eminente
Já era então grande de- sábio e teólogo, que anos
mais para seus colegas de antes vivera na casa de Fro-
profissão e teve de fugir da ben. Erasmo consultou Para-
Prússia, da Lituânia e da celso sobre sua própria saúde
Polônia. Não era do agrado declinante e ficou espantado
de ninguém, a não ser dos com o discernimento do
doentes aos quais curava. diagnóstico dele. Sua admi-
Johann Froben
Tinha preferência pelas ração por Paracelso acabou
cidades universitárias, por- influenciando os magistrados
que era nelas que os estudantes se reuniam. na decisão da indicação de um médico para a
Deles, conseguia obter audiência, mas seus cidade, posto que estava vago nessa época.
notáveis ensinamentos e curas apenas sus- Em 1526, ele foi devidamente investido
citavam a inveja dos professores e doutores, no cargo de conferencista da universidade
que sentiam ser seu dever acabar com ele. de Basel. Estava exercendo a função havia
Certo dia, ele foi convocado para atender apenas poucas semanas, quando as autorida-
ao grão-duque de Baden, que estava enfermo des acadêmicas interferiram e proibiram que
com disenteria e sua vida estava em perigo. ele continuasse.
Paracelso fez cessar a disenteria de forma tão
rápida que os médicos da família insistiram “Eles notam”, escreve, “que eu explico
que eles é que operaram a cura e que Paracel- minha arte da medicina de uma forma
so não era digno de sua fama. Os honorários ainda não habitual e, isto, de modo a
foram-lhe recusados a conselho deles. instruir cada um”.

INVERNO 2013 · O ROSACRUZ


31
n PERSONALIDADE ROSACRUZ

O que perturbava as autoridades era sua nos até os campos ao redor para estudarem
separação dos velhos métodos e a substitui- as ervas medicinais “onde Deus as colocou”.
ção destes pela sua própria experiência e seus Levava-os ao estudo de alquimia, química e
próprios experimentos. Ele tinha também aos experimentos, de modo a que eles fossem
a ousadia de ensinar em alemão em vez de seus próprios farmacêuticos. Levava os estu-
latim, de modo que qualquer um era capaz dantes pobres para sua própria casa, vestia-
de entender, e eles temiam que os novos en- -os, alimentava-os e lhes ensinava tudo. E
sinamentos pudessem se libertar dos grilhões entre estes estavam aqueles que o traíram.
dos velhos. O Dr. Franz Hartmann, que era Da riqueza, ainda existente, de seu ma-
Rosacruz e médico pessoal de Madame Bla- terial sobre a arte da cura, o biógrafo de
vatsky, diz: Paracelso apresentou um breve resumo de
algumas palestras, para mostrar que tipo de
“A glória de ser o primeiro homem a ensino os estudantes de Basel receberam des-
ensinar em língua alemã, se mestre inspirado. Depois
numa universidade alemã, de examiná-las, não pode-
© COMMONS.WIKIMEDIA.ORG

pertence a este genuíno mos nos surpreender que


alemão, Theophrastus Von ele tenha tido problemas na
Hohenhelm (Paracelso), universidade. A condição da
para todo sempre.” profissão médica, o caráter
e a conduta de seus prati-
Disseram que isso era cantes na primeira metade
porque ele não sabia nada do século dezesseis, eram
de latim e até insinuaram deploráveis e mereciam as
que ele nunca se diplomou. cáusticas invectivas que ele
Tentaram enraivecê-lo, de dirigia contra eles. Algumas
modo a terem alguma coisa frases características, extra-
contra ele. Ele foi forçado a ídas de “Três qualificações
pôr seu caso nas mãos dos que um bom e perfeito ci-
magistrados, por ordem rurgião deve possuir”, darão
Franz Hartmann
dos quais ele havia deixado uma boa ideia do sentido
seu trabalho em Strasburg dessa crítica:
para aceitar a indicação deles, a fim de pre-
servar alguns direitos ligados ao seu cargo. “Os doutores que se fizeram doutores me-
O requerimento foi atendido e a perseguição diante dinheiro, ou após longo período de
imediata cessou. Noite e dia ele trabalhou em tempo, leram seus livros apressadamente e
suas palestras com vigor inabalável. Mesmo retêm pouca coisa em sua cabeça. Mas esses
durante os feriados de Basel, ele resolveu asnos circulam na cidade como se fosse um
recuperar o tempo que as oposições acadêmi- crime para o doente contradizer um doutor.”
cas o fizeram perder, e o salão de conferência
estava lotado de estudantes ávidos. Entretanto, seu ensino construtivo e
Experiência era melhor do que lições de axiomático naquelas palestras é precioso e
anatomia; por isto, ele complementava suas perene. Embora pouco compreendido pelos
palestras com demonstrações práticas, num alemães do seu tempo, os melhores pensado-
autêntico estilo rosacruz. Ele levava seus alu- res de hoje reconhecem a grande importân-

32 O ROSACRUZ · INVERNO 2013


cia dele para a renascença alemã. Diz o Dr. vos aos doutores da velha escola e eles não
Franz Strunz: apreciaram nem um pouco o título de “im-
postores”. Ele endereçou uma carta afável aos
“Paracelso foi um pioneiro como médi- magistrados sobre a questão, mas não rece-
co, como estudante da natureza, como beu nenhuma resposta.
teólogo, porque apreendia a natureza e o Mudou-se então de Nuremberg para Be-
mundo tal como são e via todas as coisas à ratzhausen e ali escreveu alguns de seus tra-
luz da natureza, levando com isto a nova balhos mais valiosos. A proibição de imprimir
vida, indução metódica e comparação”. em Nuremberg foi um desestímulo, mas não
o refreou. Ele sabia que seus livros seriam
Dez anos depois de sua morte, as doutri- publicados em algum lugar; se não naquele
nas de Paracelso estavam sendo ensinadas momento, mais tarde. Basel, que o rejeitara,
em Basel. Alertado por amigos de sua imi- foi a primeira cidade a imprimir os livros que
nente captura e prisão em Basel, por ordem ele escrevia agora em Beratzhausen.
dos juízes, ele se viu compelido a uma fuga Outras cidades foram visitadas, nas quais
ignominiosa durante a noite. Uma vez fora ele permaneceu algum tempo, sempre in-
da jurisdição deles, ele estava livre e permi- tensamente ativo, curando o rico e o pobre e
tiu-se passar um tempo em Colmar, curando escrevendo seus livros. Seguiu-se então um
pessoas e ocupado em pesquisas. Mais tarde, período de alguns meses em que ele descan-
foi descoberto residindo em Esslingen, onde sou de escrever sobre medicina e se dedicou
montou um laboratório e trabalhou em pro- ao trabalho evangelístico e ao ensino e distri-
blemas alquímicos e astrológicos. buição da Bíblia.
Suas ocupações ocultas logo atraíram Ele perambulou por Appenzell e suas
uma coleção de assim chamados discípulos, montanhas, indo ao encontro do pobre e do
alguns dos quais eram seus empregados, ou- rico, curando-os e ensinando-os. Essa ocu-
tros, secretários e alguns alunos. Aos 35 anos pação com as necessidades tanto espirituais
ele já estava prematuramente envelhecido. como corporais dos homens foi causa de
Trabalhava quase a noite inteira, permitindo- novas perseguições nas mãos dos sacerdotes.
-se apenas umas quatro horas de sono. Ali Tão feroz era o ressentimento deles que eles
não havia pacientes ricos para ajudá-lo. Mui- perseguiam aqueles que lhe demonstravam
tos de seus seguidores eram velhacos que, hospitalidade. Faltaram-lhe onde morar, o
provavelmente, não tinham escrúpulos em que comer e o que vestir. Ele foi reduzido à
roubá-lo. Ele foi forçado a abandonar sua miséria e obrigado a fugir.
casa e pôr o pé na estrada novamente. Vale notar que Paracelso foi impelido às
Algum tempo depois, acabou chegan- suas pesquisas tanto por seus poderes espiri-
do à famosa cidade de Nuremberg. Levava tuais como por seus poderes intelectuais. Os
consigo seu livro “Prognósticos” e um outro pontos de vista do neoplatônico Cornelius
volume, recém-completado, sobre a doença Agrippa, que era contemporâneo de Paracel-
francesa. Ele esperava vê-los publicados em so, este último os desenvolveu e apresentou
Nuremberg. Entretanto, a Faculdade de Me- numa forma mais perfeita.
dicina de Leipzig havia lido seus trabalhos e
escreveu ao Conselho de Nuremberg solici- “Em todos os lugares, ele se empenha”, diz
tando que os livros não fossem publicados. Steiner, “para descer às bases mais pro-
Paracelso fora pródigo de epítetos relati- fundas do conhecimento natural, a fim de

