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Alicia B. D. de Lisondo
Organizadora
2003
AS AUTORAS
Este Projeto - Um Abrigo Psíquico foi escrito por psicólogas e psicanalistas com vasta
experiência na área clínica e na área das investigações psicanalíticas no campo dos infans,
crianças e adolescentes. Elas fazem parte da equipe do Serviço de Psicologia Psicanalítica, na
Unidade de Atendimento Infantil (UAI) do Centro de Controle de Investigação Imunológica Dr.
Antônio Carlos Corsini.
As autoras pretendem que este trabalho seja explorado por profissionais da área da saúde
e contribua para um enriquecimento pessoal na compreensão mais profunda sobre a
complexidade psiquê e soma (mente e corpo), juntamente com o relacionamento humano na
intimidade da vida institucional evidenciando a questão da subjetividade do ser em formação.
2. Avaliação Psicanalítica
4. Grupo Operativo
5. Acompanhamento Terapêutico
6. Grupo de Pais
Alicia Lisondo
(da poesia Cruz e Luz)
ÍNDICE
“... Maldição!
Ter vindo ao mundo para endireitá-lo”. (p. 47)
“Teria sido melhor que a minha mãe não me houvesse dado a luz.” (p. 75)
Hamlet
Pretendemos pensar sobre o abrigo para crianças vítimas daquela que é talvez a grande
epidemia do final do século XX e que infelizmente invade o século XXI ainda com a marca da
tragédia - embora já podendo contar com muitos avanços do campo médico -. Como toda
tragédia, essa também nos toca de maneira muito mais contundente quando nos deparamos com a
história de cada uma das crianças atendidas pelo Centro Corsini. Quando os números ganham
nomes, rostos, histórias e singularidades tomam imediatamente outra dimensão, a dimensão da
subjetividade. Pois bem, é justamente esta dimensão singular que mobiliza o olhar da psicanálise
e que orienta este projeto.
A psicanálise é a ciência e arte que no inicio do século revoluciona a epistemologia da
época quando descobre a dimensão inconsciente do ser humano. O mito do homem racional é
descentrado de sua hegemonia num cambio significativo e copernicano. Freud da voz ao infantil
vivo e presente na vida de todos . A sexualidade humana tem lugar de destaque nos primórdios da
vida mental e vida fora. A satisfação do bebê mamando no seio de sua mãe transcende a
necessidade biológica. Este primeiro modelo de relação afetiva, poética, misteriosa e estruturante
da vida humana tem sido motivo de inspiração na arte em todas as suas manifestações.
Sexualidade não é, portanto, sinônimo de genitalidade.
Cabe a Melanie Klein, a tripeira genial, segundo Lacan, descobrir o bebê presente em
todos nós. Com ela a psicanálise de crianças é consagrada com a sua força terapêutica e a
revolução dos paradigmas teóricos. Ao colocar brinquedos para ir ao encontro da criança lá onde
ela está; permite que outra linguagem se escute e veja na cena analítica. A criança faz ou deixa de
fazer usando o recurso da linguagem pré-verbal. Seu corpo na realidade, como o corpo do ator na
representação, é um palco expressivo, aquém e além da palavra. A caixa de brinquedos é o seu
alfabeto e assim conta, revela, nesse espaço sagrado do consultório para, com, contra ou dentro
da pessoa da analista afetos, fantasias, pensamentos, figurações que permitem o contato com esse
ser em formação (Klein, 1930,1952,1959) .
Bion, seu seguidor é o analista do pensamento. Ele enraíza no encontro do feminino-
continente e do masculino-conteúdo, a preciosa capacidade humana do pensar. Não há
conhecimento divorciado do mundo emocional. Aqui jaz a divisória de águas entre a psicanálise e
o cognitivismo. O pensamento humano não é só obra de um sistema neuronal. É preciso um
aparelho psíquico para poder pensar, um espaço mental esculpido por obra de uma mãe com
revêrie que exige a presença da função paterna (Protti, 2001).
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Ver item “Porque o espelho – seu sentido e uso” neste trabalho.
