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EÇA DE QUEIRÓS
1. PERSONAGEM
CENTRALIDADE
Desde o início, começa a definir-se a personagem que ocupara na obra o papel fulcral, tanto
em termos de inserção social, como em relação à intriga – Carlos. As gerações de Afonso e
Pedro da Maia surgem sobretudo em função da necessidade de explicar a existência de Carlos
“em Lisboa, no Outono de 1875″, quando começa a história.
CARACTERIZAÇÃO
Com o Naturalismo, a caracterização das personagens especializa-se: estão em
causa, então, sobretudo fatores educacionais, elementos concernentes à hereditariedade,
relações com o meio e a sua influência. Tudo inspirado numa conceção determinista e
evolucionista da existência, a que não eram alheias as teses de Darwin a propósito da origem
das espécies e da sua selecção por força das características ambienciais específicas. Porém, a
gestação d’Os Maias coincide, em grande parte, com a gradual instauração da descrença nos
valores da estética naturalista. Neste romance, encontraremos uma caracterização tipicamente
naturalista (a de Pedro da Maia), uma outra de caráter híbrido (Maria Eduarda) e, finalmente, a
do próprio Carlos da Maia, praticamente por completo afastada das normas impostas no
romance experimental.
Pedro da Maia
Com Pedro da Maia assistimos ao enunciar, por parte do narrador, dos fatores
tradicionalmente evocados sob a vigência do cânone
naturalista: característicaspsicofisiológicas (temperamento nervoso e instável, a abulia e a
passividade), meio social (o vaguear pelos botequins e lupanares, os distúrbios no Marrare e a
alternância com a imersão no ambiente beato e nas leituras devotas) e educação (a
deformação da vontade própria, a imersão na atmosfera melancólica do Romantismo
decadente, o recurso à memorização). Este leque de factores explicam as opções de Pedro
tais como o casamento sentimentalmente instável e falhado e, por fim, o suicídio, consequência
última e definitiva do seu temperamento e de uma formação virados para a cedência e para a
fuga.
Maria Eduarda
Com o seu processo de caracterização estamos com um comportamento, por parte do
narrador, de certa forma eclético, no que respeita à evocação dos elementos que definem o
modo de existência da personagem. O teor da confissão de Maria Eduarda (cap. XV) prende-se
a dois grandes vectores: por um lado, à referência a uma juventude desordenada e passada
em ambientes algo duvidosos; por outro lado, à explícita responsabilização desses ambientes e
da companhia da mãe para explicar a sua vida dispersiva e vivida ao sabor de amizades de
circunstância. Só que esta autocaracterização constitui já uma ruptura face às normas do
Naturalismo. Estruturalmente, estes dados sobre a personagem surgem depois de os
comportamentos terem sido realizados e não antes, como no caso de Pedro da Maia. Além
disso, o facto de ser uma autocaracterização, que tende a ser subjetiva, colide com as
determinações do Naturalismo.
Carlos da Maia
As sugestões de fuga às diretrizes naturalistas esboçadas na caracterização de Maria
Eduarda consumam-se inteiramente no que respeita a Carlos da Maia. Com Carlos assiste-se
àquilo a que normalmente se chama caracterização indireta, ou seja, uma caracterização
essencialmente dinâmica, em que os atributos da personagem são apreendidos gradualmente,
à medida que a sua actuação no decurso da ação vai permitindo. Assim, a vocação de Carlos
para a Medicina não é explicada pelo narrador em função de uma qualquer causa hereditária
ou ambiencial. É igualmente por meio do seu comportamento dispersivo que subtilmente é
sugerido o diletantismo que conduzirá Carlos à frustração das suas potencialidades. Mas será
sobretudo nos seus contatos sociais que Carlos definirá a sua condição de personagem em
tudo superior ao contexto social em que se insere. Carlos não tem a atenção direta, sistemática
e demorada do narrador, tal como acontecia à luz do código naturalista. O próprio Carlos afirma
que “os carateres só se podem manifestar pela ação.”
2. EDUCAÇÃO
N’Os Maias, a educação surge diversas vezes aflorada ao longo do romance, isso
acontece quando se trata de através dela delinear uma imagem das conceções que sobre o
assunto eram desposadas pela alta sociedade lisboeta cuja mentalidade deste modo se vai
precisando.
N’Os Maias são confrontados dois sistemas educativos opostos: a típica educação
portuguesa oitocentista e conservadora (de Pedro da Maia e Euzebiozinho): o primado da
cartilha e com ela uma conceção essencialmente punitiva da devoção religiosa; o latim como
prática pedagógica fossilizada e não criativa; e sobretudo a fuga ao contato direto com a
natureza e com as realidades práticas da vida. Por sua vez, Carlos é submetido a
umaeducação tipicamente inglesa: privilégio da vida ao ar livre, exercício físico, aprendizagem
de línguas vivas, desprezo pela cartilha e por todo o conhecimento exclusivamente teórico.