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Senhores Deputados,

É sensível a questão acerca do correto tratamento legislativo sobre drogas


ilícitas. Em todo território nacional podemos perceber consequências advindas
do seu uso problemático, do crime organizado movimentado em derredor do seu
comércio ilegal e da debilidade do acompanhamento e tratamento do
dependente.
Várias abordagens são possíveis, desde o enfrentamento policial e bélico
do uso e do tráfico, alimentando a indiscriminada guerra às drogas, até a
liberalidade absoluta, permitindo o uso sem qualquer controle ou limitação para
indivíduos adultos e capazes.
É consenso que a atual política brasileira sobre drogas ilícitas não tem
obtido sucesso quanto à redução de crimes. O exponencial aumento de pessoas
presas em decorrência de delitos associados ao uso e ao tráfico delas demonstra
que não tem havido efetiva prevenção ou dissuasão do uso ou do comércio de
substâncias psicoativas proibidas.
O Levantamento Nacional de Informações Penitenciárias (Infopen), do
Ministério da Justiça, aponta que o Brasil possui uma alta taxa de
encarceramento, com cerca de 726.000 presos no ano de 2016, constituindo-se,
assim, a terceira maior população carcerária do mundo, perdendo apenas para
Estados Unidos (2.145.100 presos) e China (1.649.804 presos), superando a Rússia
(646.085 presos)1.
Desde a década de noventa do século passado a população carcerária
brasileira cresceu 707% (setecentos e sete por cento)2. No entanto, a sensação de
insegurança nunca esteve tão presente. É que o sistema de justiça criminal
“investiga e pune crimes menos graves em detrimento dos mais graves, encarcera
exageradamente presos provisórios e reproduz a desigualdade social e racial do
país”, conforme pontua Marlon Alberto Weichert3.
De fato, apenas 5% (cinco por cento) a 8% (oito por cento) dos homicídios
e latrocínios são investigados com sucesso e, portanto, denunciados. Do volume
total de prisões, apenas 17% (dezessete) por cento constituem encarceramentos
decorrentes de homicídios e latrocínios. Nesse quadro, um montante de 26%
(vinte e seis por cento) das prisões realizadas no Brasil decorrem de tráfico de
drogas ilícitas4.
Quando se faz o recorte de gênero, vê-se que houve um aumento de 656%
(seiscentos e cinquenta e seis por cento) no número de mulheres encarceradas no

1 http://www.justica.gov.br/news/ha-726-712-pessoas-presas-no-brasil. Acesso em 05.09.2018.


2 http://depen.gov.br/DEPEN/noticias-1/noticias/infopen-levantamento-nacional-
deinformacoes-penitenciarias-2016/relatorio_2016_22111.pdf Acesso em 05.09.2018.
3 WEICHERT, Marlon. Prende-se muito mas prende-se mal. In
<http://blogdofred.blogfolha.uol.com.br/2015/07/02/prende-se-muito-mas-prende-se-
mal/ > Acesso em 05.09.2015.
4 http://www.justica.gov.br/news/ha-726-712-pessoas-presas-no-brasil. Acesso em 05.09.2018.
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Brasil, de 2000 até 2016, sendo que 62% (sessenta e dois por cento) delas foram
presas em razão de crimes associados ao tráfico de drogas ilícitas.5
É certo que a solução dos problemas de nosso sistema prisional não é uma
só. Porém é necessário um novo olhar com relação aos custos e benefícios dessa
política estatal sobre drogas ilícitas, que encarcera em massa, não dissuade o uso
problemático nem consegue combater, de forma eficaz, as organizações
criminosas ligadas ao tráfico.
O presente trabalho oferecido ao Parlamento Brasileiro, com o objetivo de
principiar a discussão legislativa para a revisão da Lei de Drogas, foi construído
após 6 (seis) meses de intensos estudos, ricos debates, diversas oitivas de expertos
e audiências públicas de inúmeras entidades e instituições públicas da área, e tem
por intenção adaptar o tratamento legal da questão às novas realidades sociais,
adotando por balizas não apenas os estudos científicos e os comportamentos em
sociedade, mas também as experiências internacionais de rigorismo ou de
flexibilidade quanto ao uso, e de práticas estatais quanto ao usuário dependente
ou não em drogas ilícitas, seja ele problemático ou de vida social normal.
A primeira parte da proposta apresentada cuida da atualização de alguns
conceitos necessariamente inseridos na norma e também da compatibilização do
Sistema Nacional de Políticas Públicas Sobre Drogas Ilícitas com os tempos que
correm.
É possível verificar na proposta a utilização de conceitos já solidificados
no discurso jurídico que se interpola com o tratamento científico do objeto drogas
ilícitas, modernizando a linguagem legislativa e adaptando-a aos consensos
discursivos científicos.
O dano à saúde pública foi inserido com o objetivo de delimitar o bem
jurídico penal que autoriza e limita a criação de norma penal.
Levando em consideração as inúmeras críticas ao conceito de saúde
pública como bem jurídico-penal, geralmente apontando para a insuficiência do
seu conteúdo material,6 é que se estabeleceu a necessidade de objetivo e
verificável dano à saúde de terceiro a fim de evitar presunções de lesões que
habilitem indevidamente o uso da pena de prisão. Com tal disposição buscou-se,
portanto, conferir referente material ao bem jurídico, ao mesmo tempo em que se
reconhece a alteridade como pressuposto legal da intervenção penal.7
No mesmo sentido, utilizou-se o conceito de uso problemático elaborado
a partir das Methodological Guidelines to Estimate the Prevalence of Problem Drug Use,
especificamente a partir da análise que fizeram do Regional Drug Misuse Databases

5 http://depen.gov.br/DEPEN/depen/sisdepen/infopenmulheres/infopenmulheres_arte_07-
03-18.pdf Acesso em 05.09.2018.
6 Apresentam reservas nesse sentido: BECHARA, Ana Elisa Liberatore Silva. Discursos de

emergência e política criminal: o futuro do direito penal brasileiro. In Revista da Faculdade de Direito
da Universidade de São Paulo. vol. 103. Jan./dez, 2008. p. 411-436. ROXIN, Claus. A proteção de
bens jurídicos como função do Direito Penal. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2006. p.09-36.
SCHÜNEMANN, Bernd. O direito penal é a ultima ratio da proteção de bens jurídicos – Sobre os limites
invioláveis do direito penal em um Estado de Direito liberal. In: Revista brasileira de ciências criminais,
n. 53, p. 9-37, mar.-abr. 2005.
7 BATISTA, Nilo. Introdução Crítica ao Direito Penal Brasileiro. 11ª ed. Rio de Janeiro: Revan, 2007,

p. 95.
3

Within the United Kingdom, considerando os fatores socioculturais que


incorporam a problemática do uso.8
Com a finalidade de estratificar as diferentes utilizações que se faz das
drogas ilícitas, desde seu uso isolado e excepcional até aquele permanente e
disfuncional, a fim de modelar políticas públicas mais adequadas, recorreu-se ao
conceito usuário problemático a partir das Methodological Guidelines to Estimate the
Prevalence of Problem Drug Use, da European Monitoring Centre for Drugs and Drug
Addiction ou EMCDDA (Lisboa: EMCDDA, dezembro de 1999).
Também em Grupos de Trabalho Parlamentares do Congresso belga
aparece o conceito de usuário problemático9. Usado na Bélgica desde 2001, esse
conceito é encontrado nos documentos oficiais que informam as políticas
públicas federais, podendo ser caracterizado como o uso acompanhado por um
grau de adição manifestado na impossibilidade de seu controle, expressada por
sintomas psicológicos e físicos. Nesse sentido, o uso não problemático deixou de
ser perseguido e criminalizado pelo Estado belga desde 2003, reconhecendo-se a
impossibilidade e a ilegitimidade de intervir na vida privada do indivíduo
quando ele não cause problemas para terceiros.
Não obstante, há uma série de dificuldades na instrumentalização do
conceito em razão do consenso internacional sobre o que pode ser considerado
uso problemático ou não problemático ainda estar em sua fase embrionária.
Consequentemente, até tal consenso ser atingido, o Brasil deve afirmar sua
soberania estipulando uma conceituação própria, recorrendo a estudos
científicos nacionais e internacionais.
Isso é especialmente importante porque a vagueza ou a falta de clareza
quanto ao conceito pode acarretar incertezas e consequentes arbitrariedades na
aplicação das políticas de drogas ilícitas. Há relatórios (como o citado na nota 13)
que apontam os problemas de um conceito vago, destacando a necessidade de se
empregar critérios objetivos (como a quantidade de drogas). Por isso, optou-se
por mesclar os dois critérios: o conceito de uso problemático e o recurso a critérios
objetivos.
O conceito de dependência foi elaborado a partir da Classificação de
Doenças Internacionais CID-10. É o critério adotado no Brasil pelo Sistema Único
de Saúde – SUS. Ele abrange todas as doenças e foi elaborado pela Organização
Mundial de Saúde. É ainda um conceito de dependência adotado pela SENAD,
conforme o módulo III, Detecção do uso e diagnóstico da dependência de
substâncias psicoativas, do Curso Supera executado em parceria com a Unifesp.10

8 Como ressaltado pelo Conselho Federal de Psicologia, não se pode resumir a discussão de
dependência química como se fatores socioculturais não entrassem em jogo, insistindo nos efeitos
das drogas no sistema nervoso central, de forma dramática e generalizada. CFP. Drogas, Direitos
Humanos e Laços Sociais. pág. 123. Disponível em:
https://site.cfp.org.br/wpcontent/uploads/2013/07/Drogas-Direitos-Humanos-e-Laco-
Social.pdf
9 Cf. MUYS, M. and DECORTE, T. (2005). "Problematic Use" of (ilegal) drugs: a study of the

operationalisation of the concept in a legal context in Belgium. In: KRAUS, L.; KORF, D. J. (eds).
Research on Drugs and Policy from a European Perspective. Lengerich: Pabst Science Publishers,
p.62-77.
10 O reconhecimento da dependência como um estado agravado e, portanto, mais restrito que o

uso problemático já foi reconhecido inclusive pela própria Senad. Ver o conceito de dependência
em: https://www.supera.senad.gov.br/@/material/mtd/pdf/SUP/SUP_Mod3.pdf (p. 16/17)
4

A proposta também enfrenta questão muito sensível que se refere ao uso


religioso, terapêutico ou científico de drogas ilícitas, haja vista a necessidade
plena de regulamentação dessa possibilidade, desviando-a da ilegalidade mas
sem deixá-la como cláusula aberta para possíveis distorções.
A necessidade do uso religioso, terapêutico ou científico é afirmada pelo
art. 5º, 2. da Convenção sobre Substâncias Psicotrópicas de 1971, bem como a
inviolabilidade da liberdade de consciência, crença e exercício de cultos religiosos
disposta no artigo 5º, VI, da Constituição Federal e no artigo 12 da Convenção
Americana sobre Direitos Humanos, assim como a regulação existente nos arts.
2º, 4º e 5º da Portaria 344/98 da Anvisa.
A proposta reconhece a juridicidade de tais usos, mas remete ao ato
administrativo o estabelecimento de limites e padrões de possibilidades. Porém,
quanto ao uso medicinal, as Disposições Transitórias sugeridas já estabelecem
esses padrões regulatórios, os quais teriam vigência até o surgimento da norma
administrativa específica.
Também se permite – na mesma seara da espera de regulação específica –
o uso medicinal para a cura do próprio dependente em drogas ilícitas. Essa
estratégia de tratamento não pode ser mantida fora do espectro legal.
Como mostram pesquisas mais recentes, para certos grupos de indivíduos,
a opção pela abstenção gradual é facilitada ou só se torna possível recorrendo a
drogas ilícitas mais leves ou seus componentes, ou ainda a doses gradualmente
menores, embora essas conclusões ainda não sejam amplamente generalizáveis.
Como apontam diversos estudos internacionais, enquanto o Δ(9)-tetracannabinol
pode ter como efeito a sensibilidade aumentada para outras drogas, o
cannabidiol (CBD) propriamente dito, ao contrário, pode minimizar a tendência
por busca de drogas11.
Isso se dá no contexto da proposta em razão da necessidade de
compreender a questão de saúde pública que desborda da mera questão criminal
e que perpassa a busca da realização do direito à liberdade e do princípio da
dignidade da pessoa humana;12
Quanto à questão conceitual da dependência em drogas ilícitas, cumpre
observar que a multiplicidade de fatores na produção da dependência e do uso
problemático resta comprovada pelas produções científicas mais atuais na área13
bem como pelos principais relatórios oficiais que abordam a questão:
Methodological Guidelines do European Monitoring Centre for Drugs and Drug
Addiction (EMCDDA). Por esta razão, a proposta guarda fidelidade aos consensos

