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Direito Sucessório Brasileiro:

concorrência do cônjuge ou do
companheiro supérstites,
na sucessão dos descendentes.

Giselda Maria Fernandes Novaes Hironaka


Doutora e Livre Docente em Direito pela Faculdade de Direito da USP
Professora Associada ao Departamento de Direito Civil
Faculdade de Direito da USP
Diretora da Região Sudeste do IBDFAM
Cônjuge: pressupostos e
disposição legal específica
 Regime de bens compatível com a
concorrência (art. 1.829, I).
 Cônjuge não separado judicialmente, nem de
fato (art. 1.830).
 Art.1832: Em concorrência com os
descendentes (art.1829, inciso I) caberá ao
cônjuge quinhão igual ao dos que sucederem
por cabeça, não podendo a sua quota ser
inferior à quarta parte da herança, se for
ascendente dos herdeiros com que concorrer.
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Regra: 1ª parte do art. 1.832
 Cônjuge supérstite e descendentes
recebem a mesma quota hereditária.
 Aplicabilidade: quando o cônjuge
sobrevivo concorre com um, dois ou
três descendentes do falecido, sejam
eles descendentes ou não do cônjuge
sobrevivente.
 Assim:

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Cônjuge concorrendo com 1
descendente (comum
ou exclusivo)

1/2 1/2

Cônjuge Descendente

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Cônjuge concorrendo com 2
descendentes (ambos comuns
ou ambos exclusivos)

1/3 1/3

1/3

Cônjuge Descendente 1 Descendente 2

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Cônjuge concorrendo com 3
descendentes (todos comuns
ou todos exclusivos)

1/4 1/4

1/4 1/4

Cônjuge Descendente 1 Descendente 2 Descendente 3

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Exceção: cônjuge
concorrendo com 4 descendentes
ou mais
 A partir desta hipótese, na qual o
cônjuge concorre com 4 descendentes
ou mais, garante-se-lhe a reserva legal
da quarta parte da herança, sempre
que concorrer com herdeiros do
falecido, que sejam também seus
descendentes.
 Assim:
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Cônjuge concorrendo com 4
descendentes (todos comuns)

3/16
1/4

3/16
3/16

3/16

Cônjuge Descendente 1 Descendente 2


Descendente 3 Descendente 4

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E assim sucessivamente:

 Mantém-se fixa a quota-parte (25%)


do cônjuge sobrevivente e diminui-se,
proporcionalmente, a quota-parte de
cada um dos descendentes comuns.

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Porém, já não será assim se:

 o cônjuge concorrer com mais de três


herdeiros exclusivos do falecido,
situação em que não haverá a reserva
da quarta parte da herança.

 Assim:

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Cônjuge concorrendo com 4
descendentes (todos
exclusivos)

1/5 1/5

1/5 1/5

1/5

Cônjuge Descendente 1 Descendente 2


Descendente 3 Descendente 4

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O legislador

 Esta foi a escolha do legislador:

 Privilegiar o cônjuge nos casos em


que a concorrência se produzir à
face de descendentes comuns. E
apenas nesse caso!

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O problema?

 O legislador não previu a comum hipótese de


o de cujus ter deixado
descendentes comuns
e
descendentes exclusivos,
com os quais concorra o cônjuge sobrevivo.

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Haverá solução?
 O problema, por óbvio, só se colocará na
prática se houver mais de três descendentes
do falecido.
 Nestes casos – mais de três descendentes,
com os quais concorra o cônjuge sobrevivo –
como determinar o modo de partilhar?
 Deve, ou não, ser resguardada a quarta parte
a favor do cônjuge concorrente?

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Os possíveis caminhos
hermenêuticos, à busca de
solução

 Considerem-se três hipóteses:

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1ª hipótese
 Considerar todos os descendentes como
comuns: resguarda-se a quarta parte.
 Problema prático e real: os herdeiros
exclusivos do autor da herança sentir-
se-ão lesados na medida em que sua
quota será menor do que aquela que
receberiam, se não fossem equiparados
aos herdeiros comuns.
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5 descendentes comuns,
4 descendentes exclusivos,
supondo o monte partível igual a 900

1/12
1/12 1/4
1/12
1° Trim.
1/12 1/12
2° Trim.
1/12 1/12 3° Trim.
1/12 1/12
4° Trim.

Cônjuge Descendente 1 Descendente 2


Descendente 3 Descendente 4 Descendente 5
Descendente 6 Descendente 7 Descendente 8
Descendente 9

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2ª hipótese

 Considerar todos os descendentes como


exclusivos: não se resguarda a quarta parte
 Problema prático e real: o cônjuge sobrevivo
sentir-se-á lesado na medida em que sua
quota será menor do que a que receberia, se
os herdeiros fossem todos considerados
descendentes comuns.

