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27/07/2017 Michael Löwy, As aventuras de Karl Marx contra o Barão de Münchhausen

Confins
Revue franco-brésilienne de géographie / Revista franco-brasilera de geografia

9 | 2010 :
Número 9
Resenha / compte-rendu

Michael Löwy, As aventuras de


Karl Marx contra o Barão de
Münchhausen
8.ed. São Paulo: Cortez,220 páginas
Les aventures de Karl Marx contre le Baron de Münchhausen

ANA PAULA CAMILO PEREIRA E AIRTON AREDES


Referência(s):
Michael Löwy, As aventuras de Karl Marx contra o Barão de Münchhausen. Marxismo e positivismo na
sociologia do conhecimento, 8.ed. São Paulo: Cortez,220 p.

Texto integral

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27/07/2017 Michael Löwy, As aventuras de Karl Marx contra o Barão de Münchhausen

1 Michael Löwy, ensaísta brasileiro de projeção internacional, nasceu na cidade de São


Paulo em 1938, filho de imigrantes judeus de Viena. Sociólogo pela Universidade de São
Paulo (USP) desde 1960 doutorou-se na Sorbonne, sob a orientação de Lucien
Goldmann em 1964. Vive em Paris desde 1969, onde trabalha como diretor de
pesquisas no Centre National de la Recherche Scientifique (CNRS). Veterano e lutador
político militante de esquerda, é autor de livros e artigos traduzidos em 25 línguas,
dentre os quais destacam-se: Walter Benjamin, aviso de incêndio (São Paulo, Boitempo,
2005); Ecologia e socialismo (São Paulo, Cortez, 2005) e A teoria da revolução no
jovem Marx (Petrópolis, Vozes, 2002).
2 A questão principal a que se propõe Michael Löwy no livro “As aventuras de Karl
Marx contra o Barão de Münchhausen” é, mediante, as correntes do pensamento
(positivismo, historicismo e marxismo) examinar os dilemas, as contradições, os limites
e as contribuições dessas correntes para a construção de um modelo de objetividade
próprio das ciências humanas e para uma sociologia crítica do conhecimento. Sua
perspectiva é o estudo das relações entre as classes, categorias sociais (utopia e
ideologia) e conhecimento científico. A polissemia dos termos revela uma ambivalência
de significados, que tratavam em diferentes correntes do pensamento, ideologia como
oposição ou analogia a utopia.
3 Löwy trata, no primeiro capítulo, das concepções positivistas nas ciências sociais.
Destaca que esta corrente ignora o condicionamento histórico-social do conhecimento,
o que é para o autor a principal problemática do positivismo, uma vez que para
compreender a significação específica e suas implicações é preciso examinar a sua
gênese histórica, seu desenvolvimento e o conjunto da visão social de mundo.
4 Desse modo, Löwy apresenta a utopia positivista a partir de seus principais
precursores: Condorcet, Saint-Simon, Augusto Comte, Émile Durkheim, Max Weber e
Karl Popper.
5 Na compreensão de Löwy, o iluminista Condorcet pensa a economia política através
da matemática, da física quântica, relacionando-a aos métodos das ciências naturais. A
sociedade, de seu ponto de vista, é regida pelas leis da natureza, pela probabilidade
estatística dos fatos. Os fatos sociais passam por uma insignificância matemática/física,
da qual o objetivo específico é considerá-la neutra do ponto de vista cognitivo.
6 Em Saint-Simon, socialista utópico, ainda que a ciência social seja percebida ora pela
física, ora pela fisiologia, que regia a sociedade pelas leis dos corpos, a ciência da

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sociedade é vista como uma tentativa de “salvaguarda”, de luta contra o regime