11 Nesse sentido: REN, Yanhua (et al). Cannabidiol, a Nonpsychotropic Component of Cannabis,
Inhibits Cue-Induced Heroin Seeking and Normalizes Discrete Mesolimbic Neuronal Disturbances. In:
Journal of Neuroscience, 2009, p. 14764-14769; SOCÍAS, M. Eugenia et al. Intentional cannabis use to
reduce crack cocaine use in a Canadian setting: A longitudinal analysis. In: Addictive Behaviors. vol.
72, 2017, p. 138-143; HURD, Yasmin L. et al. Early Phase in the Development of Cannabidiol as a
Treatment for Addiction: Opioid Relapse Takes Initial Center Stage. In. Neurotherapeutics,vol. 12, 2015,
p. 807- 815.
12 SCHEERER, Sebastian. Dominação ideológica versus lazer psicotrópico. In: RIBEIRO, MM; SEIBEL,

S. D. (orgs). Drogas: hegemonia do cinismo. São Paulo: Memorial; 1997. p.287-300.


13 HART, Carl (et al). Drugs, society and human behaviour. 13ª ed. McGraw-Hill, 2008; NUTT, David

et al. Drug harms in the UK: a multicriteria decision analysis, etc.


5

científicos e às construções técnicas mais aptas ao enfrentamento do grave


problema da dependência em drogas ilícitas.
Desta maneira, foram estabelecidos critérios científicos e objetivos para
conceituar de maneira clara o campo daquilo que pode ser considerado
dependência. Reconheceu-se a necessidade de políticas públicas baseadas em
evidências, evitando subjetivismos.
Outro ponto importante foi a juridicização da proteção do usuário que
assume seu uso problemático, impedindo-se a incriminação de usuários pela
participação em programas de prevenção e redução de dados do uso
problemático, garantindo o direito à liberdade (art. 5º, caput, da Constituição da
República).14
A proposta também buscou firmar a importância de embasamento das
políticas públicas em pesquisas transdisciplinares, algo especialmente
importante na política de drogas como deixa claro o estudo de Phillippe
Bourgois.15
Para tanto, determinou-se a incorporação dos avanços científicos na
avaliação de riscos do uso de drogas ilícitas tanto para si quanto para outros, em
específico a análise decisória multicriterial que trata de fatores sociais,
psicológicos e físicos16.
Especialmente no que diz respeito às terapias direcionadas a dependentes
e usuários problemáticos, buscou-se reduzir os espaços de discricionariedade e
destacar que estipular e ministrar cuidados terapêuticos exige embasamento em
evidências científicas.
Percebeu-se que uma política pública de drogas ilícitas só poderia ser
realizada de forma legítima se alimentada constante e ininterruptamente por
dados coletados e sistematizados de maneira padronizada, a fim de evitar
qualquer viés ou discrepância de informação de acordo com Unidades da
Federação, Instituição responsável ou o protocolo utilizado, o que poderia gerar
uma falsa representação do objeto analisado ou conclusões conflitantes.
Evidentemente trata-se de uma norma com forte carga programática, mas
com viés de construção de um modelo de profissionalização do trato das
questões.
14 Bourgois aponta que políticas de prevenção e redução de danos ao uso problemático como o
fornecimento de seringas podem não ser eficazes se facilitarem a incriminação dos usuários.
BOURGOIS, Phillippe. Useless suffering. The war on homeless drug addicts. In: GUTERSTON, Hugh;
BESTEMAN, Catherine (eds). The insecure American. How we got here and what we should do about
it. Berkeley: University of California Press, 2010, p.238-254. Disponível em:
http://www.philippebourgois.net/articles/Edited%20Gusterson%20Besteman%20Homeless%
20Suffering.pdf. Acesso em 20.08.2018
15 O trabalho de Bourgois revelou que o combate às relações hierárquicas de gênero poderia ser

mais importante que outras medidas comumente mais prestigiadas no campo da epidemiologia
para a prevenção do HIV e da Hepatite entre usuários de drogas. Ver mais em: BOURGOIS,
Phillippe. Anthropology and epidemiology on drugs: the challenges of crossmethodological and theoretical
dialogue. In: International Journal of Drug Policy, 2002, p. 259-269. Disponível em:
https://pdfs.semanticscholar.org/63a1/e8ec3ad4836fecbc125cc4351e1c87fe9e29.pdf. Acesso em:
18-08-2018.
16 Referimo-nos ao estudo paradigmático desenvolvido por NUTT, David et al. Drug harms in the

UK: a multicriteria decision analysis. Lancet, vol. 376, 2010, p. 1558–65. Disponível em:
https://www.thelancet.com/journals/lancet/article/PIIS0140-6736(10)61462-6/abstract.
Acesso em 16-08-2018.
6

Também optou-se por juridicizar o uso de critérios de classificação de


drogas ilícitas quanto a seu risco, tendo por referência o Methodological Guidelines
to Estimate the Prevalence of Problem Drug Use on the Local Level, do European
Monitoring Centre for Drugs and Drug Addiction ou EMCDDA. Já os elementos que
informam os critérios de classificação em si foram informados pelo já
mencionado estudo de David Nutt, Drug harms in the UK: a multicriteria decision
analysis. Esses elementos correspondem a um refinamento das diretrizes do
EMCDDA, realizado por especialistas em drogas, majoritariamente membros do
Independent Scientific Committee on Drugs (ISCD) e dois especialistas externos com
grande experiência em pesquisa na área, todos selecionados para apresentação
de análises independentes e sem conflitos de interesse em relação ao objeto de
pesquisa.17 18
Já quanto à necessidade de modulação de políticas públicas, a ideia guarda
respeito ao princípio da isonomia, o que exige atenção às necessidades específicas
de diferentes segmentos populacionais. A atenção aos diferentes vetores que
precipitam, em pessoas distintas, com trajetórias próprias, o uso problemático ou
a dependência está intimamente vinculada à possibilidade de sucesso dessas
políticas.
Parte do esforço de elaboração de políticas públicas focadas nas
especificidades de grupos vulneráveis justificou a previsão de cuidados
diferenciados com pessoas que sofrem de doenças ou enfermidades mentais,
uma vez que elas estão especialmente expostas ao uso problemático ou à
dependência e contam mais raramente com redes sociais de apoio.
Considerando que uma parte significativa das situações conflituosas se
deve a interações baseada na desinformação, previu-se a necessidade de políticas
direcionadas a informar o público e as forças policiais, de maneira a reduzir essas
interações violentas, sejam elas baseadas no simples desconhecimento de direitos
ou dos avanços internacionais feitos na área, ou por preconceito.
Nenhum dos objetivos ou finalidades estipulados pela reforma da Lei
seriam alcançáveis se o poder público optasse por repassar verbas e aliar esforços
a entidades privadas ou órgãos públicos que se norteassem por valores
qualitativamente diversos dos estipulados por Lei aprovada pelo Congresso.
Seria, efetivamente, uma forma de ladear o processo político e legislativo
constitucionalmente instituídos. Por essa razão, optou-se por estabelecer toda
uma gama de princípios retores a nortear as políticas públicas atinentes à espécie.
Diante disso, impende notar que a presente revisão cuidou de enfatizar a
preocupação com a redução de danos. Esta consiste em uma abordagem que tem
por objetivo minimizar os efeitos deletérios à saúde do usuário de substâncias
psicoativas proibidas, promovendo conhecimento da população sobre os reais
efeitos de cada droga ilícita e o autocuidado e a reflexão por parte do usuário.

17 Todos esses critérios correspondem ao que foi estipulado na Figura 1 do estudo. Para ver mais
sobre o caráter científico e imparcial do grupo de pesquisa ver em: NUTT, David et al. Drug harms
in the UK: a multicriteria decision analysis. Lancet, vol. 376, 2010, p. 1558-1559. Disponível em:
https://www.thelancet.com/journals/lancet/article/PIIS0140-6736(10)61462-6/abstract.
Acesso em 16-08-2018.
18 BOURGOIS, Phillppe. Crack and the Political Economy of Social Suffering. In: Addiction Research

& Theory, Volume 11, 2003, p. 31-37. Disponível em:


https://www.tandfonline.com/doi/abs/10.1080/1606635021000021322. Acesso em: 18-08-2018.
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A primeira adoção de política de redução de danos de que se tem notícia


ocorreu na Inglaterra, em 1926, com a publicação do Relatório Rolleston: médicos
passaram a indicar opiáceos para usuários dependentes em heroína, como forma
de evitar os riscos da síndrome da abstinência. A experiência seguinte se deu no
ano de 1984, quando o governo holandês, atendendo à preocupação da chamada
Liga de Dependentes (ou Junkiebond), uma espécie de associação dos usuários de
drogas injetáveis, alarmada com os índices de contágio de hepatite, criou o
primeiro programa de distribuição e troca de agulhas e seringas19. Desde então
outros países adotaram tal política pública, como Austrália, Canadá, França,
Escócia e Inglaterra20.
No Brasil, a redução de danos como política pública se deu oficialmente,
pela primeira vez, em 1989, na cidade de Santos/SP, com a distribuição de
seringas aos usuários de drogas injetáveis, não sem muita resistência por parte
de vários setores da sociedade. Hoje, a redução de danos é reconhecida pelo
Ministério da Saúde como estratégia de saúde pública no Brasil, e tem como
objetivo a prevenção das DSTs, AIDS e hepatites entre usuários de tais
substâncias proibidas injetáveis21.
Os arts. 18 a 26 constantes do texto atual da lei colocam a questão da
prevenção de forma abrangente. A proposta acrescenta compreensões mais
avançadas e contemporâneas acerca da redução, priorizando a educação acerca
dos efeitos do uso de drogas ilícitas e também os cuidados necessários
disponíveis ao usuário dependente.
Questão central da proposta apresentada pela Comissão diz com o
tratamento dado ao usuário de drogas ilícitas, e a objetivação da diferenciação
entre usuário e traficante no modelo legal brasileiro.
A qualificação legal do uso próprio de pequenas quantidades de droga é
um dos pontos basilares da proposta apresentada.
Muitos países, nas últimas décadas, têm buscado alternativas, que não
passem necessariamente, em todos os casos, pelo tratamento jurídico-penal desse
grave problema. Medidas concretas têm sido adotadas, tanto pelos governos
quanto por via legislativa ou judiciária, direcionadas a tornar mais flexível a
legislação e o enfrentamento da questão das drogas ilícitas.
Nota-se, assim, uma tendência mundial a descriminalizar o uso privado
de pequenas porções de drogas ilícitas, ou pelo menos da mais comum delas – a
maconha – com políticas públicas de redução de danos, de assistência social,
médica e psicológica a dependentes, oferta de alternativas a quem deseja ou
necessita afastar-se da adição, ou mesmo, para aqueles que não são usuários
problemáticos, com previsão de medidas menos sancionadoras (30 países, no
início de 2016, já haviam adotado alguma política descriminalizante).
Diversas agências das Nações Unidas, incluindo UNAIDS (Programa
Conjunto das Nações Unidas sobre HIV/AIDS), OMS (Organização Mundial de

