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(semana nº 4)
Boletim Criminal Comentado 182-
Maio de 2022
Procurador-Geral de Justiça
Mário Luiz Sarrubbo
Assessores
Olavo Evangelista Pezzotti
Ricardo Silvares
Rogério Sanches Cunha
Valéria Scarance
Danilo Pugliesi (descentralizado)
Analistas Jurídicos
Ana Karenina
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Boletim Criminal Comentado 182-
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SUMÁRIO
NOTÍCIAS...............................................................................................................................................4
1-Tema: Conexão. Reunião dos processos. Faculdade do julgador. Artigo 80 do Código de Processo
Penal. Organização criminosa. Lavagem de dinheiro. Causa de aumento de pena. Soma ou unificação
ulterior. Juízo da execução....................................................................................................................7
DIREITO PENAL....................................................................................................................................10
1-Tema: Oferecimento de vantagem indevida para evitar a atuação policial. Agente abordado com
drogas para uso próprio. Ato de ofício. Corrupção ativa. Ocorrência. Disposições do art. 48, §§ 2º e
3º da Lei de Drogas..............................................................................................................................10
2- Tema: Fixação do regime prisional. Circunstância judicial desfavorável. Pena-base acima do mínimo
legal. Condenação à pena igual ou inferior a 4 anos de reclusão. Regime inicial aberto.
Possibilidade.......................................................................................................................................11
4- Tema: Sexta Turma confirma decisão que negou progressão especial de regime a mãe presa que
não tem guarda do filho.......................................................................................................................14
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NOTÍCIAS
Na última segunda-feira (9/5) foi realizada a primeira edição do Projeto Bate-Papo com o Centro de
Apoio. Trata-se de uma iniciativa que facilita a comunicação entre os promotores, de maneira
informal e direta, e os assessores do Centro e Apoio Operacional Criminal (CAOCrim) e do Centro de
Apoio Operacional Cível (CAO Cível).
Durante quase duas horas, pouco mais de 50 membros do MPSP conversaram sobre estratégias para
a acusação nos delitos de tráfico de drogas, associação (artigo 35 da Lei de Drogas) e organização
criminosa. Os participantes ainda debateram sobre a proteção da vítima de crimes violentos e seus
familiares por meio do Núcleo de apoio às Vítimas de Violência (NAVV), os crimes cometidos pela
internet e sobre como preservar as mensagens em provedores e redes sociais. Foram igualmente
abordados aspectos polêmicos do crime de stalking, dentro outros temas no eixo criminal.
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ESTUDOS DO CAOCRIM
De acordo com o art. 38 do CPP, salvo disposição em contrário, o ofendido, ou seu representante
legal, decairá no direito de queixa ou de representação, se não o exercer dentro do prazo de seis
meses, contado do dia em que vier a saber quem é o autor do crime, ou, no caso do art. 29, do dia
em que se esgotar o prazo para o oferecimento da denúncia.
A decadência (também prevista no art. 103 do Código Penal) consiste na perda do direito de ação
por não ter sido ele exercido dentro do prazo legal. Ou, na lição de Câmara Leal, importa na “extinção
do direito pela inércia de seu titular, quando sua eficácia foi, de origem, subordinada à condição de
seu exercício dentro de um prazo prefixado, e este se esgotou sem que esse exercício se tivesse
verificado (Da prescrição e da decadência. São Paulo, Saraiva: 1939, p. 123).
O prazo decadencial, salvo exceções previstas em lei, é de seis meses e começa a fluir da data em
que o ofendido toma conhecimento sobre quem é o autor do ilícito penal. Trata-se de prazo fatal,
improrrogável, não se sujeitando a nenhuma espécie de suspensão ou interrupção. De sorte que, a
vítima (ou seu representante legal, sucessor ou curador), tem o prazo de seis meses para ofertar a
representação (se o crime for de ação penal pública condicionada a tal condição de procedibilidade),
ou para ingressar com a queixa-crime (se o crime for de ação penal privada). Não o fazendo, no caso
da ação penal privada, simplesmente estará abrindo mão do direito de queixa e, sua omissão,
acarretará a extinção da punibilidade, nos termos do art. 107, inc. IV, do Código Penal. Já na ação
penal pública condicionada, se ultrapassado esse prazo a vítima não manifestar sua intenção de ver
seu ofensor processado, não mais poderá o Ministério Público deflagrar a respectiva denúncia,
extinguindo-se a punibilidade com base no mesmo dispositivo do estatuto penal.
