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ÍNDICE

Sinopse:
Prólogo
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Epílogo
... Próximo livro da Máfia Tirreno:
Todos os direitos reservados. Nenhuma parte desta obra pode ser reproduzida
ou transmitida por quaisquer meios (eletrônicos ou mecânicos, incluindo fotocópia e
gravação) ou arquivada em qualquer sistema ou banco de dados sem autorização escrita
da autora.
Esta é uma obra de ficção. Os fatos aqui narrados são produto da imaginação.
Qualquer semelhança com nomes, pessoas, fatos ou situações da vida real deve ser
considerado mera coincidência.

Título: A Noiva Virgem do Mafioso


Romance / Dark
ISBN – 9798871528327
Texto Copyright © 2023 por Josiane Biancon da Veiga
SINOPSE:
Nunca tive uma escolha em minha vida...
Aos dez anos, eu fui dada em casamento a Klaus Lazio, herdeiro da máfia Tirreno. Nunca tive a chance de desenvolver
qualquer personalidade além da noiva pura, casta e obediente. Mas, conforme o casamento se aproxima, eu penso em como
destruir os planos que fizeram para mim.
Então, por que não tomar partido e arrancar de Klaus o direito a minha virgindade? Na noite anterior ao meu
casamento, eu me esgueiro pelos corredores do castelo de San Giovanni, e me ofereço a um dos guardas, um homem bonito e
vigoroso que não me recusa.
É assim que eu sei que Klaus terá uma mancha em sua honra. Imaginar a cara que ele fará quando descobrir que sua
noiva não é mais virgem me faz chegar ao orgasmo com aquele guarda desconhecido.
Contudo, no dia seguinte, durante a cerimônia, eu descubro que meus planos estão arruinados quando o guarda que
me amou desesperadamente no dia anterior é exatamente o maldito e desgraçado Klaus Lazio.
PRÓLOGO

u caminhei em passos arrastados pelo corredor imponente daquela mansão à beira do lago.
E Enquanto andava, tentava forçar minha respiração, pois o oxigênio parecia ter fugido dos
meus pulmões.
Era isso, não havia como escapar.
Desde que nasci, sabia que não vivia em uma família normal. Papai sumia semanas a fio,
em “missões” pelo país, enquanto mamãe dizia que eu não devia falar com ninguém sobre as
viagens de papai. Melissa, minha irmã, costumava brincar dizendo que ele era um espião do
governo, mas não demorou muito tempo para eu entender que papai não tinha nenhuma posição
heroica.
— Ande mais rápido — mamãe ordenou, sua voz sempre fria e direta.
Eu senti lágrimas nos olhos.
É claro que estava com medo. Eu tinha dez anos, e não sabia direito o que me esperava.
No dia anterior, papai me avisou de que não iria mais a escola habitual, e minha educação seria
em casa, com professores pagos pela Máfia Tirreno.
— Você devia ter arrumado melhor o cabelo dela — ouvi papai cochichando para
mamãe, e ela revirou os olhos como sempre fazia quando parecia irritada.
— Acha que é fácil? O cabelo dela é muito rebelde. Coloquei quilos de creme para tentar
tirar esse arrepiado da frente, mas Melina nunca será como Melissa.
Eu sabia. Eu nunca seria bonita como minha irmã. Nem tão querida e amada. Desde
sempre, mamãe tinha uma filha de ouro e uma de lata. A dourada era Melissa, idolatrada como a
perfeição em pessoa, com seus lindos e lisos cabelos loiros e seus olhos verdes. Ela havia puxado
totalmente a família de mamãe, que incluía modelos de revistas e atrizes. Já eu era forçada a
viver em uma luta frequente contra a balança e contra minha aparência desleixada.
Eu tinha cabelos cacheados e num tom cobre indefinido, com olhos castanhos sem graça
ou expressão. Sempre que meus pais me olhavam, eles suspiravam de decepção. Provavelmente,
se arrependeram de tentar um segundo filho. Depois que Melissa nasceu, quiseram demais um
menino. Mas, quando nasci, e eles viram que eu não era o filho esperado, passaram a me ter por
perto apenas como um estorvo a família perfeita e idealizada.
Na minha casa, todos eram bonitos. E eram todos exemplos de como o luxo pode ser um
bom amigo. Minha família usava as melhores roupas, Melissa e mamãe viviam se maquiando
com os produtos mais caros, e indo passar semanas em Spas para melhorar o aspecto da pele.
Mas, nada do que faziam por mim adiantava alguma coisa. Mamãe até tentou alisar meu
cabelo certa vez, mas ele quebrou totalmente com os produtos químicos. Agora eu tinha um
capacete curto em formato oval na cabeça.
— Eu espero que Giacomo não se sinta ofendido por Melissa ter se recusado — papai
murmurou. — Desde que ela nasceu, ele a quis para esposa de Klaus.
— Melissa quer ser livre — mamãe afirmou.
Melissa tinha um querer. Isso não era permitido para mim.
— Mas, se ele não se agradar de Melina, o que não seria nem um pouco surpreendente,
teremos que forçar Melissa.
Repentinamente, mamãe gira para trás, me encarando.
— Trate de fazer o senhor Giacomo Lazio ter a melhor imagem de você. Seja gentil e
educada.
Acenei, temerosa. Minha mãe, Lucia, era sempre assustadora quando dava ordens.
Continuei andando atrás deles. Eu tinha dez anos e estava prestes a ser oferecida em
sacrifício no lugar de minha irmã. Meu pai, contador da máfia de Tirreno, devia muito a
Giacomo Lazio, o líder. Foi prometido entre eles, que papai daria sua filha mais velha para ser
esposa de Klaus, o único filho de Giacomo. Mas, como Melissa era inconstante e – desconfiava –
andava namorando na escola, meus pais temeram que ela não fosse mais virgem, e causasse um
atrito entre os membros do clã.
Então, agora, eles estavam me levando para que Giacomo me visse e, se tivessem sorte,
aceitasse a troca. Eu não tinha uma opinião formada sobre isso, nem importava a eles que eu
tivesse. Eu tinha dez anos, e eles tinham tempo para me moldar a vontade de Klaus, até chegar o
dia do casamento.
Lágrimas escorrem pela minha face triste. Eu as recolho antes que vejam.
Antes disso tudo acontecer, eu queria ser professora. Eu amava estudar, amava a escola,
era um lugar seguro. Agora nem isso eu teria novamente. Devia apenas ser uma esposa e dar
filhos homens para Klaus. Quando completasse vinte anos, começaria a desempenhar esse papel.
Apenas dar filhos a alguém que eu não conhecia.
Quando Melissa se recusou, ela disse que jamais seria uma “vaca parideira”. Mas, esse
era meu triste destino.
Ser a vaca parideira dos Lazio.
Paramos diante de uma porta. O corredor era vasto, e havia janelas na parede oposta.
Olhei para fora, vendo as folhas amarelas do outono. Era um dia nublado, como se o tempo
estivesse prestes a chorar minha própria dor.
E então a porta se abriu.

✽ ✽ ✽

— A menina é adorável — Giacomo disse, enquanto me media dos pés à cabeça.


Queria me esconder diante do olhar dele. Não porque fosse repulsivo, ao contrário,
parecia muito simpático, mas eu estava apavorada com toda a situação.
— Que idade tem?
— Dez anos.
— É muito jovem. Meu Klaus terá trinta quando ela tiver idade para se casar. O que
aconteceu com Melissa?
— Minha Melissa... ela não é a melhor escolha — meu pai tentou consertar. — É um
pouco rebelde, e não queremos um problema com a família Lazio. Então estamos oferecendo o
que temos de melhor. Melina é doce e gentil. E obediente. E é devota de Fátima.
A informação pareceu agradar muito Giacomo.
— Nossa propriedade é chamada de San Giovanni porque somos católicos, temos muitos
laços em Roma — Giacomo me contou, como se eu entendesse o significado daquilo. — Nossas
finanças estão todas no banco do Vaticano. Fico feliz que seja uma católica. Estudou em um
colégio de freiras?
Eu assenti.
— Mas mamãe disse que não vou mais para a escola — contei a ele.
— Porque não queremos que ninguém a influencie — mamãe consertou, explicando-se.
— Melissa se tornou rebelde na escola. Então preferimos que Melina estude em casa, sobre
minha supervisão.
O homem assentiu. Ele então se afastou de mim e caminhou até sua mesa. Havia uma
garrafa de bebida lá, e ele serviu-se de uma dose.
— Eu quero que meu filho tenha uma boa esposa. Uma esposa pura, para lhe dar filhos.
Uma mulher decente, nesse mundo perdido em devassidão. Por isso eu escolhi sua família, Toni,
pois sei que Lucia é uma excelente mãe. Todavia, Klaus já tem vinte anos, e apenas iria terminar
os estudos para se casar com Melissa. Como ela tem quinze, ele teria que esperar um pouco.
Mas, com Melina, por mais adorável que seja... dez anos é muito tempo.
— Seu filho poderia viver um pouco a vida fora do matrimônio — minha mãe apontou.
— Um homem jovem tem necessidades. Enquanto ele espera que Melina cresça para ser sua
esposa, ele pode se divertir.
Não fazia ideia de que tipo de diversão estava falando, mas sabia que era do tipo que eu
jamais teria. A diferença entre ser uma garota e um garoto ficou gritando para mim naquele
momento. Klaus Lazio teria o poder de toda uma máfia, e teria uma esposa para gerar seus filhos
no momento que quisesse.
Enquanto a mim, eu teria apenas uma vida de obediência e silêncio. Nunca o incomodar
com minhas vontades, ou ter sonhos. Apenas, ser dele, como uma boneca, para ele brincar a hora
que quisesse.
Eu tinha apenas dez anos, mas eu sabia que estava sendo vendida a um preço caro
demais.
A vida era realmente algo triste.
1

u podia ouvir o vento forte batendo na minha janela. Os dias gelados de maio pareciam se
E aproximar com uma certa intensidade. Meu coração também estava glacial. Havia um tipo
de frieza que quase me incomodava.
Quase. Não totalmente. Eu faria qualquer coisa para tomar as rédeas da minha vida.
— Não é justo — Melissa reclamou, enquanto erguia algumas peças de roupa íntima de
seda da minha mala. — Eu devia ter roupas assim. Por que mamãe não comprou para mim?
Ela sempre teve tudo que quis. Era birrenta e não aceitava que não fosse o centro das
atenções. Nas minhas festas de aniversário – festas? Apenas comemorações com um pequeno
bolo e os criados da casa me cantando parabéns – Melissa exigia soprar as velas. Era estranho
porque ela tinha as próprias festas incríveis – para as quais nunca fui convidada – onde recebia
muitos amigos e tinha a atenção toda para si. Mesmo assim, ela nunca aceitava que eu recebesse
um mínimo de foco.
— Porque não é você que vai se casar amanhã — Açucena rebateu, e eu quase escondi
um riso diante do olhar revoltado de minha irmã.
Encarei a empregada, o único elo que tinha com o mundo lá fora. Açucena veio trabalhar
em minha casa quando eu tinha catorze anos, e nos tornamos amigas. Ela nunca escondeu a
frustração pelo meu triste destino, e tentou me levar revistas ou livros para que eu conhecesse um
pouco do mundo fora da prisão da minha casa.
— Devia ser eu — Melissa reclamou. — Mas, quando tinha quinze anos, recusei. Se eu
tivesse visto uma foto de Klaus Lazio antes de rejeitar o casamento, hoje estaria sendo preparada
como uma princesa.
— Ele é bonito? — Açucena indagou, mesmo claramente contra a vontade, forçada a
curiosidade. — Não importa. Nenhuma garota devia se casar com um cara que mal conhece.
— Bonito? Ele é um tesão.
Eu não fazia ideia do que era um tesão.
— E ele é tão rico e poderoso que nem sabe o que fazer com tanto dinheiro. Mamãe disse
que ele até comprou uma agência inteira de modelos para ser seu harém particular. Ele tem
muitas amantes. Sabe como são os Lazio? Eles tem mulheres à vontade, mas apenas uma oficial.
A pura. A esposa que representa a virgem Maria. Ah, pobre Melina... — disse, falsamente. Eu
sabia que Melissa não tinha realmente pena de mim, já que ela era incapaz de ser misericordiosa
por qualquer pessoa. — Vai ter que dividir o marido com mulheres lindíssimas. Ao menos, seus
filhos não serão bastardos.
Francamente, não me importava. Ao contrário, se Klaus Lazio simplesmente
desaparecesse e me deixasse viver minha vida em paz, eu estava bem com isso. Já havia aceitado
meu destino, ser apenas o útero limpo e puro para os Lazio.
Suspiro, encarando o espelho diante de mim. Açucena começa a apertar o corpete que
mamãe escolheu para eu usar hoje. Estávamos terminando de guardar minhas roupas, já que eu
me mudaria para a mansão San Giovanni hoje mesmo, a fim de estar pronta para a cerimônia no
dia seguinte.
Seria um casamento católico no jardim dentro da propriedade. Eu comecei a pensar se o
padre se negaria a confirmar a cerimônia caso eu dissesse não no altar. Mas, se eu fizesse isso,
com certeza meus pais e minha irmã não sairiam vivos de San Giovanni.
Você não nega nada para os Lazio. A máfia de Tirreno é poderosa e impiedosa. O que
eles querem, eles têm.
Conforme os anos foram passando, papai me contou que os Fiorin sempre foram parte de
Tirreno. Que o bisavô dele já servia ao bisavô de Giacomo. E que a lealdade nos manteve ricos e
protegidos desde sempre. Papai não era um capanga, e sim um contador, e seus serviços eram tão
valorizados que mamãe podia usar joias caras, e Melissa podia ir à Europa duas vezes por ano.
“Seu casamento com Klaus é um pequeno preço para fazer sua família feliz”, ele disse, e
eu precisei segurar o vômito diante das palavras.
Senti o toque confortador de Açucena sobre meus braços. Ela alisou de cima para baixo,
e volveu, como se quisesse me consolar. Eu sorri, triste, para ela através do espelho.
Eu tinha vinte anos, e nunca troquei sequer um beijo com outra pessoa. Eu fui educada
em casa, sem contato com garotos, além de um primo que vinha ocasionalmente visitar. Quando
Melissa trazia os amigos, eu era trancada no quarto. Nunca tive a chance de viver um amor, e só
sabia que o sentimento existia pelos romances que Açucena contrabandeava para meu quarto,
junto com pilhas para uma pequena lanterna que ela me deu para que eu pudesse ler de
madrugada.
Tudo foi roubado de mim, até então. Minhas escolhas e até minha virgindade seria dada
para Klaus Lazio, um homem que nunca se poupou de viver todas as emoções que a vida podia
proporcionar.
Eu sabia o que ele fazia porque Melissa me contava. Ele viveu cada um dos seus trinta
anos como se não houvesse um amanhã. E eu não podia fazer nada além de manter silêncio sobre
suas ações, já que você não discute sobre um dos principais membros da máfia italiana.
Melissa se jogou sobre a cama, puxando um vestido colorido da mala, e o observando. Eu
sabia que ela queria ficar com ele, e deixei que o pegasse. Não me importava.
— Sabe o que seria incrível? — Açucena murmurou baixinho no meu ouvido. — Se você
tirasse de Klaus Lazio a chance de roubar seu primeiro beijo. Pena que você tem menos de vinte
e quatro horas para o casamento.
Eu não sei por que ela disse isso. Era um pensamento inédito para mim, provocar Klaus
e, talvez, se eu tivesse muita alegria, fazer com que ele anulasse o casamento por eu não ser a
noiva pura que ele queria.
Mas, para isso, eu não poderia parar em um beijo.
E para isso, eu teria que encontrar um cara corajoso o suficiente para aceitar me tomar
antes de meu noivo.
Era um pensamento imoral e sórdido.
E perfeito.
Eu podia ser corajosa uma única vez. Eles me roubaram tudo, até minhas escolhas, essa
vingança seria absurdamente satisfatória.
Um som na porta me fez volver para a entrada. Papai apareceu no meu quarto, o sorriso
de orelha a orelha. Ele estava tão feliz em ter esse laço com os Lazio. Senti lágrimas nos olhos,
mas as recusei, o pensamento de que ele não se importava de estar vendendo a própria filha me
tomando com força.
Quando eu tinha quinze anos, tomei coragem e perguntei para ele se podia tentar me
salvar do meu destino como fez a Melissa. Ele me deu um soco tão forte no rosto pelo meu
atrevimento que, durante semanas, eu fiquei com a face roxa. Na época, ele pediu desculpas e
disse que jamais faria isso de novo. Não porque se arrependia, mas porque não podia danificar a
mercadoria.
Realmente, ele nunca mais me bateu no rosto. Suas agressões passaram a serem no corpo.
Meu pai não me amava. Minha mãe me humilhava constantemente. Melissa não fazia a
menor questão de fingir que tinha qualquer apreço por mim.
Mais uma vez eu pensei sobre provocar uma guerra com os Lazio. Mais uma vez, pensei
sobre como Klaus reagiria ao não ter a noivinha virgem e pura que deseja.
Eu não sabia direito o que acontecia entre um homem e uma mulher, mas sabia que, na
perda da virgindade, há dor e sangue. Então, se eu tirasse de Klaus o direito de me sangrar e me
machucar, teria ao menos um único momento de felicidade.
— Está pronta, Melina? Vamos todos para San Giovanni, nos preparar para amanhã. —
Ele volveu para a filha mais velha. — Melissa, meu amor, você já arrumou suas coisas?
— Sim, papai.
— Será a garota mais linda da cerimônia, com aquele vestido claro — disse para ela,
ignorando-me.
Minha irmã havia escolhido um vestido creme, quase branco, para o casamento. Ela
jamais aceitaria não ser o centro das atenções, mesmo durante a cerimônia.
— Melina — meu pai se aproximou, me puxando pelos ombros e me encarando
seriamente. — Amanhã você será a esposa de Klaus Lazio. Não faça nada que atrapalhe essa
honra. Será uma boa menina, uma esposa obediente, como foi educada a ser. E dê muitos filhos a
ele. É para isso que ele a quer.
Assenti.
Papai saiu depois disso, seguido por Melissa. Açucena também se foi, me deixando
sozinha com meus próprios devaneios. E não eram os melhores pensamentos. Mais uma vez,
pensei que não seria nada mal arrancar dos Lazio o direito a uma virgem comprada.
Mas, como eu faria isso, meu Deus?
2

uando eu tinha dez anos, coloquei meus pés em San Giovanni pela primeira vez para ser
Q vendida. Dez anos depois disso, eu estava de volta, para me tornar a esposa perfeita de um
desgraçado.
Não me importava quem fosse Klaus Lazio. Ele podia ser bonito como os anjos, ou gentil
como os santos, mas a verdade é que era apenas mais um membro da máfia que se beneficiava
com o tráfico e o contrabando para ter dinheiro e poder.
Eu me sentia a pior das criaturas enquanto caminhava pelos corredores. Havia um
montante de guardas circulando, todos armados, e a forma como eles me olhavam, com uma
malícia mal contida, me dava a sensação de que eu estava exposta como uma ovelha no
matadouro.
Um dos homens indicou o caminho. Papai, mamãe e Melissa caminhavam alegremente
ao lado do homem, comentando sobre como tudo era perfeito, e como eles viram a beleza dos
ornamentos que a propriedade estava recebendo para o casamento. O homem não respondia,
apenas assentia, como se ele não tivesse tempo para conversas fúteis.
Subitamente, paramos diante de uma porta. O homem a abriu e fez um sinal para que
entrássemos. Era um enorme quarto, preparado para mim na noite que antecedia o casamento.
Olhei sem fôlego para a cama, desviando meu olhar do lençol claro que receberia meu sangue em
menos de vinte e quatro horas.
Quando o homem saiu, papai me disse:
— Seu primo Marco estará aqui amanhã, e trará o resto do seu enxoval. Por hoje, tudo
que precisa está nas malas. — Ele caminhou na minha direção, e pôs as duas mãos no meu
ombro, segurando firme. — Amanhã você deixa de ser uma Fiorin, para se tornar uma Lazio.
Mas, nunca deixará de ser uma Fiorin. Não me decepcione, Melina. Você nunca foi a filha
perfeita, mas se esforce para não ser, ao menos, a filha que me envergonhe.
Eu não respondi porque não havia respostas. Suspirei quando papai se afastou, e
caminhou até mamãe e Melissa, que estavam arrumando minhas roupas no armário. Elas
comentaram novamente que meus perfumes ficaram nas malas que Marco traria, e eu pensei no
meu primo, meu único amigo, provavelmente, e no que ele diria ao me ver prestes a me tornar
um sacrifício.
Marco era o tipo de cara sem amarras, de espírito livre, e que estava ansioso para
conhecer o mundo e viver toda a experiência que podia. Nas poucas vezes que foi nos permitido
ficar a sós para conversarmos, ele me disse que lamentava meu destino.
Talvez por Açucena e ele serem as únicas pessoas que simpatizavam comigo, os
considerava amigos. Mas, Açucena era a criada e nem estaria no meu casamento, e Marco não
poderia fazer nada por mim.
Eu não tinha como escapar.
— Sim, eu sei — ouvi a voz de Melissa ao fundo, e percebi que ela e mamãe estavam
conversando alheias a mim. — Ganharemos muito dinheiro com o casamento. O velho Giacomo
sempre disse que, depois que fosse oficializado, os Fiorin seriam parte da família. Eu imagino
que, como parte da família, enfim ganharei minha Ferrari.
— Uma vermelha — mamãe concordou. — Você merece, meu amor.
— E estou tão ansiosa para uma temporada na Europa. Quero conhecer tantos lugares,
fazer tanta coisa. Ah, mamãe, mal posso esperar...
— Quem sabe você pode até se tornar a favorita de alguém especial — mamãe disse, e
papai riu. Eu não entendi o que eles queriam dizer. — Sabe, ouvi falar em como Klaus Lazio é
generoso sem exigir nada em troca. Soube que ele tem algumas residências luxuosas na Suíça e
em Dubai. Você pode pedir uma para você.
Eles conversavam como se eu não estivesse aqui, prestes a ser entregue em casamento
por um homem que eu não conhecia. Suspirei alto, tentando chamar a atenção de mamãe, para
que ela me desse o mínimo de apoio, mas foi papai que me respondeu:
— A vida não é tudo sobre você, Melina. Sua mãe e sua irmã tem direito de pensar em
como vão viver após sua saída de nossa casa.
Estou chateada em como eles não se importam. Eu só queria que minha mãe conversasse
comigo um pouco, me preparasse para o dia seguinte. Mas, ela nem me olha. Eu sempre fui
muito apegada a ela, sempre tentei chamar sua atenção, mesmo que um pouco, porque sempre
senti tanta vontade de receber seu amor, mas Lucia Fiorin nunca tinha tempo para mim.
Subitamente, um som na porta. Eu a vejo se abrindo e posso ver um velho mordomo
aparecendo em seu uniforme formal e sério.
— Boa noite. Eu me chamo Ângelo e sou o mordomo que cuidará das suas necessidades
nessa noite. Gostaria de informar que o jantar estará servido às sete e meia.
— Teremos a presença de alguém da família Lazio? — papai indagou, e meu coração
bateu forte pensando em como seria conhecer Klaus.
— Infelizmente estão todos ocupados.
Ocupados para receber a noiva? Eu estava saindo de um lar sem amor, para entrar em
outro, de igual frieza.

✽ ✽ ✽

Minha família comeu a refeição como se fosse um manjar dos deuses. Todavia, eu mal
toquei na carne, o garfo balançando sobre o prato sem que eu conseguisse engolir nada.
Havia um bolo na minha garganta, uma vontade louca de vomitar conforme as horas
passavam.
— Está tão quieta — surpreendentemente, foi Melissa que notou meu silêncio. — O que
está tramando?
— O que eu poderia tramar? — devolvi, sem pensar.
Percebi o olhar furioso de papai.
— Se você se atrever a fazer alguma bobagem, eu a mato, Melina — ele murmurou,
ameaçador, e eu sei que me bateria para mostrar sua seriedade se não estivéssemos cercados
pelos criados da máfia Tirreno.
Eu era um objeto que podia apanhar ou ser vendido sem qualquer culpa. Se eu pudesse
vomitar agora, eu o faria. Em cima da mesa, em cima da comida que eles tão felizes degustavam.
Eu queria que eles vissem o que faziam comigo, mas eu não tinha escolha a não ser manter
silêncio.

✽ ✽ ✽

Às nove horas, enfim fiquei sozinha em meu quarto. Sentada sobre a cama, meus olhos
fixados na parede oposta, observando um quadro a óleo de uma camponesa no campo. Uma
pobre camponesa, que provavelmente precisava trabalhar para viver e, ainda assim, livre, talvez
até amada, coisa que jamais fui, e jamais seria.
Repentinamente, me levantei.
Eu nunca tive uma escolha, mas talvez tivesse uma nessa noite. Talvez tentar fugir, e ser
baleada e morta. Ou talvez me oferecer a um dos homens da Tirreno, e tirar de Klaus sua noiva
virgem, e dar a minha família a vergonha que mereciam.
Caminho até a porta.
Eles estavam me oferecendo em sacrifício sem qualquer culpa. Por que eu teria que sentir
qualquer sentimento?
Levo a minha mão a maçaneta. Experimento, imaginando se irá abrir. Acredito que está
trancada, e isso me impediria de cometer uma loucura, mas quando a porta se abre, eu sei que
posso agir.
É meu direito. Uma única vez, ser dona de mim mesma.
Vou para o corredor. Luzes laterais iluminam muito pouco o corredor.
No dia seguinte, eu seria estuprada por Klaus, porque é esse o nome que se dá a uma
mulher submetida sem sua vontade por um homem. Mas, ele não precisava me roubar tudo.
Começo a caminhar. Vou me oferecer ao primeiro homem que encontrar. É loucura e ele pode
me recusar. Não importa, porque vou insistir. Uma vez Melissa disse que nenhum homem recusa
uma mulher que se esfrega nele. É isso que vou fazer.
Repentinamente, eu vejo um homem no corredor. Ele está sob a semiescuridão,
observando o jardim por uma das janelas laterais. Ele tem um copo de bebida na mão, e parece
completamente absorvido por pensamentos.
Ele é bonito. Não parece assustador. Eu me aproximo. Sinto que se passam horas até ele
girar o rosto na minha direção. Ele me encara, e percebo que seus olhos são absolutamente
pretos. Ainda assim, há um brilho enquanto ele me estuda.
— Você... — ele murmura. — O que está fazendo fora do seu quarto?
Me conhece? Claro que sim, todos os guardas devem ter me visto quando cheguei.
Estou perto das lágrimas. Sombras dançam na escuridão lá fora, fruto do vento forte que
balança as árvores.
— Sou Melina Fiorin — digo a ele.
O homem assente.
— Eu sei.
— Amanhã serei dada em casamento ao seu chefe. Nunca tive um homem, nunca me
aproximei de um além do meu primo e de meu pai. Estou apavorada, triste e desesperada. Então
eu peço que me tome nessa noite, para me livrar da obrigação de agradar o tal Klaus Lazio.
Imagino que seja leal a ele, não me importa. Jamais contarei a qualquer pessoa quem me
desvirginou, apenas quero destruir as esperanças dele de ter uma esposa pura e virgem.
Eu fui brutalmente sincera e esperei que o guarda aceitasse minhas palavras com respeito,
mas ele soltou um riso profundo diante delas.
— Klaus Lazio não se importa se você é virgem. Ele não valoriza uma mulher pelo
hímen. Isso era coisa de seu pai Giacomo, que não aceita que a nora não seja a mais pura das
mulheres.
Repentinamente, ouço passos e risos no corredor. São vozes femininas, e entro em
desespero, imaginando que serei pega na minha empreitada. Se meu pai souber, ele vai me
espancar. Não seria a primeira vez, e apanhar dói.
Então, simplesmente seguro nas mãos do homem e o puxo em direção ao meu quarto. Foi
algo automático, não acho que ele esperava isso, mas ele não tentou resistir. Rindo, ele me
seguiu, como se meu pânico e meu desespero fosse algo engraçado.
— Você derrubou minha bebida — ele comentou, quando entramos, me mostrando o
copo vazio. — Ah, eu queria ter, ao menos, a desculpa de estar bêbado para entrar nesse quarto
com você, Melina. Mas, nunca fui o mais esperto dos homens, nem o mais disciplinado.
Eu queria responder alguma coisa diante de suas palavras, mas então o homem grande
segura meu rosto, e me puxa contra si.
O primeiro beijo de minha vida é também o de minha perdição.
3

reciso dizer que ele é bonito. Talvez o homem mais bonito que já vi. Não que eu tenha visto
P muitos homens, mas assistia novelas e via filmes às vezes, e sabia a diferença entre um
homem bonito e um feio.
Esse guarda... ele realmente agradava aos olhos.
Era grande. Muito grande. Bem mais alto que eu, seus ombros eram largos e seus braços
tão musculosos que possivelmente poderiam me esmagar, se ele quisesse. Esse pensamento não
me trouxe o pânico que acreditei que fosse sentir.
Talvez porque, apesar do tamanho, a forma como ele me olhava me trazia algo além do
medo.
Ele me beijou. De novo. E outra vez. Algo foi se formando no meu íntimo, algo além do
desespero da situação.
O homem me afastou um pouco, a fim de respirar. Eu o encarei, simplesmente atendo-me
melhor em seu rosto. Eu o havia visto sobre a semiescuridão, e não pude decifrar muito naquele
momento, mas agora podia ver como seu queixo era quadrado, e como uma rala barba se
formava no rosto, como se ele houvesse se esquecido de se barbear nessa manhã. Eu levantei
minha mão e toquei seu queixo, apenas para sentir como os pelos espinhavam meus dedos.
Ele sorriu sobre minha observação.
— Você realmente é uma princesinha, Melina — murmurou. — Então quer foder a
cabeça de Klaus Lazio, apenas para que ele não tenha uma noiva virgem?
— Quando ele se deitar comigo e perceber que já sou usada, não vai me querer —
reafirmei minha ideia para ele.
— Usada? — ele repetiu a palavra, arqueando as sobrancelhas pretas para cima, como se
fosse uma palavra engraçada. — Talvez Klaus nem se importe com isso quando ver você, tão
pequena, perfeita, delicada... talvez ele se apaixone perdidamente — me disse, e eu neguei as
palavras.
— Soube que ele é um homem de muitas mulheres. Dizem que ele tem um harém.
O guarda soltou outra gargalhada diante das minhas palavras.
— Dizem isso? — indagou, como se a informação fosse nova para ele.
— Dizem.
— Realmente, ele merece que sua noiva seja desvirginada antes do casamento —
murmurou, se aproximando de novo, sua boca tocando a minha.
Eu gostava quando ele me beijava. Parecia loucura, eu nem sabia o nome dele, mas
gostava de como ele deslizava os próprios lábios sobre os meus, gostava da maneira como ele
suspirava antes de se afundar na minha boca.
Uma confusão de um calor molhado começou a se formar no meu estômago. Eu queria
muito algo que eu não entendia, mas meu corpo parecia conhecer antes mesmo de mim. Então,
simplesmente deixei que ele me levasse até a cama. Me deitei sobre ela, diante do olhar
predatório do guarda.
Encolhi ao perceber a forma como ele me observava silenciosamente, o rosto absorvido
em algo que eu não sabia o que era.
Não importava os conflitos internos do guarda. Só precisava que ele rompesse meu selo
de virgindade. Que fosse rápido ou vagaroso, não interessava. Apenas, no final dessa noite, eu
devia sangrar. E, então, no dia seguinte, destruir os planos de minha família e dos Lazio.
Eu não era mais uma ovelha. Não era mais assim que eu me sentia. Eu me tornei um lobo
diante da minha própria natureza. Mesmo que me matassem depois disso, não interessava. A
única coisa que me bastava era deixar de ser uma incubadora perfeita, e um passe livre para o
lucro de meus pais, o pagamento da vida perfeita de Melissa na Europa.
Que ela mesma se vendesse se quisesse tanto ir. Eu não mais seria sua moeda de troca.
Se eu tivesse sorte... se Klaus Lazio se apiedasse de mim – era difícil acontecer, mas
podia acontecer, pelas palavras que o guarda me disse – talvez eu pudesse ir embora. Não
conhecia nada do mundo, mas estava mais que disposta a enfrentá-lo. Qualquer coisa era melhor
que a vida de prisão que tive até então.
— Melina — o homem disse, num ronronar grave, e isso me fez voltar a cena do quarto.
Meus devaneios foram abandonados enquanto eu me focava na forma como ele me encarava.
— Sim?
— Eu vou tirar sua roupa — ele disse.
Fiquei um tanto surpresa com a ideia. Não sabia que precisava tirar minha roupa para que
eu fosse desvirginada. Na verdade, eu nem sabia como ele faria isso. Contudo, era a ignorante
aqui, e aceitei que ele fizesse da forma que achasse melhor.
Ele deslizou seus dedos grossos entre meus pés. Depois, pegou meu pé direito, e o
ergueu, levando-o até a boca. Ele beijou-me ali, e eu arqueei as sobrancelhas diante desse
momento estranho.
— Diga-me o que está sentindo — ele pediu.
— Cócegas? — meio informei, meio perguntei, incerta.
Ele riu de novo. Não era forçado, era apenas divertido, e toda vez que ria, eu me sentia
um pouco mais tranquila.
As mãos dele deixaram meu pé, e subiram pelas minhas pernas. O toque firme e
carinhoso dessa vez não me fez cócegas e sim despertou algo que me tirou o oxigênio. Eu
suspirei pesado antes de balançar minha cabeça para trás, tentando respirar novamente.
Eu soltei uma pequena exclamação quando suas mãos chegaram nas minhas coxas,
erguendo meu vestido. Ele tinha um sorriso estranho no rosto, um enfeite desconhecido que me
arrepiou inteira.
— Você é tão macia, pequena Melina.
Mais alguma coisa se agitou em mim. Eu não sabia o que esperar, mas entendia que ele
estava exercendo algum tipo de domínio sobre mim, criando algo, um laço invisível que me
deixava mole e... molhada.
Seus dedos seguraram a ponta do meu vestido. O guarda cravou o joelho entre minhas
pernas, e se inclinou sobre mim, enquanto lentamente puxava meu vestido para cima. Me sentei,
o interrompendo, subitamente nervosa porque ele veria coisas que ninguém nunca viu.
— Ah, querida... não tenha vergonha... Olhe — ele levou as mãos para a própria camisa,
abrindo a fileira de botões. Minha boca secou enquanto ele ia abrindo, seu peito se revelando
diante dos meus olhos. — Também vou me mostrar para você, pequena Melina...
Ele arrancou totalmente a camisa. Eu basicamente cravei meus olhos no seu torso,
aqueles gomos perfeitos no abdômen, os músculos perfeitamente alinhados na sua pele. Eu
gostei de ver, não sei porque, mas gostei de ver. Então, meus dedos se ergueram e eu o toquei,
porque queria sentir a textura da sua pele.
Era tão firme. Duro. Era diferente de mim, já que eu tinha seios e minha pele era bem
mais macia. Eu nunca toquei ninguém antes, e estava fascinada.
— Viu? Não precisa ter vergonha. Somos apenas dois seres humanos se tocando pela
primeira vez. E eu estou encantado com o quanto você é doce e bonita. Estou louco para te tocar,
para... — repentinamente ele puxou meu vestido para cima. Foi muito rápido e eu quase não tive
tempo de me proteger. Estava apenas de calcinha e não usava sutiã, e puxei de imediato minhas
mãos para proteger meus seios de sua visão, mas ele as removeu diante dos montes. — Quero te
tocar aqui — contou.
Eu caí para trás, olhando para o teto, enquanto o guarda subia em mim, sua boca tomando
meus mamilos. Eles estavam tão duros, e eu gemi de dor e... de outra coisa... quando ele chupou.
Meu coração estava acelerado. Sabia que fui eu mesma que provoquei a situação, mas
comecei a ficar apavorada com o tanto de sensações que ele estava despertando.
— Melina... Melina — ele repetiu, o bico do meu seio esquerdo entre seus dentes. —
Olhe para mim, Melina... Olhe como eu chupo você... Você gosta?
Com esforço, olhei para baixo. Os olhos do guarda tomaram os meus, quando ele
começou a me mamar. Eu gritei, não um grito de medo, mas um grito esganiçado, quase
desesperado, de prazer. Ele sorriu, seus dedos indo até minha boca, raspando nos meus lábios,
como se quisesse sentir meu som em sua pele.
— Você gosta de ser chupada, não é querida?
Suas mãos acariciavam minha barriga. Depois subiram e seguraram meus dois montes
gêmeos. Ele os apertou, e eu comecei a gemer diante da sensação. Comecei a me remexer diante
dele, implorando por algo, mas não sabia o que era.
— Incrível como nunca foi tocada antes, e ainda assim seu corpo parece ansiar por todo
toque.
Uma das suas mãos deixou meus seios e desceu. Seu indicador entrou dentro da minha
calcinha, e eu precisei segurar seus ombros, meus olhos arregalados enquanto ele deslizava o
dedo entre minhas pernas.
A sensação foi tão poderosa que eu senti todo meu corpo vazando em sensações
poderosas. Contudo, logo ele o retirou, mostrando a umidade deslizando entre seu indicador e
seu polegar.
— Sabe o que é isso? — ele me mostrou a gosma. — Isso é tanto que você está me
querendo.
— Eu... não sei... não sei por que estou assim.
— Melina, sua reação é apenas feminina e me dá prazer — ele murmurou, sua explicação
aliviando um pouco minha mente perturbada.
O guarda se pôs de joelhos. Suas duas mãos seguraram minhas coxas, e ele as abriu,
revelando meu centro molhado, minha calcinha marcada de desejo. Reprimi minha vergonha,
meus olhos fixos nele, em como ele parecia selvagem e faminto por mim.
— Eu acho melhor você fazer logo — disse, porque o que ele estava despertando parecia
mais a perdição do que a fria finalização dos planos de meus pais.
— Você já viu um pau? — ele indagou, e eu achei a pergunta tão estranha que fiquei sem
saber o que responder.
Já vi muitos paus no bosque perto de casa. Não sabia o que ele queria dizer.
Repentinamente, então, meus olhos se arregalaram quando ele abriu o zíper da calça e
remexeu nela. Eu me ergui com os cotovelos, observando uma coisa grande e de cabeça
vermelha aparecendo entre nós. Minha boca abriu, incrédula, porque nunca havia visto o que os
homens tinham dentro da calça. Claro, já havia reparado que o conteúdo deles nas calças parecia
mais volumoso que os das mulheres, mas nunca pensei que fosse aquele negócio.
— Isso é um pau, um caralho, um pênis. É com ele que eu arranco sua virgindade. Eu o
meto em você, dentro do seu buraco — ele levou a mão até meu centro, e me apertou,
despertando outro gemido. — Isso que você tem entre as pernas é a vagina, uma bocetinha
deliciosa. É com ela que você faz sexo, faz amor, e é com ela que você daria os filhos de Klaus.
Você entende o que estou explicando?
Eu sabia muito pouco sobre sexualidade, coisas que Açucena me explicava brevemente
escondida. Ainda assim, assenti.
— Se eu não fizer você molhar mais, se eu não te estimular, quando entrar em você, vou
te machucar, te rasgar inteira. Meu pau é muito grande, é maior que o da maioria dos homens,
mas eu sei fazer de um jeito que as mulheres gostam.
Uma parte de mim ficou feliz por ser ele. Porque se fosse no dia seguinte, com Klaus,
podia ser não só detestável, como incrivelmente doloroso. Eu pouco conhecia meu próprio
buraco, mas sabia que não era largo o suficiente para receber uma coisa daquele tamanho.
Então simplesmente fechei meus olhos, permitindo que ele fizesse o que quisesse.
Contudo, por alguns segundos que pareceram séculos, ele simplesmente não se mexeu. Foi
quando abri meus olhos novamente, o encarando.
— Essas marcas que têm no corpo? — ele indagou, deslizando as mãos sobre lesões
antigas que meu pai provocou. — O que é isso?
O que eu devia dizer? Que durante toda minha vida, papai e mamãe me espancavam
quando se irritavam? Que eles me consideram burra e indesejável? Que durante toda minha vida
eu fui apenas um instrumento para meus pais? Que eu nunca fui amada por aqueles que me
geraram?
Era uma verdade dolorosa demais para ser colocada em palavras.
— Não quero falar disso — pedi, e ele pareceu me estudar alguns segundos antes de
dizer:
— Seus pais nunca pensaram que estavam danificando a mercadoria de Klaus?
— O rosto está intacto. O corpo... bem, eles nunca olharam para ver as marcas debaixo
das roupas.
Eu odiei a sensação de dor que insistia em explodir no meu peito. Uma parte de mim
queria apenas chorar. E foi com esforço que eu segurei as lágrimas quando as mãos dele me
acariciaram como um conforto.
Era a primeira vez que alguém me tocava assim.
O guarda volveu novamente para meus lábios, trocando um beijo gentil. Era tão bom que
eu simplesmente me deixei ficar, enquanto a boca acariciava, confortava e, por fim, excitava.
— Melina... eu te prometo, ninguém mais vai te machucar. Eu juro.
Era uma promessa que um simples guarda como ele jamais devia fazer. Ainda assim, eu a
recebi com empolgação, sonhando que, ao menos nessa noite, ele e eu tínhamos um vínculo mais
forte do que o sexo forçado a fim de me livrar da virgindade.
4

guarda acomodou sua cabeça entre minhas pernas. Seus cabelos negros fizeram cócegas
O em minhas coxas. Ele havia acabado de retirar minha calcinha, e eu estava envergonhada
pelo olhar que ele me deu.
— O que está fazendo? — indaguei, porque era algo que não esperava.
Bom, eu não sabia o que esperar dessa noite, mas com certeza ver o guarda com a cabeça
entre minhas coxas não estava nos meus pensamentos.
— Já te disse — ele murmurou. — Quero te molhar mais.
Engasguei quando ele baixou a boca para meu centro, sua língua correndo entre minhas
dobras. Eu senti uma pontada de prazer tão forte que choraminguei em desespero, forçando
minha vulva nele, apenas para apertá-lo mais.
A ponta do seu nariz deslizou entre meus lábios, e eu me senti contorcer com a sensação
daquela parte dura batendo contra meu clitóris. Meus olhos estavam fechados, eu vivia as
sensações, absolutamente absorvida. Quando, enfim, abri meus olhos para ver a cena, o percebi
me encarando, como se estivesse bebendo mais que meu sexo, e sim minhas expressões.
— Sua bocetinha é tão doce quanto mel, Melina... Eu quase posso sentir açúcar na
boca... — Ele chupou mais forte, e me senti vazando em ondas quentes.
Me contorci para trás, enquanto a cabeça dele se movimentava cada vez mais
intensamente. Eu queria gritar, mas não podia fazer isso, não sem o risco de chamar a atenção de
alguém que pudesse estar passando no corredor, enquanto simplesmente levei minhas mãos até
minha boca, para tentar impedir meus gemidos.
Não foi possível. Eu gemia como se estivesse sentindo dor, mas não era dor que poderia
definir a sensação. Era algo tão intenso, tão puramente selvagem, que não havia palavras.
— Estou pensando, Melina... você quer mesmo dar a mim essa bocetinha gostosa?
Talvez eu deva apenas chupá-la e deixá-la pronta para Klaus. Seria uma maldade com seu futuro
marido não deixá-lo fodê-la com você sabendo quem ele é.
— Não me importa quem ele é — eu recuso. — Ele é só um bandido. Um sociopata com
muitas mulheres.
Era o que eu sabia sobre ele. Um homem sem princípios, cheio de amantes. O guarda
pareceu travar diante das minhas palavras, como se estivesse estudando-as. Como ele conhecia
Klaus, imaginei que estivesse ciente de que tudo que dizia era verdade. Então, sem aviso, ele
voltou a chupar, me balançando para frente e para trás contra sua face.
Ah, eu estava cavalgando contra sua boca. Que coisa louca era isso?
Era vergonhoso, mas não conseguia impedir. Então agarrei seus cabelos, enquanto
forçava mais meu centro contra ele. Foi quando as ondas se tornaram mais e mais altas, e eu
comecei a saltar de um abismo de paixão que não conseguia definir.
— Você está tendo um orgasmo, querida — ele murmurou. — É assim que se chama.
Está gozando, sua boceta está vibrando contra minha boca.
— Por favor — eu gritei, porque não queria que ele parasse para explicar nada. Só queria
que ele continuasse, e não deixasse que nada interrompesse esse momento.
Repentinamente, ele me deixou. Sua boca subiu, buscando pela minha. Eu aceitei seu
beijo intensamente, retribuindo o tanto que ele me deixou quente e feliz. Pela primeira vez, meu
corpo inteiro vibrava de uma sensação que me permitia me sentir mulher.
— Agarre minha cintura com suas pernas, Melina — ele me instruiu, me ajudando a
levantar as coxas. — E agora olhe para mim. Olhe bem para meu rosto. Quero que esteja
completamente ciente de quem está comendo você.
Obedeci. Eu sentia um vergonhoso prazer quando ele me dava ordens duramente.
O guarda se mexeu sobre mim, sua mão pairando entre nossos corpos. Eu percebi que ele
estava pegando seu pau, e a umidade em mim voltou. Por mais que eu tivesse acabado de ter um
orgasmo, eu sentia falta de outra coisa, como se fosse um buraco na minha alma.
— Querida Melina... Sua bocetinha está implorando pelo meu caralho. Olhe para baixo,
olhe como ela pinga sobre meu pau — ele esfregou a cabeça dura e vermelha entre mina fenda e
minha umidade cobriu a ponta arredondada.
Subitamente, sua mão segurou meu queixo, me fazendo encará-lo novamente. Como as
luzes estavam acesas, eu podia ver novamente o brilho negro de seus olhos. Ele sorriu, antes de
me beijar como se eu fosse a coisa mais preciosa desse mundo.
Agarrei-me nele, enquanto o guarda continuava a esfregar a cabeça latejante contra minha
boceta. Eu precisava tanto que ele entrasse, que tentei forçar meu corpo para cima, mas ele se
afastou brevemente.
— Sua safadinha — ele murmurou, rindo.
E o insulto me queimou. Eu queria que ele dissesse coisas piores sobre mim, que ele me
xingasse. Ficaria feliz que ele o fizesse. Mas, o guarda interrompeu meus pensamentos, quando
seu quadril desceu com força sobre mim. Ele ergueu minhas coxas ainda mais, abrindo espaço.
Não posso dizer que a sensação foi de prazer. Ao contrário, era como se ele estivesse me
rasgando enquanto me alargava com seu cacete. Trocamos um olhar, eu mal conseguia respirar,
enquanto ele enterrou-se até o talo. Então, ele parou, como se quisesse me deixar acostumar com
a sensação.
Apesar da ardência, e do quanto queimava, eu achei o gesto completamente gentil.
Lágrimas transbordaram em meus olhos, não sei se de gratidão, ou de dor. O guarda me encarou,
como se quisesse me permitir saber que estava tudo bem eu chorar.
— Tente relaxar, Melina... — Ele afastou um pouco os quadris, e então voltou
novamente.
Eu soltei uma exclamação, em choque.
— Ah, linda, linda... você é tão linda... — ele girou os quadris de novo, ondulando, e
então seu pau duro esfregou sobre meu clitóris no processo.
Eu gemi, o som quase saindo manhoso.
— Você gostou, Melina? Você gosta tanto quando eu bato no seu grelo, né?
Ele ondulou de novo, e de novo. A cabeça grossa de seu pau me fazia prender a
respiração toda vez que entrava, e então eu respirava de novo, gemendo, quando ele se afastava,
apenas para voltar com mais força.
Nunca pensei que viveria tal sensação erótica. E a dor foi acalmando em cada investida,
até se tornar um prazer intenso sobre os balanços de nossos corpos.
— Ah... — eu gritei, quando enfim, senti a sensação de gozo.
O guarda puxou meu rosto e trocamos outro beijo. Era uma loucura, certamente, mas era
a melhor loucura que já vivi.
5