19 http://edelei.org/pag/reducao-danos. Acesso em 05.09.2018


20 Machado, Letícia Vier; Boarini, Maria Lúcia. Políticas sobre drogas no Brasil: a estratégia de redução
de danos. Psicologia: Ciência e Profissão. Print version ISSN 1414-9893. Psicol. cienc. prof. vol.33 no.3
Brasília 2013. http://dx.doi.org/10.1590/S1414-98932013000300006. Acesso em 05.09.2018.
21 Machado, Letícia Vier; Boarini, Maria Lúcia. Políticas sobre drogas no Brasil: a estratégia de redução

de danos. Psicologia: Ciência e Profissão. Print version ISSN 1414-9893. Psicol. cienc. prof. vol.33 no.3
Brasília 2013. http://dx.doi.org/10.1590/S1414-98932013000300006. Acesso em 05.09.2018.
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Saúde), OHCHR (Escritório do Alto Comissário das Nações Unidas para os


Direitos Humanos), UNODC (Escritório das Nações Unidas sobre Drogas e
Crime) já expressaram a necessidade de descriminalizar a posse de drogas para
uso pessoal e os dados coletados pelo Observatório Europeu da Droga e da
Toxicodependência (EMCDDA), uma das agências descentralizadas da União
Europeia, também sinalizam nessa direção.
Essa nova orientação dos países ocidentais bem se traduz no pensamento
de Kofi Annan, ex-secretário-geral da ONU e membro da Comissão Global de
Políticas sobre Drogas, em discurso perante a 68ª Assembleia Mundial de Saúde,
em Genebra, em 19/05/2015:
“Já disse e repito: as drogas já destruíram muitas vidas, mas as políticas
governamentais equivocadas destruíram muito mais. A ficha criminal por
um delito leve envolvendo drogas pode ser uma ameaça muito maior ao
bem-estar do jovem que o uso ocasional de drogas.”
Como pontuado pela Comissão Global de Política sobre Drogas (Taking
Control: pathways to drug policies that work, 2014),
“a criminalização é uma política oposta a uma abordagem pragmática,
centrada na saúde e na redução de danos sociais; é, com efeito, uma política
de maximização de danos.”
No Mesmo sentido Helen Clark, administradora do Programa para o
Desenvolvimento das Nações Unidas (2013), ao sustentar, no mesmo relatório,
que a abordagem na questão das drogas ilícitas deveria ser
“primacialmente uma questão social e de saúde, mais do que uma questão
criminal”.
Em Relatório de 2016, sobre os Avanços na Reforma de Políticas sobre Drogas:
Uma nova abordagem à descriminalização, a Comissão Global de Política sobre
Drogas é ainda mais enfática, ao recomendar:
“Os Estados devem acabar com todas as penalidades – criminais e cíveis –
pela posse de drogas para uso pessoal e pelo cultivo de drogas para consumo
próprio. Milhões de pessoas em todo o mundo usam drogas e o fazem sem
causar mal a outros. Criminalizar os usuários é ineficaz, prejudicial e
enfraquece o princípio da dignidade humana e do Estado de direito.”
Existem diversas estratégias e consequentemente diversos olhares para a
questão das drogas ilícitas, mas notam-se variantes que giram em derredor dos
seguintes pontos: i) legalizar o cultivo, o comércio e o consumo de drogas ilícitas,
mediante controle governamental; ii) manter a proibição como regra, mas
permitir que as agências oficiais do Estado deixem de acionar o sistema de
persecução penal em casos onde esta se mostrar desaconselhável; iii) permitir o
uso medicinal da droga ilícita, mediante certas condições; iv) descriminalizar,
mesmo para fins recreativos, o consumo de todas as drogas, ou de alguma ou
algumas delas, fixando parâmetros, condições ou limites quantitativos toleráveis
que permitam aceitar que o portador da droga ilícita não é obrigatoriamente
traficante, mas apenas usuário.
Essa descriminalização pode ser implementada: i) mediante imposição de
certas condições ou sanções administrativas, homólogas às sanções do direito
penal (multa, prestação de serviços à comunidade, advertência, perda ou
suspensão de direitos etc); ii) por meio de acompanhamento terapêutico, médico
ou psicossocial ao usuário, em caráter obrigatório ou não.
9

Não há, por óbvio, unanimidade quanto ao total acerto das políticas
descriminalizantes, mas o pensamento que prevalece é o de que os riscos e os
aspectos negativos dessas políticas são menores do que a manutenção do clássico
modelo de criminalização total do uso de drogas ilícitas.
Merece enfático registro, sem embargo, que eventual descriminalização do
consumo pessoal de pouca quantidade de drogas ilícitas não implica qualquer
apoio, pensamento ou ação favorável a tal prática, pois são inquestionáveis os
danos que o consumo delas – como de resto o de tabaco ou álcool - causa à saúde
física e psíquica do usuário, como também à saúde pública, com reflexos numa
infinidade de pessoas, próximas dele ou não.
Daí por que devem ser cada vez mais intensificados os programas
desenvolvidos junto à comunidade – especialmente entre jovens –, para o
honesto esclarecimento acerca dos efeitos nocivos das drogas em geral, como
também deve haver maciça publicidade contrária ao seu consumo, como foi feito
em relação ao álcool e ao tabaco, cujos índices de consumo deste último
reduziram-se drasticamente nas últimas décadas mercê de uma forte ênfase dada
à informação e à publicidade negativa.
De todo modo, devem-se reconhecer como ainda mais danosos os efeitos
causados pelo maciço encarceramento e pela estigmatização produzida em quem
ingressa no sistema de justiça criminal por uma ocorrência que, em boa parte dos
casos, poderia receber outro tipo de abordagem pelo Estado e pela sociedade.
De fato, a exposição dos usuários e dos pequenos traficantes ao sistema
prisional, impingindo-lhes o convívio com criminosos experientes e violentos, e
oferecendo-os às facções criminosas que em muitos países – como é o caso do
Brasil – dominam o ambiente carcerário, não se mostra a alternativa mais
inteligente, mesmo para o pequeno operário do tráfico, visto que os desfalques
na linha de produção, distribuição e comercialização das drogas ilícitas são
incontinenti repostos, com o recrutamento de mais jovens da periferia, que, ante
a ausência de oportunidades e de perspectivas, encantam-se com promessas de
ganhos fáceis que a mercancia ilícita de drogas parece proporcionar.
Como alerta o pesquisador, sociólogo e professor do Departamento de
Sociologia da Universidade Federal de São Carlos (UFSCar) Gabriel Feltran,
entrevistado sobre seu livro Irmãos – Uma História do PCC, o modelo atual de
segurança e combate ao tráfico no Brasil “produz crime”, tirando um vendedor
de droga ilícita da rua e colocando-o na cadeia. “O lugar que ele ocupa no
mercado, vai ser ocupado no dia seguinte por outro. Então você passa a ter um
preso e um aqui esperando pra ser preso, pra você ter dois presos e outro aqui.”
A par dos efeitos deletérios causados pelo uso abusivo ou problemático
das drogas ilícitas, afirma-se que o tratamento institucionalizado pelo sistema de
justiça criminal produz uma identidade negativa do usuário e do pequeno
traficante com o mundo do crime, causando-lhes, amiúde, a exclusão social, a
perda de saúde, a redução de habilidades e potencialidades individuais e o
distanciamento do mercado de trabalho formal.
O debate, portanto, sobre a criminalização ou não do uso de drogas ilícitas
e a maneira como lidar com essa questão precisa, por óbvio, considerar a
realidade brasileira, com todas as nuanças e singularidades que caracterizam
nosso povo e nossos costumes.
10

Antes, todavia, convém examinar, à vol d'oiseau, qual tem sido a


abordagem de alguns países nessa temática.
Tomou-se como fonte principal o relatório A Quiet Revolution: Drug
Decriminalisation Policies in Practice Across the Globe (Niamh Eastwood, Edward
Fox et Ari Rosmarin, 2016, sob o patrocínio da Open Society Foundation).
Na grande maioria dos países se percebe a escolha por estabelecerem-se
parâmetros ou limites quantitativos para se considerar alguém como usuário, e
não traficante, de uma determinada droga ilícita, de sorte a considerar criminosa
a conduta de possuir, guardar ou portar qualquer quantidade acima do limite,
ainda que, eventualmente, essa droga ilícita seja direcionada ao uso pessoal.
É mister, no entanto, ter a percepção de que, em muitos casos, algumas
pessoas flagradas com quantidades maiores do que os limites indicados para a
respectiva droga ilícita não necessariamente estarão imbuídas do propósito
mercantil. Isso porque não se há de excluir a possibilidade de que a maior
quantidade de droga ilícita decorra do simples desejo de evitar manter contatos
mais frequentes com o mercado negro ou simplesmente porque se trata de
usuário com maior tolerância ou dependência em relação àquela droga ilícita. Da
mesma forma, mesmo que flagrado com quantidade abaixo do limite, poderá o
portador da droga ilícita ser criminalmente responsabilizado por tráfico, se
houver evidência nesse sentido.
Por tal razão, os limites ou parâmetros quantitativos de drogas ilícitas
devem servir como orientação, sujeita a avaliação criteriosa da autoridade
judiciária, e não como único e absoluto indicativo de distinção.
No processo de construção da presente proposta observou-se um
conjunto de estratégias adotadas por diversos países:
ARGENTINA
Na Argentina – segundo maior consumidor de cocaína na América Latina
– a Suprema Corte proferiu em 2009 a decisão Arriola, em que declarou
inconstitucional a legislação que criminaliza o porte de drogas ilícitas para uso
pessoal, sob o argumento de tratar-se de violação do direito individual à
privacidade e autonomia pessoal.
Desde 2009, tem havido várias tentativas de reformar a legislação para
refletir a posição do Supremo Tribunal, mas até hoje nenhuma foi aprovada pelo
Congresso, mesmo quando o governo de Cristina Kirchner submeteu ao
Legislativo o novo Código Penal em 2014. Atualmente, embora muitos tribunais
de primeira instância tenham iniciado a aplicação da decisão Arriola, ao rejeitar
casos envolvendo posse de pequenas quantidades de drogas ilícitas, algumas
forças policiais não ajustaram suas práticas. Aproximadamente, 70% de todas as
detenções por drogas envolvem posse para uso pessoal.
AUSTRÁLIA
A Austrália tem implementado políticas de descriminalização da cannabis
há mais de 25 anos, embora não em nível nacional. Atualmente, existem três
jurisdições que possuem leis que descriminalizam a posse e o cultivo de
marijuana para uso pessoal.
Foi concluída uma pesquisa significativa sobre os efeitos das políticas de
descriminalização da maconha. Alguns estudos sugerem um aumento
estatisticamente significativo no consumo, enquanto outros afirmam o contrário.
11