Absolutista.
7 Löwy, no exame da ideologia positivista, atém-se no filósofo Augusto Comte para
explicar a subserviência do princípio metodológico dessa corrente do conhecimento em
relação à ciência da natureza. Para Comte a física social e a ciência têm por objetivo o
estudo dos fenômenos sociais considerados dentro do mesmo espírito que os
fenômenos astronômicos, físicos, químicos e fisiológicos sujeitos a leis naturais
invariáveis. A base do axioma da perspectiva de Comte está na designação do da ciência
da sociedade ao sistema das ciências naturais.
8 Na mesma acepção de Comte, o sociólogo Durkheim, ao apresentar sua démarche
positivista nas ciências sociais, alude à concepção da análise da economia política,
referenciando-a a partir das leis físicas, denominando o conceito central da ciência
social positivista: a lei social natural. O autor conclui que o método positivista de
Durkheim apóia-se na pressuposição da existência de uma homogeneidade
epistemológica de diferentes domínios, sejam elas nas ciências sociais, sejam nas
ciências naturais.
9 Löwy, analogamente incide sobre a visão positivista clássica de Comte e Durkheim
considerando-a partir do esforço de libertar-se de análises éticas, sociais, políticas de
seu próprio pensamento. Contudo, o autor ao referenciar as idéias positivistas do século
XIX com as façanhas do Barão de Münchhausen atesta que essa “libertação dos
preconceitos” é a mais pura ilusão ou mistificação, uma vez que os positivistas clássicos,
como Comte e Durkheim, consideram os preconceitos como verdades absolutas,
incontestáveis e indiscutíveis, deixando com isso evidente seus preconceitos e
prenoções estabelecidas.
10 É em Weber que a essencialidade do fator histórico torna-se basilar no objeto de
estudo e na démarche, daí certa aproximação, ainda que contestável, com as análises de
Marx. As condições sócio-históricas em que Weber vivia, diferentemente de Comte e
Durkheim, o fazia compreender as ciências sociais mediante outra visão de mundo e,
consequentemente fazia com que seu método tivesse outros pontos de análise, que não
aquele de neutralidade social, expressa nos positivistas clássicos.
11 Nas análises sobre a sociologia do conhecimento, Löwy induz acreditar que as
formulações de Weber não estavam totalmente equivocadas, já que na concepção
weberiana há uma ligação entre valores e fatos que são, via de regra, elementos
sociológicos. Todavia, na concepção de Löwy, não há uma ruptura entre Weber e o
positivismo. Löwy destaca que Weber, ao analisar as condições de possibilidade de
objetividade do conhecimento científico-social, aproxima-se do positivismo
confirmando uma contradição irresolvível na teoria social do conhecimento.
12 Numa concepção oposta à vertente positivista clássica, Popper concebe na ciência
social a necessidade do julgamento de valor, do ponto de vista preliminar, como forma
de reconhecer a teoria já preconcebida. Ainda que avesso ao positivismo clássico de
Comte e Durkheim, ao analisar a objetividade entre as ciências naturais e as ciências
sociais, Popper recusa distingui-las e acredita que a objetividade científica ao nível
individual é impossível. Considera ainda que a objetividade não advém do próprio
cientista individual, mas do conjunto de cientistas que têm, sob sua concepção,
liberdade de crítica e articulação da linguagem. Esses dois aspectos constituem o
caráter público e/ou social do método científico. Com isso, observa-se em Popper uma
nova objetividade científica: a institucional, em que quando divulgada
institucionalmente revela-se não a fonte, mas o resultado objetivo do conhecimento,
que é desvinculado das parcialidades ou “futilidades” individuais ou de classes.
13 No entanto, ainda que a acepção de Popper conduza a superação do velho
positivismo, não transpõem o problema. Seria, de fato, utópico acreditar que a
institucionalização das pesquisas científico-social eliminaria as posições sociais ou
ideológicas.
14 O equívoco de Popper, ainda que diferente da concepção positivista clássica recaia
sobre a mesma problemática, ou seja, a ausência de objetividade entre as ciências
naturais e sociais. Contudo, Löwy reconhece a contribuição de Popper no que diz
respeito ao método público das ciências sociais. Popper atesta que a liberdade de crítica
das ciências da sociedade é inevitável e reconhecidamente necessária ao seu progresso.
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15 Imerso no conflito existente entre o positivismo e o marxismo, no segundo capítulo


