Professora Merlina Correia Alunos do 4.ºano de LPECV
2022/2023 Reflita sobre a passagem:
• A poesia da Negritude distingue-se das restantes literaturas
africanas de língua portuguesa pelo obsessivo tratamento da raça e da cor negra, qualificando-as com valores reais e simbólicos , reagindo desse modo, ao racismo branco: “o sangue negro, o sangue bárbaro” (Noémia de Sousa) A Négritude lançou as suas raízes até os movimentos culturais protagonizados por negros, brancos e mestiços que, desde as décadas de 10, 20 e 30 vinham pugnando por um Renascimento Negro (busca e revalorização das raízes culturais africanas, crioulas e populares) principalmente em 3 países das Américas, Haiti, Cuba e Estados Unidos da América, mas também um pouco por todo lado. O termo "negritude" apareceu provavelmente pela primeira vez no poema de Aimé Césaire, Cahier d'un retour au pays natal (1939). Os primeiros proponentes da Negritude enfatizavam, como pontos capitais no movimento:
- a reivindicação, por parte do negro, da cultura africana
tradicional, visando à afirmação e definição da própria identidade; - o combate ao eurocentrismo advindo do colonialismo europeu e da educação ocidental prevalecente;
- a valorização da cultura negra no mundo, em razão de suas
contribuições específicas do ponto de vista cultural e emocional as quais o Ocidente, materialista e racionalista, nunca apreciou devidamente. O ano de 1933, com a publicação do jornal L'étudiant noir, tem sido em geral considerado o do nascimento oficial do movimento. Seus editores foram Aimé Césaire (Martinica) , Léon-Gontran Damas (Guiana Francesa) e Léopold Sédar Senghor (Senegal), então estudantes em Paris. Além de criticarem a arrogância do Ocidente e de proporem soluções socialistas para o problema dos povos explorados, esses jovens escritores formulavam uma nova visão do mundo para os negros. A Negritude atraiu ampla atenção internacional após a Segunda Guerra Mundial, com o aparecimento de Présence africaine (1947), jornal que promovia os conceitos da Negritude, e com a publicação da Anthologie de la Nouvelle Poésie Nègre et Malgache de Langue Française (1948), editada por Senghor.
Depois da emancipação da maior parte das antigas colônias
africanas no início da década de 1960, a Negritude decresceu como movimento organizado. Os fundamentos da Negritude incluem a redescoberta da história e das culturas do continente africano e da diáspora negra no mundo. Contemporânea do surrealismo (em Portugal, do Neo-realismo), usou no seu discurso a componente ideologia do Pan-africanismo, já de si influenciado pelo Marxismo. Todavia, em 1939, Senghor escreveu que “a emoção é tão negra, como a razão, é branca” e que “o ritmo é a força ordenadora que define o estilo negro”. Começa aqui o pendor místico da Negritude em relação ao negro, considerado de uma perspetiva essencialista e generalizante, que passava ao lado das especificidades sociais, económicas, políticas e nacionalistas. Senghor, com a sua presidência do seu país (Senegal), os inumeráveis escritos teóricos e uma larga aceitação ocidental (política, literária e académica), contribuiu decisivamente para a divulgação da tendência ecuménica, dialogante, da Négritude. A Négritude contituiu-se como o processo de busca de identidade, de conduta desalienatória e da defesa do património e do humanismo dos povos negros. Recusou a assimilação a modelos externos à história negro-africana, embora consciente dos contributos aculturativos, sobretudo nas cidades. A Négritude pretendia a criação de um estilo próprio, no desejo de se demarcar dos modelos e motivos históricos das literaturas ocidentais. Nega-se, dessa forma, não o valor das culturas europeias (ou quaisquer outras), mas a sua dominação sobre as culturas africanas, pelo poder imperial e colonial. Chega-se assim à recusa textual da “música fútil/ das valsas de Strauss” (Noémia de Sousa), afirmado ironicamente: “Cresçam sinfonias de Beethoven/e poemas que o amigo Mussunda não entende” (Agostinho Neto). A África, a negro e a Mãe-Negra (Mãe África ou Mãe- Terra)ocupam nos textos um lugar de destaque, como referências, alusões ou temas, numa declaração humanística de povos até aí apresentados e representados (na literatura colonial), como destituídos da história, cultura e mesmo de sentimentos. Segundo a análise de Sartre, no referido prefácio à Anthologie, de Sengho dá-se a revalorização (e a sobrevalorização) das culturas em modos de vida ancestrais (tribais, clânicos), com o culto dos antepassados, o animismo e a respectiva animização retórica da natureza, o pan- sexualismo vitalista, a visão eufórica e ufanista das relações sociais e familiares nas tribos e no mundo rural e natural. Ou seja, opõe-se ao mundo tecnológico e racionalista dos europeus e mundo rural e sensitivo dos africanos, num posicionamento que receberia críticas devastadoras dos homens empenhados na abertura de África ao mundo moderno, através de revoluções socialistas. Críticas:
Esteve sob a mira de acirradas críticas da geração seguinte de
escritores africanos de fala inglesa e francesa, que denunciaram o movimento e seus postulados como racistas e irrelevantes quanto aos problemas da África pós-colonial. Cont.
Mais recentemente, escritores e teóricos (como René Depestre
e Edouard Glissant) têm criticado especificamente o caráter essencialista da Negritude (ou seja, a concepção de que há uma essência distinta a definir o negro e a distingui-lo do branco), propondo outras alternativas mais rentáveis para o entendimento das sociedades e culturas das populações afro- descendentes das Antilhas. Aimé Césaire (1913-2008)
• foi poeta e político martinicano. Estudou em Paris numa
época em que se respirava a arte de vanguarda. Interessou-se pelo surrealismo na mesma época em que formou, junto com Léopold Sédar Senghor, Léon- Gontram Damas e outros, um grupo de discussões sobre identidades e valores culturais do homem negro. Fundaram, nesta época, o jornal L’Étudiant Noir, onde aparece escrita, pela primeira vez a palavra Negritude: (…) queremos explorar os nossos próprios valores, conhecer os nossos próprios valores, conhecer as nossas forças por experiência pessoal, cavar a nossa própria profundeza, as fontes eruptivas do humano universal, romper a mecânica identificação das raças, rasgar os superficiais valores, abarcar em nós o negro imediato, plantar a nossa Negritude como uma bela árvore até que ela traga os frutos mais autênticos[1]. Bibliografia • - Laranjeira, P. (1995). Literaturas Africanas de Expressão Portuguesa. Lisboa. Universidade Aberta.
Négritude em Questão: Das Multiplicidades e Conceitualizações Do Movimento Por Ocasião Do Primeiro Congresso Internacional de Escritores e Artistas Negros (1956) - Raissa Brescia Dos Reis