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Hibridismo Cultural (116 páginas), de Peter Burke, publicado (2003) pela

Editora Unisinos de São Leopoldo/RS, faz parte da Coleção Aldus, é uma obra
composta de seis capítulos. Entre eles, ressaltam-se: Variedades de objetos;
Variedades de terminologias; Variedades de situações; Variedades de reações; e
Variedades de resultados.
A obra de Peter Burke é iniciada com a abordagem do fenômeno “hibridismo”
como sendo algo bom para alguns e condenado para outros. O autor aponta para o
uso crescente do “essencialismo” com a finalidade de criticar o oponente, havendo
uma “descontrução” das entidades tidas como falsas. Ele sublinha também a
tendência global que existe referente à mistura e à hibridização com a criação de
grupos de teóricos que abordam essa temática no âmbito econômico, social, político
e de miscigenação.
No capítulo Variedades de Objetos, Burke enfatiza sobre três tipos de
hibridismo ou processos de hibridização: artefatos híbridos – por meio da arquitetura,
mobília, imagens, traduções; práticas híbridas – por meio da religião, música,
linguagem, esporte, festividades e alhures que favorecem as formas hibridas como o
resultado de encontros múltiplos; e povos híbridos – grupos que se transformam de
uma cultura para a outra por razão política, religiosa ou econômica. Neste último tipo,
existe o indivíduo híbrido que possui uma vida entre culturas que resulta em uma
“consciência dúplice” e que é tido como o mediador cultural.
No capítulo Variedades de Terminologias, o autor destaca que a variedade
de objetos híbridos é superada pela quantidade de termos e que existem muitas
palavras para descrever o mesmo fenômeno. Todavia, os termos devem ser
manuseados com cuidado e considerados como parte da história da cultura. Entre os
termos, Burke considera: imitação e apropriação – a interação cultural no Ocidente
é discutida pela imitação que quase sempre foi duramente criticada. Porém, há
também a ideia de apropriação ou “espoliação”, mas que, consequentemente, é
acusada de plágio. Outro termo pode ser o “empréstimo” cultural, também muito
criticado, mas que por outro lado é o que de fato acontece na história de todas as
culturas. Contudo, o termo mais técnico é aculturação (forjado em 1880) em que a
cultura subordinada adora características da cultura dominante. Existem também o
termo “transculturação” para dar o sentido de mão-dupla, o termo “transferência” que
se refere a outros tipos de empréstimos; e a expressão “troca cultural” que é recente
e muito utilizada devido a um crescente relativismo; acomodação e negociação –
“acomodação” é um termo antigo, mas que recentemente começou a ser utilizado para
criticar os conceitos de “aculturação” e “sincretismo”. Neste caso a mudança cultural
acontece por acréscimo e não por substituição. Os termos alternativos para
“acomodação” são: “diálogo” e “negociação”; mistura, sincretismo, hibridização –
“hibridismo” é quase sempre um processo e não um estado e foi muito difundido por
botânicos nos séculos XIX e XX; “sincretismo” é um termo originalmente negativo para
deplorar tentativas de unir diferente grupos, mas que, de maneira positiva, pode ser
retratado como harmonização; conceitos em questão – os conceitos anteriormente
apresentados criam problemas próprios, ou seja, “apropriação” possui o problema de
descobrir o fundamento lógico, consciente ou inconsciente, para seleção de alguns
itens e rejeição de outros; o “sincretismo”, além do problema da lógica da escolha, o
que precisa ser investigado em especial e até que ponto os diferentes elementos são
fundidos; e o “hibridismo” é um termo escorregadio, ambíguo e, ao mesmo tempo,
literal e metafórico, descritivo e explicativo; tradução cultural – o autor dá ênfase na
metáfora linguística porque parece ser a mais útil e a menos enganosa. Porém, há o
problema prático de como traduzir termos-chave utilizados por um povo que é objeto
de estudo. Alguns elementos não são plenamente traduzidos, havendo, portando,
perdas de tradução; crioulização – é quando duas culturas em contato se
modificam/convergem e formam uma terceira.
No capítulo Variedades de Situações, o autor apresenta as diversas
situações, contextos e locais nos quais ocorrem encontros culturais: iguais e
desiguais – os relatos de encontros culturais entre iguais em termos de poder e
aqueles entre desiguais, têm enredos diferentes; tradições de apropriação – há