Trata-se de prazo que tem a natureza penal (já que extingue a punibilidade), devendo ser contado,
portanto, incluindo-se o primeiro dia e excluindo-se o dia final, conforme dispõe o art. 10 do Código
Penal.
Esse prazo se inicia da data em que perpetrado o crime, desde que a vítima saiba quem foi seu autor.
Ou, caso não tenha esse conhecimento, da data em que o ofendido tiver ciência da autoria. Nem
sempre, portanto, haverá coincidência entre a data do fato e descoberta de seu autor. E nem poderia
ser diferente. Pode ocorrer, assim, que em um crime praticado na data de hoje, o ofendido somente
saiba quem é seu autor depois de um ano, a partir do sucesso de investigações policiais que foram
realizadas. Será, portanto, desta última data, ou seja, depois de um ano da prática do crime, que se
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iniciará o prazo de seis meses para oferta da queixa ou da representação. Não seria justo o transcurso
do prazo para o ofendido que ignorasse quem é o autor do crime, estando impedido, por isso mesmo,
de ajuizar queixa-crime ou representar contra um desconhecido.
Crime continuado e contagem de prazo – A definição de crime continuado vem expressa no art. 71
do Código Penal, e ocorre “quando o agente, mediante mais de uma ação ou omissão, pratica dois
ou mais crimes da mesma espécie e, pelas condições de tempo, lugar, maneira de execução e outras
semelhantes, devem os subsequentes ser havidos como continuação do primeiro”.
O prazo deve ser contado isoladamente para cada um dos delitos. Suponha-se a prática de várias
ameaças, em continuidade delitiva, uma perpetrada no dia 05 de janeiro, outra no dia 10 do mesmo
mês, outra no dia 02 de fevereiro e a última em 10 de fevereiro. Para cada um dos crimes, será
contado o prazo decadencial de seis meses, em que deve ser ofertada a representação, a se iniciar
considerando o dia de início, nos termos do art. 10 do Código Penal. Assim, decadência começa a
correr, em nosso exemplo, em 05 de janeiro, outra no dia 10 do mesmo mês, outra no dia 02 de
fevereiro e a última em 10 de fevereiro.
Crime permanente, crime habitual, decadência e a contagem de prazo - A doutrina costuma indicar
a forma de contagem de prazo para o crime permanente e para o crime habitual.
O crime permanente é assim considerado aquele cuja consumação se prolonga no tempo. O exemplo
típico é o crime de sequestro previsto no art. 148 do Código Penal. Há uma primeira ação, consistente
em privar a vítima de sua liberdade, mas a consumação se prolonga, enquanto ela estiver em
cativeiro. O “dies a quo”, nesse caso, começaria a ser contado a partir da data em que cessasse a
permanência e não da data em que a vítima tivesse conhecimento sobre a autoria do crime.
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1- Tema: Conexão. Reunião dos processos. Faculdade do julgador. Artigo 80 do Código de Processo
Penal. Organização criminosa. Lavagem de dinheiro. Causa de aumento de pena. Soma ou
unificação ulterior. Juízo da execução.
DESTAQUE:
A eventual incidência da causa de aumento descrita na parte final do § 4º do art. 1º da Lei de Lavagem
de Dinheiro, na redação dada pela Lei n. 12.683/2012, não constitui empecilho para o juiz manter a
separação dos feitos, nos termos do art. 80 do CPP.
O Superior Tribunal de Justiça, há muito, já sufragou entendimento de que "a reunião de processos
em razão da conexão é uma faculdade do Juiz, conforme interpretação a contrario sensu do art. 80
do Código de Processo Penal que possibilita a separação de determinados processos" (RHC
29.658/RS, Rel. Ministro Gilson Dipp, Quinta Turma, DJe 8/2/2012).
No caso, a magistrada singular entendeu pela não reunião dos processos, com fundamento no art.
80 do Código de Processo Penal, que faculta a separação processual.
Outrossim, após fixada a causa de aumento de pena para cada crime de lavagem de dinheiro, caberá
ao Juízo da Vara de Execuções a ulterior soma ou unificação das penas eventualmente impostas em
cada uma das ações penais.
Processo: RHC 157.077-SP, Rel. Min. Ribeiro Dantas, Quinta Turma, por unanimidade, julgado em
03/05/2022.