INVERNO 2013 · O ROSACRUZ


33
n PERSONALIDADE ROSACRUZ

subir, por sua própria força, nava as leis da natureza

© COMMONS.WIKIMEDIA.ORG
até as mais elevadas regiões com as leis do microcosmo;
da cognição.” isto é um homem com sua
consciência, seus sentimen-
Dos conhecimentos ini- tos e seus desejos. Foi esse
ciais do neoplatonismo e da delicado senso artístico que
Cabala, Paracelso desenvol- provou ser a ponte audacio-
veu sua filosofia espiritual. sa entre o homem Paracelso
Com toda certeza, ele era e o observador perspicaz da
um místico, no verdadeiro realidade; um maravilhoso
sentido do termo. Seu ocul- viaduto estendido na traves-
tismo, também, derivava-se sia para uma nova humani-
da mesma fonte que as dou- dade: a Renascença”.
trinas de Cornelius Agrippa
e, mais tarde, as de Van Hel- Pouco está registrado
mont e Boehme, que foram Cornelius Agrippa sobre seus últimos dias. Ele
seus discípulos. É interessan- estava sofrendo de uma in-
te destacar que, a respeito de Boehme, Evelyn sidiosa enfermidade, sem dúvida contraída
Underhill escreve: das muitas substâncias venenosas com que
fazia experiências, e estava pagando a inevi-
“Ele é um dos mais bem registrados exem- tável penalidade de uma vida excessivamen-
plos de iluminação mística; denotando, te ativa. A crônica inteira que temos diante
junto com uma aguda consciência de com- de nós é de intenso e altruístico labor, de
panheirismo divino, todos os fenômenos de andanças e perseguições, de intolerância,
lucidez visual, automatismo e poderes inte- insulto e desprezo a uma alma sublime, des-
lectuais expandidos que lhe são próprios.” denhada e rejeitada pelos homens.
“Repouso é melhor que agitação”, escreveu,
Pode-se perguntar: foi Paracelso menos “mas agitação é mais proveitosa que repou-
que isso e demonstrou menos que isso? O so.” Ele morreu em 1541, em Salzburg, e seu
professor Strunz, escrevendo sobre a perso- corpo foi sepultado no cemitério da Igreja de
nalidade de Paracelso, diz: São Sebastião.

“Ele era uma mente de poderosas caracte- Se mergulho num negro e imenso mar nebuloso,
rísticas, cuja rara maturidade converteu a É apenas por um tempo.
enunciação dos problemas científicos em Aperto contra o peito a candeia de Deus;
termos calorosamente humanos, e a ele Seu esplendor, cedo ou tarde,
devemos a realização de uma comunidade Romperá as trevas;
humana culta baseada na compaixão e na Hei de emergir um dia. 4
fé cristã e humanitária, coisas que podemos
perfeitamente considerar como as bases
de seus ensinamentos relativos tanto ao
concreto quanto ao espiritual… Paracelso * Extraído da edição de novembro de 1929 da revista
Rosicrucian Digest e do livro A Flor da Alma, publicado
sentia como um artista e pensava como um pela GLP em 2012.
matemático, do mesmo modo que combi-

34 O ROSACRUZ · INVERNO 2013


n POESIA

eterna
busca
Entre o que sonho, suponho e vejo,
Há um abismo… Treva infinda?!
Do outro lado, lume permanente,
Semente lançada no solo do AMOR,
Nesta terra não há poente.

Como hei de atravessar para o outro lado?


A ponte é frágil e balançadeira.
Não suporta mais que o meu ser despido
De todo sentimento mundano.
Se aspiro o profano,
Cairemos eu e o meu fardo
Ao atravessar tal ponte.

vvv

Condutor de mim mesmo


Nesta Senda Peregrina
O ideal seria simular noite e dia
A minha travessia.
Caindo aqui, levantando acolá,
Nesta Eterna Dança que é
A Evolução da Vida.
© PHOTOS.COM

Por PedrO HenrIQUe assUnÇÃO da sILVa MartIns, FrC

INVERNO 2013 · O ROSACRUZ


35
n AUTOCONHECIMENTO

REVELAçãO l
INSPIRAçãO l
ILuMINAçãO

Por HILtOn neVes FILHO, FrC

“Invocado ou não, Deus está presente”.


– Adilson Rodrigues, FRC

“… assim, tenhamos consciência ou não, Deus é hodierno em nossos fenômenos”.


Com insistência, Deus nos remete recados de todas as formas e meios possíveis. Porém, de modo
particular, nos fala mais diretamente por três vias principais: pelos sonhos, pela intuição e em
resposta às nossas orações.
Quando pelos sonhos, é revelação;
Quando pela intuição, é inspiração;
Quando pela oração, é iluminação;
Essas três vias ocorrem segundo nosso cotidiano trânsito entre o estado de atividade e o de passividade.

a revelação
A revelação exige passividade: o Criador aproveita o turno em que nossa inquieta mente objetiva
está desligada e, independente da nossa vontade, envia uma mensagem simbólica.
O termo significa “tirar o véu” e mostrar algo que estava encoberto. Portanto, na revelação, Deus,
através dos sonhos, retirando o véu da obscuridade, indica o que antes era desconhecido para a
mente humana sendo, sem dúvida, uma forma de contato que se realiza diária e permanentemente.

36 O ROSACRUZ · INVERNO 2013


Embora todos sonhem mais de uma vez por dia, muitos não se recordam disso. Contudo,
recuperadas essas memórias ou não, o sonho irá produzir seus efeitos sobre o homem.
Como os batimentos cardíacos e os movimentos dos intestinos, o sonho é uma função autônoma
tão importante quanto as outras, pois compensa, reequilibra e regenera.
Via de regra, o que acontece oniricamente acaba acontecendo na vida real, exatamente por se
tratar de presciência que não poderia ser indicada de qualquer outra forma.

a inspiração
A inspiração exige os dois polos pois, se por um lado precisamos da passividade para que ela se
manifeste, é necessário querer “ouvir” e estar atento para receber a mensagem.
O termo vem do latim “inspiro”, que se traduz em “soprar para dentro”. “Inspiração” significa
que repentinamente Deus soprou a possibilidade da ocorrência de determinado fato para
dentro do homem.
A inspiração parece ser intermitente e está ligada à comunicação
de uma real possibilidade fatual.

a iluminação
A iluminação exige atividade. Com o emprego do desejo
e da vontade, buscamos, rogamos ou suplicamos algo
pela via da oração e o Criador, atendendo, faz com que
aflore uma resposta adequada à nossa compreensão.
Iluminação deriva do latim “iluminare”, que também
significa inspirar ou orientar.
Iluminação é o processo pelo qual Deus aclara e in-
funde Luz sobre as questões e desígnios do suplicante.
A iluminação pode ser permanente e admite gradação
ditada pelo discernimento de cada um.