Todos concordam, no entanto, que a descriminalização não resultou na explosão


catastrófica do uso de cannabis prevista por muitos como resultado da
descriminalização.
Uma consequência importante do sistema australiano de
descriminalização de direito e de fato é que a Austrália tem taxas muito baixas
de prisão por delitos de drogas, com menos de 1% dos criminosos presos por uso
ou posse.
BÉLGICA
A Bélgica aprovou leis em 2003 criando uma distinção legal entre o porte
de maconha para uso pessoal e outros tipos de delitos de drogas ilícitas, por meio
da criação de um sistema de penalidades administrativas. As leis foram
emendadas e complementadas por uma diretriz do Ministro da Justiça e do
Procurador-Geral publicada em 2005, determinando que os adultos encontrados
com menos de 3 gramas ou apenas uma planta de cannabis para uso pessoal
seriam objeto de um simples registro.
Se houver circunstâncias agravantes – por exemplo, posse de cannabis em
uma penitenciária ou em lugares onde menores de idade se reúnem (ou nas
imediações) – penalidades mais sérias podem ser aplicadas, incluindo 3 meses a
um ano de prisão e multa.
Todas as demais substâncias entorpecentes que não a cannabis são
criminalizadas. Em outubro de 2014, a coalizão de governo da Bélgica emitiu uma
declaração afirmando que "todo uso de drogas é ilegal", de modo que o uso e a
posse de cannabis em público não é tolerado.
CANADÁ
Em 2017, o Good Samaritan Drug Overdose Act foi aprovada para proteger
as pessoas no local de uma overdose de algumas acusações de porte, de modo a
encorajar as pessoas a ligar para o 911 em busca de atendimento médico de
urgência.
Em 2018, foi aprovado o Cannabis Act, também conhecido como Bill C-45,
que entrará em vigor em 17/10/2018, com o fito de legalizar o uso recreativo de
cannabis em todo Canadá. Combinado com o Bill C-45, uma lei para alterar o
Código Penal, tornará o Canadá o segundo país do mundo – juntamente com o
Uruguai – a legalizar o uso recreativo de maconha, desde que por indivíduos
maiores de 18 anos e no limite de posse de 30 gramas.
As vendas legais serão realizadas em lojas de varejo ou pelo correio. As
províncias são responsáveis pela criação de um sistema para as vendas no varejo
e os indivíduos terão permissão para cultivar até quatro plantas para uso próprio.
Embora a venda de comestíveis (assados, bebidas, etc.) não seja permitida
inicialmente, os indivíduos podem fazer comestíveis em casa para seu próprio
uso.
As empresas poderão marcar seus produtos, mas devem evitar qualquer
coisa que pareça atrair diretamente os jovens, como personagens de desenhos
animados, animais ou o endosso de celebridades. O patrocínio de eventos
também não é permitido. As empresas também podem usar informações factuais
em suas embalagens, como os níveis de THC, que ajudem os consumidores a
tomar uma decisão sobre qual produto comprar. A promoção só é permitida em
lugares onde os jovens não possam vê-la.
12

CHILE
Desde 2005, pessoas surpreendidas na posse de drogas ilícitas destinadas
a "uso pessoal exclusivo e consumo em um futuro próximo" passaram a não mais
ser objeto de processo criminal.
Como não existem critérios de distinção sobre uso e tráfico, o juiz deve
determinar se os entorpecentes são destinados ao uso privado, quando a prova
não permitir inferir a sua finalidade, ao mesmo tempo em que o ônus legal de
provar que a posse era para uso pessoal recai sobre a pessoa.
Se o indivíduo for preso por uso ou posse em local público, o juiz poderá
impor multas, tratamento forçado, serviço comunitário e/ou suspensão de sua
carteira de habilitação. Isso também se aplica ao consumo na esfera privada, se
dentro de um grupo reunido com esse propósito.
Embora a maioria dos casos de posse termine em uma sentença suspensa
ou em sanções administrativas, um número elevado de detenções ainda é
realizado para delitos de pequena monta, com alguns resultando em prisão.
Recentemente, o ímpeto para descriminalizar totalmente as drogas no
Chile cresceu, sobretudo em relação à maconha. A Câmara dos Deputados
aprovou em julho de 2015 um projeto de lei que descriminaliza a posse para
consumo privado até o limite de 10 gramas de cannabis, bem como o cultivo
privado até 6 plantas. Todavia, antes de o Senado aprovar o texto, o Poder
Executivo recomendou que os limites fossem reduzidos para apenas 2 gramas e
1 planta. O processo legislativo permanece pendente de conclusão.
COLÔMBIA
A posse de drogas para uso pessoal foi inicialmente descriminalizada na
Colômbia em 1994, quando o Tribunal Constitucional determinou que as
penalidades pela posse de uma dose pessoal violavam os artigos 16 e 49 da
Constituição de 1991. Após a decisão judicial, a posse de quantidades até certos
limites – 20 gramas de cannabis, 5 gramas de haxixe e 1 grama de cocaína – não
foi proibida até 2009, quando o governo do então Presidente Álvaro Uribe
aprovou uma emenda constitucional ao artigo 49, restabelecendo um modelo de
proibição.
As sanções por posse para uso pessoal após 2009 limitaram-se, em grande
parte, a sentenças administrativas, incluindo encaminhamentos para vários
serviços de tratamento e prevenção, o que resultou em algum grau de
insegurança jurídica entre autoridades judiciárias e policiais, que careciam de
orientação clara sobre como proceder com delitos de posse. Após a promulgação
da Lei 1453, em junho de 2011, as pessoas passaram a enfrentar prisão de 64 a 108
meses e multa de 2 a 150 meses de salário mínimo quando surpreendidas com
até 1.000 gramas de cannabis, 100 gramas de cocaína ou 20 gramas de derivados
de ópio.
De todo modo, uma decisão do Supremo Tribunal, de agosto de 2011,
determinou que o conceito de dose pessoal, como estabelecido em 1994, ainda
era vigente. O Tribunal Constitucional deu seguimento a essa decisão em junho
de 2012, restabelecendo a descriminalização da posse para uso pessoal, a partir
dos limites de dose pessoal estabelecidos em 1994.
ALEMANHA
13

A lei alemã contém elementos de descriminalização desde o início dos


anos 1990. No nível federal, as emendas à Lei de Narcóticos em 1992 deram aos
promotores o poder discricionário de decidir não processar um indivíduo por
posse de maconha se o promotor considerar a ofensa como de baixa lesividade e
determinar "a inexistência de interesse público" no processo criminal. A
determinação de se o delito é de baixa lesividade depende em grande parte se
indivíduo possui uma pequena quantidade de substâncias proibidas. A definição
de pequena quantidade varia entre as unidades federadas para diferentes
substâncias.
Em 1994, o Tribunal Constitucional Federal entendeu que as penalidades
criminais pela posse ou importação de pequenas quantidades de cannabis eram
inconstitucionais. No que diz respeito à cannabis, esses limites variam entre 6 e 15
gramas, enquanto que para a cocaína entre 1 e 3 gramas. Alguns estados
federados não têm limites previamente fixados, mas observam precedentes
judiciais para estabelecê-los.
Enquanto a lei concede apenas aos promotores a autoridade para não
processar um indivíduo que possui uma pequena quantidade de droga ilícita, na
prática, a polícia em alguns estados frequentemente evita prendê-los,
particularmente em casos envolvendo cannabis ou ecstasy.
Na Alemanha, as pessoas que usam drogas de forma problemática e que
receberam penas privativas de liberdade até dois anos são elegíveis para
tratamento em substituição à prisão. O encarceramento pode ser totalmente
cancelado se o apenado demonstrar participação contínua em um programa de
tratamento pela duração especificada pela autoridade administrativa. A falha em
participar com sucesso do tratamento pode resultar na execução da pena fixada
na sentença. Os relatórios indicam, no entanto, que, na prática, muitos usuários
problemáticos enfrentam a terapia forçada seguida do cumprimento da pena.
MÉXICO
Em 2009, a Lei Geral de Saúde do país foi reformada, em um esforço para
concentrar as prioridades no combate ao traficante e ao tráfico de drogas. Essas
mudanças também descriminalizaram a posse de pequenas quantidades de
drogas ilícitas, de sorte a não se processarem indivíduos surpreendidos com
menos de 5 gramas de cannabis, de 0,5 gramas de cocaína, de 50 miligramas de
heroína ou com apenas um comprimido de ecstasy.
Os limites extremamente baixos da lei para delitos de posse de droga
deixaram um grande número de pessoas vulneráveis a processos por tráfico em
pequena escala. Além disso, entre 2009 e maio de 2013, 140.860 pessoas foram
presas no México por uso de drogas, segundo dados da Procuradoria-Geral.
A Suprema Corte, em novembro de 2015, declarou inconstitucional o
modelo atual de proibição de uso da maconha e concedeu habeas corpus a quatro
membros da Sociedade Mexicana para Consumo Responsável e Tolerante (SMART),
permitindo-lhes cultivar cannabis, sob o argumento de que proibir essa droga
para uso pessoal violava o direito ao livre desenvolvimento da personalidade.
HOLANDA
O uso de drogas, como tal, não constitui crime em termos legais. No
entanto, existem situações em que o uso de drogas é proibido em nível local por
razões de ordem pública ou para proteger a saúde dos jovens, como, por
14

exemplo, nas escolas e nos transportes públicos. Cabe às autoridades locais – não
ao governo nacional – regulamentar isso.
A posse de pequenas quantidades de drogas para uso pessoal não está
sujeita a investigação policial. Qualquer pessoa flagrada com menos de 0,5g de
drogas geralmente não será processada, embora a polícia confisque as drogas e
encaminhe o indivíduo a um serviço de tratamento.
A quantidade limite para a maconha é de 5g. No entanto, em 2012, a
Diretriz da Lei do Ópio foi revisada para que, em vez de dizer "que a polícia pode
deixar de autuar a pessoa apanhada com menos de 5 gramas de cannabis”, agora
declara que isso poderá ocorrer “em princípio”. Isso deixa em aberto a
possibilidade de prender e processar indivíduos com menos de 5g de cannabis em
determinadas circunstâncias.
A Lei do Ópio estabelece que o fornecimento de drogas (posse, cultivo ou
fabricação, importação ou exportação) é punível, dependendo da quantidade e
do tipo de droga envolvida, com até 12 anos de prisão.
No entanto, a Diretriz da Lei do Ópio define condições estritas em que as
vendas de cannabis e os pontos de consumo, conhecidos como coffee shops, podem
ser tolerados pelas autoridades locais. Em 2014, havia 591 desses cafés na
Holanda.
PORTUGAL
Portugal é visto como um país exemplar no enfrentamento dos problemas
derivados das drogas ilícitas. Em 2001, inovou ao revogar as sanções penais pela
posse e uso de pequenas quantidades de qualquer droga ilícita, estabelecendo,
em paralelo, uma série de medidas de saúde pública nessa área.
A posse de qualquer droga é considerada ilegal, mas não resultará em
processos criminais se o montante possuído for inferior ao que um usuário médio
consumiria por dez dias. Quantidades limítrofes são definidas na lei para cada
substância. Quando a polícia encontra um indivíduo na posse de uma pequena
quantidade de entorpecente, ele é encaminhado a uma Comissão de Dissuasão,
cuja principal preocupação é avaliar as circunstâncias pessoais do indivíduo e
encaminhá-lo a serviços apropriados, que pode incluir tratamento médico.
Os resultados dessa política pública são controversos. Sem embargo, em
relação aos jovens estudantes com prevalência de uso de drogas em 2011, houve
uma redução na faixa entre 13 e 15 anos de idade, comparativamente a 2001, antes
da descriminalização. Além disso, a idade mediana de iniciação ao uso de drogas
subiu de 18 anos em 2001 para 20 anos em 2012.
Algumas das mudanças mais significativas em Portugal ocorreram na área
da saúde pública. Desde a descriminalização, Portugal experimentou um
tremendo aumento no número de indivíduos dependentes de drogas que
acessam o tratamento, mas tem visto reduções significativas na transmissão do
HIV e da tuberculose.
URUGUAI
Segundo a lei uruguaia, qualquer pessoa encontrada na posse de uma
"quantidade razoável destinada exclusivamente ao consumo pessoal", conforme
determinado por um juiz, está isenta de punição, tanto criminal quanto
administrativa.
15

