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Meteorologia
Pressão Atmosférica e Ventos
Rita Yuri Ynoue
Michelle S. Reboita
Tércio Ambrizzi
Gyrlene A. M. da Silva
Nathalie T. Boiaski

6.1 Introdução
6.2 Pressão Atmosférica
6.2.1 Ajuste da Pressão ao Nível Médio do Mar (PNMM)
6.2.2 A Equação do Estado
6.2.3 Variação Vertical e Horizontal da Pressão
6.3 Ventos
6.3.1 Direção e Velocidade do vento
6.4 Forças que Influenciam os Ventos
6.4.1 As Leis do Movimento de Newton
6.4.2 Força do Gradiente de Pressão
6.4.3 A Força de Coriolis
6.5 Ventos acima da Camada de Atrito
6.5.1 Vento Geostrófico
6.5.2 Vento Gradiente
6.6 Ventos em superfície
6.6.1 Força de Atrito
6.7 Movimento Vertical
Referências

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Licenciatura em Ciências · USP/Univesp · Módulo 2 97

6.1 Introdução
Este texto aborda a pressão atmosférica e como esta grandeza varia verticalmente e hori-
zontalmente. Veremos também como surgem os ventos, as forças que originam e interferem
nas condições de vento na superfície e em altitude, assim como os movimentos verticais na
atmosfera. Estes, por sua vez, são responsáveis pela formação de diferentes sistemas atmosféricos
que serão discutidos no texto Sistemas Atmosféricos.

6.2 Pressão Atmosférica


A pressão atmosférica é, simplesmente, a pressão exercida pelo peso da coluna d ar sobre uma
dada superfície.. Fisicamente, representa o peso que a atmosfera exerce por unidade de área. Como a
força gravitacional (força exercida pela Terra sobre um corpo) favorece uma maior concentração das
moléculas de ar em direção à superfície terrestre, a atmosfera será mais densa próximo a ela Figura 6.1).

Neste ponto, é importante recordar o conceito de densidade, que é a medida


do grau de concentração de massa num determinado volume.

Observando-se a Figura 6.1, nota-se que, se fossem realizados


cortes horizontais nela, mais moléculas seriam encontradas sobre o
corte mais próximo da superfície (maior densidade) e menos sobre o
corte em maior altitude (menor densidade).
Para medir a pressão atmosférica, os meteorologistas usam
a unidade de força chamada Newton, que corresponde à força
necessária para acelerar um quilograma de massa em um metro por
segundo ao quadrado, N = kg m s-2. Ao Nível Médio do Mar
(NMM), a atmosfera exerce uma força de 101.325 Newtons por
metro quadrado. Para simplificar esse número, o National Weather Figura 6.1: Concentração das moléculas
de ar em direção à superfície terrestre. /
Service dos Estados Unidos adotou o milibar (mb), que é igual a Fonte: adaptado de Aguado; Burt, 2010.

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100 Newtons por metro quadrado. Assim, a Pressão ao Nível Médio do Mar (PNMM) tem o
valor de 1.013,25 milibares.A Organização Meteorológica Mundial (OMM) recomenda o uso
do milibar e o adota como unidade internacional no intercâmbio de informações meteorológicas.

No sistema internacional (SI) de unidades a unidade-padrão da pressão no sistema


internacional (SI) de unidades é o Pascal (Pa), que corresponde a um Newton por
metro quadrado (N m-2). Nesta notação, uma atmosfera-padrão tem o valor de 101.325 Pa
(que corresponde a 1.013,25 hectopascais - hPa ou 101,325 quilopascais - kPa).

Em 1643, Evangelista Torricelli, um estudante do famoso cientista Galileu, inventou o


primeiro instrumento para medir a pressão atmosférica: o barômetro de mercúrio.Torricelli
descreveu a atmosfera como um vasto oceano de ar, que exerce pressão sobre a superfície
terrestre. Para medir essa força, ele usou um tubo de vidro totalmente preenchido de mercúrio.
Ao inverter o tubo, colocando-o num recipiente também com mercúrio, Torricelli observou
que o mercúrio deixava o tubo (fluía para o recipiente) até o
momento em que o peso da coluna de mercúrio estivesse
balanceado com a pressão exercida pelo ar acima sobre a
superfície do mercúrio; em outras palavras, até que o peso da
coluna de mercúrio se igualasse ao peso de uma coluna de ar
de igual diâmetro, que se estendia da superfície ao topo da
atmosfera.Torricelli notou que, quando a pressão do ar
aumentava, o mercúrio subia no tubo, e ocorria o contrário
quando a pressão diminuía (Figura 6.2). Portanto, o compri-
mento da coluna de mercúrio tornou-se uma medida da
pressão atmosférica. Com o passar do tempo, o barômetro de
Torricelli foi aprimorado e hoje, além de barômetros, também
existem os barógrafos. Uma descrição desses instrumentos Figura 6.2: Esquema ilustrativo do barômetro
de mercúrio de Torricelli. / Fonte: adaptado de
pode ser encontrada em Varejão-Silva (2006). Grimm, 2011.

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6.2.1 Ajuste da Pressão ao Nível Médio do Mar (PNMM)

Não é possível comparar diretamente os valores da pressão atmosférica coletados em locais


com diferentes altitudes na superfície do planeta, pois os valores da pressão das localidades mais
elevadas serão sempre menores do que os das demais. Isso ocorre porque, sobre as localidades
mais altas, a coluna atmosférica é menor e, portanto, o peso dessa coluna é menor (Figura 6.3).
Os valores de pressão medidos em superfícies com diferentes alturas são comparáveis quando
o efeito do relevo é eliminado. Para isso, aplica-se uma correção aos valores observados da
pressão atmosférica para que estes se ajustem a um dado nível de referência, em geral, o NMM.
Em locais com altitudes positivas, ou seja, acima do NMM, essa correção consiste em adicionar
certo incremento ao valor da pressão observada à superfície. Já, no caso de locais com altitudes
negativas (abaixo do NMM), a pressão observada seria diminuída como forma de compensar
a camada de ar que, teoricamente, deixaria de existir acima deles. A eliminação do efeito da
altitude não é trivial, pois é necessário estimar as propriedades físicas da atmosfera na camada
hipotética que separa uma determinada superfície do NMM.

Figura 6.3: Valores da pressão atmosférica em locais com diferentes altitudes. / Fonte: adaptado de Lutgens; Tarbuck, 2010.

