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A Obra de Calvino em Genebra

Rev.Prof. Jouberto Heringer da Silva,


Bacharel em Teologia e Letras, Licenciado em Filosofia;
Professor no Seminário Teológico Presbiteriano do Rio de Janeiro e do
Centro de Estudos Superiores Alexandre L Blackford

“...A verdadeira criação de Calvino é Genebra inteira. A academia é apenas uma parte,
ligada ao todo fortemente, profundamente. Genebra docente não era diferente da Genebra
religiosa. Genebra religiosa não se distinguia da Genebra Moral e política. Calvino era tudo.
Ia ser nela conservada não só internamente, pela sua forte unidade, mas exteriormente,
mas exteriormente pela persistência dos povos que buscavam nela aquele cuja fisionomia
ficava guardada na memória e cujo pensamento se confundia, no espírito, com o de
Genebra. O mundo protestante como o católico iam impor-lhe igualmente, um pelo amor,
outro pelo ódio, a obrigação de conservar-se ela como a cidade de Calvino, a
impossibilidade de ser outra coisa, se nada mais quisesse ser...” Bungener

A Cidade de Genebra
As primeiras referências a Genebra nós as encontramos nos comentários de Julio César, colocada
entre os Alobrogos, tendo sido posteriormente incorporada ao império romano. No Séc.V era uma das cidades
dos Brugúndios, depois passou aos Godos, depois ao domínio dos franceses e posteriormente incorporada aos
domínios de Carlos Magno. Quando a soberania carlovíngio caiu ela foi incorporada ao santo império romano
e constituída em cidade episcopal sob o domínio do princípe do império Conrado II. A partir de 1215 o bispo
governante passou a ser eleito pelo capítulo, e depois de 1418 a ser nomeado pelo próprio Papa. Mas, mesmo
antes o povo participava do governo, compartilhando-o com o bispo. Ardentius, contemporâneo de
S.Bernardo obteve de Frederico Barbarroxa a confirmação deste poder entre o bispo e o povo. Também os
condes de Saboya ambicionavam o domínio, e por isso Ardentius é considerado como o verdadeiro fundador
da independência da cidade.
Em 1385 o bispo Ademar Fabri codificou o Franquias ou a Carta Magna de Genebra, onde se
estabeleciam os direitos da cidade. Assim, o bispo gozava do título de Príncipe de Genebra, cunhava a moeda
e fixava os impostos; mas tinha de jurar observância aos direitos e privilégios estabelecidos para o povo
conforme o código da cidade.
Os cidadãos da cidade e os burgenses reuniam-se duas vezes por ano em assembléia ou Conselho
Geral, no claustro da catedral em Janeiro para eleger os 4 síndicos da cidade, e em novembro para a eleição
do tenente de justiça e de seus acessores. Este conselho podia reunir-se extraordinariamente. Aos síndicos
cabia a justiça criminal e, em suas mãos, os bispos prestavam juramento de fidelidade a constituição da
cidade. Havia ainda o pequeno conselho composto de 5 membros, designados pelo Conselho Geral, e
constituído de 4 síndicos do ano, dos 4 precedentes, do tesoureiro e de mais dezesseis cidadãos. Em alguns
casos o número de cidadãos subia a 35 por se incorporar representantes de distritos diferentes, e com isso
passava a ser o Conselho dos 60.

