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Resumo
O propósito deste estudo é fornecer ferramentas de diagnóstico que viabilizem o plano de trata-
mento para pacientes com má oclusão de Classe III sem crescimento. Foram relatados dois casos
clínicos de má oclusão de Classe III, nos quais a estratégia de tratamento baseou-se na severidade
apresentada pela má oclusão. O primeiro caso foi tratado por camuflagem ortodôntica com exodon-
tia dos primeiros pré-molares inferiores e o segundo caso foi tratado por associação do tratamento
ortodôntico e cirurgia combinada de avanço maxilar e recuo mandibular. Para as más oclusões de
Classe III com envolvimento dentoalveolar severo, o tratamento cirúrgico é a primeira alternativa a
considerar, mas ao considerar outras variáveis, apenas o tratamento ortodôntico por camuflagem
pode ser a melhor escolha.
Descritores: Classe III, camuflagem ortodôntica, orto-cirúrgico.
Abstract
The purpose of this study was to provide diagnostic tools to enable the treatment plan of Angle Class III
malocclusion in patients with no growth. Two Class III malocclusion cases are reported whose treatment
strategy was based on malocclusion severity. The first case was treated by orthodontic camouflage and
two jaw surgical intervention, and the second case was treated by a combination of orthodontic treat-
ment and two jaw surgical intervention for maxillary advancement and mandibular setback. In Class III
malocclusion cases with severe dentoalveolar involvement, surgical treatment is the first alternative to
consider, but when other variables are taken into account, camouflage orthodontic treatment may be
the best choice.
Descriptors: Class III, orthodontic camouflage, ortho-surgical.
1
Doutorando, Deptº de Ortodontia, Faculdade de Odontologia, Universidade do Estado do Rio de Janeiro.
2
Instrutora Clínica, Departamento de Ortodontia, Faculdade de Odontologia, Universidade do Estado do Rio de Janeiro.
3
Prof. Deptº de Ortodontia, Faculdade de Odontologia, Universidade do Estado do Rio de Janeiro.
1
Figura 1 - Fotos extra e intraorais iniciais do paciente.
do com .018” e .020” aço. Arco de finalização inferiores com a mecânica adotada (Figura 7).
.019”x.026” coordenado. Contenção superior Ao final do tratamento, o paciente apresenta-
com Wraparound e inferior com arco 5 – 5 (.032). va características faciais compatíveis com a defici-
ência de maxila, mas com aspecto estético razoá-
Progresso do tratamento vel e satisfeito com o resultado alcançado.
Montagem de aparelhagem fixa inferior e
arco lingual. Solicitação de extração do 34 e 44.
Orthodontic Science and Practice. 2012; 5(19):333-345. 337
Figura 7 - Superposições dos traçados cefalométricos inicial e final do paciente P.H.A. e medidas cefalométricas.
338 Orthodontic Science and Practice. 2012; 5(19):333-345.
Caso 2: Classe III – tratamento orto-cirúrgico de 2,5 mm, transpasse vertical em relação de topo
História e diagnóstico e um bom alinhamento do arco inferior (Figura 8).
A paciente C.R., do gênero feminino, aos 17 A análise radiográfica evidenciou integridade
anos de idade, procurou tratamento ortodôntico óssea e radicular. A cefalometria mostrou um pa-
por achar o seu queixo muito grande. drão esquelético de Classe III, ANB de -6º, Wits
A face, numa visão frontal, apresentava sime- de -11 mm, com deficiência maxilar e protrusão
tria, tendo a região malar ligeiramente achatada, mandibular, aumento do terço inferior da face e
linha do sorriso mostrando pequena faixa de gen- características dolicocefálicas (Figura 9).
giva, arco do sorriso consonante. Perfil côncavo, Os incisivos superiores apresentavam-se bas-
ângulo nasolabial obtuso e mandíbula protruída tante vestibularizados (1.NA = 41º) e protruídos
(Figura 8). (1-NA = 12 mm), enquanto os inferiores apresen-
Apresentava relação dentária de Classe III de tavam satisfatória inclinação vestibular (1.NB =
Angle, transpasse horizontal negativo -0,5 mm, 25º) e suavemente protruídos (1-NB = 6mm - Fi-
desvio de linha média inferior para o lado direito gura 9).
