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Abril, 2017
Montes Claros/ MG
KEILA SANTOS
Abril, 2017
Montes Claros/MG
A MULHER NEGRA AFRICANA ESCRAVA: UMA
LEITURA DE CASA GRANDE & SENZALA
INTRODUÇÃO
Caio Prado Júnior, Gilberto Freyre e Sergio Buarque de Hollanda, dentre outros,
ícones da sociologia e historiografia brasileira, são habitualmente apresentados como os
pensadores que no século passado, maior influência exerceram sobre o pensamento
histórico em nosso país. A profissionalização do historiador brasileiro passou, assim, e
continua passando, pelo estudo detalhado desses pensadores da formação do povo
brasileiro, em torno dos quais surgiu uma profícua bibliografia apresentada em
inúmeras pesquisas, dissertações de mestrado, teses de doutorados, artigos em revistas
especializadas, biografias, seminários e conferências.
Gilberto Freyre, teórico selecionado para a presente discussão, é imediatamente
associado ao estudo da família, destacando, na clássica associação entre a casa-grande e
a senzala, as suas raízes patriarcais e, não menos importante, entre os sobrados e os
mocambos, a decadência do patriarcalismo na sociedade brasileira. De sua formação
acadêmica norte-americana, é possível destacar a influência da Sociologia e da
Antropologia, disciplinas que encaminharam sua intensa pesquisa em diversos tipos de
documentos e/ou fontes originais. Freyre fundamento os seus estudos em uma extensa
bibliografia internacional, textos de viajantes, crônicas descritivas da realidade, seguidas
de pesquisa em arquivos públicos e particulares (conventos, hospitais, colégios, papéis
particulares e jornais).
Publicada em 1933, a obra analisada neste trabalho, teve origem da intenção do
autor em estudar as raízes do Brasileiro e do seu povo, buscando interpretar alguns dos
aspectos mais significativos da nossa formação, tendo se tornado uma referência no
assunto. Casa Grande & Senzala trata dos registros étnicos e raciais nacionais, além da
formação pré-capitalista brasileira. A família patriarcal tem importante papel na obra,
sendo o ponto de partida para o desenvolvimento da obra. O papel da Casa Grande na
formação sociocultural brasileira e da Senzala, que seriaum complemento da primeira,
são objetos de destaque. Observa-se no decorrer da obra que Freyre busca mostrar a
influência do escravo, índio e português na estruturação da população brasileira.
A perspectiva do autor se diferencia da criada, por exemplo, por Oliveira Vianna, com
uma concepção voltada para um melhoramento do "patrimônio genético dos grupos
humanos", por meio de incentivos à imigração do europeu para o Brasil, enquanto
Gilberto Freyre analisa esse processo de miscigenação que deu origem ao povo
brasileiro que reconhecemos hoje e as suas implicações culturais.
Segundo o historiador José Carlos Reis, Casa grande & senzala é a obra de
interpretação do Brasil mais conhecida no país e mais traduzido e editado no exterior.
Sua obra é reconhecida como uma referência superior da ciência social pelos mais
importantes cientistas sociais do mundo sociais do mundo: L. Febvre, F. Braudel, R.
Berthes e outro. Entretanto, ele jamais aceitou ser classificado como um “especialista”
das ciências sociais, antropólogo, sociólogo ou historiador, e sempre se apresentou
como escritor ou ensaísta (Freyre, 1968). Sua obra foi um grande progresso para
conhecermos a história do Brasil. Em Casa grande & senzala Freyre penetra na
sociedade colonial brasileira e recria com criatividade a vida coletiva e afetiva da
sociedade açúcar.
Muito já se escreveu sobre o sociólogo Gilberto Freyre e suas obras, mas a partir
da nossa pesquisa percebemos que a obra Casa Grande & Senzala, mesmo com as
diversas críticas e questionamentos teóricos, ainda proporciona discussões importantes
para o ofício do historiador e, também da sociologia. Por isso, o nosso interesse pelo
tema.
Em Casa Grande & Senzala, a mulher africana é desmitificada como sendo a que
corrompe a vida sexual dos senhores brancos desde meninos, Freyre explica a diferença
da mulher negra africana e da escrava.Essa diferença está relacionada com as estruturas
da sociedade escravocrata nos trópicos. Formou-se uma sociedade déspota, sádica
através dessas relações entre senhores e escravos. Não seria de fato o negro que trouxe o
sadismo para o Brasil colônia, mas sim as relações entre senhores e escravos. Freyre
exalta a alegria dos africanos, como eram adaptáveis ao clima dos trópicos, mas não
seriam eles os depravados.
A escrava seria o símbolo de corrupção sexual para os conservadores patriarcais,
clérigo, autores, relatores, dos pobres moços aristocratas, Freyre afirma que desde
meninos estes já revelavam os sadismos em suas brincadeiras com outros
meninos/meninas que eram lhe dados de presente como brinquedos. A relação sádica
transformou a casa grande e a senzala em um covil de abuso. Freyre (pag. 400) relata
que muitas [...] negras eramentregues virgens, ainda molecas de doze e treze anos, a
rapazes brancos já podres das sífilis das cidades.
