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Nosso Cromo de Cada Dia:

Benefícios e Riscos

B.F. Giannetti, C.M.V.B. Almeida, S.H. Bonilla e O. Vendrameto


Laboratório de Físico-Química Teórica e Aplicada
Instituto de Ciências Exatas e Tecnologia da Universidade Paulista
R. Dr. Bacelar, 1212, CEP 04026-002, São Paulo, Brasil

Este artigo tem o objetivo de chamar a atenção do leitor sobre os benefícios e


riscos do cromo. Este composto, que silenciosamente faz parte de nossas
vidas, tem uma relação importante com nossa saúde, parte de nossa economia
e o meio ambiente. Os exemplos citados tem a intenção de informar e de
esclarecer sobre o tema como um reflexo da preocupação de parte da
sociedade com a sustentabilidade das gerações futuras. O artigo foi escrito de
forma que os itens possam ser lidos de forma independente segundo o critério
do leitor.

A presença do cromo na alimentação

O cromo é um elemento traço essencial (mas também tóxico) para o ser


humano. Este elemento químico se encontra naturalmente no solo, na poeira e
gases de vulcões. No meio ambiente são três os números de oxidação do
metal: cromo(0), cromo(III) e cromo(VI). Cromo(III) tem ocorrência natural
no meio ambiente, enquanto cromo(VI) e cromo(0) são geralmente produzidos
por processos industriais.

Cromo(III) faz parte do centro de biomoléculas que se encontram em


pequeníssimas quantidades em nosso organismo. Sua principal função está
relacionada ao metabolismo da glicose, do colesterol e de ácidos graxos.
Nosso cérebro se nutre de glicose, e sem este alimento, nossa mente sofre
sérios distúrbios. Se nosso corpo não pode metabolizar glicose, nosso fígado
não pode produzir glicogênio, que é a energia de nossos músculos.

Os alimentos podem ser uma fonte de cromo na quantidade necessária ao


nosso organismo. Na gestação, o organismo das mães necessita de cromo em
maior quantidade, principalmente, para ser transferido à criança. Uma criança
sadia terá a quantidade necessária de cromo até os dez anos de idade. Após
este período o organismo necessita ingerir cromo.
A alimentação moderna, rica em carboidratos refinados (por exemplo,
macarrão e arroz branco), traz prejuízo ao nosso pâncreas e ao nosso estoque
de cromo. O carboidrato refinado requer cromo para ser metabolizado e, além
disto, não contribui para repor o estoque necessário para que o organismo
funcione sadiamente. Arroz branco contem 25 % do cromo presente no arroz
integral. Farinha branca contem somente 13 % do cromo presente no trigo.
Muitas pessoas são deficientes em cromo por consumirem uma dieta restrita a
alimentos refinados. Boas fontes do mineral são a levedura de cerveja, ostra,
fígado, noz, batata, trigo e farinha integral, pimenta preta e queijos.

Esportistas que treinam para competição podem precisar de suplemento


alimentar contendo cromo. Porém, se houver excesso na dosagem há o risco
da toxicidade, pois o organismo somente absorve a quantidade necessária. O
esportistas de elite trabalham em equipe com outros profissionais do esporte.
Nestas condições, o risco de uma super dosagem no esporte competitivo deve
ser pequeno. Por outro lado, há grande risco nas academias, onde pessoas – na
sua maioria jovens – que procuram uma atividade saudável, fazem uso de
suplementos alimentares sem ter orientação profissional adequada. Vale a
pena ressaltar que o risco não é somente a super dosagem, pois há estudos
científicos que mostram que quantidades não tóxicas de determinados
compostos de cromo causam danos significativos em cromossomos. Por estes
motivos, aquelas pessoas que querem ou precisam de complementação
alimentar devem consultar profissionais especializados.

