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ABORDAGEM DO LUTO NA

ATENÇÃO PRIMÁRIA À SAÚDE

PSF – AROEIRA

Drª. Magalis Calderón Díaz

PÉ DE SERRA - BA, 2023


INTRODUÇÃO

• Atenção Primária à Saúde (APS) é a porta principal de entrada ao serviço de saúde para toda
população e tem o compromisso de acolher, avaliar, diagnosticar e encaminhar aos serviços
especializados, além de acompanhar o usuário no que tange à sua integralidade, totalidade e
equidade em saúde.

• A integralidade da assistência é um dos princípios do SUS (Sistema Único de Saúde) e significa


considerar a integralidade do sujeito, dos serviços e dos cuidados, de forma completa, e não
parcial, nos diversos níveis de complexidade.

• Contudo, é importante ressaltar que nem sempre a APS é o serviço escolhido pelo usuário que
busca alívio para a dor do luto, pois ele é livre para escolher democraticamente o local onde quer
ser atendido, podendo não ter clareza do papel da APS em sua comunidade.
• A ciência que estuda a morte e o morto, em suas
diversas dimensões, é a Tanatologia, e o
aprofundamento do conhecimento nessa área é de
extremo valor para os profissionais de saúde, seja
para dar suporte emocional à família ou para atestar
o óbito ( EXCLUSIVO DO MÉDICO).

• O luto envolve uma ou mais perdas e as reações


físicas, emocionais e comportamentais decorrentes
dessa perda.

• As perdas provocam uma reação individual e única e


iniciam um processo de luto, na tentativa de
reorganizar a vida do indivíduo que ficou abalada e
modificada pela nova situação.
v Viver o luto é o primeiro passo para que a transição
entre a ausência do ente querido se transforme em
um processo de amadurecimento para a própria
vida. Mas lembre-se: todo processo possui suas
fases que precisam do tempo necessário para serem
vividas.

v O Acompanhamento profissional é de suma


importância na recuperação do estado emocional do
enlutado, evitando que estes promovam doenças
tanto psicológicas, quanto fisiológicas, já que
envolvem diversas situações, como veremos nas fases
desse processo.
• Frente ao luto, muitas vezes, os profissionais da
Atenção Básica se vêem impotentes, não
sabendo, ao certo, como se posicionarem frente
ao sofrimento e à dor da família, além de terem
que vivenciar perdas de pacientes com os quais
conviveram e que possibilitou o estabelecimento
de vínculos intensos na comunidade
(BANDEIRA et al., 2014).

• Essa falta de preparo e de reflexões sobre a


morte deixa os profissionais perplexos frente à
tomada de decisões nesse tipo de situação
(BANDEIRA et al., 2014).
FASES DO LUTO
• Os comportamentos, ansiedades e defesas das pessoas doentes diante de uma notícia de
morte iminente podem ser classificados em 5 (cinco) estágios (KÜBLER-ROSS, 2017):

• NEGAÇÃO
• RAIVA
• BARGANHA
• DEPRESSÃO
• ACEITAÇÃO
NEGAÇÃO

• Funciona como um escudo que protege a o indivíduo depois de uma


noticia ruim/triste. É uma defensa temporária sendo logo substituída por
uma aceitação parcial. Esses comportamentos tornam o manejo um
verdadeiro desafio para o profissional de saúde.

• A fase inicial e, talvez mais crítica devido ao calor do momento, o


recebimento da pior notícia. Muitas vezes exige força humana ou mesmo
contenção por medicamentos para acalmar o familiar/acompanhante.
RAIVA

• Quando não é mais possível manter o primeiro estágio de negação, ele é substituído por
sentimentos de raiva, de revolta, de inveja, de ressentimento. Poucos profissionais se
colocam no lugar dessas pessoas e se perguntam de onde vem essa raiva.

• Más, se você sentir essa dificuldade de se colocar no lugar de outro, pergunte-se: Se as


minhas atividades de vida tivessem que ser interrompidas prematuramente, eu também
não ficaria com raiva?

• Porque não poderia ter sido a minha vizinha rancorosa em vez de meu filho? Poderia ter
sido qualquer pessoa, menos com minha querida e bondosa mãe.
O terceiro estágio, o da barganha, é

BARGANHA o menos conhecido, mais igualmente


útil ao paciente ou para sua família.
A barganha, na verdade, é uma
tentativa de adiamento na qual se
espera ser recompensado por bom
comportamento quando a meta
estabelecida, for alcançada. Nesse
momento, uma abordagem
interdisciplinar é de suma
importância.