A Chegada do Protestantismo à Genebra


Diferentemente do que muitos pensam, a reforma protestante não chegou à Genebra pelas mãos de
Calvino, mas pelas de Guilherme Farrel (189-1565). Farrel era frances, de família nobre e destinado as armas,
mas optou pelas letras. Quando ouviu a pregação de Le Févre converteu-se ao protestantismo e passou a
dedicar-se a pregação, tornando-se um dos reformadores mais intrépidos e populares. Pregou em Meaux, Gap,
sua terra. Perseguido fugiu para Basiléia, Zurique, Constança, Montbéliard, Estrasburgo, Berna, Aigle, Morat,
Jura Bernes, Neuchatel, Valengin, Orbe, onde agrega-se a ele o jovem Predro Viret. Em Outubro de 1532
chegou a Genebra que havia se tornado independente em 1530 mas permanecera fiel a Roma, aproveitando-se
da comoção causada pela vendas das indulgencias na cidade, ele inicia sua pregação tendo ao seu lado o
jovem Antonio Saunier. Perseguido pelos padres que queriam afogá-lo no lago saiu as pressas de Genebra sob
tiros de arcabuz. No mês seguinte o reformador Froment chegou a Genebra e abriu uma escola para meninos e
adultos prometendo ensinar a ler em um mês, aplicando remédio aos enfermos, e tudo de graça. Na escola
ensinava a ler com textos bíblicos com os quais a Igreja estava em contradição e ensinava o preparo dos
remédios para as dores físicas e ministrava os adequados para as dores espirituais. A multidão que juntava era
tamanha que os padres passaram a persegui-lo e a incitar o povo contra ele, de forma que teve de refugiar-se,
indo para o país de Vaux, mas deixando um pequeno rebanho evangélico. Em Março de 1533 Farrel voltou a
Genebra, desta feita com a proteção do governo de Berna, com o qual a cidade de Genebra possuia um acordo
de proteção militar. Com a petição do governo de Berna nas mãos, recebeu a autorização e começou a pregar
o evangelho, e logo depois juntou-se a ele Froment e Viret na pregação do evangelho. A eloquencia de Farrel
ganhava dia-a-dia o povo para a causa do evangelho. Houveram reações católicas como a pregação do
dominicano Guy Furbity no advento de 1533 contra Lutero e suas idéias, recebendo uma resposta de Froment
que a seguir foi banido pelo Conselho, mas que retorna logo depois que o Cantão de Berna pediu a prisão de
Furbity por considerar uma agressão pessoal aos seus protegidos. Seguiu-se uma intensa disputa teológica por
dias. Em 1º de Março de 1534 Farrel pregou no convento de Rive e muitos padres e freiras aceitaram o
evangelho genuino, abandonando a Igreja, alguns que viviam em concumbinato casaram-se.
No verão de 1534 o bispo de Genebra que residia em Annecy na França, unido ao duque de Saboya
tomou de armas contra a cidade para impedir o avanço do protestantismo, a luta foi tremenda, Genebra foi
defendida pelo cantão de Berna, isso ao invés de enfraquecer o movimento reformador o incrementou mais
ainda, o protestantismo galgava passos largos, de modo que no fim do ano 1/3 da cidade já estava convertida.
O conselho ainda reconhecia a autoridade episcopal. Neste mesmo ano Farrel, Froment e Viret foram
envenenados pela cozinheira, somente Viret provou da comida e quase morreu. Quando levada aos
magistrados confessou ter sido paga por dois padres para matar os pregadores, tendo sido executada a seguir.
De 30 de maio a 24 de junho de 1535 aconteceu um debate proposto pelo Conselho no convento de
franciscano de Rive que mudaria definitivamente a sorte da cidade. De um lado o católico dominicano
Chapuis e Carele, doutor da Sorbone; do outro Farrel e Viret. Os primeiros enviados pelo cantao católico
romano de Friburgo e os outros pelo cantão protestante de Berna. Por fim os campeões de Roma se
declararam vencidos e aderiram a Reforma. Em 8 de Agosto de 1535 Farrel pregou vitorioso do púlpito da
catedral de São Pedro em Genebra. Em 10 de Agosto o conselho dos duzentos aboliu a missa pressionado pela
opinião popular. Em 27 de Agosto foi decretado que o culto reformado deveria substituir o culto católico e
que Farrel e seus amigos poderiam livremente pregar o evangelho. Assim Farrel, Viret, Froment e Saunier,
todos franceses, estabeleciam a Genebra Protestante. Em 21 de maio de 1536 na catedral de S.Pedro o
conselho geral reunido recebeu a moção do conselho pequeno e já ratificada pelo conselho dos 200 de que
aceitavam a religião reformada e a supressão dos cultos de Roma. De mãos erguidas os cidadãos tomaram o
compromisso de viverem o Evangelho como norma de suas vidas. A segunda resolução determinava o ensino
obrigatório e sem dispêndio para o povo, instituindo-se a Igreja e a Escola. O convento dos franciscanos foi
transformado em escola e o pastor Saunier foi posto a frente do corpo de professores. O Convento de Santa
Clara foi transformado em hospital, as rendas eclesiásticas foram destinadas à educação e a beneficência. Pela
primeira vez o dinheiro recolhido do povo voltava em benefício para o próprio povo.

Como Era Genebra


Antes de Farrel e de Calvino haviam severas regras de moral como em outros estados da
confederação Suíça, penas severas para os blasfemadores, para os que tomavam o nome de Deus em vão,
contra danças desonestas, canções licenciosas,
A época da chegada de Calvino Genebra não era ainda uma cidade de renome, sua população girava
em torno de 12 a 15 mil pessoas, era socialmente próspera, mas de baixo nível moral, era administrativamente
desorganizada, religiosamente infantil.

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