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GRANDE DO SUL
ANDERSON AMARAL DE OLIVEIRA
A ALQUIMIA DA PALAVRA:
YEATS, PESSOA E AS CIÊNCIAS OCULTAS.
Ijuí, RS
2009
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A ALQUIMIA DA PALAVRA:
YEATS, PESSOA E AS CIÊNCIAS OCULTAS.
Ijuí, RS
2009
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DEDICATÓRIA:
AGRADECIMENTOS:
RESUMO
ABSTRACT
Key words:
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO.............................................................................................................7
4. CONCLUSÃO........................................................................................................42
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS..........................................................................44
OBRAS CONSULTADAS..........................................................................................46
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INTRODUÇÃO:
da cultura e das influências interculturais da língua inglesa, uma vez que Fernando
Pessoa valia-se do inglês como língua franca na elaboração de sua obra.
Bulhões, nome de batismo de Santo Antônio, o qual a família acreditava ter ligação
genealógica. Dentro deste ambiente familiar e mais tarde nas escolas de freiras
irlandesas de West Street e na Durban High School, se deu à instrução de nosso
poeta, seguindo os padrões britânicos de educação.
Do seu trabalho nos escritórios, Pessoa dedicava dois dias da semana, que
lhe geravam rendimentos suficientes para suas despesas, de homem de hábitos
simples. No restante do tempo, dedicava-se às obras literárias, principalmente a
poesia, além de passeios e outras atividades. Apesar das diversas ocasiões em que
salários tentadores foram lhe ofertados, Pessoa nunca abriu mão de sua liberdade,
não se submetendo ao trabalho em tempo integral. Antes de entrar no mercado de
trabalho, tentou a sorte se lançando como empresário, montando uma tipografia
chamada “Empresa Íbis”, que adquiriu com o dinheiro herdado da avó. Contudo não
muito tempo depois o empreendimento malogra (SIMÕES, in COUTINHO, 2006 P.
33.).
(...) Há poesia em tudo – na terra e no mar, nos lagos e margens dos rios.
Também há na cidade – não o neguem – é evidente para mim aqui onde me
sento: há poesia nesta mesa, neste papel, neste tinteiro, há poesia na
trepidação dos carros nas ruas, em cada movimento ínfimo, trivial. (...) Há
para mim um significado mais profundo do que os medos humanos no
aroma do sândalo, nas latas velhas deitadas num monturo (...) (FERNANDO
PESSOA).
Trago aqui uma poesia Chamada “Os Castelos” datada em 08 de dezembro
de 1928 publicada na primeira parte do livro “Mensagem” em que é possível verificar
a influencia extremamente simbolista na descrição imagética, mas basicamente de
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OS CASTELOS
possuía a habilidade de criar bem mais que meros personagens, criando na vida
heteronímica dos diversos “outros” poetas, suas biografias, profissões, estilos de
escrita peculiares, preferências, além de outras características que os permitiram ter
uma vida literária à parte da vida do poeta ortônimo, assim chamada à obra
assinada por Fernando Pessoa sendo “ele mesmo”, e não Caieiro, Reis, ou nenhum
outro heterônimo.
Na primeira parte temos a descrição de que a vida seria apenas uma etapa,
para Pessoa, um sono que terá um despertar, sendo este, a própria morte. Contudo
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Na segunda parte temos no primeiro verso: “Mas antes era o Verbo, aqui
perdido”, se tratando o Verbo à segunda pessoa da Santíssima Trindade, “o Filho”,
temos claramente que Fernando pode ter apenas trocado as figuras de nome em um
jogo simbólico, ou seja, não tendo um Deus acima de Deus, e sim, apenas o Verbo
que se tornou Carne, portanto, tendo após a queda, se reconstituindo como Verbo
novamente, perante a sua morte, e nas palavras de Pessoa, “despertou deste sono,
a vida”. Isso se reforça quando pensamos em “Adam Supremo” referenciado no
décimo verso, pois segundo a Cabala, à qual nosso poeta também era adepto,
teríamos o “Adam Kadmon” ou seja, a base primordial de toda a criação do universo.
Ou seja, neste caso, a queda de Deus, assim como a queda de Adam Kadmon, se
refere à transmutação, pois se o progresso é de fato para toda a alquimia e toda a
ciência oculta, a purificação do ser através das evoluções transcendentais do
espírito através dos ciclos reencarnatórios, a queda vem a ser a materialização
destes espíritos superiores, podendo ser interpretada como o caminho inverso do
que buscavam. Não acredito portanto que Pessoa se refira a um Deus superior a
outro Deus, pois cairia certamente na principal questão da teoria Cosmogônica de
criação do universo que é: “se um ser é gerado de um ser precedente, como surgiu
o primeiro ser?”.