Conclusão
Partindo dessas abordagens, vislumbra-se um propósito
Divino comprometido com a prosperidade do homem
no mais amplo sentido, pois, tenhamos consciência
dessas coisas ou não, guiando-nos, Deus interfere
contribuindo de todas as formas para o nosso
© PHOTOS.COM

crescimento, sendo, assim, nossa verdadeira sentinela


de bem-aventurança. 4

INVERNO 2013 · O ROSACRUZ


37
n REFLEXÃO

OM
S.C
TO
HO
©P

Por serGe tOUssaInt, FrC – Grande Mestre da Jurisdição de Língua Francesa

P
rimeiramente, é preciso questionar continente, no mesmo país, no mesmo meio
o sentido da palavra “igualdade”. sociocultural, na mesma época, no mesmo
Na maioria dos livros de consulta contexto etc. Além disso, os fatos provam que
ela é definida como a “relação entre eles não vêm ao mundo com o mesmo poten-
indivíduos iguais”, ou como a “igualdade de cial de saúde, a mesma sensibilidade, as mes-
fato entre pessoas que tenham as mesmas mas formas de inteligência, os mesmos dons,
prerrogativas naturais, as mesmas aptidões, a as mesmas aptidões, nem na mesma família.
mesma fortuna…”. Considera-se aí também o Vemos então que as crianças não são todas
estado da “igualdade natural”, da “igualdade iguais ao nascerem e que a igualdade não
civil”, da “igualdade social”, da “igualdade existe no estado natural, o que fez alguns filó-
política” etc., o que faz supor que a noção de sofos dizerem que é utópico querer construir
igualdade se aplica a campos muito diferen- uma sociedade igualitária. Persiste o fato de
tes. Seja como for, as coisas são tais que os que a vida em si mesma é neutra neste campo
seres humanos não nascem todos no mesmo e não se preocupa com a igualdade entre os

38 O ROSACRUZ · INVERNO 2013


seres. Assim é porque ela opera segundo suas qual tem uma personalidade diferente com
próprias leis e sem levar em conta desejos suas características e suas particularidades.
e a vontade dos seres humanos. E também Se for legítimo trabalhar pela igualdade
porque ela assenta sua razão de ser no grande de oportunidades e de direitos, não cabe
princípio que é a evolução, a qual sempre pri- contar com leis que a sociedade possa e
vilegiou a diversidade e não a uniformidade. deva desenvolver com esta finalidade. Dado
Um espiritualista está mais inclinado do que ela é o reflexo dos indivíduos que a
que um materialista a compreender que a compõem, cabe acima de tudo a cada qual
igualdade não pode existir no estado natural. aprender a ser equitativo em seus julgamen-
Convicto de que todo ser humano é corpo tos e no seu comportamento, qualquer que
e alma, ele entende que cada qual herda, ao seja sua posição social. Isto quer dizer que
nascer, um corpo e uma alma que lhe são nenhum indivíduo deveria usar um status de
adequados e que dele fazem uma persona- superioridade ou uma função de poder para
lidade ou, mais exatamente, uma individu- tirar proveito disto em detrimento daqueles
alidade, única. Todos os seres humanos são que estão numa situação de inferioridade ou
então diferentes, para não dizer desiguais, no de subordinação. Inversamente, isto significa
que concerne ao potencial físico, psíquico e que todo mundo deveria compreender a ne-
espiritual que eles têm no momento em que cessidade de ser orientado, aconselhado ou
vêm ao mundo. Isto posto, deve-se fazer tudo dirigido por pessoas mais experientes, mais
para que cada um deles possa tirar o melhor inteligentes ou mais sábias. Nisto a hierar-
proveito desse potencial de nascença, donde quia é uma necessidade, ficando entendido
a necessidade de se cultivar a igualdade das que ela deve ser uma hierarquia de compe-
oportunidades e dos direitos, o que faz a tências, baseada num respeito mútuo entre
maioria das sociedades democráticas. Toda- todas as pessoas que a constituem, seja ao
via, isto não pode bastar para tornar os indi- nível de uma associação, de uma empresa, de
víduos iguais como tais. Por exemplo, todo uma instituição ou do próprio Estado. Seja
professor sabe perfeitamente que duas crian- como for, se é impossível tornarmos os seres
ças da mesma idade, oriundas de um meio humanos iguais em todos os
social equivalente, educadas de maneira qua- planos e em todos os campos,
© AMORC

se idêntica, instruídas juntas na mesma clas- podemos e mesmo devemos


se, não terão os mesmos resultados escolares. cultivar a equidade nas nos-
Por quê? Porque elas têm personalidades di- sas relações com os outros,
ferentes e, como já dissemos, com tudo o que principalmente se as coisas
isto implica em termos de aptidões, de dons, fizeram com que estivésse-
de centros de interesse, de formas de inte- mos em situação de superio-
ligência etc. Infelizmente, certos ideólogos ridade. Isto implica manter-
confundem “igualdade de oportunidades” e mos laços fraternos com os
“igualdade de resultados”, a ponto de repro- outros e neles vermos al-
varem aqueles que têm sucesso onde outros mas irmãs que, como nós, Serge Toussa
int
fracassam. Além disso, todo mundo há de estão evoluindo na senda
notar que só o fato de contar com os mesmos do aperfeiçoamento. Nisto a fraternidade
direitos (civis, sociais, políticos etc.) tampou- é um ideal a priori mais acessível do que a
co torna os seres humanos iguais no que eles igualdade, pois depende quase exclusivamen-
fazem e no que eles são, também porque cada te da boa vontade dos seres humanos. 4

INVERNO 2013 · O ROSACRUZ


39
n ESPIRITUALIDADE

© AMORC

Por MarIO serranO, FrC

40 O ROSACRUZ · INVERNO 2013


e “
m nossa vida cotidiana todos temos
“más horas”, para tomar de em- … ainda que
préstimo a expressão de Cyrano de
Bergerac; são vicissitudes inevitá-
o conceito de
veis da existência humana e nesses momen-
tos difíceis podemo-nos interrogar sobre
cavalaria tenha
o sentido das dificuldades e das provações evoluído através
do cotidiano. O conceito de cavalaria pode
ajudar e dar apoio àquele que busca enten- dos tempos, ela
dimento. Hoje, porém, o que pode repre-
sentar para nós esse conceito?
repousa sobre uma
Em seu livro intitulado O Segredo das realidade universal
Ordens de Cavalaria1, Victor Émile Michelet,
que foi presidente de diversas sociedades de transcendente e pode
poetas e Grande Mestre da Tradicional Or-
dem Martinista, evoca em preâmbulo que a
verdadeiramente
cavalaria representa no conceito popular o servir de apoio para
símbolo do heroísmo a serviço da justiça: é
um cavaleiro quem quer que se lance em de- a realização espiritual
do homem.

fesa da fraqueza contra a força. Os conceitos
populares podem, segundo ele, testemunhar
uma grande sabedoria. Tentaremos de fato
salientar que ainda que o conceito de cava- conceito popular de que nos fala Michelet está
laria tenha evoluído através dos tempos, ela impregnado de espiritualidade cristã e evoca a
repousa sobre uma realidade universal trans- noção fundamental de serviço.
cendente e pode verdadeiramente servir de Na Idade Média, o cavaleiro se dispõe
apoio para a realização espiritual do homem. voluntariamente a servir um senhor nas ter-
A cavalaria deve mesmo ser considerada ras de que está encarregado de fazer reinar
como uma via iniciática na medida em que a ordem e a justiça. Porém, é seu dever tam-
nos revela quem somos na realidade, com bém apoiá-lo e combater a seu lado em caso
nossas capacidades latentes e nossa aptidão de guerra defensiva ou agressiva: ele é seu
para resolver nossas dificuldades, apoiando- vassalo. O senhor serve então unicamente
-nos sobre nossa dimensão espiritual – a qual de referência quanto às leis que deverão ser
nos compete descobrir e valorizar – como aplicadas e respeitadas? É possível, mas não
diríamos hoje, pois ela é nossa herança. apenas isso. Durante as cruzadas, fosse no ex-
O conceito de cavalaria evoluiu através dos terior da Europa ou contra os Albigenses, era
tempos, pois originalmente os cavaleiros eram a Igreja que tentava dirigir a ação dos cava-
antes de qualquer coisa guerreiros a cavalo, leiros. Nos romances de cavalaria, vê-se bem
seja no mundo greco-romano ou no lado dos que é um ideal que lhes serve de objetivo.
Bárbaros, ou seja, dos Germânicos que os Mais tarde, não foi Dante constrangido, para
combatiam regularmente. Pode-se pensar que escapar das fogueiras da Inquisição, a se fazer
o fato de combater montado num equino exi- “cavaleiro solitário”, uma vez que a Inquisição
gia habilidade, coragem, bravura etc. Entre- não era evidentemente capaz de reconhecer a
tanto, não se trata aqui de defesa do fraco. O natureza da inspiração que o guiava?

