Você está na página 1de 14

ISSN 1518-1324

SérieAnis
Número 06, junho de 2000

Bioética y Ética y Feminismo y Gênero y Direitos Humanos y Justiça y Desenvolvimento Social

ANTROPOLOGIA E OS LIMITES DOS corps que la société designe comme espace


DIREITOS HUMANOS: seul propice à porter le signe d’un temps, la
O DILEMA MORAL DE TASHI trace d’un passage, l’assignation d’un
destin...”(com grifos no original) 4. Tempo,
Debora Diniz passagem e destino foram, portanto, as três
entidades que conferiram sentido à
crueldade da mutilação. A cicatriz de Tashi
INTRODUÇÃO não foi a primeira, mas sim a seqüência de
muitas que tiveram início em um tempo
“...In service to tradition, to what imemorial cujo sentido o corpo confirma 5.
makes us a people. In service to the Inúmeros são os rituais de iniciação, de
country and what makes us passagem, preparações para as guerras e
who we are. But who are we but festividades, de sociedades primitivas ou
torturers of children?...”1 não, que devem ser inscritos nos corpos 6.

Madre Lissa O corpo é, então, para os olinkas,


o documento e a ressurreição do passado
no presente. As cicatrizes na face, nos
Em nome da tradição, da cultura e braços ou no abdome são algumas destas
da tortura. Estas foram as entidades a que marcas. A mutilação genital é,
Madre Lissa referiu-se para justificar seu seguramente, a mais importante inscrição
papel como a mais famosa tsunga que já da tradição feita no corpo das mulheres.
existiu. M’Lissa, como era conhecida entre o Para Tashi, ter optado pela mutilação
povo Olinka, era uma instituição viva, a genital, mesmo que tardiamente, a fez
memória feminina da tradição que deveria sentir-se uma mulher Olinka, condição que
corporificar-se em cada mulher pela lhe era negada até aquele momento:
mutilação ritual. 2 Seu papel era não apenas “...certainly to all my friends who’d been
iniciar as meninas e as adolescentes no circumcised, my uncircumcised vagina was
segredo da leveza do andar arrastado das thought of as a monstruosity. They laughed
mulheres olinkas, mas principalmente at me...to them I was bound to look
manter viva a inscrição da tortura da odd...” 7. E, mais importante que ficar livre
crença. A cicatriz ritual era a lembrança da do escárnio das mulheres e meninas Olinka,
fidelidade ao grupo. As dores, seu Tashi, quando interpelada por Raye, a
juramento. O sangramento, a oferenda. Por psiquiatra que a acompanhava nos Estados
isso, o crime de Tashi, ou quem sabe de Unidos, sugere a origem do desejo que a
Evelyn, foi a pior das infrações: assassinar conduziu ao ritual, já em idade madura,
M’Lissa, nas palavras das mulheres olinkas “...to be accepted as a real woman by the
presentes ao julgamento, foi como aniquilar Olinka people; to stop the jeering.
“...the Grand Mother of the race...”. 3 Sem o Otherwise I was a thing. Worse, because of
saber, as mãos, os cacos de vidro e as my friendship with Adam’s family and my
ervas da tsunga, ausências acrescidas à special relationship to him, I was never
dissolução do grupo provocada pela guerra, trusted, considered a potential traitor,
a tradição feminina perdia parte importante even...” 8. Pois então, ser aceita como uma
de sua força. Com a morte da Grande Mãe, mulher, cumprir os papéis esperados de
morria o espírito que unia estas mulheres. uma Olinka (casar-se, cuidar dos filhos ou
carregar água), exigia de Tashi a cicatriz da
Que as avós sejam a memória da tradição.
tradição, esta não é uma característica
exclusiva do povo Olinka. A particularidade Essa obrigatoriedade da cicatriz
dos olinkas, assim como a de todos os como condição da feminidade Olinka fez
povos que não fazem uso da escrita, é o com que, no período anterior à circuncisão,
fato de a lembrança dos velhos Tashi fosse uma espécie de simulacro de
transformar-se na principal fonte das regras mulher, talvez uma estrangeira com o dom
do grupo. Pelas lembranças recupera-se do da proximidade, mas não uma autêntica
passado o tempo mítico da origem do mulher olinka. A idéia de que não se
mundo, dos animais e dos seres; justificam- incorpora a regra moral simplesmente pelas
se as regras e os tabus, ordena-se o faculdades do pensamento ou do olhar foi
presente e controla-se o futuro. Mas, na desenvolvida por Franz Kafka, no conto que
ausência da escrita, e conseqüentemente inspirou os argumentos iniciais de Clastres
dos documentos que os historiadores sobre o papel da tortura, Na Colônia Penal:
acreditam melhor representar o já feito e “...o senhor viu como não é fácil decifrar a
vivido, poucos são os sinais físicos que escrita com os olhos; mas o nosso homem a
asseguram as memórias ancestrais. É assim decifra com seus ferimentos...” 9. Kafka, ao
que, para muitas culturas, o corpo contrário das torturas rituais analisadas por
transforma-se no maior documento vivo: Clastres, referia-se às penalidades inscritas
ele é a contraprova de que a regra sempre nos corpos de criminosos por meio de uma
existiu. Segundo Pierre Clastres, ao analisar engenhosa estrutura de tortura conhecida
o papel da tortura nas sociedades como máquina do mundo 10. A máquina,
primitivas, “...c’est immédiatement, le apesar da sofisticação descritiva do oficial

1
SérieAnis 06, Brasília, LetrasLivres, 1-14, junho, 2000
Versão PDF
ISSN 1518-1324

SérieAnis
Número 06, junho de 2000

Bioética y Ética y Feminismo y Gênero y Direitos Humanos y Justiça y Desenvolvimento Social

responsável pela condução do espetáculo, moral do feminino à suposta natureza das


era basicamente composta por três fêmeas, é uma declinação característica e
utensílios: uma cama, onde se amarrava o comum aos tratados morais de todos os
condenado; um rastelo responsável por tempos: transpõe-se a fronteira da
reproduzir a mensagem do castigo no dorso moralidade para a natureza, fazendo com
do sentenciado e uns poucos aprestos de que a autoridade do costume substitua a
higiene e estética, tais como algodão para imprecisão do discurso sobre o natural,
limpar o sangue: “...compreende o para finalmente reconhecer para si o
processo? O rastelo começa a escrever; absolutismo de uma natureza que nunca
quando o primeiro esboço de inscrição nas existiu 16.
costas está pronto, a camada de algodão
rola, fazendo o corpo virar de lado Mas para que Tashi fosse capaz de
lentamente, a fim de dar mais espaço para reconhecer a efemeridade moral da cicatriz
ritual, isto é, para que desnaturalizasse a
o rastelo. Nesse ínterim as partes feridas
crença na moral da mutilação tal como
pela escrita entram em contato com o
algodão, o qual por ser um produto de tipo havia feito sua mãe, era preciso que tivesse
especial, estanca instantaneamente o sofrido alguma desilusão trágica anterior à
sua iniciação 17. Nafa, por exemplo, sofrera o
sangramento para novo aprofundamento da
11 horror trágico pela morte da filha, irmã
escrita...” . Ora, seguramente, os
selvagens pintados, mutilados ou marcados mais velha de Tashi, por ocasião do ritual.
de Clastres não eram os infratores da O sangramento de Dura foi além do
colônia penal de Kafka que tinham por esperado, fazendo com que a menina
morresse de uma hemorragia inesgotável,
fraqueza criminal a sonolência 12. Por isso,
incidente em nada extraordinário no ritual
indiferente ao fato de se a máquina do
mundo inscreve os castigos no dorso dos faraônico 18. O pavor pela morte sofrida da
condenados que toscanejam em serviço ou filha fez com que Nafa resguardasse Tashi
mutila a genitália de mulheres púberes, o da castração. Mas como a desilusão trágica
tem que ser sofrida por cada indivíduo, de
que importa é saber que, sem a cicatriz, a
nada adiantou o exemplo da conversão
entrada de Tashi na sociedade olinka
estaria definitivamente impedida assim religiosa da mãe, como tampouco a
como, sem a inscrição no dorso do experiência do pavor vivida por ocasião da
morte de Dura. Em certa medida, Tashi
condenado, a regra da colônia penal não
também experimenta o gosto da desilusão,
seria compreendida 13.
sendo as internações psiquiátricas
Foi, então, em nome deste desejo seqüenciais a maior prova do tormento
de ser uma verdadeira olinka, uma mulher trágico a que estava sendo submetida pelo
olinka como todas as outras, que Tashi confronto de moralidades. A transformação
fugiu de sua aldeia e engajou-se no exército de Tashi em Evelyn, uma mulher olinka em
de libertação de seu povo. No entanto, uma afro-americana, foi mais forte que
alistar-se nos acampamentos não foi o qualquer experiência momentânea do
suficiente para saciar seus sentimentos de trágico. Assim como Sísifo se transforma na
fidelidade ao grupo, tampouco para perenidade do seu castigo, conduzindo-o à
comprovar sua semelhança às demais. Era morte, Evelyn não era penas uma mulher
preciso que Tashi fosse além da oferenda da moralmente livre, era amoralmente insana
vida à independência do país. A dignidade segundo suas palavras: “...beyond hurt.
da morte somente viria pela inscrição olinka Unquestionably mad. Oddly free...” 19.
também no corpo morto. Por isso, Tashi
procurou M’Lissa nos acampamentos. Por um lado, a história de Tashi
mostra como o horror trágico é a condição
Segundo a narrativa de Adam, futuro
irrevogável para a mudança das crenças
companheiro de Tashi e filho do missionário
que havia convertido sua mãe ao com status de verdade, ou seja, a
cristianismo, a razão da esposa haver experiência do horror trágico é o único meio
procurado a tsunga poderia ser resumida reservado aos personagens moralizados
para que experimentem o princípio do acaso
pela ilusão de que a mutilação seria “...the
e habilitem-se a modificar suas certezas. No
only remaining definitive stamp of Olinka
tradition...” 14. Tashi estava certa de que a entanto, por outro lado, a prova a que o
mutilação a uniria às mulheres guerreiras personagem moralizado se submete por
Olinka. Para ela, as mulheres mutiladas ocasião do horror trágico não é facilmente
suportada. Deparar-se com a contingência
eram “...completely woman. Completely
de todas as crenças, inclusive aquelas que
African. Completely Olinka...” 15. Para o
raciocínio crente de Tashi, assim como para justificam o auto-aniquilamento, faz com
o de todos os sujeitos moralizados, ser uma que muitos não tolerem o princípio da
ausência de sentido, optando por uma saída
natureza completa é também ser
inesperada para os que apostam na
moralmente plena. Ou seja, da busca por
metamorfose como saída pacífica para os
mulheres completas é que se atinge o
patamar de uma olinka completa. O conflitos morais: reforçar ainda mais o
interessante é o fato de que este sentido. Ou seja, para muitos personagens
moralizados, o desnudamento da ausência
movimento feito por Tashi, de naturalização
de sentido último para o real provoca um
da moral, ou da agregação à definição