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6.2.2 A Equação do Estado

A experiência diária das pessoas indica que os gases tendem a se expandir quando aquecidos
e a se tornar mais densos quando resfriados. Isso sugere que a temperatura, a densidade e
a pressão estejam relacionadas. Tal relação é descrita pela equação do estado apresentada no
item 5.2 do texto Estabilidade Atmosférica, Nuvens e Precipitação e reproduzida aqui:

p=rRT 6.1

onde p é a pressão (Pa); r, a densidade; T, a temperatura do ar (K) e R é uma constante igual a


287 Joules por quilograma por Kelvin (J Kg−1r−1).
Segundo a equação,
a. se a densidade do ar aumentar (isto é, se mais ar for adicionado a um elemento de
volume) enquanto a T é mantida constante, a pressão aumentará.
b. similarmente, em densidade constante, um aumento na temperatura implica um aumento
da pressão.
No caso (b), o aumento da pressão ocorre porque o aumento da temperatura é uma fonte
de energia para as moléculas de ar, que se tornam mais agitadas e acabam exercendo pressão
(imagine as moléculas de ar colidindo nas paredes da Figura 6.1; em outras palavras, elas estão
exercendo pressão). A discussão a seguir usa os conhecimentos da equação do estado.
Como a atmosfera é complexa, os cientistas criam modelos em que eliminam algumas das
suas complexidades a fim de entenderem os processos da natureza. Ahrens (2000) apresenta
um modelo para o entendimento da formação de regiões de alta e baixa pressão na atmosfera.
A Figura 6.4 mostra um modelo da atmosfera constituído por uma coluna de ar estendendo-se
para cima na atmosfera, com moléculas de ar representadas por pontos.
Nesse modelo, assume-se:
1. que as moléculas de ar não estejam mais concentradas na superfície e, portanto, a densi-
dade do ar permanece constante desde a superfície até o topo da coluna (ao fazer cortes
horizontais na Figura 6.4, o número de moléculas será igual em todos os cortes);
2. que a largura da coluna não varie.

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Vamos supor que, de alguma maneira, certa quantia de ar seja forçada a entrar na coluna
(Figura 6.4). Com isso, surge a questão: o que aconteceria com a coluna?
Se a temperatura na coluna não for modificada, a adição do ar tornaria a
coluna de ar mais densa implicando num aumento da pressão do ar na superfície.
Da mesma forma, se uma grande quantidade de ar fosse removida da coluna, a
pressão do ar na superfície diminuiria. Agora vamos considerar, para o modelo da
Figura 6.5, as mesmas suposições feitas para o modelo da Figura 6.4.
Figura 6.4: Modelo da atmosfera
onde a densidade do ar permanece
constante com a altura.

Figura 6.5: Esquema que mostra que é necessária uma coluna menor de ar frio para exercer a mesma pressão do que uma extensa
coluna de ar aquecido. / Fonte: Adaptado de AHRENS, 2000.

Imagine que as duas colunas de ar na Figura 6.5a estejam localizadas numa mesma altitude
e que possuam os mesmos valores de pressão à superfície. Essa condição indica que existe o
mesmo número de moléculas em cada coluna sobre ambas as cidades. Também considere que
a pressão do ar à superfície nas duas cidades permaneça a mesma, e que enquanto o ar sobre a
cidade 1 é resfriado e sobre a cidade 2 é aquecido (Figura 6.5b).
À medida que o ar na coluna 1 se resfria, as moléculas se movem mais devagar e se juntam
(nesse caso, o ar se torna mais denso). No ar mais aquecido, acima da cidade 2, as moléculas se
movem mais rapidamente e se afastam (nesse caso, o ar se torna menos denso). Como estamos
considerando que a largura das colunas não se altera e que há uma barreira invisível entre
elas, as moléculas de ar não podem entrar ou sair dessas colunas e, portanto, ambas as cidades

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permanecem com a mesma pressão à superfície. Entretanto, com o ar mais denso e frio sobre a
cidade 1, a coluna se contrai, enquanto que a coluna se expande ficando mais alta no ar menos
denso e mais quente da cidade 2. Assim, temos uma coluna de ar menor e mais fria sobre a
cidade 1 e uma coluna mais alta e mais quente sobre a cidade 2. Dessa situação surge um
conceito muito utilizado em Meteorologia: uma coluna menor de ar mais frio e denso exerce a
mesma pressão à superfície que uma coluna maior de ar mais quente e menos denso quando o
número de moléculas é igual em ambas. Desse conceito, também se pode deduzir que a pressão
atmosférica decresce mais rapidamente com a altura numa coluna de ar frio. Imagine que vamos
nos deslocar da superfície de cada coluna até uma determinada altura (indicada pelas letras A
e B na Figura 6.5 c). Nessa situação, vamos passar por um maior número de moléculas que
se encontram mais agrupadas na coluna 1 e por um menor número de moléculas na coluna 2,
já que essas estão mais distribuídas pela coluna. Assim, ao atingirmos a altura desejada veremos
que a pressão é menor nessa altura na coluna mais fria e maior na coluna mais quente. Observe
na Figura 6.5 c que existem mais moléculas de ar sobre a letra A na coluna mais quente
do que sobre a letra B na coluna mais fria. O fato do número de moléculas de ar sobre um
determinado nível ser um indicador da pressão atmosférica está associado a outro importante
conceito: ar quente em altitude, normalmente, está associado a altas pressões atmosféricas e ar
frio em altitude está associado a baixos valores de pressão atmosférica.
Note na Figura 6.5c que a diferença horizontal de temperatura entre as duas colunas nos
pontos A e B cria uma diferença horizontal de pressão. Essa diferença de pressão origina uma
força, chamada força do gradiente de pressão, que causa o movimento do ar a partir da
região de maior pressão em direção à região de menor pressão. Suponha que a barreira invisível
entre as duas colunas seja removida e que o ar em altitude se mova horizontalmente. Nessa situ-
ação, o ar se deslocará da coluna 2 (ponto A) para a coluna 1 (ponto B). À medida que o ar em
altitude deixa a coluna 2, o peso do ar nessa coluna decrescerá o que implica numa diminuição
da pressão atmosférica em superfície. Da mesma maneira, o acúmulo de ar na coluna 1 causará
um aumento da pressão atmosférica em superfície. Em síntese, aquecimento ou resfriamento de
uma coluna de ar pode promover variações horizontais na pressão, que causarão movimentos
do ar. Nas regiões onde há acúmulo de ar sobre a superfície haverá um aumento da pressão
atmosférica, enquanto nas regiões em que há decréscimo na quantidade de ar sobre a superfície,
haverá uma diminuição na pressão atmosférica.

