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O Grande Oriente Médio

De Paulo G. Fagundes Visentini

Parte I: A Dimensão Histórica e Estratégica


Capítulo 1
A Descolonização e suas Fraturas Políticas

1.1 – Descolonização e Formação dos Estados do Grande Oriente Médio


Bases Históricas, Geográficas e Socioculturais
O que define o Grande Oriente Médio não é a religião, pois a região geopolítica é definida de fora para dentro
(como área de conexão geográfica), com Estados que fizeram parte das últimas três grandes civilizações
muçulmanas (o Império Turco Otomano, o Persa e a Índia Mogul), além dos Canatos Mongóis e, depois, do
Império Russo. A região possui um vácuo de poder, é rica em petróleo e gás, mas sem desenvolvimento
industrial nem uma potência hegemônica. São 600 milhões de pessoas, englobando 31 Estados, treze dos quais
não árabes, mas com população muito superior a estes e muito mais poderosos.
Três processos marcaram a formação do atual sistema de Estados da região: a evolução histórico-cultural
de longa duração, o processo de desenvolvimento colonial e pós-colonial e a desintegração da União das
Repúblicas Soviéticas (URSS). Na maioria dos Estados da região há uma débil e/ou fragmentada industrialização
e modernização, e uma incapacidade de estabelecer uma democracia sustentada com base numa sociedade
civil coerente e consistente, o que gerou uma “crônica crise de desenvolvimento” nas décadas finais do século
XX.
O Oriente Médio é a região de confluência de três continentes (Europa, Ásia e África), berço das primeiras
civilizações (Egito, Suméria e Babilônia) e das religiões monoteístas (o Cristianismo, o Judaísmo e o Islamismo).
Entre os dois primeiros houve sempre uma disputa pela “verdadeira fé”.
A religião islâmica surgiu no século VII, no interior da Península Arábica, com a revelação divina a Maomé
(transformado em seu profeta), unificando as tribos nômades do deserto, que viviam à margem das lutas entre
os impérios do litoral. Em 622 ocorreu a Hégira, ou revelação da fé ao profeta Maomé. Este espalhou a nova
religião, que em 10 anos unificou a península, e iniciou a expansão para o Norte da África, em direção à Ásia
central.
Situando-se entre as grandes civilizações, o islã absorveu e reelaborou elementos da antiga civilização greco-
romana e dos vizinhos cristãos europeus, africanos, persas, hindus e chineses. Durante a Idade Média, enquanto
a Europa cristã era bastante atrasada, o Oriente Médio era próspero, como constataram os cruzados.
No século XV, o Oriente Médio foi dominado pelos turcos, oriundos da Ásia Central, responsáveis pelo
estabelecimento de uma dominação feudal-militar que empobreceu a região.

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Na segunda metade do século XIX, com a decadente Turquia transformando-se no “Homem doente da
Europa”, a cobiça das ascendentes potências europeias em industrialização voltou-se para essa região de
notável importância geopolítica. Os franceses se apresentaram como “protetores” das minorias cristãs, e os
ingleses, das minorias judaicas, acirrando as tensões locais e produzindo situações em que as minorias
etnorreligiosas tornavam-se protagonistas da política internacional.

O Imperialismo europeu e o desmembramento do Império Turco Otomano


A região do Oriente Médio era extremamente importante para os planos do imperialismo inglês do século
XIX, tanto por sua posição geopolítica como pelas jazidas de petróleo existentes. Preocupados com a futura
divisão do Império Turco Otomano e com os custos da guerra vindoura, os ingleses, que já ocupavam o Egito,
dominam as periferias da Península Arábica (Aden, Hadramauth, ou Iêmen do Sul, Omã, Costa dos Piratas, os
atuais Emirados Árabes Unidos e os protetorados de Catar, Bahrein e Kuwait). Com a eclosão da Primeira Guerra
Mundial, a Turquia aliou-se à Alemanha. A Inglaterra falhou em ocupar o Iraque, os estreitos turcos e a
Palestina, procurando, então, uma aliança com os árabes, que habitavam os desertos nunca conquistados na
retaguarda turca.
Além dos aspectos militares da aliança, os britânicos buscavam a colaboração política com os elementos
mais conservadores da sociedade árabe, temendo o nascente nacionalismo deste povo. Em junho de 1916, o
Xerife Hussein lançou a revolta árabe no Hedjaz, contra a Sublime Porta (Constantinopla), e conquistou a cidade
de Meca dos turcos. Ao mesmo tempo, porém, Londres e Paris assinavam secretamente os acordos Sykes-Picot,
preparando para depois da guerra a repartição do Crescente Fértil entre ingleses e franceses. Os árabes não
sabiam disso, pois esperavam criar uma grande nação, cujo centro seria justamente o Crescente Fértil, sendo a
península um apêndice.
Quando a guerra terminou, com a derrota e desmembramento da Turquia, esta política colonial radicalizou
um nacionalismo árabe frustrado, responsável por vários levantes contra estas potências. Embora os levantes
tenham sido sufocados em sua maioria, nem tudo saiu de acordo com os planos de Londres.
No tocante à Pérsia, os ingleses, presentes na vizinha Índia e temerosos dos russos, sempre buscaram
enfraquecer o governo central persa dos Qajars, que eram pró-russos, mas que também buscavam, quando
necessário, o apoio Ocidental para controlar sua população. Tanto Ataturk, da Turquia, como Reza Shah, da
Pérsia, basearam suas política no nacionalismo étnico enraizado no passado, como forma de legitimação.
A Arábia Saudita foi o primeiro território da região a aliar-se aos Estados Unidos, permitindo a instalação de
empresas petrolíferas americanas em seu território, organizadas no conglomerado da Arabian-American
Company (Aramco). Esta era a rival da empresa anglo-holandesa Shell. Ao lado do nacionalismo anticolonial, o
Oriente Médio se caracterizava também por um antagonismo anglo-americano motivado pelo controle do
petróleo da região. Posteriormente, os interesses petrolíferos ocidentais tiveram de enfrentar em conjunto o
nacionalismo árabe.

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Da Primeira à Segunda Guerra Mundial
No período que se seguiu à Primeira Guerra Mundial, a questão judaica adquiriu maior importância,
repercutindo decisivamente sobre a região. Desde fins do século XVIII, no contexto da Revolução Francesa, os
judeus começaram a conquistar igualdade política na Europa Ocidental. Na segunda metade do século XIX,
entretanto, com o advento da questão nacional na Europa Oriental, passaram a ser perseguidos, sofrendo
Pogroms (massacres) na Rússia Czarista.
A reação judaica aos Pogroms de 1881 e 1882 foi a elaboração de seu próprio nacionalismo, o sionismo.
Desde 1882, a Chowewe Zion (simpatizantes de Sion) propunha a colonização da palestina pelos judeus. Na
Palestina, a Agência Judaica comprava terras para a colonização, geralmente adquirindo-as de proprietários
absenteístas, que viviam em Beirute e outros lugares, levando os camponeses a abandonarem suas terras. Nelas
eram implatados os Kibbutz, fazendas coletivas inspiradas em um ideal socialista de retorno à terra, mas que
constituíam também áreas militarmente fortificadas, com objetivos estratégicos. Com a ascensão do nazismo
na Alemanha, o afluxo de imigrantes judeus aumentou enormemente, o que gerou tensões com os árabes,
contribuindo para o grande levante palestino de 1936-39. Estes, sem uma liderança que os representasse e
sujeitos à posição ambígua das autoridades britânicas, acabaram derrotados.

1.2 – O estabelecimento do Estado de Israel e a questão palestina


O Mandato Britânico da Palestina e a Imigração Judaica
Desde o início do século XX, a hostilidade entre os árabes da Palestina e os judeus que chegavam à região
se manifestava de forma progressiva, seja pela exclusão dos árabes no trabalho e nas atividades organizadas
pelos judeus, seja devido ao desequilíbrio demográfico criado pelo aumento acelerado da população judia na
região. A situação delicada da Palestina se agravou ainda mais em decorrência de negociações e de acordos
contraditórios, que, desde 1915, tornaram-se o marco de divergências entre árabes e judeus. Entre os
principais, podemos citar o Acordo de Sykes-Picot – que colocava a Palestina sob controle internacional, sendo
que na Conferência de San Remo, em 1920, se decidiria pelo Mandato Britânico – e a Declaração Balfour, de
1917, na qual a Grâ-Bretanha se comprometia com o estabelecimento, na Palestina, de um lar nacional para o
povo judeu.
Três forças atuaram sobre a questão palestina: a Grã-Bretanha, que exercia o Mandato na região e que, já
em 1937, reconheceu a necessidade de partilha da Palestina entre um Estado judeu e outro árabe; os judeus
sionistas, que passaram a criar instituições próprias, constituindo quase um Estado, a partir da Organização
Sionista Mundial, da Agência Judaica, do Conselho Nacional Judeu e da Confederação Geral do Trabalho Judeu;
e os árabes, que, já por sua vez, passaram a ser representados pelo Conselho Supremo Muçulmano e pelo
Partido Palestino Árabe Nacional.
A Segunda Guerra Mundial e a perseguição de Hitler aos judeus europeus (os asquenazim) só fizeram por
aumentar a entrada destes na Palestina; em especial, clandestinidade. Neste momento, o movimento sionista
passou a priorizar fortemente a constituição de um Estado judeu na Palestina, que foi acelerada pela pressão

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psicológica do genocídio dos judeus na Europa (o Holocausto, que produziu milhões de vítimas), dando um
caráter de urgência à questão.
No contexto da ascensão de novos países à independência, da fermentação de um nacionalismo com
aspiração à unidade árabe e da fragilidade da presença inglesa, foi constituída no Cairo, em março de 1945, a
Liga dos Estados Árabes. Seus Estados-membros fundadores foram Egito, Iraque, Síria, Líbano, Transjordânia,
Arábia Saudita e Iêmen. A Liga fornecia um quadro para a articulação das elites arábicas conservadoras,
mantendo vínculos com a Inglaterra, como forma de administrar os problemas surgidos no pós-guerra.
Não podendo deter a imigração judaica clandestina, Londres encaminhou à ONU a questão palestina, em
1947. As Nações Unidas elaboraram, então, um plano de partilha, pelo qual o território passaria a abarcar um
Estado judeu e outro árabe-palestino, enquanto cresciam os atos de terrorismo de ambas as partes.

O fracasso da ONU e a Guerra de Independência


No dia 29 de novembro de 1947, o Plano de Partilha da Palestina foi à votação na sessão das Nações Unidas,
com o resultado de 33 votos a favor (entre eles, Estados Unidos e URSS, os países da Europa, América e
Oceania), 13 votos contra (os países do Oriente Médio e a Ásia) e 10 abstenções (entre elas, Grã-Bretanha). Foi
decidido pelo fim do Mandato Britânico e instauração da partilha da Palestina, pela qual o território passaria a
abarcar um Estado judeu e outro árabe-palestino.
O resultado da votação logo suscitou diferentes reações: enquanto os judeus, embora preocupados,
aceitaram o plano da ONU apresentado por Osvaldo Aranha, os árabes se mostraram extremamente contrários
à decisão, dispostos a se oporem, com todos os recursos, à criação do Estado de Israel.
Em 1948, o mediador da ONU, Conde Bernadotte, é assassinado em Jerusalém por sionistas. Os britânicos
boicotam o plano da ONU e se retiram da região, deixando um vazio de total de poder. Com o encerramento,
de fato, do Mandato britânico na Palestina, os judeus proclamaram o Estado de Israel (14 de maio), e as forças
da Liga Árabe entraram em guerra contra a nova nação no dia seguinte (isto é, intervieram na guerra civil que
já existia na Palestina). Apesar de menos numerosas, as forças judaicas eram mais bem equipadas, treinadas e
motivadas, contando com a participação de pilotos treinados nas forças aéreas aliadas da II Guerra Mundial,
ao passo que os árabes manifestavam complexas divisões internas, e alguns países, como o Líbano, apenas
simularam haver atacado Israel.
Os palestinos, que não fundaram seu Estado, proposto pela ONU, acabaram por migrar para países árabes
vizinhos, constituindo uma problemática massa de refugiados. Em 1950, a Jordânia anexou o território residual,
ainda em mãos palestinas (a atual Cisjordânia), enquanto que o Egito anexou a faixa de Gaza, que abrigava
enorme contingente de refugiados.
Ben Gurion, chefe de governo do Estado de Israel, proclamado em Tel Aviv, fez um chamamento aos judeus
do mundo inteiro para se juntarem à estruturação e ao desenvolvimento do novo país. Tanto Estados Unidos
quanto a URSS e muitos outros países reconheceram imediatamente o Estado de Israel.

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Logo após sua inteira institucionalização, o Estado de Israel definiu seu sistema político através de eleições
para a Assembleia Constituinte e Legislativa. De 1948 a 1951, aproximadamente 650 mil novos imigrantes
(quase 2 milhões até 1956) se estabeleceram em Israel, especialmente devido à chegada dos refugiados
europeus (os judeus asquenazim), e dos sefaraditas (os judeus oriundos dos países árabes). Este êxodo permitiu
a Israel uma troca de populações; os imigrantes judeus compensavam os refugiados árabes.

A Questão Palestina e os Refugiados


A questão dos refugiados se agravou cada vez mais, visto que eram proibidos de voltar a suas terras em Israel
e que não se integravam aos países árabes (com exceção da Jordânia), alimentando uma crescente esperança
de restauração nacional.
Os palestinos começam a se organizar em grupos especificamente palestinos, dentre os quais merece
destaque a al-Fatah, que surge entre os anos de 1956 e 1959. De perfil anti-imperialista e antissionista, a
organização liderada por Yasser Arafat visava criar um Estado palestino laico e democrático, como condição
preliminar à realização da unidade árabe através da luta armada. Em janeiro de 1964, em Jerusalém (oriental),
o Conselho Nacional Palestino reuniu-se pela primeira vez, fundando a Organização para a Libertação da
Palestina (OLP), que defendia a criação de um Estado palestino.
Além de estar vinculada ao problema do controle do petróleo, a criação do Estado de Israel foi percebida
pelos países árabes como uma espécie de enclave ou colônia ocidental, por meio da qual novos interesses
imperialistas estariam penetrando na região. Essa percepção foi agravada pela amplitude da derrota sofrida
perante Israel, atribuída às corruptas e incompetentes elites árabes conservadoras. As divisões sociais e
políticas do mundo árabe, seu nacionalismo emergente, o ressentimento pelas derrotas humilhantes e o
renascimento do Islã conferiam ao problema contornos ainda mais complexos.

1.3 – As tensões inter-árabes: Revolução versus conservadorismo


As revoluções, os regimes modernizadores e a guerra de 1956
Até a segunda metade da década de 1940, o nacionalismo árabe não passava de uma concepção
fragmentada, em que cada nação defendia seu próprio projeto nacional. Depois de 1952 e com a vergonhosa
derrota árabe na guerra contra Israel, em 1948-49, inicia-se uma nova fase na região do Oriente Médio. As
independências progressivas de outros países e a eclosão de revoluções de caráter populista e anti-imperialista
– e até socialista -, em alguns países árabes independentes, criaram uma nova tendência e clivagem na região.
No Magreb, o nacionalismo árabe era o fator político que se tornara o mais importante. Levantes anti-
britânicos no Egito sempre questionaram a presença semicolonial inglesa em um país formalmente
independente, até que, em 1952, um golpe militar de jovens oficiais derrubou o corrupto Rei Faruk. Na esteira
deste movimento, o país tornou-se uma República, logo liderada pelo oficial nacionalista Gamal Adbel Nasser.

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Manifestações e levantes anticoloniais também ocorreram na Tunísia, na Argélia e no Marrocos, colônias
francesas. Tunísia e Marrocos tornaram independentes em 1956, mas na Argélia, onde havia expressiva
colonização francesa, a metrópole resistiu à descolonização.
A descoberta de petróleo no Saara argelino reforçou a determinação francesa, cuja linha dura, representada
pelo General Salan e pelos colonos, criou a Organização do Exército Secreto (OAS), que chegou a tentar um
golpe de Estado contra De Gaulle como forma de evitar concessões aos árabes. A França não suportou o
desgaste da guerra e concedeu, em 1962, a independência à Argélia, de onde os colonos brancos retiraram-se.
A revolução argelina teve enorme impacto no Oriente Médio, e depois de 1962 a Argélia, rica em petróleo,
passou a ser um importante protagonista na região.
Durante a Guerra da Argélia, eclodiu a crise de Suez. Após direcionar a política externa egípcia para o
neutralismo, Nasser viu os Estados Unidos retirarem a oferta de financiamento à barragem de Assuã.
Necessitando de recursos para o desenvolvimento econômico e para as reformas sociais que prometera ao
miserável povo egípcio, Nasser nacionalizou o canal de Suez em julho de 1956. Em novembro, tropas francesas,
inglesas e israelenses atacaram a zona do canal e a Península do Sinai. O velho colonialismo franco-britânico
fazia um último esforço para recuperar suas posições no Oriente Médio. Quanto a Israel, tentava tirar proveito
da situação.
Os atacantes derrotaram facilmente o exército egípcio, mas os soviéticos lançaram um ultimato, exigindo a
retirada das forças invasoras e ameaçando intervir militarmente. Em uma tentativa de não serem ultrapassados
pelos acontecimentos, os EUA também pressionaram seus aliados a evacuar o Egito, o que ocorreu em
dezembro. Assim, Nasser conseguiu transformar uma derrota militar em triunfo político, consolidando seu
nome como a maior liderança do mundo árabe, estimulando sua ideia de unificação das nações árabes.
Enquanto aproximava-se ainda mais do mundo socialista e do movimento neutralista, o prestígio de Nasser
afirmava-se junto ao movimento de descolonização e do Terceiro Mundo, do qual já era um protagonista
reconhecido desde a Conferência de Bandung (1955).
Todavia, o nasserismo, que já concorria com o comunismo (forte no Egito, Sudão, Iraque, Síria, Líbano, Irã e
também presente na Argélia, Marrocos e Turquia) começava a sofrer a concorrência do Partido Baas (Partido
do Renascimento Árabe).
Gradativamente, o Baas passou a suplantar o nasserismo como alternativa mais consistente, tanto em
termos ideológicos como programáticos. A referência socialista desse partido não possuía uma conotação
marxista, consistindo essencialmente numa estratégia de modernização e desenvolvimento socioeconômico,
além de representar um elemento de legitimação e busca de apoio econômico e militar do Campo Soviético.
A longo prazo, ambos os movimentos transformaram-se em regimes militares autoritários (embora ainda
laicos e modernizadores), apoiados na classe média e nas emergentes burguesias nacionais, distanciando-se
progressivamente de suas formas políticas originais.

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As desventuras do esquerdismo do regime baasista sírio levaram, em fins dos anos 1970, ao poder o General
Hafez al-Hassad (do próprio Baas), que imprimiu uma linha mais pragmática e menos ideológica. No entanto, a
Síria não contava com recursos petrolíferos, fato que fez do seu desenvolvimento um processo lento.
Em 1958, um levante popular, acompanhado por um golpe de Estado liderado pelo General Kassen,
derrubou a monarquia iraquiana (a família Real e o Primeiro-Ministro foram linchados nas ruas), implantando
um regime republicano, que rompeu com o Pacto de Bagdá.
Em 1969 ocorreu, na Líbia, um golpe liderado pelo Coronel Muammar Al-Kadafi, que era um “nasserista
tardio”, pois esta corrente estava agonizando quando ele chegou ao poder. Embora de reduzida população, a
Líbia contava com recursos financeiros abundantes, oriundos do petróleo, para sustentar sua política exterior
(que apoiava firmemente o campo árabe progressista) e suas reformas sociais, fazendo do controvertido Kadafi
uma preocupação para Estados Unidos, Israel e petromonarquias, pois o islã de Kadafi concorria com a versão
conservadora saudita.
No mesmo ano, a esquerda marxista chegava ao poder no Iêmen do Sul – tornado independente da
Inglaterra em 1967 -, controlando o estratégico Porto de Aden, que dominava a entrada do Mar Vermelho.

O Pan-Arabismo e os Conflitos inter-árabes


Inicialmente, o nasserismo e, posteriormente, o Baas criavam regimes republicanos reformistas, que
entravam em conflito não apenas com Israel e com as potências ocidentais, mas principalmente com as
monarquias conservadoras e com as estruturas feudais vigentes no mundo árabe. Assim, depois dos golpes
revolucionários no Egito e na Síria, foi criado, em 1955, o Pacto de Bagdá, reunindo os governos conservadores
de Turquia, Iraque, Irã, Paquistão e Grã-Bretanha, visando conter a influência dessas revoluções.
De fato, ocorria que, lentamente, os regimes revolucionários, inicialmente pan-árabes, iam gradualmente
se nacionalizando sob a estabilidade de regimes militares.
Em 1962, oficiais nasseristas derrubaram a retrógrada monarquia do Iêmen (do Norte), que no ano anterior
rompera com a União Federal, antes mantida com o Egito. O Iêmen era um país pobre e não possuía petróleo,
mas lá se desenvolveu um nacionalismo nasserista de caráter anti-imperialista, que perdura até hoje.

Os Regimes Monárquicos, Conservadores e Pró-Ocidentais


Os quase cinco séculos em que o Oriente Médio esteve submetido ao domínio turco e, posteriormente,
europeu, legaram um grande atraso socioeconômico à região e reforçaram estruturas políticas pré-modernas.
Sobre essas sociedades, bruscamente se afirmaram os interesses geopolíticos e petrolíferos das potências
ocidentais. Estas buscaram aliados locais para, por intermédio deles, afirmar seu poder. A autoridade dessas
elites árabes se exerceu por meio de regimes conservadores e autoritários, geralmente buscando legitimar-se
através do Islã, o que servia de camuflagem à sua colaboração econômica e político-militar com os “infiéis” do
Ocidente e lhes fornecia um poderoso instrumento contra o reformismo modernizante.

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O principal núcleo de regimes conservadores foi a Península Arábica. Na Arábia Saudita – um país imenso
territorialmente, porém escassamente povoado -, a dinastia Saud (oriunda do deserto) reinava apoiando-se no
Wahabismo, a primeira seita fundamentalista do Islã (século XVIII). As bases do regime foram estabelecidas
antes do ciclo do petróleo, e este desenvolveu um nacionalismo de oposição à penetração europeia na região,
o qual evitou que o país sucumbisse ao colonialismo. Estabeleceram, então, uma aliança política com os Estados
Unidos (que não eram “colonialistas”) e assinaram um acordo com a companhia americana Standard Oil para
vender seu petróleo.
A monarquia saudita baseava-se em um islã asceta, opunha-se frontalmente ao nasserismo “ateu”, ao
sionismo e ao comunismo (postura militantemente anti-URSS) e, sempre que possível, procurava controlar as
demais petromonarquias do Golfo Árabe (governadas por famílias rivais), como o Kuwait, a Ilha-Estado de
Bahrein, a Península do Catar, os Emirados Árabes Unidos (ex-Costa dos Piratas) e Omã – todos protetorados
ou aliados dos ingleses.
Todos os países mencionados eram verdadeiras propriedades familiares, sem grande distinção entre o
patrimônio público e privado, e nelas se realizava uma modernização superficial, sem mudanças sociais.
Qualquer noção de democracia era rejeitada, e maior parte da sociedade era mantida na ignorância e na
pobreza, apesar dos xeques e sultões despenderem boa parte do tempo e dinheiro nos cassinos europeus.

