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Estudando um pouco mais sobre a ética seja a tônica de todo trabalho

realização da entrevista desenvolvido.

Nesta aula, daremos continuidade aos Então, vamos estudar mais um pouco
estudos sobre a realização da entrevista sobre a entrevista.
no cotidiano profissional. Mas antes, Lewgoy e Silveira (2007) apresentam
precisamos relembrar parte do conteúdo um breve panorama histórico sobre a
da disciplina anterior, tal como: entrevista e o Serviço Social. À
apresentação desta aula é sobre este
artigo que se encontra disponível na
1. A entrevista é um diálogo, um rede web.
processo de comunicação direta entre o
Assistente Social e um usuário Vejamos o que as referidas autoras têm
(entrevista individual), ou mais de um a nos dizer:
(entrevista grupal). Contudo, o que “A entrevista constitui-se em
diferencia a entrevista de um diálogo instrumento de trabalho do assistente
comum são o fato de existir um social pelas requisições e atribuições
entrevistador e um entrevistado e um assumidas desde os primórdios da
direcionamento quanto ao conteúdo a profissão. Mary Richmond (1950), em
ser explorado. sua obra Diagnóstico Social, referia que
2. É importante que o assistente social através dela o assistente social faria o
se organize para realizar a entrevista, diagnóstico social. Referia-se, naquela
considerando que sua ação esteja época, à entrevista inicial como uma
sustentada pelos eixos teórico, técnico e ‘conversa inicial’. Considerava-a um
ético-político. O planejamento é uma procedimento difícil, por entender que
mediação teórico-metodológica. era naquele encontro que se
3. Outro passo é estabelecer a finalidade estabeleciam as bases do ‘entendimento
da entrevista, os objetivos e o mútuo’ e da obtenção dos fios que
instrumento da coleta de dados. O papel orientariam o trabalho até alcançar a
de entrevistador que cabe ao Assistente avaliação, que ela denominava como
Social coloca-lhe a tarefa de conduzir o ‘juízo final’. Recomendava a autora
diálogo, de direcionar para os objetivos que, na primeira entrevista, fossem
que se pretendem alcançar. observados os seus objetivos e lembrava
que, naquele momento, a assistente
4. Não pode esquecer-se de delimitar o social deveria ser ‘delicada’, ‘paciente’,
horário e o espaço físico onde será e escutar largamente o ‘necessitado’.”
realizada a entrevista, ou seja, um local (p.02)
que propicie a comunicação, o
relacionamento e o respeito ao usuário. “Outra produção relevante para o
Serviço Social foi o livro sobre
entrevista de Anette Garret(1988),
Sendo assim, a entrevista é uma das traduzido por assistentes sociais na
técnicas mais importante para levantar década de 1940. A autora conceituava a
dados e informações sobre o usuário, entrevista como uma “conversa
buscando alcançar as demandas profissional”, por envolver a
explícitas e implícitas numa comunicação entre duas pessoas. A
determinada realidade e caso social. No entrevista também era percebida como
entanto, alguns cuidados são arte, como técnica que podia ser
necessários para evitar a invasão na vida desenvolvida e aperfeiçoada pela prática
do usuário, bem como garantir que a contínua. Destacava-se que apenas a
prática seria insuficiente, exigindo para
tanto o estudo daquela prática. O necessidade de se observar e
conhecimento da teoria relacionada à desenvolver algumas etapas, tais como:
entrevista forneceria o material
 Planejar
necessário ao exame critico das técnicas
“Sendo o planejamento, a primeira.
utilizadas e ao seu aprofundamento.” (P.