A depravação que ocorria no Brasil escravocrata deixou essas escravas a mercê
de doenças, principalmente a sífilis, essa depravação viciosa, sadista da sociedade
patriarcal tinham interesses absolutamente de poder, o poder econômico, pois quanto
mais gerassem os ventres das escravas aumentaria o capital do senhor, o poder de
autoridade, o poder infame do prazer com a passividade das escravas. A promiscuidade
patriarcal chega a ponto de casos de incestos, de sinhôs-moço da casa grande e
mulatinhas da senzala que seriam irmãos e teriam relações sexuais gerando outros
filhos, como infere Freyre: e que não tardasse em emprenhar negras, aumentando o
rebanho e o capital paterno. Se este foi sempre o ponto de vista da casa-grande, como
responsabilizar-se a negra da senzala pela depravação precoce do menino nos tempos
patriarcais? O que a negra da senzala fez foi facilitar a depravação com a sua docilidade
de escrava: abrindo as pernas ao primeiro desejo do sinhô-moço. Desejo, não: ordem
(FREYRE, pag. 456).
Todo contexto da historia da escravidão no Brasil esta associado ao exacerbado
sexo promiscuo atribuído a culpa a escrava. Freyre defende a ideia como já citado
anteriormente de que elas não teriam outra opção a não ser acatar as ordens deseus
donos.
Freyre (1933, pagina 462) contesta o professor antropólogo (NINA
RODRIGUES) que considerou a mulata um tipo anormal de superexcitada e também
refuta o escritor (JOSE VERÍSSIMO) que disse sobre a mestiça brasileira “um
dissolvente de nossavirilidade física e moral” afirmando que:
A verdade, porém, é que nós é que fomos os sadistas; o elemento ativo
na corrupção da vida da família; e moleques e mulatas o elemento
passivo. Na realidade, nem o branco nem o negro agiriam por si,
muito menos como raça, ou sob a ação preponderante do clima, nas
relações do sexo e de classe que se desenvolveram-se entre senhores e
escravos no Brasil. Exprimiu-se nessas relações o espírito do sistema
econômico que nos dividiu, como um deus poderoso, em senhores e
escravos. Dele se deriva toda exagerada tendência para o sadismo
característica do brasileiro, nascido e criado na casa-grande,
principalmente em engenho. (FREYRE, PÁGINA 462)
Ainda na obra, Gilberto Freyre, fala sobre as escravas de Minas Gerais no século
XVIII. De acordo com seus registros seriam elas uma finura de mulher de encantar
qualquer homem por sua beleza, dotes domésticos e também pelo sexo tornando se
preferidas como donas de casas, amantes, mucamas e cozinheiras. Havia de certo na
relação sadista entre senhores escravas em alguns casos uma excessiva
dependência Segundo Freyre conhecem-se casos no Brasil não só de predileção, mas de
exclusivismo: homens brancos que só gozam com negra. Para aqueles que tomavam
escravas como suas esposas amasiavam-se não concretizando o casamento religioso,
devido às leis portuguesas e preconceitos religiosos.
A mulher negra trouxe para a família patriarcal sua influência, religiosa que
cultua os deuses orixás, a sua sensualidade na dança, até mesmo despropositada de
excitação sexual e sim como um rito de sua cultura, sincretizou-se com o cristianismo a
fé. Na culinária enriqueceu a cultura alimentar colonial tão pobre de proteínas, com seus
temperos deixou na historia pratos até os dias de hoje saboreados como vatapá, a
feijoada, azeite de dendê. Foram elas que educaram os meninos das casas grande que
lhe ensinaram as primeiras palavras que foi diante de seu analfabetismo a interlocutora
de muitas histórias.
Freyre destaca ainda as amas em sua obra, retratando-as como mulheres que não
poderiam passar despercebida na família patriarcal. Suas influência na vida dos
senhores, senhoras, crianças, sinhazinhas da casa grande foi intensa. Elas seriam
responsáveis pela primeira educação da criança, o linguajar, os mimos, higiene, o
aleitamento seriam elas que contariam as sinhás-moças as primeiras histórias de amor
sendo suas confidentes, essas mulheres escravas negras tornavam-se muitas vezes
senhora de respeito no seio patriarcal, como relata FREYRE:
Quanto às mães pretas, referem às tradições o lugar verdadeiramente
de honra que ficavam ocupando no seio das famílias patriarcais.
Alforriadas, arredondavam-se quase sempre em pretalhonas enormes.
Negraa quem se faziam todas as vontades: os meninos tomavam-lhe a
bênção; os escravos tratavam-nas de senhoras; os boleeiros andavam
com elas de carro. E dia de festa, quem as visse anchas e enganjentas
entre os brancos de casa, havia de supô-las senhoras bem-
nascidasnunca ex-escravas vindas da senzala. (FREYRE 1933 PAG
435)
CONCLUSÃO
CARVALHO, Maria Alice de Rezende. “Casa grande & senzala e o pensamento social
brasileiro”. In: Gilberto Freyre. Casa grande & senzala. 2002. p. 887-908.
FREYRE, Gilberto. Casa-Grande & Senzala. Editora Record, Rio de Janeiro, 1998, 34ª
edição, pág. 372.
SOUZA, Jessé. Gilberto Freyre e a singularidade cultural brasileira. Tempo Social; Rev.
Sociol. USP, São Paulo, 12(1): 69-100, maio de 2000. Disponível em:
http://www.scielo.br/pdf/ts/v12n1/v12n1a05.pdf
VAINFAS, Ronaldo. “Sexualidade e cultura em Casa grande & senzala”. In: Gilberto
Freyre. Casa grande & senzala. Idem nota 2 p.771-785.