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Comentado–junho 2019
(semana 3)
CAO-Crim
Boletim Criminal Comentado - junho 2019
(semana 3)
Assessores:
Fernanda Narezi Pimentel Rosa
Marcelo Sorrentino Neira
Paulo José de Palma
Ricardo José Gasques de Almeida Silvares
Rogério Sanches Cunha
1 Analista Jurídica
Ana Karenina Saura Rodrigues
Boletim Criminal
Comentado–junho 2019
(semana 3)
Sumário
1-Tema: STJ - PROCEDIMENTO LEI DE DROGAS. Inobservância do rito procedimental que prevê a
apresentação de defesa prévia antes do recebimento da denúncia. Nulidade
relativa............................................................................................................................................8
DIREITO PENAL.......................................................................................................................................11
1-Tema: STJ – O tráfico de drogas é crime de ação múltipla, sendo prescindível a realização de atos
de venda do entorpecente..............................................................................................................11
2-Tema: STJ – A condenação simultânea nos crimes de tráfico e associação para o tráfico afasta a
incidência da causa especial de diminuição prevista no art. 33, §4º, da Lei n. 11.343/06...................12
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(semana 3)
ESTUDOS DO CAOCRIM
O Supremo Tribunal Federal encerrou o julgamento das duas ações que versavam sobre atos
de preconceito contra homossexuais, transexuais e travestis: a Ação Direta de
Inconstitucionalidade por Omissão nº 26 e o Mandado de Injunção nº 4733.
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b) a declaração, com fundamento nos incisos XLI e XLII do artigo 5º da Constituição Federal,
de mora inconstitucional do Congresso Nacional no alegado dever de editar legislação criminal
que puna, de forma específica, a homofobia e a transfobia, “especialmente (mas não
exclusivamente) a violência física, os discursos de ódio, os homicídios, a conduta de ‘praticar,
induzir e/ou incitar o preconceito e/ou a discriminação’ por conta da orientação sexual ou da
identidade de gênero, real ou suposta, da pessoa”.
Em ações dessa natureza, como dispõe o art. 103, § 2º, da Constituição Federal, “será dada
ciência ao Poder competente para a adoção das providências necessárias e, em se tratando
de órgão administrativo, para fazê-lo em trinta dias”. Como se pode notar, a decisão
proferida não substitui o Poder Legislativo na edição da norma, mas apenas declara o estado
de inconstitucionalidade e dá ciência ao órgão competente, normalmente estabelecendo um
prazo razoável para a adoção das providências, como ocorreu na ADI por omissão 3.682,
julgada em 09/05/2007 e que versava sobre a necessidade de edição de lei complementar
para criação, incorporação, desmembramento e fusão de municípios:
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“Ação julgada procedente para declarar o estado de mora em que se encontra o Congresso
Nacional, a fim de que, em prazo razoável de 18 (dezoito) meses, adote ele todas as
providências legislativas necessárias ao cumprimento do dever constitucional imposto pelo
art. 18, § 4º, da Constituição (…)”.
No mesmo sentido, afirmou a Corte Constitucional alemã, já no começo de sua judicatura, que
não estava autorizada a proferir, fora do âmbito da regra geral, uma decisão para o caso
concreto, ou de determinar qual norma geral haveria de ser editada pelo legislador. Também
o Supremo Tribunal Federal deixou assente, na decisão proferida no Mandado de Injunção n.
107, que a Corte não está autorizada a expedir uma norma para o caso concreto ou a editar
norma geral e abstrata, uma vez que tal conduta não se compatibiliza com os princípios
constitucionais da democracia e da divisão de Poderes.”
O mandado de injunção, por outro lado, integra o elenco de direitos e garantias fundamentais
e pode ser impetrado “sempre que a falta de norma regulamentadora torne inviável o
exercício dos direitos e liberdades constitucionais e das prerrogativas inerentes à
nacionalidade, à soberania e à cidadania” (art. 5º, inc. LXXI, da CF/88).
