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Pedagogia Social

Organizado por Universidade Luterana do Brasil

Pedagogia Social

Universidade Luterana do Brasil – ULBRA


Canoas, RS
2015
Conselho Editorial EAD
Andréa de Azevedo Eick
Ângela da Rocha Rolla
Astomiro Romais
Claudiane Ramos Furtado
Dóris Gedrat
Honor de Almeida Neto
Maria Cleidia Klein Oliveira
Maria Lizete Schneider
Luiz Carlos Specht Filho
Vinicius Martins Flores

Obra organizada pela Universidade Luterana do Brasil.


Informamos que é de inteira responsabilidade dos autores
a emissão de conceitos.
Nenhuma parte desta publicação poderá ser reproduzida
por qualquer meio ou forma sem prévia autorização da
ULBRA.
A violação dos direitos autorais é crime estabelecido na Lei
nº 9.610/98 e punido pelo Artigo 184 do Código Penal.

Dados técnicos do livro


Diagramação: Marcelo Ferreira
Revisão: Paula Fernanda Malaszkiewicz
Apresentação

A aprendizagem é um processo contínuo e, como tal, é na diversidade


dos espaços sociais que as suas lições são apresentadas na sua mul-
tiplicidade para que possam ser compreendidos ou não. É tarefa da Peda-
gogia Social olhar esses vários cenários e se apropriar das aprendizagens,
pois como afirma Karl MARX: “Somos os resultados das nossas relações
sociais”; sendo isso uma verdade, precisamos aprender dentro do espaço
escolar a olhar mais para a pedagogia do dia a dia, pois na sala de aula
o aluno continua sendo ele com as suas circunstâncias.

Para Humberto Maturana: “Todo viver humano ocorre em conver-


sações e é nesse espaço donde se cria a realidade em que vivemos”.
Será que na aprendizagem e na formação, que é desenvolvida na socieda-
de como um todo, damo-nos conta disso?

É essencial que se compreenda que a educação faz parte dos mais di-
versos sociais em que se está inserido. É na sala de aula, no supermercado,
no trabalho, na família, no trânsito e, assim, nos mais diversos recantos so-
ciais, que aprendemos a ser o que se é ou o que se deveria ser. Conforme
Guimarães Rosa: “É no junto do que sabe bem, que a gente aprende o
melhor”, ou seja, a Pedagogia Social precisa ser instrumento que desperte
o espírito de buscar o que nos torna virtuosos e melhores na condição que
já citei. São as conversas que nos auxiliam a olhar as aprendizagens do
outro e, diante disso, podemos fazer a seguinte questão: se pedes a minha
opinião, irás leva-la em conta? É nesse sentido que a Pedagogia Social
entra no processo escolar para ser uma contribuição dos diversos dizeres e
olhares, pois de uma forma ou de outra, todos aprendemos lições, e o que
precisamos fazer é verificar como se aprendeu o que se sabe.
Apresentação  v

Para construir esses olhares, o livro Pedagogia Social está organizado


em dez capítulos, em que cada um deles visa apresentar algumas peculia-
ridades na compreensão dos processos. Em função disso, no primeiro ca-
pítulo, “As fronteira da pedagogia social: perspectiva histórico, científica e
profissional”, iremos mergulhar na compreensão entre os limite e as possi-
bilidade da pedagogia social. Já no capítulo 2, “Pedagogia social e educa-
ção: articulações”, iremos compreender por que é necessário a articulação
para que possamos compreender o espaço da educação dentro da peda-
gogia social. No terceiro capítulo do livro, será trabalhada a “Pedagogia
do compromisso”; estudar-se-á sobre a importância do compromisso dian-
te do desenvolvimento dos sentimentos de pertencimento e esperança. No
capítulo quatro, “Pedagogia social intervenções e ações”, buscar-se-á a
compreensão das ações para que se entendam as intervenções necessárias
ou não para as mudanças. No capítulo cinco, “Pedagogia e diversidade”,
o olhar a ser construído no decorrer do estudo visa trabalhar as problema-
tizações que esses entornos sociais requerem. O capítulo seis, “Conflitos:
realizações e frustrações na convivência”, buscará demarcar a necessidade
que se tem dentro da convivência social de superação. O capítulo sete, por
sua vez, versará sobre os ambientes sociais e a sua organização. Por que
alguns aspectos na organização social exigem elementos novos e em ou-
tros ambientes não? No capitulo oito, “Pesquisa socioeducativa na peda-
gogia social: elaboração de projeto pedagógico social”, a questão central
será a compreensão de passos a serem seguidos para a elaboração de um
projeto para estudar os cenários socioeducativos. No nono capítulo, sobre
“A (re) construção da identidade: visibilidades para os pedagogos sociais”,
iremos estudar como a construção da identidade se processa ou/e, ainda,
como a identidade pode ser reconstruída. No décimo capítulo do livro de
Pedagogia Social, a partir da “Cultura da aprendizagem: a vida”, examina-
remos como acontecem as aprendizagens e os significados da vida social
durante a nossa existência.

O sertão não chama ninguém às claras; mais, porém, se esconde e


acena. Mas o sertão de repente se estremece, debaixo da gente... E –
mesmo – possível o que não foi. O senhor talvez não acha? Mas, e o que
eu estava dizendo, mas mesmo pensando em Nhorinhá, por causa. Dói
vi  Apresentação

sempre na gente, alguma vez, todo amor achável, que algum dia se des-
prezou... Mas, como jagunços, que se era, a gente rompeu adiante, com
bons cavalos novos para retroco. Sobre os gerais planos de areia, cheios
de nada. Sobre o pardo, nas areias que morreram, sem serras de quebra-
-vento. (ROSA, 2001, 646)

Assim como o sertão não chama ninguém às claras, convido você a re-
alizar a leitura e o estudo dos capítulos do livro da Pedagogia Social. Dessa
forma, juntos, poderemos ir compreendendo o que do nosso cenário social
nos auxilia e nos caracteriza. Espero e desejo que tenha no contato desses
capítulos uma compreensão de que a tarefa que se impõe na pedagogia
social não é só de querer ensinar, mas, sobretudo, de aprender com o que
os cenários e as pessoas nos apresentam.

Prof. Dr. Laíno Alberto Schneider


Sumário

1 As Fronteiras da Pedagogia Social: Perspectiva Histórica,


Científica e Profissional..........................................................1
2 Pedagogia Social e Educação: Articulações...........................24
3 Pedagogia do Compromisso................................................42
4 Pedagogia Social: Intervenções e Ações...............................63
5 Pedagogia Social e Diversidade: Problematizações...............79
6 Conflitos: Realizações e Frustrações na Convivência.............98
7 Ambientes Sociais e a Organização...................................120
8 Pesquisa Socioeducativa na Pedagogia Social.
Elaboração de Projeto Pedagógico Social...........................144
9 A (Re)Construção da Identidade: Visibilidades para os
Pedagogos Sociais.............................................................158
10 A Cultura da Aprendizagem: a Vida...................................177
Graciela Lima Lopez1

Capítulo 1

As Fronteiras da
Pedagogia Social:
Perspectiva Histórica,
Científica e Profissional

1 Graciela Maria Lima López – Possui Graduação em Ciências Sociais – So-


ciologia – pela Universidade Católica de Pelotas (1981), Especialização Sociolo-
gia Industrial pela Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (1983),
Doutorado em Filosofia – Universidade Pontifícia de Salamanca (1997) com reva-
lidação Doutorado em Antropologia Social pela Universidade Federal do Rio de
Janeiro (2002), MBA Gestão Educacional (2007). Atualmente é docente do curso
de Pedagogia EAD e Presencial da Universidade Luterana do Brasil. Atuando nas
seguintes áreas: Educação, Gestão Educacional, Sociologia, Antropologia, Filoso-
fia, Pedagogia Social, Educação Social. Integrante do Grupo de Pesquisa e Estudos
Educação Social e Transversalidade na ULBRA/Canoas.
2   Pedagogia Social

Introdução

A Pedagogia Social tem, na atualidade, importância notável,


tanto para as Universidades como para os Movimentos So-
ciais, ONGs e Sociedade Civil Organizada.

A Pedagogia Social consiste em uma novidade dentro do


amplo aspecto das Ciências da Educação; o certo é que se
trata de uma realidade profissional e de um espaço acadêmico
com mais de um século de história, com presença na maioria
dos países que não tem assumido os princípios do chamado
Estado do Bem-Estar.

Esta ciência tem um papel preponderante na projeção da


formação dos Pedagogos Sociais, facilitando e guiando os
processos educativos coletivos. Este desempenho tem permi-
tido que os grupos assumam a responsabilidade no ser e no
que fazer, além da criação de redes sociais que dignificam as
pessoas e lhes permitem ascender a uma melhor qualidade de
vida.

Uma das mais importantes repercussões derivadas da crise


do Estado do Bem-Estar e das atuais Políticas Sociais tem sido
o nascimento da denominada nova Pedagogia Social. O perfil
dessa nova Pedagogia Social é requisito para facilitar a aplica-
ção do princípio de igualdade de oportunidades na socieda-
de civil organizada, assim como para alcançar a integração,
cooperação, solidariedade intercultural, obtendo melhores e
justos níveis de convivência na participação social.

Este capítulo pretende ser um recurso ou instrumento que


facilite a formação de estudos e ações profissionais aos inte-
Capítulo 1    As Fronteiras da Pedagogia Social: Perspectiva...    3

ressados na Pedagogia Social. Ele oferece, com clareza expo-


sitiva, uma síntese na linguagem dialógica, dos temas próprios
da Ciência da Pedagogia Social e da Transversalidade.

Abordamos, neste capítulo, as temáticas sobre o Contexto


da Pedagogia Social, o Marco Conceitual e de Referências de
Pedagogia Social, Princípios de atuação, funções, Perfil Profis-
sional do Pedagogo Social.

No decorrer do processo em desenvolvimento, tentaremos


dar respostas a uma série de questionamentos que permitirão
desenvolver os conteúdos das temáticas anteriormente expos-
tas.

O que é Pedagogia Social? Que tipo de saber e ação


desenvolve e constrói a Pedagogia Social? Quais são seus
objetivos de estudo? Seus métodos específicos de trabalho e
investigação? Qual é seu perfil profissional? Quais são suas
funções? Qual é sua prática profissional? Quais são suas mo-
dalidades de atuação socioeducativa?

A escolha do tema se fez com uma visão o mais realis-


ta e prática possível da sociedade, tendo como protagonista
o ser humano, conscientes de que a realidade social é tre-
mendamente complexa e que, na atualidade, estamos teste-
munhando múltiplas mudanças, para as quais estamos pouco
preparados. Pretendemos dar à Pedagogia Social uma ação
educativa formal e não formal.
4   Pedagogia Social

Marco conceitual e histórico da Pedagogia


Social
A Pedagogia Social é uma área emergente no âmbito da for-
mação de indivíduos e grupos humanos. Está situada no ponto
onde convergem o educativo e o social.

Seu fio condutor através da história não foi a mera curiosi-


dade teórica, e sim as necessidades práticas dos homens.

É importante conhecer suas origens, as correntes filosóficas


que a utilizam, o que a constituem para poder identificá-la
conceitualmente como ciência, com os objetivos socioeduca-
tivos concretos.

A Pedagogia Social nasce como ciência no século XIX, de-


dicada à formação social do indivíduo e à atenção educativa
dos problemas humanos sociais. Por isso, a Pedagogia Social
é uma Ciência Humana, Ciência Social e, sobretudo, Ciência
Pedagógica.

Tem um caráter teórico-prático e normativo das mesmas.

A sociedade atual vive exposta a conflitos e mudanças que


influenciam e afetam profundamente nossas formas de vida. É
por esse motivo que se faz necessário um estudo que facilite
as mudanças e a adaptação à nova ordem social existente.
Nesse contexto específico, emerge a Pedagogia Social como
ciência, com um importante papel na formação do indivíduo e
dos grupos humanos.

As reflexões especulativas não nascem na Pedagogia So-


cial de uma mera curiosidade, e sim de necessidades práticas
Capítulo 1    As Fronteiras da Pedagogia Social: Perspectiva...    5

concretas. A educação sempre teve conotações sociais, a par-


tir do século XIX começa a refletir-se cientificamente sobre a
Pedagogia Social.

Lembramos que, no mundo grego, por exemplo, as ideias


pedagógicas encontram-se geralmente inseridas nos tratados
de ética e política.

A axiologia platônica implícita na República de Platão e


reelaborada por Aristóteles e os filósofos estoicos encontrou
sua expressão pedagógica na doutrina medieval das virtudes
cardinais como guia prática da conduta humana.

Foi Rousseau que colocou como escolha ter que formar um


homem ou um cidadão, não podendo ser uma mesma coisa, a
escolha era um ou outro. Ante isso, escolhe formar um homem
desde uma proposta de educação natural, não na sociedade,
já que esta, segundo ele, perverte ao homem.

Rousseau não teve muitos seguidores em seu método. Mas


o desenvolvimento de habilidades e interesses naturais e es-
pontâneos dos indivíduos tem sido aspectos retomados por
outros autores. Daí o surgimento da Pedagogia individualista
preocupada com o perfeccionismo próprio de cada pessoa,
por meio de seus interesses e aptidões e pelo Laissez–Faire.
Até o século XVIII, não se encontram programas concretos de
Pedagogia Social.

Podemos citar Pestalozzi, na Suíça, e Bassedow, na Alema-


nha, como pedagogos que sonham com a ideia de democra-
tizar o ensino.
6   Pedagogia Social

Avançando até o século XIX para abordar a Pedagogia So-


cial com rigor científico, parece conveniente citar relações exis-
tentes entre as ciências: Sociologia e Educação.

Ambas tratam problemas comuns da realidade humana


desde pontos de vistas diferentes, com finalidades e objetos
diferentes.

Em contraposição ao individualismo, consideram que a re-


alidade humana não está nos indivíduos, senão no grupo.

A concepção doutrinal sociofilosófica marcou seu impacto


no século XIX em ambas as ciências ao considerar o social não
só como origem dos valores humanos, mas também como o
último ideal a ser conseguido pelo homem.

Desde essa visão dominante dos fins do século passado,


nasce uma corrente ou escola ideológica chamada de Peda-
gogia Sociológica, que na educação tem uma finalidade ex-
clusivamente social. Essa tendência pedagógica foi apoiada
na França por Durkhein, nos EUA por Dewey e, na Alemanha,
por Natorpp, dando espaço a diferentes escolas seguindo as
ciências que fundamentam a interpretação do social e do edu-
cativo.

Devido às nefastas consequências da 1º Guerra Mundial,


surge um período histórico em que se registram diversos movi-
mentos pedagógicos favorecendo o surgimento da Pedagogia
Social.

Foi Natorpp o primeiro alemão a elaborar uma teoria so-


bre a Pedagogia Social, concebida como saber prático e saber
teórico.
Capítulo 1    As Fronteiras da Pedagogia Social: Perspectiva...    7

Pensadores como Wilmann e Rein são responsáveis pelas


propostas radicais.

Willmann representa a concepção social histórica da Peda-


gogia Social, conciliando os pontos de vista individual e social.

Esta corrente iniciou com Hermann Nohl na Alemanha (o


pai da Pedagogia Social (1879-1960)) e o Movimento de Pe-
dagogia Social, considerada como a teoria de uma prática
para a prática que não existe sem a relação com a realidade
social.

Segundo Nohl, a Pedagogia Social é uma Ciência da Edu-


cação que não se realiza na escola nem na família. Por esse
motivo, fala-se da Pedagogia Social como Educação do Ter-
ceiro Espaço, ou seja, a ciência da educação dos mais neces-
sitados como uma estratégia preventiva.

Como aspectos característicos da Pedagogia Social da ne-


cessidade promovida por Nohl, podemos destacar o seguinte:
partir de uma realidade concreta na teoria; integrar educati-
vamente todos os esforços e iniciativas que pretendam ajuda
à juventude; procurar sempre o bem-estar do sujeito; mudar
as condições ambientais para assegurar a eficácia da ação
educativa social (ARROYO, 1985, p. 208).

Defendendo-se a ideia de Pedagogia Social dentro da Edu-


cação Geral, orientou-se o campo teórico da mesma até as
atividades educativas extrafamiliares e extraescolares. Defen-
de-se a ideia de proteção à criança e juventude como tarefa
complementar ou como suprimento às funções educativas das
instituições tradicionais.
8   Pedagogia Social

A última etapa da Pedagogia Social, a partir de 1945, é


identificada como a do Ensino e Profissionalização da Peda-
gogia Social.

É uma nova etapa, a Pedagogia da Reforma e Pedagogia


da Cultura. No aspecto teórico, aprofunda-se nos aspectos
metodológicos (empíricos) e conceituais (Klauss, Mollehauer,
Runger, Iben), tendo como base as 4 correntes de pensamen-
tos da Pedagogia Social: Teórica Crítica, Racionalismo Crítico,
Marxismo, Ecologismo.

Nesse contexto específico, a práxis educativa compreende


a integração social de jovens, quando necessário, o enfoque
preventivo desta integração e a assistência social às pessoas
adultas sem matizes educativos em sua atuação.

Segundo Montoya (2002), as características mais relevan-


tes são: proteção à pesquisa socioeducativa, pragmatismo (ao
fazer revisões da sociedade), e educação, análises e sistemati-
zação do trabalho social, abertura de vários campos profissio-
nais para os Pedagogos Sociais.

Na Espanha, o termo Pedagogia social é utilizado pela pri-


meira vez em 1915 por Ortega y Gasset.

Após a 2ª Guerra Mundial, a Pedagogia Social ganhou


relevância quando o desenvolvimento dos povos exigia uma
elevação rápida dos níveis educacionais e uma expansão da
economia e os mercados exigiam uma elevação rápida dos
níveis educacionais.

Em 1932 a 1944, ela foi estudada e desenvolvida nas uni-


versidades por Luzuriaga e Ruiz, Amada P. Del Rio, Blanco.
Capítulo 1    As Fronteiras da Pedagogia Social: Perspectiva...    9

Neste contexto específico, os Pedagogos Sociais surgem como


educadores especializados, preparados para trabalhar fora da
escola e da família, trabalhando com crianças marginalizadas,
menores infratores, adultos analfabetos organicamente inseri-
dos em uma sociedade tradicional.

A Pedagogia Social é encarada pelos Pedagogos Sociais


como um processo de mudança cultural e social sujeita a resis-
tências e a serviço da ideologia dominante do momento, seja
essa conservadora ou revolucionária.

No Brasil, os primeiros passos da Pedagogia Social da-


tam de 1940 e estão associados às experiências iniciais da
alfabetização e educação de adultos, sob a inspiração de M.
B. Lourenço Filho, e à campanha de alfabetização de adoles-
centes e Adultos (1947- 1963). O mais importante foi o Se-
minário Interamericano de Educação de Adultos realizado no
Brasil patrocinado pela UNESCO e a OEA (1949), na qual se
introduz o conceito de Educação de Base.

Em 1952, baseada na experiência das Missões de Edu-


cação Rural (CNER), esta organização atuou até 1963. Foi
esta a primeira aplicação plena no Brasil das teorias e técni-
cas da Pedagogia Social. Essa alfabetização era colocada em
uma perspectiva de mudança cultural, estrutural, identificava o
analfabetismo e miséria e propunha uma solução ao proble-
ma social pela via da comunicação dos grupos organizados e
de suas lideranças.

Atualmente, a Educação Social segue 4 áreas: animação


socioeducacional, Educação de Jovens e Adultos, Educação
para o trabalho e Educação Especializada.
10   Pedagogia Social

Conceito de Pedagogia Social


Refere-se à práxis educativa, Ciência da Educação, quando
se fala de sua intenção científica; Doutrina sobre a Educação,
quando a expressão se refere a conhecimentos sobre Educa-
ção procedente da Epistemologia.

Existe uma diversidade de conceitos e objetivos sobre a Pe-


dagogia Social.

Como teoria científica a Pedagogia Social, é disciplina


acadêmica em um currículo, práxis ou atividade profissional,
exercida mediante intervenções técnicas (FORMOSO, 1994).

Segundo Quintana (2000), podemos conceituar:

ÂÂTeoria da Pedagogia Social do Indivíduo

ÂÂTeoria da Pedagogia Política e Nacionalista do Indivíduo

ÂÂTeoria da Ação Educadora da Sociedade

ÂÂTeoria do Auxílio social à Criança e à Juventude

ÂÂTeoria da Sociologia da Educação

O Pedagogo Social é uma figura profissional surgida de


diversas práticas e identidades profissionais.

É o aspecto da educação integral do ser humano que tende


a preparar a criança, o adolescente, o jovem, o adulto para
uma convivência com seus semelhantes que elimine ou redu-
za ao mínimo os atritos e os conflitos, capacitando-o para a
compreensão dos demais, o diálogo, construtivo e a paz social
(QUINTANA, 1989).
Capítulo 1    As Fronteiras da Pedagogia Social: Perspectiva...    11

É a ciência das repercussões que a educação tem na so-


ciedade.

É a ciência da ação educativa fora da família e da escola.

É a ciência pedagógica que pretende satisfazer as neces-


sidades individuais e comunitárias frequentes nas sociedades
industrializadas.

É a ciência pedagógica do Trabalho Social.

É a ciência que se propõe a prevenir, ajudar e curar os des-


vios de condutas da criança e do adolescente, da juventude.

É a ciência que fundamenta a ação compensatória direcio-


nada àqueles que não puderam, por causas normais, desen-
volver-se satisfatoriamente.

É a ciência educativa sobre socialização.

Para Baumer, a Pedagogia Social é a soma dos esforços


educativos da sociedade e do Estado fora da Escola.

É a ciências dos fenômenos sociais que tem como tarefa


descobrir e explicar os processos sociais como individuais de
forma que os fatos sejam compreendidos.

Objetos da Pedagogia Social


A informação se apresenta de forma esquemática:

Pedagogia Social – Seus objetos:

- Objeto Material – O Homem enquanto Educando;


12   Pedagogia Social

- Objeto Formal – Socialização justificando e Com-


preendendo a resolução dos conflitos Sociais por meio
da educação.

Objetos:

- Trabalho Social – Ajuda às necessidades Humanas –


Sociais;

- Pedagogia Social – Socialização do indivíduo.

Funções da Pedagogia Social


A Pedagogia Social apresenta as seguintes funções:

- Atenção à criança, ao adolescente e aos jovens com


problemas;

- Atenção à terceira idade – ao idoso;

- Atenção à família;

- Atenção às pessoas com deficiência;

- Pedagogia Hospitalar;

- Prevenção e tratamento de tóxicos – drogadição;

- Prevenção de marginalização e menores em conflito


com a lei (menores infratores);

- Reeducação dos dissocializados – reabilitadora;

- Atenção aos grupos riscos e marginalizados;

- Promoção da mulher;
Capítulo 1    As Fronteiras da Pedagogia Social: Perspectiva...    13

- Educação de Jovens e Adultos;

- Alfabetização;

- Animação sociocultural;

- Pesquisadora Avaliativa / Diagnóstica;

- Detentora e de análise dos problemas sociais e suas


causas;

- Função de orientação e de relação institucional;

- Função relacional e dialógica com os educandos;

- Função organizativa e participativa de vida cotidiana e


comunitária;

- Função formativa, informativa e orientadora;

- Função docente social;

- Função econômica profissional. (PETRUS, 1997)

As funções podem ser definidas também a seguir, conforme


o meio onde o Pedagogo Social desenvolve seu trabalho.

Apresentamos o seguinte esquema:

Funções no meio:

- Externo – realizam-se desde uma Instituição para o


meio aberto ou exterior – Indivíduo e/ou unidades
familiares – orientado às pessoas interessadas, orien-
tado para prevenção, trabalho relacionado a outras
instituições;
14   Pedagogia Social

- Interno – realizam-se dentro de uma instituição, de


uma escola ou identidade;

- Gestão – desenvolvem-se distintamente em um ou em


outro meio;

- Liderança, Gerenciamento, Coordenação.

As funções dos Pedagogos Sociais independentes do meio


giram em torno da:

- Identificação e análise de problemas das pessoas indi-


vidual e coletivamente;

- Intervenção educativa;

- Encaminha casos que necessitam de intervenção de


outros profissionais ou instituições especializadas;

- Gestão própria da atividade educativa personalizada


ou da Instituição.

Competências, Habilidades, Atitudes da


Pedagogia Social
Joe Beck
Capítulo 1    As Fronteiras da Pedagogia Social: Perspectiva...    15

Fonte: Graciela Lima López

A Pedagogia Social se entrelaça com a educação cívica,


moral, social para formar cidadãos conscientes, livres, críticos,
participativos capazes de construir em conjunto uma socieda-
de mais justa, solidária e humana.

Para realizar as funções, o Pedagogo Social precisa de


competências, capacidades e atitudes.

Perfil do Pedagogo Social


Joe Beck
16   Pedagogia Social

Fonte: Romans, Mercê (2003).

Quanto a conhecimentos
- Gerais

Específicos:

- Geral e/ou específico das áreas básicas do meio;

- Metodologias sobre fazer;

- De suas funções para poder intervir;

- Conhecimento de suas capacidades e limitações de


elaborar Projetos Educativos – de intervir no plano
Capítulo 1    As Fronteiras da Pedagogia Social: Perspectiva...    17

educativo, de trabalhar em equipe, de formação con-


tínua, capacidade para gerir recursos.

Segundo Petrus (1997), o Pedagogo Social deve apresentar


este perfil:

- Caráter otimista, dinâmico, aberto ao trabalho em


equipe e à colaboração;

- Criativo, comunicativo, colaborativo;

- Respeitoso;

- Capaz de analisar as causas e consequências dos pro-


blemas sociais;

- Sensibilidade para não se escandalizar diante de situa-


ções que os usuários apresentem;

- Controle e equilíbrio nas emoções, na sua emotivida-


de;

- Maturidade para enfrentar situações, incidentes ou


casos cujas resoluções sejam dificilmente compatíveis
para própria pessoa;

- Ser consciente de seu nível de estresse e ter sob contro-


le as consequências que para ele comporte a relação
diária com a problemática social, levando em conta
as limitações existentes na resolução de certos proble-
mas;

- Ser capaz de refletir e de melhorar sua prática profis-


sional.
18   Pedagogia Social

Competências do Pedagogo Social


- Atividades para as pessoas a que se dirigem as ações;

- Para atender as organizações tanto públicas quanto


privadas;

- Para as ações com a equipe de trabalho.

Daí a importância da formação contínua dos Pedagogos


Sociais para cumprir seus objetivos previstos em suas interven-
ções, acompanhando as mudanças e respectivas necessidades
de adequação e inovações.

A formação continuada dos Pedagogos Sociais é importan-


te para otimizar a prática educativa.

Recapitulando

Em definitivo, a Pedagogia Social focaliza sua atuação global


para a comunidade em seu conjunto, atuando sobre grupo e
sujeitos, problemáticas específicas, desde uma ação que, ba-
seada em princípios, pretenda a execução dos objetivos ade-
quados a cada nível de intervenção e com as metodologias
necessárias para cada um e cada setor.

A Pedagogia Social, como é entendida hoje, está centrada


na motivação, no interesse e na participação.

É usada como sinônimo de Educação Permanente, Edu-


cação ou Desenvolvimento de Comunidade, Educação não
sistemática, Educação para o Desenvolvimento.
Capítulo 1    As Fronteiras da Pedagogia Social: Perspectiva...    19

A Pedagogia Social, na atualidade, é o resultado de três


principais correntes de pensamento e ação:

1° Como réplica, depois como complemento à Educação


Formal. Uma educação de forma e conteúdo autoritários em
que o estudante desempenha o papel inteiramente passivo;

2° A necessidade da Educação de Jovens e Adultos sobre


o conceito de Pedagogia Social é transparente nas iniciativas
Norte Americanas do século XIX, acompanhadas às campa-
nhas de Recreação, Lazer Popular – criam-se movimentos
como Escoteiros, Associação Cristã de Moços, que comple-
mentavam a obra da Família, Escola e da Igreja na Educação
da Personalidade;

3° Finalmente, os trabalhos em grupos junto à experiência


de Serviço Social vieram enriquecer o novo conceito.

A Pedagogia Social tem inspirado ações nas diversas cam-


panhas dos Movimentos Sociais e Educacionais, formais e in-
formais.

Permanece como movimento autêntico de acessibilidade,


inclusão, empoderamento, onde quer que a Sociedade Nacio-
nal se encontre dividida e destituída de seus direitos políticos-
-sociais-humanos.

Seu objetivo agora é a participação popular e a formação


da Sociedade Civil, o que veio a enriquecer sua temática.

A Pedagogia Social volta ao Terceiro Mundo, à América La-


tina, para receber um novo sentido, na medida em que se mo-
20   Pedagogia Social

dernize e participe desse novo complexo cultural, desse novo


mundo possível.

Referências

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1985.

FORMOSO, P. Pedagogia Social. Fundamentação Científica.


Barcelona: Herder, 1994.

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ROMENS, Mercê; PETRUS, Antoni; TRILLA, Jaume. Profissão


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Atividades

1) A Pedagogia Social é uma área emergente no âmbito da


formação de indivíduos e grupos humanos. Ela trata:

a) De problemas comuns da realidade humana desde


ponto de vistas diferentes, com finalidade e objetos di-
ferentes.
22   Pedagogia Social

b) Da contraposição ao individualismo, considerando


que a realidade humana não está nos indivíduos se-
não no grupo.

c) Do social, da origem dos valores humanos.

d) Do saber prático e teórico.

e) Todas as alternativas estão corretas.

2) Para realizar as funções, o Pedagogo Social precisa de


competências, capacidades, habilidades e atitudes. Isto é,
deve apresentar certo perfil:

a) Escandalizar-se diante de situações que os usuários


apresentem.

b) Ser capaz de analisar as causas e consequências dos


problemas sociais.

c) Não controlar as emoções, não ser capaz de refletir e


de melhorar sua prática social.

d) Não atender às organizações privadas.

e) Não ter consciência de seu nível de estresse, nem con-


trole da relação diária com a problemática social, le-
vando em conta as limitações existentes na resolução
de certos problemas.

3) A Pedagogia Social nasce como Ciência no século:

a) XVI

b) XVII
Capítulo 1    As Fronteiras da Pedagogia Social: Perspectiva...    23

c) XVIII

d) XIX

e) XX

4) A Pedagogia Social é encarada pelos Pedagogos Sociais


como um processo de mudança cultural e social. No Bra-
sil, os primeiros passos da Pedagogia Social datam de
1940 e estão associados às experiências de:

a) Alfabetização de crianças

b) Educação inclusiva

c) Alfabetização e educação de jovens e adultos

d) Educação rural

e) Educação de base

5) Atualmente, a Pedagogia Social segue as áreas de:

a) Educação de Jovens e Adultos

b) Educação para o Trabalho

c) Educação Especializada

d) Animação Socioeducacional

e) Todas as alternativas estão corretas.

Gabarito
1) e  2) b  3) d  4) c  5) e
Christiane Martinatti Maia1

Capítulo 2

Pedagogia Social e
Educação: Articulações

1 Christiane Martinatti Maia é graduada em Pedagogia Séries Iniciais e Matérias


Pedagógicas do Segundo Grau pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul
(UFRGS), Especialista em Psicopedagogia Institucional e Clínica pela Faculdade
Porto-Alegrense (FAPA) e Mestre em Educação, ênfase em Educação Especial, pelo
Programa de Pós-Graduação em Educação da UFRGS (PPGEdu/UFRGS). Atua,
desde 1992, na área de pesquisa e, atualmente, participa como pesquisadora de
dois grupos cadastrados no Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e
Tecnológico (CNPq), intitulados Psicopedagogia, Ludicidade e Processos de Ensinar
e Aprender e Educação a distância: mitos e desafios. Atualmente, é professora da
Universidade Luterana do Brasil (ULBRA) nos campi Canoas, Guaíba e São Jerôni-
mo nas modalidades presencial e a distância.
Capítulo 2    Pedagogia Social e Educação: Articulações    25

Introdução

No presente capítulo, serão abordadas as ideias de Vigotski e


dos representantes da teoria Histórico-Cultural frente à cons-
trução dos processos de aprendizagem no sujeito e as interfa-
ces com as dimensões sociais e culturais que os constituem,
a necessidade de articulação entre a Pedagogia Social e a
Pedagogia para o entendimento da relação eu e outro e a
construção de conhecimentos.

