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Considerações iniciais
Neste trabalho, temos por objetivo analisar os procedimentos discursivos
empregados para a introdução e a retomada de tópicos em entrevistas televisivas. No
intento de esclarecer fatos ou trazer informações reveladoras, vários procedimentos são
utilizados pelos entrevistadores para que o entrevistado desenvolva colaborativamente
os tópicos propostos, os quais, por serem muitas vezes considerados polêmicos, podem
colocar em risco a imagem pública de quem fala. Para o corpus, foi selecionada uma
entrevista televisiva com Eike Batista para o programa “Roda Viva”, da TV Cultura,
exibida em 30/08/2010.
O trabalho está dividido em duas partes. Na primeira, examinamos as
características do gênero “entrevista”, o conceito de tópico como unidade discursiva e a
importância das perguntas na orientação do quadro tópico. Na segunda, analisamos o
corpus, verificando os procedimentos utilizados pelos entrevistadores, os quais,
estrategicamente, contribuíram para o desenvolvimento do tópico.
O embasamento teórico está norteado nos princípios da Análise da
Conversação e em estudos pautados na interação face a face.
L1 bom... como é que se faz para se pular em um ano?...pra/pra nos pobres mortais isso
é:::
L2 [éh
L1 quase magia néh?
L2 na verdade éh que o que aconteceu no ano pas/dois mil e oito foi a crise mundial que na
verdade destruiu quase setenta e cinco por cento do valor de muitas empresas que se
negociavam em bolsa
[
L1 ah
L2 e as minhas cinco empresas que/onde estava o novo mercado..que é um mercado com o
maior nível de governância e transparência se perderam junto com mercado mundial,
néhempresas... enfim.. ah PETROBRAS...VALE... todas elas...elas perderam a metadE do
valor delas... empresas como a nossa que estavam ainda em estágio de constução dos
projetos néh...elas caíram mais ainda...o que se criou um mundo::: eu acho que....todos
sabemos aqui que
Por meio de uma pergunta de pedido de confirmação, L1, por meio de uma
pergunta (“se tá falando de/da...da GRAndeCRIse?”) retoma o subtópico introduzido
por L2. No excerto, há um momento em que L1 assalta o turno de fala (= vez de falar)
de L2. Para isso, ele emprega o marcador conversacional (MC) “éh”. Esse MC está
servindo para indicar uma hesitação por parte do falante. Em seguida, L1 usa o MC de
valor coesivo “então” seguido dos marcadores “mas então”, com valor conclusivo, para
retomar o subtópico desenvolvido por L2: (não fosse a crise, já teria alcançado o oitavo
lugar) “éh...então...mas então você tá dizendo que se não fosse aquilo você JÁ
SERIA...um cara/ um talvez o oitavo ou:::: o::: u:::: oitavo?”. Note-se que esses
marcadores são empregados para a retomada do turno e do tópico. Ademais, a repetição
de “então” deixa marcado no texto seu processo de planejamento, o qual, em textos
falados, é local, ou seja, ocorre quase simultaneamente à execução da fala.
L1 do mundo?
L2 tava num crescendo de projetos
[
L1 hum
L2 que eu venho empreendendo no Brasil desde do/dos mil... praticamente onde eu decidi
vender meus ativos no exterior me concentrar o Brasil
Considerações Finais
Como vimos, o entrevistador tem um papel fundamental no direcionamento do
quadro tópico estabelecendo condições que viabilizem o bom relacionamento entre os
interlocutores e, assim, promovam a condução do evento comunicativo de forma
produtiva e de acordo com os propósitos que se desejam alcançar. Por meio das
perguntas, o entrevistador introduz ou retoma alguns tópicos estrategicamente, a fim de
que o entrevistado se comporte colaborativamente.
Percebemos que existem perguntas que podem ser utilizadas para simplesmente
estabelecer contato e manter a progressão tópica e outras que são mais invasivas e
expõem a imagem dos interlocutores. Dessa maneira, os procedimentos discursivos
utilizados pelo entrevistador, como as perguntas, servem para indicar a orientação
argumentativa do texto. Além do mais, dependendo da intencionalidade, ora serem para
preservar a face (imagem) dos interlocutores, ora para arranhá-la, colocando-os em
situação vulnerável diante do público.
Tendo em vista que se trata de um programa de entrevista televisivo, ocorre um
jogo interacional tripartido em que os interesses nem sempre se alinham e cada um dos
jogadores têm seus próprios propósitos e intenções. Como o sucesso da audiência é
medido pela engenhosidade do entrevistador nas estratégias utilizadas para a obtenção
de respostas que preencham as expectativas, cabe a ele mediar a interlocução de modo a
preservar a sua própria imagem e a de seus interlocutores (entrevistado e audiência),
promovendo, assim, a sustentação do evento conversacional.
Referências
FÁVERO, L. L. A entrevista na fala e na escrita. Em: PRETI, D. (Org.). Fala e escrita
em questão. São Paulo: Humanitas / FFLCH / USP, 2000, p. 79-97 (Projetos Paralelos
– NURC/SP, 4).
YOUTUBE. Eike Batista – Entrevista Roda Viva. 30 ago. 2010. Disponível em:
<www.youtube.com/watch?v=MoWNAGxee0K>. Acesso em out. 2012.