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Capítulo 2
A Guerra Fria Tardia no Oriente Médio

2.1 – As Guerras de 1967, 1973 e a “paz de Camp David


A Guerra dos Seis Dias e o declínio do nasserismo
Nas décadas de 1960 e 1970, os conflitos do Oriente Médio agravaram-se e adquiriram uma nova dimensão.
Em decorrência da guerra civil no Iêmen, e da iminência da retirada britânica de Aden (criando um vazio no Mar
Vermelho, que poderia ser preenchido pelo nacionalismo árabe), o nasserismo passa a sofrer fortes pressões
externas, que se somaram a tensões internas do regime e ao atolamento de suas tropas na guerra civil do Iêmen
do Norte. Israel sentia-se militar e economicamente forte, mas necessitava e desejava a guerra, antes que a
correlação de forças pudesse se alterar a favor dos árabes. Era preciso, acima de tudo, destruir o nasserismo e
a capacidade ofensiva do Egito.
Por outro lado, Nasser sente que está sendo ultrapassado pelo baasismo, na liderança do mundo árabe,
devido à combatividade do mesmo contra Israel e ao seu crescente apelo junto à população. Neste contexto,
Nasser provoca uma crise com a interdição do Golfo de Ákaba aos navios israelenses, em maio de 1967, e com
o pedido de saída das forças da ONU da fronteira. Duas semanas depois, em junho, ocorre a Guerra dos Seis

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Dias, na qual Israel ataca, de surpresa, o Egito, a Síria e a Jordânia. A invasão do primeiro é feita pelo Norte da
Península do Sinai, e o Exército egípcio, sem reforço aéreo, combate em desvantagem.
Para Israel, a Guerra dos Seis Dias foi um sucesso militar em virtude de que o país anexou vários territórios
estratégicos para sua segurança: ao Sul, a Península do Sinai; ao Leste, a Cisjordânia; a o Norte, as Colinas de
Golã.
Os judeus sefaraditas, que viviam nos países árabes, por sua vez, imigraram maciçamente para Israel,
aprofundando a separação do país em relação à região, enquanto os países socialistas rompiam relações
diplomáticas com Tel Aviv. O resultado mais contundente, no entanto, foi que a superioridade israelense na
região passou a ser insuperável.
Para os egípcios, a Guerra de 1967 constituiu um duro golpe no nasserismo, que inicia seu declínio interno
e externo, com a perda de prestígio no mundo árabe. A guerra de 1967 proporcionou a Israel o aumento
territorial, mas, na verdade, Tel Aviv pretendia barganhar a devolução parcial dos territórios conquistados em
troca do reconhecimento diplomático por parte do mundo árabe. Os países árabes, reunidos na Conferência da
Cúpula da Liga Árabe, em Cartum, rechaçaram um acordo de paz com Israel, segundo a ambígua fórmula “sim
ao Ocidente, não a Israel”.
Ainda em decorrência da Guerra dos Seis Dias, pode ser apontada a maior autonomia das organizações
palestinas frente aos governos árabes. A al-Fatah, por exemplo – que só era reconhecida pela Argélia e pela
Síria -, teve suas bases ampliadas. Em 1969, o presidente da al-Fatah, Yasser Arafat, chega à presidência da OLP,
onde os membros da Fatah já eram maioria. Em 1970, durante a Conferência de Rabat, os países árabes
reconheceram o direito dos palestinos de criar um Estado Nacional e a OLP como sendo a única e legítima
representante do povo palestino.
A resistência palestina cresceu em número e em organização, principalmente na Jordânia, radicalizando-se
no plano sociopolítico. Tal cenário começa a preocupar o Rei Hussein, que se sente ameaçado pela ascensão de
um poder paralelo ao seu. Em setembro de 1970, envia o Exército Real (composto essencialmente por beduínos)
para atacar os campos de refugiados, com objetivo eliminar os fedayns (guerrilheiros palestinos). O Setembro
Negro, como ficou conhecido, foi uma carnificina, com mais de dez mil mortos.
Os palestinos então foram expulsos da Jordânia e se retiraram para o Líbano, principalmente para a região
Sul do país, alterando o precário equilíbrio político e étnico-religioso desse território, ao introduzir uma força
muçulmana e/ou esquerdista no no complicado tabuleiro de xadrez que era a política libanesa. O país,
conhecido como “a Suíça do Oriente Médio”, será praticamente destruído no anos 1980.

A ascensão dos Árabes conservadores e a Guerra do Yom Kippur


Com a morte de Nasser, em 1970, Anwar Sadat assume o poder no Egito, promovendo uma inflexão
conservadora. Ele está desesperado o país se encontra frente a uma grave crise econômico-social, e a situação
política é difícil após o desaparecimento do carismático Nasser. Ele tenta atrair a atenção dos EUA, pois acredita

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que somente seu apoio econômico, especialmente o financeiro, pode recuperar a economia do país, e que
apenas a pressão americana pode obrigar Israel a ceder, devolvendo os territórios ocupados.
Para recuperar estes territórios, é necessário sacudir o Ocidente; para sacudir o Ocidente insensível ao drama
da elite política árabe, é necessário criar uma atmosfera de crise, uma dramatização, e para isso são necessárias
hostilidades militares, as quais implicam evidentemente a ação da União Soviética, maravilhoso lenço vermelho
que despertará, enfim, a agressividade do touro americano.
A esquerda, por sua vez, vive seu Termidor, pois não é apenas a URSS que perde terreno no Oriente Médio,
com o afastamento do Egito, mas sim a própria ideia de revolução , devido à crescente inflexão dos regimes
militares em direção à defesa de interesses nacionais. Os regimes esquerdistas permanecem apenas na
periferia, em países como o Iêmen do Sul e a Líbia.
Além desse isolamento, o esquerdismo mundial (guevarismo, revolução vietnamita, maio de 1968) passa a
se refletir no Oriente Médio. Sem o vínculo com os regimes no poder, as organizações revolucionárias perdem
o contato com as bases populares.
A guerra de outubro de 1973 foi impulsionada indiretamente pela postura americana a favor da
intransigência israelense, desde o início dos anos 1970, com a chegada de Nixon e de seu acessor, Kissinger, ao
poder.
Assim, em 1973, foi a vez do Egito e da Síria atacarem Israel de surpresa. A Guerra do Yom Kipur (Ano Novo
Judaico), foi organizada por Sadar, como forma de recuperar os territórios árabes perdidos na Guerra dos Seis
Dias. Egito e Síria declaram guerra a Israel e, no dia 6 de outubro, lançam-se ao ataque.
Egito e Síria chegam a reconquistar parte de seus antigos territórios (parte da Península do Sinai e as Colinas
de Golã), mas os israelenses lançam sua contraofensiva e conseguem expulsar os invasores, especialmente
devido à amplitude da ponte aérea americana, que envia um volume gigantesco de armamentos (o dobro do
enviado pelos soviéticos aos árabes).
Na ausência de uma derrota total, Egito e Síria saíram vitoriosos no plano político e psicológico, conseguindo
extrair muitos frutos deste conflito. Depois de um acordo de paz, em 1974, Israel desocupa a zona do Canal de
Suez, que é devolvida ao controle egípcio, em troca de negociações para o estabelecimento de relações entre
os dois países.

A crise do petróleo, a Paz de Camp David e a diplomacia árabe


A guerra de 1973 evidenciou a determinação dos países árabes conservadores e pró-ocidentais em forçar
uma situação que capitalizasse parte do apoio americano para si, pois ele se concentrava majoritariamente em
Israel. O que possibilitou a emergência de tal política foi a configuração de uma situação nova e complexa,
iniciada nos anos 1960. A crescente utilização do petróleo pelas nações industriais criou uma nova realidade no
Oriente Médio, permitindo que os países árabes dispusessem de maiores recursos para sua política externa.
Foi esta situação que permitiu aos árabes moderados (particularmente a Arábia Saudita e o Egito) articular
uma guerra com fins limitados contra o Estado hebraico.

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Apesar de certos ganhos imediatos, a nova renda do petróleo acabará não favorecendo os países árabes e
muçulmanos. Os desequilíbrios internos das sociedades locais se aprofundaram, desestruturando o tecido
social e corrompendo as elites, pois cresceram a dívida, o consumo e a inflação. Muitos países do Golfo sequer
possuíam um Banco Central, e os petrodólares acabaram retornando ao Ocidente.
Globalmente os ganhos árabes ficaram muito abaixo do esperado. Quanto aos EUA, estes passaram a ter
como aliado o mais populoso país árabe, que, além disso, ocupava uma posição estratégica entre a Ásia e a
África e entre o Mediterrâneo e o petróleo do Golfo, enquanto simultaneamente enfraquecia
irremediavelmente a influência soviética na região.
A Guerra do Yom Kippur teve também dois outros desdobramentos importantes. O primeiro deles foi o
desencadeamento de uma guerra civil intermitente no Líbano, em 1975. O segundo desdobramento foi a
aproximação do Egito, em relação aos EUA, e a ruptura com a URSS. Com a evolução diplomática no Oriente
Médio e a mediação do presidente americano Jimmy Carter, Egito e Israel, representados respectivamente por
Sadat e Menahen Begin, estabelecem em Camp David, em 1978, dois acordos: um que decidia por uma trégua
no conflito árabe-israelense, e o outro, que estipulava um período de três meses para retirada das tropas
israelenses da Península do Sinai, com sua posterior devolução ao Egito.
Todavia, muitos desentendimentos aconteceram, até que em março de 1979 foi firmado em Washington,
entre Egito e Israel, um tratado de paz que conciliava as exigências territoriais egípcias com as exigências de
segurança de Israel. Segundo esse tratado Israel se retiraria do Sinai em três anos, o Canal de Suez e o Golfo de
Ákaba teriam liberdade de navegação e, last but not least, os dois países restabeleceriam relações diplomáticas.
Para Israel, os ganhos foram intensos, apesar da devolução do Sinai; o país rompeu seu isolamento
diplomático na região, neutralizou a principal ameaça militar e aprofundou a divisão do mundo árabe.
Não obstante, também houve ganhos diplomáticos para o conjunto do mundo árabe. O aumento dos
recursos petrolíferos permitiu uma maior atuação diplomática. O Movimento dos Países Não Alinhados recebeu
enorme impulso, mudando a correlação de forças na Assembleia Geral da ONU, que aprovou a proposta do
Terceiro Mundo para o estabelecimento de uma Nova Ordem Econômica Internacional, buscando relações mais
equilibradas na economia mundial.
Este, contudo, não foi o único ganho diplomático dos árabes. Em dezembro de 1974, o líder da OLP, Yasser
Arafat, discursou pela primeira vez na ONU – instituição que reconheceu o direito palestino à independência e
concedeu à Organização o status de observador permanente na Assembleia Geral.

2.2 – Revoluções dos anos 1970: Irã, Afeganistão, Líbia e Iêmen do Sul
A Revolução Iraniana e sua Islamização
Com a deterioração da détente e o desencadeamento da Nova Guerra Fria, em fins dos anos 1970, a região
cuja instabilidade mais preocupou Washington foi a mesma que o assessor americano Zbigniew Brzezinski
denominou Arco das Crises, a qual se estende do Chifre da África ao Paquistão, passando pela Península Arábica.

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Em função do petróleo do Golfo Pérsico, da proximidade da URSS e do Oceano Índico, a região era considerada
vital para os EUA.
A revolução iraniana foi a que mais afetou a estratégia americana na região do “Arco das Crises”. O Irã
possuía o maior, mais bem treinado e equipado Exército do Oriente Médio, situava-se estrategicamente entre
a fronteira soviética e o Golfo Pérsico, possuía grande riqueza petrolífera e era o aliado mais importante dos
Estados Unidos na região, a peça básica de seu esquema militar e o gendarme mais confiável.
A Revolução Iraniana foi o resultado da convergência de uma luta política contra os 25 anos de ditadura do
Xá, de uma revolta social contra as profundas desigualdades do modelo capitalista adotado e de uma revolta
islâmica e nacionalista contra a cultura ocidental – sobretudo o american way of life -, revolução esta
abruptamente introduzida no país, na esteira da modernização capitalista e contra a sujeição do país à
diplomacia dos EUA.
A revolução assumia um conteúdo social retrógrado. Entretanto, ela possuía um fortíssimo conteúdo anti-
imperialista, que atingiu o paroxismo no episódio dos reféns da embaixada americana em Teerã.

Revolução, Reação e Intervenção no Afeganistão


O Afeganistão, feudal e tribal, sempre teve excelentes relações com a URSS, e foi o primeiro Estado a
reconhece-la em 1919, mantendo acordos de cooperação econômica e militar desde 1924. Em 1973, em mais
um dos golpes de Estado no país – formalmente contra a corrupção generalizada – o Príncipe Daud depunha
seu primo do trono e proclamava a República, apoiando-se em uma ampla frente, da qual fazia parte o grupo
marxista Parcham.
O Governo Daud, face à crescente desagregação econômica – quase 10% da população precisava trabalhar
no exterior – e à progressiva influência dos comunistas no governo, começou a aceitar a ajuda econômica do
Xá do Irã, que desejava criar sua própria área de influência. Desde 1974, Daud permitiu a atuação da Savak
(polícia política iraniana) dentro do governo afegão, para eliminar a esquerda do aparelho estatal. A siatuação
agravou-se quando Cabul resolveu reorientar sua diplomacia, aproximando-se também de China, EUA e
Paquistão. Assim, em 1978, o PDPA (Partido Democrático do Povo Afegão, fundado em 1965), com apoio de
outros grupos políticos, reagiu apressadamente desfechando um golpe de Estado, que denominou “Revolução
de Abril”.
O novo governo era liderado por Taraki, do Khalq, que iniciou programas de alfabetização, reforma agrária,
emancipação dos jovens e das mulheres e nacionalização de alguns setores da economia. Não obstante, a luta
interna prosseguia, e Hafizullah Amin – também do Khalq – isolou progressivamente Taraki e o grupo Parcham.
Os soviéticos, já preocupados com os primeiros ventos da Nova Guerra Fria, resolveram então agir. Taraki
foi a Moscou, no início de dezembro, e assinou, com Brejnev, um Tratado de Amizade e Cooperação, que, na
verdade, constituía um apoio para derrubada do odiando Amin, que percebeu a manobra e assassinou Taraki
logo após seu retorno. Assim, a URSS resolveu apoiar um golpe para derrubar Amin, a ser complementado com
a intervenção militar maciça para apoiar o novo governo, o que veio a ocorrer em 27 de dezembro de 1979.

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Esse novo governo era liderado por Brabak Karmal, do Parcham, que promoveu uma abertura política,
moderou o ritmo das reformas e buscou uma aproximação com os líderes religiosos e chefes tribais, enquanto
os soviéticos tentavam reerguer o Estado e o Exército afegãos, e suas tropas procuravam controlar os pontos
vitais do país.

As Revoluções da Líbia e do Iêmen do Sul


Até 1959 a Líbia era um dos países mais pobres da África, e sofria grande influência dos Estados Unidos e do
Reino Unido. Porém, neste ano, foram encontradas vastas reservas de petróleo no subsolo líbio, o que resultou
em um grande impulso econômico. Apesar do desenvolvimento causado pelas vendas do petróleo, a população
passou a ficar insatisfeita com a má distribuição da riqueza.
Em 1969 o Coronel Muammar al-Kadafi, então com apenas 27 anos, liderou um golpe que derrubou a
monarquia e instaurou uma república. Kadafi se tornou chefe de Estado a partir de 1970 e a partir de então
tentou usar o dinheiro vindo do petróleo em melhorias para o país.
Kadafi governava por intermédio do Conselho de Comando Revolucionário, sendo integrante do setor
esquerdista do Exército líbio e seguidor de Abdel Gamal Nasser, líder pan-arabista egípcio. O nacionalismo árabe
e as políticas nacionalistas do governo serviram como canalizadores das tensões da população líbia, excluída e
marginalizada dos enormes ganhos provenientes da extração petrolífera.
Durante os anos 1970 e 1980, a Líbia sofreu um certo isolamento diplomático devido tanto a sua posição
socialista (o que acabou por gerar uma aproximação com a União Soviética), quanto a sua intervenção em
outros países árabes, que levaram a um afastamento do ocidente e a conflitos nas relações com os demais
países africanos.
No plano externo, a política kadafista girou em torno da unidade árabe, sendo caracterizada – em um
primeiro momento – por seu teor antiamericano e anti-israelense. A partir dos anos 2000, o governo líbio
procurou ampliar suas relações econômicas e comerciais com o Ocidente e exercer maior protagonismo nos
fóruns internacionais, estratégia para superar seu estereótipo radical.
A Grande Jamairia Popular Socialista da Líbia, em 2010, tinha uma população de 6,5 milhões de habitantes,
uma taxa de crescimento demográfico anual de 2,0% e uma população urbana de 78%. Era um regime
considerado autoritário (democracia direta), de cunho socializante e popular.
A Líbia sofreu ataques militares e embargos comerciais dos países ocidentais por supostamente proteger e
apoiar terroristas e apoiar o terrorismo. Quando os Estados Unidos invadiram o Iraque, Kadafi declarou que
abandonaria o programa de armas de destruição em massa líbio, possivelmente temendo o mesmo destino de
Saddam Hussein.
A escassez de terras férteis no país dificulta o desenvolvimento agrícola, que é limitado a itens como tomate,
batata, trigo, cevada, azeitona e tâmara. Na área da pecuária, são criadas ovelhas, cabras e vacas para consumo,
e cavalos e camelos para o transporte.

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O principal produto de exportação líbio é o petróleo e derivados, que soma 95% dos produtos vendidos ao
exterior. Esses produtos se destinam principalmente à Itália, Alemanha, França e Espanha. Os Estados Unidos,
que antigamente eram o maior parceiro comercial do país, hoje se encontra na 5º posição.
O Iêmen do Sul, por seu turno, foi formado pela antiga colônia inglesa de Aden, e se tornou independente
em 1967, após forte mobilização e conflitos protagonizados pela Frente de Libertação Nacional (FLN) que
possuía uma ala nacionalista e outra socialista. Um acordo firmado em 1973 para a unificação com o Iêmen do
Norte não foi cumprido, devido às crescentes posições pró-ocidentais no Norte. Em 1978 o Presidente Ali
Robaye planejou um golpe para evitar a transformação da FLN em Partido Socialista Iemenita (PSI), sendo
derrubado e substituído no ano seguinte por Abdel Fattah Ismail, que instituiu uma orientação masrxista-
leninista.
As disputas internas, entretanto, não diminuíram, e em 1985 o Conselho Supremo do Povo reduziu os
poderes do presidente, ocasionando uma violenta guerra civil em 1986, a qual provocou 10 mil mortes. A facção
de Ismail, que morreu em combate, foi vencedora, e reafirmou a linha política do país.
O diálogo entre os dois Iêmens jamais foi abandonado e, em 1981, passaram a fazer prospecções geológicas
conjuntas, resultando na descoberta de importantes jazidas petrolíferas na região de fronteira. A diplomacia da
Perestroika soviética e a erosão do bloco socialista e da ajuda externa fizeram as discussões sobre a unificação
avançarem. Em maio de 1990 ambos os países fundiram-se na República do Iêmen, com a capital em Sanaa, no
Norte.

2.3 – Conflitos dos anos 1980: Líbano e Iraque-Irã


A Guerra Iraque-Irã e o enfraquecimento do mundo árabe
No Machreck, a situação adquiriu contornos radicalmente novos devido à Guerra Iraque-Irã (primeira
Guerra do Golfo) e à invasão do Líbano por Israel. O Irã encontrava-se em situação caótica e pareceu uma presa
fácil ao Iraque, governado pelo Partido Baas e formalmente aliado da URSS. A pretxto de antigos litígios
fronteiriços, o Iraque atacou seu vizinho em setembro de 1980, ocupando parte da zona produtora de petróleo,
mas sendo contido. A Guerra Iraque-Irã constituía um meio de esmagar a revolução anti-imperialista iraniana e
também uma luta pelo petróleo do golfo, em um momento em que o mundo vivia o segundo choque
petrolífero.
A estagnação militar, o prolongamento do conflito e a evolução diplomática fizeram com que a URSS e os
Estados Unidos oscilassem em relação à posição na guerra, inclusive afastando-se ocasionalmente da mesma,
ou até mesmo adotando posturas comuns em certas conjunturas.
Aparentemente irracional depois de determinado momento, a Guerra do Golfo manteve-se por quase uma
década pelas seguintes razões: interesse dos exportadores de armas, manobras envolvendo a política
petrolífera, divisão do mundo muçulmano em benefício de Israel (que aproveitou o conflito para destruir o
reator nuclear iraquiano), necessidades internas de legitimação política e de construção de exércitos modernos

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e experientes por Khomeini e Saddam Hussein, ao que se ligavam rivalidades históricas entre árabes e persas,
e muçulmanos sunitas e xiitas.
A evolução de países como a Síria e o Iraque, aliados da URSS e governados pelo Baas, evidenciou o fracasso
(ou melhor, a consequência negativa do sucesso) da “via não capitalista de desenvolvimento”.

A implosão do Líbano e a invasão israelense


O Líbano encontrava-se em Guerra Civil desde 1975. A começar de sua independência da França, em 1943,
o país se mostrou à mercê de forças internas e externas, que durante o Mandato Francês pareciam
relativamente estabilizadas.
O aprofundamento das divergências internas e das rivalidades regionais e internacionais acerca da região
explica os 15 anos deste conflito civil no Líbano. Os cristãos do país buscavam uma aliança com Israel, ao passo
que a Síria, representante máxima do “Arabismo”, tentava controlar o solo libanês e aumentar sua influência
por lá. Em 1976, a Síria ocupou a maior parte do território libanês, à exceção do extremo Sul e da área
controlada pelos cristãos.
No contexto internacional, Iraque e Líbia condenaram a ocupação, assim como Estados Unidos e URSS, Israel
mostrou-se neutro, mas em junho de 1982, no auge da Guerra Iraque-Irã, atacou o Líbano para eliminar a OLP.
O desgaste militar no Líbano e o descontentamento interno levaram Israel a retirar-se desse país,
conservando apenas uma zona-tampão ao Sul, em conjunto com uma facção cristã aliada. O Líbano,
propriamente dito, mergulhou em um processo de balcanização, em que se mesclavam conflitos feudais-
religiosos, controle da produção e distribuição de drogas e lutas sociais cada vez mais explícitas. Os problemas
que Israel pensou em resolver rapidamente com sua “Operação Paz para a Galileia” agravaram-se ainda mais.