— A hmais
— o guarda gemeu alto, parecendo se libertar enquanto avançava e recuava cada vez
rápido. — Você é tão apertada... ah, tão apertadinha... sua bocetinha é tão estreita
que está espremendo meu cacete... Tão gostosa, tão gostosa...
A forma como ele dizia, me deixava cada vez mais quente. O guarda se arqueou sobre
mim, rosnando, e me pegou para mais um beijo. Eu já perdi as contas de quantos havíamos
trocados nessa noite.
Gemi alto, enquanto erguia meu quadril para ele, indo de encontro ao seu próprio
movimento. Ele riu com meu movimento. Pareceu entender algo que eu mesma não era capaz de
captar. Então, para minha surpresa, o guarda parou, travando o movimento, apenas para me ver
agoniada, enquanto tentava buscá-lo.
— Me diga o que você quer — exigiu, e eu enrubesci porque não sabia se era capaz de
expressar em palavras o montante de sensações que me tomavam.
— Preciso de você — disse.
— De que jeito?
— Preciso... que não pare — minhas unhas se cravaram nos ombros dele, num puro sinal
de agonia. — Preciso que... bata... bata seus quadris em mim.
Ele soltou outro riso satisfeito. Inclinou-se, e me beijou de novo, sugando minha boca
com força. O guarda ainda não me deu o que busquei, então pressionei minha boceta contra ele,
forçando seus golpes.
— Diga com as palavras mais selvagens que puder — ele disse. — Eu quero ouvir o
quanto você precisa de mim.
Eu estava à beira das lágrimas. Vergonha me tomava de muitas formas, mas não havia
mais como voltar atrás, então eu simplesmente gritei, usando as expressões que ele mesmo me
ensinou nessa noite:
— Quero que me foda! Quero que bata seu pau na minha boceta! Quero que ondule em
mim, que me faça sentir cada veia do seu caralho esfregando na minha entrada. Me dê isso!
Agora!
Meus olhos giraram para trás, enquanto eu tentava manter meu cérebro funcionando. A
forma como o calor do guarda avançou, fazendo meu corpo inteiro se tornar um pedaço de carne
sensível a cada pedaço dele, me levou à beira de um abismo.
— Oh, sim... sim... — eu apontei, quando ele começou a bater fundo naquele ponto
mágico, algo que eu nem era capaz de saber que existia antes dessa noite.
Meu corpo enrijeceu quando cheguei ao lugar mais elevado da alma. Ele fodeu com
força, soltando pequenos sons de satisfação enquanto batia ritmado contra mim. E então eu me
tornei puro êxtase, felicidade e prazer.
— Ah! — o guarda gemeu, e seu músculo grosso e pesado se tornou mais duro, enquanto
ele murmurou meu nome e teve um espasmo. Repentinamente, eu me senti molhada com algo
mais que meu próprio líquido.
O guarda ergueu meu quadril, derramando dentro de mim, se elevando o suficiente para
assistir enquanto seu gozo me inundava, vazando da minha entrada e descendo pelos meus pelos,
caindo na cama.
Foi tão quente que eu comecei a gozar de novo, rebolando contra ele apenas para receber
mais. Ele bateu duas ou três vezes depois disso, tremores secundários nos recebendo enquanto
sentia que o momento estava finalizando.
Foi incrível. Foi a coisa mais louca e satisfatória que eu já vivi. Eu só queria ficar
vivenciando isso para sempre, mas conforme a aura do sexo foi se findando, eu fui-me dando
conta do que seria minha vida a partir de agora.
Talvez eu não sobrevivesse depois de Klaus descobrir que eu não era mais pura. Uma
parte de mim esperava que ele me matasse, isso me aliviaria do horror que meu pai faria quando
eu fosse devolvida por indignidade. Ainda assim, eu estava tão feliz.
Tão feliz por ter vivido uma única vez. Por ser dona de minhas escolhas, uma única vez.
Eu nem sabia o nome do guarda, mas sabia que ele foi muito generoso comigo nessa
noite, e que ele me salvou de muitas maneiras, mesmo que para ele não tenha sido um ato gentil,
e apenas sexo, algo que o corpo dele pediu muito mais do que seu coração.
Meu olhar cravou nele. O guarda estava retirando seu pau amolecido de mim, seus olhos
observando minha boceta rubra de paixão e sangue. Ele sorriu diante da cena, e eu quase levei
meus dedos até as mechas de seus cabeços escuros para lhe acariciar.
Nesse instante, nosso olhar se encontrou.
Como eu gostava dos olhos negros como a noite que ele tinha. O guarda era tão bonito.
Se eu fosse outra pessoa, e ele fosse outra pessoa, bem que podíamos nos conhecer melhor, e
termos algo além de sexo.
Talvez até amizade.
Porque, uma parte de mim, insistia que ele era doce e gentil.
Isso ficava clamando nos meus ouvidos, como se fosse uma esperança numa existência
carregada de ausência.
— Você está bem? — ele indagou. — Você não é mais virgem — apontou. — Se seu
objetivo era deixar Klaus irritado por não ter uma noiva virgem na noite de núpcias, você
conseguiu.
— Prometo que ele nunca saberá que foi você — disse, enquanto o guarda se afastava.
O homem deu de ombros. Não parecia que estava preocupado com a possibilidade de ser
morto pelos Lazio.
Imaginei que ele fosse se vestir e ir embora nesse momento, uma parte de mim se sentiu
tão triste pelo ato, mas, para minha surpresa, o guarda simplesmente foi até o banheiro. Ele
pegou uma toalha lá e a molhou com água quente.
Com o canto dos olhos, eu o vi torcendo a toalha, e então a esfregando em si mesmo. Ele
limpou o sangue sobre seu eixo e suas coxas, e então jogou a toalha num canto. Eu observei a
cena, um pouco preocupada com o fato de ele não estar preocupado em esconder a toalha.
Como eu explicaria isso no dia seguinte? Bom, eu nem devia estar preocupada. Não
importava, de qualquer forma Klaus saberia, em poucas horas, que eu não era mais virgem.
Depois, ele pegou outra toalha branca. Fez a mesma coisa com ela, molhando-a e
torcendo-a, mas ao invés de voltar para si, ele veio até mim. Fiquei um pouco surpresa quando o
vi empurrando meus joelhos e abrindo minhas pernas novamente. Eu não devia e não estava com
vergonha, apesar da cena de ele limpar meu buraco ser tão íntima.
Não sei por que não me sentia encabulada com ele. Talvez fosse pela sua gentileza
gritante.
— Qual é o seu nome? — perguntei.
Antes, eu não queria saber. Porque não queria ter um nome para ser torturada. Não queria
entregá-lo a ninguém. Mas, uma parte de mim queria ter um nome para minhas lembranças, e
jurei a mim mesma que jamais o contaria a ninguém.
Ele sorriu para mim.
— Querida Melina... Apenas descanse. Amanhã é seu casamento, e será um dia cheio.
Ele estava certo. Sem nomes, sem vínculos.
Então simplesmente me permiti acomodar-me embaixo das cobertas e deixar o sono me
levar.
6

m pouco antes da manhã começar, eu fui acordada pela entrada rápida de uma moça de
U cabelos loiros e olhar intenso no quarto. Eu me sentei na cama, procurando pela presença
do guarda, mas estava sozinha. Só então me dei conta de que estava nua, meus seios à
mostra, e me cobri rapidamente com o lençol, envergonhada.
A mulher erguei a mão, num pedido mudo de desculpas, e me disse em seguida:
— Por favor, continue a dormir. Só vim buscar as coisas no banheiro.
“As coisas” eram as toalhas ensanguentadas e cobertas de porra. Com o olhar espichado,
vi a mulher pegando uma sacola de lixo e colocando tudo rapidamente. Ela saiu tão rápido
quanto entrou, logo em seguida.
Não havia como voltar a dormir tranquilamente, já que esse casamento mudaria tudo. Ou
me daria a morte, ou a liberdade. Eu me levantei rapidamente, procurando o banheiro, pronta
para tomar um banho.
Enquanto a água quente caia sobre meu corpo estranhamente dolorido, comecei a
planejar o que faria a seguir. Diria a Klaus antes de ele me levar ao sexo, ou deixaria que ele me
tomasse e então visse que eu já era usada?
Francamente, não havia uma resposta.
Tinha certeza de que não o veria antes da cerimônia. Não fazia ideia de como era sua
aparência, mas mesmo que fosse um homem bonito, havia uma certeza em mim de que não
queria que outro homem me tocasse além do guarda.
A nudez do guarda me tomou de assalto, e eu fechei os olhos, balançando a fronte e
espantando os pensamentos.
Francamente, esperava nunca mais vê-lo. Até porque, sua vida também estava em risco
depois do que ele fez.
Momentos depois, me sentei em frente a uma penteadeira, usando um roupão atoalhado.
Meus cabelos estavam molhados, então peguei um secador posto ali para secá-los. A penteadeira
tinha tudo que uma garota gostaria de usar, desde maquiagem até joias. Também havia itens de
cabelo como secador, chapinha, babyliss. Nunca tive uma quantidade tão grande de itens ao meu
dispor, e uma parte de mim me permitiu ser mimada por um momento.
Talvez fosse meu único. Talvez o último. Não havia como saber, e não adiantava ter
medo agora. Eu havia feito minha escolha. Não me arrependeria jamais dela.
Nem sei quanto tempo fiquei aqui, olhando as coisas, usando-as. Enfim, quando era perto
das nove horas da manhã, ouço sons no corredor e meu corpo se reteve de ansiedade. Em
seguida, minha mãe e Melissa entram no quarto, conversando animadamente. Elas nem bateram
na porta, simplesmente agiram como se fosse sua casa. Minha cabeça começou a doer com a
quantidade de palavras que elas falavam, sem cessar.
Só houve um breve silêncio quando Melissa estava atrás de mim, olhando as coisas que
trouxeram na noite anterior, para que eu usasse.
— Mamãe... olhe essas joias. Quero ficar com o colar.
— Você o merece muito mais que Melina, meu amor — Lucia concordou, contudo, para
minha surpresa, pareceu pensar melhor logo em seguida. — Mas, hoje, deixe que Melina use. Se
Klaus Lazio mandou trazer essas joias, é porque quer vê-la usando.
— Não vai combinar com ela.
— Eu sei, mas não vamos contrariar Klaus. Você sabe a fama dele?
— Além de ter várias mulheres, inclusive nessa casa?
Melissa sorriu para mim através do espelho. Eu a encarei, sem saber exatamente o que ela
queria dizer, mas não levou muito tempo de dúvida, já que ela, rindo, contou:
— Tem pelo menos duas mulheres que dormem com Klaus Lazio aqui. Suas concubinas.
Você precisa conhecê-las, são tão bonitas. Com certeza, ele sempre as terá em primeiro lugar.
Nossa, que pena para você, Melina, será apenas a barriga dele, para gerar seus filhos. Porque
amor e paixão ele terá de outras.
Eu não sei por que ela estava tão empenhada em me machucar. Suas palavras eram
felinas, insistindo em entoar como um insulto. Estava sentada aqui, agora, porque ela mesma se
recusou a ser esposa de um Lazio. Estava forçada a me manter como um objeto desde que me
lembrava, apenas para que ela pudesse viver todas as emoções da vida.
Desde sempre, fui a preterida, a filha indesejada, apenas uma coisa que meus pais
mantinham para ser o bode expiatório, enquanto a filha de ouro viajava, aproveitava amizades e
se divertia.
E agora, nesse único dia em que a coisa seria sobre mim, ela parecia revoltada pelo fato.
Ah, se ela soubesse... Se ela soubesse que tudo acabaria em desgraça no final do dia. Que
Klaus me mataria pelo insulto, ou mataria nosso pai. Não sei se ela se importava com isso, mas
foi incrivelmente satisfatório perceber que Melissa perderia todo o luxo e dinheiro quando a
máfia de Tirreno percebesse que Toni Fiorin não foi capaz sequer se cuidar da pureza da própria
filha.
Eu precisei esconder um sorriso diante do pensamento. Apanhar desde criança e ser usada
e manipulada me deu uma frieza sem igual quando precisei colocar na balança o risco em que
estava colocando a minha família. Se Klaus me matasse – ainda que apenas a mim – ainda assim,
eu tiraria dos meus pais toda a mordomia.
Se eles também morressem, tudo bem. Eu adoraria o objetivo final.
— Tudo bem ele gostar de outras — rebati, e ela pareceu espantada por eu simplesmente
ter aberto a boca. — Não é um casamento por amor. É muito melhor ele ter várias mulheres e me
deixar em paz.
Elas trocaram um olhar e eu me senti recompensada por isso.
— Colocando as asinhas de fora? — mamãe murmurou. — Oh, não importa. Hoje você
deixará de ser meu problema. Nem vou mais pensar em você.
Dei de ombros.
Eu francamente não me importava mais.
Pouco depois, outras pessoas entraram no quarto. Era um homem que faria meu cabelo, e
ele chegou muito sorridente dizendo que a noiva precisava estar lindíssima nesse dia. A moça
que faria minha maquiagem começou a abrir suas maletas com pinceis na mesa de centro,
enquanto mamãe e Melissa se afastavam para irem arrumar a si mesmas.
— Que lugar lindo esse, não? — O rapaz me comentou, enquanto penteava meus cabelos.
— San Giovanni é um pedaço do paraíso.
— Eu não o conheço.
— Não conhece sua casa? — ele pareceu espantado.
— Sei que é uma mansão escondida entre a floresta e a montanha, mas só estive aqui uma
vez, aos dez anos. Ontem quando chegamos não foi me permitido caminhar.
Ele arregalou os olhos diante da minha confissão.
— Tenho certeza de que amanhã você poderá explorar sua casa — assegurou, como se
quisesse me dar forças. — Ah, já fiz o cabelo de muitas mulheres aqui na mansão San Giovanni.
Mas você com certeza é a mais bonita que já vi — ele disse, e eu sabia que estava mentindo.
Especialmente porque Melissa soltou uma gargalhada carregada de deboche.
— Muitas mulheres? — mamãe a cortou, indagando ao rapaz. — Concubinas?
— Sim, Giacomo tinha muitas. Mas, eu fazia especialmente os cabelos de Valkíria, a
esposa. Antes de falecer, ela era a luz da vida de Giacomo Lazio. Ah, nem me apresentei — ele
volveu para mim. — Sou Tomasso. E você, minha futura rainha dessa casa?
Ele era tão gentil. Não conhecia homens como ele, cheio de sensibilidade, e me senti
segura como a muito não me sentia.
— Sou Melina.
— Que nome lindo.
— Era o nome de minha avó.
Eu pouco a conheci. Ela morreu quando eu tinha sete anos, e pensei em como minha vida
teria sido se ela não tivesse falecido tão jovem, aos cinquenta anos, de câncer. Na época, lembro-
me de ela me dar atenção. Não sei o montante de atenção que recebi, mas sabia que era mais do
que minha mãe ou meu pai me davam, então eu tinha uma saudade descomunal dela.
— Eu sou Beatrice — a outra mulher se apresentou. — Também trabalho maquiando as
mulheres daqui. Preparei uma maquiagem linda e suave para você, mesmo noiva, não quero que
a maquiagem esconda o tanto que é linda.
Eu não era acostumada a elogios. Fiquei sem saber o que responder. Por sorte, o silêncio
foi quebrado pela entrada de uma das criadas. Ela trouxe um carrinho recheado de coisas, um
café da manhã completo.
Nem pensei muito quando vi a comida. Estava faminta, especialmente depois da noite
anterior. Então eu me afastei de Tomasso e me aproximei dos frios. Peguei uma fatia de queijo e
um pequeno pão quando ouvi a voz de Melissa atrás de mim.
— Mamãe, eu quero isso!
Arqueei minhas sobrancelhas. O carrinho estava cheio de comida, eu não entendia
exatamente o que ela queria. Repentinamente, mamãe estava ao meu lado, me forçando a largar o
pão que arrumei.
— Sua irmã disse que quer.
— Mas, tem mais aqui — tentei argumentar.
— Como você se atreve? Melissa escolhe primeiro!
Encarei a criada, que parecia simplesmente pasma diante da cena. Todos ficaram em
silêncio, enquanto eu simplesmente entregava a Melissa meu pão e meu queijo.
— Só por esse atrevimento, você não vai comer — mamãe me avisou.
Fiquei à beira das lágrimas, e não por fome. Estava com tanta vergonha por causa da
criada, de Tomasso e Beatrice. Eu era acostumada a humilhação, mas não era acostumada à
exposição.
Contudo, toda a cena foi interrompida pelo som de passos. Com assombro, assisti a
criada caminhar pela sala, e ir até minha irmã. Ela arrancou a comida das mãos de Melissa. Sua
expressão era tão assustadora que eu quase não acreditei no que estava vendo.
— Não seja uma pirralha. Você já é uma mulher adulta, tome vergonha! Essa comida é
para sua irmã, ela escolhe primeiro. Se ela quiser dividir com você, dividirá, mas a senhora
Melina agora é a dona da casa. Então, aprenda a respeitá-la, ou suma daqui.
7

ra tão inacreditável que eu não conseguia respirar. Nunca ninguém havia falado assim com
E Melissa. Houve um silêncio brutal no quarto, todos pareceram tentar absorver a cena com
custo, enquanto a criada se aproximava de mim, puxava minha mão, e depositava o pão
entre meus dedos.
— Como você se atreve? — Mamãe, por fim, conseguiu gritar.
— Como eu me atrevo a quê? A colocar sua filha mais velha e completamente malcriada
em seu lugar?
— Você é só uma empregadinha e...
— Nessa casa, você e eu somos iguais. Não, estou errada. Você é menos do que eu.
Porque você é só a mulher de um contador. A Tirreno tem muitos. Mas, criadas de confiança são
poucas e eu estou entre elas. Se eu levar ao senhor Klaus que a noiva está sendo ofendida pela
mãe e pela irmã, garanto que as duas serão expulsas daqui aos pontapés. Não importa o laço de
sangue que tem com Melina. Ela é a futura senhora de San Giovanni, e deve ser completamente e
totalmente respeitada.
O tanto de importância que eles davam a mim começou a agoniar. Quando Klaus visse
que eu não era a noiva certa, isso poderia ter um custo muito alto. Pior que a morte.
Provavelmente, tortura.
— E senhor Klaus disse, especificamente, que a senhorita Fiorin devia se alimentar bem,
pois terá um dia cheio com o casamento — completou a criada.
— Que absurdo — mamãe quase não podia acreditar no que estava acontecendo. — Ela é
minha filha e sou eu que digo o que ela come o que deixa de comer.
— Ser sua filha será secundário. O principal papel que Melina desempenhará nessa casa
será a de esposa e a de mãe dos filhos de Klaus Lazio.
A mulher era muito corajosa. Ela tinha uma postura tão firme que soube que mamãe não
conseguiria derrotá-la. Simpatizei tremendamente com ela nesse momento, já que ser defendida
parecia tão irreal.
— Pois eu não aceito ser tratada assim — mamãe disse, entre os dentes. — Falarei com
Klaus, pode acreditar — e então ela saiu pisando firme.
Melissa correu logo atrás. O ar só voltou definitivamente aos meus pulmões quando a
figura odiosa delas desapareceu.
— Muito obrigada — disse, segurando as lágrimas.
Só então eu observei verdadeiramente a criada. Ela usava uma roupa preta muito
elegante, e tinha longos cabelos presos em um coque no alto da cabeça, em um grande monte.
Seus olhos era enérgicos, mas ela tinha um sorriso nos lábios, destinado para mim. Não era
velha, tinha uns trinta ou trinta e cinco anos. Sua pele era como um pêssego bem cuidado. Era
definitivamente muito bonita.
— Beba um pouco de água, criança — achei engraçado a forma maternal com que ela
falou comigo, apesar de ter pouca idade a mais que eu.
— Ainda bem que você chegou, Mia — Tomasso comentou, respirando fundo. — Oh,
me perdoe Melina, mas sua mãe e sua irmã são assustadoras.
Eu concordei, sem conseguir dizer uma palavra. Lágrimas me tomaram, e logo todos eles
me confortaram, cercando-me e ajudando-me a sentar.
— Fique tranquila, querida — Beatrice afirmou. — Não deixe que elas destruam o dia
feliz que será seu casamento.
Oh Deus... Não seria um dia feliz. Não havia como ser.
— Beba — a criada me entregou o copo de água. Eu mal conseguia segurá-lo, tanto que
minhas mãos tremiam. — Eu sou Mia — ela se apresentou. — Senhor Klaus me pediu para
cuidar de você, menina. Pode contar comigo para qualquer coisa, está bem?
Eu pensei em como Klaus pareceu uma boa pessoa. Sim, eu sabia que ele era um
bandido, Capo de uma máfia, mas não podia deixar de alçar o quanto ele foi generoso comigo
desde que cheguei, me oferecendo um bom quarto, trazendo um cabelereiro e uma maquiadora
para cuidar de mim, e agora uma criada que colocou minha mãe para correr.
— Agora venha se sentar diante do espelho — Tomasso me chamou com um tapinha
gentil no ombro — Quero pensar como farei esse cabelo mais bonito. Seus cachos são tão
perfeitos, mas acho que precisam de finalização.
Voltei para a penteadeira e permiti que Tomasso continuasse sua tarefa de me preparar.
Com o canto dos olhos, vi Beatrice começar a ajeitar a maquiagem, enquanto me olhava,
provavelmente buscando meu tom de pele na base. Mia sentou-se em um canto, com seus olhos
de águia, analisando tudo.
Houve passos no corredor, e olhei para a porta. Pensei que seria mamãe e Melissa
voltando, mas foi apenas um ou outro guarda cruzando por aquele caminho. Quando minha
família saiu, elas deixaram a porta aberta, e só então Mia percebeu que não estávamos em
privacidade. Ela se levantou e a fechou.
Todavia, um sentimento forte me tomou quando vi o uniforme preto dos guardas. Me
lembrei daquele homem da noite anterior, cujo nome eu nem sabia, e o tanto de sensações que
ele despertou com seu beijo.
Oh, céus... o que seria de mim quando Klaus soubesse?
— Mia? — chamei a criada quando ela voltou depois de fechar a porta.
— Sim?
— Meu noivo... — murmurei. — Ele é um homem piedoso?
Era a única coisa que eu precisava saber. Ele teria piedade de mim quando não me visse
sangrar na noite de núpcias?
— Piedoso? — Mia arqueou as sobrancelhas.
— Sim... Eu só quero saber como é meu noivo. Eu nunca o vi, nem ninguém nunca fala
sobre ele, além de ele ter muitas mulheres.
Houve outro silêncio no quarto.
— Precisa saber que Sr. Klaus vai respeitá-la — Mia adiantou-se. — E jamais será
submetida a conviver com nenhuma de suas amantes, se não quiser.
— Se eu não quiser?
— Ah, é que Giulia e Emma são tão legais. Seria uma pena não conviver com elas.
Legais? As amantes de meu futuro marido? Isso era loucura.
— E elas também são cientes de que você será esposa. E irão respeitá-la. Não precisa se
preocupar com nada, referente a Klaus e as meninas.
— Eu... eu... — gaguejei, porque não sabia o pensar do absurdo que estavam me dizendo.
— Só queria saber como ele é psicologicamente. Ele é piedoso? — insisti.
A pergunta que eu queria fazer era: “ele teria misericórdia de mim e não me mataria?”,
mas não havia realmente como levar essa questão a eles.
— Ele não é gentil — Mia me surpreendeu com a resposta. — Mas, ele é justo. E é um
bom homem. Um pouco diferente do senhor Giacomo, que Deus o tenha. Nesses anos que
trabalhei aqui, sempre fui respeitada e tratada com dignidade.
— Mas, suponho que será gentil com você — Tomasso pareceu querer consertar diante
do meu olhar. — Acho que ela está perguntado sobre hoje à noite, Mia — ele apontou, e eu
percebi que ele pensava que eu era uma virgem com medo.
De fato, eu estava com medo. Mas, não era mais virgem.
— Ah, sobre isso... Ele é um homem com muita experiência e não a machucará.
Não era a resposta que eu esperava, mas decidi ficar em silêncio e deixar o destino tomar
as rédeas da minha vida.
8

u estava tradicionalmente atrasada para o casamento. Não que eu realmente pensasse em me


E atrasar, mas Beatrice precisou refazer minha maquiagem duas vezes, entendendo
erroneamente meu semblante preocupado e fechado como se eu não tivesse gostado do seu
trabalho.
Não era verdade, e eu até pensei em lhe assegurar que a maquiagem estava perfeita, mas
conforme as horas iam avançando, eu não conseguia mais encontrar palavras.
O medo começou a me enervar. Não podia deixar de ver a loucura que fiz, acreditando
que poderia me livrar desse casamento. A morte sempre foi uma possibilidade libertadora, mas
quando o sol se pôs naquele dia estranhamente abafado, a chance de perder a vida me levou a
lugares inexplicavelmente aterrorizantes.
Fui impulsiva na noite anterior, e agora estava em pânico.
Mia me ajudou a entrar no vestido de noiva. Eu o havia experimentado dias antes, mas só
agora ele me cortou o laço da racionalidade. Ver-me de branco no espelho, usando rendas que
não combinavam comigo, preparada como um sacrifício para o altar, me fez cair na real.
O choro me tomou em uma careta de dor, medo e pânico. Senti a mão de Mia,
confortadora, me apertando o ombro, dizendo que tudo ficaria bem.
— Você terá um bom marido, criança. Nem todas tem tanta sorte — ela me assegurou, e
a simpatia que ela me dava me fez perceber que eu sentiria falta de Mia quando tudo isso
findasse.
Tentei me controlar. Tomasso e Beatrice já haviam ido, e agora apenas Mia estava aqui.
Minha mãe e Melissa não haviam voltado ao quarto desde que saíram de manhã, e não sei como
foi o confronto delas com Klaus, mas ninguém apareceu para expulsar Mia.
Isso me fez pensar que talvez Klaus fosse um homem generoso, com um pouco de
piedade. Eu só precisava que ele me compreendesse por um segundo, e me desse a chance de ser
livre. Só isso.
— Sr. Klaus me pediu para lhe entregar esse colar de esmeraldas. Era de sua mãe, e ele
queria muito que usasse na cerimônia — Mia me disse.
Eu não recusei, apesar de saber que isso poderia se voltar contra mim. Eu não era digna
de usar algo de uma mulher como Valkíria Lazio. Ainda assim, permiti que Mia o colocasse, e
me observei novamente, usando aquela bonita pedra enorme e verde, que contrastava com minha
pele, onde o decote do vestido permitia a visão de meus montes gêmeos.
— Mia, devo esperar um homem feio? — indaguei, apenas porque queria que ela me
preenchesse o ambiente com palavras.
Não me importava a aparência de Klaus. Não fazia a menor ideia de como era meu noivo,
contando que ele me permitisse ir embora.
— Ah, ele é tão belo — ela contou, encantada. — Você tem tanta sorte, minha senhora
— ela repetiu.
— Não acho que sorte seja a palavra certa — murmurei.
— Sei que está apavorada. É natural. Ainda acho que o senhor Klaus devia tê-la
conhecido antes do casamento, ter se apresentado, ter dado passeios com a senhora... enfim, ter
criado um vínculo. Mas, as coisas são como são na Tirreno, e de todos os homens que seu pai
podia tê-la entregado, Klaus com certeza foi a melhor escolha.
Repentinamente, há uma batida na porta. O momento da cerimônia se aproxima, e penso
que será meu pai para me buscar. Contudo, quando a imagem de meu primo Marco surge, eu
sinto vontade de correr até ele e lhe abraçar.
Ele é a única figura realmente familiar que eu tenho. Ainda assim, nunca foi nos
permitido muito mais intimidade do que um olhar cruzado entre primos.
— Melina — ele suspira, encantador. — Você está linda.
Sorri para ele e então caminhei em sua direção. Estendi minhas duas mãos para meu
primo, e ele as segurou.
— Como você está se sentindo? — indagou.
— Com medo — confessei.
— Vai dar tudo certo. Até porque, nada pode ser pior do que conviver com Melissa —
me deu uma piscadela que quase me fez rir.
— O casamento já está atrasado, não é? Por que papai não veio me buscar ainda?
— Eu vou levá-la para o jardim. Tio Toni a espera lá.
Assenti. Volvi para Mia e pedi ajuda para ela erguer o véu a fim de que eu conseguisse
descer as escadas sem pisar nele. Gentilmente, ela me seguiu.
— Prima — Marco disse baixinho, enquanto andava ao meu lado. — Se eu pudesse te
salvar agora, eu salvaria. Mas, não sou nada.
Ele era muita coisa. Ele era meu primo querido. E ele me fazia sentir querida e amada. A
única pessoa do mundo que se importava comigo.
— Marco... — sussurrei, confortadora.
Sabia que Marco estava sofrendo pela situação.
— Isso é doentio, Melina... Tudo que fizeram contigo por todos esses anos. A forma
como te trataram. Eu os odeio por isso. Mas a única coisa que posso fazer é rezar para que Klaus
Lazio tenha por você mais sentimento e simpatia do que os Fiorin jamais tiveram. Desejo,
sinceramente, que ele seja sua família, prima. Que ele seja um marido bom, e que lhe dê amor.
— Um homem como ele? Acha que é capaz?
— Ele também não teve muito poder de decisão. Giacomo escolheu sua esposa quando
era muito jovem, e o pai exigiu que aceitasse o casamento, inclusive deixando uma cláusula em
seu testamento – tanto o oficial quanto aquele entre a Tirreno – de que Klaus Lazio só seria o real
chefe da máfia quando fosse pai de um filho não bastardo. Dizem que é um homem justo e bom,
não sei, não o conheço realmente. Ainda assim, rezo para que os boatos sejam sinceros e que ele
a trate com respeito. Se tudo que quer é um filho para ter o poder da máfia em mãos, você pode
lhe dar isso, Melina.
A história me surpreende um pouco. Então era por isso que Klaus aceitou o casamento,
esse acordo medieval e cruel?
— Os pais gostam de brincar com a vida dos filhos — murmuro.
— Giacomo era muito preocupado com isso. Ele dizia que os homens de sua família
sempre foram desgraçados por mulheres traiçoeiras. Quando ele se casou com Valkíria –
comentam – a maldição meio que se quebrou. Ela lhe deu um filho e foi a melhor mulher que um
homem poderia querer. Então ele se preocupou que Klaus tivesse uma esposa igualmente pura e
inocente.
Ele não teria uma coisa nem outra.
Chegamos à antessala. Lá fora, eu podia ver o brilho da decoração. O jardim estava
especialmente montado para a cerimônia. Havia muita gente ali, aguardando o casamento.
Meu pai se aproximou nesse momento. Ele parece raivoso, eu não faço ideia do porquê.
Ele não está tendo tudo o que sempre quis? Não está vendendo sua filha para os Lazio?
— Você está atrasada — reclamou. — Essa é a primeira impressão que seu noivo vai ter
de você!
— Tio Toni, é normal que as noivas se atrasem para o casamento — Marco diz,
amenizando um pouco o olhar raivoso de papai.
Depois disso, papai pediu que Marco fosse para o jardim. Quando ficamos sozinhos, eu
imaginei que ele me diria qualquer coisa sobre ser uma boa esposa, ou algo assim, mas as
palavras a seguir me deixaram sem fôlego.
— Eu já sei que você andava com livros não autorizados no quarto. Mandamos limpar
seu quarto, para torná-lo um quarto de hóspedes, e uma das criadas encontrou material anarquista
embaixo do seu colchão.
Era apenas romances. Não havia destaque político ou qualquer coisa no livro. Era apenas
uma fuga para minha vida infeliz.
— Papai...
— Cale a boca — ele disse, me puxando pelo braço violentamente. Podia sentir seu hálito
batendo na minha face como bofetões. — Eu tentei te criar para ser uma esposa pacífica e
obediente, e será isso que eu vou entregar para Klaus, entendeu? Se te atrever a qualquer coisa
além de abrir as pernas para ele e lhe dar filhos, eu mato Açucena.
Meu olhar arregalou.
— Oh, acha que não sei que foi ela que te levava livros? Acha que eu não sei que ela a
deixava ver televisão quando sua mãe ou eu não estávamos em casa? Aquela criada infeliz
sempre foi atrevida!
— Papai, por favor...
— Escute bem, Melina. Eu acabo com Açucena. E depois, eu mato Marco, seu priminho
querido. É isso que você quer? As únicas duas pessoas que te amaram na vida inteira sendo
mortas porque não consegue ser obediente?
Meu Deus... meu Deus... Quando Klaus descobrisse que eu não era mais virgem, não
seria apenas eu que teria a vida arriscada. Papai mataria meus amigos como vingança. O peso de
minhas decisões caíram como uma bomba, e eu perdi a força nas pernas. Eu teria despencado,
não fosse papai me erguer, com força.
— Controle-se — disse, saliva desprendendo de sua boca. — Melissa, sua mãe e eu
apenas esperamos que seja uma boa esposa. Nossa vida financeira depende disso. Então, mostre
esse seu lindo sorriso, e se comporte.
Desesperadamente, lutei para controlar as minhas pernas. Aceitei que papai colocasse
meu braço no seu, e comecei a caminhar com ele para a área onde o casamento aconteceria.
A marcha nupcial começou a tocar.
Lágrimas brotaram em meus olhos enquanto vou me aproximando do jardim.
Eu não vejo os rostos das pessoas ao redor do corredor que me leva ao padre e ao noivo.
Eu mal consigo ver qualquer pessoa sobre minhas vistas nubladas de dor.
Estou aterrorizada. Estou destroçada. Se Deus fosse bom, eu cairia morta agora, qualquer
coisa que evitasse o que aconteceria a Marco e Açucena. Como eu pude ser tão inconsequente,
sem pensar que havia um ponto fraco?
Repentinamente, papai e eu travamos. Eu o vejo se aproximar de um homem e apertar
sua mão. Depois, papai se volta para mim, e me dá um beijo estranho na testa. Ele nunca me
beijou antes e eu quase recuso o gesto por puro instinto. Contudo, em seguida, sou guiada até
uma silhueta masculina. Pisco repentinamente para clarear a minha visão e visualizar meu noivo.
— Melina... você está tão linda — ouço.
Só então eu realmente o vejo.
E não consigo acreditar que diante de mim está o guarda da noite anterior.
9

stou em um estado catatônico, mal consigo respirar, enquanto me forço a observar a figura
E alta e grande diante de mim. O choque é tão grande, que mesmo quando ele aperta minha
mão, não me mexo, não o sigo o passo necessário para ficar diante do padre.
— Melina — ele repete meu nome, me fazendo ofegar, como se só então eu fosse capaz
de respirar.
Encaro seus olhos pretos, o mesmo olhar que assombra meus pensamentos desde que ele
esteve em meu quarto. Eu não consigo acreditar que ele está diante de mim, a negritude de suas
vistas me queimando como se fosse uma fogueira santa diante de uma infiel.
— Você... — sussurrei.
Sei que ninguém me ouviu além dele. Seu sorriso cínico surge diante de mim, e eu recuo
em choque. Mas não chego realmente a dar dois passos. A mão de Klaus Lazio ainda me segura,
e não consigo desviar.
Ele é tão grande, mas não é seu tamanho que me intimida. É a maneira como ele exala
poder. Eu me sinto tão pequena, enquanto vou percebendo que esse homem me enganou, me
deixou acreditar que era um simples segurança, enquanto me tirava a virgindade, um hímen que
sempre lhe pertenceu.
Klaus me possuiu na ciência de que eu era dele, como um objeto que ele sempre teve
posse. Ele me tomou para si, e ainda me fez acreditar que era o que eu queria. Ele me permitiu
ter o mínimo de felicidade, em pensar que eu estava tirando de Klaus o poder sobre minha vida e
meu corpo. Quão tola eu era? Estava entregando-me de bandeja ao meu noivo, sem saber que
era ele.
Acho que vou vomitar ou vou desmaiar. Uma parte de mim fica tranquila porque minha
amiga Açucena e meu primo Marco estão salvos, mas outra está enojada porque eu sou apenas
uma peça manipulável desse tabuleiro.
— Se aproxime — ouço a voz rouca e grave.
Não é Klaus, apesar de pensar que ele poderia me forçar ao altar que fizeram para a
cerimônia na hora que quisesse.
Encaro o padre, um velho de cabelos brancos e olhar firme que parece julgar a noiva que
está recuando diante de todos. Ouço som de passos atrás de mim, e sei que é meu pai, porque ele
não se afastou muito desde que me entregou nas mãos de Klaus. Sinto a mão de meu pai na
cintura e ele me empurra em direção ao meu futuro marido.
— Não — a voz imponente de Klaus o para na metade do intento. — Não a toque. Ela
nunca mais será tocada por ninguém além de mim — ele avisa, e isso me faz revirar o estômago.
Mais uma vez eu sou um objeto sem escolha, sem decisão. Foi assim com meus pais.
Agora, era passada para Klaus, sem direito a dizer se o queria ou não.
— Venha, Melina... Eu sei que está nervosa, mas não precisa ficar — ele comenta, como
se não soubesse exatamente o porquê estou completamente em choque.
Klaus Lazio me enganou como seu primeiro ato como marido. Era tão vergonhoso...
Deus... como eu me senti usada nesse momento. Ainda assim não há uma escolha, então deixo
que me conduza diante do padre, que começa o ritual num discurso desconcertante de como
estamos aqui nessa noite para unirmos essas duas almas destinadas.
Mais uma vez, quero vomitar.
Eu começo a me perder em pensamentos. Klaus me amando tão gentilmente. Klaus não
me explicando quem era. Ele autoritário, enxotando meu pai. Tão possessivo.
Estou em devaneios, desconsertada. Meus pensamentos se chocam como carros em um
acidente. Não consigo prestar atenção a minha volta e ao que está sendo dito. Repentinamente,
Klaus me balança. Eu o encaro, e então percebo ele apontando com a face para o padre.
Volto-me para o velho. Ele pigarreia, irritado.
— Repito — diz, deixando claro que não é a primeira vez que fala comigo. — Você
aceita Klaus Lazio como seu legítimo esposo?
Como assim? Eu podia escolher?
Estou confusa, e a palavra “não” dança pelos meus lábios. Mas, antes de dizê-la, volto-
me para as pessoas naquele jardim. Eu não conheço os rostos, mas vejo Marco ao longe, sorrindo
tristemente para mim.
Lágrimas despencam agora, e eu volto-me novamente para o padre. Eu mal consigo
responder, então apenas aceno, em concordância.
— Preciso que diga de forma audível para as testemunhas — o padre explica, apontando
para um grupo à sua direita, padrinhos e madrinhas, acredito eu.
Não conheço ninguém.
— Sim, senhor — digo, engasgada, como se a frase fosse tremendamente dolorosa de
falar. — Eu aceito.
O olhar de Klaus está fixo em mim. Ele sabe que eu não quero aceitar, mas entende que
devo estar sendo forçada a isso. Ele não parece satisfeito pela minha resposta, talvez pensasse
que eu aproveitasse a pergunta para me livrar dessa situação.
Ainda assim, quando a frase é indagada a ele, Klaus sequer pestaneja.
— Aceito — ele diz, tão firme e forte, que me faz estremecer.
Esse deve ser o pior casamento da história. Uma noiva chorando em pânico e um noivo
claramente contrariado.
— Eu os declaro marido e mulher — o padre anuncia. — Pode beijar a noiva agora.
Sei que o beijo sela a cerimônia, então eu me volto a ele, aceitando meu destino. Sua
incubadora, sua vaca parideira, como diz Melissa.
Klaus solta minhas mãos, e segura meu queixo. Ele me ergue, fazendo com que meu
rosto o encare. Há um tipo de carinho e conforto na forma como ele aproxima sua própria face, e
desliza os lábios pelas minhas lágrimas.
Ele tem pena de mim. Acho que é isso. Ele é homem e é livre. Ele tem até um harém,
pelo que sei. Suas amantes devem estar assistindo a essa farsa com um sorriso nos lábios,
pensando no meu destino horrível. Então, sim, Klaus parece se apiedar da minha triste sina.
— Você é minha esposa agora — ele afirma, seu hálito batendo na minha boca. — E eu
cuidarei de você — jura, enquanto segura meu pescoço e afunda seus lábios quentes na minha
boca.
Eu forço meus lábios, fechando-os. Não é que não queira que ele me beije – de fato, não
quero! – mas estou tão revoltada quanto envergonhada diante de todos. Há aplausos diante do
beijo. É tão bizarro que alguém realmente possa se alegrar diante dessa farsa, mas as pessoas
realmente parecem alegres porque o atual chefe da Tirreno tem sua esposa perfeita.
Não importa o que eu sinto. Há ninguém aqui, talvez com exceção de Marco, que tem
qualquer piedade. Meu próprio – agora – marido está sorrindo contra minha boca, forçando sua
língua entre meus lábios travados. Quando me recuso a abri-los, ele me morde como se fosse a
coisa mais natural e fizesse isso todos os dias. No exato momento que eu quero reclamar, Klaus
aproveita e enfia a língua dentro da minha boca.
Subitamente, sou tomada de assalto pela lembrança de como ele me beijou na noite
anterior. Meu corpo clama uma saudade que eu desconheço.
Isso me deixa tão em alerta, que consigo me afastar dele. Os aplausos cessam no instante
que eu o empurro. Há um suspense no ar, talvez alguém pense que ele vai me matar agora pelo
insulto.
Seria maravilhoso que o fizesse.
Esqueço-me brevemente de Marco e de Açucena, e sou egoísta o suficiente para desejar a
morte.
Mas, para minha surpresa, Klaus gargalha diante da cena, como se eu fosse apenas uma
noivinha inocente assustada com um beijo. Ele sabe que não é verdade, ele sabe como aceitei
seus beijos na noite anterior.
Ainda assim, ele está me poupando. Risos ecoam ao nosso redor. Olho para as pessoas,
felizes e animadas, e meu olhar repentinamente cai em mamãe e papai, que parecem enojados
pelo meu comportamento.
— Está feito, amigos — Klaus brama, alegremente. — Marido e mulher! — Nos
apresenta. — Vamos brindar a isso!
Gritos animados emergem. O sol já se pôs. Minha nova vida começa agora.
10

odos estão bebendo vinho e champagne, enquanto riem e contam histórias sobre como o
T velho Giacomo gostaria de estar aqui nessa noite. Alguém diz que ele está, que sua alma
está, de alguma maneira abençoando o filho, e há outra exclamação e um brinde à memória
do falecido senhor da Tirreno.
Estou em uma realidade alternativa, onde caminho em passos desconcertantes entre essas
pessoas. Klaus já me deixou em paz, e agora está bebendo com seus homens, enquanto eu busco
por um rosto conhecido a quem possa me refugiar.
Onde está Marco? Eu gostaria de poder contar a ele o que aconteceu. Queria desabafar a
alguém como me sinto ridícula e burra. E como meus planos de ser devolvida por Klaus se
destruíram depois de vê-lo no altar.
— Ah, Melina — Melissa aparece ao meu lado.
Ela tem olhos selvagens, como se estivesse louca para me contar alguma coisa. Eu mal
consigo vê-la nessa névoa de dor que me envolve. Todavia, tento respirar fundo e encarar minha
irmã.
Melissa está linda. Vestida em um Balenciaga creme, quase branco, com seus cabelos
lisos e bonitos em uma trança longa despojada sobre seus ombros. Sua maquiagem só a destaca
ainda mais. Ela seria a noiva perfeita, com certeza, se não tivesse se recusado a esse papel, anos
antes.
— Eu conheci Giulia — ela me contou.
— Quem?
— A amante favorita de Klaus. Ela é linda, Melina. Cabelos negros como a noite, e olhos
assustadoramente pretos. Ela parece uma ninfa. Acho que você não tem muita chance, irmã —
ela me diz, o tom jocoso.
Eu não me importo. Mas nem adiantaria dizer isso a ela, porque Melissa também não
liga. Seu intento é me machucar. Ela faria todo o possível para realizar isso.
— O que houve? — ouço mamãe se aproximando de nós.
Não a encaro. Nem consigo erguer minha face, tamanha minha derrota.
— Estou falando para minha irmãzinha sobre Giulia, a garota com quem conversamos
durante a cerimônia — Melissa explicou.
— Ah — mamãe deu de ombros. Papai surgiu ao seu lado, parecendo igualmente
despreocupado. — Ela é muito bonita.
— Pobre Melina — Melissa repetiu.
— Melina não está se casando para ser amada — papai rebateu Melissa, como se a
estivesse repreendendo. — Melina será apenas uma barriga para Klaus. Seria uma sorte para ela
que as amantes bonitas de Klaus o deixem ocupado, assim ela não precisaria se preocupar com o
mau humor de seu marido.
Aquela frase me fez erguer o olhar. Eles falaram sobre meu futuro infeliz como se fosse
apenas um acaso. Eu senti, mais uma vez naquela noite, lágrimas surgindo nos meus olhos. Um
cansaço descomunal me tomou, enquanto dizia aos meus parentes:
— Todos vocês são como frutas podres. Bonitas por fora, mas cheias de larvas por
dentro. Foram capazes de vender uma filha por dinheiro e status, sem ao menos se preocupar
como seria o futuro dela dentro dessa prisão.
Foi bizarro como papai se aproximou de mim. Eu quase implorei que ele me batesse,
porque queria que ele o fizesse na frente de todos, apenas para saber qual seria a reação de Klaus
diante disso. Agora eu era sua mercadoria, seu útero, como ele reagiria ao ver outro homem me
agredindo?
Mas, papai não levantou a mão. Ele simplesmente levou-a até minha cintura e me
beliscou forte, quase arrancando a pele. Foi feito de uma forma muito discreta, mas não deixou
de ser extremamente dolorido. Eu gemi de dor e me encolhi rapidamente, percebendo que fui
cercada pelos meus de forma automática, para simplesmente camuflar qualquer reação.
— Ah, olá — ouço um som as minhas costas, e uma mão gentil toca minha cintura. —
Estava procurando por você… — encaro a mulher que se aproxima. É a loira da manhã, que
recolheu os panos ensanguentados de meu quarto. — Preparei sua camisola para a primeira noite,
querida.
Ela falava como se me conhecesse. Mas, nunca trocamos mais que uma frase de
conversa. Ainda assim, ela me tirou de perto da minha família, e não pude deixar de expressar
minha gratidão por isso.
— Está tudo bem — a loira respondeu, enquanto entravamos na mansão.
Subimos até um quarto. Não era o meu, era um muito maior, extremamente luxuoso, em
tom de marrom e dourado. Era um quarto masculino, isso estava claro, e pude perceber que era o
quarto de Klaus porque havia retratos sobre uma mesa. Eram fotos dele esquiando na Europa e
viajando para países do Oriente Médio. Reparei que havia mulheres nas fotos. Duas, em especial.
A loira era uma delas.
— Aqui — ela me sentou na cama, e então foi até uma mesa. Havia coisas lá, como um
balde de gelo e uma garrafa de champagne. Imaginei que ela fosse se servir da bebida, mas a
loira pegou um guardanapo e fez uma compressa com gelo.
Ela voltou a mim. Pediu que eu puxasse o vestido para cima, e eu o fiz porque estava
completamente no automático. Fiquei com as roupas de baixo, enquanto a loira punha o gelado
sobre minha costela.
— Vai ajudar a acalmar a dor. Sabe, eu já levei muitos beliscões assim. Uma vez levei
um soco no mesmo lugar que você levou o beliscão. Não conseguia respirar, foi horrível. Pelas
suas cicatrizes, eu acho que você entende o que estou falando.
Eu me senti tão próxima dela nesse instante. Eu só queria me abraçar nessa garota, a
única pessoa que demonstrou piedade por mim até então, mas não era uma escolha. Uma parte de
nascer e crescer com uma família como a minha, é ter dificuldades de acreditar que realmente
possa confiar em alguém e que as pessoas possam te ajudar sem interesse.
— Vai inchar — ela disse. — Está muito vermelho.
— O que vai inchar?
Klaus apareceu repentinamente no quarto, e eu puxei o vestido novamente para baixo,
para me cobrir. Como a mão da loira estava sobre meu ventre, não consegui fazer isso
totalmente.
— Klaus, achei que estaria na festa — ela disse.
— O que aconteceu? — ele repetiu, seu olhar saindo da loira e indo até mim.
Eu não sabia o que dizer.
— O pai a machucou — a loira respondeu. — Eu vi. É um grosseiro, e a irmã não é nada
melhor. Giulia disse que a tal Melissa passou a festa toda tentando chamar a atenção para si,
tendo crises sempre que alguém falava que a noiva estava bonita.
— Inveja é uma merda — Klaus respirou fundo, como se o assunto o cansasse.
— Não sei como uma irmã pode odiar a outra. Eu amo tão profundamente a minha.
— Não se compare com a tal Melissa — ele disse, puxando a compressa de gelo da mão
da loira, e observando o vermelho em minha pele. — Eu avisei que ele não devia tocar em minha
noiva — comentou, para ela, claramente irritado.
Era como se eu não estivesse aqui. Eles conversavam um com o outro como se eu fosse
apenas uma peça de decoração. Não sei por que fiquei magoada, mas fiquei. Eu já devia estar
acostumada a esse tratamento, mas me machucou a situação.
Repentinamente, Klaus olha fundo nos meus olhos. O susto foi tão grande que eu
simplesmente desviei meu olhar dele como se queimasse. Klaus ficou em silêncio e cerrou a
mandíbula enquanto removia a mão e permitia que a loira voltasse seus cuidados.
— Diga-me, Melina... Seu pai bate muito em você?
Eu podia negar. Mas, de que adiantaria? Estava ali, as provas, expostas sobre meu corpo.
— Por que você aceitou se casar? O padre não teria abençoado se você tivesse dito não.
Não deve nada a sua família. Nenhum deles presta.
A forma como ele indagou, me fez perceber que Klaus queria realmente uma resposta
sincera.
— Papai disse que mataria Marco, meu primo, se eu fizesse qualquer coisa que
prejudicasse o casamento.
— Seu primo é importante para você? — ele indagou.
Parecia um pouco ferido, não sei por quê.
— É o único amigo que tive em toda minha vida. Ele e Açucena, a criada. Papai também
a mataria.
— Jesus... — a loira murmurou.
Meu olhar volve do chão para Klaus. Analiso sua expressão, a forma como ele recebe
minha explicação. Sua mandíbula aperta e os músculos estalam enquanto ele parece morder algo
imaginário.
— Cubra-a — ele diz a loira, que rapidamente baixa completamente meu vestido.
Então, Klaus vai até a porta. Ele chama alguém. Não leva cinco segundos para um
homem grande e forte entrar no quarto.
— Senhor?
— Carlo, eu quero que mantenha o Fiorin sobre vigília. Não o deixe sair de San
Giovanni. E me traga o rapaz da família. Marco, é o nome.
Imediatamente, eu entrei em surto. Não podia permitir que machucasse meu primo, e
basicamente corri até ele, e me joguei aos seus pés.
— Por favor, não faça nada ao meu primo. Ele é um bom rapaz, Marco nunca prejudicou
ninguém, por favor...
Carlo se afastou, fechando a porta. O semblante fechado de Klaus se diluiu quando isso
aconteceu. Ele tocou meu rosto, segurando-o, enquanto parecia me estudar. Por fim, sorriu, como
se isso pudesse me tranquilizar.
— Leve-a ao quarto que arrumamos ontem — disse a loira. — Peça para Mia cuidar dela,
e volte aqui.
A loira assentiu e, obediente, veio até nós. Ela segurou meu braço, enquanto me guiava
novamente pelo corredor. Eu não queria ir, preocupada com Marco, mas não havia escolha. Uma
mercadoria nunca tem poder de decisão.
11

izer que eu estou irritado é um eufemismo. Estou puto, revoltado, enojado, e prestes a
D torcer o pescoço de alguém.
Nem sei por que estou assim, na verdade. Essa merda de vida dentro da Tirreno
sempre foi a mesmíssima coisa. Um peixe maior comendo o menor.
Eu derramo whisky em um copo e o levo aos lábios. Quando tinha quinze anos, ainda
vivendo o luto pela morte de minha mãe, papai me avisou que havia escolhido uma noiva para
mim. Lembro-me de ficar em alerta, sem saber o que pensar, mas meu pai assegurou que a jovem
era de boa família, e alguém como mamãe.
Eu não entendi o que isso significava até, aos dezoito, ouvi-lo conversando com um dos
membros da Tirreno, falando sobre uma noiva pura e virgem, que só teria a mim para adorar e
venerar. Ele basicamente narrou um útero perfeito, para receber meu sêmen sagrado e gerar meus
filhos.
Ainda assim, não tinha uma opinião sobre o assunto. Minha mãe era uma mulher incrível,
doce e gentil, e eu sabia que havia sido uma moça entregue virgem ao meu pai, para casamento.
Imaginei se isso não poderia ser uma boa coisa, e tentei descobrir tudo que podia sobre minha
noiva.
Nem preciso dizer que jamais me casaria com Melissa Fiorin. Ela era uma fútil, sem
princípios, alguém cuja presença eu jamais suportaria. Não me importava que ela andava
trepando por aí, eu realmente não ligava para essa história de incorruptível, afinal, eu mesmo me
divertia aqui e acolá com muitas mulheres.
Assim, não me casaria com Melissa. Ela tinha defeitos que eu não suportaria. Estava
pronto a dizer ao meu pai quando houve a troca. Melissa por Melina. A irmã mais nova me daria
cinco anos a mais de tempo, e achei isso muito bom. Todas as minhas tentativas de descobrir o
que podia sobre minha noiva foram quebradas, já que, diferente de Melissa, ela era mantida
sobre forte segurança, basicamente não vendo ninguém além das pessoas que moravam na sua
casa.
Não posso deixar de sorrir ao pensar nela na noite anterior.
Mesmo presa a vida inteira, ainda tinha um espírito absurdamente livre. Ela lutou muito e
foi muito corajosa ao me buscar no corredor, oferecendo-se a alguém que não conhecia. Eu sabia
que isso era derivado do desespero em ser dada em casamento a um Lazio, e ainda assim a
admirei.
E não pude recusá-la.
Ela era tão doce. Seu sabor ainda estava nos meus lábios.
Ouço sons de passos, saltos altos. Eu reconheço a quem pertence porque Giulia tem um
jeito pesado de pisar. Quando ela entra no quarto, meu olhar intercepta um julgamento.
— Eu reparei que sumiram durante a festa. Primeiro a noiva e Emma. Depois, você.
Agora os Fiorin. Que merda está acontecendo?
Giulia se aproxima da bancada de bebidas e se serve. É como se ela buscasse álcool para
me ouvir, como se isso pudesse acalmar seu espírito.
— O que achou de minha noiva?
— Quem tem que gostar é você — devolveu.
— Ah, por favor, me diga o que pensa — reclamo, mesmo sabendo que ser azeda é parte
de sua personalidade.
Ela deu de ombros.
— A garota parece apavorada.
Eu aceno em concordância.
— Ela tem marcas no corpo, de espancamento — conto. — Muitas, algumas recentes,
mas algumas claramente tem algum tempo. Emma disse que viu o pai a agredindo. Isso me deu
raiva. Eu deixei claro para Toni Fiorin que não deve tocar no que é meu.
Giulia toma uma dose como se a bebida nem queimasse. Em seguida, ela se serve de
outra.
— Preciso de você lúcida para me falar o que acha — reclamo.
— A vida é uma merda, nós dois sabemos disso — ela dá de ombros, sua frieza quase me
incomoda. — Apanhar dos homens é algo comum para as mulheres que servem a máfia. Esposas
ou amantes, filhas ou concubinas... mulheres envolvidas nesse universo apanham.
— Por que isso não te revolta?
— Quem disse que não me revolta? — ela bebe a dose num único gole. Quando vai se
servir da terceira, seguro seu braço. Nós trocamos um olhar antes de ela largar a bebida. —
Klaus, não dá para mudar o passado, mas ao menos você será um bom marido para ela.
— Não sei se serei. Nunca quis ser um marido.
— Eu soube da sua aventura ontem à noite. Emma me contou — ela largou, me fazendo
enrubescer.
Era claro que Emma iria fofocar. Eu devia ter imaginado.
— Não me julgue — peço.
— Não estou julgando, apenas constatando que você pode ser um bom marido.
— Não recusar sexo não é a mesma coisa de ser um marido.
— Você parecia muito animado hoje dizendo “sim” para o padre — ela cutucou, e eu
sorri.
— O que posso dizer? Melina é uma coisinha. Você viu... É muito fofa. E o fato de ela
estar tão desesperada me trouxe... lembranças.
Giulia assentiu.
— Eu sei.
Repentinamente, a porta abre. Vejo uma loira bonita entrando, e sorrio para Emma.
— Ela está bem?
— Deixei-a com Mia. Diga-me, o que fará com os Fiorin?
Era a pergunta de um milhão. Por mais que a minha vontade era de não deixar Toni,
Lucia e Melissa saírem vivos daqui, achava que essa não era a melhor maneira de começar um
casamento.
— Ainda não sei. Por mais terrível que sejam, ainda são os pais e a irmã de Melina. Eu
não quero que ela se ressinta com o passar dos anos, sabendo que o marido matou todos os seus
parentes. Você sabe, o tempo tem esse poder... Ele amansa as lembranças, e um dia ela pode
começar a se lembrar de momentos bons com os pais.
— Será que teve momentos bons?
— Ainda não sei. Vou pensar nisso.
Emma sorriu e eu arqueei minhas sobrancelhas.
— O que foi?
— Está preocupado com ela — a loira respondeu, me fazendo revirar os olhos, em
escárnio.
— Não é fofo? — Giulia riu. — O terrível e manipulador Klaus Lazio está encantado
pela noivinha.
Quando eu tinha vinte e cinco anos, logo após encontrar Emma, pus homens para cercar a
casa de Fiorin, a fim que me dessem qualquer informação sobre Melina. Eu queria saber como
ela era. Um dos homens conseguiu uma fotografia de Melina na janela de seu quarto. Seus
cabelos rebeldes sendo tocados pelo vento. Seu rosto estranhamente triste e abatido. Ela
claramente parecia a Rapunzel esperando pelo príncipe que a salvaria da torre.
Contudo, eu não era um encantado. Ao contrário, minha vida desregrada podia ser um
ponto de ruptura nos sonhos de Melina. Na noite anterior, soube que ela pensava que eu tinha um
harém de mulheres. Apesar de isso estar errado, eu ainda tinha muitas amantes. Nunca terminei
nenhum caso pensando em minha noiva. Não sabia se o faria por uma esposa.
Todavia, quando pensava nela... quando pensava na maneira como ela se entregou
desesperadamente para mim... Como seu inocente corpo se encaixou ao meu, como ela gozou
quando a fodi... eu nem me imaginava indo para outros braços.
Mais sons de passos. Eu observei a porta, e quando a imagem de Carlo surgiu, eu esperei
a entrada de Marco Fiorin.
O jovem apareceu com olhos assustados. Eu pensei nele como algum tipo de romance
impossível de Melina, pela forma como ela o protegeu quando achou que eu podia prejudicá-lo,
mas quando investiguei a família Fiorin, não soube nada que envolvesse Marco nesse âmbito.
O rapaz era filho da falecida irmã de Toni. Ele estudava contabilidade, e planejava viajar
para conhecer o mundo. Era muito comum, sem nada que o destacasse. O tio pagava seus
estudos, e ele trabalhava em um bar para suprir suas demais necessidades.
Não era envolvido com nada da Tirreno, nem de nenhuma outra organização.
— Minha – agora - esposa gosta muito de você...
O ciúme queimou na minha língua, e eu nem entendia por quê. Eu mal conhecia Melina.
Ainda assim, ver a forma como ela se preocupou o primo pareceu me corroer. Encarei Marco,
tentando decifrar algo em seu semblante depois do que eu disse.
Talvez ele se desculpasse por medo. Talvez ele se mijasse diante de mim. Mas, para
minha surpresa, o jovem Marco, sem um centavo no bolso, o jovem Marco que jamais segurou
uma arma, que não fazia ideia do quanto eu era perigoso, simplesmente ergueu o queixo
corajoso.
Ele tinha honra. Eu apreciei isso.
— Amo minha prima. Ela é a minha família. E eu jamais concordaria com esse
casamento, mas não tenho poder de decisão. Melina não merecia esse destino. Ela merecia se
casar com um homem que a amasse, não com um homem que...
Ele não terminou a frase, já que Giulia, a pessoa mais fria que eu conhecia, simplesmente
se irritou o suficiente para avançar na sua direção. Eu a segurei antes que ela lhe estapeasse.
— Como se atreve, seu merdinha? — Giulia indagou. — Respeite Klaus. Ele é o Senhor
da Tirreno!
— Se controle! — digo para Giulia, num tom meio baixo.
Ela respira fundo, mas então se desvencilha de mim, com um safanão, e se afasta,
caminhando até a cama. Giulia se senta no que devia ser meu leito matrimonial, nessa noite que
não está terminando como o planejado.
12

