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NARCISISMO
= D.: Narzissmus. — E’.: narcissisme, En.: narcissisrn. Es.: narcisismo. 1.:
— — —
tiarcisismo.
• Por referência ao mito de Narciso, é o amor pela imagem de si mesmo.
• 1. O termo narcisismo (a) aparece pela primeira vez em Freud em 1910, para explicar a escolha de
objeto nos homossexuais; estes tomam a si mesmos como objeto sexual; partem do narcisismo e
“...
procuram jovens que se pareçam com eles, e a quem possam amar como a mãe deles os amou’ (la).
A descoberta do narcisismo leva Freud a propor no Caso Schreber,
—
o auto-erotismo e o amor de objeto. “O sujeito começa por tomar a si mesmo, ao seu próprio corpo, como
objeto de amor” (2), o que permite uma
primeira unificação das pulsões sexuais. Em Totem e tabu (Totem und Tabu, 1913) ele expressa o
mesmo ponto de vista.
2. Vemos que Freud já fazia uso do conceito de narcisismo antes de introduzi-lo” através de um estudo
especial (Sobre o narcisismo: uma introdução [ZurEinfúhrungdes Narzissmus, 1914]). Mas, neste texto,
é no conjunto da teoria psicanalítica que ele introduz o conceito, considerando particularmente os
investimentos libidinais. Com efeito, a psicose (“neurose narcísica”) põe em evidência a possibilidade que
a libido tem de reinvestir o ego desinvestindo o objeto; isto implica que fundamentalmente, o
“..
investimento do ego persista e se comporte para com os investimentos de objeto como o corpo de um
animálculo protoplásmico para com os pseudópodes que emitiu” (3a). Referindo-se a uma espécie de
princípio de conservação da energia libidinal, Freud estabelece um equilíbrio entre a “libido do ego”
(investida no ego) e a “libido objetal”: “quanto mais uma absorve, mais a outra se empobrece” (3b). “O
ego deve ser considerado como um grande reservatório de libido, de onde a libido é enviada aos objetos, e
que está sempre pronto a absorver libido que reflua dos objetos.’ (4)
No quadro de uma concepção energética que reconhece a permanência de um investimento libidinal do
ego, somos levados a uma definição 287
NARCISISMO
estrutural do narcisismo, O narcisismo já não surge como uma fase evolutiva, mas como uma estase da
líbido que nenhum investimento de objeto permite ultrapassar completamente.
3. Tal processo de desinvestimento do objeto e de retirada da libido sobre o sujeito já tinha sido destacado
por K. Abraham em 1908 a partir do exemplo da demência precoce. “A característica psicossexual da
demência precoce é o retorno do paciente ao auto-erotismo [1 O doente mental transfere para si só, como
seu exclusivo objeto sexual, a totalidade da libido, que a pessoa normal orienta para todos os objetos
animados ou inanimados que a rodeiam.’ (5) Freud fez suas estas concepções de Abrafiam: elas ‘...
conservaram-se na psicanalise e tornaram-se a base da nossa atitude para com as psicoses” (6). Mas
acrescenta a idéia que permite especificar o narcisismo com relação ao auto-erotismo de que o ego não
— —
existe de início corno unidade e que exige, para se constituir, “uma nova ação psíquica” (3c).
Se quisermos conservar a distinção entre um estado em que as pulsões sexuais se satisfazem de forma
anárquica, independentemente umas das outras, e o narcisismo, em que o ego na sua totalidade é tomado
como objeto de amor, seremos levados a fazer coincidir a predominância do narcisismo infantil com os
momentos formadores do ego.
Neste ponto, a teoria psicanalítica não é unívoca. Numa perspectiva genética, podemos conceber a
constituição do ego como unidade psíquica, correlativamente à constituição do esquema corporal.