INVERNO 2013 · O ROSACRUZ


41
n ESPIRITUALIDADE

Efetivamente, os heróis da Antiguidade,


© AMORC

como Hércules ou Heitor, já estavam na pro-


ximidade dos deuses e portadores do ideal
cavalheiresco. Mais próximo a nós, Edmond
Rostand nos retrata através da heroica perso-
nagem Cyrano de Bergerac o próprio símbolo
do cavaleiro destemido a serviço de um ideal
de absoluto. Oscar Schindler e Aristide de
Susa Mendès também foram animados por
Deus sobre salvar heroicamente do perigo
de vida milhares de judeus condenados pela
barbárie nazista. Noutra ordem de ideias,
Charles Chaplin difunde de maneira igual-
mente corajosa, em 1940, seu filme O Grande
Ditador, para defender a tolerância e o hu-
manismo face àquilo que ele pressentia: que
seria a barbárie nazista – e isso mesmo com
90% dos norte-americanos hostis à guerra e
dos quais, segundo certos historiadores, uma
boa parte ainda antissemita na época.
Ainda hoje a força desse ideal cavalhei-
resco se manifesta de tempos em tempos
para quem sabe reconhecê-lo em nosso
Louis-Claude de Saint-Martin mundo desencantado. Assim, Jacques Brel,
um trovador moderno, nos exorta como um
Aqueles que no imaginário representam verdadeiro guia espiritual: “Seria preciso ter
melhor, ainda hoje, a abnegação e a defesa do apenas ambições, digamos, relativamente
fraco e mesmo o combate do bem contra o mal nobres, e então urgentemente sucumbir a elas.
são indubitavelmente os Templários, e isso ape- Mesmo que seja impossível, e sobretudo se for
sar da campanha histórica de detração de que impossível”. Não teria ele encarnado Dom
foram vítimas há muitas centenas de anos. Ora, Quixote de Cervantes, autor que combateu
o que sabemos efetivamente sobre os Templá- ao lado dos cavaleiros da Ordem dos Hos-
rios? Não eram eles também guerreiros ocu- pitalários na batalha de Lepanto, em 1571?
pados no manuseio da espada? Contudo, uma Quando perguntaram a Jacques Brel que
força invisível parece tê-los envolvido num tipo de pessoas ele preferia, respondeu com
halo de glória. Não repousaria essa força invisí- grande ternura: “Os fracos, os tímidos, os
vel amplamente sobre seu ideal – esse ideal de sensíveis, os que dizem ‘isso me faz mal’; pois
virtude, integridade, coragem e lealdade? No são pessoas que sofrem pelos outros”.
filme Cruzada, o herói, defensor de Jerusalém Na literatura simbólica ocidental, o Graal,
durante as cruzadas, diz: “Jerusalém é um reino que pode representar o ideal e a Força abso-
da consciência ou isso não é nada”. Trata-se de luta de todo cavaleiro, desaparece tempora-
fato de transcendência – a que eleva o homem riamente do mundo dos homens, nos lembra
a um status superior e com o qual todos so- Victor Émile Michelet, e retorna aos céus
nham secretamente: o status de cavaleiro! pelos anjos, quando nenhum ser humano é

42 O ROSACRUZ · INVERNO 2013


digno de possuí-lo. Pode-se então perguntar fazer uma aliança com o mundo espiritual: à
de onde vem esse ideal que anima o cavalei- força de coragem, paciência, constância e fé
ro, ideal de bem e de justiça. E nesse ponto ele soube encontrar e percorrer o caminho.
confluímos na espiritualidade. Numa abordagem espiritualista da psicolo-
Com efeito, tradicionalmente agir à ca- gia, é a um estado superior de satisfação e
valeiresca é também agir em defesa da fé, de equilíbrio que o homem ascende ao optar
ou seja, é necessário saber encontrar em si a pela disciplina. O domínio progressivo do ego
força para conservar a fé, permanecendo em não conduz à frustração, mas ao contrário,
contato com o mundo ao nosso redor – em a uma maior liberdade de pensamento e de
nossa “circunferência” – como diria Louis- ação. Não era isso o que simbolizava a mon-
-Claude de Saint-Martin: permanecer ligado taria que, se se mostrasse um mau mestre,
ao mundo espiritual para dele se nutrir e para podia se tornar o melhor dos servidores?
se beneficiar da inspiração que dele emana, Contudo, a aposta dessa vida de serviço
ao mesmo tempo em que se permanece em também é permitir a intervenção do mundo
confronto com as provações da vida terrestre; espiritual na vida dos homens. Em seu aspec-
resistir às incitações contínuas a ter pensa- to místico, trata-se de servir de ponte para as
mentos ruins, palavras ruins e ações ruins; virtudes espirituais a fim de que elas entrem
ainda mais, considerar as inevitáveis dificul- pelo homem no mundo e que dessa maneira
dades da vida como suportes para “fortificar”
nosso desejo de agir bem. Para um rosacruz,
a cavalaria é precisamente estar em contato
© CLIPART.COM

com a vida profana enquanto se conserva a


fé, mantida viva e crescente por meio de um
trabalho interior constante.
A cavalaria é portanto uma sabedoria,
pois visa orientar o homem em suas escolhas:
ela o guia e o ajuda a exercer positivamente
seu livre-arbítrio e lhe dá força para escolher
o bem contra o mal. “O único combate no-
bre é o combate interior”, diz-nos um sábio
ameríndio. E Morihei Ueshiba, fundador do
Aikido e grande místico, acrescenta: “Não há
ganhador nem perdedor, pois não há combate;
lutar significa combater o espírito de disputa
que trazemos em nós”. Agir à cavaleiresca exi-
ge pois o cultivo do discernimento e que se
dê prova de disciplina. O termo “disciplina”
não contém a palavra “discípulo”? E não pode
haver discípulo a menos que haja um mestre.
O cavaleiro saberá portanto encontrar ambos
em si mesmo subordinando a parte material
de si (o discípulo) à sua parte espiritual (o
mestre, o ideal). Aí também se trata de uma
busca espiritual. O verdadeiro cavaleiro soube Dom Quixote

