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HISTÓRIA DAS IDEIAS POLÍTICAS

LINHA DE SEBENTAS
História das Ideias Políticas

Índice
1. OBJETO DA HISTÓRIA DAS IDEIAS POLÍTICAS ..................................................................... 3
2. DOIS CONCEITOS DE LIBERDADE: ISAIAH BERLIN ................................................................ 3
3. NOÇÃO NEO-ROMANA DE LIBERDADE : QUENTIN SKINNER .................................................. 5
4. SÉCULO XVIII: THOMAS HOBBES ...................................................................................... 7
5. DOUTRINA DA “CONSTITUIÇÃO MISTA ” (SÉC.IV A.C.): ARISTÓTELES .................................... 8
6. ‘’ a constituição mista’’........................................................................................... 11
7. A IDADE MÉDIA/A ÉPOCA MEDIEVAL ............................................................................. 12
8. A CONSTITUIÇÃO MEDIEVAL E A SUPREMACIA DA COMUNIDADE POLÍTICA .......................... 14
8.1. O PODER POLÍTICO DA MONARQUIA E A “CONSTITUIÇÃO MISTA ” DE S. TOMÁS DE
AQUINO (1225-1274) ................................................................................................... 14

9. LIBERALISMO/IDADE MÉDIA ......................................................................................... 17


9.1. A CONSTRUÇÃO DO CONCEITO DE SOBERANIA : JEAN BODIN ...................................... 17
10. IDADE MODERNA ..................................................................................................... 19
10.1. O ESTADO DE NATUREZA E O CONTRATO SOCIAL : THOMAS HOBBES ........................ 19
10.2. O CONTRATO SOCIAL: JEAN JACQUES ROUSSEAU .................................................. 22
10.3. O estado de natureza em rousseau ............................................................ 23
11. A TEORIA CONTRATUALISTA: JOHN LOCKE .................................................................. 25
12. Comparação entre teóricos contratualistas ...................................................... 27
Hobbes e Locke: a natureza como referência ............................................................ 27
Rousseau e Locke ....................................................................................................... 27
Locke e Rousseau/Hobbes ......................................................................................... 28
13. A LIBERDADE DOS ANTIGOS E A LIBERDADE DOS MODERNOS: BENJAMIN CONSTANT ........ 28
14. ‘’ON LIBERTY’’: JOHN STUART MILL ............................................................................ 30
Repetitório de Perguntas ............................................................................................... 34

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História das Ideias Políticas

1. OBJETO DA HISTÓRIA DAS IDEIAS POLÍTICAS


 A Disciplina de História das Ideias Politicas irá abranger apenas o pensamento
europeu.
 A história das Ideias Políticas surge inserida num determinado contexto, ou seja,
uma base ou fundamento, dependendo certas circunstâncias sociais e culturais
vigentes.
 Os contextos limitam as ideias políticas (Contextos = Transformações Sociais)
o Contexto social e cultural
o Herança cultural
o Vocabulário, linguagem
o Ideias como resposta a situações políticas concretas

2. DOIS CONCEITOS DE LIBERDADE: ISAIAH BERLIN

Teoria liberal sobre a liberdade: Liberdade negativa ≠ liberdade positiva

NOÇÃO DE LIBERDADE NEGATIVA


 Segundo Isaiah Berlin, a liberdade negativa remete-nos para a teoria liberal
sobre a liberdade (opinião defendida pelo autor)
 Ausência de impedimentos
 Atitude não-coerciva
 Trata-se de um Estado não-intervencionista, a sua função consiste apenas em
assegurar a liberdade individual: autoridade serve para impedir a colisão dos
diversos direitos individuais
o Para conseguir a autonomia/liberdade é necessário encontrar ‘’bases
sociais” que garantam uma sociedade coesa; isso só se torna possível
com intervenção estatal
 Segundo Isaiah Berlin, a limitação da área de livre ação do homem confere ao
indivíduo um espaço demasiado confinado para o desenvolvimento mínimo das
suas faculdades mentais
o A lei é sempre algo que limita a liberdade, daí a defesa de pouca escrita
jurídica

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 A liberdade não se confunde com: igualdade, independência, equidade, justiça,


cultura, felicidade humana ou consciência tranquila
o “O que importa é não colocar obstáculos às pessoas”
 A liberdade é fundamental para a inovação e desenvolvimento da sociedade.
 Todavia, a liberdade não pode ser totalmente ilimitada, pois assim haveria uma
interferência doentia dos indivíduos na vida de outrem
o Caos ---> Anarquia

A DEFESA DA LIBERDADE CONSISTE NA META “NEGATIVA” DE EVITAR A


INTERFERÊNCIA: o indivíduo possui uma esfera de liberdade individual, na qual estão
estabelecidas as fronteiras para a intervenção estatal.

 NOÇÃO DE LIBERDADE “POSITIVA”: porque exige a intervenção do Estado


o Remete para a intervenção do Estado, para possibilitar uma orientação
prévia e pensada, de modo a descobrir o mundo racional;
 Existe um poder legítimo que regula a intervenção com o intuito
de emancipar o indivíduo.
 ‘’Os perigos de usar metáforas orgânicas (…) para justificar
a coerção de alguns indivíduos por outros (…) elevar a um
nível “superior de liberdade”
o Numa fase inicial, o indivíduo abdica da liberdade individual, de modo a
submeter-se ao Estado/a um terceiro, que o remeta para outra noção de
sociedade: LIBERTAÇÃO DO EU “REAL”/RACIONAL E OPRESSÃO DO EU
“EMPÍRICO”/IRRACIONAL

 Basta que haja uma autoridade forte que encaminhe os homens


para o bem, para o racional: “…é dizer que posso ser coagido para
meu próprio bem, que a minha cegueira impede de ver: o que
pode, ocasionalmente, reverter em meu benefício; pode
inclusivamente alargar o âmbito da minha liberdade.”
(pensamento utilizado pelas mentes organizadoras dos
Estados/ideologias totalitárias)

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3. NOÇÃO NEO-ROMANA DE LIBERDADE: QUENTIN SKINNER


 A conceção “neo-romana”, ou conceção republicana de liberdade constitui a
análise de Quentin Skinner à dicotomia da noção de liberdade apresentada por
Isaiah Berlin
o Não estar na dependência da vontade arbitrária de alguém, isto é livre ≠
escravo
 Ser livre é ser cidadão de um Estado livre, onde se é governado pela lei escolhida
pelo povo
o Uma pessoa é livre quando se rege pela leia em cuja elaboração ela
própria participou
Liberdade
Organização da
sociedade/limitação do
Participação poder público

 Segundo Skinner, o que importa é a participação política e não a ausência de


impedimento para o Bem-Estar, a não intervenção dá lugar à participação.
 Para uma boa organização da sociedade é necessário que todos decidam, ou
seja, que todos tenham participado.
o Como? Através do direito de voto, de modo a redigir um documento que
exprima a vontade da população.

