os 493 anos de Reforma Protestante. • Lutero e as 95 teses na Catedral de Wittenberg. 1. Origem da Reforma: Alguns pontos que caracterizavam a igreja romana no início do século XVI; ei- los: a) O papado era uma potência religiosa e política e, grande parte da vida eco- nômica girava em torno das igrejas paro- quiais, ocasionando uma insatisfação por parte das autoridades civis, devido à ingerência do papa em seus negócios. b) Havia uma corrupção política, econô- mica e moral generalizada na "igreja" e no clero, contribuindo para um sentimen- to anti-clerical. c) Uma profunda carência espiritual: A igreja tornara-se extremamente meticulo- sa no confessionário e, ao mesmo tempo, induzia os fiéis a realizarem boas obras que, como não poderiam deixar de ser, eram sempre insuficientes para eliminar o sentimento de culpa latente. • Tillich (1886-1965), resume: “Sob tais condições jamais alguém poderia saber se seria salvo, pois jamais se pode fazer o suficiente; ninguém podia receber doses suficientes do tipo mágico da graça, nem realizar número suficiente de méritos e de obras de ascese. Como resultado desse estado de coisas havia muita ansiedade no final da Idade Média”. d) As tentativas reformistas eram cruel- mente eliminadas pela Inquisição. e) O Culto há muito que se tornara apenas num ritual meramente externo, repleto de superstições, consistindo em grande parte na leitura da vida dos santos. 2. A Reforma como Movimento Religioso: Os séculos anteriores à Reforma são descritos como período de grande ansie- dade. • “Nos fins da Idade Média pesava na alma do povo uma tenebrosa melancolia”, constata o holandês Huizinga. • Lutero (1483-1546) e as suas famosas angústias espirituais, espelhava “a epítome dos medos e das esperanças de sua época” (T. George). • As insatisfações não visam criar uma nova igreja mas sim, tornar a existente mais bíblica. • A Reforma deve ser vista não como um movimento externo mas sim, como um movimento interno por parte de “católicos” piedosos que desejavam reformar a sua Igreja, revitalizando-a, transformando-a na Igreja dos fiéis. • Não podemos nos esquecer que as mudanças causadas pelo Renascimento e Humanismo contribuíram para ela; afinal, a Reforma ocorreu na história, dentro das categorias tempo e espaço, onde o homem está inserido. • A concepção da Reforma como um movimento originariamente religioso não implica a compreensão de que ela esteve restrita a apenas esta esfera da reali- dade; pelo contrário, entendemos que a Reforma foi um movimento de grande alcance: • cultural, • institucional, • social e • político • na história da Europa e, posteriormente em todo o Ocidente. • A amplitude da influência da Reforma em diversos setores da vida estava implí- cita em sua própria constituição: • Era impossível alguém abraçar a Reforma apenas no campo da religião e continuar em tudo o mais a ser um homem de uma ética medieval, com a sua perspectiva da realidade e prática intocáveis. • A Reforma em sua própria constituição era extremamente revolucionária: • “A Reforma ocupou, e deve continuar a ocupar, um legítimo e significativo lugar na história das idéias” (McGrath). • É significativo o testemunho de dois estudiosos católicos, Abbagnano e Visalberghi, quando afirmam que, “contribuição fundamental à formação da mentalidade moderna foi a reforma religiosa de Lutero e Calvino”. 3. A Reforma e a Propagação das Escri- turas: “A Reforma não trouxe perfeição social ou política, mas ela gradualmente gerou um aperfeiçoamento vasto e único. O que o retorno da Reforma aos ensina- mentos bíblicos trouxe para a sociedade foi uma oportunidade para o exercício de uma liberdade tremenda, sem recair no caos” (Schaeffer). • A Reforma teve como objetivo precípuo uma volta às Sagradas Escrituras, a fim de reformar a Igreja que havia caído ao longo dos séculos, numa decadência teológica, moral e espiritual. •A preocupação dos reformadores era principalmente "a reforma da vida, da adoração e da doutrina à luz da Palavra de Deus“ (Packer). •Partindo da Palavra passaram a pensar acerca de Deus, do homem e do mundo! • O princípio protestante do "livre exame" caminhava na mesma direção do espírito humanista de rejeição a qualquer autoridade externa: • As coisas são o que são porque são, não porque outros dizem que elas sejam. • Isto é válido para as verdades cientí- ficas, como para as verdades teoló- gicas: •Não é a Igreja que autentica a Palavra por sua interpretação "oficial", mas, sim, é