2.1 Pedagogia social e Pedagogia:


articular é preciso!

Frente às diretrizes e legislações atuais relacionadas ao curso


de Pedagogia, pode-se destacar que essas se vinculam a for-
mação de profissionais associados às áreas formais da Educa-
ção, capacitando-os para a docência nas áreas de Educação
Infantil, anos iniciais do Ensino Fundamental e Educação de
Jovens e Adultos (EJA), bem como para a gestão de instituições
de ensino, formação de professores e estruturação de projetos
educacionais. Apesar dos licenciandos perceberem as diferen-
ças entre os espaços formais e não formais de educação e
essa discussão ocorrer em sua formação, infelizmente, o es-
paço para a discussão dos historicamente excluídos, margina-
lizados não apenas em processo educacionais, mas políticos,
econômicos, sociais e culturais ainda é pequeno nos cursos de
graduação. E a formação para atuação nesses campos, mais
26   Pedagogia Social

ainda, principalmente no que se refere na ação educadora da


sociedade (MACHADO, 2002, p.05).

Desse modo, pode-se inferir o primeiro diferencial entre


a Pedagogia e a Pedagogia Social: enquanto a primeira ar-
ticula-se em espaços formais de educação em sua maioria,
relacionada à formação de professores, a segunda constitui-
-se em espaços não formais de educação, preocupada com
ações educativas transformadoras, não apenas frente à vida
dos sujeitos, mas sua vida em sociedade. Machado (2002, p.
3) auxilia no entendimento dessa discussão ao colocar:

Assim, têm sido considerados, como objetivos da Peda-


gogia Social, dois campos distintos: o primeiro referente
à socialização do indivíduo, socialização compreendida
como ciência pedagógica da educação social do indi-
víduo, que pode ser desenvolvida por pais, professores
e família; o segundo relacionado ao trabalho social,
com enfoque pedagógico, direcionado ao atendimento
a necessidades humano sociais, desenvolvido por equi-
pe multidisciplinar da qual participa o Educador Social,
como profissional da Pedagogia Social.

Mas essa diferenciação se mantém em uma visão vigotskia-


na? Podemos separar essas duas áreas ou há necessidade de
redimensioná-las? De articulá-las na formação dos estudantes
de Pedagogia e não apenas relacioná-las à Pedagogia Social?

Para Vigotski (1991) e demais representantes da Teoria His-


tórico-Cultural, o desenvolvimento humano constitui-se como
um complexo processo dialético, no qual a interação de fato-
res externos e internos promovem uma apropriação do meio
Capítulo 2    Pedagogia Social e Educação: Articulações    27

que não pode ser compreendida em um viés comportamental


ou de aceitação, mas, sim, dos aspectos histórico, cultural e
social que os sujeitos compartilham de modo qualitativo – as
relações entre eu e o (s) outro(s) no espaço cultural: a cultura
origina formas especiais de conduta, modifica a atividade das
funções psíquicas, edifica novos níveis no sistema do compor-
tamento humano em desenvolvimento (2000 b, p.34).

Quando pensamos em construção de conhecimentos for-


mais/científicos, para o teórico não há como separar cultura
da prática pedagógica, visto que, para Vigotski, o processo
de instrução possibilita a constituição da consciência. Assim,
compreende o saber como aspecto social, construído nas inte-
rações, mediações sociais, onde o educador seria responsável
por estruturar atividades educativas as quais permitam a cria-
ção, a internalização de forma crítica e reflexiva do conhe-
cimento social: o ambiente social é a autêntica alavanca do
processo educativo, e o papel do professor consiste em lidar
com essa alavanca (1991, p.72).

Dessa forma, a aprendizagem da cultura e a cultura da


aprendizagem se constituem de forma inter-relacionada e dia-
lética: todas as aprendizagens ocorrem em contextos sociais.
Diferentes contextos em diferentes culturas, visto que para o
teórico as culturas são múltiplas e não única. Assim, quan-
do pensamos em aprendizagem cultural, essa não é estanque
ou invariável, mas, sim, complexa, variável frente às relações
que as constituem (MARTÍNEZ, 2007, p.43): a relação entre
o aprendiz e os materiais de aprendizagem está mediada por
certas funções ou processos de aprendizagem, que se derivam
da organização social dessas atividades e das metas impostas.
28   Pedagogia Social

Não há como os educadores, em uma premissa vigotskia-


na, deixarem fora de sua sala de aula, dos muros da escola,
questões como identidade de gênero, identidade étnica, di-
reitos das pessoas com deficiência, dificuldades de aprendi-
zagem, movimentos sociais entre outros. A instituição escolar
não é vista como um espaço a parte da cultura, da sociedade,
mas, sim, parte integrante da cultura, do social e do cultural:
espaço significativo para a construção de aprendizagens dos
sujeitos, também se constitui por meio dos conhecimentos dos
sujeitos, de suas experiências:

Contextos de ensinar e aprender são, portanto, contex-


tos de produção de significações em que os sujeitos em
relação ativamente produzem aos outros como a si mes-
mos. Isso porque aprender, de acordo com a Psicologia
Histórico-Cultural, consiste na apropriação ativa (e não
adaptação, introjeção literal do percebido) das significa-
ções das produções humanas que caracterizam a reali-
dade como universo semiótico: é um meio para a huma-
nização, posto que possibilita a constituição de modos
mais complexos e elaborados de regulação pelo próprio
sujeito de sua conduta e vontade. (ZANELLA, ROS, REIS
E FRANÇA, 2004, p. 96)

Assim, para o teórico, a apropriação de conceitos produ-


zidos socialmente e culturalmente, bem como os presentes no
espaço educativo, não é neutra, muito menos possui caracte-
rísticas de arbitrariedade, mas, sim, interage com as histórias
de vida dos sujeitos, suas potencialidades, diferenças, necessi-
dades e anseios, pois para o teórico cada sujeito: é um agre-
Capítulo 2    Pedagogia Social e Educação: Articulações    29

gado de relações sociais encarnadas num indivíduo (2000c,


p. 33).

As relações interpessoais presentes no espaço educativo,


assim, são produzidas pela intermediação das relações, das
trocas caracterizadas pelas significações características de dis-
tintos grupos sociais aos quais pertencem os sujeitos e insti-
tuem suas histórias. Situações de marginalização, de exclusão,
de integração estão dentro dos muros da escola, das salas de
aula, mesmo que não sejam conteúdos programáticos – não
há como retirar da pele do sujeito suas marcas, suas histórias,
vivências e discursos. A escola não apaga, mas busca ignorar
as múltiplas vozes presentes – nas salas de aula e em seu en-
torno – da comunidade na qual a instituição está inserida. E é
esse ignorar que a Teoria Histórico-Cultural problematiza: se
ignoro a história de vida do sujeito e de seu grupo social, suas
problemáticas, ignoro os processos educativos!

o estudo das relações sociais não pode se restringir ao


exame do plano observável das interações face a face;
os processos de linguagem que acontecem nessas intera-
ções devem ser vistos como algo maior do que a conver-
sação de interlocutores imediatos; os efeitos dos outros
sobre o indivíduo não dependem somente de formas de
atuação direta; os outros não são apenas as pessoas fisi-
camente presentes, mas também “figurastipo” da cultura
ou representantes dos códigos e normas, participantes
das práticas sociais. (GÓES, 2000, p. 128)

Pode-se compreender a instituição escolar, nessa perspec-


tiva, como representação da sociedade, com seus distintos
30   Pedagogia Social

estratos sociais, paradigmas acerca dos sujeitos e de mun-


do. E os significados devem ser ressignificados nas práticas
educativas, pois apesar de esse espaço proporcionar conhe-
cimentos científicos, deve partir daquilo que constitui o sujei-
to: suas emoções, dúvidas, valores éticos e morais a fim de
partilhar, compartilhar e ressignificar – inclusive aprendizagens
de mundo. Das características singulares, construir as carac-
terísticas plurais: o que nos torna único-individual, nos torna
plural-social. De subjetividades e de alteridades compor-se e
descompor-se, em práticas sociais, na escola:

na subjetividade social da escola, além dos elementos


de sentido de natureza interativa gerados no espaço es-
colar, se integram à constituição subjetiva deste espaço
elementos de sentido procedentes de outras regiões da
subjetividade social, como podem ser elementos de gê-
nero, de posição socioeconômica, de raça, costumes, fa-
miliares, etc., que se integram com os elementos imedia-
tos dos processos sociais atuais da escola. (GONZÁLEZ
REY, 2003, p.203)

2.2 O contar sobre si: tecer a Educação


Social e a Educação?!

Toda emoção é um chamamento à ação ou uma renúncia a


ela. (...) As emoções são esse organizador interno das nossas
reações, que retesam, excitam, estimulam ou inibem essas ou
aquelas reações. Desse modo, a emoção mantém o seu pa-
Capítulo 2    Pedagogia Social e Educação: Articulações    31

pel de organizador interno de nosso comportamento (2004,


p. 139).

A educação carece do olhar da educação social: não ape-


nas ver, mas aprender a escutar com os olhos os sujeitos que se
encontram em vulnerabilidade social, tais como os moradores
de rua, os sujeitos que estão sob efeitos de substâncias psico-
ativas que alteram seu comportamento – os ditos dependentes
químicos, os profissionais do sexo que convivem com o medo,
a violência física, sexual e o preconceito social. Todos os sujei-
tos que se encontram à margem da sociedade – sinalizados em
nossos discursos, mas pouco visualizados em nossas práticas.
Principalmente, em práticas educativas que os encantem: para
a vida, para a aceitação das diferenças.

Encantamento por maravilhar-se frente o conhecimento.


Emocionar-se por contar sua história–narrativa em uma via
tortuosa, vida fragilizada em movimentos de vulnerabilidade
social: exposto no dia a dia, qual caminho construir na escola?
Nas ruas que se intercruzam, mas podem não levar a lugar
nenhum? E o papel do outro, dos outros nas aprendizagens
cotidianas, no espaço educativo? Martínez (2006, p.117) des-
taca que:

O reconhecimento do caráter histórico e cultural da


constituição da psique humana e, especialmente, o pa-
pel essencial que é conferido ao Outro nos processos de
aprendizagem e desenvolvimento na ontogênese reme-
tem à compreensão da aprendizagem escolar não ape-
nas como um processo do sujeito individual, mas como
um processo de natureza social.
32   Pedagogia Social

Pode-se entender que a aprendizagem se constrói com base


no social para Vygotsky, porém as instituições escolares permi-
tem que os aspectos sociais sejam encontrados dentro de seus
muros? Como a relação com os outros, com as diferenças, é
apresentada nas salas de aulas? Os discursos respeitam e se
estruturam com base em outros discursos? A palavra, as pa-
lavras para o teórico me posicionam na relação eu e outro(s):
acabo por me visualizar, por me relacionar comigo conforme
os outros me visualizam, como se relacionam comigo. E quais
as palavras que encontramos frente às questões associadas à
vulnerabilidade social? Quais os olhares lançados e constru-
ídos? Mergulhando ao fundo de si mesmo o homem encontra
os olhos do outro ou se vê com os olhos do outro (BAKHTIN,
2002, p.328).

O sujeito se torna, assim, em sua constituição, complexo:


não são apenas aspectos biológicos, emocionais, cenestési-
cos, cognitivos que o compõe, mas saberes e não saberes,
aspectos sociais e culturais, questões associadas ao gênero,
etnia, sexualidade, estrato social, amigos, familiares. Produtor
de história, produzido pela história.

Sujeito plural e heterogêneo


É nessa noção de pluralidade e heterogeneidade que Vigotski
(2000) se pauta para produzir fraturas na concepção de su-
jeito moderno ao lançar mão da expressão “pessoa social”.
Para Sirgado (2000), “a ideia de ‘pessoa social’, no contexto
em que ela aparece, é o equivalente de ‘agregado de relações
sociais incorporadas num indivíduo’, o que fala mais de multi-
Capítulo 2    Pedagogia Social e Educação: Articulações    33

plicidade que de unidade, como é entendida a ideia de sujeito


psicológico” (Barros, 2012, p. 126).

Dessa forma, pode-se compreender o conceito de pessoa


social para Vigotski como o resultado de relações dinâmicas
de sua constituição com base histórica mediada pela lingua-
gem – apropriação dos signos, práticas sociais estabelecidas
em sua comunidade:

O social está lá, presente, mesmo quando estamos sozi-


nhos; ele não está fora de nós mesmos, nem somente en-
tre nós, ele está em nós, no espírito e no corpo de cada
um de nós... Simultaneamente, essa abordagem é não
apenas muito social, mas também muito subjetiva, por-
que no fundo o que ele diz, é que o social está vivo se,
de certa maneira, ele está acordado permanentemente
pela atividade singular, subjetiva. Não é o social entendi-
do como coação, restrição externa, mas um social vivo.
(CLOT, 2006, p.23)

Se o social é vivo para Vygotsky no mundo externo à escola,


por que se torna invisível no espaço educativo? Cabe à edu-
cação e não apenas à educação social o rompimento com as
metodologias tradicionais de ensino que engendram o sujeito,
que percebem o aprender como memorização de conteúdos,
que integra o sujeito considerado diferente, deficiente e não
o inclui. Que não promove o todo, o complexo, o social nas
relações: individualiza ao avaliar, ao fragmentar os conheci-
mentos, ao selecionar saberes e conhecimentos – torna a sala
de aula como um pódio ao destacar os melhores e a rejeitar
os que considera piores. E os educandos em vulnerabilida-
34   Pedagogia Social

de social percebem seu lugar nesse cotidiano: estigmatizados,


com marcas que os denunciam, acabam por evadir – o que
representa a escola para eles?

Em uma interpretação simples das palavras de Vigotski, po-


deria se pensar que o que ocorre no plano pessoal é uma sim-
ples imitação do que ocorre no plano social da relação. Mas
em uma interpretação mais cuidadosa, pode-se dizer que, ao
interiorizar a significação do outro da relação (e não poderí-
amos esquecer que cada pessoa faz parte de uma malha de
relações diferentes), o indivíduo está dando entrada na sua
esfera íntima a esse outro... Uma vez que toda relação social
é relação de um eu e um outro, sua internalização implica
na conversão de dois em uma unidade na qual o outro per-
manece sempre presente como um “não eu”, um estranho....
Além disso, se as relações reais entre as pessoas constituem
geneticamente o substrato das funções psicológicas, como diz
Vigotski, então é fácil entender por que a subjetividade huma-
na adquire a forma de drama real (SIRGADO, 2000, 67).

Dramas reais que a Educação não acolhe: os margina-


lizados, considerados desviantes sociais, e seus problemas e
necessidades são acolhidos pela educação social – seria o
social um sufixo que permite a essa educação perceber que o
sujeito não se constitui sozinho? Que em seus momentos de
relação com o outro e construção a partir do outro necessita
de vários outros?

Cabe à Pedagogia e à Pedagogia Social o diálogo, a fim


de, em vez de continuarem em caminhos opostos ou binários,
constituírem-se em um viés educativo que respeite o social do
Capítulo 2    Pedagogia Social e Educação: Articulações    35

sujeito social: articular é preciso para que os processos de es-


cuta construam práticas educativas inclusivas com metodolo-
gias diferenciadas para educandos diferenciados: ouvir é ver
aquilo de que se fala, falar é desenhar imagens visuais (STA-
NISLAVSKI).

Afinal de contas, para a teoria Histórico-Cultural o outro


nos constitui de forma significativa com sua história de vida.
Um outro histórico, cultural e social. Sem o(s) outro(s), não
há eu!

Recapitulando

o outro me olha e, como tal, detém o segredo de meu


ser e sabe o que sou; assim, o sentido profundo de meu
ser acha-se fora de mim, aprisionado em uma ausência;
o outro leva vantagem sobre mim /.../ Sou experiência
do outro: eis o fato originário. (SARTRE, 1999, p. 453).

Articular conhecimentos se faz necessário. Articular teoria e


prática. Articular olhares, escutas e interfaces entre a Pedago-
gia e a Pedagogia Social. Quem são os excluídos, marginali-
zados, desviantes da sociedade, de nossas salas de aula, de
nossos olhares e escutas?

A Pedagogia deve reestruturar-se frente às necessidades


atuais, não apenas metodológicas e teóricas, mas de aceita-
ção das diferenças e dos considerados diferentes: a inclusão
inicia no sujeito e não através de legislações!
36   Pedagogia Social

Em uma premissa vigotskiana, não há como o processo


educativo não problematizar e atuar frente questões que se
encontram presentes no cotidiano do sujeito: violência, po-
breza, marginalização, dependência química, gênero, etnia,
dificuldades de aprendizagem etc., pois o que está presente
na sociedade, está presente na escola. Assim, é necessário que
se compreenda que a aprendizagem é um processo cultural,
social, decorrente de processos de mediação, de intervenção
do outro – um outro que sabe outros saberes, outros conceitos.
Porque não possibilitamos o aprender de outros saberes para
articulá-los com outros conhecimentos?

Para Vigotski, o encantamento do processo educativo está


no permitir o eu e o outro a olhar: não a mesma paisagem,
mas as múltiplas paisagens, os múltiplos focos que desviam
nosso olhar, para que, quem sabe, possamos, juntos, olhar:
para o outro eu que está ao nosso lado e que deseja aprender
a aprender a olhar!

Referências

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blemas fundamentais do método sociológico na ciência da
linguagem. São Paulo: Hucitec, 2002.

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Capítulo 2    Pedagogia Social e Educação: Articulações    37

CLOT, Y. Vygotski: para além da Psicologia Cognitiva. Pró-


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38   Pedagogia Social

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tir da psicologia histórico-cultural. Psicol. Soc. [online].
2005, vol.17, n.2, pp. 99-104.

Atividades

1) Responda às questões abaixo com as alternativas V para


Verdadeiro e F para Falso:
Capítulo 2    Pedagogia Social e Educação: Articulações    39

a) A aprendizagem da cultura acaba por levar a uma de-


terminada cultura da aprendizagem. As atividades de
aprendizagem devem ser entendidas no contexto das
demandas sociais que as geram.

b) Vigotski nega o aspecto biológico no desenvolvimento


humano.

2) Considere as afirmativas a seguir e assinale a alternativa


correta:

I. A Pedagogia social surge atrelada à necessidade de


cuidado social em ações de intervenção e prevenção.

II. Os sujeitos marginalizados têm sua dignidade humana


diminuída. Tornam-se os desviantes – aqueles a que
pouco nos referimos, pouco escutamos.

III. A pedagogia vivencia, atualmente, propostas metodo-


lógicas que acolhem as diferenças, a diversidade em
todos os espaços educativos. Desse modo, não po-
demos falar em sujeitos marginalizados, excluídos dos
espaços educacionais.

a) Somente as afirmativas I e II estão corretas.

b) Somente as afirmativas II e III estão corretas.

c) Somente a alternativa II está correta.

d) Somente a alternativa III está correta.

e) Todas as afirmativas estão corretas.


40   Pedagogia Social

3) Considere as afirmativas a seguir e assinale a alternativa


correta:

I. Para Vigotski, na educação, não existe nada de passi-


vo, de inativo.

II. Para a teoria histórico-cultural, não há conhecimentos


difíceis, áreas de conhecimento insignificantes para a
nossa vida, mas, sim, metodologias de ensino e pro-
postas avaliativas escolhidas por alguns educadores
que dificultam o processo de aprendizagem.

III. O sujeito sofre influências de todos os grupos sociais e


culturais no qual transita.

a) Somente as afirmativas I e II estão corretas.

b) Somente as afirmativas II e III estão corretas.

c) Somente a alternativa II está correta.

d) Somente a alternativa III está correta.

e) Todas as afirmativas estão corretas.

4) Quem sou eu? Quando não temos nada de prático nos


atazanando a vida, a preocupação passa a ser existencial.
Pouco importa de onde viemos e para onde vamos, mas
quem somos é crucial descobrir.

A gente é o que a gente gosta. A gente é nossa comida


preferida, os filmes que a gente curte, os amigos que esco-
lhemos, as roupas que a gente veste, a estação do ano pre-
ferida, nosso esporte, as cidades que nos encantam. Você
não está fazendo nada agora? Eu idem. Vamos listar quem
Capítulo 2    Pedagogia Social e Educação: Articulações    41

a gente é: você daí e eu daqui. Com base nesse trecho da


crônica de Martha Medeiros intitulada “Você é o que você
gosta”, construa um texto entre 08 e 12 linhas que pro-
blematize a seguinte questão: de que forma o social, para
Vigotski, interfere em minha constituição enquanto sujeito?
Por quê?

5) Responda às questões abaixo com as alternativas V para


Verdadeiro e F para Falso:

a) A emoção, para Vigotski, é apenas um estado de es-


pírito que gera uma tendência relacionada a algum
tipo de ação, sem relacionar-se com a construção de
novas aprendizagens.

b) O processo de desenvolvimento do sujeito social, para


Vigotski, ocorre de forma complexa, caracterizado por
elementos interacionais, pessoais e contextuais.

Gabarito
1) e  2) b  3) d  4) c  5) e
Laíno Alberto Schneider1

Capítulo 3

Pedagogia do
Compromisso 1

1 Laíno Alberto Schneider – formação acadêmica em filosofia e antropologia.


Formado em filosofia pela FAFIMC, em 1987. Pós-graduado, em 1991, como
mestre em Antropologia Filosófica pela PUCRS. Doutor em Filosofia pela UPS (Sa-
lamanca – Espanha). Doutorado em Filosofia no ano de 2000 e o reconhecimento
pela UFRGS, em 2006, como Doutor em Antropologia Social. Educador e pes-
quisador da ULBRA desde 1991. Coordenador geral da Educação a Distância da
Ulbra nos anos de 2009 e 2010 e coordenador em 2011 do Programa Permanente
de Acessibilidade da ULBRA. Líder do Grupo de Pesquisa Educação Social e Trans-
versalidade. As linhas de pesquisas são acessibilidade, movimentos sociais, forma-
dores e educação social, com o desenvolvimento de pesquisas sobre o processo de
aprendizagem na educação à distância e o educador social.
Capítulo 3   Pedagogia do Compromisso   43

Introdução

No presente capítulo, será desenvolvida a reflexão sobre a pe-


dagogia do compromisso, ou seja, sobre qual é a responsabi-
lidade pedagógica no desenvolvimento profissional e pessoal
do aluno no processo de formação.

Para ser possível esta compreensão, o capítulo terá qua-


tro subdivisões que serão organizadas da seguinte forma: Co-
nhecimento e transformação – neste tópico, será analisada a
possibilidade de transformação através do conhecimento. É
possível a transformação sem o conhecimento? Já no tópico 2
serão apresentadas as relações de pertencimento, ou seja, é
possível pertencer ou estar compromissado com alguma coisa
sem nela se identificar? Por sua vez, no tópico 3, onde a temá-
tica a ser trabalhada se refere à Pedagogia da Esperança, será
apresentado e analisado como, na formação do indivíduo, se
faz necessário a possibilidade de encontrar alternativas para o
modelo apresentado. Por fim, será discutida a grande questão
que se apresenta no capítulo, que é a Pedagogia do Compro-
misso.

Para o desenvolvimento deste capítulo, serão necessárias e


fundamentais a reflexão e a compreensão sobre a tarefa que
se impõe na relação e no estabelecimento dos vínculos consi-
go e com o outro. Parafraseando O pequeno príncipe, na pe-
dagogia social somos eternamente responsáveis pelo cidadão
que formamos (ou não?).
44   Pedagogia Social

Assim, a questão central do capítulo é verificar e compre-


ender a responsabilidade e a tarefa que se impõe na formação
e criação dos vínculos.

3.1 Conhecimento e transformação

Qual é a ideia que possibilita a compreensão do que se en-


tende por conhecimento, pois com muita frequência ouvimos
a seguinte afirmação “conheço tal pessoa ou tal situação”? É
nesse momento que reiteramos a observação feita com a pes-
soa com quem dialogamos: “você conhece mesmo?”. Aqui é
que começamos a nos dar conta de que muitas vezes usamos
a expressão “conhecemos” como uma mera formalidade. A
questão que se impõe sobre o conhecimento é: será que po-
demos conhecer essencialmente o que a coisa ou a pessoa é?

A questão que se apresenta é essencial para que possamos


compreender a complexidade do que é a Pedagogia Social,
pois muitas vezes temos somente algumas informações sobre
determinada pessoa ou situações, mas mesmo com isso não
nos damos conta de que essas informações estão ou podem
estar repletas de vícios ou de verdades circunstanciais.

Aristóteles, na sua elaboração filosófica, afirmava que so-


mente se conhece quando se tem o conhecimento da causa.
O conhecimento da causa exige, do agente e do interlocutor,
a possibilidade de ser capaz de demonstrar plenamente o que
julga conhecer. Assim como no ditado popular afirmamos que
“só amamos o que conhecemos”, assim também o processo
Capítulo 3   Pedagogia do Compromisso   45

pedagógico requer este comprometimento. Em função dessa


afirmativa, podemos apresentar alguns questionamentos que
são fundamentais para refletirmos sobre se o conhecimento
perpassa ou não o nosso agir pedagógico. Conhecemos a re-
alidade em que estamos inseridos? Se a resposta é afirmativa,
será que a realidade que conhecemos está cercada da ótica
pessoal, social ou coletiva? Se for de cunho pessoal, somente
terá relevância para a pessoa. É necessário que se tenha um
conhecimento que abranja estes três atores envolvidos no pro-
cesso, ou seja, o individual, social e o contextual.

Avançando na discussão sobre o conhecimento, mergu-


lhemos no debate sobre o assunto na perspectiva do outro.
O que o outro conhece sobre a minha pessoa? Novamente,
quando nos aproximamos da compreensão do que possa ser o
conhecimento, ou do que podemos conhecer, verificamos que
esse processo só se torna pleno quando acontece nas duas di-
reções. Isso quer dizer que uma relação de aproximação entre
o eu e o outro é mútua.

Se só somos capazes de amar o que conhecemos, esta afir-


mativa não é exclusivamente pessoal visto que precisa aconte-
cer das duas partes. É diante dessa perspectiva que brota, por
meio da motivação e do interesse, a relação de aproximação.
Nesse sentido, conhecer representa a identificação do que nos
aproxima e nos distancia.

O fazer pedagógico precisa aproximar o professor e o alu-


no para que o conteúdo e a disciplina a serem administrados
sirvam de pretexto para auxiliar no desvelamento de quem se
é. O conteúdo não pode ser a essência do fazer pedagógi-
46   Pedagogia Social

co, mas, sim, a relevância que o mesmo requer ou impacta


na formação e na construção de um ser humano. Em outras
palavras, é no conhecimento que descobrimos a essência do
existir das coisas e das pessoas. O conhecimento é pré-requi-
sito para se compreender o que se é, do que se precisa e da
possibilidade de transformação. Dessa forma, a informação
não pode apresentar o fim em si mesma, e sim ser o ponto
de partida para, por meio do conhecimento, buscar-se uma
sociedade melhor e mais justa.

Muitos teóricos e pesquisadores denominam o presente


momento como a era da informação e/ou do conhecimento.
A afirmativa em si se justifica pelas constantes inovações e nas
novidades apresentadas nos setores tecnológicos. No entanto,
examinando esses mesmos aspectos, podemos verificar a su-
perficialidade tanto das informações como do conhecimento.
As informações e conhecimentos repassados pouco ou nada
significam para quem é convidado e integra esse diálogo, visto
que se cria uma aura de superficialidade e as mensagens vir-
tuais não criam o elo de aproximação e vínculo com a própria
mensagem. É nessa superficialidade que se cria uma esfera
de indiferença e de descompromisso, tanto com a informação
quanto com o conhecimento. É nesse momento que se cria, na
sociedade, uma desconexão da Pedagogia como compromis-
so de transformação.

A possibilidade de transformar somente acontece quando


o indivíduo toma consciência daquilo que faz parte do seu
cenário e somente pode existir essa intervenção a partir do
momento em que as informações conduzem a consciência do
conhecimento. A mudança ou a transformação para que pos-
Capítulo 3   Pedagogia do Compromisso   47

sam acontecer exigem uma mudança na forma de se pensar


e de se compreender o que se faz. Somente se modifica uma
atitude a partir do momento em que novos paradigmas são
incorporados e compreendidos nas ações individuais e sociais.

O fazer pedagógico do compromisso precisa implicar per-


manentemente na transformação dos sujeitos, da sociedade
e dos entornos. Assim como os ventos trazem e levam novas
sementes para o surgimento de novas plantas para o dia de
amanhã, é o semear, a perspectiva da responsabilidade que
leva e traz o compromisso com o espírito empreendedor e
transformador do modelo que se tem.

A partir do momento em que uma criança, um jovem, um


adolescente, um adulto, um idoso busca complementar ou in-
crementar a sua formação é sinal de que ele está buscando
algo a mais do que ele já apresenta. É dentro dessa perspecti-
va educacional que a Pedagogia precisa apresentar caminhos
e viabilidade para possibilitar essa germinação.

A palavra transformação é composta basicamente dentro


de uma perspectiva de dois grandes conceitos que são, primei-
ro, o conceito de “trans” que, por sua vez, exige uma investi-
gação daquilo que não aparece de forma visível e tangente. É
em função dessa incursão do “ir em busca” que se alcança o
que se encontra por detrás do visível. Esse é o conceito a que
Heiddegger chama de desvelamento. Já por sua vez, o concei-
to de formação nos dá a ideia de formar e não simplesmente
de doutrinar, ou seja, o conceito de transformação não é um
conceito que se apresenta instantaneamente, mas é um pro-
cesso que se instaura lentamente a partir da compreensão e da
48   Pedagogia Social

consciência que o sujeito desenvolve dentro do seu processo


de humanização. Assim como o conhecimento é o ponto de
ligação entre o que se é e aquilo que se pode vir a ser, é na
realização e na conquista do conhecimento que as transforma-
ções vão se processando.

3.2 Relações de Pertencimento

Para dar início ao tópico, é fundamental que se tenha a clareza


do que significam os conceitos de relação e de pertencimento.
É dentro dessa perspectiva que podemos fazer as seguintes
questões: que tipo de relações o professor e o aluno estabele-
cem na sala de aula? Que tipo de sentimento de pertencimen-
to é desenvolvido nesse espaço educacional?

Quando dizemos ser-no-mundo não expressamos uma


determinação geográfica como estar na natureza, junto
com plantas, animais e outros seres humanos. Isso pode
estar incluído, mas a compreensão de ser-no-mundo é
algo mais abrangente. Existe uma forma de ex-istir e de
co-existir, de estar presente, de navegar pela realidade e
de relacionar-se com todas as coisas do mundo. Nessa
co-existência e con-vivência, nessa navegação e nesse
jogo de relações, o ser humano vai construindo seu pró-
prio ser, sua autoconsciência e sua própria realidade.
(BOFF, 2011, p. 92)

Pertencimento nos apresenta a possibilidade de estar liga-


do a outros fatores e elementos. É a partir disso que começa-
Capítulo 3   Pedagogia do Compromisso   49

mos a aprender que não se está sozinho em um cenário social,


mas que, sobretudo, somos o resultado daquilo que nos liga
aos outros e as coisas. É na coexistência e na convivência que,
conforme observa Leonardo Boff, começa-se o jogo, isto é,
é a partir dos contatos e interações estabelecidas que cada
sujeito precisa se dar conta que ele existe da mesma forma
como os demais atores sociais. Essa co-existência ensina que
se faz necessário abrir mão de certas condições pessoais para
possibilitar e permitir a construção da vida social.