Figura 1 - “Adoración del Niño” - Corregio
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A relação dos cuidadores com as crianças e adolescentes está regida pelas leis trabalhistas
que nem sempre contemplam a especificidade, complexidade e exigências do trabalho necessário
para criar a vida mental. O sistema trabalhista atual de turnos de oito ou doze horas e conseqüente
alternância permanente dos funcionários para cobrir o dia e a noite dificulta a criação de uma
estrutura psíquica pelo infans. A qualidade da relação que se cria entre os cuidadores e os
hospedados é fundamental e ela depende da disponibilidade e qualidade afetivas do cuidador. O
contato mental, a partir da interpretação afetiva dos cuidados sensoriais, estrutura a vida psíquica.
Todos os sentidos são conclamados a orquestrar o reconhecimento do cuidador através da
voz, do olhar, do contato físico, do perfume e das sensações proprioceptivas e cinestésicas. Ante
o “desaparecimento” do cuidador o infans pode viver angústias catastróficas, de liquefação, de
precipitação, sentindo-se despedaçado e desintegrado. O desaparecimento do cuidador é vivido
como definitivo afinal, ele não tem ainda a representação psíquica do outro ou a capacidade de
simbolizar ou pensar, ficando impedido de compreender a noção de transitoriedade que implica
em noções de tempo e espaço. Para o infans o cuidador não vai e volta como quando é capaz de
viver a experiência afetiva de dizer “tchau”, de brincar de despedida quando a mamãe vai
embora, ou o típico jogo de esconde- esconde.
Remetemo-nos a experiência do “fort-da” relatada por Freud (1920). Seu neto, na
ausência da mãe, balbuciava esses sons que no alemão se assemelham ao som das palavras
usadas para se despedir e para o reencontro enquanto lançava um carretel segurado por uma
corda. Ele lançava o carretel para, em seguida, recuperá-lo puxando-o pela mesma corda. Esta
experiência foi sabiamente interpretada por Freud como a representação de uma mãe que vai e
volta. Na brincadeira, contudo, a criança adquire o controle sobre uma situação que na realidade
lhe escapa completamente vivenciando-a ativamente buscando suplantar a angústia
experimentada pela passividade com que vivencia a experiência que dá origem à brincadeira.
Pedimos ao leitor que guarde esta experiência em mente para compreender a importância do
brincar na expressão das vivências psíquicas e a elaboração das angústias. O espaço do percurso
do carretel é sagrado assim como qualquer templo religioso (Luzuriaga, 1970).
A cada afastamento repete-se uma situação traumática que inunda o self primitivo e frágil
de uma angústia indizível, irrepresentável que esfacela o ser em formação num encadeamento de
traumas cumulativos. Contra essas experiências o psiquismo precisa de um escudo protetor e esta
é uma das funções maternas2: dosar a estimulação prevenindo a perigosa sobre-excitação. Para o
bebê o mundo é o que ele pode apreender sensorialmente.
A constância da presença atenta e capaz de contato mental do cuidador e a regularidade
no exercício de sua função não garante, mas é condição necessária e de fundamental importância
nos primórdios da vida mental (Houzel, 1997). O cuidador alfabetiza emocionalmente o bebê ao
interpretá-lo: “Você está bravo porque demorou a mamadeira” ou “Você está alegre porque
encontrou o ursinho” (Ferro, 1977).
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Observe-se que não dizemos funções da mãe mas sim, função materna. A possibilidade do exercício dessa função, em geral atribuída a mãe,
existe para aquele capaz de identificar-se com o bebê
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O cuidador é o Outro num vínculo de amor, ódio e conhecimento. Quando dizemos ódio
referimo-nos a algo diferente de Thanatos ligado a destrutividade. A célula originária das
relações sociais é concebida entre o infans e o Outro capaz de criar sentido e fazer com que a vida
tenha sentido. O primeiro objeto estético, fonte de curiosidade, é o corpo, o rosto, e a mente do
cuidador a serem tocados, agarrados, cheirados, lambidos, enfim, explorados. O valor da vida
humana não depende da manipulação mecânica de um corpo coisa. O valor é dado pela atribuição
de sentido que o cuidador outorga. Ser a “majestade o bebê” é um passo necessário da regulação
narcísica na construção da auto-estima (Freud, 1914). A desilusão é um processo que deve vir
posterior e gradualmente.