Podemos ainda pensar que tal unidade é precipitada por uma determinada imagem que o sujeito adquire
de si mesmo segundo o modelo do outro, e que é precisamente o ego. O narcisismo seria a captação
amo:osa do sujeito por essa imagem. j. Lacan relacionou este primeiro momento da formação do ego com
a experiência narcísica fundamental que designa pelo nome de fase do espelho* (7). Nessa perspectiva,
em que o ego se define por uma identificação com a imagem de outrem, o narcisismo mesmo primário’
—
— não é um estado do qual estaria ausente toda e qualquer relação intersubjetiva, mas a interiorização de
uma relação. E essa justamente a concepção que ressalta de um texto como Luto e melancolia (Trauer
und Melancholie, 19115), onde Freud parece não ver no narcisismo nada mais do que uma
“identificação narcísica’ com o objeto (8).
Mas, com a elaboração da segunda teoria do aparelho psíquico, esta concepção se apaga. Freud acaba
opondo de forma global um estado narcísico primitivo (anobjetal) e relações com o objeto. Este estado
primitivo, a que ele dá então o nome de narcisismo primário, seria caracterizado pela total ausência de
relações como meio, por unia indiferenciação entre o ego e o id, e teria o seu protótipo na vida intra-
uterina, da qual o sono representaria uma reprodução mais ou menos perfeita (9).
A idéia de um narcisismo contemporâneo da formação do ego por identificação com outrem nem por isso
é abandonada, mas este é então denominado “narcisismo secundário”, e já não ‘narcisismo primário”: “A
libido que aflui ao ego pelas identificações [... representa o seu ‘narcisis-
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• O narcisismo primário designa um estado precoce em que a criança investe toda a sua libido cai si
mesma, O nareLsismo secuno’á rio designa um retorno ao ego da libido retirada dos seus
investimentos objetais.
• Estes termos têm na literatura psicanalítica, e mesmo apenas na obra de Freud, acepções milito diversas,
que nos impedem de apresentar uma definição unívoca mais exata do que aquela que propomos.
1. A expressão narcisismo secundário levanta menos dificuldades do que narcisismo primário. Freud
usa-a, desde Sobre o narcisismo: uma introdução (ZurEinführung des Narzissmus, 1914), para
designar certos estados como o narcisismo esquizofrénico: eis que somos levados a conceber este
..
narcisismo, que apareceu pela incorporação dos investimentos objetais, como um estado secundário
construído com base num narcisismo primário obscurecido por múltiplas influências’ (1). Para Freud, o
nax-cisismo secundário não designa apenas certos estados extremos de regressão; é também uma
estrutura permanente do sujeito: a) No p’ano econômico, os investimentos de objeto não suprimem os
investimentos do ego, antes existe um verdadeiro equilíbrio energético entre estas duas espécies de
investimento; b) No plano tópico, o ideal do ego representa uma formação narcísica que nunca é
abandonada.
2. De um autor para outro, a noção de narcisismo primário está sujeita a extremas variações. Trata-se de
definir um estado hipotético da libido infantil, e as divergências incidem de maneira complexa na
descrição desse estado, na sua situação cronológica e, para certos autores, na própria existëncia dele.
Em F’reud, o narcisismo primário designa de um modo geral o primeiro narcisismo, o da criança que
toma a si mesma como objeto de amor, antes de escolher objetos exteriores. Esse estado corresponderia à
crença da criança na onipotência dos seus pensamentos (2),
Se procurarmos concretizara momento da constituição desse estado, já em Freud encontraremos
variações. Nos textos do período de 1910-15 (3) esta fase é localizada entre a do auto-erotismo primitivo
e a do amor de objeto, e parece contemporânea do aparecimento de urna primeira unificaçào do sujeito,
de um ego. Mais tarde, com a elaboração da segunda tópica, Freud conota pelo termo narcisismo primário
um primeiro estado da vida, anterior até mesmo à constituição de um ego, e do qual a vida intra-uterina
seria o arquétipo (4). A distinção entre o autoerotismo* e o narcisismo é então suprimida. Não é fácil
perceber, do ponto de vista tópico, o que é investido no narcisismo primário assim entendido.