2
SérieAnis 06, Brasília, LetrasLivres, 1-14, junho, 2000
Versão PDF
ISSN 1518-1324

SérieAnis
Número 06, junho de 2000

Bioética y Ética y Feminismo y Gênero y Direitos Humanos y Justiça y Desenvolvimento Social

estremecimento moral tão severo que, ao é, então, mais forte que o pensamento
invés de a experiência do horror trágico os moral, que busca iludi-lo de que é possível
conduzir à mudança esperada, ela pode vir a felicidade no castigo. A angústia de Sísifo
a reforçar ainda mais a intransigência do pelo castigo sem fim é a dor pela
conflito, produzindo o reforço da crença aproximação do trágico, é a experiência do
original. O horror trágico é a condição para horror trágico. A pedra de Sísifo
o desvendamento da ausência de sentido, corresponde à morte de Dura vivenciada por
mas não necessariamente para a Nafa. Pedras e sangramentos assumem o
metamorfose trágica. mesmo papel estimulante do trágico:
destroçam a tranqüilidade das ilusões
A experiência do horror trágico assentadas.
tanto pode ser sublime e assim permitir a
metamorfose do sujeito moralizado, quanto Mas se o mito de Sísifo pode ser,
aniquilante, transformando-se em uma em alguma medida, considerado trágico, tal
espécie de castigo. O mito de Sísifo é um como deseja Camus, é porque “...son héros
desses exemplos em que o encanto do est conscient...” 24. A consciência de que fala
trágico subverteu-se em um tormento sem o autor, ou a reflexão nas palavras dos
fim. Albert Camus inicia sua análise sobre iluministas, são substitutos morais —
Sísifo com as seguintes palavras: “...Les valores herdados do léxico racionalista —
dieux avaient condamné Sisyphe à rouler que encobrem a verdadeira essência do
sans cesse un rocher jusqu’au sommet trágico: o horror. Ou seja, não é pelo
d’une montagne d’où la pierre retombait par pensamento reflexivo ou por uma decisão
son propre poids. Ils avaient pensé avec deliberada de ultrapassar a fronteira da
quelque raison qu’il n’est pas de punition inconsciência à consciência que a
plus terrible que le travail inutile et sans metamorfose trágica se processa. Para que
espoir...” 20 (sem grifos no original). Ora, a desilusão provoque a angústia necessária
diferentemente da interpretação à experiência do trágico é preciso que Sísifo
historicamente reconhecida para o mito, não tenha esperanças quanto à liberdade, é
onde inútil e sem esperança antecipariam o preciso que ele projete o seu futuro ainda
trabalho humano mecanizado e supérfluo da rolando pedras, pois “...où serait en effet sa
revolução industrial, Sísifo pode também peine, si à chaque pas l’espoir de réussir le
ser entendido como o personagem que soutenait?...” 25. A tortura a que se refere
experimentou o horror trágico mais Camus é a mesma aflição a que foi
duradouramente 21. Inútil e sem esperança, submetido Édipo por ocasião do
em uma perspectiva trágica de análise do descortinamento dos crimes de parricídio e
real, significam o reconhecimento da incesto que havia cometido, pois é da
ausência de sentido inerente ao castigo. natureza da verdade perder sua força
São sentimentos comuns aos personagens quando é reconhecida como ilusão. Por isso,
moralizados quando confrontados com a Édipo, Tashi ou Sísifo atestam a
crueldade da tragédia. Os deuses, ao incontornabilidade do trágico: “...le
repreenderem Sísifo por ter acorrentado a tragique est partout là où il y a présence,
morte, impediram que o herói se est donc toujours et partout: il se définit
reconfortasse nas ilusões morais, par la quotidienneté, non par l’exception et
obrigando-o a desenvolver uma tarefa que, les catastrophes...” 26. O consolo final que
por condição, impedia qualquer Camus reserva para Sísifo, após ter
possibilidade de sentido 22. Pois cada esforço atestado a perenidade da crueldade, é que
de elevação da pedra assim como a espera apesar de a experiência trágica ter
de sua descida provocavam em Sísifo a ensinado-lhe a crer somente no rochedo,
angústia aniquilante do limbo trágico. ainda assim, “...il faut imaginer Sisyphe
heureux...” 27.
O fato é que Sísifo transforma-se
no próprio objeto do castigo: “...un visage Sendo assim, a história da cicatriz
qui peine si près des pierres est déjà pierre de Tashi, a passagem da anomalia à ferida
lui-même! Je vois cet homme redescendre e desta à loucura, fez com que ela
d’un pas lourd mais égal vers le tourment condensasse em si as principais qualidades
dont il ne connaîtra pas la fin. Cette heure morais que caracterizam o encontro entre
qui est comme une respiration et qui moralidades e culturas: a amoralidade dos
revient aussi sûrement que son malheur, personagens livres e loucos; a moralidade
cette heure est celle de la conscience. A dos que não suportam a liberdade e a
chacun de ces instants, où il quitte les tragédia, e a imoralidade dos que admiram
sommets et s’enfonce peu à peu vers les a tragédia, mas vivem aprisionados por
tanières des dieux, il est supérieur à son crenças morais. Tashi inicia sua vida com o
destin. Il est plus fort que son rocher...” 23 peso do estigma da não-mutilação. A
(sem grifos no original). Ser mais forte que herança imoral que herdou de sua mãe
a pedra significa que Sísifo é mais vigoroso provocava um júbilo amedontrado nas
que as ilusões que poderiam justificar-lhe o outras meninas: “...There were a few other
castigo. Ser mais forte que a força da girls who had not been circumcised. The
opressão é ser superior à moralidade. O girls who had been would sometimes
pensamento do pavor a que está submetido actually run from us, as if we were demons.

3
SérieAnis 06, Brasília, LetrasLivres, 1-14, junho, 2000
Versão PDF
ISSN 1518-1324

SérieAnis
Número 06, junho de 2000

Bioética y Ética y Feminismo y Gênero y Direitos Humanos y Justiça y Desenvolvimento Social