Não pretendemos criar um ambiente sem falhas. Isso não é real nem mesmo para a criança
que se desenvolve num lar saudável e estável. As falhas ambientais, desde que aconteçam em um
momento apropriado permitem e promovem o crescimento.
A desilusão só pode vir no momento em que o bebê puder diferenciar eu e não-eu. Antes
disso qualquer desilusão é vivida como uma perda no próprio eu, como uma amputação cuja “dor
fantasma” é insuportável. A desilusão é necessária e deve ser lenta e gradual, do contrário, ela
adquire o estatuto de um trauma que só pode ser para sempre repetido sem ser jamais elaborado.
A transcendência da ordem material, a possibilidade de ir além da vida vegetativa, a
fundação do humano depende da formação do superego formado pela introjeção das figuras
parentais. São eles os responsáveis pela transmissão de valores sociais, culturais, éticos. A
filogênese palpita nesse superego que protege e condena. Por trás do simples gesto de oferecer
uma mamadeira o infans engole um mundo de valores e sentidos (Aulagnier, 1979).
Bion (1962), chama de “splitting forçado” o mecanismo ao qual recorre a criança vítima
de uma desilusão precoce: o seio é cindido entre, de um lado, a materialidade do leite e, de outro,
o amor, fonte de segurança, que recebe junto com o leite. A cisão vem no lugar da ilusão.
Não é suficiente, embora auspicioso, cuidar do nome para não estigmatizar o paciente
portador de HIV. Deixar de se referir a ele como “aidético” é, sem dúvida, importante, mas acima
disso está a necessária compreensão do infans com uma mente a ser parida num nascimento
psíquico. Este é o desafio e o sentido de um Serviço de Psicologia Psicanalítica para crianças e
adolescentes. Trata-se da construção da subjetividade de um ser humano para que não esteja
condenado a ser um morto em vida. Ainda que não haja um comprometimento anatômico,
enzimático, metabólico ou outras dificuldades orgânicas, as dificuldades psíquicas aparecem
como palco privilegiado para o desvelamento das falhas na estruturação do aparelho mental.
(Geissmann, 1993).
O cuidador proporciona um útero mental a um corpo pulsional, desejante. Aprende-se a
amar quando se é amado, aprende-se a pensar quando se é pensado, “aprende-se” a sonhar
quando se é sonhado, entra-se na linguagem quando se é interpretado pelo Outro e, fatalmente,
aprende-se a destruir, ou a refugiar-se no isolamento autístico quando o ser sofre a insuportável
dor da desintegração e/ou quando não se tem quem acuda a súplica do choro e/ou do esperneio,
quando se sofre a incapacidade de penetrar no coração de um Outro significativo. A angústia de
separação é catastrófica quando se impõe antes da necessária simbiose. O infans aninhado no
corpo da mãe forma uma envoltura psíquica que o infans vive como desgarramento, quando não
há modulação entre os encontros e as separações (Anzieu, 1987; Tustin, 1984). Quando se cai no
abismal vazio sem ter quem segure e ofereça sentidos verdadeiros para a vida. A angústia a qual
nos referimos encontra sua expressão em várias obras de arte tais como: “O grito” (fig.2).
“Não existo” (fig.3) é o desenho de um adolescente adotado aos 6 meses de idade após ter
vivido entre várias amas de leite, refugiado de canto em canto escapando de seu destino: a morte.
Em sua tribo de origem havia uma lei que não devia ser transgredida: quando uma mãe morria no
parto seu filho também devia morrer.
