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Universidade da Integração Internacional da Lusofonia Afro-Brasileira (UNILAB)

Grupo de Estudos em Linguística Textual (GELT/FUNCAP)

A ciberviolência discursiva
Profa. Dra. Mariza Angélica Paiva Brito

Maria Elisângela Rodrigues


Thiago Rodrigo Diniz de Sousa
O que diz o discurso
ordinário
E se esclarece que ela “atinge principalmente as mulheres” (POCKET, 2016, s.p.).
Entretanto, outros afirmam reconhecer a ambivalência das palavras chamadas de violentas,
pois certos empregos podem produzir um efeito positivo:

Quem nunca disse “Que idiota!” ao seu/à sua melhor amigo(a)? Entre amigos, os palavrões
podem ser uma demonstração de afeição, uma implicância, significando apenas “Que
bobagem!”, “Você me mata de rir!”. É uma linguagem codificada, impessoal, um sinal de
amizade, só para rir. Conforme o vínculo entre as pessoas, o tom empregado e o contexto, os
insultos não visam forçosamente a magoar. Podem até ser apelidos afetivos!
(FILSANTÉJEUNES, 2015, s. p.)
O que diz o discurso
ordinário
Charaudeau destaca a importância de examinar o discurso cotidiano para compreender como a
violência verbal se manifesta nas interações comuns. Ele argumenta que muitas vezes a violência
verbal está presente no discurso cotidiano, e sua análise deve considerar como as pessoas usam a
linguagem para expressar agressão, hostilidade ou discriminação.
Da violência em geral:
Algumas reflexões

• A violência, em geral, e a violência verbal em particular


não datam de hoje.

• E insultos foram ditos em todas as épocas, sinal de que


insultar é humano.
Da violência em geral:
Algumas reflexões
• Charaudeau reflete sobre a natureza da violência em geral,
incluindo suas várias formas, desde a física até a verbal e a
simbólica.

• Ele explora como a violência está enraizada em estruturas sociais e


culturais e como a linguagem desempenha um papel central na
perpetuação ou mitigação da violência.
Violência e agressão

A impossibilidade de fazer fila no pátio, os gritos nas escadas, a violência dos


alunos entre si, física ou verbal, a falta de civilidade geral são exemplos da violência
com que o professor se confronta. Contra a violência da regra se choca a violência
dos alunos. Há, portanto, um entrechoque das violências constitutivas do contexto
escolar (FEREZ, 2018, s.p.).
Violência e agressão
• Charaudeau diferencia violência de agressão, ressaltando que a agressão
refere-se a comportamentos hostis, enquanto a violência engloba ações
agressivas e outras formas de dano.

• Ele examina como a linguagem pode ser uma ferramenta de agressão, mas
também observa que a violência pode ser expressa de maneiras mais subtis
através das palavras.
Não confundir violência e relação
de dominação
• Charaudeau enfatiza a importância de distinguir entre violência e
relações de dominação.

• Ele adverte que nem toda relação de dominação envolve violência


explícita, e a análise precisa discernir entre esses conceitos,
reconhecendo que podem estar interligados em algumas situações.
Distinguir violência física e
violência verbal
• Violência física

A violência física tange a atos de comportamento gestual que, pelo emprego da força, causam
um dano ao corpo daquele que a sofre e que se torna vítima graças a esse ato. A vítima não
precisa interpretar o ato em questão, não precisa opinar sobre o resultado dessa ação, pois é na
própria instância dessa ação que ela se torna vítima.

Julga-se a violência física pelo resultado: um dano sofrido por um corpo (ferimento ou morte),
do qual a pessoa se torna vítima pelo ato em si. O que cabe, então, ao juiz é constatar o estado
do agredido e determinar a responsabilidade do agressor.
Distinguir violência física e
violência verbal
• Violência verbal

A violência verbal vem de um ato de linguagem que se manifesta pelo emprego de certas
palavras, estruturas ou expressões capazes de ferir psicologicamente uma pessoa, presente ou
ausente, diretamente dirigida ou em posição de terceiro. Mas, como para qualquer outro ato de
linguagem, o sentido do ato de agressão verbal e seu impacto dependem da interpretação do
receptor. Pode acontecer de a pessoa visada por esse ato verbal não se sentir nem atingida nem
ferida.
Distinguir violência física e
violência verbal

• Charaudeau ressalta a importância de distinguir entre violência física (como agressões


físicas) e violência verbal (como o uso de palavras prejudiciais). Ele argumenta que
essas duas formas de violência têm características distintas e podem ter diferentes
impactos nas vítimas.
As palavras e as noções

• Charaudeau explora como as palavras usadas no discurso podem transmitir


noções de poder, hierarquia e submissão.

• Ele sugere que a análise da violência verbal deve considerar como as


palavras são utilizadas para reforçar ou desafiar essas noções.
Insulte > Insulter
• "Insulte" é um substantivo que representa o resultado ou o produto de um ato de
fala ofensivo. É uma palavra que se refere ao conteúdo ou à expressão insultante
em si. Em outras palavras, é a materialização do ato de insultar na forma de
palavras ou gestos ofensivos.

• "Insulter" é um verbo que representa a ação de proferir insultos, ofender alguém


ou realizar um ato de fala que é considerado rude ou depreciativo. É a realização
do ato de fala ofensivo em si. Quando alguém "insulte" outra pessoa, está
executando a ilocução de insultar, usando linguagem ou comportamento
depreciativo.
Injure > Injurier

• "Injure" é relacionado ao substantivo "injúria" ou "ofensa", que se refere a


palavras ou ações que prejudicam a dignidade ou a integridade moral de
uma pessoa.