Para José Afonso da Silva, o mandado de injunção não é uma variante da ação direta por
omissão, pois sua impetração não visa à edição de norma regulamentadora, mas sim a garantir
a eficácia da norma constitucional no caso concreto:
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103, § 29). É equivocada, portanto, data venia, a tese daqueles que acham que o julgamento
do mandado de injunção visa a expedição da norma regulamentadora do dispositivo
constitucional dependente de regulamentação, dando a esse remédio o mesmo objeto da
ação de inconstitucionalidade por omissão. Isso quer apenas dizer que o mandado de injunção
não passaria de ação de inconstitucionalidade por omissão subsidiária, a dizer: como os
titulares dessa ação (art. 103) se omitiram no seu exercício, então fica deferido a qualquer
interessado o direito de utilizar o procedimento injuncional para obter aquilo que
primeiramente ocorria àqueles titulares buscar. A tese é errônea e absurda, porque: (1) não
tem sentido a existência de dois institutos com o mesmo objetivo e, no caso, de efeito
duvidoso, porque o legislador não fica obrigado a legislar; (2) o constituinte, em várias opor-
tunidades na elaboração constitucional, negou ao cidadão legitimidade para a ação de
inconstitucionalidade; por que teria ele que fazê-lo por vias transversas?; (3) absurda
mormente porque o impetrante de mandado de injunção, para satisfazer seu direito (que o
moveu a recorrer ao Judiciário), precisaria percorrer duas vias: uma, a do mandado de
injunção, para obter a regulamentação que poderia não vir, especialmente se ela dependesse
de lei, pois o legislativo não pode ser constrangido a legislar; admitindo que obtenha a
regulamentação, que será genérica, impessoal, abstrata, vale dizer, por si, não satisfatória de
direito concreto; a segunda via é que, obtida a regulamentação, teria ainda que reivindicar
sua aplicação em seu favor, que, em sendo negada, o levaria outra vez ao Judiciário para
concretizar seu interesse, agora por outra ação porque o mandado de injunção não caberia.”
Não obstante o STF tenha inicialmente discordado dessa orientação, em julgados posteriores
de certa forma mitigou a limitação de que o mandado de injunção deveria apenas constatar a
inconstitucionalidade da omissão e determinar que o legislador adotasse as providências
necessárias. Como exemplo, temos o MI nº 670, que versava sobre a não regulamentação do
direito de greve do servidor público.
Consignou-se no acórdão que “Apesar dos avanços proporcionados por essa construção
jurisprudencial inicial, o STF flexibilizou a interpretação constitucional primeiramente fixada
para conferir uma compreensão mais abrangente à garantia fundamental do mandado de
injunção. A partir de uma série de precedentes, o Tribunal passou a admitir soluções
‘normativas’ para a decisão judicial como alternativa legítima de tornar a proteção judicial
efetiva”. Nessa esteira, determinou-se a aplicação das Leis 7.701/1988 e 7.783/1989 nas
situações que envolvessem o exercício do direito de greve por servidores públicos civis.
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Feita essa breve síntese, alertamos que dez dos onze ministros reconheceram haver uma
demora inconstitucional do Legislativo em tratar do tema. Apenas Marco Aurélio Mello
discordou.
Diante desta omissão, por 8 votos a 3, os ministros determinaram que a conduta que retrata
homofobia e transfobia passe a ser punida pela Lei de Racismo (7.716/89), que hoje prevê
crimes de discriminação ou preconceito por "raça, cor, etnia, religião e procedência nacional".
Algumas observações importantes para o dia a dia dos órgãos atuantes no sistema de justiça
criminal:
V – discute-se se o crime em tela pressupõe ou não finalidade especial, sendo certo que o STF
exclui do alcance do tipo a liberdade de crença. O Tribunal deixou claro que a repressão contra
essas condutas não restringe o exercício de liberdade religiosa. Fiéis, pastores e líderes
religiosos têm assegurado o direito de pregar suas convicções, desde que essas manifestações
não se convertam em discursos de ódio, incitando hostilidade ou a violência contra a
comunidade LGBT.
VII – em que pese o STF ter discutido condutas que segreguem ou incentivam a segregação
de homossexuais, transexuais ou travestis, acabou por criar campo fértil para que a injúria
preconceito quanto à orientação sexual ou identidade de gênero se adeque não ao caput do
art. 140, mas ao disposto no art. 140, §3º., do CP.
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COMENTÁRIOS DO CAO-CRIM
De acordo com decisões reiteradas do STJ, a inobservância do rito procedimental que prevê a
apresentação de defesa prévia antes do recebimento da denúncia gera nulidade relativa
desde que demonstrados eventuais prejuízos suportados pela defesa.
“Art. 55. Oferecida a denúncia, o juiz ordenará a notificação do acusado para oferecer defesa
prévia, por escrito, no prazo de 10 (dez) dias.”