Löwy destaca predominância e influência do historicismo, tanto o conservador como o
relativista, como uma vertente importante na sociologia do conhecimento e na
construção de uma teoria social.
16 De acordo com Löwy, o historicismo é uma corrente conservadora, francamente
reacionária, no entanto sua contribuição foi um passo importante para a compreensão
da historicidade dos fatos sociais e para o desenvolvimento da ciência histórica
moderna.
17 Num compêndio entre a oposição racionalista e a-histórica, regada pela percepção
romântica e nostálgica, o historicismo conservador, revolucionariamente, rompe com a
visão de mundo do passado, mediante uma dimensão utópica e ideológica de defesa da
ordem monárquica, hostil à sociedade burguesa, à nobreza, aos junkers, a burocracia,
ao clero (católico e protestante), a pequena burguesia rural e urbana e a intelligentsia
tradicional.
18 Na concepção do historicismo conservador o conservadorismo não era considerado
um julgamento de valor, significava, mais precisamente, uma expressão direta do
movimento histórico, ou seja, do desenvolvimento dos fatos no decorrer do tempo.
19 A partir dessa demonstração evidente das limitações do historicismo conservador,
Löwy indaga-se sobre o relativismo do ponto de vista do historiador, que corresponde,
segundo o autor, a necessidade de transmutação do historicismo conservador para o
historicismo relativista.
20 Nos dizeres de Löwy, o fracasso metodológico do historicismo conservador e do
historicismo relativista é a prova simultânea da potência crítica dessa corrente e de sua
incapacidade de responder os problemas que ela mesma suscita.
21 A procura de um fundamento social para a solução do ecletismo fez com que o
historicismo se desenvolvesse a partir das contribuições de Mannheim que apresenta
uma nova sociologia histórica do conhecimento que se aproxima, por vezes, de uma
tendência marxista. Mannheim confere à sua tese uma versão particularmente radical
do historicismo relativista combinado com temas marxistas. Sua idéia principal é a
dependência situacional de todo conhecimento histórico. A dimensão sociológica e a
influência marxista fazem da teoria de Mannheim um compêndio de análises que
versam sobre categorias do conhecimento relacionadas com o sistema econômico e
político de certas classes sociais. Com isso, concebe que a formação e evolução do
conjunto dos grupos sociais estão fundamentadas nas relações de produção e
dominação, o que caracteriza sua aproximação com a teoria marxista.
22 A problemática de Mannheim com o materialismo histórico e sua confirmação a
partir de Marx o induz a definir o conceito de “ideologia total” de uma classe social, seu
pensamento social condicionado, seu processo cognitivo, suas problemáticas etc. Nessa
óptica, Löwy salienta que Mannheim sistematizou uma sociologia do conhecimento
mediante as ciências humanas a partir de uma perspectiva socialmente condicionada.
Desse modo, alega que o conjunto da problemática apresentado por Mannheim,
constitui um enriquecimento para a sociologia marxista do conhecimento em razão,
sobretudo, do seu caráter historicista.
23 Ainda na análise cognitiva de Mannheim, sua defesa incidia sobre o dilema estrutural
que desafiou Lukács, qual seja: que classe social cujo ponto de vista permite o máximo
de conhecimento possível em época determinada? Essa questão era compreendida por
Mannheim que atribuía à intelligentsia um privilégio epistemológico que lhe deixava
“livremente flutuante” da adesão a qualquer classe, desta forma, Mannheim
sistematicamente aglutinava suas idéias considerando que a intelligentsia era o sujeito
social do optimum de conhecimento, já que seu desvinculamento e/ou a autonomia
com relação às classes sociais o creditava a uma situação de liberdade.
24 A perspectiva analítica de Mannheim partia de uma visão unilateral para reconhecer
e compreender o conjunto, consequentemente, considerava que o valor cognitivo era
equivalente, o que Löwy combate, precipuamente, destacando que estruturalmente, a
defesa de Mannheim, é incapaz de oferecer uma perspectiva mais ampla. Löwy conclui
que as novas constatações de Mannheim reforçam o princípio da carruagem, ou seja, a
interpretação de que o conhecimento social é uma carruagem sobre a qual se pode
montar à vontade e a qualquer tempo, também, confirma o princípio do Barão de
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Müchhausen, isto é, o pesquisador se livra puxando os próprios cabelos e saindo do