A presença do cromo na indústria


O elemento químico cromo é empregado principalmente para fazer aços
inoxidáveis e outras ligas metálicas. Na forma do mineral cromita, é
empregado na indústria de refratários para fazer tijolos de fornos
metalúrgicos. Compostos de cromo produzidos pela indústria química são
usados na indústria de tratamentos superficiais (por exemplo, a
eletrodeposição de cromo, conhecida na indústria de galvanoplastia e o
processo por cromado), manufatura de pigmentos, curtume de couro,
tratamento de madeira e tratamento de água (podendo ser usado como inibidor
da corrosão na água usada em torres de resfriamento).

Cuidados especiais são necessários tanto na manipulação durante o processo


industrial como no tratamento dos resíduos. Os resíduos possuem alto poder
de contaminação, quando não são convenientemente tratados e simplesmente
abandonados em corpos d’água, aterros industriais ou mesmo lixeiras
clandestinas. Com facilidade, o cromo atinge o lençol freático ou mesmo
reservatórios ou rios que são as fontes de abastecimento de água das cidades.
Se o resíduo é degradado no solo, o cromo permanece e pode ser absorvido
por plantas que posteriormente servirão de alimento diretamente ao homem ou
a animais, podendo por este caminho também atingir o ser humano.

Cromo(VI) é um carcinógeno humano reconhecido e muitos trabalhadores são


expostos a este composto químico. A fumaça contendo este elemento químico
causa uma variedade de doenças respiratórias, incluindo câncer. O contato da
pele com compostos de cromo causa dermatite alérgica e, mais raramente,
pode provocar ulcerações na pele formando cicatrizes e até perfurações do
septo nasal. Há suspeitas de que este composto químico possa afetar o sistema
imunológico de seres humanos.

A presença do cromo em Hollywood e no Brasil

O filme “Erin Brockovich - Uma Mulher de Talento”, além da beleza e a


interpretação de Julia Roberts (que ganhou um Oscar por sua atuação), conta a
história dos trágicos efeitos da contaminação por cromo da população de uma
cidade americana. A história é baseada em fato verídico. A personagem, ao
organizar arquivos de uma ação judicial, depara-se com alguns registros
médicos que a intrigam. Decide investigar e acaba descobrindo que uma
indústria vinha contaminando as águas de uma pequena cidade e, por este
motivo, muitas pessoas haviam contraído câncer. Como resultado, a empresa
foi condenada a pagar uma indenização milionária.

A história contada no filme não está longe de nossa realidade. As quantidades


de cromo que são liberadas no meio ambiente por nossas indústrias é
preocupante.
Para se ter uma idéia desta questão no Brasil, vale a pena exemplificar com a
indústria de curtimento do couro. A atividade industrial dos curtumes é
intensiva em mão de obra mas pouco agrega em termos de tecnologia. É por
isso, larga e facilmente disseminada em muitas comunidades do país. Na
indústria de curtume (e de forma semelhante na indústria de galvanoplastia) o
tratamento dos efluentes industriais gera um resíduo sólido que é denominado
de lodo e que contém cromo. O lodo é acondicionado em recipientes, pode ir
para incineradores ou deve ser guardado indefinidamente em condições
ótimas, ao abrigo de intempéries, insolação e outros agentes que possam
romper o recipiente e espalhar o resíduo na natureza. O responsável pelo
material obriga-se a esses cuidados que são supervisionados e inspecionados
pelas autoridades periodicamente. Os altos custos, decorrentes do
armazenamento e/ou da incineração, induzem a comportamentos inadequados,
como o descarte de resíduos em locais impróprios. Deve-se considerar,
também, que nem todos os Estados possuem aparato com condições técnicas
de aconselhar e vigiar o funcionamento de empresas que utilizam o cromo em
seus processos.

O gigantismo do problema pode ser avaliado se for considerada a produção


significativa da indústria calçadista brasileira e, somado a este fato, que nos
curtumes o couro processado gera quantidades apreciáveis de resíduos: de 30
a 50 % de resíduos tais como lodo, serragem da rebaixadeira e pó da lixadeira
(todos contendo cromo na sua composição). Além disto, existem regiões no
Brasil em que complexos industriais do setor calçadista com centenas de
indústrias, produzindo dezenas de toneladas por dia de retalhos de couro que
são depositados em aterro industrial (do tipo I destinado para resíduos
perigosos).