Planejar significa organizar, dar clareza
3)
e precisão à própria ação; transformar a
“Balbina Ottoni Vieira(1972) foi uma realidade numa direção escolhida; agir
das primeiras assistentes sociais do racional e intencionalmente; explicitar
Brasil a escrever sobre entrevista. os fundamentos e realizar um conjunto
Considerava-a o meio – por excelência orgânico de ações. Nesse sentido, é
– no estabelecimento das relações com importante que o assistente social se
o ‘cliente’, necessárias ao ‘tratamento organize para realizar a entrevista,
social’. Vieira não conceituou a considerando que sua ação esteja
entrevista, mas descreveu como ela sustentada pelos eixos teórico, técnico e
deveria ser operacionalizada, seguindo a ético-político. O planejamento é uma
mesma posição das autoras que a mediação teórico-metodológica. Para
precederam.” (P. 3) tanto, o entrevistador tem de conhecer a
política social para a qual se destina o
“Kisnermam (1978) introduziu um
trabalho da instituição; deve seguir a
conceito de entrevista, considerando-a
especificidade para a qual ela terá de
um meio de trabalho que permite
responder. Assim, se for para a área da
estabelecer uma relação profissional,
saúde, terá de conhecer as políticas de
um vínculo intersubjetivo e interpessoal
saúde direcionadas a determinado
entre duas ou mais pessoas,
segmento da população (infância,
estabelecendo como diferencial, em seu
adolescência, velhice, gênero) e a sua
uso, a maneira e a intenção de quem a
particularidade. Precisa conhecer
pratica. Para Benjamin (1984), a
também a instituição e o seu marco de
entrevista é um diálogo sério que tem
referência. O segundo passo é
propósito entre duas ou mais pessoas.
estabelecer a finalidade da entrevista, os
Carvalho (1991) inspirou-se na
objetivos e o instrumento da coleta de
fenomenologia existencial francesa de
dados. O terceiro é delimitar o horário e
Merleau-Ponty quando escreveu sobre a
o espaço físico onde será realizada a
entrevista em Serviço Social. A autora
entrevista, ou seja, um local1 que
tecia críticas às produções que
propicie a comunicação, o
comumente a inseriam como
relacionamento e o respeito ao usuário.”
instrumento do estudo de caso e dentro
(P. 4)
de um pensamento causal como o de
Richmond (1950) e de Garret (1988).  Executar
Enfatizava que a entrevista é apenas um Outros detalhes que fazem parte do
meio do qual se serve o assistente social planejamento e execução da entrevista
para executar a experiência da são destacados por LEWGOY E
compreensão na leitura da fala SILVEIRA (2007, P. 6). Assim como:
originária do gesto. Para ela, é na
Planejar
entrevista que se realiza a leitura da
 A necessidade de explicitar os
verdade.” (p.04)
objetivos da entrevista e dos
Após este breve histórico, Lewgoy e serviços disponíveis em relação
Silveira (2007) falam que a entrevista, às expectativas do usuário.
como outros instrumentos, exige um rito Executar
para o seu desenvolvimento, isto é, a  Nas entrevistas de seguimento, o
contrato pode reformular-se. O
tempo de duração da primeira popular: “Entrou por um ouvido e saiu
entrevista ocupa, geralmente, de pelo outro”. Ouvir é uma capacidade
45 a 50 minutos, considerando biológica que não exige esforço do
que tempo superior diminui a nosso cérebro, enquanto escutar decreta
capacidade de concentração. As trabalho intelectual, pois após ouvir há
entrevistas subsequentes variam que se interpretar, avaliar, analisar e ter
de 45 a 30 minutos. Nas uma atitude ativa. Há circunstâncias em
instituições onde o usuário pode que apenas se finge prestar atenção, mas
ser atendido diariamente, o tempo na realidade os nossos pensamentos
pode ser reduzido de acordo com estão voltados para outros assuntos. É
os objetivos. muito comum conversarmos com
A terceira etapa apresentada por algumas pessoas que se desligam das
Lewgoy e Silveira (2007) é o momento nossas palavras e apresentam um brilho
do registro da entrevista. Essas nos característico no olhar, o que demonstra
dizem o que esta etapa tem como que o corpo ficou, mas o pensamento
objetivo contribuir para a integralidade está viajando para muito longe dali. A
do atendimento e compartilhar o escuta, então, é o que torna possível a
conhecimento com os demais habilidade no uso das técnicas de
trabalhadores da instituição. Quando o acolhimento, questionamento,
prontuário for único, deve ser sintético, clarificação, reflexão, exploração e
sem perder a profundidade, e a sua aprofundamento, silêncio sensível,
elaboração pode ser durante ou apropriação do conhecimento e síntese
imediatamente após o atendimento. A integrativa entre tantas outras que
linguagem deve ser clara, objetiva e existem e as que ainda serão criadas.”