Laughing, though...” 28. Talvez a conversão assim como de todas as outras mulheres
moral e religiosa de Catherine (Nafa) não olinkas 29. É assim que Tashi abandona
deva ser considerada o melhor exemplo de voluntariamente o relativo espaço recriativo
desilusão aos olhos ocidentais, uma vez que conquistado por sua mãe e converte-se em
a personagem abandona uma certeza por uma mulher olinka normal 30. Tashi
outra tão poderosa quanto. No entanto, reconhece não apenas a força impiediosa da
quando inserida no contexto da cultura moralidade, mas também admite sua
olinka, a metamorfose de Catherine é fraqueza em enfrentá-la.
profundamente simbólica. A decisão por
preservar a filha da ferida traria sérias No entanto, diferente dos crentes
conseqüências para o futuro moral e social ordinários, os mundanos de cada
de Tashi. Este movimento de negação comunidade moral, Tashi não foi capaz de
moral, o abandono da segurança do reconfortar-se plenamente submetendo-se à
crença. Ao casar-se com Adam, filho de
absolutamente certo, determinado pela
missionários protestantes e ele próprio um
tradição, fez com que Catherine
reordenasse seu vínculo com a moralidade afro-americano, mantinha-se em um limbo
feminina olinka. A integridade genital de moral e cultural. Sua vida como estrangeira
nos Estados Unidos, desgarrada do rebanho
Tashi somente foi possível pela desilusão
Olinka, a fazia duvidar do imperativo ritual.
prévia da mãe. Assim como Tashi não era
uma criança olinka qualquer, também sua E o caminho da dúvida - um movimento
mãe não era mais a mesma mulher que um típico do absurdo, mas realizado, entre os
dia pretendeu mutilar Dura. personagens moralizados, por aqueles que
buscam a imoralidade - a fez reconhecer a
O interessante do desenrolar do contingência da ilusão ritual. Foi assim que
drama existencial de Tashi, tal como Tashi desvelou o verdadeiro sentido da
narrado por Walker, é o fato de que a mutilação: de crença na natureza das
conversão religiosa e moral da mãe não foi mulheres transformou-se em uma espécie
suficiente para que a filha tomasse para si de tortura isenta de sentido: “...he is saying
as mesmas qualidades do espírito desiludido I am a tortured woman. Someone whose life
de Catherine em relação à moral sexual was destroyed by the enactment of a ritual
olinka. Intencionalmente, a narrativa upon my body which I had not been
apresenta uma lacuna descritiva quanto à equipped to understand...” 31. Ora, o
infância da menina não-mutilada. Desse desnudamento do real tal como
período, as experiências afetivas de Tashi experimentado por Tashi, a constatação
somente são conhecidas muito brevemente definitiva do caráter ficcional, quase
por ocasião de suas entrevistas com a supérfluo, de toda identidade, é
psiquiatra. Ainda assim, há uma razoável definitivamente insuportável para qualquer
economia narrativa com relação às personagem moralizado. O apego às ilusões
expectativas femininas da personagem é a condição de vida para qualquer um
ainda na infância. É somente das angústias deles, não apenas para as mulheres
de Tashi, mulher madura, que o leitor toma olinkas; muito embora essa submissão
conhecimento. A idéia de que sua moral não signifique que os personagens
feminidade estaria sendo desmantelada pela moralizados estejam fadados a um
não-mutilação, assim como seu sentimento imobilismo moral. Ao contrário, a desilusão
de perda da identidade olinka foram as duas moral é um artifício do espírito e do
principais razões que a forçaram a pensamento trágico, acessível a todos os
reconsiderar a decisão de sua mãe. Tashi personagens moralizados, assim como fez
clama pelo selo de sua identidade, pela Catherine distanciando-se da moral
cicatriz ritual, a ferida que não permite a feminina olinka para resguardar Tashi da
dúvida, pois o desejo pela inscrição iniciação ritual. O espaço da imoralidade
definitiva no corpo, assim como no espírito, está aberto a todos as pessoas, mas o
é a marca registrada dos indivíduos processo de desengano moral será sempre
moralizados. angustiante.
Com a iniciação ritual, Tashi A diferença entre a angústia de
procurou abandonar definitivamente o Catherine e a de Tashi está na intensidade
tempo em que viveu a imoralidade que sua do horror trágico vivida por cada uma delas.
mãe a condenou a viver, um ser solitário Nafa experimenta o sabor da tragédia, a
entre os seus pares. Sua prova de ausência de sentido para a crença, na
conversão definitiva à moralidade olinka, a sangradura de sua filha durante o ritual. A
cicatriz ritual, deveria torná-la imune à morte de Dura e a impossibilidade de
pilhéria bem como à desconfiança de seus encontrar culpados para a perda fizeram
pares. Pela fé que depositou na tradição, com que a conversão ao cristianismo
Tashi retornou ao estado de normalidade demarcasse a transformação de Nafa em
previsto para as mulheres. A anomalia do Catherine. Pela experiência do pavor
excesso de seu corpo seria definitivamente trágico, o enfrentamento com a crueldade
esquecida. A cicatriz tornou-se, então, o do real, Nafa foi capaz de revigorar-se pela
principal argumento moral de Tashi: a dor morte da filha e reerguer-se. Mas o fato é
da moralidade fazia parte de seu corpo que a intensidade da desilusão foi na

4
SérieAnis 06, Brasília, LetrasLivres, 1-14, junho, 2000
Versão PDF
ISSN 1518-1324

SérieAnis
Número 06, junho de 2000

Bioética y Ética y Feminismo y Gênero y Direitos Humanos y Justiça y Desenvolvimento Social

medida do suportável, a tal ponto que Nafa crenças olinkas. Considerava bárbaras e
foi capaz de assumir para si o espírito da violentas as crenças que haviam morto sua
recriação. A crise moral de Nafa foi dela irmã e mutilado suas ilusões 34.
com ela mesma, dela com a exterioridade
da moral, dela com o sangramento da filha, O interessante é que Tashi não se
dela com a própria ferida. Nafa, ao contenta com esta depressão moral,
contrário de Tashi, não se sentiu superando o estado de humilhação em que
humilhada. Sentiu a angústia da perda da se encontra. Ela sai à procura da liberdade
amoral dos insanos, dos únicos personagens
filha e do sentido. Foi assim que a
verdadeiramente livres e tolerantes. Com a
metamorfose da mãe foi resultado do único
arbítrio que resta aos personagens loucura, Tashi, escolhe o ícone da tradição
moralizados: a recriação. olinka para o sacrifício do abandono moral:
M’Lissa. Matar Madre Lissa seria o mesmo
Diferente foi o horror trágico de que aniquilar a mão invisível da moral que
Tashi, que foi não somente humilhada em um dia a mutilou. Castrar a vida da tsunga
suas crenças, mas submetida a experiências seria a castração definitiva daquela que
vexatórias em nome de suas cicatrizes castrou-lhe o espírito da ilusão. Madre Lissa
morais: “...no matter how sick I became não castrou apenas a genitália de Tashi:
during the pregnancy, I attended myself. I pelo ritual, pela humilhação que lhe
could not bear the thought of the quick- desvelou a ausência de sentido, Tashi
stepping American nurses looking at me as ascendeu à ordem dos absurdos, uma
if I were some creature from beyond their ordem suprema reservada àqueles
imaginings. In the end, though, I was the indiferentes à autoridade do costume. Por
creature. ...” 32 (sem grifos no original). O isso, durante seu julgamento no tribunal,
desejo de Tashi de recuperar a honra olinka Tashi repete ser inquestionavelmente louca,
pela cicatriz converteu-se no vexame pelo estranhamente livre. A liberdade dos
corpo recém-parido. O imobilismo físico a absurdos agora lhe pertencia.
que estava submetida pela cirurgia do parto
reforçou o imobilismo argumentativo em Desta forma, os sentimentos de
apreço e desapreço pela ilusão moral são
que se encontrava. Foi assim que a
constitutivos de qualquer código e não
imoralidade do excesso transformou-se na
imoralidade da falta. No país de adoção, a fazem parte apenas da trajetória cultural da
normalidade olinka fez dela uma criatura tsunga, onde amor e ódio definem sua
inesperada, com uma sexualidade também biografia (“...it was traditional for a well-
appreciated tsunga to be murdered by
não prevista. E foi nesse movimento insano
someone she circumcised, then
de julgamento valorativo que Tashi
executou o último e derradeiro ato burned...” 35). Estes dois sentimentos
reservado aos personagens moralizados, antagônicos estão, em diferentes
incapazes de lidar com a contingência da intensidades, presentes em todos os
personagens moralizados. Foi o apreço de
crença, mas confrontados com a tolerância
Tashi pela cultura olinka bem como sua
absoluta do não-sentido: a loucura.
submissão à estética corporal da mutilação
Assim como sugere o dito comum, que a fez procurar M’Lissa em uma fase de
não é louco quem quer, Tashi não sua vida em que não era mais esperada a
enlouqueceu por uma deliberação que a submissão ritual. Por outro lado foi o
conduz a distanciar-se de todas as ilusões. desapreço pela tortura, o exagero da morte
A razão da sua loucura foi simplesmente o que fez Nafa resguardar a filha do ritual. E,
fato de que a experiência do horror trágico finalmente, foi o desapreço insano de Tashi,
foi superior ao limite do suportável. Tashi a loucura da perdição, o que lhe deu força
foi humilhada em suas ilusões. para assassinar M’Lissa e livrar-se de todos
Vulgarizaram sua cicatriz a ponto de ela os referenciais morais. Ou seja, somente
própria passar a encará-la também como quando o desprezo, a indiferença amoral
uma mera ferida ritual. A segurança da atinge o limiar do absurdo, isto é, a
moral converteu-se em uma tortura sem tolerabilidade radical, é que o personagem
sentido. E é neste momento de perdição encontra-se livre. Mas neste momento
que Tashi compreende a morte de Dura. O sublime da liberdade, ele está também
último diálogo que teve com M’Lissa, na morto. A morte de Tashi não foi apenas
verdade a derradeira tortura da tsunga simbólica. O tribunal que a julgou,
antes de ser assassinada, foi o reforço da considerou-a culpada e decretou a pena
insanidade de Tashi: “...Stop, I say...I máxima para a assassina da tradição. Se
could not bear to hear it...But she says, No, não fosse morta, o suicídio seria a única
I will not stop. You are mad, but you are opção digna que lhe restaria. Assim como
not mad enough. Don’t you think your todos os personagens livres, Tashi deveria
mother might have told you how Dura died? ser encarcerada, silenciada e distanciada da
She didn’t, did she? That she was that one moralidade que não prevê atos insanos
in a hundred girls so constructed that the como a destruição da memória, a
slightest scratch made her bleed like a vulgarização da ferida, a dúvida.
stuck cow...” 33. Pela humilhação sofrida,
Tashi passou a sentir vergonha de suas

5
SérieAnis 06, Brasília, LetrasLivres, 1-14, junho, 2000
Versão PDF
ISSN 1518-1324

SérieAnis
Número 06, junho de 2000

Bioética y Ética y Feminismo y Gênero y Direitos Humanos y Justiça y Desenvolvimento Social