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6.2.3 Variação Vertical e Horizontal da Pressão

Nas seções anteriores, foram mostrados detalhes sobre a variação da pressão com a altitude.
Aqui, é apresentada apenas uma síntese de alguns conceitos. A pressão em qualquer altitude na
atmosfera é igual ao peso do ar acima daquele ponto. À medida que se ascende na atmosfera,
o ar torna-se menos denso (pois a força de gravidade empurra o ar em direção à superfície
terrestre). Portanto, há um decréscimo da pressão com a altitude. A variação da pressão com
a altitude não é constante: a taxa de decréscimo é muito maior próximo à superfície, onde
a pressão é mais alta, do que em níveis mais altos (superiores a 12 km), onde a pressão é
mais baixa (Figura 6.6). A Tabela 6.1 mostra o decréscimo da pressão com a altura numa
atmosfera-padrão. A atmosfera-padrão é uma idealização da distribuição vertical de pressão
atmosférica (bem como da temperatura e da densidade do ar), que representa as condições médias
da atmosfera real. Note que, ao NMM, a pressão é de aproximadamente 1.013 hPa, enquanto, a
50 km acima da superfície, é de 0,8 hPa.
Para se comparar a pressão em superfície
em várias estações meteorológicas,primeira-
mente, a pressão de todas as estações deve ser
ajustada (reduzida) ao NMM. A compa-
ração dos registros de pressão obtidos em
diferentes regiões do globo revela dife-
renças de pressão ao NMM que são bem
menores do que os valores obtidos na
vertical. Na horizontal, as pressões encon-
tradas ao NMM, geralmente, variam entre
960 e 1.050 hPa (Figura 6.7) e sendo esses
valores encontrados a grandes distâncias
(>> 1.000 km). Tais valores indicam uma
diferença de pressão da ordem de 100 hPa.
Já na vertical, a diferença da pressão entre a
superfície e 50 km de altura,por exemplo,é de
aproximadamente 1.000 hPa (Tabela 6.1), Figura 6.6: Variação da pressão com a altitude. Fonte: adaptado de
que é uma ordem de grandeza superior às Strahler; Strahler,1997.

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variações registradas na horizontal em superfície. A Figura 6.7 também mostra a localização


dos sistemas de alta e baixa pressão (centros com linhas fechadas) ao NMM em termos médios
climatológicos (período de 1948 a 2011). É evidente que os sistemas ocorrem afastados uns dos
outros. Em termos médios, os sistemas que apresentam as mais baixas pressões encontram-se
nas latitudes médias e os de mais alta pressão, nos subtrópicos (Figura 6.7). A explicação para
a distribuição espacial dos sistemas de alta e baixa pressão será abordada no texto Circulação
Geral da Atmosfera.

Tabela 6.1: Variação da pressão atmosférica com a altitude. / Fonte: adaptado de Lutgens; Tarbuck, 2010.

Altura (km) Pressão (mb) Temperatura (ºC)


50,0 0,798 −2
40,0 2,87 −22
35,0 5,75 −36
30,0 11,97 −46
25,0 25,49 −51
20,0 55,29 −56
18,0 75,65 −56
16,0 103,5 −56
14,0 141,7 −56
12,0 194,0 −56
10,0 265,0 −50
9,0 308,0 −43
8,0 356,5 −37
7,0 411,0 −30
6,0 472,2 −24
5,0 540,4 −17
4,0 616,6 −11
3,5 657,8 −8
3,0 701,2 −4
2,5 746,9 −1
2,0 795,0 2
1,5 845,6 5
1,0 898,8 9
0,5 954,6 12
0 1013,2 15

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Predomínio de baixas pressões

Predomínio de altas pressões

Predomínio de altas pressões

Predomínio de baixas pressões

Figura 6.7: Média climatológica (1948


a 2011) da pressão atmosférica ao nível
médio do mar. / Fonte: National Centers
for Environmental Prediction (NCEP).

6.3 Ventos
O vento é, simplesmente, o ar em movimento na horizontal. Já o ar é uma mistura de
diferentes moléculas de gases. A caracterização do vento, em qualquer ponto da atmosfera,
necessita de dois parâmetros: a direção e a velocidade.

6.3.1 Direção e Velocidade do vento a

A direção do vento define a posição a partir da qual o vento sopra


e não para onde o vento está indo. A direção é expressa em termos
do azimute, isto é, do ângulo que o vetor velocidade do vento forma
com o norte geográfico local (0°), medido no mesmo sentido do
b
movimento dos ponteiros de um relógio. Dessa forma, o vento que vem
de leste tem direção de 90°, o que vem do sul tem direção de 180° etc.
A determinação da direção do vento é feita com base num círculo
(representação azimutal), em que os valores dos graus estão dispostos
diferentemente aos do círculo trigonométrico. A Figura 6.8 mostra Figura 6.8: Comparação entre o
círculo utilizado para determinar
uma comparação entre tais círculos e pode-se notar que, no círculo a direção do vento (a) e o círculo
trigonométrico (b).

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trigonométrico, o valor de 90° corresponde a 0° do círculo utilizado para determinar a direção