com impecável correção gramatical, (p.07)
evitando-se o uso de adjetivos, os quais
expressam juízo de valor. O registro, E sobre o acolhimento, Lewgoy e
além de cumprir com as exigências Silveira (2007) nos dizem que este,
técnico-administrativas dos serviços, como técnica, e processo, sofre a
pode também servir como banalização e com frequência é
documentação da área do ensino e, para sinônimo do que poderia ser
isso, será em forma de relatórios identificado como o prelúdio na
descritivos processuais, o qual só entrevista, que é muito importante, mas
responde aos quesitos pedagógicos no não é o suficiente para constituir-se no
processo de supervisão acadêmica. A acolhimento.
sistematização do material produzido Prelúdio em termos musicais é a parte
ocorre posteriormente ao registro de preliminar de uma composição que
várias entrevistas, cuja análise, com introduz o tema e que é componente
base em referenciais teóricos, deverá integral da composição, porém não é
levar à produção de novos toda a composição. O prelúdio
conhecimentos. acompanha a entrevista, mas há
momentos em que se evidencia mais,
Lewgoy e Silveira (2007), ao final do como no início.
artigo, abordam sobre a escuta, o O primeiro passo é a cordialidade e a
acolhimento e a reflexão no processo da preservação das regras de educação.
entrevista, nos colocando que:
Na primeira entrevista, o entrevistador
“Escutar implica ouvir, contudo, a apresenta-se com clareza, solicitando
recíproca não é verdadeira. Quem que o usuário também o faça. Também,
escuta ouve, mas quem ouve não é o momento em que ambos devem
necessariamente escuta. Daí o dito dizer por que estão ali. O entrevistado
diz porque veio e o (a) assistente social desenvolvendo a devida atenção quanto
explicita qual o seu objetivo. E ao conteúdo abordado nesta aula e,
prossegue as referidas autoras em suas sobretudo, procurando ler mais sobre o
observações: assunto.
 “É importante salientar que, com Sobre as perguntas a serem
frequência, na ânsia de ser aceito e de realizadas, discutimos na disciplina
parecer informal, são utilizados “vícios” passada que é preciso desenvolver
de linguagem e de tratamento, como questionamentos que serão úteis ao
chamar as pessoas de “mãe” quando ela desenvolvimento do trabalho, visando
procura a instituição em função do contribuir para a evolução do caso
filho, ou de “vó”, quando se trata de social. Então como sugerimos na
idosos, ou “baixinho” ou “fofo”, para disciplina anterior, converse com o
crianças, ou “cara”, para adolescentes, supervisor de campo sobre o objetivo
e, por último, “amiga”. Em geral, tais de cada pergunta desenvolvida. Qual
designações escondem, através de uma o propósito a ser alcançado, visando
máscara pseudocarinhosa, uma forma evitar a invasão de privacidade, ao
massificante e um processo de não- aplicar perguntas que trarão
individualização dos sujeitos. Essas conteúdos que não serão utilizados no
denominações não são próprias da trabalho a ser desenvolvido junto a
relação profissional, porque os usuário entrevistado.
entrevistados não são mães, nem avós, Para Lewgoy e Silveira (2007), a
nem amiguinhos, nem amigos do entrevista é um momento de reflexão
entrevistador. Essa premissa já introduz para que o indivíduo possa, através da
o pressuposto de um processo artificial fala, examinar, revelar e reproduzir
de acolhimento”. (Lewgoy e Silveira, material de cunho cognitivo ou
2007, p.08) emocional com intenso significado. Ao
reproduzir o que foi declarado pelo
E Lewgoy e Silveira(2007, p. 8) falam
sujeito, o assistente social busca mostrar
mais um pouco sobre o processo de
que seus sentimentos foram entendidos.