É a partir da existência e co-existência que cada um precisa


se dar conta de que ele sempre existe a partir da construção
social que os sujeitos vão estabelecendo nas suas relações.
Pertencer a um grupo é assumir a identidade do mesmo e
apresentar os legados das aprendizagens.

Ocupemo-nos do termo “relações”. Entende-se por rela-


ções as ações que fazem elo das atitudes, pois relacionar sig-
nifica vincular a lógica das ações e atitudes nos processos de
formação de vínculos. A existência de uma relação necessa-
riamente implica em uma ação compromissada com o dizer e
o fazer.

É fundamental que, no ambiente educacional, tanto o alu-


no quanto o professor perceba e entenda a coexistência de
um sentido e significado de tudo o que se faz e processa. Uma
ação não pode terminar nela mesma. Aprender a fazer o vín-
culo de conexão e correlação com as práticas do dia a dia do
agir pessoal e social confere uma lógica de que a aprendiza-
gem tem a função libertadora.
50   Pedagogia Social

Se, por um lado, o termo relação implica no compromisso


mútuo, a palavra pertencimento estabelece a identidade da
integração do que se está fazendo. É dentro da perspectiva
do estabelecimento de vínculos do que se faz que aos poucos
o desvelamento vai aproximando e identificando que as se-
melhanças são muito mais tangíveis do que as diferenças, ou
seja, em essência, é a partir do momento em que fica claro
que os objetivos são muito mais próximos do que distantes que
os vínculos e as identidades começam a aparecer.

É da relação de complementação que o professor e o alu-


no precisam construir a sua relação de pertencimento. Um
dos grandes problemas que muitas vezes se processa nessa
relação entre professor e aluno não acontece de forma efeti-
va porque o aluno e o professor não se sentem pertencentes
aos mesmo espaço, pois, muitas vezes, cria-se uma distância
entre o agir do professor e do aluno. E a alimentação desse
distanciamento dificulta, de forma decisiva, o estabelecimento
da aproximação para a construção do sentimento de perten-
cimento. É fundamental que o aluno e o professor dialoguem
em uma relação de aproximação para que seja possível o es-
tabelecimento do sentimento de pertencimento, pois somente
se estabelecem o vínculo e o compromisso quando ambos,
professor e aluno, se sentirem vinculados, ou seja, pertencen-
do e fazendo parte da repercussão das ações.

Rubem Alves (2011) destaca que um educador “é um fun-


dador de mundos, mediador de esperanças, pastor de proje-
tos”. A magia das relações acontece porque se faz necessário
que, nesse processo, novas situações e possibilidades sejam
criadas. A partir do momento que Rubem Alves utiliza os ter-
Capítulo 3   Pedagogia do Compromisso   51

mos “projeto”, “mediador da esperança” e “fundador de mun-


dos”, ele nos dá a real dimensão de pertencimento e de víncu-
los que se estabelecem a partir da ação com o outro. Mediar a
esperança é ser capaz de alimentar perspectivas que oferecem
aos dois atores uma possibilidade de algo melhor e inovar.

O estabelecimento de vínculos é algo que não acontece


automaticamente, mas que precisa ser construído e sedimen-
tado. Por isso, é fundamental que sejam observadas as ações
e reações que acontecem no espaço educacional, pois elas
evidenciam se há uma relação de pertencimento ou não.

Assim como um cenário em uma sala de aula demonstra


uma realidade sociocultural, cada sujeito no seu vínculo social
vai repassando esses modelos socioculturais. Um professor e
um aluno que não se sentem integrados no seu espaço edu-
cacional muito provavelmente não vão se sentir integrados no
seu espaço social, familiar e comunitário. Dessa forma, se a
escola não se preocupa em integrar as partes, fazendo com
que professor e aluno se sintam parte daquele grupo, jamais
se estabelecerá uma relação de vínculo. Se esse modelo de
sentimento de pertencimento não é semeado pela família, pela
comunidade, pela sociedade, é no espaço educacional uma
das últimas possibilidades que se tem de se estabelecer o sen-
timento de vínculo daquilo que se faz.

Com afirma Brandão:

Neste contexto, a reflexão está necessariamente referen-


ciada à relação escola/sociedade, dentro de uma pers-
pectiva político-social (...) deve ser capaz de contemplar
o desafio permanente de trabalhar no horizonte do proje-
52   Pedagogia Social

to inconcluso da construção da democracia. Isto implica


a viabilidade de um núcleo de saberes formadores que
permita ao aluno aceder a um suporte epistêmico uni-
versal que tanto comporte a expressão de todas as suas
experiências culturais e individuais, quanto incorpore um
padrão democrático de práticas e de relações institucio-
nais, indissociável da democratização dos conteúdos es-
colares. (BRANDÃO, 1995, 98)

Toda a relação social é uma perspectiva político social,


pois é a partir dessa situação que se cria e se inventa os fatores
sociais. É no nascimento desse cenário social que as diferen-
ças e semelhanças precisam ser administradas e gerenciadas.
É desse gerenciamento que o processo político vai ditando a
velocidade e a elaboração deste cenário social. É na reunião
das individualidades dos sujeitos que o novo modelo social
vai apresentando as suas faces e saberes e administrar esse
processo de pertencimento é ser capaz de repensar as ações e
as consequências que essas ações apresentam, tanto na pers-
pectiva do sujeito como da perspectiva social.

A indiferença do fazer pedagógico com o descompromisso


das relações sociais evidencia uma falência da possibilidade
de integrar as pessoas em seus diversos cenários sociocultu-
rais.

Somos o resultado das relações, conexões e desconexões


construídas nos processos de aproximação ou não. Portanto,
somos o resultado do modelo que nos é repassado e ensi-
nado. A pergunta que se impõe nesse momento: será que a
nossa sociedade e modelo sociocultural possibilita a formação
das relações e vínculos? Esta é a questão que se impõe e que
Capítulo 3   Pedagogia do Compromisso   53

se apresenta para avaliar o modelo de pertencimento que es-


tamos construindo. É nesse sentido que Paulo Freire (1982,
p. 28) apresenta a seguinte afirmativa: “Ninguém educa nin-
guém, ninguém se educa sozinho, o homem se educa em co-
munhão”.

Continuando nessa linha de reflexão: no que eu, como


professor, ou eu, como aluno, identifico-me com os meus co-
legas?

3.3 Pedagogia da Esperança

O que caracteriza e se entende por pedagogia da esperança?


A pedagogia da esperança é o elemento desencadeador e
motivador da transformação, pois é a esperança que confere
ao sujeito a perspectiva de algo melhor e transformador. Ofe-
recer, nesse sentido, por meio do espaço educacional, a possi-
bilidade de transformação, que é um dos grandes desafios que
o fazer educacional precisa levar em conta.

Para uma criança, o ponto desencadeador da pedagogia


da esperança é o desenho das possibilidades de realização
dos processos lúdicos e cooperativos. Nesse sentido, pode se
utilizar e se valer dos diversos jogos lúdicos para repassar ou
criar o conceito da esperança. Nos processos lúdicos, há os
que são mais peritos ou habilidosos ou possuem a competên-
cia de desenvolver as competências para os desafios que o
mesmo requer. É dentro dessa perspectiva que o espaço pe-
dagógico precisa apresentar possibilidades de crença e fé, em
54   Pedagogia Social

que mesmo quem não reúne as predisposições para a natu-


ralidade do desenvolvimento das habilidades, tenha as condi-
ções básicas para poder se apropriar e exercitar as melhorias
perante tal circunstância.

Segundo Alícia Fernández (2007, p. 47),

Essa busca criativa é que atua como chave para encon-


trar dentro de nós mesmos essa zona de jogo, esse espa-
ço lúdico e criativo, único lugar de onde, no tratamento,
alcançaremos vencer, pelo vínculo, o sintoma que nos
ocupa, o qual não é outra coisa senão a inteligência
aprisionada, a criatividade encapsulada, a curiosidade
anulada, a renúncia a pensar, conhecer e crescer.

É fundamental que a concepção da esperança seja um


conceito presente em todos os processos em que o espaço
formativo e educacional se apresenta, pois é da possibilidade
de se alcançar as competências e as habilidades que brotam e
surgem as motivações para a transformação.

(...) no ato mesmo de responder aos desafios que lhe


representar seu contexto de vida, o homem se cria, se
realiza como sujeito, porque esta resposta exige dele re-
flexão, critica, invenção, eleição, decisão, organização,
ação... (FREIRE, 1980, p. 37)

O grande desafio que precisa ser compreendido é que


cada sujeito necessita se dar conta de que a sua construção
de vida e de gente está umbilicalmente ligada ao processo
administrador da vida em grupo. A superação desse desafio
reside exatamente ao desapego das razões pessoais. É dentro
Capítulo 3   Pedagogia do Compromisso   55

dessa perspectiva que as conquistas e as perspectivas sociais


alcançam a dinâmica da transformação e da possibilidade de
auxílio dos diversos atores sociais. É por isso que o grande
desafio norteador da construção social está na virtuosidade da
superação das motivações individuais e pessoais.

A escola precisa, nesse espaço, ser um elemento que de-


sencadeie os aspectos motivacionais no descobrimento e de-
senvolvimento de habilidades e competências. É a partir da
noção de que o aluno ou o sujeito é capaz que o acreditar
auxilia nas conquistas. Infelizmente, poucos são os espaços
em que a esperança e o incentivo fazem parte dos processos
de conquistas e melhorias alcançadas. Nos espaços sociocul-
turais da sociedade atual pouco se exercita a virtude do reco-
nhecimento e, além disso, as pessoas somente representam
mais um neste cenário social. É imprescindível que nos espa-
ços sociais se perceba quais são os sonhos, o que cada sujeito
busca na realização pessoal e profissional.

A Pedagogia do Compromisso precisa ser, em essência, o


elemento desencadeador das possibilidades de descobrimento
e desenvolvimento dos talentos de cada ator.

A dificuldade que geralmente se encontra no contexto so-


cial atual (pelo espírito de competitividade) pouco ou nada se
destaca das possibilidades do outro.

A sociedade como um todo precisa apresentar ao sujeito


que a integra quais suas capacidades para construir uma so-
ciedade melhor. Em vez de se desenvolver o espírito competiti-
vo, é essencial que se desenvolva esse espírito cooperativo. Os
jogos são um exercício de inserção e inclusão dos atores para
56   Pedagogia Social

qualificar este contexto. Exemplificando tal situação, podemos


afirmar que somente se forma uma equipe de qualquer ativi-
dade esportiva que apresente a coletividade como ponto fun-
damental. Dentro dessa perspectiva, se somente forem levados
em consideração os melhores e não as diferenças, jamais se
formará uma equipe, pois é exatamente das diferenças que
surgem as possibilidades de ampliar os horizontes nas pers-
pectivas de conquistas.

Uma sociedade se faz não pelos talentos, competências e


habilidades individuais somente, e sim pelo aproveitamento e
pela compreensão da importância dos diversos papéis na me-
lhoria das condições de integração. É esse amadurecimento e
essa capacidade de inclusão que se torna o fator cementador
da aproximação dos sonhos com a realidade.

Cuidar das coisas implica ter intimidade, senti-las den-


tro, acolhe-las, respeitá-las, dar-lhes sossego e repouso.
Cuidar e entrar em sintonia com, auscultar-lhes o ritmo
e afinar-se com ele. A razão analítico-instrumental abre
caminho para a razão cordial, o sprit de finesse, o espíri-
to de delicadeza, o sentimento profundo. A centralidade
não é mais ocupada pelo logos razão, mas pelo pathos
sentimento. (BOFF, 2011, p. 96)

Em essência, a Pedagogia da Esperança precisa ser o ele-


mento aproximador dos sonhos do sujeito com as realidades
socioculturais que o mesmo integra.
Capítulo 3   Pedagogia do Compromisso   57

3.4 Pedagogia do Compromisso

A questão inicial que podemos fazer, e que nos conduz para


uma sociedade de espírito coletivo, é: qual o comprometimen-
to e a minha contribuição para que tal perspectiva se concre-
tize? Na Pedagogia do Compromisso, é fundamental que se
perceba a contribuição pessoal que pode ser apresentada no
processo de cooperação social, pois se faz necessário que o
processo e a perspectiva em relação sejam invertidos, isto é,
em vez de esperar que o outro faça o primeiro movimento, é
fundamental que o ponto de partida aconteça a partir da pos-
tura pessoal.

Precisa se ter a compreensão de que compromisso é (e


precisa ser) recíproco, mas se os dois lados do processo pau-
tarem a primeira postura pela exigência do compromisso e do
gesto do outro, geralmente o processo não acontece. Dian-
te dessa perspectiva, a Pedagogia do Compromisso requer o
comprometimento do agente motivador com os processos de
integração.

O trabalho e a relação educativa que se dá na sala


de aula e no convívio entre educadores (as)/ educan-
dos (as) traz ainda as marcas da especificidade da ação
educativa. A escola e outros espaços educativos ainda
dependem dessa qualidade. As tentativas de racionaliza-
ção empresarial não conseguiram tornar essa qualidade
dispensável. Além do mais, para que substituir uma es-
cola centrada nas relações interpessoais e em processos
e saberes artesanais, por uma escola centrada na racio-
nalidade empresarial, na desqualificação do trabalho, se
58   Pedagogia Social

o trabalho qualificado dos mestres é tão barato? (AR-


ROYO,2011, p.19)

Na questão que Miguel Arroyo apresenta, a partir das re-


lações interpessoais, o fator econômico nem sempre é o mais
significativo e relevante, e sim o despreparo e a não quali-
ficação dos profissionais que estão ligados a esse processo
de construção de sonhos e possibilidades não permite que se
tenham grandes esperanças e possibilidades de transforma-
ções e mudanças. Muito mais que uma relação de trabalho, o
espaço educacional é um grande cenário, ou precisa ser, um
espaço de semeadura de sonhos. Por isso que a escola não
pode ser pensada e planejada como uma empresa que visa
lucros, pois o maior investimento, em uma construção social,
é uma sociedade preparada para superar os desafios. Assim, é
necessário qualificar-se e buscar a partir dos saberes de cada
um dos atores as lições das aprendizagens realizadas.

O compromisso sempre é algo que acontece com, não é


um processo isolado.

Recapitulando

No decorrer do capítulo sobre a Pedagogia do Compromis-


so, ficou evidente que as coisas não podem ser feitas e pro-
cessadas isoladamente, pois tudo que é feito na esfera social
necessariamente implica consequências com os outros. Dessa
forma, é ao se conhecer as possibilidades e perspectivas que
são visualizadas as possiblidades de transformação desse ce-
nário social.
Capítulo 3   Pedagogia do Compromisso   59

Pertencer a um grupo familiar, comunitário ou social é se


dar conta de que esses atores estabeleceram ações com ou-
tros atores sociais e, como tal, pertencem não só a condição
individual, mas sobretudo criam e alimentam o sentimento de
pertencimento e responsabilidade com o grupo.

A Pedagogia do Compromisso é, por essência, a Pedago-


gia da Esperança e é por isso que o ser humano é um ser
social e político, visto que assume a responsabilidade de cons-
truir e semear perspectivas de uma sociedade mais igualitária
e melhor.

Referências

ALVES, Rubem. O preparo do educador. In. Brandão Carlos R.


(org.) O educador: vida e morte. 12. ed. Rio de Janeiro:
Graal, 1982.

ARROYO, Miguel G. Ofício de mestre. Imagens e autoima-


gens. 13. ed. Petrópolis, RJ: Vozes, 2011.

BOFF, Leonardo. Saber cuidar. Ética do humano – compai-


xão pela terra. 17. ed. Petrópolis, RJ: Vozes, 2011.

BRANDÃO, Zaia (org.) A crise dos paradigmas e a educa-


ção. São Paulo: Cortez, 1995.

FERNÁNDEZ, Alícia. Os idiomas do aprendente. Análise das


modalidades ensinantes com famílias, escolas e meios de
comunicação. Porto Alegre: Artmed, 2007.
60   Pedagogia Social

FREIRE, Paulo. Educação e mudança. Rio de Janeiro: Paz e


Terra, 1982.

____. Conscientização: teoria e prática da libertação. Uma


introdução ao pensamento de Paulo Freire. 3. ed. São Pau-
lo: Moraes, 1980.

Atividades

1) Aristóteles, em sua elaboração filosófica, afirmava que so-


mente se conhece quando se tem:

a) O conhecimento da causa

b) O conhecimento das circunstâncias

c) O conhecimento dos efeitos

d) O aprendizado da vida

e) O aprendizado do cenário

2) Qual é pré-requisito para se compreender o que se é, do


que se precisa e da possibilidade de transformação?

a) O estudo

b) A inteligência

c) O conhecimento

d) O fazer pedagógico

e) O respeito pelo outro


Capítulo 3   Pedagogia do Compromisso   61

3) Entende-se por relações as ações que fazem elo das atitu-


des, pois relacionar significa vincular a lógica das ações e
atitudes aos processos de formação:

a) De atitudes

b) De respeito

c) De formação

d) De conversas

e) De vínculos

4) A Pedagogia do Compromisso precisa ser, em essência, o


elemento desencadeador de quê?

a) De possibilidades de descobrimento e desenvolvimen-


to dos talentos de cada ator.

b) De possibilidades de aceitação da situação existente.

c) De possibilidades de descobrimento e aceitação do


outro.

d) De possibilidades de inovação e reflexão.

e) De possibilidades de resgate da história.

5) Segundo Leonardo Boff, cuidar das coisas significa ter:

a) Respeito e reconhecimento.

b) Intimidade, senti-las dentro, acolhê-las, respeitá-las,


dar-lhes sossego e repouso.
62   Pedagogia Social

c) Intimidade, senti-la desconectada do ser, respeitando


sua individualidade.

d) Respeito, acolhê-la, dar-lhe equilíbrio.

e) compreensão das diferenças latentes e rejeitá-las.

Gabarito
1) a   2) c  3) e  4) a  5) b
Graciela Lima Lopez1

Capítulo 4

Pedagogia Social:
Intervenções e Ações 1

1 Graciela Maria Lima López – Possui Graduação em Ciências Sociais – So-


ciologia – pela Universidade Católica de Pelotas (1981), Especialização Sociolo-
gia Industrial pela Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (1983),
Doutorado em Filosofia – Universidade Pontifícia de Salamanca (1997) com reva-
lidação Doutorado em Antropologia Social pela Universidade Federal do Rio de
Janeiro (2002), MBA Gestão Educacional (2007). Atualmente é docente do curso
de Pedagogia EAD e Presencial da Universidade Luterana do Brasil. Atuando nas
seguintes áreas: Educação, Gestão Educacional, Sociologia, Antropologia, Filoso-
fia, Pedagogia Social, Educação Social. Integrante do Grupo de Pesquisa e Estudos
Educação Social e Transversalidade na ULBRA/Canoas.
64   Pedagogia Social

Introdução

A Educação é um fator muito importante, indispensável para


que a humanidade possa conseguir os ideais de paz, liberdade
e justiça social (DELORS, 1996).

Este capítulo nos permitirá avançar na construção de con-


ceitos e metodologia que identifiquem desde a teoria o que já
se há configurado como um dos âmbitos mais importantes da
Pedagogia Social, assim como facilitará avançar na sistemati-
zação de metodologias e técnicas das intervenções socioedu-
cativas.

Os objetivos didáticos são os seguintes:

a) Analisar as funções e as fronteiras de intervenção so-


cioeducativas;

b) Conhecer os princípios metodológicos necessários


para trabalhar com grupos coletivos e problemáticos
específicos sociais;

c) Saber identificar situações de marginalização e risco;

d) Aprender a desenvolver e realizar programas socioe-


ducativos a nível individual, de grupo e comunitário;

e) Adquirir e desenvolver habilidades para comunicar-se


e enfrentar problemas socioeducativos.
Capítulo 4    Pedagogia Social: Intervenções e Ações    65

Princípios de atuação da Pedagogia Social


Neste sentido, as intervenções socioeducativas da Pedagogia
Social, dirigem seus esforços para a busca do desenvolvimento
das pessoas, grupos e comunidades para que passem a ter
uma intervenção ativa, preventiva, para melhorar a qualidade
de vida e sua realidade social.

Por isso, os objetivos da intervenção socioeducativa consis-


tem em reduzir e prevenir situações de risco social e pessoal
por meio da intervenção na solução de problemas concretos
que afetam os indivíduos, grupos ou comunidades para me-
lhorar a qualidade de vida.

A Pedagogia Social dirige sua atuação global para a co-


munidade toda, atuando também sobre os coletivos e as pro-
blemáticas específicas.

Os objetivos são escolhidos adequadamente a cada nível


de intervenção e com uma metodologia especifica para cada
setor.

Temos para a atuação da Pedagogia Social:

ÂÂA comunidade com uma intervenção de caráter preven-


tivo;

ÂÂOs coletivos que, por diversas situações, encontram-se


em situação de risco, de desigualdade ou de exclusão
social e os indivíduos afetados por uma problemática
específica.

Encontramos nesse processo de intervenção, como primei-


ro passo, uma demanda social que precisa atender aos indiví-
66   Pedagogia Social

duos, aos coletivos e aos setores da população que se encon-


tram em situação de risco ou em processo de marginalização
social.

Essa demanda social nos vincula significativamente com as


políticas de ação social para escolha do campo onde se vai
fazer a ação.

Temos como princípios inspiradores da Ação Social:

ÂÂIgualdade: a Pedagogia Social é um instrumento da Po-


lítica Social, desenvolvida para contribuir a eliminar as
desigualdades sociais;

ÂÂUniversalidade: a Pedagogia Social é dirigida a todos os


cidadãos e grupos sem descriminação;

ÂÂGlobalidade: a Pedagogia Social aborda os problemas


sociais na perspectiva de considerar a pessoa como su-
jeito que pertence a um grupo social e a uma comuni-
dade – sociedade a que está vinculada;

ÂÂPrevenção e Promoção: a Pedagogia Social está orienta-


da à prevenção das circunstâncias que originam a mar-
ginalização e a promoção e integração das pessoas e
grupos na vida comunitária;

ÂÂIntegração: de acordo com este princípio, será facilita-


da aos indivíduos e grupos sua integração por meio de
instituições que a sociedade utiliza para satisfação de
suas necessidades, permanecendo no seu próprio meio
social;
Capítulo 4    Pedagogia Social: Intervenções e Ações    67

ÂÂCoordenação: as atuações estarão coordenadas junto


com as que apresentam o Município, o Estado, a região,
etc., sejam elas da iniciativa privada ou pública;

ÂÂParticipação: é fundamental a participação dos cidadãos


no planejamento e avaliação dos Programas e Projetos,
assim como na Gestão dos Projetos;

ÂÂResponsabilidade Pública ou Privada: os programas são


assumidos como Responsabilidade Social dos cidadãos
engajados na Lei de Diretrizes Nacionais.

Consideramos que a Pedagogia Social se define em função


da intervenção que se realiza com o indivíduo concreto em
função do momento e do objetivo que se pretende conseguir
com a atuação socioeducativa.

Locais e características da intervenção da ação


social
Promoção Cultural Social Casas de cultura e arte;
Atividades artísticas de participação;
Pedagogia do tempo livre;
Animação esportiva;
Formação e promoção permanente;
Promoção da mulher;
Universidades Populares;
Entidades de participação popular e Lazer;
Alfabetização.
68   Pedagogia Social

Atenção ao risco de situações Centros abertos a comunidade;


de marginalidade, inadaptável Serviços Sociais básicos;
social, Centros Culturais de musica e dança;
Serviços de atenção a setores Centros de atendimento para diferentes
da comunidade, Projetos de problemáticas;
Inclusão. Centros da Terceira Idade;
Centro atendimento de tempo livre infanto-
juvenil;
Centros de artesanatos;
Centros de extraclasse;
Centros de formação de informática;
Ajuda técnica para o voluntariado social;
Alcoólicos Anônimos;
Emigrantes – Refugiados- Exilados;
Menores de rua;
Moradores de rua;
AIDS- GLS- Centro de atendimento ao
drogado.

Serviços ou Programas Casa de acolhimento ao menor infrator;


Especializados Instituições penitenciárias;
Comissões de assistência social para família
dos penitenciários;
Residências para Terceira Idade;
Apoio em situação de abandono;
Centros de Esporte e lazer para jovens;
Problemas sócios familiares;
Violência contra a mulher centro de
acolhimento;
Programa de Educação Familiar;
Mães adolescentes solteiras;
Área da saúde: trabalho educativo com
coletivos específicos, educação sexual,
diabéticos, alcoólicos, drogados, AIDS;
Área da Saúde Mental: centro promoção da
saúde, psiquiátricos, serviços comunitários;
Sítios, comunidades terapêuticas;
Centros de tratamento;
Minorias étnicas;
Educação Multicultural;
Projetos de Inclusão Social no bairro.
Capítulo 4    Pedagogia Social: Intervenções e Ações    69

Características da Intervenção Tipos de intervenção:


Primária, Secundária, Terciária
Tipos de população:
Geral, de risco, marginalizada
Tipos de equipamento:
Aberto, semiaberto, fechado
Tipos de Instituição:
Públicas, Privadas

Esta é apenas uma forma de expor no quadro as diferentes


formas de intervenção.

Essa divisão é só um instrumento para expor a realidade,


assim como também comprovamos que, em muitas ocasiões,
na realidade, é muito difícil poder ver os limites em que se está
e se encontra.

Acreditamos que pode ser um modo simples, ao menos


inicialmente, de mostrar a complexidade das diferentes áreas
de intervenção deste admirável profissional.

Por sua vez, a evolução da sociedade, a rapidez, a diver-


sidade das mudanças sociais nos mostram constantemente
a complexidade dos âmbitos na prática de Intervenção e de
Ação Social desse profissional.

Na prática, apresenta-se uma divisão entre diferentes âm-


bitos: da Promoção Cultural-Social, da atenção ao risco e ou
situações de marginalização, do inadaptável social. Esta divi-
são é um instrumento para expor a realidade.

Em muitas ocasiões é muito difícil separar quando se está


trabalhando em um ou outro âmbito.
70   Pedagogia Social

Cremos que pode ser um modo adequado, ao menos ini-


cialmente, de mostrar a diversidade e complexidade dos âmbi-
tos de intervenção junto com as mudanças sociais.

Exemplos dessa promoção cultural-social são simples fru-


tos da persistência em uma parte da cidade marcada desde
sua origem pela exclusão.

Em uma região distante do centro de Porto Alegre-RS de-


nominada Restinga, temos um exemplo: nela não há teatros,
cinemas, mas se multiplicam cineastas jovens, artistas e dan-
çarinos, músicos.

Vindos de um âmbito da capital lembrado pela pobreza e


pela violência, lutam pela falta de estrutura para serem reco-
nhecidos pelo talento artístico.

Os exemplos desse fenômeno suburbano se acumulam e já


temos o primeiro filme produzido pelos moradores da região.

Também se consagraram no Festival de Dança Sul, como


o grupo Restinga Crew, junto com o trabalho socioeducativo
do hip hop.

O exemplo do grupo Restinga Crew oferece oficinas gra-


tuitas de Break no ginásio da comunidade e na escola pública
do bairro.

Este trabalho de promoção cultural deu tão certo que tirou


o primeiro lugar na categoria destaque em Danças urbanas.

O vínculo do HIP HOP com a educação garantiu ainda


outros prêmios dentro do Projeto Trabalhos Socioeducativos.
Capítulo 4    Pedagogia Social: Intervenções e Ações    71

Esses jovens viviam em situação de vulnerabilidade social


e, graças a esses Projetos Pedagógicos Sociais desenvolvidos
pelo trabalho e Ações Educativas, foram ajudados a ir pelo
caminho certo, como afirmam seus integrantes.

Estes foram alguns exemplos de experiência de mudanças


socialmente compartilhadas com o objetivo de ver os benefí-
cios que podem produzir os Pedagogos Sociais com sua in-
tervenção, assim como os usuários, objetos e sujeitos dessa
ação.

Etapas da Intervenção Socioeducativa


Análise da realidade na coleta Identificação de problema e
de informação necessidades.
Quem está dentro dessa realidade.
Agentes de intervenção.
Diagnóstico Objetivos do programa.
Recursos Materiais disponíveis,
Humanos, Econômicos.
Desenvolvimento Teórico do
Programa.
Ações Implementação das ferramentas
sociopedagógicas.
Avaliação da Intervenção Se obtiveram resultados esperados.
socioeducativa realizada Se cumpriram os objetivos propostos.

Este esquema apresenta alguns dos elementos básicos de


um modelo de Pedagogia Social que responda aos aspectos
vistos anteriormente.
72   Pedagogia Social

Eles são:

ÂÂA contextualização da Intervenção: não se podem dar


respostas standard, e sim adaptadas às características
concretas da comunidade e de seu entorno.

ÂÂParticipação da comunidade no processo de mudanças:


criar mecanismos, estratégias, estruturas de participação
que envolva todos os participantes.

ÂÂA coordenação de todos os agentes socioeducativos


presentes no âmbito do território.

ÂÂA equipe como espaço de aprendizagem e contraste da


tarefa educativa.

ÂÂA importância dos processos para responder a esta re-


alidade: desenvolver uma metodologia continuada da
Investigação-Ação.

ÂÂFlexibilidade e adaptação aos processos pessoais e co-


munitários: precisa ser uma característica sempre pre-
sente no modelo de Intervenção das Ações Educativas.

Nesse sentido, o Pedagogo Social é mais que um simples


Gestor.

É necessário que os resultados da análise e a reflexão edu-


cativa alimentem esse educador para ser corresponsável com
a instituição gestora e com os destinatários de sua tarefa.

Esse processo interativo, dialético entre os agentes da so-


cialização e o sujeito socializado terá como consequência a
inserção do sujeito no processo social.
Capítulo 4    Pedagogia Social: Intervenções e Ações    73

Estratégias e procedimentos de intervenção


Essas estratégias socioeducativas podem ser sistematizadas em
três ferramentas pedagógicas:

Pedagogia da Tarefa (Ação), Pedagogia da Relação, Peda-


gogia do Grupo.

Ferramentas socioeducativas
Joe Beck

Pedagogia da Tarefa
Entendemos esta como as atividades/experiências. Essa tarefa
se dá como um processo de construção ativa por parte de gru-
pos e das pessoas por meio das experiências estruturadas que
o Pedagogo Social, como mediador, proporciona.

Essas tarefas que o Pedagogo Social dá têm que ser coe-


rentes com as situações cotidianas que ocorrem tanto na aula
como também no contexto social, cultural e familiar dos sujei-
tos.

Elas devem ser acessíveis, úteis, atrativas, experimentadas,


acompanhadas, queridas pelos sujeitos, coletivas e solidárias
com o impacto social para a comunidade.
74   Pedagogia Social

Pedagogia da Relação
Este procedimento é um pouco mais difícil porque trata da
relação entre o sujeito e os conflitos que desta relação se deri-
vam. O conflito é visto como momento de crise, como proces-
so que pode ser positivo, fonte de mudança, de maturidade,
de toma de decisões de assumir responsabilidade.

Por isso, a função do Pedagogo Social como educador há


de ser de ajudar a superar esses conflitos que se apresentam
de uma forma positiva e construtiva, conduzindo para a auto-
afirmação progressiva.

O Pedagogo Social deve usar esses conflitos como ferra-


menta educativa. Dessa forma, o sujeito toma consciência,
analisa e o supera.

Pedagogia do Grupo
É a Pedagogia que utiliza o grupo como ferramenta de ação
socioeducativa. Esta estratégia pedagógica faz da dinâmica
do grupo um fator educativo de mudanças.

O grupo facilita o intercâmbio de experiências, a integra-


ção social, favorecendo a aprendizagem para a vida.

O trabalho de grupo facilita o aprendizado cooperativo em


atividades coletivas e solidárias, tomam decisões compartilha-
das, favorecendo a aprendizagem.