INVERNO 2013 · O ROSACRUZ


43
n ESPIRITUALIDADE

o mundo seja provido dele. O mundo seria é um pequeno caos cujo desenredo deve nos
tenebroso se o homem não empregasse sua mostrar a origem das coisas temporais, a sepa-
vontade para oferecer uma passagem às for- ração da luz das trevas e a regularidade viva
ças do espírito. Assim sendo, é pelo homem de todas as formas que ocupam o lugar desse
espiritualizado que a realidade divina, invisí- nada com que, se não fosse por elas, o espaço
vel e intangível, penetra o mundo. É “a tarefa” nos contemplaria”. Cabe ao homem também
dos homens estabelecer esse elo com as força se “des-enredar” em seu plano para dar teste-
do Espírito, pois somente eles podem buscá- munho da grandeza de seu Criador. Podería-
-las no fundo de si mesmos e do mundo em mos aí identificar a “reconciliação” cristã que
que foram colocados para tanto. De certo é fazer a Sua vontade fazendo a nossa, o que
modo, Deus necessita dos homens para essa seria servi-Lo para nosso maior serviço.
operação; ou, se preferirmos, é por essa “in- “A serviço uns dos outros encontramos nossa
cumbência” que Deus julgou e depois decidiu liberdade”, está escrito numa das representa-
que Sua glória se realizaria. O homem, no ções da Távola Redonda, pois o homem en-
status de cavaleiro, pode se tornar o repre- contra a liberdade e a igualdade por meio da
sentante de Deus na Terra. Uma via de ser- fraternidade. Compreendemos bem? E os ca-
viço não é a maneira mais certa de se obter a valeiros dessa mesma távola simbólica fazem
aprovação e a bênção do Cósmico? essa invocação antes de suas reuniões de tra-
Esta é a razão pela qual um retiro diário balho: “Senhor, dá-nos a sabedoria para perce-
sobre nossos comportamentos pode ser útil ber aquilo que é justo, a vontade para escolhê-lo
para conscientizarmo-nos de quais oportuni- e a força para defendê-lo em todas as circuns-
dades de poder manifestar a vontade, a glória tâncias”. Ademais, Cyrano, a ponto de desafiar
ou a presença divina podem ter-nos escapa- sozinho uma centena de homens que ameaça
do, assim como os momentos em que soube- a vida de seu amigo, poeta como ele, justifica-
mos ser dignos de nossa existência, desejada -se assim: “Vai, Gascão, faz o que deve!”.
por Deus no objetivo único de manifestá-Lo Então, isso certamente nos parece no
aqui e agora. Isso nos permite ademais me- mais das vezes “difícil”; como se isso não
dir nosso estado de consciência – o ponto fosse natural, pois quem sabe os pássaros
em que nos encontramos nesse particular do céu também sofram para voar e as flores
no caminho que nos leva a manifestá-Lo em para desabrochar… Isso remete à filosofia de
toda pureza e em perfeita dignidade. Esta é Saint-Martin, para quem nossas dificuldades
indubitavelmente a verdadeira cavalaria espi- advêm do fato que, após a queda do homem,
ritual: manifestar Deus quando nos é exigido, consequência de sua falha, nós “saímos da
e também concedido, caminhar. linhagem”; pois como explicar que tenhamos
“A intenção de Deus é que cada ser, na tantas dificuldades para entender esse “por
medida em que sua própria capacidade o per- que somos feitos”? Para esse grande esotéri-
mitir, reproduza a Bondade divina”, escreve co, a consciência de nosso sofrimento, e so-
Dante em Monarquia. Paralelamente, Louis- bretudo de nossas insuficiências, é a própria
-Claude de Saint-Martin acrescenta, em O prova da existência do Plano Divino. Pode-se
Espírito das Coisas: “O objetivo da vegetação de fato imaginar que possamos ser ao mesmo
é transmitir-nos os raios de beleza, de cor e de tempo sofredores e conscientes do ser e que
perfeição que têm sua origem na região su- isso não tenha, além de tudo, nenhum senti-
perior e que tendem unicamente a se infiltrar do – nenhuma finalidade? Seria isso um (in-
em nossa região inferior; assim, cada semente feliz) acaso a mais na Criação do universo?

44 O ROSACRUZ · INVERNO 2013


car no mundo espiritual a inspiração e a For-
© COMMONS.WIKIMEDIA.ORG

ça para viver o cotidiano. Que possamos não


esquecer disso, não postergar isso incessante-
mente e nos reconciliar com nossa dimensão
espiritual a fim de que ela possa ser acolhida
em consciência e não apenas furtivamente,
através dos sonhos enquanto dormimos. Um
de nossos “bufões” contemporâneos, que
continuava a sonhar com uma sociedade me-
lhor para os homens, observava: “Gritavam:
‘isso é apenas um começo, continuemos o
combate’; ao passo que era apenas um com-
bate e era preciso continuar o começo…”.
Sendo crianças, sabíamos disso, pois nos
perguntavam ainda: “O que você quer ser
quando crescer?” Depois, com o passar do
tempo, esquecemo-nos de continuar a nos
A Távola Redonda
tornar aquilo que queríamos ser. Será por
isso que os homens não querem “crescer”?
Ou então a impressão de dificuldade não Será também isso que desespera os poetas?
é senão a tomada de consciência dos recursos Um conto sufi fala de um homem que,
que nos faltam para fazer aquilo que “senti- após haver observado que os animais en-
mos” que deveríamos fazer? Assim, nossas contravam facilmente alimento na natureza
falhas não são talvez apenas a consciência circunvizinha, decidiu sentar-se ao pé de
dos recursos de que precisamente carecemos? uma árvore na floresta e esperar, despreo-
Um dos elementos característicos do cavalei- cupadamente, que a natureza o alimentasse.
ro realizado não é a Força que o anima – seu Evidentemente, ele enfraqueceu rapidamente
“poder”, diríamos hoje –, a que atribuímos e tornou-se vingativo, censurando Deus pe-
aos “super-heróis” de nossa época? las dificuldades da existência dos homens da
Cabe ao homem construir seu mundo Terra. É então que ele vê caminhar na floresta
como Deus quer que seja feito pelo homem, uma criança inocente e manifestamente aban-
ou seja, pela parte de criação que Ele nos donada. Depois ele vê uma matilha de cães
reservou e que nos incumbe. Ou então teria famintos que farejavam seus passos. Então, o
Ele nos feito criadores, à Sua imagem? E para pressentimento do que iria suceder enfureceu-
tanto é necessário nos munir dos recursos -o e ele bradou aos céus, dirigindo-se ao Cria-
necessários para agir positivamente, suplan- dor: “Como? Deixarás essa criança tornar-se a
tando gradualmente nosso medo e nossa presa desses animais? Não farás nada por ela?”.
impressão de incompletude. “Se Jesus te pede Foi então que ele ouviu uma voz lhe dizer:
algo é porque sabe que és capaz”, diz-nos para “Para essa criança ainda frágil eu fiz a ti!”. 4
nos confortar Teresa de Lisieux. Não está na
ordem das coisas que possamos nos tornar
aquilo que podemos ser um dia?
nota: 1. Le Secret de la Chevalerie, no título original
Os homens são todos cavaleiros espiritu- em francês. (N. do T.)
ais por vir, ou seja, heróis que podem ir bus-

INVERNO 2013 · O ROSACRUZ


45
n EDUCAÇÃO

Por Jean BerrY KOsHt, FrC*

spero que consiga imprimir as pró- Percebe-se que a extorsão não deve estar
ximas quatro linhas nas mentes e no muito presente nos filmes. As mentes recepti-
interior dos corações das mães e dos vas infantis que assistem a esses filmes ficam
pais, especialmente daqueles que indelevelmente impressionadas, e então, com
têm crianças em seus lares, sendo responsá- a ajuda das armas de brinquedo, fornecidas
veis pelo futuro de seus filhos: pelos mais velhos imprudentes, emulam o
criminoso nos mínimos detalhes.
Mantenha uma oração em seu coração para guiar-lhe, Elas pensam na linguagem do criminoso.
Faça da sua vida um exemplo da verdade, Vemos com frequência uma criança surgir
Os caminhos de um homem são moldados por de trás de um arbusto e com firme objeti-
Na casa onde ele passa sua juventude. vo, comandar um “assalto!”.
A vítima dessa brincadeira poderia ter
Se os pais observassem os princípios aqui sido você ou eu.
contidos para uma geração, toda a sociedade Sim, eles pensam na linguagem dos
de nosso país seria revolucionada. Que per- bandidos, e então adaptam as palavras e
sonalidades estamos formando em nossos ações ao pensamento.
jovens? Vejo-os na tenra idade, com apenas Os pais dessas mesmas crianças não
três anos, portando cinturões, bainhas para pensam por um instante antes de comprar
espadas e pistolas, com suas roupas, ao se um kit de equipamentos de ladrão, permi-
vestirem pela manhã, podendo ficar com os tindo-lhes a prática de arrombamento de
ornamentos até o anoitecer, quando cada fechaduras ou de janelas.
corpinho cansado se prepara para ir dormir, As crianças logo se cansam das armas de
após um longo e cansativo dia, brincando de brinquedo. Começam a querer armas de fogo
assaltos e de assassinatos. de verdade, munições reais e experiência
Há vários anos assisto essa lamentável concreta. E tudo o que aprendem nos filmes
ocorrência, predominante em todos os lugares. e em seus próprios quintais, naturalmente
Muitos desenhos animados são respon- asseguram-lhes maior eficiência.
sáveis pela crescente onda de criminalidade. Esses jovens bandidos roubam um

46 O ROSACRUZ · INVERNO 2013


homem ou uma mulher, com a mesma
crueldade e indiferença de um assassino final. nota: Esse artigo, de Jean Berry Kosht, foi publicado
Qual resposta se espera disso? Qual é a originalmente em 1930. O artigo refletia as influências da-
queles tempos, no entanto, a mensagem permanece in-
resposta dos dias de hoje? tacta, clara e importante para a cultura atual da violência.