O conflito Israel-Palestina e a Primeira Intifada


Em 1984 os trabalhistas voltaram ao poder com Shimon Peres, mas com uma maioria relativa que o obrigou
a dividir o mandato com os conservadores do Likud, que assumiram em 1986 com Isaac Shamir. Mas o
sentimento de abandono dos palestinos, provocado pela perda de contato com a OLP (transferida para Tunis),
levou, em dezembro de 1987, à eclosão de protestos, greves, boicotes e confrontos violentos, nos quais os
jovens palestinos reagiam às balas com pedras.
O nível de brutalidade com que os civis palestinos foram reprimidos causou enorme dano à imagem
internacional de Israel e importantes fraturas na sociedade israelense.
As dificuldades de Israel, entretanto, começaram a ser atenuadas pela reorientação da política soviética sob
Gorbachev, que gradativamente passou a confluir com a dos Estados Unidos. O líder soviético liberou a
emigração de judeus de seu país (eram aproximadamente dois milhões), os quais constituíam o último
contingente expressivo disposto a instalar-se em Israel, passando a afluir em grande número para o país, no
momento que a Intifada atingia seu apogeu.
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Capítulo 3
A Ásia Central no Grande Oriente Médio

3.1 – O Pós-Guerra Fria: a Guerra do Golfo e o fundamentalismo


As dimensões regionais do encerramento da Guerra Fria
Desde fins de 1987 a URSS e os EUA passaram a negociar o desarmamento e a resolução dos conflitos
regionais, onde a vontade de Gorbachev de obter a paz, através de concessões, era muito maior. Antes da
queda dos regimes comunistas do Leste Europeu a Guerra fria já havia sido encerrada no Oriente Médio.
O chamado Arco das Crises deixava de existir como elemento de competição sistêmica e como problema
securitário. Nas Nações Unidas, já não havia mais o veto soviético, e a correlação de forças no Oriente Médio
passou a ser totalmente favorável ao Ocidente.

A segunda Guerra do Golfo e o isolamento do Iraque


Em agosto de 1988 era assinado o cessar-fogo entre Iraque e Irã, países militarizados, mas em terrível
situação econômica, que deixaram de ter interesse para os Estados que antes alimentaram o conflito entre
ambos. Logo, à falta de opções diplomáticas de regimes como Argélia, Líbia, Iraque e Irã, viriam somar-se os
crescentes problemas econômicos ocasionados pela redução do preço do petróleo, do qual o Kuwait era um
dos articuladores.
Um semestre após o Presidente Bush haver proclamado o início de uma Nova ordem Mundial da paz,
democracia e prosperidade, e Fukuyama ter decretado “o fim da história”, eclode uma crise diplomática de
grande magnitude. Em 2 de agosto de 1990, o Iraque, mergulhado na crise interna, abandonado pelas
petromonarquias invade o Kuwait.
Inicialmente, o Iraque justifica a intervenção como sendo uma resposta às demandas do governo kuwaitiano
que subverteu a antiga ordem, apresentando uma raison de la nation. Porém, em seguida, declara que a
ocupação do Kuwait é uma simples “reintegração à pátria”, onde exprime claramente o uso de uma raison
d’état.
A ação foi condenada unanimemente pelo Conselho de Segurança da ONU, que decretou medidas –
embargo econômico e envio de tropas à região – com uma rapidez nunca vista, mostrando que Saddam havia
caído numa armadilha, e evidenciando o poder e a determinação dos EUA. Ocorre que o Kuwait possuía US$
120 bilhões investidos no exterior, dos quais US$ 30 bilhões pertenciam aos EUA. Assim, fica evidente porque
os americanos logo vieram em socorro à monarquia kuwaitina.
Saddam tentou provocar Israel a entrar na guerra lançando mísseis scud, com o objetivo de dividir a coalizão
adversária e de legitimar seu discurso, não obtendo, porém, sucesso.
Saddam Hussein, entretanto, manteve-se no poder e derrotou as revoltas curdas no Norte e as xiitas no Sul,
embora o Iraque tenha permanecido isolado pelo embargo internacional por muitos anos, com o objetivo de

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evitar a reconstrução do país, justificar a presença militar na região e impedir que Bagdá voltasse ao mercado
do petróleo.
O líder iraquiano procurou, então, levantar o mundo árabe e islâmico adotando um discurso militante, do
qual amplos setores sociais e políticos da região estavam carentes. Poucos Estados apoiaram o Iraque, mas suas
massas populares saíram às ruas em apoio a Saddam.
Ironicamente, a destruição do Iraque deixou campo livre para as petromonarquias tentarem impor uma
nova ordem regional, apoiada no Eixo Riad-Cairo-Washington. Com o fim da ameaça representada pela URSS e
pelos regimes reformistas árabes inimigos do Ocidente e das petromonarquias, Israel perdeu grande parte de
sua importância estratégica.
As petromonarquias, por sua vez, com seus regimes ditatoriais, repressivos, socialmente retrógrados e
economicamente excludentes, conscientizaram-se, com a guerra, de sua fragilidade estrutural. O affair Iraque
versus Kuwait revelou a fragilidade externa e a artificialidade das petromonarquias do Golfo. A OLP, por seu
turno, ficou em uma situação difícil, devido a seu apoio ao perdedor. Finalmente, grandes contingentes e
importantes bases americanas foram estabelecidas no Golfo, configurando-se uma espécie de “intervenção
permanente” na região, a pretexto de combater um fantasmagórico poder residual do Iraque.
Novamente, o governo americano ameaça e toma providências concretas para atacar o Iraque. Desta vez,
no entanto, encontra resistência entre seus próprios aliados europeus e do Oriente Médio, além da oposição
aberta dos demais membros do Conselho de Segurança da ONU.
Após a guerra, com sua infraestrutura (inclusive civil) completamente devastada, o Iraque foi submetido a
um embargo completo, que causou milhares de vítimas pela falta de alimentos e de medicamentos. Uma zona
de exclusão aérea foi estabelecida ao Norte e outra no Sul do país, sendo constantes os incidentes com os aviões
aliados. Durante o longo embargo, a população iraquiana padeceu de sofrimentos imensos, mas o poder interno
de Saddam não foi abalado.
Um dos elementos invocados para a manutenção do embargo foi a tentativa de forçar Saddam a renunciar
e redemocratizar o país; todavia, isso nunca foi possível, pois a oposição iraquiana é muito frágil, dividida, e não
possui implantação interna no país. O outro foi a suposição de que o Iraque possuía armas de destruição em
massa (químicas, basteriológicas ou nucleares) ou a capacidade de fabricá-las.
O único meio de isolado Saddam agir foi, até 1999, o de fazer um jogo de aceitação e recusa das inspeções
da ONU em seus arsenais. Após muitas negociações, a Organização impôs inspeções através da UNSCOM, a
Comissão Especial das Nações Unidas para o desarmamento do Iraque.
Entretanto, em 1998 houve uma crise, pois Bagdá acusava alguns inspetores de serem espiões do EUA,
extrapolando suas atribuições. A denúncia iraquiana foi apoiada por China, Rússia e França. A missão foi expulsa
do país e americanos e ingleses bombardearam o país (Operação Raposa do Deserto), sem consultar o Conselho
de Segurança da ONU.

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As Transformações do Fundamentalismo Islâmico
Os movimentos políticos de caráter islâmico tiveram origem em grupos de perfil fascistizante como os
Irmãos Muçulmanos, desde o entreguerras. Esses movimentos foram apoiados pelos Estados conservadores,
particularmente as petromonarquias.
Tal apego ao islã servia pra encobrir a aliança dos monarcas com o Ocidente e o caráter socialmente
conservador daqueles. O raciocínio era, de Washington a Riad, de que a “religião representa um antídoto ao
comunismo” (e também contra o nasserismo, o baasismo, o socialismo islâmico e o liberalismo). Os aiatolás, no
espectro da revolução iraniana, por exemplo, tornaram-se a alternativa política menos prejudicial ao Ocidente.
O quadro começa a alterar-se com o aprofundamento da crise socioeconômica, com o avanço da
globalização e com a derrota ou eliminação dos movimentos e regimes reformistas. O desenraizamento e o
desespero das populações criam um espaço fecundo para o fundamentalismo islâmico, que evolui e diversifica-
se, avançando na esteira da inviabilização de outros grupos e projetos sociopolíticos.
O fundamentalismo islâmico também passou a ganhar terreno em outros países da região, inclusive dentro
do movimento palestino, até então essencialmente nacional e laico. As ações, por vezes espetaculares, do
Hezbollah (Partido de Deus, dos xiitas libaneses) no Sul do Líbano e os atentados do Hammas (movimento
islâmico palestino), nos territórios ocupados, catalisam a atenção de uma população desesperada pela
repressão, pobreza e avanço das colônias judaicas.
O grande fator de internacionalização do fundamentalismo e sua capacitação para agir a partir da eficácia
“moderna e global” consistiram o estímulo da administração Reagan para o desencadeamento de uma cruzada
islâmica internacional, uma Jihad contra a União Soviética. Formaram-se quadros e redes internacionais,
capacitados em finanças, armamentos, tecnologias e formas de organização sofisticadas.
Contudo, os EUA se desiteressaram pelo Afeganistão, após o fim da URSS, e esses grupos foram
abandonados à própria sorte. Em seu ressentimento, eles se voltaram contra o Ocidente e, particularmente,
contra os EUA.

3.2 – O Caminho da Paz Israel-OLP: Oportunidades perdidas nos anos 1990


O Oriente Médio após a Guerra do Golfo
Após a Guerra do Golfo, o Irã tornou-se alvo das pressões ocidentais, enquanto o país procurava apoio para
seu projeto nuclear. De qualquer maneira, o processo de paz traz implícita a integração econômica da região, a
qual permitirá o estabelecimento de uma maior estabilidade social e diplomática no Oriente Médio, bem como
a inserção internacional menos onerosa desta área no processo de globalização econômica em curso.
Pouco mais de meio ano após o fim da Guerra do Golfo, a agonizante União Soviética esfacelou-se na esteira
do “golpe” e contragolpe de 1991. As 15 Repúblicas Federadas tornaram-se formalmente independentes em
dezembro. Esse fato adquiriu uma dupla importância para o Oriente Médio: a nova Rússia não possuía qualquer
papel internacional destacado semelhante à antiga URSS, reforçando-se a posição de Washington; por outro
lado, as independências das Repúblicas de população majoritariamente islâmica na Ásia Central (Cazaquistão,

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Uzbequistão, Quirquistão, Tadjiquistão e Turcomenistão) e no Cáucaso (Azerbaijão) ampliaram o interland da
região e sua área de instabilidade.
A isto se deve agregar a derrubada do regime socialista afegão, em abril de 1992, quando o General Rashid
Douston (comandante da milícia uzbeque) passou para o lado da guerrilha devido ao não repasse de recursos,
por parte do governo, para os comandantes regionais. A queda dos comunistas, entretanto, não trouxe paz ao
país, mas uma reformulação das alianças em bases étnicas e a intensificação do conflito.
O Paquistão, com apoio americano e saudita, criou, em fins de 1994, a milícia Talibã (“estudantes da
religião”), que por intermédio de uma ofensiva fulgurante controlou o Sul do país e tomou Cabul em fins de
1996, implantando o regime islâmico mais obscurantista existente.
No Magreb, a desestabilização político-social, da qual o fundamentalismo é um dos aspectos, tem
preocupado a União Europeia, que teme pela segurança de seu flanco Sul. No Machreck, observa-se uma série
de alterações políticas espetaculares que, em última instância, tem como objetivo deter as transformações
históricas em curso e estabilizar a região. Ou seja, trata-se de mudar para conservar.
Após a Segunda Guerra do Golfo e o fim da Guerra Fria, muitos analistas internacionais, políticos e
acadêmicos destacavam a “derrota do mundo árabe”, dividido, enfraquecido econômica e militarmente, além
de não contar mais, no discurso político, com a legitimidade unificadora conferida anteriormente pela defesa
(ainda que muitas vezes retórica) da causa palestina, pois a OLP enfrentava uma aguda crise política, militar e
financeira. Ao mesmo tempo, intensificou-se a repressão nos territórios ocupados, onde ocorria uma instalação
recorde de colonos judeus e o assassinato de lideranças palestinas no interior e no exterior.
Na verdade, Israel estava sendo pressionado pelos EUA. O Presidente Bush opunha-se à construção de novas
colônias e congelou importantes créditos destinados ao país, até que este iniciasse conversações com os
palestinos. Sem alternativas, Shamir cede e em 30 de outubro de 1991 iniciou-se a Conferência de Paz de
Madrid.
O que mudara na região? Em primeiro lugar, cabe destacar que, com o final da Guerra Fria e da Segunda
Guerra do Golfo desapareciam as ameaças militares externas e locais. Assim, Israel perdia grande parte de sua
importância estratégica para os EUA. Em segundo lugar, é importante salientar que o campo árabe moderado
jogara no desencadeamento do conflito com um papel muito mais importante que aparentava, pois Cairo e
Riad eram as capitais articuladoras de uma nova estratégia para o Oriente Médio.
Por que então os EUA, a potência formalmente “vencedora” da Guerra Fria, foram forçados a aceitar o jogo
diplomático dos árabes moderados? Não se tratava apenas de promover a paz e cortar despesas em uma das
regiões mais problemáticas do planeta, mas também, ao realiza-la na perspectiva das petromonarquias, obter
bilhões de petrodólares necessários à economia americana. Esse “dinheiro novo”, que irrigaria e ajudaria a
revitalizar uma economia em recessão, encontrava-se nos bancos árabes do Golfo, um dos novos e mais
vigorosos centros financeiros mundiais.
Tanto na perspectiva dos EUA quanto das petromonarquias e dos demais Estados árabes moderados, havia
o interesse econômico de estabilizar a região a um custo limitado, para que ela pudesse inserir-se de forma

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satisfatória na nova ordem mundial, já que representa uma área estratégica e economicamente promissora do
Terceiro Mundo.
Existem razões suplementares para os “apelos ao Império” por parte do Eixo Riad-Cairo. Saddam Hussein
desmascarou a fragilidade e a artificialidade do Kuwait e, por extensão, das demais petromonarquias. Os xeques
temem as demandas políticas democratizantes e distributivas socioeconômicas de suas próprias populações.
Neste sentido, a situação torna-se cada vez mais explosiva do ponto de vista social. Faz-se, portanto, necessário
lograr um certo conserto diplomático, pois até o presente as guerras tem sido catalisadoras de revoluções e de
mobilizações sociais em todo o Oriente Médio.
Simultaneamente, o governo israelense procurou ganhar tempo, arrastando as conversações de paz. No
final de 1992 haveria eleição nos Estados Unidos e o Likud apostava todas as cartas em uma possível derrota
de Bush frente aos Democratas.
A situação e, Israel não era melhor. A recessão e o desemprego, agravados pela constante chegada de novos
imigrantes soviéticos, bem como as dificuldades militares nos territórios ocupados e no sul do Líbano, produzem
uma mal estar generalizado na sociedade israelense. A intransigência dos conservadores começa a aparentar
um suicídio político aos olhos da opinião pública. Assim, em julho de 1992, os trabalhistas, apoiados por uma
coalizão do centro à esquerda, vencem as eleições e formam um novo governo.

O Acordo de Oslo entre Israel e OLP


O fim da Guerra Fria veio, por outro lado, a alertar a percepção ocidental, particularmente americana, do
fundamentalismo islâmico. A eleição do Democrata Bill Clinton não trouxe plenamente os resultados esperados
por Israel, pois o presidente americano teve de responder aos mesmos problemas de seu antecessor, os quais
continuaram a se agravar. Não havia mais condições de subsidiar Israel como no passado. Além disso, no Estado
judaico cresciam os movimentos pela paz desde o início da Intifada. A faixa de Gaza, particularmente, como
bolsão de miséria demograficamente concentrada, começou a tornar-se um fardo para as forças de segurança
israelenses.
A OLP, por seu turno, conhecia crescentes dificuldades. Desde 1982 sua direção política encontrava-se longe
das frentes de luta, parte de seus quadros dirigentes foi recentemente assassinada, a Intifada criara uma
realidade no interior dos territórios ocupados que não era controlada pela direção, seus aliados desapareceram,
as petromonarquias haviam cancelado a maior parte da ajuda financeira ao movimento e expulsado a maioria
dos trabalhadores palestinos (como castigo pelo apoio ao Iraque durante a guerra) e, finalmente, o movimento
islâmico Hammas (que não integra a OLP) ganhava espaço rapidamente nos territórios ocupados. É então que
Yasser Arafat, conhecido como “o homem das sete vidas”, começa a aparecer aos olhos do governo israelense,
como já anteriormente para os EUA, como um interlocutor válido.
Sob a mediação dos EUA e sediados na Noruega iniciam-se as conversações secretas entre Israel e OLP, as
quais vieram a tornar-se públicas e a culminar na assinatura em Washington de um surpreendente acordo de
paz em setembro de 1993. Segundo este (conhecido como Oslo I), Israel e OLP reconhecem-se mutuamente, e

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os palestinos recebem o controle da maior parte da problemática Faixa de Gaza e da pequena cidade de Jericó,
na Cisjordânia, na qual Arafat se estabeleceria. Nos quatro meses seguintes, Israel deveria retirar suas tropas
destas áreas, cujo controle passaria a ser feito por uma polícia palestina formada pela OLP, respeitando critérios
e condições de segurança ditados por Tel Aviv.
Em 1994, Israel e Jordânia estabeleceram relações diplomáticas, reconhecendo-se mutuamente e assinando
um acordo de paz. Em 1995, foi assinado o Acordo de Oslo II. Arafat ficou com a difícil e delicada tarefa de
reprimir seus próprios conterrâneos, particularmente os grupos de esquerda e os grupos islâmicos, que se
opuseram ao acordo. Apesar das dificuldades, atrasos e divergências, Rabin honrou o acordo.

Impasses e Crise do Processo de Paz


Contudo, em novembro de 1995 um estudante judeu pertencente a um dos partidos israelenses de extrema-
direita assassinou o Primeiro-Ministro Rabin. O sucessor Shimon Peres não teve mais a base política suficiente
para prosseguir no processo de paz e perdeu as eleições para Benyamin Nethanyahu, por menos de 1% dos
votos.
Apesar dos impasses, o acordo abriu um processo de construção da paz entre Israel e os palestinos, mas
também entre os países árabes. Israel, com suas imensas vantagens comparativas (estrutura moderna, técnicos,
inserção mundial), constitui uma espécie de cidade-Estado, capaz de nuclear a região, conectando-a à
globalização. Não restou qualquer ameaça militar aos país hebreu, apenas a segurança interna. Não obstante,
esta pode ser gradativamente contornada com a satisfação dos anseios nacionais palestinos e com o espraiar
do desenvolvimento aos territórios ocupados e aos vizinhos. Contudo, a direita e os religiosos ortodoxos
israelenses, bem como os setores do complexo militar, além do Hamas e da esquerda palestina, opõem-se ao
acordo.
Após a queda do Muro de Berlim, em lugar do “fim da história” apregoado por Francis Fukuyama,
passaríamos a viver uma aceleração do processo histórico e uma evolução pouco previsível do mesmo. Com a
destruição do sistema Versalhes-Ialta, como bem demonstra Fred Halliday, as relações internacionais
encontram-se muito próximas das estruturas diplomáticas pré-1914.
O problema crucial, além deste estatuto de Jerusalém Oriental (Al-Qods), é a situação das colônias judaicas
construídas sobre os territórios palestinos (cuja manutenção é irrealista) e a reivindicação palestina de retorno
dos refugiados, desde a década de 1940 (que também é irrealista). São questões que podem ser negociadas,
desde que haja uma consciência de que as alternativas a elas, como a instabilidade e a violência permanentes,
são piores.
Uma atitude provocativa do General Ariel Sharon – a visita à esplanada das mesquitas, em Jerusalém –
desencadeia uma nova onda de violência. O objetivo de Sharon foi bloquear o processo de paz e recompor o
governo israelense, com a presença dos conservadores, dando início a uma Segunda Intifada e a retomada do
governo pelo Likud, com uma vitória esmagadora sobre os trabalhistas.

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O General Sharon é conhecido por seu ímpeto belicista e aventureiro, por sua conivência com os massacres
de Sabra e Chatila (favelas palestinas em Beirute), em 1982, por haver estimulado a construção de colônias
judaicas nos territórios ocupados, quando era ministro da habitação do Governo Nethanyahu, e por ter sido o
pivô do desencadeamento da revolta palestina, que prossegue. Seu governo procurou, de início, reverter as
negociações de paz, intensificando políticas de força.

3.3 – Ásia Central: os novos Estados e o retorno do Grande Jogo


A expansão russa para o Leste e para a Ásia Central ocorreu como reação à ocupação mongol, o Canato da
Horda de Ouro, que foi declinando e perdendo territórios para os russos. Estes se expandiram pela floresta
siberiana até o Oceano Pacífico, que atingiu no século XVII e XVIII. O avanço sobre a Ásia Central só ocorreu no
século XIX, com o declínio das confederações tribais da região e do Império Persa.
O socialismo trouxe a modernização social e o desenvolvimento econômico, com a emancipação das
mulheres, a alfabetização, a construção de infraestruturas (transporte e energia) e a integração no ethos
soviético.

A região conhecida com Ásia Central compreende cinco ex-repúblicas soviéticas: Cazaquistão, Uzbequistão,
Quirguistão, Tadjiquistão e Turcomenistão. No Cáucaso encontra-se outra república islâmica desmembrada da
URSS, o Azerbaijão, que se liga às demais pelo Mar Cáspio. Depois de quase dois séculos de dominação russa e
de 70 anos de integração no espaço soviético, essas repúblicas tornaram-se independentes em dezembro de
1991.
Esses países formavam parte de antigos e decadentes canatos mongóis ou turcos que foram conquistados
pela Rússia, sendo que alguns deles jamais haviam existido como Estados independentes. A divisão da Ásia
Central, além de fazer parte da política soviética de promover as nacionalidades, tornou-se taticamente
imprescindível, além de terem sido criadas campanhas antirreligiosas e de russificação das línguas russa e persa,
como forma de minar a unidade muçulmana.
Algumas minorias étnicas, espalhadas pelas ex-repúblicas, continuaram vivendo em comunidades isoladas
e constituem, atualmente, um importante foco de desequilíbrio que, muitas vezes, percebe o islamismo como
importante catalisador para promover a unidade regional.
A modernização econômica da região provocou certos problemas ecológicos, como a redução do Mar de
Aral, a partir dos anos 1960, devido ao desvio das águas dos rios para projetos de irrigação para a cultura do
algodão. Por outro lado, a introdução da agricultura nas chamadas “terras virgens” do Norte das estepes
cazaques e a industrialização fizeram com que grandes contingentes de russos, ucranianos e outros se
estabelecessem na Ásia Central, complicando o equilíbrio demográfico.
Com o desmembramento da URSS, as antigas fronteiras administrativas conservaram, além da instabilidade
das minorias étnicas, problemas relacionados a transporte e infraestrutura e à carência de quadros

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burocráticos. Esse vazio político deu espaço para as redes internacionais – sobretudo para a máfia – articularem-
se, mas também reforçou regimes autoritários e repressivos.
É importante ressaltar que as repúblicas da Ásia Central, durante a Perestroika, lutaram pela manutenção
da URSS, sentindo-se vulneráveis com uma independência indesejada. Assim, a maioria dos governantes
continuou os mesmos do período soviético.
Após a independência da Ásia Central, várias questões adquiriram caráter de urgência, sobretudo aquelas
relacionadas à segurança e à consolidação dos Estados Nacionais autônomos, pois, até então, a maioria das
questões técnicas e burocráticas estavam centralizadas em Moscou. Grande obstáculo para tal tarefa foi a falta
de pessoal qualificado, além de uma organização interna que atingisse tais objetivos.
O colapso da URSS provocou a divisão do Exército entre as ex-repúblicas, o qual acabou por vender, em
muitos casos, armamentos para milícias e chefes locais. Em maio de 1992 foi assinado o START I (Strategic Arms
Reduction Treaty) entre o Cazaquistão e os EUA; posteriormente, a Ucrânia e a Bielo-Rússia também assinaram
um protocolo como os EUA, mas os três países mantiveram a prerrogativa sobre a destruição de suas armas ou
a possibilidade de transferências para a Rússia em sete anos. Em junho de 1992 foi assinado o START I entre a
Rússia e os EUA; além disso, Cazaquistão, Ucrânia e Bielo-Rússia assinaram o Tratado de Não Proliferação
Nuclear.
A partir da Perestroika e do fim do sistema comunista, o islã reapareceu na Ásia Central, invocando a
memória histórica e cultural do período em que os impérios islâmicos dominaram grande parte daquela região
e tornando-se um verdadeiro obstáculo para os líderes políticos, que encontraram dificuldade em lidar com
suas estruturas oficiais. O vácuo deixado pelas lideranças oficiais islâmicas permitiu a proliferação de grupos
fundamentalistas patrocinados pelos wahabitas da Arábia Saudita; pelas Guardas Revolucionárias do Irâ; e por
alguns grupos fundamentalistas sunitas do Paquistão.
A estrutura política da Ásia Central apresenta um quadro extremamente delicado, pois a instabilidade
provém não somente de unidades territoriais artificialmente construídas – que após a independência
precisaram se afirmar como nações soberanas, lidando com problemas internos como o crescente
fundamentalismo islâmico – mas, também da manutenção de presidentes autoritários, que de certo modo, não
cumpriram as promessas de abertura democrática feitas após o fim do socialismo soviético.
A dificuldade de articular uma estratégia para garantir a segurança da Ásia Central encontra outro obstáculo
nas lideranças tribais e nos clãs políticos, que, através de uma estrutura arcaica e conservadora, tornaram-se
um problema dissuasivo para a construção de uma identidade nacional, catalisando tensões e colocando muitos
desses países em verdadeiras “guerras civis”.
Outro problema extremamente delicado para a região é a crônica situação econômica, cuja condução para a
aproximação da economia de mercado e as privatizações mostraram a inabilidade de alguns governos para lidar
com a nova situação, embora tenham reinserido a Ásia Central em uma complicada disputa entre potências
regionais e mundiais pelas riquezas da região – sobretudo gás natural e petróleo.