Figura 9 - Telerradiografia de perfil da paciente C.R. ao início do tratamento, radiografias periapicais dos incisivos superiores e inferiores e radiografias interpro-
ximais iniciais dos lados direito e esquerdo.
Figura 13 - Superposições dos traçados cefalométricos inicial e final da paciente C.R. e medidas cefalométricas.
trole de torque, torna-se essencial para a retração lo combinado cirúrgico ortodôntico, sendo 1475
dos caninos e, subsequentemente, dos incisivos disponíveis com acompanhamento de pelo menos
inferiores. Finalmente, os terceiros molares infe- de 1 anos pós-cirúrgico e 507 pacientes com cinco
riores que estavam em posição mésio angular, fo- anos ou mais de acompanhamento no longo pra-
ram verticalizados e mantidos no arco para ocluí- zo23. Apesar de serem estudos bidimensionais ali-
rem com os segundos molares superiores. cerçados em superposições na linha SN da cefalo-
Por vezes, torna-se necessário o ajuste oclusal metria radiográfica, pode ser considerado o maior
na cúspide lingual dos segundos pré-molares su- projeto de pesquisa financiado continuamente na
periores para evitar contatos prematuros durante história do Instituto Nacional de Pesquisa Dental e
os movimentos excursivos da mandíbula18. Craniofacial (DE-05221, agora em seu 30º ano na
A segunda parte do presente trabalho, refere- Universidade da Carolina do Norte) que permitiu
-se ao relato do caso clínico 2 em que a má oclu- estudos cuidadosos dos resultados de diferentes
são de Classe III foi tratada com um protocolo abordagens cirúrgicas e técnicas ortodônticas24.
combinado orto-cirúrgico devido à grande discre- Dentre as pesquisas oriundas da UNC, Pro-
pância maxilomandibular que comprometia a es- ffit et al.24 (2007) conseguiram propor uma hie-
tética facial da paciente. rarquização da estabilidade e a previsibilidade da
Ao longo das últimas décadas, a cirurgia or- cirurgia ortognática, de acordo com a direção do
tognática tornou-se um procedimento coadju- movimento cirúrgico, tipo de fixação e técnica ci-
vante de rotina no tratamento ortodôntico de rúrgica empregada. Segundo esse trabalho, o pro-
discrepância mandibular, maxilar ou maxiloman- cedimento ortognático mais estável foi o reposi-
dibular11,30. Nesse aspecto, a estabilidade da cirur- cionamento superior da maxila, seguido (de perto)
gia ortognática tem se tornado um campo vasto pelo avanço mandibular em pacientes com a altu-
de pesquisa, especialmente oriundo do banco de ra facial anterior normal ou aumentada (se a altu-
dados do Programa Dentofacial da Universidade ra facial for diminuída pela rotação para cima do
da Carolina do Norte (UNC, do inglês University of mento, a estabilidade tende a ser comprometida).
North Carolina), mais especificamente dos esfor- A combinação do movimento superior da maxila
ços somados dos Departamentos de Ortodontia e com o avanço da mandíbula mostrou-se significa-
Cirurgia Oral e Maxilofacial21,22. tivamente mais estável quando a fixação interna
Para ter uma ideia da importância daquelas rígida foi utilizada na mandíbula. De acordo com
pesquisas, até fevereiro de 2007, a UNC apresenta- os autores, recuo mandibular muitas vezes não foi
va registros de 2264 pacientes com deformidades estável e o movimento para baixo da maxila que
de desenvolvimento (sem anomalias craniofaciais criou a rotação da mandíbula também mostrou-se
ou síndromes) que foram submetidos ao protoco- instável (Figura 14).
paciente, além de ser um procedimento razoavel- 22. Proffit W.R., Phillips C., Turvey T.R. Stability after surgical-
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