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O desfecho deste poema nos leva a visão de Pessoa, que tange a busca da
verdade como sendo algo inacessível aos homens, assim como o trecho anterior em
que compara o homem a um inseto batendo na vidraça. Fica subentendido que o
conhecedor da verdade, neste caso Christian Rosencreutz, leva o grande
conhecimento consigo, uma vez grande parte das revelações vêm com a morte, não
toda a verdade, e que na realidade nossa incompletude é uma grande sombra, que
terá luz. O fato de “ouvirmos para além da sala” nos remete a dimensão de uma
antecâmara, termo muito utilizado pelos místicos rosacruscianos.
Desta primeira fase podemos compreender que além amor regionalista que
sua poesia é carregada, William Yeats enquanto pessoa pública, lutou em
movimentos pela autonomia irlandesa, na esfera política e cultural, sendo também
um poeta sonhador que levava para sua obra o encanto das paisagens naturais,
ricas em sentidos místicos característicos típicos irlandeses assim como seus
conflitos pessoais e esteticistas, na tentativa de encontrar a beleza ideal recorrente
ao seu apaixonado mundo de sonhos que constantemente entravam em conflito com
a realidade. A exploração dos limites do sonho e da realidade dá o tom
predominante da sua obra principalmente nesta fase.
A CRIANÇA ROUBADA
Após esta fase turbulenta de desilusões, Yeats passa certo tempo com
amigos aristocratas em uma espécie de retiro, que reflete na volta do “belo” em suas
obras, como no volume “Os cisnes selvagens de Coole”. A beleza alva dos cisnes
que ruflam nos lagos irlandês, pode ser compreendida como uma visão da própria
sociedade aristocrata e a conservação de suas tradições e os princípios de beleza,
buscados anteriormente pelo poeta, que agora demonstram uma maior maturidade.
Antes de tratar a fase da síntese final da obra de Yeats, vale lembrar que
temos até aqui três fases bem delineadas, começando com os conceitos de beleza
ideal, do sonho de uma Irlanda livre, contrária às imposições da Inglaterra
opressora; A segunda fase na qual a realidade amarga é retratada através de
protestos dentro da própria poesia nas quais Yeats conflitava consigo mesmo nos
problemas do teatro Abbey, os problemas amorosos com Maud Gonne, além da
frustração com a burguesia católica irlandesa; Encerra-se esta espécie de trilogia
Yeatseana com a retomada de alguns aspectos do estilo inicial de sua poesia, o seu
reencontro em uma nova classe social, a aristocracia. Além de aspectos antes não
abordados, mas que já eram estudados citamos do misticismo e os estudos
ocultistas que resultaram em mudanças de rumo significativas na carreira de Yeats.
carregado de Hermetismo. Assim como outros artistas de sua época, Yeats busca
respostas aos seus dilemas pessoais no aprofundamento dos estudos místicos e
metafísicos pois os conhecimentos apenas religiosos protestantes não davam conta
de seus anseios. Dentre tais estudos, podemos relacionar aos estudos teosóficos,
de Madame Helena Petrovna Blavatsky que tinha por preceitos básicos relacionar a
filosofia, a ciência e a religião sendo de caráter inteiramente místico. Em 1887
passou a fazer parte da Sociedade Teosófica, se tornando inclusive amigo da
própria fundadora em Londres. Segundo Vizioli (2001. p. 19) desde jovem Yeats já
se interessava nos estudos ocultistas, tendo diversas influências na poesia, inclusive
a obra anteriormente citada de William Blake. Yeats se tornou um iniciado nas
ciências herméticas da Golden Dawn society de Londres, vindo posteriormente a
fundar a Sociedade Hermética de Dublin, carregando consigo também fortes
influências rosacruscianas. Devemos ressaltar que o fato de ser irlandês,
principalmente nacionalista, levava Yeats a uma atmosfera mística, pois o povo da
Irlanda possui descendência Celta, que eram politeístas e muito supersticiosos,
crendo em fadas, grandes mistérios e outras formas de expressões artísticas e
culturais que difundiram, influenciando outras culturas.