O grupo reparte tarefas, horários, responsabilidades, fun-


ções, negocia, respeita os pensamentos diferentes e aceita a
diversidade.
Capítulo 4    Pedagogia Social: Intervenções e Ações    75

Recapitulando

De nada servirão os Pedagogos Sociais se não puderem ofe-


recer à sociedade alguma função útil de saber fazer Projetos e
trabalhos socioeducativos para melhorar a comunidade onde
trabalham marcadas pela exclusão e pelo risco da marginali-
dade.

A intenção deste capítulo foi detalhar a atuação do Peda-


gogo Social e, também, a Pedagogia Social como pilar im-
portante para o desenvolvimento de sua atuação, as carac-
terísticas da sua intervenção e suas etapas como agente de
socialização e, consequentemente a inserção dos sujeitos no
processo social.

Referências

DELORS, Jacques. La Educación encierra un tesoro. Infor-


me a la UNESCO de la Comisión Internacional sobre la
educación para el siglo XXI, presidida por Jacques Delors.
Madrid: Santillana/UNESCO, 1996.

FREIRE, Paulo. Pedagogia da Autonomia: Saberes Necessá-


rios á Pratica Educativa. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 2009.

GOHN, Maria Gloria. Educação não Formal e Cultura Po-


lítica. Impactos sobre o associativismo do Terceiro Setor.
São Paulo: Cortez, 2011.
76   Pedagogia Social

GOHN, Maria Gloria. Educação não Formal e o Educador


Social. São Paulo: Cortez, 2010.

PETRUS, A. Pedagogia Social. Barcelona: Ariel,1997.

QUINTANA, Cabanas J. M. Pedagogia Social. Madrid: Uned,


2002.

Atividades

1) Os esforços das intervenções sócios educativas da Peda-


gogia Social se dirigem para a busca do desenvolvimento
das pessoas, grupos e comunidades para que passem a ter
uma intervenção ativa, preventiva, para melhorar a quali-
dade de vida e sua realidade social. Por isso, os objetivos
de intervenção socioeducativa consistem em:

a) Reduzir e prevenir situações de risco social e pessoal


por meio da intervenção na solução de problemas que
afetam os indivíduos, os grupos e as comunidades
para melhorar a qualidade de vida.

b) Não escolher adequadamente a cada nível de inter-


venção os objetivos nem as metodologias para cada
setor.

c) Não dirigir sua atuação para a sociedade.

d) Não dirigir sua atuação sobre os coletivos e suas pro-


blemáticas específicas.

e) Nenhuma alternativa está correta.


Capítulo 4    Pedagogia Social: Intervenções e Ações    77

2) A Ação Social tem como princípios inspiradores:

a) Igualdade e Universalidade

b) Prevenção e Promoção

c) Globalidade e Integração

d) Coordenação, Participação e Responsabilidade Públi-


ca e Privada

e) Todas as alternativas estão corretas

3) Podemos afirmar que as etapas da intervenção socioedu-


cativa são:

a) Análise da realidade na coleta socioeducativa realiza-


da

b) Diagnóstico

c) Ações

d) Avaliação da intervenção socioeducativa realizada

e) Todas as alternativas estão corretas.

4) As estratégias socioeducativas podem se sistematizar em:

a) Pedagogia da Tarefa – Ação

b) Pedagogia da Relação

c) Pedagogia do Grupo

d) Estão corretas a, b e c.

e) Nenhuma alternativa está correta.


78   Pedagogia Social

5) As intervenções e Ações da Pedagogia Social têm como


objetivos didáticos:

a) Saber identificar situações de não marginalização.

b) Desvincular as demandas sociais da população que se


encontra em situação de risco e vulnerabilidade social
das Políticas de Ação Social.

c) Conhecer princípios metodológicos necessários para


trabalhar com grupos problemáticos e coletivos.

d) Adquirir, mas não desenvolver habilidades para se co-


municar e não enfrentar problemas.

e) Nenhuma alternativa está correta.

Gabarito
1) a   2) e   3) e 4) d 5) c
Christiane Martinatti Maia1

Capítulo 5

Pedagogia Social
e Diversidade:
Problematizações 1

1 Christiane Martinatti Maia é graduada em Pedagogia Séries Iniciais e Matérias


Pedagógicas do Segundo Grau pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul
(UFRGS), Especialista em Psicopedagogia Institucional e Clínica pela Faculdade
Porto-Alegrense (FAPA) e Mestre em Educação, ênfase em Educação Especial, pelo
Programa de Pós-Graduação em Educação da UFRGS (PPGEdu/UFRGS). Atua,
desde 1992, na área de pesquisa e, atualmente, participa como pesquisadora de
dois grupos cadastrados no Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e
Tecnológico (CNPq), intitulados Psicopedagogia, Ludicidade e Processos de Ensinar
e Aprender e Educação a distância: mitos e desafios. Atualmente, é professora da
Universidade Luterana do Brasil (ULBRA) nos campi Canoas, Guaíba e São Jerôni-
mo nas modalidades presencial e a distância.
80   Pedagogia Social

Introdução

No presente capítulo, abordar-se-ão, frente às ideias de dife-


rentes pesquisadores relacionados aos Estudos Culturais e ou-
tras correntes teóricas os conceitos de diversidade, as diferen-
ças relacionadas às questões de deficiência e gênero. Também
serão abordados os processos de inclusão, marginalização e
exclusão existente na sociedade e na instituição escolar.

5.1 Quem são os outros: quando a


diferença insere marcas!

Incluir! Lema atual de nossa sociedade. Trazer para todos os


espaços da sociedade aqueles sujeitos considerados há algu-
mas décadas os desviantes – deficientes, loucos, homossexu-
ais, negros, índios, dependentes químicos, profissionais do
sexo, travestis, enfim, tudo que deveria ser e estar escondido,
principalmente do processo educativo formal: a instituição es-
colar.

Não podemos analisar as marcas que os processos de ex-


clusão, marginalização e inclusão demarcam nos corpos dos
sujeitos sem entendermos que essas práticas são decorrentes
de ações culturais e existiram e existem desde que o homem
é homem. Assim, a cultura deve ser entendida como um pro-
cesso vivo, (re)construído por meio das ações dos sujeitos, de
suas crenças religiosas, crenças étnicas, de gênero, e não bio-
lógica. Laraia (2004, p. 43) nos auxilia nessa compreensão ao
destacar que:
Capítulo 5    Pedagogia Social e Diversidade: Problematizações    81

O homem é o resultado do meio cultural em que foi so-


cializado. Ele é um herdeiro de um longo processo acu-
mulativo, que reflete o conhecimento e a experiência ad-
quiridos pelas numerosas gerações que o antecederam.
A manipulação adequada e criativa desse patrimônio
cultural permite as inovações e as invenções. Estas não
são, pois, o produto da ação isolada de um gênio, mas
o resultado do esforço de toda uma comunidade.

E as comunidades sempre isolaram, excluíram e margina-


lizaram o que consideram diferente, deficiente: a diferença,
parte constituinte dos sujeitos para algumas correntes teóricas,
como a teoria Histórico-Cultural, é necessária para a constru-
ção do sujeito social; ela se torna marca, estigma para os Es-
tudos Culturais frente uma análise crítica dos movimentos his-
tóricos, sociais e culturais das sociedades, visto que os sujeitos
dualizam o eu-outro de forma desfavorável: o outro é aquele
que se diferencia do meu eu, seja etnicamente, em gênero ou
em possibilidades intelectuais, de cultura, de acesso aos bens
sociais, econômicos. Assim, o outro deve se constituir como
o meu eu: não há espaço para a diferença. Se a diferença
demarca, limita, ela deve ser excluída, extinta ou escondida.

Historicamente, Amaral (1995) salienta que o homem sem-


pre excluiu, marginalizou os considerados diferentes, deficien-
tes: nas civilizações gregas e romanas, as crianças que nas-
ciam com deficiência eram mortas logo após seu nascimento.
As que apresentassem algum desvio em seu desenvolvimento
durante seu crescimento acabavam abandonadas a sua pró-
pria sorte: deixadas em florestas, bosques ou colocadas em
pequenas embarcações para desaparecerem nas aguas de
82   Pedagogia Social

rios, lagoas etc. ficavam à mercê de sua própria sorte: morrer


ou sobreviver era questão de um tempo determinado por al-
guns sujeitos que se consideravam normais – padrão da nor-
malidade versus anormalidade. Assim, mudar o olhar sobre
a concepção de diferença, de deficiência, faz-se necessário,
visto que essas práticas ainda hoje permanecem presentes em
algumas culturas:

Mudar a concepção desses corpos é a marca deste pe-


ríodo histórico. Olhar para eles sem piedade, mas com
reconhecimento, acreditando em suas capacidades para
além das limitações que apresentam é o que se propõe a
humanidade, estimulada pelos próprios corpos deficien-
tes e por todos os outros corpos que acreditam que todo
ser humano pode superar quando tem oportunidades
para tal. (GAIO; PORTO, 2006, p.12)

Porém, é difícil mudar o olhar e as ações: apesar de po-


líticas públicas que buscam legitimar as diferenças e incluir
pessoas com deficiência, discutir questões de gênero e etnia a
sociedade ainda acolhe e coloca em prática processos margi-
nalizantes ao propor ações judiciais que digam que os diferen-
tes são desviantes – caso de algumas instituições escolares e
de representantes de escolas que buscam driblar o Estatuto da
Pessoa com Deficiência aprovado em 2015 que nega práticas
de cobrança de mensalidade diferenciada para educandos in-
clusos.

Essa prática elucida a visão dos Estudos Culturais frente o


modelo binário inclusão–exclusão que não deve ser entendi-
do como duas posições opostas, mas, sim, que se articulam:
Capítulo 5    Pedagogia Social e Diversidade: Problematizações    83

os limites que separam incluídos e excluídos são tênues, visto


que para incluir, primeiramente, excluo, ou seja, devo nomear
quem é o deficiente, quem é o diferente, como destaca Lopes
(2006, p. 214): junto com eles estão ações que não questio-
nam as bases sobre as quais estão sendo montadas. Assim, ao
inclui-los no espaço regular de ensino, no mercado de traba-
lho, nos espaços sociais, a inclusão “é utilizada como um me-
canismo sutil de apagamento das diferenças” (2006, p.215).

E os especialistas surgem para o apagamento das diferen-


ças: tutores, monitores que estarão ao lado dos deficientes, se
não fazendo por eles, sendo eles – segurar a mão, conter o
corpo, aplicar atividades diferenciadas, tentar alfabetizar, can-
tar e brincar pelo sujeito. E essa inclusão acaba por induzir o
sujeito à margem do espaço educativo: está em sala de aula
entre seus pares, mas não é igual aos seus pares – fato re-
lembrado por várias instituições de ensino ao cobrarem um
adicional na mensalidade, além dos especialistas contratados
para estarem ao lado desses sujeitos. Fator presente no mer-
cado de trabalho: salários diferenciados, contratos como es-
tagiários ou terceirizados. Mas esses comportamentos sociais,
culturais e econômicos passam a ser aceitos e compartilhados:
o desvio coloca-se no interior da norma:

A dialética inclusão-exclusão gesta subjetividades espe-


cíficas que vão desde o sentir-se incluído até o sentir-
-se discriminado ou revoltado. Essas subjetividades não
podem ser explicadas unicamente pela determinação
econômica, elas determinam e são determinadas por
formas diferenciadas de legitimação social e individual,
e manifestam-se no cotidiano como identidade, sociabili-
84   Pedagogia Social

dade, afetividade, consciência e inconsciência. (SAWAIA,


2004, p. 9)

Assim, educadores sociais e educadores devem estar aten-


tos para os conceitos e práticas de inclusão presentes na so-
ciedade e nos espaços formais e não formais de educação: se
delimito a diferença, se atuo sobre a diferença, não há inclu-
são, há integração, principalmente na escola:

há necessidade de olhar para a escola procurando en-


tendê-la como um lugar atravessado por verdades pro-
clamadas pela ciência, pela cultura, pela economia. A
escola serve não só para formação e orientação de um
coletivo, mas, também, produz, cria outros perfis sociais.
(VARELA, 1995, p. 24)

De forma nenhuma se busca negar a importância do movi-


mento inclusivo, bem como dos avanços nessa área, mas, sim,
questionar nossas ações, nossos discursos sobre as diferenças,
sobre as deficiências: se a demarcarmos para moralizar, para
criar práticas excludentes – no sentido de existirem apenas
para um grupo de sujeitos – estamos vivenciando e praticando
modelos de exclusão ou integração, mas não de inclusão:

O capitalismo, na verdade desenraiza e brutaliza a to-


dos, exclui a todos. Na sociedade capitalista essa é a
regra estruturante: todos nós, em vários momentos de
nossa vida, e de diferentes modos, dolorosos ou não,
fomos desenraizados e excluídos. É própria dessa lógica
de exclusão, a inclusão. A sociedade capitalista desen-
raiza, exclui, para incluir de outro modo, segundo suas
Capítulo 5    Pedagogia Social e Diversidade: Problematizações    85

próprias regras, segundo sua própria lógica. (MARTINS,


1997, p. 32)

Nessa lógica, incluídos e excluídos compartilham os mes-


mos espaços culturais, sociais e econômicos, mas com acessos
e funções diferenciadas, principalmente no que diz respeito à
autonomia: onde estão as pessoas com deficiência no merca-
do de trabalho? Quais as profissões demarcadas para esses
sujeitos?

Quando se utiliza esses e não nós, não há inclusão! Há


integração! Nesse sentido, há necessidade de se repensar os
discursos nas Pedagogias, social ou não! E o que seria inte-
gração? Na ousadia de conceituar, diria que integrar significa
permitir que o sujeito faça parte da sociedade, do mercado
de trabalho, enfim, de todos os espaços, porém com a marca
que o identifica. Carecemos de um novo olhar e de uma nova
ação: a da inclusão de todos os sujeitos compreendidos como
diferentes, inclusive o nós. Diferenças que trazem necessidades
e potencialidades para todos! Afinal, o que significa ser nor-
mal? A diferença também normatiza, quando apenas alguns
são identificados como:

A Modernidade, descrita por Foucault (1989) e Bauman


(1998) como sociedade disciplinar ou normalizadora
pode ser compreendida como um ambiente de suces-
sivos confinamentos, cada qual com suas próprias leis e
sanções disciplinadoras. A instituição da norma absoluti-
za atitudes e pensamentos e o controle passa a ser uma
questão de estar “dentro” ou “fora” dos padrões estabe-
lecidos como normas. Assim, no cenário do mundo mo-
derno, “a exclusão social se manifesta como formação
86   Pedagogia Social

ideológica dominante, onde o sujeito com deficiência é


o principal personagem, já que os seres humanos são
calcados na dicotomia de certo e errado, bom ou ruim,
normal ou anormal”. (MARQUES; MARQUES, 2003, p.
227)

Pode-se dizer, então, que a inclusão não separa ou deixa


a margem sujeitos identificados como anormais ou errados,
mas, sim, oportuniza a todos os sujeitos conviver com sua nor-
malidade e anormalidade, permitindo-os explorar o certo e o
errado que habita em cada um. Ou seja, quando compreen-
demos nossa completude com defeitos, qualidades, habilida-
des, potencialidades e dificuldades que nos constituem.

5.2 O outro em (re) construção: gênero!

A partir da modernidade, a sociedade passou a estruturar ca-


racterísticas femininas e masculinas, e a descrever e prescrever
como meninos e meninas deveriam se vestir, as cores relacio-
nadas ao sexo, os brinquedos e as brincadeiras, as formas de
se relacionar com os outros e com o sexo oposto e as profis-
sões. A sexualidade se tornava biológica, sem relação com os
demais aspectos sociais, culturais, entre outros. E as relações
sexuais e afetivas passaram a ser fiscalizadas em nome da mo-
ral, dos preceitos religiosos e pela continuidade da família.

Porém, se aceitarmos que o gênero seria construído so-


cialmente, a escola seria um poderoso agente nesse processo
de regulação da sexualidade. A questão biológica ficaria sub-
metida apenas a uma definição dada pela natureza: macho e
Capítulo 5    Pedagogia Social e Diversidade: Problematizações    87

fêmea. Como a feminilidade e a masculinidade se constituem


em uma categoria mais complexa, visto que nestes estariam
implicados as práticas sociais, o discurso, os símbolos, as re-
gras e as representações (LOURO, 2001, p.70), a construção
de gênero perpassa movimentos sociais, culturais, constituin-
do-se em uma construção de identidade: identidade feminina,
identidade masculina, identidade sexual.

E uma normativa sobre a construção de gênero passa a


se fazer presente nas relações familiares. As crenças sociais
(baseadas na ideologia androcêntrica) fornecem às famílias
conceitos sobre como devem ser um menino e uma menina.
Assim, acreditam que os meninos são mais ativos, choram
mais alto, possuem mais fome, são mais agressivos, arteiros
e inteligentes. Acaba-se por estruturar nas relações entre os
sujeitos uma maior consideração ao desejo do menino a partir
do processo de legitimação, tornando-o mais forte e exigente,
habituando-o a valorizar-se. Em um contraponto, acredita-se
que a menina seja dócil, chore menos, seja ensinada a aguar-
dar, a postergar seu desejo e a adequar-se ao desejo do outro
para que construa determinados comportamentos dóceis, que
se torne mãe e, depois, profissional.

Mas e os sujeitos que não se adequam a essas visões? E o


menino que adora usar cor de rosa e brincar com bonecas?
Que deseja ser a princesa dos contos de fada e não o prínci-
pe? E a menina que se traveste de homem aranha, adora brin-
car com os meninos e acredita ser um menino? Infelizmente,
escola e família não sabem lidar com a construção de gêne-
ro, com a orientação sexual dos sujeitos. Em um movimento
conjunto, mas principalmente familiar, começam a modificar
88   Pedagogia Social

o comportamento dos sujeitos, destacando verbalmente as


ações relacionadas a meninos e meninas. Coloca-os de casti-
go, procuram especialistas, proíbem brincadeiras, brinquedos
e, se nada der certo, recorrem à violência física ou expulsam
os sujeitos de casa quando esses chegam à juventude:

As minorias nunca poderiam se traduzir como uma infe-


rioridade numérica, mas sim como maiorias silenciosas
que, ao se politizar, convertem o gueto em território e o
estigma em orgulho – gay, étnico, de gênero. Sua visi-
bilidade tem efeitos contraditórios: por um lado, alguns
setores sociais passam a demonstrar crescente aceitação
da pluralidade sexual e, até mesmo, passam a consumir
alguns de seus produtos culturais; por outro, setores tra-
dicionais renovam seus ataques, realizando desde cam-
panhas de retomadas de valores tradicionais da família
até manifestações de extrema agressão e violência física.
(LOURO, 2004, p.54)

Frente os processos de marginalização, dos discursos sexis-


tas e moralizantes, das normativas de ser homem e ser mulher,
nos Estados Unidos, a partir de 1990, com base nos Estudos
Culturais e no Pós-Estruturalismo francês, estrutura-se a Teo-
ria Queer, que pretende questionar, problematizar as relações
entre a sociedade e as minorias sexuais frente a sua constitui-
ção diversa e múltipla, contemplando todas as concepções de
sexualidade:

O termo inglês queer é antigo e tinha, originalmente,


uma conotação negativa e agressiva contra aqueles que
rompiam normas de gênero e sexualidade. Recentemen-
Capítulo 5    Pedagogia Social e Diversidade: Problematizações    89

te, foi adotado e ressignificado pelo conjunto de teóricos


que, em oposição aos estudos de minorias, decidiu privi-
legiar uma perspectiva crítica sobre os processos sociais
normalizadores. Nas palavras de Guacira Lopes Louro, o
queer designa “a diferença que não quer ser assimilada
ou tolerada, e, portanto, sua forma de ação é muito mais
transgressiva e perturbadora” (LOURO, 2001, p.546).
De qualquer forma, queer permanece uma denominação
aberta que abrange tanto esta corrente teórica quanto
os movimentos sociais contemporâneos que defendem
culturas sexuais marginalizadas. Não há identidade entre
a corrente de estudos e os movimentos, no máximo uma
coalizão em constante diálogo. Sobre esta relação, con-
sulte as reflexões sobre a New Gender Politics em Butler,
2004. (MISKOLCI, 2007, p. 2)

Lopes (2002) e Louro (2004) destacam que a teoria Queer


se diferencia dos outros estudos acerca da sexualidade por
buscar expressar novas formas de compreensão sobre gênero,
sobre a participação efetiva e ativa de sujeitos sexuais. Não
busca delimitar ou fragmentar conceitos, mas problematizar
e reconstruir novas formas de visualizar a sexualidade e os
sujeitos:

Queer é tudo isso: é estranho, raro, esquisito. Queer é,


também, o sujeito da sexualidade desviante – homosse-
xuais, bissexuais, transexuais, travestis, drags. É o excên-
trico que não deseja ser integrado e muito menos tolera-
do. Queer é um jeito de pensar e de ser que não aspira
ao centro e nem o quer como referencias; um jeito de
pensar que desafia as normas regulatórias da socieda-
90   Pedagogia Social

de, que assume o desconforto da ambiguidade, do entre


lugares, do indecidível. Queer é um corpo estranho que
incomoda perturba, provoca e fascina. (LOURO, 2004,
p. 57)

Nesse sentido, essa corrente teórica visa questionar e de-


bater a relação social de um sujeito homossexual considerado
inferior, menor, em uma sociedade heteronormativa e os pro-
cessos que a sociedade estrutura para estigmatizar, depreciar,
desacreditar, excluir, colocar à margem os sujeitos com condu-
tas que considera diferentes das normatizadas – sejam homos-
sexuais ou heterossexuais. Ela propõe que a marginalização
seja vista como positiva para que uma identidade das minorias
sexuais seja repensada.

Assim, a teoria Queer representa todas as ações e situa-


ções que envolvem a identidade sexual em suas abrangências
individuais e plurais com vistas à representatividade de uma
cultura múltipla e específica de grupos como os gays, lésbicas,
bissexuais, travestis, transexuais, drag queens, entre outros. O
que podemos aprender com as concepções apresentadas por
esse segmento teórico relacionando a Educação Social?

Que os espaços familiar e escolar são constituídos de uma


forma heteronormativa, inábeis em lidar com a diferença e
pluralidade sexual, organizando-se como guardiões das nor-
mas de gênero e geradores da heterossexualidade. Não há
como medir a homofobia nos espaços educativos, destaca
Bento (2008, p.129), porém afirma que: “quando se fala na
escola, tudo aparece sob o manto invisibilizante da evasão.
Na verdade, há um desejo em eliminar e excluir aqueles que
Capítulo 5    Pedagogia Social e Diversidade: Problematizações    91

contaminam o espaço escolar. Há um processo de expulsão e


não de evasão”.

Expulsa-se o sujeito do espaço educativo ao não permitir


que um educando travesti utilize o banheiro respondente a sua
identidade de gênero e não a sua constituição biológica; ao
permitir que ocorram piadas, agressões físicas e verbais, cons-
trangimentos e apontamentos – indicar o que é errado, o que
deve ser modificado. O que se pretende é que haja respeito
frente à diversidade sexual e que seja dada voz e visibilidade
aos sujeitos que, durante muito tempo, foram calados e escon-
didos. Não há educação, não há ato educativo sem processos
democráticos, inclusive a democracia sexual – respeito diante
a diversidade sexual.

Recapitulando

Historicamente, as diferentes culturas e espaços sociais nunca


conviveram de forma pacífica com os considerados diferentes,
excluindo-os, marginalizando-os, delegando a esses um espa-
ço ilusório em sociedade – no processo educativo, acabavam
por evadir ou eram encaminhados para escolas Especiais ou
APAEs, onde especialistas estariam aptos a trabalhar com suas
deficiências. Aos homossexuais femininos e masculinos, indi-
cava-se que não demonstrassem sua orientação sexual, que
ocultassem seus desejos por sujeitos do mesmo sexo (gera-
ção do armário) e, principalmente, que buscassem orientação
psicológica e espiritual. Aos heterossexuais, considerados nor-
mais, cabia fiscalizar uma sexualidade que não era sua.
92   Pedagogia Social

E os binários homossexual/heterossexual e mulher/homem


se constituem para normatizar modos de ser e de viver sexu-
almente: ao classificar os sujeitos, toda sociedade estabelece
divisões e atribui rótulos que pretendem fixar as identidades.
Ela define, separa, e, de formas sutis ou violentas, também
distingue e discrimina (LOURO, 2000, p.12).

Mas, se ao criar rótulos, pretende-se construir a diferença


como negativa, como marca que estigmatiza, essa será alicer-
çada na base das relações culturais e nos discursos que são
acolhidos pela sociedade e que se busca perpetuar, ou seja, a
diferença será ensinada de forma negativa – abolir a diferen-
ça, negar a diferença e excluir a diferença se faz necessário.

Assim, cabe aos educadores sociais problematizar os dis-


cursos relacionados ao ser homem e ser mulher, e ao binaris-
mo de gênero pautado em uma matriz heterossexual. O que
significa ser homem, ser mulher? Por que as diferenças nos
incomodam tanto?

Questionar-se é um bom começo...

Referências

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Capítulo 5    Pedagogia Social e Diversidade: Problematizações    93

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(Org.) Escola básica na virada do século: cultura, políti-
ca e currículo. Porto Alegre: FACED/UFRGS Editora, 1995.

Atividades

1) Responda às questões abaixo com V para Verdadeiro e F


para Falso:

a) As pessoas consideradas diferentes, deficientes, con-


forme o momento histórico e os valores vigentes, ti-
nham seu destino marcado de forma inflexível: eram
mortas ou abandonadas à própria sorte.

b) Como sujeitos sociais, não nascemos homem ou mu-


lher, mas aprendemos a ser homem e mulher por meio
das práticas culturais, sociais, entre outras.
Capítulo 5    Pedagogia Social e Diversidade: Problematizações    95

c) Todo sujeito considerado diferente deve se tornar o


mais parecido com os ditos normais. Apenas desse
modo não sofrerá perseguição.

2) Construa um texto entre 15 e 20 linhas que proble-


matize, teoricamente, a seguinte questão: como o
educador social, em um projeto de trabalho, pode
problematizar a construção da identidade de gênero
feminino e masculino na mídia impressa e televisiva?
Exemplifique.

3) Considere as afirmativas a seguir e assinale a alternativa


correta:

I. Há profissões consideradas femininas e masculinas


pela sociedade, porém essa característica é muito
mais cultural e social que biológica.

II. Os discursos sociais produzem representações de fe-


minino, de masculino, de homem e de mulher.

III. As mulheres, historicamente, também sofreram um


processo de invisibilidade como sujeito, assim como
gays, lésbicas e travestis.

a) Somente as afirmativas I e II estão corretas.

b) Somente as afirmativas II e III estão corretas.

c) Somente a alternativa II está correta.

d) Somente a alternativa III está correta.

e) Todas as afirmativas estão corretas.


96   Pedagogia Social

4) A onda agora é a periguete/ Eu tenho uma pick up/ Ela é


toda turbinada/ Quando liga o som/ Chega estremece o
chão/ Eu ando na cidade/ Curtindo o dia inteiro/ O som
automotivo ela é a sensação/ balança periguete, pode
balançar/ balança periguete, pode balançar(...). A músi-
ca “Periguete”, da Banda Baetz, pode ser utilizada em um
projeto de trabalho, enfatizando o seguinte tema transver-
sal, proposto pelo MEC:

a) Pluralidade cultural

b) Orientação sexual

c) Meio ambiente

d) Ética

e) Inclusão

5) Responda às questões abaixo com V para Verdadeiro e F


para Falso:

a) Somos constituídos socialmente, historicamente, por


meio de dispositivos discursivos, presentes em distintos
espaços institucionais. Desse modo, acolhemos verda-
des que nos possibilitam interagir ou não com os ou-
tros.

b) Somos constituídos geneticamente, socialmente; desse


modo, os processos de exclusão, marginalização, tem
relação com a criação do sujeito em seu núcleo fami-
liar, apenas.

c) O preconceito é uma questão individual do sujeito.


Capítulo 5    Pedagogia Social e Diversidade: Problematizações    97

Gabarito
1) V, V, F

2) Uma das seguintes frases-chave deve fazer parte da res-


posta: por meio de imagens e letras de música, proble-
matizar o conceito de feminino e masculino; problematizar
o vestuário de homens e mulheres a partir de imagens e
esculturas de pintores desde gregos e romanos.

3) e

4) b

5) V, F, F
Laíno Alberto Schneider1

Capítulo 6

Conflitos: Realizações
e Frustrações na
Convivência 1

1 Laíno Alberto Schneider – formação acadêmica em Filosofia e Antropologia.


Formado em Filosofia pela FAFIMC, em 1987. Pós-graduado em 1991 como mes-
tre em Antropologia Filosófica pela PUCRS. Doutor em Filosofia pela UPS (Sala-
manca – Espanha). Doutorado em Filosofia no ano de 2000 com reconhecimento
pela UFRGS, em 2006, como Doutor em Antropologia Social. Educador e pesqui-
sador da ULBRA desde 1991.  Coordenador geral da Educação a Distância da
Ulbra nos anos de 2009 e 2010 e coordenador em 2011 do Programa Permanente
de Acessibilidade da ULBRA. Líder do Grupo de Pesquisa Educação Social e Trans-
versalidade. As linhas de pesquisas são acessibilidade, movimentos sociais, forma-
dores e educação social, com o desenvolvimento de pesquisas sobre o processo de
aprendizagem na educação a distância e o educador social.
Capítulo 6    Conflitos: Realizações e Frustrações na Convivência    99

Introdução

A questão a ser trabalhada neste capítulo irá retratar a dificul-


dade e a complexidade que são apresentadas na convivên-
cia. Por isso, o capítulo Conflitos: realizações e frustrações na
convivência vai percorrer o caminho para se superar o espa-
ço individual e possibilitar a organização sociocultural. Nes-
se sentido, muitos são os conflitos que pautam o abrir mão
da liberdade natural para compactuar contratualmente uma
liberdade convencional. Para trabalhar esse capítulo, em um
primeiro momento, serão desenvolvidos os tipos e no que im-
plicam as relações e, a partir daí, como surgem os conflitos.
Posteriormente, será desenvolvida a temática da preservação
e mudança: modelos e conflitos, quando será discutido o que
se preserva e o que precisa ser modificado para se possibili-
tar a convivência. No tópico referente à cultura dos opostos e
complementares, será apresentada e desenvolvida a dinâmica
da cultura, quando será verificado como as diferenças entre
os sujeitos, a sociedade e a cultura questionam os modelos
de cultura consagrados e, ao mesmo tempo, auxiliam na re-
visão do modelo cultural existente. No tópico As conquistas e
as frustrações na convivência, serão apresentados o mal-estar
e os avanços que se tornam indispensáveis para possibilitar a
convivência em grupo.

No decorrer do capítulo é que serão discutidas as causas


e os porquês da dificuldade que a sociedade e a cultura en-
contram para a superação dos conflitos. É possível a mudança
sem a existência de conflitos ou questionamentos dos modelos
100   Pedagogia Social

em vigência? Convido-o para juntos desenvolvermos essa jor-


nada reflexiva a partir da pedagogia social.

6.1 As relações e seus conflitos

A partir do momento em que as pessoas se encontram ou se


desencontram, iniciam-se as relações. Essas relações, pelas
suas características subjetivas, com facilidades, auxiliam o sur-
gimento dos conflitos. Como para o ser humano não existe a
possibilidade da vivência e do desenvolvimento dos potenciais
humanos sem a vida na sociedade, nasce aí a necessidade da
convivência. A partir do momento em que se inicia o processo
da convivência, tem-se aí também o início da condição para
a convivência.

(...) aprender a viver juntos, desenvolvendo conhecimen-


to acerca dos outros, na sua história, tradições e espi-
ritualidade. E a partir daí, criar um espírito novo que,
graça precisamente a esta percepção das nossas cres-
centes independências, graças a uma análise partilhada
dos riscos e dos desafios do futuro, conduza a realização
de projetos comuns ou, então, a uma gestão inteligente e
apaziguadora dos inevitáveis conflitos, utopia, pensarão
alguns, mas utopia necessária, utopia vital para sair do
ciclo perigo que se alimenta do cinismo e da resignação.
(DELORS, 2006, p. 19)

É um equívoco pensar que viver juntos é uma tarefa fácil.