contexto (auto-análise crítica). Nesse ínterim, Löwy destaca que Mannheim nada mais
fez do que retornar as velhas receitas do positivismo tradicional.
25 No terceiro capítulo conceito de ideologia ganha força nas análises e escritos de Karl
Marx. O condicionamento histórico e social é apresentado pela crítica ao discurso
neutro e objetivo que se propunha até então. Para Marx, ideologia designava um
conjunto de elementos composto pela formas especulativas, idealistas e metafísicas da
consciência social. Nessa concepção, Löwy destaca as idéias de Marx, contextualizando
a relação existente entre os representantes do partido democrático e a pequena
burguesia.
26 A importância da análise sócio-histórica nos escritos de Marx é preconizada como
forma de se compreender a evolução da ciência social, do ponto de vista científico.
Segundo Marx, as lutas de classes não podem ser compreendidas senão em relação com
a história social e econômica, tudo se passa no movimento histórico do concreto.
27 Löwy encontra em Sismondi uma contribuição ímpar para as ciências sociais. Havia
em sua teoria uma implicação de contradição, transitoriedade entre as classes que
resultava a riqueza versus a miséria, e que Sismondi, representante de uma pequena
burguesia tradicionalista e anticapitalista, em certas questões, aproximou mais de um
conhecimento objetivo que Ricardo, representante da burguesia industrial progressista
e revolucionária.
28 Economistas e representantes da burguesia, de um lado, socialistas e comunistas
representantes da classe proletária, de outro. É nessa condição, que a partir de 1830
abre-se um novo período para a ciência, que passa a ser produzida pelo movimento
histórico associado com a plena consciência de causa, tornando-se revolucionária. A
ideologia positivista invade o século XX e a doutrina do movimento operário socialista
da Segunda Internacional. Dentre os pensadores dessa época, destaca-se Bernstein que
reconhecia uma oposição irredutível entre a dialética marxista e a epistemologia
positivista da ciência. Situado entre as correntes de Kant e Comte, Bernstein recusava a
unidade dialética entre ciência e socialismo.
29 Numa concepção positivista Karl Kautsky, representante da doutrina do marxismo
ortodoxo, oposto ao revisionismo positivista e à esquerda revolucionária, tendia a
assimilar natureza e sociedade. Concatenado na fórmula social-darwinista, Kautsky
concebia o marxismo como uma ciência positiva, livre de julgamentos de valor,
apresentando o marxismo como uma ciência axiologicamente neutra.
30 A influência do positivismo sob o materialismo histórico é mais notadamente
específico em Max Adler que insistia na tese de que o marxismo era a própria
sociologia. Afirmava que o marxismo não era uma visão de mundo, era não-político,
identificava seu materialismo como o positivismo realista.
31 O método não-positivista que explicitamente identifica a ligação epistemológica com
a classe do proletariado e com a ciência marxista é verificada em Lênin, o qual defende
que em uma sociedade fundada na luta de classes, não poderia haver uma ciência
imparcial. O ponto de vista de classes é marcadamente essencial na concepção leninista.
É em Lênin que se restabelece a unidade dialética entre ciência e revolução.
32 Analogamente, Rosa Luxemburgo se coloca contrariamente a posição positivista,
defende que uma sociedade verdadeira é composta de classes com interesses
particulares e concepções diferentes. Percebe, ainda, a relação do marxismo mediante a
superação dialética, alegando que esse posicionamento é condizente com o ponto de
vista proletariado de Marx, considerando-a como uma classe revolucionária. Rosa
Luxemburgo afirma o caráter classista e os limites históricos do materialismo histórico,
confirmando sua superioridade em relação a outros marxistas-positivistas. Alega que a
teoria marxista corresponde à passagem da etapa capitalista à etapa socialista da
humanidade.
33 Löwy identifica o marxismo historicista como uma corrente metodológica que se
distingue pela importância central atribuída à historicidade dialética dos fatos sociais.
O primeiro representante é Georg Luckás para quem o conhecimento social estava
ligado aos limites do conhecimento da situação objetiva de classe. Luckás busca inovar
com sua démarche esboçando uma sociologia historicista diferencial atrelada à