A Trama Moral e a Antropologia antropológico de falar como os nativos, tal


como neste trecho dos antropólogos Sandra
A história de Tashi condensa o Lane e Robert Rubinstein, ao assegurarem a
conflito moral dos antropólogos e de todos
legitimidade da mutilação ritual: “...Female
os que se confrontam com as crenças
circumcision, however, is not an organism
morais. Tashi representou com presteza os to be rooted out and killed with antibiotics,
três grupos de personagens que, no meu prevent through immunization...The
entender, incorporam e vivenciam os extreme language used by Western authors
dilemas morais da humanidade. A certeza, a
to describe female circumcision is perceived
dúvida e a loucura são as qualidades
by Arab and African people as a continued
fundamentais destes personagens, devaluation of themselves and their entire
incorporados em Tashi pela falta, pelo cultures. To put the matter quite bluntly, if
excesso e pela morte. Na ausência de Tashi we care about the genitals of the women in
e das torturas genitais e espirituais a que
those cultures, we need also to care about
foi submetida, Antígona, Zaratustra e
their feelings...” 38. Ou seja, assim como as
Abraão poderiam representá-la em um mulheres mutiladas justificam a mutilação
mundo ficcional que se mistura ao real. em termos culturais, para si e para os
Tashi é apenas uma proposta de realidade.
outros, em geral os antropólogos também
Uma zombaria infeliz, porém possível de
perfazem o mesmo movimento
concretizar-se. Os dilemas vividos por Tashi culturalmente autojustificativo, seja em
podem, com certa facilidade, ser relação às mulheres mutiladas, às cabeças
substituídos por tantos outros que também decepadas dos Ilongotes ou à forma mais
sugerem a força opressiva dos tratados
radical de assombro humano, o canibalismo,
morais a que a humanidade está subjugada.
por não reconhecerem outra instância capaz
A opção pela ficção em detrimento dos de legitimar as crenças senão as próprias
personagens reais, os tradicionais nativos crenças.
de carne e sangue de que falava Bronislaw
Malinowski, se justifica mais por um prazer Uma etnografia da angústia, além
estético que propriamente por qualidades de contemplar a lógica inerente a cada
da primeira que não estejam presentes no sistema simbólico, deveria também levantar
mundo cotidiano 36. A crueldade do real, a a questão fundamental sobre quais são os
tortura moral, a ausência de sentido nas discursos e práticas que justificam e
ilusões, infelizmente, não são perpetuam o sofrimento 39. E, talvez, mais
características exclusivas da ficção. Afora importante do que isto, devêssemos
este gozo ficcional, acredito ainda, tal como perguntar quem se constitui, numa
sugere Richard Rorty, nas propriedades determinada sociedade, como o alvo
antecipatórias da ficção: “...novels and preferencial da dor moral. Mas a nostalgia
ethnographies which sensitize one to the imperialista, parafraseando Renato Rosaldo,
pain of those who do not speak our dificulta qualquer forma de descrição
language must do the job which etnográfica que seja crítica dos padrões
demonstrations of a common human nature culturais aos quais o antropólogo encontra-
were supposed to do...” (sem grifos no se vinculado pela pesquisa de campo 40.
original) 37. Certamente não foi por acaso que os
etnógrafos assumiram este estilo crítico
Por outro lado, além das moralmente distante de seus objetos de
qualidades estéticas e sensíveis da ficção
estudo e sequer podemos desconsiderar
sugeridas por Rorty, o uso de personagens suas razões. A responsabilidade moral
fantasmagóricos em detrimento dos de daqueles que Rorty chamara,
carne e sangue permite um certo
provavelmente zombando de Clifford
distanciamento cínico, porém saudável, da
Geertz, em um debate entre os dois sobre o
infelicidade, um ingrediente ativo dos relativismo, agentes do amor, certamente
conflitos morais. Seguramente, é mais não é pequena, por isso sua aversão
confortante lidar com a crueldade do real valorativa 41. Isso, no entanto, não justifica
quando referido a personagens que não
a distância que se estabeleceu entre os
sangraram como Dura ou que não foram
diferentes discursos acadêmicos
condenados ao muro de fuzilamento como relacionados à moralidade. Por um lado,
Tashi. Enfrentar a dor moral como um antropólogos, etnógrafos e romancistas
princípio humano de ordem filosófica, preocupados em ampliar nosso horizonte do
ficcionalmente representada, pressupõe
possível e, por outro, filósofos empenhados
uma certa flexibilidade desrespeitosa no
em desconsiderar o possível etnográfico
trato do sofrimento, impossível de ser pela eleição de universais éticos.
executada pelo estilo antropológico de Tristemente, em nome de um apelo
aproximação da alteridade. O envolvimento
essencialista agradável aos olhos
afetivo imposto pelo trabalho de campo fez
moralizados da humanidade, esta mentira
com que, tradicionalmente, os antropólogos
filosófica vem sendo soberana.
se distanciassem de qualquer forma de
crítica moral da cultura observada. O silêncio moral dos antropólogos
Reproduzir o discurso de uma determinada se justifica, por um lado, pela aversão à
sociedade confundiu-se com o ethos retórica ainda vigente do imperialismo, e,

6
SérieAnis 06, Brasília, LetrasLivres, 1-14, junho, 2000
Versão PDF
ISSN 1518-1324

SérieAnis
Número 06, junho de 2000

Bioética y Ética y Feminismo y Gênero y Direitos Humanos y Justiça y Desenvolvimento Social

por outro, pela descrença antropológica que, durante muito tempo, manteve-se
depositada na nova forma de imperialismo silenciada na antropologia, especialmente a
humanitário surgida no pós-guerra: a de inspiração norte-americana: a
cultura dos direitos humanos 42. Certamente associação imediata do relativismo à
a desconfiança dos antropólogos face à tolerância. O relativismo cultural como um
Declaração Universal dos Direitos Humanos método de apreensão comparativa da
não se mantém com a mesma intensidade realidade, isto é, como um instrumento
de 1947, quando a diretoria executiva da metodológico de abordagem do real sensível
American Anthropological Association (AAA) às diferenças culturais da humanidade, é
escreveu: “...It will not be convincing to the um lado da questão. Outro, bem diferente,
Indonesian, the African, the Indian, the é a defesa, como fez Ruth Benedict ao final
Chinese, if it lies on the same plane as like de Patterns of Culture, de “...equally valid
documents of an earlier period. The rights patterns of life...” 48. Confundir relativismo
of Man in the Twentieth Century cannot be cultural com tolerância radical foi um lapso
circumscribed by the standards of any disciplinar dos antropólogos, valendo-lhes
single culture, or be dictated by the por isso títulos pouco nobres para o
aspirations of any single people. Such a pensamento racionalista dominante, tais
document will lead to frustration, not como subjetivistas, niilistas, incoerentes,
realization of the personalities of vast maquiavélicos, idiotas éticos, etc 49.
numbers of human beings...” 43. E, por fim, Seguramente os antropólogos não eram
asseverando uma das maiores certezas nas inocentes quanto a este deslize conceitual,
quais os antropólogos são socializados, o da passagem do relativismo à tolerância,
repúdio da AAA anuncia o princípio: “...man mas o fato é que a oposição ao imperalismo
is free only when he lives as his society cultural era mais forte que quaisquer outras
defines freedom...” 44. Esta crença de que a considerações. E para suportá-lo era preciso
liberdade de cada indivíduo somente a eleição de outro valor moral tão
poderia ser medida pelo valor moral impactante quanto a proposta de
destinado a ela por cada cultura foi um tiro universalismo ético. Foi assim que a
com dois alvos anunciado pelos tolerância, herdeira do liberalismo anglo-
antropólogos da AAA. saxão, ganhou força na antropologia.
O primeiro pontuava a importância A máxima tolerante de Benedict
do respeito à autonomia de cada sistema tornou-se, portanto, a saída para a
sócio-cultural, indicando uma clara preservação da diversidade moral. E, ao
resistência dos antropólogos a qualquer contrário do que contra-argumentou Geertz,
novo discurso de imperialismo ético ou de no famoso repúdio ao movimento anti-
revigoramento de uma perspectiva relativista, “...the fear that our emphasis on
naturalista para a humanidade. Vistos como difference, diversity, oddity, discontinuity,
conservadores, os antropólogos que se icommensurability, uniqueness, and so
posicionaram contrariamente à Carta on...might end leaving us with little more to
justificavam-se pelo pressuposto, do qual say than that elsewhere things are
também compartilho, de que não é possível otherwise and culture is as culture does has
a eleição de um tribunal além-das- grown more and more intense...” 50, o
moralidades que julgue as diferenças trabalho dos antropólogos restringiu-se sim
culturais e, portanto, morais, sem o apoio à provocação moral da humanidade pela
em alguma ilusão específica 45. Qualquer exibição contínua do possível etnográfico.
proposta de ressurgimento do tribunal Poucos são os etnógrafos, como por
filosófico do olho de deus, nas palavras de exemplo Hanny Lightfoot-Klein, engajados
Hilary Putnam, estaria fadado ao fracasso, em movimentos sociais de direitos humanos
uma vez que não há esse metavocabulário e oponentes de alguma crença moral das
capaz de julgar todos os vocabulários da sociedades de onde tenham feito trabalho
humanidade 46. O repúdio dos antropólogos de campo 51. E uma quantidade menor ainda
norte-americanos à Declaração dos Direitos de antropólogos ofereceria seus
Humanos pode ser resumido na dificuldade conhecimentos etnográficos como bases
de livrar-se do etnocentrismo expressada para intervenção moral em sociedades
por Rorty anos depois: “...there will be no moralmente distantes da sua de origem 52.
such activity as scrutinizing competing Regra geral, os antropólogos direcionaram
values in order to see which are morally seus esforços para a demonstração da
privileged. For there will be no way to rise diversidade, para a compreensão do
above the language, culture, institutions, impossível, e, nesse processo, assumiram a
and practices one has adopted and view all bandeira da tolerância como o melhor
these as on a par with all others...” 47. Foi argumento disponível para a coexistência
assim que o primeiro alvo do na diferença. Isso não significa, no entanto,
pronunciamento da AAA foi claramente a que esta tenha sido uma tarefa
tradição imperialista e intolerante do insignificante, pois, como o próprio Geertz
ocidente. sugeriu, o deseqüilíbrio das certezas deve-
se basicamente ao sucesso dos
Por outro lado, no cerne da crítica antropólogos em provocar as mentiras
imperialista, estava também a outra faceta
tranqüilizadoras dos filósofos do além.