COMENTÁRIOS DO CAOCRIM
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Art. 80. Será facultativa a separação dos processos quando as infrações tiverem sido praticadas em
circunstâncias de tempo ou de lugar diferentes, ou, quando pelo excessivo número de acusados e
para não Ihes prolongar a prisão provisória, ou por outro motivo relevante, o juiz reputar conveniente
a separação.
Nesses casos a separação é facultativa, ou seja, caberá ao juiz definir se é conveniente a separação
dos processos, nas hipóteses elencadas neste dispositivo. São elas:
Infrações tiverem sido praticadas em circunstâncias de tempo ou de lugar diferentes – O art. 76, inc.
I do código, dispõe que a competência será determinada pela conexão quando “ocorrendo duas ou
mais infrações, houverem sido praticadas [...] por várias pessoas em concurso, embora diverso o
tempo e o lugar”. É a chamada conexão intersubjetiva por concurso, da qual tratamos na análise
daquele dispositivo. Nesse caso, é facultada ao juiz a separação dos processos. Já no que se refere
aos inc. II (conexão objetiva teleológica e consequencial) e inc. III (conexão instrumental ou
probatória), do art. 76, pensamos não ser cabível o desmembramento. É que este dispositivo em
exame, em sua primeira parte, faz menção apenas às infrações praticadas em circunstâncias de
tempo ou de lugar diferentes, não podendo se estender essa faculdade às demais causas. Salvo se
por outro motivo previsto no próprio dispositivo, isto é, quando excessivo o número de réus, a fim
de evitar a dilação do tempo de prisão provisória ou por outra justificativa relevante.
Número excessivo de réus – É a hipótese mais verificada na prática. Justifica-se a separação quando
houver um número excessivo de acusados, circunstância que acarreta um tumulto processual, com
dificuldade de colheita da prova e, por consequência, prolongamento exagerado do feito, com
possibilidade de configuração de excesso de prazo da prisão provisória de réus que estejam
eventualmente nesta condição.
Motivo relevante – O legislador deixa uma hipótese em aberto, a demonstrar que o rol deste
dispositivo é meramente exemplificativo. Assim, configurado um motivo relevante, que a lei não
aponta qual é, tem o juiz a faculdade de determinar a separação dos processos. Tourinho Filho:
aponta dois exemplos: quando o procedimento relativo a cada um dos crimes for diverso e quando
se verificar a iminência da prescrição (art. 115 do Código Penal), porque maior de 70 anos um dos
réus (Processo Penal, vol. I, p. 283).
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DESTAQUE:
A escolha pelo Magistrado de medidas cautelares pessoais, em sentido diverso das requeridas pelo
Ministério Público, pela autoridade policial ou pelo ofendido, não pode ser considerada como
atuação ex officio.
Processo: AgRg no HC 626.529-MS, Rel. Min. Rogerio Schietti Cruz, Sexta Turma, por unanimidade,
julgado em 26/4/2022, DJe 3/5/2022.
COMENTÁRIOS DO CAOCRIM
Conforme vem decidindo o STJ, a determinação do magistrado, em sentido diverso do requerido pelo
Ministério Público, pela autoridade policial ou pelo ofendido, não pode ser considerada como
atuação ex officio, uma vez que lhe é permitido operar conforme os ditames legais, desde que
previamente provocado, no exercício de sua jurisdição.
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DIREITO PENAL:
1- Tema: Oferecimento de vantagem indevida para evitar a atuação policial. Agente abordado com
drogas para uso próprio. Ato de ofício. Corrupção ativa. Ocorrência. Disposições do art. 48, §§ 2º e
3º da Lei de Drogas.
INFORMATIVO 735-STJ
DESTAQUE:
Consoante previsão do artigo 333 do Código Penal, o delito de corrupção ativa ocorre com a conduta
de oferecer ou prometer vantagem indevida a funcionário público, para determiná-lo a praticar,
omitir ou retardar ato de ofício.
Assim, o entendimento de que não há ato de ofício a ser praticado por policiais quando abordam
sujeito na posse de drogas está em dissonância com as disposições legais e a jurisprudência desta
Corte.
O artigo 28 da Lei de Drogas, ainda que não preveja pena privativa de liberdade, permanece como
crime. Não houve descriminalização da conduta, mas tão somente sua despenalização, vez que a
norma especial conferiu tratamento penal mais brando aos usuários de drogas.