Embora o uso e a posse de drogas ilícitas sejam descriminalizados pela lei,


pesquisadores apontam que as práticas policiais e os processos judiciais
resultaram no encarceramento de muitos usuários de drogas. Várias pessoas são
colocadas em prisão preventiva, com a presunção de um crime de cultivo ou
tráfico, mas sem acusações formais.
Entre 2009 e 2013, o número de pessoas encarceradas por delitos de drogas
aumentou 39%, superando aumento global da população carcerária em 24%. Pior
ainda, o número de presos provisórios situava-se em 69,4% da população
carcerária em outubro de 2015, ressaltando as deficiências do sistema de justiça
criminal do país, que funciona de forma contraproducente em relação ao objetivo
legislativo da descriminalização.
Em dezembro de 2013, o país tornou-se o primeiro no mundo a aprovar
legislação que estabelece o marco legal para a regulação estatal da cannabis para
uso recreativo.
O marco regulatório foi revelado em maio de 2014 e estipula o seguinte: i)
haverá três formas de aceder à cannabis legal: cultivar até seis plantas para
consumo doméstico, juntar-se a uma cooperativa de cannabis entre 15 e 45
membros ou comprar o medicamento em farmácias licenciadas para uso
recreativo ou medicinal. Todos estes meios de acesso à maconha devem ser
licenciados pelo Instituto para a Regulamentação e Controle da Cannabis
(IRCCA), que reconhecerá apenas cidadãos uruguaios e residentes permanentes
maiores de 18 anos; ii) o teor de THC da cannabis cultivada comercialmente será
limitado a 15%; iii) a produção total de clubes de cannabis e o cultivo doméstico
não devem exceder 480 gramas por indivíduo por ano.
ESTADOS UNIDOS
Mais de 1,5 milhão de detenções por drogas ilícitas são feitas todos os anos
nos Estados Unidos – a esmagadora maioria apenas por porte. Em 2015, trinta e
quatro estados ainda consideram a posse simples de pequenas quantidades de
drogas além da cannabis como crime, enquanto 16 estados, além de Washington–
DC, bem como o governo federal, tratam a posse para uso pessoal como uma
infração de menor potencial ofensivo. Três estados recentemente reclassificaram
a posse de crime para delito de menor potencial ofensivo (dados mais atuais
serão fornecidos adiante).
Em 2014, a Califórnia tornou-se o primeiro estado a reduzir o simples
porte de drogas de crime para infração de menor potencial ofensivo, com a
adoção da Proposição 47, amplamente aprovada por iniciativa do eleitor. Desde a
sua aprovação, mais de 13.000 pessoas foram libertadas e novamente
sentenciadas – economizando ao estado cerca de US$ 156 milhões em custos de
encarceramento. Em 2015, Connecticut e Utah tornaram-se os estados mais
recentes a reduzir as penalidades por posse de drogas.
Além disso, 32 estados e o Distrito de Colúmbia adotaram leis de
imunidade conhecidas como Leis do Bom Samaritano, que protegem os que
prestam socorro em situações de usuários sob risco (overdose, por exemplo).
Califórnia
Nos 10 anos seguintes à descriminalização da maconha na Califórnia em
1976 – onde o porte para uso pessoal de até 28,5 gramas se tornou contravenção
16

punível com uma multa de até US$ 100,00 – o estado economizou US$ 1 bilhão
com o sistema de justiça criminal e policiamento.
O estado diminuiu as penalidades associadas à posse de cannabis em 2011,
por meio da aprovação do Projeto de Lei do Senado n. 1449, que tornou a posse
de até 28,5 gramas infração administrativa em vez de delito de menor potencial
ofensivo. Por consequência, as detenções por consumo indevido de maconha
caíram drasticamente, passando de quase 55.000 em 2010 para 6.411 em 2014.
Embora a cannabis seja atualmente a única droga ilícita descriminalizada
em muitos estados nos EUA, a Califórnia está entre as jurisdições que fizeram
maiores avanços no sentido de reduzir, de modo geral, as sanções punitivas
associadas a alguns delitos envolvendo drogas ilícitas. Em 2000, os eleitores da
Califórnia aprovaram a mudança da lei estadual para impor tratamento
comunitário e condicional, em lugar de uma sentença privativa de liberdade, aos
infratores não violentos condenados por posse de drogas ilícits, na primeira ou
na segunda vez. Após o início da implementação dessa lei, em 2001, centenas de
milhares de indivíduos foram encaminhados para tratamento e evitaram entrar
no sistema de justiça criminal, com economia para o estado de US$ 5.836,00 para
cada infrator que completou com sucesso o tratamento.
Em novembro de 2014, quase 60% dos eleitores aprovaram a Proposição
47, que rebaixou seis crimes não violentos – incluindo o simples porte de drogas
para todas as substâncias – para a categoria de infração criminal de menor
potencial ofensivo. Nos 12 meses após a votação da Proposição 47, a população
carcerária da Califórnia caiu 3,8% e milhares de presidiários foram libertados.
Washington D.C.
Os legisladores agiram para resolver o problema das prisões por posse de
cannabis, por meio da aprovação de uma lei (“Marijuana Possession
Decriminalization Amendment Act”) em março de 2014. Segundo essa lei, a posse
de uma onça (28,3g) ou menos de cannabis passou a configurar apenas ilícito
administrativo, punível com multa de U$ 25,00, além do possível confisco da
droga e de petrechos relacionados, se visíveis quando da abordagem policial.
Presentear alguém com até 28,3 gramas de cannabis – ou seja, sem transação
financeira – passou a ser, da mesma forma, uma infração não criminal, embora o
consumo público permanecesse criminoso. Os indivíduos tinham 14 dias para
pagar a multa e, se não o fizessem, o dobro da penalidade seria cobrado.
Porém, essa via de descriminalização durou apenas sete meses na prática,
pois, em novembro de 2014, 69,4% dos eleitores aprovaram a Iniciativa Ballot 71,
para legalizar o porte de cannabis para uso pessoal, abrangendo pessoas com mais
de 21 anos que possuam até 2 onças (56,7g) de cannabis ou que cultivem até seis
plantas de cannabis em suas casas licitamente. O consumo em local público
continua sendo crime, embora, no início de 2016, o conselho da cidade estivesse
começando a explorar a regulamentação de espaços públicos onde os adultos
poderiam usar cannabis.
Em levantamento mais recente, publicado em 24/7/2018 por Marcelo
Tuvuca, constatou-se que mais da metade dos norte-americanos já têm acesso à
maconha de forma regularizada, para fins medicinais ou mesmo recreativos. Dez
estados (incluindo o Distrito de Colúmbia, da capital Washington) permitem este
último tipo uso, que coloca a erva no mesmo status de outras drogas permitidas
17

no país (álcool e tabaco, por exemplo). Entre esses estados está o mais importante,
a Califórnia, que concentra 12% da população. Outros 20 locais, incluindo Nova
York, Flórida, Pensilvânia e Illinois, já regularizaram a maconha estritamente
para fins medicinais. A soma desses 30 estados representa 62% da população do
país.
Confira-se a imagem ilustrativa dessa situação:

https://noticias.uol.com.br/internacional/ultimas-noticias/2018/07/24/de-vila-
a-terapeutica-maconha-e-regularizada-em-ritmo-acelerado-e-ja-atinge-62-dos-
eua.htm

Diante disso, quais os questionamentos que costumam ser feitos à política


de descriminalização de drogas ilíciatas para consumo pessoal, bem condensados
em dossiê elaborado pela Plataforma Brasileira de Política de Drogas?
O mais importante desses questionamentos diz respeito à eficácia de tal
política descriminalizante ante a pretendida redução do consumo de droga ilícita,
nomeadamente por jovens. Nesse ponto, os estudos têm mostrado alterações
pouco significativas no número de usuários de drogas ilícitas, nos países que
passaram a tolerar o consumo até certos limites. O seguinte gráfico, da EMCDDA,
ilustra essa conclusão:
18

As linhas pontilhadas referem-se aos países em que houve aumento das


penas para posse de maconha, enquanto as linhas sólidas indicam os países com
políticas de redução de penas ou descriminalização do uso. A linha vertical
espaçada é o ano em que houve alteração na política criminal de cada país. Como
se nota, não houve substancial alteração da tendência (talvez à exceção do Reino
Unido) verificada anteriormente à mudança de rumos.
Mas, ainda que ocorra pequeno aumento no consumo de drogas ilícitas
logo após políticas descriminalizantes, é de considerar que existem outros fatores
envolvidos, não se mostrando possível extrair a inexorável conclusão de que o
aumento do consumo da maconha, por exemplo, teve como causa única a
descriminalização do seu uso. De todo modo, mesmo que se pudesse concluir
nesse sentido, não haveria como desconsiderar o fato de que uma quantidade
grande de jovens deixaram de ingressar nas roldanas do sistema de justiça
criminal e, no caso do Brasil, deixariam de sofrer as agruras do convívio
penitenciário e da sua inserção nas facções criminosas.
Outro possível questionamento sobre a descriminalização do uso de
drogas ilícitas refere-se a um suposto aumento de situações de violência contra
terceiros. Aqui também não se verificam, segundo o Dossiê PBPD, variações
consistentes nos índices de violência e de criminalidade nos países que adotaram
políticas mais flexíveis no trato das drogas para consumo pessoal. Sem embargo,
no Uruguai, onde não somente se descriminalizou o uso de maconha, mas se
regulamentou sua comercialização, as notícias recentes dão conta de um aumento
em 66% no número de homicídios, na primeira metade de 2018, em comparação
com igual período do ano passado (Folha de São Paulo, 2/9/2018, matéria de
Sylvia Colombo).
De todo modo, no entender dos que analisaram os dados referidos no
Dossiê da PBPD, “as evidências indicam que crimes violentos não estão
normalmente associados ao uso de drogas em si, mas a dinâmicas específicas do
tráfico de drogas em países já caracterizados por altos índices de violência”, como
19

é o caso do Brasil, em que o tráfico de drogas potencializa a violência,


especialmente em grupos socioeconomicamente vulneráveis, “muito mais
expostos aos mercados ilícitos e à repressão estatal e social”.
Constitui aspecto também de fundamental importância a análise dos
custos sociais e econômicos decorrentes da política de criminalização do
consumo de drogas ilícitas.
Segundo o Relatório Anual do UNODC de 2010, o custo econômico do uso
e dependência em drogas ilícitas em alguns países pode chegar a 2% do PIB,
quando atividades criminosas conexas estão incluídas.
No Brasil, certamente os números são maiores, não só pelo alto índice de
pessoas presas por tráfico (próximo a 30% entre os homens e a 70% entre as
mulheres), mas pelos delitos violentos – como homicídios, roubos, latrocínios e
porte e posse de armas – que costumam gravitar ao redor das organizações
criminosas que gerenciam o comércio de drogas ilícitas.
Não se negligenciem, outrossim, os danos causados pela estigmatização
do usuário de drogas ilícitas, não raramente visto e tratado como um criminoso,
um marginal, uma pessoa de personalidade fraca, o que acaba por comprometer
os papeis que essa pessoa tente desempenhar no mercado de trabalho, com
reflexos negativos em seu ambiente familiar e social.
Esses custos sociais e pessoais são, de fato, maiores e mais dramáticos, pois
implicam não apenas o impacto econômico-financeiro sobre as famílias dos
encarcerados, mas também o afastamento natural dos serviços de atenção e
tratamento aos dependentes. Isso porque, como conclui o Dossiê PBPD,
“quando é tratado como um crime, o uso de drogas é visto prioritariamente
como questão policial, diminuindo a importância da educação, da
prevenção e do sistema de atenção biopsicossocial”.
Com isso também se maximizam outros problemas de saúde pública,
como a transmissão do HIV/Aids e de outras doenças contagiosas, mais
propensas a disseminação e agravamento no ambiente carcerário.
À vista de tudo o que fora analisado pela Comissão, qual parece ser a
proposta necessária para inicio da discussão legislativa em tema tão sensível e
socialmente estratégico para o Brasil?
Parece haver um certo consenso, ou pelo menos uma tendência entre os
definidores de políticas públicas dos países ocidentais, de que o modelo
preconizado pelas Convenções da ONU, de 1961, 1971 e 1988 e sob a liderança
ideológica dos sucessivos governos norte-americanos, nomeadamente a partir da
Presidência de Richard Nixon – war on drugs -, não logrou bons resultados. E é
sintomático e curioso perceber que é precisamente nos EUA que está ocorrendo
a mais sensível mudança de rumos na política de enfrentamento das drogas, ao
menos em relação à cannabis, com a maioria dos estados permitindo o uso
medicinal ou recreativo dessa droga.
O que, portanto, constituía um claro objetivo dos tratados internacionais e
dos governos em geral – "a world free of drugs" – resultou na percepção de que
mais factível é humanizar as políticas relacionadas ao uso de drogas, sob a
premissa de que a preservação da saúde das pessoas envolvidas nesse universo
é o que mais importa (em conformidade com a principal conclusão da Assembleia
20