7
SérieAnis 06, Brasília, LetrasLivres, 1-14, junho, 2000
Versão PDF
ISSN 1518-1324

SérieAnis
Número 06, junho de 2000

Bioética y Ética y Feminismo y Gênero y Direitos Humanos y Justiça y Desenvolvimento Social

Mas a inquietação causada pelos humanitário do pós-guerra ganhou força


impossíveis morais trazidos à tona pelos com a assinatura de tratados e
etnógrafos não vem sendo facilmente compromissos ético-legais entre os países
digerida. Rorty, em uma réplica apaixonada de hegemonia política e social. Foi assim
a Geertz, resume o temor relativista em um que teve início a era do imperialismo
argumento que, por sua importância, humanitário no ocidente, onde a cultura dos
transcrevo parcialmente aqui: “...this direitos humanos vem sendo seu
bemusement makes us susceptible to the representante mais exemplar 56. Esta nova
suggestion that the culture of Western forma de humanismo propõe a defesa dos
liberal democracy is somehow “on pair” with direitos individuais, com a garantia de
that of the Vandals and the Ik... If we proteção cultural e moral a certos grupos
continue this line of thought too long we mais vulneráveis. Com mais força que todos
become what are sometimes called “wet” os discursos naturalistas que o
liberals. We begin to lose any capacity for antecederam, a cultura dos direitos
moral indignation, any capacity to feel humanos espalhou-se pelo mundo, sendo,
contempt. Our sense of selfhood dissolves. ainda hoje, uma referência obrigatória para
We can no longer feel pride in being quase todos os estados-nação e entidades
bourgeois liberals, in being part of a great superiores que os regulamentam.
tradition, a citizen of a no mean culture. We
have become so open-minded that our Mas o paradoxo imposto pela
brains have fallen out...” 53. Ora, antes que cultura dos direitos humanos, é constatação
os miolos de Rorty ou de qualquer outro de que não há possibilidade de desenlace
para os conflitos morais que honre os
liberal norte-americano estourem, é preciso
interesses da forma como foram
entender que Geertz jamais propôs tanto o
princípio feyerabendiano do tudo vale inicialmente confrontados pelas partes
quanto as formas de intervencionismo ético, discordantes. A condição de todo e qualquer
mesmo que brandos, tais como direitos desfecho para a discórdia moral implica no
constrangimento de uma das partes
humanos, “tolerância desesperada do
interessadas na questão ou mesmo, em
cosmopolitanismo da Unesco”, etc 54. Estes
foram julgamentos de valor feitos por casos mais extremos, na ofensa de ambas
teóricos estupefatos com a diversidade as partes. O fato é que o desfecho da
desavença sempre implicará no
moral da humanidade e humilhados em
aniquilamento físico ou moral de pelo
suas certezas da superioridade do ocidente.
menos uma das partes. No entanto, apesar
No caso de Rorty, por exemplo, foram
teóricos indignados em ver a ousadia da de a possibilidade de (auto) aniquilamento
cultura dos vândalos sendo comparada ao ser parte constitutiva da insensatez do
conflito moral, é possível ainda traçar pelo
liberalismo democrático. Ou seja, o nó da
menos duas outras maneiras de abandono
questão não está na antropologia e nos
antropólogos ou mesmo em seus das verdades morais sem o aniquilamento
posicionamentos morais tolerantes ou não à físico; são elas: a metamorfose voluntária e
diversidade, mas na maneira com a qual a a docilidade.
humanidade irá conviver com os dados de A metamorfose voluntária pode
pesquisa coletados pelos etnógrafos. ser provocada por uma mudança nas
crenças com status de verdade, isto é, a
desilusão. Esta metamorfose, da forma
A Cultura dos Direitos Humanos, a como analiso, pode ocorrer das seguintes
Antropologia e os Conflitos Morais formas: 1-) pela persuasão ou pelo
convencimento no confronto de posições
Esse debate entre a diversidade e
morais distintas e no esperado diálogo das
os limites da tolerância não ficou restrito à
antropologia norte-americana dos anos 60 e diferenças, idéias caras ao projeto ético de
70. Estas duas décadas marcaram uma Habermas por exemplo; 2-) por
intensificação dos discursos sociais que redescrições privadas, um projeto
nietzschiano, tal como a ocorrida com
procuravam conviver com as críticas
Zaratustra: “...Noutro tempo, também
desencadeadas pelo confronto de
moralidades. O papel das etnografias, Zaratustra projetou a sua ilusão para além
especialmente daquelas que descortinavam do homem, como todos os
um mundo exótico e distante, com crenças transmundanos...” 57; 3-) ou ainda desafiada
por uma série de fatos dramáticos,
morais tidas por imorais, foi de fundamental
provocada pela experiência do horror
importância para o fortalecimento do
discurso da diversidade moral da trágico, como por exemplo ocorreu com
humanidade 55. Na esteira das etnografias — Nafa ao se deparar com a morte de Dura
especialmente as relacionadas à temática Por outro lado, a docilidade à
das relações de gênero, pelo poder de regra pode ser física ou moral. No caso da
crítica anti-naturalista que continham — peça de Sófocles, por exemplo, a cena em
estavam os movimentos sociais organizados que Ismene, irmã de Antígona, se recusa a
que assumiram como espírito de luta uma acompanhá-la ao funeral do irmão morto,
oposição a qualquer forma de absolutismo sua renúncia justifica-se tanto pelo temor
moral. E, acrescido a isto, o espírito às promessas de castigo físico anunciadas

8
SérieAnis 06, Brasília, LetrasLivres, 1-14, junho, 2000
Versão PDF
ISSN 1518-1324

SérieAnis
Número 06, junho de 2000

Bioética y Ética y Feminismo y Gênero y Direitos Humanos y Justiça y Desenvolvimento Social

pelo rei contra o transgressor do edito (o ditaduras morais, sendo a maior delas a
juramento de pena de morte), mas também negação da própria tragicidade que lhe é
por subjugar-se às opiniões do rei Creonte inerente. Ou seja, nega-se aquilo que é
ao reconhecer nele valimento moral acima praticamente a própria natureza do
de suas crenças particulares. Vale humano.
acompanhar o trecho em que Ismene
contrargumenta com Antígona o porquê de Assim sendo, não há vida moral sem
sua resignação frente o edito: “...Agora que tragédia. Mas assim como não há vida humana
sem o trágico, a condição de sobrevivência dos
restamos eu e tu, sozinhas, pensa na morte
seres humanos em coletividade, sem o apelo à
inda pior que nos aguarda se contra a lei
desacatarmos a vontade do rei e a sua condição do porco de Epicuro, é a negação da
força. E não nos esqueçamos de que somos tragédia. Essa relação amoral/moral é, na
mulheres e, por conseguinte, não verdade, o paradoxo da vida humana
moralizada. Somos incapazes de viver sob a
poderemos enfrentar, só nós, os homens.
certeza da ausência de sentido, do princípio do
Enfim, somos mandadas por mais poderosos
e só nos resta obedecer a essas ordens e acaso e, mais intensamente ainda, sob a
até a outras inda mais desoladoras...” 58 possibilidade aniquilante do exercício da
tolerância extrema. Infelizmente, ao pé da
(sem destaque no original). A conjugação
negação da tragédia está o sofrimento, esta
do abandono familiar, no qual as duas irmãs
se encontravam após a morte de Édipo, aos condição da natureza humana moralizada que
poderes do rei e ao fato de serem mulheres todos os grandes tratados morais que a
fez com Ismene ponderasse sua fraqueza humanidade já conheceu tentaram conter e
reabilitar. Os fios que tecem e amarram as
diante da vontade de Creonte. A docilidade
narrativas morais, sejam elas ficcionais,
moral de Ismene foi resultado de um
cálculo de forças onde ela se reconhece etnográficas ou biográficas, são urdidos pelo
como a parte mais fraca da relação social, sofrimento, pela dor, pelo choro, pelas mortes,
cabendo-lhe como único mecanismo de enfim, pelo suicídio de Tashi e Antígona, pela
cegueira de Édipo, pelo desamparo de
sobrevivência física o estado de silêncio.
Zaratustra. Ou seja, antes que o
Não somente inexistem contentamento, o sofrimento é a condição da
instrumentos para solucionar o conflito vida humana na diversidade moral: é a
moral de uma maneira que venha a condição de possibilidade para a existência de
contemplar plenamente os interesses vários personagens morais, ou melhor dizendo,
discordantes, como também não há maneira para sua coexistência no mundo. E não há
de se evitar o conflito. A discórdia moral é como suavizar esse recalque da tragédia no
constitutiva da vida humana organizada em encontro das moralidades.
sociedades. Mas, ao contrário do que se
poderia esperar do pensamento filosófico A idéia de que o sofrimento seria a
tradicional, a característica do pensamento condição de vida dos seres humanos
moralizados foi desenvolvida por Arthur
humanista moderno é exatamente encobrir
Schopenhauer, em O Mundo como Vontade
esta condição da vida moral da humanidade
pela proposição de projetos de ação que e Representação, a ponto de o autor
sugerem saídas filosóficas que ignoram a sentenciar que “viver é sofrer” 60. O
diferença. Ora, onde houver seres humanos argumento de Schopenhauer era de que à
medida que o fenômeno da vontade se
socializados haverá conflito moral. E o que
aperfeiçoasse nos seres humanos, na
constitui a tragédia moral da humanidade é
não apenas a afirmação do caráter mesma intensidade se fortaleceria o
inacessível da solução, mas a constatação sofrimento. Ou seja, quanto maior o desejo
moral, maior também a dor da sua
do caráter impensável da noção mesma de
consecução. Segundo ele, um bom indicador
solução 59. Na verdade, esta configuração da
humanidade embebida em meio ao trágico da forma como o sofrimento cresceu com o
— posto que a essência do trágico é aperfeiçoamento das faculdades sensitivas é
também o conflito, a natureza da a comparação entre a diferença de
sensibilidade dos humanos e das plantas:
humanidade e da tragédia são a mesma —
“...à medida que o conhecimento se torna
não é novidade. Antígona, Creonte, Hêmon,
a rainha e os demais personagens da peça mais claro e em que a consciência aumenta,
levados à cena por Sófocles são os o sofrimento cresce, chegando no homem
protagonistas de um conflito moral ao grau supremo: e é neste ponto tanto
mais violento quanto melhor é o homem
permanente entre humanos — a discórdia
dotado de lucidez de conhecimento, quanto
moral — e que, infelizmente, em alguns
períodos da história mundial acreditou-se mais excelsa é a sua inteligência: aquele
poder silenciar pela imposição de Verdades em quem está o gênio, é sempre aquele que
maiormente sofre...” 61. Ora, o que à época
Absolutas, ora baseadas na moralidade de
de Schopenhauer poderia ser lido como uma
Antígona, ora na de Creonte. Viveram-se
mensuração fisicalista de dor entre
longos períodos de obscurecimento do
conflito por meio da imposição de uma humanos e vegetais, isto é, quanto mais
solução única para todos os desejos aprimorado o sistema nervoso maior a
capacidade de sentir dor, pode ser
humanos e, de fato, parte considerável da
atualmente revisto sob outra fórmula:
humanidade ainda vive sob a égide de tais