Após affairs românticos com Olívia Shakespear e com Lady Gregory, Yeats
encontra em Georgie Hyde-Lees, seu tão sonhado matrimônio. A participação desta
vem alterar o sentido da vida e da obra de nosso poeta. Descobre quatro dias após
o casamento, que sua esposa possuía o dom da mediunidade, psicografando
diversos escritos realizados de forma automática (VIZIOLI, 2001. p. 19). Com base
neste material coletado durante algum tempo, desenvolve suas teorias metafísicas
sobre o desenvolvimento da humanidade, os movimentos cíclicos da história e o
universo metafísico. Com uma gama de materiais de escrita própria com base nas
psicografias de Georgie, publica a obra “One Vision” (Uma visão), em 1925 que na
opinião de Vizioli (2001, pg. 19), principia por opor a Racionalidade à Imaginação,
sendo o grande divisor de águas de sua obra. Uma de suas constatações foi de que
a evolução do nosso mundo se dá da seguinte forma:
E segue dizendo,
O que esse ‘duplo cone’ nos revela é que toda a civilização está
sempre entrosada com a que veio antes e com a que vem depois, pois a
cultura que nasce se nutre daquela que vem substituir (...)”(VIZIOLI, 2001,
pg. 21).
Desta forma a visão de Yeats sobre vida após a morte e o processo
reencarnatório possui grandes semelhanças com os sistemas de outros filósofos e
místicos:
Contudo, podemos dizer felizmente, que o público leitor ganhou com uma geração
de obras de singular qualidade.
(...) sua obra se tornou muito mais difícil e, às vezes, até obscura.
Esse fato, porém, não constitui inconveniente insuperável, porquanto, em
vista da coerência de todo o sistema, o leitor pode intuir o caráter simbólico
dos pormenores mesmo sem conhecer aquele texto. (VIZIOLI, 2001. p.27)
Assim como William Yeats, Fernando Pessoa também possuía ligações com
estudos herméticos e ocultistas, sendo um alquimista à sua própria maneira, como
diz Coutinho (id.), “...tentou, mas para ele rigorosamente vã por sua própria maneira,
a aventura dos filósofos alquímicos”. A busca seja pela beleza ideal de Yeats, ou a
ambição dos alquímicos na busca da pedra filosofal e do elixir da juventude, fez com
que muitos artistas se lançassem nesta aventura altamente influenciada pelo
modernismo do século XIX a utilizando-se de diversos instrumentos como as artes
plásticas, a literatura entre outros métodos ritualísticos de magia.
HINO A PÃ
(de Mestre Therion *)
Vibra do cio subtil da luz,
Meu homem e afã
Vem turbulento da noite a flux
De Pã! Iô Pã!
Iô Pã! Iô Pã! Do mar de além
Vem da Sicília e da Arcádia vem!
Vem como Baco, com fauno e fera
E ninfa e sátiro à tua beira,
Num asno lácteo, do mar sem fim,
A mim, a mim!
Vem com Apolo, nupcial na brisa
(Pegureira e pitonisa),
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dos seus padrões estéticos e suas concepções políticas e sociais, como a garça
rufante e sua mitologia céltica e grega inicial revisitada na sua fase final já com a
entrada do elemento transcendental.
(...) seria lícito pensar que o ritual evocado neste poema pode ser
o de qualquer sociedade esotérica, mas a última estrofe do poema não
deixa lugar a dúvidas (...) pois nas cerimônias da Golden Dawn (...) exige-se
a aprendizagem e a prática do jogo do xadrez enochiano.” (CRESPO, 1988,
Pg. 368)
No poema “Oscila o Incensório Antigo”, pode se visualizar o neófito (novato)
participando dos ritos que o iniciam nos diferentes graus da Golden Dawn em uma
cerimônia na qual se dá a formalização da entrada do novo membro à ordem. Pela
clareza das informações trazidas na própria poesia, não a detalharemos mais, pois
uma análise mais pormenorizada foge dos propósitos destas páginas.
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Yeats por sua vez, além do seu tratado filosófico e metafísico One Vision
(1925) produziu e publicou diversas poesias contendo evidentes traços esotéricos, a
exemplo de A torre (1928) e A escada em espiral e outros poemas (1933).