— V ocê é corajoso, Marco — digo, enquanto me aproximo da mesa onde está o


champagne. — Sente-se, quero conversar...
O olhar dele queima, então eu completo:
— Quero conversar numa boa — expliquei. — Quero entender a dinâmica familiar dos
Fiorin. Minha noiva foi machucada — apontei, e pude ver seus olhos deixando a arrogância e
tomados pela preocupação.
— Como?
— Isso sou eu que pergunto. Melina está bem, mas têm marcas em seu corpo que são
mais antigas que a que Toni provocou hoje. Já sei que ela apanhava, mas quero entender os
motivos da família parecer odiá-la.
— Eu... Realmente, eu não sei — ele pareceu derrotado.
Só então Marco se aproximou da cadeira. Nós dois nos sentamos. Ele parecia muito mais
brando agora, quase como se toda a sua firmeza houvesse se dissipado diante de meus olhos.
— Ela sempre foi doce e gentil. É muito boa pessoa. Tem uma alma honrada, apesar de
ter vivido em uma prisão desde que me lembre. Melina só conviveu com pessoas que foram
permitidas se aproximar e, mesmo assim, com tempo limitado. Quando Melissa se recusou a
casar com você, Toni ficou preocupado que Melina também se recusaria quando tivesse idade.
Então, ele tratou de mantê-la sobre forte vigilância.
— Mas, isso não justifica as agressões.
— De fato, não — concordou. — O que posso dizer? Quando ela tinha onze anos, eu a vi
apanhar pela primeira vez. Eu sei que ocorreram outras vezes, porque os criados da casa
comentavam, mas ninguém se atrevia a questionar meu tio pela sua ligação com a Tirreno. As
pessoas têm medo.
— Você tem medo?
— Todo mundo tem medo — ele deu de ombros. — Quem não tem é porque já perdeu o
amor à vida. Eu amo minha prima, me preocupo com ela, mas não morreria por ela nem por
ninguém.
— Você não tem honra — Giulia comentou, ao longe, e eu ignorei suas palavras, porque
não queria que Marco ficasse intimidado pela mulher de beleza excepcional.
— Meus tios queriam um menino, depois de Melissa. Quando Melina nasceu, eles
ficaram... — ele pareceu buscar a palavra cuidadosamente — enojados.
— Enojados? — A frase veio de Emma, que de tão silenciosa, quase esqueci sua
presença.
— Eles parecem ter ódio dela. Estranhamente, todo o amor que são capazes de sentir é
para Melissa. Melissa é a rainha da vida deles, meus tios fazem tudo por ela. Mas, Melina... eles
nunca a quiseram.
Encarei as duas outras mulheres, buscando por opinião. Carlo ainda estava perto da porta,
mas ele não parecia ter nada a dizer.
— Qual é a dúvida? — Giulia reclamou. — Dois narcisistas desgraçados mimando a filha
de ouro, enquanto torturam a filha indesejada.
Vejo Emma baixando a cabeça, enquanto um silêncio desconfortável se instala por alguns
segundos.
— Agradeço se for um bom marido — as palavras de Marco me despertaram. — Sei que
não será fiel, já que suas amantes vivem com você — ele girou a cabeça, apontando Emma e
Giulia. — Mas, se puder ser bondoso o suficiente para não bater nela, já será mais do que ela
tinha na casa dos pais.
Eu fiquei um pouco chocado com o tão pouco ele esperava.
— Tia Lucia não a deixa comer mais que uma vez ao dia, porque Melina tem tendência a
engordar. Melina também ficava muitos dias sem ver o sol, porque eles temiam que ela perdesse
o aspecto pálido da pele, ou ganhasse manchas. Se você deixá-la comer, e se deixá-la ver o sol...
Já terá feito muito por ela. Sei que minha prima será uma boa esposa, porque ser boa é uma
característica dela. Se suas amantes — ele girou mais uma vez o rosto para as duas mulheres — a
respeitarem o mínimo e não tentarem criar intriga, sei que Melina não fará causo de elas
morarem com você.
— Mande esse cara calar a boca — Giulia disse, entre os dentes. — Ele está me irritando.
Marco pareceu surpreso.
— Estou fazendo apenas um pedido simples.
— Simples? Cara... — ela reclamou, levantando-se da cama e indo até ele. — Você é um
covarde que viu sua prima sendo violentada de muitas formas, e nunca moveu um dedo para
ajudá-la. Agora vem com esse discurso hipócrita pedindo bondade para Klaus. Você não tem
direito de pedir nada.
Giulia então se afastou, saindo do quarto. Pensei que Emma a seguiria, porque Emma
estava sempre a seguindo para todos os lugares, mas a loira permaneceu parada próxima de
Carlo, seus olhos arregalados aguardando o desfecho.
— Desculpe meu atrevimento — Marco murmurou. — Mas, é insultante para uma esposa
que amantes morem na mesma casa.
— Emma e Giulia jamais saíram de perto de mim — avisei, encerrando a questão. —
Mas, eu entendo quando me pede para ser bom com sua prima. Eu serei. Farei o possível para
que ela tenha em mim um bom marido. Enquanto isso, você pode me ajudar com uma questão
mais urgente.
Marco arqueou as sobrancelhas, interessado.
— Você sabe... Faz um ano que meu pai faleceu. Desde então, assumi completamente o
domínio da Tirreno, mas o poder pode cegar. Muitos acham que eu não sou capaz de dominar
nossa organização. Há burburinhos de gente tentando me passar para trás. A minha vontade,
depois de ver as marcas em Melina, é destruir Toni — contei. — Contudo, se eu matar seu tio,
falarão que estou aniquilando aliados. Você não mata companheiros. A não ser que descubra que
esses companheiros estão tramando contra você.
— Quer incriminar meu tio? — ele pareceu surpreso.
— Só quero trocar o Fiorin de lugar. Sabe... ter um novo Fiorin coordenando as finanças.
Você estuda contabilidade, não é?
Eu estava jogando no escuro. Podia me dar mal, mas pensei que precisava arriscar. Toni
Fiorin era da velha guarda, e eu não queria seus amigos contra mim. Mas, se ele me traísse e eu
precisasse colocar seu sobrinho no lugar, isso seria visto como um ato misericordioso. Ao invés
de eu aniquilar a família, simplesmente baniria o velho para algum canto. Quando ele fosse
esquecido, daí sim eu me vingaria por ele ter posto a mão na minha esposa.
Minha esposa...
A denominação queimou na minha alma.
— Posso pensar? — Marco indagou, havia, claro um misto de nervosismo e dúvida nele.
Não devia ser fácil trair a própria família, mas Marco tinha uma mágoa não escondida
pela forma como seus tios trataram Melina.
— É claro. Um homem chamado Matteo entrará em contato com você para ouvir a
resposta.
Ele então se levantou e se foi. Eu ainda troquei um olhar sugestivo com Emma, antes de
eu mesmo sair do quarto.
Meu coração estava ansioso por ver Melina e saber como ela estava. E ter minha noite de
núpcias, mais que merecida. Meus passos me levaram até seu aposento. Um homem honrado a
deixaria em paz nessa noite difícil. Mas, eu não era esse cara. Eu não era um herói. Eu só queria
ter minha esposa novamente. E a teria, não importava o quê.
13

porta do quarto se abriu e olhei para Klaus que entrou com uma expressão indecifrável no
A rosto. Era estranho pensar nele assim, não mais o noivo ou o prometido, mas meu marido.
Pelo que mamãe me falava, eu devia chamá-lo agora de “meu senhor”, ou “meu
esposo” sempre que me dirigisse a ele. Deixar claro que eu pertencia a ele era algo que
esperavam de mim.
Ele estava sozinho. Perguntei-me o que havia acontecido com a loira gentil, e qual seria
sua relação com Klaus, mas francamente, isso pouco importava. Eu sabia meu lugar nessa
família. O caso de ele ter mentido para mim e me tomado no dia anterior ao casamento não
mudava o fato de que Klaus teve a noiva virgem que sempre quis.
Meu destino era inviolável. Eu seria sim a sua esposa perfeita, a mãe de seus filhos, a
mulher na sombra, vivendo apenas para vê-lo aproveitar seus dias divertidos ao lado de outras,
enquanto eu criava seus descendentes.
Klaus se aproximou de mim. Estava sem o smoking preto da cerimônia. Tudo que vestia
agora era a calça social e uma camisa branca cuidadosamente enrolada até seu antebraço. Meu
marido me analisou alguns segundos, antes de erguer sua mão e tocar meu queixo. Minha
garganta ardeu, e eu quis chorar.
— Senhor? — Mia chamou sua atenção. — Talvez seja bom chamar um médico.
Ele olhou para a criada, que estava perto da entrada do banheiro.
— Médico? — Klaus retornou seus olhos para mim. — Você sente dor?
Arrisquei encará-lo, enquanto analisava as respostas plausíveis. Eu sempre tinha dor, mas
já estava acostumada.
— Não é necessário um médico — disse.
— De qualquer maneira, vou pedir para um vir olhá-la essa semana — ele me
contradisse. Se já havia decidido, por que me perguntava? — Mia — volveu-se para a outra. —
Os Fiorin vão embora. Quero que avise aos criados para arrumar suas malas, e os despache daqui
o mais breve possível.
— Mas, e a festa?
— A festa continua para os meus homens e suas famílias. Os Fiorin não são mais
convidados.
A forma como ele disse isso me arrepiou dos pés à cabeça. Eu pensei imediatamente em
Marco, mas temia perguntar o que ele fez ao meu primo. Não conhecia Klaus Lazio para saber se
ele aceitava questionamentos.
— Sim, senhor Lazio — Mia abaixou a cabeça e então saiu do quarto.
Houve um breve silêncio depois disso. Meu corpo inteiro ardia de nervoso. Eu não usava
mais o vestido de noiva, agora estava envolta um robe felpudo, sabia que meu corpo não era
visto por baixo dos panos, mas me sentia nua pela maneira como ele me encava.
Era a noite de núpcias. Klaus exigiria o que tinha direito. Ele não se fez de rogado na
noite passada e, vergonhosamente, uma parte de mim até queria viver aquilo de novo. Contudo,
havia muitas questões no meu íntimo. Preocupação com o futuro, especialmente com a vida de
Marco.
— Meu primo? — fui corajosa o suficiente para murmurar as duas palavras.
As demais questões ficaram esmagadas no meu coração.
— Ele está vivo, se é isso que a preocupa.
Eu quase me ajoelhei diante dele e o agradeci pela misericórdia.
— E minha família?
— Seu pai se atreveu a te machucar mesmo eu deixando claro que você não pertence
mais a ele. Não costumo tolerar desobediência, mas farei uma exceção essa noite porque não
quero começar um casamento matando a família inteira da noiva.
Eu assenti. Não tinha certeza sobre o que sentir diante disso. Uma parte de mim queria
que minha família sofresse por tudo que já me fizeram. Outra insistia em amá-los, especialmente
mamãe, a quem sempre quis ter por perto.
— Obrigada, meu esposo — murmurei.
Ele deslizou a mão novamente por meu rosto, seus dedos mais uma vez seguraram meu
queixo. Ele o ergueu, me fazendo encará-lo. Algo queimou em mim novamente, e eu apertei
minhas coxas tentando conter essa sensação poderosa que me tomou.
— Relaxe, minha esposa — ele disse, e eu ofeguei com seu tom quente. — Você sabe,
Melina... Eu estou encantado por você. É tão linda e inocente. Uma parte de mim só quer afundar
em você, e esquecer toda essa merda de Tirreno, honra, negócios e poder. Mas, a outra...
A outra o quê?
— Ah, Melina... Eu me pergunto por que seus pais a venderam ao meu? Claro, não sou
idiota e sei que há muito poder envolvido. Que os Fiorin querem a vantagem de ter um deles na
minha casa, serem sustentados por nós. Mas, ainda me pergunto se é só isso. Seu pai, a forma
como ele me desobedeceu nessa noite... Isso mostra que ele não me tem respeito, nem tem medo.
Uma das merdas da ambição é que ela nunca se contenta. Ela sempre exige mais e mais. Você
entende isso?
Não. Francamente, me contentaria se ele não me batesse. Só isso já me deixaria grata.
Quanto ao luxo e poder que Klaus Lazio podia me dar... Eu viveria bem melhor na pobreza, mas
com amor e respeito.
Aliás, amor era a única coisa que eu queria na vida. O amor da minha mãe, de minha
família, de um marido. Só queria que as pessoas realmente se importassem comigo. De que
adiantava ter vestidos bonitos ou beber água em copos de cristal, se sequer sou bem quista pelos
que me rodeiam?
— Minha irmã... — a frase escapou de meus lábios sem eu sequer pensar nela. — Minha
irmã insinuou que você poderia lhe levar para morar na Suíça.
— Sua irmã quer ser minha amante? — ele se surpreendeu. — Melissa é muito bonita,
mas eu não a quero.
— Por que já tem muitas amantes? — Não sei por que eu queria saber, mas eu queria.
Um sorriso de deboche surgiu em seu rosto, e então ele se curvou para mim e beijou
minha boca. Fiquei surpresa com o gesto, apesar de saber que era natural que ele me beijasse,
porque era meu marido.
— Toda e qualquer mulher que eu tiver, não é problema seu — ele me avisou, e eu não
sabia o que pensar disso.
Um homem da Tirreno ter amantes era natural e até desejável, já que deixaria sua esposa
em paz. Mas, uma dor descomunal me tomava cada vez que pensava nele ao lado de outras.
Talvez até da loira dessa noite.
— A moça que me salvou na festa — apontei. — Qual é o nome dela?
— Emma.
“Giulia e Emma são tão legais”.
Subitamente, lembrei-me do aviso de antes. Já havia sido avisada que tinha duas amantes
de Klaus na casa. Me disseram que elas me respeitariam, e Emma realmente pareceu gentil
comigo, mas eu fiquei tão angustiada diante de, realmente, ter que conviver com suas amantes,
que quase chorei.
— Emma é sua concubina?
— Melina, já disse que não importa a você.
— Só queria saber... — senti lágrimas caindo dos olhos.
Era tão humilhante.
— Você só precisa saber que Emma é de minha completa e absoluta confiança.
— E Giulia também? — lembrei-me do outro nome.
Ele arqueou as sobrancelhas.
— Já andaram falando delas para você?
— Sim. É proibido?
— Giulia e Emma cuidarão de você — ele assegurou.
— Achei que Mia fosse fazer isso.
Um riso maroto escapou de seus lábios. Acho que ele podia identificar um sentimento
que eu mesma não identificava. Ciúme, talvez?
— Sim. Giulia e Emma são de minha completa e absoluta confiança — completou,
repetindo. — E elas vão cuidar de você de todas as formas que você precisa ser cuidada. E Mia
também fará isso. E é só isso que é da sua conta.
De repente, ele se ajoelhou diante de mim. Suas mãos deslizaram pelas minhas coxas,
erguendo meu robe. Eu senti o ar sumir dos meus pulmões, porque não esperava a ação, e porque
era tão quente que me senti pegando fogo.
— Você não precisa me temer, minha esposa. Eu nunca vou machucar você.
Parecia uma promessa tão doce. Eu devia aceitá-la. Era mais do que já tive todos os meus
dias. Sim, viveria com suas amantes por perto, mas ele estava dizendo que nunca me levantaria a
mão. Eu podia aguentar as amantes, mas apanhar dele... isso sim era aterrorizante.
É isso. Vou aceitar meu destino.
Contudo, eu me vi desvencilhando-me dele e caminhando na direção contrária ao quarto.
Uma parte de mim indagava o que porra eu estava fazendo, mas outra me dizia que precisava
exigir que ele mandasse suas amantes embora, colocando limites.
Porque... eu queria ser exclusiva. E queria que ele fosse exclusivo também. Era burrice
pensar assim, mas eram sonhos que mantinha no fundo da alma, desde que lia os romances de
Açucena ou assistia as novelas na televisão.
Só sonhos bobos de menina...
Repentinamente, sinto a mão dele na minha cintura. Klaus me segura e me puxa para ele.
Estou de costas, enquanto posso sentir sua ereção em minha bunda, e seu beijo no meu pescoço.
— Como está a pele machucada na sua barriga? Ainda dói?
— Um pouco — respondo.
Havia uma outra dor em meu peito. Mas, essa eu não saberia expressar.
— Por que ontem à noite me fez acreditar que era um guarda? — me atrevi a perguntar.
— Foi engraçado ver sua cara quando me viu no altar — ele riu, a boca mais uma vez
deslizando pelo meu pescoço. — Você realmente acreditou que qualquer guarda se atreveria a
tomar minha noiva?
— Melissa disse que nenhum homem recusa uma mulher que se oferece.
— Sua irmã superestima a importância do sexo — ele deslizou a língua pelo pescoço, e
depois colocou-a na minha orelha. Meu corpo inteiro fraquejou, e eu não consegui esconder um
gemido desesperado. — Se bem que você, Melina... Eu adoro a forma como seu corpo parece
implorar para que eu o foda. Ah, seu corpo é meu, Melina. Sua alma é minha.
— Para lhe dar filhos — completei, porque era só por isso que eu estava aqui.
— Sim. Não precisamos que isso não seja saboroso. Eu posso ser um marido gentil e lhe
dar muito prazer no processo. Mas, preciso de filhos porque preciso que o legado de meus
antepassados sejam mantidos. Você sabe... Os Lazio controlam a Tirreno desde a idade média.
Isso nos dá poder e muito dinheiro, mas caso eu decida acabar com tudo, e simplesmente deixar
para lá nosso legado... Você acha que vou sair tranquilamente de uma máfia? Eles me matariam
por traição. Eu tenho a lealdade de meus homens, enquanto for forte e determinado. Meu pai
sempre me ensinou assim, e preciso disso porque tenho muito a proteger. A vida não é fácil,
Melina.
Eu sabia que não.
— Agora vamos para cama, minha esposa. Estou ansioso para tomar essa boceta nos
lábios de novo...
Não havia como fugir dessa incumbência. Então eu simplesmente assenti o segui até o
leito.
14

ra minha noite de núpcias. A noite que eu sonhei por muito tempo. Mas, não a noite que eu
E estava vivendo. A realidade não era um príncipe encantado que me roubaria de minha
família e me daria uma vida cheia de felicidade. A realidade era um homem desconhecido,
um bandido, e que tinha o poder de me fazer gemer de um jeito que jamais imaginaria.
Klaus abriu meu roupão, revelando meu corpo nu por baixo. O ar frio tocou minha pele, e
eu arrepiei diante dos seus olhos. Ele estava em cima de mim, os joelhos cravados cada qual em
um lado dos meus quadris, seu olhar parecia sombrio e faminto.
— Sabe, esposa — ele murmurou, enquanto abria os botões da sua camisa. Logo, ele a
removeu, revelando sua pele coberta de pelos escuros, seu abdômen definido, e seu peito
musculoso. Minha boca secou diante da visão. — Disse a mim mesmo que diria “não” no altar.
Estava cansado de ser um joguete manipulável, queria escolher minha própria esposa. Mas,
quando você, tão corajosamente, se ofereceu para mim no corredor, não pude recusar.
Sua mão volveu na minha pele. Ele a deslizou pelo meu peito, e subiu. Quando apertou
minha garganta – o suficiente para amedrontar, mas não o suficiente para machucar – eu exalei
outro suspiro de prazer.
— Nunca mais ouse se oferecer a outro homem. Eu mato o cara, e mato você também —
me ameaçou. — Você entendeu?
— Quer dizer que a maneira que eu tenho de escapar de seu domínio é indo para outra
cama? A morte seria um alívio — confessei, porque precisava, não porque queria provocá-lo.
Klaus largou minha garganta, e arranhou minha pele com as unhas, enquanto voltava a
descer para meu peito.
— Alívio, esposa? Alívio será me ter entre suas pernas todas as noites. Eu juro que você
irá implorar por isso, dia após dia, sentindo-se inútil e triste cada vez que eu deixá-la para
procurar outra boceta.
— Eu odeio você — disse, diante de suas palavras.
Era um novo nível de humilhação. Durante toda minha vida, fui espancada por meu pai,
abusada por Melissa, e renegada por minha mãe. E nada pareceu doer tanto quanto o que ele me
disse agora.
E eu mal o conhecia. Por que machucava tanto?
— Me odeia? Claro que não — recusou. — Você nem sabe o que é odiar. Nem o que é
amar. Até ontem à noite, você nem sabia o que acontecia entre um homem e uma mulher. Mas,
você vai aprender isso, Melina. Vou te ensinar cada sentimento, além daquele que faz seu corpo
reagir tão desesperadamente ao meu. Você vai me amar, Melina — jurou. — Vai me amar ao
ponto de ficar chorando quando eu não aparecer. Vai me amar ao ponto de implorar de joelhos
que eu passe a noite com você.
— Por que isso parece horrível?
— Porque isso é o começo do ódio. Quando você não tiver o que quer, então vai me
odiar. Sabe... Minha mãe amava meu pai. E o odiava na mesma intensidade. Ela morreu o
odiando. E ele, o tolo, jurava que ela era uma santa, sempre pronta a recebê-lo de braços abertos.
Giacomo Lazio nunca percebeu que a esposa o mataria se pudesse. Essa é a diferença entre nós,
Melina. Eu sempre vou esperar que você me crave uma faca nas costas. O amor é uma fraqueza,
por isso nunca vou amar você. Mas, isso não significa que não vou te dar tanto prazer que você
vai se partir ao meio em lavas de desejo.
Repentinamente, ele me gira na cama. Ficar de costas me deixou em estado nervoso
imediato, e eu tentei me desvencilhar, mas as mãos de Klaus prenderam as minhas para trás, e ele
me puxou, me deixando completamente a sua mercê.
— Me solte! — gritei.
Ao invés de ele fazer o que eu pedi, Klaus manteve meus pulsos presos com uma das
mãos, e a outra deslizou entre a fenda da minha boceta. Ele afastou brevemente, apenas para me
dar um tapa na bunda, e então retornou, me fazendo queimar naquele carinho bruto.
Seus dedos rasparam no meu clitóris e eu ofeguei, um gemido de pura satisfação
exalando de meus lábios, enquanto sentia meu corpo aquecer e gotejar de umidade. Minha boceta
apertou em seus dedos, uma excitação descomunal enquanto eu me contorci implorando por algo
que remetia a noite anterior.
Eu o queria em mim novamente. Isso era revoltante e indigno. E ainda assim, era tudo
que eu conseguia pensar, seu caralho raspando nas minhas paredes internas, a forma como ele
ofegava cada vez que invadia.
Klaus retirou os dedos novamente. Ele basicamente me cobriu, enquanto levava a mão
úmida até minha frente, mostrando-me a meleca gosmenta em seus dedos. Ele apertou o
indicador e o polegar, fazendo com que ela espichasse, clara e ao mesmo tempo cremosa.
— Você é louca por mim — ele disse, sua boca na minha orelha, me fazendo sibilar. —
Louca para que eu a foda. Não consegue esconder isso... Olha como sua boceta fica úmida por
mim.
Eu fechei os olhos com força, porque não queria ver minha reação. Mas, fechar os olhos
me trouxe novamente a noite anterior, lembranças me povoando de como ele me fez gozar
infinitas vezes, como doeu e como foi prazeroso, de como chorei e gritei de alegria na mesma
medida.
— Você é louca por mim — repetiu sua acusação. — Não sabe como isso me deixa
satisfeito, esposa. Eu vou te comer tanto, vou te usar tanto... você é minha, Melina... Minha
menina, minha esposa...
Ele pressionou a cabeça de seu pau contra minha entrada molhada e empurrou. Eu estava
de quatro, e fui forçada a cair para frente, enquanto ele rosnava e empurrava mais fundo e mais
fundo. Gritei de puro êxtase, lágrimas despejando dos meus olhos por pura humilhação por
gostar tanto de como ele me dava esse prazer estranho e indigno.
Um dia sonhei que teria um marido que faria amor comigo enquanto dizia que me amava.
Klaus não era assim. Ele queria foder e provar que eu pertencia a ele, como qualquer móvel em
sua casa.
E, mesmo assim, mesmo assim... Oh, mesmo assim eu gostava tanto de como ele
afundava, descansava, e então volvia, cada vez com mais fúria.
— Ah — gemi alto, e ele riu, enquanto eu comecei a mover a bunda para trás, apenas
para receber seus impulsos.
Meu corpo era um maldito traidor.
— Sua boceta está me apertando, Melina... — Ele começou a foder sem dó. — Você é
tão apertadinha... ai, tão gostosa...
Lutei contra o orgasmo, não querendo que ele ouvisse o quão perto eu estava. Mordi
meus próprios lábios, tentando abafar o gemido desesperado. Mas, não havia como esconder a
forma como meu corpo sacudiu diante dele, enquanto estremecia em impulsos ferventes.
— Isso... Goza... goza Melina... Goza no meu pau...
Suas estocadas aceleraram até ele gemer alto, explodindo dentro de mim. Seu pau
estremeceu e inchou, antes de ele rugir como um leão, e então sair, gotejando seu gozo na minha
bunda e na cama.
Klaus caiu sobre mim. Seu peso quase me esmagando. Mas, ele não ficou muito tempo.
Logo o vi se afastando. Arrisquei olhar para trás, e ele estava fechando o zíper. Só então me dei
conta de que ele nem tirou a calça. Deus, ele me submetia, nua e sem defesas, de uma forma tão
dominante, enquanto tudo que precisava fazer era abrir o zíper.
Repentinamente, seu olhar caiu em mim. Eu esperei ver qualquer coisa, mas não havia
nada.
— Vá tomar um banho — ordenou. Não pediu, mandou. — Não gosto de dormir com
uma mulher cheirando a sexo.
— Aonde você vai? — indaguei, quando percebi que ele iria sair do quarto.
— Não — ele negou minha indagação movendo a cabeça. — Nunca pergunte. Apenas
saiba manter as pernas abertas para quando eu quiser tê-la. Depois, tome um banho e fique
cheirosa, caso eu volte e queira dormir ao seu lado.
Quando ele saiu do quarto, atirei o travesseiro contra a porta. Eu o odiava na mesma
intensidade que o queria. Klaus iria acabar com a minha sanidade se eu não mantivesse a cabeça
no lugar.
15

festa de casamento terminou depois de três dias e três noites de comemoração.


A Francamente, eu já estava exausto da música e das conversas altas no mesmo dia que me
casei, mas não poderia tirar dos meus homens o direito a comemorar sei lá o quê.
Foder uma mulher nem devia ser algo para parabenizar. O fato de eu estar enlaçado a
Melina Fiorin não era grande coisa. Ok, eu a achei adorável, não escondi isso de ninguém, mas
uma coisa era um casamento por amor, e outra era estar nessa porque era meu dever.
Não a procurei nos dias seguintes a cerimônia. Uma parte de mim simplesmente não
queria mais vê-la. Tê-la em meu corpo me deixou vulnerável de alguma forma que não entendia,
e não era capaz de alcançar a compreensão das minhas emoções.
Então ordenei que Mia ficasse por perto dela, e que Emma e Giulia não se aproximassem.
Não que eu planejasse impedir as três mulheres de terem contato, mas nesse primeiro momento,
era bom que estivessem separadas.
— Ela não saiu do quarto desde o casamento — Giulia me disse, entrando no meu
escritório naquela manhã.
Ergui meus olhos dos documentos que analisava, e encarei a linda morena, que surgia
com um vestido cheio de flores cor-de-rosa, e o cabelo preso em um rabo-de-cavalo.
Giulia tinha vinte e cinco anos, mas parecia ter quinze.
— Ela não está presa no quarto. Pode sair quando quiser.
— Não está mesmo? — indagou, e sua expressão dizia mais que as palavras.
Ok. Eu não era um cara legal. Eu sempre fui brutal porque dentro desse universo, se você
mostrava fraqueza você estava morto, e eu tinha muito a defender, mas... não... eu não prendi
minha esposa no quarto.
— Não está. — Afirmei.
— Então, me autoriza a vê-la?
Eu já havia dito que não. Não gostava quando Giulia me questionava, mas ela tinha essa
personalidade indomável que nunca me fazia colocá-la em seu lugar.
— O que está pensando? Que bati nela?
— Não estou pensando nada. Conheço você e sei que não bate nas suas mulheres, mas a
garota deve estar deprimida, e precisa sair do quarto. Precisa ver as pessoas, e conhecer todos na
casa. Isso faz parte de ser sua senhora.
— A única coisa que ela precisa é estar disponível para quando eu quiser dormir com ela
— devolvi.
— Não vai fazer esse tipo machão insensível para mim, Klaus. Os outros podem cair
nesse teatro, mas eu te conheço mais que a mim mesma. Eu sei exatamente que você não é
assim.
Quero responder, mas uma batida na porta interrompeu-me. Eu digo para a pessoa do
outro lado que entre, e então Mia aparece, um tanto reticente, diante dos meus olhos.
— O que aconteceu?
— Sua esposa se recusa a comer — ela me conta. Há uma preocupação crescente em sua
voz, e isso queima meu estômago. — Ontem de manhã ela comeu apenas um pão e tomou um
suco, mas no almoço disse que estava sem fome, e deixou a comida intocada no jantar. Hoje de
manhã ela também não tocou em nada.
— Perguntou se sente alguma coisa?
— Perguntei, e me disse apenas que não tem fome. Ela parece triste e abatida.
— Deve estar caindo a ficha que está presa a você — Giulia comentou, jogando sal na
ferida. — Que futuro deve estar aparecendo diante de seus olhos: Apenas a vaca parideira de um
homem que nem a procurou por três dias. Um homem que deve dizer claramente que não quer
nada dela além de sexo e filhos. Ela vem de uma casa sem amor, e entra em outra pior ainda. É
um destino que deixaria qualquer um com depressão.
Meu peito pesou diante das palavras. Céus, como Giulia conseguia sempre me jogar no
fundo do poço? Ela tinha essa mania terrível de não amaciar as palavras.
— Ela terá uma boa vida aqui — combati. — Terá roupas bonitas, e uma casa
confortável. Está segura, nunca mais será agredida.
— Esse é preço de suportar um marido insensível?
— Ninguém se casa por amor dentro da Tirreno.
— Mas, os homens têm o direito de ter amor, não é? Giacomo amava sua mãe. Você,
quando está se sentindo solitário, procura carinho e conforto em braços femininos. Deve corrigir
essas palavras, e saber que só as mulheres da Tirreno são condenadas a viver sem nenhum
sentimento.
Puta que pariu! Às vezes eu queria esganar Giulia.
— Mia — me dirigi a criada. — Chame o médico para sua senhora — ordenei.
Mia concordou e então saiu do escritório, apesar de minha ordem parecer insuficiente
para o tamanho do problema.
Eu devia ir até Melina. Devia lhe dar atenção. Ela era uma jovem esposa, precisando que
alguém lhe incentivasse a assumir a casa e suas responsabilidades. Mas, eu temia ir até ela e
tomá-la nos braços, essa era a verdade.
— Qual é o seu problema?
Eu não sabia se a questão de Giulia era uma dúvida ou uma crítica.
— Precisamos fazer um inventário dos espólios que adquirimos depois de destruirmos os
Sorretino. Eu tenho muito a fazer.
Os Sorretino havia tentado invadir nosso espaço na América do Sul. Depois que papai
morreu, eles acharam que eu era apenas um jovem problemático que aceitaria tudo
pacificamente. Nesse último ano, eu tratei de eliminar todos eles, poupando apenas as mulheres e
as crianças.
— Você pode colocar homens de confiança para fazer isso — Giulia apontou.
— Não.
— Então eu posso fazer isso — ela disse. — Eu sou capaz, mais que qualquer homem
dentro da Tirreno.
— Eu sei disso, mas não me atrevo. Você sabe... Há um montante de gente achando que
colocar as mãos em você ou Emma me fará parar a expansão do meu domínio.
— E não faria? — ela ergueu a sobrancelha bem delineada.
— Provavelmente Emma e você são meus únicos pontos fracos. Então, preciso que
estejam por perto.
— Sua esposa também é um ponto fraco — ela deixou claro. — Mesmo que diga para
mim que não sente nada por ela, por ser quem é, sua esposa — destacou —, qualquer homem de
qualquer máfia adversária iria querer roubá-la de você.
Só de pensar nisso, eu senti vontade de matar alguém.
— Ouça meu conselho, Klaus: vá cuidar de Melina. Vá ao menos ver como ela está. Uma
mulher bem cuidada pode ser seu porto seguro. Uma mulher renegada, pode ser sua perdição.
✽ ✽ ✽

Melina estava deitada de costas para a porta de entrada. Eu tranquei a porta atrás de mim,
observando que o quarto estava vazio, e que Mia havia deixado a bandeja com suco, pães e
queijos sobre a mesa perto da janela.
Olhei para Melina. Ela não parecia dormir, apesar de mal se mexer. Apenas sua
respiração fazia com que um leve movimento sobre o robe de seda branco aparecesse. Ela estava
tão encolhida que me deu pena, e eu quase caminhei até ela para consolá-la de sua triste sina.
— Esposa — disse, chamando sua atenção.
Ela girou o rosto para mim, mas parecia não me ver. Estava com os olhos inchados de
chorar, havia uma dor nela que quase me arrebatou também. Então eu desviei de seu olhar e
caminhei até a bancada. Peguei uma fatia de queijo, e levei aos lábios.
— Está bom — disse. — Por que não quer comer?
Melina não respondeu.
— Quer morrer de fome? Demora bem mais dias do que você imagina, e vai doer para
caramba até acontecer.
Nada. Ela voltou a deitar-se encolhida, o rosto para a parede. Seus olhos profundos
pareciam derrotados, e eu quis brigar com ela apenas para despertar qualquer reação.
— Esposa, você está triste pela sua nova vida ou essa é uma tentativa patética de chamar
minha atenção?
Ponto. Mexer com seu orgulho fê-la me encarar novamente. Quase sorri quando vi o fogo
em seus olhos, e precisei me conter para não ir até a cama e beijá-la apenas para receber um
pouco daquele calor na minha boca.
— Eu nunca vou querer sua atenção — ela garantiu, e eu gargalhei.
— Melina... Fazer greve de fome demonstra exatamente o contrário. Mas, ponto para
você: Tem totalmente a minha atenção. Façamos o seguinte, você come e eu te darei um
presente. O que você quiser.
Ela se ergueu, claramente interessada.
Era uma guerra de interesses, essa nossa relação. E eu jamais perdia uma guerra.
16

— O que eu quiser?
— Bom, o que estiver ao meu alcance — ponderei.
— Liberdade.
— Isso não está ao meu alcance — dei de ombros.
Não sei se seria fácil explicar para Melina o quanto um homem como eu não pode
demonstrar fraqueza. A vida dela, de todos com quem eu me importava, estava dançando sobre a
corda bamba da minha personalidade. Atacar minha esposa desprotegida e livre seria a maneira
mais fácil de mostrar que eu não era um homem a ser respeitado.
Então, querendo ou não, Melina ficaria sobre meu olhar atento.
— Então... Eu posso caminhar perto do lago?
Arqueei a sobrancelha, curioso, enquanto olhava para o lado. A enorme janela mostrava o
lago perto do jardim. Não havia percebido que ela tinha uma visão daquele lado da propriedade
quando a deixei ali.
— Você quer se atirar no lago, né? — indaguei.
Tinha quase certeza de que ela queria se matar.
— Só quero respirar ar puro — murmurou.
Era um pedido justo.
— Vou com você.
— Eu não quero andar com você — objetou. — Quero ficar sozinha, por favor.
— Até ter certeza de que não é uma suicida, eu não vou permitir que fique um minuto
sem estar sobre meu olhar atento, ou sob a vigilância de algum dos meus homens.
— Por que se importa? Sou apenas uma peça de peão.
— Se soubesse jogar xadrez, saberia que nem todos os peões são peças a serem
desperdiçadas.
Mas, eu mesmo tinha dúvidas sobre a importância dela nesse jogo. Sinceramente, tinha
mulheres a escolher, por que apenas uma, que eu nem mesmo escolhi, teria qualquer importância
a mais? Ainda assim, quando Melina se ofereceu para mim naquela noite, o desespero em seus
olhos, e a certeza de que ela era tão corajosa para tentar atrapalhar os planos de um Klaus Lazio
imaginário foi o suficiente para cravar algo dentro do mim.
Giulia estava certa em insinuar que Melina tinha sua importância em minha vida. Mas,
não apenas por ser um ponto fraco. Havia algo a mais, eu não sabia o que era. Talvez as
promessas que fui forçado a fazer para ela no altar despertaram algo que eu não podia enfrentar.
Não agora... Não quando havia acabado de assumir a Tirreno e sabia que estavam
planejando me destituir do poder.
— Chega desse jogo — me irritei. — Você vai comer agora. Ou vou forçar a comida na
sua garganta.
Ela pareceu assustada com a minha ameaça, e acabei recuando quase de imediato. Isso
era vergonhoso.
— Melina, precisa ser saudável. Preciso de filhos saudáveis, e isso depende da mãe deles
estar bem de saúde. Então, por favor, coma.
Sim, ela até pensou em recusar, mas por fim, seu olhar amenizou e ela se levantou da
cama e foi até a mesa. Eu podia ver a dor e as lágrimas nos seus olhos, enquanto mordia um
morango. O caldo suculento molhou seu lábio inferior, e meu corpo ficou rígido com a forma
sedutora que ela mastigava.
Ergui minha mão e a pousei sobre seu lábio inferior. Ela me encarou, a ação enviando
raios de desejo através meu corpo, embora meu rosto permaneceu impassível.
Retirei a mão, engolindo em seco, enquanto ela pegava outro morango.
— Coma o pão e tome um café. Coloque mais que frutas no estômago.
— Mamãe dizia que eu ficaria gorda se comece carboidrato. Eu tenho tendência a
engordar, sabe? — me contou. — Então eu nunca pude comer...
Imagens de uma carne saudável cobrindo seus ossos me atiçou. Eu quase podia me ver
mordendo-a. Não é que eu tenha algum tipo de fetiche com mulheres mais cheias, mas pensar em
Melina assim me deixou com tesão.
— Você pode comer à vontade, aqui...
— Mas, minha mãe...
— Não ligo para o que sua mãe pensa. A opinião dela também não deve mais importar a
você. Agora é uma mulher adulta, uma esposa, a única coisa que deve pesar em você é o que seu
marido pensa. E, mesmo o que eu penso, não deve jamais ficar acima do que você mesma pensa.
Seguro o queixo dela e o ergo, fazendo com que os olhos de Melina fiquem fixos nos
meus.
— Você é uma garota corajosa, Melina... O que fez na noite anterior a cerimônia me
mostrou que tem garra, que sabe lutar... Isso me fez dizer sim no altar — admiti, até mesmo para
mim. — Eu não sei se teria aceitado esse casamento se você não tivesse lutado contra ele.
Ela arregalou os olhos.
— Você quer dizer que se eu tivesse ficado em meu quarto sem fazer nada, você iria me
recusar no altar?
Eu quase ri diante do completo assombro que demonstrou.
— Pois é — concordei.
— Não acredito! Eu podia ter me tornado livre se...
— Melina, não tinha como você saber — abrandei. — E pense... Foi bom se casar
comigo, não foi? Você terá uma boa vida...
— Sendo apenas sua parideira.
— Faz parecer como se fosse horrível. Mas, a verdade é que é uma honra.
Melina debochou com desdém. Suas narinas dilataram-se com minhas palavras, mas ela
não retrucou. Simplesmente afastou minha mão do seu queixo, e começou a comer o pão.
— Há uma fera ferida dentro desse corpo frágil — murmurei, me aproximando, minha
boca próxima do seu ouvido. — E uma fera sempre mostra suas garras.
Minha mão voltou a erguer. Dessa vez eu não fui até seu queixo, e sim a puxei pela
cintura. Abri seu roupão com uma mão, e afundei meu rosto entre seus seios, capturando sua pele
com minha língua.
Ela não fugiu, nem tentou se afastar. Simplesmente aceitou meu beijo, minha boca
deslizando entre sua camisola. O cheiro dela era tão bom. Lembrava bolo de baunilha com café
em manhãs de inverno, ao lado de minha mãe.
Eu senti saudades e suspirei.
— Klaus — ela murmurou.
Isso me fez volver a cena entre nós. Meu breve devaneio me fez perceber que eu gostava
dela. Melina era familiar, quase como um lugar tranquilo onde posso ancorar após uma noite
tempestuosa em um mar revolto.
Repentinamente, ela envolve meu pescoço com ambas as mãos, suas unhas cravando na
minha nuca, enquanto inclina a cabeça e me busca, um beijo estalado entre nós.
Ah, ela não iria se matar, isso era certo. Melina acabaria por aceitar sua vida como
minha esposa, e iria me receber satisfeita toda noite que eu a quisesse. Isso me fez sorrir como
um bobo, enquanto a apertava em meus braços.
17

eus lábios carnudos estavam separados e seus olhos doces se fecharam enquanto ela
S inclinava a cabeça para trás. Travei no meio da carícia, Melina deitada abaixo de mim,
apenas para observar como ela absorvia todas as sensações. Ela parecia tão ansiosa por
experimentar o prazer que uma parte de mim esqueceu que era um casamento forçado, algo que
ela tentou fugir desesperadamente.
— Você é tão doce, esposa — murmurei, enquanto minhas unhas traçavam os picos
duros visíveis sob o sutiã de renda.
Ela suspirou, ainda sem abrir os olhos. Então, segurei sua mão e a pus exatamente onde a
minha estava. Queria que ela tivesse o tato das próprias reações, e meu pau se contraiu quando
sua mão explorou, descendo pelo seu corpo, e indo em direção ao seu centro delicado.
— Você não imagina a visão que estou tendo — digo. — Sua pele pálida contrastando
com seus pelos escuros. Tudo isso visível pela renda da calcinha. Você é uma tentação difícil de
resistir.
— E você está tentando resistir? — ela provocou.
Minha mão desce pela minha ereção. Toco-me tentando aliviar o peso do desejo entre
nós.
— Eu quero resistir sim — admito. — Há coisas que você não entende...
— Por que não tenta me explicar?
Uma conversa sobre a vida era exatamente o que eu não queria nesse momento. Estava
duro como uma rocha, e meu corpo clamava pela libertação que ela podia me dar. Já fazia dias
que eu a tive pela última vez, e mal podia esperar para estar dentro dela novamente, como se
fosse um vício impossível de evitar.
— Sabe... Quando eu era jovem... Quando eu tinha vinte anos e ainda estava noivo de sua
irmã, disse ao meu pai que queria largar tudo e viver de minha arte na praia — ri do pensamento,
porque parecia tanta loucura agora. — Eu só queria dar o fora dessa droga toda. Mas, meu pai
me mostrou que não há como escapar da Tirreno. Você pode até tentar, mas eles vão te encontrar
e te matar pela audácia, e por medo de que você eventualmente fale demais.
O olhar dela brilhou diante do relato. Era como se ela me entendesse.
— Então, a vida veio como uma enchente destruindo tudo, só deixando entulhos e
sujeira. E eu descobri que não posso ser fraco porque há muita gente dependendo de mim. Gente
que me importa de verdade.
— Aceitar se casar comigo faz parte dessa vida, não é? — ela compreendeu
imediatamente.
— Eu não tive uma palavra sobre o casamento. Meu pai ordenou e fui forçado a aceitar.
Primeiro Melissa, depois você. Eram apenas nomes que não me tocavam. Hoje penso no quanto
seria infeliz se Melissa não tivesse dado o fora.
— Ela pôde escolher — o ressentimento surgiu, sem controle, no tom dela.
— Sim, ela pôde. E ela fez bem. Graças a Deus escolheu dar o fora. E ficou nós dois com
a incumbência de gerarmos a continuação dos Lazio. Eu não acho que você é uma péssima
escolha, ou que você não me atrai... Claramente me atrai — eu levo sua mão até meu pau duro,
apenas para lhe dar certeza. — Mas, você sempre será a escolha de meu pai. Não a minha.
Sim, sou brutalmente sincero, porque eu acho que merecia que eu fosse. Melina já foi
forçada a estar casada comigo, viver sobre uma ótica de falsidade e mentira era pior que isso.
— Você também nunca foi minha escolha. Minha escolha... — ela pareceu pensar algum
segundo, e então me contou: — seria um romance como nos livros.
Momentos antes, quando a trouxe para a cama após ela me beijar, vi fogo nela. Agora, ela
apenas parecia um mar calmo.
— E isso existe? — zombei.
— Eu não sei... Eu... — gaguejou. — Eu sempre quis ser amada. Mas, entendo que não
vai acontecer com você.
Ela era tão jovem e ingênua, sonhando com coisas tolas como sentimento. A vida era
muito diferente disso, especialmente a nossa. Com o passar do tempo, Melina descobriria a
terrível realidade de pertencer a Tirreno. Havia sangue nas lacunas de nossa existência.
— Nós podemos ter outras coisas além do amor. Companheirismo e sexo — apontei.
Melina abriu a boca para dizer alguma coisa e depois fechou-a, apertando a mandíbula
para manter seus pensamentos dentro de si. Uma parte de mim achava que ela me mandaria me
foder, mas ela foi reservada o suficiente para tentar não transparecer isso.
Eu saí de cima dela, e a puxei para fora da cama. Quando Melina ficou em pé, larguei
suas mãos e andei até a cabeceira. Sentei-me no colchão, espichando as pernas sobre o leito,
observando-a diante de mim, os raios da luz da manhã parecendo coroá-la sobre seu corpo
adorável.
— Tire a camisola e a calcinha — eu ordenei. — Quero vê-la nua.
Pensei que ela iria recusar e me desafiar, mas uma parte de mim entendeu que Melina
estava disposta a seguir o jogo. Não sei se porque ela também reagia a mim, ou se porque ela
estava cansada demais para lutar.
Então, ela simplesmente puxou a camisola, me permitindo uma visão de seus seios fartos.
Quando a calcinha desceu, eu vi um filete de desejo baixando junto. Minha boca secou de
vontade de mamar aquela delícia.
— Pegue um cacho de uvas — apontei a mesa. — Segure a base com a boca, ajoelhe-se
no chão e o traga rastejando até mim.
Mais uma vez, imaginei se ela faria ou não. Seu peito subia e descia enquanto ela parecia
não compreender minhas ordens. Por fim, ela pegou a uva e pôs o cabo na boca, segurando-o
com os dentes. Então, ela foi para o chão, as duas mãos espalmadas no piso, ficando de quatro.
Quando ela começou a engatinhar para mim, eu quase gozei.
Então ela se aproximou. Tirou o cacho da boca, e o levou para meus lábios. Ela me
alimentou como se eu fosse um imperador romano, e isso me deu muita satisfação. Eu sei que
casamento é uma merda, especialmente os forçados, mas esse está se mostrando uma surpresa
cada vez melhor.
Então minha boca buscou a dela. Minhas mãos a puxando contra mim, seu corpo
entrando na cama, entre lençóis e uva, um desejo descomunal nos arrastando cada vez mais
fundo e fundo.
Todavia, como nada era perfeito, antes mesmo que eu pudesse tirar a roupa, ouço uma
batida na porta.
— Vá embora! — eu grito.
Minhas ordens não são para serem discutidas, mas há duas pessoas nessa casa que nunca
se preocuparam em me obedecer, e há uma delas na porta.
— Klaus, há vários homens no seu escritório te esperando. Dizem que tem uma reunião.
Merda! Era Emma. Eu fiquei entre a cruz e a espada, sem saber se a mandava embora, ou
se seguia com ela. Emma sempre era a responsável, que lembrava a importância dos
compromissos. Ainda assim, tecnicamente, eu estava em lua-de-mel e eles deviam respeitar isso.
— Diga a eles para aguardar meia hora. Estou com minha esposa — avisei.
Houve silêncio e eu pensei que ela se foi. Contudo, era Emma e claramente ela não deu
um passo.
— Você está aí, não está?
A porta estava fechada, mas eu quase podia vê-la do outro lado, com os braços cruzados e
batendo o gracioso pé no chão.
— Eu vou te esperar — ela avisou.
— Você está brincando?
— Não há nada que fará aí que eu já não fiz um milhão de vezes.
Isso me deu nos nervos. Eu quase perdi o tesão com essa frase, mas quando olhei para
Melina, e vi o olhar obscuro dela quase implorando pela foda, eu soube que não conseguiria
retroceder.
— Vá para a reunião no meu lugar — ordenei. — E diga aos homens para fazer o que
você mandar.
Claro que Emma não era capaz de assumir nada, mas eu sabia que Giulia estaria por
perto, e se havia alguém que eu confiava para dar ordens era a morena. Suspirei de alívio quando
ouvi os passos se distanciando.
— Agora... Vou cuidar de você, esposa.
18

respiração de Melina estava acelerada. Ela engasgou ofegante enquanto eu encaixava seus
A quadris embaixo do meu.
— Ah, Klaus... por favor... — ela gemeu meu nome de um jeito que me deixou em
êxtase.
Havia uma regra implícita na Tirreno de que a mulher sempre chamava seu homem de
“senhor” ou “marido”. Mas, Melina dizia meu nome. Ela parecia quebrar as denominações, tirar
do matrimônio o peso que ele tinha.
Eu não posso negar que isso me agrada. Sou um cara livre, que sempre odiou a prisão das
obrigações que me aguardavam. Mas, com Melina... a forma como ela se contorcia, seus dentes
afundavam nos próprios lábios, me fazia sentir...
Quase especial.
Quase.
Não era realmente um sentimento que eu podia sentir por uma garota como ela. Por mais
que gostasse de Melina, gostasse de como ela fazia sexo, gostava da personalidade corajosa que
me buscou na noite anterior ao casamento, ainda assim, era um enlace forçado, tanto para mim
quanto para ela.
— O que você quer, esposa? — indago, brincando com meus quadris, sentindo meu pau
raspar no seu clitóris inchado.
— Você — ela quase gritou. — Você, Klaus. Eu quero você.
Sorri diante da simplicidade. Era apenas uma mulher ansiosa por um homem. Não havia
mais que isso nessa ação. Não estávamos apaixonados, mas sabíamos que o sexo pode ser algo
que mexe com a sua cabeça. Tínhamos uma clara atração e podíamos usar disso a nosso favor,
enquanto cumpríamos o que estávamos destinados a fazer.
Ter filhos.
Uma extensão.
Uma família é algo importante na Tirreno. Um homem precisa de uma esposa e um filho.
Isso mostra que ele é capaz de cuidar de algo tão importante quanto a própria Tirreno. Meu avô
dizia que um homem que não pode cuidar de uma esposa e de uma criança não é um homem
digno. Não importa quantas amantes você tenha, contanto que você seja alguém capaz de dar
uma vida boa e honrada a uma mulher, para que ela tenha condições de cuidar de seu bem mais
precioso: seu sangue e carne no formato de uma criança.
Eu penso no quanto isso é hipócrita, enquanto cuspo na mão e espalho a saliva na cabeça
do meu caralho.
Alguns anos antes, eu joguei na cara de meu pai o quanto ele era um lixo por ter traído
minha mãe tantas vezes, e ainda dizer que a amava. Lembro-me de como insisti saber se suas
decisões sobre meu futuro eram porque me amava e se preocupava, ou tudo que significava para
ele era ter seu sangue continuado.
Afundei meu pau na sua boceta suplicante. Uma parte de mim não conseguia sair do mar
de melancolia diante das lembranças. Mas, quando Melina estendeu as mãos e me abraçou, eu
ronronei contra ela, sentindo seu aperto tanto em seus braços quanto eu suas paredes internas.
Ela tinha alguma coisa... eu não sei o quê.
Não era porque ela se entregou para mim a primeira vez completamente virgem. Não era
o hímen, eu não ligava para isso. Era algo além de sua pureza, imaturidade e necessidade.
— Ah, sim... Sim, Klaus... Klaus — ela repetiu meu nome tantas vezes.
Eu sorri contra seus lábios enquanto a tomava para outro beijo. Eu gostava de saber que
ela estava gostando, que estava sentindo prazer. Não que eu fosse o mais misericordioso dos
caras. Sinceramente, nunca prestei atenção antes se uma garota gozava. Mas a forma como ela
convulsionava enquanto eu metia nela parecia tornar meu próprio prazer ainda mais satisfatório.
— Klaus! — ela gritou, e então seu corpo apertou o meu, quase drenando minha alma.
— Isso... goza Melina... você goza tão gostoso — eu elogiei, deixando que ela se
aproximasse do orgasmo.
— Sim... Klaus... — ela gritou e então começou a ter espasmos enquanto arqueava o
corpo para trás, recebendo meu cacete que batia fundo e mais fundo.
— Goze para mim — eu exigi.
Ela esguichou de prazer, jatos se espalhando e se unindo ao meu próprio orgasmo, que
derramava entre nós. Eu a comi com força, batendo mais e mais em seu corpo enquanto ela
empurrava de volta para mim com cada impulso.
— Ah, é tão bom — sua sinceridade me fez grunhir e ter espasmos como se estivesse
recebendo choques elétricos.
Quando tudo acabou, desabei para o lado, recolhendo meu pau mole e minhas bolas
murchas. Um sorriso desdenhoso surgiu no meu canto da boca, enquanto eu olhava para o teto,
iluminado pelo céu da manhã.
— Nós devíamos sair em lua de mel — eu murmurei. — Apenas para termos um tempo
para nós, sem ninguém para nos atrapalhar.
Eu nem havia pensado em levá-la a uma lua de mel antes dessa manhã. Parecia uma ideia
romântica e um tanto ridícula, especialmente pelo fato de nosso casamento ser a porra de um
acordo de nossos pais.
Ainda assim, cá estou eu, como um idiota, mal contendo um pensamento doce de levar
Melina para conhecer as Maldivas ou para fazer compras em Dubai.
19

rgui meus olhos para a fileira de vestidos bonitos dispostos no closet de meu quarto. Mia
E estava atrás de mim, ajudando-me a escolher a roupa que eu usaria nesse dia. Eu nunca tive
mais que dois ou três vestidos, e mesmo eles não eram tão bonitos quanto estes, aqui, então
estava claramente confusa sobre o que eu vestiria nessa minha primeira saída do quarto.
Nessa manhã, a terceira consecutiva que Klaus acordava em meus braços depois de uma
noite de amor, ele me disse que eu podia passear pelo jardim. Eu mal conseguia acreditar que
poderia simplesmente caminhar entre as árvores, e talvez ver o lago e descobrir se havia peixes
como eu imaginava. Respirar ar fresco parecia um sonho que eu mal acreditava que estava
vivendo.
— São tão bonitos — disse para Mia.
— O floral combina com seu tom de pele — ela apontou, sorrindo.
Isso era uma surpresa. Realmente nunca fui vaidosa, até porque não tinha como ser. Mas,
agora, uma parte de mim queria estar bonita, então gostei de saber disso.
— Estou confusa, Mia — contei, porque eu precisava desabafar com alguém e não havia
outra pessoa aqui para mim.
— Pelo quê, senhora?
— Meu marido é um homem estranho — murmurei. — Ele parece ser tão frio diante das
outras pessoas, mas ele foi tão doce em me preparar tudo isso.
— Ora, ele precisa ser brutal e assustador na Tirreno, para garantir nossa segurança,
minha senhora — ela explicou, sua mão passando confortadora pelo meu braço. — Mas, quando
a porta se fecha e vocês só tem um ao outro, tenho certeza de que ele mostra outra face.
Eu iria concordar com ela, quando algo cruzou minha mente. Como Mia sabia? Ela
também já foi íntima de Klaus?
— Você já foi uma das suas amantes?
Eu precisava saber. Por mais que entendesse que mulher nenhuma se recusaria a esse
homem controlador, que usava o medo e o poder para se manter no topo, queria ouvir da voz
dela o que podia esperar de Mia.
Eu mal a conhecia, como não conhecia ninguém aqui. Era minha nova família, mas
estava nervosa de considerar a criada uma amiga, sendo que ela podia ser outra a esquentar o
leito de meu marido.
— Oh, senhora! — exclamou, negando. — Claro que não!
— Então, como sabe?
— Ah, tenho olhos, senhora. Vejo como ele trata Giulia e Emma.
Esses nomes de novo. Eu sabia que meu casamento com Klaus não era por amor, nem de
minha parte, nem da dele, mas sentia uma dor estranha cada vez que pensava que ele tinha
amantes tão importantes que as mantinha perto de si, que queria usufruir da presença delas.
Eu contive um suspiro, enquanto pegava qualquer um dos vestidos, simplesmente
abandonando a ideia de realmente me importar com o tanto de mulheres que Klaus têm. Era uma
luta inútil, pois os homens da Tirreno fazem o que querem. Meu próprio pai, certa vez ouvi
Açucena comentar, tinha suas amantes. E minha mãe sempre aceitou isso sem uma única palavra,
pelo que eu sabia.
Amor e fidelidade não fazia parte dos acordos de casamento. Quanto antes eu entendesse
isso, melhor.
Era uma vida estranha, mas era a única que eu tinha.