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Tanto Turcomenistão como as demais repúblicas da Ásia Central esperaram diminuir sua dependência
econômica em relação à Rússia, conectando-se ao mercado mundial por meio da construção de suas próprias
rodovias e oleodutos.

A Queda do Regime Socialista e a Fragmentação do Afeganistão


Surpreendentemente, o regime socialista afegão sobreviveu à saída dos soviéticos, à progressiva redução
da ajuda econômica e militar, ao fim da Guerra Fria e à própria desintegração da URSS. As ofensivas
guerrilheiras, fortalecidas pela continuidade da ajuda externa, não conseguiram derrubar o governo, nem
chegar a um acordo para a formação de um novo regime.
Cabul, ocupada por diferentes milícias, foi praticamente destruída, com 70% da população fugindo para o
campo. Os remanescentes do regime derrubado juntaram-se a diferentes grupos, que tenderam a se agrupar
por etnias. Muitos partidos vinculavam-se aos novos países da Ásia Central, em que sua etnia era majoritária.
Havia, porém, uma divisão dominante: os moderados (como Massud), desejosos de um governo de coalizão e
de independência externa, e os fundamentalistas (como Hektmatyar), ligados ao Paquistão e ao Ocidente.
O Governo Rabbani, do campo moderado, foi reconhecido internacionalmente, embora combatido por
Hekmatyar. Os recém-formados países da Ásia Central, ricos em petróleo e situados entre a Rússia e a China,
constituíram uma nova realidade geopolítica, cobiçada pelo Ocidente. O Afeganistão, localizado entre o Irã e a
China, ocupava uma posição-chave, representando o único acesso à região.
Contudo, Hekmatyar fracassou militarmente. O Paquistão buscou, então, uma alternativa, com ajuda
americana e saudita. Seus serviços de inteligência recrutaram entre os campos de refugiados “estudantes da
religião” (talibãs, de etnia pashtu) das escolas corânicas – uma poderosa milícia – oferecendo treinamento,
armas, dinheiro e apoio aéreo.
Em setembro de 1996 conquistaram Cabul, executando os adversários e capturando o ex-Presidente
comunista Najibullah (deposto em 1992), que se encontrava refugiado na representação da ONU, responsável
por sua proteção. Ele e seu irmão foram castrados, enforcados e, após, trucidados em praça pública. Nenhum
país do mundo esboçou qualquer tipo de protesto a esse ato.
Em agosto de 1998, Mazar-i-Sharif, bastião uzbeque de Dounston, foi conquistado, bem como o reduto dos
xiitas hazaras (onde estavam as estátuas de Buda). Nesta região diplomatas iranianos foram assassinados,
quase provocando uma guerra entre os dois países.
Desde então, os talibãs começaram a escapar ao controle de seus mentores, profundando o domínio sobre
a produção e o comércio de drogas (de maneira independente) e envolvendo-se com o terrorismo
internacional.
Os talibãs não possuíam um programa político exequível na era da globalização, mas podiam sobreviver
largo tempo devido ao estado de anomia, fadiga e destruição a que foi submetida a sociedade afegã, em um
retrato dramático da sorte dos perdedores da Nova Ordem Mundial. Tantas ingerências externas e pressões
contrárias à modernização acabaram produzindo um verdadeiro monstro.

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Atores Globais do Novo Grande Jogo
O desaparecimento da União Soviética criou um vazio de poder que foi agravado pelo retrocesso econômico
dos países da Ásia Central, projetando potências médias da região, como a Turquia, o Irã, o Paquistão, a Arábia
Saudita, o Egito e Israel, bem como Rússia e China. Essa situação trouxe de volta o “grande jogo” na Ásia Central,
conforme definido pelo jornalista paquistanês Ahmed Rashid, o qual introduz atores como os EUA e as
companhias petrolíferas.
Essa perspectiva, que recupera a importância geopolítica da Ásia Central, também foi utilizada por Zbigniew
Brzezinski, ex-chefe do Conselho de Segurança Nacional dos EUA, que defende o controle da Eurásia, pois a
região possui a maior parte dos recursos naturais do planeta (75% das reservas conhecidas de energia), além
da grande concentração de poderes nucleares.
Os EUA procuram inserir-se na região através da OTAN e, em especial, da Turquia, que foi uma base pró-
Estados Unidos de monitoramento utilizada na Guerra do Golfo, converge com o desejo turco de servir ao
Ocidente, utilizando para si as relações com Ásia Central. A Turquia selou uma aliança com Washington para
conter a influência iraniana, e Ancara (capital do país) tornou-se o primeiro ponto estratégico de ligação entre
líderes da Ásia Central que demandavam ajuda econômica, apoio político e acesso ao Ocidente.
Apesar da rivalidade histórica entre a Rússia e a Turquia, não interessava a esta que o ex-império soviético
se fragmentasse ainda mais, o que a conduziu a negociar com nove vizinhos para a formação da Organização
Econômica para o Mar Negro (Turquia, Rússia, Azerbaijão, Ucrânia, Bulgária, Romênia, Armênia, Geórgia e
Moldávia), dando ao país um papel proeminente na região.
Irã, devido à sua posição estratégica – acesso ao mar -, é um importante eixo de comunicação, sobretudo
para o escoamento de gás do Turcomenistão, principal corrente da Sibéria, além de ser caminho para um dos
únicos oleodutos que ligam a Ásia Central ao resto do mundo. É um país que possui importantes reservas
petrolíferas, que tem influência no Afeganistão e que mantém amizade com a Rússia, a qual, mais do que nunca,
tenta manter sua influência na Ásia Central.
O Paquistão apresenta alguns paradoxos; o primeiro é o fato de o país não ter dinheiro pra investir na Ásia
Central, mas possuir acesso ao mar, além de ter um grande potencial para oferecer serviços como transporte,
rede bancária, programas de treinamento comercial, além de promover contatos internacionais para
desenvolver a indústria têxtil na região. A outra dicotomia que divide os interesses paquistaneses está entre
uma elite econômica que quer mercados e Estados politicamente estáveis, e os grupos fundamentalistas, entre
eles o Jamaat-i-islami, que quer uma revolução islâmica na Ásia Central.
A Índia, por sua vez, foi fortemente atingida pela independência das ex-repúblicas soviéticas, uma vez que
Nova Déli tinha excelentes relações econômicas, políticas e militares com elas, por intermédio da Rússia.
Com a China, as relações tendem a se tornar cada vez mais importantes, pois, além de compartilharem
vários quilômetros de fronteira, preocupam-se com a questão da segurança de suas respectivas regiões, uma
vez que vários grupos fundamentalistas, armados e treinados nas ex-repúblicas, ameaçam desestabilizar
cidades chinesas.

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Todavia, a ascensão chinesa nessa parte do mundo não agrada a um importante ator internacional, os EUA,
que procuram garantir as reservas mundiais de petróleo para si, em detrimento da China, cujo acesso facilitado
a esse recurso vital seria importante para o seu desenvolvimento industrial.
Com Israel, o relacionamento tem crescido na área econômica, e as lideranças asiáticas consideram-no como
um precedente para mostrar ao Ocidente que são relações seculares e que não dependem do mundo
muçulmano.
Os EUA, apesar do seu novo posicionamento na região, desde o fim da Guerra Fria – redimensionamento da
hegemonia americana, para diminuição de custos -, tiveram que lidar com uma situação sem precedentes,
depois dos ataques terroristas de 11 de setembro, que apontaram o Afeganistão como responsável pelo
suporte logístico da operação.
A posição americana na região é indiscutivelmente delicada, pois, no intuito de controlar o petróleo e o gás
desse território, necessita formar alianças, as quais, muitas vezes, vão de encontro aos interesses dos “aliados”.
Alguns rejeitam ser utilizados como “moeda de troca”, e outros aproveitam a “vulnerabilidade” americana, que
muitas vezes desconhece a lógica dos governos da região, para obter concessões econômicas e militares.

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Capítulo 4
Da Guerra ao Terrorismo ao Vazio Estratégico

4.1 – Terrorismo e Intervenção americana no Afeganistão


Terrorismo “islâmico”: mitos e realidades

Depois dos atentados de 11 de setembro de 2001, a expressão “terrorismo” passou a integrar a linguagem
cotidiana em todo o mundo.
Há pelo menos quatro sentidos para a expressão terrorismo. O primeiro se refere ao Terrorismo de Estado,
ou “terrorismo desde cima”. Trata-se de atos generalizados de violência sistemática, praticados por governos
contra sua sociedade, contra minorias internas ou contra povos dominados, com o objetivo de quebrar a
resistência à sua autoridade e impor determinado projeto.
O segundo, mais famoso e consensual, é a execução de atos violentos, especialmente atentados, contra
alvos determinados, muitas vezes fora das fronteiras nacionais. Ocorreram amplamente nos anos 1960 e 1970,
geralmente ligados a problemas europeus ou do Oriente Médio. Essas ações têm objetivos políticos, seja para
chamar a atenção da opinião pública internacional para certos conflitos, ou para criar uma situação
insustentável para o inimigo.
O terceiro tipo de terrorismo é o que produz o maior número de vítimas e destruições: o terrorismo comunal
(ou comunitário) das guerras civis ou “terrorismo desde baixo”. Foi ocaso da África Central, dos conflitos na ex-

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URSS e, especialmente, na ex-Iugoslávia. Trata-se de conflitos desordenados, em que a população civil ou suas
milícias intervêm diretamente contra outras comunidades, geralmente minorias étnicas ou religiosas.
Finalmente, o quarto e último tipo, não representa um terrorismo materializado, mas uma espécie de
percepção pânica ou “ansiedade global”. Trata-se de uma gigantesca orquestração, manipulando o sentimento
de insegurança das populações, em uma época de crise e incertezas. Seu objetivo é o de criar um consentimento
a medidas repressivas, que, basicamente, implicam perseguição de opositores, simplesmente rotulados de
terroristas, justifica a supressão de direitos civis e o desencadeamento de guerras.

O 11 de setembro e a reação da Guerra Infinita de Bush


Na manhã de 11 de setembro de 2001 o mais fantástico atentado terrorista da história atingia pela primeira
vez o território metropolitano americano, golpeando os maiores símbolos do poder financeiro e militar dos EUA
(e do Ocidente).
As evidências da responsabilidade do mega atentado terrorista apontavam para a organização Al Qaeda,
liderada pelo saudita Bin Laden, e para o regime talibã do Afeganistão que lhe dava abrigo. Apoiando-se na
comoção mundial e definindo que “quem não está conosco está contra nós”, Bush desencadeou a guerra ao
terrorismo, que teve como primeiro alvo o Afeganistão.
Este acontecimento sangrento e, ao mesmo tempo, impactante, marcou o início do século XXI e do Terceiro
Milênio, e faz com que a chamada “Síndrome do declínio do Império Romano” esteja silenciosamente se
instalando no coração dos americanos.
Os EUA necessitavam atacar o Afeganistão, mas, por incrível que pareça, o Pentágono não tinha um estudo
preparado para esta eventualidade. Foi o diretor da CIA que aproveitou ocasião, adaptando às pressas planos
anteriores para preparar a intervenção. Assim, foi a CIA, e não o Pentágono, que ocupou a posição central nos
rumos da guerra. Ainda no final do mês, forças especiais (americanas e inglesas) já ocupavam territórios afegãos
a partir do Paquistão.

Intervenção, ocupação e resistência no Afeganistão


A operação de invasão dependia de alguns arranjos diplomáticos, basicamente fazer o Paquistão abandonar
sua aliança com o regime Talibã. Era necessário também, para poder acessar o Afeganistão pelo Norte (onde se
encontrava a resistência), ter autorização dos Estados da Ásia Central para cruzar o território e estabelecer
bases, o que envolvia negociações com a Rússia e a China.
A situação interna do Afeganistão, que já era terrível para a população, devido à incapacidade administrativa
do Talibã e as secas que assolavam o país, se tornou ainda pior com os massivos bombardeios de mísseis e
bombardeios B-52, gerando destruição e migrações internas.
A Resolução 1.386, aprovada pelo Conselho de Segurança da ONU ainda em dezembro de 2001, autorizou
o estabelecimento de uma Força Internacional de Assistência para a Segurança (ISAF) pelo período de seis

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meses para auxiliar o governo interino do Afeganistão na manutenção da segurança de Cabul e da área
circundante.
Em 22 de dezembro, Hamid Karzai tomou posse como Primeiro-Ministro de um governo de coalizão, que
tinha a responsabilidade de trazer paz e estabilidade para o país destruído.
Não ocorreram os prometidos investimentos em reconstrução e desenvolvimento, com a atenção se
voltando ao Iraque e o Afeganistão considerado sob controle, apesar de Bin Laden e o mollah Omar não
haverem sido encontrados. A falta de infraestrutura de transporte, armazenamento e irrigação, além de campos
minados que impossibilitam a agricultura e dificultam o pastoreio assolaram o país.
Acreditando já controlar o país, os EUA começaram a retirar parte de suas forças para enviá-las ao Iraque.
Em pouco tempo se formou uma insurgência, denominada de neotalibã, especialmente no Sul e Leste do
Afeganistão, onde era possível cruzar a fronteira paquistanesa e buscar refúgio nas áreas tribais, habitadas
também por pashtus.
Com a incapacidade financeira e administrativa do governo interino do Afeganistão em estimular
economicamente e construir estabilidade social e política no país, foram criadas, ainda em 2022, as Equipes
Provinciais de Reconstrução (EPRs): unidades civil-militares que operam ao nível provincial e que são lideradas
cada uma por um Estado-membro da ISAF. O objetivo central dessas unidades seria o de conduzir operações
centradas em governança, reconstrução e desenvolvimento, ou seja, tentar ganhar a confiança da população a
partir também de meios não militares.
Em 2004, após a consolidação da OTAN em Cabul, foi adotada uma nova constituição, e eleições
presidenciais foram realizadas. A Constituição do Afeganistão mantém o Islã como religião oficial, mas agora
permite a liberdade de expressão e prática de outras crenças. Hamid Karzai foi eleito presidente nas eleições
de outubro-novembro de 2004. Um ano depois foram realizadas eleições parlamentares.
Há uma descentralização do poder político real do Afeganistão. Segundo Khanna (2008) “o orçamento do
Afeganistão é quase todo assegurado por ajuda ocidental, mas a maior parte dessa assistência é gasta, na
verdade, com despesas gerais, segurança e salários, perdendo-se boa parte do restante no ralo da corrupção.
Enquanto os EUA e a Rússia promovem ajuda financeira, cooperam no campo da contrainsurgência e no
combate ao narcotráfico, a China trilha outros caminhos. Com poderosas reservas para investimento, o país
abre a chamada “Nova Rota da Seda”, em um processo de desenvolvimento rápido das bases da integração
econômica da Ásia Central.
À medida que a OTAN vai retirando suas tropas, o Afeganistão, assim como o Paquistão, busca aproximar-
se das potências regionais que lhe oferecerem maiores benefícios, e a Organização para a Cooperação de Xangai
(OCX) pode oferecer a proteção de que precisam. Em 2005 foi criado um Grupo de Contato na OCX para dar
apoio ao Afeganistão na sua reconstrução.
Enquanto as eleições presidenciais (2009) e parlamentares (2010) ocorrem de forma tumultuada, a OTAN,
em encontro em Lisboa, anuncia plano de entregar a tarefa da segurança interna às forças afegãs em 2014.

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Antes, porém, tiveram de enviar mais tropas ao país, pois os insurgentes neotalibãs estavam ganhando terreno,
enquanto outros países começavam a abandonar a coalizão e retirar suas tropas da infindável guerra.
O que foi pensado como uma guerra rápida e fácil se tornou um conflito sem fim, onde até o Talibã já é
aceito pelos EUA como interlocutor. A morte de Bin Laden pelas forças especiais americanas próximo à capital
paquistanesa, envolta ainda em mistério, parece ter sido um excelente trunfo para Obama, quando ele
anunciava a retirada da região para breve.

4.2 – A invasão do Iraque, o Irã e a nova geopolítica do petróleo


A invasão anglo-americana do Iraque e a insurgência
A partir de 2000, o Iraque passou a recuperar seu protagonismo internacional com a visita do presidente
venezuelano Hugo Chávez, a reabertura das embaixadas do Egito e Turquia, a normalização com a Síria (e a
reabertura do oleoduto fechado em 1982) e a participação iraquiana na Cúpula da Liga Arábe, no Cairo, e na
Cúpula Islâmica, em Doha. Ao mesmo tempo, os constantes ataques americanos passaram a ser condenados
por governos árabes, europeus e dos demais membros do Conselho de Segurança (exceto a Inglaterra), além
de serem retomados os voos político-humanitários de vários países.
O Governo Bush desejava atacar o Iraque devido, especialmente, a problemas internos dos EUA (crise
econômica, necessidade de aumentar os gastos armamentistas e perda de credibilidade da Guerra ao
Terrorismo), bem como geopolíticos (Ásia Central, Irã e Afeganistão). Com relação a este último aspecto, o Irã
constituía o verdadeiro alvo e ficaria completamente cercado por países pró-americanos, se o regime de
Saddam caísse. Contudo, a aposição europeia, árabe e dos demais membros do Conselho de Segurança (mesmo
a Inglaterra) a essa iniciativa belicosa era cada vez maior.
O Governo Bush, motivado pelos acontecimentos de 11 de setembro de 2001, lançou em setembro de 2002
o primeiro Plano de Segurança Nacional, documento no qual são explicitadas a Doutrina Bush e a definição de
ameaça à segurança estadunidense. Segundo a Doutrina, uma ameaça seria definida pela combinação de
radicalismo e tecnologia. Como repetiu diversas vezes o então Secretário de Defesa Donald Rumsfeld, se esses
movimentos fossem apoiados ou protegidos por Estados soberanos. Esses Estados foram definidos como
“Estados Párias”. O Iraque foi incluído, junto do Irã e da Coreia do Norte, nessa classificação formando o “Eixo
do Mal”.
Após a Guerra do Golfo, uma série de resoluções das Nações Unidas determinaram que o Iraque estaria
proibido de possuir ou desenvolver armas de destruição em massa. Os últimos relatórios da equipe de
inspetores não encontraram armas de destruição em massa, sejam nucleares ou biológicas, e informaram que
o Iraque estava de fato cooperando com as inspeções. A administração Bush, entretanto, alegando que o Iraque
possuía arma químicas e biológicas e capacidade para atacar os EUA, iniciou uma série de manobras políticas
que culminaram numa decisão, assinada em outubro de 2002, na qual o Congresso dos EUA autorizava o
presidente a conduzir uma ofensiva militar contra o Iraque.

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No Conselho de Segurança das Nações Unidas, os EUA e do Reino Unido tentaram aprovar uma resolução
permitindo operações militares no Iraque, porém enfrentaram a oposição de países como Rússia e França.
O Governo Bush, entretanto, já havia decidido unilateralmente pela invasão, e em meados de julho de 2002
enviou uma equipe de elite do Exército, apoiada por um grupo da CIA, para preparar a chegada das tropas
convencionais. Em março de 2003 o Presidente Bush enviou um ultimato ao Iraque, dizendo que iniciaria o
ataque se Saddam Hussein e seus filhos não deixassem o Iraque em 48 horas.
As tropas de coalizão iniciaram o ataque pela Península de al-Faw, no Sudeste do Iraque, região considerada
estratégica por possuir campos de petróleo e ser quase desabitada, para evitar que as instalações fossem
destruídas, enquanto uma terceira força dos EUA avançou para Oeste com o intuito de atingir Bagdá.
Em menos de dois meses após o início da invasão as tropas estadunidenses já haviam controlado Bagdá e
derrubado o regime. O período imediato pós-invasão foi marcado pela busca e captura dos antigos líderes do
Partido Baas, pelo início das tratativas entre a coalizão muntinacional, líderes locais e exilados e as Nações
Unidas para a formação do governo de transição. Mas também houve duas formas de resistência militar, uma
advinda dos apoiadores do antigo governo ainda não capturados e outra de militantes extremistas islâmicos,
grande parte dos quais vindo do exterior.
A captura de Saddam Hussein finalmente aconteceu em dezembro de 2003, quando os americanos o
encontraram num esconderijo perto de Tikrit, sua cidade natal. Neste ano também, o representante especial
da ONU, o brasileiro Sérgio Vieira de Mello, que se opunha a muitos itens da agenda americana para o Iraque,
foi morto quando um caminhão com explosivos destruiu a sede da ONU. A pergunta que se deve fazer numa
situação como esta é: a quem interessava sua morte?
O início de 2004 foi marcado por novos confrontos com grupos insurgentes e uma escalada de violência,
marcada por ataques a bomba nas principais cidades do Iraque e pela morte de milhares de civis.
Sequestro de pessoas pelo mundo, voos ilegais e centros de tortura clandestinos em países europeus,
abusos e violências contra a população civil, com matanças por equívoco (festas de casamento confundidas
com “insurgentes”) esvaziaram completamente o discurso de defesa dos direitos humanos.
A eleição do novo Governo de Transição ocorreu em 2005, e apesar de ter sido boicotada pelos partidos
sunitas e marcada por conflitos, obteve relativo sucesso e acabou sendo vencida por Ibrahim al-Jaafari. O
embate político continuou até o início de 2006, quando Nourial-Maliki foi indicado Primeiro-Ministro e os
partidos entraram em acordo sobre o gabinete, que ficou composto por membros de partidos curdos, sunitas
e xiitas.
Em dezembro de 2006, após um longo julgamento, o Tribunal Especial do Iraque sentenciou Saddam Hussein
à morte pelo assassinato de 148 xiitas iraquianos na cidade de Dujail, em 1982. Imagens não oficiais da execução
foram transmitidas pelo mundo, provocando problemas diplomáticos.
Em depoimento ao Congresso dos EUA, em 2008, o General Petraeus pediu que os líderes estadunidenses
adiassem a retirada de mais soldados do Iraque, pois o fim do conflito ainda não estava próximo. Mais tarde,
um relatório assinado pelo General William Wallace iria reconhecer que o Exército dos EUA, apesar de ter

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capacidade para retirar Saddam do poder no Iraque, não era suficientemente equipado e preparado para
conduzir a reconstrução do país.
Em 2009 começaram a ser tomadas medidas para restaurar a autoridade plena do governo interino do
primeiro ministro Nourial-Maliki, como a entrega do controle da Zona Verde de Bagdá e do antigo palácio
presidencial de Saddam Hussein ao governo iraquiano. O cenário político também obteve algumas melhoras
com um relativo sucesso das eleições para os conselhos provinciais, as quais ocorreram com um baixo nível de
violência e com menor participação das forças americanas.
Em fevereiro de 2009, o recém-empossado Presidente dos EUA, Barack Obama, anunciou que o fim das
operações militares estadunidenses no Iraque se daria em agosto de 2010. Em abril o Primeiro-Ministro Gordon
Brown anunciou o término das operações britânicas no Iraque, e a retirada das tropas dos EUA, inclusive de
Bagdá, iniciou-se em julho. O início da retirada das tropas, entretanto, não foi acompanhado pela redução da
violência. O dia das eleições parlamentares gerais, 7 de março de 2010, foi marcado por mais atentados em
Bagdá, mas 62% dos iraquianos votaram.
O anúncio oficial do Presidente Barack Obama que determinou o término da Operação Iraque Livre e a
retirada das tropas de combate ocorreu em 31 de agosto de 2011, sete anos depois do início da guerra.