Esta noção de liberdade é refutada por HOBBES: Afirma que a liberdade é a ausência de
impedimento; atitude anti coerciva: ‘’liberdade negativa”

EM SUMA: ‘’LIBERTY BEFORE LIBERALISM” – QUENTIN SKINNER

 Segundo Quentin Skinner, Isaiah Berlin não pode afirmar que existe uma dupla-
conceção de liberdade (positiva e negativa): Skinner postula uma conceção neo-
romana de liberdade
o O que importa é a forma de governo – autogoverno – que resulta da
vontade do povo, isto é, a forma de governo e a conceção de liberdade

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têm que ter por base a participação de todos os Cidadãos. Desta forma,
todos os cidadãos devem participar individualmente na constituição do
poder público (ex.: voto)
 ASSIM: Ser livre é ser cidadão de um Estado livre no qual as leis regentes
dependem do consentimento dos cidadãos
o Participação leva à liberdade e ao desejo de representação: vontade é
legítima mesmo quando estão envolvidas considerações relacionadas
com a segurança comum e com o bem-estar da sociedade – envolve a
criação de obstáculos ao indivíduo
 O bem comum pode predominar sobre os direitos individuais:
limita a liberdade individual – Liberdade pode significar
impedimentos, para que ninguém fique seja vítima da vontade
arbitrária de outrem: autoridade para garantir a liberdade
(defendia a existência de leis para atingir a liberdade)
 Desta forma Skinner defende:
o Liberdade ≠ Escravidão
 Escravidão: não há liberdade, o indivíduo depende portanto da vontade
arbitrária de outrem
o O escravo depende da boa vontade do senhor: O escravo não participa
 Skinner afirma que, as Nações e os Estados não são livres se a sua ação está
dependente de normas externas, ou submetida a um tirano
o Os cidadãos destes Estados são escravos mesmo que tenham vontade
intrínseca de serem livres, porque estão sujeitos a um Estado tirano
 Os Estados são escravizados quando estão sujeitos à vontade de outros Estados
(relação metrópole/colónia) e sempre que a sua Constituição não tenha
mecanismos de defesa, permitindo o ABUSO DE PODER e a aplicação de medidas
discriminatórias
SOLUÇÃO - UMA CONSTITUIÇÃO MISTA que englobe:
O Rei /Senhor O Senado Aristocrático Assembleia Democrática
Moderam os excessos democráticos da maioria

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Objetivo: o Rei não se torna tirano e o povo deixa de ser escravo – Equilíbrio entre os
elementos que constituem a sociedade

4. NESTE CONTEXTO SURGE UM NOVO ARGUMENTO, EM MEADOS DO SÉCULO XVIII:


THOMAS HOBBES
 Refuta Skinner, afirmando que a liberdade começa quando a lei acaba, ou seja,
é no silêncio da lei que reside a liberdade:
o Para ser livre basta não ser impedido/limitado
 Liberdade ≠ Lei, Forma de Governo
 Todavia, o Estado tem o dever de impedir a usurpação da liberdade individual
por parte de outrem (da maioria)
 Hobbes é a base do liberalismo clássico, na medida em que defende a liberdade
negativa, postulando que a lei reduz a liberdade do indivíduo, mesmo que o
indivíduo não dependa da vontade arbitrária de outrem, como numa República.
(É por isto que Skinner passa a chamar a sua teoria de conceção neo-romana de
liberdade, em vez de conceção republicana de liberdade.)
o O que importa é a ausência de impedimento!
 Skinner responde afirmando que a teoria de Hobbes é
secundariamente democrática, ou seja, o impedimento e a sua
ausência não é o mais importante, mas sim a participação dos
indivíduos na forma de governo.
 Hobbes contra argumenta: Quando se reivindica o fim da
pobreza/dependência, isso não significa necessariamente a
presença de liberdade

 Assim nasce o new liberalism: não há liberdade se um indivíduo está


condicionado pela pobreza, pelo excesso de trabalho e pela insegurança quanto
à garantia da sua subsistência
o Aqui a lei é indispensável ao funcionamento da liberdade, de modo a
regular e a atenuar os impedimentos: Bem comum
 Visa mostrar como a tradição liberal é algo tão individualista (liberalismo
clássico) como comunitarista (new liberalism).

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As ideias políticas são condicionadas pelos respetivos contextos:

 Contexto de Skinner: preocupação acerca da hegemonia da liberdade negativa,

na medida em que o que interessa é a Participação.

 Contexto de Isaiah Berlin: A contestação aos governos totalitários do pós-

guerra, daí a defesa da liberdade negativa.

Surge num contexto histórico específico marcado pelo pós-1ª Guerra Mundial.

5. DOUTRINA DA “CONSTITUIÇÃO MISTA” (SÉC. IV A.C.): ARISTÓTELES


 Pensador que viveu entre 384 e 322 a.C. na Macedónia;

 É considerado o Pai da Democracia;

 Não achava que a liberdade fosse uma caraterística natural do homem, devia

antes ser conquistada;

 É partidário do bom senso, do equilíbrio, da moderação, da virtude;

 O ideal a atingir não é uma sociedade justa, mas sim, o bom cidadão, isto é, o

cidadão virtuoso, justo, orientado para a felicidade;

 Defende uma Constituição Mista diferente da atual.

A grande questão da filosofia aristotélica é saber como é que o homem pode viver uma

“vida boa”

 “Vida Boa” é aquela em que os seres humanos exercem as capacidades que os

distinguem dos outros animais. O cidadão virtuoso recorre às suas virtudes

intelectuais, emitindo juízos acerca do bem e do mal, do benéfico e do

prejudicial e é capaz de agir de acordo com esses mesmos juízos.

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o ‘’ Vida boa’’ é aquela que permite aos homens exercer as suas virtudes

intelectuais e de caráter.

 Para viver uma vida boa, o Homem necessita de:

o Viver em Comunidade: o Homem é frágil e necessita dos outros, isto é,

ninguém deseja viver isolado, na medida em que fora da comunidade, o

Homem deixa de o ser

 É a vida em comunidade que faz o homem ser o que fora dela não

o consegue ser.

o Participação política na vida dessa comunidade: é importante participar

na vida política da comunidade, para ajudar a alcançar o bem comum,

na Pólis (a comunidade ideal)

Para Aristóteles, o Homem só é Homem enquanto ser político e social, daí a Pólis ser

benéfica e essencial para o Homem.

 Pólis – É uma forma natural de organização, na qual o indivíduo se distingue dos


outros animais.
o Forma mais completa e perfeita de vida em comunidade
o Forma natural de associação
o Resulta do impulso natural dos Homens para se organizarem em Cidades-
Estado, em busca da “vida boa”
o É na Pólis que o Homem se distingue do animal
o Possibilita a realização máxima das virtudes do Homem
 Por outro lado, existem formas de viver em sociedade mais imperfeitas, outras
comunidades que contribuem para o funcionamento perfeito da Pólis, embora
sendo imperfeitas.