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identificação da luta do proletariado como uma classe que reconhece em si mesma a


consciência de sujeito e o objeto do conhecimento.
34 Em Korsch, Löwy analisa uma relação próxima à Luckás. Korsch encontra no
marxismo uma ciência do movimento revolucionário do proletariado, sem interesses de
classes de manter os preconceitos burgueses. Löwy identifica por sua vez, um caráter
reducionista em Korsch quando considera a teoria marxista apenas como uma simples
expressão teórica da luta prática da classe operária pela sua libertação.
35 Em Gramsci, Löwy conduz uma leitura imbricada numa concepção diametral, da qual
explica que Gramsci por vez propunha a compreensão da ciência do conhecimento por
uma dimensão ideológica e uma dimensão cognitiva. Sua defesa parte da construção
científica e teórica de compreender e julgar de forma realista a posição e as razões de
seus adversários, distante das pressões ideológicas do ponto de vista de cada classe.
36 Na concepção de Löwy, o pensamento de Luckács foi resumido e obteve uma nova
contribuição em Goldmann. Para este, a sociologia do conhecimento possui uma
estrutura de categorias da consciência do pesquisador que define os fatos sociais de
acordo com suas aspirações e interesses, que são diferentes em cada grupo. Critica
radicalmente às mistificações do positivismo e a assimilação obstinada das ciências
humanas às ciências naturais.
37 Em síntese, Löwy conclui que a corrente historicista do marxismo foi a que
apresentou idéias mais profundas sobre a resolução dialética, sobre o problema da
objetividade científico-social, que fugiram às armadilhas do “princípio da carruagem”
como fundamento relativista.
38 Sobre o marxismo racionalista, que se baseia na relação entre a Teoria Crítica e o
ponto de vista de classes, Löwy destaca as concepções de Horkheimer, Marcuse e
Adorno. A Teoria Crítica incumbe-se da negação à ordem estabelecida e ao
antipositivismo, manifestando a unidade da dialética negativa. Opõe-se a neutralidade
da ciência e defende um engajamento partidário como forma de escapar ao relativismo.
Löwy destaca que tanto Horkheimer como Marcuse renegam o relativismo de
Mannheim, sendo que Horkheimer critica ferozmente, a démarche de Luckás, ainda
que em alguns escritos, inconscientemente se aproxime de Luckás. Em Marcuse, essa
relação de proximidade é indireta, sendo, contudo, mais acentuada.
39 Também representante da Escola de Frankfurt, Adorno aproxima-se da concepção de
Popper, aderindo ao relativismo cético e o subjetivismo popperiano. Sua crítica
fundamentava-se, assim como Horkheimer e Marcuse, nos escritos de Mannheim sobre
o condicionamento social a partir da consciência verdadeira.
40 Para Löwy a perspectiva da Teoria Crítica está enraizada na luta de classe do
proletariado pelo socialismo. Contudo, a busca de racionalidade contínua dos teóricos
críticos era abstrata, a-histórica socialmente, o que para o marxismo tem uma
referência potencialmente diferenciadora. Em sua concepção a racionalidade não pode
ser dissociada da luta de classe, pois historicamente a racionalidade encontra em cada
período uma figura concreta deduzida diretamente dos interesses da situação histórica
objetiva do proletariado. Löwy, sinteticamente considera que o problema da Teoria
Crítica reside no fato da mesma negar a história como fato real, caracterizando-a como
socialmente desenraizada e abstrata.
41 O fenômeno estalinista teve grande influência nos estudos sobre ideologia/ciência.
De acordo com Löwy, trata-se de uma formação na URSS de uma camada burocrática,
proveniente do proletariado, não constituindo uma classe social. É nessa questão
particular, que Löwy destaca que por tal fato, esta camada, não poderia criar uma visão
social do mundo, pois seu objetivo era mascarar o marxismo e transformá-lo em um
poder ideológico conservador. Representava, portanto, um “marxismo vulgar”, apegado
ao pensamento burguês e subordinado a seus interesses políticos e sociais. Buscava a
ideologização das próprias ciências naturais, mediante o privilégio de uma biologia
vulnerável às ideologias. Löwy argumenta que a inovação teórica do estalinismo baseia-
se num positivismo ao inverso, pois queria neutralizar as ciências sociais e políticas e
politizar as ciências da natureza.
42 Na conclusão, Löwy destaca que todo questionamento à ordem estabelecida sempre
foi tomado como uma ameaça subversiva. A formação de um modelo científico de
objetividade encontrou no curso da história o confronto entre a condição pré-
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estabelecida e a condição de sucessão pretensa sobre a sociologia do conhecimento. A