As fraturas na Diplomacia Ocidental e o cerco ao Irã


O candidato Republicano George W. Bush em 2001, foi eleito presidente, em um pleito marcado por
situações contestáveis. O século XXI foi proclamado “o século americano” por algumas personalidades, mas o
novo governo adotou atitudes unilaterais.
Bush passou a ignorar as organizações internacionais, mesmo a ONU, dentro da visão de que “os EUA haviam
vencido a Guerra Fria e deveriam colher os frutos”. A ideia de apoiar a liderança americana nas organizações
multilaterais, tal como vinham fazendo os democratas, foi completamente abandonada, dando lugar a uma
visão unilateral que contrariou seus próprios aliados da OTAN.
A guerra contra o Iraque constituiu um eficaz instrumento para isolar e derrotar posteriormente o Irã, país
aliado da Rússia e da China. O Irã ficou cercado, pois a Leste o Paquistão e o novo regime afegão eram aliados
dos EUA (onde mantinha tropas e bases) e ao Norte o Turcomenistão e o Azerbaijão cooperaram com a OTAN,
recebendo assessores e equipamentos de monitoramento eletrônico. A Oeste havia a Turquia, que é membro
da OTAN e possui bases aéreas americanas, e o Iraque, sob ocupação direta. Além do seu ativo nacionalismo e
recursos petrolíferos serem visados pela diplomacia ocidental, o Irã é considerado o melhor trajeto para o
escoamento rentável e seguro de petróleo e do gás da Ásia Central.
Ainda durante a guerra no Afeganistão autoridades americanas declararam que outros países
representavam também uma ameaça à América, devendo ser invadido, o que inquietou a opinião pública e os
meios diplomáticos. O Eixo do Mal, como o Presidente Bush o caracterizou em sua expressão religiosa, era
constituído por Irã, Líbia, Síria, Coreia do Norte e, até mesmo, Cuba.

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Concretamente, a administração Bush desejava obter uma condenação da ONU ao regime iraquiano para
depor Saddam Hussein como parte da guerra ao terrorismo. Contudo, a França, a Alemanha e a Rússia, com
apoio da China (o Eixo da Paz), recusaram-se a aceitar a guerra sem que os inspetores concluíssem as
investigações e obtivessem provas.
Obviamente que a posição russa, francesa e alemã não se baseavam apenas em aspectos éticos e jurídicos.
O embargo ao Iraque estava em rápida erosão, e as companhias petrolíferas destes e de outros países já
negociavam contatos com Saddam. Ademais, a posição internacional dos mesmo também estava sendo
ameaçada pelo unilateralismo americano.

A Nova Geopolítica Eurasiana do Petróleo


Trata-se de uma reação para evitar uma tendência histórica que emerge lentamente, a de construção de um
sistema mundial multipolar, regulado pela ONU, em um quadro de equilíbrio de poder entre Estados
Unidos/NAFTA, União Europeia, Rússia/CEI, Japão/Tigres Asiáticos, China, Índia/SAARC, Irã, África do Sul/SADC
e Brasil/Mercosul/UNASUL, como assinalou o politólogo brasileiro Hélio Jaguaribe. Os blocos econômicos
constituem o principal resultado da globalização, e estão se tornando blocos político-econômicos.
O fim da Guerra Fria e da URSS fizeram com que os “muros” que compartimentavam a Eurásia
desaparecessem, e um processo no qual a economia asiática crescia aceleradamente, demandando petróleo
do Oriente Médio, enquanto a Europa dava sinais de buscar maior autonomia. Assim, a massa terrestre
eurasiana ia deixando de ser uma expressão puramente geográfica, para se tornar um gigante geoeconômico e
geopolítico que concentra o dinamismo econômico e populacional mundial, num contexto de rápido
crescimento dos fluxos regionais.

4.3 – Da estagnação israelense à “Primavera Árabe”: a transformação


A estagnação israelense
O governo de Ehud Barak (1999-2001) foi caracterizado pela tentativa de manter um difícil balanço entre a
Esquerda e a Direita. O principal mecanismo utilizado para manter o apoio da Direita era uma política de não
impor restrições à expansão de assentamentos nos territórios ocupados. Contudo, esta política também
agravou as frustrações de palestinos, que se tornam crescentemente céticos quanto ao processo de paz.
Enquanto Arafat fazia referência à capacidade do Fatah de lançar um ataque militar caso necessário, Sharon
adotava um discurso crescentemente belicoso.
A provocação do General Sharon (em visita à esplanada das mesquitas, em setembro de 2001), desencadeou
uma onda de violência – a segunda Intifada – que deixou um saldo de mais de uma centena de mortos e
milhares de feridos, a maioria palestinos.
Essa estratégia visava demonstrar que o custo da manutenção do status quo seria altíssimo para os
israelenses, e era orientada pela ANP. Arafat, também isolado e tentando tirar o máximo que os democratas

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americanos seriam capazes de oferecer nas vésperas da eleição americana, também se aproveita do levante
para tentar avançar.
A segunda Intifada representou uma verdadeira guerra urbana latente, que lembra a que o Exército
israelense enfrentou no Líbano, nos anos 1980. A insegurança e o elevado número de vítimas que produz gera
uma situação de tensão extrema para ambas as partes. Contudo, esse confronto reforça o desgastado poder
de Arafat e une os palestinos em torno dele. Cabe lembrar que foi governo direitista de Menachen Begin quem
negociou os acordos de Camp David no fim dos anos 1970, devolvendo a Península do Sinai ao Egito em troca
de reconhecimento diplomático. A aceitação de um estatuto nacional aos palestinos é a condição para o
estabelecimento de relações entre Israel e seus vizinhos.
A paz conservadora que era tentada na região, muitas vezes impulsionada de fora para dentro, só poderá
subsistir com uma profunda reforma social e com a integração das economias locais, atenuando assim, além
das desigualdades sociais, as nacionais.
A violência Israel-Palestina se desenvolve em uma espiral ascendente, em um aprofundamento calculado,
com um objetivo claro: eliminar a ANP, chefiada por Yasser Arafat e, como consequência, produzir a
inviabilização, de fato, dos Acordos de Oslo.
Eliminar Arafat e a ANP traria que benefícios? Que interlocutor seria colocado em seu lugar? Anulando-se o
processo de paz, o que fazer com a população palestina? Expulsá-la do territórios e construir novos
assentamentos para colonos israelenses? Não podemos nos esquecer que estas são alternativas que complicam
o problema, pois a queda de Arafat só deixaria aos palestinos o Jihad e Hamma fundamentalistas e terroristas.
Estes só pararam de crescer quando a paz avançou: portanto, Arafat é seu inimigo.
Dando sequência ao impasse, a decisão de construir uma cerca inexpugnável e um muro de concreto (o
Muro Protetor), separando os palestinos de Israel, como meio de deter a onda de atentados suicidas, de certa
forma chocou o mundo.
Tentando retomar a ofensiva política na região, o Presidente Bush formalizou seu plano de paz, que parecia
fazer certas concessões aos israelenses, como questionar a legitimidade de Arafat como líder palestino e manter
certo controle internacional sobre as finanças e polícia palestinas. Os Estados árabes foram instados a
normalizar as relações com Israel e a reprimir as organizações terroristas, enquanto Israel é pressionado a
retirar-se de áreas recentemente invadidas, liberar o direito de ir e vir dos palestinos (entre os segmentos dos
territórios que a ANP controla) e repassar o dinheiro bloqueado.
Em 2003 foram realizadas novas eleições legislativas. O Likud mantém sua liderança, com Sharon à sua
frente. Ao mesmo tempo, pressões ocidentais favoráveis a Mahmoud Abbas por suas posições contrárias à
manutenção da Intifada fazem com que este seja apontado Primeiro-Ministro da Autoridade Palestina,
enquanto o Hamas conquista crescente apoio da população mais favorável à luta armada.
Ainda em 2003 o Quarteto para o Oriente Médio (ONU, EUA, União Europeia e Federação Russa) publica o
Mapa do Caminho para a paz, com propostas de etapas a serem seguidas. No mesmo ano foi feita a Iniciativa
de Genebra, um modelo para um acordo de paz incorporando diversos elementos de propostas anteriores.

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No final de 2004, Arafat morre, e em 2005, Mahmoud Abbas é eleito Presidente da Autoridade Palestina,
tentando controlar diplomaticamente a ação de outros grupos palestinos e trazer o fim da Intifada. No mesmo
ano, o Governo Sharon implementa a evacuação unilateral de todos assentamentos em Gaza, e quatro outros
assentamentos no Norte da Cisjordânia.
No início de 2006, Sharon sofre um derrame e fica incapacitado, com Ehud Olmert sendo apontado Primeiro-
Ministro interino. Em julho de 2006, uma escaramuça na fronteira Norte de Israel com o Hezbollah e o sequestro
de dois soldados provoca uma escalada, resultando em uma campanha aérea seguida de invasão terrestre do
Sul do Líbano. O Exército israelense se retira quando consegue negociar o retorno dos dois soldados
sequestrados. Contudo, seu desempenho durante o conflito é percebido como desapontador, sendo este
considerado uma derrota israelense. Resulta disso uma crise política, com a confiança no Governo Olmert
caindo intensamente.
As tensões internas do governo da ANP resultam na ruptura entre Hamas e Fatah em 2007, este retendo
controle sobre a Cisjordânia e aquele consolidando sua autoridade sobre a Faixa de Gaza. Nos meses seguintes,
além da adoção de medidas rigorosas de bloqueio contra os territórios controlados pelo Hamas, houve diversos
incidentes transfronteiriços nos arredores da Faixa de Gaza. Causando crescente tensão entre o governo
israelense e o Hamas. Na metade de 2008 houve um acordo de cessar fogo entre ambas as partes, mediado
pelo Egito, com duração estipulada de dois meses. Conforme a trégua se aproximava do fim, houve uma
retomada de agressões.
Teve início então a Operação Chumbo Fundido de Israel, que tinha como objetivo, de acordo com o
Ministério de Relações Exteriores de Israel, “dar um duro golpe contra a organização terrorista Hamas,
fortalecer a capacidade de dissuasão de Israel, e criar uma situação securitária melhor para aqueles que vivem
próximos da Faixa de Gaza.
No dia 17 de janeiro, as forças israelenses anunciaram um cessar-fogo unilateral, afirmando já ter atingido
seus objetivos militares, e no dia seguinte, o Hamas anunciou um cessar-fogo de uma semana, exigindo a
retirada das tropas israelenses, que foi concluída no dia 21 de janeiro.
Ao longo de 2009 e 2010, processo importante foi o crescente distanciamento entre o governo dos EUA de
Barack Obama e o governo de Netanyahu, com uma atuação percebida como intransigente. Em 2010, em
particular, os EUA, com o apoio do Egito e da Jordânia, lograram que os governos de Abbas e Netanyahu
voltassem às negociações diretas. Contudo, quando Netanyahu não prolongou um congelamento de expansão
dos assentamentos israelenses, as negociações foram interrompidas.
A chamada Primavera Árabe causa certa tensão em Israel, ao se contatar o fim do governo de Mubarak, no
Egito, com o futuro do acordo de paz sendo colocado em dúvida por alguns políticos, especialmente dado o
desempenho da Irmandade Muçulmana nas eleições egípcias no final de 2011.
Em 2011 houve ainda uma onda de protestos e greves contra o governo em Israel, cujas principais queixas
são os altos custos de vida, principalmente de aluguéis, no país. A esquerda tem buscado utilizar estes
movimentos para revitalizar sua posição no espectro político nacional. Outra questão foi a inédita conclamação

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do Presidente Peres à sociedade israelense para que saísse às ruas em protesto pelos crescentes atos
obscurantistas dos judeus ultraortodoxos (fundamentalistas) contra o comportamento liberal e laico de outros
setores da sociedade.

As muitas faces da Primavera Árabe


A inédita onda de protestos que varreu o mundo árabe desde dezembro de 2010 deixa no ar uma questão
crucial: ele ingressa numa nova era de superação de regimes autoritários, ou vive mais de uma se suas
periódicas explosões de ira? Sem dúvida há uma crise geral, uma explosão semelhante à Primavera dos Povos
europeia de 1848, mas, como naquele caso, em cada país há uma realidade e motivação específicas.
Teoricamente, tudo teve início na pequena vila tunisiana de Sidi Bouzid, localizada 265 km ao sul de Tunis,
quando Mohamed Bouazizi, um jovem de 26 anos, graduado, porém desempregado, vendia legumes na rua
para sustentar a família. Uma história igual à de milhões na região. A polícia, entretanto, o proibiu de vender e
o humilhou. Desesperado, ele ateou fogo em seu corpo em 17 de dezembro de 2010 e veio a falecer em 4 de
janeiro de 2011. Milhares de pessoas compareceram ao funeral e os protestos se espalharam, concentrando-
se na Avenida Burguiba, no centro de Tunis, sob o slogan “dégage (popularmente, “cai fora”), endereçado ao
Presidente Zine el-Abidine Bem Ali, há 23 anos no poder.
Os protestos atingiram então o Egito, o mais populoso país árabe, produzindo semanas de protestos, que
causaram a renúncia de Mubarak, o estabelecimento de um Governo Provisório tutelado pelos militares e,
finalmente, a eleição de um presidente da Irmandade Muçulmana em 2012. Mas sua política interna e externa
foi errática e as manifestações foram retomadas, culminando com um golpe militar em julho de 2013, que
instalou um novo Governo Provisório, seguindo-se nova onda de violência.
Nas monarquias constitucionais do Marrocos e da Jordânia, a onda de protestos da Primavera Árabe foi
contida por reformas iniciadas anteriormente e pelo apoio Ocidental aos regimes governantes, que ocupavam
posições geopolíticas estratégicas. Nas petromonarquias da Arábia Saudita, Kuwait, Qatar, Emirados Árabes
Unidos e Omã, uma combinação de repressão, concessões econômicas e apoio Ocidental levaram à contenção
dos protestos, sendo o caso mais sério o do Reino Saudita.
Em três países os protestos degeneraram em guerras civis extremamente violentas: Líbia, Iêmen e Síria (com
prolongamentos no Líbano). Na Líbia, após semanas de perplexidade com a revolta eclodida em Benghazi (com
elementos do próprio regime), Kadafi reagiu e, quando avançava sobre os rebeldes, houve intervenção da OTAN
(especialmente anglo-francesa, com força aérea, armas, dinheiro e unidades de elite). Após nove meses de
combates, Kadafi foi assassinado após se render e implantado um novo governo pró-ocidental.
No Iêmen, após quase um ano de violências localizadas, o Presidente Salleh renunciou, num pacto que
manteve seu grupo no poder. Para tal desfecho contribuiu a divisão da oposição e o apoio do Ocidente e das
Petromonarquias. Mas a instabilidade ainda prossegue, com atentados.
Mas na Síria, onde o regime parecia capaz de conter os protestos da oposição e de grupos comunitários,
houve uma escalada, com apoio explícito de nações europeias (Inglaterra e França, especialmente), bem como

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das petromonarquias aos revoltosos. A continuidade do conflito interessa aos EUA e Israel, pois desgasta o Irã,
um dos principais apoiadores militares da Síria.
Na Argélia, os protestos foram débeis, num país já cansado de uma guerra civil que iniciara em 1992. A
Turquia, que tentou ser mediadora, modelo para novos regimes e, depois, líder da região, aliando-se ao
Ocidente, passou a conhecer sua onda de protestos internos em meados de 2013, abrindo-se nova frente de
instabilidade. Já o Irã, surpreendentemente, com protestos e sanções ocidentais, logrou realizar eleições, com
a vitória de um candidato moderado em 2013. O país, apesar de tudo, mantém certo equilíbrio e capacidade
de negociação.

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Parte II: A Diplomacia Contemporânea


dos Estados do Grande Oriente Médio
Capítulo 5
Os Estados Pivôs do Machrek Árabe

5.1 – O Egito, o Iêmen e a Liga Árabe

Egito
A revolta iniciada na Tunísia logo atingiu o Egito, nação com 1 milhão de quilômetros quadrados e oitenta
milhões de habitantes, que ocupa uma posição estratégica entre a África e a Ásia/Oriente Médio, e é o país
mais povoado da região. Trata-se de um dos poucos países árabes a ter relações diplomáticas e comerciais com
Israel.
As Forças Armadas têm sido o principal pilar do poder desde que se implantou a república e, 1952, por meio
de um golpe de Estado que levou Nasser ao poder. Sadat, que o sucedeu após sua morte em 1970, e Mubarak,
que assumiu quando este foi assassinado em 1981, foram militares, assim como Nasser.
Houve pressão internacional para que Mubarak encontrasse uma solução e a nomeação do chefe da
inteligência, General Omar Suleiman, à vice-presidência vaga desde 1981 foi reveladora. Mubarak buscava
apoio do Exército para a manutenção temporária do poder e a preparação de uma transição pactuada
envolvendo personalidades consideradas pelo povo como não corrompidas.
A formação de uma ampla aliança de forças opositoras, que teve inicialmente como porta-voz El Baradei
demonstrou uma tentativa de criar um pólo com poder de negociar uma transição desde fora do regime de
Mubarak. Mas ele dificilmente falaria em nome dos islâmicos, que o veem como um “homem do Ocidente”,
apesar de não corrompido.

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A crise do Egito e de outros países árabes não era apenas política, mas também econômica. Em todos os
países afetados por turbulências políticas houve um forte aumento nos preços dos alimentos, combustíveis e
serviços. Isto decorreu de um aumento mundial, mas foi potencializado pela crise econômica dos EUA e da
Europa, que demandam aos demais países “sacrifícios e ajustes”, que eles mesmo não fazem. A falta de turistas
ampliou a crise interna, afetando a região e, por extensão, os mercados financeiros.
A pressão americana pela renúncia de Mubarak deveu-se ao temor de ver emergir no Egito um duplo poder,
o do Estado e o das ruas, que precede as revoluções. Isso já estava acontecendo, pois o governo não mais
governava, a economia estava paralisada e as forças políticas, após décadas de inércia, ganhavam um
dinamismo imprevisível.
A renúncia do Presidente Hosni Mubarak, em 11 de fevereiro de 2011, foi resultado da pressão popular, mas
também americana e das Forças Armadas, por distintas razões. A multidão que saiu às ruas e se concentrou na
Praça Tahir (Libertação) desejou não apenas a saída do homem que governou o país com “mão de ferro” por
três décadas, mas também o fim do seu regime autoritário e da corte de favorecidos que controlava a economia.
Queria também a melhoria do nível de vida. Já os Estados Unidos desejavam um novo governo que satisfizesse
(ou ao menos acalmasse) os egípcios, sem comprometer a estabilidade da região.
Com a crise de 2008 nos EUA e na Europa, o país foi duramente atingido. Mubarak havia suspendido sua
política de redução de subsídios energéticos, ocasionando um novo aumento nos preços. Houve uma
significativa de capitais no segundo semestre de 2008 e um considerável reforço do dólar.
No tocante à política externa, Mubarak vinha demonstrando autonomia crescente. Com a retomada do
conflito entre Israel e Palestina, no final de 2008, a posição egípcia foi de apaziguamento, crítica aos ataques a
Gaza e tentativas de cessar-fogo a Gaza e tentativas de cessar-fogo duradouro.
Uma das questões mais críticas para o Egito são os constantes conflitos no Chifre da África e, principalmente,
no Sudão e na Somália. Devido à proximidade geográfica e a questões geopolíticas, como a distribuição de
recursos hídricos da região, o Egito não pode ignorar seus vizinhos do Sul pelo risco de instabilidade que tal
representaria para a região. O advento das ações de pirataria, que perturbam a navegação na conexão entre o
Mar Vermelho e o Oceano Índico, representa um problema para o Egito.
As relações entre a União Europeia e o Egito, por sua vez, se baseiam em um acordo de associação, que
passou a vigorar em 1º de junho de 2004. O Egito teve livre acesso para suas exportações industriais para a
União Europeia, enquanto as exportações da EU se baseavam na cláusula de Nação Mais Favorecida.
Mubarak mantinha excelentes relações com Washington, tanto em termos políticos como econômicos, pois
os EUA eram os maiores parceiros comerciais do Egito. Washington via o Egito como um forte aliado estratégico.
Contudo, na última década, os Estados Unidos vinham diminuindo significantemente a assistência prestada ao
Egito.
Ademais, a contínua expansão da economia egípcia, com tentativa de aumentar as exportações aos EUA e
a relutância do Cairo em se sujeitar às condições americanas, além da tendência autonomista egípcia,
contribuíram para esse redução.