Ao contrário, ela é complexa e desafiadora, pois é a partir des-
Capítulo 6    Conflitos: Realizações e Frustrações na Convivência    101

sa relação de convivência que se faz necessário a mediação e


superação dos conflitos pessoais em prol da perspectiva dos
interesses coletivos.

Viver em sociedade ou em grupo é, por essência, apro-


ximar as relações, e é daí que surgem os determinismos da
convivência. São as relações que apresentam os entendimen-
tos, as compreensões e as aprendizagens que individualmente
cada sujeito desenvolveu e estes conceitos se fortalecem ou
não a partir do momento em que as relações são processadas.
É dentro dessa perspectiva que os sujeitos buscam se identifi-
car no outro a partir da semelhança e, por sua vez, procuram
se afastar do que é contrário a essas convicções. É nesse sen-
tido que as relações de amizade geralmente são processadas
por pessoas que pensam e agem muito parecido com a sua
visão de mundo e de pessoa. No entanto, o problema aí apre-
sentado é que sempre se estará ouvindo aquilo que gostaria
de se ouvir, ou seja, iremos reforçar as convicções já existentes.

Esse modelo de relações e de convivência auxilia na manu-


tenção e na preservação do que é denominado monoteísmo
cultural, ou seja, uma forma única e linear de se perceber as
coisas e as pessoas. Agora, a partir das relações em que a
convivência exige a superação das diferenças é que se fazem
necessários um diálogo e uma conversa sobre os pontos de vis-
ta existentes. É muito comum e natural que se tenha nesse mo-
delo de relação inúmeros conflitos, pois se fazem necessários
um aprimoramento do modelo existente. Portanto, a relação
com os outros como se fosse consigo mesmo é uma relação
sem grandes questionamentos e necessidades de mudanças; a
partir do momento em que isso não é assim caracterizado ou
102   Pedagogia Social

se busca o diálogo para conversar sobre essas diferenças ou


não será possível uma convivência harmônica.

As abelhas e as formigas também agem sobre a natureza


e sabem transformá-la admiravelmente. Mas fazem isso
como uma extensão do corpo, não da consciência. Não
se separam reflexivamente da “coisa” que produzem e,
consequentemente, não atribuem significado ao que fa-
zem. Não re-criam o que criam. O homem-sujeito que
produz a cultura – define-se mais por significa-la como
um ato consciente de afirmação de si mesmo, senhor do
seu trabalho e do mundo que transforma, do que por
simplesmente fazê-la de modo material. Antes de ser ma-
chado objeto, é o seu símbolo, logo, a relação simbólica
entre ele e o homem, entre o homem e os seus símbolos.
É isto o que torna o homem um “ser histórico”, um ser
que não está na história, mas que a constrói como pro-
duto de um trabalho e dos significados que atribui, ao
fazê-lo: ao mundo, a sua ação e a si mesmo, vistos no
espelho de sua prática. Um ser tornado histórico também
no sentido de que não existe como uma espécie de es-
sência dada ao mundo, mas como alguém a quem a his-
tória cria ao ser, ela própria, construída por ele. (BRAN-
DÃO, 2002, p. 39)

A formação social das abelhas, formigas e outras espécies


do reino animal observam a lei dos processos instintivos. Des-
sa forma, sua organização, em grande parte, é um processo
dado e que se mantém em um processo de repetição. Agora a
construção e a elaboração do processo de convivência social
do ser humano segue a lógica das superações dos conflitos e
Capítulo 6    Conflitos: Realizações e Frustrações na Convivência    103

frustrações para o compromisso de viver em grupo. É a partir


desse momento que o ser humano inventa e cria as possibili-
dades de como vai viver nesse cenário.

É na falta de diálogo que se iniciam as grandes tragédias


socioculturais. O que em um primeiro momento poderia ser
um momento de construção social a partir da oxigenação dos
conflitos, esse processo de relação sociocultural passa a se
tornar cada vez mais complicado e complexo.

A UNESCO, ao estabelecer os tesouros a serem descober-


tos por meio da educação, destacou quatro pilares, que são:
aprender a conhecer, aprender a fazer, aprender a conviver
e aprender a ser. Sendo estes os quatro pilares que precisam
ser desvelados, descobertos na construção de uma sociedade
inclusiva e capaz de respeitar a cultura e a sociedade do outro,
eles demonstram a relevância que a convivência tem e exige,
pois é na convivência que desenvolvemos um sujeito e uma
sociedade melhor.

A educação para a tolerância e para o respeito dos ou-


tros, condição necessária à democracia, deve ser consi-
derada como uma tarefa geral e permanente. É o que os
valores e, em particular, a tolerância não pode ser objeto
de ensino, no estrito sentido do termo: querer impor va-
lores previamente definidos, pouco interiorizados, levam
ao fim de contas a sua negação, porque só têm sentido
se forem livremente escolhidos pela pessoa. (DELORS,
2006, p. 59)
104   Pedagogia Social

Tolerar não é simplesmente fazer de conta, e sim fazer com


que o outro compreenda que as diferenças precisam ser res-
peitadas para se permitir novas perspectivas e mudanças.

Por isso, o conhecimento, que é a ferramenta básica desen-


volvida a partir das informações, alcança, no ofício do apren-
der, a possibilidade de se compartilhar as diferentes formas de
se observar e compreender os fenômenos. É nessa diversidade
que brota a possibilidade de se ser muito mais e melhor, tanto
na condição pessoal como na condição de coletividade.

Se, por um lado, a demarcação das subjetividades na com-


posição das relações sociais alimenta os conflitos, por outro,
possibilita a superação da estagnação e a perpetuação do
status quo. Já pensou como seríamos se continuássemos pen-
sando da mesma forma e convivendo nas mesmas relações
de gerações após gerações? Esta questão que se impõe de-
monstra como os conflitos, por vezes, são indispensáveis para
a conquista de novos espaços. Por isso, é indispensável que
se tenha presente que cada sujeito precisa abrir mão da sua
individualidade para poder desfrutar do que a vida em grupo
exige e demanda.

6.2 Preservação e mudança: modelos de


conflitos

Na construção dos processos sociais são indispensáveis os


conflitos, pois são eles o ponto de partida para a construção
das mudanças. Diante de um contexto social, é fundamental
Capítulo 6    Conflitos: Realizações e Frustrações na Convivência    105

que se identifique qual é o tipo de conflito que ali se apresenta,


isto é, a ordem do conflito social pode ser de cunho emocio-
nal, afetivo, econômico, social, cultural.

A educação é um processo contínuo que dura toda a


vida, e que faz da comunidade onde vivemos um mundo
espontaneamente conservador, ao que o educar se refe-
re. Isso não significa, é claro, que o mundo do educar
não mude, mas sim que a educação, como sistema de
formação, da criança e do adulto, tenha efeitos de longa
duração, que não mudam facilmente. Há duas épocas
ou períodos cruciais na história de toda pessoa que tem
consequências fundamentais para o tipo de comunidade
que trazem consigo em seu viver. (MATURANA, 2001, p.
29)

A identificação com que tipo de conflito se está se depa-


rando é crucial para que sejam identificadas as possibilidades
de superação e de interação com os mesmos, porque a cada
tipo de conflito precisa se ter uma relação e um entendimento
exclusivamente diferenciado. Além de cada pessoa apresentar
a sua individualidade, o tipo de conflito requer as suas magias
inclusivas.

A superação de um conflito se torna possível a partir do


momento em que se entende a raiz, a causa geradora do
mesmo. É nesse momento que a observação, a conversa e
o diálogo são os primeiros passos a serem alimentados para
se entender o que está acontecendo. É nesse momento que
verificamos e identificamos quais são os valores, as crenças, os
conhecimentos, as normas e os símbolos que são preservados
106   Pedagogia Social

pelos atores no espaço sociocultural. É na identificação do que


é preservado, mantido e cuidado que começamos a identificar
quem é o sujeito e a sociedade na qual se está inserido. Essa
identificação é a porta de entrada para qualquer possibilidade
de interação e posterior mudança, visto que, para se pensar
em transformação, é essencial entender o que e o porquê de
as coisas precisarem ser alteradas ou modificadas.

É no cenário da preservação que as memórias começam


a alçar novos voos. Não é possível e nem pode se imaginar
tal possibilidade em se querer apagar o passado, pois é ele o
legado da possibilidade do presente e do futuro.

Como o ser humano e a sociedade estão em constante pro-


cesso e movimento, é fundamental que se entenda que alguns
pilares não podem ser excluídos, e sim exigem a preservação.
Assim, não se faz necessário, a cada momento, excluir-se a
trajetória e o processo de aprendizagem desenvolvido pelo su-
jeito no contexto social. É na preservação dos legados que len-
tamente os processos da mudança precisam ser construídos. É
nesse momento que nos deparamos com novos e vários con-
flitos, pois a magia da vida e a definição das identidades não
estão prontas, mas, sim, estão em constante construção. Aqui
as questões cruciais se apresentam, ou seja, o que é preciso
preservar? Qual é a identidade que o sujeito e a sociedade
não podem abrir mão sob o risco de descaracterização? O
que é preciso mudar? Por que é necessária a mudança? Por
fim, por que se está preservando este e aquele aspecto e não
outros? É na busca das respostas que os processos são elabo-
rados e construídos.
Capítulo 6    Conflitos: Realizações e Frustrações na Convivência    107

A mudança, por si só, não significa avanços e conquistas;


pelo contrário, é indispensável que se saiba o que e por que
as mudanças são necessárias, pois é no decorrer do processo
que são identificados os acertos e equívocos dessas escolhas.
Nesse sentido, toda a mudança está carregada e repleta de
riscos. Se, por um lado, os riscos são de cunho pessoal e a
responsabilidade e gigantesca, por outro, quando no processo
da construção da pedagogia social esses processos implicam
terceiros, o grau de comprometimento e reponsabilidade é
enorme, pois, como diz o poeta, somos responsáveis pelo que
se constrói ou pelo que auxiliamos os outros a construir.

São os conflitos que exigem tanto do sujeito como da so-


ciedade uma urgência na investigação, pois os mesmos, para
serem superados, exigem mudanças, e estas precisam preser-
var determinados pontos e, de forma sintética, possibilitar no-
vos processos.

Nós sabemos, na medida em que vamos sabendo da


nossa história e do nosso passado, das nossas experi-
ências sociais acumuladas, dos significados construídos,
das possibilidades e limites de um projeto de futuro, de
um projeto de sociedade ou de campo e de cidade. (AR-
ROYO, 2011, p. 264-5)

É nesse momento em que os processos dialéticos preci-


sam ser alimentados e desenvolvidos, pois é na preservação
ou identificação que se tem o ponto de partida a partir do
qual novos aspectos são buscados e é nesse momento que o
movimento e as transformações vão apresentando os novos
paradigmas da caminhada sociocultural e individual.
108   Pedagogia Social

Uma das lições a aprender para nossas propostas educa-


tivas, é que todas essas experiências partem das manifes-
tações de humanismo, de preocupação e de cuidado, de
sentimentos que envolvem a relação com as crianças e
adolescentes em todas as comunidades, por mais inuma-
nas que sejam suas condições de produção da existência
(...)

Como educadores e pedagogos de ofício, o que pode-


mos aprender com essa pluralidade de ações pedagógi-
cas que acontecem perto de nós, das escolas? (...). (AR-
ROYO, 2011, p. 250)

É no resumo e na dinâmica dos processos dialéticos que


a pedagogia social precisa desenvolver suas dinâmicas e me-
todologias das mudanças. Preservar é necessário, mas é da
essência humana que as transformações e mudanças sejam
processadas, pois é por meio dos alicerces e paradigmas que
os modelos novos podem ser incorporados e inserirem novas
necessidade e oportunidades.

6.3 A cultura dos opostos e


complementares

O processo da dialética das mudanças começa a ser alimenta-


do por intermédio dos conflitos dos opostos, pois são eles que,
primeiramente, causam o impacto do questionamento. Além
de questionar o modelo pessoal, exige um processo de enten-
dimento, pois apresenta um modelo diverso do até então veri-
Capítulo 6    Conflitos: Realizações e Frustrações na Convivência    109

ficado. Dentro da perspectiva antropológica, é o que pode ser


denominado de antropocentrismo, isto é, pensa-se em uma
sociedade e cultura exclusivamente construídas de uma forma
única de se pensar e perceber as possibilidades de organiza-
ção social. É por isso que quando algo diferente acontece no
cenário em que se está inserido, a primeira reação ou postura
é de rejeição e de aversão ao que aí é apresentado. É no mo-
mento posterior que esse tipo de postura e posição começam
a apresentar suas reações.

É do postulado da alteridade e diversidade que os proces-


sos de diálogo apresentam ou não a possibilidade de uma
nova composição. A partir do momento em que não se tem
outro modelo, tanto o sujeito como a sociedade não serão
capazes de apresentar novas respostas para essas demandas.
Exemplificando: se em uma esfera social as pessoas com de-
ficiência não se apresentam no espaço escolar, isso é fruto de
uma sociedade que se acostumou à exclusão, ou seja, como
tal não se aplica a necessidade da mudança, pois o modelo
sociocultural não necessita ampliar os seus olhares e horizon-
tes. É a partir do momento em que uma criança, um adoles-
cente, adulto ou idoso apresenta alguma demanda que nesse
cenário não se faz presente que se inicia um novo processo.
O ponto de partida daquele modelo sociocultural é a rejeição,
pois o que não se deseja, em essência, é a mudança, visto que
a inclusão dessa pessoa exige que novas alternativas sejam
aplicadas e inseridas no cenário social. É a partir deste mo-
mento que a sociedade, em caso afirmativo, começa ampliar
os seus horizontes e que, por via de regra, possibilita melhorar
a condição social dos sujeitos.
110   Pedagogia Social

Uma sociedade se constrói ao longo de um processo em


que novas situações são apresentadas e, no decorrer dos pro-
cessos, são processadas novas conquistas e realizações. E é
por isso que os opostos são o elemento primordial e funda-
mental para a dinâmica da mudança e dos processos dialéti-
cos. Pensar na dinâmica da sociedade e da cultura é ser capaz
de entender e acolher, assim como de identificar a integração
dos opostos. A partir dessa integração é que nascem e bro-
tam um novo sujeito e uma nova sociedade. Agora, o que
por vezes é mais tranquilo e pacífico, é se seguir uma jornada
que demanda só repetições. As repetições individuais e sociais
somente confirmam o que já existe e, como tal, não exigem
novas respostas e alternativas. No entanto, em sua essência,
implicam ter se passado um período (semana, ano, década...)
sem ampliar as perspectivas ou possibilidades. Esse tipo de
situação representa uma tragédia tanto pessoal quanto social,
pois se passou um tempo sem processar novas possibilidades.

Ao se observar a natureza, encontra-se com facilidades


essa harmonia entre os opostos, ou seja, é por meio da inte-
gração do dia e da noite que podemos falar em estações, em
climas, em colheitas, em possibilidades de outros momentos.
Outro momento muito usual dos opostos pode ser observa-
do no clima entre os opostos do calor e do frio. Se, por um
lado, a natureza nos apresenta estes modelos e apresenta por
meio deles algumas situações e necessidade de mudanças, é
comum que o processo aconteça de forma impactante como
um temporal, um tsunami, uma tempestade, mas logo no dia
ou nas semanas seguintes se restaura um processo normaliza-
ção dos fenômenos da natureza. É com esse processo que a
sociedade e a cultura aprendem a ter os primeiros cenários e
Capítulo 6    Conflitos: Realizações e Frustrações na Convivência    111

modelos de administração de conflitos. São esses modelos que


nos ensinam: se na natureza isso está presente, é urgente que
se aprenda que esses fenômenos dos opostos se identificam na
sua integração.

A normalidade dos processos socioculturais demonstra que


há uma acomodação ou o que, em essência, poderia se deno-
minar doutrinamento de um modelo sociocultural. O que, por
sua vez, demanda um processo sociocultural de conservação
e de repetição. Por um lado, nesse sentido, pode representar
uma tranquilidade; por outro, não requer novas perspectivas e
nem apresenta novas possibilidades. Portanto, a ausência de
conflitos proporciona um grande momento de acomodação e
de uma sociedade doutrinada ao status quo. É fundamental
que se entenda que a integração dos opostos, além de exigir
novas perspectivas e conclusões, exige, em essência, e deman-
da a complementação e aprimoramento tanto do sujeito como
da sociedade.

Assim como coloca Guimarães Rosa, que “é no junto do


que sabe bem, que a gente aprende o melhor”, é a partir
do exemplo que uma sociedade precisa aprender a olhar e a
observar que a aprendizagem faz parte de todos os cenários
socioculturais. Feliz da estrutura social e cultural que é capaz
de abrigar e acolher esses momentos e, por outro lado, infe-
liz da sociedade que, em vez de tentar construir a partir dos
opostos e das diferenças novas situações, alimenta o ódio e a
vingança por essa exigência, pois com isso perdem o sujeito e
a sociedade uma oportunidade de aprender e de se aprimorar.
Novamente, enfatiza-se a importância do que destaca Jacques
112   Pedagogia Social

Delors: o tesouro a ser descoberto é de responsabilidade do


que se denomina educação.

Educação, isto é, tudo o que a Humanidade aprendeu


acerca de si mesma. Atraiçoando um pouco o poeta,
que pretendia fazer o elogia do trabalho, podemos pôr
na sua boca estas palavras (...). (DELORS, 2006, p. 32)

Por isso, educar, além de descobrir, é possibilitar que as


capacidades sejam desenvolvidas. As competências por vezes
podem ser inatas, mas adquirem, por intermédio da habilidade
e do exercício de boas práticas, as habilidades e metodologias
da superação dos conflitos. O problema não são os opostos,
e sim a incapacidade de aprender com eles. Na natureza, o
problema não é nem a noite nem o dia, e sim como esse
processo ou metamorfose se processa. Algo muito similar são
os modelos socioculturais; em sua essência, cada um procura
preservar o seu modelo, em pouco ou nada dialogando com o
modelo dos outros. É nessa falta de diálogo que as superações
e as mudanças apresentam e definem as eternas exclusões.

6.4 As conquistas e as frustrações na


convivência

Na cultura dos opostos encontram-se os grandes desafios as-


sim como também as grandes oportunidades de avanços e
aprimoramentos. É a partir desta perspectiva que, o que mui-
tas vezes pode ser visto e interpretado como um problema ou
mal-estar na civilização, por outro lado pode apresentar as
Capítulo 6    Conflitos: Realizações e Frustrações na Convivência    113

oportunidades de conquistas e avanços. Podemos perguntar o


que é uma conquista e uma frustração na convivência? Com
esta pergunta nos vemos inseridos e entrelaçados com a com-
plexidade que a convivência nos apresenta.

São as possibilidades, os momentos que representam as


grandes oportunidade de transformação. Por vezes a não
aceitação ou acolhida de um desconforto momentâneo pode
significar a negativa a uma oportunidade de ampliação dos
horizontes e perspectivas.

Aprender a conviver exige aprimoramento e avanços, pois


uma convivência em grupo não pode ser, de forma alguma,
entendida como um eterno espaço de conformismos e repeti-
ções, e é por isso que novas perspectivas e conquistas preci-
sam ser apresentadas até como mecanismo de avanços e de
saúde social.

Aprender a viver juntos desenvolvendo a compreensão


do outro e apercepção das interdependências – realizar
projetos comuns e preparar-se para gerir conflitos – no
respeito pelos valores do pluralismo, da compreensão
mútua e da paz. (DELORS, 2006, p. 102)

A vida social não necessariamente requer a convivência,


pois ela meramente representa o fazer parte de um grupo, o
que pode ser feito por todos os seres vivos. Agora, a convivên-
cia é necessariamente uma escolha de como se quer construir
esta vida em grupo. E é por isso que é indispensável a parti-
cipação e a interação com os atores que fazem parte desse
cenário social. A vida em grupo ou sociedade emana de uma
construção que os sujeitos fazem em prol de uma perspectiva
114   Pedagogia Social

de segurança e conforto de desenvolvimento individual e co-


letivo. São das conquistas e até dos momentos de frustração
que a sociedade vai apresentando os seus enredos dramáticos
da existência coletiva.

O espetáculo que a convivência nos ensina é de que, em


um primeiro momento, era visto como algo trágico e, como
tal, apresenta uma dramaticidade existencial e subjetiva, pode,
a partir dos seus ensinamentos e aprendizagem, servir como
uma alavanca para a mudança. Não se entende uma convi-
vência sem conquistas e, ao mesmo tempo, frustrações, pois
são estes os dois polos que demarcam a relação e interação
dos atores nesses espaços.

Se, por um lado, a sociedade constrói os seus ídolos para


demarcar as conquistas, por outro, a mesma sociedade apre-
senta os seus estigmas para demarcar o que é nocivo para
esse mesmo cenário. É nesse sentido que se fazem necessárisd
a leitura e a releitura dos fatores que a convivência social exige
e apresenta.

Segundo o dicionário online Priberam da Língua Portugue-


sa, conquista é o “ato de conquistar”. Por isso é que se faz
necessário que, na convivência, aprendamos a identificar as
conquistas que cada um processa, pois do contrário podemos
estar diante de uma sociedade altamente egoísta, no aspecto
individual, ou egocêntrica, no aspecto coletivo. Na definição
conceitual do termo conquista, tem-se uma noção da fragili-
dade sobre a qual muitas vezes os pilares são construídos. O
que se faz necessário neste porém é que aprendamos a olhar
as dimensões mais amplas das complexidades, que por sua
Capítulo 6    Conflitos: Realizações e Frustrações na Convivência    115

vez denominamos de conquistas. É imprescindível que a socie-


dade ou o sujeito faça a seguinte questão: o ganho pessoal ou
do grupo ao qual se integra tem o seu ganho em detrimento
da perda de espaço do outro? Caso a resposta seja afirmativa,
é indispensável que se perceba a importância de se estar no
lugar do outro na condição de sujeito e de sociedade.

A preservação da convivência social, mesmo com suas ad-


versidades, por vezes necessita da sua força e vontade para
melhorar os seus modelos. Visto que as pressões para a não
mudança e transformação são grandes, faz-se necessário que
se tenha persistência para que avanços possam ser feitos.

Já frustrar é, segundo o mesmo dicionário, “privar (outrem)


do que espera com fundamento”, ou seja, à aprendizagem
da convivência social se fazem necessários os cuidados e a
observação da perspectiva dos diversos atores. Por isso é in-
dispensável que os movimentos dialéticos saibam dialogar e
conversar sobre o que representa esse processo de construção
social.

Para a convivência, é fundamental que se aprenda res-


peitar e, ao mesmo tempo, faz-se necessário que se entenda
a necessidade da cooperação para que os conflitos não se
transformem em vinganças e tragédias. Conviver não é um
processo individual, e sim coletivo. E, como tal, é indispen-
sável que se entenda que toda e qualquer atitude implica
compreensões positivas e negativas sobre o que está acon-
tecendo. É nesse momento que se torna indispensável que as
justificativas e os porquês das ações encontrem eco na dialé-
tica da convivência.
116   Pedagogia Social

Recapitulando

Como afirmava Blaise Pascal, o homem é um caniço pensante.


Por vezes, essa diversidade que a sociedade e os sujeitos apre-
sentam nada mais é do que só um sombreamento, pois em es-
sência estamos muito mais próximos do que distantes. O que
por vezes difere ou pode diferir são os contextos e épocas, pois
as leituras de determinadas situações nessas determinações,
esse tipo de entendimento e com o passar do tempo adquire
ou inclui novas dinâmicas dessas situações.

A magia da superação dos conflitos representam as reali-


zações e conquistas nas relações de convivência. É nela que
se aprende que existem elementos que precisam ser preser-
vados, até para podermos apresentar e valorizar os legados
dos saberes de cada geração. Assim como os opostos podem
ser complementares, as semelhanças podem ser simplesmente
uma demonstração de conformismo e estagnação. Aprende-
-se na relação político-social que a convivência precisa ser
uma conquista em que as frustrações são alimentadas pela es-
perança de possibilidades e de perspectivas melhores. A partir
do momento em que algo é conquistado, demonstra-se que
aquela ação conseguiu êxito a partir do momento em que essa
conquista é reconhecida e valorizada. Por isso, as superações
dos conflitos nos ensinam que na convivência constantemente
precisam ser administradas as conquistas e as frustrações.
Capítulo 6    Conflitos: Realizações e Frustrações na Convivência    117

Referências

ARROYO, Miguel G. Currículo, território em disputa. 2. ed.


Petrópolis, RJ: Vozes, 2011.

____. Ofício de mestre. Imagens e autoimagens. 13. ed. Pe-


trópolis, RJ: Vozes, 2011.

BRANDÃO, Carlos Rodrigues. A educação como cultura.


Campinas, São Paulo: Mercado de Letras, 2002.

DELORS, Jacques. Educação: um tesouro a ser descoberto.


Relatório para a UNESCO da comissão internacional
sobre educação para o século XIX. 10. ed. São Paulo:
Cortez; Brasilia, DF: MEC: UNESCO, 2006.

MATURANA, Humberto. Emoções e linguagens na edu-


cação e na política. Belo Horizonte: UFMG, 2. reimpr.,
2001.

Atividades

1) Segundo Delors, aprender a viver juntos pressupõe desen-


volvimento do:

a) Conhecimento acerca de si mesmo, de sua história,


suas tradições e sua espiritualidade.

b) Conhecimento acerca da comunidade, de sua mitolo-


gia, de suas tradições objetivas.
118   Pedagogia Social

c) Respeito acerca dos outros, de sua trajetória, sua loca-


lidade e suas religiões.

d) Conhecimento do entorno vivencial.

e) Conhecimento acerca dos outros, de sua história, suas


tradições e sua espiritualidade.

2) O que dá início às grandes tragédias socioculturais?

a) O diálogo efetivo.

b) Os debates unilateriais.

c) A escolha de culturas.

d) A falta de diálogo.

e) O respeito mútuo.

3) Segundo Maturana, a educação é um processo:

a) Descontinuado, que dura toda a vida.

b) Contínuo, que dura toda a vida.

c) Estanque, que está restrito à escola.

d) Ultrapassado.

e) Contínuo de retrocesso.

4) A superação de um conflito se torna possível a partir do


momento em que se entende:

a) Sua causa geradora.

b) As consequências dele.
Capítulo 6    Conflitos: Realizações e Frustrações na Convivência    119

c) O desencontro dos atores sociais.

d) Seus efeitos.

e) Sua forma de revisão.

5) Conviver é um processo:

a) Estanque

b) Individual

c) Coletivo

d) Restritivo

e) Permanente

Gabarito
1) e  2) d  3) b  4) a  5) c
Lourdes da Silva Gil1

Capítulo 7

Ambientes Sociais e a
Organização 1

1 Lourdes da Silva Gil – Pedagoga, Licenciada em Matemática pela UFRGS,


Especialista em Orient.Educa. p/crianças de Séries Iniciais pela UFRGS, Mestre em
Métodos e Tecn. de Ensino pela PUCRS e Doutora em Ciências da Educação pela
Pontifícia Univ. Católica de Salamanca-ES. Participa da Equipe de Coordenação do
Curso de Pedagogia EAD- ULBRA, Canoas/RS.
Capítulo 7    Ambientes Sociais e a Organização    121

Introdução

Ambientes sociais envolvem sempre um contexto essencialmen-


te humano e, no conceito de Pedagogia Social, o significado
se reduz, mas, também, em contraste, amplia-se. Reduz-se
quando se pensa no agir sobre si mesmo, ou seja, o homem
interferindo no seu fazer cotidiano, mas, quando envolve os
outros, em um contexto de sociedade, o leque de possibilida-
des e de respostas para diferentes perguntas e situações do
agir deste homem se amplia de tal forma que a sua ação
possibilita um desenvolvimento sadio tanto da própria pessoa,
como das outras e das condições sociais que se apresentam.
Então, o ambiente social se amplia e certamente se modifica.

Neste parágrafo anterior, foi usada a palavra homem, mas


tome para si, o que você age ou faz, envolvendo a si mesmo
e aos outros no ambiente onde você vive e em determinados
contextos. São comportamentos que afloram em diferentes
momentos e situações, tanto no âmbito de pequenos ou até de
grandes grupos sociais. Pode ocorrer em ambientes diversos,
sob o desenvolvimento de sensibilidades diferentes. Fala-se em
sensibilidades diferentes quando envolve pessoas, pois cada
um pode perceber o seu mundo ou o seu entorno de modo
diferenciado. As percepções individuais são muito diferentes e
até inimagináveis, mas implicando sempre responsabilidades,
não se pode negar, quando existir ação social e suas conse-
quências.

Nesta fala, tem-se o ser humano, o meio ou ambiente


(onde esse homem se insere), mais os seus atos e suas conse-
quências. É o homem agindo ou não em seu habitat.
122   Pedagogia Social

Usaram-se as expressões meio ou ambiente por se jul-


gar existir uma redundância, ou seja, meio poder ser também
ambiente e vice-versa. Se o ambiente envolve todas as coi-
sas vivas e não vivas que existem ou que ocorrem na Terra,
terão fatores que poderão influenciar e afetar os chamados
ecossistemas, bem como ou, consequentemente, a vida do ser
humano.

7.1 A ação humana e do meio como


organizações na natureza

Com base em estudos para entender o agir ou a ação huma-


na e seus efeitos, foram se estabelecendo leis, sendo usadas
como referências as influências sofridas e provocadas pela
ação e seus efeitos, sendo estabelecidas certas infraestruturas
de diferentes ordens tanto física, química e biológicas, as quais
permitem que a vida prossiga ou se realize de uma determina-
da forma.

Assim, podem ser lembrados aqui, como por exemplo, en-


tre tantos outros:

a) A adaptação do ser humano para habitar regiões ge-


ladas como do ártico, quando a estrutura do nariz foi
se tornando mais afilado e até bem mais curvo para
que o ar gelado fosse se aquecendo no percurso da
anatomia humana para poder alcançar o pulmão sem
matar o esquimó de pneumonia. Inversamente, nas re-
giões mais quentes ou tórridas, observa-se o homem
Capítulo 7    Ambientes Sociais e a Organização    123

com nariz mais largo e curto para permitir a passagem


do ar mais ventilado e, assim, não queime a propria
narina, traqueia e brônquios dos habitantes daquela
região.

b) A baixa estrutura física do homem que habita a região


quente do Equador, como o tipo chamado “nordesti-
no”. São efeitos que vão se repetindo pela mudança
física-biológica, que de alguma forma atuam em rea-
ção e proteção da vida de modos diferentes, tornando
o homem mais resistente, adaptado e em consonância
com o ambiente mais ou menos agressivo.

c) O clima influencia a vida de modo geral e, em es-


pecial, a humana, pois envolve as questões de tem-
peratura, umidade, pressão atmosférica, vento, chuva,
bem como a contagem de partículas atmosféricas e
muitos outros elementos meteorológicos em uma dada
região e por um longo período de tempo. Observa-se
essa influência na estrutura de prédios que o homem
constrói como abrigo nessas regiões, na posição so-
lar, na estrutura e demarcação de ruas etc. Conforme
se verifica nos itens a e b, o clima de um local afe-
tou o homem que ali habita, mas é preciso registrar
que o clima é afetado pela latitude terrestre, tipo de
solo, altitude, incidência do sol, ou pela cobertura de
gelo ou neve, assim como pelos corpos de água próxi-
mos e suas correntezas, levando o homem a construir
mais ou menos próximo das águas. Essas construções,
quando não bem projetadas, podem ser afetadas pe-
las enchentes no período de precipitação das águas,
124   Pedagogia Social

pela erosão quando os desmatamentos são feitos pelo


homem na ânsia de construir a sua habitação, sem
pensar nos elementos naturais que evitam a erosão de
modo geral.