Geral das Nações Unidas de 2016 (UNGASS 2016 on the World Drug Problem: focus
on people, public health and human rights).
No Brasil, embora não tenha havido alterações legislativas de relevo nos
últimos 12 anos, desde a entrada em vigor da Lei 11.343/2006, a jurisprudência
dos Tribunais Superiores (e de alguns tribunais e juízes) tem sinalizado,
claramente, para uma abordagem cada vez mais flexível e menos ortodoxa na
interpretação da lei e sua aplicação aos casos concretos.
Eis alguns exemplos ilustrativos dessa jurisprudência:
• HC n. 143.798/SP (DJe 22/5/2017), em que o Ministro Luís Roberto
Barroso deferiu a liminar para suspender o trâmite de processo instaurado contra
acusado de importar 14 sementes de maconha.
• HC n. 118.533/MS, Relatado pela Ministra Cármen Lúcia (j. em
23/6/2016 pelo Pleno), em que se reconheceu que o tráfico “privilegiado” a que
alude o § 4º do art. 33 da LAD (na verdade, se trata de causa especial de
diminuição de pena) não possui natureza hedionda, do que decorrem diversas
consequências, i.e., a progressão de regime (requisito objetivo) passa a ser de 1/6
da pena (art. 112 da LEP); o livramento condicional se obtém com 1/3 da pena
cumprida, se não reincidente em crime doloso e tiver bons antecedentes, ou 1/2,
se reincidente em crime doloso (conforme art. 83 do CP); possibilidade de anistia,
graça e indulto, desde que cumpridos os demais requisitos.
• Possibilidade de substituição da pena privativa de liberdade por
restritiva de direitos, com declaração de inconstitucionalidade da vedação legal
consubstanciada no art. 44 da LAD (HC n. 97.256/RS, de relatoria do Ministro
Ayres Britto), com expedição da Resolução nº 5, do Senado Federal, para a
eficácia erga omnes;
• Reconhecimento da inconstitucionalidade do Art. 2º, § 1º, da Lei n.
8.072/1990: “A pena por crime previsto neste artigo será cumprida inicialmente
em regime fechado”, por ofensa à individualização da pena (inciso XLVI do art.
5º da CF/88), sendo exigida a fundamentação (CP, art. 33, § 3º, c/c o art. 59), nos
termos do acórdão proferido no HC 111840 ES, da Relatoria do Min. Dias Toffoli
(DJe-249 p. 17-12-2013).
O Supremo Tribunal Federal, chamado a julgar a constitucionalidade do
art. 28 da Lei Antidrogas, no Recurso Extraordinário nº 635.659/SP, avançou na
discussão do tema, com o placar parcial de três votos pela inconstitucionalidade
(em amplitudes distintas), estando o RE com vista, atualmente, ao Ministro
Alexandre de Moraes.
Dos votos já colhidos, resumidamente se pode dizer o seguinte:
O relator do Recurso Extraordinário, Ministro Gilmar Mendes, considera
inconstitucional o art. 28 da L. 11.343/2006 sobretudo pela violação ao direito à
personalidade e ao princípio da desproporcionalidade do trato jurídico-penal
conferido ao usuário, cuja esfera de liberdade e de intimidade hão de merecer
proteção legal, e não sua estigmatização por uma opção, de usar substância
psicoativa, que somente a ele diz respeito.
Propõe que, na ponderação dos interesses envolvidos nessa discussão – a
liberdade individual e a saúde pública –, seja levado em conta que não é qualquer
grau de lesividade individual que justifica a intervenção do direito penal para
regular a vida, conforme, aliás, ocorre em relação ao tabaco e ao álcool, cujos
21

efeitos nefastos à saúde humana não implicam, só por isso, a criminalização de


seu uso. Conclui por afirmar que dar tratamento criminal ao uso de drogas ilícitas
é medida que ofende, de forma desproporcional, o direito à vida privada e à
autodeterminação e propõe estabelecer, tal qual vem ocorrendo em diversos
países, critérios objetivos para distinguir usuários e traficantes.
O Ministro Edson Fachin, segundo a votar, propôs a descriminalização do
porte apenas de maconha para consumo próprio, aduzindo violação ao princípio
da ofensividade e a necessidade de enfrentamento do problema de uso de drogas
sob o prisma das políticas públicas de saúde.
Pontua, enfim, que o Poder Legislativo estabeleça parâmetros que
possibilitem a distinção entre usuários e traficantes.
A seu turno, o Ministro Luís Roberto Barroso sublinhou a necessidade de
enfrentar a questão das drogas sob uma ótica utilitarista (consequencialista),
tendo em vista o contexto social e a realidade brasileira, bem como os danos que
a política de guerra às drogas tem produzido nos usuários de drogas,
especialmente os jovens, pobres e negros, maiores prejudicados com o maciço
encarceramento verificado no Brasil nas últimas décadas. Concordou em que a
criminalização do uso de maconha para uso pessoal fere o direito à privacidade,
recordou as experiências de descriminalização em outros países, como Portugal,
Espanha, Uruguai e propôs um parâmetro para diferenciar consumo (ou
produção própria) e tráfico de maconha: porte de 25 gramas de maconha ou a
plantação de até seis plantas fêmeas da espécie.
A proposta apresentada pela Comissão dá um passo adiante em relação
ao avanço promovido em 2003, quando o porte de drogas para consumo pessoal
deixou de ser punido com pena privativa de liberdade, o que veio a ser entendido
como uma despenalização do consumo de droga. Na verdade, parece mais
acertado o termo descarcerização para denotar essa opção legislativa, quanto ao
sancionamento do ato de adquirir, guardar, ter em depósito, transportar ou
trazer consigo, para consumo pessoal, drogas. Isso porque qualquer dessas
condutas continua sendo considerada crime e também continua a atrair a
imposição de sanções criminais (tanto que inscrita no Capítulo III, cuja epígrafe
é Dos Crimes e das Penas), ainda que não privativas de liberdade.
O passo adiante que ora se propõe percorrer é o da descriminalização
dessas condutas, o que, mesmo que pareça óbvio dizê-lo, não custa repetir, não
implica legalizar o uso de drogas e muito menos sinalizar de forma positiva para
qualquer de suas formas de comercialização e uso.
O que se faz é uma necessária escolha entre, de um lado, o universo de
consequências nefastas impostas ao usuário (dependente ou não) alcançado pelo
sistema de justiça criminal, e, de outro, a tentativa de minorar esses efeitos e obter
melhores resultados sociais, mercê de uma abordagem mais inteligente e humana
da questão, posto que menos visível aos olhos da sociedade.
Aliás, o debate sobre esse tema sempre foi marcado pelo preconceito, pela
má informação, pela exploração midiática, pelo emocionalismo, pelo moralismo
e pela simplificação. Já é tempo de estimular a população, por meio do
enfrentamento corajoso, honesto e não tangenciado desse problema social, a
abrir-se à discussão civilizada, racional e científica sobre o tema das drogas
22

ilícitas e mesmo das drogas em geral, mesmo aquelas lícitas e de uso social
aprovado, como álcool e tabaco, entre outras.
Chega-se a dizer que quem defende alguma medida de liberalização do
uso privado de pequenas quantidades de drogas ilícitas está defendendo as drogas,
quando obviamente não é disso que se trata.
Há receio de que ainda não estejamos preparados, enquanto nação, a
seguir os mesmos passos de nações mais alinhadas ao pensamento atual em
expansão no mundo ocidental. É é nosso dever firmar uma posição e deixar o
registro histórico de um trabalho que, independentemente dos resultados
concretos, terá sua importância no futuro processo legislativo e no
amadurecimento das instituições.
A partir de todos os debates já desenvolvidos pela Comissão, nos
encontros presenciais e virtuais, inclusive com a explanação de especialistas, fez-
se a opção por uma proposta de descriminalização do uso privado de pequenas
quantidades de drogas ilícitas. E de quaisquer drogas, não apenas da maconha,
por conseguinte, como fizeram alguns países.
Sabe-se da miríade de drogas que já está no mercado, bem como de outras
que estão surgindo e se popularizando. Segundo informa o EMCDDA (European
Monitoring Centre for Drugs and Drugs Addiction) foram identificadas na Europa,
em 2017, mais de 670 novas substâncias psicoativas, ainda não abrangidas pelos
controles internacionais. Variam sobretudo entre canabinoides sintéticos,
estimulantes, opiáceos e benzodiazepinas. Na maioria dos casos, são
comercializadas como substitutos “legais” de drogas ilícitas; noutros, são
destinadas a pequenos grupos que querem experimentá-las em busca de novos
efeitos. Algumas dessas substâncias podem ter origem em medicamentos, que
são desviados da cadeia de abastecimento legítima ou obtidos ilegalmente
(http://www.emcdda.europa.eu/system/files/publications/8585/20181816_T
DAT18001PTN_PDF.pdf).
Escolher apenas a maconha como droga ilícita que permite a não
responsabilização penal do usuário não se mostrou, ao ver da Comissãao, o
melhor caminho a trilhar. A uma, porque parte da ideia de que a maconha é a
mais leve das drogas ilícitas, premissa que somente é correta se o grau de
Tetraidrocanabinol (THC) presente na composição da dose não for elevado. A
duas, porque o isolamento da maconha como única droga ilícita de uso permitido
manteria a política criminalizante e, consequentemente, menor possibilidade de
abordagem terapêutica e médica em relação aos usuários de mais baixa renda,
que têm no crack a droga de mais fácil acesso.
De outra banda, há consenso quanto à necessidade de, na hipótese de
aceitar-se a não criminalização do ato de consumo próprio do usuário de drogas
ilícitas, indicarem-se parâmetros objetivos para auxiliar na tarefa judicial de
separar usuário de traficante.
Acerca do critério previsto na atual Lei Antidrogas, o Relatório Final de
Pesquisa sobre as Sentenças Judiciais por Tráfico de Drogas na Cidade e Região
Metropolitana do Rio de Janeiro, realizado pela Defensoria Pública do Rio de
Janeiro, assinala que
“A subjetividade do critério adotado tem sido alvo de diversas críticas por
meio daqueles que operam e estudam o sistema de justiça criminal
brasileiro. Uma pesquisa sobre o perfil do condenado por tráfico de drogas,
23