do vento; os demais valores também estão em posições diferentes nos dois círculos. Outra diferença
é o sentido do movimento: no círculo trigonométrico, o movimento é realizado no sentido
anti-horário, ao passo que, no círculo usado para deter-
minar a direção do vento, é feito no sentido horário.
Quando não há instrumentação para determinar a
direção do vento com precisão, costuma-se estimá-la
através do uso da rosa dos ventos (Figura 6.9). A direção
será aquela que mais se aproxima de um dos pontos
cardeais (norte N, sul S, leste L, oeste O) ou colaterais
(nordeste NE, sudeste SE, sudoeste SO, noroeste NO).
É comum encontrar a sigla desses pontos no idioma
inglês; nesse caso, os pontos cardeais são: N, S, E e W, e
os colaterais: NE, SE, SW e NW. Figura 6.9: Rosa dos ventos e os pontos cardeais,
colaterais e subcolaterais.
A velocidade (ou intensidade) do vento pode ser
expressa em metros por segundo (m s-1), em quilômetros por hora (km h-1) ou em knots (k t).
Um knot (nó) corresponde a uma milha náutica (1.852 m) por hora. O valor de velocidade de
0 m s-1 é usado quando não há vento, situação conhecida como calmaria. Quando, em poucos
minutos, ocorre um aumento repentino da velocidade do vento, tem-se uma situação de rajada.
Em geral, as rajadas também são acompanhadas por variações bruscas na direção do vento.
A rajada de vento ocorre devido à turbulência atmosférica, (passagem de vórtices ou redemoinhos
pela região) diferenças de altitude entre terrenos ou ao longo de frentes frias onde ocorre
grandes variações de temperatura e pressão. Como os ventos em superfície podem apresentar
rajadas, as observações meteorológicas da intensidade e direção do vento para fins de análise
e previsão do tempo devem se referir aos valores médios correspondentes a um intervalo de
10 minutos e não a um único registro do vento a cada 10 minutos.
Na atmosfera, existe tanto movimento do ar na direção horizontal (por exemplo, de norte
para sul) quanto na vertical (ar descendo ou subindo na atmosfera). Entretanto, considera-se
vento somente o movimento na horizontal. Como o vento é uma grandeza vetorial, torna-se
importante definir o que é vetor. Vetor é um segmento orientado de reta, que tem origem
(de onde sai) e extremidade (até onde chega), bem como direção, sentido e intensidade.
Assim, o vento é um vetor (Figura 6.10), pois possui direção (horizontal), sentido (leste,

6 Pressão Atmosférica e Ventos


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oeste, sul etc., que é indicado pela extremidade do vetor) e intensidade (velocidade).
Os vetores podem ser decompostos em componentes x e y no plano cartesiano. No caso do
vento, as componentes são chamadas componente zonal (u) aquela que representa o vento na
direção leste-oeste (eixo x), e componente meridional (v)
aquela que representa o vento na direção norte-sul (eixo y).
Com relação à componente zonal, o vento de oeste para leste
é representado por valores positivos, enquanto o de leste para
oeste, por valores negativos. Já, com relação à componente Figura 6.10: Exemplo de um vetor indicando
vento de sudoeste (225°). O número 3 m s -1
meridional, o vento de sul para norte é representado por valores representa a intensidade do vetor, isto é, a
positivos, enquanto o de norte para sul, por valores negativos. velocidade do vento.
Nas cartas sinóticas (dados medidos simultaneamente sobre o globo em horários-padrão
definidos pela OMM), a direção do vento é indicada por um traço que tem orientação
similar a do azimute do vento e que é unido a um ponto que representa o local da observação
(Figura 6.11). A intensidade do vento é representada na extremidade do traço através de
barbelas (pequenas bandeiras) que representam 10 kt cada uma. As velocidades de 5 kt são
indicadas por metade de uma barbela e as de 50 kt, por triângulos. Ventos com velocidade
inferior a 5 kt não possuem barbela anexada ao traço que parte do local da observação.
Nas situações de calmaria (0 kt) somente é desenhado um círculo ao redor do ponto da
observação. Quando, numa carta meteorológica, os pontos com a mesma direção do vento são
unidos, formam-se linhas chamadas isogônicas. Já as linhas formadas pela união de pontos com
vento de mesma intensidade são chamadas de isotacas.

Figura 6.11: Representação da


direção e da velocidade (barbelas)
do vento em uma carta sinótica
no Hemisfério Sul. / Fonte:
adaptado de Varejão-Silva, 2006.

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6.4 Forças que Influenciam os Ventos


6.4.1 As Leis do Movimento de Newton

A primeira lei do movimento de Newton afirma que um objeto em repouso permanecerá


em repouso e um objeto em movimento permanecerá em movimento (e se deslocará em velo-
cidade constante e em linha reta) a menos que uma força seja exercida sobre ele. Já a segunda lei
de Newton declara que a força exercida sobre um objeto é igual à sua massa vezes a aceleração
produzida. Essa lei pode ser escrita como

F=ma 6.2

De acordo com a equação 6.2, quando a massa de um objeto é constante, a força que age
sobre o objeto está diretamente relacionada à aceleração que é produzida. Como mais do que
uma força pode agir sobre um objeto, a segunda lei de Newton se refere à força líquida, total
ou resultante. Um objeto irá sempre acelerar na direção da força resultante que atua sobre ele.
Com base nessas ideias, para determinar a direção do vento, é necessário identificar e examinar
todas as forças que afetam o movimento horizontal do ar. Entre essas forças estão a força do
gradiente de pressão, a força de Coriolis e o atrito.
Inicialmente, serão apresentadas as forças que influenciam os ventos em todos os níveis da
atmosfera e, depois, a força de atrito que atua nos ventos próximos à superfície.

6.4.2 Força do Gradiente de Pressão

A Figura 6.12 mostra uma região de pressões mais altas (1.020 mb) no lado esquerdo
do mapa e de pressões mais baixas (1.016 mb) no lado direito. Já as isóbaras indicam o valor
da pressão e sua variação na horizontal. O cálculo da variação da pressão numa determinada
distância fornece o gradiente de pressão.

6 Pressão Atmosférica e Ventos


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diferença de pressão
Gradiente de Pressão = 6.3
distância
que também pode ser representado matematicamente como:

∆p
GP = 6.4
d

Figura 6.12: O gradiente de pressão entre


os pontos 1 e 2 é 4 mb por 100 km. A força
líquida direcionada da maior para a menor
pressão é a força do gradiente de pressão
e é representada pela seta em vermelho. /
Fonte: adaptado de Ahrens, 2000.

Na Figura 6.12, o gradiente de pressão entre os pontos 1 e 2 é de 4 milibares (que é


1.020 – 1.016 = 4) por 100 quilômetros, ou seja, 0,04 mb/km. Isso significa que, a cada
quilômetro (indo da direita para a esquerda), a pressão aumenta 0,04 mb. Geralmente, o vetor
que representa o gradiente de pressão é desenhado nos mapas meteorológicos; se o mesmo fosse
desenhado na Figura 6.12, seria uma seta que apontaria da região de menor pressão para a de
maior pressão (isto é, seria uma seta com sentido oposto à seta vermelha). Agora, suponha que,
na Figura 6.12, as isóbaras estejam mais próximas (isto é, afastadas apenas 50 km). Nesse caso,
o gradiente de pressão equivale a 0,08 mb/km. Esse valor indica que há uma rápida mudança
na pressão sobre uma área relativamente pequena ou um forte gradiente de pressão.
No entanto, se a pressão estiver mudando de forma que as isóbaras fiquem mais afastadas umas
das outras, a diferença de pressão será menor sobre uma área relativamente maior. Essa condição
indicaria um gradiente de pressão menos intenso ou um enfraquecimento dele.
Quando existem diferenças horizontais na pressão do ar, surge uma força líquida, que é
responsável pela geração dos ventos. Essa força é chamada força do gradiente de pressão
(FGP), que se dirige das altas pressões para as baixas pressões, formando ângulos
retos (ângulos de 90º) com as isóbaras. A magnitude da FGP está diretamente relacionada

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ao gradiente de pressão. Quanto mais intensos forem os gradientes de pressão, maior será a FGP
e vice-versa. Essa relação é mostrada na Figura 6.13.