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5 descendentes comuns,
4 descendentes exclusivos,
supondo o monte partível igual a 900

1/10 1/10
1/10 1/10

1/10 1/10

1/10 1/10
1/10 1/10

Cônjuge Descendente 1 Descendente 2


Descendente 3 Descendente 4 Descendente 5
Descendente 6 Descendente 7 Descendente 8
Descendente 9

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Observação

 Estas soluções de identificação dos


descendentes herdeiros (hipótese híbrida)
não podem prevalecer, pois ferem o
espírito conferido pelo legislador ao
dispositivo legal aplicável a cada uma das
situações, em separado (descendentes
comuns ou descendentes exclusivos).

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3ª hipótese

 Divisão do monte partível,


proporcionalmente, segundo o nº
de herdeiros comuns e segundo o
nº de herdeiros exclusivos.
 Assim:

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5 descendentes comuns,
4 descendentes exclusivos,
supondo o monte partível igual a 900.

Comuns Exclusivos

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Então:

 Operada esta divisão em dois sub-


montes, cada um deles se partiria
segundo a regra do art. 1.832 aplicável
a cada hipótese (ora a 1ª parte – regra
geral – ora a 2ª parte – exceção).
 Assim:

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Partilha do sub-monte comum
(5/9 do monte total = 500)
com reserva da quarta parte

75
125

75 1° Trim.
2° Trim.
3° Trim.
75
4° Trim.
75
75

Cônjuge Descendente 1 Descendente 2


Descendente 3 Descendente 4 Descendente 5

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Partilha do sub-monte exclusivo
(4/9 do monte total = 400)
sem reserva da quarta parte

80 80

80 80

80

Cônjuge Descendente 6 Descendente 7


Descendente 8 Descendente 9

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Consolidando as quotas havidas
em cada um dos sub-montes

 Cônjuge: 125 + 80 = 205


 Descendentes comuns: 75
 Descendentes exclusivos: 80

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Quais as imperfeições
desta 3ª solução?

 O cônjuge sobrevivente recebeu 41/180


avos, o que equivale a 22,77777%...
 Os filhos recebem quotas desiguais, o
que desatende ao art. 1.834 e aos
ditames constitucionais.

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Companheiro: pressuposto e
disposição legal específica
 Concorre apenas em relação aos bens
adquiridos onerosamente na vigência da união
estável (art. 1790, caput).
 Art. 1.790: A companheira ou o companheiro

participará na sucessão do outro, quanto aos bens


adquiridos onerosamente na vigência da união
estável, nas condições seguintes:
I - se concorrer com filhos comuns, terá direito a uma
quota equivalente à que por lei for atribuída ao filho;
II - se concorrer com descendentes só do autor da
herança, tocar-lhe-á a metade do que couber a cada
um daqueles; [...]
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Companheiro concorrendo
com um filho comum

1/2 1/2

Companheiro Filho 1

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Companheiro concorrendo
com um descendente
exclusivo

1/3

2/3

Companheiro Descendente 1

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Companheiro concorrendo com
2 filhos comuns

1/3 1/3

1/3

Companheiro Filho 1 Filho 2

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Companheiro concorrendo com
2 descendentes exclusivos

1/5

2/5

2/5

Companheiro Descendente 1 Descendente 2

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O legislador

 Esta foi a escolha do legislador:

 Privilegiar o companheiro quando


a concorrência se produzir à face
de filhos comuns. E apenas nesse
caso!

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O problema?

 O legislador não previu a comum hipótese de


o de cujus ter deixado
descendentes comuns
e
descendentes exclusivos,
com os quais concorra o companheiro
sobrevivo.

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Haverá solução?

 Os possíveis caminhos hermenêuticos à


busca de solução:

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1ª hipótese

 Identificação de todos os filhos (comuns


e exclusivos) como se comuns fossem,
aplicando o inciso I do art. 1790.

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5 descendentes comuns,
4 descendentes exclusivos,
supondo o monte partível igual a 900

1/10 1/10
1/10 1/10

1/10 1/10 1° Trim.


2° Trim.
1/10 1/10
3° Trim.
1/10 1/10
4° Trim.

Companheiro Descendente 1 Descendente 2


Descendente 3 Descendente 4 Descendente 5
Descendente 6 Descendente 7 Descendente 8
Descendente 9

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2ª hipótese

 Identificação de todos os descendentes


(comuns e exclusivos) como se exclusivos
fossem, aplicando o inciso II do art. 1790.

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5 descendentes comuns,
4 descendentes exclusivos,
supondo o monte partível igual a 900

2/19 1/19
2/19
2/19
2/19
2/19
2/19
2/19
2/19 2/19

Companheiro Descendente 1 Descendente 2


Descendente 3 Descendente 4 Descendente 5
Descendente 6 Descendente 7 Descendente 8
Descendente 9

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Observação

 Estas soluções de identificação dos


descendentes herdeiros (hipótese
híbrida) não convém porque ofendem o
espírito conferido pelo legislador ao
dispositivo legal aplicável a cada uma
das situações, em separado (filhos
comuns ou descendentes exclusivos).
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3ª hipótese

 Composição dos incisos I e II do art.