Na resposta, o denunciado deve suscitar todas as teses de interesse para sua defesa, inclusive
matérias preliminares ao mérito, sob pena de, não o fazendo neste momento oportuno,
operar-se a preclusão. As matérias podem ser as mais diversas, mas, em especial, deve-se
atentar para o disposto no art. 397 do Código de Processo Penal, que dá ensejo à absolvição
sumária, caso acolhida a respectiva alegação. Assim, nessa oportunidade devem ser agitadas
causas de atipicidade, excludentes de ilicitude, culpabilidade ou punibilidade. A juntada de
documentos que interessem à defesa, bem como do rol das testemunhas (no máximo de
cinco) também ocorre neste momento. Caso a defesa pretenda obter esclarecimentos do
perito, acareações, reconhecimentos a serem produzidos em audiência, é este também o
momento oportuno para que se requeiram essas provas.
Ocorre que nem sempre o rito estabelecido na Lei 11.343/06 é seguido. São inúmeras as
situações em que se aplicam as disposições dos artigos 394 e seguintes do CPP, o que provoca
primeiro o recebimento da denúncia para que somente em seguida se efetue a citação a fim
de que a resposta à acusação seja apresentada (arts. 396 e 396-A). Com isso, inverte-se a
ordem estabelecida na lei especial, que possibilita que a resposta obste a própria deflagração
da ação penal.
Em razão dessa inversão, não são poucos os casos de inconformismo em que réus processados
por tráfico e outros crimes relacionados na Lei 11.343/06 buscam a decretação de nulidade
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por cerceamento de defesa. Tais pretensões, no entanto, não têm encontrado respaldo na
jurisprudência.
Com efeito, o STJ firmou a tese de que não se atribui nulidade absoluta à inversão entre a
notificação para a apresentação da defesa e o recebimento da denúncia:
III – Além disso, o defensor constituído continuou a se manifestar nos autos e compareceu aos
demais atos processuais, tendo acompanhado o recorrente nas audiências e, inclusive,
formulado indagações às testemunhas e aos corréus, manifestando-se por escrito em
oportunidades distintas.
COMENTÁRIOS DO CAO-CRIM
No julgamento das ADPF 395 e 444, o STF considerou, por maioria, procedentes as arguições
para pronunciar a não recepção, pela ordem constitucional, da condução coercitiva para
interrogatório, sob pena de responsabilidade administrativa, civil e penal da autoridade e da
invalidação das provas obtidas por meio do ato ilegal, sem prejuízo da responsabilidade civil
do Estado.
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O ministro Gilmar Mendes – relator – afirmou que embora a autoridade tenha classificado o
ato como “entrevista”, tratou-se de verdadeiro interrogatório, antes do qual não se assegurou
ao agente o direito a prévia consulta a seu advogado e não houve ciência a respeito do direito
ao silêncio nem ao direito de não produzir provas contra si mesmo:
“Observo, portanto, a violação às decisões proferidas nas ADPFs 395 e 444, na medida em que
utilizada técnica de interrogatório forçado proibida a partir do julgamento das referidas ações.
Há a evidente tentativa de contornar a proibição estabelecida pelo STF em favor dos direitos
e garantias fundamentais das pessoas investigadas.”
Neste ponto, o voto foi seguido por unanimidade pelos demais membros da 2ª Turma, que
divergiram apenas sobre outro pedido contido na reclamação, referente à declaração de
invalidade da apreensão e de exame de um telefone celular, que, segundo se alegava, não
estava inserido na ordem de apreensão. Para o relator, de fato não havia prévia decisão
judicial que justificasse a necessidade e a proporcionalidade da medida, mas os demais
ministros consideraram que a legalidade da medida decorria da ordem de busca e apreensão
na residência do investigado, razão por que a diligência tinha amparo legal e constitucional.
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DIREITO PENAL:
1-Tema: STJ – O tráfico de drogas é crime de ação múltipla, sendo prescindível a realização
de atos de venda do entorpecente.
COMENTÁRIOS DO CAO-CRIM
O tráfico de drogas é crime de ação múltipla e a prática de um dos verbos contidos no art.
33, caput, é suficiente para a consumação da infração, sendo prescindível a realização de atos
de venda do entorpecente.