Eu sei que não fiz muitas coisas


boas na vida, mais se eu ajudar
mais ao próximo, poderia ter mais
chance de melhorar meu quadro?
Deus, eu te pedi com ira para que
não levasse a minha mãe, eu
prometo que farei doações
aos menos favorecidos, se o senhor
salva a minha mãe.
Nesse quarto estágio, a pessoa já
se apresenta retraída, triste e DEPRESSÃO
evitando contato com outros. Caso a
pessoa já se encontre mais
compreensiva com todo o processo,
ela conseguirá ir para o passo
seguinte: a ACEITAÇÃO.

Meu cabelo começou a cair, já não


tenho mais as minhas mamas, meus
dentes já não são os mesmos.

Já não sou mais a mesma mulher.


Como minha mãe está fraquinha, ela
já não fala mais. Precisa de ajuda
para as necessidades básicas.
ACEITAÇÃO

• Quando o paciente que está em cuidados paliativos, ou a família que está cuidando, já
passou por todos os estágios aqui descritos, já externou toda sua raiva e
incompreensão coma sua situação e recebe ajuda para superar tudo, atingirá o estágio
que nem é mais raiva, muito menos depressão, e a aceitação, É como se a dor tivesse
desaparecido, a luta fosse cessada e houvesse chegado o momento de preparação para
o destino final.

• Já posso partir, não fiquem tristes por mim. Estou pronto. Minha mãe já não aguanta
mais tanto sofrimento. Vai ser melhor para ela e para todos nós.
• Cada indivíduo reage de forma individual e única diante da perda, seja de um ente
querido, familiar ou de amizades, e o passo seguinte é iniciar o processo de luto,
tendo que lidar com a reorganização da vida que foi abalada e modificada pela nova
conjuntura. O luto nada mais é do que um trabalho psíquico que consiste em
elaborar a perda e em abandonar as relações com o objeto perdido (ONARI,
[2011]).
• Worden (1998) lista categorias no processo de luto normal, dividindo-as em:

• COGNIÇÕES: Descrença, confusão, preocupação, sensação de presença e alucinações.

• SENTIMENTOS: Tristeza, raiva, culpa, ansiedade, solidão, fadiga, desamparo, choque,


anseio, emancipação, alivio e estarrecimento.

• SENSAÇÕES FÍSICAS: Vazio no estomago, aperto no peito, nó na garganta,


hipersensibilidade ao barulho.
É de fundamental importância que a equipe de saúde conheça os principais fatores que influenciam no
enfrentamento do luto por parte da família, a fim de facilitar a assistência no momento
oportuno (QUEIROZ; QUEIROZ, 2012):

FISIOLÓGICOS PISICOLÓGICOS

• Natureza e significado da perda;​


• Controle de sintomas, sono, • Qualidades da relação com a pessoa falecida;​
alimentação; • Lugar que a pessoa falecida ocupava na dinâmica
• Autonomia e qualidade de vida. familiar;​
• Recursos de enfrentamento;​
• Personalidade e saúde mental;​
• Idade e aspectos sociais e culturais do enlutado;​
• Circunstâncias da terminalidade;​
• Perdas secundárias.​
SOCIAIS

• Isolamento; ​
• Suporte afetivo; ​
• Nova identidade social.

ESPIRITUAIS

• Sistemas de crenças;
• Relação espiritualidade e luto.
TÉCNICAS DE ABORDAGEM
• É importante refletir sobre o contexto no qual o indivíduo está inserido, sua
cultura, sua formação e seu desenvolvimento afetivo. Buscar saber quais são
as crenças, os apegos, os medos e as inseguranças vividos individual e
coletivamente, permitirá ao profissional da APS ter uma dimensão de suas
ações, podendo desenvolver uma abordagem mais efetiva e construir um
cuidado contínuo, podendo começar com:

• 1) Deixar falar sobre a perda é o melhor remédio


• 2) Ouvir, confortar, e não tentar conformar
• A partir do acolhimento (deixar falar, ouvir, compreender, comportar) montar o
genograma (organizar os familiares envolvidos/próximos) completo da família,
incluindo informações de como cada membro está lidando com o luto.