• "Injurier" é o verbo correspondente a "injure", representando o ato de


proferir injúrias ou ofensas verbais contra alguém.
Juron > Jurer

• "Juron" se refere a uma "imprecação" ou "palavra de profanação" e geralmente


envolve o uso de linguagem vulgar, blasfema ou obscena.

• "Jurer" é o verbo correspondente a "juron" e significa "jurar". Inicialmente, o


termo "jurer" significava "prestar juramento" e apelar para uma autoridade
sagrada, como Deus, para afirmar a verdade. No entanto, com o tempo, também se
tornou associado a expressões sacrílegas ou profanas, como o uso de nomes
sagrados em vão.
Como avaliar a força de
violência das palavras?

• Não se pode atribuir a priori um grau de violência às


palavras, pois, uma vez mais, a força das palavras
depende, para seu efeito, dos contextos de emprego e
daquele que as recebe.
Como avaliar a força de
violência das palavras?

• Charaudeau propõe uma avaliação da intensidade da violência verbal


com base em critérios como intensidade emocional, intenção do falante,
contexto e impacto na vítima.

• Ele argumenta que essa avaliação pode ajudar a compreender a


gravidade da violência verbal.
As condições de produção

• O autor ressalta que a análise da violência verbal deve levar em consideração as


condições de produção do discurso, como o contexto social, político e cultural em que
ocorre.

• Ele enfatiza que o contexto desempenha um papel fundamental na interpretação da


violência verbal.

• Essas reflexões de Patrick Charaudeau fornecem uma estrutura abrangente para a análise
da violência verbal, enfatizando a importância de considerar o contexto, a intenção e os
efeitos das palavras usadas nas interações humanas.
Ciberviolência discursiva

• Etimologicamente, o termo violência tem origem no latim violentia e significa força ou vigor desferido
contra qualquer coisa ou ente. A violência é o uso da força que resulta em agressão, ferimentos, tortura ou
até morte, ou uso de palavras e ações que machucam ou até constrangem as pessoas, ou, ainda, o abuso do
poder numa relação quase sempre hierárquica. Assim, a violência pode ter graus variáveis, a depender se a
agressão afeta a integridade física, moral ou mesmo os direitos de uma pessoa. (BRITO et al, 2022).

• Paveau (2017), define ciberviolência como acontecimentos discursivos morais desencadeados por
enunciados violentos relacionados à noção de decência, de uma época, de uma cultura e de um espaço.
Amossy (2017) salienta que os usos de violência são muito frequentes na internet e parecem integrar uma
rotina aceita em certas comunidades virtuais.
Ciberviolência discursiva

• Os usuários intensificam discussões, violam as regras de civilidade e


parecem ameaçar o bom andamento da interação.

• Por isso, a ciberviolência pode ser associada à polêmica, porque não


busca o acordo com a outra parte, apenas silenciar o outro. Quando se
priva o outro da palavra, tira-se do sujeito a liberdade de fala. (BRITO et
al., 2022)
As formas de assédio direto

• Ciberassédio físico;
• Assédio verbal on-line ou flaming;
• Assédio não verbal on-line (imagens);
• Assédio social on-line por exclusão.
As formas de assédio indireto

• Outing;
• Usurpação de identidade;
• Difamação;
• Sites de ódio.
Parâmetros tecnodiscursivos

• Anonimato-pseudonimato;
• O efeito de ausência e a cultura do quarto;
• O efeito cockpit;
• O deslocamento da relação de poder;
• A inseparabilidade;
• A viralidade.
Desqualificação do outro

Para Amossy (2017), a desqualificação do adversário, esse tipo de


argumentação não é um simples gerenciamento de conflitos que se
dicotomizam e polarizam, mas é um discurso naturalmente
desqualificador no qual o Oponente ataca o adversário e usa a favor dessa
empreitada todos os procedimentos retóricos e argumentativos possíveis,
na tentativa de deslegitimá-lo.
Desqualificação do outro

O objetivo, na desqualificação do outro em uma modalidade polêmica,


não é discutir os méritos da razoabilidade dos argumentos do Oponente,
mas sim desqualificar o adversário como interlocutor sério, apresentando-
o como alguém incompetente, não confiável ou inconsequente.
(CAVALCANTE et al., 2020, p. 63).
Desqualificação do outro

Por fim, tem-se a desqualificação do outro, traço da polêmica de nosso


interesse para esta pesquisa. Os participantes de uma polêmica pública se
reagrupam em lados opostos, refirmando não só o aspecto identitário que os
une uma relação de um “nós” contra um “eles”, como também apresenta o
adversário pejorativamente. Isso faz parte de um aspecto inerente à fala
polêmica – o contradiscurso.
(DUTRA; FARIAS, 2022)
Referências Bibliográficas
AMOSSY, R.. Apologia da polêmica. São Paulo: Contexto, 2017.

BRITO, M. A. P.; CABRAL, A. L. T.; SILVA, A. A. A ciberviolência em práticas textuais do ambiente


digital. Entrepalavras, Fortaleza, v. 12, n. esp., e2407, p. 52-75, out./2022. DOI: 10.22168/2237-6321-2407.

CAVALCANTE; Mônica Magalhães et al. Linguística Textual e Argumentação. 1.ed.


Campinas: Pontes, 2020.

CHARAUDEAU, P. Reflexões para a análise da violência verbal. Tradução de Patrícia Reuillard (UFRGS);
coordenação de Ernani Cesar de Freitas (UPF/PPGL), 2019 Disponível em http://www.patrick-
charaudeau.com/Reflexoes-para-a-analise-da,362.html Acesso em 30 de setembro de 2022.

PAVEAU, M.. Análise do discurso digital: dicionário das formas e das práticas. Campinas: Pontes, 2021.
Obrigado

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