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O Egito visava, então, a uma aproximação cada vez maior com as economias emergentes, tanto em termos
de cooperação política quanto de interação. A aproximação com o Brasil era cada vez mais perceptível. No final
do mês de dezembro de 2009, o ministro do Exterior egípcio, Ahmed Aboul Gheist, e o ministro de Relações
Exteriores brasileiro, Celso Amorim, se reuniram no Cairo visando à consolidação das relações bilaterais e à
coordenação sobre diversas questões de prioridade comum tanto no âmbito regional, quanto no internacional.
Há dez anos, a política externa regional egípcia atingiu um ponto de inflexão. Parou de sustentar grupos
rebeldes e insuflar conflitos nos países vizinhos para tentar assegurar a hegemonia regional e o quase
monopólio da exploração das águas da Bacia do Nilo. Por volta de 2000, o Cairo passou a lançar mão da
mediação diplomática como forma de resolução de conflitos no continente africano.
No plano interno, a lentidão da transição política promovida pelo Governo Provisório após a renúncia de
Mubarak levou à ocorrência de novos protestos – dessa vez, menos intensos – de julho a outubro de 2011. As
eleições, consideradas justas por observadores internacionais, foram realizadas em três fases, entre novembro
de 2011 e janeiro de 2012. A prioridade da Assembleia era selecionar os membros que iriam redigir uma nova
Constituição, visto a anterior ter sido suspensa pelos militares em fevereiro de 2011, a ser submetida a um
referendo antes das eleições presidenciais.
Em junho de 2012, as primeiras eleições presidenciais democráticas do Egito seguiram as tendência das
legislativas, a Irmandade Muçulmana elegeu Mohamed Morsi como Presidente do Egito.
A tensão do governo com as forças opositoras ganhou novo ápice, em dezembro de 2012, com a aprovação
em referendo da Nova Constituição do país. A nova Carta foi escrita por uma assembleia constituinte dominada
pelo partido do governo e foi percebida pela oposição como incapaz de garantir os direitos das minorias do
país.
A situação acabou resultando em novas manifestações populares, que tomaram as ruas do Egito, contrárias
à restrição de liberdade de expressão, ao maior papel do Islã e da Irmandade Muçulmana no governo e à
tentativa de limitar o papel do Judiciário, que caracterizaram o Governo Morsi, em meio a sua incapacidade em
superar a paralisia decisória e avançar em uma reforma política.
Na esfera da política externa, Morsi trouxe a ideia do Egito novamente conquistar uma posição de destaque
na região, também com um programa de maior diversificação de relações, as quais incluíam aproximações com
o Irã, o Hamas, além de mais destaque à África. Isso, entretanto, foi constrangido pelos problemas internos,
bem como pela falta de recursos disponíveis, deixando o país dependente dos parceiros econômicos
tradicionais (Estados Unidos e União Europeia).
Em junho de 2013, milhões de pessoas foram às ruas, propiciando, após um ultimato de 48 horas dado a
Morsi pelos militares, sua deposição e a nomeação do presidente interino Adly Mahmud Mansour. Era
derrubado, então, o primeiro presidente egípcio eleito pelo sufrágio universal, e o primeiro islamita. O General
Abdul Fatah Al-Sisi, chefe das Forças Armadas e então ministro da Defesa, grande arquiteto do golpe, suspende
a Constituição e promete novas eleições até o final do ano. A repressão do novo governo sobre partidários de
Morsi foi imediata, com a morte de 80 pessoas. Em agosto de 2013, novos protestos pró-Morsi acabam com a

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morte de mais de 600 civis e, após, é instaurado o estado de emergência, com toque de recolher durante a
noite.
A defesa de um “processo de transição plenamente inclusivo, abrangendo todos os grupos políticos,
inclusive a Irmandade Muçulmana” é defendida pela EU e os EUA parecem apoiar, discretamente, o novo
governo, esperando que as promessas de eleição sejam cumpridas. Caso os EUA assumissem que o fato
consumado foi de fato um golpe de Estado, sua legislação interna o compeliria a cortar a ajuda externa ao Egito.
Por fim, é importante analisar o impacto do fato ocorrido no Egito sobre as forças político-islâmicas.
Participando do jogo democrático e das eleições em vários países da região, diversos grupos e partidos políticos
poderão sentir um enfraquecimento de sua posição após o golpe egípcio contra a Irmandade Muçulmana.
Ainda. Grupos jihadistas mais radicais podem aproveitar para interpretar a derrubada de Morsi como sendo
infrutífero participar do sistema político, aproveitando a oportunidade para legitimar um discurso de luta
política armada como única alternativa ao poder.

A Liga Árabe
A Liga dos Estados Árabes é uma organização intergovernamental composta por países que têm a língua
árabe como oficial, sendo formada por 22 países membros: Argélia, Bahrein, Camarões, Djibuti, Egito, Iraque,
Jordânia, Kuwait, Líbano, Líbia, Mauritânia, Marrocos, Omã, Qatar, Arábia Saudita, Somália, Sudão, Síria,
Tunísia, Emirados Árabes Unidos (EAU), Iêmen e Palestina – considerada pela Liga como um Estado
independente.
Criada em 1945 pelos Estados da Síria, Transjordânia – atual Jordânia -, Iraque, Arábia Saudita, Líbano e
Egito, a Liga foi idealizada e incentivada pela Inglaterra em 1942, para aglutinar as nações árabes em uma frente
contra as nações do Eixo, durante a Segunda Guerra Mundial. Seu órgão máximo é o Conselho, que se reúne
ordinariamente duas vezes ao ano e é composto de representantes de cada Estado, e cada membro tem direito
a um voto.
Historicamente, o principal problema enfrentado pela Liga Árabe foi a questão de Israel e Palestina. Desde
seu começo, a Liga se posiciona contra a criação de um Estado não árabe na Palestina. Quando Israel torna-se
independente em 1948, a Liga Árabe torna este seu problema principal, afirmando um sentimento de profunda
injustiça que estava sendo cometida na região do Oriente Médio.
Na esteira desse problema, a guerra de 1967 com Israel trouxe pesadas consequências ao imaginário do
povo árabe, enfraquecendo a ideia de que uma frente unida poderia se opor a Tel Aviv. A Liga passa uma
resolução caracterizada pelos três nãos: não à paz, não às negociações e não ao reconhecimento de Israel.
Entretanto, o estrago será ainda pior após a guerra seguinte, em 1973. É depois dela que o Egito assina os
Acordos de Paz de Camp David com Israel, em 1978. A Liga Árabe interpreta tal ação como uma traição do Egito,
expulsando-o da Liga e impondo-lhe diversas sanções. A ideia da unidade árabe sofre, então, um grande golpe.
Pode-se dizer que, apesar de todos os seus supostos esforços e ações, a Liga Árabe é uma das organizações
regionais que menos conseguiu atingir seus objetivos e que por vezes tornou-se insignificante nos cálculos de

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política externa das grandes potências. Isso se deve principalmente a inúmeros problemas estruturais que a
organização apresenta.
O capítulo 7 da Carta da Liga Árabe estipula que decisões unânimes do Conselho devem ser vinculantes sobre
todos os Estados-Membros da Liga; decisões por maioria devem ser vinculantes apenas para aqueles Estados
que as aceitaram. Em qualquer um dos casos, as decisões do Conselho devem ser efetuadas em cada Estado-
Membro de acordo com suas próprias leis.
Desta forma, a Liga não possui nenhum recurso para quando um Estado-Membro aceita uma decisão da
organização, mas falha em implementá-la internamente. Além disso, a falta de decisões vinculantes e a
necessidade de unanimidade coloca em jogo a efetividade da organização, visto que os Estados-Membros
raramente concordam nos tópicos discutidos.
Outros problemas somam-se aos já citados. A Carta da Liga impede a interferência em assuntos internos dos
Estados-Membros de diversas formas, o que muitas vezes atrasa a organização em momentos em que é
necessário agir rapidamente.
Recentemente, entretanto, a Liga saiu de sua inércia e tomou ações regionais de maior impacto, mais uma
vez em favor do Ocidente. Desde o começo da Primavera Árabe, a organização regional expulsou a Líbia e votou
a favor da imposição de uma zona de exclusão aérea sob seu território, o que pavimentou o caminho para a
operação da OTAN no local. Houve também ações em relação à Síria, que foi suspensa da participação na
organização, além da imposição de sanções econômicas.

5.2 – A Arábia Saudita e o Conselho de Cooperação do Golfo


O Conselho de Cooperação do Golfo (CCG)
O CCG é composto pela Arábia Saudita, Bahrein, Emirados Árabes Unidos (EAU), Kuwait, Omã e Qatar. São
todos países da Península Arábica no litoral do Golfo Pérsico. Foi criado em 1981 com o objetivo securitário,
sendo depois exploradas outras áreas de integração. Todos os Estados-Membros possuem algumas
características em comum: são países árabes e islâmicos, monarquias – constitucionais ou absolutistas, e são
produtores de petróleo.
Houve uma proposta inicial em 1976 formulada pelo príncipe do Kuwait e o sultão de Omã, mas a ideia de
integração apenas se concretizou devido às ameaças externas que surgiam na década de 1980. À época, o
grande perigo aos Estados do Golfo era o Iraque. Temiam constantemente uma ação militar por parte de Bagdá,
regime laico, armado e socializante. Em 1979, a situação piorou ainda mais com a revolução iraniana, que passa
a ameaçar o status quo das famílias reais do Golfo. No mesmo ano ocorre a intervenção soviética ao
Afeganistão, gerando incertezas adicionais pela proximidade de uma superpotência das rotas de petróleo.
Soma-se a isso a eclosão da Guerra Iraque-Irã em 1980, que à época gerava apreensão em relação ao rumo que
tomaria. Assim, em 1981, por motivos securitários, o CCG foi fundado.
Na década de 1980, o grupo apoia o Iraque contra o Irã, mesmo tendo temido Bagdá anteriormente. Depois
da guerra, diversos acordos entre os países do CCG e Washington são firmados. Os diversos acordos com um

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parceiro externo enfraqueceram a possibilidade de uma estratégia conjunta entre os países membros do CCG
para lidar com os problemas da época, o Iraque e o Irã. Além disso, por esta aproximação com o Ocidente,
começa a germinar com mais intensidade a percepção por parte de grupos radicais islâmicos que os países do
CCG se alinhavam com os “impuros estadunidenses”.
A situação se altera em 2003, com a invasão dos EUA ao Iraque. O CCG, que via Saddam como uma ameça,
sentiu-se de certa forma, aliviado em ver seu inimigo deposto. Entretanto, novamente os Estados-Membros
não conseguiram formular uma estratégia para lidar com os efeitos da invasão, com a Arábia Saudita solicitando
a retiradas das bases americanas (que se deslocaram para o Qatar). É adotada uma postura reativa,
respondendo a cada evento surgido.
A ameaça maior aos Estados-Membros foi o aumento das atividades terroristas contra eles, principalmente
contra a Arábia Saudita. Um dos princípios defendidos por Osama Bin Laden, um saudita, para a al-Qaeda era
acabar com a dominação dos interesses ocidentais no mundo árabe.
À medida que percebiam que o Iraque não se constituiria novamente como uma ameaça per se, o CCG vai
mudando de atenção de Bagdá para Teerã, gradualmente surgindo como o principal perigo às petromonarquias
do Golfo. Tal visão é reforçada com a ascensão de Mahmoud Ahmadinejad à presidência, que tinha aspirações
hegemônicas na região.
Em 2005, Teerã parece sentir-se mais confiante, passa a dar apoio material às redes xiitas militantes cujos
interesses convergiam com os seus. O CCG teme, então, a expansão da influência iraniana e o papel que esta
poderia desempenhar fora do Golfo, além da ingerência em países como Líbano (Hezbollah) Síria, Palestina
(Hamas), e dos novos governos xiitas no Iraque (Nouri al-Maliki), no que poderia vir a se tornar um emergente
eixo xiita em oposição ao Ocidente. Apesar disso, os membros do CCG sem uma estratégia comum, optam por
não bater de frente com Teerã.
Mais recentemente, o CCG parece ter aproveitado a oportunidade conjuntural da Primavera Árabe para
traçar uma postura mais agressiva a fim de conter a influência iraniana. Dentro dos países-membros, adotaram
uma postura conservadora, visando manter o status quo dos regimes governantes: utilizaram-se tanto de
generosos incentivos financeiros para setores-chave da sociedade quanto de repressões e intervenções
militares.
Do outro lado está o critério para ação do CCG em relação aos outros países. Na Síria e na Líbia, a organização
agiu de forma oposta ao Bahrein, apoiando os manifestantes e os rebeldes contra os regimes. Destaca-se, nesta
posição, o esforço feito pelo Qatar e pela Arábia Saudita, através de apoio político-militar e recursos financeiros.
No âmbito econômico, o CCG é uma zona de livre-comércio e uma união aduaneira incompleta, visto que o
Bahrein possui um acordo de livre-comércio em separado com os EUA. Há também um mercado comum em
construção, além de planos para uma união monetária. Por fim, no âmbito político, nota-se a não existência de
instituições fortes e/ou supranacionais, não havendo nenhum desejo por parte dos países em ceder sua
soberania. O grupo também pode ser considerado uma espécie de comunidade de segurança, dada a
expectativa de relações não violentas entre os membros.

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Arábia Saudita
A Arábia Saudita é o maior país da Península Arábica, destacando-se perante os outros Estados do Golfo
devido não apenas à sua dimensão, mas também à sua riqueza econômica e em recursos naturais. O misterioso
país, nunca colonizado pelo Ocidente, busca legitimar-se como líder religioso do Islã, pois é protetor de lugares
sagrados como Meca.
O país é uma monarquia absolutista islâmica, com a família al-Saud reinando desde os anos 1920. O atual
governante é o rei Abdullah bin Abdul Aziz, que também ocupa o cargo de Primeiro-Ministro, e todo o sistema
estatal está baseado em lações familiares e de parentesco.
Graças à sua riqueza, a Arábia Saudita conseguiu avançar em direção à modernidade em diversos setores
econômicos, o mesmo não ocorrendo no âmbito das relações sociais. Os imensos recursos financeiros
permitem que o governo selecione elites comerciais e burocráticas em meio à população, que junto da família
real administram e distribuem benefícios sociais para o povo saudita, visando evitar o surgimento de
descontentamento popular.
Membro de grande importância da OPEP, a Arábia Saudita possui as segundas maiores reservas de petróleo
do mundo (17% das reservas mundiais), ficando atrás apenas da Venezuela. Em 2012, foi também o segundo
maior produtor do mundo de petróleo, desta vez perdendo para a Rússia, mas é o país que mais exporta
petróleo. Os lucros provenientes do setor compõem 80% da receita orçamentária nacional, 45% do PIB e 90%
das receitas de exportação.
Com tamanha riqueza e dado seu tamanho, o país ocupa uma posição geoestratégica importante no mundo
e especialmente no Oriente Médio, onde tenta traduzir seus recursos e esforços em uma posição de liderança
regional. Riad, então, desempenha um papel-chave nas relações securitárias do Oriente Médio e,
principalmente, na região do Golfo.
Na região do Golfo, onde Riad visa ter posição de proeminência, surgiram rivalidades entre a Arábia Saudita,
o Irã – sobretudo depois da Revolução Iraniana de 1979 – e o Iraque. Hoje, o maior temor por parte dos sauditas
é o Irã, que depois de ter derrubado o Xá surgiu como uma grande ameaça à estabilidade do regime em Riad –
um dos motivos para, em 1981, a Arábia Saudita ter criado o CCG.
Trabalhando em conexão com as outras monarquias menores do Golfo através do CCG, Riad persegue uma
agenda política a fim de preservar o status quo na península, para a manutenção de sua monarquia absolutista
sunita. A Casa Real Saud teme a possibilidade da expansão da democracia na região, sendo um pesadelo ainda
pior a perspectiva de uma revolução islâmica nos moldes do que aconteceu em 1979 em território iraniano.
Os sauditas encontram-se entre apoiar a política estadunidense contra o Irã e manter algum nível de
relações normais com Teerã. O país, assim o CCG como um todo, não quer estar em uma posição que
automaticamente o envolva em uma guerra entre Estados Unidos e Irã, sendo necessário à casa de Saud manter
certa autonomia e capacidade de manobra.

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A Primavera Árabe – bem como a intervenção militar do CCG no Bahrein contra a população xiita em março
de 2011 – intensificou ainda mais a rivalidade. Riad aproveita neste conflito seus aliados extrarregionais,
principalmente os EUA, bem como sua vasta rede de recursos financeiros e capacidades.
A relação saudita-estadunidense é marcada por tensões e por cooperação. Até os anos 1970, os EUA não
tinham uma política direcionada aos sauditas, mesmo com suas companhias petrolíferas extraindo petróleo no
país. Entretanto, após a guerra de 1973 entre Israel e os países árabes e o boicote da OPEP, no qual a Arábia
Saudita esteve profundamente envolvida junto do Irã do Xá, Washington percebeu a força crescente dos
recursos de Riad e Nixon traçou grandes planos de cooperação.
É depois do 11 de setembro de 2001 que as relações começam a estremecer. Washington lança pesadas
críticas aos sauditas, visto que 15 dos 19 terroristas envolvidos no ataque eram sauditas, além da al-Qaeda e
do próprio Osama bin Laden pesadas críticas aos sauditas, além da al-Qaeda e do próprio Osama Bin Laden
terem laços no país. Os sauditas começam a reagir. Decidem, por exemplo, pela compra de caças Typhoon dos
europeus, ao invés dos aviões estadunidenses.
Somam-se a isso as crescentes críticas surgidas nos EUA sobre Washington manter boas relações com um
regime tão conservador e que desrespeita diversos direitos humanos. Mesmo afirmando que apoiam a
expansão da democracia pelo mundo, os estadunidenses permitem que a Arábia Saudita seja uma exceção.
Por fim, nota-se que a Arábia Saudita tem se aproximado da China, possivelmente devido aos problemas na
relação com os EUA – os quais agravaram-se com a aproximação de Washington com Teerã nas novas rodadas
de negociações em relação ao programa nuclear iraniano, fato o qual os sauditas se opuseram.

Bahrein
O Bahrein é uma pequena monarquia “constitucional” localizada no Golfo Pérsico, de clima desértico, que
possui a maior porcentagem de xiitas na composição de sua população entre todos os outros países árabes –
cerca de 75%. A comunidade xiita existia na ilha há séculos, mas tal característica consolida-se quando o Xá
persa Abbas I a tomou em 1602. Os persas foram expulsos de lá pela família al-Khalifa, que tomou o território,
o qual foi envolvido depois pelos britânicos como “protetorado”, tornando-se independente em 1971.
A família real é sunita, mesmo que a grande parte da população seja xiita, o que causa descontentamento.
A liberdade de expressão política é limitada. Há um Primeiro-Ministro, Khalifa ibn Salman al-Khalifa, tio do rei,
por ele indicado. O povo pode votar para escolher seus representantes municipais.
Sua economia é uma das mais diversificadas na região do Golfo. Já tendo sido próspero no setor petrolífero,
o país hoje começa a sofrer com a possibilidade do esgotamento de suas reservas, visto que o Bahrein possui
um minúsculo número destas em comparação com outros Estados do Golfo. Por isso, nos últimos anos, o país
veio traçando planos para diversificar sua economia, através de grandes investimentos em infraestrutura,
comunicação, dessalinização da água, zonas industriais e novos portos.
O ano de 2011 marcou o país devido às revoltas populares ocorridas na esteira da Primavera Árabe.
Começando em fevereiro de 2011 e estendendo-se pelo ano, os protestos clamavam por maiores direitos

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políticos. Mais tarde, passaram a pedir pelo fim da monarquia dos Khalifa. A partir de tarde, passaram a pedir
pelo fim da monarquia dos Khalifa. A partir de então, a Arábia Saudita percebe a situação como perigosa para
sua própria ordem interna.
Em marco, a crise piorou e o governo do Bahrein declarou lei marcial e clamou pela ajuda das outras
monarquias do Golfo. Em março de 2011, a Arábia Saudita mandou cerca de mil soldados para apoiar o governo
e acabar com os protestos dos xiitas, juntamente com quinhentos policiais dos EUA (Emirados Árabes Unidos).
O país possui problemas com seu vizinho iraniano que, desde sua independência, clama a ilha como sua,
podendo vir a tomá-la pela força. Mesmo que nada tenha sido feito, o medo dos governantes do Bahrein
aumentou pelo fato de desconfiar que os xiitas da sua população estivessem ligados a Teerã.

Emirados Árabes Unidos (EAU)


Os EAU constituem um conjunto de sete emirados localizados no lado árabe do Golfo Pérsico/Árabe.
Originalmente compostos de nove emirados (Estados da Trégua), após a saída do Reino Unido do local, apenas
sete deles uniram-se para formar os EAU, enquanto os outros dois tornaram-se independentes, o Qatar e o
Bahrein. O sétimo emirado, Ras associou-se aos outros seis emirados (Dubai, Abu Dhabi, Sharjah, Anjman, Umm
Al-Qaywayn e Al-Fujayrah).
Dubai e Abu Dhabi são os emirados mais ricos e por isso possuem maior proeminência no sistema político,
e os demais são menores e estão na parte montanhosa do leste). Os EAU são uma monarquia constitucional
parlamentarista, que possui pouquíssima participação popular. O primeiro-ministro e também vice-presidente,
é o Governante de Dubai, atualmente o xeique Mohammed Bin Rashid al-Maktoum. Há um Conselho Supremo
Federal composto de sete emires, cada um proveniente de um emirado. Este corpo, juntamente com um
conselho de ministros e o presidente são os responsáveis pelas principais tarefas legislativas e executivas.
Apesar da falta de democracia, o regime é popular, o que se deve principalmente à riqueza do país, distribuída
de forma a atingir a todos.
A economia do EAU tem destaque na região do Golfo. É uma país considerado rico dado o seu tamanho e
sua população, o que se deve, principalmente, ao dinheiro proveniente das exportações de petróleo.
Os principais destinos de exportação são o Japão, Índia, Irã e Coreia no Sul, enquanto as principais fontes de
importação são Índia, China e EUA. Cabe destacar que dentro dos EAU, a riqueza é quase toda proveniente de
Dubai e de Abu Dhabi, que é repassada então aos outros emirados. A balança comercial do país é superavitária,
exportando cerca do dobro do valor que importa.
Possui uma relação complicada com o Irã, que, apesar dos altos níveis de comércio entre os países, é
considerado a principal ameaça à segurança dos EAU. Tais motivos levaram os EAU a se aproximarem dos EUA,
mesmo criticando seu apoio a Israel. O país foi um grande apoiador da guerra contra o Iraque em 1991, onde
fortaleceu seus laços com Washington. Hoje o país abriga um expressivo número de bases militares dos EUA.

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Em 2011, foi o primeiro país do Golfo a receber tropas permanentes da OTAN. No final deste mesmo ano,
os EUA venderam cerca de US$3,5 bilhões em armas aos EAU, incluindo mísseis e radares, em meio às tensões
daquele ano com o Irã em relação ao seu programa nuclear.

Kuwait
Localizado no Norte do Golfo Pérsico, o Kuwait é um pequeno emirado de 2,7 milhões de habitantes, com
solo e climas desérticos, mas que possui grande riqueza em petróleo. Constitui-se como uma monarquia
constitucional.
A monarquia é hereditária e o atual emir, Sabah al-Ahmad al-Jaber al Sabah, é descendente da família al-
Sabah, que reina no local desde o século XVIII (tornado “Protetorado” britânico em 1899). O Primeiro-Ministro
atual é Jaber al-Mubarak al-Hamad al-Sabah.
Com a sexta maior reserva de petróleo do mundo, sua riqueza provém em grande parte desta commodity.
O Estado domina grande parte da economia, mas, através da renda do petróleo, garante extensos serviços
sociais à sua população, bem como pesados subsídios – os cidadãos do Kuwait possuem saúde e educação
gratuitos. O número de trabalhadores estrangeiros é quase cinco vezes maior que o número de habitantes
nascidos no Kuwait. Seus principais destinos de exportação são Coreia do Sul (18%), Índia, Japão e China, e as
principais origens de importação, Estados Unidos (13%), China, Arábia Saudita, Coreia do Sul, Índia.
Desde que teve seu território invadido pelo Iraque, em 1990, (situação para o qual contribuiu com sua
intransigência após o fim da Guerra Iraque-Irã), o Kuwait aproximou-se dos seus vizinhos do Golfo (foi um dos
fundadores do CCG) e dos Estados Unidos, por constatar que não conseguiria defender-se só de ameaças
regionais.
Hoje, ainda que mantendo litígios com o Iraque, o Kuwait sente-se mais ameaçado pelo Irã. Isso está
diretamente ligado às tensões dentro do país entre a população sunita e xiita – a qual representa cerca de 40%
do total.