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PÓLIS
Comunidade de indivíduos que participam no Governo de uma comunidade de
pessoas livres e iguais – não há submissões: ser livre é não estar sujeito a ninguém e
não ter ninguém sujeito a nós
FAMÍLIA ALDEIA
Objetivo natural de reprodução que Conjunto de famílias que se juntam para
engloba governantes e governados se protegerem do inimigo externo,
garantindo melhor a preservação

 A situação ideal de igualdade proporcionada pela Pólis só é possível graças à


existência de outros tipos de comunidades, menos perfeitas: só pode haver
cidadãos se existirem súbditos (mulheres, escravos, crianças) que deram
possibilidade aos outros de lutar pela sua liberdade.

A Pólis representa a forma mais natural de viver; porém, para que tal seja possível, é
necessário que haja escravos para que o homem seja libertado da necessidade

 As funções económicas de subsistência da Pólis têm que ser garantidas por não-
cidadãos (escravos e emigrantes)
o Requer a escravatura, isto é, a existência de súbditos que não fazem parte
da Pólis
 É natural, ou seja, nasce com o Homem, na medida em que uns
nascem com aptidões físicas e outros com intelectuais.
 Assim: Escravatura é natural = necessária para a sobrevivência da
Pólis.
 A Liberdade é feita pelo Homem:
o É alcançada através da libertação das necessidades mais primárias da
vida, sendo isto resolvido pelo recurso ao trabalho escravo (escravizando
os outros).
 A qualidade de escravo alivia os Homens livres da coerção da
necessidade. O Homem livre, o cidadão da Pólis, não é

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constrangido pelas necessidades físicas da vida nem sujeito à


dominação instituída por outros homens.
o Para ser livre é necessária a libertação em relação às necessidades
primárias; não sendo o cidadão um escravo mas sim, um proprietário de
escravos.
 A liberdade da esfera política começa depois de todas as
necessidades terem sido domadas, através de um processo de
governação.
 A vida privada é fundamental à pública, isto é, possibilita a vida pública
o O Homem completa-se, distinguindo-se do animal: A cidade é um fator
de realização.

6. ‘’ A Constituição Mista’’
 Constitui uma proposta para a boa organização da cidade com base num estudo
empírico de constituições de várias cidades.
 É um meio que não está associado à limitação do poder, mas sim ao equilíbrio e
união dos outros “órgãos políticos”
o É um meio para evitar a dissolução da Pólis, que estava ameaçada pela
radicalização da luta entre ricos e pobres: Guerra Civil
 Solução: uma melhor forma de governo para manter unida a
comunidade (equilíbrio entre as diversas componentes
constituintes da cidade)
 Objetivo: tentar acabar com as desigualdades económicas e
sociais.

 Segundo Aristóteles existiam 3 regimes políticos:


o A realeza (governo de um só) – degenera em tirania
 Governo de um só com vista ao interesse pessoal
o A aristocracia (governo de poucos) – degenera em oligarquia
 É a busca do interesse dos ricos
o Regime constitucional (governo de todos: povo) – degenera em
democracia
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 Via o interesse dos pobres

 Para Aristóteles, tudo isto se torna um ciclo (as coisas naturalmente entram em
decadência e renovação) – DEGENERAÇÃO: possibilidade de dissolução,
deixando de haver comunidade (meio natural do homem)
o A degeneração era motivada pela determinação económica, isto é, na
divisão entre ricos e pobres, na qual cada classe, consoante a sua riqueza,
deseja diferentes formas de organização política que mais lhe favoreça.
 Conduz a um ciclo vicioso, precisamente a essa degeneração, pois
nenhum homem é virtuoso o suficiente para evitar esta realidade:
por outras palavras, a virtualização do poder está omnipresente,
isto significa a constante possibilidade de o poder vir a ser
transformado em prol dos respetivos interesses

Solução: defesa da classe média

 É na classe média que a vida é melhor, na medida em que consiste no justo meio.
o Desta forma a sua existência é imprescindível para atenuar os contrastes
entre ricos e pobres.
 Devia ser maioritária, pois se predominasse estariam criadas melhores condições
para a vida política, evitando a degeneração.
o Promovendo a união e convidando os cidadãos ao exercício da virtude,
promovendo a atividade racional, chamando todos os elementos a
participar fazendo-os coexistir em equilíbrio.
 Objetivo: resolução dos problemas e organização da comunidade, atingindo o
bem comum.
o É a organização da cidade que promove a racionalidade e a virtude em
prol do bem comum.

Em suma: Segundo Aristóteles, a melhor forma de governo é a República de caráter


misto, contendo alguns elementos da Oligarquia e da Democracia, apoiada no
predomínio das classes médias (chamando para o Governo da cidade os três elementos).

7. A IDADE MÉDIA/A ÉPOCA MEDIEVAL


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Caraterísticas (a supremacia da comunidade política):

 O cristianismo é uma revolução religiosa com implicações morais, sociais e


políticas;
 Nova conceção de divindade
 Substituição do dever de justiça pelo dever da caridade;
 Noção de humanidade;
 Todo o poder vem de Deus;
 Supremacia das relações familiares, morais e religiosas;
 Poderes limitados;
 Pluralidade de poderes, nenhum é soberano, limitam-se uns aos outros;
 Não existe uma norma positiva (constituição escrita);
 A Constituição é um conceito natural;
 Poder é distribuído por instituições, logo limitado;
 Limitação intrínseca dos poderes;
 Tudo o que existe tem um fim: salvação eterna;
 Aceitação de privilégios;
 O Rei é a cabeça do Reino, ou o coração que bombeia o sangue para todo o corpo
o É no entanto inferior ao conjunto das partes que representam a
comunidade política, isto é, o rei não existe de forma autónoma, só
existe em função da comunidade política (o corpo).
 Função do Rei/Príncipe:
o Ser justo
o Atribuir a cada um a sua ordem natural
o Repor a ordem
o Dar a cada um aquilo que lhe pertence
 O PODER DO REI/PRÍNCIPE: SEGUNDO JOHN SALISBURY A COMUNIDADE PODE

RESISTIR AO REI INJUSTO , RECORRENDO EM ÚLTIMO CASO AO TIRANICÍDIO

o Limitado e absoluto
o Só é limitado por Deus
o Se age contra os direitos dos súbditos pode ser morto legitimamente
(tiranicídio)

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 Governar não é dirigir, é julgar, manter a paz e não permitir que


outrem tenha atos arbitrários
 Deveres do Príncipe
o Garantir a paz e a unidade do Reino;
o Prevenir os crimes, reprimir a violência e fazer justiça;
o Proporcionar aos mais necessitados meios de subsistência
 ‘’Governar é guiar aquilo que é governado para o seu fim’’