Com efeito, este Superior Tribunal de Justiça, alinhando-se ao "entendimento firmado pela Corte
Suprema no julgamento do RE 430.150/RJ, sedimentou orientação de que a Lei n. 11.343/2006 não
descriminalizou a conduta que tipificou no art. 28, que, portanto, continua a configurar crime.
Ocorreu mera despenalização, assim entendida como a ausência de previsão, para o tipo, de pena
privativa de liberdade como sanção" (HC 406.905/SP, Rel. Ministro Felix Fischer, Quinta Turma,
julgado em 7/11/2017, DJe 13/11/2017)" (AgRg no HC 623.436/SC, Quinta Turma, Rel. Min. Ribeiro
Dantas, DJe de 17/12/2021).
Em casos dessa natureza, muito embora não se imponha a prisão em flagrante, é obrigação do policial
conduzir o autor do fato diretamente ao juízo competente ou, na falta deste, à delegacia, lavrando-
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se, neste caso, o respectivo termo circunstanciado e providenciando-se as requisições dos exames e
perícias necessários, nos termos do artigo 48, §§ 2º e 3º, da Lei n. 11.343/2006.
Cumpre ressaltar, ainda, que para a configuração do delito de corrupção ativa, a norma penal sequer
exige que o ato de ofício tenha sido efetivamente praticado, até porque, em se constatando que o
funcionário retardou ou omitiu ato de ofício, ou o praticou infringindo dever funcional, incidirá a
causa de aumento de pena prevista no parágrafo único do artigo 333 do Código Penal.
Processo: AREsp 2.007.599-RJ, Rel. Min. Jesuíno Rissato (Desembargador convocado do TJDFT),
Quinta Turma, por unanimidade, julgado em 3/5/2022.
COMENTÁRIOS DO CAOCRIM
Importante acrescentar, em acréscimo ao que decidido pelo STJ, que a existência da corrupção ativa
independe da passiva, isto é, a bilateralidade não é requisito indispensável (RHC 70.059/GO, Rel. Min.
Sebastião Reis Júnior, DJe 4/11/2016), podendo apresentar-se de maneira unilateral (só a ativa ou só
a passiva)1.
“Perante o nosso Código atual, a corrupção nem sempre é crime bilateral, isto é, nem sempre
pressupõe (em qualquer de suas modalidades) um pactum sceleris. Como a corrupção passiva já se
entende consumada até mesmo na hipótese de simples solicitação, por parte do intraneus, da
vantagem indevida, ainda que não seja atendida pelo extraneus, assim também a corrupção ativa se
considera consumada por parte do extraneus, pouco importando que o intraneus a recuse” (Direito
Penal – Parte Especial v. 9, p. 429).
1. Somente na modalidade “receber”, da corrupção passiva, o crime será bilateral, pois só é possível o agente “receber”
o que foi “oferecido” por terceiro. Nesse sentido: “(...) Rejeitada a tese da ausência de bilateralidade entre ‘oferecer’
e ‘receber’ vantagem indevida (...)”. (STF, 1.ª T., HC 83.658/RJ, j. 29.06.2004).
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INFORMATIVO 735-STJ
DESTAQUE:
Dadas as peculiaridades do caso concreto, admite-se que ao réu primário, condenado à pena igual
ou inferior a 4 (quatro) anos de reclusão, seja fixado o regime inicial aberto, ainda que negativada
circunstância judicial.
A despeito de o § 3º do art. 33 do Código Penal dispor que para a escolha do modo inicial de
cumprimento da pena deverão ser observados os critérios do art. 59, não fica o julgador compelido
a fixar regime mais gravoso do que o cabível em razão do quantitativo da sanção imposta, ainda que
presente circunstância judicial desfavorável.
Assim, embora a definição da pena-base acima do mínimo legalmente previsto autorize, nos termos
do art. 33, § 3º, do Código Penal, a fixação do regime inicial imediatamente mais grave do que o
estabelecido em razão do quantum da pena aplicada, nada impede que o julgador deixe de
recrudescer o modo prisional se entender que aquele cominado ao montante da pena imposta se
mostra suficiente à reprovação do delito.
Processo: REsp 1.970.578-SC, Rel. Min. Olindo Menezes (Desembargador convocado do TRF1ª
Região), Sexta Turma, por maioria, julgado em 03/05/2022.