Omã
Omã é o segundo maior país da Península Arábica, com saída tanto para o Golfo Pérsico quanto para o
Oceano Índico. Sua população é esparsa e seu território consiste de desertos, vales e montanhas rochosas. É
uma monarquia absoluta, governada pelo Sultão Qabus bin Said al-Said desde 1970, ano da independência. Não
existem partidos políticos nem uma oposição organizada a Qabus. Diferentemente de outras nações da região,
formadas de maneira artificial com a ação do ex-colonizador, o Sultanato de Omã já existia há séculos e foi um
poderoso império mercantil no Oceano Índico e Leste da África.
Sua economia é aberta, possuindo pouca presença estatal. As reservas de petróleo de Omã são pequenas
em relação aos seus outros vizinhos do Golfo, mas, mesmo assim, são muitos importantes à economia –
representam 90% dos lucros auferidos com exportações e 40% da composição do PIB. A balança comercial de
Omã é positiva e o país possui uma dívida externa relativamente pequena.

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Por décadas o país foi dependente do Reino Unido como provedor de sua segurança. Hoje em dia, mesmo
ainda mantendo laços com Londres, Omã passou a reconhecer os EUA como principal responsável por este
papel. Entretanto, o país preza por manter uma política externa de balanceamento entre seus vínculos com
países do Ocidente e suas relações com o Irã, seu vizinho através do Estreito de Ormuz.
Mesmo utilizando uma política de balanceamento, possui fortes laços com os EAU, ficando ao seu lado
diante das disputas territoriais deste com o Irã. Omã também tomou a iniciativa na região do Golfo em apoiar
o processo de paz entre Israel e os países árabes.

Qatar
O Qatar localiza-se no Leste do Golfo Pérsico e é um pequeno Estado monárquico absoluto, rico em petróleo
e gás natural. A família al-Thani governa o país desde que chegaram ao Qatar, em meados do século XIX. Em
1995, Hamad bin Khalifa al-Thani realiza um golpe de Estado, retirando seu pai do poder e assumindo o trono,
tornando-se o emir. A Constituição garante ao emir poderes quase absolutos. Existe, ainda, um conselho de
ministros – escolhidos por ele – e um conselho de assessores que dão aparência de consulta. O Primeiro-
Ministro, Hamad bin Jassim bin Jabet al-Thani, tem responsabilidades administrativas, além de gerir o
orçamento nacional. O emir é também ministro de defesa e comandante supremo do Exército.
Os lucros provenientes do petróleo são responsáveis por cerca de 30% do PIB do país e 70% das receitas
governamentais. A população do país é pequena, 2 milhões de habitantes, o que garante o maior PIB per capita
do mundo. A inflação é baixa e quase não existe desemprego. A dívida externa é muito pequena também. O
governo, usando o dinheiro proveniente do petróleo, investe pesadamente em gastos sociais, educação, saúde
e infraestrutura, o que ajuda a manter a estabilidade política do país.
Por ser um país pequeno em uma área de instabilidade, o Qatar sempre havia seguido uma política externa
mais prudente. Mantém boas relações com o Reino Unido e com os EUA, apesar de alguns problemas ocasionais
em questões pontuais. É apoiador do processo de paz entre Israel e Palestina e dentro do Conselho de
Cooperação do Golfo (CCG) é voz ativa. A Primavera Árabe tornou-se um ponto de mudança na política externa
do Qatar.
O Qatar passou a posicionar-se ao lado dos direitos humanos e da liberdade de expressão democrática, ao
mesmo tempo em que apoiava a intervenção. O Primeiro-Ministro diversas vezes clamou pela imposição de
uma zona de exclusão aérea e o país foi um dos primeiros a reconhecer o novo governo líbio, organizado pelos
rebeldes, além de afirmar que participaria militarmente de qualquer ação.
O emir aproveitou o momento adquirido com a intervenção na Líbia e tentou reforçar seu papel de agente
árabe progressivo e responsável. Nota-se que ali surgiu a nova competição entre Arábia Saudita e Qatar, ambos
os países tentando ter a liderança na Síria.

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5.3 – Os Estados do Crescente Fértil
Iraque
Iniciando-se em 1980 com a Guerra do Iraque com Irã, seguido da Guerra do Golfo em 1991, bem como a
constante pressão estadunidense e as pesadas sanções contra Bagdá durante a década de 1990, as guerras
envolvendo o Iraque acabaram culminando em 2003, com a invasão dos Estados Unidos, a qual surte efeitos
até hoje.
Sua economia é em grande parte dominada pelo Estado: emprega atualmente 3,5 milhões de pessoas, 65%
da força de trabalho, e responde por 70% do PIB. O governo iraquiano vem tentando atrair investimentos
estrangeiros, o que, todavia, é dificultado pelos grandes problemas internos que o país enfrenta: altos níveis de
corrupção, infraestrutura sucateada, falta de serviços básicos, escassez de mão de obra qualificada e leis
arcaicas.
Bagdá, em recente pesquisa pela Transparência Internacional (do inglês Transparency International), foi
elencado como o oitavo governo mais corrupto do mundo. Críticas ao Primeiro-Ministro Nourial al-Maliki
quanto a isso são frequentes. Destaca-se o fato de ter sido criada uma força paramilitar de cerca de seis mil
homens, as Forças Especiais Iraquianas, sob controle direto do atual Primeiro-Ministro. As mulheres continuam
a ser sub-representadas politicamente e são a maior parte nas estatísticas de desemprego, analfabetismo e
pobreza. Além disso, outro fato destacável é que a al-Qaeda, que não existia no Iraque antes da invasão de
2003, ironicamente agora faz-se presente, mesmo com a Guerra ao Terror, sob o nome de “Al-Qaeda do
Iraque”.
Além disso, o resultado da guerra também parece ter influenciado na política externa dos Estados Unidos,
que hoje agem mais cautelosamente, também evitando entrar em grandes atoleiros no Oriente Médio. O
problema sectário no país é responsável por uma grande onda de violência e disputas políticas. A facção sunita,
até então no poder através de Saddam Hussein, perdeu seu poder para os xiitas, que agora governam o país,
encabeçados por Maliki. Os sunitas, a partir de então, veem-se como a nova classe marginalizada, organizando
protestos e causando o incremento da violência através do país. A al-Qaeda, agora presente no país, articula-
se fundamentalmente sobre uma base sunita, organizando diversos atentados de caráter sectário, visando
destruir alvos xiitas e do governo.
O novo governo xiita é acusado de, da mesma forma que o antecessor, desrespeitar os outros grupos
sectários – principalmente os sunitas. É também acusado de grandes níveis de corrupção e abuso de violência,
indicado pelo assassinato de manifestantes sunitas por forças de segurança do governo.
Por fim, mas não menos importante, cabe dissertar sobre o grande impacto que esta guerra trouxe à
geopolítica e à dinâmica regional do Oriente Médio. Desde a Revolução Iraniana de 1979, delineia-se na região
do Golfo Pérsico uma rivalidade constante entre Iraque, Irã e Arábia Saudita – todos disputando uma posição
de potência regional. A Arábia Saudita, à época, decide agir através da formação do Conselho de Cooperação
do Golfo (CCG), ao passo em que o Iraque e o Irã já haviam entrado em um conflito armado, em 1980, que

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duraria oito anos, causando estragos em ambos os países. Desde então, Bagdá servia como uma trava aos
interesses regionais de Teerã.
Assim, antes de 2003, o Iraque enquadrava o Irã regionalmente. Após a invasão e a destruição tanto do
governo quanto do Exército iraquiano, os Estados Unidos é que tornaram a principal força de dissuasão frente
a Teerã. Porém, Washington veio retirar-se completamente do Iraque no final de 2011, permitindo que os
interesses iranianos se expandissem ainda mais, não só na região, mas dentro do próprio território iraquiano.
Com Saddam Hussein neutralizado, o Irã aproveitou a ascensão dos governos Xiitas para aproximar-se do
Iraque, iniciando uma nova fase nas relações bilaterais entre os países. Teerã cultiva um crescente comércio
com Bagdá, além de ser um grande investidor no país.
Destaca-se o fato de que foi a mediação de Teerã que conseguiu unir as duas facções xiitas concorrentes –
a de Nourial-Maliki e a de Muqtada al-Sadr -, possibilitando a formação de um governo de coalizão, depois
encabeçado por Maliki, e que recebeu apoio de Washington. Neste mesmo sentido, o Iraque vem sendo um
parceiro iraniano nos assuntos regionais.
A Arábia Saudita, país que temeu o Iraque por diversos anos, preocupa-se frente à aproximação de Teerã e
Bagdá, que só aumenta seu sentimento de insegurança no cenário regional. Riad também é crítica da posição
dos EUA no que tange a suas políticas iraquianas, principalmente pelo fato de Washington ter apoiado Maliki
ao cargo de Primeiro-Ministro, fato que acabou aproximando ainda mais Iraque e Irã.

Síria e a Guerra Civil


Desde 2000, o país é presidido por Bashar al-Assad, filho do antigo presidente, Hafiz al-Assad. Todos os
efeitos das mudanças foram minimizados pelo conflito iniciado em 2011. As sanções econômicas aplicadas ao
regime por outros países pioraram a situação da Síria, que já enfrentava problemas estruturais como alto
desemprego, grande déficit público, rápido aumento populacional e pressão por maior disponibilidade de
energia e por mais recursos hídricos para agricultura.
Em 2011, protestos eclodiram na cidade de Da´ra, logo se alastrando para outras cidades do país. Os
manifestantes clamavam pelo fim do estado de emergência, pela legalização de partidos políticos e por uma
maior liberalização e participação política. Assad fez certas concessões, como acabar com o fim do estado de
emergência. Porém, isso não foi suficiente, já que ele afirmava não ter intenção de sair do cargo, o que era
clamado pela oposição. No começo de 2012, Damasco ainda aprovou um referendo instaurando uma nova
Constituição que provia ao país um sistema multipartidário bem como um limite ao mandato presidencial.
Ainda nesta mesma época, o enviado especial da ONU e da Liga Árabe, Kofi Annan traçou o chamado Plano
de Paz de Seis Pontos (Six-Point Peaceplan), acordado tanto pela oposição quanto pelo governo, e, portanto,
recebendo a aprovação do Conselho de Segurança. Em abril de 2012, o plano foi colocado em prática, mas
nenhum dos lados respeitou o cessar-fogo.
É importante destacar que o regime de Bashar al-Assad é formado por uma minoria islâmica, a Alauíta. Hafez
al-Assad era um deles, e foi em seu regime que este grupo se tornou a nova elite. Desde então, sua manutenção

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política depende da posição dos Assads no poder. O regime Alauíta possui quase todos os postos de poder
preenchidos por membros desse grupo.
Entretanto, com o passar do tempo e a continuação dos choques entre forças da oposição e do governo, o
embate na Síria agravou-se. Passou de uma simples contestação popular interna para um conflito que envolve
diversos outros atores e interesses regionais e internacionais e que dura até hoje, não parecendo prestes a
acabar.

Líbano
É um dos países do Oriente Médio com o maior número de cristãos, e o maior em porcentagem de sua
população, quase 40% dela. É interessante notar, contudo, que essa porcentagem já fora maior, e, com o passar
do tempo, a religião islâmica vem ganhando mais adeptos. Isso ocorre sem, no entanto, extinguir o peso político
do grupo cristão dentro do país.
O Líbano já havia sido um dos principais centros financeiros do Oriente Médio, sediando diversos bancos,
mas a guerra civil no país de 1975-90 afetou esta posição. Tal fato também enfraqueceu a sociedade e o Estado
como um todo, ocasionando grandes perdas econômicas. A reconstrução pós-guerra civil realizou-se através
de empréstimos internacionais, resultando em um alto nível de dívida externa ao país.
Recentemente, problemas internos de governança e a situação atual na Síria fizeram com que o crescimento
a 8% ao ano.
A história do Líbano nos últimos anos foi marcada por intenso conflito entre diferentes grupos político-
religiosos, bem como por grande intervenção externa nos assuntos internos do país; ambas as características
estando geralmente ligadas. Tudo isso resultou na sangrenta guerra civil de 1975-90 – onde a vizinha Síria
esteve intimamente ligada – bem como nas tensões com Israel, que invadiu o país em 1978, 1982 e 2006.
Hoje em dia, a influência externa continua a interferir no país, com Síria e Israel mantendo-se entrelaçados
na dinâmica interna do Líbano. Entretanto, recentemente é o Irã que tem tomado uma posição proeminente
na política libanesa, principalmente depois do final da guerra civil. Isso se deve ao fato de Teerã ter fortes
vínculos com o Hezbollah.
A influência do Irã para com o Hezbollah se faz através de ajuda financeira ao grupo e através de auxílio
material, normalmente atravessado pelo território da Síria – a qual também é uma parceira estratégica de
Teerã. Grande parte do poderio militar que o Hezbollah possui provém do Irã, dando-se destaque aos mísseis
Katyusha de curto alcance, usados contra Israel na guerra de 2006.
Entretanto, o Hezbollah e os laços existentes entre Líbano e Irã não têm apoio de toda a população libanesa.
Há dois grupos que expressam essa diferença de opiniões: o movimento 8 de Março – que considera o Irã como
um aliado contra as agressões israelenses – e o movimento 14 de Março – que procura balancear a influência
iraniana e síria. O último grupo representado principalmente por cristãos, havendo também sunitas. Importante
figura ligada a tais ideias foi Rafiq Hariri, bilionário libanês que compartilha fortes vínculos com os sauditas

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através de laços financeiros. Tendo sido Primeiro-Ministro duas vezes, uma entre 1992-1998 e outra entre 2000-
2004, foi assassinado, em 2005, em um atentado terrorista.
Após crises internas, sobretudo depois da invasão israelense de 2006, Saad Hariri, filho de Rafiq, assume o
posto de Primeiro-Ministro, onde permanece até 2011. Depois de meses, será formado um novo governo, agora
liderado pelo Primeiro-Ministro Najib Mikati, este foi próximo das ideias compartilhados pelo grupo Hezbollah.
Destaca-se aqui o fato de o governo pouco ter reagido de fato aos problemas sírios, evitando críticas pesadas à
Bashar al-Assad.
Eventualmente, as tensões envolvendo a Síria levaram a uma crise de governabilidade no Líbano, visto que
o gabinete de Mikati encontrava-se paralisado por disputas internas entre facções que divergiam quanto a
apoiar ou não o regime de Assad. Sua saída do governo, em 23 de março de 2013, ocorreu três dias após
conflitos intensos entre apoiadores e opositores do presidente sírio na cidade de Trípoli, no Norte do Líbano,
cidade natal de Mikati.
No dia 06 de abril de 2013, o sunita Tamam Salam assumiu como o novo Primeiro-Ministro, apoiado por
diversos partidos no país, incluindo o Hezbollah. Anunciou que sua prioridade era superar as divisões políticas
do país, em alusão aos conflitos internos, prevenindo também que o conflito sírio transbordasse para o Líbano
na Síria continuaram. No dia 25 de maio de 2013, Hassan Nasrallah, secretário-geral do Partido do Hezbollah,
anunciou oficialmente a entrada do grupo no conflito sírio.

Israel e Palestina
Israel é uma democracia parlamentar, localizada às margens Leste do Mediterrâneo, entre Síria e a Península
Arábica. Por seu território corre o Rio Jordão, proveniente das montanhas ao Norte, incluindo as Colinas de
Golã.
A economia israelense é avançada devido ao seu setor de tecnologias, exportando bens de alto valor
agregado, ao passo em que importa alimentos, petróleo e equipamentos militares. De longe, os EUA se mantêm
como o principal parceiro comercial de Israel. A crise financeira de 2008 teve impacto relativo em Israel, que
pode se recuperar rapidamente. Seus laços com países fora do Oriente Médio também conseguiram insular o
país de efeitos adversos provenientes da Primavera Árabe.
Na parte palestina de Jerusalém, há uma crescente queda no crescimento econômico devido ao crescente
isolamento da cidade e do avanço dos checkpoints de segurança israelense. Estima-se que cerca de 80% da
população que lá vive esteja abaixo da linha de pobreza. A situação econômica na Faixa de Gaza também vem
deteriorando, principalmente devido às maiores restrições impostas por Israel e a grande densidade
populacional local.
Em novembro de 2012, a Assembleia Geral da ONU passou uma resolução reconhecendo a Palestina como
Estado observador da organização, sendo apoiada por 138 países. Entretanto, Netanyahu, Primeiro-Ministro
israelense, afirmou que nada iria mudar e rapidamente tomou medidas de retaliação contra o povo palestino.

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Outro momento importante no final de 2012 foi a nova batalha entre Israel e Gaza no que se chamou
Operação Pilar de Defesa. Em outubro de 2012, Tel Aviv bombardeia um bairro palestino na cidade de Rafah
para matar dois terroristas ligados à Al-Qaeda, ferindo também civis. Após novos incidentes, Israel troca tiros
de tanque com a Palestina, que responde com um alto número de foguetes sendo disparados. Em 14 de
novembro, Tel Aviv inicia a Operação Pilar de Defesa utilizando ataques aéreos, bem como navios e tanques.
A operação israelense ocorreu cinco dias após Netanyahu anunciar em cadeia nacional a convocação de
eleições, a ocorrerem em janeiro de 2013. De fato, sua popularidade aumentou cerca de 20 pontos depois da
operação, atingindo 55%. O cessar-fogo realizou-se no dia 21 de novembro, mesmo com uma bomba tendo
explodido em um ônibus em Tel Aviv no mesmo dia, algo que não ocorria desde 2006. O ataque foi reivindicado
pelo braço armado do Fatah.
A Primavera Árabe de fato trouxe preocupações a Tel Aviv. Israel adotou uma visão conservadora e
pessimista frente às novas perspectivas regionais. Síria e Egito são dois dos países que mais sofreram com as
mudanças, e são peças-chaves para a segurança israelense. Sobre o Egito, importa a Israel a manutenção dos
Acordos de Camp David, que prezam pela paz entre os dois países. Os problemas na Síria também trazem
preocupação, visto que a possibilidade de colapso do Estado sírio traz consequências imprevisíveis a Tel Aviv.
Tais acontecimentos também influenciaram na relação de Israel com o Hamas. A ascensão da Irmandade
Muçulmana no Egito parecia sinalizar um bom cenário para o Hamas, que compartilha com tal grupo diversas
ideias. Entretanto, a queda de Morsi rompeu quaisquer possibilidades de melhoras com o Egito, que, depois do
golpe de al-Sisi, tem tomado medidas contra o Hamas.
Cabe ressaltar, por fim, a possível reaproximação entre a Autoridade Palestina e a Faixa de Gaza.
Inicialmente, um acordo entre o Hamas e o Fatah para formar um governo de unidade nacional fora mediado
pelo Qatar em 2012, após o primeiro ter saído da Síria. Entretanto, por diversos problemas, o acordo não
vingou.

Jordânia
É atualmente uma monarquia constitucional, possuindo rei e Primeiro-Ministro, onde o primeiro, rei
Abdullah II, ainda tem grandes poderes em política externa e na política interna. Seu exército é constituído de
beduínos, provenientes de diversas regiões do país.
Sua economia é uma das menores do Oriente Médio, sofrendo constantemente com a falta de água,
petróleo e outros recursos naturais, tornando o governo altamente dependente de apoio externo. Grande parte
do dinheiro que recebe como auxílio financeiro é proveniente das monarquias do Golfo.
Em 2009, após a dissolução do Parlamento pelo Rei Abdullah, novas eleições ocorrem a Samir al-Rifai é
indicado como novo Primeiro-Ministro. Durante a Primavera Árabe, o país também é afetado por diversos
protestos populares clamando pela saída do Primeiro-Ministro Rifai, além de se mostrarem contra os altos
preços de combustíveis e alimentos. Fica em aberto o futuro da Jordânia, bem como das demandas populares.

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Capítulo 6
Os Estados Não Árabes do Machreck

6.1 – A Turquia, o Azerbaijão e a Geopolítica do Cáspio


A Turquia: novo líder regional ou aliado ocidental
A Turquia, por sua grande população (73 milhões de habitantes), regime político modernizador e laico,
posição geopolítica e participação em importantes organizações, como a OTAN, foi ao longo da Guerra Fria um
fator de estabilidade para a Europa e para o Oriente Médio. Todavia, desde a década de 1980, esta situação
vem se alterando. Mas a Primavera Árabe parece ter dado à Turquia a oportunidade, já esboçada com o
surgimento de novos Estados na Ásia Central, de tornar-se um líder regional.
Em 2002, pela segunda vez em sua história, um partido de identidade islâmica, o Adaletve Kalkinma Partisi
(Partido da Justiça e Desenvolvimento – ou simplesmente AKP) chegou ao poder, vencendo as eleições
parlamentares, sob a liderança de Recep Tayyip Erdogan.
Contrariando a experiência anterior do Partido Islâmico Refah, seu ex-primeiro ministro, Necmettin Erbakan,
priorizava a integração com o mundo islâmico, enquanto o AKP defendia negociações para a entrada da Turquia
na União Europeia. Nas eleições de 2007, o AKP novamente saiu vitorioso, com 46,7% dos votos, em
comparação com 34,8% dos votos totais, em 2002.
As dificuldades em governar logo foram sentidas: num primeiro momento, o AKP não desafiou as bases
seculares do Estado turco, mas existem pontos em que o governo e Estado têm divergido, como na educação
(promessa do AKP de não mais proibir o uso do véu nas universidades).
O que vem ocorrendo, durante o governo de Erdogan, baseia-se numa nova política de definição da
identidade da Turquia: sobre a questão da minoria nacional curda, ele afirma que é a religião muçulmana o
elemento que articula uma identidade supranacional turca. Ele sustenta que a Turquia, sendo um país
multiétnico, com 99% dos turcos praticantes da religião muçulmana, é o Islã que os une.
Nota-se uma tensão entre secularistas e islamitas que, de todas as formas, o Exército turco, baluarte secular,
vem tentando evitar a islamização ao longo das duas últimas décadas. Por outro lado, existe um verdadeiro
interesse do país ingressar na União Europeia, uma integração composta por países de maioria cristã.
A economia turca constitui-se num complexo de indústria, comércio e o setor agrícola que, em 2005, ainda
era responsável por aproximadamente 29% dos empregos. A taxa de desemprego em 2008 foi de 8%. A Turquia
dispões de um setor privado forte e em rápido crescimento, mas o Estado ainda desempenha um papel
preponderante nas áreas de indústria de base, bancos, transporte e comunicações.
Aspectos como o secularismo nas universidades, a liberdade de imprensa, Direitos Humanos, a relação entre
a sociedade e o Exército, vêm sendo colocados em um plano em que qualquer interferência maior pode isolar
o Estado turco. As negativas dos países islâmicos em ter a Turquia como líder e a resistência do Ocidente,
deixam a República turca em posição pouco confortável.