✽ ✽ ✽

— Oh, são cisnes? — indaguei, apontando o casal branco e belo que nadava a alguns
metros de nós.
Mia assentiu, rindo.
— São tão lindos, não é?
— Sim! — Eu realmente estava emocionada pela visão. Esse foi o melhor presente que
eu tive em toda minha vida, e era grata a Klaus por me permitir observar esses animais
magníficos.
— Esses dias a fêmea ficou doente e precisaram levá-la ao veterinário. Daí quando a
trouxeram de volta, juro que o reencontro foi a coisa mais linda que eu já vi. Eles dançaram um
para o outro. Você já viu a dança dos cisnes? É tão perfeito, senhora. São os animais mais
incríveis do mundo.
O relato me fez sorrir. O amor era um sentimento tão bonito, gostaria de experimentá-lo,
mas jamais aconteceria para mim. Eu tinha um marido que não me amava, e se me permitisse
sentir por ele qualquer coisa além de respeito ou obediência, seria destroçada, e morreria de dor.
— Olá!
O cumprimento veio à nossas costas. Eu girei, e dei de cara com a loira bonita que me
salvou de meu pai no casamento. Seu sorriso espontâneo me fez sorrir de volta. Ela tinha uma
bandeja nas mãos, com uma jarra de suco de laranja e copos, e os levou até uma mesinha no
jardim. Quando colocou a bandeja lá, acenou para mim e Mia para que nos aproximássemos.
— Klaus disse que foi lhe permitido caminhar no jardim, então eu trouxe suco — ela
disse.
Foi tão gentil que eu não consegui recusar o copo que me serviu assim que me aproximei.
— Bom, já que está em boas mãos, vou deixá-las a sós e ir fazer outras coisas — Mia
avisou, e então fez uma breve reverência e se afastou.
Pássaros cantavam ao longe, e o vento quase frio me fez procurar um banco no sol. Eu
me sentei, sentindo o calor tocar minha pele, e fechei os olhos por momento, apenas para
apreciar essa sensação.
— Liberdade, não é? — a loira disse, interrompendo meus pensamentos, e me fazendo
encará-la.
Bebi outro gole do suco, esperando que ela se sentasse ao meu lado.
— Liberdade? — murmurei. — Nem sei o que é isso.
— Terá liberdade com Klaus — avisou. — Ele não vai prendê-la. Apenas, vigiá-la para
mantê-la segura.
— Me manter segura?
— Qualquer inimigo iria querer matar sua esposa, apenas para afrontá-lo.
Não escondi o espanto. É claro que eu era um alvo, especialmente porque um homem que
não é capaz de proteger a própria esposa, não é capaz de cuidar de uma máfia.
— Qual seu nome? — indaguei à loira.
Claro, eu sabia a resposta, mas queria começar o assunto. Eu tinha outras questões
também, mas essa era a mais urgente.
— Sou Emma — ela contou.
Isso confirmava que era a amante de Klaus, uma das favoritas, já que me disseram seu
nome várias vezes desde que cheguei. Uma parte de mim ficou enojada comigo mesma por sentir
simpatia por ela, sendo essa mulher alguém que divide a cama com meu próprio marido.
— É uma época linda do ano aqui nas montanhas, não? — ela continuou, como se não
percebesse minha reação. — Embora o outono esteja quase indo embora. O inverno será terrível,
vi na televisão. Dizem que as mudanças climáticas vão...
Ela continuou a falar quase sem respirar, uma palavra atrás da outra, enquanto imagens
dela aparecendo no quarto e recolhendo as toalhas, ou imagens dela me puxando no casamento e
me tirando de perto de meus pais, cuidando de mim com o gelo, me tomavam.
— Você é uma das amantes de Klaus? — eu a interrompi.
Mais uma vez, sabia a resposta, mas queria que ela me dissesse com todas as letras. A
forma como ela arregalou os olhos, a maneira como sua boca abriu e ela começou a gaguejar um
som que lembrava a letra “A”, me fez perceber que entrou em pânico.
Talvez ela pensasse que, como esposa, a mandaria embora, ou a puniria de alguma forma.
Mas, eu não tinha esse poder, e mesmo que tivesse, sabia que o culpado de tudo era Klaus. Essa
loira, Emma, era apenas uma peça de satisfação para ele.
Repentinamente, dois homens surgem no jardim. Como estamos sentadas atrás de uma
floreira, não nos viram. Eles conversam animadamente, e nós duas os observamos rindo, quando
um deles empurra o outro, que cai quase aos nossos pés.
Por um breve momento, o rapaz no chão resvala em Emma. Ele não parece uma ameaça,
ele apenas a toca porque parece buscar algo para se segurar enquanto desaba. É uma cena
comum, uma brincadeira entre amigos, que instantaneamente sai do controle, quando Emma
parece ter um surto pelo simples toque.
— Oh, céus — o homem diz. — Me perdoe, senhora Emma — ele repete.
Não basta. Emma começa a gritar, dizendo para não encostar nela, e logo ela já está
tentando correr pelo jardim, como se fosse uma cega, basicamente não vendo o lago a sua frente.
Eu fico tão chocada com a cena, que corro atrás dela, e a prendo na cintura antes de ela
cair no lago.
Emma grita, ela simplesmente parece enlouquecida, e eu preciso forçar minhas mãos para
que não escape. Não sei se o lago é fundo, mas é gelado, especialmente nesse outono. Se ela cair,
vai ficar doente.
— Ajuda — eu peço para os homens, e para meu assombro, eles não vem para nós,
tentando segurá-la, simplesmente saem correndo na direção oposta. — Emma! — chamo sua
atenção, tentando fazê-la parar de se mexer.
Repentinamente, há outra presença ao meu lado. Eu ergo os olhos, e vejo Klaus ali. Eu o
encaro, sem saber o que ele dirá em ver a esposa e a amante juntas, mas meus pensamentos são
interrompidos pela forma branda com que ele ergue as mãos e toca as madeixas loiras.
— Emma... sou eu, Emma... — Ele diz, tão suavemente, que meu coração chora.
Ela parece começar a se recuperar de seu surto, e o encara. Repentinamente, Klaus a puxa
para si, e ela balança em seu abraço, escondendo seu rosto molhado de lágrimas no seu peito
masculino.
— Tudo bem, Emma — ele murmura. — Eu estou aqui, Emma...
Ele a ama. É isso. Eu vejo o amor ali, na forma como ele toca sua face, na maneira como
ele descansa o queixo no topo da sua cabeça. Eu não conheço o amor, mas soube identificá-lo
imediatamente quando o vi.
— Obrigado por não ter a deixado cair no lago — ele murmura para mim.
Eu concordo, enquanto percebo que há outras pessoas aqui. Carlo está parado mais
distante, e há uma mulher de cabelos pretos e longos nos encarando perto de onde estão os
bancos. Aquela mulher é basicamente a mulher mais bonita que eu já vi na minha vida, e eu
quero dizer algo, mas a maneira como Klaus ergue Emma nos braços me cala.
Dói. Dói para caramba vê-lo levando-a como se ela fosse a coisa mais importante de sua
vida. Meu olhar fica repleto de lágrimas, eu não consigo ficar indiferente ao carinho e ao respeito
que demonstra. É algo tão forte que eu só quero desaparecer.
20

eu marido não apareceu em meu quarto naquela noite. Eu tinha muitas questões,
M especialmente sobre Emma. Queria tirar a limpo a situação deles, saber onde eu me
situava dentro disso, mas a ausência de Klaus deixou claro que eu não tinha espaço para
questionar como as coisas funcionavam dentro dessa casa.
Ao menos, não estava mais presa. Quando Mia me chamou para tomar café da manhã no
jardim, percebi que teria uma liberdade que jamais pensei que aconteceria em meus dias de
clausura na casa de meus pais. Só por isso, já devia ser grata. Ainda assim, sentia um amargo
corroendo minha boca, uma vontade louca de chutar e gritar uma dor que eu não entendia,
apenas sentia.
Essas coisas eram muito confusas. Eu não era acostumada a experimentar essas
sensações, então tentei manter uma postura impassível, mesmo quando a morena do dia anterior
se aproximou da mesa onde eu tomava o café.
— Ainda não me apresentei a você — ela me disse. — Sou Giulia. Posso me sentar?
Eu era acostumada ao tom jocoso de Melissa, então esperei que isso viesse da amante
favorita de Klaus, mas não aconteceu. Ao contrário, ela parecia estranhamente respeitosa, e isso
me fez pensar que talvez ela seja uma escrava como eu, alguém sem direito a impor sua opinião,
alguém não livre para ir embora.
Por isso, assenti, apontando a cadeira. Giulia se sentou e se serviu uma xícara de café
quase que imediatamente.
— Eu acho que você tem muitas questões — ela murmurou, após tomar um gole e fazer
uma careta estranha. Então, pegou o açúcar e começou a despejar colheres na xícara. Uma,
duas... cinco... Eu fiquei chocada com a quantidade. — Deve estar se perguntando o que
aconteceu ontem com Emma...
— Estou me perguntando onde está meu marido — disse, contrariada.
— Klaus passou a noite com Emma. Ela estava em surto, você viu. Eu tentei lidar, mas
nunca sei como lidar com as reações de Emma...
Eu sabia que ele provavelmente estava com a amante, mas ouvir isso doeu pra caramba.
— Então, o que aconteceu?
— Emma não suporta que qualquer homem a toque — ela contou, voltando a beber o
café. Dessa vez, seu semblante pareceu agradável.
— Qualquer homem com exceção de Klaus — apontei.
— É... ele consegue tocá-la. Mas, outro... Ela fica louca. Não é culpa dela.
— Como assim?
— O que eu vou te contar, quase ninguém sabe, mas como a esposa de Klaus, acredito
que você deva saber. Emma foi criada em um bordel, e aos doze anos foi leiloada. Ela foi
comprada por um grupo de empresários, por alguns milhões. Ela é linda, não é? Imagine seu
rosto com um semblante infantil. As pessoas são doentes.
Absorvi tudo, um tanto chocada, um tanto sem reação.
— Você quer dizer...?
— Ela foi uma boneca sexual de uma grupos de homens com idade entre quarenta e
oitenta anos. Às vezes era usada até desmaiar. Quando Klaus a encontrou, alguns anos antes, ela
estava nua, estava com as pernas abertas, e uma fileira de homens com o pau duro aguardando
sua vez de fodê-la. Emma estava sangrando, acho que não aguentaria mais aquela noite. Ela
passou algum tempo internada depois disso.
— E esses homens?
— Todos mortos. Klaus mesmo os matou. — Para minha surpresa, Giulia deu um sorriso
maroto na minha direção. — As portas do inferno são fichinhas perto das portas de homens com
dinheiro e poder. Tirando Klaus, nenhum deles presta.
Eu queria dizer muitas coisas, mas não conseguia falar nada. Quando Emma me falou que
também levou socos, pensei qualquer coisa, talvez até um pai ou um namorado abusivo, mas
isso? Isso era a pior coisa que alguém podia viver. Uma parte de mim, a parte que sentia ciúmes
dela, se quebrou nesse instante, e uma pena e compaixão absurda tomou conta do meu coração.
— Klaus não é tão melhor assim. Ele a tirou desses homens para tê-la para ele.
— Como assim?
— Eu sei que vocês duas são amantes dele.
Havia flores penduradas atrás dela, em um jardim vertical. A maneira como Giulia
inclinou o corpo para trás, a cabeça pendendo como se ela tentasse entender minhas palavras —
como se as mesmas não fossem suficientemente claras — fez com que seus cabelos negros
resvalassem na relva, adornando sua cabeça.
Ela realmente parecia uma deusa em um jardim.
— Como assim? — ela repetiu e eu abri a boca, em choque.
— Todos me avisaram que vocês duas são amantes dele — apontei.
Ela assentiu, enfim, parecendo entender minhas palavras.
— E Klaus disse...?
O que importava?
— Klaus e eu não conversamos sobre vocês.
— Hum.
Eu realmente queria que ela dissesse alguma coisa, mas Giulia simplesmente se serviu de
mais café. Depois, ela cortou um pedaço de bolo de laranja, e quando começou a comer, percebi
que ela não me diria mais nada da relação deles.
— Você também era uma prostituta?
Um sorriso surgiu em seu rosto. Escárnio puro.
— Eu valeria alguns milhões, não acha?
Giro meu rosto para o lago. Havia uma fonte perto dele, com uma mulher nua
derramando um jarro ininterrupto de água do próprio lago. O som corrente era cântico de calma e
tranquilidade. Balancei a cabeça, um sorriso surgindo, sem controle, na minha boca.
— Eu acho que valeria.
— Não, não sou prostituta — contou. — Minha mãe era uma guerreira, e me criou muito
bem. Eu pude estudar, pude trabalhar. Até conhecer Klaus e vir morar com ele. Isso aconteceu
depois de mamãe morrer, e eu ficar sozinha. Klaus meio que me salvou da solidão.
— Viver numa casa com a esposa dele não é vergonhoso?
Ela deu uma garfada no bolo, e pareceu pensar.
— Ah, não. Eu gosto de você. — E eu recebi uma piscadela que me fez, novamente,
esconder um sorriso.
Droga, eu também gostava dela. O que era ridículo.
— Você tem ciúmes de Emma por dividir Klaus com ela?
— Não.
— Não tem ciúmes de mim?
— Não também.
— Você sente alguma coisa além de fome por açúcar? — cutuquei, e ela riu.
— Eu gosto de beber também — Giulia deu de ombros. — Você ainda é muito nova
nessa casa, Melina, mas eu acho que logo Klaus vai te explicar como as coisas funcionam aqui.
— Já entendi como funcionam.
— Acredite em mim, você não faz nem ideia. Sabe, por exemplo, que só não está 100%
livre porque tem um alvo bem grande nas costas, não é? Agora que é esposa de Klaus, vão tentar
te matar.
Eu imaginava isso. Klaus não parecia ansioso por me prender, e como não me amava, não
teria motivos para cuidar de mim. A não ser que eu fosse um alvo. Especialmente porque as
coisas de honra e ego funcionavam bastante dentro desse universo. Mulheres são essencialmente
objetos que homens mantêm a seu bel prazer. Se são roubadas ou mortas, se tornam motivo de
vergonha.
— Me explica — pedi. — Como as coisas funcionam para Klaus?
— Eu não posso fazer isso. É papel de seu marido. Quando ele achar que você é
suficientemente de confiança, ele vai falar. Até lá, fique sabendo que não sou sua inimiga.
Então, ela termina o bolo. Bebeu o último gole de café e se levantou. Giulia se afasta sem
dizer mais nada, e eu fico absorvida em tudo que isso significa.
Meus olhos a seguem, até ela deixar o jardim, e meio que se desviam quando noto a
presença de Klaus vindo na direção do lago. Eles cruzam um com o outro, e falam meia dúzia de
palavras. Giulia então se afasta, e Klaus vem na minha direção.
Meu coração acelera, e eu tento controlar o tremor nas minhas mãos. Estou magoada por
ele não ter ficado comigo na noite passada, mas meio que entendo que ele se preocupou com
Emma. As duas mulheres eram uma constância em sua vida, e eu era a novidade. O papel de
esposa não foi uma decisão nossa, ele foi forçado a me aceitar. Eu não podia exigir lealdade.
— Está ventando bastante — ele comentou, retirando o casaco e o colocando nos meus
ombros. — Vai pegar um resfriado.
Não respondi, aceitando o calor da vestimenta, fechando os olhos quando os dedos dele
passaram pelos meus ombros e então tocaram minhas madeixas.
— Não estou com frio.
— Está sim.
— Como está Emma? — indaguei, disparando como uma metralhadora contra ele.
Seu olhar pareceu um tanto chocado.
— Ela acordou melhor essa manhã. — Depois disso, ele estendeu a mão para mim. —
Venha, quero te mostrar os peixes que cultivo — explicou, não sei se realmente querendo me
mostrar algo ou apenas querendo mudar de assunto.
Eu devia mandá-lo a merda depois de ele ter sumido por uma noite para ficar com outra
mulher, mas aceitei sua mão estendida.
21

— A h,se que lindo — murmurei, enquanto me aproximava do lago e observava alguns peixes
aproximando da beirada, como se esperassem algo. — É uma cor de laranja tão viva
— indiquei, apontando um dos animais brancos com manchas laranjas que mergulhava e voltava
a superfície várias vezes.
— É uma carpa — Klaus me explicou. — Meu pai amava carpas. Dizia que era um dos
peixes mais inteligentes. E ele está pedindo comida — avisou.
— O que ela come?
— O que ela não come? — ele devolveu, rindo. — Ela come qualquer coisa, desde
hortaliças, à pequenos insetos. Mas, essencialmente, ração. As carpas são as rainhas do lago. Eu
nem sei quantas tem, já que elas se reproduzem muito rápido. Mas, não se preocupe com elas,
pois temos empregados que cuidam de sua saúde, e as alimentam várias vezes por dia.
Eu nunca havia visto um animal assim, tão de perto. Trancada em minha casa, eu só sabia
que existiam por causa dos livros ou da televisão. Uma parte de mim queria muito tocar na água
e deslizar meus dedos pela pele brilhosa, mas eu temia que mordessem, então permaneci de pé,
ao lado de Klaus, olhando para o lago.
— Você fala delas com muito carinho — disse, porque era verdade. A forma como Klaus
falava era terna, e isso me surpreendente, especialmente porque eu jamais pensei que ele fosse o
tipo de homem que demonstrasse qualquer sensibilidade.
— Hum, eu gosto de animais — ele contou, como se lesse meus pensamentos. — Há
vários aqui na propriedade. Temos cães, os peixes, temos gatos também. Giulia ama gatos, ela
vive recolhendo os que encontra na rua.
— Eu gostaria de vê-los.
Ele ficou em silêncio e depois olhou de volta para a fonte de água.
— Você vai vê-los, ocasionalmente, correndo de lá pra cá. Alguns são bem ariscos, só se
aproximam quando estão com fome. É difícil quebrar o ciclo e fazê-los entender que nós,
humanos, nem sempre somos os desgraçados que vai machucá-los. A maioria dos animais de rua
acha que todo ser humano é cruel, porque a maioria já sofreu muito na mão de gente ruim.
Eu senti meu coração apertar pela maneira como ele disse isso.
— Giulia me contou sobre Emma — murmurei. — Você é um homem gentil por cuidar
dela.
Um sorriso melancólico surge em seus lábios com meu elogio.
— Não sou gentil, Melina...
— Bom, não fez nada que me fizesse pensar diferente disso, até então.
Ele suspirou e franziu os lábios. Parecia estar pensando em algo, mas eu não sabia direito
o que era. Quando ele falou, todavia, quase perdi o oxigênio dos pulmões.
— Eu me pergunto, Melina... Essa sua doçura não seria a forma perfeita que Toni Fiorin
encontrou de me manipular? Ele deve imaginar que eu cairia como um pato vendo suas marcas e
imaginando o quanto sofreu nas mãos de sua família. Às vezes penso que você facilmente
poderia me fazer fraquejar e me usar.
— Como assim?
Sua mandíbula forte apertou enquanto ele parecia pensar seriamente.
— Me diga: se seu pai quisesse usá-la para me derrubar, você o ajudaria? E se ele a
chantageasse? Você contaria a ele como são as coisas aqui dentro dessa casa?
— Desconfia de mim?
— Desconfio até de minha sombra — admitiu. — Nessa casa, Giulia e Emma são minhas
únicas pessoas de confiança, e eu quero crer que você também será, já que é minha esposa. Mas,
preciso ter certeza sobre o que esperar de você.
Não havia como eu provar uma lealdade que não sentia. Claro, não iria ajudar meu pai,
nem faria nada para prejudicar Klaus, mas exigir fidelidade quando ele mesmo esfregava as
amantes na minha cara era a coisa mais absurda que já ouvi.
— Proteja Marco e salve Açucena e eu serei grata o suficiente para nunca falar a meu pai
sobre o que eu vejo ou deixo de ver na sua casa.
— Ou talvez eu possa simplesmente mantê-la presa em seu quarto — observou. — Assim
você nunca saberá de nada. — Todavia, ele amenizou em seguida: — É fácil cuidar de seu
primo, mas quanto a empregada, não é tão simples assim roubar a criadagem de um membro da
Tirreno. Existe um código de respeito ao lar que preciso acatar. Ao menos, até ter uma prova de
que seu pai está tentando me passar a perna e eu poder matá-lo por traição. Você sabe de algo
que pode me ajudar nisso?
Neguei.
— Eu vivia presa, não sei de nada. Mas... francamente... eu penso que meu pai só quer
que a Tirreno continue mantendo os luxos de minha família.
— Você pouco conhece a vida, pequena Melina. Quanto mais se tem dinheiro, mais se
quer. Poder é uma doença, um vício, nunca é satisfeito o suficiente.
— Fala por experiência própria?
Ele riu baixinho, um sorriso curto que me mostrou seus dentes perfeitamente alinhados.
— Cuidado, Melina — disse, e seu tom aqueceu meu corpo inteiro. — Eu entregaria o
poder de bom grado se isso não significasse que estaria colocando em risco a vida das pessoas
que gosto.
Repentinamente, ele levanta a mão, segurando meu braço. Ele me puxa, fazendo com que
meu rosto escore em seu peito. Era uma maneira de ser carinhoso e eu entendi isso.
— Só não me seja desleal, esposa...
— Ou o quê?
— Ou terei que ser exatamente o tipo de marido que você teme.
— Você teria coragem, mesmo?
Suas mãos deslizaram em minha cintura, e ele me apertou mais contra si. Eu queria
abraçá-lo, mas não podia esquecer que o marido gentil que ele se mostrava agora contrastava
com o homem que me deixou sozinha a noite passada para ficar ao lado da amante. Sim, eu me
apiedava do passado de Emma, mas isso não significava que estava disposta a dividir um marido
com ela.
— Não — ele murmurou, sua frase bateu em meus cabelos como um vento calmo. — Eu
não teria coragem de machucar você. Então, por favor, não me obrigue a isso.
Eu afastei a cabeça o suficiente para encará-lo. Queria ver seu rosto, decifrar o que ele
queria me dizer. Seu beijo me tomou tão em seguida que eu não tive tempo de raciocinar, e
apenas deixei que meus braços o cercassem, me agarrando dele, enquanto Klaus afundava na
minha boca, roubando meu ar, me deixando ofegando e carregada de desejo.
— Senhor? — era Carlo, e Klaus me afastou gentilmente.
— Sim?
— Matteo chegou para a reunião dessa manhã.
Klaus suspirou, e então me deu outro beijo, dessa vez na face, enquanto me abandonava e
seguia ao lado de Carlo. Eu permaneci observando os homens até eles sumirem de vista. Então,
volvi em direção aos peixes, percebendo que éramos estranhamente parecidos.
Ambos estávamos presos nessa casa, nessa propriedade. E, ambos, caso escapássemos
daqui, morreríamos.
De certa forma, pertencer a Tirreno ainda nos mantinha seguros.
22

única coisa que eu queria naquela manhã, depois de uma noite infernal com Emma, onde
A ela passou por repetidos surtos, temerosa que homens invadissem o quarto e a estuprassem,
era uma boa notícia.
Eu havia incumbido um dos meus homens de confiança para ir até Marco, saber sua
resposta. O sobrinho de Toni Fiorin precisava me dizer sim, ou iria morrer. Eu teria que matá-lo
para que ele não contasse ao tio que eu planejava destitui-lo de seu papel na Tirreno.
Assim, entrei no escritório e cumprimentei brevemente Matteo. Fui reto até a mesa de
bebidas e me servi de uma dose de Whiskey porque precisava beber. Estava cansado e irritado, e
só queria respostas rápidas e objetivas.
— Soube de Emma... Ela teve outro ataque? — ele comentou, e eu pensei em como as
fofocas andavam rápido por aqui.
— O último médico que a viu, Dr. Colombo, disse que talvez precisassem interná-la para
tratamento.
— Fará isso?
— É claro que não. Emma não vai sair das minhas vistas. Eu posso controlar seus surtos,
só preciso que os homens se afastem.
— Carlo disse que foi um acidente.
— Sim, um dos rapazes empurrou o outro, sem ver que Emma estava no jardim. Não vou
punir ninguém, só pedi que prestassem mais atenção.
Matteo assentiu, sua cabeleira negra e um pouco comprida demais balançou no gesto. Ele
respirou pesadamente, enquanto me aguardava aproximar da escrivaninha. Então entregou uma
planilha em papel pardo.
— O carregamento para a Europa foi interceptado ontem à noite pela Polícia Federal —
ele me contou.
Eu fiquei puto com a informação.
— Como isso aconteceu?
— Meu palpite: tem alguém nos traindo de dentro da organização.
— E quem sabia que iríamos embarcar as drogas no porto, ontem?
Matteo pareceu pensar.
— As pessoas de sempre, Klaus. Ninguém que você não confie.
— Então é alguém que eu confio está tentando me derrubar?
— Ou está sendo pago para fazer isso. Estou de olho no movimento, você sabe... e
realmente acho que a velha guarda não gostou que seu pai deixou o poder em suas mãos. Eles
acham que você é jovem e inconsequente demais.
Um sorriso desdenhoso arrebata meus lábios. Estavam enganados, é claro. Se havia algo
que eu não era, era inconsequente. Ao contrário, sempre fui precavido, porque tinha muito a
perder. Minha vida pouco importava, mas se eu caísse, cairia comigo muita gente que eu queria
bem.
— E Marco Fiorin?
— O rapaz tem ambição — Matteo me contou, como se eu não soubesse. — Ele cresceu
o olho em ter a posição do tio. Acho que até está pensando em ficar com a mansão que o tio
mora. Ele não tem nenhum apreço pela família.
— Tem pela minha esposa, a prima.
— Ah, sim... Conversei com Marco e ele me disse que quer muito bem a prima. Mas,
como ter certeza? Os Fiorin são uma cobra comendo a outra.
Pensei em Melina, e em sua presença atraente e doce, e foi difícil visualizá-la como uma
cobra peçonhenta prestes a dar o bote.
— E ele já achou algo que possa nos ajudar?
— Nada.
Matteo se ajeitou na cadeira à minha frente, inclinando-se um pouco.
— Klaus, se alguém está nos traindo dentro da organização... Toni Fiorin já deve estar
sabendo que você está tentando caçá-lo, e vai apagar seus rastros.
— Ninguém sabe disso. Apenas Marco, você e eu.
— Apenas nós? Tem certeza?
Puxei a mente.
— Quando falei com Marco, Emma e Giulia estavam presentes.
— Hum... — ele resvalou para trás. — Elas não fariam isso.
Não era uma pergunta. Era uma afirmação. Matteo sabia que as duas eram as pessoas
mais leais que eu podia ter cruzado o caminho. Aliás, ele estava presente quando consegui
encontrar Emma e me ajudou a salvá-la e matar os homens que a mantinham presa.
— Fique de olho nisso — eu disse, encerrando a questão. — Se desconfiar de alguém
dentro de minha casa, me avise imediatamente.
Matteo assentiu.
— Vai ficar para o almoço?
— Eu posso? — ele brincou a questão.
Se eu tive um amigo na vida, foi ele, então era óbvio que ele era sempre bem-vindo para
comer no meu lar.
— Sim, você ainda não conversou com minha esposa — apontei.
— Eu a vi no casamento, e era uma coisinha perfeita... — me deu uma piscadela.
— Se flertar com ela, acabo com você.
— Klaus, está com ciúme? — riu. — Isso não me surpreende. Lembro-me de, uma vez,
você quase me bater porque levei Giulia para sair.
— Você realmente acreditou que eu não faria nada em ver você dando em cima dela?
Giulia não é para o seu bico.
Matteo ergueu as mãos, em rendição.
— Sou um santo, você sabe...
— Se tem algo que você não é, é um santo — rebati.
— Olhe quem fala... Se bem que... Eu me pergunto, como fará com as suas muitas
amantes, agora que está casado? Lembro que você odiava o fato de seu pai sempre trair a sua
mãe...
— Bom, eu... — pensei um pouco. — Faz muito tempo que não falo com as mulheres
com quem tenho caso. Então, é só uma questão de enviar um presente caro e dizer que estou
fora. Realmente, não tenho compromisso com nenhuma das mulheres com quem dormia.
— E está mesmo fora? Vai mesmo dispensar as modelos com quem transa?
— Estou cheio de problemas com as tentativas da velha guarda de me derrubar. Não
tenho tempo para mulheres. E se eu precisar esvaziar as bolas, tenho uma jovem esposa me
esperando.
Era um tanto frio, mas era real.
— Você é tão calculista que me assusta, Klaus.
Era uma realidade. Mas, era a única realidade que eu podia me atrever a ter.
23

— E mma não saiu do quarto? — indaguei a Giulia, que se aproximava da mesa em passos
lentos.
— Não. A criada levará o almoço para ela, lá.
Giulia sentou-se duas cadeiras afastada de mim. Ela sempre se sentava à minha direita
desde que meu pai morreu, e eu assumi que ela continuaria a usufruir dessa posição, mas então
me lembrei que agora o lugar pertencia a Melina, e fiquei um pouco surpreso com o sentimento
que brotou em mim.
Eu tinha uma esposa, a mulher que jurei diante de Deus e do padre que cuidaria até o fim
dos meus dias. Era uma estranha sensação de pertencimento.
Até então, Melina não havia se juntado a nós nos almoços e jantares, e eu respeitei a
maneira como ela ficou fechada no quarto, mas como ela saiu hoje para ver o lago, e como ela já
havia se encontrado com Giulia e Emma, acreditei que era a hora de Melina começar a
compartilhar a refeição conosco.
Observei Matteo flertando com Giulia como ele sempre fazia. Eu ignorei, porque sabia
que era inocente, ele não representava nenhum perigo para ela. Minha atenção, agora, estava
focada em outro lugar. Na esposa que pedi para Mia chamar para almoçar conosco.
Será que Melina se recusaria?
Ela havia insinuado duas ou três vezes que Giulia e Emma eram minhas amantes. Era o
que todos pensavam, e eu gostava que pensassem assim, porque mesmo que elas fossem um
alvo, ainda não seriam os maiores alvos. Os homens da Tirreno acreditavam que amantes eram
descartáveis, então elas tinham o mínimo de liberdade enquanto achassem que eu apenas dormia
com elas.
Mas, Melina pensar assim me incomodava. Contudo, como eu poderia explicar a ela?
Como saberia que ela é de confiança ao ponto de eu contar a verdade? Ela poderia me trair e isso
poderia custar a vida das minhas pessoas mais caras.
Repentinamente, vejo um corpo esguio surgindo na lateral da sala. Matteo se levantou,
respeitosamente, e eu também fiz isso, porque era o que se fazia quando uma esposa entrava na
sala. Inclinei minha cabeça para ela, e puxei a cadeira à minha direita para que Melina se
sentasse.
Ela estava cheirando bem. Eu havia deixado um L’Interdit Givenchy na sua penteadeira
um dia antes de ela vir para essa casa. Era o perfume favorito de minha mãe, e eu pensei que
minha esposa podia compartilhá-lo com a melhor pessoa que eu já conheci.
Minha mãe amaria Melina. Eu quase podia ver a semelhança entre elas, a doçura nos
olhos, a maneira sincera como ela não escondia o que sentia. Meu pai era um filho da puta em
fazer minha mãe sofrer tanto. Mamãe morreu com quarenta e sete anos, jovem demais, por conta
da depressão. Ela basicamente definhou, e papai nem viu isso, ocupado viajando com sua última
amante para algum paraíso qualquer.
Ele teve a capacidade de me dizer em seu enterro, que ela foi a única mulher que ele
amou. Eu me perguntei como um homem pode amar uma mulher e fazê-la sofrer tanto, mas não
o enfrentei com essa pergunta, porque desde pequeno fui condicionado a nunca questionar.
— Melina, esse é Matteo — apresentei ela ao meu amigo.
— A senhora é deslumbrante — ele disse, sedutor, e eu quis enfiar a faca no rabo desse
italiano safado.
Mas, não podia negar que era verdade. Ela usava um vestido multicolorido com rendas
brancas que adoravam seu colo. Ela era tão delicada e perfeita, na mesma medida que camuflava
o quão sensual ela era. Uma parte de mim se enrijeceu pensando em como ela se mostrava
tentadora e sexual quando estava nua, se contorcendo em meu corpo.
— Obrigada — respondeu, enquanto um rubor cobria suas bochechas.
— Você é um homem de sorte, Klaus.
— Eu sei disso.
Sentei-me à cabeceira e aguardei que trouxessem o almoço. Nossas refeições em casa
eram sempre muito simples, comida italiana e vinho de qualidade, produzido na serra. Quando a
criada entrou com a primeira bandeja, meu foco foi desviado da comida pelo riso de Giulia.
— O quê? — indaguei, quando vi a morena e Matteo trocando uma conversa sussurrada.
— Giulia disse que Melina também tem sorte, pois beleza é algo de família e você é
muito bonito — Matteo contou, e eu sabia que, pela metade, Melina ficaria sem entender a frase.
— Ignore-os — disse a minha esposa.
Por baixo da mesa, levei minha mão até sua perna. Seu vestido de cetim estava frio ao
meu toque. Eu só a queria dar algum conforto, mas tocá-la simplesmente me acendeu, já que
fazia mais de um dia que eu não a tinha.
Melina era como um vício. Passar a noite com Emma me tirou a chance de usufruir de
minha esposa. Eu queria levá-la logo para o quarto e fazer amor com ela, mas ainda tinha muita
coisa para fazer nesse dia, e todos os meus fetiches com ela teriam que esperar.
— Quando sairão para a lua de mel? — Matteo indagou.
A maneira como suas bochechas ficaram rubras pela pergunta fez meu pau endurecer.
— Ainda não sei.
— Tenho certeza de que Matteo pode cuidar de tudo para que você possa levar sua
esposa para uma viagem — Giulia insistiu.
Melina estava em completo silêncio, como se não se atrevesse a emitir uma opinião,
então eu a introduzi a conversa.
— O que pensa? Gostaria de viajar?
— Eu... — ela balbuciou. — Eu não sei.
— Não sabe?
— Nunca pensei nisso.
Eu podia insistir na ideia, mas via como ela ficava constrangida de a questão ser
levantada diante de outras pessoas. Melina era muito tímida, e não era acostumada a presença
animada de Matteo. Então, eu dei um leve apertão em sua perna, novamente, para lhe dar
conforto.
Era como se eu quisesse dizer que estava tudo bem. A maneira como seu olhar brilhou
para mim fez algo bater como um martelo no meu peito, tão forte que doeu. Eu tirei a mão e
desviei o olhar, volvendo minha atenção para o prato que acabava de ser servido.
Eu não era acostumado a esse tipo de reação. Nem dela, nem minha. Isso me assustou
para caramba.
24

iulia entrou no meu escritório trazendo uma bandeja com duas xícaras de café. Eu estava
G sentado em uma poltrona ao lado do sofá que Matteo ocupava, e recebi a xícara com um
sorriso manso, enquanto observava com os olhos atentos a morena entregar a outra xícara
para Matteo.
Vi a piscadela e o risinho que trocaram, e fiquei puto porque eu sabia que Matteo não era
digno nem de lamber os pés de Giulia.
— Você sabe que eu te mato se chegar perto dela, não sabe?
— Você sempre foi muito ciumento. O que é uma bobagem, porque o papel que tem na
vida dela não pode ser substituído, mesmo por um marido.
— Se um dia eu achar um marido para Giulia, não será um safado como você.
— Com licença — ela pigarreou. — Eu estou aqui e posso escolher meu próprio marido
— apontou. — E com certeza não seria um safado — sorriu novamente para Matteo. — A não
ser que eu o torne um homem bom.
— Você acha que Matteo tem solução? — debochei.
— Se eu castrá-lo, tem — ela afirmou, e eu precisei conter o riso em ver Matteo
dobrando as pernas rapidamente, protegendo suas partes.
Eu bebo um gole do café, quando percebo que Giulia vai se afastar.
— Onde está Melina?
— Ela foi para o quarto. Acho que está um pouco perdida na casa, ainda. Não sabe
exatamente o que fazer, e fica constrangida com a minha presença.
— Por quê? — Matteo pareceu surpreso.
— Porque ela acha que Emma e eu somos amantes de Klaus e ele não a desmentiu — ela
contou, de supetão, e eu fiquei irritado com a claro desgosto em sua voz.
— O quê? Por quê? — Matteo me encarou.
— Porque é o que todos acham.
— Mas, ela é sua esposa — insistiu. — Ela precisa saber...
— Não — recusei. — Não enquanto eu não ter certeza de que posso confiar nela.
— Com certeza ela lhe dará muita lealdade depois de ser tratada como um simples objeto
sexual — Giulia ralhou, e eu a fuzilei com os olhos.
— Uma amante ou duas é descartável. O máximo que os outros pensam sobre Emma e
você é que são boas de cama para que as mantenha na minha casa. Talvez até imaginem que eu
gosto o suficiente das duas para brigar por vocês. Mas, ninguém acha que me destruirá por matar
alguma amante minha. Mas, se souberem a verdade... Vocês duas se tornaram mais que alvos.
Podem ser moedas de troca. Podem até tentar usá-las em casamento para tomarem a Tirreno.
Então, não ouse falar nada a ninguém, especialmente a Melina. Se o pai dela souber...
— Mas, e sobre Emma? — Matteo levantou a questão mais difícil. — Como vai esconder
os surtos e...?
— Posso dizer que Emma tem algum tipo de...
— Melina sabe a verdade sobre Emma — Giulia me contou, e eu fiquei possesso.
— Como é que é?
— Emma teve um ataque na frente dela. E você saiu com Emma nos braços. O que você
acha que ela pensou?
Não importava o que Melina pensava. Era isso que eu queria dizer a Giulia, mas não
conseguia articular as palavras, porque uma parte de mim estava aliviado por Melina saber que
eu não passei uma noite transando com uma amante em casa, ao invés de estar com ela.
— Nem discuta com Giulia — Matteo aconselhou. — Nunca vencerá uma discussão com
ela.
Giulia me deu um sorriso, antes de puxar a bandeja contra o peito e sair do escritório. Eu
pus a xícara meio vazia sobre a mesinha de centro, suspirando alto, enquanto tentava aparentar
que estava apenas permitindo que Giulia vencesse a discussão.
— Você é um homem de sorte, meu amigo — Matteo comentou. — Lembra-se de
quando tínhamos vinte anos, e encontramos Giulia trabalhando naquela lanchonete para ajudar a
cuidar da mãe doente? Você disse para mim que, com o gênio dela, jamais conseguiria mantê-la
ao seu lado por muito tempo. Dez anos depois, cá estamos nós, com Giulia nos servindo café.
— E me confrontando sempre que pode.
— Ela tem esse direito. Alguma mulher nessa casa tem que levantar a voz para você,
senão achará que manda demais — ele riu. — É incrível como ela e Emma são diferentes.
— Emma nunca teve a chance de desenvolver qualquer personalidade além da
complacente.
— Nem sua esposa, pelos boatos que ouvi... Parece que os Fiorin eram terríveis.
— Mas, ao menos Melina nunca sofreu abusos sexuais — dei de ombros. — Por isso, às
vezes, o olhar dela brilha como se quisesse bater de frente comigo... — eu ri, meio perdido em
pensamentos. Quando, contudo, encaro Matteo e percebo o jeito sugestivo que ele devolve meu
olhar, eu limpo a garganta e tento fechar o semblante, como sempre. — Estou tentando fazer
com que ela mantenha distância emocional. Não é meu objetivo que sofra.
— Você é o melhor cara que eu conheço — Matteo comentou, e eu não sabia o quanto
isso era verdade.
Suspiro, mudando de assunto:
— Quanto tempo você acha que vai demorar para Toni Fiorin vir incomodar na casa? Ele
está mantendo distância, mas pretendo diminuir o auxílio econômico aos poucos. Sei que ele me
rouba, preciso provar isso, para cortar totalmente esse homem da Tirreno.
— Por que não corta todo o dinheiro de uma vez?
— Meu pai tinha um acordo com ele, de que manteria seus gastos se entregasse a filha
inviolável, e ele cumpriu sua parte.
— Hum... Temos um carregamento de armas que enviaremos para o Oriente Médio. Uma
fortuna em AK-47 e dois Snipers 50. Você sabe... Se essas armas não chegarem ao destino, Toni
Fiorin teria um argumento forte para derrubar você do poder.
— Você acha que ele está planejando algo?
— Eu acho que ele está muito quieto para um homem ambicioso. Ele foi o contador desse
carregamento, e ele sabe cada passo do trajeto.
Era verdade.
— Quero que fique de olho, mantenha uma guarda forte dos contêineres até chegar à
origem. Mas, se você sentir que algo vai acontecer, deixe eles chegarem perto...
— O que planeja?
— Eu quero expor Fiorin como o rato sujo e traidor que ele é. E então eu vou destruí-lo
na frente de todos, para que cada homem da Tirreno saiba que eu não sou um jovem tolo e
mimado que meu pai criou. Giacomo manteve a Tirreno com mãos de ferro e olhos de águia, eu
serei tão bom quanto ele nisso.
Matteo assentiu.
— Você realmente planeja matar seu sogro? O que fará com sua esposa?
— Ela sofreu muito nas mãos do pai. Acredito que não vai se indispor por causa dele.
Mesmo assim, estou deixando claro que seu papel nessa casa é ser a mãe dos meus filhos. Ela
não é mais uma Fiorin, é uma Lazio.
— Ainda assim, ela pode ser um problema — apontou. — O sangue, às vezes, puxa.
— Até lá, já pretendo que ela tenha um bebê nos braços. Então ela estará tão apegada a
um filho que nem vai se importar com o destino que darei a sua família.
Matteo riu.
— Se bem conheço você, ela já pode estar até grávida.
Eu não esperava isso, não esperava essas palavras, e fiquei atônito porque só diante delas
eu tive alguma realidade sobre ser pai. Repentinamente, visões de Melina segurando um bebê,
amamentando ou ninando, me tomou, e a porra de uma coisa mágica explodiu no meu peito.
Eu nunca nem sonhei com amor ou sonhei com a família perfeita, mas quando pensei
nela assim, eu me senti um idiota apaixonado, e tentei apagar esses pensamentos buscando a
xícara e bebendo mais café.
Eu não sei se Matteo percebeu como me senti, mas ele sorriu com o canto dos lábios
quando eu volvi meu rosto para ele. Sem sentir, um sorriso também surgiu em meu rosto.
25

u me sento na cama, a solidão de meu quarto naquela pausa pós almoço me absorve em
E questões difíceis de serem explicadas.
Giulia claramente flertou com o homem, Matteo, nas fuças de Klaus. Isso podia
significar que ela estava tentando enciumá-lo, pois agora ele tinha uma esposa. Todavia, não foi
isso que me surpreendeu.
A verdade é que eu não conseguia tirar da cabeça o semblante despreocupado de meu
marido. Ele nem parecia estar prestando atenção no que acontecia à mesa, suas mãos sempre me
tocando por baixo, seu olhar cravado em mim repetidas vezes.
“Beleza é algo de família” a frase enigmática me tomou de assalto, de repente me
fazendo pensar em Giacomo. Eu mal lembrava da cara do homem, mas sabia que ele não era
bonito. Quero dizer, não que fosse feio, mas o filho com certeza era muito mais bonito.
Talvez estivessem falando da mãe de Klaus. Eu gostaria de conhecê-la, ao menos ver
uma foto da mulher.
Minha mão desliza pelo joelho, o tecido de cetim que o cobre é macio ao meu toque. Eu
penso na maneira como Klaus pôs a mão na minha perna, não sedutoramente, e sim querendo
apenas me trazer a conversa, me confortar de alguma forma sobre coisas que eu não entendia.
Ele foi tão gentil... Ele nem parecia um carrasco. Comparo esse toque à forma como ele
pegou Emma nos braços. Depois do que Giulia me disse, sabia que meu marido não passou a
noite transando com ela, mas o fato de ele ter ficado ao seu lado quando ela precisava me remetia
ao quanto ele era generoso e decente com uma garota.
Eu não queria me apiedar de suas amantes, mas queria ver Emma. Talvez eu pudesse
perguntar a Mia se estava tudo bem eu ir até ela, conversar um pouco. Não imaginava o tipo de
horror que ela já viveu, e isso me fez perceber que cada mulher nesse clã tem uma cruz mais
pesada que a outra. Sempre pensei em mim mesma como a maior das vítimas, mas havia piores.
Mais uma vez, penso que Klaus é um cara bom. E isso me deixa em estado de alerta. Não
quero sentir qualquer tipo de simpatia por ele, mas os dias que passam nessa casa me fazem
perceber que... talvez ele não seja um monstro.
Ainda assim, quando me toma, ele deixa claro que é meu dono.
Ao invés de me enojar, isso só me deixa mais e mais aquecida.
Eu ergo minhas mãos e cubro meu rosto. Estou com vergonha de quem sou, com
vergonha das reações do meu próprio corpo. Ergo-me e vou até o banheiro, para molhar a face, e
tentar aliviar o calor que me tira o ar, quando a porta do quarto abre.
Meu coração acelera pensando ser Klaus, mas é Mia que está chegando, carregando
várias toalhas de algodão dobradas no braço. Sei que ela está aqui apenas para guardar as roupas,
mas eu preciso conversar com alguém, então a intercepto antes de ela sair do quarto.
— Mia... Meu marido?
— Ele está no escritório tomando café com Sr. Matteo — ela me contou. — Quer
acompanhá-los?
— Não. Me fale de Matteo. Ele parece muito íntimo de meu esposo.
— Sim, é o melhor amigo dele desde a infância. Os dois cresceram juntos. Matteo era
filho da criada de confiança da Sra. Valkíria. Quando a mãe de Matteo morreu de câncer, Sra.
Valkíria basicamente adotou o garoto. Sr. Matteo e Sr. Klaus se consideram irmãos de alma.
— E Giulia... Qual a relação dela com Matteo?
Mia riu, um pouco maliciosa.
— São amigos. Mas, flertam, claramente.
Como Klaus não se enfurecia por isso?
— Eu posso ver Emma? — indaguei de supetão, e percebi Mia arregalando os olhos
diante de mim.
Sei que era um atrevimento, mas realmente queria vê-la. Ela foi simpática comigo desde
o primeiro instante, e sua história me tocou profundamente. Ainda assim, eu entenderia se Mia
me desmotivasse da ação.
— Claro, Sra. Vou levá-la até a porta do quarto de Emma.

✽ ✽ ✽

O quarto de Emma ficava na ala leste da mansão. Era um ambiente bonito, em cores
claras e tons pasteis. Ela sorriu para mim quando me aproximei, e estendeu a mão me fazendo
sentar próxima dela, em sua cama.
— Desculpe se te assustei — ela me disse, parecia tão triste que eu senti lágrimas
despertarem nos olhos.
Como pode uma pessoa tão gentil já ter sofrido tanto?
— Como você está? — indaguei, depois de fazer um movimento com a face, indicando
que estava tudo bem entre nós.
— O médico me medicou, então estou... nas nuvens.
O tom dela era muito pastoso, o que me fez perceber que estava levemente dopada.
— O remédio tira a dor — ela me disse, e eu assenti.
— Fisicamente?
— De certa forma. Eu nem fico triste, nem quero chorar. Não sinto nada.
Quase pedi o nome da medicação, porque eu também a queria. Seria um sonho deitar a
cabeça no travesseiro, sem ser avassalada por lembranças cruéis da infância.
— Você conheceu Giulia? — Emma indagou, e eu assenti.
— Ela é linda.
— Ela é linda sim — concordou, um sorriso doce transformando sua expressão. — Eu
vejo como homens a olham. Todos a querem. Mas, ela não quer ficar com ninguém. Nunca,
nunca e nunca. Ela odeia os homens.
Arqueei as sobrancelhas.
— Até Klaus?
— Klaus não é homem — ela riu, a voz se arrastando mais e mais. Eu percebi que
conforme os minutos passavam, o efeito do remédio que ela tomou parecia mais potente.
— Como assim Klaus não é homem?
Se tinha uma coisa que meu marido era, era ser homem. Um homão.
— O que eu quero dizer é que Klaus não está na lista, entende? Giulia odeia os homens
que podem tocar nela, que podem desejá-la.
— Klaus não a deseja?
— Evidente que não!
Eu não conseguia entender. Queria perguntar mais, talvez eu devesse, mas Emma estava
completamente fora de si. Ela não me daria respostas satisfatórias, e meu marido mal falava
comigo. Talvez eu devesse interpelar Giulia.
— Falando em Klaus... Você já está grávida?
Não fazia uma semana que eu estava casada, com certeza eu não estava grávida. Mas,
Emma não estava em seu juízo perfeito, então eu entendi que ela não conseguia prestar atenção
em datas. Simplesmente neguei, triste porque a indagação me fez lembrar do porquê eu estava
aqui.
Para dar filhos a Klaus, a continuação de sua linhagem.
— Você é tão linda. Seus bebês serão tão amados.
Emma estava quase fechando os olhos. Sua mão aliviou a minha, e desabou do lado da
cama. Ela estava quase ressonando, quando indaguei:
— E se eu não puder dar filhos a ele, Emma? Ele me mataria para conseguir outra
esposa? Ou ele me permitiria ir embora? O que você acha?
— Se ele amar você — ela balbuciou, as palavras quase um breve suspiro —, nunca
permitirá que se vá.
Amar? Klaus nunca me amaria. Eu não era amada, nunca fui por ninguém, nem mesmo
pela minha família. No máximo, eu tinha a simpatia de Açucena e de Marco. Mas, amor... amor
ninguém nunca dedicou a mim. Agora mesmo, eu estava sendo apenas uma égua reprodutora do
garanhão da Tirreno.
— Mesmo sem bebês? Ele me manteria aqui sem um filho?
Desde que eu vim para cá, tomei decisões precipitadas; para começar, eu me entreguei a
Klaus achando que era um guarda, e deixei claro a ele que queria tirar dele o gosto da minha
virgindade. Ele me ridicularizou por isso, e eu era forçada a viver ao seu lado vivenciando sua
vida com suas amantes.
Se bem que... Giulia e Emma eram excelentes pessoas e nada fizeram contra mim.
Todavia, ainda assim, era humilhante.
Então, mais uma vez, eu pensei que podia ter a liberdade se me dedicasse a não
engravidar. Devia haver um jeito de eu impedir que isso acontecesse. Mas, o resultado podia ser
tão desastroso quanto minha tentativa de não me casar.
— Emma, ele me manteria aqui sem um filho? — repeti, exigindo uma resposta.
Mas, ela já estava roncando levemente quanto terminei a pergunta.
Era algo que eu teria que descobrir sozinha.
26

evei as mãos abaixo da torneira, a água quente aquecendo minha pele. Ergui o olhar e me
L encarei no espelho.
Meu marido era uma incógnita. O mesmo homem que me humilhava era o homem
que levou a mão abaixo da mesa para me confortar, e o mesmo homem que cuidou de uma
Emma doente sem exigir nada em troca.
Terminei de lavar as mãos e busquei a toalha branca ao lado, meus olhos ainda fixos no
enorme espelho que refletia a mulher carregada de dúvidas.
Como eu evitaria um filho? E o que ele faria quando os meses começassem a passar e eu
não aparecer com a barriga grande diante dele?
Pensei em Giulia nesse momento. Talvez ela me desse respostas, mas eu não sabia o
nível de lealdade que ela tinha para com Klaus, que pudesse deixar as coisas claras para mim.
Eu saí do banheiro, repentinamente, tomada pela raiva. Por que eu tinha que lutar tanto
pelo mínimo de dignidade que todo ser humano merecia? Pensei em Emma e em como as coisas
eram difíceis para as mulheres desse meio, e quis matar Klaus por ele me submeter como os
homens submeteram Emma. Ela foi brinquedo de vários, eu era de Klaus.
A quantidade divergia, mas o sentimento de ser usada era o mesmo.
Raiva começou a pulsar em mim. Apenas um objeto... Um marido que me humilhava de
tantas formas. Palavras dele me dizendo para sempre estar de banho tomado, ou o fato de ele
esfregar as amantes na minha cara... tudo isso começou a se acumular, e quanto dei por mim,
estava buscando não sei pelo que nas enormes gavetas do banheiro.
Quando achei uma tesoura de pontas arredondadas, sorri.
Eu não tinha como me matar com ela, mas podia ao menos destruir as coisas materiais
que Klaus me deu para ele saber que eu tinha alguma vontade. Caminhei segurando a tesoura e
entrei no quarto.
Mia estava terminando de ajeitar as roupas de cama para a noite, e me encarou curiosa.
— Senhora?
Abri o closet e comecei a puxar dele os vestidos de seda, as lingeries bonitas e rendadas,
os casacos, e tudo que meu marido me deu. Eu não sei exatamente o que estava fazendo, mas a
adrenalina me deu prazer quando comecei a picar tudo com a tesoura, um sorriso de felicidade
única tomando meu rosto, conforme ia destruindo as roupas.
Era como se eu estivesse destruindo a boneca sexual de Klaus nesse momento. Se a
tesoura tivesse ponta, eu a cravaria na minha barriga agora, só para tirar dele o gosto de me
engravidar.
— Minha senhora... — Ouço a voz de Mia as minhas costas, e ela é tão gentil e
compreensiva que eu começo a chorar, contrariando a intensa felicidade que me toma em destruir
tudo. — Tudo bem, minha senhora... — ela pôs a mão no meu ombro, e eu desabei em soluços,
com tanta autocomiseração misturada a ódio, sentando-me no chão.
— Por que não posso ser livre, Mia?
— Nasceu uma Fiorin, senhora... Jamais será livre. Se Klaus a devolver, será levada por
seu pai, e ele ficará muito zangado pela filha ser devolvida. Só Deus sabe as torturas que lhe fará.
Aqui é mais seguro, minha senhora.
— Ainda assim, dói, Mia...
Ela sorriu e encolheu os ombros:
— Diga isso ao Sr. Lazio. Diga a ele que está doendo.
— Eu nunca lhe daria esse gosto.
— Ele saberá quando ver essas pilhas de roupas. Não ficará zangado, apenas comprará
outras. Mas, se dizer a ele que dói o que está passando, talvez possa não apenas comprar roupas
novas, mas ser um novo homem para a senhora.
— E quando a Giulia e Emma?
— O que tem elas?
— Eu me sinto tão humilhada por elas morarem aqui.
— Elas fizeram algo contra a senhora?
Eu neguei rapidamente
— Não, na verdade não. Aliás, elas são até gentis.
— A sra. Valkíria não morava com as amantes do sr. Giacomo, mas as mulheres faziam
questão de humilhá-la sempre que tinham a chance. Só de a senhora ter o respeito de Emma e
Giulia, devia se sentir grata, senhora.
Neguei.
— Mas, não me sinto.
— Não acho que o Sr. Klaus vai expulsar as duas — Mia me confessou, murmurando. —
Ele nunca as perde de vista. É uma estranha relação, a daqueles três.
— Eles deviam ficar juntos, já que se amam tanto — sinto ciúme queimando minha
língua. — E me deixarem em paz.
— Sr. Lazio precisa de um filho.
— Por quê?
— Porque um homem sem um filho não é um homem, é um garoto. Ele precisa de um
filho não bastardo para começar a ter respeito da velha guarda da Tirreno.
— Não quero ser mãe — caí para trás, nos braços dela. Os soluços se tornaram mais
intensos. — Eu nunca nem peguei um bebê nos braços, também nunca fui amada por uma mãe,
nem saberia o que fazer com uma criança.
— Oh, minha senhora... Seus instintos vão aflorar quando pegar um pequenino nos
braços. Será a coisa mais intensa e maravilhosa da sua vida. Não precisa temer o momento.
Garanto que será incrível.
Fechei os olhos, aproveitando o abraço dela. Repentinamente, a voz de Mia me faz abrir
os olhos.
— Talvez já esteja grávida, Senhora..., Mas, caso não estiver, pode tentar conseguir a
afeição de seu marido antes de engravidar, para passar por esse momento mais tranquila.
— Eu não quero engravidar, Mia... Você consegue me entender? Eu não quero trazer um
filho em um lar sem amor.
Ela assentiu.
— Bom, a senhora pode usar a tabelinha. Conhece? Contas os dias a partir da sua
menstruação para tentar evitar transar quando estiver ovulando. Ou pode tentar posições em que
o Sr. Lazio não ejacule totalmente na senhora. Pode oferecer outro buraco também.
— Que outro buraco?
Quando ela me explicou, eu arregalei os olhos, chocada.
— Isso existe?
— Sim, senhora.
— Eu não vou oferecer meu outro buraco, Mia. Fora de cogitação — neguei, balançando
a face.
— Dizem que quando a mulher transa por cima, é mais difícil o jato do homem chegar no
útero — Mia me contou, e eu percebi pelo seu tom que ela sabia tanto mais que eu. — Posso
procurar na internet coisas que falem sobre isso e lhe explicar.
Volvi e a encarei.
— Mesmo? Pode fazer isso por mim?
Ela assentiu.
— Vou fazer tudo que puder para lhe ajudar, minha senhora. Quero vê-la feliz. Quem
sabe, com o tempo, a senhora e meu senhor possam até se amar.
— Isso é impossível, Mia.
— Sr. Klaus é um homem bom. Ele faz o tipo que não é, mas ele sempre me tratou com
respeito. E até paga a faculdade de meu irmão. Eu só tenho elogios sobre ele.
— Isso não quer dizer que eu possa amá-lo um dia. Nem que ele venha a me amar. Klaus
está focado em seu poder, em suas amantes... ele não tem tempo para construir uma relação com
uma esposa. Eu sou apenas um objeto para ele, um útero, e isso me enoja num nível, Mia...
Subitamente, a imagem de Klaus surge na porta do closet. O quanto ele ouviu, eu não sei.
Seu rosto era indecifrável, então quando Mia se afastou, pedindo licença, eu entrei quase em
pânico.
27

u me pus de pé porque era a posição mais segura para se estar enquanto Klaus observava a
E bagunça da porta do closet.
Senti um pouco de vergonha por ele entrar no meu quarto e me encontrar com uma
tesoura nas mãos ao lado da pilha de roupas bonitas que ele me deu. Ainda assim, tentei manter-
me firme, porque já havia aprendido, naqueles poucos dias, que qualquer sinal de fraqueza o
faria me submeter a sua vontade.
— Às vezes me pergunto o quão imatura você é... — Ele disse, seu tom parecia cansado.
Eu não respondi porque não sabia qual seria a resposta segura. E ele pareceu entender que
não teria nenhum retorno, então pôs as mãos nos bolsos e se afastou da porta, me dando margem
para sair.
Klaus se aproximou da mesa lateral onde uma moringa com água gelada estava. Ele
serviu um copo, enquanto eu caminhei até o lado oposto do quarto, sem saber se devia ir a cama
me deitar, ou se devia esperar que ele simplesmente saísse.
— Fui ver Emma — contei, de súbito, as palavras ecoando no quarto.
Klaus se virou para mim, suas sobrancelhas arquearam.
— Por quê?
— Só queria ver como ela estava.
— Ela não interessa a você. Não acho positivo que se aproximem.
— Você tem medo de uma revolução entre as mulheres? Que eu me una as suas amantes
para destruir você?
Um sorriso de deboche surgiu em seus lábios, mas ele não respondeu.
— Ela me disse que você não era homem — contei, porque queria vê-lo irritado, sabendo
o que Emma pensava nele.
— É mesmo? — ele continuou completamente tranquilo.
— O que ela quis dizer?
— O que importa? Emma e Giulia não são assuntos seus.
Meu estômago queimou de pura raiva.
— Então vá ficar com elas. Não sei por que está aqui. Eu não vou te receber em meu leito
de braços abertos, não importa o quão gentil foi comigo no almoço.
Klaus me surpreendeu em seguida, movendo-se rapidamente até mim, cruzando o espaço
que nos separava e passando sua mão pelo meu pescoço, segurando firme minha nuca, enquanto
me fazia recuar até a parede.
Quando senti minhas costas pressionando a parede fria, percebi que estava encurralada.
Meu peito subia e descia em puro horror. Não sei como estava sendo tão corajosa em enfrentá-lo,
ele era grande e poderoso e tinha a capacidade de me destruir se quisesse.
— O que vai fazer? — indaguei.
A mão dele apertou em volta da minha garganta. Era a segunda vez que ele fazia isso,
não ao ponto de machucar, mas como se estivesse se contendo para não me esganar.
— Você quer me matar? Então me mate — provoquei. — Me livre dessa sina...
— Está enganada, Melina... Eu não quero te matar. Só quero que mantenha seu coração
protegido de mim. Eu posso ser gentil com você, e isso pode fazer com que se apaixone. O amor
é uma merda, especialmente porque não sou capaz de amar ninguém. Não quero que sofra.
Então, preciso de um filho, e você precisa me dar um. Isso não significa que precisa se tornar
infeliz o tempo todo. Pode ter roupas bonitas, pode passear, pode viajar, pode fazer o que quiser.
Só não pode sentir por mim algo além de respeito.
Aquilo parecia tão sincero que eu fraquejei.
— Eu quero ser livre — apontei.
— Não vai acontecer.
Repentinamente, a boca dele esmagou a minha. Não era um beijo gentil ou delicado, e
sim um ato de pura dominação. Senti lágrimas nos olhos, e o empurrei com toda força. Quando
nossas bocas se descolaram, percebi o olhar de Klaus queimar, e imaginei que ele me jogaria na
cama agora.
Mas, uma batida na porta interrompeu meus pensamentos.
— Sim? — Klaus indagou quase gritando, sem ir até a porta fechada.
— Matteo ligou — a voz de Giulia pareceu abrandá-lo. — Você precisa vir comigo.
Ele me encarou mais uma vez. Pareceu querer recusar. Mas, acabou saindo do quarto,
indo resolver suas coisas.
Era um alívio sem medida.
28

k. Isso está começando a sair do controle.