As falhas na estruturação da subjetividade são o portal das mais graves patologias:
autismo, psicose, perversões, psicopatias, problemas na aprendizagem, doenças psicossomáticas,
condutas anti-sociais, tais como: roubo, mentira ou homicídio. Há ainda, os casos de suicídio,
anorexia e outras das, assim chamadas, patologias do vazio (Rosenfeld, 1992). Esse é o risco
quando o abrigo não pode substituir a função materna e paterna (Lisondo, 2000). O
cumprimento de papéis pseudomaternais, e pseudopaternais podem significar um pseudopapel
de cuidado. Isto é, cuida-se da materialidade de um corpo que exige enorme dedicação porque
sobre ele paira o fantasma da morte, mas se pode negligenciar a construção da vida psíquica
quando o infans não é visto, compreendido, aninhado, segurado corpo a corpo, abrigado na mente
e no coração. Ele precisa ser fonte de inspiração das canções de ninar, do brincar e da poesia
sendo, assim, interpretado como ser humano. Cuidar da vida de um ser humano é algo maior que
o sinistro vírus do HIV, a nova praga de Tebas ( Lisondo, 2002) .A sintonia de um cuidador com
um infans pode evocar metáforas artísticas como a de bailarinos, ou da soprano na ópera que dá
voz ao coração.
O desfile de personagens inconstantes manipulando estes seres a cada turno de trabalho só
permite identificações superficiais, de extrema fragilidade. O inconsciente é atemporal e não
compreende a leis trabalhistas. Assim como o choro, o desespero e as agonias intensificam-se
com um cuidador estranho a cada hora. Dessa agonia, o “falso self” será o corolário, a forma
possível da criança proteger-se (Winnicott, 1971).
O “falso-self” comporta desde uma dimensão saudável e adaptativa até uma dimensão
patológica. Trata-se de uma adaptação do bebê às falhas ambientais. Por vezes, a criança sente
que essa proteção é de tal modo necessária que se torna difícil a vivência de um “self verdadeiro”
provocando um sentimento perturbador de irrealidade, de não existência. Isso acontece quando o
“falso self”, originário da necessidade de proteção de um “self verdadeiro”, teme tanto às
agressões ambientais que permanece em ação todo o tempo. Este é o sentido das armaduras
defensivas, a “segunda pele”, a concha autística (Huberman de Chiappini, 1997; Bick, 1968;
Tustin, 1984, Franch, 2001) . Desse modo, o verdadeiro contato humano, nutriente da vida
psíquica, fica absolutamente prejudicado. O que torna tal dificuldade mais preocupante é que a
criança pode parecer aparentemente adaptada. Assim, a criança desenvolve um “falso self”
(Winnicott, 1949), uma mente cuidadora que visa à suplantação das falhas ambientais. A criação
desse “falso self” impõe um grave prejuízo ao processo de integração deixando o campo livre
para as patologias psicossomáticas.
O ideal familiar e/ou institucional da criança independente, auto-suficiente, sobre
adaptada, “boazinha”, “bem comportada” e “obediente” pode inibir a expressão dos afetos, os
traumas, as perdas, os lutos onde está em destaque a orfandade, a morte real dos progenitores. O
sofrimento impingido pela doença não pode dessa forma ser expresso.
Na gênese da patologia somática está o congelamento na circulação dos afetos, o déficit
representacional, a incapacidade para simbolizar, a escravidão a um mundo primitivo e concreto.
Ser doente e ao menos ser alguém no apelo desesperado para existir.
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Figura 3 - “Não Existo” - realizado por uma criança da UAI
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Figura 4 - "L’Implorante ou La Suppliante" - Camille Claudel, 1900
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Pai - PROTEÇÃO
RÊVERIE À MÃE
HOLDING
SER OBJETO DE RIVALIDADE NO TRIÂNGULO EDÍPICO
TRABALHO PSÍQUICO:
- INVESTIMENTO LIBIDINAL AO BEBÊ
- LIMITAÇÃO DA LOUCURA MATERNA
- GARANTIA DE TRANSFORMAÇÃO DA LOUCURA MATERNA
- AFIRMAR A POTÊNCIA FÁLICA NA TRIANGULAÇÃO,
ATRAVÉS DO BEBÊ
- INTERDICÇÃO
- Importância do pai real (Salas) e simbólico (Dor) -
- A presença do pai e seu investimento pulsional em relação ao bebê são
fundamentais para a constituição psíquica.
- A função paterna é um falo ordenador.
- O pai separa a simbiose original na díade inicial.