 O Poder Espiritual e o Poder Temporal são legítimos e têm ambos origem divina

8. A CONSTITUIÇÃO MEDIEVAL E A SUPREMACIA DA COMUNIDADE POLÍTICA


8.1. O PODER POLÍTICO DA MONARQUIA E A “CONSTITUIÇÃO MISTA” DE S. T OMÁS DE

AQUINO (1225-1274)
 O grande contributo que S. Tomás de Aquino vai dar tanto à história da Igreja
como à história do pensamento político e filosófico é o de elaborar uma síntese
entre o cristianismo e o Aristotelismo.
 Segundo este, e na esteira de Aristóteles, o Homem é um animal social e, mais
do que isso, é um animal político, ou seja, um ser que exige a vida política e social
para se manter e desenvolver, com o fim de satisfazer as suas necessidades
espirituais e materiais
 A Sociedade política é a sociedade perfeita, no sentido que é a única:
o Capaz de proporcionar a satisfação de todas as necessidades da vida;
o A sociedade política tem origem natural, ou seja, surge da necessidade
de uma autoridade que governe para que o bem comum se realize: Quem
tentasse alterar esta ordem natural era considerado um tirano, porque
atentava contra uma ordem vigente e pré-estabelecida
 Na Idade Média, a Constituição era um conjunto de regras, pactos
e contratos que garantiam a todos as suas liberdades (a uns mais
do que a outros), devendo os costumes e as tradições serem
sempre respeitados
 Atentar contra esta constituição natural não positivada é
contrariar a ordem vigente

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 S. Tomás de Aquino defende que não há que refletir sobre a organização social
porque a sociedade já está naturalmente organizada: aos homens cabe aceitá-la
e não mudá-la – A Constituição da Sociedade tal como está (natural) é boa, visto
que:
o Não serve para limitar os poderes, uma vez que estes já se encontram
limitados – ninguém é soberano
o Há uma descentralização dos poderes que torna essa limitação
intrínseca/natural
 A melhor forma de evitar a tirania do Rei é a adoção da Constituição Mista
o A principal preocupação é evitar que a Monarquia degenere em Tirania.
Para tal, S. Tomás de Aquino recupera a Constituição Mista de Aristóteles,
isto é, a intenção de conjugar o elemento monárquico, com o elemento
democrático e aristocrático.
 Esta Constituição mista atribuía importância extra a vários estratos da sociedade:
o O Rei era a ‘’cabeça’’ ou o ‘’coração’’ do Reino, sendo a sua função
exaltada, porque sem ele o reino não sobrevive, sendo neste sentido
superior
o O Rei é inferior ao conjunto das partes, dado que o Rei não existe de
forma autónoma, ele só existe em função da comunidade política,
devendo preservar a ordem dessa sociedade, que é natural, ou seja,
anterior a ele, através da utilização do seu poder judicial, fazendo justiça;
 Conceção do Rei justiceiro, que coloca cada um no seu devido
lugar. Desta forma, o Rei consegue manter a paz e medir conflitos.

Deus

Povo

Rei

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 Deus entrega o poder ao povo e às comunidades, e estes transferem esse poder


para o Rei
o Porquê? Porque a monarquia é o melhor regime, embora também
considere, à semelhança de Aristóteles, as 3 formas de governo e o
princípio da degeneração.
 Monarquia é a que mais se identifica com a ideia de Deus, isto é,
se Deus criou o mundo sozinho, o Reino devia ser governado por
um só, mas também porque a monarquia é o único regime que
consegue manter a união do reino.
 Esta monarquia é limitada: o poder temporal está subordinado ao poder
espiritual e à comunidade: dupla limitação do poder da Monarquia
o Fins espirituais: Deus é o ser supremo e o Papa, como seu representante
na Terra, tem um mandato divino e imperativo e tem de ser respeitado
pelos regentes
o Fins temporais: o Rei está obrigado a manter a ordem da comunidade
porque se não o fizer, a comunidade pode exercer o tiranicídio.

EM SUMA: S. TOMÁS DE AQUINO E A CONSTITUIÇÃO MISTA

 S. Tomás de Aquino baseando-se em Aristóteles, retoma a ideia da “Constituição


Mista” como sendo a única forma de evitar que o Rei se transforme num tirano.
o Isto pressupõe a conjugação do elemento monárquico com o
aristocrático e com o democrático, surgindo assim as cortes medievais:
forma de garantir a representação política de todos os estratos da
sociedade perante a monarquia e de fazer com que cada estrato se sinta
parte integrante da sociedade.
 As cortes deviam ser convocadas para que a tirania fosse evitada, para que todos
os estratos se sentissem representados.
 A sociedade é corporativa
 Por outro lado, o poder do monarca está naturalmente limitado pelo facto de
esse poder ser de origem divina. Desta forma, o Homem é virtuoso porque é filho
de Deus

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 Por outro lado, a própria constituição das coisas, isto é, a sua ordem natural, é
limitadora do poder real, na medida em que este governa de acordo com a
vontade de todos os estratos sociais, através da Corte Medieval (representa os
estratos sociais)

Constituição mista Constituição Mista de S. Tomás de Aquino


Aristotélica ≠
Projeto para alcançar OBJETIVO: representação de todas as partes da sociedade no
o equilíbrio poder político, aconselhavam o Rei
O perigo da tirania decorria do isolamento do rei. Assim, com
representantes junto de si, a probabilidade de se tornar
tirano tornava-se menor: Cortes Medievais
 A cidade precisa de uma autoridade natural
 Do exercício da obediência decorre a virtude
 A esfera terrena da vida tem os seus fins, sendo necessário um governante que
encaminhe os homens para os seus fins.

9. LIBERALISMO/IDADE MÉDIA
 Têm pontos de convergência que explicam a aproximação dos liberais aos
medievais:
o Base na constituição
o Forma partilhada de poder
o Ideia de uma ordem natural – de que resulta o bem geral
o Respeito pelos direitos fundamentais
o Poder descentralizado

9.1. A CONSTRUÇÃO DO CONCEITO DE SOBERANIA: JEAN BODIN


 Jean Bodin defendia um poder soberano que fosse perpétuo, originário e
indivisível, ou seja, que não derivasse de outro poder
o Existem poderes que o detentor do poder soberano não é obrigado a
partilhar.

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 Não existe a interferência de outros poderes no poder soberano.