O Eu caminho entre as caixas daquele depósito, meus passos me levando até os dois
indivíduos jogados no chão. Um deles está com a cara destruída pela surra que levou, mas
nenhum deles parecia disposto a me entregar o nome que eu precisava.
— Eles não falam — Matteo se aproximou e murmurou perto do meu ombro. — Não sei
mais o que fazer se não os matar.
Ele ergueu a mão e eu percebi seu punho bastante ferido, o que me fez perceber que foi
ele que deu a surra no cara. Encarei os outros homens, homens de Matteo, todos com armas nas
mãos, como se aguardassem minhas ordens.
— Eu preciso saber como eles estão descobrindo todos os nossos planos — disse ao meu
amigo, que assentiu.
Então ele girou na direção dos homens e ordenou que amarrassem os caras com os pulsos
e os tornozelos para trás.
Eu me afastei brevemente, apenas para dar aos dois homens o entendimento que eu não
estava com pressa, e puxei um cigarro. No lado de fora daquele galpão no porto, o acendi,
deixando que a fumaça mentolada aliviasse minha atenção.
— Você sabe... Toni Fiorin organizou as planilhas desse carregamento. Ele sabia que as
armas estavam aqui.
— Eu não posso acusá-lo sem provas. Além disso, eu não acho que Toni está sozinho.
Sei que a velha guarda está ansiosa por me derrubar, mas ninguém é tão estupido de tentar roubar
as armas nas minhas fuças, antes mesmo de embarcá-las.
— Se isso acontecesse, eles provariam que não está pronto para ser o Capo da Tirreno. Já
imaginou se perdesse as armas dessa forma?
Era verdade.
— Como os caras entraram?
— Os homens que faziam a guarda trocaram de turno. Eu tinha homens de vigília e eles
perceberam que os seus homens deixaram uma brecha e perceberam que esses dois caras se
aproveitaram disso, entrando no depósito no momento da troca de guarda.
— Eles tinham que ter conhecimento dos horários — apontei. — Isso era algo interno, de
dentro da minha casa. Isso significa que não estou seguro dentro do meu lar. Há alguém dentro
da San Giovanni tentando me derrubar.
— Quem acha que é?
— Como eu posso saber? Todos que trabalham lá, já faziam isso para meu pai. Eu cresci
com aquelas pessoas. A única novidade é... — Não queria dizer a palavra, mas acabei por soltá-
la. — Melina.
— Sua esposa? Acha que ela se atreveria?
— É filha de Toni Fiorin.
— Mas, pelo que sei, apanhava do pai...
— Lealdade à família é uma coisa estranha — dei de ombros. — Não quero acreditar que
seja ela — admiti ao meu amigo, terminando o cigarro. — Em que momento ela entraria no meu
escritório e mexeria nos meus papeis?
— Pense além dela. Quem mais tem acesso ao seu escritório?
— Qualquer pessoa na casa entraria lá sem problemas.
— Tire Emma e Giulia dessa lista, e pense nos demais. Não quero acusar nem culpar
ninguém, mas precisa ser mais precavido e ficar de olho. Mesmo que confie naquelas pessoas,
preste mais atenção.
Era um conselho justo. Eu volvi para dentro do depósito. Caminhei na direção do rapaz
que não estava com a cara quebrada, e me inclinei para ele.
— Qual seu nome? — perguntei.
— Lorenzo.
— Certo, Lorenzo... Você parece muito jovem. Qual sua idade?
Ele fez uma careta estranha, parecia um garoto cheio de orgulho e, ao mesmo tempo,
apavorado por ter visto o parceiro apanhar.
— Dezessete.
— O que um rapaz de dezessete anos faz no meu depósito, hem? Você sabe o que eu faço
com quem me rouba, Lorenzo? Você não estava roubando para si, não é? A pessoa que te
mandou aqui colocou sua vida em risco apenas para ter essas armas. Essa pessoa não se importa
com você. Me dê o nome, Lorenzo, e eu te permito uma segunda chance.
Nada. Completo silêncio.
— Você vai mesmo morrer por outra pessoa? O que você é? Cristo?
— Não fale nada — escuto o outro cara resmungar, entre seus dentes quebrados, e o
encaro.
Não é uma criança, como esse Lorenzo. É um homem feito, de mais de quarenta anos,
que sabe bem o que está fazendo, e que se atreveu a trazer um menino para cá, em prol do poder
de outro capo. Isso me enojou, e eu me pus de pé, caminhando em passos rápidos e sacando a
pistola do meu terno alinhado.
Eu não disse nada, apenas puxei o gatilho, estourando seus miolos podres, dando-lhe a
morte rápida que ele nem merecia. Repentinamente, volto minha atenção ao garoto, e o vejo
chorando, mijando-se nas calças, enquanto morde os lábios, sem saber se seu orgulho vale a sua
vida.
— Vamos, garoto... eu não tenho a noite toda — aviso. — Você vai me dar um nome, ou
vai ter a cabeça arrebentada como seu amigo?
— Mas... Eu... eu não tenho um nome. Francesco é quem falava com o cara...
— Nunca o viu? Não pode me dizer como era? Era alguém de meia idade? Cinquenta
anos, talvez? — insisti, porque queria ao menos uma descrição de Toni.
— Não. Ele era mais jovem. Trinta ou trinta e cinco. Cabelos escuros, branco, ombros
largos...
Eu encaro Matteo.
— Marco Fiorin, talvez — digo ao meu amigo, e ele parece surpreso.
— Por que ele te trairia?
— Fique de olho nele — ordeno. — Se Marco Fiorin cresceu o olho para a Tirreno, isso
explicaria Melina me trair. Ela ama o primo. — Guardo a arma, enquanto começo a me afastar.
— Coloquem o garoto em um ônibus para longe, e lhe dê dinheiro para se manter por um tempo.
Ele pode ser morto porque sabe demais.
— Ele não sabe nada — Matteo ridicularizou.
— Marco Fiorin pode achar que o tal Francesco falou mais que devia. De qualquer
maneira, deem a chance para o garoto sobreviver.
Matteo acena com a cabeça, enquanto começa a espalhar ordens. Eu puxo outro cigarro
do maço e começo a andar para fora. Há um corpo ali, evidências que precisam ser apagadas,
mas isso não é meu trabalho, e eu confio na expertise de Matteo.
Eu levo meus olhos para os enormes navios há alguns metros. O som do mar revolto me
atinge, enquanto o ar gelado daquela noite invernal molha minha face. É uma noite boa para ficar
na cama com minha mulher, mas estou aqui matando e tentando manter a Tirreno sob controle.
Sinto-me como se estivesse diante de um castelo de cartas prestes a cair. Um passo em
falso, e todos morrem. Não me importo de morrer, mas Emma e Giulia são minha
responsabilidade e...
O telefone toca. Eu costumo deixá-lo no mudo, e um som abafado vibra no meu bolso.
Eu o puxo, enquanto sinto a presença de Matteo se aproximando.
— Sim? — atendo, vendo antes que é o número da propriedade San Giovanni.
— Meu senhor — É Mia. — Preciso lhe avisar... Oh Deus...
Ela parecia assustada. Eu não sei bem o porquê, e fico um pouco alarmado. Mia não tem
o costume de me temer, nem receia me dizer nada. Não sou monstruoso com as mulheres, apesar
de o ser com minha esposa.
É que é estranho... Eu a ouvi perguntando a Mia como podia evitar a gravidez. E dizendo
que se enoja de mim. Isso doeu para cacete, mas não podia culpá-la pelos sentimentos. Então
confessei algo que jamais pensei que lhe diria: todas as minhas ações com ela, até mesmo as
frases cruéis que lhe disse inúmeras vezes desde que nós nos casamos eram apenas a minha
forma de lhe proteger.
O amor era uma merda...
Eu lembro de cada lágrima que minha derramou naquele casamento infeliz que a
definhou dia após dia, ao lado de um homem que lhe jurava amor eterno, que a tratava como uma
santa em um altar, mas que não deixava de procurar vagabundas sempre que estava entediado.
— Mia? — insisti, porque percebi o silêncio do outro lado da linha.
— Senhora Giulia saiu da mansão, levando a senhora Emma. Disse que iriam passear.
Carlo foi com elas, porque sabia que elas não tinham autorização para saírem sozinhas.
Não era a primeira vez. Sempre que Emma começava a reagir dos surtos, Giulia a levava
para jantar fora. Não sei porque Mia parecia assustada com isso.
— E daí?
— E daí que elas levaram a senhora Melina junto.
29

motorista abriu a porta do carro assim que eu me aproximei. Não disse nada, enquanto
O sentava-me no banco traseiro, esperando que Matteo também entrasse e se acomodasse ao
meu lado.
— Ela não atende?
— Giulia com certeza está vendo o telefone chamar — disse, entre os dentes. — Está me
ignorando de propósito.
— Por que ela faria isso?
— Porque ela gosta de me deixar furioso! — respondi, irritado.
Na primeira vez que Giulia saiu sozinha, apenas com Emma, gritei com ela, e ela gritou
de volta dizendo que eu não mandava nela. Na segunda, tentei argumentar o quanto era perigoso,
e ela ergueu o casaco e me mostrou uma pistola, retrucando que era capaz de cuidar de si mesma.
Depois, simplesmente aceitei o fato de que não poderia jamais controlá-la, e que apenas
precisava mantê-la sobre vigilância com Carlo, evitando embate. Mas, não pensei que ela levaria
minha esposa consigo nas suas escapadelas.
Onde estava? Provavelmente em um restaurante no último andar de um edifício luxuoso
no centro da cidade. Ela adorava a comida daquele lugar. O carro começou a andar. Eu havia dito
ao motorista o endereço do restaurante, e essa era minha primeira parada. Caso não a encontrasse
lá, precisaria ir em cada canto da cidade descobrir onde diabos ela levou Melina.
— Giulia cuidará de Melina — Matteo comentou, como se isso pudesse aliviar a tensão.
— E quem cuidará de Giulia caso Melina realmente seja uma espiã?
— Porra, amigo... Não faça isso. Sei que está tentando levantar barreiras para se proteger
do que sente por Melina, mas essa não é a melhor maneira. Ela não fez nada para que desconfie
dela.
— Ela é filha de Toni Fiorin e...
Repentinamente, me dei conta do que ele disse.
— Me proteger do que sinto por ela?
— Eu vi como você reagiu a presença dela naquele almoço — comentou. — Seu olho
brilhava, Klaus...
— Não seja idiota.
— Eu conheço você. Sei que a sua esposa mexeu com você como nunca vi nenhuma
mulher fazer antes.
— Errado. Não acredito em amor. Mas, acredito em sexo e atração, e Melina me atrai
sim. Mas, se ela for uma traidora, eu não hesitarei em matá-la.
Matteo negou com a face.
— Klaus, você realmente acha que vai me convencer com esse discurso?
Respirei fundo, porque não tinha certeza se era minha intenção convencê-lo ou me
convencer.
O quanto eu podia abrir espaço para sentimentos com Melina quando tantas dúvidas –
especialmente sobre a lealdade dela – caíam como chuva tempestuosa sobre nós?

✽ ✽ ✽

O carro parou em frente ao edifício e eu saí em passos firmes em direção ao prédio, sendo
recebido por um maître logo na entrada. Só os mais ricos e poderosos comiam aqui, e havia
muita segurança no local, ainda assim, eu olhei duas vezes há minha volta para ter certeza de que
ninguém estava me encarando.
Apertei o botão do elevador para o andar da cobertura, e meus olhos estavam fixos no
mostrador, enquanto sentia meu coração acelerar diante da perspectiva de ver Melina longe da
prisão que era San Giovanni.
— Nós podemos jantar aqui, não? — Matteo comentou, eu quase me esqueci dele ao meu
lado, como um fantasma. — Poupar o garoto realmente abriu meu apetite.
A porta abriu nesse momento, e eu rumei em direção à recepção, trombando com uma
mulher vestindo um vestido justo e preto.
— Desculpe — murmurei.
Não tinha tempo para lhe dar atenção, mas senti que ela me prendeu com as mãos,
deslizando-as pelos meus braços, enquanto meu olhar cravou nela.
— Klaus Lazio — ela sorriu, e só então a reconheci como uma modelo irlandesa ruiva
com quem andei trepando mais de um ano antes. — Você sumiu.
— Oh... — eu nem sabia direito o que responder, então simplesmente peguei sua mão e a
ergui, lhe dando um beijo respeitoso nos dedos. — Kiara... Você está magnífica... — disse, e
percebendo que ela gostou do elogio, soltei sua mão, quase ansioso para me afastar.
— Eu recebi aquele colar de brilhantes, com sua carta informando que estava de
casamento marcado e não poderia mais me encontrar. Fiquei tão triste.
Ela sorriu sedutoramente enquanto eu deixava meus olhos pousarem nos seios que se
elevavam com sua respiração.
— Eu também me casei, Lazio... Com um velho que devia morrer em seis meses, mas
que está aí, no restaurante, firme e forte, fazendo de minha vida um tormento.
Eu precisei rir disso, era o tipo de carma que uma mulher como ela merecia.
— Bom, eu preciso ir — disse, tentando me desvencilhar.
— Espere. Tentei entrar em contato com você, mas... Não é fácil quando você não tem
interesse em ver uma mulher.
Volvi para Matteo, e ele estava quase rindo.
— Nosso caso acabou, Kiara. Sou um homem casado agora.
— Mas, pelo que sei, suas amantes favoritas permanecem ao seu lado. Então eu...
Eu não gosto do jeito como falam de Giulia e Emma, então simplesmente me afasto,
caminhando para a recepção do restaurante. Ouço Kiara me chamando mais uma vez, mas eu não
tenho tempo para ela. Preciso saber se Melina está aqui. Deixo que Matteo cuide da mulher,
enquanto sou visto pela recepcionista, que sorri para mim:
— Sr. Lazio. Que prazer tê-lo aqui essa noite.
Aceno, sem saber direito o que perguntar, sem deixar claro que eu não faço ideia de onde
está minha esposa. Então, decido jogar verde:
— Minha esposa está me esperando — digo.
E ela sorri.
Colhi maduro.
30

ra incrível o quanto essa comida era deliciosa. Eu nunca havia experimentado comida árabe
E antes, e não conseguia parar de provar. Emma também não colaborava, sempre colocando
mais e mais alimentos no meu prato.
— É pasta de berinjela — ela me estendeu um pequeno pão coberto de uma pasta de cor
clara, que pareceu extremamente apetitosa. — E você ainda tem que experimentar o Shawarma.
É tão gostoso.
— Ela vai explodir, Emma — Giulia comentou, do outro lado da mesa oval, o que me fez
sorrir.
Tirando o fato de elas serem amantes de meu marido – algo que eu já nem mais tinha
tanta certeza – eram tão gentis comigo que eu não sabia como agradecer. Especialmente quando
cheguei ao restaurante e dei de cara com Açucena, descobrindo que Giulia pediu a minha antiga
empregada que fosse me ver.
— Eu fico tão feliz que a senhora esteja comendo direito — Açucena comentou,
enquanto degustava o cordeiro. — Até engordou um pouquinho.
Imediatamente, imagens de minha mãe dizendo que eu ficaria uma porca gorda me
tomaram, e eu senti o pão sírio entalando na minha garganta.
— Quando ela foi morar lá em casa parecia um esqueleto — Giulia comentou. — Agora
está bonita, não? Com muita carne para Klaus — ela me deu uma piscadela e eu senti meu rosto
queimar de vergonha.
Carlo estava perto de nós, e ele desviou o rosto para o assunto das mulheres,
respeitosamente.
— Como ele é? — Açucena me indagou, e eu vi curiosidade nela.
— Eu nem sei o que responder. Ele me confunde. Às vezes é bom, outras ele é cruel.
— Ele bate em você? — minha amiga pareceu preocupada.
— Klaus jamais bateria nela — Giulia negou. — Mas, se um dia ele te levantar a mão,
fale comigo e eu o coloco em seu lugar.
Giulia parecia uma mãe dominadora, o que era estranho porque ela era mais jovem que
Klaus.
— Ele nunca me bateu. Nem fez menção disso — neguei. — Ele é cruel com palavras.
Às vezes ele parece apenas me ver como sua parideira. Outra, ele parece respeitoso e gentil.
Senti a mão de Emma segurando a minha. Ela era de longe a pessoa mais gentil que eu já
conheci, o que era surpreendente, tendo em vista seu passado. Nós não costumávamos conversar
muito, nossa relação estava sendo construída com olhares. Emma me entendia, como se fosse
uma parte perdida de mim.
— Klaus tem seus fantasmas — Giulia contou. — Ele nunca quis ser um Capo. Foi
forçado pelas circunstâncias e agora não pode fugir.
— Ele me disse que sonhava em vender suas artes na praia — eu acenei, um sorriso bobo
se formando em meu rosto.
— A mãe de Klaus o ensinou a pintar — Giulia explicou. — Ela era uma mulher sensível
e dedicada a arte. Foi vendida a Giacomo como um objeto. Giacomo a viu com quinze anos em
uma festa, e a comprou de seu pai. A família dela nunca mais a procurou. Giacomo a idolatrava,
porque era linda e doce. E era muito religiosa. Então ela tinha essa aura de Maria, a Mãe.
A semelhança com a minha própria história doeu. Novamente, a mão de Emma segurou a
minha, num carinho de conforto. Eu ergui meus olhos, e percebi que Açucena viu o gesto com
curiosidade, provavelmente se perguntando como eu podia aceitar isso vindo de uma das
mulheres de Klaus.
Era algo difícil de explicar. Naquela casa eu só tinha três pessoas: Mia, Emma e Giulia. O
fato de as duas últimas vagarem pela cama de Klaus era inacreditavelmente quase sem
importância. Qual seria a culpa delas, nisso? Provavelmente foram compradas por Klaus assim
como eu fui. Elas não tinham o título de esposa, mas eram tão objetos quanto eu.
— E como estão as coisas lá em casa? — indaguei.
Não era mais “lá em casa”. Era a casa da família Fiorin, e eu não era mais parte disso.
Agora eu era uma Lazio, mas minha cabeça ainda pensava dessa forma.
— Melissa conseguiu a Ferrari que tanto queria.
Incrível como a vida era boa para ela, sem qualquer merecimento.
— Mas, agora ela não quer mais a Ferrari, e sim uma Lamborghini. Nada parece
satisfazê-la. Seu pai lhe disse que não podiam pedir outro carro desse valor para o Lazio, pois a
Tirreno se incomodaria com tantos pedidos, e ela teve um surto. Gritou e se jogou no chão como
se tivesse cinco de idade, e não vinte e cinco. Então sua mãe disse que ela precisa pedir isso
pessoalmente para Klaus.
Eu troquei um olhar com Giulia nesse momento. Ela não parecia preocupada ou
impressionada, mas eu me perguntei o que faria se Melissa se tornasse amante de Klaus. Ela
podia fazer minha caveira para ele, tornar minha vida um inferno, pois ela me odiava.
— Se Melissa colocou isso na cabeça, nada vai dissuadi-la — comentei.
Quando Klaus saiu essa noite para resolver seus problemas, eu pensei que seria uma noite
calma, outra que teria fechada no quarto, com meus próprios pensamentos. Mas, então Emma e
Giulia apareceram e me convenceram a vir com elas.
Foi incrível... Ver as ruas, as luzes da cidade...
Então me encontrei com Açucena e pensei que essa seria a noite mais feliz da minha
vida. Contudo, agora que ela me contou isso, eu só conseguia sentir tristeza e melancolia.
Nem devia... Klaus nem devia ser qualquer motivo de preocupação.
— Não há nada com que se preocupar — Giulia interrompeu meus pensamentos.
Giulia podia falar isso, mas ela não conhecia Melissa, e não sabia como minha irmã podia
ter terrível.
— Klaus é um homem bom — ela afirmou em seguida, e isso me surpreendeu porque ela
não parecia ter qualquer dúvida. — Claro, ele sua carga, tem seus problemas emocionais. Mas,
quem de nós não tem? Melina — ela volveu para mim. — Acredite nele. Não há possibilidade de
Klaus se enredar com sua irmã.
— Além disso, você é perfeita para Klaus — Emma afirmou, segura. — Você é doce e
gentil. E ele gosta de você. Especialmente porque ele dizia que não aceitaria o casamento...
— Emma! — Giulia ralhou, e eu acenei, desconsiderando.
— Klaus me disse que iria dizer não no altar — contei a ela. — Mas, ele voltou atrás
porque....
Porque eu me ofereci a ele. Eu fiquei com vergonha de contar isso, apesar de imaginar
que elas sabiam, já que foi Emma que buscou minhas toalhas na manhã seguinte ao sexo.
Minha atenção foi desviada por um movimento de Carlo. Ele se afastou para atender a
um telefonema. Eu vi Giulia também o seguindo com os olhos, parecendo aliviada quando ele
estava longe.
— Não é um saco isso? Um homem nem devia estar participando de uma noite de
garotas! — reclamou. — Mas, ele não nos deixaria sair se não viesse junto.
— O que ele fez muito bem! Não dei autorização para sair e levar minha esposa — ouço
uma voz masculina rugir as minhas costas, e sinto meu marido antes mesmo de vê-lo.
Giro, e então o vejo. Másculo, alto e imponente em seu terno caro. Ele contorna a mesa e
fica ao lado de Giulia, pegando-a pelo braço e a forçando-a a se erguer da cadeira. Vejo o quanto
está furioso, e imagino que vai bater nela, porque sempre que meu pai me pegava assim, me
espancava. Todavia, surpreendentemente, percebo Giulia o fuzilando com os olhos, e ela não
precisa dizer nada para que Klaus a solte, como se a pele dela queimasse suas mãos.
— Que noite maravilhosa — só então percebo Matteo em seu encalço. Ele sorri para nós
antes de completar. — Jantar ao lado de tão distintas damas.
Emma ri embevecida, e Açucena enrubesce.
— Homens não estão convidados — Giulia recusa.
— Por favor, estamos com fome — Matteo insiste.
— Então procurem outra mesa, pois estamos tendo uma noite de meninas.
— Não há outra mesa — Klaus recusa, enquanto volve até mim, e então me dá um leve
beijo na têmpora. O gesto é tão surpreendente que eu preciso me segurar no lugar para não evitá-
lo. — Esposa, podemos?
Eu não sei receber carinho. Especialmente na frente de outras pessoas. E eu também não
estou acostumada a Klaus me pedir permissão. Normalmente ele avassala tudo e impõe sua
vontade.
— Ah, que saco — Giulia percebe a dúvida nos meus olhos. — Sentem-se então e
comam. Bando de cuzões.
Eu precisei esconder um sorriso diante do linguajar dela. Céus, como eu gostava do jeito
bruto de Giulia, como se não tivesse medo de nada nem de ninguém. Gostaria muito de ser como
ela.
Klaus puxou uma cadeira e sentou-se entre mim e Emma. Matteo entre Emma e Açucena.
Como era uma mesa redonda, ficou tudo muito pequeno e desconfortável, mas sentia como se
fosse quase um jantar de família, e não pude deixar de sorrir.
— Você está bem?
A pergunta de Klaus não era para mim. Ele estava olhando para Emma. Eu a vi sorrindo
triste e acenando, uma dor tão grande nos olhos que eu quase chorei por ela.
— Vai passar, minha princesa — ele murmurou, bem baixinho, para ela, e sei que
ninguém mais ouviu.
Doeu em mim? Não sei... Depois do que Emma me contou, eu não acreditava mais em
algo romântico entre eles. Ainda assim, meu marido se mostrava outro homem com ela. Um
homem bondoso e companheiro. Gentil e delicado. Ele nem parecia um Capo.
— Você está linda, Melina — ele girou para mim.
O elogio foi tão surpreendente que eu fiquei sem palavras.
— Acho que nunca a vi tão bem-vestida. Que bom que alguns vestidos sobraram do
ataque da sua tesoura.
Que cretino!
31

— V ocê eu não conheço — Klaus girou para Açucena, que ficou nervosa diante do olhar
dele.
— Ela é Açucena — eu respondi por ela, apresentando-a. — Já falei dela para você.
Meu marido abriu a boca como se estivesse espantado de vê-la ali. Então ele
simplesmente girou para Giulia, como se soubesse que foi ela que planejou esse reencontro.
Mais uma vez, eu vi o completo despeito e despreocupação de Giulia. E mais uma vez senti
inveja da capacidade dela de não se encolher diante do olhar de Klaus.
— Seu patrão sabe que veio reencontrar Melina? — ele indagou para Açucena, que
negou imediatamente.
— Senhor Toni jamais permitiria. Ele me xingou muito quando descobriu que eu levava
livros para a senhora Melina. Ele disse que eu a estava tornando uma anarquista. Mas eu garanto
que eram apenas romances estilo Julia e Sabrina.
— Anarquista por ler romances? — Klaus meio indagou, meio debochou. — Toni Fiorin
realmente sabe o poder dos livros, tanto para o bem quanto para o mal. Acho que depois da
imprensa, livros são a maior forma de manipular massas.
— Depois da imprensa? — Giulia negou. — As pessoas não são mais tão burras. Com o
avanço das redes sociais, a imprensa hoje é questionada o tempo todo.
— Sabendo pagar os jornalistas certos, qualquer veículo de comunicação pode convencer
as pessoas de que uma velha de oitenta anos, com uma bíblia na mão, é um perigo a sociedade,
enquanto um homem de trinta, com uma arma engatilhada, é apenas um guerreiro da justiça —
Klaus apontou. — Como você acha que a Tirreno continua atuando desde a idade média sem a
revolta popular?
Eu nem imagina que a máfia pagava jornalistas. Meu pai uma vez comentou que se
pagavam sindicalistas e políticos, mas jornalistas? Era tão impressionante o quanto eu conhecia
pouco aquele universo.
— Não queremos a revolta popular porque não somos maus — Emma destacou. —Não é
Klaus? Não queremos prejudicar ninguém, só vender nossos produtos.
Os produtos eram armas e drogas, e eu vi Klaus esconder um sorriso de escárnio.
— O governo não gosta de concorrência, querida.
— Vamos mudar de assunto? Isso está me deprimindo — Emma retorquiu, e eu
concordei com ela. — Enquanto estava no quarto, eu li algumas revistas, e encontrei o lugar
perfeito para Melina e você passarem a lua de mel.
Eu nem pensava numa lua-de-mel. Sim, Klaus havia comentado um dia ou outro, mas
nunca me atentei. Especialmente, diante de tudo que estava ocorrendo nesse casamento sem
amor. Ainda assim, quando Klaus me encarou, como se estudasse minha expressão diante da
sugestão, eu o senti como uma criança errante procurando por abrigo.
— Melina e eu ainda não falamos sobre viajar — ele destacou.
— Para fortalecer o casamento — Emma insistiu. — Um casamento precisa ser regado
como uma planta, para se desenvolver. Que melhor coisa do que viajar juntos e sozinhos?
Fiquei com tanta vergonha da forma como o olhar de Klaus me queimou. Ele parecia
estar relembrando cada detalhe do sexo que já compartilhamos, e imaginando-o em lugares
exóticos. Uma parte de mim quis ansiosamente viajar com ele, mas outra só queria fugir do tanto
que isso poderia significar.
A cada dia que passava, eu tinha menos repulsa pelo meu marido. Uma parte de mim até
ficava feliz quando ele estava por perto. Isso assustava para caramba.
— Que lugar, Emma? — ele indagou.
— Verona, na Itália.
— Deus, por que você me odeia? — ele reclamou. — Aquele lugar é frio para caramba.
— É super-romântico! — Ela negou. — E vocês podem tomar vinho enquanto andam
pela arena ou conhecem os museus.
Voltei a comer, enquanto ouvia Emma falar sobre o lugar. Relaxei diante da conversa,
imaginando como seria andar pela cidade secular, conhecer lugares construídos pelos romanos, e
imaginar a história diante dos meus olhos.
Klaus recusou cada detalhe, dizendo que odiava o inverno italiano. Ainda assim, ele
pousou a mão na minha coxa, discretamente, daquele mesmo jeito que ele fazia quando queria
compartilhar algo que só nós dois sabíamos.
— O que pensa, Melina? — repentinamente, ele girou de novo para mim, sua mão firme
agora deslizando pela minha perna e subindo.
Eu senti o ar me faltando, enquanto um suor estranho descia pela minha espinha. Meu
rosto ficou vermelho, mas as pessoas ali deviam imaginar que eu estava constrangida por estar
sendo inclusa na conversa, não porque a mão dele estava perigosamente perto da minha boceta.
— Eu... Eu vou aonde quiser — disse, depois de tudo, tentando recuperar o ar.
Não sei por que estava sendo tão submissa, mas havia uma verdade inclusa nas minhas
palavras. Eu iria aonde ele quisesse, ficaria feliz apenas de estar ao seu lado.
— Você vai ter que esperar um pouco, Melina... estou ocupado com os negócios...
— Eu posso cuidar dos negócios — Giulia interveio.
— Você está louca para me escantear, não é? Ainda sou o Capo, Giulia.
— Você precisa cuidar da sua esposa. Passar tempo com ela. Tempo de qualidade. Dar-
lhe atenção e carinho. Assim vão desenvolver sentimentos mais profundos do que simplesmente
atração física.
Klaus pareceu estudar o assunto por um tempo, e então repentinamente puxou o
guardanapo do colo e empurrou a cadeira para trás.
— Você está certa, Giulia. Melina e eu precisamos ficar um pouco sozinhos. Então, vocês
me deem licença. — Ele girou para Açucena. — Foi um prazer conhecê-la. Por favor, sinta-se à
vontade e coma o que quiser, é tudo por minha conta. Mas, agora Melina e eu precisamos ir.
Ele girou para mim, estendendo a mão. Como fui educada a fazer, obedeci de imediato,
aceitando que ele me ajudasse a levantar da cadeira, e segui com ele para fora do restaurante.
Entramos no elevador completamente sozinhos, e imaginei se Matteo ou Carlo viria conosco,
mas os dois permaneceram perto da mesa das mulheres.
— Você quer ir em uma lua de mel? — ele perguntou, quando o elevador se mexeu.
— Faço o que quiser, meu esposo — murmurei, derrotada.
— O que há de errado com você? Pode me dizer o que sente, Melina... Eu não vou bater
em você ou coisa assim. Se quiser ir, fale. Se não quiser, seja sincera. Emma é meio romântica
com esses assuntos, mas você pode ter sua própria opinião.
Girei para ele e estudei sua expressão. Ele parecia duro e indiferente.
— Emma é doce — murmurei. — Ela foi gentil em sugerir.
— Você é meio como ela — apontou. — Às vezes mostra energia, mas então parece
completamente derrotada, como se não pudesse esperar nada de mim além de vergonha e
humilhação.
— E por que eu esperaria qualquer outra coisa?
— Você gostaria de ter um casamento real, esposa?
A pergunta me pegou desprevenida. Eu abri a boca, sem palavras, e nesse instante, a
porta do elevador se abriu e saímos pelo saguão. Eu realmente não tinha uma resposta.
— Sabe, Melina... essa noite eu descobri que há traidores dentro da minha casa. Ainda
não sei quem é, mas sei que essa pessoa está por perto, descobrindo meus planos e tentando
prejudicá-los. O primeiro nome que me veio à mente foi o seu.
Eu travei. Não escondi o quanto fiquei surpresa e magoada. Sei que meus olhos se
encheram de lágrimas, porque o homem que era meu marido desconfiava de mim — logo de
mim! — quando a casa era cheia de guardas e empregados. E então eu simplesmente desviei dele
e saí correndo.
Uma dor descomunal vazava dos meus poros. Eu queria chorar e gritar com ele pela
acusação tão injusta, mas eu não conseguia pensar em nada que articulasse minhas palavras. Ele
tinha qualquer motivo para desconfiar de mim? Não. Mas, ele também não tinha qualquer motivo
para não desconfiar.
Eu não era nada para Klaus. Nada além de um lugar para ele enfiar o pau.
Já era tarde e a rua estava vazia. O único som que eu ouvia era os saltos dos meus sapatos
batendo contra a calçada de concreto. Agora estava chorando de decepção e tristeza pela vida
infeliz que eu tinha, onde mesmo que eu não fizesse nada de errado, ainda caía sobre meus
ombros a culpa de todos os problemas.
— Eu disse — repentinamente, Klaus me pegou pelo braço, me girando para ele. Soube
então que ele correu atrás de mim. — Eu disse que seu nome me veio à mente, mas eu não
acredito nisso — ele justificou. — Inferno, Melina!
Ele estava brigando. Com o quê, eu não sei.
— Você pode ser a minha desgraça, Melina... Você acha que eu sou machista o suficiente
para acreditar que as mulheres não são capazes de destruir um homem? Você pode acabar
comigo só estalando os dedos, Melina!
O que ele queria dizer?
Estávamos sob a luz de um poste velho que não iluminava direito. Ainda assim, eu vi as
sombras de medo e desespero nos olhos dele.
— Fale comigo, Melina... Diga para mim o que sente. Me faça entender seus sentimentos.
Se está com raiva, ou se está feliz. Você pode me dizer o que gosta e o que não quer. Eu não vou
te impor nada, se simplesmente for franca comigo.
Então ele me soltou. Suas mãos caíram na lateral do seu corpo. Ele parecia tão derrotado.
— Você é a traidora, Melina? Se for, não vou te matar. Não farei nada para você, mas
preciso que me responda francamente. Preciso saber.
— Não sou.
— Então eu vou acreditar e nunca mais vou acusá-la disso. Você entende? Eu estou aqui
pondo minha vida em suas mãos. Você só precisa falar. Só dizer.
Pela primeira vez naquele casamento, estava vendo Klaus como um homem inseguro. E
isso abriu espaço para que eu visse humanidade nele.
— O que você está sentindo? — perguntei, diante disso. Se ele queria que eu falasse, ele
também teria que falar.
— Quando Mia ligou e disse que Giulia a levou para sair, eu fiquei louco. Eu temia
perder você.
— Por que sou sua propriedade?
— Não — ele balançou a cabeça. — Porque é importante para mim, Melina. Porque eu
não queria me casar, mas quando eu a vi fiquei tão louco que não pude fugir desse casamento. Eu
sou um homem perdido, Melina... cheio de obrigações e afundado na lama de uma máfia. E eu
nem posso fugir disso... Porque... Eu preciso te contar sobre Giulia e Emma...
— Elas não são suas amantes...
Não era uma pergunta. Era uma afirmação.
— As pessoas precisam acreditar que são. Elas... — ele pareceu corroído. — Você pode
esperar um tempo até eu conseguir colocar em palavras tudo que as envolve?
Assenti.
— Você me odeia, Melina? — ele indagou, e eu neguei quase de imediato, balançando a
fronte. — Podemos viver em paz, Melina? Eu posso confiar em você?
Eu assenti, e então ele sorriu. Eu acho que foi a primeira vez que eu vi um sorriso tão
sincero vindo dele, então de imediato em me aconcheguei em seus braços, aceitando aquele
abraço de reconciliação e perdão.
Klaus ainda tinha muito a me explicar, mas ele estava abrindo o coração e a mente para
mim. E eu estava aceitando isso, mesmo que pouco, porque era mais do que eu jamais tive.
32

casa estava silenciosa. Apesar de eu saber que os guardas estavam atentos na escuridão,
A ninguém se atreveu a incomodar o Capo e sua esposa, que entravam de mãos dadas
naquele ambiente quieto e quase acolhedor.
A casa que eu nasci e cresci sempre foi vista por mim como uma prisão. Depois, passou a
ser um abrigo, um local onde eu ficaria seguro e manteria Emma e Giulia protegidas também. E
agora era simplesmente um lar.
Foi por causa de Melina que essa última sensação passou a tomar conta de tudo.
Meu lar. Não... não era a casa... era ela.
Naquela mesma noite, afirmei para Matteo que ela era a traidora. Na verdade, estava
tentando me convencer porque precisava desesperadamente parar de sentir por ela isso que
estava me corroendo. A sensação de pertencimento e de paz que eu tinha quando estava em seus
braços podia ser minha ruína.
Eu me entregaria aos sentimentos sem sequer pensar se o único que pudesse ser destruído
era eu mesmo. Mas, havia mais que meu egoísmo correndo em mim. Então, lutei contra ela com
todas as armas que eu tinha. Mas, quando vi a forma como Giulia e Emma a tratavam na mesa,
sabia que elas estavam mais abertas e eram mais corajosas do que eu.
Não conseguia tirar minhas mãos de Melina, nem pensar direito com o perfume suave e
doce dela me tomando de assalto. Ela era tão maravilhosa, que a única coisa que conseguia
pensar era em tê-la novamente. Então, precisei fugir e vir com Melina para casa.
Nessa noite eu não queria que ela fosse ao seu quarto, então a levei ao meu. Melina não
recusou nenhum passo, aceitando meu convite para dormir em minha cama como a jovem esposa
amorosa que ela foi preparada para ser.
Mas, havia algo nela que não foi criado por seus pais narcisistas ou pelas regras imorais
da Tirreno. Melina era delicada e pura, era forte e determinada... E quando me aceitava, não era
porque o casamento exigia isso, mas era porque ela realmente me aceitava.
Eu não era um Capo com ela. Eu era apenas Klaus.
Abri a porta de meu quarto e Melina entrou. Ela havia vindo aqui apenas uma vez antes,
na noite do nosso casamento. Havia sido uma noite desastrosa de muitas maneiras. Eu não
planejava ter com Melina naquela noite, mas acabei por me impor, como um canalha que sempre
desprezei.
Eu sorri para ela quando Melina entrou no quarto. Tirei meu casaco assim que fechei a
porta, largando-o sobre uma cadeira.
— Fique à vontade — disse a ela. — Emma havia preparado uma mala para você nesse
quarto, então tem coisas suas nos armários. Você pode pegar para tomar um banho e ficar
confortável — contei.
Não queria me impor de novo, então rumei até o banheiro. Comecei a tirar a roupa,
pronto para tomar um banho e me esgueirar nas cobertas, para uma noite tranquila ao lado de
minha esposa.
Quando eu estava de cueca boxer, Melina apareceu na porta do banheiro. Ela ainda estava
com a roupa que saiu, nem sequer tentou tirar a maquiagem na penteadeira colocada num dos
cantos do quarto.
— Esse era para ser meu quarto? — ela indagou.
— Minha mãe dizia que uma esposa deve ficar com seu marido. Eu achei que era o certo
— dei de ombros.
— Por que então fiquei no outro?
— Do jeito que as coisas aconteceram, achei que fosse mais gentil preparar um quarto de
hóspedes confortável para você.
Ela pareceu realmente surpresa pela minha frase.
— Você está me surpreendendo, Klaus. Não pensei que fosse esse tipo de homem.
— Gentil?
— Bom, não ao menos comigo. Eu vi como trata Emma. Você realmente se importa com
os sentimentos dela. É porque ela foi... — ela tentou mastigar as palavras — abusada?
— Quando eu encontrei Emma, ela tinha menos de quarenta quilos. Estava carne e osso,
era estuprada constantemente, não conhecia nada além de ser colocada de pernas abertas para
homens poderosos foderem. No primeiro ano comigo, ela nem conseguia falar. Durante meses,
ela pareceu tão em choque que não tinha reação de dor ou medo. Ela era apenas uma boneca, de
olhos arregalados, e sem entender o que estava acontecendo.
— Como ela foi parar nisso?
— A mãe a vendeu. A mãe nunca a quis. A mãe a ofereceu ao meu pai, mas papai
também não tinha interesse nela. Então, quando ela era criança, foi vendida para um bordel, onde
foi leiloada. Como os valores começaram a ficar astronômicos, um grupo de empresários dividiu
o prêmio. Ela é linda, não é? Os homens viram isso. Eu não sei como ela sobreviveu a tantos
anos de abuso. Foram oito, se não me engano. Emma contou depois para Giulia que a primeira
vez foi com doze. Emma nunca me falou do assunto, mas ela sabe que eu sei. Quando eu a
encontrei, havia homens em cima dela.
— Você estava caçando os homens, e os pegou fazendo isso? — a pergunta dela queimou
minha língua. Eu poderia mentira a resposta, mas não fui capaz disso.
— Não. Eu a procurava a anos.
De repente, Melina avança. Eu não sei o que ela viu em meus olhos, mas ela pareceu me
ler de um jeito assustador. Então, ela abriu os braços e me aceitou entre eles. Eu me senti um
garotinho, recebendo o conforto de uma mãe após ralar os joelhos.
— Você vai ser uma mãe maravilhosa — murmurei, contra os cabelos dela, enquanto
afundava meu rosto em seu ombro. — Você é tão gentil...
— Eu tenho medo de ser mãe — admitiu. — Tenho medo de não saber amar, porque
nunca fui amada.
— Se for por exemplo paterno, eu tive o pior dos pais. Acredite, meu pai não era melhor
que o seu. Ele me via apenas como uma continuação para a Tirreno. Mas, ainda assim, sei que
sou capaz de amar um filho.
Ela me soltou, escondendo-se do meu olhar, e eu não insisti. Eu a permiti tomar banho
primeiro, deixando-a sozinha no banheiro. Quando ela saiu, momentos depois, eu mesmo fui
tomar meu próprio banho. Nenhum toque adicional, nenhuma malícia no olhar quando cruzamos
um pelo outro. Éramos apenas duas pessoas que estavam lutando para se respeitarem, e
compartilharem uma vida.
Uma parte de mim ficou orgulhoso de estar me forçando a manter esse casamento dentro
de uma área digna. Eu acho que era mais do que minha mãe jamais teve. Respeitar Melina seria
como eu conseguiria seguir em frente.
Era assim que eu teria filhos com ela, e era assim que eu teria uma casa amorosa para
onde voltar depois da vida desgraçada que eu tinha.
Quando saí do banheiro, ela já estava deitada. Aproximei-me da cama, e puxei as
cobertas, deitando-me do lado direito, buscando me ajeitar para uma noite de sono depois de
tudo.
O silêncio caiu sobre nós enquanto entrávamos nesse território desconhecido, onde eu
não me impunha como homem, e ela tinha confiança de que eu não a forçaria como mulher.
Eu sorria enquanto fechava os olhos.
33

ão sei que horas eram quando abri os olhos novamente. O breu noturno tomava tudo ao
N meu redor. Havia uma paz naquele silêncio, quebrado apenas pelo ressonar confiante e
tranquilo de Melina.
Girei meu rosto para ela. Conforme meus olhos foram se acostumando a escuridão, pude
decifrar suas formas, o semblante pacífico em sonhos que eu desconhecia. Ela estava deitada de
lado, sua frente para mim, sua mão esquerda quase cobrindo sua face, pousada no travesseiro,
enquanto o braço direito estava escondido embaixo da cabeça.
Sorri para ela, enquanto me aproximava um pouco, apenas o suficiente para ficar diante
dela, meu nariz quase tocando o seu.
Como podia ser tão bonita? Ela fazia ideia de quanto eu perdia o ar sempre que a via?
Disse várias vezes a mim mesmo que estava com Melina porque era o certo a fazer, mas a grande
verdade é que estava com Melina porque era o que eu queria.
Me aproximei mais, aninhando meu corpo ao dela. Meu pau se acomodou entre suas
pernas, enquanto ela gemia baixinho com o toque.
— Klaus — ofegou, acordando. — O que está fazendo?
— Só abraçando você — expliquei, apesar de o cheiro dela me deixar duro, e a forma
como seu calor me preencheu me deixou louco para fazer amor.
— Hum... — ela gemeu, aceitando meu abraço, abrindo um pouco mais as pernas,
fazendo com que meu pau se contorcesse. — Me deixe dormir — pediu.
Respirei fundo, inalando a fragrância doce de seus cabelos. Então fiquei em silêncio,
apenas mantendo-a para mim até que seu corpo relaxou o suficiente, e percebi que ela apagou em
um sono tranquilo.
Dormir em meus braços era um sinal de confiança. Eu contei coisas a Melina essa noite
que não teria coragem de falar a ninguém mais, e ela devolveu esse avanço se permitindo
acreditar o suficiente para dormir apertada contra mim.
Deus do céu... eu não conseguia me lembrar de estar me sentindo mais vulnerável antes.
Mesmo quando estive com armas apontadas para minha cabeça, nunca me senti tão à beira da
morte e da vida quanto agora.
Meu coração batia com tanta força, e isso era aterrorizante. E ainda assim, era o lugar
mais certo e seguro que já estive.
Nos braços dela. Em seu encontro. Fechei os olhos, e o sono me tomou. E foi assim que
eu caí no limbo da segurança e de algo tão profundo que eu não tinha uma palavra para
descrever.
Talvez amor..., mas, amor não existia, então... o que era?

✽ ✽ ✽

O sol da manhã avançou pelo quarto. Meus olhos queimaram com a claridade, enquanto
ia sentindo o calor estranho – nunca antes experimentado ali naquele leito – de um corpo ao lado
do meu.
Não qualquer corpo.
Melina. Minha esposa.
Ela estava deitada sobre mim. Eu não sei em que momento da noite eu fiquei de costas e
Melina se acomodou em meu peito, seus cabelos esparramados e fazendo cócegas, suas coxas
descansando sobre meu pau meio mole.
Meio... porque ele já estava acordando, e parecia estar buscando um calor de mulher.
Melina se esfregou contra minha coxa enquanto também ia acordando. O lençol estava
em seus tornozelos, e eu era capaz de ver sua bunda branca naquele quarto iluminado. Sua
camisola estava erguida até sua cintura, e tudo que me separava de Melina era a calcinha branca
dela e minha boxer que já não escondia o desejo da manhã.
Girei para o lado, segurando sua bunda e a encaixando sua bocetinha no meu caralho
duro. Suspirei de prazer, enquanto minha ponta vazou ao sentir seu calor. Ela gemeu e se
esfregou para cima e para baixo, ainda em seu sonho, contra mim. E então eu não resisti e a
tomei em um beijo poderoso.
— Klaus — ela acordou, e imaginei que ela fosse me afastar assustada, mas Melina me
empurrou para trás e subiu sobre mim.
Ela me montou, e com dificuldade eu consegui baixar a cueca o suficiente para meu pau
aparecer entre nós, um pinto feliz procurando o ninho entre suas pernas.
— Monta meu cacete, Melina — pedi, enquanto ela apenas levava a barra da calcinha
para o lado, e liberava seu buraco para mim.
Ela deslizou pelo meu cacete, toda a extensão, até o talo. Seu rosto adquiriu uma
expressão safada e ao mesmo tempo tensa, enquanto ela começou a pular em cima de mim, para
cima e para baixo, cada vez mais energicamente.
Céus, nós havíamos acabado de acordar e já estávamos desesperados um pelo outro.
— Ah, que gostosa — eu disse, segurando seus peitos com as duas mãos, sentindo seus
mamilos duros nos meus dedos.
— Ah, Klaus... Klaus — ela começou a dizer meu nome cada vez que afundava mais, a
ficção se tornando uma tortura que estava me levando ao delírio. — Klaus... Ah, é tão bom...
— Uma rapidinha de manhã, esposa? Posso te dar isso todos os dias — eu disse, apenas
porque queria que ela dissesse que queria. E sua resposta me deixou mais e mais duro.
— Sim, Klaus... Por favor... por favor... todos os dias... Ah! Ah!
Como eu podia gostar tanto de ver essa mulher me implorando para fodê-la? Era mais do
que jamais vivi. Não que as outras mulheres que já tive também não me imploravam, mas com
Melina era diferente.
Levei a mão até sua boceta faminta que estava me devorando. Esfreguei meus dedos nos
seus grandes lábios, enquanto ela se sentava mais e mais duro.
— Ah, Klaus — ela apelou, sua voz tão doce, gemendo tão suavemente. — Klaus...
Não consegui mais segurar, então a girei na cama, caindo por cima dela, martelando meu
pau com força no seu buraco. Eu empurrei de novo e de novo, e ela aceitou, circulando sua perna
na minha cintura, abrindo-se para mim.
— Ah, Melina... você está gozando no meu pau — disse, quando suas paredes internas
me apertaram com tanta força que eu quase perdi o controle.
E então nós dois quebramos como cacos de um cristal. Despedaçados, um pelo outro. O
que isso significava, eu não fazia ideia, mas eu temia Melina na mesma intensidade que algo me
dizia que já não poderia viver sem ela.
34

u basicamente não via Klaus pela casa. Ele estava sempre ocupado no escritório, em
E reuniões intermináveis. Então, basicamente, minhas companhias nas refeições, ou para o
dia a dia, eram Giulia e Emma.
Com o tempo, entendi que havia coisas a serem feitas aqui. O papel das mulheres nessa
organização era preparar a casa para torná-la um lar. Então, com os dias, fui eu que passei a
escolher o que Klaus jantaria, ou que horas seria levado o café para ele no seu escritório. Era
também eu que exigia que parasse de trabalhar no final do dia, e seguisse comigo para o quarto.
Admito que essa era minha parte favorita de ser esposa.
Ser mulher passou a ser algo que eu gostava. Sem a pressão e o abuso, até que não era de
todo mal.
Emma também se sentia assim. Adorava passar o dia fofocando ou falando de artistas da
televisão, enquanto bebia chá e tricotava – algo que me confidenciou que aprendeu para lidar
com a ansiedade. Todavia, Giulia se ressentia da nossa figura feminina. Ela queria um papel
masculino, e eu passei a entender que Klaus lhe dava algumas ordens rasas sem ninguém
perceber, como organizar papeis, ou planejar vendas, apenas para acalmar seu espírito
indomável.
— Você devia ser grata em não precisar lidar com bandidos — Emma a repreendeu,
numa das tardes que tomávamos o chá da tarde no jardim.
— Eu colocaria todos eles para correr — Giulia prevaleceu, e eu acreditava nela.
A forma como Giulia olhou amorosamente para Emma me fez arquear as sobrancelhas, e
então uma questão me surgiu, e eu não fui capaz de escondê-la das duas.
— Vocês se gostam?
As duas me encararam com as sobrancelhas arqueadas.
— É claro — Emma respondeu.
— Eu digo... como... namoradas?
Giulia explodiu num riso, enquanto Emma negou com a face rapidamente.
— Nós somos irmãs — Emma explicou, e eu medi as duas, loira e morena, muito
diferentes uma da outra.
— Como amigas?
— Como “de sangue” — Giulia completou, e eu fiquei chocada.
— Vocês são irmãs de verdade?
— Meia irmãs, na verdade. Apenas por parte de pai.
Eu tinha muitas outras questões para trazer à tona, mas fui interrompida pela entrada de
Mia.
— Senhora, sua mãe e sua irmã estão aí. Posso dizer para entrarem?