Os caminhos de um homem são moldados,


Na casa onde ele passa sua juventude.

Há ainda outro ângulo a ser considerado, quando se discute a questão das armas de brinquedo.
Todos os pais consideram essencial que as crianças que estão aprendendo a andar aprendam a
ter medo do fogo, para que nunca peguem fósforos ou mexam no fogão a gás.
Essas lições são então completamente semeadas na pequena mente, tornando-se uma parte
dela à medida que a criança se desenvolve. Quando a criança atinge a idade dos sete ou oito
anos, a mãe não tem maiores preocupações quanto a isso. Mesmo assim, ela passa
uma hora de visita com a vizinha. Até agora, as crianças não são ensinadas a ter
respeito. Se qualquer tipo de arma, como um revólver carregado, for deixado por
negligência ao seu alcance, elas a associam simplesmente a outro brinquedo e as
tomam, sem ter nenhuma noção de perigo.
Alguém entra na sala nesse momento, talvez alguém de sua família ou um
amiguinho, e com um divertido riso inocente, o jovem visa alguém. Rápido como um
lampejo, dispara o gatilho com o dedo. “Bang! Você está morto!” Um forte estrondo e
uma vida paga o preço da ignorância.
Essa não é uma rara ocorrência. Não seria um crime contra a criança,
levar consigo essa imagem chocante, ao longo de toda a sua vida,
permanecendo no álbum de sua memória para sempre, e sem ser a
responsável por isso?

Os caminhos de um homem são moldados,


Na casa onde ele passa sua juventude

Que comportamento estamos construindo


em nossos adolescentes? Que futuro estamos
construindo para nós mesmos? Um futuro
de orgulho e prazer ou de angústias e de
arrependimentos?
Não seria uma maravilho-
sa mudança se pudésse-
mos, através da própria OS.C
OM

OT
legislação, cancelar e ©
PH

proibir para sempre a


fabricação de armas de
brinquedo?
Isso poderia ser feito antes
que os bebês de hoje se tornassem os homens do amanhã. 4

INVERNO 2013 · O ROSACRUZ


47
n AUTOCONHECIMENTO

FÓrUM rOsaCrUZ*

Q
uantos de nós podemos afirmar
que não temos inimigos, reais ou
imaginários? Mais simplesmente,
quantos presumem que não têm
qualquer inimizade e estão perfeitamente em
paz com o mundo?
Um dia, num estado mental bastante negati-
vo, o leitor pode ter encontrado um conhecido,
talvez um amigo. Ele estava em seu costumeiro
estado mental e caçoou um pouco ou o cen-
surou, justificadamente ou não. Qualquer que
tenha sido o caso, o leitor deu vazão ao seu
orgulho e ficou zangado; desde então, sente que
tem um inimigo. Teria sido muito mais simples

.C OM
TOS
HO
©P

48 O ROSACRUZ · INVERNO 2013



receber, compreensivamente, aquilo que o
outro, sem dúvida, tinha razão para lhe dizer. nunca se
Esqueça um instante quem é e supo-
entregue a um

© PHOTOS.COM
nha, nesse momento, que é a outra pessoa.
Imagine os motivos que ela pode ter tido.
Faça um esforço, por exemplo, para compre-
momento de mau
ender a razão de sua censura. Ela o censu- humor. exerça uma
rou, mas o leitor podia ter esclarecido tudo
em poucas palavras e se afastado sem se vibrante força de
atormentar. Ao invés disto, que fez? Cortou
os laços de amizade, ou talvez, meramente tranquilidade e
sociais que os unia, ferindo-se tanto quanto irradie bondade e


feriu a outra pessoa. Passou, então, a sentir-se
torturado por seus próprios pensamentos e compreensão…
a tentar culpar o outro pelos fatos que con-
cebeu em sua própria mente. Que inferno
passou a ser a sua vida interior! temente pratica os experimentos recomen-
O tempo passará e anestesiará seu so- dados. Essa força é boa, positiva, vitalizante e
frimento mental, porém sempre se sentirá geradora de paz. Deixe que ela se irradie por
perturbado quando aquele pensamento vier à seu intermédio.
sua mente. Por quê? Porque em certa ocasião, É tão simples recolher-se ao próprio
por alguns momentos, foi incapaz de se do- âmago por alguns segundos e recorrer a essa
minar; porque, por alguns segundos, imagi- fonte infinita! Adquirindo o hábito de fazê-
nou ver pensamentos e intenções numa outra -lo, falaremos menos, e isto já é bom, pois
pessoa quando na realidade os trazia em seu teremos evitado umas poucas palavras que
próprio âmago. Uma pequena causa muitas poderiam ter sido desastrosas. Portanto, nun-
vezes tem efeitos consideráveis. ca se permita ser como um pião, que por al-
Todos nós amamos a paz e desespe- guns momentos não pode parar de girar, tão
radamente a buscamos. Se só se pode logo receba impulso e movimento. Quando
encontrá-la na solidão, então se é culpado sentir que está prestes a perder o autocontro-
de uma fraqueza. Sempre somos demasia- le, em qualquer lugar e a qualquer momento,
damente indulgentes conosco mesmos. É recolha-se rapidamente ao seu âmago e, com
nosso relacionamento com o mundo que toda a convicção de que é capaz, diga mental-
demonstra o nosso autodomínio e é entre mente: PAZ. Comece hoje mesmo e persista.
outras pessoas que a paz assume todo o Assim substituirá maus hábitos por um bom
seu valor e a sua força. hábito e se surpreenderá com os resultados.
Nunca se entregue a um momento de Será, então, o que deve ser: uma centelha do
mau humor. Exerça uma vibrante força de Infinito, agindo para o bem deste mundo,
tranquilidade e irradie bondade e compreen- tanto quanto para o seu próprio bem. 4
são, mesmo em meio a um mar de agitação.
Contudo não se torne passivo. Permaneça
cheio de energia e da força dinâmica que re-
cebe do Cósmico enquanto progride através * Extraído do Fórum Rosacruz (janeiro 1981).
dos estudos Rosacruzes e enquanto diligen-

INVERNO 2013 · O ROSACRUZ


49
n DEPOIMENTO

Por MOaCIr COrreIa, FrC

d
epois de caminhar por muito tem- flexo da grande imperfeição que ainda há em
po ao longo da estrada ora larga minha natureza exterior e grosseira.
ora estreita da minha vida, que a Esta conscientização fez com que a hu-
cada minuto está sendo construí- mildade se instalasse no meu coração e
da por meus pensamentos, palavras e ações, criasse profundas raízes por todo meu ser.
eis que em dado momento da cami- Quando levantei para prosseguir
nhada quando dei uma parada meu caminho, não sei de onde
para descansar, surgiu ao surgiu bem na minha frente
meu lado direito uma fon- um ancião. Imediatamente
te de água transparente, notei que a sua estatura
límpida e cristalina e, ao e fisionomia tinham
meu lado esquerdo, um muito a ver com a minha
© PHOTOS.COM

lago de água turva, tene- e a sua voz, apesar de


brosa e pútrida. calma, mansa e suave,
Aí então percebi que era autoritária.
a fonte não poderia estar Mesmo consciente da
noutro lugar senão ali mes- minha total lucidez, quase
mo e que a sua finalidade não fui persuadido pela minha
era outra senão a de ser o exato imaginação a acreditar que esta-
reflexo da minha natureza sutil e va contemplando o sábio ancião que
sensível, que está em ininterrupto processo um dia, em algum ponto da estrada, me tor-
de evolução e que também o lago de águas narei. Mas de repente, com gestos rítmicos e
turvas, tenebrosas e pútridas era o exato re- vigorosos, o ancião fez com que eu voltasse