Este deixa assim de governar com os outros estratos sociais, para
governar acima deles, que passam a ser seus súbditos.
 Jean Bodin considera que a constituição medieval não é relevante, introduzindo
uma cisão: o soberano tem o poder absoluto, contudo reconhece as ordens
jurídicas descendentes = novo conceito de soberania ≠ S. Tomás de Aquino
 Elementos do conceito de soberania
o É um poder, visto que tem a faculdade de impor aos outros um comando
a que eles ficam a dever obediência
o É um poder perpétuo, não pode ser limitado no tempo
o É um poder absoluto, isto é, não está sujeito a condições ou encargos
impostos por outrem, não recebe ordens ou instruções de ninguém, nem
é responsável perante nenhum poder
 Atributos do conceito de soberania
o É una e indivisível
o É própria e não delegada, isto é, pertence por direito próprio ao Rei e não
provém de eleições pelo povo ou de nomeação por um imperador
o É irrevogável, ou seja, o povo não tem o direito de retirar ao seu soberano
o poder político;
o É supremo
o É independente da ordem internacional
 Competências exclusivas do soberano
o Legislar e revogar leis sem o consentimento dos súbditos
o Declarar guerra e paz e decidir em última instância as controvérsias e os
conflitos entre os seus súbditos

 Segundo Bodin, estas situações têm que ser solucionadas, de modo a evitar a
desordem: Considera o poder político do soberano limitado.
o O direito divino, isto é, o respeito pelas leis divinas e naturais
o Respeito pela propriedade dos súbditos
o O direito natural
o As leis humanas e fundamentais do Reino
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o Deve aceitar o pluralismo natural da sociedade


 O poder soberano não tem necessariamente de estar
concentrado no Rei, mas sim numa única figura, que pode ser a
Assembleia (na Aristocracia e na Democracia). A ordem é
concretizada, porque mesmo que não haja acordo, há um poder
que pode dividir em última instância, superando as dificuldades
da Constituição Mista.

EM SUMA: Jean Bodin foi o grande pensador da monarquia absoluta europeia. Defendia:

 Inexistência da Separação de poderes


 Não havia garantias judiciais de defesa dos súbditos
 Não há Constituição, nem direitos do Homem, nem princípio da legalidade

10. IDADE MODERNA


 Fase do Renascimento
 Atenuação forte do Espírito Religioso Global
 Acentuação humanista e dos valores profanos
 Humano é mais importante que o Divino
 Supremacia do poder civil sobre as autoridades religiosas
 Fortalecimento do poder real
 Fim do Feudalismo/ afirmação de um Estado Soberano
 Nascimento de grandes monarquias europeias

10.1. O ESTADO DE NATUREZA E O CONTRATO SOCIAL: THOMAS HOBBES

Thomas Hobbes tinha uma teoria ainda mais extrema do poder soberano.

Fases de construção do poder soberano

 O “Momento voluntarístico da decisão soberana”: O soberano cria ordem onde


ela não existe, ou seja, entre o indivíduo e o soberano não há nada – a não ser
pela vontade do soberano

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o Antes da sociedade havia um Estado Natureza, isto é, o Homem é


naturalmente isolado. Aqui o ser humano é egoísta e egocêntrico, ou
seja, move-se pela procura da sua felicidade, e procurando aumentar
sempre o seu bem-estar.
 O seu “isolamento, a sua distância radical face a qualquer outro sujeito”
 Devido à natureza egoísta do Homem no estado de natureza e à sua constante
procura do maior bem-estar, surgem conflitos que geram o caos e a anarquia.
Para criar ordem o Homem decide abdicar de algumas das suas liberdades e
delegá-las num soberano capaz de criar ordem e mitigar conflitos, impondo o
seu poder, que é forte e incontestável. Surge aqui a figura do Leviatã
o O soberano dispõe dos poderes legislativo e judicial, bem como da
capacidade de decidir guerra e paz e de nomear magistrados (segundo
Thomas Hobbes, não existe uma ordem, mas sim indivíduos no estado
natureza – estes antecedem o soberano e estão desvinculados de
qualquer ato social).
o Estes conflitos baseiam-se na competição, na reputação/Glória e em
discórdias: os Homens encontram-se numa situação de Guerra
permanente, o que representa um entrave para o desenvolvimento da
sociedade; não há justiça, nem organização social
 Consequentemente, nesta guerra de todos contra todos, nada
pode ser injusto. As noções de certo ou de errado, justo ou injusto
não existem – Onde não há poder comum não há lei, e onde não
há lei, não há injustiça. Tudo isto só é possível em sociedade e não
em isolamento.

RESOLUÇÃO: UM CONTRATO SOCIAL – através de um ato voluntarístico os indivíduos do


Estado Natureza delegam o poder a uma soberania, com o intuito de garantir o bem-
estar e a segurança.

 Entre os indivíduos do Estado Natureza e o soberano estabelece-se um contrato,


no qual os indivíduos cedem parte dos seus poderes ao soberano em troca da
ordem e da paz.
 A criação da sociedade tem como base um contrato

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 Sem a sociedade não há total liberdade


 Os indivíduos decidem racionalmente a delegação de poderes ao soberano,
criando assim uma sociedade: tornam-se povo
 Antes do contrato social não há poder nem soberano, nem sociedade.

 Para Thomas Hobbes, o DIREITO NATURAL consiste em poderes postos em


prática pelos indivíduos, com O INTUITO DE PRESERVAR A SUA NATUREZA. Estes
poderes são executados a seu belo prazer, constituindo um mecanismo de
defesa à sua liberdade/natureza.
o Os homens têm direito a todas as coisas até aos corpos uns dos outros:
insegurança (isto só acontece no Estado de Natureza).
o Diferente do Direito Natural de Jean Bodin, que corresponde às normas
antigas, que permitem a harmonia e a ordem da sociedade
 Para Hobbes é a ordem da sociedade daí a melhor maneira de
preservar a vida é realizar um contrato social, e não permanecer
no Estado de Natureza.

 Outro conceito importante para Hobbes é o da Lei da Natureza (conduz o homem


ao contrato): impede os homens de fazer tudo o que querem, ou seja, um
preceito ou regra geral encontrada pela razão que proíbe o Homem de fazer tudo
o que queira e possa, até mesmo destruir a sua vida ou priva-lo dos meios
necessários para a preservar  objetivo: auto-preservação
o A razão obriga o homem a procurar a paz
o A razão obriga o homem a resignar valores e princípios com o intuito de
preservar a Paz e a segurança
o A razão obriga os homens a cumprir os contratos que celebram: isto
acontece porque é necessário criar uma força/poder para garantir que
todos cumpram o contrato (é necessário um poder soberano, porque o
homem nem é bom nem perfeito)
 As leis da razão e da paixão não são suficientes, devido à
desconfiança, ou seja, é preciso um poder soberano para a
manutenção da sociedade
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 A paixão também conduz o homem ao contrato social porque:


o Tem medo de morrer
o Deseja conseguir tudo o que é necessário para garantir uma vida
confortável, sendo tudo isto alcançado através do trabalho.

Como é que acontece o contrato?


É através da vontade de todos, estabelecendo uma sociedade restrita
Conceito de representação: deixa de ser
Conceito de autorização multidão caótica e passa a ser
reconhecido como Povo

Porquê que estes indivíduos querem uma pessoa artificial?