9
SérieAnis 06, Brasília, LetrasLivres, 1-14, junho, 2000
Versão PDF
ISSN 1518-1324

SérieAnis
Número 06, junho de 2000

Bioética y Ética y Feminismo y Gênero y Direitos Humanos y Justiça y Desenvolvimento Social

quanto maior a capacidade simbólica (e, contrário do que pensam os pessimistas


portanto, moral) dos seres, com mais vulgares, é apenas a defesa da
intensidade se experimenta a angústia. consideração do projeto trágico para a
humanidade: “...“logique du pire” ne
Para comprovar esta tese de que o signifie donc rien d’autre que: de la
sofrimento cresce com a introjeção da philosophie tragique considerée comme
moralidade, Schopenhauer fez uso da tela possible...” 63 (com grifos no original). O
de Tischbein sobre a representação da reconhecimento de que todas as crenças
aflição pelo roubo da cria em mulheres e
são, em alguma medida, uma crença no
ovelhas. Na parte superior do quadro, havia
nada, apesar de este ser um pressuposto
algumas mulheres das quais os filhos foram aniquilante para os personagens
seqüestrados e, logo abaixo delas, ovelhas moralizados, deve ser posto na ordem-do-
que também haviam perdido seus filhotes. dia para a mediação dos conflitos morais. A
As mulheres de Tischbein, assim como
desnaturalização das certezas seria,
Antígona que a caminho da caverna chorava
portanto, o primeiro passo para o exercício
seus lamentos, foram representadas com da tolerância, projeto tão almejado pelos
requintes de sofrimento e desespero pelo filósofos humanistas modernos e pelos
abandono, ao passo que as ovelhas
antropólogos em particular.
mantinham-se impassíveis diante da perda.
Para Schopenhauer, indiferente ao fato de O conflito como um valor é uma
se existe realmente esta fronteira entre o criação recente da história moral da
sofrimento humano e de outras espécies de humanidade. Como já disse, isso não quer
animais não-humanos, o que a imagem da dizer que a diferença e a discórdia morais
tela sugeria com muita propriedade era o não possuam passados. Ao contrário: onde
fato de que a consciência da perda, ou houve seres humanos organizados em
melhor dito, a consciência do sofrimento sociedades existiram diferenças, diferenças
cresceria com a moralização do animal. estas que conduziram ao conflito. A
Dentro desta perspectiva, ser um sujeito novidade é que, para as sociedades
moral resultaria, portanto, em ser um herdeiras dos valores iluministas e
personagem em que a condição de vida é o defensores da democracia liberal,
sofrimento, ou melhor dito, em ser um considera-se o dissenso uma qualidade a
sujeito com consciência da angústia. ser cultivada. Foi preciso a animação da
dúvida no campo das moralidades, o
Considerando então que a negação revigoramento do trágico com Nietzsche,
da tragédia é a condição da vida moral dos
para que as moralidades exigissem o direito
seres humanos e que o sofrimento é a
de expressão. E mais do que este
condição da vida moral, quem acredita reconhecimento expressivo, os sujeitos
poder domesticar a crueldade do real, e morais anseiam pela felicidade, uma
conseqüentemente o sofrimento, está, qualidade característica da tragédia. Desta
antes que mais nada, assassinando o real e
forma, a Antropologia, sendo um discurso
suas particularidades. Em meio a um
moral sobre a tolerância, não poderia ter
conflito dramático, o silenciamento das surgido em outro momento da história da
dores morais representa o aniquilamento da humanidade.
diferença pela imposição de um padrão
moral válido para todos os personagens e É assim que este paradoxo da
que impede a repulsa pública da regra. A tragédia, isto é, a felicidade somente se
dor é condição para a felicidade, é por onde processa pela dúvida, no entanto a dúvida traz
se forma a voz da contrariedade. Ela se a angústia como condição de existência, é
constitui, como dizia Nietzsche, por um não também o paradoxo da Antropologia. O dilema
criador, o não dos nobres, que nasceria do do antropólogo não deve ser resultante apenas
fundo do insulto moral que, ao inverter os do enfrentamento cotidiano com as etnografias
valores, poderia levar à libertação 62. Por impossíveis. Assim como a morte de Dura que
isso, os tratados morais que não lidaram impunha à Nafa uma relação desnuda com o
com o sofrimento, esse atributo real e, acima de tudo, com ela mesma, o
tranqüilizador dos personagens morais, não paradoxo trágico converte-se também no
se referiam a esta humanidade, mas a uma dilema pessoal do antropólogo. O missionário
outra filosoficamente idealizada, habitada da tolerância necessita ser a mais provocativa
por seres humanos dispostos a um diálogo das figuras imorais se de fato busca a felicidade
moral sem sofrimento e violência, uma e a distância amorais necessárias ao projeto de
humanidade sem contrapartida no mundo tolerância. Mas, para tanto, a intensidade das
real. O pensamento trágico é por definição desilusões deverá atingir o limite do suportável.
inimigo de toda metafísica, uma praga que Seguramente, esta é uma das ilusões mais
reinou durante séculos no pensamento próximas do trágico já feitas no campo do
moral da humanidade. pensamento humanista, mas somente o futuro
poderar assegurar qual a medida da desilusão
Dito isto, é preciso fazer notar que que os antropólogos serão capazes de suportar.
a lógica do pior, segundo os termos de
Clemént Rosset, não significa o
aniquilamento da possibilidade de vida
humana organizada. A lógica do pior, ao

10
SérieAnis 06, Brasília, LetrasLivres, 1-14, junho, 2000
Versão PDF
ISSN 1518-1324

SérieAnis
Número 06, junho de 2000

Bioética y Ética y Feminismo y Gênero y Direitos Humanos y Justiça y Desenvolvimento Social