50 O ROSACRUZ · INVERNO 2013


à realidade. Quando dei por mim, vi que o ainda manchado do meu coração. Eis que ao
misterioso ancião, ao mesmo tempo em que mesmo tempo em que meu coração ia se tor-
fitava meus olhos, agitava freneticamente nando mais puro e transparente, o lago con-
as águas turvas do lago. Eis que a atmosfera taminado também ia sumindo do meu lado
contaminou-se com o repugnante mau chei- esquerdo até desaparecer completamente.
ro que dele se desprendia. Neste momento, o ancião retirou as mãos da
Fiquei entristecido e chocado ao minha cabeça e com o sorriso e o esplendor
PERCEBER, VER e COMPREENDER que, de Deus estampado na face, simplesmente
ao mesmo tempo em que o lago era agitado, desapareceu.
o animal selvagem que há em minha natu- A paz do universo, depois disto, instau-
reza primitiva também era agitado e dele se rou-se em todas as células do meu ser e,
desprendia o mesmo cheiro repugnante e, transpirando amor por todas as partes do
quanto mais o ancião agitava as turvas águas corpo, fui atraído por um cativante perfume
do lago, mais agitada e feroz ficava a fera que de rosas que se desprendia da água da fonte.
em mim estava oculta. Foi então que PERCEBI, VI e COMPRE-
Na angústia desta descoberta, senti as ENDI que eu estava no centro da fonte e que
suaves mãos do ancião pousarem sobre mi- a fonte havia se tornado infinita em suas
nha cabeça. Chorei e as lágrimas que caíam dimensões e que as suas águas eram águas
sobre meu peito desnudo adquiriam poder vivas e que tinham uma transparência e lim-
divino para abrir minha carne e lavar o lado pidez só comparável à transparência e lim-
pidez do corpo dos anjos, superando assim
qualquer coisa existente na Terra.
Depois desta conscientização, examinei
cuidadosa e atentamente o meu reflexo que
surgia com perfeição na água, e com toda
naturalidade e ausência de espanto, constatei
que ao invés de ver o meu rosto, via o rosto
do ancião… CRO-MÂAT! 4


a paz do universo,
depois disto, instaurou-se em


© PHOTOS.COM

todas as células do meu ser.

INVERNO 2013 · O ROSACRUZ


51
n LEITURA COMPLEMENTAR

© WEB

Martin Luther King Jr.

Por CrIstIna MarIa POMPeU PUMar, srC

É
inegável que a linguagem é um ca- A principal função da linguagem é sabi-
racterística do homem. Ele é um damente a comunicação, mas nem sempre
Homo Loquens (homem de lingua- foi assim. Estudos antropológicos mostram
gem) e tal propriedade faz dele um que a palavra, antes de se tornar um meio de
ser totalmente singular. comunicação entre os seres humanos, foi um
É através da linguagem, das classificações meio de expressão. O homem primitivo, ao
que fazemos, dos nomes que damos e dos emitir sons, gritos e exclamações, expressava
signos que “capturamos” o mundo que nos sua dor, seu prazer, sua surpresa, seu ódio
cerca e o mundo subjetivo interior, tomando etc; isto é, as palavras foram inicialmente
de fato posse de ambos. usadas para exprimir um estado emocional.

52 O ROSACRUZ · INVERNO 2013


A linguagem era apenas uma combina- pode ser mais ou menos positiva. O poder
ção de sons, gritos ou interjeições com o fim criativo da linguagem humana pode cons-
de manifestar o estado interior – sentimen- truir ou destruir, embora algumas pessoas
tos/emoções – tais como o medo, a insatisfa- desconheçam os efeitos que suas palavras
ção, a raiva ou, ao contrário, o bem estar, a exercem sobre si mesmos e ao seu redor.
alegria, o prazer etc. De toda sorte, importa termos em mente
Com o passar do tempo, a linguagem do que tudo o que dizemos desencadeia vibra-
ser humano foi aprimorada, permitindo ao ções que contribuem para a harmonia ou,
homem expressar tanto o seu estado emo- ao contrário, geram discórdia. Isto ocorre
cional quanto o mental. Assim, atualmente porque as palavras são carregadas do es-
dispomos de uma linguagem articulada e tado mental e emocional da pessoa que as
particularmente rica para comunicar nossas pronuncia. Baseado nesses fatos, depreende-
emoções aos outros, transmitindo-lhes si- -se que, caso esse estado seja positivo, as
multaneamente nossas ideias. Este é o poder palavras pronunciadas, para além das apa-
de evocação das palavras: elas são a manifes- rências, veiculam vibrações da mesma natu-
tação visível do pensamento invisível; são a reza. Inversamente, se ele for negativo, tam-
forma exterior da realidade interior que nos bém para além das aparências, a influência
ajudam a estabelecer a ordem na comunica- exercida será de natureza negativa.
ção com o outro, com a natureza e com o Eu A melhor evidência disto é que pode se
Interior mais Elevado. perceber se alguém está calmo, preocupado
ou irritado unicamente pelo tom e intensi-
“Assim será minha palavra, que sair de dade de sua voz, pois ela cria na atmosfera
minha boca; não tornará para mim vazia, o ambiente vibratório que traduz, perfeita-
mas fará tudo o que eu quero e produzirá mente, seus pensamentos e emoções. Por
os efeitos para os quais enviei.” exemplo, quando uma pessoa está com raiva,
– (Isaías, 55:11) sua maneira de falar é tal que perturba nega-
tivamente seu ambiente imediato, a ponto de
Dizer que a linguagem humana é dotada
de poder de evocação não é suficiente, pois
ela também tem uma influência criativa
que dá uma dimensão especial às palavras
que pronunciamos. Desde os tempos
mais remotos os místicos atribuem

“ a tradição
um poder criativo às palavras. Para
eles, as palavras correspondem a
formas-pensamento cuja natureza Rosacruz perpetua, em
vibratória exerce uma influência
não somente nas pessoas que as seus ensinamentos, sons
pronunciam, mas também nas vocálicos de natureza


que as ouvem. “A palavra falada
é como uma abelha: tem mel e tem universal.
ferrão”.(do Talmude)
Ou seja, a influência das palavras,
conforme as emoções ou ideias expressas,

INVERNO 2013 · O ROSACRUZ


53
n LEITURA COMPLEMENTAR


… toda a
palavra emitida pela voz
humana, seja ela mística
não, produz efeitos definidos sobre
os seres e as coisas, uma vez que
a palavra é uma combinação de
vibrações que veicula, ao mesmo
tempo, um ou vários sons e um
ou não, produz efeitos estado particular de consciência.
definidos sobre os seres Sabedores de que as palavras
que empregamos, face a seu sen-
e as coisas…
” tido profundo, podem canalizar
energias negativas ou positivas, deve-
mos purificar nossa maneira de pensar
com o único objetivo de dizer coisas úteis
e construtivas. De outro modo, contribuí-
mos para a criação de formas-pensamentos
poder comunicar a outrem seu estado colé- prejudiciais ao bem-estar físico, psíquico e
rico. Inversamente, a experiência prova que espiritual da humanidade.
um indivíduo perfeitamente sereno pode, tão Se nossa busca é de verdadeiro aperfei-
somente falando, transmutar vibrações nega- çoamento, é preciso fazermos tudo para
tivas do ambiente e restaurar a harmonia. dominar nossas palavras, colocando-as a
Um bom exemplo do poder criativo das serviço do poder criativo do pensamento.
palavras é dado pela utilização mística de Desse modo, nossos pensamentos e palavras
certas combinações de sons como os man- serão realmente expressão do Pensamento e
tras hindus, que consistem de combinações da Palavra Divinos.
de entoações vocálicas às quais são atribu-
ídos poderes específicos para influenciar as “Toda palavra exerce uma influência sobre
emoções humanas e estimular os chakras, os outros e por isso, como buscadores, te-
tendo até certo valor terapêutico. Os man- mos o sagrado dever de discipliná-la e usá-
tras se apresentam geralmente na forma de -la no mais amplo sentido de ideais dignos
uma palavra ou expressão provinda de um e nobres que aspiramos para todos.”
texto religioso e têm um sentido preciso; – Charles Vega Parucker
são muito numerosos, baseados antes na
repetição do que na entoação, o que tem por Algumas pessoas têm dificuldade em ser
finalidade favorecer a meditação ou a prece. discretas; dizem, impulsivamente, qualquer
(ex: “OM MANI PADME HUM” – “A Joia coisa que lhes vem à mente, chamando isso
da Flor de Lótus”.) de franqueza, inconscientes da infelicidade
A Tradição Rosacruz perpetua, em seus que provocam. Isso poderia ser evitado se
ensinamentos, sons vocálicos de natureza elas desenvolvessem a capacidade de inverter
universal – ou seja, são encontrados nos mentalmente os papéis, imaginando como
textos sagrados das maiores religiões; cada se sentiriam no lugar da outra pessoa. É
um deles canaliza uma energia vibratória preciso ter tato; a arte de ter tato é a arte de
que produz efeitos físicos, psíquicos e espi- permanecer polido, firme e, não obstante, ser
rituais precisos. sincero diante de uma situação embaraçosa.
Assim, vemos que toda palavra emi- Com um pouco de sensibilidade isto pode
tida pela voz humana, seja ela mística ou ser aprendido em proveito de todos.