Figura 6.13: Relação entre o gradiente de


pressão e a força do gradiente de pressão.
As linhas de cor cinza representam as
isóbaras. As setas vermelhas indicam
a magnitude da força, que é sempre
direcionada da maior para a menor pressão. /
Fonte: adaptado de Ahrens, 2000.

A força do gradiente de pressão é escrita matematicamente como:

1 ∆p
FGP = 6.5
r d

onde r é a densidade do ar. Veja que essa equação considera, além do gradiente de pressão
(∆p/d), a densidade do ar (r). A densidade do ar deve ser levada em conta quando consideramos
uma massa unitária de ar em movimento.
A força do gradiente de pressão é a única força capaz de gerar os ventos, mas ela
não é a única a atuar sobre o ar. Se a FGP fosse a única, o vento sempre se dirigiria das altas
para as baixas pressões. Porém, à medida que o ar começa a se deslocar, o vento é desviado do
seu curso pela força de Coriolis. Antes de apresentar essa força, será explanada a questão da
existência da força do gradiente de pressão na vertical.

Equilíbrio Hidrostático

Já foi mostrado que


1. a força do gradiente de pressão origina o vento (que escoa das altas para as baixas
pressões) e que,

6 Pressão Atmosférica e Ventos


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2. a pressão atmosférica decresce rapidamente com a altitude. Com esses dois fatos,
é normal pensar que o vento poderia ser direcionado da superfície para as maiores
altitudes. Se isso realmente ocorresse, os seres vivos se sufocariam, pois todo o ar iria
em direção ao espaço em resposta à força do gradiente de pressão na vertical.
Entretanto, considere outro fato relevante: a gravidade empurra toda a massa em
direção à superfície terrestre. Aí surge a questão:

Por que a atmosfera não colapsa em direção à superfície do planeta?

Isso não ocorre porque a força do gradiente


de pressão vertical e a força de gravidade têm
normalmente (ou aproximadamente) o mesmo
valor e operam em sentidos opostos (isto é, a
FGP vertical aponta da superfície para as mais
altas altitudes e a força de gravidade, das maiores
altitudes em direção à superfície). Essa situação é
chamada equilíbrio hidrostático. Para facilitar
o entendimento desse conceito, imagine uma
coluna atmosférica formada por muitas camadas.
Ao selecionarmos uma dessas camadas como
na Figura 6.14, note que a força do gradiente Figura 6.14: Coluna atmosférica com uma camada destacada em
de pressão (que aponta para cima) tem a mesma cinza. A camada possui equilíbrio hidrostático porque a força que
atua para cima é igual à força que atua para baixo. Tais forças são

magnitude da força que aponta para baixo (pois representadas


Hobbs, 2006.
pelas setas pretas. / Fonte: Adaptado de Wallace;

as setas possuem o mesmo tamanho). Assim, essa


camada não pode se deslocar verticalmente (está sem movimento), ou seja, possui equilíbrio hidrostático.
Quando a força gravitacional é exatamente igual à força do gradiente de pressão vertical, não
há aceleração na vertical. Quando a força gravitacional excede ligeiramente a FGP vertical, isso
resulta em movimento subsidente. Por outro lado, quando a FGP vertical excede a força gravi-
tacional, ocorrem movimentos ascendentes. Movimentos ascendentes na atmosfera estão asso-
ciados à ocorrência de tempestades. Isso será abordado no texto Sistemas Atmosféricos.

Meteorologia
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6.4.3 A Força de Coriolis

A Figura 6.15 mostra uma análise da pressão atmosférica em superfície sobre a América do
Sul. As linhas amarelas representam as isóbaras e os vetores coloridos, a velocidade e a direção
do vento. Neste momento, não faremos nenhuma interpretação do que está acontecendo na
figura em termos de tempo meteorológico.
Anteriormente, foi mencionado que o vetor representativo da força do gradiente de pressão
forma ângulos retos (ângulos de 90º) com as isóbaras. Portanto, os ventos, representados pelos
vetores coloridos na Figura 6.15, também deveriam formar ângulos retos com as isóbaras
como na Figura 6.13. Porém essa situação é pouco observada e os vetores tendem a ser
paralelos às isóbaras (Figura 6.15). Os desvios que ocorrem no ângulo do vetor vento em
relação às isóbaras (isto é, uma mudança na direção dos ventos) são decorrentes da influência
da rotação da Terra.

Figura 6.15: Exemplo de PNMM (hPa)


e vento (m s-1) em 1.000 hPa. A PNMM
é representada pelas isóbaras em
amarelo. O vento é representado pelos
vetores coloridos. Vetores na imagem
com o mesmo tamanho do vetor em
branco significam ventos com intensi-
dade de 10 m s-1. / Fonte: Master/IAG/
USP e DSA/INPE e análise do CPTEC.