O clima influi na diversidade de espécies animais e da flo-


ra devido aos impactos que possa causar. É preciso lembrar
de sua importância quando se estudam determinadas regiões
onde são classificadas espécies animais e vegetais que só de-
terminada região as possui, sendo apontadas razões como a
temperatura e os recursos naturais ali existentes.

Também o ambiente pode apresentar fatores determinantes


para a disseminação ou não de determinadas doenças, como
por exemplo, na região norte brasileira, a febre amarela* ou
impaludismo, que é muito frequente. Já nas regiões sem maio-
res cuidados sanitários ou sem redes de esgotos, surgem casos
de verminose, leptospirose, entre outras. Você pode estar lem-
brando situações pontuais da sua região, pois cada ambiente
tem as suas características peculiares quanto a isso.

7.2 Os territórios reais e imaginários a


destacar na Pedagogia Social

A Pedagogia Social traz em seu bojo a ideia de territórios,


tanto reais como imaginários, interpretados em espaço e limite
na e da vida humana, tomando, então, referências para a vida
e também para estudos nos aspectos geográficos e históricos.
Capítulo 7    Ambientes Sociais e a Organização    125

Sob o aspecto geográfico, conforme estudos apresentados


desde as séries iniciais, têm-se os rios, as montanhas, os de-
sertos, os vales, as geleiras, os manguezais, as cachoeiras,
os precipícios, os desertos, as caatingas etc., que o homem
foi encontrando como fatores que impuseram ou se transfor-
maram em barreiras para a sua acomodação ou exploração
espacial ou territorial. Hoje, para muitos povos, isso não se
constitui barreira, sendo usada a engenharia e muitas tecnolo-
gias para superá-la.

São dados reais as construções antigas como a Grande


Muralha da China, visível da lua pelos astronautas, as pon-
tes romanas, existentes até hoje, cujos engenheiros acompa-
nhavam as campanhas de invasão. A primeira era de defesa,
guarnecida pelos soldados chineses em suas guaritas e as se-
gundas abriam comunicação e facilitavam o transporte das
tropas para determinadas invasões, e ainda servem para a co-
municação em determinadas regiões. Todas foram táticas de
guerrilha, de previsão de ataque e de defesa.

Como se vê, o ser humano sempre usou a sua inteligência


para resolver problemas que foram surgindo, sendo a convi-
vência e as trocas fatores importantes para o seu desenvolvi-
mento. Historicamente, o homem vive em grupos e isso lhe
auxilia no seu crescimento, na sua aprendizagem, colaboran-
do no seu fazer e agir, na própria resolução de problemas ou
no encontro de alternativas para contornar as dificuldades ou
necessidades que lhe possam surgir.

O primeiro espaço geográfico (físico) a ser considerado


que o homem enfrenta é o útero materno, depois o lar (a famí-
126   Pedagogia Social

lia), a vizinhança, o seu prédio, a rua onde reside, a igreja, a


escola, o bairro, a cidade, o seu Estado e País.

*Febre amarela – impaludismo. Subst. Doença contagiosa


produzida por um protozoário parasito dos glóbulos verme-
lhos do sangue, do gênero Plasmodium, transmitida por um
mosquito das regiões quentes e pantanosas, o anófele. (Sin.:
malária, maleita, paludismo.)

As primeiras relações são importantes para que este ser


(bebê ou criança) estabeleça outras em sua vida. A questão do
acolhimento, do tratamento recebido, da educação parental
vai refletir nas outras relações que ele(ela) possa estabelecer.
Você pode estar se questionando quanto aos aspectos gené-
ticos, aqueles herdados que cada um traz consigo estabeleci-
dos. No entanto, esses aspectos podem ser amainados ou exa-
cerbados, dependendo do meio onde se habita. Concorda-se
que é a aprendizagem social quem molda o sujeito, conforme
afirma Bandura (1963), bem como ela é influenciada pelo su-
jeito.

Nesse sentido, a teoria dos sistemas ecológicos de Bron-


fenbrenner, citada por Shaffer (2005, p.59), aborda “que as
características inatas do indivíduo interagem com as forças
ambientais para modelar o desenvolvimento”.

7.2.1. Os diferentes ambientes como sistemas


de influência significativa
O primeiro ambiente natural, para Bronfenbrenner, é a princi-
pal fonte de influências para qualquer pessoa em desenvolvi-
mento, seguido de outros sistemas que interagirão com o indi-
Capítulo 7    Ambientes Sociais e a Organização    127

víduo e entre os próprios sistemas de modo muito significativo,


a saber:

a) Microssistema: é o primeiro, onde o sujeito desde bebê


se encontra inserido – a família. Percebe-se que uma
relação estabelecida entre duas (2) pessoas é influen-
ciada diretamente por uma terceira. Se um casal vive
harmonicamente, tende a interagir com mais paciên-
cia e sensibilidade com seu(s) bebê(s) que aquele casal
que vive sob tensão ou atritos. Os diferentes tipos e
organizações familiares vão interferir diretamente no
bebê em seu desenvolvimento psicossocial e, certa-
mente, marcar sua formação e vida futura.

b) Mesossistema: As conexões ou inter-relações entre mi-


crossistemas, como lares, escolas, grupos de pares,
igrejas constitui e é denominada de mesossistema.
São locais onde os microssistemas diferentes se en-
contram e tentam conviver. Cada um se constitui em
elemento importante de aprendizagem social. As rela-
ções estabelecidas no Microssistema vão se refletir nas
relações agora mais amplas. A criança do exemplo
positivo citado anteriormente, agora no microssiste-
ma, como em uma escola, ao fazer suas atividades,
irá se comunicar e cooperará provavelmente de modo
muito significativo quando seus pais valorizam essas
atividades e a estimulam. Assim, a desvalorização dos
estudos vai influenciar tanto na queda do desempenho
escolar da criança como do adolescente. O grupo de
pares (colegas e/ou amigos de bairro) pode influenciar
128   Pedagogia Social

positiva ou negativamente na adolescência e tem um


papel preponderante nas relações.

c) Exossistema: Ampliando os contextos, a terceira cama-


da ambiental proposta pelo autor envolve a vizinhan-
ça, a direção da Escola, os serviços de saúde e bem-
-estar da comunidade, a mídia, os amigos da família,
a família externa (avós/tios/outros parentes), o lugar
de trabalho (dos pais ou da própria pessoa) e os servi-
ços legais.

d) Macrossistema: A quarta camada envolve os aspec-


tos de ideologia geral, as leis, os costumes culturais,
subculturas ou classe social, conforme Bronfenbrenner,
onde os valores sócio-políticos se sobressaem na or-
ganização da região, estado e país.

Chama-se a atenção que cada estrutura encaixa a anterior,


com intercomunicações entre elas, em um esquema ou sistema
dialógico. Essa intercomunicação e assimilação de aspectos
vivenciados levam a mudanças nas pessoas ou ambientes ao
longo do tempo – denominado de cronossistema.

Exemplificando:

a) Uma criança, além da convivência nuclear familiar, é


levada ao consultório médico, ao playgrand do pré-
dio, a brincar na rua (conforme a sua localidade e
habitação, onde estabelece relações com outras crian-
ças, com adultos, jovens e velhos, participa de uma
creche etc.). Ao participar de conexões diferenciadas,
a criança vai incorporando novas aprendizagens so-
Capítulo 7    Ambientes Sociais e a Organização    129

ciais e comportamentais e sofre influência das outras


camadas de forma direta ou indireta.

b) Uma pessoa, ao se deslocar do seu lar, usa um trans-


porte coletivo para chegar ao seu local de emprego.
Então ela sofre interferências no transporte das pessoas
que lá estão e dos seus comportamentos. O transporte
coletivo é um ambiente social e pode ser considerado
um local próprio da camada do Mesossistema.

Esse ambiente é composto por várias pessoas, com suas


histórias e como seres ativos no processo desenvolvimental au-
xiliam na mudança de forças internas de cada indivíduo como
o instinto, como no processo de maturação de cada um. Esse
fato aparentemente imperceptível contribui na evolução por
“estágios” diferentes, porém descontínuos, provocando e fa-
zendo variar o aspecto de maturação, tempo, espaço e per-
cepções individuais.

Pense que essa teoria de Bronfenbrenner pode ser dese-


nhada com círculos concêntricos, ou por meio de um círculo
dentro do outro onde no mais central está uma pessoa. Agora,
faça aberturas em cada círculo, como se fosse vazado ou tra-
cejado. Essas aberturas servem para a comunicação do sujeito
entre as diferentes camadas, para que ele transite pelos outros
espaços fazendo trocas de experiências, assimilações etc.

A figura colocada a seguir tem como propósito tentar de-


monstrar significativamente de que o indivíduo sai do seu mun-
do – microssistema e passa a interagir com as outras camadas
ecossistêmicas. Assim, a parte mais clara de luz azul corres-
ponderia ao Mesossitema, e assim por diante (ecossistema,
130   Pedagogia Social

macrossistema), podendo, em vários momentos ou constan-


temente, ultrapassá-los na dependência das comunicações e
atuações de cada camada sobre o indivíduo. As comunica-
ções constantes, o ir e vir no transpasse, na transversalidade
ou na transposição dialógica entre o indivíduo, os outros, o
ambiente, a cultura, conduzem a mudanças significativas entre
todos em um determinado tempo – cronossistema.

Talvez essas ideias colocadas até aqui possam lhe parecer


de fundo Etológico – base bioevolucionista do comportamento
e do desenvolvimento, mas não se pode deixar de considerar
os aspectos de necessidade biológica do ser humano.

7.3 A adaptação versus aprendizagem –


um assunto a ser considerado

A adaptação leva a determinados comportamentos que po-


dem se perpetuar, os quais as pessoas do entorno acabam
incorporando como o desenvolvimento de um hábito e consi-
derado normal. É o que se afirma comumente como: “sempre
se fez assim...”.

Para ilustrar, trazemos uma situação de hábito familiar: em


uma família, tornou-se um prato tradicional nas datas de co-
memorações uma espécie de embutido (tipo mortadela) as-
sado no forno, e uma jovem esposa se prontificou a fazê-lo
e levá-lo na comemoração do Natal. Ao prepará-lo, o jovem
esposo, que observava satisfeito com as habilidades culinárias
da sua esposa, perguntou-lhe por que cortava as pontas antes
Capítulo 7    Ambientes Sociais e a Organização    131

de colocar o alimento no forno. Sem explicação aparente, ela


respondeu que sua mãe e sua avó sempre fizeram dessa forma.
Chegada a noite de comemoração e estando todos já presen-
tes, o jovem esposo se aproximou da avó da jovem cozinheira
e lhe perguntou por quais razões as pontas do embutido eram
cortadas. Seria para apurar mais o gosto dos temperos? Para
que assasse mais e melhor? A avó, como especialista no pra-
to, respondeu: “Como a forma que eu possuía, na época, em
minha casa, era pequena, eu cortava as pontas para melhor
acomodar o embutido e as sobras eu guardava para o café
da manhã”. O segredo foi desvendado, mas por três gera-
ções foi repetida a confecção do quitute sem questionamentos
maiores. Foi um hábito incorporado, precisando que alguém
observador e de fora da família fizesse o questionamento. En-
tão, com esse exemplo ilustrativo, deseja-se chamar a atenção
para uma simples formação de hábito que se iniciou em uma
família, tornando-se uma tradição.

A aprendizagem está sempre presente em qualquer ato


humano, seja como um assunto novo, como retificação de
algo que já ocorreu erradamente para aquele momento, ora
acrescentando, ora ampliando conhecimento, mas carregado
sempre de emoção positiva ou negativa.

Isso reporta para a ideia de apreço que emerge confor-


me os contatos e reações humanas. O apego no transcurso
da História é algo relativamente novo, resultado do mundo
moderno, pois no período do homem nômade e lutador pela
sobrevivência não era permitido que a criança chorasse frente
a estranhos ou animais ferozes.
132   Pedagogia Social

Hoje, observam-se crianças apegadas a seus(suas)


cuidadores(oras) e aos poucos membros de sua família. Quan-
do esses agem com afetividade, a criança demonstra, geral-
mente, ser mais confiante e comunicativos. Quando os adultos
colocam ou trazem experiências negativas, insegurança, falta
de harmonia, conflitos internos em suas relações, a criança
evidenciará, geralmente, comportamentos mais de descon-
fiança, timidez, mais cautela não só com o cuidador ou pais,
como mais tarde poderá assumir posturas similares com seus
afetos, outras pessoas conhecidas ou colegas de trabalho por
ter aprendido a não confiar nas pessoas que conviveram com
ela em períodos iniciais de sua vida.

O altruísmo é uma atitude de resposta a essas aprendiza-


gens iniciais incorporadas ao longo do tempo. Alguns autores
argumentam ser o altruísmo uma motivação inata, cuja habili-
dade de se colocar no lugar do outro é denominada de empa-
tia, sendo um fator importante nas relações humanas.

Nos círculos das camadas ecossistêmicas, nos quais o su-


jeito vai se abrindo ou se fechando conforme vai vivenciando
ou observando diferentes comportamentos, ele se comportará
como empático (simpático), social ou antipático, antissocial.

Imagine-se, então, entrando em um ônibus, no qual várias


outras pessoas estão acomodadas. Observe os comportamen-
tos delas. Aproveite que uma delas está tranquila e imagine
que ela, ao descer do transporte coletivo, agradece rapida-
mente ao motorista por tê-la conduzido até ali. O motorista,
provavelmente, responde-lhe satisfeito pelo reconhecimento e
importância de sua função profissional e certamente redobrará
Capítulo 7    Ambientes Sociais e a Organização    133

os seus cuidados. Agora, ao contrário, alguém reclama aos


brados do ponto de parada que o motorista não atendeu ao
seu pedido, que o motorista isso..., que o motorista aquilo...,
refletindo e influenciando quanto há animosidade do e no gru-
po todo de passageiros e condutor do veículo. A agressividade
pode não se só expressa no tom de voz, mas por gestos e
atitudes, provocando insegurança e situações de perigo e de
risco para os passageiros (ambiente interno) e também para
transeuntes, outros veículos do entorno (ambiente externo).

Tais situações (positiva ou negativa) exemplificadas interfe-


rem no entorno e em diferentes camadas ecossistêmicas, pois
o que era aparentemente restrito a dois indivíduos (passageiro
e motorista) pode afetar e ampliar consequências maiores em
grupos e condições sociais apontadas.

Observa-se que a imaginação proposta a você foi de duas


(2) situações diferentes; no entanto, pode-se lembrar a notícia
desastrosa de desafeto ocorrido em um coletivo urbano cario-
ca que afetou, em 2013, várias pessoas, incluindo-se mortos
e feridos em uma situação de embate físico de um passageiro
com o motorista. A atuação de órgãos administrativos pode
cooperar auxiliando ou acarretando problemas maiores para
os ocupantes do caso do coletivo. Os traumas podem ser físi-
cos, mas os que mais perduram são os psicológicos e, princi-
palmente, quando não há atitude de solidariedade e de ajuda
para a sua resolução ou para pôr-se no papel e função de
cada envolvido.

O condicionamento operante defendido por Skinner (1953)


na Pedagogia Social deve ser lembrado quando da ideia de
134   Pedagogia Social

associação às consequências agradáveis ou desagradáveis,


em um reforço à repetição do que foi favorável ou limitar as
consequências desagradáveis. O trabalho de profissionais da
saúde pode colaborar e contribuir para a remoção de con-
dicionamentos que podem limitar ou inibir comportamentos
após uma situação traumatizante.

A punição, socialmente, foi e é apontada como uma tática


de controle de comportamentos e no aspecto social; mais do
que nunca, ela tem efeito controlador, mesmo que possa ser
contraproducente ou meramente superior a uma resposta in-
desejável e não ensinar uma nova resposta.

Em casos de repressão social, como movimentos e protes-


tos de ruas ou em prédios públicos, o polícia se utiliza de obje-
tos de repressão como gás de pimenta, cassetetes, ostentação
e aparato de formação de tática de defesa policial, usando
escudos, máscaras e atos de avanço em esquema de forma-
ção de ataque. A tentativa é de amedrontar e inibir avanços
da população e ou de grupos específicos de manifestantes.
Dois efeitos podem ser destacados no grupo de manifestantes:
um, de não retorno a qualquer outra manifestação quando
os efeitos de “moral” são vivenciados; o outro, de acerbo do
sentimento de ódio ou revolta acirrada.

A percepção do indivíduo entra como outro elemento im-


portante nos fatos e na circulação entre as camadas ecossis-
têmicas. A percepção tomada como a maneira como é obser-
vado o entorno e a situação, ou seja, a capacidade de sentir
coisas, sensações, o ver a volta de ou “ver” por introspecção,
leva uma pessoa a interpretar, analisar como sentiu, vivenciou
Capítulo 7    Ambientes Sociais e a Organização    135

ou experimentou determinadas sensações e transmiti-la a si e


ao grupo, reagindo ou não, positiva ou negativamente, sobre
um determinado fato.

A experiência e percepção são únicas, pois são sentidas e


vistas de modo diferenciado, em consonância com a história e
leitura de cada um, razão pela qual se afirma que cada indi-
víduo pode contar ou narrar uma mesma situação ou fato de
modos muito diferentes. O sujeito pode não estar mentindo,
mas percebendo de forma muito distinta de outra pessoa. Daí
se levar para a situação de depoimentos judiciais, onde pesso-
as intimadas para depor podem narrar situações tão diferentes
que nem parecem ser sobre o mesmo fato. A atitude de um
juiz é estabelecer parâmetros para as perguntas na tentativa
de chegar a fatos narrativos muito mais próximos da realidade.
A interpretação pessoal é um elemento que entra no discur-
so, podendo distorcer ou chegar o mais próximo da realidade
de um fato. É um componente do discurso que pode desviar
totalmente do fato, pela análise e crivo pessoal das vivências
anteriores do sujeito que funcionam como uma “peneira” na
análise de um fato, comprovando que o perceber é relativo e
individual.

7.4 O sagrado e o profano “costuram” as


camadas ecossistêmicas

Da mesma forma, e é importante trazer neste capítulo as ideias


de sagrado e profano, do bem e do mal, da transcendência,
136   Pedagogia Social

as quais acompanham o ser humano ao longo do tempo e do


tempo de cada homem.

Este é um campo que perpassa todas as camadas ecossis-


têmicas propostas por Bronfenbrenner quando a escola, por
exemplo, quase sempre segue valores religiosos de determi-
nada região; o calendário que um país ou localidade se pau-
ta segue um calendário religioso, a alimentação apresentada
pela família ou na comunidade pode estar pautada por ordem
religiosa, sendo muito forte para os seguidores de alguma
religião e, como exemplo, pode se trazer a “afro”, quando
apresenta permissão ou não para determinado membro, a uti-
lização de alimento salgado ou doce em conformidade com a
entidade protetora do indivíduo. Sendo o Brasil um país consi-
derado católico (conforme dados do IBGE), o consumo maior
de peixe na “semana santa” se efetiva e acelera economica-
mente determinados mercados.

O turismo tem sido incrementado no âmbito religioso e em


determinados períodos anuais, conforme calendário cristão ou
mulçumano, por exemplo.

A própria linguagem se desenvolve conforme a influência


maior ou menor de ordem religiosa, sendo nitidamente iden-
tificada quando o sujeito interage com outros grupos, onde é
possível detectar o ramo religioso que segue.

A separação entre o Estado laico do religioso no Brasil,


historicamente, sofreu reações polêmicas e de muito protesto
na época. O casamento civil, desvinculado do religioso, hoje
é uma prática comum, constituindo-se do arbítrio de cada pes-
soa ou do casal.
Capítulo 7    Ambientes Sociais e a Organização    137

Torna-se o limite entre o sagrado e o profano, então, muito


tênue em determinadas culturas se for considerada a origem
de um povo, a migração levando na bagagem todo um apren-
dizado cultural.

Apesar das diferentes atitudes de repulsa que caracte-


rizam a negação dos elementos religiosos, as menções
apontam para o fato de que o ser humano busca ligar-se
ao transcendente como se mantivesse com tal elemento
uma ligação umbilical, da qual retira os recursos vitais
para a sua existência. (SEIFERT; STEFFEN e FLOR, 2013,
p. 12)

A possível ligação umbilical não está só no sentido apre-


sentado pelos autores, mas pela influência provavelmente da
família desde o ventre e que perpassa os princípios, os valores,
os comportamentos, muitas vezes em diálogo conflitante, de
consolo ou de apaziguamento com o próprio indivíduo, por
diferentes etapas do seu desenvolvimento em seu ciclo vital. A
“religiosidade” de cada um tem ou pode ter fases de maior ou
menor expansão.

Em uma pesquisa feita por esta autora com pessoas na


faixa de 50 anos ou mais (até 70) que frequentavam a univer-
sidade nos anos 1999 e 2000, elas declararam não ter sentido
mudança e nem aumento em relação aos seus sentimentos re-
ligiosos. O foco naquele momento era a família e a realização
de um sonho – o de realizar um curso superior preterido por
diferentes razões em sua vida. No entanto, com a expansão de
outras ordens religiosas, observa-se na linguagem oral (tan-
to presencialmente como por telefone), em correspondências
138   Pedagogia Social

via e-mail ou em redes sociais a manifestação mais aberta e


espontânea de religiosidade e de crenças em uma entidade
superior.

As ideias de bem e mal, conforme Gikovate (2005), sem-


pre se conflitaram e torturaram o indivíduo no seu proceder,
até diário. Algumas propagandas representam tais ideias com
figuras simbólicas (religiosas) do anjo e do demônio em diá-
logo com o homem ou personagem quando em tomada de
decisão. Fazer ou não fazer? Ser ou não ser, eis a questão!(“To
be, or not to be, that is the question”), já dizia William Shakes-
peare na peça teatral A tragédia de Hamlet, em um retrato do
ser humano de sua época, mas mais do que nunca, atual.

Gikovate (2005) apresenta, como evolução do sujeito en-


tre os seus conflitos comportamentais do bem e do mal, os
quais tornam as pessoas egoístas e/ou generosas, um terceiro
elemento que é o justo – aquele elemento de equilíbrio que
conduz o ser humano a pesar os dois elementos antagônicos
gerados por seus sentimentos frente a determinadas situações
e a tomar uma solução mais justa e harmônica possível. Os
sentimentos internos, os conflitos pelos quais cada pessoa
passa refletem não só na camada microssistêmica como tem
repercussões na mesossistêmica. Então há alteração no seu
entorno, como se observou nos exemplos citados anterior-
mente.

Esses conflitos também levam o sujeito normal a sentimen-


tos antagônicos e, porque não, universais de culpa e perdão?
São territórios psicológicos resultantes de um fato externo, mas
Capítulo 7    Ambientes Sociais e a Organização    139

que brotam no sujeito, de dentro para fora, havendo o que


Heimann (SEIFERT, p.237) diz ser “um duplo caminho na for-
mação da culpa humana: interno e externo”.

Encontra-se em Thomas Heimann, no capítulo 12 do livro


de Cultura Religiosa, quando ele aborda a culpa e o perdão,
uma questão existencial, uma classificação de culpa em dois
tipos: a culpa objetiva e a culpa subjetiva. A objetiva, segundo
ele, “existe em separado dos nossos sentimentos. Ela ocorre
quando uma lei ou norma é violada. Transgressor é culpado
perante essa lei (pela transgressão dela), mesmo que talvez
não se sinta culpado”(p.143), enquanto a culpa subjetiva “é
sentimento pouco confortável de pesar, remorso, vergonha e
autocondenação que surge com frequência quando fazemos
e pensamos algo que sentimos estar errado ou quando deixa-
mos de fazer algo que julgamos que deveria ser feito” (p. 143).

Um dos motivos que foi posto mencionando o sujeito nor-


mal se deve ao fato de que o sujeito com alguma patologia
mental dificilmente tem consciência plena do ato que cometeu,
não tem presente o sentimento de culpa, razão pela qual se
torna perigoso para o convívio social. Todo ato pode envolver
sentimentos de culpa, situações de perdão ou não, mas que,
ao envolver duas ou mais pessoas, certamente, estará provo-
cando alteração de comportamentos, sentimentos, atitudes e,
naturalmente, modificando, além do âmbito pessoal, aspectos
do âmbito social em uma camada (ou em outras ou em todas)
do chamado ecossistema, com menor ou maior duração (cro-
nossistema).
140   Pedagogia Social

Recapitulando

Em qualquer ambiente social, pode-se observar a atuação do


sujeito, do grupo e as consequências advindas de uma atitude
tomada. Assim, qualquer pessoa se vê envolvida em camadas
bem distintas e que interagem entre si, ou que mantém cons-
tante comunicação entre elas. São variantes nessas camadas,
no espaço e no tempo, mas nos quais se podem analisar, sem-
pre, aspectos internos e externos do sujeito, pois ele é sempre
o principal ator quando abordado na Pedagogia Social.

Referências

BANDURA, A & WALTERS,R.H. Social Learning and perso-


nality development. Nova York: Holt, Rinehart & Winston,
1963.

GIKOVATE, Flávio. O mal, o bem e mais além – egoístas,


generosos e justos. São Paulo: MG Editores, 2005.

HALL, Calvin S.; LINDZEY, Gardener & CAMPBELL, John B..


Teorias da personalidade. 4. ed. Porto Alegre: Artmed,
2000.

SEIFERT, Paulo Augusto e outros. Cultura religiosa. Canoas:


ULBRA, 2013.

SHAFFER, David R. Psicologia do desenvolvimento: infância


e adolescência. Trad. da 6. ed americana. São Paulo: Pio-
neira Thomsom Learning, 2005.
Capítulo 7    Ambientes Sociais e a Organização    141

SKINNER, Burrhus Frederic. The tecnology of teaching. Nova


York: Appleton-Century-Crofts, 1968.

__________. Reflections on behaviorism and society. En-


glewood Cliff, N. J.: Prentice-Hall, 1978.

Aprendizagem social. In Infopédia [Em linha]. Porto: Porto


Editora, 2003-2013. [Consult. 2013-10-17]. Disponível na
www: <URL: http://www.infopedia.pt/$aprendizagem-
-social>.

Atividades

A bibliografia referenciada neste capítulo é também uma fonte


para sua consulta.

1) As sentenças a seguir são Verdadeiras ou Falsas?

( ) O homem, em qualquer ambiente, age sempre positi-


vamente.

( ) O homem, em qualquer ambiente, age sempre nega-


tivamente.

( ) O homem age no ambiente e sofre as consequências


de sua ação.

( ) O homem é sempre um predador no ambiente.

2) Qual a resposta mais coerente para a ideia a seguir? Ver-


dadeiro ou Falso?
142   Pedagogia Social

Para poder sobreviver em qualquer ambiente, o homem:

( ) Tem de se adaptar ao ambiente.

( ) Constrói a sua habitação com os recursos naturais


existentes.

( ) Vivendo em grupo deve se adaptar e receber contribui-


ções mesmo que negativas.

( ) Não sabe viver em grupo.

3) Na teoria dos sistemas ecológicos de Bronfenbrenner cita-


da por Shaffer (2005, p.59), consta que qualquer indiví-
duo se encontra inserido primeiramente no:

a) Mesossistema

b) Microssitema

c) Exossistema

d) Microssistema

4) Na teoria dos sistemas ecológicos de Bronfenbrenner cita-


da por Shaffer (2005, p.59), consta que qualquer a escola
como instituição é importante quando abrange inúmeros
microssistemas, razão pela qual ela está inserida no:

a) Mesossistema

b) Microssitema

c) Exossistema

d) Microssistema
Capítulo 7    Ambientes Sociais e a Organização    143

5) Na Pedagogia Social, deve-se considerar também como


espaço ou organização do Ambiente Social:

I. A Punição como condicionamento operante.

II. A percepção individual favorecedora para a leitura


dos entornos.

III. A experiência pessoal no agir e controladora de novos


comportamentos.

IV. A introjeção do sagrado como reguladora de compor-


tamentos e de hábitos.

a) Todas as alternativas são falsas.

b) Todas as alternativas são verdadeiras.

c) Somente A e B são verdadeiras.

d) Somente C e D são verdadeiras.

Gabarito
1) F, F, V, F

2) V, F, F, F

3) d  4) a  5) b
Graciela Lima Lopez1

Capítulo 8

Pesquisa Socioeducativa
na Pedagogia Social.
Elaboração de Projeto
Pedagógico Social
Pesquisa Socioeducativa na Pedagogia Socia. ...
1

1 Graciela Maria Lima López – Possui Graduação em Ciências Sociais – So-


ciologia – pela Universidade Católica de Pelotas (1981), Especialização Sociolo-
gia Industrial pela Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (1983),
Doutorado em Filosofia – Universidade Pontifícia de Salamanca (1997) com reva-
lidação Doutorado em Antropologia Social pela Universidade Federal do Rio de
Janeiro (2002), MBA Gestão Educacional (2007). Atualmente é docente do curso
de Pedagogia EAD e Presencial da Universidade Luterana do Brasil. Atuando nas
seguintes áreas: Educação, Gestão Educacional, Sociologia, Antropologia, Filoso-
fia, Pedagogia Social, Educação Social. Integrante do Grupo de Pesquisa e Estudos
Educação Social e Transversalidade na ULBRA/Canoas.
Capítulo 8    Pesquisa Socioeducativa na Pedagogia Socia. ...    145

Introdução

A Pedagogia Social como Ciência Social e Pedagógica deve


realizar investigações para explicar os processos socioeducati-
vos, a fim de chegar a sua compreensão.

Na pesquisa socioeducativa, os conceitos metodológicos


devem ficar claros porque, segundo o método empregado, é
o procedimento a seguir. É independente do tema de estudo
que, por sua vez, afeta todo o processo da investigação.

A pesquisa na Pedagogia Social busca uma explicação ob-


jetiva dos fatos.

Se quisermos adequar a Pedagogia Social às demandas da


sociedade, devemos buscar as respostas na metodologia que
utilizamos na pesquisa.

Segundo Minayo (2010), a metodologia é o caminho do


pensamento e a prática exercida na abordagem da realidade.
Por isso, a metodologia ocupa o lugar central no interior das
teorias.

Lênin (1998) diz que o método é a alma da teoria.

A metodologia inclui as diferentes teorias de abordagem e


o conjunto de técnicas que possibilitam a construção da reali-
dade mais a criatividade do pesquisador.

Atendendo à dupla finalidade teórico-prática da Pedago-


gia Social, é necessário distinguir entre métodos orientados à
investigação teórica e métodos dirigidos à práxis pedagógica.
146   Pedagogia Social

MÉTODOS DE INVESTIGAÇÃO
Investigação Investigação Investigação Investigação
Filosófica Empírica Histórica Comparativa

Com relação aos métodos gerais de investigação, optamos


pelas quatro grandes vias metodológicas clássicas: a investi-
gação filosófica, a investigação empírica, a investigação histó-
rica e a investigação comparativa.

A Investigação Filosófica tem sido usada ao longo da


história do pensamento para descobrir a verdade da realida-
de. Acede-se ao conhecimento de forma imediata e direta por
meio do método fenomenológico. De outra forma, logra-se o
conhecimento de forma indireta pelo método indutivo e dedu-
tivo.

O pensamento é alimentado pela realidade externa e é


produto direto da experiência.

O raciocínio é algo ordenado, coerente, lógico, podendo


ser dedutivo ou indutivo.

A Investigação Empírica na Pedagogia Social resulta im-


prescindivelmente do estudo da realidade do fenômeno edu-
cativo em suas diferentes dimensões.

Na investigação empírica, a indução é o método básico.

O ponto de partida deste método é a observação dessa


realidade ou aceitação das proposições evidentes para pros-
seguir por dedução ou indução.
Capítulo 8    Pesquisa Socioeducativa na Pedagogia Socia. ...    147

Este método se desdobra nos processos de observação,


análise e sínteses, a hipótese e a teoria; procura-se interpretar
a realidade no contexto geral.

Aqui, podemos sinalar os estudos exploratórios, estudos


descritivos, estudos de caso etc.