1
Walker, Alice. Possessing the Secret of Joy. Leenhardt, Do Kamo: la persona y el mito en el
New York. Pocket Books. 1992: 226. O uso do mundo melanesio, seguramente um dos mais
romance de Walker, assim como de outros bonitos (Barcelona. Paidós. 1997). Para
personagens ficcionais ou históricos, não análises compilatórias de etnografias clássicas
implica em uma cumplicidade com as posturas sobre o corpo, vide Rodrigues, José Carlos.
ideológicas de seus autores. Algumas Tabu do Corpo. 3ed. Rio de Janeiro. Achiamé.
antropólogas, como é o caso de Emmanuel 1983. Outro estudo interessante, muito embora
Babatunde, autora da belíssima etnografia em uma linha marxista do controle do corpo é o
Women’s Rights versus Women’s Rites: a study livro de Luc Boltanski, As Classes Sociais e o
of circumcision among the Ketu Yoruba of Corpo. 3ed. Rio de Janeiro. Ed. Graal. 1989. No
South Western Nigeria, possuem sérias Brasil, não são muitas as publicações
reservas ao romance de Walker pelas críticas específicas sobre o assunto. Uma interessante
culturais que realiza sob o manto imperialista e compilação de artigos e etnografias sobre o
essencialista do movimento de mulheres norte- corpo pode ser encontrada no livro organizado
americano (New Jersey. Africa World Press. por Ondina Fachel Leal, Corpo e Significado:
1998). ensaios de antropologia social. Porto Alegre.
2
Os Olinka faziam parte de uma sociedade Ed. UFRGS. 1995.
7
imaginária, localizada na África de colonização Walker, Alice. Possessing the Secret of Joy.
francesa. New York. Pocket Books. 1992: 121.
3 8
Walker, Alice. Possessing the Secret of Joy. Walker, Alice. Possessing the Secret of Joy.
New York. Pocket Books. 1992: 163. Todos os New York. Pocket Books. 1992: 122.
9
personagens africanos do romance de Walker Kafka, Franz. Na Colônia Penal. São Paulo.
possuem dois nomes. Tashi é o nome da Companhia das Letras. 1998: 44.
10
personagem em sua língua nativa e Evelyn o Modesto Carone faz referência ao nome da
nome dado pelos missionários. O mesmo ocorre estrutura no comentário, “Duas Novelas de
com sua mãe: Nafa e Catherine. Primeira”, publicado ao final do conto de Kafka
4
Clastres, Pierre. “De la torture dans les (In: O Veredicto/Na Colônia Penal. São Paulo.
sociétés primitives”. In: La Société Contre Companhia das Letras. 1998).
11
L’Etat. Paris. Éditions Minuit. 1974: 154. Este é Kafka, Franz. Na Colônia Penal. São Paulo.
um dos artigos de Clastres dentre os mais Companhia das Letras. 1998: 43.
12
referenciados pelos estudiosos do corpo e A sentença para aqueles que dormiam em
da tortura em antropologia. Além da beleza serviço era o rastelo assassino que lhes
argumentativa do autor, o trecho que gravaria a pena no corpo: “...o
encerra o artigo é de um vanguardismo mandamento que o condenado infrigiu é
inesperado. Clastres sugere que pior que a escrito no seu corpo com o rastelo. No
tortura física das sociedades primitivas é a corpo deste condenado, por exemplo — o
crueldade das moralidades transformadas oficial apontou para o homem —, será
em leis escritas, especialmente com o gravado: Honra teu superior!...” (com grifos
surgimento do Estado: “...profondeur no original) (Kafka, Franz. Na Colônia Penal.
admirable des Sauvages, qui d’avance São Paulo. Companhia das Letras. 1998: 36).
13
savaient tout cella, et veillaient, au prix Segundo o oficial condutor da máquina do
d’une terrible cruauté, à empêcher mundo, somente na sexta hora de inscrição, o
l’avènement d’une plus terrifiante condenado estaria apto a entender a caligrafia
cruauté...” (:160). Ao contrário das análises do castigo: “...mas como o condenado fica
de Richard Rorty sobre a tortura, Clastres tranqüilo na sexta hora! O entendimento
não considera a tortura física o pior dos ilumina até o mais estúpido...” (Kafka, Franz.
vícios (Rorty, Richard. “The Barber of Kasbean: Na Colônia Penal. São Paulo. Companhia das
Nabokov on cruelty”. In: Contingency, Irony, Letras. 1998: 44).
14
and Solidarity. Cambridge. University Press. Walker, Alice. Possessing the Secret of Joy.
1997). Para ele, a tortura moral (ou mesmo New York. Pocket Books. 1992: 64.
15
legal ou ética) imposta pelo Estado Walker, Alice. Possessing the Secret of Joy.
configura-se de uma crueldade ainda mais New York. Pocket Books. 1992: 64.
16
terrível. Rosset, Clément. L’Anti Nature: éléments
5
Hanny Lightfoot-Klein, em Prisioner of Ritual: pour une philosophie tragique. 3ed. Paris.
an odyssey into female genital circumcision in Presses Universtaires de France. 1995.
17
Africa, faz referências longíquas à Não me refiro à idéia de trágico tal como
ancestralidade da prática: “...the practice of sugerido pela tradição literária; baseio-me
female circumcision dates back to antiquity, antes na perspectiva trágica de Clément
and although various theories have been Rosset, onde trágico é o não sentido (La
advanced, its origins are obscure...” (Neu York. Philosophie Tragique. Paris. Presses
Harrington Park Press. 1989: 27). A autora Universitaires de France. 1991).
18
remonta a Heródoto, às múmias egípcias, aos Segundo Olayinka A. Koso-Thomas há
papiros gregos como documentos históricos e basicamente três tipo de mutilação genital: 1. a
arqueológicos que comprovariam o passado clitoridectomia ou sunna que consiste na
remoto da prática. remoção do prepúcio do clitóris e mesmo na
6
Alguns estudos sobre o corpo tornaram-se remoção do clitóris; 2. a excisão ou redução
clássicos na antropologia, sendo o de Maurice que é a remoção do prepúcio, do clitóris e dos

11
SérieAnis 06, Brasília, LetrasLivres, 1-14, junho, 2000
Versão PDF
ISSN 1518-1324

SérieAnis
Número 06, junho de 2000

Bioética y Ética y Feminismo y Gênero y Direitos Humanos y Justiça y Desenvolvimento Social

lábios menores, deixando os lábios maiores les sociétés primitives”. In: La Société Contre
intactos; 3. a infibulação ou circuncisão L’Etat. Paris. Éditions Minuit. 1974: 155).
30
faraônica que consiste na remoção do prepúcio, Raye, a psiquiatra que acompanhava Tashi
do clitóris, dos lábios menores e maiores, e na nos Estados Unidos, questiona a voluntariedade
sutura dos dois lados da vulva, deixando um do ato da personagem por ocasião da primeira
abertura minúscula para a passagem da urina e vez que ela relata sua iniciação ritual: “...and
do sangue menstrual (The Circumcision of yet you willingly gave this up in order to...Raye
Women: a strategy for erradication. London. was frowning in desbelief...” (Walker, Alice.
Zed. 1987). A mutilação mais radical, melhor Possessing the Secret of Joy. New York. Pocket
conhecida por faraônica, foi à qual Tashi foi Books. 1992: 122).
31
submetida. Atribui-se o nome faraônica ao fato Walker, Alice. Possessing the Secret of Joy.
de este tipo ser identificado com os métodos de New York. Pocket Books. 1992: 162.
32
circuncisão do Antigo Egito com os faraós Walker, Alice. Possessing the Secret of Joy.
(Koso-Thomas, Olayinka A. “Female New York. Pocket Books. 1992: 60.
33
Circumcision”. In: Reich, Warren T. (ed.). Walker, Alice. Possessing the Secret of Joy.
Encyclopedia of Bioethics. vol. 1. New York. New York. Pocket Books. 1992: 258/9.
34
Simon & Schuster Macmillan. 1995: 383). Sobre a força da humilhação como estratégia
19
Walker, Alice. Possessing the Secret of Joy. de desestruturação moral e como a
New York. Pocket Books. 1992: 167. característica que diferencia os seres humanos
20
Camus, Albert. Le Mythe de Sisyphe. Paris. dos outros animais, vale conferir um trecho de
Editions Gallimard. 1942: 161. Richard Rorty: “...O’Brien reminds us that
21
Na verdade, esta metáfora operária para o human beings who have been socialized —
mito de Sísifo foi sugerida por Camus ao dizer: socialized in any language, any culture — do
“...L’ouvrier d’aujourd’hui travaille, tous les share a capacity which other animals lack. They
jours de sa vie, aux mêmes tâches et ce destin can all be given a special kind of pain: they can
n’est pas moins absurde...Sisyphe, proletaire all be humiliated by the forcible tearing down of
des dieux...” (Camus, Albert. Le Mythe de the particular structures of language and belief
Sisyphe. Paris. Editions Gallimard. 1942: 164). in which they were socialized...” (“The Last
22
Camus sugere que esta interpretação da Intellectual in Europe: Orwell on cruelty”. In:
origem do castigo de Sísifo é de autoria de Contingency, Irony, and Solidarity. Cambridge.
Homero (Camus, Albert. Le Mythe de Sisyphe. Cambridge University Press. 1997: 177).
35
Paris. Editions Gallimard. 1942: 162). Na Walker, Alice. Possessing the Secret of Joy.
versão contada por Homero, Plutão teria New York. Pocket Books. 1992: 276.
36
enviado o castigo da pedra à Sísifo por não ter Malinowski, Bronislaw. Os Argonautas do
suportado “...le spectacle de son empire désert Pacífico Ocidental: um relato do
et silencieux. Il dépêcha le dieu de la guerre qui empreendimento e da aventura dos nativos nos
délivra la Mort des mains de son vainqueur...” arquipélagos da Nova Guiné Melanésia. 2ed.
(Camus, Albert. Le Mythe de Sisyphe. Paris. São Paulo. Abril Cultural. Coleções Os
Editions Gallimard. 1942: 162). Pensadores. 1978: 27.
23 37
Camus, Albert. Camus, Albert. Le Mythe de Rorty, Richard. “Private Irony and Liberal
Sisyphe. Paris. Editions Gallimard. 1942: 163. Hope”. In: Contingency, Irony, and Solidarity.
24
Camus, Albert. Le Mythe de Sisyphe. Paris. Cambridge. Cambridge University Press. 1989:
Editions Gallimard. 1942: 163. 94.
25 38
Camus, Albert. Le Mythe de Sisyphe. Paris. Lane, Sandra D.; Rubinstein, Robert A.
Editions Gallimard. 1942: 163. “Judging the Other: responding to traditional
26
Rosset, Clément. Logique du Pire. Paris. female genital surgeries”. In: Hasting Center
Presses Universitaires de France. 1993: 58. Report, May-June 1996: 38.
27 39
Camus, Albert. Le Mythe de Sisyphe. Paris. Na verdade, são pouquíssimas as etnografias
Editions Gallimard. 1942: 166. Esta frase final sobre a dor moral. Em geral, as pesquisas
com a qual Camus encerrou sua narrativa sobre existentes referem-se antes às representações
Sísifo foi tema de análise de alguns sociais sobre as dores físicas provocadas por
comentaristas de sua obra que sugerem a doenças do corpo. No entanto, apesar de o
identificação de Camus com o herói absurdo enfoque ser diferente, questões relacionadas à
(Audibert, Raoul; Lemaitre, Henri e Elst, moralidade acabam surgindo. O livro de Arthur
Thérèse Van Der. “Il Faut Imaginer Sisyphe Kleinman, The Illness Narratives: suffering,
Heureux”. In: XXe Siécle: les grands auteurs healing, and the human condition (New York.
français. Anthologie et Histoire Littéraire. Paris. Basic Books. 1988) é um bom exemplo. Outra
Gallimard. 1988). publicação recente, no estilo de Kleinman, é
28
Walker, Alice. Possessing the Secret of Joy. Doença, Sofrimento, Perturbação: perspectivas
New York. Pocket Books. 1992: 122. etnográficas, organizado por Luiz Fernando Dias
29
Sobre a importância da dor da tortura para a Duarte e Ondina Fachel Leal (Rio de Janeiro.
iniciação ritual, vale conferir o seguinte trecho Fiocruz. 1998).
40
de Clastres: “...d’une tribu à l’autre, d’une Rosaldo, Renato. “Imperialist Nostalgia”. In:
région à l’autre, les techniques, les moyens, les Culture & Truth: the remaking of social
buts explicitement affirmés de la cruauté analysis. Boston. Beacon Press. 1993.
41
diffèrent: mais la fin reste la même: il faut faire Rorty, Richard. “On Ethnocentrism: a reply to
souffrir...” (Clastres, Pierre. “De la torture dans Clifford Geertz”. In: Objetivity, Relativism, and