6 Pressão Atmosférica e Ventos


Licenciatura em Ciências · USP/Univesp · Módulo 2 113

O efeito da rotação da Terra sobre os corpos em movimento recebe o nome de Força de


Coriolis (FC). Esta é uma força aparente porque só existe em função da rotação da Terra (nada
está aplicando força) e, por isso, também é conhecida como efeito de Coriolis. Por definição,
a FC tende a desviar lateralmente a trajetória dos corpos em movimento que estão sobre
sistemas girantes como a Terra. É importante ressaltar que, na superfície, a força de atrito também
influencia o vento, mas isso será discutido mais adiante.
Algumas considerações sobre a força de Coriolis:
• se o corpo está em repouso não sofrerá a ação da FC;
• se a Terra não rotasse, não haveria FC agindo sobre os corpos que se movem acima da superfície;
• a FC apenas altera a direção do movimento;
• objetos que se movimentam livremente na atmosfera, inclusive o vento, são defletidos
(desviados)para a direita do seu movimento no Hemisfério Norte e para a esquerda no
Hemisfério Sul (Figura 6.16);
• a FC depende da velocidade do movimento, isto é, o desvio é maior se a velocidade for
maior. Podemos pensar para o caso do movimento do vento, que no mesmo período de
tempo, asparcelas de ar mais rápidas percorrem distâncias maiores que as parcelas mais
lentas. Quanto maior o deslocamento, maior o desvio da parcela de ar em relação ao
sistema de coordenadas fixo à Terra.
• a FC aumenta com a latitude, ou seja, o seu efeito é mais percebido quando o movimento
se dá em direção aos polos e é menos percebido próximo do equador. Esse efeito está
associado com a forma da Terra, pois nos polos, onde a superfície é perpendicular ao eixo
da Terra, a rotação diária faz com que o plano horizontal do nosso sistema de coorde-
nadas faça uma volta completa em torno do eixo vertical a cada 24 horas. No equador
a superfície da Terra é paralela ao eixo de rotação da Terra. Consequentemente, ela não
sofre rotação em torno de um eixo vertical à superfície. Portanto, no equador a superfície
sobre a qual o vento sopra não sofre rotação num sentido horizontal.

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Figura 6.16: Deflexão do vento


para a esquerda do movimento no
Hemisfério Sul e para a direita no
Hemisfério Norte devido à força
de Coriolis. / Fonte: adaptado de
Strahler; Strahler,1997.

O efeito de Coriolis é mais fácil de ser visualizado quando o movimento é de sul para
norte (ou vice-versa) do que quando é de oeste para leste (ou vice-versa). A Figura 6.17
ilustra a situação do vento soprando de oeste para leste ao longo do paralelo 40° em ambos os
hemisférios. Algumas horas depois, o vento de oeste transformou-se em vento de noroeste no
Hemisfério Norte e de sudoeste no Hemisfério Sul, em relação ao sistema de coordenadas fixo
à Terra. a b

Figura 6.17: Deflexão no vento


de oeste produzida pelo efeito de
Coriolis. Para facilitar a interpretação
da figura, olhe a posição dos
paralelos e meridianos no instante
inicial (a) e depois de decorridas
algumas horas (b). / Fonte:
adaptado de Grimm, 1999.

6 Pressão Atmosférica e Ventos


Licenciatura em Ciências · USP/Univesp · Módulo 2 115

Contrário à crença popular, a FC não faz a água girar no ralo da pia no sentido horário
no Hemisfério Norte e no sentido anti-horário no Hemisfério Sul. Já foi explicado que a FC
depende da velocidade do movimento e, no caso, do giro da água no ralo da pia a velocidade
seria muito pequena e a massa da água também; assim, a FC seria mínima. A FC também é
mínima em ventos de menor escala espacial, tais como as brisas (ver capítulo Circulação Geral
da Atmosfera). O efeito de Coriolis é mais perceptível somente quando o movimento atinge
uma vasta área; por exemplo, em sistemas atmosféricos como os ciclones e furacões.

6.5 Ventos acima da Camada de Atrito


Já foi mostrado que a força do gradiente de pressão é única a força que gera os ventos e que
a força de Coriolis influencia somente a direção do vento. Agora, essas duas forças serão exami-
nadas para entendermos como elas produzem os ventos acima da camada de atrito (camada que
se estende do solo a aproximadamente 1.000 metros de altura).

6.5.1 Vento Geostrófico

A Figura 6.18 mostra parte de uma carta meteorológica no Hemisfério Sul, com as variações
horizontais de pressão, a uma altitude acima da camada de atrito. O espaçamento similar das
isóbaras indica a existência de uma FGP constante, dirigida de norte para sul (seta azul à esquerda
na Figura 6.18). A figura nos faz refletir por que o vento é de oeste e não de norte. Para
tal entendimento, uma parcela de ar é
colocada na posição 1 no diagrama e é
acompanhado o seu comportamento.
Na posição 1, a FGP age sobre a parcela,
acelerando-a para sul na direção das
baixas pressões. Entretanto, quando o ar
começa a se mover, a FC o desvia para
a esquerda do movimento (pois está
sendo considerado o Hemisfério Sul), Figura 6.18: Representação do vento geostrófico para o Hemisfério Sul:
acima da camada de fricção, o ar inicialmente em repouso começa a acelerar
curvando a sua trajetória. Imagine que a até se tornar paralelo às isóbaras em função da FGP estar balanceada com a
FC. / Fonte: adaptado de Grimm, 2011

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parcela de ar aumente a sua velocidade; à medida que isso ocorre (posições 2, 3 e 4), a grandeza
da FC aumenta (mostrado pelo aumento das setas na figura), fazendo o vento curvar-se cada vez
mais para a esquerda. A velocidade do vento pode aumentar até um ponto onde a FC se equilibra
com a FGP. Quando isso ocorre (posição 5), o vento não acelera mais porque a força resultante
é zero. Então, o vento flui em linha reta, paralelamente às isóbaras a uma velocidade constante.
Esse escoamento é chamado vento geostrófico. Assim, o vento geostrófico é o vento que surge
quando a FGP está em balanço com a FC. Observe que o vento geostróficono Hemisfério Sul
deixa as pressões mais baixas a sua direita e as pressões mais altas a sua esquerda (Figura 6.18).
O vento geostrófico é uma aproximação do vento real. Isto é, ele representa, aproximada-
mente, a direção e a intensidade do vento observado num dado local. Além disso, como o vento
geostrófico depende do balanço da FGP e da FC, ele representa melhor o vento real nas regiões
afastadas do equador. Já próximo ao equador, como o efeito de Coriolis é muito pequeno, o
balanço entre as duas forças é rompido e o vento geostrófico acaba se diferenciando do vento real.
É importante enfatizar que o vento geostrófico está intimamente associado com a FGP:
quanto maior a FGP mais intenso será o vento geostrófico e quanto menor a FGP menor será a
intensidade desse vento. A Figura 6.19 ilustra bem essa situação. Nesta, o vento escoa paralela-
mente às isóbaras do mesmo modo que a água flui paralelamente a suas margens. Na posição 1,
como a FGP é menor do que na posição 2, o vento escoa com baixa velocidade, ao passo que na
posição 2 é mais intenso.Também é importante destacar que quando o vento adquire trajetória
meandrante, no momento em que a trajetória é próxima das direções norte e sul, o escoamento
do vento é chamado meridional. Já quando o vento flui próximo das direções leste e oeste, o
escoamento é chamado zonal. Na atmosfera, as trajetórias meandrantes são denominadas ondas.

