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Análise do filme: Quanto vale ou é por quilo?

O filme traz uma relação entre a sociedade escravista e a contemporaneidade, ressaltando


tanto as permanências quanto as mudanças que ocorreram ao longo do tempo. Por meio
de várias tramas, ele explora as relações entre passado e presente, oferecendo uma
análise crítica das continuidades históricas que moldam a sociedade brasileira.

Nos primeiros momentos do filme somos apresentados a uma cena onde uma mulher
alforriada segue homens que capturaram seu escravo. Durante essa busca por seus
escravos, essa mulher é acusada e condenada por invadir a propriedade de um senhor
branco, mesmo que estivesse ali apenas para reivindicar o seu direito de propriedade
sobre aqueles escravos. Aqui podemos observar o quanto o meio influência a nossas
percepções, uma mulher preta naturalizou a compra e venda de pessoas pretas. Isso
ilustra como até mesmo pessoas historicamente oprimidas podem internalizar e perpetuar
as normas opressivas da sociedade.

Outra cena marcante retrata uma professora de uma comunidade carente recebendo
doações de computadores e descobrindo que essa doação envolve crimes. Isso lança uma
forte crítica ao terceiro setor, composto por ONGs e empresas privadas com interesses
sociais, que muitas vezes se aproveitam da miséria humana em prol de sua própria
lucratividade. O terceiro setor muitas vezes utiliza a situação de vulnerabilidade como uma
ferramenta para obter benefícios como a redução de impostos, além de usar a caridade
como um meio de aumentar sua visibilidade e consequentemente suas vendas e
arrecadações. Essa situação revela que, na verdade, a motivação por trás dessas ações é
o lucro, e não o genuíno desejo de ajudar as pessoas em situação de vulnerabilidade.

Essa crítica também ressalta que a desigualdade não é apenas resultado de ações
individuais, mas é uma condição intrínseca ao sistema. A estrutura do sistema se baseia
na criação e manutenção da desigualdade, tornando a miséria uma característica inerente
ao próprio sistema. Isso é evidenciado pelo fato de que muitas pessoas ainda sofrem com
a falta de acesso a necessidades básicas como água potável e alimentos, e que os negros
continuam a enfrentar os piores empregos, com os piores salários e a viver nos piores
lugares.

O filme aborda a ideia de que, assim como a nossa sociedade escravista foi baseada na
exploração e na manutenção da miséria dos escravizados, hoje em dia no Brasil, o nosso
sistema econômico e as nossas relações sociais ainda são baseadas nessa exploração da
condição de miséria de uma grande parte das pessoas. Questões como desemprego,
jornadas de trabalho exaustivas e condições de trabalho precárias, são retratadas no filme
como consequências diretas dessa relação. A condição de miséria dessas pessoas serve
de suporte para a existência de formas de transformar a miséria humana em lucratividade,
evidenciando a persistência de estruturas sociais que perpetuam a desigualdade.

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