✽ ✽ ✽

Meus batimentos cardíacos estavam erráticos diante da presença das duas mulheres. Nem
pareciam minha família, eu não sentia nada além de apreensão por vê-las depois de tantos dias.
Meu coração estava aos pedaços.
— Como está sendo o casamento? — mamãe perguntou, após se acomodar na cadeira do
jardim.
Estávamos todas diante de uma mesa oval. Emma se levantou brevemente para servir chá
para Lucia e Melissa, e eu mal conseguia articular alguma palavra.
— Está sendo bom — murmurei.
Desde que cheguei aqui, passei a ser uma pessoa mais falante. Contudo, diante delas, eu
mal conseguia pronunciar alguma palavra.
— Há comentários de que seu marido é primitivo, e mantêm mulheres perto de você —
Melissa apontou, olhando para Emma quando esta lhe serviu o chá. Eu senti que Emma
enrubesceu de vergonha, e uma parte de mim quis protegê-la daquele olhar malicioso.
— Há muitos comentários sobre a Tirreno. Se a senhora Lazio ficar se incomodando com
cada fofoca que falam, ela nem aproveitará esse casamento — Giulia despejou, e quase sorri
agradecida para ela.
Melissa virou o rosto e observou a morena. Seu olhar queimou.
— Eu a vi no casamento. Achei que nem estaria mais na casa, depois da cerimônia.
— Para você ver como seu achismo não tem nenhum fundamento — Giulia cutucou, o
que fez Melissa ficar enrubescida de vergonha.
O ambiente estava ficando cada vez mais tenso, então intervi.
— O que fazem aqui?
Mamãe me encarou como se nunca tivesse me visto antes.
— Ora, estou visitando minha filha. Você tem família, é uma Fiorin. Evidente que
sempre estaremos por perto.
— Agora a família dela é seu marido, e ela é uma Lazio. A senhora Lazio — Giulia
afirmou novamente, e mamãe estremeceu de raiva.
— Acho que você e essa outra empregadinha podem nos deixar a sós — mamãe disse,
fazendo um desdém com a mão. — Quero ficar a sós com minhas filhas.
— De que empregadinha está falando?
O ar queimou e eu comecei a sentir o oxigênio faltando do meu pulmão. Eu odiava
conflitos, e a breve e momentânea paz que eu tinha em minha casa parecia destruída nesse
instante.
— Sra. Lazio — Mia apareceu às minhas costas. — O chef pediu que a senhora
escolhesse o jantar dessa noite — ela me entrou dois menus, como fazia todos os dias, e eu os
segurei, tentando fazer com que minhas mãos parassem de tremer, enquanto observava a lista.
— Melina escolhe o que comem? Nossa... — ouço a voz de Melissa ao fundo. — Deve
sempre escolher as piores coisas. Nunca teve bom gosto para nada...
— Melissa, querida... — mamãe a acalmou, batendo de leve na sua mão.
— Irrita-me um pouco, porque esse lugar devia ser meu. Uma casa grande, empregados,
muito poder... Garanto que se Klaus tivesse se casado comigo, ele não precisaria manter amantes
dentro da casa, para satisfazer o que Melina é incapaz de dar.
Minha cabeça começou a rodar e rodar, e eu perdi um pouco meu eixo. Eu sinto um
vômito louco tomando conta do meu peito, subindo, e quase indo até minha garganta. Todavia,
tentei manter o controle, tentei manter a calma, porque era meu lugar comum, algo que eu
sempre estive acostumada. Ser humilhada era tão parte de mim que eu nem devia mais me
importar.
— Garanto que se fosse você, Klaus teria desisto no altar — Giulia despejou e eu vi raios
e trovoadas ecoando nos meus ouvidos.
— Melina! — ouço mamãe e ergo meus olhos para ela. — Faça alguma coisa!
A ordem me deixou sem chão. Fazer o quê? Eu estava me esforçando para manter essa
casa em paz, e não tinha nenhum problema com Giulia e Emma, especialmente depois de saber
que elas não compartilhavam o leito com meu marido. Se havia alguém que eu não queria aqui,
essas pessoas eram minha própria mãe e minha própria irmã.
— Oh, temos visita? — ouço uma voz profunda surgindo no jardim.
Todas nós nos viramos para ver Klaus caminhando em nossa direção. Ele estava usando
um terno escuro e seu cabelo estava meticulosamente escovado para trás. Ainda assim, havia um
cansaço em seu olhar e uma forma desgrenhado em sua expressão, que me fez perceber que ele
estava cansado.
Ele caminhou na minha direção e me deu um beijo gentil na têmpora, antes de voltar para
minha família.
— Não sabia que as duas viriam... — apontou. — Teria mandado organizar um jantar
para recebê-las. Mas, infelizmente, sem aviso prévio, não poderei ser um anfitrião. Melina e eu
temos um compromisso essa noite.
Eu percebi como ar acalmou quase de imediato, e a maneira como Melissa sorria para
Klaus. Havia lembranças de ela querer se tornar uma das amantes dele, pois estava ansiosa para
ser cuidada como a princesa que ela sempre se considerou. Isso me deixou confusa e cheia de
raiva.
— Tenho certeza de que podemos agendar um jantar — Melissa sorriu.
— Com certeza.
Klaus e eu não tínhamos nenhum compromisso agendado, não que eu soubesse. Mas,
fiquei em silêncio, aceitando a mentira com alívio, quando as percebi concordarem de imediato,
mediante a promessa de um jantar futuro.
— Qual nosso compromisso? — indaguei a ele, quando as duas foram embora, meia hora
depois. Emma e Giulia também se retiraram, e só estávamos nós dois no jardim.
— Nosso compromisso é jantarmos sozinhos no quarto — ele me deu uma piscadela, e eu
precisei conter um sorriso.
— Obrigada, Klaus. Você se livrou delas tão facilmente.
— Precisei. Você parecia prestes a desmaiar quando cheguei aqui.
— Melissa e Giulia começaram a brigar. Eu... eu não sei lidar com isso.
— E imagino que Emma também entrou em pânico e não conseguiu te defender, né?
Falarei com Giulia para manter a calma quando as duas vierem, porque não quero que se sinta
mal. Você é muito importante para mim, Melina — ele disse, e eu senti meu coração bater tão
forte que achei que iria ser arrancado do peito.
Eu não sei o quanto esse casamento estava sendo real, mas a cada dia eu me sentia mais
próxima de Klaus. Como a bonança antes da tempestade.
35

a tempestade levou cinco dias para acontecer. Foi como um temporal de verão, um encontro
E entre massas gélidas e quentes, com trovoadas e ventania devastando tudo.
Naquele final de tarde, peguei meu aparelho celular – que havia ganhado dias antes,
e cujo ainda estava aprendendo a manejar – e comecei a ver as notícias de fofocas. É sempre
interessante saber o que está acontecendo com aquela atriz, ou saber quem foi o artista que traiu
a esposa.
Eu nem pensei que a esposa era eu.
Foi sentada no sofá que eu li, em letras garrafais, a informação de que o “empresário”
Klaus Lazio foi visto ao lado da cunhada, no shopping.
A foto abaixo parecia a coroação de toda a dor. Eu me sentia a pessoa mais traída do
mundo, enquanto focava os olhos na imagem de Melissa agarrada no braço de Klaus, enquanto
eles entravam em uma joalheria.
O texto, sem dizer muito e ao mesmo dizendo tudo, contava que ele lhe deu um bracelete
cravado em diamantes que custava alguns milhões.
— Melina?
Levantei os olhos e encarei Giulia. Ela tinha as sobrancelhas arqueadas e parecia estar
confusa diante de mim.
Então eu estendi o celular para ela. Giulia leu a notícia impassível, e quando me devolveu
o celular, disse:
— Não deve ser o que parece. Tenho certeza de que Klaus tem alguma explicação.
— Minha irmã quer ser amante dele — apontei.
— O jeito da sua irmã é exatamente o tipo que Klaus despreza. Ela é muito parecida com
a mãe de Emma, na forma de ver o mundo e lidar com as pessoas. A mãe de Emma via a tudo e a
todos como mercadoria, só pensava em dinheiro e lucro. Klaus odeia gente assim.
Eu tentei me levantar, mas caí sentada em seguida, minhas vistas escurecendo, como se
minha pressão tivesse baixado. Logo, senti ânsia de vômito e precisei pôr a mão na boca para
controlar.
— Você está bem? Eu vou ligar para Klaus — ela disse.
Não levou muito tempo para o mordomo Ângelo e o chefe da segurança Carlo
aparecerem, para me ajudarem a irem para o quarto. Emma veio logo em seguida com um chá de
camomila. Eu agradeci a todos, e pedi que me deixassem sozinha.
Estava cheia de dor em minha alma. A verdade é que eu não tinha a menor confiança em
meu marido, eu mal o conhecia, e ele trazia segredos que ainda não me achava digna de
confessar.
Lá fora, a luz do sol começava a desaparecer. Eu fechei os olhos, contendo as lágrimas,
em ver Melissa tendo exatamente o que queria, mais uma vez. E dessa vez, era pior. Ela não
estava tirando de mim um vestido ou o amor de meus pais. Ela estava tirando a única pessoa com
quem me senti conectada na vida.

✽ ✽ ✽

— Isso é ridículo — Klaus afirmou, enquanto lia a nota do portal. — Vou forçá-los a
apagar isso. Melissa é uma cadela, mesmo... Ela deve ter chamado o tabloíde para pegar a fofoca.
— Não acho que a fofoca seja o problema — apontei. — Por que está lhe dando
presentes?
Ele me encarou como se não acreditasse na minha pergunta.
— Por você, evidente.
Não havia nada de evidente no gesto. Eu desviei meus olhos do homem de terno escuro,
vestido e penteado com esmero, como ele estava todos os dias, mesmo que estivesse trabalhando
em casa, ou indo resolver algo na rua.
— Melissa é uma mulher exigente. Ela quer carros, quer joias... senão ela vem aqui te
incomodar. Ela deixou claro isso para mim. Francamente, posso dar a ela presentes se isso
significar sua paz. Ou posso matá-la, mas pensei que você não iria querer que eu matasse sua
irmã apesar da rivalidade entre as duas.
— Nunca houve rivalidade — apontei. — Melissa sempre teve tudo. Eu sempre fiquei de
lado.
— Melina — ele murmurou, suspirando. — Eu não estou transando com sua irmã, apesar
do site insinuar isso.
— Dizem que ela costuma ficar em uma das suas coberturas na área central.
— Isso é verdade. Mas, ela fica lá sozinha. Ela me pediu a chave e eu dei, não uso aquele
lugar desde que me casei com você, e não pretendo levar minha esposa no mesmo ambiente onde
levava prostitutas. Vou vender aquele prédio.
Sempre que ele falava parecia me ter muito respeito. Uma parte de mim insistia que
Klaus estava se esforçando por mim, como nunca, e eu devia ser grata a ele por isso. Mas, o fato
é que mesmo que ele tivesse uma explicação, eu ainda sentia muita dor em imaginá-lo com outra
mulher, especialmente minha irmã.
Isso seria... ciúmes?
— Giulia disse que você não passou bem lendo a notícia. Precisa que eu chame um
médico?
Sua indagação me cortou o outro pensamento.
— Não. Já estou melhor. Minha pressão baixou, apenas isso.
Ele sentou-se ao meu lado na cama, segurando minha mão.
— Precisarei viajar essa noite, Melina. Matteo vem me buscar lá pelas nove. Sinto muito
por isso, mas é algo necessário. Estou verificando pessoalmente uma carga que será enviada para
a Europa.
Concordei, apesar de saber que negar não adiantaria de nada. Ele pareceu satisfeito e
então completou:
— Esposa... você quer jantar no quarto?
De súbito, um calor se espalhou pelo meu corpo, algo que eu não esperava, como se meus
hormônios houvessem explodido em fagulhas quentes que queimavam minha pele, fazendo meu
corpo inteiro latejar e minha boceta piscar de vontade.
Minha mão deslizou pela sua coxa, subindo até a protuberância em sua calça. Klaus
parecia tão chocado pela minha reação que nem se mexeu. Mas, ele não podia estar mais em
choque do que eu mesma.
— Talvez eu queira comer você.
36

laus arqueou as sobrancelhas diante da minha frase, como se não acreditasse que a mesma
K houvesse vindo de minha parte. Eu mesma estava surpresa com meu próprio atrevimento,
mas as labaredas que meu corpo mergulhou estavam incontroláveis e eu precisava de que
Klaus aliviasse tanto calor.
— Melina... Você está bem? — ele balbuciou, por fim, e me senti tão envergonhada pela
ousadia que tirei a mão rapidamente, e tentei fingir que não havia dito nada.
Não adiantou. Klaus simplesmente deu um salto na cama, ficando sobre mim. Eu sorri
enquanto ele se enfiava entre minhas pernas, como se ali fosse seu lugar preferido, buscava
minha boca e me beijava como se meus lábios fossem exatamente o que ele precisava para viver.
— Você está ficando uma safada, Melina... Acho que isso é minha culpa — ele sorriu,
sua respiração batendo nos meus dentes. — Imagine você falar assim comigo antes, quando era
uma Fiorin... Ah, mas agora como Lazio você sabe que me tem nas mãos, não sabe?
Ele lambeu meus lábios de novo, mordendo o inferior e chupei-o de volta, porque era o
que eu queria fazer. Com Klaus, eu nunca precisava fingir, ele recebia minhas reações instintivas
como se elas simplesmente fizessem parte de nós.
— Melina... — sua testa bateu na minha, e nossos olhares se encontraram. — Como vou
ficar um único dia longe de você?
— Por que precisa viajar? Mande um de seus homens.
— Tirando Matteo, não posso confiar em nenhum deles, meu amor — meu coração
saltou no peito diante da forma como ele me chamou. Era a primeira vez que Klaus me chamava
assim. Eu senti que ele também ficou chocado pela frase, e quase se afastou, mas eu me agarrei
nele como uma desesperada, e por fim meu marido ficou em meus braços. — A casa está cheia
de guardas, e Giulia sabe atirar. Ela cuidará de você.
— Eu não temo por mim, Klaus... Quando sai de casa... eu temo que não volte. Tenho
medo que lhe matem...
— Melina, eu faria qualquer coisa por uma vida calma e tranquila. Mas, eu não posso...
Um dia você vai entender...
Eu o abracei, trazendo-o para mim novamente, meu calor foi se dissipando em ondas
extremas de puro carinho. Nossos beijos ficaram mais pacíficos, e eu sentia que tanto eu quanto
Klaus queríamos consolar um ao outro pela vida infeliz que foi imposta a nós.
— Klaus!
Era Giulia. Ela bateu na porta duas vezes. Aguardou. E então bateu de novo. Eu senti que
Klaus ficou zangado por isso, senti que ele queria continuar o que estávamos fazendo, e ele
quase gritou para que ela fosse embora, quando a voz de Giulia retornou do outro lado da porta.
— O médico está aqui — ela disse.
Isso fez com que Klaus saísse de cima de mim, e fosse até a porta. Eu me ajeitei o melhor
que pude enquanto a figura de Giulia e de um jovem médico surgia.
— Você é a maior empata-foda que eu já vi na vida — Klaus resmungou para ela, que
sorriu como se aquilo não a incomodasse nenhum pouco.
— Não gostou? Dorme que passa — ela rebateu, caminhando até mim. — Melina passou
mal e eu acredito que saber o que está se passando com ela é mais importante que aliviar seus
instintos masculinos.
Eu sorri para Giulia, como se transmitisse que agora estava tudo bem, mas ela nem fez
menção de se afastar. Ao contrário, parecia disposta a permanecer por perto, insistindo que o
médico me examinasse.
— Boa noite, senhora Lazio — o jovem médico cruzou por Klaus e se aproximou de
mim. — Eu sou Antony Colombo. Pode me chamar como Dr. Colombo, igual o descobridor —
ele brincou. — Giulia me disse que você não passou muito bem.
— Eu me sinto bem agora — insisti ao médico simpático.
— Ela ficou pálida e depois amarela — Giulia apontou.
— Não acho que tenha nada de errado comigo. Eu não sinto nada diferente — apontei. —
Apenas, eu vi algo que não queria ter visto — expliquei, mais uma vez, a imagem de Klaus e
Melissa juntos me deu ânsia de vômito.
— Olha só! — Giulia apontou para mim, e eu apenas me deitei para trás, nos
travesseiros, tentando conter essa sensação desagradável. — Ela é sensível, doutor — a morena
insistia. — Tem uma natureza frágil como Emma, mas isso é demais.
Abri meus olhos, e vi Klaus ao lado de Giulia, tão pálido quanto eu imaginava estar. Ele
parecia extremamente preocupado, mas sua preocupação se tornou animação assim que Giulia
completou:
— Eu acho que ela está grávida.
Eu fiquei chocada. Francamente, eu não me sentia grávida. Não havia nada de diferente
comigo.
— Você acha? — Klaus indagou a ela.
— Vocês são como dois coelhos.
— Mas, grávida... eu nem me esforcei muito...
— Nem se esforçou? Você mal consegue se conter diante das outras pessoas.
Comecei a ficar zonza de novo com eles debatendo minha vida dessa forma. O médico
percebeu e imediatamente começou a me examinar. Primeiro meus olhos, depois tateando na
minha barriga.
— Vou tirar uma amostra de sangue e uma de urina, ok?
Acenei em concordância, porque não havia realmente nada que eu pudesse fazer. Uma
parte de mim não queria estar grávida sem ter a certeza dos sentimentos de meu marido, sem ter
dele a confiança completa que me faria ser digna de seus segredos. Outra, estava animada e feliz
pela possibilidade de ter um bebê.
Algo meu... Uma pessoinha minha, depois de toda vida de dor e sofrimento.
O médico pegou uma seringa em seguida, e começou a tirar sangue. Meu líquido foi
parar em um tubo de ensaio, antes de ir para uma bolsa fechada e térmica. Logo em seguida, ele
me deu um potinho, pedindo que eu urinasse nele.
— O exame de urina nos dará uma resposta mais rápida, mas a confirmação virá no
exame de sangue — Dr. Colombo explicou para Klaus, que assentiu.
Fui para o banheiro. Dr. Colombo entrou no banheiro pouco depois, pegando meu pote e
começando a fazer seus testes. Eu não quis ver o resultado, esperando pelas notícias no quarto.
Sentei-me na cama, e Giulia logo sentou-se ao meu lado.
— Você não está sozinha. Emma e eu vamos te ajudar em tudo — ela disse, segurando
minhas mãos.
— Eu também estou aqui — Klaus apontou para si mesmo.
— Homens são a coisa mais inútil do universo, se tratando de bebês — ela deu de
ombros, e ele ficou furioso.
— O bebê nem existiria se não fosse por mim! — ele esbravejou.
— Sim, é muito difícil fazer um filho. Parabéns pelo seu esforço. Só se lembre-se de que
seu pai fez um monte, e nem por isso foi um pai.
Eu não entendia por que eles estavam brigando. Comecei a ficar ansiosa e nervosa,
conforme o tempo começou a demorar. Repentinamente, Dr. Colombo saiu do banheiro.
— Ah, bom — ele apertou as mãos, nervoso.
Eu soube que a notícia era ruim porque o mensageiro sempre temia dá-la ao rei.
— Negativo — apontou. — Mas, ainda precisamos da confirmação no exame de sangue.
Vou providenciar hoje mesmo. Assim que eu tiver os resultados, lhe avisarei.
— Não tem pressa — a mandíbula de Klaus apertou, como se ele estivesse abatido e
derrotado pelo resultado.
Eu me senti tão triste por algo que nem aconteceu, como se tivesse decepcionado meu
marido. A mão de Giulia apertou a minha, como se ela entendesse. Eu me casei com Klaus para
lhe dar filhos, e já se passou semanas e eu ainda não havia engravidado.
— Às vezes os bebês demoram, Sr. Lazio. Podemos aumentar as possibilidades com
hormônios e...
— Não. Será quando Deus quiser que seja — Klaus recusou. — Mandarei rezar uma
missa para São Geraldo, para que nos abençoe com uma gestação. Mas, o momento será da
vontade de Deus.
Às vezes as coisas aqui nessa casa eram tão frias, que eu quase esqueci que a Tirreno
tinha raízes profundas na Igreja Romana.
— Vou pedir para que um dos homens o leve para casa, Dr. Colombo. Obrigado por ter
vindo nessa noite.
O médico saiu. Logo em seguida, Giulia também nos deixou a sós. Meu marido foi até
um dos armários e começou a arrumar roupas em uma mala. Ele não disse nada, eu tampouco
tive coragem de falar sobre como ele parecia decepcionado.
— Quanto tempo ficará fora? — indaguei.
— Ainda não sei. Mas, quando voltar, juro que passarei semanas enchendo sua barriga
com meu filho, Melina — ele me deu uma piscadela, que fez com que meu coração aliviasse o
peso da culpa.
Klaus era um bom homem. Apesar desse casamento forçado, apesar de eu não saber a
verdade sobre Giulia e Emma, apesar de ele parecer derrotado depois de receber o resultado do
teste, a maneira como ele se aproximou de mim e beijou minha têmpora, me fez perceber que ele
respeitava meu tempo.
Meu coração balançou diante disso.
Uma parte de mim entendia que esse Klaus respeitador estava fazendo com que eu o
amasse. E amor não fazia parte desse casamento.
37

s coisas estão se complicando. Eu posso sentir no ar que cada passo que dou sou atacado
A por inúmeros lados. O cheiro de pólvora corrompe minha mente. Encosto a cabeça em um
dos vagões de transporte, enquanto recupero a calma.
Matteo está carregando novamente sua arma. Eu nem sei quantos tiros ele já deu contra o
grupo que está tentando nos roubar, e essa é a segunda vez que ele precisa repor a munição. Eu
sou mais metódico, não atiro ao léu, só disparo quando tenho certeza de que vou matar. Assim,
só dei três tiros aqui, e os três derrubaram adversários.
— Você não parece concentrado — Matteo ralha, o que me faz sorrir apesar de estar em
uma guerra.
— Concentrado? Se a gente sobreviver essa noite, vou levar Melina para uma lua de mel.
Não demorada, apenas alguns dias longe de tudo...
— É sério que está pensando na sua esposa enquanto estão atirando na gente?
Um dos homens de Matteo saiu de trás de um dos contêineres. Estamos em uma área de
carregamento do porto. Mais uma vez, meus homens estavam protegendo uma carga valiosa de
armas e, mais uma vez, foram atacados. Só que agora, Matteo e eu havíamos organizado uma
armadilha, e esperamos por eles.
Quando um grupo de cerca de vinte homens chegou naquela noite, já estávamos dentro
de um dos galpões, e o recebemos à bala. Apesar de saber que devíamos matar todos, avisei para
deixar dois ou três vivos, pois eu precisava de nomes, talvez até comprasse a lealdade de
qualquer um deles.
Sem uma prova de traição, eu não podia atacar os mais velhos da Tirreno.
Ser frio e calculista não era algo fácil, especialmente porque sabia que a velha guarda
havia corrompido pessoas de dentro da minha casa. Meu coração estava pesado de preocupação,
especialmente com as mulheres.
Eu não podia falhar. Especialmente porque ninguém escapa da máfia. Não era como se eu
pudesse pegar Melina, Giulia e Emma e abandonar a Tirreno. Elas e eu seríamos mortos porque
sabíamos demais. A única forma de eu proteger as garotas era continuar a ser o líder. E para ser o
líder, não podia haver falhas.
A velha guarda queria que eu fosse morto. Não me achavam digno de ser o Capo. Mas, os
faria provar do próprio veneno assim que tivesse provas e um nome.
O homem de Matteo avançou em direção aos carros. Eram três veículos pretos. Os caras
estavam bem armados, e era possível ver apenas quando a escuridão era atingida por raios claros
cada vez que uma das armas disparava.
— É agora! — Matteo diz, num dos intervalos dos disparos.
Seu grupo avança e eu vou atrás. Corremos entre os vagões de ferro, os usando como
escudo. O som dos disparos se tornou mais alto conforme avançamos. E então eu puxo minha
AK47 que está pendurada no meu ombro, e deixo que o automático faça o serviço.
Eu sei que serei vitorioso nessa noite. Nunca perco uma guerra.

✽ ✽ ✽

— Eu nunca vou falar — o homem murmura, o sangue escorrendo pela sua boca.
Eu avanço e lhe dou outro chute nos lábios. Um dos dentes claros dele cai no chão,
enquanto ele geme de dor. Atrás de mim, Matteo e seus homens arrastam os corpos dos demais
membros dos ladrões. O único que sobreviveu estava sendo torturado por mim há mais de
quarenta minutos, e ainda assim se recusava a dizer qualquer coisa.
— Para que tanta lealdade? — reclamei.
— Você não merece ser o Capo. Seu pai nunca mereceu ser o Capo — ele disse, o que
me fez perceber que a raiva incontida desse homem era mais que ambição ou lealdade a outro
líder.
— Nisso você tem razão — murmurei.
Meu pai era um cretino. Mas, um cretino com muitos apoiadores. Especialmente em
Roma. Quando você mantêm a Tirreno com mãos de ferro e gerando riqueza, você consegue a
fidelidade de gente que nem imagina. Especialmente no Vaticano.
Meu pai manteve o poder matando opositores. Uma parte de mim dizia que esse seria
meu próprio destino. Eu teria que matar aqueles que estavam tentando me derrubar. Mas, jovem
e ainda sem mostrar meu próprio serviço gerando lucros para a Tirreno, muitos não acreditavam
que eu era capaz.
E fato de três de primeiros carregamentos de armas que enviava de navio terem sofrido
um confisco da polícia e tentativa de roubo, mostra que ninguém me tem respeito.
Terei que conquistar o respeito. E a Tirreno só entendia isso na base da morte.
Irritado, puxei a 9 milímetros da cintura e apertei o gatilho. O sangue do homem diante
de mim jorrou enquanto sua cabeça explodia para trás, traços quentes de seu líquido vermelho
espalhando-se por toda parte.
Puxei um lenço do bolso do casaco, para limpar o sangue que respingou sobre meu rosto.
Matteo apareceu ao meu lado nesse momento.
— Devia ter insistido na confissão. Você precisa de um nome.
— Eu tenho um nome. É o Fiorin, eu já sei. Preciso é que Marco me dê a prova cabal.
Mas, estou começando a me cansar de esperar. Ainda posso agir nas sombras, como ele está
fazendo, e matá-lo sem assumir que o fiz. Se destruir o chefe do grupo, vou desencorajar
qualquer traição.
Matteo concordou. Eu sabia que ele me seguiria até o inferno. Era hora de jogar o jogo da
velha guarda, e fazê-los entender que eu não era um garotinho assustado. Eu era um homem
pronto a defender minha família.
38

cordo com um sobressalto, sentindo um calafrio na espinha. Um suor gelado me faz sentir
A frio, apesar de estar com duas cobertas sobre meu corpo. Sento-me na cama, um ar
estranho tomar conta do ambiente.
Penso em meu marido. Ele está bem?
Klaus tem uma vida perigosa e eu sempre sinto sobressaltos quando ele não está por
perto. Temo por sua vida, essa é a pior parte de ser a esposa de um Capo.
Olho para o relógio e vejo que são três da manhã. Não consigo voltar a dormir, então
decido levantar e tomar um copo de água. Caminho em passos vagarosos até a moringa,
percebendo que ela está vazia.
Não gosto de sair do quarto à noite, pois ainda não sinto essa casa como minha casa.
Talvez seja porque há muitos seguranças andando de lá para cá o tempo todo. Não é um
ambiente que sinta minha intimidade respeitada. Não é culpa dos guardas. É apenas uma questão
de costume.
Abro a porta. O corredor está escuro. A casa está estranhamente silenciosa, apesar do
horário, é um lugar cheio de gente, e o fato de não haver guardas no corredor faz meu coração
bater rápido. Talvez eu devesse ficar no quarto, mas sinto que é ridículo temer os corredores
vazios como se eu fosse uma criança.
Meus passos vagarosos me fazem rumar até a cozinha. Enquanto me sirvo de um copo de
água, observo a área externa pela janela atrás da pia. Mais uma vez, só há silêncio, exceto pelo
som do vento que bate na janela.
Há algo errado, eu posso sentir.
Nunca andei pelos corredores de madrugada, mas sempre ouvi passos vindos do corredor.
Então sabia que sempre há seguranças andando pela casa. Porém, exatamente nessa noite,
quando meu marido está fora de casa, não há nenhum.
Termino de beber a água, e levo o copo para a torneira, a fim de enchê-lo novamente.
Nesse momento, olho de novo para o quintal mal iluminado.
Por que os homens não estão em seus postos?
Repentinamente, solto o copo, rumando na direção contrária. Preciso ir até um dos
quartos, buscar por Giulia. Ela saberia o que dizer, o que fazer. Estou com pressa, então não
tento ser silenciosa. Dessa vez meus passos são pesados, e eu corro pelos corredores, travando
apenas quando me aproximo da porta do escritório de Klaus.
Sinto um arrepio de medo cruzando pela minha espinha. Lentamente, me aproximo da
porta aberta. Há uma sombra atrás da mesa, e é com dificuldade que eu a reconheço.
Uma lâmpada está acesa, mas não na mesa, e sim na parede atrás da figura. Isso torna sua
anatomia quase fantasmagórica. Seus ombros são largos, seu corpo é grande, seu cabelo escuro
cai por cima dos seus olhos, enquanto ele busca por algo nos papeis.
Então, o homem levanta os olhos e me encara. Um breve momento transpassa por nós,
como se o tempo houvesse parado. O que quebra esse momento é a forma como ele enrijece os
ombros e se prepara para correr até mim.
Não sei o que ele fará para me calar. Mas, pelo olhar que ele me dá, sei que não vou
sobreviver a essa noite.
Eu grito por socorro, mas aparentemente ninguém me ouve. Seus passos soam como um
estrondo, e eu giro na direção dos quartos enquanto a figura me persegue. Outro grito explode na
minha garganta quando ele me agarra pelo pescoço e me joga no chão. Eu sinto sua respiração
quente no meu ouvido. Eu tento me soltar, mas ele é mais forte do que eu.
— Cale a boca! — Sua voz é um sussurro como se tentasse se conter. — Cale a boca!
Não é uma chantagem para que eu me cale e ele me deixasse ir. Suas mãos agarram
minha garganta e ele aperta. Eu começo a lutar contra, enquanto o sinto se remexer entre minhas
pernas. Só tive um outro homem ali, meu marido, mas reconhecia seu intento.
Ele iria se aliviar em mim antes de me matar. Já não tinha mais nada a perder. A
melancolia me toma enquanto começo a sentir minhas costelas doerem e o ar faltante fazer
minhas vistas escurecerem.
Preciso respirar e não consigo. A pior sensação que já experimentei na vida.
Pensei em Klaus e no pouco tempo que tive ao seu lado. O que ele sentiria em saber que a
esposa foi morta asfixiada e depois violada debaixo de seu teto? Senti vontade de chorar por ele.
Desde que eu o conheci, meu marido se esforçou para que eu não gostasse dele e não visse seu
lado generoso, como se isso pudesse me proteger de todo mal que ele simbolizava.
Mas, o pouco que eu vi, o pouco que ele me permitiu ver, se mostrava um homem
decente, que cuidava de Emma e Giulia com todo amor, e que se esforçava para me dar uma vida
honrada. Klaus era um paradoxo que eu queria conhecer melhor antes de partir.
Olhei para o homem acima de mim. Suas narinas dilataram e ele pressionou seu pau entre
minhas pernas. Eu tentei lutar a última vez, mas a falta de oxigênio roubou minhas forças. E
então me entreguei a desesperança, como alguém que sabe que não pode vencer essa última
batalha.
Todavia, um som ecoou acima de mim. Não qualquer som, e sim uma explosão que logo
se tornou líquido quente que me cobriu. A mão na minha garganta aliviou e eu pude respirar.
Conforme ia recobrando a consciência, percebi que o homem caiu para o lado. Minhas
mãos tatearam na escuridão, e pela fraca luz da lua que entrava por uma janela no corredor, eu
pude vislumbrar o homem com a cabeça estourada.
Eu nunca havia visto isso, então gritei de pânico. Não havia mais um crânio completo, e
sim pedaços de carne acima do pescoço. Olhei na direção contrária, algo me fazendo acreditar
que veria Klaus ali, como um príncipe encantado que me salvaria de todo mal.
Mas, minha história não era de fadas, e Giulia deixava claro que nenhuma mulher
precisava de um homem para salvar outra.
Era ela que se erigia na escuridão. A fumaça exalava de uma arma grande, de quase
metade de seu tamanho. Por Deus, ela parecia uma deusa vingadora, de camisola branca e
cabelos negros contrastando com sua pele pálida. Uma parte de mim reconheceu Klaus nela,
nesse momento.
Emma estava atrás de Giulia. Os olhos arregalados e a mão na boca, como se não
acreditasse que isso estivesse acontecendo.
— Quem é ele? — a loira indagou, por fim, sem conseguir identificar a figura masculina
naquele amontoado de carne.
— É nosso irmão — Giulia respirou, suspirando, decepcionada e triste. — Nosso outro
irmão, Carlo.
39

inha garganta ardia, e eu mal consegui engolir o chá de camomila que Emma me trouxe.
M Sentada no sofá da enorme mansão, sentia a respiração lenta de Emma ao meu lado,
como se ela temesse dizer qualquer coisa.
A loira tinha uma arma no colo. Um pequeno revólver que nos salvaria, caso mais
alguém tentasse nos atacar nessa noite. Éramos três mulheres na escuridão da mansão, nenhum
guarda ou empregado por perto, e ainda assim, era como se estivéssemos cercados por muitos
inimigos.
Repentinamente, as luzes se acendem. Eu dou um sobressalto, para só então perceber que
era Giulia que acendia as lâmpadas, iluminando a sala. Ela parecia completamente tranquila e
isso me acalmou.
— Não tem ninguém na casa. Eu já avisei Klaus, e ele vai mandar os seguranças
voltarem. Aparentemente, Carlo dispensou a todos. Ele também está voltando, vai pegar um voo
daqui alguns minutos. Em uma ou duas horas, estará em casa.
— Como Carlo pode ter feito isso? — Emma murmurou, e eu vi lágrimas em seus olhos.
— Eu achei uma Glock automática no porão— Giulia desconversou, erguendo uma arma
para nós. — Francamente, os lança-foguetes são muito pesados e estou com os ombros doendo.
Emma e eu nos encaramos, chocados a total falta de tremor na voz de Giulia. Ela havia
acabado de estourar a cabeça de um homem e parecia que não sentia absolutamente nada.
— Entendi direito... Você matou seu irmão? — indaguei com dificuldade. Até mesmo
engolir a saliva fazia minha garganta doer.
— Para salvar você — Giulia justificou, dando os ombros. — Você é minha irmã
também.
Eu sorri, agradecida. Ainda assim, insisti.
— Eu não sabia que ele era irmão de vocês duas.
— Meio-irmão. Nosso pai era um filho da puta — ela apontou. — E pelo jeito Carlo era
como ele, já que estava tentando se forçar em você. Não admito que nenhum homem faça isso a
uma mulher. Especialmente, pelo histórico de minha Emma — ela comentou, encarando a loira.
— Se Carlo tivesse qualquer dignidade, teria a mesma posição.
Podia ver como elas se amavam. Não era acostumada a esse tipo de relação sem
rivalidade entre irmãs. Melissa nunca gostou de mim. Então, era quase como assistir algo irreal.
— Klaus sabia que Carlo era meio irmão de vocês?
Giulia negou. Pela primeira vez, ela parecia um pouco culpada da situação. A mão de
Emma continuava firme na minha, e houve um breve aperto, diante do nome de Klaus na
conversa.
— Nós descobrimos a pouco tempo, algumas semanas antes do seu casamento — Emma
explicou. — Carlo nos ouviu falando sobre sermos irmãs, sobre nossa origem, e veio conversar
conosco. Então ele explicou nossa ligação, e disse que nos protegeria. Eu acreditei nele.
— Ele nos teria vendido na primeira oportunidade — Giulia pareceu mais incrédula. — É
claro que eu não acreditei nele, e queria falar disso a Klaus, mas não sabia como trazer o assunto
à tona. Além disso, o fato de ele ter nos ouvido indicava que ele estava espionando. Mas, acusar
sem provas... Eu precisava de uma prova. Não pensei que a prova viria às custas de Melina.
Desculpe, eu devia ter agido antes — ela me encarou.
— Você não tem culpa, Giulia...
— Eu devia cuidar da casa e ser a líder dos seguranças, mas Klaus me acha incapaz —
ela balbuciou, nervosa. — Quero ver a cara dele quando descobrir que fui que salvei a sua esposa
amada do guarda que ele confiava.
Esposa amada...?
— Giulia... O que você e Emma são para Klaus? Por que ele as protege e as tem em casa?
— Ainda não está claro? — Giulia deu de ombros. — Isso é algo que seu marido precisa
explicar. Me perdoe, Melina... Eu teria dito a você no dia que se casou com Klaus, mas não
posso. Por mais que eu seja atrevida, ainda sou leal ao meu...
A voz dela interrompeu. Meu o quê?
— Klaus é nosso líder. Ele sabe o momento certo. Espero que ele diga a você. Mas, a
decisão é dele.

✽ ✽ ✽

Os sons de passos ecoaram pelo rol de entrada. Eu ergui minha face, vendo meu marido
surgir na sala. Meus olhos se encheram de lágrimas porque vê-lo parecia acalmar toda
tempestade em meu íntimo.
O olhar de Klaus se fixou em mim. Ele caminhou na minha direção, ajoelhando-se aos
meus pés. Eu podia ver como ele estava preocupado pela forma como suas mãos me tatearam,
como se tentassem descobrir se eu estava machucada. Mas, eu estava bem, graças a Giulia. O
que doía não era mais minha garganta, e sim as dúvidas que me corroíam nesse casamento.
— Você está bem? — ele perguntou.
Quando ele falava assim comigo, nem parecia o líder de uma máfia cruel. Era só um
homem diante de sua mulher.
— Sim... — murmurei. — Giulia me salvou.
Ele assentiu, volvendo-se para a morena que estava do outro lado da sala. Não levou nem
cinco segundos para voltar a ficar de pé e ir até ela. Quando Klaus a puxou para um abraço, eu
precisei desviar meus olhos.
— Giulia... eu nunca poderei agradecê-la.
Emma voltou da cozinha nesse momento. Ela caminhou até eles, e o abraço do par se
tornou um abraço do trio. Pela primeira, observei o momento sem a máscara de ciúme, e pude
entender algo que, até então, não havia ficado claro para mim.
Não havia malícia ali. Não havia qualquer sinal de sexualidade. Era diferente quando ele
me tocava.
— Klaus — chamei sua atenção, e ele volveu o rosto para mim, largando as duas garotas.
— Eu quero que me explique a verdade.
— A verdade...? — ele balbuciou, parecendo mastigar meu pedido com apreensão.
Entendia que, falar para mim, simbolizava confiar em mim. Sendo assim, quando ele
caminhou de volta na minha direção, estendendo as mãos, as segurei firme, acreditando
totalmente em suas boas intenções. Era um salto no escuro para ambos.
— Vamos para nosso quarto, esposa. Temos muito o que conversar.
40

quarto estava exatamente do jeito que o deixei quando saí de lá. O sol raspava na janela,
O anunciando a chegada de um novo dia. Quando cruzamos pelo corredor, o corpo de Carlo
não estava mais no lugar, acreditei que Giulia havia se livrado dos pedaços.
Ela era uma surpresa. Uma mulher tão bela e tão fria ao mesmo tempo. E, ainda assim, eu
gostava imensamente dela, e agora nutria por Giulia um sentimento além da simpatia. Era
gratidão.
Todavia, por mais que o corpo houvesse desaparecido, o sangue ainda estava lá. Klaus
havia observado a poça por algum tempo, antes de me seguir ao quarto. Havia sido uma longa
noite, eu estava cansada e imaginava que ele também. Ainda assim, precisávamos falar.
Eu queria saber tudo. Nosso futuro, o futuro de nosso casamento, dependia do quanto ele
confiaria em mim.
— Klaus — chamei sua atenção quando entramos no quarto e ele pareceu perdido em
pensamentos por algum tempo.
— Eu pedi para seu primo Marco investigar seu pai — me contou, e isso não me
surpreendeu. — No dia do nosso casamento, fiz um acordo com Marco, que o faria assumir o
papel de seu pai se ele conseguisse provas de que Toni Fiorin estava desfalcando a Tirreno.
Marco nunca conseguiu uma prova, e Matteo e eu acreditávamos que era por Toni estar
escondendo rastros. Mas, não sabíamos como ele havia descoberto dos meus planos com
Marco...
Eu me sentei na cama. Klaus permaneceu em pé, a réstia de luz da manhã brilhando em
seus cabelos pretos.
— Somente Giulia, Emma e eu estávamos presentes quando falamos com Marco. Ou, ao
menos, era isso que eu me lembrava. Contudo, quando Giulia me ligou e falou sobre Carlo, me
lembrei que Carlo também estava no quarto, naquela noite. Ele sempre foi tão... discreto... sua
presença era quase de um fantasma.
— Carlo era irmão de Giulia e Emma — eu contei a ele.
E aguardei a surpresa.
E ela veio tão logo terminei de falar. Seus olhos arregalaram, e ele pareceu perder o
equilíbrio por um breve segundo.
— Claro que era — apontou. — Como eu não vi isso antes? Meu pai... ele trouxe Carlo
para casa porque era homem e serviria ao propósito. Ele sempre considerou os homens
superiores as mulheres.
— Seu pai? Do que está falando?
O monstro que aterrorizava meus pensamentos relacionados a relação dele e das meninas
pareceu diminuir conforme eu ia entendendo a implicação de tudo.
— Giulia e Emma também são suas irmãs?
— E Carlo também era... Eu nunca soube dele — murmurou. — Na noite que Giulia,
Emma e você saíram para jantar, eu fui impedir um assalto as nossas mercadorias. O assaltante
disse que um homem de cabelos pretos e pele branca os contratou. Eu pensei... — ele emudeceu
uns segundos. — Eu não podia imaginar ser Carlo...
Klaus se sentou ao meu lado na cama. Sua mão segurou a minha, enquanto ele parecia
buscar lembranças que machucavam.
— Meu pai era um canalha. Eu era seu filho legítimo, seu filho de casamento, mas ele
teve muitas amantes. Ele saía com muitas mulheres, e teve alguns filhos espalhados por aí.
Quando nasciam homens, ele os trazia para a Tirreno, tornava-os seguranças, ou lhes dava cargo
na Itália ou em outro lugar. Meu pai valorizava muitos os filhos homens, mesmo os bastardos.
Mas, houve duas vezes que nasceram mulheres. A primeira foi de uma modelo irlandesa, que o
procurou ainda na gestação. Papai lhe disse que cuidaria do bebê. Quando nasceu uma menina,
ele mandou a mulher se livrar da criança. Era a mãe de Giulia. Ela era decente, e abandonou a
carreira de modelo e começou a trabalhar num bar para cuidar da filha. Mamãe soube dela
quando a menina tinha dez anos, e mandou um dinheiro para ajudá-la, sem sabermos que a mãe
de Giulia tinha câncer. Ela morreu quando Giulia tinha quinze anos, e eu a busquei e a trouxe
para mim desde então. Papai não sabia que Giulia era sua filha até pouco antes de sua morte.
Acreditava que era uma amante, e até lhe ofereceu uma pequena fortuna para ela me abandonar e
passar a “cuidar dele”.
Eu fiquei chocada.
— E Emma?
— A segunda mulher veio até ele pedindo dinheiro para um aborto. Papai disse que era
pecado, que a Santa Igreja condenava, e falou a mulher que compraria a criança. Diante do
dinheiro fácil, a mãe de Emma manteve a gestação e quando nasceu uma menina, papai voltou
atrás e disse que não a queria mais. Deu algum valor para a mãe de Emma, e disse o mesmo que
disse a mãe de Giulia: se livre da criança. Acho que, na cabeça dele, acreditou que a mulher
levaria Emma para um orfanato ou coisa assim...
— Mas, não foi o que aconteceu...
— Ela a levou para um bordel. Vendeu Emma ainda bebê, e depois desapareceu. Emma
foi criada dentro de um prostíbulo, e aos doze foi leiloada — ele fechou os olhos, seu sangue
deixou seu rosto rubro de ódio. — Mamãe sabia dela, tentou achá-la em orfanatos, mas não havia
nenhuma entrada de criança naqueles meses nos abrigos da cidade. Anos depois, uma das
amantes de papai me contou o que soube, que se espalhava a notícia que Emma era usada como
uma bonequinha de luxo. Na época havia boatos de que eles costurariam sua boca para que ela
não gritasse... Quando soube, eu fiquei louco... Eu fiquei louco... — ele repetiu, e eu precisei
apertá-lo nos braços para aliviar tanto desespero. — A encontrei meses depois. Foi numa noite,
Matteo e eu soubemos que ela estava sendo levada para Dubai, eles iriam... iriam defecar na boca
dela... — Eu não aguentei as lágrimas e chorei diante da história. Tudo que eu sabia, tudo que
Giulia me disse, ainda não era o pior. — Matteo e eu os encontramos quando estavam
preparando o estupro. Matamos todos. Eram velhos... eram homens que tinham idade para serem
avôs dela...
— Klaus...
— Foi a primeira vez que eu matei alguém. Foi com gosto. Eu me senti tão bem e
poderoso, e eu queria voltar lá só para repetir isso, só para matá-los de novo. Eu devia tê-los
torturado mais, eu devia... eu me arrependo de ter feito tudo acabar em uma noite.
Klaus olhou para mim, como se esperasse medo ou rejeição. Mas, tudo que havia em
mim era um sentimento enorme por ele. Amor, talvez. Eu nem sabia direito o que significava,
mas eu sabia que o amava.
— Você é o melhor homem que eu já conheci...
— Eu só te fiz sofrer — ele apontou.
— Você protegeu suas irmãs. Eu entendo agora... Se souberem que elas são filhas de
Giacomo, vão matar você e se casar com elas para tentar assumir a Tirreno através de ligação de
sangue.
— Até conhecer você, eu não me importava de morrer. O que me segurava, era saber o
destino horrível que as reservava, um casamento como o de minha mãe, sendo usadas pelos
homens como uma barriga fácil, sem direito a opinião ou a respeito. Giulia aguentaria, é forte
como a mãe dela era, mas Emma... Isso acabaria com o resto de sua sanidade. Ela tem tantos
traumas, ela tem ataques seguidos, ela toma antidepressivos, e...
— Klaus, você me magoava de propósito para que eu não me apaixonasse, não é? —
apontei. — Por quê?
— Minha mãe amou meu pai — ele disse, os ombros caindo, como se estivesse
confessando o pior dos pecados. — Ela nunca falou, mas eu sei. Isso a destruiu. Ela morreu de
tristeza e decepção. Você nem imagina o que é isso... Nem imagina o que é ver a pessoa mais
importante da sua vida definhando diante dos seus olhos.
— E seu pai?
— Ele era cretino... Ele nem estava presente quando ela morreu. Havia levado uma das
amantes para uma viagem de aniversário. Ele só voltou para o velório de mamãe.
Podia ver o tanto de tristeza o tomava. Descrença. Temor. Preocupação.
Suas dúvidas pareciam levá-lo a um lugar triste e profundo, de onde Klaus não podia
escapar.
— Você não é seu pai... E eu não posso me impedir de te amar, Klaus — expliquei. —
Porque o que você é... Você é bom, é protetor... Lembro-me da primeira vez que te vi abraçando
Emma, o cuidado e amor que você demonstrou com ela. Eu fiquei corroída de ciúmes. Mas, não
dela. E sim do que ela estava recebendo. Eu também queria seu abraço, e seus cuidados. Não
consigo mais fingir que não o quero, Klaus. Eu te amo...
Ele me encarou como se não acreditasse em minhas palavras. Eu quis repeti-las, mas
então Klaus segurou meu rosto como se precisasse simplesmente afundar em meu olhar. Seus
lábios caíram nos meus em seguida, levando-me a certeza de que ele nutria a mesma coisa,
mesmo que não dissesse.
Eu estava feliz. Klaus e eu éramos um só.