COMENTÁRIOS DO CAOCRIM
Após ser fixada a reprimenda definitiva, o juiz determinará, na própria sentença, o regime inicial para
seu cumprimento.
Trata-se de etapa importante na missão de individualização da pena, devendo ser analisada também
à luz do artigo 112 da Lei de Execução Penal, que impõe o sistema progressivo de cumprimento da
sanção privativa de liberdade. Presentes os requisitos subjetivos e objetivos, o condenado migra do
regime fixado na sentença para outro, menos rigoroso. Conclusão: o regime estampado na sentença
é apenas o inicial (e não o regime de cumprimento integral da reprimenda).
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O juiz atenderá aos seguintes fatores para identificar o regime inicial mais justo (e coerente com os
fins da pena):
O tema central da decisão em comento reside no fato de ser possível ao juiz, apesar da negativação
de circunstâncias judiciais, ao contrário do que ocorre quando reconhecida a agravante da
reincidência, não recrudescer o regime prisional. Confere-se ao julgador a faculdade - e não a
obrigatoriedade - de recrudescer o regime prisional.
INFORMATIVO 735-STJ
DESTAQUE:
Não se olvida que esta Corte firmou a orientação de ser imprescindível, nos termos dos arts. 158 e
167 do CPP, a realização de exame pericial para o reconhecimento das qualificadoras de escalada e
arrombamento no caso do delito de furto (art. 155, § 4º, II, do CP), quando os vestígios não tiverem
desaparecido e puderem ser constatados pelos peritos.
Contudo, importa ressaltar a orientação de que, "'excepcionalmente, quando presentes nos autos
elementos aptos a comprovar a escalada de forma inconteste, pode-se reconhecer o suprimento da
prova pericial [...]'(AgRg no HC 556.549/SC, Ministro Reynaldo Soares da Fonseca, Quinta Turma, DJe
1/3/2021)" (AgRg no HC 691.823/SC, Ministro Sebastião Reis Júnior, Sexta Turma, DJe 30/9/2021).
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No caso, a circunstância qualificadora foi comprovada pela prova oral, inclusive pela confissão do
próprio réu, além da existência de laudo papiloscópico que identificou impressões digitais no local
apontado pela vítima como sendo o local onde o réu pulou o muro.
Processo: AgRg no REsp 1.895.487-DF, Rel. Min. Antonio Saldanha Palheiro, Sexta Turma, por
unanimidade, julgado em 26/04/2022, DJe 02/05/2022.
COMENTÁRIOS DO CAOCRIM
Art. 171. Nos crimes cometidos com destruição ou rompimento de obstáculo a subtração da coisa,
ou por meio de escalada, os peritos, além de descrever os vestígios, indicarão com que instrumentos,
por que meios e em que época presumem ter sido o fato praticado.
Em que pese ser peremptório o dispositivo, ele deve ser interpretado em consonância com o disposto
no art. 167 CPP, sendo possível a elaboração do exame de corpo indireto por meio de testemunhas,
oitiva da vítima e, em nossa compreensão, mesmo pela confissão do réu.
4- Tema: Sexta Turma confirma decisão que negou progressão especial de regime a mãe presa que
não tem guarda do filho
Notícias do STJ
Por maioria, a Sexta Tuma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) confirmou decisão do Tribunal de
Justiça de Santa Catarina (TJSC) que negou a progressão especial de regime de cumprimento de pena
a uma mulher condenada por tráfico de drogas, pelo fato de que ela não tem a guarda de seu filho
menor de 12 anos. Esse tipo de progressão está previsto no artigo 112, parágrafo 3º, da Lei
7.210/1984 (Lei de Execução Penal).
De acordo com o colegiado, o caso não se amolda aos objetivos da legislação, relacionados à
preservação da saúde física e emocional da criança durante a primeira infância.
Segundo o processo, o TJSC manteve a decisão do juízo de execução, que revogou a progressão
especial sob o fundamento de que a apenada, além de não ter a guarda do menor há cerca de três
anos, fez visitas esporádicas ao filho antes de ser presa.
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A Defensoria Pública impetrou habeas corpus no STJ, alegando que o Judiciário não pode criar essa
restrição, pois a lei não condicionou a progressão especial à manutenção da guarda da criança. Após
o ministro Sebastião Reis Júnior, relator, negar o habeas corpus, a defesa recorreu para que o caso
fosse submetido à turma julgadora.