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A Turquia, atualmente, encontra-se num dilema: aprofundar as relações com a Rússia, principal parceiro
comercial (importa quase 70% de suas necessidades de gás e 50% de carvão da Rússia). Por outro lado, a Turquia
sempre se voltou para o Ocidente. A importância das relações da Turquia com os países europeus é enfatizada
e o partido no poder está comprometido em cumprir os requisitos para fazer parte da EU, enfatizando o
comprometimento da Turquia com a OTAN. O aprofundamento das relações da Turquia com os Estados do
Cáucaso e da Ásia Central e especificamente com o mundo muçulmano é defendido como meio de diversificar
as relações externas.
Na região , além da tentativa de reconciliação com a vizinha Armênia – apoiada tanto pelos Estados Unidos
quanto pela Rússia (com a qual foram normalizadas as relações) -, a Turquia tem buscado aprofundar as
relações com seus vizinhos, notadamente a Síria e o Irã.
Embora Erdogan afirme o compromisso da Turquia com o governo dos EUA, nota-se, após um início
promissor, um desgaste mútuo. A questão da Guerra do Iraque reflete bem isto.
Em 2009, as relações entre Estados Unidos e Turquia buscaram novamente voltar à normalidade, após as
visitas ao país da secretária de Estado americana, Hillary Clinton (março), e depois da viagem do Presidente
Barack Obama e Ancara (abril). O relacionamento histórico entre os governos turco e americano foi afetado
durante a administração do Presidente George W. Bush devido aos vários incidentes diplomáticos relacionados
ao Iraque: o Parlamento turco rejeitou permitir o uso de território turco para a invasão do Iraque em 2003, e,
em resposta, os EUA detiveram vários agentes secretos turcos no norte-iraquiano.
Na visita, Hillary agradeceu pelo papel da Turquia no processo de paz para resolver o conflito palestino-
israelense e defendeu a “solução baseada em dois Estados” que propiciem um ambiente de “democracia,
prosperidade e estabilidade”, que permitam “a Israel e a seus vizinhos árabes viver em paz”. Mas Erdogan e o
chanceles Babacan mantiveram seu discurso de inclusão do Hamas no processo de paz.
Em relação à América Latina, a Turquia tem demonstrado interesse em aumentar as relações comerciais.
Brasil e México têm siso os principais parceiros comerciais turcos na América Latina. Interessante que
acadêmicos, estadistas e políticos turcos sonham que seu país venha a ser “o Brasil do Oriente Médio”, numa
alusão à liderança brasileira na América do Sul.
Em relação à OTAN, a Turquia desempenhou importante papel no envio de tropas para a operação de
proteção a civis na Líbia em 2011, embora o país tenha sido aceito como mediador por ambas as facções.
Erdogan, que desde 2003 ocupava o posto de Primeiro-Ministro turco, nas eleições de julho de 2007 e nas de
junho de 2011 foi reeleito em vitórias esmagadoras, sendo o único Primeiro-Ministro turco a acupar o cargo
três vezes consecutivas.
Durante seus mandatos como Primeiro-Ministro, Erdogan empreendeu diversas reformas, muitas destas
para aproximar a Turquia do Ocidente. Em relação aos direitos humanos e à questão das minorias étnicas,
grandes entraves nas negociações entre a União Europeia e a Turquia, Erdogan apresentou – em 2009 – um
plano de reformas para conter as querelas com os curdos.

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A política externa de Erdogan e do AKP está associada ao nome Ahmet Davutoglu, Ministro das Relações
Exteriores desde 2009. Sua doutrina, apelidada de Neo-Otomanismo, tem contribuído para a renovação da
política externa e para um crescente importância da diplomacia turca, especialmente no Oriente Médio.
Segundo Davutoglu, em seu livro “Profundidade Estratégica”, a Turquia tem importância devido à sua história
e à sua posição geográfica, sendo considerada um “país central”.
A Turquia apresenta um modelo que combina com Islã, a democracia, o secularismo, a economia de
mercado e o desenvolvimento, mescla esta que popularizou o Primeiro-Ministro Erdogan e que se propõe a ser
exemplo aos países árabes em processo de renovação.
Erdogan apresenta-se como o divulgador do modelo turco, colocando a Turquia no núcleo duro das
Revoluções Árabes – no papel de inspiradora – e enfatizando uma colaboração turco-árabe. O Egito foi o
primeiro destino do premiê, que realizou um giro pelos países varridos pelas insurreições populares.
Em 15 de setembro de 2011, Erdogan visitou a Tunísia, sua segunda parada, onde declarou que o Islã e a
democracia não eram incompatíveis e que um muçulmano poderia, com muito êxito, governar um Estado,
mensagem clara para um país no qual o partido muçulmano venceu, de fato, as eleições parlamentares de
outubro. A última etapa do ciclo de viagens do premiê foi a Líbia, em 16 de setembro, onde aproveitou a
multidão aglomerada na Praça dos Mártires para, oportunistamente, lançar um aviso à Síria: “Acabou a era da
autocracia”.
Em relação à Síria, após anunciar a suspensão de todas as negociações financeiras com o país e congelar os
bens do governo de Bashar al-Assad como forma de sanção, a Turquia suspendeu, em 9 de dezembro de 2011,
seu acordo de livre comércio com os sírios. Segundo Ancara, as medidas têm como fundamento persuadir o
presidente da Síria a dar fim à repressão contra manifestantes, que provocam refugiados na fronteira entre dois
países.
Durante sua viagem ao Egito, em pronunciamento na sede da Liga Árabe no Cairo no dia 13 de setembro,
Erdogan afirmou que o “reconhecimento do Estado palestino não é uma opção, é uma obrigação”, referindo-
se ao pedido palestino de adesão à ONU.
O Brasil apoia a posição turca em relação à Palestina e ambos os países partilham da crença na necessidade
de uma reforma nas Nações Unidas. Em maio de 2010, Brasil, Irã e Turquia selaram acordo sobre troca de
combustíveis nucleares, tendo sido suspenso em julho, porém, devido à aprovação de sanções contra Teerã na
ONU.

Azerbaijão
Localizando-se no Sudeste do Cáucaso, o Azerbaijão é uma república semipresidencialista, cuja maioria da
população é muçulmana, e um dos cinco países que fazem fronteira com o Mar Cáspio – juntamente com Rússia,
Cazaquistão, Irã e Turcomenistão.

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Estando em uma posição tão estratégica, o Azerbaijão adota deliberadamente uma política externa
pragmática, jogando com os diversos países da região cujos interesses conflitam na maior parte do tempo –
como Irã, Rússia, Turquia, União Europeia e Estados Unidos.
Com 40% do território coberto por cadeias de montanhas e possuindo apenas cerca de 20% de suas terras
aráveis, este país depende muito economicamente de seus recursos naturais, principalmente de suas riquezas
minerais – como o petróleo e o gás natural. Essa grande concentração e dependência do petróleo torna o país
vulnerável às variações no preço internacional do produto.
Um importante destaque do Azerbaijão é o oleoduto BTC (Baku-Tbilisi-Ceyhan), entre Azerbaijão, Georgia e
Turquia, principal motor econômico do país. Recentemente, porém, o país vem focando-se no desenvolvimento
da produção do gás natural, aumentando cada vez mais seus esforços para desenvolver sua já crescente
produção. Suas principais reservas localizam-se no Mar Cáspio, região rica neste tipo de riqueza mineral.
No âmbito regional, a Turquia é o maior parceiro estratégico do Azerbaijão. Além da cooperação energética
já mencionada entre ambos os países, a Turquia também fornece importante auxílio militar: desde o começo
do conflito entre Azerbaijão e Armênia, Ankara fechou suas fronteiras com a Armênia e passou a auxiliar e
treinar as forças militares azerbaijanas.
Quanto à Rússia, a relação entre ambos melhorou desde o começo do século XXI. O país é o maior parceiro
econômico russo no sul do Cáucaso. Em 2003, os países delimitaram suas fronteiras marítimas no Mar Cáspio,
e agora cooperam em relação ao assunto. Por fim, a relação Azerbaijão-Irã é mais complicada. Desde 2005 os
dois países possuem um acordo de não agressão, e o Azerbaijão já afirmou que seu território não será usado
em um ataque ao Irã. Mesmo assim, sua aproximação com o Ocidente leva o Irã a flertar com a Armênia, o que
resulta em mais desconfianças recíprocas.
O principal problema de segurança para o Azerbaijão, porém, ainda é seu conflito com a Armênia sobre a
região de Nagorno-Karabakh. Desde sua independência da URSS, esse território do Azerbaijão é ocupado pelos
armênios. Afirmando prezar pela estabilidade regional, o Azerbaijão ainda não se utilizou de seu direito de
autodefesa, estipulado na Carta da ONU, para desferir novo golpe contra a Armênia e opta por propor o
estabelecimento de uma região autônoma no seu território para Nagorno-Karabakn.

A geopolítica do Cáspio
O Cáspio possui diversas reservas de gás natural e petróleo a serem exploradas, sem, entretanto possuir um
estatuto legal sobre suas águas. Dessa forma, Rússia, Irã, Turcomenistão, Cazaquistão e Azerbaijão ainda não
definiram suas relações na região.
Todos os cinco países envolvidos vêm demonstrando interesse e realizando reforços para garantir a
segurança de seus interesses na região, principalmente através de uma escalada e de um fortalecimento de
suas marinhas. A Rússia é de longe o país com a maior e mais bem preparada Marinha neste mar, seguida pelo
Irã.

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O principal temor de uma presença dos EUA na região por parte da Rússia e do Irã se dá pelo fato de as três
ex-repúblicas soviéticas terem flertado e/ou assinado contratos para a exploração de reservas de gás ou
petróleo em suas supostas águas territoriais com empresas estadunidenses.
Em 2012, a OTAN traçou o Plano de Ação de Parceria Individual entre a organização e o Azerbaijão, a qual
passou a discutir e dar assistência à ex-república soviética em diversos tópicos, aumentando a desconfiança na
região do Mar Cáspio. Como consequência, há uma piora ainda maior na relação destes países – EUA e ex-
repúblicas soviéticas – com a Rússia e principalmente com o Irã.

6.2 – Irã, Afeganistão e Paquistão


A República Islâmica do Irã: potência emergente ou regime em crise?
Outra nação com aspirações de potência regional (mais do que de “liderança”) é o Irã. Mas, diferentemente
da Turquia, o Irã não tem a mesma margem de manobra do vizinho, que é membro da OTAN e pode reivindicar
a posição de uma nação capaz de estabilizar a região.
As eleições presidenciais de 2009 marcaram fortemente a política iraniana, enquanto a posição
internacional do país evidencia um crescente impasse. As massivas manifestações de rua em Teerã, promovidas
pelos apoiadores do candidato reformista Hossein Mousavi e reprimidas pelo regime, contestando a vitória
eleitoral que propiciou ao candidato oficial Mahmoud Ahmadinejad um segundo mandato, causaram certa
surpresa. Isto porque a República Islâmica do Irã, implantada há pouco mais de três décadas, é, geralmente,
vista como um regime quase monolítico.
Essa potência petrolífera de 72 milhões de habitantes teve uma história tumultuada no século XX e nos
últimos 50 anos esteve, de certa forma, na contramão da evolução internacional.
A guerra iniciada por Saddam Hussein em 1980, apesar dos danos causados, permitiu não apenas a
sobrevivência da revolução, como abriu o caminho para que os liberais, os velhos nacionalistas modernizadores
e, finalmente, a esquerda socialista e comunista fossem esmagados em 1981 pelos islâmicos liderados por
Khomeini num banho de sangue
Em 1988, um Khomeini que sentia a morte se aproximar, aceitou a proposta de paz e preparou a sucessão
de forma a conservar sua visão política na condução do país. Era, apesar das aparências, o Termidor da
Revolução. Apesar de o Estado continuar sendo a base da economia, foi introduzida a liberalização econômica,
com atração de capital estrangeiro e expatriado, na busca de algo semelhante ao modelo chinês. A paz e uma
população essencialmente jovem contribuíram para aprofundar as contradições da sociedade iraniana.
Essas contradições pegaram os dirigentes religiosos de surpresa, quando um candidato reformista pouco
conhecido, Khatami, venceu as eleições presidenciais de 1997 com os votos especialmente dos jovens e da
mulheres, governando por dois mandatos.
Em 2005 foi eleito Mahmoud Ahmadinejad, um economista e professor universitário de vida frugal,
prometendo a defesa dos princípios fundadores da Revolução. Os programas sociais, o projeto nuclear e suas
bravatas diplomáticas permitiram-lhe um apoio popular amplo, que foi respaldado pela elite religiosa, que se

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encontra em processo de desgaste. A inflação, a urbanização e o desemprego são elevados, apesar de o país
ser moderno e estar numa faixa de renda e IDH médios.
Nas eleições de 2009 o campo reformista novamente se dividiu e a cúpula islâmica resolveu apoiar
novamente esse político atípico. A massiva participação, inclusive do voto rural, surpreendeu, bem como a
reação dos vencidos. De qualquer maneira, o que ficou evidente foi, pela primeira vez desde a consolidação do
regime, a emergência de uma oposição forte e aberta.
Muitos analistas consideram que houve poucas mudanças nas esferas política e econômica iranianas, apesar
de isso ter sido prometido nas eleições presidenciais de 2005, quando Ahmadinejad foi eleito pela primeira vez.
Enquanto os candidatos reformistas ainda enfatizavam a importância da reforma e da abertura política,
deixando necessidades básicas como emprego e condições de vida da população de fora, Ahmadinejad
prometia justiça econômica e combate à corrupção.
A conjuntura internacional contribuiu para produzir um consenso em relação a várias questões entre os
grupos ideológicos opostos no Irã. As ambições hegemônicas dos EUA no Oriente Médio, materializadas em
intervenções militares nos vizinhos Afeganistão e Iraque, uniram esses segmentos em torno de um sentimento
nacionalista comum.
O gabinete do presidente encontrou-se quase inteiramente voltado às questões de política externa e à
política doméstica iraniana, devido aos desafios mais urgentes surgidos nesses dois campos. A política externa
se revelou, em muitas ocasiões, mal gerenciada, pois Teerã protagonizou episódios de extremo desgaste
diplomático devido a declarações desnecessárias e gratuitas, em geral feitas pelo próprio Ahmadinejad, como
as acerca do Holocausto e do Sionismo.
O país é palco de frequentes manifestações da classe média, de estudantes e até de setores de trabalhadores
que se opõem ao governo, as quais são duramente reprimidas. A preocupação com a segurança e o temor da
eclosão de uma Revolução Colorida (no caso, Verde), ou Regime Change, apoiada pelo Ocidente, são
evidenciadas pelo aumento da importância política e da porcentagem do orçamento nacional destinada ao
Corpo da Guarda da Revolução Islâmica (IRGC).
Calcula-se que a força conte com cerca de cem mil homens na ativa. Ela possui suas próprias tropas
terrestres, navais e aéreas, além de controlar as armas estratégicas do Irã. Ademais, ela controla a Força de
Resistência Basij, uma milícia voluntária islâmica com cerca de 90 mil integrantes e capacidade adicional de
mobilizar quase um milhão de pessoas. A Basij é, frequentemente, incumbida de reprimir protestos e
manifestações contrárias ao governo e possui núcleos em todas as cidades do país.
A economia iraniana é pouco diversificada e profundamente dependente das receitas provenientes do
petróleo e gás. Além disso, o Estado gasta muito, anualmente, em subsídios voltados para diversos setores da
economia, pois as exportações de produtos não relacionados ao petróleo são fracas.
No campo econômico, o que se observa, atualmente, no Irã é a continuação da reforma econômica baseada
em privatizações, iniciada na década de 1990 pelo Presidente Khatami. Em junho de 2008, Teerã anunciou que
passaria a permitir que investidores estrangeiros comprassem empresas estatais iranianas, seguindo o seu

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programa de liberalização econômica de longo alcance e atendendo à necessidade premente de atrair
investimentos externos.
Essa aceleração do programa de privatizações iraniano empreendida pela Organização Iraniana de
Privatização, paradoxalmente, não satisfaz os interesses econômicos e estratégicos americanos, pois ela
favorece países como a China, a Rússia, alguns países europeus e o Japão, os quais mantêm relações de
comércio e investimento de longa data com o Irã. Sendo assim, para os Estados Unidos é interessante implantar
sanções econômicas para paralisar os fluxos de capital para o Irã.
A Rússia, a China e a Índia (e inclusive o Brasil), por sua vez, tendem a ser aliadas do Irã, devido ao
petróleo/gás e à posição geopolítica do país. Por fim, controlar o ciclo nuclear é condição indispensável para
qualquer nação manter uma posição internacional de destaque no século XXI, e o histórico e popular
nacionalismo iraniano está vinculado à questão. Além disso, o Irã necessita diversificar sua matriz energética,
para ampliar a vida útil de suas reservas de petróleo e gás, e a energia nuclear é, como no caso de todo país
com recursos para tanto, uma das melhores opções.
O programa nuclear iraniano, iniciado na década de 1950 com a ajuda dos EUA, buscou independência da
assistência externa após a Revolução de 1979. A partir de 2002, chamou a atenção internacional devido à
suspeita de um programa clandestino de enriquecimento atômico.
Um novo relatório da AIEA, de novembro de 2011, afirmou que o Irã havia realizado testes “relevantes para
o desenvolvimento de um dispositivo nuclear”; o embaixador iraniano no órgão, entretanto, afirmou que seu
país não tinha intenção de suspender suas atividades de enriquecimento de urânio. Em resposta, EUA, Reino
Unido e Canadá impuseram novas sanções financeiras e energéticas como forma de pressão.
A história das relações árabe-iranianas, por sua vez, oscilou entre a coexistência pacífica e o conflito. Na
esteira das Revoluções Árabes, iniciadas em dezembro de 2010 na Tunísia, o Irã não tem sido afetado
internamente, embora tenha havido alguns conflitos pontuais.
O quadro permanece incerto e há ameaças de um ataque contra as instalações iranianas. Israel chegou a
anunciar o desligamento temporário de uma usina nuclear para o caso de o Irã retaliar um eventual ataque
americano-israelense. Teerã, por sua vez, se sente ameaçado, pois todos os vizinhos são aliados dos EUA,
mantendo o impasse e a tensão.
A Síria é uma peça fundamental na política iraniana para a região, sendo ponte para o apoio de Teerã ao
Hezbollah no Líbano e, até recentemente, ao Hamas nos territórios palestinos, além de facilitar a crescente
influência iraniana junto do governo xiita no Iraque.
Por isso, quando as instabilidades na Síria se agravaram, diversos países contrários aos interesses do Irã
perceberam uma oportunidade de canalizá-las contra o regime de Bashar al-Assad com o intuito de derrubá-lo
e então provavelmente romper o eixo de influência de Teerã na região.
Os EUA também perceberam que a situação na Síria poderia ser uma oportunidade de enfraquecer a
influência e o poderio do Irã, país considerado por Washington a principal ameaça aos seus interesses na região.
Isso explica as recentes ações estadunidenses de aprovar o envio de armas aos rebeldes seculares,

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principalmente o Exército Livre da Síria, para mudar a balança de poder contra o regime sírio atual. Isso também
está em consonância com a estratégia de interferir na região sem colocar tropas no solo, processo buscado pela
administração de Obama nos últimos anos.

Paquistão
Com uma população de mais de 190 milhões de habitantes, o Paquistão é o sexto país mais populoso do
mundo. É uma República Islâmica Parlamentar, atualmente presidida por Mamnoon Hussain, tendo como
Primeiro-Ministro, Mian Nawaz Sharif, eleito em 2013. Sua religião predominante é o Islamismo, praticado por
95% da população. Destes, a grande maioria é da corrente sunita, em torno de 85% a 90% dos islâmicos. É
declaradamente um país possuidor de armas nucleares e possui o sétimo maior exército do mundo. A sociedade
paquistanesa é relativamente jovem, sendo a idade média do país 21 anos, mas, segundo a ONU, quase 50% da
população se encontra abaixo da linha da pobreza.
No que tange a suas fronteiras, o Paquistão possui certos problemas com o vizinho Afeganistão,
principalmente nas áreas fronteiriças – Áreas Tribais, no Noroeste do país -, hoje em dia caracterizadas por
serem local de intensa atividade terrorista e falta de presença estatal. Entretanto, seu maior problema
fronteiriço ainda permanece sendo a questão do território da Caxemira, disputada com a Índia desde 1947, e
que mesmo sob a supervisão da ONU ainda não teve nenhum resultado definitivo.
E economia paquistanesa baseia-se principalmente na exportação de têxteis, demonstrando um baixo nível
de valor agregado na pauta de produtos exportados e uma vulnerabilidade às demandas do mercado mundial.
Desde o desencadeamento da Guerra ao Terror pela administração Bush, o Paquistão tornou-se um aliado
fundamental para as operações estadunidenses na região do Oriente Médio, principalmente no Afeganistão.
Quando Bush declara a Guerra ao Terror e decide invadir o Afeganistão, o Paquistão vem a se tornar país-
chave para o sucesso das operações estadunidenses: Washington tinha ciência dos antigos contatos entre a ISI
e os grupos radicais, além do fato de esta possuir conhecimento sobre o território afegão. Vale destacar que,
devido aos antigos contatos entre os dois países, os EUA manterão certa desconfiança no trato com a ISI, o que
se agravará com o decorrer da guerra contra o terrorismo na região.
O problema no Paquistão e a busca por uma forma de resolvê-lo aprofundaram-se não na administração
Bush, mas na administração Obama. Tendo gasto bilhões de dólares em suas aventuras no Afeganistão e no
Iraque, e sentindo a exaustão popular para com estas guerras no Oriente Médio, os Estados Unidos sabiam que
não poderiam desdobrar um contingente de tropas na região Noroeste do Paquistão para acabar com as
atividades terroristas ali existentes. É principalmente devido a isso que o Governo Obama passa a usar drones
– veículos aéreos não tripulados (VANT) – como nova estratégia antiterrorista.
O uso dos drones começou em 2004 como um projeto secreto da CIA onde eram desferidos ataques pessoais
contra alvos específicos de uma lista pré-aprovada de membros da al-Qaeda, principalmente em território
paquistanês.

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A administração Obama aumentará o uso de drones e do targeted killing deixando de lado o
intervencionismo de Bush para enfrentar o terrorismo. Em seus três primeiros anos no poder, a administração
Obama lançou no mínimo 239 ataques de drones – um número 44 vezes maior que o utilizado em toda
administração George W. Bush. O problema, entretanto, é que tais ataques começaram a atingir e matar civis
devido a erros de cálculo. O crescente número de causalidades civis começou a gerar uma maior antipatia pelo
programa de drones no Paquistão por parte dos próprios paquistaneses, muitas vezes desenvolvendo-se em
um antiamericanismo. A falta de transparência na escolha dos alvos também é objeto de discórdia entre os dois
países.
Hoje a controvérsia do uso dos drones continua em aberto. De um lado, há inúmeras manifestações contra
essa estratégia tanto dentro do Paquistão quanto por ativistas de direitos humanos. De outro, uma grande
quantidade de pessoas, incluindo diversos setores do governo paquistanês, as aprovam, posto que produzem
resultados concretos, pelo menos no curto prazo.
O movimento do Talibã de anunciar a possível participação em negociações bilaterais com os EUA veio após
as forças afegãs terem assumido oficialmente o controle da segurança de todo o território do Afeganistão,
colocando as forças militares da coalizão OTAN-Estados Unidos em uma posição de suporte ao governo. A
Transferência de responsabilidade foi o último passo necessário para a retirada final das forças da coalizão que
invadira o país em 2001, derrubando o Talibã, então governo do Afeganistão.

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