A investigação histórica
A utilização da metodologia histórica na investigação pedagó-
gica social cumpre uma dupla função, pois permite compreen-
der a realidade educativa social no passado e na atualidade.

Identificamos três etapas para a Investigação Histórica:

1º Reunião de dados (coleta de dados);

2º Avaliação crítica dos mesmos;

3º Preparação escrita de um relatório dos fatos e sua inter-


pretação.

Este processo se faz em quatro etapas:

Heurística (localização e classificação dos documentos);

Análise critica (para determinar a validade histórica);

Hermenêutica (interpretação histórica do conteúdo do do-


cumento);

Exposição do relatório do trabalho histórico.

Este processo deve manter uma unidade.


148   Pedagogia Social

Investigação comparativa
Esta investigação é indicada para o campo da educação com-
parada, cujo objetivo é o estudo comparado dos sistemas edu-
cativos do mundo.

Este tipo de investigação tem como meta estudar os êxitos


e fracassos dos sistemas pedagógicos dos diferentes países e
seus resultados.

Apresenta quatro etapas:

Descrição das informações obtidas nas fontes, documen-


tos, direto com a realidade;

Interpretação e análises dos dados, estudo descritivo;

Estabelecer hipóteses, determinar critérios;

Comparar os dados (estudo comparativo).

O método comparativo é eficaz na investigação social, na


sistematização dos problemas e no planejamento da ação so-
cioeducativa.

Este método logra uma visão integradora da educação em


determinados contextos sociais e culturais.

Metodologia da práxis
O objetivo de todo processo político educativo é o desenvolvi-
mento das capacidades, das habilidades, competências e dos
potenciais de cada educando/educador para sentir, pensar e
Capítulo 8    Pesquisa Socioeducativa na Pedagogia Socia. ...    149

agir de forma autônoma, crítica e criativa no contexto dos gru-


pos sociais em que vive.

Essa é a essência da práxis na perspectiva da metodologia


dialética.

Neste pressuposto, o educando como sujeito do processo


político pedagógico só aprenderá a sentir, sentindo; a agir,
agindo; a criticar, criticando; e a pensar sobre a ação, pensan-
do (GRACIANI, 1999).

A Metodologia da Práxis nos permite olhar o educando não


como uma abstração, seja ele analfabeto ou trabalhador, mas
como um sujeito concreto na sua existência histórica que pos-
sui valores, medos e conhecimentos que trazem junto com eles
para o contexto educativo.

Segundo Arruda (1988), que traz sua experiência do mun-


do sindical, para atingir o objetivo estratégico, há três tarefas
fundamentais nesta metodologia:

1. Auxiliar na apropriação pelos educandos de todo conhe-


cimento científico, histórico, político, cultural acumulado
pela humanidade ao longo da história e que sirva a suas
necessidades e objetivos.

2. Auxiliar na apropriação dos instrumentos de avaliação crí-


tica de seus conhecimentos para que os educandos pos-
sam identificar seu caráter histórico cultural para que se
proponham a renová-lo, atualizá-lo e recria-lo.

3. O mais importante: auxiliar na apropriação dos educan-


dos dos instrumentos para a teorização da própria prática
150   Pedagogia Social

para que os novos conhecimentos sirvam para a transfor-


mação da realidade, da comunidade e de si próprios.

Essas três tarefas estão interligadas e ajudam a desenvolver


a participação democrática, princípio fundamental da Peda-
gogia Social.

A Pedagogia Social exige um processo permanente de teo-


rização sobre a prática para lograr o avanço histórico na qual
se insere.

A criação e recriação da aplicação das diferentes metodo-


logias e sobretudo da metodologia da Práxis favorece a for-
mação sólida do educador social, transformando-o em agente
multiplicador, formador de formadores na prática social.

Momentos de reflexão e sistematização coletiva favorecem


a autonomia e independência dos Pedagogos Sociais como
agentes de mudança do grupo em que realiza sua ação edu-
cativa.

Este tipo de investigação tem uma grande importância no


campo educativo para superar a teoria e a prática e encontrar
um espaço de diálogo para que o sujeito prático se converta
em um investigador.

Segundo Minayo (2010), os dados recolhidos da realidade


dessas práxis são suficientes para explicar a realidade social.

Surge aqui o Método Quantitativo para estudar a realidade


como suficiente para explicar a realidade social, usando ins-
trumentos padronizados e neutros.
Capítulo 8    Pesquisa Socioeducativa na Pedagogia Socia. ...    151

O Método Qualitativo é um processo que estuda a distin-


ção entre leis e as teorias do ponto de vista de sua caracterís-
tica qualitativa.

O trabalho em uma pesquisa qualitativa, segundo Minayo


(2010), divide-se em três partes:

1. Fase exploratória: define o objeto de estudo, organiza a


teoria e a metodologia, cria hipóteses, descreve os instru-
mentos de trabalho, faz o cronograma.

2. Entra direto no trabalho de campo quando combina os


instrumentos de observação, comunicação, levanta e co-
leta dados, confirma ou não as hipóteses.

3. Analisa o material recolhido e o documenta quando ocor-


re a interpretação de dados.

Na análise qualitativa, levantam-se códigos sociais a partir


do levantamento dessas opiniões.

Este tipo de pesquisa não termina aqui, porque toda inves-


tigação produz novo conhecimento que precisarão de novas
pesquisas.

Modelo de projeto de pesquisa social


Guia Prático para Elaboração de Projetos
Pedagógicos Sociais
1. Título do Projeto e dados de Identificação

1.1. Instituição
152   Pedagogia Social

1.2. Dependência da Instituição

1.3. Localização

1.4. Responsável pela Instituição

1.5. Responsável pelo Projeto

1.6. Endereço eletrônico

2. Justificativa / Fundamentação Teórica

2.1. Contextualização

2.2. Diagnóstico da Realidade

3. Objetivos

3.1. Geral

3.2. Específicos

4. Metas

5. População Alvo

6. Atividades e Ações

6.1. Identificação das Atividades – Ações

6.2. Caracterização

6.3. Responsáveis

6.4. Local

6.5. Horário – Duração

6.6. Métodos – Técnicas e Instrumentos


Capítulo 8    Pesquisa Socioeducativa na Pedagogia Socia. ...    153

7. Cronograma

8. Previsão Orçamentária

9. Avaliação do Processo e Resultados – Feedback

(LÓPEZ, 2010).

Recapitulando

Podemos afirmar que as estratégias participativas dão possibi-


lidades educativas que transcendem aos métodos.

Os pedagogos sociais são educadores sociais que se com-


prometem com os educandos sujeitos dessa educação, com os
trabalhadores que estudam para se formar educadores, com
as mudanças, os movimentos sociais.

Que a partir dessas práxis ou de uma situação de necessi-


dade concreta se construa uma base de conhecimentos cen-
trados na melhoria da educação dos indivíduos e dos grupos
sociais que participam.

Referências

ARRUDA, M. Metodologia da Práxis e Formação dos tra-


balhadores. Rio de Janeiro: Vozes, 1998.

CERVO, Armando Luiz; BERVIAN, Pedro Alcino. Metodologia


Cientifica. São Paulo: Pearson Printice Hill, 2005.
154   Pedagogia Social

DEMO, P. Metodologia cientifica em Ciências Sociais. São


Paulo: Atlas, 1981.

DESLANDES, Suely Ferreira (Org.). Pesquisa Social: teoria,


método e criatividade. Petrópolis: Vozes, 1994.

GRACIANI. M. Pedagogia social de Rua analise e sistema-


tização de uma experiência vivida. São Paulo: Cortez:
Instituto Paulo Freire, 1999.

LÊNIN, V. O que fazer? São Paulo: Hucitec, 1998.

LÓPEZ, Graciela Lima. Guia Prático para elaboração de


Projetos Pedagógicos Sociais. Canoas: ULBRA, 2010.

MINAYO, M. O Desafio da Pesquisa Social, Teoria Métodos


e Criatividade. Rio de Janeiro: Hucitec-Abrasco, 2010.

PETRUS, A. Pedagogia Social. Barcelona: Ariel, 1997.

SANTOS FILHO, José Caminho; SANCHEZ, Silvio Gamboa.


Pesquisa Educacional: quantidade-qualidade. São Paulo:
Cortez, 2001.

THIOLLENT. Michel. Critica Metodológica, Investigação so-


cial e Enquete Operaria. São Paulo: Polis,1992.

Atividades

1) A Pedagogia Social, como Ciência Social e Pedagógica,


deve realizar investigações para explicar os processos so-
cioeducativos a fim de chegar a sua compreensão. Para
Capítulo 8    Pesquisa Socioeducativa na Pedagogia Socia. ...    155

isso, utiliza-se de métodos orientados à investigação teóri-


ca e métodos dirigidos à práxis pedagógica. Com relação
aos métodos de investigação, podemos optar por:

a) Investigação Filosófica.

b) Investigação Empírica.

c) Investigação Histórica.

d) Investigação Comparativa.

e) Todas as alternativas estão corretas.

2) A utilização da metodologia histórica na investigação pe-


dagógica social cumpre uma dupla função, pois permite
compreender a realidade educativa social no passado e
na atualidade. As etapas dessa investigação são:

a) Reunião de dados.

b) Avaliação crítica dos dados coletados.

c) Relatório e sua intervenção.

d) Estão corretas a, b, c.

e) Nenhuma alternativa está correta.

3) O objetivo de todo processo político é o desenvolvimento


das capacidades e das habilidades de cada educando e
educador para sentir, pensar e agir de forma autônoma,
crítica e criativa no contexto dos grupos sociais em que
vive. Esta é a essência da práxis na perspectiva da meto-
dologia dialética que tem como pressuposto:
156   Pedagogia Social

a) O educando como sujeito do processo político peda-


gógico.

b) Olhar o educando como analfabeto.

c) Um sujeito abstrato, não concreto na sua existência


histórica.

d) Um sujeito que não possui valores.

e) Um sujeito que não possui conhecimento, nem traz


junto com ele para o contexto educativo.

4) A criação e recriação da aplicação das diferentes metodo-


logias, especialmente a metodologia da práxis, favorece:

a) A formação sólida do Pedagogo Social.

b) A transformação em agente multiplicador.

c) A formação de formadores na prática social.

d) A autonomia, independência dos Pedagogos Sociais


como agente de mudanças do grupo em que realiza a
ação educativa.

e) Todas as alternativas estão corretas.

5) O método qualitativo é um processo que estuda a dis-


tinção entre leis e as teorias do ponto de vista de suas
características qualitativas. O trabalho em uma pesquisa
qualitativa se divide em partes, sendo elas:

a) Exploratória.

b) Trabalho de campo.
Capítulo 8    Pesquisa Socioeducativa na Pedagogia Socia. ...    157

c) Análise do material recolhido, coletado.

d) Documentação do material coletado, interpretação


dos dados.

e) Todas as alternativas estão corretas.

Gabarito
1) e  2) d  3) a  4) e  5) e
Christiane Martinatti Maia1

Capítulo 9

A (Re)Construção da
Identidade: Visibilidades
para os Pedagogos
Sociais 1

A (Re)Construção da Identidade: Visibilidade...

1 Christiane Martinatti Maia é graduada em Pedagogia Séries Iniciais e Matérias


Pedagógicas do Segundo Grau pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul
(UFRGS), Especialista em Psicopedagogia Institucional e Clínica pela Faculdade
Porto-Alegrense (FAPA) e Mestre em Educação, ênfase em Educação Especial, pelo
Programa de Pós-Graduação em Educação da UFRGS (PPGEdu/UFRGS). Atua,
desde 1992, na área de pesquisa e, atualmente, participa como pesquisadora de
dois grupos cadastrados no Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e
Tecnológico (CNPq), intitulados Psicopedagogia, Ludicidade e Processos de Ensinar
e Aprender e Educação a distância: mitos e desafios. Atualmente, é professora da
Universidade Luterana do Brasil (ULBRA) nos campi Canoas, Guaíba e São Jerôni-
mo, nas modalidades presencial e a distância.
Capítulo 9    A (Re)Construção da Identidade: Visibilidade...    159

Introdução

No presente capitulo, abordar-se-á, a partir das ideias de dife-


rentes correntes teóricas, a construção da identidade no sujeito
e como suas interfaces se relacionam com a identidade e os
processos de inclusão e marginalização.

9.1 Sobre a construção da identidade:


problematizações!

São os estados que ditam as regras de nossas vidas e, so-


bretudo, que dão forma às nossas identidades, tanto co-
letivas como individuais. (MAYBURY-LEWIS, 2003 p.11)

Ao se pensar na construção da identidade, pode-se pen-


sar em uma constituição interna, porém Bauman (2005), Hall
(2000), entre outros, destacam a relação entre identidade e
os aspectos cultural, social, politico, econômico, étnico e de
gênero, desmistificando a relação biológica. Dessa forma, a
identidade não é apenas individual, mas de grupo. Não é to-
talizante, mas fragmentada:

(...) a identidade plenamente unificada, completa, segura


e coerente é uma fantasia. Ao invés disso, à medida que
os sistemas de significação e representação cultural se
multiplicam, somos confrontados por uma multiplicida-
de desconcertante e cambiante de identidades possíveis,
com cada uma das quais poderíamos nos identificar – ao
menos simplificações. (HALL, 2002, p.13)
160   Pedagogia Social

Assim, a identidade é definida historicamente, e não bio-


logicamente, conforme afirmam alguns teóricos, entre eles,
Freud. O sujeito assume identidades distintas em diferentes
momentos, decorrentes de suas práticas sociais, identidades
não unificadas ao redor de um eu coerente: dentro de nós há
identidades contraditórias, empurrando em diferentes direções,
de tal modo que nossas identificações estão sendo continuada-
mente deslocadas (HALL, 2000, p. 13).

Para o pesquisador, a identidade se modifica conforme o


sujeito é abordado ou interpretado, constituindo-se a identi-
dade em uma relação entre perdas e ganhos em um processo
descrito como: constituindo uma mudança de uma política de
identidade (de classe) para uma política de diferença (HALL,
2003, p.21).

E a nossa identidade, em seu movimento de construção


e reconstrução, constitui-se, também, na ligação entre o que
vemos e não vemos presente nas mídias: uma identidade para
cada movimento (HALL, 2002, p.49), contemplada e contem-
pladora dos distintos espaços sociais, tais como escola, família
etc. Assim, a identidade se estabelece em gênero, etnia, de
classe e política. Não apenas uma identidade individual, mas
uma identidade social – construída no interior da representa-
ção, por meio da cultura, não fora dela:

Elas são o resultado de um processo de identificação que


permite que nos posicionemos no interior das definições
que os discursos culturais (exteriores) fornecem ou que
nos subjetivemos (dentro deles). Nossas chamadas sub-
jetividades são, então, produzidas parcialmente de modo
Capítulo 9    A (Re)Construção da Identidade: Visibilidade...    161

discursivo e dialógico. Portanto, é fácil perceber porque


nossa compreensão de todo este processo teve que ser
completamente reconstruída pelo nosso interesse na cul-
tura; e por que é cada vez mais difícil manter a tradicio-
nal distinção entre “interior” e “exterior”, entre o social
e o psíquico, quando a cultura intervém. (HALL, 2002,
p. 37)

Para Maia (2000), os discursos, em geral, são organiza-


dos a partir de inúmeras vozes, que concorrem entre si para
edificar e situar os sujeitos, a fim de fabricar diferentes efeitos
em cada um de nós. Os discursos, desse modo, produzem sig-
nificados, valores, crenças e emergem de visões particulares,
de modos de agir e de pensar sobre o mundo, como salienta
Costa (2004, p.48):

Os significados em uma sociedade ou cultura são produ-


zidos “segundo um jogo de correlação de forças no qual
grupos mais poderosos – seja pela posição política e ge-
ográfica que ocupam, seja pela língua que falam, seja
pelas riquezas materiais e simbólicas que concentram e
concedem, ou por alguma outra prerrogativa – atribuem
significado aos mais fracos e, além disso, impõem a estes
seus significados sobre outros grupos”. Essa disputa pelo
poder de narrar, de representar, é que tem sido denomi-
nada de política da representação ou política de identi-
dade, produzindo seus efeitos na «política cultural». A re-
presentação que vale, que é socialmente aceita, é aquela
que é fabricada, inventada, pelos grupos que detêm mais
poder, material ou simbólico. (COSTA, 2001, p. 42)
162   Pedagogia Social

Silva (2004) salienta que a chamada política de identidade


se estrutura com base em duas relações centrais do conceito
de representação: representação como “delegação” e como
“descrição”. Por delegação, pergunta-se quem tem o direito
de representar quem, em instâncias nas quais se delega um
número reduzido de representantes o direito a voz e o poder
de decisão de um grupo inteiro: a delegação de alguns para
falar e agir em nome do outro faz com que o processo de
apresentação e descrição do outro seja dirigido por quem pos-
sui esta delegação, pois quem fala pelo outro controla as for-
mas de falar do outro. Essa ideia de representação constitui-se
como democracia representativa, destaca Hall (2004).

No processo de representação associado à descrição, per-


gunta-se sobre como os diferentes grupos culturais e sociais
são apresentados nas diferentes formas de inscrição cultural.
As duas dimensões da representação são indissoluvelmente re-
lacionadas, sendo a representação uma das práticas centrais
que produzem cultura e a linguagem, consistindo no meio pelo
qual “significamos” as coisas:

Representação é o processo pelo qual membros de uma


cultura usam a língua (amplamente definida como qual-
quer sistema que empregue signos, qualquer sistema sig-
nificante) para produzirem significados. Esta definição já
carrega a importante premissa de que as coisas – obje-
tos, pessoas, eventos do mundo – não têm em si qual-
quer significado estabelecido, final ou verdadeiro. Somos
nós – na sociedade, nas culturas humanas – que fazemos
as coisas significarem, que significamos. Os significados,
Capítulo 9    A (Re)Construção da Identidade: Visibilidade...    163

consequentemente, mudam sempre de uma cultura ou


época para outra. (HALL, 2002, p.61)

A Ciência, os discursos acerca da normalidade e anorma-


lidade presentes na sociedade contribuem na construção de
nossa identidade cultural com vistas à constituição de sujeitos,
discursos e verdades – isso só é possível a partir da relação do
que somos e não somos:

A identidade cultural ou social é o conjunto daquelas


características pelas quais os grupos sociais se definem
como grupos: aquilo que eles são. Aquilo que eles são,
entretanto, é inseparável daquilo que eles não são, da-
quelas características que os fazem diferentes de outros
grupos. Identidade e diferença são, pois, processos inse-
paráveis. A identidade cultural não é uma entidade ab-
soluta, uma essência, uma coisa da natureza, que faça
sentido em si mesma, isoladamente. Na vida cotidiana,
na experiência ‘normal’ da existência, essa estreita de-
pendência entre identidade e diferença desaparece, se
apaga, se torna invisível. Tanto a nossa identidade quan-
to a identidade dos outros (a diferença) aparecem como
absolutas, como essências, como experiências originais,
primordiais. A identidade só faz sentido numa cadeia
discursiva de diferenças: aquilo que “é” é inteiramente
dependente daquilo que “não é”. Em outras palavras, a
identidade e a diferença são construídas na e através da
representação: não existem fora dela. (SILVA, 2004, s/p)

E as diferenças acabam por perfazer o nós e os eles, os


normais e os anormais. Para pesquisadores da área dos Es-
tudos Culturais, o anormal sustenta a normalidade, sustenta
164   Pedagogia Social

um padrão estabelecido na sociedade, calcado em estereóti-


pos, na dualidade da construção do eu e do outro. Gil (1994,
p.10) salienta que:

nós exigimos mais dos monstros, pedimos-lhes, justa-


mente, que nos inquietem, que nos provoquem vertigens,
que abalem permanentemente as nossas mais sólidas
certezas; porque necessitamos de certezas sobre a nossa
identidade humana ameaçada de indefinição. Os mons-
tros, felizmente, existem não para nos mostrar o que não
somos, mas o que poderíamos ser. Entre esses dois polos,
entre uma possibilidade negativa e um acaso possível,
tentamos situar a nossa humanidade de homens.

Essa duplicidade de papéis presentes na relação do eu –


outro, do normal e anormal, do eu e o monstro, com base nas
ideias de Marques (s/d) nos constituem em um jogo estruturan-
te, conferindo, ao mesmo tempo, segurança e insegurança, já
que ela representa o espelho que reflete a imagem do homem
e o confirma no sentimento de ser no mundo. Porém, se essa
semelhança se torna grande demais, a ponto de obscurecer
total ou parcialmente o autorreconhecimento, a presença do
outro deixa de ser interessante, tornando-se, então, um fator
de insegurança, uma vez que passa a ser interpretado como
uma ameaça à identidade do indivíduo: O conhecimento de
si mesmo é, de certo modo, um jogo dialético entre os dois
polos que caracterizam a presença do outro: a semelhança e a
diferença (VAYER e RONCIN, 1989, p. 60 in MARQUES, s/d).

Nesse sentido, o outro monstruoso, anormal, para os pes-


quisadores, demonstra nossa dificuldade em se trabalhar com
Capítulo 9    A (Re)Construção da Identidade: Visibilidade...    165

o conceito de imperfeição, com o devir inumano: o nascimen-


to monstruoso mostraria como, potencialmente, a humanida-
de do homem, configurada no corpo normal, contém o germe
da sua inumanidade, destaca Gil (1994, p. 135).

O normal e o anormal, assim, constituem-se a partir dos


discursos que propõem a construção de um sistema de margi-
nalização, de colocar o outro na margem da sociedade, por
separá-lo para que não visualizemos nossa própria dificuldade
de lidarmos com nossos próprios monstros – aqueles que nos
habitam e que tentamos exterioriza-los como normais ...

9.2 O educador social e o


multiculturalismo: relações
necessárias!

dividir mundo social entre “nós” e “eles” significa classifi-


car. O processo de classificação é central na vida social.
Ele pode ser entendido como um ato de significação pelo
qual dividimos e ordenamos o mundo social em grupos,
em classes. A identidade e a diferença estão estreitamen-
te relacionadas às formas pelas quais a sociedade pro-
duz e utiliza classificações. As classificações são sempre
feitas a partir do ponto de vista da identidade. Isto é, as
classes nas quais o mundo social é dividido não são sim-
ples agrupamentos simétricos. Dividir e classificar signifi-
ca, neste caso, também hierarquizar. Deter o privilégio de
classificar significa também deter o privilégio de atribuir
166   Pedagogia Social

diferentes valores aos grupos assim classificados. (SILVA,


2000, p.38)

Classificados como diferentes: deficientes, gays, lésbicas,


negros, afrodescendentes, orientais, índios, dependentes quí-
micos, profissionais do sexo, analfabetos, analfabetos funcio-
nais, obesos etc. Se a identidade não é inata, assim como a
diversidade, e se constitui com base nos contextos histórico,
cultural, social e político, os processos de classificação se es-
truturam nesses contextos para impor padrões na sociedade
para acolher alguns e deixar outros à margem – e são os su-
jeitos que estão nessa margem com os quais os educadores
sociais desenvolvem projetos: não apenas educacionais, mas
de reestruturação de suas vidas para que problematizem e re-
flitam sobre os conceitos de minoritário ou inferior.

Assim, os educadores sociais, com bases nas ideias de Hall


(2000), devem compreender que as sociedades capitalistas
são lugares de desigualdade no que se refere à etnia, sexo,
gerações e classes, sendo a cultura o locus central em que
são estabelecidas e contestadas tais construções. É na esfera
cultural que ocorre a luta pela significação, na qual os grupos
subordinados procuram fazer frente à imposição de significa-
dos que sustentam os interesses dos grupos mais poderosos:

[...] a cultura é agora um dos elementos mais dinâmicos


– e mais imprevisíveis – da mudança histórica do novo
milênio. Não devemos nos surpreender, então, que as
lutas pelo poder deixem de ter uma forma simplesmente
física e compulsiva para serem cada vez mais simbólicas
e discursivas, e que o poder em si assuma, progressiva-
Capítulo 9    A (Re)Construção da Identidade: Visibilidade...    167

mente, a forma de uma política cultural. (HALL, 1997,


p. 20).

Dessa forma, os Estudos Culturais ressaltam que a cultura


precisa ser apreendida, pesquisada e concebida, bem como
tudo o que está associado a essa e a seu papel característico.
O pesquisador destaca que essa corrente teórica foi estrutura-
da, assim como um projeto político de oposição, e suas mo-
vimentações sempre foram acompanhadas de transtorno, dis-
cussão, ansiedades instáveis e um silêncio inquietante (2000,
p.45).

O que se propõe, então, é o redimensionamento do con-


ceito de cultura e um novo olhar sobre as (re)construções cul-
turais, agora não mais cultura única, mas múltipla. Um re-
dimensionamento de como as identidades sociais e culturais
são edificadas nos processos educativos formais e não formais
como resultantes das relações de poder e regimes de verdade
existentes na estrutura curricular ou nos objetivos de aprendi-
zagem.

Nesse sentido, entra em cena o multiculturalismo, a fim de


possibilitar a problematização acerca da fabricação das iden-
tidades em um currículo pretensamente fixo, imutável:

o multiculturalismo crítico compreende a representa-


ção de raça, classe e gênero como o resultado de lutas
sociais mais amplas sobre os signos e significações e
enfatiza [...] a tarefa central de transformar as relações
sociais, culturais e institucionais nas quais os significados
são gerados. (MACLAREN, 2003, p. 32)
168   Pedagogia Social

O multiculturalismo, entendido dessa forma, pode contri-


buir para a discussão e entendimento das interfaces relaciona-
das à aceitação e não aceitação dos sujeitos associados aos
grupos minoritários: o reconhecimento de sujeitos relegados
há um segundo plano se faz primordial – a inclusão dos não
ditos e não nomeados ou nomeados de uma forma precon-
ceituosa.

Estruturar um currículo com base nas ideias do Multicultu-


ralismo é primordial, visto que essa corrente de estudos ques-
tiona a forma linear relacionada a distintos movimentos. Um
exemplo são os surdos que possuem um processo histórico,
uma cultura e uma comunidade completamente diferenciada
dos deficientes, ou seja, não podemos compará-los, pois es-
pecificidades estão presentes em cada deficiência, assim como
na luta de gays, lésbicas, travestis entre outros. Moreira(2003,
p. 55) auxilia nessa questão ao salientar que:

se nos interessa uma Educação que inclua o conceito


de identidade como um movimento, como um comple-
xo de elaboração instáveis, com configurações sujeitas
a mudanças, interessa-nos uma Educação que inclua a
corporeidade, o gênero, a condição física e mental tal
como se apresenta [...].

O que se pretende é trazer para os espaços formais e não


formais de educação, a partir das histórias dos sujeitos rela-
cionadas aos movimentos de marginalização e exclusão, dis-
cussões que possibilitem e promovam uma modificação em
suas vidas de forma global – inclusive de pertencimento. Feltrin
(2007, p.50) destaca que: o mal do um mundo não está em
Capítulo 9    A (Re)Construção da Identidade: Visibilidade...    169

ser diferente, mas em não aceitar a diferença, não reconhecê-


-la e não fazer dela instrumento de construção, crescimento
social e igualdade entre as pessoas.

Se o aprender e ensinar, nessa perspectiva, devem se cons-


tituir com base nos diálogos de todos os sujeitos que com-
põe não apenas as salas de aula, a instituição escolar, mas o
entorno em geral, o educador e o educador social precisam
articular conteúdos e conhecimentos externos aos conteúdos
mínimos, ao currículo escolar – trazer à tona os discursos se-
gregados em pequenos espaços, calados e inteligíveis para
alguns – que não os desejam compreender. Hall (2000, p. 04),
destaca que:

A sociedade não é, como os sociólogos pensaram muitas


vezes, um todo unificado e bem delimitado, uma totali-
dade, produzindo-se através de mudanças evolucioná-
rias a partir de si mesma, como o desenvolvimento de
uma flor a partir de seu bulbo. Ela está constantemente
sendo “descentrada” ou deslocada por forças fora de si
mesma.

Frente às ideias do pesquisador, a sociedade se estabelece


de forma multifacetada, na qual as identidades se integram
diante das diferenças. E é no descentrar, no deslocamento das
forças que o multiculturalismo contribui para a problematiza-
ção das ações relativas à marginalização das culturas minori-
tárias, com vistas a que esses sujeitos visualizem a sua identi-
dade: São as lutas dos grupos sociais discriminados e excluídos
de uma cidadania plena, os movimentos sociais, especialmen-
170   Pedagogia Social

te os referidos a questões identitárias, que constituem o locus


de produção do multiculturalismo (CANDAU, 2012, p. 130).

Urgem projetos educativos que deem projeção às culturas


silenciadas e às que se desejam silenciar: (re)descobrir sujeitos
e suas identidades.

Recapitulando

O anseio por identidade vem do desejo de segurança, ele


próprio um sentimento ambíguo. Embora possa parecer
estimulante no curto prazo, cheio de promessas e pre-
monições vagas de uma experiência ainda não vivencia-
da, flutuar sem apoio num espaço pouco definido, num
lugar teimosamente, perturbadoramente nem-um-nem-
-outro, torna-se, a longo prazo, uma condição enervante
e produtora de ansiedade. Por outro lado, uma posição
fixa dentro de uma infinidade de possibilidades também
não é uma perspectiva atraente. Em nossa época líquido-
-moderna, em que o indivíduo livremente flutuante, de-
simpedido, é o herói popular, estar fixo ser identificado
de modo inflexível e sem alternativa é algo cada vez mais
malvisto. (BAUMAN, 2005 p. 35)

Identificar: para incluir ou marginalizar. Marginalizar e


depois incluir. Mas incluir a quem? A cultura, para Hennigen
(2006), sustenta-se em práticas discursivas de significação –
significar algo, alguém –, as quais constituem o social. E os
conceitos de normalidade e anormalidade circulam na socie-
Capítulo 9    A (Re)Construção da Identidade: Visibilidade...    171

dade nos distintos espaços institucionais, inclusive nas mídias.


Esses discursos exercem poder sobre a identidade dos sujeitos.

Romper as amarras discursivas sobre as minorias – o que


significamos como menor – é o sustentáculo da Pedagogia So-
cial: trazer para a margem não apenas os discursos perdidos e
abafados, mas os sujeitos por trás dos discursos – sujeitos de-
sejantes de se colocar no mundo de forma política e cultural!

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Atividades

1) Responda as questões abaixo com V para Verdadeiro e F


para Falso:

( ) A cultura predominante, considerada como normal,


torna-se modelo. Dessa maneira, para ser olhado
como normal, o sujeito deve se construir nos padrões
da cultura prevalecente. O que não se constituir dessa
forma será considerado minoria.
174   Pedagogia Social

( ) Dar-se conta de que existem diferenças e de que essas


devem ser respeitadas é indispensável para a constru-
ção de uma sociedade que valorize e aceite as múlti-
plas culturas

( ) Não existe o conceito de minoria em nossa sociedade


após a criação de políticas afirmativas no Brasil.

2) Construa um texto entre 15 e 20 linhas que problematize,


teoricamente, a seguinte questão: quais as interfaces pre-
sentes na construção da identidade do sujeito? Explique.

3) Considere as afirmativas a seguir e assinale a alternativa


correta:

I. Considerar as identidades como plurais é uma das ca-


racterísticas do Multiculturalismo.

II. Na cultura, estão presentes conhecimentos, crenças,


moral, legislações, costumes, preceitos religiosos, en-
tre outros, aprendidos pelo sujeito em sociedade.

III. A sociedade não constrói os conceitos de normalidade


e anormalidade; esses são construídos de forma indi-
vidual.

a) Somente as afirmativas I e II estão corretas.

b) Somente as afirmativas II e III estão corretas.

c) Somente a alternativa II está correta.

d) Somente a alternativa III está correta.

e) Todas as afirmativas estão corretas.


Capítulo 9    A (Re)Construção da Identidade: Visibilidade...    175

4) Responda as questões abaixo com V para Verdadeiro e F


para Falso:

( ) A cultura ocorre por transmissão genética, social e cul-


tural.