1790, pela atribuição de uma quota e
meia ao companheiro sobrevivente (não
ofende o art. 1834, que confere
igualdade de direitos sucessórios aos
filhos).

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5 descendentes comuns,
4 descendentes exclusivos,
supondo o monte partível igual a 900

2/21 1/7
2/21
2/21
2/21
2/21
2/21
2/21
2/21 2/21

Companheiro Descendente 1 Descendente 2


Descendente 3 Descendente 4 Descendente 5
Descendente 6 Descendente 7 Descendente 8
Descendente 9

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Observação
 Ao se atribuir uma quota e meia ao
companheiro, por este viés de interpretação,
deu-se a ele mais do que o legislador
pretendeu, em cada caso. Além disso, a
composição de um tal quinhão derivou da
retirada de quantia do monte-mor, pela qual
todos os filhos se responsabilizaram
igualmente, o que também afronta o espírito
do legislador, estampado nos incisos I e II do
art. 1790

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4ª hipótese

 Composição dos incisos I e II do art.


1790, pela subdivisão proporcional da
herança, segundo a quantidade de
descendentes de cada grupo, comuns
ou exclusivos (ofende o caráter
constitucional do art. 1834)

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5 descendentes comuns,
4 descendentes exclusivos,
supondo o monte partível igual a 900.

Comuns Exclusivos

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Então:

 Operada esta divisão em dois sub-


montes, dividir-se-iam os montes
segundo a regra dos incisos I e II do
art. 1.790 aplicadas a cada hipótese.

 Assim:

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Partilha do sub-monte comum
(5/9 do monte total = 500)
companheiro herdando como filho

83,33 83,33

1° Trim.
83,33 83,33 2° Trim.
3° Trim.
4° Trim.
83,33 83,33

Companheiro Descendente 1 Descendente 2


Descendente 3 Descendente 4 Descendente 5

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Partilha do sub-monte exclusivo
(4/9 do monte total = 400)
companheiro herdando meia quota

44,44
88,88

88,88

88,88

88,88

Companheiro Descendente 6 Descendente 7


Descendente 8 Descendente 9

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Consolidando as quotas havidas
em cada um dos sub-montes

 Companheiro: 83,33 + 44,44 = 127,77


 Descendentes comuns: 83,33
 Descendentes exclusivos: 88,88

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Qual a principal imperfeição
desta 4ª solução?

 Os filhos recebem quotas desiguais, o


que desatende ao art. 1.834 e aos
ditames constitucionais.

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Observação
 Esta 4ª solução impede uma partilha
que não ofenda alguma das disposições
do NCC envolvidas no assunto, de modo
especial o art. 1834 que determina a
garantia de igualdade dos quinhões e
tem caráter constitucional.

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Algumas sugestões para as
alterações legislativas do CC/2002
 Supressão do art. 1.790.
 Alterar o inciso III do art. 1.829 para alocar o
companheiro sobrevivente na ordem de vocação
hereditária, como herdeiro.
 Alterar os incisos I e II do mesmo artigo para
alocar o companheiro sobrevivente, como
concorrente, quando os herdeiros forem os
descendentes ou os ascendentes.
 Alteração do mesmo inciso I no que concerne ao
regime de bens do casamento ou da união
estável. Assim:
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Algumas sugestões para as
alterações legislativas do CC/2002
 Art. 1.829 – A sucessão legítima defere-se na ordem
seguinte:
 I – aos descendentes, em concorrência com o cônjuge
sobrevivente, desde que o regime de bens do casamento
fosse o da comunhão parcial de bens, e desde que
houvesse bens particulares do falecido, sobre os quais
incidirá a referida concorrência; ou em concorrência com o
companheiro sobrevivente, acerca dos bens que fossem
exclusivos do falecido, não pertencentes ao acervo comum
onerosamente adquirido na constância da união estável.
 II – Aos ascendentes, em concorrência com o cônjuge ou
com o companheiro sobreviventes.
 III – ao cônjuge ou ao companheiro sobreviventes.
 IV – (...)

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Algumas sugestões para as
alterações legislativas do CC/2002
 Art. 1.832:
 Inserir o companheiro no caput do artigo, ao
lado do cônjuge.
 Inserir um parágrafo único nesse artigo com a
intenção de solucionar o problema da hipótese
híbrida, assim redigido:
Se a concorrência do cônjuge ou do
companheiro se produzir exclusivamente em
relação a herdeiros dos quais sejam
ascendentes, ser-lhes-á deferida, ao menos, a
quarta parte do acervo de bens sobre o qual
incidir a referida concorrência.
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Algumas sugestões para as
alterações legislativas do CC/2002
 Art. 1.831:
 Para acrescentar o companheiro na
previsão do direito real de habitação
 Art. 1.845:
 Inclusão do companheiro na categoria
dos herdeiros necessários ao lado dos
descendentes, dos ascendentes e do
cônjuge.

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