 Porque a liberdade reside numa situação de acalmia, não atentando contra o


soberano, não corrompendo o Contrato Social
o O poder soberano, legítimo e absoluto só se desfaz regressando à
anarquia, pondo desta forma em causa o poder social.
 Logo, só existe povo enquanto existir soberano; assim, este não
se pode arriscar a regredir ao Estado de Natureza.

Em Suma: A ordem fundamenta-se no temor, no medo e no horror que leva o Homem a


estabelecer a ordem (diferente de S. Tomás de Aquino, no qual a ordem deriva do amor
pela criação divina).

10.2. O CONTRATO SOCIAL: JEAN JACQUES ROUSSEAU


 A liberdade só se consegue através da libertação do Homem da Sociedade,
deixando de ser infeliz e corrupto.
o A ideia de libertação do Homem pressupõe uma orientação para a
liberdade: ‘’Os Homens são bons, mas a sociedade corrompe-os’’.

Hobbes: Estado de Natureza = Rousseau: Estado de sociedade


Ambos vivem numa situação de guerra de todos contra todos

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DESORDEM SOCIAL
 Rousseau postula que existe uma ordem natural das coisas
o A desordem existente no Estado-sociedade deve-se à perfetibilidade:
capacidade do Homem de se aperfeiçoar
 Isso constitui um problema, já que em sociedade este terá desejos
que não conhecia no Estado de Natureza.
 Desta forma, segundo Rousseau, a Sociedade representa crueldade, escravatura,
desordem/guerra (tirania: lei do mais forte)
o Sociedade: forma de dar segurança aos mais fracos e de garantir aos mais
ricos a sua propriedade.
 Também é na sociedade que reside a desigualdade, em termos de propriedade,
magistratura e na transformação do poder legítimo em poder limitado
o Rousseau refuta o contratualismo de Hobbes.

10.3. O Estado de Natureza em Rousseau


 No Estado-Natureza o Homem guia-se pelos seus instintos animalescos que o
tornam menos violento e mais solitário, como Rousseau descreveu: o Homem no
Estado-Natureza é um bom selvagem. A sociedade desperta no Homem o que há
de pior na sua natureza surgindo vícios que o tornam mais violento.
 Em sociedade os homens comparam-se uns aos outros e a opinião dos outros
começa a ser relevante, o que leva à degeneração do “bem em si” para o “bem
próprio” (desejo de ascensão e de distinção)
 Depois da integração do Homem na desordem social, este nunca mais volta ao
Estado de Natureza.
 Estado-Natureza em que o Homem vive de acordo com o Direito Natural,
marcado pela ausência de sofrimento e pela bondade natural não prejudicando
“o outro”, isto é, a apologia do menor mal possível para terceiros.
 O Homem nem é bom, nem é mau, é neutro, na medida em que não tem
preocupações sociais, sendo o seu único objetivo subsistir e alimentar-se.

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o O Homem é simples, corajoso e forte. Como há independência não há


submissão, logo o Homem é livre no Estado de Natureza, perdendo tudo
isto quando é integrado numa sociedade.
 Sociedade: É sempre contrária à natureza humana, uma vez que
se trata de uma construção artificial, que ao contrariar a natureza
do homem impede que este viva em liberdade.
 Desta forma, R. defende que o poder soberano deve ser ilimitado e deve
promover o bem de todos: passa pela integração do homem na sociedade,
fomentando o “eu comum” e extinguindo o bem e os interesses particulares.
 A boa ordem política consiste na integração do homem num todo, e no
estabelecimento de um contrato social que regule a sociedade como um todo.
o Cria-se a partir de um Estado Social, que tem como finalidade evitar a
guerra de todos contra todos, desejo que surge devido ao efeito
usurpador da sociedade.
 Necessidade de estabelecer regras para proteger as posses dos
ricos e os abusos de poder dos ricos em relação aos pobres: É um
contrato artificial, porque o Homem é antissocial.

Em suma:

 Rousseau pretendia uma sociedade feliz e de homens virtuosos, só sendo


possível através de um contrato social = é a solução capaz de identificar cada
indivíduo dentro do todo a que pertence; individualidade tende a diluir-se no
todo.
 Em Rousseau, a teoria contratualista pressupõe uma democracia direta, na qual
não há transferência de poderes. Até mesmo os indivíduos egoístas devem
subscrever o contrato social, pois não vão ser lesados e estão submetidos a si
próprio. A vontade geral é infalível, pois jamais lesará todos ou uma parte, nem
beneficiará apenas uma parte, isto porque a lei é geral e abstrata.
 As teorias contratualistas acabam num princípio de soberania ilimitada: esta não
admite a ideia de Constituição, visto que ela defende uma separação de poderes.
– É um instrumento de superação da desordem.

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Críticas dos liberais às Teorias de soberania absoluta:

 Caráter ilimitado do poder do soberano


 A ordem não cria a soberania: o soberano não respeita os direitos
naturais do Homem
 Não existe separação de poderes

11. A TEORIA CONTRATUALISTA : JOHN LOCKE


 John Locke é um teórico político contratualista, que diverge das posições de
Hobbes e Rousseau.
 O Estado de Natureza é um estado de liberdade e não de licença: é governado
pela lei da razão: ensina toda a humanidade, que sendo todos iguais e
independentes, ninguém deve prejudicar os outros na sua vida, saúde,
liberdade ou propriedade.
o Os homens são propriedade de Deus, logo não se podem destruir uns
aos outros, não havendo nenhum laço de subordinação entre os
Homens.
 ‘’Todos são obrigados a preservar-se a si próprios e, pela mesma
razão, desde que a sua preservação não esteja em causa, todos
têm o dever de preservar o resto da humanidade.
 É um estado de Natureza mais pacífico, na medida em que não há destruição
mútua-
 A execução das leis no Estado de Natureza está “nas mãos de todos os homens”,
ou seja, todos os homens podem punir os transgressores e impedir que os
crimes sejam cometidos: Direito de matar o assassino-
o Desta forma, quem denuncia contra a razão e a lei atenta contra a
humanidade.
 O Estado de Natureza degenera em Estado de Guerra. Todavia são Estados
Opostos, na medida em que:

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Estado Natureza Estado de Guerra


Existem julgamentos mútuos pela lei da É permanente, e caso aconteça já não é
razão possível voltar ao Estado de Natureza.
É um Estado de paz Estado de destruição recíproca

SOLUÇÃO: FUNDAR UMA SOCIEDADE CIVIL E O PODER POLÍTICO

 Através de um contrato social: lei comum que resulta do consentimento de


todos. Lei que evita julgamentos arbitrários possibilitando ao Homem libertar-se
da violência e da sujeição à vontade arbitrária de outrem
o Tudo isto pressupõe a existência de um juiz e de uma instância de
decisão: todos podem apelar em caso de injúria e têm que respeitá-la.
 Causas para a criação do Contrato Social:
o O medo da guerra
o A regulação da propriedade privada
 Objetivo do governo: evitar a violência e garantir a liberdade.