( ) O sujeito é o efeito do meio cultural no qual foi so-


cializado, fruto de um longo sistema acumulativo, que
contempla o conhecimento e a experiência adquiridas
pelas gerações anteriores.

( ) Não existe uma ligação direta entre representação,


cultura e linguagem.

5) Considere as afirmativas a seguir e assinale a alternativa


correta:

I. As identidades estão em constante processo de estru-


turação, assim, não são fixas, inalteradas.

II. Para Hall, a identidade é sempre vista da perspectiva


do outro.

III. As identidades, para Hall, só podem ser percebidas no


que têm a dizer – sobre si e o outro, na relação com o
outro.

a) Somente as afirmativas I e II estão corretas.

b) Somente as afirmativas II e III estão corretas.

c) Somente a alternativa II está correta.

d) Somente a alternativa III está correta.

e) Todas as afirmativas estão corretas.


176   Pedagogia Social

Gabarito
1) V, V, F.

2) Uma das seguintes palavras-chave deve fazer parte da res-


posta: aspectos cultural, social, político, econômico. Signi-
ficados de normalidade e anormalidade.

3) a

4) F, V, F

5) e
Laíno Alberto Schneider1

Capítulo 10

A Cultura da
Aprendizagem: a Vida1

1 Laíno Alberto Schneider – formação acadêmica em Filosofia e Antropologia.


Formado em Filosofia pela FAFIMC, em 1987. Pós-graduado em 1991, como mes-
tre em Antropologia Filosófica pela PUCRS. Doutor em Filosofia pela UPS (Sala-
manca – Espanha). Doutorado em Filosofia no ano de 2000 e o reconhecimento
pela UFRGS em 2006, como Doutor em Antropologia Social. Educador e pesquisa-
dor da ULBRA desde 1991.  Coordenador geral da Educação a Distância da Ulbra
nos anos de 2009 e 2010 e coordenador em 2011 do Programa Permanente de
Acessibilidade da ULBRA. Líder do Grupo de Pesquisa Educação Social e Transver-
salidade. As linhas de pesquisas são acessibilidade, movimentos sociais, formado-
res e educação social, com o desenvolvimento de pesquisas sobre o processo de
aprendizagem na educação a distância e o educador social.
178   Pedagogia Social

Introdução

No presente capítulo A cultura da aprendizagem: a vida, que


faz parte do livro da Pedagogia Social, iremos nos deparar
com a questão da aprendizagem. É importante frisar que a
aprendizagem não é compreendida nesse capítulo como ofí-
cio, e sim como processo de compreensão e relação com
os processos vitais do existir pessoal e social. É dentro dessa
perspectiva que, primeiramente, iremos nos defrontar com a
questão: o que é aprendizagem e o que significa e demonstra
que realmente aprendemos? Posteriormente, será destacado o
que é cultura da aprendizagem, ou seja, o que culturalmente
as convenções sociais julgam fundamentais que se aprenda.
Além disso, também iremos trabalhar o conceito de cultura.
Após essa definição e compreensão, será desenvolvida uma
reflexão sobre o que é a vida, quais os seus significados e valo-
res. Na parte final do capítulo, destacaremos a aprendizagem
como um exercício social. Será que, coletivamente, estamos
cônscios dos processos que são ensinados?

Convido-o (a) para, juntos, desenvolvermos e dialogar-


mos sobre a cultura da aprendizagem. Afinal de contas, o que
aprendemos sobre o existir?

10.1 O que é a aprendizagem

Um dos aspectos centrais na convivência social é nos darmos


conta de como acontece e onde acontece a aprendizagem,
pois infelizmente ainda se pensa, no espaço educacional, que
Capítulo 10    A Cultura da Aprendizagem: a Vida    179

a aprendizagem é algo que acontece quase que exclusivamen-


te no espaço escolar. Chamamos a atenção de que não é essa
a concepção que será destacada no decorrer do capítulo, pois
se entende que a aprendizagem é um processo que acontece
em todos os espaços, sejam pessoais, sociais ou coletivos. A
aprendizagem é um processo sobretudo constante e contínuo.
Não existe lugar ou espaço em que a aprendizagem não se
desenvolve. O que existe, por vezes, são desatenções com os
ambientes no qual se está inserido, e mais, a aprendizagem é
todo processo de necessidades que são e foram desenvolvidos
para o desenvolvimento de habilidades e competências.

A aprendizagem corresponde ao entendimento que se de-


senvolve ou se desenvolveu com o processo de ensinagem,
pois o ofício do ensino é somente uma demonstração do que
é feito para se alcançar determinadas metas e objetivos. Só
que esse processo, que pode ser suficiente para uma pessoa
ou outra, geralmente, é insuficiente para significar que algo
se aprendeu no processo. O ensino e precisa ser o ponto de
partida e não de chegada.

Vivamos nosso educar de modo que a criança aprenda


a aceitar-se e a respeitar-se, ao ser aceita e respeitada
em seu ser, porque assim aprenderá a aceitar e a respei-
tar os outros. Para fazer isso, devemos reconhecer que
não somos de nenhum modo transcendentes, mas somos
num devir, num contínuo sem variável ou estável, mas
que não é absoluto nem necessariamente para sempre.
(MATURANA, 1998, 30)

É nesse sentido que os espaços sociais e culturais precisam


ser mais acolhedores e investigativos no entendimento do por-
180   Pedagogia Social

quê de algumas ações serem processadas e muito menos ava-


liativas com o que foi ensinado, pois assim teremos uma socie-
dade que se repete, e não uma sociedade de transformação.

A aprendizagem é o processo mágico a partir do qual o su-


jeito conta a sua história. Em cada processo de aprendizagem
(ou não) podemos e deveríamos fazer a pergunta: por que a
aprendizagem aconteceu ou não? Pois é nesse momento que
a Pedagogia Social instala a semente das possibilidades. São
dessas possibilidades que se criam as possibilidades de enten-
dimento do que realmente é significativo e importante para o
sujeito ou a sociedade.

Muitos são os ensinamentos e, geralmente, pouquíssimas


são as aprendizagens. A aprendizagem é, dentro dessa pers-
pectiva, o ensinamento que deixou na sua marca a memória
do que é fundamental e que, por si só, conta o que de signifi-
cativo aconteceu neste espaço sociocultural.

É na aprendizagem que o sujeito ou a sociedade se prende,


para aí construir o seu porto seguro.

Para que uma criança possa aprender, os adultos devem


proporciona-lhe um espaço onde também ele descubra
que tem algo para ensinar aos outros, sejam adultos ou
crianças. (FERNANDEZ, 2001, p. 102)

Esse é o grande desafio da aprendizagem, ou seja, possi-


bilitar o espaço que o outro possa descobrir ou redesenhar a
aprendizagem a partir da sua perspectiva. É usual e comum
que a aprendizagem assuma um caráter, na maioria das vezes,
de objetividade, e não de subjetividade. Esse fato confere não
Capítulo 10    A Cultura da Aprendizagem: a Vida    181

uma aprendizagem, mas, sim, o ensinamento de um percurso


desenvolvido por outros anteriormente.

A possibilidade da existência de um espaço de descobri-


mento e de aprendizagem genuína faz com que a aprendiza-
gem redefina o seu valor e a sua relevância. É diante dessa
perspectiva que a Pedagogia Social precisa mergulhar na sub-
jetividade do existir do sujeito e da sociedade para compre-
ender o que é fundamental e essencial dentro desse espaço.
Uma crítica que comumente se processa no desenvolvimento
das aprendizagens é de que a sociedade, por meio da sua
cultura, desenvolve um modelo altamente autoritário para es-
tabelecer um modelo já existente. É no mergulho da subjeti-
vidade, tanto da sociedade quanto do sujeito, que as lições
da aprendizagem adquirem realmente os significados de uma
trajetória. Contar e recontar essa trajetória ou memória é o
ofício que a Pedagogia Social precisa seguir. Aprender que a
trajetória feita por um sujeito não significa contar a trajetória
dos demais integrantes desse espaço social.

Um dos principais papéis reservados à educação consis-


te, antes de mais, em adotar a humanidade da capacida-
de de dominar o seu próprio desenvolvimento. Ela deve,
de fato, fazer com que cada um tome o seu destino nas
mãos e contribua para o progresso da sociedade em que
vive, baseando o desenvolvimento na participação res-
ponsável dos indivíduos e das comunidades. (DELORS,
2006, P. 82)

A eternidade é o eco da memória. É dessa forma que a


humanidade, além de assumir a capacidade de dominar o
182   Pedagogia Social

seu desenvolvimento, elabora e mantém, no seu presente, o


legado produzido e construído pelas gerações. Assim como
cada geração enfrentou suas dificuldades produzindo a partir
delas, os fatores básicos de sobrevivência estão na valorização
desses fatores que elas reinventam.

É diante das descobertas que os atores sociais fazem que


construímos, ou começamos a construir, o legado da cultura
da aprendizagem.

10.2 O que é a cultura da aprendizagem

Mergulhar na cultura da aprendizagem é sermos capazes de


contar e recontar a trajetória individual e social de um deter-
minado cenário e contexto. É dentro dessa perspectiva que é
fundamental que se entenda o que é cultura, pois é aí que se
aprende a cultuar o que individual e socialmente é relevante.

Ao se deparar com a pergunta: “o que é cultura?”, ou ain-


da, “o que é a cultura da aprendizagem?”, qual é a primeira
possibilidade de resposta que surge? Aprender a contar esse
momento é fundamental para que se possa compreender os
significados e modelos de aprendizagem. É nesse sentido que
começamos a definir, de forma genérica, o que usualmente o
conceito de cultura deixou como legado.

Primeiramente, é fundamental que seja compreendido que


o ser humano é o resultado do seu meio cultural, isto é, con-
forme o próprio pensador Ortega y Gasset, “eu sou eu e as
minhas circunstâncias”. Portanto, é decisiva a compreensão
Capítulo 10    A Cultura da Aprendizagem: a Vida    183

do processo de socialização para que sejamos capazes de en-


tender quem é o sujeito ou qual é a sociedade na qual se
está inserido, visto que a cultura é o elemento que possibilita
a adaptação do sujeito à sociedade dentro do seu tempo e
espaço. Em síntese, a cultura é o resultado das invenções dos
modelos sociais que os atores, dentro de um espaço e tempo,
utilizam para apresentar a sua perspectiva.

Por cultura, entende-se toda a forma consistente que a so-


ciedade encontrou para integrar e contar os diversos fatos da
sua memória. É na cultura da aprendizagem que usualmente,
nos processos de objetivação, os modelos socioculturais são
repassados. É nesse momento que a cultura passa a ser um
modelo altamente cruel com quem está buscando desenhar ou
redesenhar a sua história.

Se, por um lado, a cultura é o resultado da construção


que determinado grupo social encontrou para justificar os seus
modelos, é importante frisar a importância da vigilância desses
modelos não serem perpetuados, pois é da característica da
cultura não acolher com facilidade as mudanças.

Todos os conceitos e afirmações sobre os quais não te-


mos refletido, e que aceitamos como se significassem
algo simplesmente porque parece que todo mundo se
entende são antolhos. (MATURANA, 1998, P. 15)

Muitos são os fatores e aspectos que não são produzidos


pela reflexão, e sim construções processadas socialmente de
tal forma que os processos de aprendizagem desenvolvidos,
no aspecto social, construíram-se muito mais pela constância
e perspectiva de socialização do que por toda uma reflexão e
184   Pedagogia Social

um questionamento. Mesmo que o seu processo de aprendi-


zagem tenha se originado a partir dessa produção coletiva, é
fundamental que se busquem os motivos e as fundamentações
do porquê desses fatores terem se processado dessa forma.
É na cultura da aprendizagem que estas lições precisam ser
ensinadas e compreendidas.

Outro aspecto importante que merece ser destacado para


a compreensão do conceito de cultura é a diferença entre a
cultura material e imaterial. É do ofício conceitual desse en-
tendimento que a cultura vai apresentando a sua memória,
ou seja, a cultura material é toda construção tangível palpável
que determinado sujeito e/ou sociedade encontra para obje-
tivar as relações, a cultura material é representada por toda a
solidificação de aspectos que podem ser observados de forma
concreta e, por isso, são a representação do elemento objetivo
da memória desses atores. São os objetos que materializam
e objetivam o tempo e o espaço em que as coisas se proces-
saram de determinada forma. A cultura material sempre é o
resultado ou produto final desse percurso, ou seja, o livro, de
forma material, conta e apresenta o objeto de uma determina-
da época/espaço, mas o que fez com que surgisse este objeto
é o que realmente representam as consistências e lições deste
livro. O livro em si não conta a memória e a trajetória, pois
ele é o resultado da cultura imaterial. É nesse sentido que a
cultura imaterial essencialmente é caracterizada pela sua sub-
jetividade. Se, por um lado, o objeto encontrado, no caso o
livro, é material e, como tal, objetivo, por outro, o que confere
importância e significado a esse mesmo livro é o que confere a
esse objeto a possibilidade de contar a sua memória.
Capítulo 10    A Cultura da Aprendizagem: a Vida    185

(...). Toda a teoria da educação é uma dimensão parce-


lar de alguns sistemas motivados de símbolos e de signi-
ficados de uma dada cultura, ou do lugar social de um
entrecruzamento de culturas. Assim também, qualquer
estrutura intencional e agenciada de educação constitui
uma entre outras modalidades de articulação de proces-
sos de realização (...). (BRANDÃO, 2002, p. 139)

O que faz algo ser preservado, digno de credibilidade, de


valores e conhecimentos solidifica no objeto a aprendizagem
de uma sociedade naquele tempo e espaço. É a cultura mate-
rial a qual se investiga o que deu origem e significado àquele
produto, isto é, são os atos, as ações e o comportamento que
objetivam a memória da subjetividade da cultura sociocultural
da aprendizagem.

Evidente que, no seu ponto de partida, a sociedade come-


çou a se organizar com as representações mais naturais pos-
síveis, o que por sua vez, dentro da cultura da aprendizagem,
adquire a simbologia da repetição ou da ampliação do que a
natureza assim apresentava. Com o passar do tempo e a ne-
cessidade de inovações e recriações, as pessoas e a sociedade
sentiram a necessidade de mudanças e transformações, pois
se aprendeu com o tempo e com o próprio ensino da natureza
que a repetição e a permanência dos mesmos conceitos e mo-
delos representam e legitimam a permanência do status quo
do que já aí estava estabelecido. É nesse momento que a cul-
tura imaterial refaz e reconta a memória das transformações.

É preciso ter a coragem de pensar em escala planetá-


ria, de romper com os modelos tradicionais e mergulhar,
decididamente, no desconhecido. Devem mobilizar-se
186   Pedagogia Social

todos os recursos internos e externos para construir um


mundo novo baseado na solidariedade e não na destrui-
ção mútua. (DELORS, 2006, p. 244)

É na cultura da aprendizagem que acontece a fusão entre


o antigo e o novo. É na cultura material que o elemento novo
apresentado pelas descobertas e redefinições que a cultura
imaterial encontra a sua materialização. Assim como cada su-
jeito vai definindo e redefinindo a sua caminhada, a cultura da
aprendizagem precisa ser um processo constante de vigilância
e atenção com as novas necessidades socioculturais que se
apresentam. Assim como nos modelos socioculturais de an-
tigamente o ser humano conseguia sobreviver aproveitando
os alimentos que a natureza apresentava, o mesmo aprendeu
com a necessidade criar novas possibilidades para a sobrevi-
vência. É por isso que a fusão e a relação constante entre a
cultura material e imaterial vão recontando e reconstruindo o
caminho da jornada sociocultural, tanto do sujeito como da
sociedade.

É na cultura da aprendizagem que os elos de encontro e


desencontro entre o novo e o antigo precisam ser reproces-
sados. A cultura, nesse sentido, é o elemento que possibilita
o jogo da relação entre o individual e o coletivo. É a cultura
o abrigo e o desenvolvimento do social, visto que é por meio
dos símbolos, conhecimentos, crenças, valores e normas que
a sociedade vai se organizando e planejando na aproximação
dos sujeitos atores na coletividade. Assim como a natureza se
apresenta e, com o passar do tempo, assume novas caracte-
rísticas e formas, a cultura vai abrigando e definindo a rela-
ção do que se é e pode ser. É dentro dessa perspectiva que a
Capítulo 10    A Cultura da Aprendizagem: a Vida    187

cultura da aprendizagem auxilia e determina o que, naquele


espaço e tempo, a organização social convenciona e julga ser
predominante.

É na cultura da aprendizagem que são buscadas e defini-


das as vias de sobrevivência. Portanto, a aprendizagem requer
uma convenção sociocultural para definir ou redefinir os mar-
cos aí necessários e fundamentais.

10.3 O que é a vida

A memória da cultura da aprendizagem é demarcada por ex-


periências por vezes positivas e outras negativas, pois é a vida
que nos ensina e apresenta o que se é capaz de aplaudir e jul-
gar ter sido algo altamente positivo. Com o passar do tempo,
notamos que esta não foi o legado deixado para a aprendi-
zagem da vida, porque é a cultura da aprendizagem que, aos
poucos, vai nos auxiliando e nos demonstrando que a vida é
um constante desabrochar e desvelamento do que o fato de
estar vivo nos apresenta.

Estas construções históricas e cotidianas da cultura são:


saberes, valores, códigos e gramáticas de relacionamen-
tos entre as diferentes categorias de atores culturais. São
também as várias espécies duradouras ou transitórias de
metodologias de ações motivadas, assim como as práti-
cas instrumentais de algum trabalho destinado a lograr
determinados objetivos. (...). Relacionados à necessidade
e à nossa capacidade de lidarmos com o nosso mundo
188   Pedagogia Social

natural adaptando-o criativamente ao home (...). (BRAN-


DÃO, 2002, 139-0)

A vida é o maior espetáculo de um ser vivo. O fascínio e


o esplendor que o mesmo apresenta na sua infância, ado-
lescência, juventude, velhice, nos apresentam as suas pecu-
liaridades e fundamentos desse contexto e período. A vida é,
em essência, o processo de harmonização do esplendor da
individualidade. É da característica da vida a sua unicidade,
a impossibilidade de transferência a outros. A vida é, assim, a
confirmação e a possibilidade de a subjetividade se apresen-
tar na sua objetividade. É a vida como ponto da objetividade
que a cultura da aprendizagem nos apresenta, mas é na sua
objetivação da subjetividade que a mesma encontra eco na
confirmação das possibilidades da sua existência. Assim como
o sujeito não nasce pronto, a vida é necessariamente um des-
velamento que vai se apresentando no palco e nos horizontes
do oceano.

É em função disso que cada etapa e momento são a con-


formação e a construção da possibilidade e da existência da
continuidade.

A escritora e profissional da saúde Elisabeth Kübler-Ross,


na sua andança e vivência nos estudos com doentes termi-
nais, aprendeu que muitas pessoas existiram, mas nunca vi-
veram. Esse é um dos ensinamentos que precisamos aprender
na complexidade e cultura de massificação de hoje. Estar vivo
está muito longe de significar realização, mas é o fato de se
estar vivo que possibilita se desenvolverem novas possibilida-
des para, com isso, podermos construir algo que edifique a
existência dessa vida.
Capítulo 10    A Cultura da Aprendizagem: a Vida    189

Na carta-testamento do chefe Seatle, de 1854, apresenta-


da na ONU, pode-se perceber a preocupação já de outrora
com a questão da sustentabilidade e da interferência que o ser
humano faz no sistema planetário.

Isto sabemos: a terra não pertence ao homem, o homem


pertence à terra. Isto sabemos: todas as coisa estão liga-
das como o sangue que une a família. Há uma ligação
em tudo.

O que ocorrer com a terra recairá sobre os filhos da


terra. O homem não tramou o tecido da vida; ele é sim-
plesmente um de seus fios. Tudo o que fazer ao tecido,
fará a si mesmo.

Mesmo o homem branco cujo Deus caminha e fala como


ele de amigo para amigo, não pode estar isento do des-
tino comum. É possível que sejamos irmãos, apesar de
tudo. Veremos. De uma coisa estamos certos e o homem
branco poderá vir a descobrir um dia: nosso Deus é o
mesmo Deus. Ele é o Deus do homem, e Sua compaixão
é igual para o homem vermelho e para o homem bran-
co. A terra lhe é preciosa, e feri-la é desprezar seu cria-
dor. Os brancos também passarão; talvez mais cedo que
todas as tribos. Contaminem suas camas, e uma noite
serão sufocados pelos próprios dejetos.

Mas quando de sua desaparição, vocês brilharão inten-


samente, iluminados pela força do Deus que os trouxe a
esta terra e por alguma razão especial lhes deu o domí-
nio sobre o homem vermelho. Esse destino é um mistério
para nós, pois não compreendemos que todos os búfalos
190   Pedagogia Social

sejam exterminados, os cavalos sejam todos domados,


os recantos secretos da floresta densa impregnadas do
cheiro de muitos homens, e a visão dos morros obstruí-
dos por fios que falam. Onde está o arvoredo? Desapa-
receu. Onde está a águia?

Desapareceu. É o final da vida e o início da sobrevivên-


cia.

Somos o que vivemos e não se vive o que se é, pois os


determinismos culturais e sociais exercem e predominam na
construção da história dos sujeitos. É em função disso que a
Pedagogia Social que precisa ser e fazer parte da cultura da
aprendizagem da formação dos sujeitos dentro da socieda-
de. Muitas lições que, geralmente, pelas suas inexperiências
pessoais, só demonstram a sua importância e significado em
situações futuras. É da essência da vida compreendermos de
que as descobertas e os desvelamentos são produzidos por
intermédio dos descobrimentos que a existência pessoal vai
apresentando.

A tarefa que a Pedagogia Social nos oferece é de que


essa é a grande redefinição que o espaço educacional pre-
cisa apresentar para inserir nos conteúdos teóricos a vivência
e experiência da prática que nos é ensinada e que, em sua
essência, precisa ser aprendida na vida. É nesse sentido que
é urgente que os espaços educacionais se deem conta de que
a vida requer uma cultura da aprendizagem, pois as coisas
não acontecem por acaso e nem só por necessidade, mas é
preciso que saibamos aprender a aproveitar os diversos mo-
mentos que os processos estéticos da vida humana nos apre-
senta. Com o espírito e a cultura da massificação, geralmente,
Capítulo 10    A Cultura da Aprendizagem: a Vida    191

a essência do existir e da vida, além de serem apresentadas


de forma fragmentada, são recontadas pelos seus momentos
desvinculados de sentido e significado.

A vida é, por essência, a possibilidade de definições e re-


definições dos sentidos e significados das escolhas que são
feitas. Por isso que a vida é um constante movimento de possi-
bilidade. A vida não é algo estático, e sim dinâmico. É essa a
lição fundamental que a cultura nos apresenta, ou seja, só nos
conservamos em transformação. Se a vida é o resumo do que
se foi e do que se é e do que se poderá ser, a mesma relação
precisa ser feita com a vida.

10.4 Aprendizagem como exercício social

Assim como a vida é um processo, um exercício de entendi-


mento que não pode ser transferido, a aprendizagem sociocul-
tural só pode ser entendida como exercício social e coletivo.
Não basta uma pessoa reconhecer a importância da aprendi-
zagem da vida, pois, de uma forma ou de outra, cada sujeito
perpassa pelas mesmas angústias e necessidades de confirma-
ção. Assim como se aprende de que o sujeito não é uma ilha
e que nada adquire sentido e significado isoladamente, é o
exercício social que na sua definição pode ser denominado de
cidadania que se constrói uma cultura da alteridade.

O processo vital que, no seu início, apresenta como ponto


de partida a individualidade, com o passar do tempo precisa
se aprender que é na socialização e no compartilhamento que
192   Pedagogia Social

se superam os interesses individualistas para se construir uma


possibilidade de existência em comunidade.

Se, por um lado, a vida humana é algo individual, única e


intransferível, por sua vez, é na confirmação da superação dos
interesses pessoais e egocêntricos que se cria uma sociedade
livre, fraterna e compromissada com um mundo mais amplo
e melhor.

O trabalho de transformar e significar o mundo é o mes-


mo que transforma e significa o homem: é uma prática
coletiva. É uma ação socialmente necessária e motivada
e apropria sociedade em que o homem se converte para
ser humano é parte da cultura, no sentido mais amplo
que é possível atribuir a esta palavra. (...). A construção
social da consciência realiza-se através do trabalho, que,
por sua vez, resulta da possibilidade de comunicação en-
tre as consciências, ao ser realizado coletivamente e ao
ser coletivamente significado. (BRANDÃO, 2002, p. 40)

O ser humano é, por sua definição, um ser social por na-


tureza e por cultura. Logo, é a soma dos sujeitos ou das par-
ticularidades que vão definindo e caracterizando os modelos
socioculturais. A existência de um modelo social indiferente
e descompromisso um com o outro somente demonstra que
estamos vivendo uma cultura da aprendizagem do individua-
lismo e, como tal, se está distante de se construir e elaborar um
exercício social da convivência. Somente superamos as frag-
mentações e os individualismos a partir do momento em que
se pensa e, na prática, demonstramos uma cooperação e um
exercício de superação dos interesses e vaidades pessoais.
Capítulo 10    A Cultura da Aprendizagem: a Vida    193

Ser o sujeito da história e ser o agente criador da cul-


tura não são adjetivos qualificadores do homem. São o
seu substantivo. Mas não são igualmente a sua essência
e, sim, um momento do seu próprio processo dialético.
(BRANDÃO, 2002, p. 41)

São nos pequenos exercícios de inserção social que o


exercício do social vai encontrando os seus ecos e seus com-
partilhamentos. A aprendizagem como exercício social é um
processo indispensável para a formação de um espírito social
e coletivo. São inúmeras as oportunidades em que as ações
processadas apresentam possibilidades e deveriam ser utiliza-
das como momento de aprendizagem, pois pequenas corre-
ções implicam, com o passar do tempo, grandes correções e
ajustes de postura. Os pequenos milagres da prática coletiva
são construídos, ou precisam ser, a partir de ações individuais,
porque é aí que se tem a oportunidade do processo propedêu-
tico, isto é, da formação de um espírito coletivo.

É urgente que a sociedade se dê conta de que é necessária


a reflexão sobre as consequências do que se faz ou se deixa
de fazer. É do exercício social que são superados os interes-
ses individualistas. Não é um processo fácil de processar esse
tipo de postura, mas é altamente pedagógico e necessário que
essa metodologia seja implantada.

Exemplificando, algo que demonstra a desconexão ou des-


compromisso com o outro pode ser observado em um simples
exercício que alguém faz por meio do deslocamento de um
automóvel. É frequente, para não se afirmar comum, verifi-
car pessoas nesse deslocamento jogarem objetos em qualquer
espaço, sem, contudo, se dar conta ou passar por momentos
194   Pedagogia Social

de constrangimento. O simples ato em si já demonstra que o


exercício do social não existe, pois não encontra eco na pre-
ocupação com o outro e com as consequências do ato em si.
E muitas vezes, se inquerido, é capaz de protestar ou se sentir
ofendido com qualquer observação. Agora, se no momento
em que o ato foi feito e alguém faz a observação e a pessoa
recebe essa observação como algo que seja capaz de melho-
rar a sua condição de pessoa e de postura social, temos aí
uma bela demonstração de exercício de convivência construti-
va dos processos sociais.

Reconectar-se com a teia da vida significa construir, nutrir


e educar comunidades sustentáveis, nas quais podemos
satisfazer nossas aspirações e nossas necessidades sem
diminuir as chances das gerações futuras. (...)

[...]. Todos os membros de uma comunidade ecológica


estão interligados numa vasta e intrincada rede de rela-
ções, a teia da vida. (CAPRA, 2006, p. 231)

Por isso o exercício da vida social é o resultado da constru-


ção que a sociedade estabelece no seu espaço. É notório e de
fácil compreensão de que algo, para ser virtuoso, exige renún-
cia e aprimoramento e que, por sua vez, o vício simplesmente
é um ato expresso a partir de uma vontade exclusivamente
impulsiva.
Capítulo 10    A Cultura da Aprendizagem: a Vida    195

Recapitulando

Assim como no apelo feito pelo líder da tribo de Seatle, po-


demos nos questionar sobre o legado que estamos deixando
para as futuras gerações. Da mesma forma que a cultura da
aprendizagem nos ensina que a vida é o que se tem de mais
precioso na face da terra, é fundamental que se repense a
forma como a sociedade constrói a sua sobrevivência. Como
outrora algumas espécies foram dizimadas pelo afã de con-
quistas ou necessidade de sobrevivência, podemos nos ques-
tionar a que preço estamos conquistando e mantendo a vida
no sistema econômico atualmente vigente.

Será que a expansão de conquista e o preço a ser pago


pelas futuras gerações justificam as ações que hoje desenvol-
vemos? Esta está entre as questões que foram elencadas no
decorrer do capítulo e que certamente necessitarão que a cul-
tura da aprendizagem repense o significado e a importância
da vida não somente do homem, mas de todo o ecossistema.

Referências

BRANDÃO, Carlos Rodrigues. A educação como cultura.


Campinas, São Paulo: Mercado de Letras, 2002.

CAPRA, Fritjof. A teia da vida: uma nova compreensão cientí-


fica dos sistemas vivos. São Paulo: Cultrix, 2006.

DELORS, Jacques. Educação: um tesouro a ser descoberto.


Relatório para a UNESCO da comissão internacional
196   Pedagogia Social

sobre educação para o século XIX. 10. edição. São Pau-


lo: Cortez; Brasilia, DF: MEC: UNESCO, 2006.

FERNÁNDEZ, Alícia. Os idiomas do aprendente: análise de


modalidades ensinantes com famílias, escolas e meios de
comunicação. Porto Alegre: ArtMed, 201

MATURANA, Humberto. Emoções e linguagem na educa-


ção e na política. Belo Horizonte: UFMG, 1998.

PIERCE, Franklin. Carta do chefe Seatle. Disponível em:


<http://www.dhnet.org.br/desejos/sonhos/seatle.htm>.
Acesso em: 27 fev. 2015.

Atividades

1) Qual é, segundo o Capítulo 10, um dos aspectos cen-


trais na convivência social?

a) Um dos aspectos centrais na convivência social é nos


darmos conta de como acontece e onde acontece a
aprendizagem.

b) Um dos aspectos centrais na convivência social é nos


darmos conta de como acontece a avaliação.

c) Um dos aspectos centrais na convivência social é a


aprendizagem.

d) Um dos aspectos centrais na convivência social é nos


darmos conta da história social.
Capítulo 10    A Cultura da Aprendizagem: a Vida    197

e) Um dos aspectos centrais na convivência social é nos


darmos conta de como acontecem as conversas entre
os atores educacionais.

2) Segundo Alícia Fernandez, para que uma criança possa


aprender, os adultos devem lhe proporcionar um espa-
ço onde ele também descubra que tem algo:

a) Para aprender com o educador.

b) Para aprender a ouvir o outro.

c) Para ensinar aos outros, sejam adultos ou crianças.

d) Para ensinar a si mesma as regras impostas na escola.

e) Para ensinar aos outros de suas individualidade.

3) Onde acontece a fusão entre o antigo e o novo?

a) Na cultura da escuta.

b) Na cultura da aceitação.

c) Na cultura da aprendizagem.

d) Na cultura do outro.

e) Na cultura individualista.

4) Segundo o Capítulo 10, é urgente que os espaços edu-


cacionais se deem conta de que a vida requer uma
cultura:

a) Da aprendizagem

b) Do amor
198   Pedagogia Social

c) De redefinições

d) De individualidades

e) Da avaliação

5) Segundo F. Capra, todos os membros de uma comu-


nidade ecológica estão interligados em uma vasta e
intrincada rede de relações. Esta rede é a:

a) Teia de informações.

b) Maturação do conhecimento.

c) Maneira de reformular a vida.

d) Forma de aceitação do que foi definido historicamente.

e) Teia da vida.

Gabarito
1) a  2) c  3) c  4) a  5) e

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