12
SérieAnis 06, Brasília, LetrasLivres, 1-14, junho, 2000
Versão PDF
ISSN 1518-1324

SérieAnis
Número 06, junho de 2000

Bioética y Ética y Feminismo y Gênero y Direitos Humanos y Justiça y Desenvolvimento Social

Truth. Cambridge. Cambridge University estratégias de erradicação da prática da


Presses. 1997: 207. mutilação.
42 52
Segundo consta, Eduardo Rabossi foi o Isso não quer dizer que os antropólogos
primeiro filósofo a fazer referência ao discurso sejam seres capazes de viver a tolerância do
sobre os direitos humanos como uma espécie absurdo. O fato é que os antropólogos
de cultura: “...los derechos humanos domesticam a intolerância em suas escritas
constituyen componentes esenciales de nuestra etnográficas. Malinowski, por exemplo, é
visión del mundo...existe una floreciente paradigmático sobre isso. Os Argonautas é o
cultura de derechos humanos en el mundo. livro obrigatório para a alfabetização dos
Formamos parte de ella. Nos encontramos antropólogos. Nele, os estudantes aprendem
inmersos en ella...” (“La Teoria de los Derechos como fazer um trabalho de campo, aproximar-
Humanos Naturalizada”. In: Revista del Centro se dos nativos, escrever uma etnografia, enfim,
de Estudios Constitucionales, no 5, enero- Malinowski ensina como ser antropólogo. No
marzo, 1990: 159). entanto, a publicação do diário privado de
43
Este trecho foi citado em Renteln, Alison campo do autor mostrou com detalhes o
Dundes. “Relativism and the Search for Human repúdio moral que Malinowski sentia em relação
Rights”. In: American Anthropologist. vol. 90, aos nativos. Raymond Firth analisa uma série
number 1, March 1988: 67. de resenhas e comentários sobre o livro em que
44
Este trecho foi citado em Renteln, Alison o tom dominante foi de recusa ao Malinowski
Dundes. “Relativism and the Search for Human desnudado pelo Diário, como se a publicação do
Rights”. In: American Anthropologist. vol. 90, lado secreto do autor houvesse rompido com
number 1, March 1988: 67. um mito (Firth, Raymond. “Segunda
45
Uso praticamente como sinônimos os termos Introdução”. In: Um Diário no Sentido Estrito
relativismo moral, tolerância moral, crença do Termo. Rio de Janeiro. Record. 1997). Por
moral e seus corolários culturais, tais como outro lado, essa maior tolerância dos
relativismo cultural, tolerância cultural, crença antropólogos para com seus objetos de estudo
cultural. Assim como Alison Renteln argumenta, ocorre quando há uma distância simbólica entre
acredito que boa parte dos debates envolvendo a cultura do antropólogo e a cultura do nativo.
o relativismo cultural resumem, na verdade, Nos casos onde a cultura do antropólogo é
questões sobre o relativismo moral ou ético. também seu universo de pesquisa são
Mas, somente para fins de compreensão, aceito recorrentes o engajamento crítico, como, por
a proposição de que o relativismo moral seja exemplo, nos estudos de gênero relativos a
um subconjunto do relativismo cultural sociedades urbanas.
53
(“Relativism and the Search for Human Rights”. Rorty, Richard. “On Ethnocentrism: a reply to
In: American Anthropologist. vol. 90, number Clifford Geertz”. In: Objetivity, Relativism, and
1, March 1988: 59). Truth. Cambridge. Cambridge University
46
Putnam, Hilary. La Herencia del Presses. 1997: 203.
54
Pragmatismo. Barcelona. Paidós. 1997. Rorty, Richard. “On Ethnocentrism: a reply to
47
Rorty, Richard. “The contingency of a liberal Clifford Geertz”. In: Objetivity, Relativism, and
community”. In: Contingency, Irony, and Truth. Cambridge. Cambridge University
Solidarity. Cambridge. Cambridge University Presses. 1997: 203.
55
Press. 1989: 50. No caso específico sobre o tema da mutilação
48
Benedict, Ruth. Patterns of Culture. Boston. genital, os primeiros estudos etnográficos e
Houghton Mifflin. 1934: 278. documentos internacionais assinados datam
49
Para uma boa análise do medo que o dos anos 70. A Comissão de Direitos Humanos
relativismo causa nos racionalistas vide o artigo das Nações Unidas mencionou pela primeira
de Clifford Geertz, “Anti anti-relativism”. In: vez a prática em 1952. Mas foi somente em
Krauz, Michael. Relativism: interpretation and uma reunião da Organização Mundial de Saúde,
confrontation. Idiana. University of Notre Dame em 1990, que sugeriu-se substituir o termo
Press. 1989: 12. “circuncisão feminina” por “mutilação genital
50
Clifford Geertz, “Anti anti-relativism”. In: feminina” (Isa, Ab. Rahman; Shuib, Rashidah;
Krauz, Michael. Relativism: interpretation and Othman, M. Shukri. “The Practice of Female
confrontation. Idiana. University of Notre Dame Circumcision among Muslims in Kelantan,
Press. 1989: 19. Malaysia”. In: Reprodutive Health Matters, vol.
51
Hanny Lightfoot-Klein é autora da etnografia 7, no. 13, May. 1999: 137). Em 1979, a
mais famosa sobre a mutilação genital ritual, Organização Mundial de Saúde promoveu uma
Prisioners of Ritual: an odyssey into female conferência sobre “Práticas Tradicionais que
genital circumcision in Africa (New York. Afetam a Saúde da Mulher”, em Khartoum, no
Harrington Park Press. 1989). Lightfoot-Klein é Sudão. Esta reunião marcou o início do debate
psicóloga de formação básica e depois de sobre o tema em âmbito internacional
inúmeras viagens exploratórias à África nos (Lightfoot-Klein, Hanny. Prisioner of Ritual: an
anos 70 decidiu escrever uma etnografia no odyssey into female genital circumcision in
sentido antropológico do termo. Para isso, a Africca.Neu York. Harrington Park Press. 1989).
56
autora engaja-se a programas de pós- Rabossi, Eduardo. “La Teoria de los Derechos
graduação em antropologia e psicologia social Humanos Naturalizada”. In: Revista del Centro
e, hoje, é uma referência importante nos de Estudios Constitucionales, no 5, enero-
estudos sobre as mulheres mutiladas e sobre as marzo, 1990.

13
SérieAnis 06, Brasília, LetrasLivres, 1-14, junho, 2000
Versão PDF
ISSN 1518-1324

SérieAnis
Número 06, junho de 2000

Bioética y Ética y Feminismo y Gênero y Direitos Humanos y Justiça y Desenvolvimento Social

57
Nietzsche, Friedrich W. Assim Falou
Zaratustra: um livro para todos e para
ninguém. 3 ed. Rio de Janeiro. Civilização
Brasileira. 1983: 47.
58
Sófocles. “Antígona”. In: A Trilogia Tebana:
Édipo Rei, Édipo em Colono, Antígona. 2a ed.
Rio de Janeiro. Jorge Zahar Ed. 1990: 199.
59
Rosset, Clément. Logique du Pire. Paris.
Presses Universitaires de France. 1993: 45.
60
Schopenhauer, Arthur. O Mundo como
Vontade e Representação. Rio de Janeiro.
Ediouro. s/data: 67.
61
Schopenhauer, Arthur. O Mundo como
Vontade e Representação. Rio de Janeiro.
Ediouro. s/data: 67.
62
Nietzsche, Friedrich W. Genealogia da Moral:
uma polêmica. São Paulo. Companhia das
Letras. 1998: 29.
63
Rosset, Clément. Logique du Pire. Paris.
Presses Universitaires de France. 1993: 14.

Bibliotecária Responsável:
Kátia Soares Braga (CRB/DF 1522)

Jornalista Responsável:
Fabiana Paranhos (DRT/DF 2496)

Tiragem:
50 exemplares

Serviço Editorial:
Editora LetrasLivres
Caixa Postal 8011
CEP 70.673-970
Brasília-DF Brasil
+55 61 343 1731
letraslivres@anis.org.br

14
SérieAnis 06, Brasília, LetrasLivres, 1-14, junho, 2000
Versão PDF

Você também pode gostar