Figura 6.19: Comparação


entre o escoamento do vento
e o da água num rio. / Fonte:
adaptado de Ahrens, 2000.

6 Pressão Atmosférica e Ventos


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6.5.2 Vento Gradiente

O vento geostrófico é uma boa aproximação do vento real em regiões onde as isóbaras são
retas, porém as Figuras 6.7 e 6.15 mostram que as isóbaras não são totalmente linhas retas.
Elas formam curvas abertas ou que se conectam formando células aproximadamente circulares
que recebem o nome de ciclones ou baixas (região onde a pressão aumenta da isóbara mais
central em direção a mais externa) e de anticiclones ou altas (região onde a pressão diminui
da isóbara mais central em direção a mais externa). Nessas situações o vento real pode ser
aproximado pelo vento gradiente. O vento gradiente surge através do balanço entre três forças:
FGP, FC e força centrípeta. Nesse momento é importante recordar como é definida a força
centrípeta. A força centrípeta é uma força resultante (isto é, que é obtida a partir da soma
vetorial de todas as forças que atuam num corpo) que é direcionada para o centro da trajetó-
ria de um corpo em movimento curvilíneo ou circular, não deixando o corpo “escapar pela
tangente”. Portanto, a força centrípeta é responsável por mudar a direção do escoamento.
Para um melhor entendimento do vento gradiente é fornecida a explanação a seguir.
No nosso caso, na atmosfera, suponha a existência de uma área de baixa pressão no Hemisfério
Sul (Figura 20a, lado esquerdo). Uma parcela de ar é inicialmente colocada em repouso na
posição 1. A FGP acelera o ar na direção do centro do sistema de baixa e a FC desvia o
movimento do ar para a esquerda até que o ar se mova paralelamente à isóbara na posição 2.
Da posição 2 para a posição 3 o ar teve um movimento curvo, ou seja, foi mudando a sua
direção ao longo da trajetória. Isso vai alterar a FGP, que se torna maior do que a FC.
A diferença entre essas duas forças (força resultante) será a força centrípeta (Força centrípeta =
FGP – FC). Como resultado há uma força líquida apontando para o interior do centro de baixa
pressão (o balanço entre a FGP e FC foi rompido).

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Aa Ab

Ba Bb

Figura 6.20: Ventos e forças


atuantes em torno de áreas de
baixa e alta pressão acima da
camada de atrito. A. Hemisfério
Sul; B. Hemisfério Norte.

Na Figura 6.20a (lado direito), para o caso de um sistema de alta pressão no Hemisfério
Sul, o vento flui no sentido anti-horário em torno do centro da alta.Para manter o vento
girando em torno do círculo, a FC dirigida para o centro deve ser maior que a magnitude da
FGP dirigida para fora do sistema, de tal modo que a força centrípeta (a força resultante) seja
dirigida para dentro (Força centrípeta = FC – FGP).
Para o Hemisfério Norte, vale o esquema da Figura 6.20b para o centro de baixa (figura
da esquerda) e para o centro de alta (figura da direita), lembrando que, para o Hemisfério
Norte, o centro de baixa gira no sentido anti-horário e o centro de alta gira no sentido horário.
Entretanto, o significado físico é o mesmo independentemente do hemisfério.
Nos níveis mais altos da atmosfera, o raio de curvatura do escoamento, em geral, é muito grande
(há ondas com distância superior a 3.000 km) e o escoamento pode ser considerado aproximada-
mente retilíneo. Assim, o vento geostrófico continua sendo uma boa aproximação para o vento real.

6 Pressão Atmosférica e Ventos


Licenciatura em Ciências · USP/Univesp · Módulo 2 119

6.6 Ventos em superfície


6.6.1 Força de Atrito

Nas cartas meteorológicas de superfície, os ventos não escoam totalmente paralelos às


isóbaras (Figura 6.15); à medida que se movem das altas para as baixas pressões, eles cruzam
as isóbaras com ângulos inferiores a 90°. Esse fato é decorrente do atrito do vento com a
superfície do planeta. O ângulo em que o vento cruza as isóbaras pode variar, mas em média é
de cerca de 30°.
A Figura 6.21Aa mostra o efeito do atrito no vento próximo à superfície (exemplo para
o Hemisfério Sul). Inicialmente, olhando-se o topo da figura, nota-se que o vento em níveis
afastados da superfície (acima de 1.000 m) escoa paralelamente às isóbaras, uma vez que a FGP
está em equilíbrio com a FC. Perto da superfície, o balanço entre essas duas forças é rompido
pelo atrito. O atrito reduz a velocidade do vento que, por sua vez, reduz a FC. Com isso há
um rompimento do balanço entre a FC e a FGP e o vento tenderá a cruzar as isóbaras na
direção das menores pressões. No Hemisfério Sul, o vento em superfície flui no sentido horário
(Figura 6.21Ab) e para dentronos sistemas de baixa; já, nas altas pressões em superfície, o vento
flui para fora e no sentido anti-horário (Figura 6.21Ac). Um exemplo do vento em superfície
sobre a América do Sul é dado na Figura 6.22.
No Hemisfério Norte, em superfície, o vento escoa no sentido anti-horário e para dentro
nos sistemas de baixa (Figura 6.21Bb); já, nas altas pressões, o vento flui para fora e no sentido
horário (Figura 6.21Bc).

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A
Aa Ab Ac

B
Ba Bb Bc

Figura 6.21: Efeito do atrito nos ventos em superfície. Observe que em altitude o efeito é nulo. A. Hemisfério Sul;
B. Hemisfério Norte.

a b
Figura 6.22: a. Mapa meteorológico em superfície mostrando as isóbaras e o vento num dia de
dezembro na América do Sul. b. Escoamento idealizado em torno dos sistemas de pressão na
superfície no Hemisfério Sul. / Fonte: adaptado de Ahrens, 2000.

6 Pressão Atmosférica e Ventos


Licenciatura em Ciências · USP/Univesp · Módulo 2 121

A Figura 6.23 traz uma síntese do escoamento em sistemas de alta e baixa pressão, tanto
em baixos quanto em altos níveis, e em ambos os hemisférios.

