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2 Teatro Da Vertigem PDF
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Nos primeiros dez anos de trabalho o Teatro da Vertigem traz a cena brasileira a
Trilogia Bíblica, composta pelos espetáculos “O Paraíso Perdido (1992)”, “O Livro de
Jô (1995)” e “Apocalipse 1.11 (1999)”, montagens criadas para espaços não teatrais
como igrejas, hospitais e presídios, respectivamente. Seu ultimo trabalho, “BR 3”, é
uma incursão do grupo pelas identidades brasileiras, cuja representação tinha como
palco o rio Tietê.
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Em 1995, o grupo estréia “O Livro de Jó”, abordando em primeiro plano a
questão da Aids e explorando temas religiosos em paralelo. A exposição do corpo nu
ensangüentado e atores que “performam” cadáveres são alguns dos elementos deste
espetáculo que propunha um percurso por um hospital desativado gerando uma
atmosfera inquietante e desconfortável para a platéia, que circulava por alas hospitalares
desativadas: um ambiente cênico bastante hostil neste segundo trabalho da trilogia.
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sentir o cheiro de mofo e umidade, criando uma relação física imperativa. A sensação
física, no entanto, não se esgota, na impressão de histórias vividas nesse cenário, mas é
um apoio decisivo para que as impressionantes cenas construam a memória de um
apocalipse que estamos vivendo. Assistir a uma cena de sexo explícito, realizada por um
casal que vive profissionalmente dessa atividade, ou participar do corredor polonês na
representação de um massacre, e ainda se confrontar com a ameaça de tortura com um
rato, ou ficar frente a frente, com um homem degradando uma mulher ao urinar em seu
corpo, adquire um sentido agressivo, mas em nenhum momento gratuito ou banalizador
da violência" (LUÍS, Macksen, apud. ENCÍCLOPÉDIA ITAÚ CULTURAL)
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contexto performático de um clube de show noturno para mostrar cenas de sexo ao vivo
na peça. (...) O trabalho do texto da peça Apocalipse 1,11 foi elaborado por Fernando
Bonassi, dentro de um processo de criação coletiva com o grupo do Teatro da Vertigem.
Esse processo tem fonte de criação no ator que serve como uma espécie de testemunha
da condição humana dentro da grande cidade. Além de testemunhas, o Teatro da
Vertigem estimula os atores a serem pesquisadores do espaço urbano. (...) O grupo
optou por inserir o casal que faz sexo explícito, após as visitas à boca-do-lixo de São
Paulo, espaço no centro da cidade, caracterizado pela presença de áreas de prostituição,
clubes e cinemas pornôs. Após essas visitas, aconteceram encontros com o dramaturgo,
Fernando Bonassi, que trabalhou em forma de diálogo aberto a partir do conteúdo
trazido pelos atores. (...) Na cena da boate, a relação entre o texto falado pelos atores e a
presença muda do casal RMP, no palco, parece ter importância e cria um interessante
contraste. Primeiro a Besta apresenta a dupla, citando um trecho bíblico sobre a
multiplicação do ser humano. Com tal apresentação, o personagem suscita um olhar
sobre o fenômeno do RMP, concentrando na função biológica, determinada pela
reprodução e pela divindade. Além disso, a apresentação do casal RMP, enfeitado com
adornos indígenas, é acompanhada do tema das vitórias de Ayrton Senna, som que, para
muitos brasileiros, reafirma o orgulho nacional associado ao desempenho, à velocidade,
à eficiência, à precisão e à capacidade de vencer os limites. Porém, a cena do casal que
se apresenta não reforça o efeito da música da TV - a eficiência ‘mecânica’ na
performance do casal. O som de competição automobilística cria uma outra condição,
diversa da atuação do casal no clube. O casal, ao mesmo tempo em que conserva a ação
original do clube pornô, diferencia sua presença no palco teatral, através do seu
relacionamento com os demais elementos teatrais: a fantasia, o som, a fala da Besta, as
ações da Babilônia e a presença do carteiro no palco. Essas relações têm o intuito de
complexificar o efeito da ação do casal. A partir das interações com os demais
elementos teatrais, essa ação pode adquirir novas, ou outras conotações que abrem um
leque de associações que a performance no clube pornô não inclui. (...) Ao se observar o
uso do casal RMP pelo Teatro da Vertigem, percebe-se que a cena que mostra a cópula
do casal é congelada de repente para que o movimento do carteiro que entra seja o novo
foco da cena. Dessa forma, o texto cria movimento. É possível considerar o contexto da
entrada do texto na cena do casal RMP como um elemento brechtiano de
distanciamento. Rizzo (1994), ao dissertar sobre Brecht e o efeito do distanciamento,
sugere que o diretor alemão pretendia despertar a consciência crítica do espectador e
retirá-lo da sua passividade (PELED: 2006).