• Além disso, o profissional tem o dever de sinalizar os riscos que possam prejudicar
o indivíduo no processo de luto, como abuso de drogas e de alimentação, além de
abusos no âmbito de experiências que possam ter consequências incitadoras de
sofrimento biopsicossocial e espiritual, uma vez que o sujeito está vulnerável e
fragilizado pelo processo de luto.

• É pertinente, ainda, mencionar o quanto é importante as pessoas próximas


expressarem sentimentos congruentes em relação ao processo de luto, pois as
tentativas de ocultamento fazem com que o sujeito se sinta cada vez mais
angustiado, sozinho, abandonado, ansioso e alienado em relação à realidade.
A melhor maneira é estar junto à pessoa e estabelecer um vínculo de apoio, e cabe
à equipe toda definir de que forma realizá-lo.

• Algumas sugestões:

• Estimular ajuda mútua entre os familiares;


• Estimular suporte nas redes sociais, igrejas, clubes, grupos de arte etc.;
• Aconselhamento individual e/ou familiar;
• Grupo de apoio;
• Psicoterapia individual e/ou familiar;
• Acompanhamento conjunto com profissional da equipe da APS
Junto às equipes da Estratégia de Saúde da Família (ESF), é possível a criação
de estratégias que permitam ao enlutado ter acesso à assistência. A sociedade
vive a mercantilização e a cobrança em tempo e produção.

• Assim, que a equipe reconheça suas possibilidades de atuação e identifique com o paciente o que,
nesse momento, é importante para contribuir adequadamente com o processo de dor.

• Na APS, tem-se a oportunidade de contar com o território, entender o que este oferece em termos de
caminhos a serem percorridos, ou seja, buscar, junto a outros equipamentos, resoluções e possíveis
encaminhamentos e encaminhar/notificar os casos mais complexos.

• Junto à APS, é possível pensar em estratégias de educação para a comunidade, capacitando


os agentes de saúde e demais profissionais que, nesse contexto, atuam para organizar espaços
de escuta e aprendizagem, com o objetivo de atingir o território em que se está inserido.
Para guiar o Médico de Família e Comunidade (MFC) nessa abordagem ao luto, o
acrônimo REFINO foi criado para indicar ações benéficas em relação a esse cuidado:
São listadas, a seguir, mais algumas ações que podem ser utilizadas
como estratégia para melhor abordagem aos pacientes enlutados:

• Educação continuada sobre cuidado do luto, o que pode gerar compreensão do


tema e melhor atendimento à comunidade;
• Discussão de casos e matriciamento por profissional capacitado, visando
compreender que somente encaminhar sem discutir não é eficaz. Ter esse olhar
delicado para a questão pode prevenir sofrimentos futuros;
• Tempo adequado para atendimento. É necessário que o tempo de atendimento seja
maior do que 15 minutos e a unidade básica de saúde (UBS) precisa flexibilizar as
agendas;
• A estrutura deve possibilitar salas onde os profissionais possam sentir-se seguros para que
o atendimento aconteça de portas fechadas, pois isso favorece a fala do paciente;
• Incluir, na rotina do médico de família e comunidade (MFC), reuniões familiares nos casos
em que o paciente esteja em fase final de vida, pois essa ação ajudará os enlutados no
processo de organização e luto.

Essas pequenas ações no dia a dia têm a intenção de:

• Atenuar o sofrimento;
• Reabilitar comportamentos desadaptativos;
• Prevenir comportamentos de risco;
• Aperfeiçoar comportamentos adequados;
• Promover comportamentos necessários;
• Visar ao bem-estar do paciente.
• O trabalho com o luto na APS deve ser visto
como essencial e possível. A equipe de saúde
precisa tomar cuidado para, em meio a tantas
ATRIBUIÇÕES urgências, demandas e diagnósticos, não
silenciar o cuidado a esse sofrimento.
DOS

PROFISSIONAI A principal tarefa dos profissionais é resgatar
a vida do paciente enlutado, englobando os
S DE SAÚDE aspectos físicos e psíquicos para, assim,
permiti-lo revelar seus medos, desejos,
emoções e sentimentos.
• É fundamental estar em contato
autêntico com esse ser humano. O
ATRIBUIÇÕES profissional da saúde se vale de seu único
DOS e legítimo instrumento — a palavra. O
trabalho, então, consiste em ajudar a pessoa
PROFISSIONAI a reencontrar a doçura das palavras.
S DE SAÚDE

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