Nas várias cidades brasileiras, onde existem aglomerados industriais de couro


e calçado há um conflito latente devido ao rápido esgotamento da capacidade
dos aterros e necessidade de criação de novos. Os resíduos da indústria de
couro e de calçado comprometem o meio ambiente, principalmente, sob dois
aspectos. O tempo considerável de degradação desses retalhos faz com que o
solo fique sem uso por várias gerações. Vale a pena lembrar que o processo de
curtimento é feito justamente para retardar a putrefação do couro. Outro
aspecto importante é o efeito de concentração do cromo no solo devido às
grandes quantidades depositadas nos aterros de retalhos.

A presença do cromo no meio ambiente das futuras gerações

A sociedade brasileira está tomando consciência do conceito de


desenvolvimento sustentável. A noção de sustentabilidade é entendida como o
novo paradigma do desenvolvimento humano, cujo objetivo é conciliar justiça
social, equilíbrio ambiental e eficiência econômica. Espera-se que as novas
gerações não ajam como as gerações passadas, que viam os recursos da
natureza como inesgotáveis e o crescimento econômico sem limites. O
desenvolvimento sustentável é um novo paradigma que está, de forma gradual
e negociada, resultando em um plano de ação e de planejamento participativo
nos níveis global, nacional e local.

A sociedade brasileira está dando sinais de amadurecendo neste sentido.


Muitas organizações não governamentais, tem tido um papel importante nesta
questão, conscientizando e reivindicando uma melhor qualidade de vida para
o cidadão. O estado, também, participa cada vez mais ativamente aplicando
políticas públicas que auxiliam à sociedade encontrar um equilíbrio entre o
meio ambiente e a atividade econômica. Paralelamente, nas últimas décadas, o
estado tem se aparelhado melhor para encaminhar este assunto,
conceitualmente e tecnicamente.

Os empresários, individualmente e participando de associações de classe, tem


percebido que sem um meio ambiente sadio os negócios estão sob risco. A
sobrevivência da empresa não é possível sem recursos naturais disponíveis.

A empresa poluidora está desperdiçando os seus recursos (energia, matéria


prima e insumos, mão de obra e capital) e gastando (a empresa ou a
sociedade) mais recursos para diminuir os danos ambientais. Este tipo de
empresa é, certamente, uma empresa ineficiente. Ineficiente para si e para a
sociedade. A empresa poluidora tem vários tipos de prejuízos, entre eles: a
imagem de seus produtos e a perda de mercado no comércio internacional
(barreiras alfandegárias verdes). Desta forma, a perda da capacidade
competitiva é o principal prejuízo que os empresários percebem hoje. Cabe
destacar, também, que a universidade brasileira e institutos de pesquisa estão
participando desta questão, cada vez mais, ativamente. Muitos são os projetos
que tratam da questão ambiental. Os esforços de pesquisa tem-se direcionado
ao desenvolvimento de soluções adequadas para nossos problemas. Por
exemplo, no caso dos resíduos de cromo na indústria couro-calçadista há um
grande número de trabalhos, finalizados e em desenvolvimento, que levam em
conta as condições locais e são realizadas com o apoio de amplos setores
empresariais.

Certamente, o nossa entrada para o mundo desenvolvido só será possível com


a conciliação da justiça social, equilíbrio ambiental e eficiência econômica.
Sem esta condição estabelecida as “Brockovichs” se manifestarão dentro e
fora do país e, rapidamente, de país “Rico por Natureza” passaremos a ser
conhecidos pelo país de “Risco para a Natureza”.
Fontes alimentares:
A melhor fonte de cromo é a levedura de cerveja, mas muitos indivíduos não a
toleram, já que ela causa distensão abdominal (sensação de "estufamento") e
náusea. As outras boas fontes de cromo são a carne vermelha, fígado, ovo, frango,
ostra, gérmen de trigo, pimentão verde, maçã, banana, espinafre e manteiga. A
pimenta preta e o melado também são boas fontes de cromo, mas normalmente
eles são consumidos apenas em pequenas quantidades.

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