realizada pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) em conjunto


com a Universidade de Brasília (UnB) em 20083, apontou, como uma falha
da Lei, os amplos poderes concedidos ao policial para optar entre a
tipificação do uso e do tráfico, diante da falta de critérios objetivos. Essa
subjetividade faz com que, muitas vezes, uma pessoa seja considerada
traficante em razão do local onde foi abordada, mesmo estando sozinha e
com pequena quantidade de droga.”
Sob essa compreensão, a presente proposta considerou conveniente, no
tocante aos limites quantitativos, seguir como parâmetro principal não o número
de dias de consumo pessoal (em Portugal, por exemplo, é um decêndio), mas o
número de doses toleradas para se considerar o portador ou possuidor da droga
como um simples usuário. É que não raro uma pessoa pode, a depender do tipo
de droga, consumir várias doses ao dia – como no caso do crack – o que
dificultaria aferir o número de dias máximo para não exceder o limite fixado para
aquela substância psicoativa.
Fixa-se um prazo de seis meses para que a Secretaria Nacional de Políticas
sobre Drogas (ou a Anvisa) realize estudos e apresente uma tabela com o
quantitativo correspondente às drogas conhecidas, nos moldes indicados,
devendo a tabela ser revista e atualizada a cada 6 meses.
O art. 28 passa a prever, portanto, que não configura crime a conduta de
posse, uso e compartilhamento – em situação de consumo pessoal – de até 10
(dez) doses de qualquer substância.
Sem embargo, elencam-se condicionamentos que visam a evitar que, pelo
simples fato de alguém ser encontrado com pequena quantidade de droga ilícita,
seja beneficiado com a exclusão do crime de tráfico. Para tanto, ressalva-se a
possibilidade de prova de traficância, não se tolera que a realização das condutas
indicadas ocorra nos locais mencionados no dispositivo, e também não se admite
envolvimento de criança, adolescente ou pessoa de algum modo vulnerável.
Impende observar que não se cuida de legalização do uso de
entorpecentes, mas de descriminalização do uso próprio e privado em
quantidade limitada.
A proposta também prevê que também não deve responder por crime
quem, para não se submeter aos riscos e aos custos do comércio de drogas ilícitas,
semeia, cultiva ou colhe até 6 plantas – nomeadamente a cannabis sativa – das
quais se possa extrair substância ou produto capaz de causar dependência física
ou psíquica, para seu consumo pessoal. Considerou-se que o limite de 6 plantas
sugere tratar-se de alguém que realiza tais ações sem o propósito de
comercialização da droga ilícita extraída a partir do vegetal.
O art. 29 cuida de infrações administrativas, fiel ao escopo da proposta no
sentido de descriminalizar mas não liberar o uso de drogas ilícitas de forma
ampla.
A presente proposta também trata dos tipos penais referentes à atividades
praticadas em derredor do tráfico ou do consumo ilegal de drogas, objetivando
alcançar a devida proporcionalidade entre o ato praticado e a reprimenda
desejada como sanção.
De outra feita, apesar de se discutir em alguns países a legalização das
drogas ao usuário, não se vê, quanto ao tráfico de drogas, a mesma disposição.
Subsidiariamente, constate-se que a legislação brasileira, no que se refere a
24

punição do traficante, também não se difere em muito do adotado


mundialmente, mesmo por países que possuem uma política liberal quanto ao
uso.
À título de exemplo, veja-se, as penas por tráfico de drogas ao redor do
mundo. Países que aplicam a pena de morte: Bahrein, Bangladesh, Brunei, China,
Cuba, Egito, Gaza, Índia, Indonésia, Irã, Iraque, Kuwait, Laos, Líbia, Malásia,
Myanmar, Coreia do Norte, Omã, Paquistão, Catar, Arábia Saudita, Singapura,
Coreia do Sul, Sri Lanka, Sudão, Síria, Taiwan, Tailândia, Emirados Arabes
Unidos, Estados Unidos, Vietnã, e Iêmen22.
Outros países:
Argentina - penas de prisão de 4 a 16 anos para o tráfico e contrabando.
Bélgica - as penas variam em função da gravidade do delito, podendo
chegar de 5 a 20 anos e multa.
Bolívia - penas muito severas de prisão: de 10 a 20 anos por tráfico e de 8
a 12 anos por mero transporte.
Bulgária - pena de até 20 anos e multas.
Colômbia - enas de prisão de 3 a 20 anos23.
França – a pena por tráfico pode variar de 10 anos à prisão perpétua24.
Noruega – a pena varia de 2 a 21 anos de prisão, conforme a natureza e
quantidade da droga25.
Portugal – 4 a 12 anos de prisão, mas cabe redução no caso de usuário que
vende para manter o vício26.
Suécia – 3 a 10 anos de prisão para infrações ordinárias e graves27.
Reino Unido – as penas máximas são de 14 anos a prisão perpétua, a
depender da natureza da substância28.
Uruguai – apesar da regulamentação da venda da maconha, aumentou as
penas para os traficantes de outras drogas, como crack e pasta básica, e para
corrupção policial. Os condenados podem ficar entre 4 e 15 anos na cadeia29.

22 https://www.gazetaonline.com.br/noticias/mundo/2015/01/veja-os-paises-que-
adotam-a-pena-de-morte-por-trafico-de-drogas-1013886681.html
23 https://libros-revistas-derecho.vlex.es/vid/penas-trafico-drogas-paises-653583277
24 http://www.emcdda.europa.eu/countries/drug-reports/2018/france/drug-laws-and-
drug-law-offences_en
25 http://www.emcdda.europa.eu/countries/drug-reports/2018/norway/drug-laws-
and-drug-law-offences_en
26 http://www.emcdda.europa.eu/countries/drug-reports/2018/portugal/drug-laws-
and-drug-law-offences_en
27 http://www.emcdda.europa.eu/countries/drug-reports/2018/united-kingdom/drug-
laws-and-drug-law-offences_en
28 http://www.emcdda.europa.eu/countries/drug-reports/2018/united-kingdom/drug-
laws-and-drug-law-offences_en
29http://www.diariodepernambuco.com.br/app/noticia/mundo/2018/06/24/interna_mundo

, 755749/uruguai-legalizou-maconha-e-elevou-penas-para-trafico-de-outras-drogas.shtml
25

Mantendo a criminalização, a presente proposta desconstruiu o tipo penal


do artigo 33 da lei vigente – formado por 18 (dezoito) núcleos verbais! -
obedecendo ao mais moderno comando de teoria do direito criminal, que aponta
erro dogmático em misturarem-se condutas cujo tipo objetivo é uma ação com
outras tantas cujo verbo caracterizador aponta uma situação de estado.
Esta subdivisão do amplo espectro de possibilidades de cometimento do
delito de tráfico é necessária porque a atual redação abarca situações de
lesividade distintas sob uma mesma sanção. Por esta razão o projeto modificou
as hipóteses de cometimento do delito de tráfico em diversos delitos com penas
distintas.
Isso permitirá punir mais gravemente quem praticar condutas previstas
em tipos diversos – por concurso -, o que hoje não é viável já que está tudo num
tipo só, bem como sancionar criminalmente, de modo mais ou menos gravoso
cada grupo de condutas, conforme sua importância, e diminuir a
discricionariedade judicial.
Os seguintes tipos penais foram inseridos no art. 33 em substituição à
tipificação genérica:
• Tráfico internacional de drogas ilícitas.
o Pena: reclusão de 8 (oito) a 20 (vinte anos)
• Tráfico de drogas ilícitas
o Pena: reclusão de 5 (cinco) a 15 (quinze) anos
• Exposição à Venda, Prescrição, Guarda ou Depósito de Drogas
ilícitas
o Pena: reclusão de 3 (três) a 8( oito) anos
• Transporte de drogas ilícitas por meio de terceiro instigado ou
coagido
o Pena: reclusão de 2 (dois) a 5 (cinco) anos
• Cultivo de plantas sejam matéria prima para drogas ilícitas
o Pena: reclusão de 3 (três) a 8 (oito) anos
• Comércio de sementes para cultivo ou preparação de drogas ilícitas
o Pena: reclusão de 1 (um) a 4 (quatro) anos
• Aquisição, venda, remessa, depósito e fornecimento de sementes de
plantas que sejam matéria prima para drogas ilícitas
o Pena: reclusão de 1 (um) a 3 (três) anos
• Oferta para uso compartilhado superior a 10 (dez) doses por
usuário:
o Pena: detenção de 6 (seis) meses a 1 (um) ano.
• Oferta para uso compartilhado de drogas ilíictas a inimputável
o Pena: reclusão de 1 (um) a 2 (dois) anos.
• Petrechos para comercialização de drogas ilícitas
o Pena: reclusão de 2 (dois) a 8 (oito) anos
• Financiamento ou custeio de tráfico ilícito de drogas
o Pena: reclusão de 10 (dez) a 20 (vinte) anos.
• Colaboração para o tráfico de drogas ilícitas
o Pena: reclusão de 2 (dois) a 5 (cinco) anos.
• Prescrição culposa de drogas ilíictas
o Detenção de 6 (seis) meses a 2 (dois) anos
26

• Condução de embarcação ou aeronave sob o efeito de drogas ilícitas


o Pena: detenção de 6 (seis) meses a 2 (dois) anos.
• Introdução de drogas ilícitas em unidade prisional para cônjuge,
companheiro, ascendente ou descendente
o Pena: reclusão de 2 (dois) a 5 (cinco) anos
As penas referentes ao tráfico foram modificadas. Todas as reprimendas
vêm acompanhadas de multa e deu-se especial relevância ao delito de
financiamento do tráfico e ao tráfico internacional, apenados mais gravemente
que na legislação atual.
Causas de aumento de diminuição foram construídas com base em
diversos critérios já existentes em diversos diplomas normativos, mas inovou-se
ao estabelecer aumentos e diminuições fixas, reduzindo-se o âmbito de
discricionariedade do magistrado.
Também se inovou ao estabelecer causas de aumento e diminuição
baseadas na quantidade drogas.
Isto se justifica em razão da imensa gama de decisões judiciais com
parâmetros absolutamente distintos, desconstruindo o princípio da isonomia na
aplicação da norma penal.
Igualmente se avançou, desfazendo o delito de associação para o tráfico,
transformando em clausula de aumento de pena a participação em associação
criminosa devida e mais propriamente especificada.
No que toca à parte procedimental, as alterações propostas para o rito de
processamento dos crimes previstos na lei tiveram como escopo adaptar a norma
a novos diplomas legais e entendimentos jurisprudenciais.
As principais alterações propostas para os arts. 48 a 59 prestam-se a
adaptar a Lei n.º 11.343/2006 a outros diplomas legais que surgiram após o seu
advento (p. ex., a Lei 11.719/2008, que introduziu diversas alterações do CPP,
inclusive a de que o interrogatório passe a ser o último ato da audiência de
instrução), bem como exigências pertinentes a recomendações do Conselho
Nacional de Justiça (audiência de custódia) e, ainda, adaptações da Lei ao que a
jurisprudência pátria já consolidou em seus entendimentos.
Como o uso pessoal e privado de pequenas quantidades de drogas ilícitas
ficou descriminalizado, em regra, no anteprojeto, passando a figurar, em alguns
casos, como infração administrativa, foi necessária a adaptação no § 1º do art. 48
para que o procedimento previsto na Lei n. 9.099/95 fosse seguido unicamente
em relação aos tipos penais que permaneceram previstos como crime de menor
potencial ofensivo.
Diante das penas definidas nesta proposta para os tipos penais, ao menos
já se pode observar que, em princípio, diversos crimes são previstos como de
menor potencial ofensivo.
De outro lado, surge a questão de como a lei deve regulamentar o
procedimento da força policial quando a situação posta envolver usuário em
situação que não constitua crime, mas se mostre passível de sanção
administrativa. Deparando-se um policial, no exercício do seu poder de polícia,
com usuário portando ou usando droga ilícita numa das situações especificadas
no art. 29 do anteprojeto, deve ele saber que procedimento seguir quanto ao
usuário e à substância.
27

Tratando-se de hipótese de mera infração administrativa prevista no art.