Esta última acepção do narcisismo primario prevalece correnternente nos nossos dias no pensamento
psicanalítico, o que resulta numa limitação do significado e do alcance do debate; quer se aceite ou se
recuse a noçâo, designa-se sempre assim um estado rigorosamente “anobjetal”, ou pelo menos
iudifere,ciado’, sem clivagem entre um sujeito e um mundo exterior.
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NECESSIDADE DE PUNIÇÃO
Dois tipos de objeções podem-se opor a essa concepção do narcisismo:
—No plano da terminologia, essa acepção perde de vista a referência a uma imagem de si mesmo, a uma
relação especular que o termo narcisismo supõe na sua etimologia. Por isso pensamos que a expressão
narcisismo primário é inadequada para designar uma fase descrita como anobjetal.
—No plano dos fatos, a existência dessa fase é muito problemática, e alguns autores acham que existem
desde o inicio no lactente relações de objeto, “um amor de objeto primário” (5), de forma que a noção de
um narcisismo primário, entendido como primeira fase anobjetal da vida extra-uterina, é rejeitada por eles
como mítica. Para Melanie Klein, não se pode falar de fase narcisica, visto que desde a origem se
instituem relações objetais, mas apenas de “estados” narcísicos definidos por um retorno da libido a
objetos interiorizados.
A partir dessas críticas, parece-nos possível recuperar o sentido da intenção de Freud quando, retomando
a noção de narcisismo introduzida em patologia por H. Ellis, ampliou-a, considerando-a unia fase
necessária na evolução que vai do funcionamento anárquico, auto-erótico, das pulsões parciais, à escolha
de objeto. Nada parece opor-se a que designemos pelo termo narcisismo primário uma fase precoce ou
momentos básicos, que se caracterizam pelo aparecimento simultâneo de um primeiro esboço do ego* e
pelo seu investimento pela libido, o que não implica que este primeiro narcisismo seja o primeiro estado
do ser humano, nem que, do ponto de vista econõmico, esta predominância do amor de si mesmo exclua
qualquer investimento objetal (ver: narcisismo).
NECESSIDADE DE PUNIÇÃO
=D.: Strafbedüfnis. F.: besoin de punition, En.: need for punishment. Es.: necessidad de castigo, L:
— — — —
bisogno di punizione.
• Exigência interna postulada por Freud como dando origem ao comportamento de certos sujeitos em
quem a investigação psicanalítica mostra que procuram situações penosas ou humilhantes e se
comprazein nelas (masoquismo moral), O que há de irredutível em tais comportamentos deveria, em
última análise, ser referido à pulsão de
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NECESSIDADE DE PUNIÇÃO
• A existência de fenômenos que implicam uma autopunição despertou muito cedo o interesse de Freud:
sonhos de punição, que são como que um tributo pago á censura para a realização de um desejo (1), ou,
sobretudo, sintomas da neurose obsessiva. Desde os primeiros estudos sobre esta afecção F’reud
descreve as auto-recriminações; depois, em Notas sobre um caso de neurose obsessiva
(Bemerkungen über einen &1( von Zwangsneurose, 1909), os comportamentos autopunitivos; mais
geralmente, é o conjunto da sintomatologia, com o sofrimento que implica, que faz do obsessivo um
carrasco de si mesmo.
A clínica da melancoUa destaca a violência de uma compuísão à auto- punição, que pode chegar até o
suicídio. Mas outra contribuição de Freud e da psicanálise é motivar pela autopunição comportamentos
em que a punição, aparentemente, é apenas uma conseqüência não desejada de certas ações agressivas e
dei jtuosas (2). Neste sentido podemos falar de criminosos por autopunição”, sem que se deva ver neste
processo a motivação única de um fenômeno sempre complexo.