Segundo Vizioli (2004, pg. 27) “os próprios títulos são simbólicos, pois tanto
a ‘torre’ quanto à ‘escada em espiral’ são emblemas – contrapartes masculina e
feminina da mesma imagem – do giro vortical e da ascensão do homem em direção
ao infinito”. Os giros vorticais na verdade dizem respeito às teorias que Yeats
possuía sobre a vida e a evolução dos seres humanos ilustrada pela figura de um
cone com a parte menor para baixo. Desta parte inferior parte uma espiral com
voltas mais largas, que representam o movimento cíclico da humanidade. Este giro
vortical yeatseano é uma concepção muito recorrente na sua vida e obra. A poesia
“A Segunda Vinda” (1921) faz referência a esses giros, sendo considerada o
prenúncio de uma nova era, ou apenas como uma profecia dos acontecimentos
bélicos que se sucederiam. A genialidade desta obra, encontra-se entre outros
elementos, na fusão da segunda vinda de Jesus Cristo e o apocalipse, profetizados
pela Bíblia cristã.
A SEGUNDA VINDA
Iniciação
Na poesia acima, cipreste citado não pode ser visto apenas como uma
árvore, pois segundo as lendas, a cruz à qual Jesus Cristo foi apregoado, era feita
desta madeira, além de que segundo a tradição persa é a arvore do paraíso, nos
remetendo a um sentido muito além da dialética do sonho e da realidade. Temos
uma relação cíclica nesta obra, na qual a vida – morte – ressurreição (de Jesus
Cristo) – paraíso pode ser interpretada com os preceitos transcendentais
herméticos nos levando a outra dimensão que se esclarece nos versos
subseqüentes. A relação vigente no poema é a vida – morte – reencarnação, uma
vez que nos verso final temos : “Neófito, não há morte.”. Esta frase deriva do latin
“non omni moriar.”
Desta forma a fusão artística de Pessoa e Yeats fica clara, não sendo o
hermetismo apenas um adorno à obra, mas sim parte de estudos intensos que se
utilizaram de metodologias das mais diversas, e por vezes nada ortodoxas, incluindo
evocações de espíritos e rituais de magia. Contudo, a nós cabe apenas avaliar o
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teor da obra e o ganho que a literatura teve com as influências tão profundas de
pessoas visionárias que sempre buscaram transcender a arte, nem que para isso
seu “eu” tivesse que ser deixado para segundo plano como Fernando Pessoa. A
riqueza da literatura se edificou de tal forma que dois artistas de lugares diferentes,
que nunca imaginaram se conhecer, tiveram uma ligação através de uma obra
poética ímpar que reforçou suas nações e a suas respectivas produções culturais,
desenvolvendo uma poética identitária nacional.
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CONCLUSÃO:
A Golden Dawn Society foi, sem dúvida, a ordem mística esotérica de maior
influência na cultura ocidental. Sua marca se faz sentir na literatura, na pintura
chegando até o cinema e a música pop. Este elemento de influência vem
adicionando magia e mistério as artes exatamente devido ao modo como as
questões ligadas ao hermetismo e a alquimia permeiam os processos artísticos bem
como os iniciáticos. É neles e através deles que a simbolização de um mundo oculto
se revela em um segundo mistério que só o trabalho crítico e de pesquisa analítica
consegue restaurar integralmente, conforme nos propusemos a fazer neste trabalho.
Com uma tal falta de gente coexistível, como há hoje, que pode
um homem de sensibilidade fazer senão inventar os seus amigos, ou
quando menos, os seus companheiros de espírito? (FERNANDO PESSOA)
William Butler Yeats, ganhador do prêmio Nobel, realiza em relação à cultura
de língua inglesa o mesmo processo realizado por Pessoa com a língua portuguesa
e inglesa. A grandeza de sua obra só pode ser compreendida como uma
interpretação mágica dos destinos do indivíduo, da Irlanda bucólica e em busca da
sua autonomia, da sua identidade cultural e religiosa a uma rebelião a dominação
inglesa, que opõe–se à atmosfera de sonhos trazida na sua primeira fase poética.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS:
RAPOSO, Carlos. Thelema: Uma Religião da Nova Era. Sexto Sentido. São Paulo:
Mithos, n. 50, p. 35-40.
VIZIOLI, Paulo (sel.). Poemas/ William Butler Yeats. São Paulo: Companhia das
Letras, 2001.
OBRAS CONSULTADAS:
ALPRIM, Alex. O mago e a Besta. Sexto Sentido. n.20. Abr. 2001. Disponível em <
http://raulsantosseixas.multiply.com/journal/item/133> Acesso em 05 fev. 2009.