29 do anteprojeto, entendeu-se que qualquer procedimento de apreensão e
destinação da droga ilícita deveria se dar no âmbito de algum órgão do Poder
Executivo, assim como a imposição de multa ao usuário, pois não seria adequado
que essas atribuições fossem exercidas por algum órgão do Poder Judiciário, já
que a conduta deixou de ser prevista como crime. E, nas competências do Juizado
Cível legalmente estabelecidas na Lei n. 9.099/95, não se encontrou previsão de
qualquer delas que comportasse a situação em foco.
Mais do que isso, se se pudesse pensar que o agente, em virtude do uso,
poderia ser eventualmente enquadrado como dependente e nessa situação
estivesse a comprometer a sua capacidade, com mais razão a sua apresentação a
um Juizado Cível estaria expressamente vedada por força do § 2º do art. 3º da Lei
n.º 9.099/95, que exclui da competência do Juizado Especial Cível as causas
relativas ao estado e à capacidade das pessoas, ainda que de cunho patrimonial.
Por outro lado, no âmbito do Poder Executivo, pensou-se que
possivelmente na estrutura do Sistema Nacional de Vigilância Sanitária é que
estaria melhor identificado algum órgão ou entidade que pudesse desempenhar
a dupla atribuição de (i) receber a droga apreendida, certificar-lhe a natureza e o
peso, bem como encaminhá-la para a devida ulterior destruição, assim como de
(ii) dosar e aplicar a multa administrativa, sanções administrativas previstas no
art. 29-A do anteprojeto.
Com efeito, a Lei n.º 9.782/99, que define o Sistema Nacional de Vigilância
Sanitária, cria a Agência Nacional de Vigilância Sanitária – ANVISA e dá outras
providências, estabelece em seu art. 2º, incisos III e VII, que
“Compete à União, no âmbito do Sistema Nacional de Vigilância
Sanitária, controlar e fiscalizar produtos e substâncias de interesse para a
saúde, bem como atuar em circunstâncias especiais de risco à saúde.”
Também se houve por bem fazer expressa menção aos meios
investigativos que passam a fazer parte do procedimento referente à lei alterada.
A modificação proposta visa somente a deixar claro que os procedimentos
investigativos previstos na Lei n.º 12.850/2013 podem ser utilizados nos casos de
crimes previstos na Lei de drogas, mesmo que não caracterizada precisamente a
existência de uma organização criminosa nos moldes estabelecidos na Lei n.
12.850/2013.
Manteve-se, contudo, a referência aos dois procedimentos indicados nos
incisos I e II desse artigo haja vista a diferença sustentada por alguns entre entrega
vigiada e ação controlada. Com efeito, costuma-se definir ação controlada como o
retardamento da intervenção policial, apesar de o fato criminoso já se encontrar
numa situação de flagrância, permitindo a efetivação do chamado flagrante
prorrogado ou diferido, com o fim de se poder exercer um monitoramento e uma
vigilância sobre a atividade delituosa, para, assim, conseguir-se obter maiores
elementos de prova e mais eficácia para a investigação.
Por sua vez, a entrega vigiada seria um instituto correlato à ação
controlada, para alguns não se confundindo inteiramente com ela, contudo.
Trata-se de procedimento previsto e recomendado pelas Nações Unidas,
na Convenção de Viena de 1988 (Convenção contra o Tráfico Ilícito de Entorpecentes
e Substâncias Psicotrópicas), aprovada pelo Decreto Legislativo n. 162, de 14-9-
28

1991, e incorporada ao nosso ordenamento jurídico pelo Decreto n. 154, de 26-6-


1991.
Os arts. 1º, I, e 11 da referida Convenção Internacional conceituam entrega
vigiada nos seguintes termos:
“Artigo 1º ...
...
l) Por ‘entrega vigiada’ se entende a técnica de deixar que remessas ilícitas
ou suspeitas de entorpecentes, substâncias psicotrópicas, substâncias que
figuram no Quadro I e no Quadro II anexos nesta Convenção, ou
substâncias que tenham substituído as anteriormente mencionadas, saiam
do território de um ou mais países, que o atravessem ou que nele ingressem,
com o conhecimento e sob a supervisão de suas autoridades competentes,
com o fim de identificar as pessoas envolvidas em praticar delitos
especificados no § 1º do artigo 3º desta Convenção.
Artigo 11. Entrega Vigiada
1. ..., as Partes adotarão as medidas necessárias, dentro de suas
possibilidades, para que se possa recorrer, de forma adequada, no plano
internacional, à entrega vigiada, com base nos acordos e ajustes
mutuamente negociados, com a finalidade de descobrir as pessoas
implicadas em delitos estabelecidos de acordo com o § 1º do artigo 3º e de
encetar ações legais contra estes.
...
3. As remessas ilícitas, cuja entrega vigiada tenha sido negociada, poderão,
com o consentimento das Partes interessadas, ser interceptadas e
autorizadas a prosseguir intactas ou tendo sido retirados ou subtraídos,
total ou parcialmente, os entorpecentes ou substâncias psicotrópicas que
continham”.
Da mesma forma, a Convenção de Palermo, incorporada ao ordenamento
jurídico brasileiro pelo Decreto n. 5.015, de 12-3-2004, define a “entrega vigiada”,
como:
“técnica que consiste em permitir que remessas ilícitas ou suspeitas saiam
do território de um ou mais Estados, os atravessem ou neles entrem, com o
conhecimento e sob o controle das suas autoridades competentes, com a
finalidade de investigar infrações e identificar as pessoas envolvidas na sua
prática.”
No ordenamento jurídico pátrio, a Lei n. 11.343/06 atualmente vigente já
traz previsão do instituto no seu art. 53, II, dispondo sobre
“a não atuação policial sobre os portadores de drogas, seus precursores
químicos ou outros produtos utilizados em sua produção, que se encontrem
no território brasileiro, com a finalidade de identificar e responsabilizar
maior número de integrantes de operações de tráfico e distribuição, sem
prejuízo da ação penal cabível”.
Não se pode desconhecer que o objetivo dessa forma de investigação
conhecida como entrega vigiada é, assim como na ação controlada, permitir que
todos ou a maior parte dos integrantes de uma organização criminosa do tráfico
sejam identificados e presos, com isso obtendo-se maior eficiência na
investigação, dado que uma interceptação prematura de uma remessa da droga
29

pode comprometer o resultado mais eficaz da investigação, inclusive podendo


prejudicar a identificação ou incriminação do destinatário da substância.
Por isso, não se pode discordar que há semelhança entre a ação controlada
e a entrega vigiada, mormente em seus meios e objetivos, dentre os quais
aguardar o momento mais oportuno para concretizar a resposta estatal e
identificar o destino dos bens e as pessoas envolvidas na prática criminosa, mas
para alguns não se pode entre ambas enxergar completa similitude.
Há quem entenda que a Lei n. 12.850/13 fundiu os institutos da ação
controlada propriamente dita e da entrega vigiada, embora chamando ambos de
ação controlada. Isso porque seu art. 8º explicita que a ação controlada consiste
em
“retardar a intervenção policial ou administrativa relativa à ação praticada
por organização criminosa ou a ela vinculada, desde que mantida sob
observação e acompanhamento para que a medida legal se concretize no
momento mais eficaz à formação de provas e obtenção de informações.”
E, no art. 9º, cuida do que seria uma verdadeira entrega vigiada, aduzindo
que
“se a ação controlada envolver transposição de fronteiras, o retardamento
da intervenção policial ou administrativa somente poderá ocorrer com a
cooperação das autoridades dos países como provável itinerário ou destino
do investigado, de modo a reduzir os riscos de fuga e extravio do produto,
instrumento ou proveito do crime.
Por sua vez, é de se notar que a entrega vigiada atualmente prevista no
art. 53, II, da Lei n. 11.343/2006, não envolve a previsão de necessária
transposição de fronteiras, na verdade prestando-se a permitir uma vigilância
sobre a circulação de drogas no território nacional.
Por conseguinte, é de se considerar, salvo melhor juízo, que a previsão
original da Lei n. 11.343/2006, quanto à entrega vigiada (art. 53, II), deva ser
mantida e a ela adicionada a previsão mais genérica de ação controlada disposta
na Lei n. 12.850/2013, bem como a previsão de entrega vigiada mais específica,
igualmente constante desta última.
Não se deve desconsiderar, por fim, que o momento de utilização do
instituto da ação controlada pode aparecer na investigação quando ainda não se
disponha de dados suficientes de que o grupo que esteja possivelmente
cometendo crime de tráfico se constitua efetivamente como uma organização
criminosa, ao invés de um mero concurso de pessoas. Daí o motivo para que
conste, na Lei n. 11.343/2006, a previsão expressa da possibilidade de aplicação
dos procedimentos investigativos previstos na Lei n. 12.850/2013
(especificamente listados em seu art. 3º).
No cotejo entre a redação atual, referente ao procedimento, e a proposta
neste documento, pode-se dizer que a celeridade, a segurança e a especificidade
foram o norte das alterações processuais e procedimentais.
Demais disso, tratou-se também apreensão, arrecadação e destinação de
bens, direitos, ou valores do investigado ou acusado.
O crime organizado, que tem como base o tráfico de drogas ilícitas e, de
permeio, o contrabando de armas e a corrupção, movimenta no planeta cifras que
representam três vezes o PIB do Brasil, a ponto de transformar-se em um dos
maiores empreendimentos financeiros do mundo. Os sistemas bancários e de
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capitais, em escala global, se encarregam de fazer circular e promover a lavagem


desse dinheiro contaminado com substâncias entorpecentes, que traz graves
consequências sociais graves e alimenta a violência.
Esse fenômeno está bem presente no Brasil. As facções criminosas que
comandam a criminalidade possuem como suporte financeiro os recursos
oriundos do tráfico de drogas. As organizações criminosas possuem arrecadação
anual que as coloca entre as maiores empresas no país no critério faturamento.
As considerações acima revelam que a preocupação em eliminar os
ganhos financeiros com a comercialização de drogas ilícitas é tão importante
quanto cuidar dos tipos penais pertinentes a essa modalidade de criminalidade.
Até porque a finalidade do tráfico de entorpecentes é a obtenção de lucro. Por
conseguinte, o maior eficácia na repressão e prevenção ao tráfico passa,
necessariamente, por uma política criminal voltada para impedir que esse tipo
de crime seja compensado com o lucro obtido, sendo esta a orientação da
Convenção Única sobre Entorpecentes de Nova York, de 1961 (Decreto n. 54.216, de
1964), da Convenção sobre Substâncias Psicotrópicas de Viena de 1971 (Decreto n.
79.388, de 1977) e da Convenção contra o Tráfico Ilícito de Entorpecentes e de
Substâncias Psicotrópicas de 1988 (Decreto n. 154, de 1991).
Nessa senda, as propostas da Comissão têm como premissa tornar mais
eficiente a persecução criminal quanto à eliminação do lucro com o tráfico de
entorpecentes e a desconstrução financeira de organizações criminosas que
utilizam esses recursos para estabelecer as suas relações de poder.
Objetiva-se punir o tráfico, nomeadamente o de grandes proporções, e seu
financiamento, para quebrar sua estrutura financeira. Com isso, a repressão
deixará de se basear em flagrantes do pequeno vendedor de rua, que produz
apreensões ínfimas, incapazes de vulnerar o nefando comércio – além de fornecer
soldados indefesos às facções criminosas nas cadeias - e passará a se basear em
ações de inteligência, essas sim suscetíveis de golpear o tráfico e reduzir o poder
das organizações criminosas.
Por fim, construiu-se proposta temporária de fixação de quantitativos para
caracterização de uso de drogas ilícitas – para efeitos do art. 28 – bem como
balizadores necessários para o uso medicinal de plantas que podem servir para a
produção delas.
O conteúdo desta proposta, no sentir dos juristas e do médico integrantes
da Comissão representa uma estratégia moderna e segura, com sólido arrimo
científico, para o enfrentamento de tão grave questão social, de saúde, econômica
e política não apenas no Brasil, mas em todo o mundo.
Espera-se que as Senhoras e Senhores Parlamentares possam –
evidentemente após os necessários aperfeiçoamentos a serem feitos – transformar
essas sugestões em realidade jurídica.

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