entrevista ao salientar os seguintes
A reflexão é empregada com vistas a
pontos:
provocar o aprofundamento do tema em
 1-“Cabe lembrar que a questão, com o propósito de
privacidade é um direito; impulsionar mudanças. A técnica de
logo é preciso que o reflexão pretende oferecer ao usuário a
usuário saiba por que e possibilidade de examinar as suas
para que terá de falar crenças ou supostas formas de
sobre a sua história.” conhecimento à luz dos fundamentos
 2-“O usuário será que as sustentam. Para isso, exige a
informado sobre as etapas consciência de que, se dada situação é
da entrevista, tempo problemática, identificando as
aproximado de duração, condições que influenciam a ele,
preenchimento de usuário, é possível gerar hipóteses de
formulários de soluções e testar as hipóteses. A
identificação e o registro reflexão tem caráter retrospectivo, nela
da evolução da entrevista, o sujeito reflete sobre a sua própria
a fim de garantir que ação.
dados relevantes não
Mas tenha muita atenção ao significado
sejam esquecidos.”
do silêncio, no desenvolvimento da
A entrevista é uma técnica que se
entrevista. Para Lewgoy e Silveira
aprende observando e fazendo,
(2007), o silêncio é uma expressão não- competência e atenção por parte do
verbal que muitas vezes comunica bem profissional.
mais que as palavras. O silêncio assusta
A realização de uma boa entrevista
e inquieta o entrevistador iniciante. Ele
exige que o profissional tenha muito
pode ser também a tentativa de encobrir
bem definido os objetivos a serem
a faceta de um momento que o sujeito
alcançados; que conheça, com alguma
não consegue enfrentar. Mas há também
profundidade, o contexto em que
o:
pretende realizar a entrevista; que tenha
 Silêncio de reflexão desenvolvido a devida introjeção, pelo
Que se manifesta normalmente em entrevistador, do roteiro da entrevista; e
situação de tristeza, ou após a que tenha a segurança e autoconfiança.
intervenção do entrevistador, ou após o
A entrevista é um diálogo, um processo
feedback. Nele, observa-se a ausência
de comunicação direta entre o
de tensão; há o recolhimento
Assistente Social e um
introspectivo de elaboração mental.
usuário (entrevista individual), ou mais
 Silêncio de desinteresse de um (entrevista coletiva). Contudo, o
Nele, o indivíduo perde o foco da que diferencia a entrevista de um
atenção, camufla resistência, diálogo comum são o fato de existir um
desinteressa-se pela situação externa entrevistador e um entrevistado, e um
porque tanto ela o atinge quanto pode direcionamento quanto ao conteúdo a
não lhe comunicar nada. ser explorado.
Claro que existem mais conteúdos sobre
Outra etapa de extrema importância é o
a entrevista social, mas a partir da
da avaliação da(s) entrevista(s), é o
experiência de estágio o aluno se
momento de retomar os objetivos e as
aproximará integrando teoria e prática.
expectativas do usuário, revisão dos
O aluno-estagiário pode buscar as
diferentes momentos e de planejamento
leituras sobre o assunto a partir das
conjunto de novas estratégias (Lewgoy
referências sugeridas, seja na
e Silveira, 2007).
Universidade, ou no processo de
O momento da avaliação é
supervisão.
extremamente delicado. O profissional
precisa desenvolver uma auto-
observação para não permitir que o
preconceito ou a indução faça parte das
suas análises. A relação com a
experiência profissional e leituras até
então realizadas são primordiais para
auxiliar no processo de análise do
conteúdo levantado. E, caso se tenha
alguma dúvida sobre alguma questão
abordada na entrevista, cabe considerar
a possibilidade de realizar mais um
encontro com usuário para aprofundar a
questão – caso seja necessário e viável.
Cabe assinalar, então, que entrevista é
trabalho, não bate-papo informal ou
conversa entre amigos. Realizar
entrevistas de forma adequada exige

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