culturas fracas ou fortes de apropriação e adaptação. Algumas tem propensão maior
para incorporar elementos estrangeiros do que outras. Há lugares que são mais
favoráveis à troca cultural, como por exemplo, as metrópoles e as fronteiras; a
metrópole e a fronteira – são locais para o entendimento mútuo onde pessoas de
diferentes origens se encontram e interagem. Na metrópole há cruzamento de cultura
e de comércio, bem como a presença de diferentes grupos de imigrantes que muitas
vezes tentavam se isolar no passado para manter sua língua e sua identidade original,
mas que com o tempo assimilavam e acrescentavam algo novo à mistura. A fronteira,
por sua vez, é uma zona de “interculturas” de encontro não apenas locais, mas
também de sobreposição ou interseções entre culturas; classes como culturas –
existência da influência das classes mais altas sobre as mais baixas e duelo entre
classes profissionais.
No capítulo Variedades de Reações, Burke destaca a existência de quatro
reações a “importação” ou “invasões” culturais: aceitação, rejeição, segregação e
adaptação. Para explicá-las, o autor faz a seguinte subdivisão: a moda de tudo o que
é estrangeiro – a primeira reação é de acolhida/aceitação, mas não se pode dizer
que a troca de cultura é sempre de tolerância. Existe a combinação da harmonia com
a desarmonia social e essa existência se dá pelos símbolos de cada cultura;
resistência – quando há a defesa das fronteiras culturais contra a invasão;
purificação cultural – quando há extremismo pela purificação, isto é, uma limpeza
étnica e não apenas linguística; segregação cultural – é uma linha divisória interna
dentro de uma mesma cultura em que há a concentração em manter parte de um
território livre de estrangeirismo. Essa reação permite a existência de uma vida dupla,
isto é, uma pessoal e outra profissional, por exemplo. No decorrer das gerações, a
segregação se transforma em adaptação; adaptação – é a incorporação das partes
em uma estrutura tradicional. Pode ser tratada como um movimento duplo de des-
contextualização e re-contextualização, em que se retira um item de seu local original
e o modifica para se encaixar em seu novo ambiente. Neste caso, há uma
“negociação” cultural em que merecem ser enfatizados os diferentes estágios do
processo, o número de pessoas envolvidas e o fato de que as mudanças se dão dos
dois lados; circularidade – utilização da metáfora do círculo para se referir às
adaptações culturais estrangeiras que são tão completas que o resultado pode ser
“re-exportado” para o seu lugar de origem; tradutores – são pessoas deslocadas, em
grande parte, e que possuem uma “consciência dúplice” que auxilia no processo de
tradução.
No último capítulo Variedades de Resultados, o autor realiza a sua conclusão
enfatizando os resultados que podem ser obtidos no longo prazo e demonstrando a
sua preocupação com o futuro. Admitindo que as culturas deixaram de ser ilhas e que
o processo de segregação só pode ser realizado no curto prazo e que as tradições
são áreas de construção (construção e reconstrução), restam quatro cenários
possíveis: contraglobalização – é a resistência à “invasão” de formas globais de
cultura e a ênfase na cultura e na identidade local. Este cenário tem sua importância
majorada na medida em que os significados da cultura são destruídos ou
inferiorizados. Pode ser considerada uma reação forte, mas que pode não durar muito.
Contudo, seu efeito será dado sobre cultura do futuro, mesmo não sendo o efeito
desejado; diglossia cultural – neste contexto a cultura global poderá fazer com os
indivíduos sejam biculturais, ou seja, uma língua mundial será utilizada em algumas
situações e a língua local em outras; homogeneização cultural – tratada como
“americanização” por seus opositores, essa tendência acontece principalmente no
Ocidente, mas também no Japão e, cada vez mais, na China, pois há uma variedade
de estilos sem o objetivo de causar dano ao outro; hibridização cultural – é a posição
intermediária, pois os encontros culturais levam à uma mistura cultural. Os seus
críticos enfatizam o caos, a fragmentação, aquilo que se perde no processo; por fim,
Burke fala de uma crioulização do mundo – isto é, o surgimento de uma nova “ordem
cultural”, em que os objetos são absorvidos, a cultura é “reordenada”/reconfigurada e
ecótipos novos são formados.

FONTE: BURKE, Peter. Hibridismo Cultural. 1. ed., São Leopoldo/RS: Unisinos, 2006.
116p.

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