a Bíblia que se autentica a Si mesma como Palavra autoritativa de Deus. • Na Reforma deu-se uma mudança de quadro de referência. •Por isso, podemos falar deste movimento como tendo um de seus pilares fundamentais a questão hermenêutica. •O “eixo hermenêutico” desloca-se da tradição da igreja para a compreensão pessoal da Palavra. •Partindo desses princípios, a Reforma onde quer que chegasse, se preocupava em colocar a Bíblia na língua do povo. •O reavivamento da pregação foi um dos marcos fundamentais da Reforma. •Os Reformadores criam que se as Escrituras estivessem numa língua acessível aos povos, todos os que quisessem poderiam ouvir a voz de Deus e, todos os crentes teriam acesso à presença de Deus. • Contudo, os reformadores esbarraram num problema estrutural: o analfabetismo generalizado entre as massas. • Lutero traduziu a Bíblia para o alemão, concluindo o seu trabalho em outubro de 1534. •A sua tradução é uma obra primorosa, sendo considerada o marco inicial da literatura alemã. 4. A Necessidade da “Fé Explícita”: Calvino combate a “fé implícita” – que era patente na teologia católica –, declarando que a nossa fé deve ser “explícita”. • Calvino denomina a fé implícita de “espectro papista” e, “fé forjada e implícita inventada pelos papistas. Pois por fé implícita eles querem dizer algo destituído de toda luz da razão”, que “separa a fé da Palavra de Deus”. • “Que costume é esse de professar o evangelho sem saber o que ele significa? Para os papistas, que se deixam dominar pela fé implícita, tal coisa pode ser suficiente. Mas para os cristãos não existe fé onde não haja conhecimento” (Calvino). •Pelas palavras de Calvino, podemos observar a necessidade latente do ensino e estudo constante da Palavra de Deus, a fim de que cada homem, sendo como é, responsável diante de Deus, tenha condições de se posicionar diante de Deus de forma consciente; a fé explícita é patenteada pela Igreja por meio do ensino da Palavra. • A prática de afastar o povo da Palavra, mantendo-o na ignorância, é uma atitude anticristã e altamente prejudicial: •“Daqui se faz evidente que espécie de cristianismo existe dentro do papado, onde não só é a crassa ignorância exaltada em nome da simplicidade, mas também o povo é rigidamente proibido de buscar o real discernimento” (Calvino). •Lamenta que nem todos, mesmo tendo oportunidade, têm usado deste privilégio: o estudo das Escrituras. • O princípio da “Fé explícita” está relacionado também à produção das Confissões Reformadas. 5. Algumas Ênfases: 1) A salvação por Graça unicamente em Jesus Cristo; o Deus encarnado: Verdadeiro Deus e Verdadeiro Homem. 2) A suficiência do sacrifício de Cristo para salvar completa e totalmente o povo de Deus. 3) A fé como a boa obra do Espírito em nós que nos capacita a responder positivamente ao chamado de Deus. 4) A Palavra de Deus, e somente Ela é a autoridade final de todo o nosso pensar, crer, agir e sentir. 5) A Inerrância e infalibilidade das Escrituras como princípios teóricos e práticos que norteiam a nossa perspectiva da realidade em todas as suas dimensões: religiosa, social, política, econômica, ética, profissional, familiar, etc. Portanto, uma ética comprometida com as Escrituras. 6) O Culto a Deus como meta e razão de ser da Igreja, que se manifeste em consonância com a Palavra, em santo temor e sincera gratidão para com Deus. 7) Um compromisso com o real a partir da fé em Cristo, gerada em nós pelo Espírito. 8) A aceitação incondicional da Majes- tade de Deus e do Senhorio de Cristo em todas as coisas a começar de nossa salvação definitiva. 9) A compreensão de que a Igreja de Deus não é um conjunto de pessoas individuais mas, é o corpo de Cristo, o povo constituído por Deus por meio do Seu Espírito, para cultuá-Lo, viver a Sua Palavra e proclamar a Sua salvação em Cristo. 10) A Valorização do homem como Imagem e Semelhança de Deus. 11) O zelo pela pregação fiel da Pala- vra, administração correta dos Sacra- mentos e o exercício fiel da disciplina. 12) Oração sincera e submissa. Calvino entendia que “com a oração encontramos e desenterramos os tesouros que se mostram e descobrem à nossa fé pelo Evangelho”. 13) A Glória de Deus como alvo supremo de toda as coisas (1Co 10.31). Palestras ministradas no Primeiro Encontro de Teologia do Instituto Bispo Roberto McAlister de Estudos Cristãos, realizado na Catedral da Igreja Cristã Nova Vida, Rio de Janeiro, RJ., no dia 23 de outubro de 2010. Rev. Hermisten Maia Pereira da Costa