✽ ✽ ✽

— Eu cuidarei delas com a minha vida — Matteo disse a ele, e eu percebi Klaus segurar
um sorriso de gratidão.
— Lembre-se de cuidar delas como se fosse eu. Se engraçar-se para cima de uma de
minhas irmãs, eu te mato — ameaçou.
— Eu te amo também, cara — Matteo assentiu, e eu precisei segurar um riso.
— Eu não disse que eu te amo.
— Pare, cara... Olhe sua esposa aí... Essa coisa de macho ficar se confessando para
macho pega mal — Matteo me deu uma piscadela e eu precisei conter o riso.
— Vai ser só um final de semana. Melina precisa ficar longe da casa até...
— Klaus, você não precisa se justificar.
— Talvez eu deva levar Emma junto — ele murmurou tão baixo, mas eu fui capaz de
ouvir.
— Klaus, suas irmãs vão ficar bem. Confie em mim. E relaxe. Tenha um final de semana
com sua esposa. Vou cuidar de tudo. Tenho uma reunião com Marco Fiorin hoje, e ele tem
novidades. Qualquer coisa, eu te ligo avisando. Agora, apenas aproveite Melina, aproveite a
praia, e esqueça San Giovanni. Você precisa dessa folga antes da verdadeira guerra começar.
Eu me arrepiei com a frase. Mas, entendia o simbolismo das palavras. Simplesmente
volvi para as duas mulheres que estavam perto da escada, esperando para nos despedir. Eu
abracei Emma e Giulia, antes de voltar para o carro e entrar.
Logo Klaus sentou-se ao meu lado. Ele olhou mais uma vez para as três figuras perto da
escada, e eu vi como estava apreensivo.
— Talvez não queira ir — disse a ele.
— Eu quero ir. E você precisa ir. Não dorme a dois dias, Melina. E sei que Matteo
cuidará das mulheres — ele as denominou assim porque havia um motorista no carro e Klaus não
queria ser ouvido. Me pergunto se algum dia a verdade viria à tona e as pessoas saberiam que ele
não era o marido desgraçado que todos imaginavam, que levava as amantes para a casa da
esposa. — Vamos descansar esses dois dias, e segunda estarei de volta, com muito trabalho me
esperando — murmurou.
Suspirei, me aconchegando em seu abraço. O lugar mais seguro de meu mundo. Eu iria
esquecer os problemas, e me concentrar em Klaus. Era só isso que me importava.
41

— S enhor Lazio — uma mulher bonita estava parada diante da porta larga, com um sorriso
delicado. — É um prazer recebê-lo em nosso resort.
Ela me encarou. Havia algum julgamento em seu olhar. Imaginei que pensava que eu era
mais uma de suas amantes, e isso me entristeceu um pouco, porque eu parecia apenas mais uma
figura apagada ao lado de um homem poderoso.
Uma parte de mim queria ser mais que isso, ter minha própria vida, além de viver para
Klaus. Não sei porque o julgamento dela me despertou esse sentimento, mas era algo que nutri
desde o instante que vi Giulia lutando por uma posição na Tirreno além da costumeira parte de
ser um adorno.
— Minha esposa — Klaus virou para mim, e nos apresentou. — Melina. — A forma
gentil com que ele disse meu nome me fez sorrir para Klaus. — Espero que o quarto seja digno
de recebê-la.
— É nossa melhor cabana — A mulher apontou, ainda sem me encarar diretamente. Sua
sobrancelha elevada continuou erigida, seu julgamento pareceu se tornar ainda mais intenso. Era
como se ela se perguntasse porque Klaus estava ao lado de uma mulher como eu, quando ele
tinha outras bem mais belas à sua disposição. — Sempre escolhemos o melhor para você.
Ela deu um passo e o tocou no braço de meu marido. Bem na minha frente. Eu escondi o
ciúme porque era ridículo ter esse sentimento depois de passar a vergonha de mantê-lo com
Emma e Giulia e entender totalmente errado a relação deles.
Klaus nunca havia me dito que eram amantes. Ele omitiu a verdade, mas nunca mentiu.
Então, se ele não me dissesse as coisas diretamente, me recusaria a ser levada por outras
emoções, carregada pela dúvida que nosso casamento ainda me provocava.
— Minha esposa é uma mulher difícil de impressionar — ele lhe deu uma piscadela. —
Então por isso quero o melhor para ela, porque, francamente, qualquer lugar ao lado de Melina
será perfeito para mim.
A resposta dele a fez tirar a mão de seu braço. Eu senti meu coração transbordando com a
maneira doce com que ele falou sobre mim, e uma parte de mim quis tanto que esse casamento
fosse de verdade, além do sexo ou da paixão. Eu queria amor, eu queria que ele me amasse. Eu já
havia confessado o que sentia para ele, mas Klaus nunca me deu uma resposta. Acho que meu
marido ainda temia ser como o pai, e me machucar.
Ele não via a diferença? Ele era o melhor irmão e com certeza seria o melhor
companheiro.
Nós a seguimos para dentro de um prédio. Era a recepção de um resort na praia.
Cruzamos pela área comum de hóspedes, e logo saímos na parte traseira, indo direto por uma
trilha que levava a uma fileira de choupanas, em uma praia privativa.
Cada choupana tinha seu próprio espaço, com cercas verdes altas, que davam aos seus
frequentadores a sensação de estarem isolados do mundo.
Era um lugar perfeito para uma lua de mel, apesar de saber que essa fuga de final de
semana não era exatamente a nossa. Emma me disse, no dia anterior, que Klaus planejava uma
viagem de um mês para o exterior. Ela me perguntou se havia algum lugar no mundo que eu
gostaria de conhecer, e eu citei a Tailândia porque, francamente, Bangkok era um sonho desde
que li um livro de Alex Garland trazido por Açucena. Naquela época, eu viajei para “A Praia”
sem sair do lugar.
Agora, pisando na areia fofa, me senti como Richard, com sua mochila nas costas,
conhecendo a vida natural e perfeita da criação divina.
Quando a mulher se afastou, entregando as chaves para Klaus, ele me observou
caminhando na areia. Sua boca me mostrou outro sorriso, e logo ele perguntou:
— Você gostou desse lugar?
— Sim... — respondi.
— No que está pensando?
— O som do mar parece música — disse, simplesmente.
Era a primeira vez que eu ouvia o mar, era a primeira vez que meus pés pisavam a areia.
Quase não dava para acreditar na sensação, mesmo em meus sonhos trancada em meu quarto,
nunca imaginei que a areia fazia cócegas embaixo do pé, e em como era fofa e pesada.
— Eu te amo, Klaus — eu repeti a confissão do dia que ele me disse a verdade. E
exatamente como naquele dia, Klaus não retornou minhas palavras com nada além de um sorriso.
— Eu vou guardar as malas. Fique aqui, aproveite um pouco o sol. Por sorte, está um
pouco quente hoje. Mas, não vá para o mar sem que eu esteja por perto. Sei que não sabe nadar.
— Como sabe? — indaguei.
— Não é difícil imaginar. Você passou a vida presa num quarto. Duvido que seu pai a
tenha mostrado como se virar na água.
Não era uma observação zombeteira. Ele só disse a verdade, e eu concordei. Então, logo
Klaus sumiu para dentro da choupana, e eu fiquei na areia. Até me aproximei do mar, mas não
cheguei a tocar na água. Simplesmente me sentei em um pequeno monte elevado e fiquei
observando as ondas batendo e retornando.
Como cântico antigo. A vida realmente era uma roda que girava e girava.
Nem sei quanto tempo fiquei aqui. Simplesmente parada, admirando o mar. Foi quando
senti a presença de mais alguém. Aflita, girei para trás, para dar de cara com meu marido, que
pareceu estranhar minha reação num primeiro momento.
— Eu sinto muito que Carlo tenha machucado você dentro de sua casa, Melina... Onde
devia se sentir segura.
— Você é minha casa — rebati. — Eu me sinto segura quando estou perto de você.
Ele sentou-se ao meu lado. Sua mão deslizou pela lateral do meu rosto, como se estivesse
me analisando e confortando ao mesmo tempo. Seus olhos pareciam tão pretos agora. Então
Klaus abaixou seu rosto até o meu e beijou meus lábios entreabertos, permanecendo lá, como se
minha respiração o ajudasse a respirar melhor também.
— Matteo me ligou. Seu primo foi até ele, e entregou documentos de que seu pai pagava
Carlo para me trair.
— Carlo fez tudo isso por dinheiro?
A forma como ele tentou me estuprar, a forma como ele parecia cheio de raiva... Eu mal
acreditava que uma pessoa podia ser tão ruim simplesmente por grana.
— Não, querida. O dinheiro o ajudou a decidir, mas havia mais que ambição nas ações de
Carlo. Agora que sei que ele era meu irmão, eu imagino que Carlo sentisse ódio por me ver
liderando a Tirreno, enquanto ele, também filho de Giacomo, era apenas um segurança.
Então, tentou te tomar naquela noite para me atingir onde doía. Você é uma parte preciosa para
mim, Melina... Machucar minha esposa iria me arrasar. Especialmente porque ele não teria
coragem de violar Emma ou Giulia, já que havia uma réstia de decência nele.
— Giulia disse que ele as teria vendido. Você acha isso?
— Não tenho dúvidas. Se Carlo assumisse a Tirreno, ele usaria as irmãs para fazer
acordos. Emma valeria menos, porque não é virgem, mas Giulia é preciosa. Filha de Giacomo
Lazio, bonita, inteligente e intocada por qualquer homem. Com certeza Carlo a daria a quem
pagasse mais.
Nesse mundo, éramos apenas objetos.
— Melina... Eu vou destruir seu pai. É algo que já decidi. Toni Fiorin não vai parar
enquanto não me tomar a Tirreno. Eu preciso do sangue dele, para desencorajar outros que
possam tentar contra mim. Entenda, não se trata apenas de proteger meu poder e meu dinheiro ou
posição. Se trata de salvar minhas irmãs. Preciso saber onde está sua lealdade.
Eu o encarei. Nossos narizes ainda perto, nossos olhos fixos um no outro.
— Meu sangue é Fiorin, mas minha família é você. Você é meu marido, e eu sempre
ficarei ao seu lado.
42

— V enha para a cama, esposa.


Volvi meu corpo para trás, meus olhos observando o homem deitado sobre lençóis
claros. Ele estava apenas de cueca, a pele bronzeada e musculosa como um convite aberto.
— O mar é tão grande — eu disse, apontando para o horizonte, na varanda, onde uma
vista magnífica me mostrava as ondas balançando, visíveis apenas porque a lua estava cheia.
— Melina — ele insistiu, o que me fez sorrir e volver para dentro, fechando a porta da
varanda atrás de mim.
O som das ondas ainda era audível ali, e parecia música. Eu gostava dessa sensação de
liberdade, mesmo que ilusória. Ainda era presa, mesmo que fosse para minha própria segurança.
— Klaus, você me permitiria estudar? — indaguei, de súbito, o que o fez arquear as
sobrancelhas, de forma enigmática.
Eu via o monte entre suas pernas, a forma robusta como ele me desejava, e parecia que o
assunto não era bem-vindo nesse momento.
— Estudar?
— Eu só pude aprender o básico. Papai dizia que não importava se eu tivesse qualquer
conhecimento além de ler e escrever ou de fazer contas de adição ou subtração. Dizia que eu
seria apenas uma esposa e mãe, e nada além disso. Mas, sempre quis saber mais do mundo. Por
exemplo: os peixes que têm no mar. No que são diferentes das carpas do lago de San Giovanni?
Uma parte de mim temia contar a Klaus sobre esses pensamentos bobos. Mas, outra,
percebeu que ele ficou animado pelas minhas dúvidas, e talvez pela esperança que eu depositava
nele em confessar esses pensamentos.
— Sim, amore mio... Você pode estudar os peixes. Você pode estudar o que você
quiser...
Amor... Meu amor...
— Agora venha se deitar ao meu lado. Eu quero beijar você.
Deitei-me nos travesseiros, me ajustando até ficar confortável, e observei-o começar a
passar sua mão pelas minhas coxas, subindo até minha barriga. Ele estava inclinado para mim,
todo seu corpo de lado, me devorando detalhadamente com os olhos.
— Eu vi os gatos de Giulia na semana passada. Eles ficam em um galpão, não é? Eu
tentei me aproximar, mas eles saíram correndo.
— São ariscos. Ficaram sofrendo muito tempo nas ruas. Mas, Giulia os está acostumando
com a presença humana.
— Eu quero saber por que eles podem correr tão rápido — apontei. — Os animais me
fascinam.
— Hum... reparei que fica muito tempo admirando o lago.
— A carpa branca de mancha laranja... aquela maior, sabe? — ele assentiu, seus dedos
subindo para meus seios. — Eu a chamo de Capo Klaus.
Um sorriso enorme apareceu em seu rosto. Meu corpo aqueceu instantaneamente
observando cada centímetro branco de seus dentes. Eu gostava quando ele sorria.
— Por quê?
— Ela é temperamental e parece que manda em todos os outros peixes do lago. Ela é
como você, cheia de atitude. Mas, ela também é protetora e parece gostar da sua família.
O olhar dele subiu para o meu. Nossos olhos se encontraram, antes da boca dele descer
para a minha e Klaus e puxar para um beijo repleto de algo mais que sexo.
Havia um carinho transbordando sobre essa cama, e isso nos abraçou por algum tempo,
deixando apenas que Klaus e eu ficássemos um no outro, beijos suaves e mãos gentis passeando
e tateando, em busca de calor.
Por fim, Klaus se ajoelhou na cama. Eu assisti em êxtase enquanto ele tirava a cueca
branca e seu pênis inchado erigia como uma arma se preparando para a guerra.
Aquele calor úmido me transbordou, enquanto sentia minha parte baixa inchar e latejar,
diante do olhar dele. Eu entreabri minhas pernas, para que ele visse a umidade que provocava,
meu desejo de recebê-lo, de senti-lo se enterrar em mim, enquanto grito seu nome.
Suas narinas dilataram-se e seus olhos pretos ficaram mais nublados enquanto ele
observa. Repentinamente, ele ordenou:
— Tire a camisola e a calcinha. Eu quero ver.
Klaus queria assistir meu buraco pulsando de vontade de tê-lo. Eu não me fiz de rogada,
estava completamente entregue e faria qualquer coisa que ele me pedisse. Então, imediatamente
puxei minha camisola para cima, removendo-a enquanto erguia os quadris e permitia que ele
puxasse a calcinha, deixando-me completamente nua diante de sua visão.
— Como você pode ser tão linda?
— A mais bonita das mulheres que você já teve? — provoquei, apenas para vê-lo ficar
desconfortável.
— Nem se compara. Nunca tive uma mulher tão linda. Você é a mais perfeita.
Depois de saber a verdade sobre Emma e Giulia, parei de me comparar a elas, mas ainda
me perguntava como devia ser as outras mulheres que Klaus já teve. Melissa disse que eram
modelos, mas eu nunca vi nenhuma pessoalmente. Uma parte de mim até queria pegar o celular e
ler as fofocas, mas outra se recusava a trazer qualquer outro nome para nossa cama.
— Você é fiel, Klaus? — indaguei, a surpresa transbordando entre nós. Ele não esperava
a pergunta, e nem imaginava que eu a faria, algum dia.
— Não tive outra mulher além de você desde o nosso casamento — ele apontou.
Eu sabia disso.
— Ok, você é fiel — assumi. — Mas, continuará sendo? Ou quando passar a novidade de
meu corpo, não deixará de procurar outras? Pode ser sincero, prefiro que o seja. Quero saber o
quanto posso entregar de meu coração a você. Não quero me decepcionar, apenas isso.
Ele pareceu pensar um pouco. Ainda havia o desejo duro entre nós, e a pergunta podia ser
inclinada a mentira, já que estávamos ambos molhados. Ainda assim, quando ele respondeu, eu
soube que foi o mais sincero possível.
— Eu serei fiel a você, Melina. Desde o dia de nosso casamento, até o dia de nossa
morte. Desde agora e para sempre. Você tem minha palavra.
Era a resposta que eu queria. E era tão perfeita que simplesmente afastei bem os joelhos e
observei seus olhos descerem até meu corpo exposto. Ele observou meu centro, sua língua
varrendo seus lábios como se ele estivesse louco para provar sua refeição favorita.
— Se toque... — ele disse, seu tom rouco me fez tremer. — Quero ver você colocando os
dedos...
Eu não sabia como fazer isso, e Klaus percebeu como eu parecia incerta. Então ele
simplesmente pegou minha mão e a levou a minha boceta. Delicadamente, ele fez com que meu
dedo mergulhasse em mim, o polegar passeando pela abertura, me fazendo choramingar de
prazer. Eu rolei meu indicador sobre meu clitóris. Meu rosto caiu para trás, um gemido profundo
saindo da minha garganta.
Era tão bom... eu não sabia que podia me dar prazer sozinha.
Minha mão mergulhou e mergulhou. Eu comecei a me foder, quase esquecida de meu
marido que olhava tudo com olhos atentos, apertando seu próprio caralho enquanto me via
gemer.
— Klaus... — eu o chamei.
Ainda que fosse gostoso, não parecia completo. Eu precisava da boca dele, dos dedos
dele, do toque dele. Era impressionante como só ele parecia me deixar preenchida por algo além
das lacunas de minha alma.
— Eu vou chupar você, querida... Quer minha boca mamando essa bocetinha sedenta, né?
— Sim — gemi, meu corpo se contorcendo nos lençóis.
Klaus ergueu minhas coxas e se ajeitou entre elas. Ele tirou gentilmente minha mão, e
relou a língua sobre minha entrada, me arrastando para um mundo em que só havia nos dois,
com o mar de testemunha.
— Oh, Klaus... não pare — implorei, quando ele chupou com forças. — Não pare... é tão
bom...
Mesmo que o mundo acabasse agora, eu estava feliz. Eu tinha a fidelidade de meu esposo
e o tinha me dando prazer. O que mais uma mulher pode desejar dessa vida desgraçada?
43

— V ocê está gozando com a minha chupada, Melina — ele balbuciou, meus grandes lábios
cobrindo sua boca como um beijo. — Olha como estremece... Olhe como baba por
mim...
Cavalguei seu rosto enquanto o orgasmo atravessava meu corpo como uma onda elétrica,
avassalando minha consciência. Era só sentir e sentir, ser tomada pelo momento em que eu
chegava cada vem mais longe.
— Minha Melina... — ele murmurou, beijando-me em uma trilha que ia de minha boceta
sedenta até a parte interna das minhas coxas, subindo, meu abdômen, subindo, meus seios, e
então minha boca.
Klaus se acomodou entre minhas pernas, e eu inclinei meu quadril para cima, buscando
seu pau duro, querendo algo além do beijo para completar meu orgasmo. E quando sua tora
deslizou contra o meu clitóris molhado, gemi de antecipação.
— Abra mais essas pernas para mim, querida — ele sussurrou no meu ouvido. — Eu
quero derramar minha semente bem fundo dentro de você.
Dias antes, havia ouvido de Mia que eu devia fazer por cima para evitar que ele
ejaculasse bem dentro de mim. Mas, agora, tudo que eu queria era receber seu calor, seu líquido
que me daria um bebê de olhos tão negros quanto os dele.
Como o simples pensamento de ser mãe de um filho de Klaus parecia coroar o prazer, até
intensificá-lo de uma forma que se tornava incontrolável?
Um sorriso pretensioso surgiu em seus lábios quando eu cumpri o que Klaus ordenava,
abrindo mais ainda minhas coxas, de tal forma que arregaçaram para ele. Seu pau bateu na minha
entrada, e a ficção da carne me fez suspirar.
— Klaus — pedi, implorei, por aquilo que só ele podia me dar.
— Você é tão linda, Melina... Toque-me e sinta como eu quero você.
Fiquei surpresa pelo pedido, mas não o reneguei. Levei minhas mãos até seu cacete
emergente, maravilhada como era macio e duro ao mesmo tempo. Passei minhas mãos pela sua
extensão, sentindo cada detalhe da pele, tudo isso feito olho no olho, cada um de nós embriagado
pela reação do outro.
— Você é tão... imenso — eu disse, ele gargalhou, completamente embevecido.
— Você sabe como alimentar meu ego, Melina...
Ele envolveu a minha mão, apertando-a e deslizando-a para cima e para baixo ao redor de
seu mastro. Eu adorei a sensação de como ele parecia completamente entregue a mim, ao meu
toque, exatamente como eu ficava quando ele me chupava. Eu sorri diante da maneira como
Klaus fechou os olhos, respirando irregular, enquanto eu comandava aquela bronha.
— Oh, caramba... — gemeu, rolando meus olhos, sua boca voltando para a minha, num
beijo violento.
Como era gostoso ouvi-lo gemer. Minha boceta se contorceu diante do som que escapava
dos seus lábios. Klaus parecia tão dominado pelo meu simples toque que eu não me fiz de
rogada, deslizando as mãos e apertando, para cima e para baixo, em movimentos cada vez mais
rápidos.
— Ah, Melina... eu vou gozar na sua barriga... — ele disse, como se quisesse me prevenir
e me impedir de continuar.
Mas eu não conseguia parar. Apertei mais meu punho, batendo a punheta com força, cada
vez mais enérgica, admirando sua expressão, a forma como ele apertava os olhos, cada detalhe
dos seus gemidos.
— Me chupa, Melina — ele pediu.
Foi quando ele se afastou, caindo ao meu lado na cama, seu pau dando punhos para o ar,
implorando por uma cavidade úmida e quente. A boceta faria o trabalho, mas eu estava ansiosa
para provar seu sabor. Então eu me curvei sobre ele, meu coração acelerado, minha boca se
aproximando, incerta do que fazer.
— Eu nunca fiz isso antes — disse.
— Eu sei querida. Apenas deslize a língua, e depois chupe como se estivesse tomando
um sorvete.
Inclinei-me para frente, passando a ponta da minha língua por cima da sua cabeça. Seu
sabor era salgado, mas não desagradável. Eu bebi a ponta esbranquiçada da cabeça, e depois
afundei toda a carne na minha boca.
— Porra! — Klaus gritou, seus quadris se agitaram e ele ergue-os para me encontrar mais
fundo. — Melina! Caramba! Melina!
Eu sorri diante da sua reação, afundando os lábios e depois subindo. Quando estava
saindo, afundei de novo, sua ponta quase chegando na minha garganta. Tive ânsia de vômito,
mas consegui me conter.
— Chega — ele rosnou. — Monte meu pau como se monta um cavalo — ele ordenou. —
Quero fodê-la com tudo que eu tenho, Melina.
44

u fiz o que Klaus me pediu. O montei, seu caralho imenso se projetando entre minhas
E pernas, pedindo passagem para meu ninho úmido e quente. Era a primeira vez que eu
dominava a situação no sexo, e estava adorando a forma como ele parecia absolutamente
entregue em minhas mãos.
Ele tentou entrar, mas eu me levantei brevemente, apenas para deixar claro que só
aconteceria no meu ritmo. Ao invés disso, resvalei sobre seu pau, para frente e para trás,
lentamente, numa tortura deliciosa, deliciando-me com sua expressão entregue.
— Melina... Ah, Melina... — gemia enquanto eu moía meu clitóris na sua extensão.
Eu gostava quando Klaus dizia meu nome, porque era a certeza de que ele só estava me
vendo, e não o fantasma de qualquer mulher de seu passado. Uma parte de mim estava mais que
satisfeita com sua promessa de fidelidade, porque entendia que não podia dividi-lo com mais
ninguém.
Eu me inclinei e o beijei, só então permitindo sua entrada. Seu movimento rápido,
invadindo meu corpo, foi vagaroso de início, mas depois Klaus se deixou levar pela necessidade
latente de seu corpo.
Eu joguei a cabeça para trás, buscando oxigênio, enquanto a força não controlada de seu
pau grosso batia dentro de mim. Sinto-me pequena nas mãos dele, uma mulher frágil que ele
pode quebrar em pedaços se quiser. E, ainda assim, confio tanto nesse homem que me abandono
em seus braços, enquanto ele mete com força arqueando e buscando cada vez mais ângulos de
penetração que possam nos preencher e dar cada vez mais prazer.
— Ah, caralho... porra... que gostoso — ele diz. — Sua bocetinha me suga, Melina...
— Hum, é tão bom Klaus — eu respondo, descendo e subindo, meus seios saltando para
cima e para baixo, no movimento.
Repentinamente, Klaus me gira na cama, deitando-me abaixo dele. Seu mastro não me
deixou em nenhum momento, nossas pernas continuam enroladas uma na outra, ele apenas está
buscando uma posição onde possa colocar mais energia no momento.
Então ele começou a bater em rápidas sucessões. Meus lábios se apertam enquanto seu
pau me alarga e me esfola com uma energia que mal consigo alçar.
— Klaus... Klaus... por favor...
— Eu sei — ele diz, seu corpo unido ao meu, e então o orgasmo começa a despejar ondas
cada vez mais altas em nossos corpos.
Há uma suspensão breve enquanto minha boceta bebe seu esperma quente, que derrama,
enquanto ele goza em jatos rápidos. Grito com a intensidade do ato, uma longa pausa nos
tomando quando nossos corpos começam a se acalmar.
Klaus cai em cima de mim. Meu cérebro falha enquanto tento me situar no tempo e
espaço pós orgasmo. O mundo nem parece real, o tanto que meu corpo está satisfeito e feliz. É
como se eu houvesse esperado a vida inteira por ele.
Por Klaus...
Ele desaba para o lado, apenas para tirar seu peso de cima de mim. Sua coxa permanece
descansando na minha, seu pau morto, desfalece em cima da minha vulva. É tão íntimo quanto o
sexo que acabamos de compartilhar.
— Você está feliz, Melina? — ele indagou, baixinho, o som de sua voz emergindo em
meus pensamentos entorpecidos pelo cansaço do dia.
— Por que eu não estaria? — indaguei.
— Uma parte de mim teme machucá-la nesse casamento — assumiu. — Quero que seja
feliz. Se algum dia te magoar de alguma forma, você pode ser direta comigo, ok?
Girei meu rosto para meu esposo. Ele parecia cheio de um conflito que não posso
alcançar. Levo meus dedos até sua face, meu indicador raspando na sua barba malfeita.
— O que te aflige, esposo?
— Eu amo você — ele disse, e eu perdi o ar porque não esperava que suas palavras
viessem naquele instante.
Não após a paixão do sexo ter acalmado nossos corpos. Que Klaus dissesse isso quando
estava me fodendo era até compreensível, palavras apaixonadas surgiam em momentos assim.
Mas, nessa calmaria? Nessa aura pós orgasmo? Nesse simples momento em que éramos apenas
dois corpos deitados um ao lado do outro.
— Nunca amei ninguém além de minha mãe e de minhas irmãs — ele me contou, e eu
permaneci em silêncio, porque entendia que ele precisava falar. — Mas, mamãe se foi, não fui
capaz de salvá-la de um casamento tão horrível. E Emma e Giulia... as pessoas precisam achar
que elas são duas putas, apenas para protegê-las. Eu nem posso chamá-las de irmãs na frente de
outras pessoas. Então, Melina... Nunca soube demonstrar meus sentimentos para ninguém.
Quando Giulia me ligou e disse que Carlo tentou abusar de você, fiquei louco. Depois, vê-la
triste e assustada pela casa... Eu não fui capaz de estar ao seu lado quando mais precisou de
mim... Isso me avassalou de culpa...
— Klaus...
— Eu nem sei ser um marido, Melina... Quero te salvar e te guardar dentro de mim, para
que ninguém possa feri-la, mas temo não conseguir isso. Não sem matar todo mundo que possa
te fazer mal.
Eu o trouxe para meus braços nesse instante. Sentia que ele estava apavorado e
desesperado, temendo o que o futuro nos reservava.
— Klaus, não sei se você é o melhor marido do mundo, mas você é o único que eu quero.
Eu o amo, querido — disse, apertando-o contra mim. — Não se preocupe comigo, apenas fique
ao meu lado. Nós podemos aguentar tudo se estivermos juntos...
Sua boca resvalou em meu colo, num carinho mudo. Já eu beijei sua testa, como se
respirar o perfume masculino de suas madeixas negras me fizessem acalmar de todo nevoeiro.
O amor era algo incrível e tempestuoso ao mesmo tempo. Temia ser magoada e, na
mesma medida, sabia que ele nunca faria isso. Não sei como esse sentimento conseguiu alcançar
essas duas pessoas quebradas que éramos, mas aconteceu, e eu não podia ser mais feliz. Amava
Klaus, e queria ficar o resto da minha vida ao seu lado.
Só isso importava.
45

quele final de semana na praia teve o efeito que Klaus desejou, e quando retornei a San
A Giovanni, estava me sentindo mais animada e menos aflita com a propriedade. Parecia que
ela voltou a ser o abrigo que me recebeu depois de uma vida amargurada com os Fiorin.
— Você parece iluminada — Emma disse.
Eu encarei minha cunhada. Era estranho pensar nela assim, como cunhada; e, igualmente
era um alívio, já que minha simpatia por Emma foi automática. Ela foi a primeira família que
tive nessa casa, quando me salvou de meu pai no dia do meu casamento.
Aceno em concordância com a face, enquanto giro o rosto em direção ao lago.
— Eu me sinto bem. Klaus disse que me ama — conto a ela, não conseguindo esconder
um sorriso diante disso.
Emma abriu um enorme sorriso, unindo as duas mãos e suspirando pesadamente, como se
estivesse encantada perante a mais bela das flores.
— Sério?
— Ele já disse isso a outra mulher? — indaguei, porque tinha realmente curiosidade para
saber o passado de meu marido.
— Nunca conheci nenhuma de suas mulheres. Klaus e Giulia me acham... você sabe...
doente — ela murchou diante dos meus olhos e, rapidamente, eu levei minha mão através da
mesa que nos separava e segurei na dela, como ela sempre fazia para mim.
— Eles são protetores, mas eles a amam. Quando eu não sabia a verdade, tinha tanto
ciúme de você — admiti. — Porque quando meu marido te olha, ele parece encantado. E Giulia,
quando cita seu nome... o olhar dela transborda carinho.
Emma assentiu, certa dos sentimentos dos dois irmãos.
— Eu sei disso. Só queria estar melhor, não ter esses ataques de pânico... Assim os dois
poderiam me ver como alguém capaz de cuidar de si mesma.
Apertei os dedos de Emma com os meus. Era a forma que encontramos de
demonstrarmos carinho uma pela outra.
— Mas, posso não ser uma pessoa corajosa, todavia, serei a melhor tia do mundo — ela
disse, a mudança do assunto me chocando.
— Do que está falando? — indaguei.
— Dr. Colombo ligou quando vocês estavam na praia. Ele disse que precisam retornar à
ligação para saber o resultado do exame de sangue.
— O de urina deu negativo — apontei. — O que foi bom. Eu ainda não estava pronta
para saber estar grávida.
— E agora está? O de sangue é o mais seguro. O de urina pode ter dado um falso
negativo.
O pensamento de ter um bebê de Klaus não me trouxe nenhuma aversão, dessa vez. Saber
que meu marido me amava, que ele me tinha respeito, me deixou disposta a carregar seus filhos.
E, pensando bem, que melhor maneira de começar essa nova vida?
— Talvez eu esteja grávida. Talvez não. Acho que Klaus aceitará qualquer dos
resultados. Ele não está pensando nisso no momento. Parece mais preocupado com a Tirreno e
com a maneira como ele nos manterá seguras.
Emma assentiu.
— Meu irmão é um homem valoroso. E ele tem Matteo, que é um aliado confiável.
Tenho certeza de que ele conseguirá nos manter bem.
— A única coisa que me incomoda nisso, Emma... É que para Klaus nos manter seguras,
talvez ele tenha que matar meu pai. — Admiti para ela. — Minha família foi terrível, mas Toni
Fiorin ainda é meu pai. Eu sinto... algo tão triste no meu coração — lágrimas se formam nos
meus olhos, e um aperto no meu peito quase me impede de continuar. — Eu não quero me sentir
assim, mas não consigo evitar. Quando penso que Klaus terá que matar meu pai... isso é muito
angustiante.
— Você é humana, Melina. E tem um bom coração. É claro que ficaria triste. Sabe...
Quando Giacomo morreu, eu pranteei sua morte. Ele nunca quis me conhecer, ele ficou muito
zangado com o filho por ter ido atrás de mim... Ele até tentou chantagear Klaus em deserdá-lo se
não se livrasse de mim. Matteo me contou que Giulia ele até quis conhecer depois de saber quem
ela era, mas eu... eu era imunda e suja, uma prostituta — ela murmurou. — Giulia o mandou a
merda e disse que jamais choraria por ele. Mas, eu chorei. Senti como se uma parte de mim
também morresse com ele. Acho que somos sensíveis. Como eu queria ser como minha irmã —
apontou. — Giulia tem uma energia invejável. Acho que ela herdou isso de sua mãe. Klaus me
falou que quando Giacomo ofereceu dinheiro para a mãe Giulia se livrar dela, a mulher o
mandou enfiar seus milhões no traseiro.
Sorri.
— O fato é que somos diferentes, somos mais suscetíveis as emoções. Isso não nos faz
pior. Apenas, diferentes. Eu confio que meu irmão fará o melhor para cuidar de mim. E você
precisa confiar nele como seu marido. Se ele disse que a ama, você pode acreditar nele. Klaus
tem palavra, ele fará qualquer sacrifício para te manter segura.
Emma estava certa. Olhei para o lago, vendo as carpas seguindo capo, seguras de que seu
líder sabia o que era melhor para elas. Eu devia fazer o mesmo. Klaus era minha rocha, meu
esposo, minha vida. Seja qual for a atitude que ele tomará, será o melhor para mim.
46

iulia e Emma haviam saído naquela tarde para fazerem compras. Eu devia ir junto, mas
G recusei porque pedi ao Dr. Colombo que viesse me ver, trazendo os resultados. Não disse a
elas sobre isso, porque queria ter a liberdade e privacidade o suficiente para conversar
sobre os resultados.
Meu casamento já não era uma incógnita e eu entendia a importância de ter um bebê para
a Tirreno, mas também sabia que, caso o resultado fosse positivo, não seria por causa da
organização que meu coração transbordaria de sentimentos.
Dr. Colombo entrou na sala de estar com sua costumeira pasta preta, que sempre o via
carregando quando vinha ver Emma. Eu fiquei em pé, aguardando em uma prece muda por uma
confirmação ao que meu coração queria.
Construir uma família com o homem que eu amava.
Ainda assim, se o resultado continuasse negativo, eu falaria sobre minha saúde, e pediria
um novo teste, já que Klaus e eu fizemos sexo muitas vezes depois do exame de urina e sangue.
Enfim, era por isso que eu não queria minhas cunhadas aqui comigo.
Nem meu marido...
Klaus tinha algo para fazer na cidade. Eu não sei o que, nem perguntei, quando ele se foi,
apenas liguei para o médico. Desde que Carlo morreu, Klaus precisava se afastar da casa com
mais frequência, assim sabia que o antigo chefe da segurança era também responsável por muitas
questões externas.
— Como a senhora se sente? — Dr. Colombo indagou.
— Estou bem. Sinto-me bem.
— Teve outras tonturas?
— Não.
— Enjoos?
— Não também. Por que essas perguntas?
— Porque seu exame deu positivo, senhora Lazio.
Eu estou grávida. Apesar de esperar o resultado, quando ele veio, precisei me acomodar
no sofá para segurar o choque. Eu estava gerando uma vida dentro de mim, uma parte de Klaus...
Isso era mágico e completamente assustador.
Dr. Colombo veio em meu auxílio, trazendo seu estetoscópio para ouvir meu coração
acelerado.
— Nós vamos precisar de novos exames para eu verificar se está tudo bem, garantir que
tenha uma gravidez tranquila e...
Ele continuou falando sobre vitaminas e descanso. Praticamente ouvia tudo sem
conseguir entender, porque estava tão aérea, transportada para um mundo onde eu teria um bebê
nos braços, um presente de Deus depois de uma vida tão triste e apagada.
Repentinamente, silêncio. Encaro o médico nesse instante. Dr. Colombo está sorrindo.
— Será uma mãe incrível, Senhora Lazio — ele afirma.
Eu não sei. Mas, vou me esforçar para ser.

✽ ✽ ✽

Não poderia esperar Klaus voltar para casa para lhe contar a novidade. Precisava dizer a
ele, e não podia ser por telefone. Então fui até um dos guardas, o semblante sério e muita firmeza
na voz.
— Leve-me até meu marido.
O homem arqueou as sobrancelhas, como se estivesse pronto para negar o pedido.
Todavia, imitei o olhar de Giulia, deixando claro que não aceitaria ser contrariada. Por fim, o
rapaz assentiu, e mandou preparar um carro.
Eu estava aprendendo muitas coisas nos últimos tempos. Aprendi a ser uma esposa,
aprenderia a ser mãe, e agora estava aprendendo a dar ordens. Escondi um sorriso satisfeito,
enquanto entrava no veículo preto e brindado da Tirreno, ao lado de um jovem segurança que eu
praticamente nunca havia visto antes.
Até porque, o único dos guardas que interagia conosco era Carlo. Com a morte dele,
imaginava que passaria a falar com esses outros homens com mais frequência.
— Você sabe onde meu marido está? — indaguei a ele, enquanto dirigia.
— Sr. Klaus está na sua cobertura, no prédio central. Ele tem um apartamento lá.
O que meu marido fazia em um apartamento? Seria um lugar que ele tinha para encontrar
mulheres? Eu jurei a mim mesma não ser carregada pelo sentimento de ciúme, mas eu iria
inquirir a Klaus explicações, com certeza.
— Ele faz reuniões lá, não é? — disse em voz alta, simplesmente justificando para mim
mesma.
Beirava ao ridículo. Klaus faria reuniões em San Giovanni, ou na sede, na área industrial.
Ele não faria reuniões em um apartamento. O sorriso malicioso que o jovem motorista deu para
si mesmo me fez corroer de dúvidas.
Klaus jurou que seria fiel. Mas, eu podia confiar nele cegamente?
Agora eu esperava um bebê dele. Logo ficaria com a barriga avantajada. Eu achava lindo
esperar uma criança, mas Melissa uma vez disse que homens tinham nojo de mulheres grávidas.
Isso aconteceria com Klaus?
Talvez eu precisasse que Giulia e Emma estivessem comigo, para aliviar meus
pensamentos. Eu tinha certeza de que Klaus teria uma explicação para o apartamento, e só
precisava confiar nele. Ele era um bom marido, e nosso casamento recente ainda não o enjoou.
E eu também nem tinha sinais de estar grávida. Ele não tinha como estar com nojo de
mim.
— Senhora, chegamos — o motorista disse, quase uma hora depois.
Toda a viagem passou quase sem eu ver nada diante da janela do carro, tão absorvida
estava em pensamentos.
— Você pode ficar aqui — eu disse ao rapaz, abrindo a porta do carro diante do olhar
assustado dele.
— Mas, senhora...
Não fiquei para ouvir nada. Cruzei a calçada que separava a rua do veículo e entrei no
prédio. Um porteiro um tanto assustado me encarou, e tentou me interceptar, quando o segurança
chegou logo atrás de mim.
— É a esposa de Klaus Lazio — ele me apresentou, e o olhar logo retrocedeu.
— Senhora, vou avisar seu marido de que está aqui — o homem parecia desesperado.
E essa reação me fez ter certeza de que Klaus estava com uma mulher. Então, eu nem
pensei mais, corri para o elevador, e o fechei tão logo entrei, não deixando tempo para que os
homens me impedissem. Eles não iriam me tocar, não se arriscariam a colocar a mão em mim,
mas podiam fazer qualquer coisa que não me deixasse entrar no elevador.
Encarei os números. O prédio tinha vinte andares, e eu apertei logo o último botão.
Enquanto a máquina se movia, senti lágrimas nos olhos. O pouco que eu vi quando entrei nesse
edifício, é que ele era de luxo. Mas, eu não vi seguranças aqui, e nem imaginava como Klaus
podia estar num lugar assim com uma mulher qualquer arriscando a própria vida. O velho
porteiro não conseguiria impedir ninguém de ir até ele.
A porta do elevador se abriu, e então eu vi uma fileira de guardas na entrada. Todos eles
ficaram chocados quando me encararam.
— Ninguém ouse me tocar — anunciei, a voz firme como Giulia fazia, avançando pelo
corredor bem iluminado.
Os homens se afastaram de mim respeitosamente, abrindo espaço para que eu cruzasse o
corredor em direção a uma das portas. Havia uma música suave ali, e senti raiva florescendo
através do meu corpo aumentando proporcionalmente conforme eu avançava.
Abri a porta. Entrei, e a fechei atrás de mim.
Eu esperava ver Klaus nu ali, com uma mulher, mas ele não estava em lugar nenhum.
Todavia, havia uma mulher, parada perto de uma das janelas, olhando para a cidade ao longe. Ela
era tão perfeita, seus cabelos desciam em ondas suaves pelas suas costas, e ela segurava um copo
com algum tipo de bebida.
O estresse me fez cegar. Por alguns instantes, eu me perdi em uma tontura angustiante, de
quem sempre soube que não era nada para ninguém, mas que se permitiu sonhar ser o mundo de
Klaus.
E então a minha visão turva voltou ao normal, e eu a percebi me encarando.
Levei alguns segundos para acreditar.
De todas as mulheres...
De todas elas...
Por quê?
Por que, Klaus?
Por que Melissa?
— Irmãzinha? — ela indagou, ao me ver.
E então eu vi o sorriso vulgar, a forma como ela pareceu tão feliz em me fazer sofrer.
Tudo isso se juntou em um ódio descomunal e eu perdi o chão, perdi meu eixo, e basicamente
caminhei em passos firmes e retos até ela.
Fechei meu punho. Melissa não esperava que a garota criada presa para ser a boceta de
um chefe da máfia tivesse qualquer atitude, mas eu estava cega. Então desferi o primeiro soco.
Ela caiu para trás, entre incrédula e dolorida, e eu logo cai em cima dela, conectando
meus dois punhos em seu rosto, uma sucessão rápida entre um soco e outro, raiva me tomando
de tal forma que eu só queria bater e bater.
Melissa gritou. Eu ouvi os passos dos homens atrás de mim, mas nenhum deles ousava
me tocar. Então continuei. Bati até perder as forças, bati sem trégua, bati pelos anos de
humilhação, por tudo que já me fez. Eu não tinha tanta força, talvez nem estivesse machucando-a
de verdade, mas estava descarregando toda a dor.
Minha mãe nunca me amou, meu pai me vendeu. Mas, de todos, minha irmã era a pior.
Ela era cruel, desumana. E ela estava sendo amante do meu marido.
— Melina!
Mãos fortes me puxaram para trás. Era Klaus, eu mal o via, agora percebia que era
porque as lágrimas esconderam minha visão. Mas, sentia tanto ódio no meu coração, que meu
punho agora começou a ir contra ele.
Ele nem se moveu, enquanto eu batia no seu peito, no seu rosto. Klaus me deixou ficar
até eu cair no chão. Havia tanta dor em mim. Eu fui tão tola em acreditar que ele me amava, em
acreditar que ele me queria verdadeiramente, não apenas como uma barriga para gerar seu fruto.
Eu devia saber... O Capo de uma máfia jamais seria leal a uma mulher.
47

entei me desvencilhar de meu marido quando ele me cercou nos braços, apertando firme
T para conter minha gana de matá-lo com as próprias mãos.
— Melina! — ele gritou tão forte, repentinamente, que me fez acordar do ódio,
restando apenas a incrível decepção a me tomar.
Então girei meu rosto, e vi Melissa no chão. Ela estava ensanguentada, com as duas mãos
no nariz, e um hematoma abaixo dos olhos. Minha irmã me encarou com tanto ódio que jurei que
ela avançaria sobre mim – e eu realmente quis que o fizesse, para eu poder bater mais nela –, mas
Melissa permaneceu parada onde estava, como se não acreditasse que eu fui capaz de reagir.
— Sua vagabunda desgraçada — eu disse. — Eu te odeio!
— Despeito, irmã? Sabe que seu marido prefere passar as tardes comigo do que ao seu
lado? Por que não engravida logo para dar a Klaus o bebê que ele tanto precisa, e assim o deixa
livre de qualquer obrigação com você, para que ele possa ficar apenas comigo?
Melissa podia ter se casado com Klaus, mas ela se recusou a ser apenas a sua incubadora.
Melissa teve escolhas na vida que eu não tive, e ela escolheu ser amante do meu marido, para
receber dele apenas as coisas boas, como presentes e sexo. Minha irmã não teria nenhuma
obrigação nessa relação além de estar bonita e disposta. Isso era tão insultante que girei
novamente para Klaus e voltei a bater nele.
— Tire Melissa daqui! — ele gritou para seus homens, enquanto tentava me segurar.
Klaus era forte, mas eu estava carregada de ódio. Ainda assim, ele conseguiu me segurar
até estarmos sozinhos, só então ele me soltou. Eu consegui lhe dar um último safanão, antes de
começar a caminhar pela cobertura, mal acreditando no que estava acontecendo.
Subitamente, o senti nas minhas costas, sua mão resvalando levemente na minha cintura.
— Melina...
— Não me toque! — gritei, girando para ele, o dedo em riste. — Seu desgraçado!
— Não é o que você está pensando — ele teve a audácia de dizer.
— Que bela frase clichê — murmurei, irritada.
— É sério, Melina. Não é o que você está pensando. Não estou transando com sua irmã,
apenas enrolando ela.
Eu não queria ouvir mais nada, então comecei a me afastar em direção à porta. Todavia,
não consegui chegar até ela, pois Klaus me segurou antes.
— Melina! Você precisa entender! Seu pai está tentando me desbancar. Com a morte de
Carlo, ele não tem mais acesso a mim, o que é bom. Contudo, da mesma forma, não é tão bom,
porque nunca sei o que esperar e quando esperar. Quando eu sabia que havia um traidor na
minha casa, podia meio que anteceder o que seu pai faria. Mas, agora... Agora ele pode atacar
sem que eu espere. Por isso, me aproximei de Melissa.
— Vai dormir com minha irmã para proteger a Tirreno? — debochei.
— Não, Melina... Vou apenas demonstrar interesse, presenteá-la, e largar informações
para que ela leve até seu pai. Melissa é arrogante, e já acha que estou apaixonado por ela. Não é
difícil imaginar que ela vai armar com o pai para me derrubar.
Eu até entendia o propósito. Mas, ainda assim, estava enojada e só queria que ele
desaparecesse da minha frente.
Mais uma vez tentei me afastar. Quando ele me segurou, eu lhe dei outro tapa.
— Não encoste em mim — avisei. — Estou com nojo de você!
— Melina — ele cerrou a mandíbula. Parecia irritado, sendo que só eu tinha esse direito.
— Estou tentando explicar, por favor, compreenda.
— Eu não vou compreender nada! Você sabe que Melissa sempre foi cruel comigo, e
ainda assim a traz para essa cobertura. Você jurou para mim que não tinha nada com ela quando
aquele site te pegou comprando uma joia! Você mentiu!
— Você é minha esposa. Eu não vou trair você. Já lhe dei minha palavra. Por que é tão
difícil acreditar em mim?
Havia uma pouco de racionalidade no que ele dizia, mas eu estava tão zangada que não
conseguia captar nada. Então simplesmente voltei a andar pela cobertura, de um lado para o
outro, até me sentir tonta o suficiente para desabar.
Só não caí no chão porque Klaus estava às minhas costas, e ele me segurou firme.
— Melina — havia uma urgência e preocupação nítida expressa em sua voz. — Melina?
— ele me chamou de novo e de novo, cada vez mais preocupado, e então mais uma vez eu tentei
me desvencilhar de seu abraço.
— Já estou bem.
— Não parece bem, Melina. Vou chamar Dr. Colombo para vê-la.
A mão de Klaus apertou minha cintura, me puxando cada vez mais para ele.
— Eu não preciso ver o médico — avisei. — Eu estaria bem se eu não tivesse te pego no
flagra entretendo minha própria irmã!
— Esposa — a palavra saiu mastigava entre os dentes. — Eu já disse que não fiz nada!
Realmente, não estava com disposição de ficar rebatendo cada defesa dele, então apenas
acenei e consegui me desvencilhar, emoções borbulhando em meu peito.
— Por que está aqui? — Klaus indagou. — Por que veio sozinha? Onde estão Giulia e
Emma?
— Elas foram fazer compras. Eu precisava ver você então... — lágrimas me tomaram, e
quando me dei conta, eu estava em um pranto desesperado, as duas mãos cobrindo meu rosto,
tentando segurar as lágrimas incontroláveis.
Essa devia ter sido uma tarde incrível, onde eu contaria ao meu marido que estava
grávida. Mas, acabou por ser tenebrosa e horrível.
— Ei... Melina... está tudo bem — ele disse, se aproximando, a mão esfregando as
minhas costas.
— Nada está bem...
Ele respirou fundo, me puxando para seu peito. Acabei deixando-me resvalar nele, meio
de má vontade, apenas porque uma parte de mim dizia que precisava acreditar.
Conforme o choque ia passando, podia captar uma sinceridade latente em sua explicação.
Sim, havia uma verdade no que ele dizia, talvez ele realmente estivesse usando Melissa. Isso
ainda doía para caramba, mas Klaus estava fazendo o possível para proteger nossa família.
— Eu estou grávida — contei, então.
Os dados estavam lançados.
48

elina estava grávida.


M Isso mudava tudo.
O tempo para planejar derrubar Toni Fiorin acabou.
Eu não podia e não iria arriscar a vida de um filho.
Levei as mãos até seu ventre, tocando-o, um sentimento absurdo de posse a me tragar.
Quando a tomei por minha mulher, eu sabia que esse seria o motivo. Precisava de uma esposa
para ter um filho, mas agora que eu o tinha, sabia que as coisas não eram tão simples assim.
Eu amo Melina. E eu amo essa criança. Eu mal soube dela, mas já a amava
tremendamente. Senti lágrimas brotando nos meus olhos diante da grandiosidade do sentimento,
mas pisquei rapidamente para espantá-las. Não podia chorar, porque o Capo não tem esse direito.
Só havia chorado uma vez antes, que foi quando encontrei Emma, e Matteo me adiantou que
ninguém podia me ver assim, sentimental.
Mas, como não ser sentimental sabendo que minha mulher gerava meu filho? Mais uma
vez, em tantas que já vivi, eu odiei meu pai por não ser capaz de amar os frutos que ele espalhou
por aí.
— Melina — segurei suas mãos e a levei até uma poltrona. Eu a fiz sentar, enquanto me
ajoelhava diante dela. — Você precisa aprender a confiar em mim e nos meus sentimentos.
Ela assentiu. Melina sabia seu papel dentro do casamento.
— Eu te amo, Klaus — ela murmurou. — Mas, não sou capaz de dividi-lo com ninguém,
com mulher nenhuma, especialmente com Melissa.
— Nunca me dividirá — afirmei. — Esposa, eu te amo — beijei seus dedos, meu coração
batendo com tanta intensidade que eu sabia que cada palavra era real. — Eu te amo, Melina... —
repeti. — E por te amar tanto, eu preciso proteger nossa família. Antes, todas as minhas ações
eram por Emma e Giulia. Eu mataria quem fosse para deixar minhas irmãs seguras. Mas, agora
você e meu filho são minha vida, e farei o que for preciso para nada os machuque. Carlo está
morto, e eu preciso armar para que seu pai saiba sobre os carregamentos de armas. Por isso, eu
vou me encontrar com Melissa, dar-lhes presentes, e então contar a ela sobre meus planos. Eu sei
que vai doer em você, mas eu preciso fazer. Não há melhor maneira de Toni Fiorin saber meus
planos do que Melissa os relatar ao pai.
Seu semblante era de alguma forma positivo. Ela girou o rosto para as janelas laterais,
seu olhar se perdendo na cidade ao longe. A observei atentamente enquanto fazia isso, sua
aliança de casamento brilhando em seu dedo, seu conjuntinho azul claro contornando puramente
suas formas, seu cabelo preso em um coque frouxo atrás da cabeça.
Ah, tão bonita... tão bonita... Eu me perderia para sempre em suas curvas, meu pau
eternamente duro por ela.
Eu estava em uma ligação quando ouvi um dos homens gritar. Logo, o som da briga
feminina chegou aos meus ouvidos. Eu abandonei a ligação e corri até a sala onde encontrei as
duas irmãs jogadas no chão, Melina por cima de Melissa, socos sendo dados como jamais pensei
que veria.
Eu nem consegui explicar que havia acabado de chegar, apenas para trazer um novo
presente para Melissa. Não passei mais que meia hora com ela aqui, apenas conversando um
pouco, ansioso para ir embora.
Sim, eu estava presenteando Melissa, mas não faria sexo com ela. Eu tinha orgulho da
criação digna que tive, dedicada a honra, dada por minha mãe, uma mulher maravilhosa. Eu
jamais seria como meu pai, não importava o quão tentador fosse a mulher disposta a me abrir as
pernas. E Melissa não me tentava de forma alguma. Sua personalidade doentia me dava nojo.
— Eu confio em você — Melina disse, por fim, aliviando minha alma.
Afundei meu rosto em seu colo, sentindo suas mãos deslizando pelos meus cabelos.
Apesar de nosso começo confuso, hoje ela era meu porto seguro. Se Melina acreditava em mim,
tudo valeria a pena, eu me tornava o homem mais poderoso do mundo, eu não tinha medo de
nada.
— Vamos para casa, esposo — ela me pede, suspirando. — Ainda não comemoramos
minha gravidez.
Eu assenti.
Eu podia levá-la ao paraíso aqui mesmo, mas esse lugar não era digno de minha esposa.
Então simplesmente me pus de pé e segurei sua mão, levando-a comigo.
Queria ter Melina em mim, e não seria nesse ambiente impuro, onde tive outras mulheres
que nem rostos tinham em minhas lembranças apagadas. Tudo que eu me importava, e tudo que
eu vislumbrava era Melina.
Minha esposa. Minha vida. A mãe de meu filho.

✽ ✽ ✽

— Você é tão linda — o murmuro escapa de meus lábios enquanto deslizo a língua por
sua fenda úmida, exatamente do jeito que ela gosta.
Seu clitóris fica duro na minha boca. Melina joga a cabeça para trás, seus seios
empinados, os bicos duros, enquanto ela se contorce nas minhas mãos.
— Klaus — ela abriu mais as pernas, esfregando sua bocetinha na minha cara. — Ah,
Klaus... aí... bem aí... — ela aponta, enquanto eu afundo a língua, saboreando seu gosto.
— Fica de costas, Melina — eu peço, meu caralho duro apontando para cima, pedindo
passagem na sua entrada pegajosa.
Melina cumpriu o que eu ordenei. A recompensei lambendo de sua bocetinha até atrás, e
depois voltando, fazendo com que gemidos roucos exalassem dela, enquanto sua bunda empina,
e ela cai com a parte superior sobre a cama.
Ela está assim. Os seios e o rosto no colchão, e a bunda elevada, pronta para ser fodida
por mim.
— Você gosta quando eu te como assim, né Melina? — indago, ficando de joelhos atrás
dela, e correndo meu pau por entre seus grandes lábios. Seu líquido o meleca o suficiente para
deixá-lo mais feliz, e então eu atravesso entre suas dobras, afundando dentro dela. — Você é tão
apertadinha... é tão bom, Melina...
— Me fode — ela implora. Eu bato nela, saio e volto a bater, tão firme e forte que nós
dois gememos de satisfação. — Ah, Klaus...
— Foder você é o que eu penso dia e noite, esposa — digo. — Quero passar o dia
metendo duro dentro de você...
Ela sibilou e foi ao meu encontro, batendo sua bunda no meu quadril. Segurei sua cintura
para comandar o ritmo, construindo meu orgasmo através de cada metida. Era tão bom que logo
começou a correr o orgasmo pelas minhas veias, e eu senti que Melina começou a gemer cada
vez mais alto, seu corpo ficando duro, e seu aperto me tirando o ar.
— Ah, você está gozando no meu pau, Melina... Tão rápido... É tão bom, não vou resistir
e vou gozar com você...
A forma como ela raspava me fez grunhir, sentindo cada golpe. Eu bati na bunda dela, e
depois levei uma das mãos até seu cabelo. Fiz um coque com o punho, e a segurei, enquanto a
deixava balançar sobre meu caralho dolorido.
— Klaus —ela gritou. — Eu estou... ah, ah... estou... ah...
— Eu sei... libere, Melina... não se segure — disse, enquanto sentia sua boceta apertar
forte ao meu redor, me espremendo, aproveitando cada centímetro de nossa fricção. — Ah,
Melina... — Inclinei minha cabeça para trás, meu quadril tomando conta vida própria, batendo
tão rápido e tão duro que doía. Eu me senti derramando em ondas quentes, nossa lava caindo de
nós e molhando o lençol.
Algum momento depois, quando me deitei sobre ela, pude ouvir o som do meu próprio
batimento cardíaco acelerado. Eu estava tão apaixonado e entregue a essa mulher que não
conseguia pensar em um único dia longe dela.
Minha mão tocou seu ventre, e eu pensei no meu filho. Ah, eu o amava tremendamente, e
eu esperava que ele tivesse uma vida mais feliz do que a minha. Para isso, eu teria que agir o
mais rápido possível.
— Eu te amo, Klaus — ela se remexeu abaixo de mim, estava toda suja com minha porra,
e parecia ainda mais linda por isso.
Sorri.
— Eu também te amo — afirmei.
Nunca havia dito isso a outra mulher, mas tinha certeza de que era o que eu sentia por ela.
Por Melina, eu destruiria o mundo inteiro, e construiria outro, um seguro, apenas para ela.
49

oni Fiorin pretendia me matar. Eu soube disso em uma tarde em que lanchava com Melissa.
T A minha cunhada estava sentada divinamente do outro lado da mesa em um rico quiosque
vintage, onde bebíamos chá e comíamos bolo de laranja.
Fazia uma semana que ela apanhou de Melina e seu rosto ainda tinha as marcas. Apesar
disso, ela sorria feliz, satisfeita com meu último mimo.
A havia presenteado com um bracelete de ouro naquela tarde. Melissa insistiu que
fossemos para um hotel, ou para a cobertura, mas disse que não estava me sentindo muito bem e
a convenci a vir comer aqui.
Não sei quanto tempo vou conseguir enrolá-la sem sexo, mas os presentes pareciam lhe
dar tanto prazer quanto um orgasmo.
— Então... Você dizia...? — insisti.
— Que papai está planejando casar Melina com outro homem. Eu não sei como ele faria
seu divórcio com ela, mas era certo de que Melina se casaria com um tal de Carlo... Ouvi falar...,
mas, o cara sumiu. Agora, papai está conversando com outro cara... Enfim, Klaus... Não é
maravilhoso? Logo você estará divorciado e poderemos ficar juntos oficialmente. Eu pensei
melhor e quero ser a senhora Lazio.
— Sim, querida... é maravilhoso — menti.
— É a vida nos dando outra chance. Eu devia ter me casado com você, mas estava... não
sei... Acho que Melina é tipo uma bruxa que consegue virar a cabeça da gente... Ela me fez
recusar esse casamento.
— Ela não tinha dez anos quando você recusou?
— Mesmo nessa idade, ela nunca foi flor que se cheire.
Eu estava enojado. Era difícil ouvir toda essa baboseira e não dizer uma única palavra.
— Enfim, não vejo a hora de Melina estar com outro, e nós estarmos livres. Papai falou
que consegue uma anulação facilmente para que o padre possa nos casar na igreja. Eu quero
tanto me casar na Catedral da Sagrada Família em Barcelona. Eu vi a basílica na minha última
viagem para a Europa e fiquei apaixonada.
A raiva ferve através de mim. Não haveria um casamento, mesmo que eu o desejasse.
Toni Fiorin já devia estar com meu assassinato engatilhado. Ele não precisaria de uma anulação
com a Igreja porque, provavelmente, Melina seria viúva. De qualquer maneira, precisava ficar
frio e colocar meu plano em ação.
— Isso custará caro. Não apenas o casamento, e todos os trâmites, mas também levar
nossos convidados para a Europa — disse, e ela pareceu animada porque eu não recusei sua
ideia.
— Valerá a pena, amor. É o que eu quero, você precisa me dar o que eu quero — insistiu.
— Por sorte, vai entrar um alto valor de venda nos próximos dias. Na terça à noite, um
carregamento bilionário de armas será enviado no porto.
— É mesmo, querido? E eu poderei ter meu casamento na Espanha?
— Claro, Melissa. Eu te darei o mundo.
Minha promessa falsa e vazia a fez sorrir. Mais uma vez, eu a comparei a irmã. Como
podiam serem tão diferentes? Não fisicamente, mas em personalidade. Melina era minha deusa,
minha vida, meu tudo. Eu não a perderia, não importa o quê. E não morreria, não a deixaria só
para ser dada a outro homem, como um animal sem escolhas.

