Escolar Documentos
Profissional Documentos
Cultura Documentos
ESTÉTICA DA RECEPÇÃO
A segunda tese de Jauss, que afirma que a experiência literária do leitor pressupõe um
conjunto de conhecimentos prévios (literários ou de vida), contrapõe-se à possível crítica
de que seus métodos historiográficos baseados nessa experiência do leitor pudessem
resultar numa leitura impressionista, subjetiva. Ao demarcar o modo como o leitor
confere sentido ao texto, Jauss entende esse conhecimento prévio de mundo como
sistemas histórico-literários de referência trazidos tanto pelo leitor quanto evocado pelas
obras. O sistema histórico-literário, que abrange todas as convenções literárias, é utilizado
pelo leitor em cada obra lida, e recebe o nome de horizonte de expectativa.
A terceira tese de Jauss propõe a noção de distância estética, que é entendida como o
afastamento entre o horizonte de expectativa preexistente no leitor e o horizonte de
expectativa suscitado por uma nova obra. Assim, a curta distância estética, por exemplo,
entre o horizonte de expectativa do leitor e o da obra, faz com que ela se acomode ao
horizonte de expectativa do leitor, aproximando-se do que Jauss chama de arte ligeira.
Esse é o caso de best-sellers e romances de banca de jornal, cujas convenções e sistemas
literários não se alteram. De outro modo, quando o horizonte de expectativa da obra se
afasta do horizonte do público leitor, o valor estético da obra tende a ser maior, pois esta
obra está propondo um novo horizonte, que força o público leitor à transformação de
seu próprio horizonte de expectativa, para que o horizonte antes desconhecido passe a
ser o sistema histórico-literário de referência para leituras posteriores.
Em sua quarta tese, Jauss tenta fundamentar seu método, posicionando-se contra os
métodos do objetivismo histórico nos estudos literários, para os quais o trabalho de
interpretação é um simples descortinar do sentido atemporalmente verdadeiro de um
texto. Procurando entender como os sentidos do texto são construídos ao longo da
história, Jauss vê a reconstrução do horizonte de expectativa de uma obra como uma
aspecto fundamental para essa construção de sentido. Para ele, a própria consciência que
interpreta um texto (leitor, críticos) está envolvida num processo histórico que afeta o
modo com esse texto é lido. Para explicar esse fenômeno, Jauss empresta um conceito de
Gadamer, a história do efeito, e afirma que o texto seria a resposta a perguntas feitas pelo
público, e que para entender o sentido de um texto-resposta, seria necessário
compreender a pergunta feita. Para tanto, é necessário também que o horizonte de
expectativas da obra e do público seja reconstruído.
Ao descrever o caráter diacrônico de seu projeto na história literária, Jauss, em sua quinta
tese, entende que o lugar de uma obra na série literária não pode ser determinado apenas
em razão de sua recepção inicial, baseando-se no contraste entre velho e novo no
momento de sua aparição. Não se trata, para ele, de ver a história literária como sucessão
de obras que tenham alcançado um ápice no interior de um sistema. A função de uma
obra depende, também, da história das recepções de um texto. Se o valor de uma obra
não é percebido no momento de sua recepção, devido à distância estética entre o
horizonte de expectativa da obra e o do público leitor, talvez seja necessário um longo
processo de recepção para que a obra seja compreendida.
Jauss afirma, em sua sexta tese, que deve-se levar em conta a leitura de uma obra no
momento de seu aparecimento, num movimento sincrônico a partir de critérios do
presente, além de serem lidas a partir de suas sucessivas recepções. Relacionar a obra ao
seu momento significaria reconstituir o horizonte de expectativa a partir do qual é
recebida como atual ou inatual, como ultrapassada ou perene.
Em sua proposta de um novo tipo de história literária, Jauss acaba por propor novas
categorias para se pensar o que é a literatura. Se os textos são passíveis de diferentes
recepções, devido aos diferentes públicos que os lêem no tempo e no espaço, o status
desses textos também se modifica, o que força a reformulação dos critérios que definem
os textos literários. Porém, segundo Zappone, a teoria de Jauss esbarra em um problema,
a caracterização do leitor. O leitor idealizado por Jauss é um leitor com habilidades muito
refinadas de leitura, uma vez que ele precisa ter um conhecimento prévio de referências,
de diferentes gêneros e do uso estético e prático da linguagem. Trata-se, portanto, de um
leitor plenamente integrado nas estruturas do campo literário. Assim, a teoria da
Recepção proposta por Jauss abarca apenas em parte o aspecto social e histórico que
pretende abranger, ainda que suas idéias introduzam de forma mais sistemática a
discussão sobre o aspecto recepcional dentro dos estudos literários.