Figura 6.23: Escoamento idealizado em torno dos sistemas de baixa (B) e alta (A) pressão na
superfície e em altos níveis nos hemisférios norte e sul. / Fonte: adaptado de Aguado; Burt, 2010.

6.7 Movimento Vertical


Na seção anterior, mostrou-se que os ventos em superfície convergem para o centro de baixa
pressão e divergem em torno do centro de alta pressão. A Figura 6.24 exemplifica esse processo
para os Hemisférios Norte e Sul. No lado esquerdo dos quadros a e b, estão representados os
centros de baixa pressão em superfície. Independentemente do hemisfério, à medida que o
vento converge para o centro da área de baixa pressão, por conservação de massa, ele tem que ir
para algum lugar. Como o ar que converge não pode penetrar na superfície, ele sobe lentamente
na atmosfera. Acima da baixa em superfície (~6.000 metros), o ar começa a divergir. Quando
o escoamento divergente se iguala ao convergente em superfície, a pressão no centro da baixa
não se altera. Mas quando esses escoamentos deixam a situação de equilíbrio, a pressão na
superfície muda. Por exemplo, se a divergência em altos níveis for maior do que a convergência
em superfície, a pressão decresce no centro da baixa, e as isóbaras em torno da baixa ficarão mais
próximas umas das outras. Esse processo aumenta o gradiente de pressão (e, portanto, a força do
gradiente de pressão), o que, por consequência, aumenta o vento em superfície.

Meteorologia
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A mesma análise pode ser realizada com base nos sistemas de alta pressão em superfície (lado
direito dos quadros a e b da Figura 6.24). Nesses sistemas, o vento se move para fora do centro
de alta pressão (diverge). Para substituir o ar que sai em superfície, o ar em níveis mais altos
converge e desce (subside) lentamente.
É importante destacar que o ar que ascende favorece a formação de nebulosidade e
precipitação enquanto o que subside inibe esses processos e promove condições de céu limpo.
Na seção 6.4.2, foi mencionado que a atmosfera está em equilíbrio hidrostático, isto é, as
camadas da atmosfera não se deslocam verticalmente. Aparentemente, essa informação está em
desacordo com os parágrafos anteriores, que revelam a existência de movimentos verticais.
Na realidade, o equilíbrio hidrostático é uma teoria que facilita/simplifica os estudos dos
processos atmosféricos. Ressalta-se, portanto, que os movimentos verticais ocorrem e são
responsáveispela formação de diferentes sistemas atmosféricos como alguns dos que serão
apresentadosno tópico Sistemas Atmosféricos.

a
b

Figura 6.24: Centros de alta e de baixa pressão e movimento do ar associados. a. Para o Hemisfério Sul; b. Para o Hemisfério Norte. /
Fonte: adaptado de Ahrens, 2009.

6 Pressão Atmosférica e Ventos


Licenciatura em Ciências · USP/Univesp · Módulo 2 123

Referências
Aguado, E.; Burt, J.E. Understanding Weather and Climate. 5.ed. New York: Prentice
Hall, 2010.
Ahrens, C.D. Essentials of Meteorology: An Invitation to the Atmosphere. 3. ed. Brooks/
Cole, 2000.
Ahrens, C.D. Meteorology Today: An Introduction to Weather, Climate, and the
Environment. 9. ed. Brooks/Cole, 2009.
Foster, P.R.P.; Fernandes, D.O.; Foster, R.P. Instrumentos Meteorológicos e
Técnicas de Observação. V.1, Faculdade de Meteorologia, Universidade Federal de
Pelotas, 2003. CD-ROM.
Grimm, A.M., 2011: Meteorologia Básica: Notas de Aula Online. Disponível em:
< http://fisica. ufpr.br/grimm/> Acesso em 1º fev. 2011.
Silva, Justi da; M. G. A. Pressão Atmosférica e Ventos. Tradução de Ahrens. Rio de Janeiro:
UFRJ, 1993.
Lutgens, F. K.; Tarbuck, E.J.The Atmosphere: An Introduction to Meteorology. 11. ed.
New York: Prentice Hall, 2010.
Varejão-Silva, M.A. Instrumentos Meteorológicos Utilizados em Estações de
Superfície. Recife: Sudene, 1973.
___________. Meteorologia e Climatologia. Brasília, v. 2, p.463, 2006. Disponível em:
<http://www.agritempo.gov.br/publish/publicacoes/livros/METEOROLOGIA_E_
CLIMATOLOGIA_VD2_Mar_2006.pdf>. Acesso em: 09/2012.
Strahler, A.; Strahler, A. Introducing Physical Geography. 2. ed. New Jersey: John Wiley
& Sons, Inc.,1997.

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124 Licenciatura em Ciências · USP/Univesp · Módulo 2

Glossário
Ascendentes: Ar subindo na atmosfera.

Equilíbrio hidrostático: ocorre devido ao balanço entre a força de gravidade e a força do gradiente
vertical de pressão.
Força de Coriolis: efeito da rotação da Terra sobre os corpos em movimento. Os corpos são defletidos
para a direita do seu movimento no Hemisfério Norte e para a esquerda no Hemisfério Sul.
Força de gradiente de pressão: força decorrente da diferença de pressão atmosférica entre duas regiões.
A força do gradiente de pressão aponta da região de maior para menor pressão.
Gradiente de pressão: grandeza que indica a direção na qual a pressão atmosférica varia em relação à
distância (GP = ∆p/d). O gradiente de pressão aponta do menor para o maior valor de pressão.
Isóbaras: Linhas com mesmo valor de pressão.

Isóbaras: Linhas que unem pontos com mesmao pressão atmosférica. valor de pressão.

Isogônicas: linhas que unem pontos com a mesma direção do vento.

Isotacas: linhas que unem pontos com a mesma intensidade do vento.

Movimento subsidentes: ar que se desloca verticalmente de um nível mais alto para um mais baixo
na atmosfera.
Movimentos ascendentes: As que se desloca verticalmente de um nível mais baixo para um mais alto
na atmosfera.
Subsidente: Ar descendo na atmosfera.

Vento geostrófico: vento teórico que resulta do balanço entre as forças de Coriolis e do gradiente de
pressão. O vento geostrófico é um vento paralelo (que acompanha) às isóbaras.
Vento gradiente: vento teórico que resulta do balanço entre as forças de Coriolis.

6 Pressão Atmosférica e Ventos

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