✽ ✽ ✽

— Papai quer me casar com outro homem? — Melina repetiu, assustada, e Emma
segurou suas mãos, enquanto tentava acalmá-la.
— Isso não vai acontecer, esposa — digo, firme. — Jamais permitiria.
— Se eles descobrirem que ela está grávida, vão armar para que aborte — Giulia diz, tão
firme e séria, que me faz ter a certeza de que seria exatamente isso que aconteceria.
Não era mais salvar minha esposa e a Tirreno das mãos de Toni. Era proteger meu filho
que ainda nem nasceu.
— Eu avisei Melissa que vai haver um carregamento na terça. São armas falsas, todas
marcadas. Quando Toni conseguir roubá-las, terei a prova final.
— Matteo disse que Marco Fiorin mandou papeis que provam que o tio está desviando
armas para lucro pessoal.
— Sim, eu sei — apontei. — Mas, ele facilmente poderia dizer que o sobrinho manipulou
os papeis. Eu preciso pegá-lo com a mão nas armas. E ter testemunhas disso. Por sorte, Marco
avisou que o tio vai supervisionar pessoalmente esse carregamento, já que acredita que as armas
dentro dos caixotes são as mais tecnológicas e caras já feitas — expliquei. — Vou fazer uma
reunião com dois ou três membros da velha guarda. Eles podem não me querer como Capo, mas
não irão tolerar deslealdade. A Tirreno não sobreviveu todos esses anos com traição.
Meu olhar caiu em minha esposa novamente. Seus ombros balançaram enquanto ela
chorava desesperadamente. A perspectiva de ser dada a outro pareceu aterrorizá-la, e eu me
culpei por contar, mas precisava que Melina soubesse exatamente o que podia acontecer.
— Se eles matarem você, Klaus... Eu morrerei com você — ela disse, me fazendo sorrir.
— Não diga bobagens, esposa. Vamos envelhecer juntos.
Fiquei de joelhos diante de seus pés, a trazendo para um abraço. Ela cravou as unhas nos
meus ombros, ancorando-se em meu abraço. Seus dedos vagaram hesitantemente pelo meu
cabelo enquanto ela tentava controlar as lágrimas.
— Não deixe que façam mal ao nosso bebê, Klaus.
— Nunca. Eu prometo.

✽ ✽ ✽

Para que Toni não desconfiasse, deixei uma pequena quantidade de guardas protegendo
os caixotes. De onde eu estava, no topo de um prédio ao lado do galpão, tinha uma visão
privilegiada da entrada do porto e também do galpão, onde as armas falsas estavam sendo
mantidas.
— Por que trouxe sua amante essa noite? — Emílio Zapatta, um dos membros mais
velhos da Tirreno, apareceu ao meu lado, arrastando seus pés. — Este não é um lugar para
mulheres.
Giulia o fuzilou com os olhos, enquanto forçava a si mesma a não puxar a pistola a
descarregá-la na cabeça do velho.
— Ela não é minha amante — disse ao homem, que pareceu surpreso. — É a nova chefe
de segurança do Capo. E é minha irmã. Respeite-a.
O homem abriu a boca, espantado. Logo, Marino e Ítalo, outros dois anciões da Tirreno
se aproximaram.
— Sua irmã? Então... Isso é incrível. Não sabíamos que o velho Giacomo tinha uma filha.
Podemos uni-la em casamento com...
— Minha irmã só vai se casar se um dia ela se apaixonar e quiser isso.
— Uma mulher com direitos? — Emílio pareceu chocado.
O vento bateu forte ali. Como seria fácil jogar esses três merdas daqui para baixo, apenas
para nunca mais ouvi-los falar assim de Giulia.
— Meu casamento é cheio de amor. E é o melhor casamento que eu poderia ter. Não
desejo nada menos que isso para minha irmã.
Eu troquei um olhar com Giulia. Depois de Melina e do bebê, ela e Emma eram minha
vida. Eu não deixaria que nada as machucasse. Meu tom foi tão claro aos homens que eles
simplesmente acenaram.
— Mas, então... Klaus — Ítalo chamou minha atenção. Eu encarei o contrabandista de
cabelos brancos com interesse. — Você realmente nos fará passar a noite aqui, nesse frio,
esperando que Toni Fiorin caia em sua armadilha?
— Toni Fiorin está me roubando. Ele quer provar a vocês que não sou capaz de proteger
a Tirreno. Depois vai me matar, e vender minha esposa. Isso não vai acontecer, mas para impedi-
lo preciso que sejam minhas testemunhas do assalto. Sei que o farão, porque servem a Tirreno
com dignidade. Podem não gostar de mim, mas sabem que ser o Capo é meu direito de
nascimento.
Eles trocaram um olhar que foi muito claro. Talvez eles já soubessem dos planos de Toni,
talvez até concordassem com eles, mas, como anciões, eles queriam ser respeitados e, se Toni
não respeitava nem mesmo meu sangue Lazio, por que ele respeitaria três velhos caindo aos
pedaços?
Repentinamente, Giulia se aproxima. Ela tem um Walk Talk nas mãos, e me antecipa:
— Chegaram três carros na entrada do porto. Eles estão vindo na direção do galpão.
Matteo antecipou aos homens que entreguem tudo sem lutar.
Encarei os três velhos depois de ela me avisar isso.
— Senhores, preparem-se para assistir em primeira mão como eu vou resolver uma
traição, assim os tranquilizarei que a Tirreno está nas melhores mãos. Meu sangue Lazio jamais
será derrotado.

✽ ✽ ✽

Os assaltantes levaram os caixotes sem disparar um tiro. Primeiro, eles renderam os


guardas de Matteo, e depois encostaram um caminhão perto da entrada do galpão. De onde
estávamos, assistimos a tudo. Só nos mexemos, quando o caminhão começou a sair do porto.
Eles devem ter acreditado que esse foi o roubo mais fácil de suas vidas.
Se fosse comigo, imediatamente pensaria que havia algo de errado, mas Toni Fiorin era
arrogante, e devia estar se congratulando pelo esquema perfeito que desenvolveu.
Matteo seguiria a carga falsa. E os velhos foram comigo logo atrás deles. Tudo foi feito
tão meticulosamente, que quando chegamos diante de outro galpão, dessa vez um prédio de
tijolos na saída da cidade, nem parecia surpreendente que meus homens o cercassem tão
propriamente que mesmo que Toni tivesse um exército com ele – o que não tinha! –, ele teria que
se render.
Quando Emílio, Marino e Ítalo entraram comigo no depósito, os homens de Toni e o
mesmo já estavam ajoelhados no chão, com as mãos sobre a cabeça.
— Ah, são vocês — Toni tentou mascarar o nervosismo na voz. — Meus homens e eu
descobrimos que havia um roubo em andamento e...
— Já basta! — eu o interrompi. — Não piore a sua situação mentindo descaradamente
para mim e para os anciões.
Peguei um pé-de-cabra em uma pilha de paletes, e o enfiei a tampa trancada de madeira,
forçando-a para abri-la. A fechadura tiniu quando caiu sobre o chão, enquanto eu empurrava a
tampa para cima, e pegava uma das armas de plástico misturado a metal – para dar peso – e a
jogava nos pés de Toni.
— Você achou mesmo que eu não descobriria que estava me roubando? Nada disso aqui
é real, apenas sua deslealdade. E não há como você negar, eu tenho documentos que provam o
que digo. Além disso, Emílio, Ítalo e Marino estão aqui para testemunhar você com a mão na
botija.
Ele engoliu em seco, olhando de mim para a caixa e vice-versa.
— Você armou para mim, Lazio? — ele murmurou. — Armou porque sabe que eu o
tiraria deste cargo que nem devia ser seu. Carlo, seu irmão, era mais preparado. Carlo iria se
casar com Melina depois de tudo. E ele me daria metade da Tirreno por minha lealdade. Mas,
você estragou tudo.
— Carlo tentou violar sua filha — apontei, irritado com aquela coragem repentina. —
Que tipo de pai você é?
— Melina é mulher. Ela nasceu para servir aos homens da Tirreno.
— Mas, Melissa não? Por que sua filha mais velha tem um tratamento diferente?
Ele tremeu diante da minha pergunta. Ainda assim, se recusou a responder. Eu pensei em
forçá-lo com violência, mas Emílio esclareceu tudo:
— Melissa é sua filha de ouro. Toni teve caxumba quando era um garoto, e pensou ser
infértil. Ainda me lembro de como Toni e Lucia queriam adotar um garoto porque acreditavam
que jamais seriam pais. Contudo, Lucia engravidou um tempo depois.
Eu agradeci o homem pela explicação, antes de me volver para o homem no chão.
— Melina também é sua filha.
— Melina nem devia ter nascido — ele despejou. — Devia ter sido um menino. Lucia fez
um exame, e o médico disse que seria um garoto. Você não imagina minha decepção quando
vimos uma menina nascendo.
Eu estava tão irritado que precisei me conter para não o matar agora. Especialmente
porque queria levá-lo até sua casa, descobrir todos os seus planos, pegar documentos que
provavam quem estava do seu lado, e assim matar um por um dos traidores. Não seria dando
uma morte rápida a esse imbecil que teria meus intentos realizados.
— A confissão dele serve como prova final? — indaguei aos anciões que estavam logo
atrás de mim.
— Sim, Capo — Ícaro respondeu, me chamando de líder pela primeira vez desde que me
lembro.
Fiz um sinal para Matteo e Giulia que estava na entrada do depósito, com as armas em
punho, preparados para me defender caso fosse necessário. E então me aproximei deles o
suficiente para falar baixo, assim ninguém nos ouviria.
— Descubra se os homens aqui são apenas contratados de uma noite, ou são leais ao
Fiorin — disse a Matteo. — E você, vá para casa, e explique a Melina o que aconteceu — disse a
minha irmã. — Diga a ela que matarei toda sua família nessa noite.
— É algo muito pesado para falar para uma grávida — Giulia negou.
— Melina é leal a mim — rebati. — E ela precisa saber. Não posso agir nas costas de
minha esposa. Melina deve estar ciente de cada passo que vou dar. Os Fiorin são um problema
que vou que erradicar.
Os dois assentiram. A breve explicação selou o destino de Toni e suas mulheres nessa
noite.
50

sol se pôs no horizonte naquela tarde de terça-feira como costumava fazer todas os dias,
O com sua costumeira e tranquila paz. Não havia nada de diferente no clima, nem tampouco
os seguranças da casa pareciam preocupados ou nervosos.
Eu sabia que meu marido havia ido para uma missão naquela noite, e não podia deixar de
rezar para São Miguel Arcanjo para que protegesse das balas o homem que eu amava.
Diante de um pequeno altar na capela que ficava nos jardins de San Giovanni, me pus de
joelhos, enquanto minha boca proferia diversas vezes uma prece insistente. Nem sei quanto
tempo fiquei aqui, absorvida pela minha fé, até que minha oração foi repentinamente
interrompida por passos atrás de mim.
Girei e vi Emma e Giulia. Emma estava na casa o dia todo, mas Giulia havia saído com o
irmão. O fato de ela ter retornado sozinha me deu repentino horror, que logo foi interrompido
pelas palavras tranquilizadoras de minha cunhada:
— Klaus está bem. Foi ele que me enviou, Melina...
Eu me pus de pé, enquanto as encarava. A capela estava um tanto escura, iluminada
apenas pelas velas que acendi. Eu dou dois passos em direção à Giulia, e aguardo.
Uma parte de mim sabe o que ela vai dizer, mas outra recusa as palavras.
— Klaus disse que chegou a hora.
Meu olhar vai de Giulia para Emma, e então retorna a Giulia. Mais uma vez, eu sei do
que ela está falando, mas quero as palavras inteiras para senti-las no meu coração.
— Chegou a hora de quê?
— Os Fiorin serão mortos nessa noite.
Embora estivesse esperando pelo alívio, esperando que minha alma relaxasse diante da
informação, tudo que senti foi uma punhalada tão forte no meu coração que precisei levar as
mãos para ele, a fim de acalmar a dor terrível que me acometia.
Eu me inclinei para o chão, e Emma logo me segurava em seus braços.
— Por que está doendo? — eu perguntei a ela, as lágrimas deslizando pelo meu rosto,
sem controle.
Emma me trouxe para seu peito, e eu chorei no colo dela.
Quando eu tinha dez anos, Toni Fiorin me levou até San Giovanni para eu ser vendida a
Giacomo Lazio. Eu devia odiá-lo mais que tudo nessa vida, e uma parte de mim o odiava, mas
outra só sofria porque ele era incapaz de me amar.
A imagem de Lucia então chegou a mim. Mamãe e sua elegância, em roupas sempre de
alta costura, com seu perfume suave que fazia meu coração bater tão forte. Durante toda a minha
infância eu sonhei com um abraço dela, exatamente como eu a via dar a Melissa. Por que ela não
podia me amar?
Eu nem sei mais o que sentia por ela. Uma parte de mim sempre esperou que minha mãe
nutrisse qualquer sentimento por mim, mas outra sabia que era algo impossível de acontecer. E
então eu fui arrastada para uma tristeza tão profunda que meu choro se tornou uma lamúria de
pura dor.
A verdade é que eu ainda era a garotinha que queria o amor dos pais e a amizade da irmã.
Eu ainda tinha essas fantasiosas expectativas de que podia haver uma chance. Não aconteceria
jamais, mas no fundo da minha alma, era algo que eu esperava.
Agora eu tinha outra família. Não uma, mas duas irmãs que me amavam e cuidavam de
mim. Um marido que se mostrava leal e generoso, e uma criança no ventre que me daria todos os
abraços que jamais recebi.
E ainda assim, estou chorando pelos Fiorin.
— Querida — Giulia se curvou para mim, segurando minhas mãos. Ela não costumava
me chamar de querida, ela sempre foi um tanto fria no tratamento, mas quando segurou minhas
mãos, sei que minha cunhada queria consolar minha alma, se apiedava dos meus sentimentos. —
Eu sei que está doendo. Não concordo com Klaus sobre isso, mas ele está fazendo tudo que pode
para proteger nossa família, especialmente o bebê que tem no ventre.
Assenti.
— Eu sei, Giulia. Mas, como eu... como vou superar o fato de que meu marido matou
meu pai, minha mãe e minha irmã? Eu sei que eles merecem, sei que não me amam, e sei que
eles fariam mal ao meu bebê, caso fosse necessário. Mas, não há outra saída? Esse nosso mundo
é tão cruel, Giulia... eu só queria que houvesse outra maneira...
— Talvez haja — Emma nos interrompeu. — Tirar todo o dinheiro dos Fiorin e dar uma
ordem direta para todos os membros da Tirreno que qualquer ligação ou contato com os Fiorin
será tratado como traição.
Nós duas encaramos Emma, enquanto a ideia ia se moldando na minha mente.
— Acha que Klaus aceitaria? Isso seria visto como fraqueza... — Objetei, porque por
mais que eu estivesse disposta a salvar meus parentes, meu marido vinha em primeiro lugar.
— Poderia ser visto. Mas, também seria visto como respeito pela esposa. Misericórdia
não é tão ruim assim — Giulia apontou. — Papa João Paulo II dizia que devíamos guardar a
família. Sempre teremos a desculpa de que é o que Vaticano quer.
Repentinamente, Giulia se põe de pé e me puxa com as mãos. Eu a encaro por um
segundo, e então seguro firme. Ela me levanta, enquanto me arrasta para fora da capela.
Havia muita maldade na Tirreno, mas também havia uma ordem moral profunda,
enraizada por Roma há séculos. Essa seria a desculpa perfeita para dar alívio ao meu coração
triste.
Os Fiorin não mereciam, mas eu iria salvá-los.
51

u nunca havia visto a mansão Fiorin tão cercada de gente. Havia guardas armados por cada
E canto, e todos eles me olharam com deferência quando adentrei o térreo ao lado de Giulia.
Uma parte de mim estava assustada por voltar a esse lugar, aonde fui tão infeliz.
Outra, me dizia que era o certo. Eu estava esperando um bebê, e não queria que ele tivesse essa
lacuna em sua vida, de saber que o pai matou toda a família da mãe.
— Mas que... merda — vi as palavras se desenhando nos lábios de Klaus assim que ele
pôs os olhos sobre mim. Eu sabia que ele estava nervoso por me ver aqui, mas sua raiva logo foi
direcionada a outra mulher: — Giulia, você ficou maluca?
— Sua esposa precisa falar com você — ela objetou.
— Agora?
Eu olhei em volta. Estávamos na sala luxuosa, ricamente decorada por mamãe, que fez
um curso de designer de interiores só para cuidar da própria sala. Eu nunca havia parado para
observar como era bonita, e isso me trouxe um sentimento saudosista de algo que nunca vivi.
De meus sonhos em que Lucia me amava...
— Melina, essa não é uma boa hora — Klaus foi na minha direção, e segurou meu braço.
Eu o encarei por algum tempo, como se perguntasse o que ele estava fazendo. Eu sabia a
resposta, e ainda assim queria ouvi-la.
— Será uma longa noite, esposa. Seu pai precisa me dar nomes.
— Onde ele está?
— Em um dos quartos. Matteo está lá com eles.
— Eles? Fala de todos os Fiorin?
— Menos Marco — concordou.
— E onde estão os criados?
— Na cozinha. Eu terei que dar um susto na criadagem para que essa noite não saía
daqui. Mas, não pretendo matá-los.
Assenti. Ele era um homem piedoso. Fosse outro Capo, todos morreriam dentro dessa
casa, antes mesmo do sol nascer.
— Esposa... vá para casa... — ele deixou cair a mão em minha barriga, alisando-a como
se quisesse proteger nosso bebê. — Esse não é o melhor lugar para estar.
— Eu preciso estar aqui, Klaus. Eu vim pedir sua misericórdia.
Ele me encarou como se não acreditasse em minhas palavras. Então, seu olhar saiu de
mim e foi até Giulia, como se esperasse que a irmã colocasse um pouco de juízo na minha
cabeça. Todavia, Giulia demonstrou concordar comigo, o que o fez respirar fundo, irritado.
— Melina, seu pai te vendeu e iria vender novamente. Ele não ama você. Sua mãe e sua
irmã são duas cadelas que jamais pediriam por você.
— Eu sei disso.
— Amor, como pode estar aqui pedindo por eles?
Levo minha mão até seu peito, tocando-o onde é seu coração. Posso sentir as batidas
aceleradas de Klaus sobre meus dedos, e isso me faz sorrir.
— Porque não sou como eles.
Ele suspirou pesadamente, se afastando com as mãos nos bolsos. Seus passos pareciam
desencontrados. Havia outros homens aqui, e todos pareciam atentos a decisão do Capo. Klaus
caminhou de um lado para o outro, ele não estava pronto para uma decisão, e eu não queria
forçar isso nele. Então solicitei:
— Posso vê-los?
— Inferno, Melina... — ele gemeu.
— Por favor, marido.
Outro suspiro pesado, e então ele concordou.
✽ ✽ ✽

Eu não estava esperando ver meu pai com o rosto completamente deformado pela surra
que levou. Conforme entrei no quarto que reconheci como sendo o de meus pais, pude ver
Melissa e mamãe abraçadas em um canto, e papai aos pés da cama, com uma poça de sangue
vazando de suas cavidades.
Matteo me encarou surpreso quando me viu, seu olhar foi de mim para Klaus, como se
questionasse o que diabos meu marido estava fazendo.
— Não foi a sua melhor decisão — Matteo negou, diante do silêncio de Klaus.
Eu não me importava com isso. Queria saber o que sentiria em ver meus parentes
machucados e aterrorizados, mas não senti nada. Apenas, provavelmente, um vazio existencial
que quase me fez chorar.
— Melina! — mamãe gritou, tentando vir até mim, pedindo por minha ajuda. Contudo,
ela não pode se aproximar, porque Matteo a impediu, apontando-lhe uma arma. — Melina, seu
marido está louco. Ele vai nos matar!
Era o que eles mereciam, sabia disso. Volvi meu olhar para minha irmã, uma parte de
mim, uma parte egoísta de mim, quase exigindo que ela me pedisse ajuda, que admitisse pela
primeira vez em sua vida que eu era necessária.
Entretanto, Melissa se absteve de qualquer palavra. Ela apenas baixou a cabeça, como se
estivesse caindo em si, que nem mesmo sua aparência perfeita ou sua tentativa frustrada de
sedução a Klaus, teve qualquer efeito desejado.
— Papai — eu me curvei ao chão, ficando diante de meu genitor. — Dê os nomes dos
traidores a Klaus.
Meu pai mal me via pelos olhos inchados, e gemeu recusando a oferta, como se sua
pouca dignidade pudesse lhe valer de qualquer coisa nessa noite.
— Eles vão vasculhar tudo em seu escritório, e encontrarão o que procuram. Poupe o
tempo deles, e talvez Klaus possa poupá-lo.
— Um Capo não poupa ninguém — ele balbuciou, sangue escorrendo pela sua boca.
— Pai, eu pedirei por sua vida, se mostrar o mínimo de boa vontade — avisei.
Ele bufou, como se a vida não valesse a pena agora que foi desmascarado. Todavia, havia
algo que meu pai se importava mais que tudo, e isto era Melissa. Eu observei minha irmã por um
tempo, e então voltei a falar.
— Papai, pedirei por todos. Melissa é jovem e pode reconstruir a vida dela. Não a
condene a morte, por favor.
Houve um silêncio pesado no ambiente. Pela primeira vez, eu ouço o som de desespero
vindo da jovem garota do outro lado do quarto. Minha mãe correu até ela, e a abraçou. Observei
a cena, ciúme e tristeza me tomando. Eles se amavam, todos eles. Não é que eles não tinham
sentimentos, eles só não o tinham para mim.
Me pus de pé, e me afastei do quarto. Não havia mais nada para ver ou pedir. Fiz o que
precisava, a decisão agora era de Klaus.

✽ ✽ ✽
Caminhei pelos corredores, indo até minha antiga cela, no sótão. Entrei no quarto que me
serviu de abrigo por tantos anos, observando cada detalhe daquele cubículo, comparando-o ao
requintado quarto que vi agora pouco.
O que eu estava fazendo aqui, pedindo pela vida de pessoas que me fizeram tanto mal?
— Você dormia aqui? — Giulia me indagou, às minhas costas.
— Eu lembro de cada segundo presa nesse quarto — respondi. — Parece ter acontecido
há anos, e na verdade nem faz tanto tempo assim. Você acha que fiz certo em pedir misericórdia
pelos meus pais?
Giulia suspirou pesadamente.
— Sim — respondeu, por fim. — Se não estivesse tentando, passaria o resto da vida se
culpando. Agora, tirou de si mesma esse peso. A decisão pertence a Toni Fiorin. É ele que vai
decidir se vai salvar a família ou não. Você fez o que pode.
Caminhei até minha cunhada, e a abracei. Minha ligação com Emma era maior, mas
Giulia também se tornou fundamental na construção dessa nova Melina. Uma mulher confiante,
capaz de perdoar quem lhe fez mal, na mesma medida que é capaz de seguir em frente.
Não importava o que meu pai decidisse. Ele, mamãe e Melissa seriam passado depois
dessa noite.
52

ra incrível que, mesmo assistindo o sol nascer, não sentia sono, completamente nervosa,
E sentada em um dos bancos do jardim, aguardando o desenrolar daquela noite.
Um dos guardas me entregou uma xícara de café, sorrindo na minha direção, como
se quisesse me animar. Eu agradeci prontamente.
— Talvez queira deitar-se um pouco, senhora — ele comentou, depois disso. — Pelo
bebê.
Neguei com a face. Por mais que eu quisesse dar a meu bebê uma noite de descanso, não
conseguiria repousar em um leito sem saber o que aconteceria aos meus pais e minha irmã.
Desde as quatro horas, Giulia sumiu. Eu sabia que ela estava com Klaus e Matteo, e
imaginava que isso significava que meu pai havia feito sua escolha. Ele estava sendo morto ou
estava apenas delatando seus comparsas. Eu aguardei do lado de fora, visitando o jardim como
jamais fiz antes, observando as plantas mexendo com o vento, meus pensamentos nublados pela
incerta.
Repentinamente, passos. Eu giro meu rosto, e vejo meu marido. O guarda
respeitosamente se curva e se afasta, enquanto me coloco em pé e encaro Klaus atentamente.
— O que aconteceu? — indaguei, quando ele segura minhas duas mãos.
— Seu pai perdeu tudo. Vou tirar dele cada tostão. Não terá mais a casa, nem os carros, e
precisará ir para longe, uma cidade no Nordeste ou coisa assim. Terá apenas o suficiente para
comprar uma casa simples num lugar longe de tudo. Levará sua mãe e sua irmã com ele. Se
ousarem voltar, serão mortos. Não haverá piedade numa segunda vez.
Eu suspiro de alívio, abraçando fortemente meu marido. Tinha conhecimento que o
principal motivo para Klaus ter mostrado misericórdia era por mim.
— Ele entregou seus parceiros?
— Sim. Sabe que tentarão matá-lo por traição, então ficará longe porque se voltar, irá
morrer.
— Como mamãe e Melissa reagiram?
Klaus arqueou as sobrancelhas. Eu entendia a confusão que devia ter se tornado o quarto
onde eles estavam.
— Melissa parece não entender a gravidade da situação. Ela começou a chorar e a dizer:
“papai, você prometeu...”. É incrível como uma mulher de vinte e cinco anos parece uma criança
que não recebeu um pirulito.
— A culpa é de meus pais. Eles a mimaram ao extremo.
— Ela com certeza será a que mais irá sofrer, sem os luxos que está acostumada. Pais que
amam muito um filho e são indiferentes ao outro, nem imaginam como essas diferenças podem
prejudicar ambas as crianças. Melina, nunca faremos diferença entre nossos filhos.
Eu acenei em concordância.
— Filhos? Teremos mais de um?
— Seremos como Adão e Eva povoando a terra novamente, meu amor — ele sorriu. —
Matteo e Giulia estão cuidando das coisas lá dentro. Vamos para casa, você não dormiu a noite
toda e eu me preocupo com isso. O bebê precisa descansar.
Balancei a fronte. Meu marido era gentil e cuidadoso. Eu era a mulher mais sortuda do
mundo por causa disso.

✽ ✽ ✽

Acordei em torno das quinze horas, com os dedos de Klaus acariciando minha boceta
encharcada. Ele enroscou seu polegar na minha entrada, me fazendo suspirar, ainda sobre o
torpor do sono.
— Você não acha que mereço uma recompensa por ter poupado seus pais? — ele brincou
ao meu lado, o ar mentolado de sua boca tocando meu rosto.
Girei de lado, ficando de frente para ele. Minha mão balançou, contra seu corpo, tocando
seu pênis até se tornar rocha dura, num movimento ritmado que sempre o fazia gemer.
— Já está descansada? — ele indagou, as mãos se movimentando dentro da minha
calcinha.
— Sim, já dormi bastante — sorri, adorando o carinho.
— Eu gosto como você aperta meus dedos ou meu pau com a sua bocetinha — ele me
contou, enquanto esfregava meu clítoris em movimentos enérgicos. — Eu sempre saio com o pau
esfolado depois de uma noite com você, esposa.
Eu ri. Não era minha culpa, na verdade. O cacete dele era tão grande e grosso, não havia
como eu não o apertar.
Rolei sobre ele, procurando-o, enquanto minha boca buscava seus beijos. A casa estava
tão silenciosa naquele dia, como se todos soubessem que o Capo e sua mulher precisassem
daquele descanso. Eu estava tão satisfeita pelas coisas terem se ajeitado com os Fiorin que nem
pensei em como Klaus precisaria agir dali em diante.
Muita gente, muitos traidores, morreriam nos próximos dias.
Ondulei meus quadris nele, esfregando meu clitóris em movimentos descendentes contra
seu pau nu. Klaus havia se deitado sem roupas naquela manhã, talvez pensando em me amar
quando acordasse. Não sei se era o propósito, mas amei o espaço que tinha, em brincar com o
poder que exercia sob ele, sem precisar ficar arrancando suas roupas.
Repentinamente, ele inverteu as posições, ficando sobre mim. Sua mão envolveu minha
garganta, como ele fez várias vezes no passado, mas não como quisesse me machucar, apenas
porque queria exercer poder. Eu gostava disso, e gemi de puro tesão com o gesto.
— Eu amo você, Melina — ele disse, suas palavras balançando sobre mim exatamente
como seus quadris, buscando meu buraco.
Eu molhei mais, meu corpo preparado para ser dele. Havia espasmos de prazer circulando
pelo meu baixo ventre, e eu inclinei meu corpo, procurando o dele.
Às vezes, Klaus nem tirava minha calcinha, apenas a deslizava para o lado. Dessa vez,
ele levou as mãos ao tecido, puxando com tanta força que a rasgou. O gesto de dominação me
fez gritar de prazer, como se ele estivesse me fodendo.
— Você gosta disso, esposa?
— Sim, por favor... por favor — balancei contra ele.
Klaus afundou num único movimento, como um golpe de espada envolta em mel. Eu
apertei meus lábios com os dentes, mordendo quase ao ponto de arrancar sangue, enquanto ele
bateu no fundo, chegando exatamente naquele ponto que me fazia ver estrelas.
— Ah, Melina... que gostoso... — ele disse.
Havia um sorriso malicioso em seus lábios. Levei as mãos até sua face, segurando-a
enquanto ele balançava em um movimento ritmado contra mim. Observar sua expressão de
prazer era tão tentadora que eu quis gravar esse momento na minha mente.
Deus, eu podia viver para sempre apenas com esse momento...
— Eu te amo — disse para ele. — Eu te amo tanto.
Klaus balançou de novo e de novo. Nossos gemidos perderam-se naquela tarde
abandonada. O mundo podia acabar nesse instante. Nós dois chegamos ao paraíso. Juntos.
53

unca pensei que em seis meses minha barriga estaria tão grande e pontuda. Eu acomodo
N minhas mãos sobre ela, quase descansando do peso, enquanto sorrio para Açucena que me
serve uma xícara de chá.
Açucena veio trabalhar aqui em casa, assim como boa parte dos criados Fiorin. Meu
marido era um homem justo, e devido a inocência daquelas pessoas, ele não acreditava que
mereciam perder seus empregos porque meu pai era um traidor idiota.
— Ainda custo a acreditar que a menina Melina está tão bonita e adorável com essa
barriga — Açucena encara o homem de cabelos negros do outro lado da mesa, que sorri para ela,
animado.
— Eu também estou espantado com o quão bonita ela está — Marco concorda, sua
cabeça balançando de um jeito gentil, o que me faz sorrir.
Nunca fui acostumada a elogios, mas realmente estava me sentindo a pessoa mais
especial do mundo, por causa do bebê. Klaus parecia cada dia mais admirado com o tamanho,
Giulia e Emma estavam sempre conversando com o bebê, Mia e Açucena ficavam me mimando,
empolgadas com a vida que eu estava gerando. Era algo realmente incrível.
— Eu estava com medo de ser mãe — admiti para ele. — Mas, agora, mal posso esperar
para ter o bebê nos braços.
— Já disse que quero ser a babá. Mia e eu estamos disputando o cargo — Açucena lhe
contou, o que o fez rir.
— Acho que essa criança terá muitas pessoas em volta dela, cuidando de seu bem-estar.
O que é bom, não é Melina? Você merece uma rede de apoio.
Na última visita ao Dr. Colombo, no hospital, quando fui fazer exames, conversei com
uma jovem mãe que estava segurando seu bebê nos braços. Ela me disse que seu maior apoio
estava sendo sua mãe, e isso me entristeceu porque Lucia jamais conheceria o neto, nem teria a
menor inclinação para isso. Aquela saudade de algo que nunca experimentei, que sempre sentia
quando pensava na minha mãe, me despertou com força mais uma vez.
Talvez sejam os hormônios da gravidez. Eu preciso superar Lucia.
— Você tem notícias dos Fiorin? — perguntei ao meu primo, que pareceu um pouco
incomodado com minha questão.
— Ah, Melina... Não sei se devo falar deles para você.
— Por favor — peço. — Meu marido não ficará zangado. Ele entende meus sentimentos.
Klaus se mostrava o melhor marido do mundo. Ele não era apenas apaixonado, mas
também respeitava meus limites e meus sonhos. Até me trouxe folders sobre biologia, algo que
eu tinha muita vontade de estudar, dizendo que eu poderia começar o curso depois que o bebê
nascesse, que ele cuidaria do nosso filho para que eu pudesse seguir esse sonho.
— Tio Toni começou a trabalhar em um pequeno escritório de contabilidade. Ele ainda
parece não acreditar no salário que um contador ganha fora da Tirreno. Estou de olho nele por
um tempo, para que não faça nenhuma besteira.
— E mamãe?
— Tia Lúcia não aceita sua nova vida. Acho que eles não se divorciaram porque ambos
não tem o que fazer longe um do outro. Tia Lucia nunca trabalhou, nem sabe como se virar longe
do marido, e viver de uma pequena pensão seria pior para ela. Eles mal conseguem pagar o
aluguel de um apartamento em um residencial popular.
Absorvo a informação com tristeza. Apesar de tudo, não me sinto feliz por vê-los tão mal.
— E Melissa? — Açucena indagou, ao meu lado.
— Ela me surpreendeu — Marco contou. — Soube que Melissa arrumou emprego de
secretária, e está morando perto da praia, dividindo o aluguel com outra funcionária da empresa
onde está trabalhando. Pelo que sei, ela cortou relações com os pais, e voltou para a faculdade.
Eu realmente não esperava que ela reagisse tão bem, mas depois que caiu a ficha de que não teria
mais seus luxos, meio que... ela se tornou uma pessoa normal.
Era estranho, nunca pensei em minha irmã como uma pessoa normal. Sinceramente, nem
conseguia imaginá-la como alguém que trabalha e paga as próprias contas. Nem conseguia vê-la
sem a máscara da arrogância e longe da pessoa mimada que ela sempre foi.
Todavia, não a odiava. Especialmente nesse momento, em que eu estava tão feliz em meu
casamento e com meu bebê no ventre.
— Espero que ela encontre paz — digo, e vejo meu primo concordando comigo.
— Você é uma pessoa de ouro, prima — ele diz. — Estou muito feliz em vê-la tão bem,
até mais gordinha — ele sorri. — Você era tão magra e abatida.
— Eu me alimento melhor agora — respondo. — E eu me sinto parte dessa casa, dessa
família. Nunca me senti uma Fiorin, então não sabia o que era pertencer a algo. Agora sou
totalmente uma Lazio, especialmente porque carrego um no ventre.
— Quando você se casou, eu pedi ao seu marido apenas que não lhe batesse e lhe
permitisse se alimentar. Não imaginava que fosse feliz, porque não pensava em Klaus Lazio
como um homem decente. Mas, depois de tudo, depois de saber sobre Emma e Giulia... Agora
penso que ele foi a melhor escolha para você, mesmo não tendo sido sua escolha.
— No começo eu estava com tanto medo — admiti. — Eu faria qualquer coisa para que
ele não se casasse comigo. Hoje, penso que não poderia ser feliz longe de Klaus. Ele me
completa de todas as formas. Eu o amo.
Meu primo sorriu. Eu sei que ele estava aliviado, percebia durante minha adolescência
que Marco se culpava por não fazer nada para me ajudar. Sempre soube que ele tinha medo de
papai, então nunca tive qualquer mágoa de meu primo por sua apatia. Ao contrário, eu o amava,
e quis protegê-lo no início do meu casamento.
Conhecendo Klaus como eu conhecia agora, sabia que meu marido não faria nada para
machucar Marco se este não merecesse.
— E você, Marco — Açucena nos interrompeu. — Quando irá se casar?
Ele riu baixinho, meio constrangido.
— Não pensava nisso antes, queria apenas aproveitar a vida... Mas, agora que sou o novo
contador da Tirreno, eu penso... talvez Giulia poderia me conceder o privilégio...
— Ela não é muita areia para o seu caminhão? — Açucena provocou.
— Estou pensando alto — ele lhe deu uma piscadela, que fez Açucena rir. — O que acha,
prima?
Eu não achava que Giulia estava disposta a se casar com qualquer pessoa, mas se
acontecesse, seria com Matteo. Eles gostavam de flertar um com o outro. Meu primo não tinha a
menor chance, mas tentei não me envolver, até porque as coisas podiam ser surpreendentes, às
vezes.
Então simplesmente dei de ombros, e voltei a beber meu chá. Ao fundo da cena, capo
nadava tranquilamente ao lado de seus companheiros, e eu gostava do som que a água fazia, bem
mais gentil que as ideias mirabolantes de meu primo.
— Case-se por amor, Marco. Amor é a única coisa que pode fazer um casamento dar
certo.
54

u a vi com seus cabelos loiros balançando ao vento. Sua expressão era doce e serena que eu
E simplesmente caminhei até ela naquela trilha da propriedade, imaginando que Emma estava
atrás de alguma borboleta e pássaro, como sempre fazia para se distrair.
— Acho que vi alguém em meio as árvores — ela me contou tão logo me aproximei, e eu
arqueei as sobrancelhas, olhando para o bosque diante de nós.
Estávamos na encosta da floresta, a uns cem metros do lago. Apesar do isolamento, a
propriedade era cercada de guardas, e ninguém entraria ou sairia de San Giovanni sem ser
percebido.
— Deve ser impressão, minha querida — disse, segurando seus ombros e trazendo para
meu abraço. — Às vezes figuras distorcidas saem dos nossos pensamentos e acabamos por vê-las
diante de nós. Como você está se sentindo?
Emma dá de ombros.
— É difícil sentir qualquer coisa com os remédios — ela comenta. — E você? Faz dias
que não conversamos.
Assenti. Os eventos dos últimos meses me aproximou mais de Giulia. Enquanto
caçávamos e matávamos traidores, Giulia e eu compartilhamos mais que a unidade entre irmãos.
Agora, tínhamos mais que o sangue nas veias, tínhamos o sangue nas mãos.
Emma, de certa forma, era protegida desses eventos. Então, eu mal a via. Sabia que
estava bem, mas não procurava tanto por ela, já que quando saía de manhã, ela ainda dormia, e
quando voltava à noite, ela já havia se recolhido.
— Estou me esforçando para ter tempo para o bebê — justifiquei.
— Em poucos dias, teremos seu filho entre nós — ela sorriu. — Isso é tão mágico, não é
Klaus?
Meu pai governou com mão de ferro, uma parte de mim dizia que era o necessário para
me proteger e a minha mãe. Mas, eu queria governar sobre a lealdade dos que sobrevivessem.
Quero que meu filho ou filha tenha mais na vida do que um pai frio que só pensa em lucro e
sucesso.
— Você está feliz? — Emma perguntou.
— Muito. Demais.
— Já sabe o sexo do bebê?
— Ainda não. Melina sabe, o médico lhe disse, mas eu quero que seja uma surpresa no
parto.
Emma concordou.
— Ela não contou para ninguém. Disse que quer que sua surpresa seja mais genuína.
Irmão, você ficaria zangado se fosse uma menina?
Eu sabia porque da questão. Papai nunca quis filhas, recusou as duas que gerou. Mas, eu
não era como ele, e neguei imediatamente a pergunta.
— Se nascer mulher, será tão capo quanto se nascer homem. Darei ao primogênito o
direito a liderança, não importa o sexo.
Emma sorriu amplamente, mostrando-me todos os seus dentes lindos e enfileirados.
— Você vai ser um pai maravilhoso, Klaus — ela suspirou, afundando-se em meu
abraço. Eu beijei o topo de sua cabeça.
O vento balançou-nos. O verão estava a todo vapor, mais ali, perto das árvores, o vento
era gelado, o que fez com que nosso abraço fosse ainda mais confortável.
— E você será a melhor tia — lhe digo, o que a faz rir.
— Vou sim, mas Giulia não pode saber...
— Tenho quase certeza de que Giulia vai ser a tia maluca dos gatos que vai ensinar um
monte de coisa errada para todos os filhos que Melina e eu teremos — ri, porque era exatamente
o que aconteceria.
Ela ergueu o rosto para mim e sorriu:
— Eu estou feliz por você.
A ausência de um futuro próprio para Emma me deixou tão triste, que precisei mudar de
assunto com ela. Por mais que eu adorasse falar sobre o bebê, não queria que ela pensasse em si
mesma sem uma criança própria.
Emma nunca seria mãe, nem teria o amor de um homem. Não que uma mulher precisasse
disso para viver, mas eu queria que ela fosse completa de todas as formas, inclusive
sentimentalmente.
O que não aconteceria.
Puxei sua mão em direção ao lago, mudando o assunto para as carpas. Enquanto minha
boca falava sobre os novos peixes que Melina queria trazer para casa, eu afundei em
pensamentos sobre o futuro de Emma, sempre dopada pela depressão, sempre protegida de tudo
porque é incapaz de aguentar que – além de nossa família - alguém a toque.
É quase uma mágoa física, que me faz sentir vontade de ir até o túmulo de papai e mijar
sobre ele.
— Eu te amo, minha irmã — murmurei, o que a faz-me encarar, e sorrir. Seus lindos
olhos azuis brilharam para mim.
— É incrível, não é? Eu sei que você me ama, você sempre me amou, mas só passou a
falar sobre isso depois de Melina entrar na sua vida. Ela quebrou muitas coisas em você, Klaus...
seus muros não caíram apenas para ela.
A mulher certa te transforma. Era um fato. Eu concordei com Emma, porque sabia que
Melina me tornou um ser humano melhor. Eu me sentia o homem mais poderoso do mundo ao
seu lado.
55
Final

u sinto a primeira contração em uma noite sem lua, quando estávamos deitados na cama,
E prontos para dormir. Imediatamente, puxo a mão de Klaus entre as minhas, apertando,
dizendo-lhe com os olhos que chegou a hora.
— Tem certeza? — ele indaga, e eu quase dou risada.
Talvez ele pense que a dor alucinante que sinto no meu baixo-ventre é apenas um acaso.
Ou talvez seja o final de uma história que começou quando tive minha primeira tontura e enjoo.
Não há como ser outra coisa, estou com nove meses, e o bebê já devia estar em meus braços.
— Chegou a hora, esposo — explico, porque sei que Klaus precisa das palavras para agir.
Klaus está assustado. Eu vejo em seus olhos, enquanto ele corre pelo quarto, pega a mala
que preparei para a maternidade, e começa a zanzar desencontrado.
Então, ele saí. Sim, ele saiu sem mim, tão idiota e apavorado está. Todavia, ele retorna
dois minutos depois, com os olhos arregalados, desculpando-se enquanto estende a mão para
mim.
Eu estou de camisola e não troco de roupa. Apenas coloco o penhoar para me proteger de
olhares inconvenientes, e vou andando com meu marido pela casa, até chegarmos ao
estacionamento, onde outros homens apavorados começam a correr de um lado para o outro, para
tirar carros do caminho, e pegar um veículo mais confortável.
— Onde está Giulia? — reclamo, porque prefiro ela a esses homens desengonçados ao
meu lado.
— Em missão.
— Jura? Você a mandou para uma missão quando estou parindo?
— Querida, sou seu marido e estarei ao seu lado...
Ele estava à beira de um colapso, prestes a desmaiar. Com certeza o Capo Klaus Lazio
não seria de grande ajuda.
— E Emma? — indago, enquanto vou entrando dentro de uma Suv enorme e preta. Klaus
me auxilia enquanto me ajeito no banco.
— Oh, esqueci de acordar Emma — ele conta, e eu começo a rir, independente da dor
que vem e vai.
Não foi assim que planejamos o parto. Era para ser um momento calmo, onde cada um
saberia exatamente o que fazer. E eu teria Emma e Giulia como presenças femininas para me dar
apoio.
Todavia, cá estou eu, em alta velocidade em direção ao hospital mais próximo, com um
Capo desesperado ao meu lado, sentindo comigo cada contração cada vez mais frequente.
Nem sei explicar como chegamos ao hospital, nem quem fez parte da equipe que me
levou para dentro. Claramente, eu mal vi o rosto do médico Colombo, que tentou me
tranquilizar, dizendo que ainda não estava na hora, e precisaríamos aguardar mais um pouco.
Dez horas, para ser exato.
Dez horas agoniantes em cima de uma cama hospitalar porque me recusei a ter cesárea.
Nos momentos finais, quando já estava desmaiando de dor, eu me arrependi da decisão, mas
quando as contrações me inclinaram a fazer força, junto ao incentivo de Klaus ao meu lado
enquanto eu colocava nosso filho no mundo, soube que deixar a natureza agir foi minha melhor
decisão.
Eu tinha medo da dor pós-parto. Eu li várias coisas sobre isso durante a gravidez, e
planejei que sofreria da dor apenas no momento de dar à luz, recusando-me a pensar que ainda
teria semanas desconfortáveis a seguir – o que aconteceria – minimizando meu medo de
amamentar ou da cicatrização dos pontos.
Eu gritei e chorei durante o parto. Eu queria minha mãe ali, para lhe fazer perguntas e
receber seu conforto, mas, racionalmente, sabia que ela nunca estaria aqui. Eu tinha meu marido,
e precisava apenas acreditar que seu amor me faria aguentar esse momento.
Até que ouvi o choro do bebê.
E, incrivelmente, a dor passou como se nunca a houvesse sentido. Eu fui tomada por uma
emoção tão grande, que não conseguia pensar em nada, apenas no meu filho pequeno, que
parecia me buscar como eu a ele.
— É um menino — Dr. Colombo disse.
Encarei meu marido e vi lágrimas em seus olhos, mas ele piscou rápido e espantou-as. Eu
sorri, cúmplice, entendendo que ele não podia demonstrar emoção apesar de estar vivenciando
isso. Eu guardei a informação do sexo do bebê por meses, apenas para ver esse brilho agora.
Peguei nosso bebê nos braços e deixei que ele descansasse sobre meus seios. O bebê
parou de chorar nesse instante, me reconhecendo.
— Ele é perfeito — ouvi Klaus ao meu lado, sua boca buscando minha testa suada, para
um beijo.
Era verdade. Nosso bebê é perfeito. Mãos e pés no lugar certinho.
— Agora somos completos — disse a ele.
Meu marido assentiu. Klaus sabia que era verdade.

✽ ✽ ✽

— Eu vou te amar tanto, tanto e tanto... — eu ouvi Giulia dizendo, balançando meu filho
nos braços, e não pude deixar de rir da frase. — Vou te sufocar de tanto amor — ela prometeu, e
eu sabia que cumpriria.
— Me deixe pegá-lo um pouquinho — Emma reclamou ao lado da irmã, estendendo os
braços para receber nosso pequeno novo membro da família.
— Qual será o nome dele, Melina? — Giulia perguntou-me e eu encarei meu marido, que
estava meio que deitado com metade do corpo ao meu lado no leito.
Klaus fez uma careta carregada de dúvidas. Na verdade, nós ficamos discutindo nomes
diversas vezes, e não chegamos a um consenso. Lemos várias sugestões na internet, mas nada
parecia se adequar ao futuro Capo da Tirreno.
Precisava ser algo imponente.
— Nós sabemos. Pensamos em Klaus Filho.
— Ah, que nome horrível — Giulia fez uma careta, que me fez rir, e Klaus concordar. —
Não façam isso ao meu menininho...
— Tem alguma sugestão, cunhada? — indaguei.
Ela olhou o bebezinho, e depois volveu para nós.
— Eu acho que deviam homenagear algum santo — apontou. — Isso cairia bem nos
ouvidos do pessoal do Vaticano.
Gostei da ideia, não por conta da opinião dos padres ou coisa assim, mas porque queria
que meu filho tivesse o nome de alguém que se dedicou a ajudar as pessoas.
— Talvez de um apóstolo — Klaus disse, em seguida, me fazendo sorrir, porque a ideia
era fantástica.
— Pedro — disse, tão logo ele terminou de falar. — Pedrinho.
Giulia sorriu, adorando a ideia. Emma balançou o bebê nos braços, animada.
— Oh, Pedro, a titia Emma vai adorar ajudar a cuidar de você — ela comentou.
O nome se encaixava bem. O bebê resmungou, pedindo para mamar, e logo minha
cunhada loira me estendeu meu filho.
A sensação de ter o leite sugado não era exatamente boa, doía um pouco, mas meu amor
por Pedro era tão grande que eu só queria vê-lo bem e se alimentando direitinho. Então, eu sorri
apaixonada, enquanto meu filho mamava meus seios.
— Esposa — a voz calorosa de Klaus me tirou dos pensamentos, me fazendo olhá-lo. —
Eu te amo.
Me senti feliz.
Amada.
Completa.
— Eu também te amo, Klaus — disse a ele.
Nem percebi, mas Emma e Giulia saíram do quarto nesse momento, para nos deixar
absorvidos em nosso momento família.
— Eu sou tão sortudo por tê-la em minha vida.
Ele me beija suavemente, enquanto o tempo parece parar por alguns segundos. O que
mais se precisa para ser feliz? Eu tenho tudo ao alcance dos braços.
Sou, definitivamente, a mulher mais abençoada do mundo.
EPÍLOGO

bebê mexeu-se em meus braços, e eu o balancei animadamente, enquanto o ouvia


O balbuciar sons que lembravam a letra A e E.
— Eu sei. A mamãe é linda — disse a Pedro, percebendo que meu filho estava com
o olhar fixo na mãe, que conversava animadamente ao longe com duas mulheres, esposas de
alguns de meus homens.
— Klaus — ouço a voz de Matteo às minhas costas e giro para ficar de fronte ao meu
melhor amigo. — A cerimônia de batismo foi linda — ele elogiou. — Mais uma vez, eu te
agradeço pelo convite para ser padrinho.
Eu apenas sorri diante da informação. Melina e eu estávamos indecisos entre Matteo e
Marco, Giulia ou Emma, então decidimos dar aos primeiros o título ao nosso primogênito, e aos
outros dois, o do próximo que viesse.
Porque pretendíamos ter mais filhos. Uma família grande, cheia de amor.
— Emma me comentou que está pretendendo levar Melina para uma lua de mel...
— Ainda não decidi. Com o bebê, estamos muito ocupados. Contudo, ainda não tivemos
uma lua de mel, e nosso filho já tem cinco meses. Talvez quando Pedro completar um ano e,
ainda assim, teremos que levá-lo junto, porque não dá pra ficar longe desse moleque — brinquei,
erguendo meu filho a altura do meu rosto, e depositando nele um beijo na bochecha.
— É um fofo — Matteo deu de ombros. — Eu espero um dia ter os meus.
— Vai acontecer no momento certo.
— Não sei. Sua irmã não parece disposta a me dar qualquer oportunidade. Giulia flerta,
mas não...
— Tire o olho da minha irmã — resmunguei. — Você não tem nem chance.
— Hoje, vendo Giulia com o bebê nos braços... eu acho que ela seria uma boa mãe.
— Vocês dois se adoram, mas são amigos — neguei. — Não vai acontecer, porque é
difícil passar a barreira da amizade. Você não é apaixonado por ela, nem ela por você. Precisa
encontrar uma mulher que mexa com o seu mundo, Matteo, assim como Melina mexeu com o
meu.
Como se soubesse que estávamos falando dela, repentinamente, Melina aparece diante de
mim. Ela estende as mãos para nosso filho, e meu garotinho logo se balança querendo ir para os
braços da mãe.
Melina suspira, respirando a pele dele, como se o perfume do bebê fosse a melhor coisa
do mundo. Eu mal posso acreditar em como sou apaixonado por ela, e como meu coração acelera
diante da cena.
— Do que estão falando? — inquiriu.
Matteo dá de ombros, enquanto eu resmungo.
— Sobre Giulia. E sobre Matteo.
— Hum, Marco está interessado nela — minha esposa me contou, como se estivesse
falando sobre o tempo.
— Outro que vai dar com os burros na água — dou risada, porque nenhum deles tem
qualquer chance.
Melina deu um passo a frente, encostando seu corpo no meu. Pus o braço em volta de sua
cintura e a puxei para perto de mim, enquanto ouvíamos Matteo discorrer sobre como ele era
melhor que Marco para Giulia. Toda essa conversa era inútil, porque minha irmã não tinha
interesse em nenhum deles.
— Ei! — ouço a voz de Giulia ao longe, e me volto para minha irmã que se aproxima. —
Vocês viram Emma?
Nós três giramos o rosto ao redor, buscando a loira entre as figuras diversas que estavam
aqui para o batismo de meu filho. Apertei levemente a cintura de minha esposa, antes de deixá-la
e começar a caminhar entre as pessoas.
— Eu não vejo Emma desde o café da manhã — comentei para Giulia, que me seguiu.
Isso foi duas horas antes do batismo, que foi feito às 9 da manhã. Houve o almoço para os
convidados, e agora todos se divertiam no jardim e na piscina.
— Eu também não a vejo desde o café da manhã — a preocupação latente na voz de
Giulia me arrepiou.
Girei meu rosto para onde estivera segundos antes. Matteo já havia saído, provavelmente
também à procura de Emma também. Melina ainda estava lá, com meu filho nos braços, o rosto
não escondia sua preocupação.
— Onde está Emma...? — li seus lábios perfeitos, enquanto meu coração entrava em
desespero.
Meses antes, Emma viu uma figura escondida entre as árvores. Algo gritou dentro de
mim nesse instante.
Eu devia ter dado mais importância ao que ela disse.
Olhei para Giulia. Nós dois, remanescentes do sangue de Giacomo Lazio, de alguma
forma sabíamos que nossa irmã estava em perigo.
... PRÓXIMO LIVRO DA MÁFIA
TIRRENO:
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