Acolhido pela maioria do colegiado, o voto do relator destacou que, segundo o acórdão recorrido, a
mulher se dedicou a atividades ilícitas após entregar o filho para a avó paterna, depois que o pai foi
morto durante perseguição policial.
Alinhado com o precedente da corte (RHC 152.552), o ministro observou que a circunstância de a
criança estar sob os cuidados da avó é fundamento idôneo para justificar a não concessão da
progressão especial.
"Não bastasse o genitor da criança ter sido morto em perseguição policial, a sentenciada optou por
seguir o mesmo caminho, ao envolver-se com o crime de tráfico e delitos correlatos, ao invés de se
fazer presente na vida do menor que já perdeu o pai", afirmou.
COMENTÁRIOS DO CAOCRIM
O § 3º do art. 112 da LEP, inserido pela Lei 13.769/18, disciplina de forma específica a progressão de
regime para a apenada mulher gestante, mãe ou responsável por crianças ou pessoas com
deficiência, estabelecendo os seguintes requisitos cumulativos:
IV – ser primária e ter bom comportamento carcerário, comprovado pelo diretor do estabelecimento;
A fração de pena a ser cumprida (1/8) é menor do que a fração mais benevolente do caput do art.
112 (16%). E essa fração mínima (1/8) deve ser observada, mesmo em se tratando de crimes
hediondos e equiparados.
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O que decidiu o STJ no caso em exame é que, sem desconsiderar o espírito da lei, a aplicação da
benesse pressupõe que a criança, na sua criação, dependa da mãe, não sendo suficiente a
comprovação da maternidade. A Corte observou que a circunstância de a criança estar sob os
cuidados da avó é fundamento idôneo para justificar a não concessão da progressão especial.
"Não bastasse o genitor da criança ter sido morto em perseguição policial, a sentenciada optou por
seguir o mesmo caminho, ao envolver-se com o crime de tráfico e delitos correlatos, ao invés de se
fazer presente na vida do menor que já perdeu o pai”.
Vale lembrar que o § 4º do art. 112 – também inserido pela Lei 13.769/18 – estabelece que o
cometimento de novo crime doloso ou falta grave implica “a revogação do benefício previsto no §
3º”, ou seja, provoca a regressão de regime. Sem implicar na violação do princípio da presunção de
inocência (ou de não culpa), não se exige – assim como ocorre na regressão disposta no art. 118 da
LEP – sentença condenatória transitada em julgado, bastando prova, no incidente próprio, de que a
condenada praticou crime ou fato definido como falta grave.
Dada a redação do § 4º do art. 112, uma dúvida pode surgir: “revogação do benefício” quer dizer
apenas a regressão de regime ou também a impossibilidade de que nova progressão seja concedida
com base nas regras mais amenas? Trata-se, pensamos, de vedação a nova progressão de regime
com base no § 3º do art. 112. Caso a condenada cumpra os requisitos do § 3º, progrida de regime e
cometa novo crime ou falta grave, deverá regredir e cumprir os requisitos gerais – da LEP – para que
possa progredir de regime novamente. Assim é porque não faria sentido se referir a “revogação do
benefício” se a intenção fosse apenas a regressão, que já é uma consequência necessária do
cometimento de crime ou falta grave durante a execução da pena, como estabelece o art. 118, I, da
LEP. Como o § 3º do art. 112 estabelece uma forma de progressão especial, devem ser beneficiadas
somente as condenadas que se mostrem aptas à ressocialização, pois, caso contrário, não se justifica
o tratamento menos severo.
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1-Tema: Revisão de inquérito policial arquivado pelo Promotor de Justiça, mas ainda sem
apreciação judicial – não conhecimento.
Autos n.º 1537xxx-4x.2021.8.26.0625 – MM. Juízo da 1.ª Vara Criminal da Comarca de Taubaté
Investigado: FERRUCCIO FERNANDES BELLO
Vítima: Lilian June Fernandes da Cunha
Assunto: revisão de inquérito policial arquivado pelo Promotor de Justiça, mas ainda sem
apreciação judicial – não conhecimento.
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Ouvida a fls. 56, Lilian ratificou toda a versão apresentada na representação. Declarou que
as mensagens via whatsapp foram enviadas pelo investigado para o telefone coorporativo da clínica,
na qual trabalhava na época, razão pela qual apenas possui prints em seu aparelho celular particular.