Limites ao poder político

 Poder está limitado pelo bem público da sociedade e pelas leis da Natureza
reforçadas por leis positivas
 É limitado pelas leis positivas decididas por todos
 Não pode retirar a propriedade sem consentimento dos homens
 Não pode interferir no princípio da propriedade privada

John Locke e a teoria da propriedade

 Outro dos temas defendidos por John Locke é a propriedade privada: resulta da
intenção real em cobrar impostos à propriedade – crítica de Locke
 A propriedade é um bem absoluto, pois já existe no Estado de Natureza e, sendo
uma instituição anterior à sociedade constitui um direito natural do indivíduo e
por isso nenhum estado o pode limitar ou violar. Desta forma, o indivíduo pode
disfrutar dos seus bens sem nenhuma restrição.

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 Defesa da propriedade, o pensamento liberal protege o trabalhador que através


do seu esforço adquiriu propriedade. Propriedade esta que não deve ser limitada
por outrem.
 Apelando à razão do Homem há uma repartição justa da terra
o Com um aumento populacional dá-se a regulamentação da propriedade
privada, na medida em que, a terra torna-se “escassa” e “rara”.
o É através do apelo à razão na repartição justa da terra, que cada um
ocupa aquilo que consegue cultivar: Para benefício de toda a
humanidade
 SOLUÇÃO: cria-se um poder de controlo através de acordos entre os homens.
 A propriedade é inviolável e o contrato social é criado em função de defesa da
propriedade.

12. COMPARAÇÃO ENTRE TEÓRICOS CONTRATUALISTAS

Hobbes e Locke: a natureza como referência


 Adotam o mesmo esquema explicativo de origem da sociedade
 Locke prevê a paz no Estado de Natureza, enquanto Hobbes prevê a guerra, a
morte e a destruição
 Hobbes afirma que os indivíduos abdicam totalmente dos seus direitos e Locke
defende que esses direitos transitam para que sejam melhor defendidos.

HOBBES LOCKE
Os homens renunciam a quase todos os Os homens não renunciam aos seus
seus direitos para criar o Estado Absoluto, direitos principais, mas apenas àquela
dotado de um poder mais forte possível parcela de direitos que se revela
necessária para criar um estado liberal.

Rousseau e Locke
 A propriedade é um direito natural em Locke
 Em Rousseau o soberano decide o destino da propriedade
 Para Locke o contrato social é positivo, enquanto para Rousseau, este é artificial.

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Locke e Rousseau/Hobbes
Locke Rousseau/Hobbes
Defesa de uma liberdade negativa, Defesa de um conceito de liberdade positiva,
ou seja, na ausência de na qual o Estado e a vontade da maioria
impedimento. respeitam os direitos naturais
PODER SOBERANO LIMITADO PODER SOBERANO ILIMITADO

13. A LIBERDADE DOS ANTIGOS E A LIBERDADE DOS MODERNOS: BENJAMIN


CONSTANT

 Benjamin Constant era um liberal na medida em que, preconizava uma atitude


reduzida de intervenção ou mesmo abstencionismo do Estado na vida
económica e social.
o Uma parte de cada um de nós tem de ser independente, individual, sobre
a qual a vontade geral não pode atentar – reduzida ou abstenção da ação
do Estado.
‘’LIBERDADE DOS ANTIGOS” “LIBERDADE DOS MODERNOS”
Segue o modelo de liberdade greco-
Liberdade de não-submissão senão às leis
romana
Democracia direta e participativa; no
entanto, há uma submissão à
O objetivo é a redação de poucas leis
autoridade do todo: O indivíduo é um
corpo social
Participação passiva na vida política, em
Deliberação dos rumos a seguir pela
que o indivíduo exerce a soberania
comunidade
através do voto
Participa apenas na eleição dos seus
Indivíduo não faz as leis
representantes
O Homem tem menos tempo e são
A liberdade não faz as leis
muitos a participar democraticamente

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Desenvolvimento do
A liberdade de uns usurpa a liberdade comércio/globalização que acaba por
de outros: recurso à escravatura despoletar a independência privada e o
INDIVIDUALISMO
A liberdade assenta numa garantia dos
É participada por poucos homens
direitos privados
O Homem deve garantir a vigência de
O individuo pode exercer o seu poder
direitos individuais, vigiando o poder
político e discursar
instituído
O cidadão antigo tinha mais tempo
para se dedicar à política, visto que a
sua disponibilidade era suportada por
um regime esclavagista
MAIOR PARTICIPAÇÃO POLÍTICA MENOR PARTICIPAÇÃO POLÍTICA
Esta diferença deve-se sobretudo à evolução das dimensões territoriais e à densidade
populacional:

 Grécia Antiga: caraterizada por uma pequena dimensão da comunidade política,


o que permitia e exigia a participação de todos os cidadãos, de forma direta na
determinação do rumo da comunidade.
 Idade Moderna: a população tem vindo a aumentar e por consequência a
comunidade política também. Torna-se impossível a reunião de todos os
cidadãos na política.
o Solução? Princípio Democrático de modelo representativo, em que os
cidadãos participam indiretamente.

Críticas a Rousseau e Hobbes:

 Caráter ilimitado do poder soberano


 A ordem não coincide com a soberania – antes de haver soberano já existiam
direitos naturais
 Impossibilidade da divisão de poderes
 Contratualismo não tem tradição histórica

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 Constant critica Rousseau, visto que o que permite a liberdade é a independência


individual. Já Rousseau incentiva os Homens ao bem-comum.

A Passagem da liberdade dos antigos para a dos modernos resulta de uma mudança
histórica:

 Nascimento do estado “moderno”


 Abolição da escravatura
 Desenvolvimento do comércio internacional

DECLÍNIO DO INTERESSE PELA POLÍTICA E PRESERVAÇÃO E GOSTO PELO INDIVÍDUO E


DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS

 É por isto que se diz que Constant é um apologista do sistema representativo (os
deputados eleitos não têm liberdade total de ação pois são fiscalizados pelo
povo), que é o mais adequado aos cidadãos modernos.
 Não há democracia direta no mundo moderno porque:
o A demografia não o permite
o Existem outros assuntos no mundo moderno, que não a política, tais
como: o comércio, o bem-estar privado e a indústria.
 Predominância do pensamento liberal, a nível económico e social.