Podemos perceber aqui a inserção do ato sexual não apenas como um elemento
de impacto visual, ou tampouco pelo uso do “diferente pelo diferente”, mas como uma
estratégia discursiva de impacto crítico. Busca-se por meio de dados de impacto
cotidiano uma forma cênica ainda mais teatral, o que justifica a idéia de hiper-
teatralidade comumente associada ao trabalho do Teatro da Vertigem.
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Vanderlei Bernardino e Sergio Siviero em Apocalipse 1.11: cena de afogamento em vaso sanitário.
Disponível em: www.teatrodavertigem.com.br.
Peled analisa ainda a polêmica sobre o uso de atores pornôs em Apocalipse 1:11,
a partir de dois artigos publicados na revista The Drama Review, no Reino Unido pelos
pesquisadores André Carreira e William Stanton, que analisam o espetáculo do Teatro
da Vertigem, de forma bastante contraditória entre si:
Segundo Carreira o uso do casal cria um efeito meta-teatral, pelo fato de serem
performers de palco e fazerem sexo real ao mesmo tempo. O elemento de meta-
teatralidade na peça refere-se à “dupla sensação de realidade”, característica referendada
por Carreira que consiste no fato de os atores estarem, ao mesmo tempo, representando
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e fazendo sexo. Segundo o diretor, para que a meta-teatralidade possa aparecer, é
preciso “intensificar o real” (idem)
Jesus Cristo e João fumam um cigarro em cena final de “Apocalipse 1.11” (1999). Disponível em:
www.teatrodavertigem.com.br
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Através da busca por temas como o sagrado e profano em O Paraíso Perdido, a
contaminação da humanidade no mundo pós HIV no ambiente hospitalar do espetáculo
O Livro de Jó, ou mesmo o fim do mundo de Apocalipse 1.11 e o encontro com os
Brasis de BR 3 inserindo o público no coração de São Paulo: o Rio Tietê, ambiente
degradado e que se pretende esquecer no cotidiano. O Teatro da Vertigem insere o
público em ambientes de pura degradação. Do altar das igrejas paulistas às margens do
Tietê – ou da Baía de Guanabara, onde BR 3 foi posteriormente encenada – o grupo
propõe o percurso por espaços desarmônicos, desconfortáveis para público e atores,
contraponto marcante em relação as encenações teatrais de caixa cênicas.
Temas inquietantes, tratados de formas hiperteatrais e desarmônicas, em
espaços de degradação: em quinze anos de trabalho com apenas quatro montagens o
Teatro da Vertigem tem sido um grupo de constante presença nas discussões sobre o
teatro contemporâneo e seus novos pressupostos.
Cena de “BR 3”, montagem mais recente do grupo encenada no Rio Tietê em São Paulo.
Disponível em: www.teatrodavertigem.com.br
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Referências:
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PELED, Yiftah. Ready-made performático: incorporação de performances no Teatro da
Vertigem. Visitado em 21/11/2007. In: Revista Polêmica Imagem. Disponível em
http://www.polemica.uerj.br/pol20/cimagem/p20_yiftah.htm ; Rio de Janeiro: 2006;
RINALDI, Miriam. E existe ator que não seja criador? Artigo. In: Jornal ‘O Sarrafo’.
http://www.jornalsarrafo.com.br/edicao02/mat07.htm. São Paulo: Abril de 2003
Websites:
ARQUIVO VIRTUAL DE ARTES ESCÊNICAS
http://artesescenicas.uclm.es/index.php
ITAÚ CULTURAL – ENCICLOPÉDIA VIRTUAL
http://www.itaucultural.org.br/
TEATRO DA VERTIGEM – WEBSITE DO GRUPO
www.teatrodavertigem.com.br/
Vídeos:
Portifólio da atriz Miriam Rinaldi com cenas dos espetáculos:
http://www.youtube.com/watch?v=sad7z94WvWY
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