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9º SEMESTRE DE DIREITO

DIREITO CIVIL

SUCESSÃO HÍBRIDA E A RESERVA DA QUARTA PARTE DA


HERANÇA
O objetivo desse trabalho sobre as sucessões hereditárias é pesquisar a aplicabilidade
da reserva da quarta parte de herança ao cônjuge sobrevivente no caso de haver a situação de
sucessão híbrida.

Inicialmente, conceitua-se sucessões híbridas as situações em que há concorrências


entre o cônjuge, convivente ou companheiro sobrevivente, os filhos em comum ao de cujus e os
filhos exclusivos do de cujus. Ou seja, situação em que o(a) falecido(a) possui filhos com o
cônjuge consorte e filhos concebidos em outras relações.

Antes de quaisquer discussões, há de se considerar que a Constituição Federal, em seu


artigo 227 § 6º, considera que os “filhos, havidos ou não da relação do casamento, ou por
adoção, terão os mesmos direitos e qualificações, proibidas quaisquer designações
discriminatórias relativas à filiação”. Assim, todos os filhos são considerados de maneira
igualitária à luz da Constituição Federal, não podendo haver tratamentos diferenciado entre
eles.

Em face ao tema das sucessões, o artigo 1829 do código civil considera a preferência à
sucessão legítima aos ascendentes em concorrência com o cônjuge sobrevivente. O referido
código considera ainda que, nessa concorrência sucessória, dever-se-á garantir ao cônjuge,
companheiro ou convivente, a reserva de quarta parte da herança. O artigo que trata do tema
é o artigo 1832 do código civil, definindo que, ipsis litteris, “em concorrência com os
descendentes caberá ao cônjuge quinhão igual ao dos que sucederem por cabeça, não podendo
a sua quota ser inferior à quarta parte da herança, se for ascendente dos herdeiros com que
concorrer”.

É claro que o artigo 1832 considera o cônjuge quando for ascendente aos herdeiros a
quem concorrer. Porém, o código civil não possui dispositivo para tratar da situação em que o
cônjuge é ascendente de apenas parte dos herdeiros, caso haverá a filiação híbrida.

Encontra-se, assim, aberta uma lacuna quanto à reserva da quarta parte da herança ao
cônjuge, convivente ou companheiro, versada pelo artigo 1832 do código civil, no caso de
sucessão híbrida, que vinha dividindo os doutrinadores do direito.

Parte dos doutrinadores, dentre os mais renomados do país, entendiam que no caso de
herdeiros necessários híbridos concorrerem na sucessão com o cônjuge sobrevivente, não
caberia a reserva de quarta parte a este. Essa corrente doutrinária foi adotada como majoritária
e considerava toda a filiação como exclusiva, justificando a não aplicação da reserva do referido
artigo.

Todavia, uma segunda corrente doutrinária, entendida como minoritária, entendia que
deveria ser considerada a reserva da quarta parte, caso houvessem ascendentes comuns, pela
interpretação literal do artigo 1832 do código civil, independentemente da existência de filiação
exclusiva do de cujus.

Havia, ainda, uma terceira corrente que defendia a divisão de herdeiros em grupos de
descendentes comuns e descendentes exclusivos. Desta feita, caberia ao consorte a parte
proporcional aos grupos, segundo a sua participação em cada um deles.

Em todos os casos, deve-se considerar a reserva da meação, discutindo-se tão somente


o quinhão que caberia ao de cujus. Portanto, essa controvérsia objetiva a divisão da parte que
caberia ao de cujus, independente do regime adotado de comunhão de bens.
Para elucidar a questão, durante a V Jornada de Direito Civil, estabeleceu-se no
enunciado 527 que “na concorrência entre o cônjuge e os herdeiros do de cujus, não será
reservada a quarta parte da herança para o sobrevivente no caso de filiação híbrida”.
Assim, manter-se-ia o posicionamento da corrente doutrinária majoritária, em que
havendo herdeiros exclusivo do de cujus, o cônjuge, convivente ou companheiro, concorreriam
com os herdeiros necessários na proporção de cabeças concorrentes.
Em acórdão do Superior Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, julgou-se
um Recurso Especial nº 1.617.501-RS, impetrado pelo Ministério Público, que discutia a fixação
do quinhão hereditário que faria jus a companheira do de cujus, dentre outros temas. No caso
em tela, o de cujus possuía um filho em comum com a consorte, da qual era companheiro, bem
como mais seis filhos exclusivos.
No acórdão, com julgamento de 11 de junho de 2019, o relator Ministro Paulo de Tarso
Sanseverino, apresentou tabela com 5 teses doutrinárias para a discussão do tema, bem como
menciona o enunciado 527 da V Jornada de Direito Civil. Após ponderações sobre o exposto, o
Ministro concluiu que:
Em resumo, conclui-se que a reserva de no
mínimo 1/4 da herança em favor do consorte do
falecido ocorrerá apenas quando concorra com
seus próprios descendentes (e eles superem o
número de 3). Em qualquer outra hipótese de
concurso com filhos exclusivos, ou comuns e
exclusivos, não haverá a reserva de 1/4 da herança
ao cônjuge ou companheiro sobrevivente. É de
rigor, por conseguinte, a parcial reforma do
acórdão recorrido, reconhecendo-se que a
recorrida, Sra. Nara Alaides de Oliveira, concorrerá
com os demais herdeiros apenas sobre os bens
particulares (e não sobre a totalidade dos bens do
de cujus), recebendo, cada qual, companheira e
filhos, em relação aos referidos bens particulares, o
mesmo quinhão.
Portanto, entende-se que a reserva de quarta parte da herança ao cônjuge, convivente
ou companheiro, prevista no artigo 1832 do código civil, é aplicada tão somente quando o
consorte sobrevivente concorrer apenas com seus próprios descendentes. Havendo
descendentes exclusivos do de cujus, o consorte concorrerá com os demais herdeiros na
proporção que couber a cada um desses, preservada a meação a que fizer jus.

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