14. ‘’ON LIBERTY’’: JOHN STUART MILL


 O objetivo deste ensaio é o de encontrar um princípio muito simples, que possa
governar as relações da sociedade com o indivíduo, nomeadamente no que diz
respeito à coação e controlo.
 O conflito existente neste ensaio é entre a Igualdade e a Liberdade. Todavia, a
harmonia das relações sociais só poderá ser alcançada impondo limites ao
soberano, entre os quais:
o Reconhecimento de imunidades à sociedade
o Existência de salvaguardas constitucionais
 Deve-se também evitar a tirania da maioria, situação em que a maioria subjuga
as opiniões minoritárias

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o A única razão legítima para interferir na esfera de liberdade dos outros é


a AUTOPROTEÇÃO: é o único fim em virtude do qual a humanidade está
autorizada a interferir com a liberdade de ação de um dos seus membros;
ou seja, a coação é apenas legítima para garantir a liberdade da
humanidade.
 Este princípio da autoproteção é uma exceção à regra geral da total não
ingerência na liberdade de ação dos Indivíduos.
 Uma sociedade livre deve cumprir os seguintes princípios:
o Possibilidade de moldar a vida de acordo com o nosso caráter
o Liberdade de formação de um grupo
o Limitação do poder do Estado
 Em primeiro lugar está sempre o indivíduo, e só depois vem o Estado, nem o
indivíduo nem a sociedade, podem interferir na vida privada individual
 Todas as opiniões devem ser válidas e publicamente acessíveis, pois: O CRITÉRIO
DA MAIORIA NÃO É ACEITE POR STUART MILL – E desta forma se justifica a defesa
da liberdade de imprensa e de opinião
o Enquanto houver uma opinião que postule que uma proposição, tida
como verdadeira, seja falsa, ela não pode ser considerada verdadeira,
pois não é possível ser-se juiz universal e decidir a veracidade das
proposições
 É por isto que também se justifica a importância de um espírito
crítico e de uma mente aberta, bem como a liberdade de
discussão: só isso torna uma proposição discutida verdadeira e
não um “Dogma Morto” (= ponto fundamental indiscutível)
 Ou seja, a verdade é descoberta precisamente na discussão entre indivíduos. O
que não significa que Mill seja um mero relativista, pois admite a existência de
UMA VERDADE.

Nota: O regime democrático deve respeitar o indivíduo, não interferindo na liberdade de


pensamento, de consciência, de expressão. Só assim se evitará que se transforme num
regime democrático tirânico (segundo a perspetiva individualista - Constant, Stuart Mill,
Tocqueville) – A liberdade é plena, desde que não prejudique os outros indivíduos.

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 Estes pensadores preferem a Liberdade Civil à Liberdade política


o Liberdade Civil: é preferível um soberano débil e fraco que garanta a
liberdade dos cidadãos, não interferindo nos direitos civis
o Liberdade Política: um soberano forte e poderoso mais preocupado com
os direitos políticos do que com a esfera dos direitos individuais de um
cidadão.

15. ALEXIS TOCQUEVILLE


 Tocqueville, tal como Rousseau, afirma que o homem não tem a perceção de si
próprio como indivíduo, ou seja, naturalmente o homem não é individualista
o O Homem vive na sociedade de grupos/classes, na qual os direitos e
liberdades são coletivos e não individuais = SOCIEDADE ARISTOCRÁTICA:
Assim sendo, os homens viviam felizes pois não desejavam alcançar
objetivos maiores, até porque não os conheciam.
 Assim sendo, Tocqueville propõe o seguinte esquema para o surgimento do
individualismo: Igualização

1 Origem do Individualismo
Centralização
 O individualismo é o resultado de um processo histórico, em que se dá uma
igualização das condições sociais
o O poder central foi retirado à Aristocracia
o Descaracterização e submissão da Aristocracia perante a mesma lei
o Concentração do Poder
 Por outro lado, o individualismo ficou a dever-se à centralização do poder:
o Destruição dos corpos presentes entre os indivíduos e o soberano
o Os indivíduos são todos iguais perante o soberano e a lei suprema
 Criação de uma sociedade individualista
Despotismo Democrático
Consequências do Individualismo
2 Paternalismo Burocrático
 Substituição da motivação política pela motivação económica
 Preferência pelo bem-estar material em prejuízo do interesse comum

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 Sociedade atomizada
 A separação absoluta entre a vida pública e privada comporta o risco de deixar
nas mãos da classe política e da organização estatal a determinação do rumo dos
interesses comunitários
o Despotismo Democrático: tiranias das maiorias contra as minorias
o Paternalismo Burocrático: exercido pelo Estado, em nome da ordem
pública, sobre a massa dos indivíduos que lhe confia a direção dos
assuntos públicos. Isso comporta um reforço adicional da classe política.

3 Propostas de Tocqueville:

Autonomia Municipal Arranca os indivíduos do isolamento, proporcionando a


descentralização do poder estadual. Os municípios tinham um
papel educativo, pois mobilizavam o indivíduo para questões
políticas.
Associativismo Civil Sozinho o indivíduo não tem força, mas organizado em
associações poderá impor-se. As associações conseguem
pressionar o poder político.
Liberdade de Imprensa É fundamental, pois qualquer individuo pode exerce-la, fazendo
circular a informação de forma mais rápida.
Proteção da Religião A religião é um elemento integrador do individuo, criando neste
um sentimento de pertença. Na religião os indivíduos estão
vinculados a uma série de valores e ideias que partilham e com
as quais se identificam. O excesso de individualismo é assim
contrariado.
Separação dos Poderes
Partidos Políticos Fornecem a representação dos cidadãos junto do poder político.
Os partidos submetem os indivíduos a um conjunto de regras e
valores comuns, criando um sentimento de pertença
Trava o despotismo
Potencia o exercício público da liberdade

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Repetitório de Perguntas

1. De acordo com Aristóteles, a que corresponde a liberdade?


2. De acordo com Hobbes, quais são as limitações ao poder soberano?
3. O que é que põe termo ao Estado de Natureza, segundo Locke?
4. Contraponha as leis naturais de Hobbes e de Locke.
5. O que entende por liberdade positiva?
6. O que entende por liberdade negativa?
7. O que é a vida boa, para Aristóteles?
8. Qual a condição necessária para que haja uma vida boa?
9. O que pensa Aristóteles acerca da escravatura?
10. Que tipo de regime político defende Aristóteles?
11. Diga o que entende por constituição mista no pensamento de
Aristóteles.
12. Para S. Tomás de Aquino, em que consiste a vida boa?
13. Qual é o regime político preferido por S. Tomás de Aquino?
14. O que pensa Jean Bodin acerca da constituição mista?
15. Como deve ser o poder soberano no entender de Jean Bodin?
16. Quais os poderes exclusivos do soberano em Jean Bodin?
17. Quais os dispositivos teóricos que Hobbes considera necessários
para a existência de um soberano?
18. Distinga a conceção de Hobbes e de Rousseau em relação à natureza
má ou boa do Homem.
19. No contexto do contrato social, para Rousseau, quem deve ser o
soberano?
20. De acordo com Tocqueville, diga uma das formas por ele
apresentadas para contrariar o individualismo da sociedade atual.

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