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PROVA I MODERNA FINAL
PROVA I MODERNA FINAL
A expansão do impresso se fez presente nos mais diversos grupos sociais, mesmo que de
forma desigual. Natalie Davis (1991) trata sobre as diversas formas como a palavra impressa
adentrou nas camadas populares, tanto no campo quanto nas cidades. Tendo em vista os
estudos da autora, é possível traçar o contato dessas comunidades com a nova tecnologia e os
impactos que foram deixados.
Além disso, também chegam no mundo rural as bíblias impressas e outros livros de oração.
Tal acontecimento é uma evidência importante dos impactos religiosos causados pela prensa,
apesar de não ter sido muito expressivo entre os camponeses. A autora pontua, de forma
pertinente, que a despeito dos corriqueiros vendedores ambulantes desses produtos religiosos,
o livre exame da bíblia tão pregado entre os protestantes não encontra muito espaço entre os
aldeãos. O Calvinismo se faz presente muito mais por imposição dos nobres sobre seus
servos, do que por apoio aos ideais reformadores, sendo que a nova fé era pouco compatível à
cultura oral e ritualística em que se baseava a vida religiosa dessas comunidades.
Entretanto, apesar de não ter encontrado muito espaço no meio rural, a simples presença
desses vendedores demonstra o enorme impacto da prensa na disseminação da fé protestante,
principalmente entre as elites e o meio urbano. É por meio dos textos sagrados traduzidos para
as línguas vulgares e impressos em grande volume que se faz possível a livre leitura e
interpretação da bíblia, rompendo com o monopólio do saber religioso detido pelo clero
católico. Dessa forma, a nova tecnologia de Gutenberg se torna uma imprescindível aliada do
luteranismo e do calvinismo, cujas doutrinas se estabelecem na leitura individual das
escrituras.
Adentrando, então, nos meios urbanos, são evidentes os inúmeros impactos da impressão. A
própria presença dos ateliês da prensa nas cidades já promove efeitos sociais, ao passo que as
muitas pessoas que participam do processo gráfico estabelecem um enorme contato com a
palavra escrita, sendo que a autora cita a frequente leitura em voz alta nessas oficinas
(DAVIS, 1991, p.176), além dos altos índices de alfabetização desses trabalhadores. Ainda
relativo às implicações sociais, é possível fazer uma associação lógica entre a difundida
presença da palavra escrita e o crescente letramento da população. Davis fala sobre um
estímulo à educação promovido entre os grupos de comerciantes, nas oficinas artesãs
(dependendo muito do tipo de produto artesanal) e até mesmo em orfanatos municipais
(DAVIS, 1991, p.172, 173).
De forma ainda mais impressionante, pode ser visualizada a forma como artesãos, mulheres e
trabalhadores de ofício produziram diversos materiais impressos que liam, como poemas,
contos, questões técnicas do ofício, entre muitos outros. O povo em geral não era um mero
receptor das publicações das elites letradas, pelo contrário, utilizava também da prensa como
instrumento tanto em círculos mais restritos, como para se fazer ouvido politicamente. A
produção escrita esteve disponível para os grupos sociais à margem do poder, dando a eles
chance de tornarem públicas suas várias queixas (sobre questões trabalhistas, a pobreza, a
nobreza, entre muitos outros) (DAVIS, 1991, p.179, 180). Além disso, a disseminação de
panfletos favorecia a maior propagação de notícias e informações, o que contribuía para que a
população se tornasse cada vez mais ciente do quadro político, social e religioso em que
estavam inseridos.
Apesar das inúmeras formas como a prensa permitiu uma certa emancipação da população
comum, permitindo, por exemplo, a destruição do monopólio da Igreja sobre as escrituras, ou
dando voz pública a esse grupo, ela se tornou, essencialmente, um instrumento das elites. As
impressões em larga escala eram bastantes dispendiosas, sendo muitas vezes necessário um
sistema de patronagem, como uma espécie de mecenato aos impressores. Assim, eram os mais
abastados que decidiam o que seria amplamente publicado, determinando também aqueles
textos direcionados ao povo, que podiam ser almanaques de caráter utilitário; alguns textos
religiosos com ilustrações para estabelecer o sentido a ser atribuído à leitura; textos sobre
curiosidades e alguns saberes médicos tradicionais,que traziam novas informações sobre a
saúde que contrariavam o saber popular; e, principalmente, as imagens, que alcançavam
também o grande público iletrado.
Além de se estabelecer na cultura popular, se fazendo presente com leituras orais públicas,
panfletos e ilustrações nos mais diversos ambientes (comuns, religiosos, de ofício, nas
tavernas, entre muitos outros), os impressos também tiveram papel fundamental na cultura e
na atividade social das elites. Os humanistas fazem da prensa um importante instrumento para
a disseminação do movimento intelectual pela Europa, se unindo ainda na “República das
Letras” para estimular a leitura de determinadas obras e compartilhar ideias. É importante ter
em vista, ainda, a contribuição dessa tecnologia para se ampliar o contato dos eruditos com os
mais diversos textos universitários, entre eles os filosóficos, teológicos e de gramática, alguns
dos quais eram utilizados no studia humanitatis, que se estabelece como base do próprio
movimento humanista e que influencia no movimento renascentista.
BIBLIOGRAFIA:
Dessa maneira, ainda é possível atrelar a disseminação dessas obras clássicas e não cristãs ao
aumento da secularização do pensamento. Em contato ainda maior com culturas pagãs, abre-
se espaço para questionar as acepções católicas que dominavam diversas áreas do saber.
Assim sendo, o conhecimento ultrapassa os objetivos de estudo do transcendental, e os
intelectuais passam a se debruçar sobre novos assuntos e concepções diferentes das religiosas.
Ao tratar sobre o artifex, André Chastel (1991) enfatiza o papel social que assumem. Estes
indivíduos estavam a serviço da clientela, atrelados aos laços contratuais e jurídicos, além de
serem dependentes das estruturas das corporações de ofício. Apesar das inúmeras amarras,
muitos encontravam espaço para expressar a individualidade e, em raros casos, a genialidade.
Era na figura do artifex polytechnes que se congregavam inúmeras e diversas habilidades
artísticas, como a pintura, escultura, arquitetura e decoração, formando, assim, um homem
renascentista único. Dessa forma, carregando em si as reformadas capacidades técnicas e
apresentando em suas obras caráter matemático e científico, junto a personagens mitológicos
ou novas formas de representar imagens cristãs, os (poucos) distintos artista se destacam do
artesão e promovem uma arte cada vez mais valorizada (principalmente de forma comercial),
assim como seu papel na sociedade: se torna glorioso e estimado.
BIBLIOGRAFIA:
CHASTEL, André. “O Artista”. In: GARIN, Eugenio (dir.). O Homem renascentista. Lisboa:
Presença, 1991. p. 171-190
GOODY, Jack. “As renascenças foram apenas europeias?” In: Renascimentos: um ou muitos?
São Paulo: Unesp, 2011. p. 283-320