O tipo penal do tráfico de drogas é composto por dezoito ações nucleares: importar(trazer de
fora), exportar (enviar para fora), remeter (expedir, mandar), preparar (por em condições
adequadas para uso), produzir (dar origem, gerar), fabricar (produzir a partir de matérias
primas, manufaturar), adquirir (negociar ou entrar na posse), vender(negociar em troca de
valor), expor à venda (exibir para a venda), oferecer (tornar disponível), ter em
depósito (posse protegida), transportar (levar, conduzir), trazer consigo (levar consigo, junto
ao corpo), guardar (tomar conta, zelar para terceiro), prescrever
(receitar), ministrar (aplicar), entregar (ceder) a consumo ou fornecer(abastecer)
drogas, ainda que gratuitamente (amostra grátis).
Nota-se facilmente que estas ações podem se combinar num mesmo contexto fático sem que
isso provoque concurso de crimes. O tráfico é crime de ação múltipla (ou de conteúdo
variado), em que vários núcleos típicos praticados no mesmo cenário permitem a punição por
crime único, cujo encadeamento de condutas influencia apenas na aplicação da pena-base
(circunstâncias do crime).
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“1. Tendo o réu conhecimento prévio e pleno domínio da conduta da corré, que tentou
ingressar com droga em estabelecimento prisional, deve ser condenado pelo delito de tráfico
de drogas. 2. É desnecessária, para a configuração do delito de tráfico, a efetiva tradição ou
entrega da substância entorpecente ao seu destinatário final.” (AgRg no AREsp 483.235/BA, j.
25/9/2018)
***
“Do contexto dos fatos, não há falar em interferência ou indução dos policiais como agente
infiltrado sem autorização judicial. Na verdade, quando os policiais tomaram conhecimento,
através das mensagens do celular, que o paciente estava a caminho do flat para uma entrega,
ele já estava na posse do entorpecente, tendo consumado o delito. Logo, é legítima a
intervenção policial para fazer cessar a atividade criminosa quando constatada a prática do
tráfico ilícito de entorpecentes.” (AgRg no HC 446.355/SP, j. 19/3/2019)
2-Tema: STJ – A condenação simultânea nos crimes de tráfico e associação para o tráfico
afasta a incidência da causa especial de diminuição prevista no art. 33, §4º, da Lei n.
11.343/06.
COMENTÁRIOS DO CAO-CRIM
É tese consolidada no STJ que a condenação simultânea nos crimes de tráfico e associação
para o tráfico afasta a incidência da causa especial de diminuição prevista no art. 33, §4º, da
Lei n. 11.343/06 por estar evidenciada dedicação a atividades criminosas ou participação em
organização criminosa.
O crime de associação para o tráfico consiste na reunião de duas ou mais pessoas para o fim
de praticar, reiteradamente ou não, os crimes de tráfico de drogas (nas formas básica ou
equiparada – art. 33, caput e § 1º) ou de tráfico de maquinário, aparelho, instrumento ou
qualquer objeto destinado à fabricação, preparação, produção ou transformação de drogas
(art. 34).
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O tráfico de drogas, por sua vez, contém uma causa de diminuição de pena para as situações
em que o agente é primário, com bons antecedentes, não se dedica a atividades criminosas,
nem integra organização criminosa.
No caso da imputação em concurso, não são poucos os que buscam ainda assim a incidência
da diminuição de pena sob o argumento de que a associação para o tráfico não é por si uma
prova de dedicação a atividades criminosas. Além disso, é comum o argumento de que
embora tenha havido a prática da associação para o tráfico, o agente cumpre os demais
requisitos estabelecidos no § 4º do art. 33 (primariedade, bons antecedentes e não
caracterização de organização criminosa).
Estes argumentos não convencem porque, como já destacamos nos comentários à tese 17 da
Edição I, os requisitos do tráfico privilegiado são cumulativos. Se, no caso da associação para
o tráfico, concluirmos que há de fato dedicação a atividades criminosas, obsta-se o benefício.
E não há mesmo possibilidade de desconsiderar essa dedicação para a formação da associação
para o tráfico, que, como vimos, pressupõe estabilidade e permanência, cuja existência só se
concebe se houver empenho e dedicação para a manutenção da societas criminis, que de
resto é um crime permanente:
“3. Os fundamentos utilizados pelas instâncias ordinárias para não aplicar a minorante do §
4º do art. 33 da Lei de Drogas ao caso concreto, em razão da dedicação dos pacientes à
atividade criminosa, evidenciada sobretudo pela quantidade de drogas apreendida – 61kg de
maconha –, alidada às circunstâncias do delito, está em consonância com o entendimento
desta Corte Superior de Justiça. Ademais, acolher a tese de que os pacientes não se dedicam
à atividade criminosa, é necessário o reexame aprofundado das provas, inviável em habeas
corpus.
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