busca de uma démarche que constituísse um conhecimento real sobre as ciências da
natureza e as ciências da sociedade, fez com que grandes correntes epistemológicas
conflitassem sobre suas visões de mundo.
43 Para Löwy não há uma distinção entre as ciências humanas e as ciências naturais, há
um espaço cognitivo de intermediação, ou seja, uma zona de transição que as relaciona.
44 Ao tratar da “cegueira” e da “claridade” que conduzem as lutas sociais de classes em
busca da verdade, Löwy destaca que o marxismo compreende que a classe proletária
possui o máximo de consciência possível. Sendo uma classe universal, seus interesses
coincidem com os da maioria da humanidade. É uma classe revolucionária, cuja visão
de mundo tem a possibilidade objetiva de ser transparente. É a partir de sua
consciência de classe que o proletariado pode tomar o poder e transformar a sociedade
em socialista por meio do conhecimento objetivo da realidade, da estrutura econômica
e social, da relação de forças e da conjuntura política.
45 A partir dessa compreensão, Löwy concluindo suas análises enfatizando que a ciência
da visão de mundo do proletariado é uma forma de transição para a ciência da
sociedade sem classes, podendo, portanto, atingir o máximo de objetividade, pois a
sociedade deixaria de ter visões antagônicas. Em outras palavras, a visão de mundo
proletária representa o horizonte comum a um conjunto de forças políticas e
intelectuais, sociais e culturais que reivindicam sua utopia revolucionária. Nessa
perspectiva, Löwy considera que as diferentes visões de mundo, de busca de uma
sociologia do conhecimento serviram como um preâmbulo para as determinações e
visões de mundo subsequentes. O ponto de partida constitui-se mediante as leituras e
análises dos escritos anteriores, ou seja, esta é a compreensão crítica da própria
história.
46 As análises de Löwy ainda consideram que a visão proletária pode e deve ser capaz de
incorporar as verdades parciais produzidas pelas ciências de nível inferior ou limitadas,
sem que isso, necessariamente, leve ao ecletismo. Suas conclusões atestam que o
proletariado, na medida em que busca a possibilidade objetiva ao acesso da verdade, é a
classe revolucionariamente mais crítica, mas isso não o induz a uma garantia suficiente
do conhecimento da verdade social.
47 Em síntese, a obra de Michael Löwy é de grande importância para a construção de
uma ciência sociológica. Seus escritos permitem compreender a “nuance” das correntes
mediante o movimento histórico, impetrando a compreensão versada pelo próprio
autor, mediante o “princípio da carruagem”, o que incentiva reflexões a respeito do
método.

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Para citar este artigo


Referência eletrónica
Ana Paula Camilo Pereira e Airton Aredes, « Michael Löwy, As aventuras de Karl Marx contra o
Barão de Münchhausen », Confins [Online], 9 | 2010, posto online no dia 21 Julho 2010,
consultado o 27 Julho 2017. URL : http://confins.revues.org/6544

Autores
Ana Paula Camilo Pereira
Mestre em Geografia pela Universidade Estadual Paulista UNESP/FCT, campus de Presidente
Prudente SP

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apaulacape@hotmail.com

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Publicado em Confins, 19 | 2013
Airton Aredes
Professor da Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul. Doutorando em Geografia pela
Universidade Estadual Paulista UNESP/FCT, campus de Presidente Prudente SP

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