Informou que referidas mensagens também foram lidas pela funcionária Maria das Graças Claro de
Souza. Quanto às ofensas praticadas de forma oral/pessoalmente, afirmou que não há testemunhas
a arrolar, visto que estava sozinha com investigado na ocasião.
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Maria das Graças Claro de Souza declarou que trabalhou por cerca de um ano no Centro
Médico Dr. Winter. Quanto à mensagem enviada pelo investigado para o whatsapp da clínica, dirigida
a Lilian, informou que foi a primeira pessoa que a leu, já que no momento de seu recebimento, estava
no computador e o whatsapp web estava logado. Que foi a única mensagem com conteúdo similar
que leu partindo do investigado e dirigida a Lilian. Disse que nunca presenciou FERRUCCIO ofendendo
Lilian pessoalmente. Afirmou que tinha prévio conhecimento de que Lilian tinha uma deficiência,
bem como que, antes do envio da mensagem em questão, já havia informado ao investigado que
Lilian tinha alguma deficiência, uma vez que ele já havia reclamado dela anteriormente (fls. 57).
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indicar que tivesse ele feito essa crítica vinculada à condição invocada de deficiência de
desenvolvimento.
Ressaltou que nem mesmo a intenção de demitir a ofendida da função por ela exercida tinha
relação com a alegada deficiência, mas sim com uma suposta ausência de interesse e
responsabilidade em seu exercício.
Apontou, ainda, que não há nos autos prova de que a ofendida realmente sofre dos males
que constaram em seu termo de declarações ou, ainda, que estas doenças possam ter alguma relação
com os problemas constatados pelo investigado no exercício das funções a ela confiadas.
De outra parte, quanto à injúria qualificada imputada ao investigado, destacou que, além de
não haver nenhuma testemunha a respeito, não se trouxe aos autos nenhum dado ou circunstância
em que teria sido praticada, razão pela qual não vislumbrou elementos suficientes para a
caracterização da justa causa para o prosseguimento da persecução penal (fls. 70/71).
A ofendida, por intermédio de seu advogado, peticionou nos autos e manifestou sua
discordância em relação a promoção de arquivamento do feito, requerendo, alternativamente, a
declaração da nulidade do pedido do arquivamento, alegando fundar-se em percepções falsas, com
a abertura de nova vista ao Ministério Público para oferecimento de denúncia ou que o procedimento
investigativo seja submetido à instância superior do Ministério Público para revisão do
arquivamento, diante da existência de elementos suficientes de autoria e materialidade delitiva (fls.
72/77).
A ofendida novamente peticionou nos autos, por meio de seu advogado, requerendo a
remessa do feito à Procuradoria-Geral de Justiça (fls. 83/89).
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A Culta Magistrada, então, determinou a remessa dos autos a esta Chefia Institucional, com
base no art. 28, § 1º, do CPP, sem apreciar o pedido de arquivamento formulado pelo Ministério
Público. (fls. 90).
É o relatório.
Importante compreender, ainda, que a suspensão determinada pela liminar do Min. Luiz
Fux não se refere apenas ao caput do art. 28 do CPP, o que tornaria aplicável o § 1º do art. 28
acrescentado pela Lei n. 13.964/2019, que trata da possibilidade de recurso em face do
arquivamento pela vítima ou por seu representante legal.
Pelo contrário, a fls. 35 da r. decisão do Min. Luiz Fux, proferida na ADI 6299, consta o
seguinte:
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Nota-se, assim, que o procedimento que trata do arquivamento do inquérito policial previsto
no art. 28 do CPP – atualmente revogado pela Lei n. 13.964/2019 – continua em vigor.
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Como se sabe, no revogado art. 28 do CPP, mas que continua em vigor, o arquivamento de
inquérito policial promovido pelo Promotor de Justiça deve passar pelo crivo do magistrado –
homologando-o ou não; in casu, o MM. Juiz não exerceu o necessário controle a respeito do
arquivamento, deferindo-o ou não, como ainda lhe compete.
Dessa sorte, cabe ao Poder Judiciário, observado o princípio da devolução, atentar para o
disposto no art. 28 do Código de Processo Penal, em sua redação original, ainda em vigor.
Diante do exposto, com a renovada vênia da MM. Juíza, deixa-se de conhecer desta remessa
e se promove o retorno dos autos à origem, para que tenha lugar a análise da promoção de
arquivamento dos autos, nos termos do art. 28 do CPP.
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