54 O ROSACRUZ · INVERNO 2013


Neste sentido, saber escutar é essencial. religiões e sociedades filosóficas. A doutri-
A qualidade da escuta está na medida da na da Palavra Perdida pressupõe que toda
harmonia que se estabelece entre as pessoas Criação foi concebida no Pensamento Divino
que estão em situação de troca de palavras. e depois projetada no espaço ao som do
Escutar permite ir ao encontro do outro e Verbo, tradicionalmente considerado como
respondermos à sua própria necessidade Vibração Primordial. Ou seja, tudo o que
de se comunicar. O querermos “captar”, existe no plano visível e invisível é resultado
mesmo no silêncio e para além da palavra, do poder criativo da Linguagem Divina.
aquilo que ele quer nos dizer e nos fazer Assim, todas as manifestações, coisas,
compreender; o tentarmos apreender os Forças Cósmicas Naturais, leis físicas do
sentimentos que dele emanam; o tentarmos universo etc. devem sua existência às contí-
descobrir em suas palavras uma passagem nuas reverberações da Palavra inicialmente
que nos dê acesso à sua personalidade pro- pronunciada. A natureza vibratória de cada
funda. Tudo isso só é possível se quisermos coisa enquadra-se desse modo numa gigan-
verdadeiramente escutar o outro para nos tesca escala ou teclado. Cada coisa tem uma
aproximarmos dele, sem procurarmos jul- relação com uma nota ou combinação de
gar. Quando conseguimos isso, estamos notas que é parte da palavra.
perto dele; não daquele que conhecemos Uma das mais remotas referências à pa-
objetivamente, mas de uma personalidade lavra data de 4000 a.C., no Antigo Egito. O
que está procurando se expressar e que pre- Deus Ptah encabeçava o Panteão dos deuses
cisa de nós para fazê-lo. menores e era o protetor dos artesãos e dos
Se soubermos escutar um ser humano artistas. Na concepção metafísica, Ptah era o
com respeito e atenção, saberemos escutar artífice – o criador do universo: por meio do
tudo; a Natureza, o Universo ou o Deus
de nosso coração, pois, como dizia Anne
Phillippe, em palavras simples e belas:
“Essenciais podem ser, em certos dias
ou em certas horas, uma voz,
um olhar, uma palavra dita
ou calada, uma nuvem que
passa, a contemplação de
um caracol ou de uma
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folha, um poema, uma


música, precisamente
porque naquele dia
ou naquela hora, uma
secreta coincidência nasce
entre essas coisas simples
e efêmeras e aquilo que
sabemos que é essencial mas
que não se deixa nomear.”
Não se pode abordar a questão
da linguagem sem se referir à Palavra
Perdida, existente, como arcano, em diversas Malcolm X

INVERNO 2013 · O ROSACRUZ


55
n LEITURA COMPLEMENTAR

pensamento, as ideias de Ptah foram trans- Tradição da Palavra sustentam que em


formadas em uma palavra por ele proferida, determinada época o Homem a conhecia –
de modo que através dessa palavra seu pen- quando vivia na presença de Deus e as Leis
samento foi concretizado, foi realizado. Num Divinas não tinham segredo para ele, pois
texto encontrado em Mênfis, lê-se: ele próprio era um agente das mesmas e as
utilizava com plena consciência.
“Ptah, o Grande, é o Pensamento e a A forma como a Humanidade se
Língua dos deuses e o pensamento é o que tornou despojada de tão grande tesouro,
dá nascimento a toda manifestação… ou perdeu a Palavra, constitui a tradição
e é de Ptah que procede o poder do para qual são oferecidas diversas
Pensamento e da Língua.” explicações por diferentes grupos. Alguns
deles acreditam que o Homem poderá
Os sumérios, por seu turno, conside- se redimir e recuperar a Palavra Perdida
ravam as palavras entidades reais e vivas, ou, pelo menos, certas sílabas da mesma,
dotadas de um poder que refletia um Verbo já que alguns consideram que a Palavra
Divino. A este respeito, a inscrição em um completa é inefável ao homem, o qual
Templo sumério afirma: ainda que chegasse ao conhecimento de
seus componentes, não seria capaz de
“A Palavra que Ele pronunciou do alto pronunciá-la na íntegra.
sacudiu o Céu, e a Palavra que Ele Misticamente, o fato é que o Homem
pronunciou de baixo fez tremer a Terra.” foi criado à imagem e semelhança de Deus,
(2150 a.C.) sendo, por conseguinte, dotado da Palavra
em estado latente, a qual, entretanto, só
Em última análise, a explicação da deve ser recuperada sob o impulso de sua
Palavra Perdida está perfeitamente expressa evolução espiritual, reverência a Deus ou
no Evangelho segundo São João que, talvez, comunhão com o Absoluto.
mais que qualquer outro escrito místico, tra- O exercício do silêncio é o primeiro
duz maravilhosamente essa ideia. Eis o texto compromisso em direção a essa busca. E é a
que todos conhecemos, mas que dada a sua capacidade de receber, na intimidade, a voz
beleza e profundidade merece ser relido: silenciosa que anuncia e detém o mistério.
Certeza de tudo e tudo o que procuramos.
“No princípio era o Verbo, No silêncio a busca do que não foi dito, do
E o Verbo estava com Deus, que não foi desvelado e daquilo que cada
E o Verbo era Deus. um de nós, e somente cada um de nós,
Ele estava no princípio com Deus. pode e deve descobrir no âmago da própria
Tudo foi feito por intermédio Dele, alma. E aí nascerá, no coração cansado de
E sem Ele nada do que foi feito se fez. cada viajante, a verdadeira filha do silêncio:
A Vida estava Nele a Palavra. Aquela Palavra, manifestação
E a Vida era a Luz dos homens. singular da grande Palavra, origem eterna
E a Luz resplandece nas trevas de todo o sempre.
E as trevas não prevaleceram contra ela.”
“Eu não sou digno de que entreis em
Algumas culturas, organizações minha casa, mas dizei uma só palavra e
filosóficas e religiosas que preservam a serei salvo.” 4

56 O ROSACRUZ · INVERNO 2013


AJUDA
ESPIRITUAL
Há uma crença quase universal que afirma que quando a humanidade vive
sua pior necessidade a ajuda espiritual vem de regiões transcendentais. Um
dos testemunhos mais populares dessa crença é atribuído a Sri Krishna
no trecho do grande épico hindu, o Mahabharata, conhecido e apreciado
como Bhagavad Gita:

Quando o Bem cresce fraco,


quando o Mal aumenta seu poder,
eu faço de mim um veículo.
Em todas as eras eu volto
para distribuir o sagrado,
para destruir o pecado dos maus,
para estabelecer a verdadeira bondade.

– S.I.
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