- Propicia a mudança catastrófica para caminhar da dependência até a
independência, da fusão até a separação.
- O pai permite elaborar a relação dual e especular da mãe com o bebê.
- Aparece como o terceiro, o Outro da mãe (Green), para separar o bebê
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Figura 5 - San Cristóbal, 1637 (São Cristóvão) - José de Ribeira
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2- O pai diz para a criança: " não dormirás com tua mãe".
O pai diz para a mãe: "o filho não é o FALO".
- O pai interdita, proíbe, diz não, coloca os limites necessários para o
desenvolvimento mental.
- O pai permite o encontro com a lei, o outro do outro.
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Pai :
- faz suportável a renúncia incestuosa.
- recebe impulsos deslocados da mãe.
- permite o acesso a ambientes mais amplos (Dor).
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condição humana.
Lei: - Parentesco
- Proibição do incesto: Ligação filial simbólica no SOBRENOME
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incestuosa é insubstituível.
- O ego, o objeto e o auto-erotismo constituem uma unidade.
- A mãe oferece o sorriso diferente do “seio bom”no trabalho de des-
corporalização (Green).
- O bebê internaliza a “estrutura enquandrante da mãe”- superfície de
representação -.
- A mãe precisa consentir a separação (Green).
- A “loucura materna” é uma loucura “normal”. É a expressão de toda a
onipotência que a mãe tem sobre o bebê.
Pensamento Kleiniano
Posição autista-contígua (Ogden) P.S. P.D. ( Ogden integra o
pensamento de Bion e Winnicott).
Posição adesiva (E. Bick) P.S. P.D.
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- Da barreira de contato.
- Do véu da ilusão, véu de conjecturas.
- A função do rêverie abre a Cc. Rudimentária do bebê que é sensorial.
- A parceria mãe - bebê é fonte e matriz do crescimento.
- A Cc. de si mesmo não é sensorial.
- Cc. órgão que permite a percepção básica da qualidade psíquica do “si
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mesmo”.
- A mãe transmite, ensina e sustenta a função alfa do bebê.
- Ela inicia a atividade K. da mente e capacita o bebê para a mudança
catastrófica.
- Ensina ao bebê a brincar e criar a tolerância à frustração numa
misteriosa alfabetização emocional (Ferro).
- Ensina à mente do bebê a qualidade onírica.
- Permite ao filho diferenciar seu sexo e renunciar ao outro.
- A mãe cria uma relação narcísica num vínculo endogâmico. A relação
incestuosa é insubstituível.
O Pensamento de Winnicott
A mãe suficientemente boa e a preocupação materna primária: ambiente
facilitador.
- Propicia o estado fusional do bebê com a mãe (narcisismo primário de
Freud).
- Garante o sentimento da continuidade do SER do bebê.
- Permite o desenvolvimento do verdadeiro self no interjogo de ilusão e
desilusão.
- Permite o viver criativo e o gesto espontâneo, manifestações do
verdadeiro self.
- Permite a construção do objeto subjetivo.
- O papel de espelho do olhar da mãe. Concordância e harmonia entre o
estado interior do bebê e a expressão do olhar da mãe.
- A mãe exerce a função de “holding”.
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entre o pai
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Jocasta aparece nesta versão como omissa. O filho não nasce de um encontro estético,
genital e consciente, numa penetração afetiva. Nasce de uma atuação, numa noite de embriaguez.
A perda do enamorado não é tolerada, ela se apropria de Laio. Será que o filho não seria o seu
falo? A perpetuação da fantasia de completude incondicional? Jocasta não reconhece Édipo como
filho no leito nupcial. Ela não faz o trabalho de elaboração do luto pela morte do marido. Não
pode elaborar a perda da juventude e aceitar a passagem geracional na sua meia idade quando o
filho ocupa o lugar de marido no leito nupcial. Ela não alimenta a mente de Édipo com a verdade
possível. Ela, como Laio, obstaculiza o caminho do saber possível na rede de intrigas, mentiras e
segredos. Estes pais eram pais mortos desde sempre, parafraseando Green (1994). A transgressão,
o filicídio, a adoção, os segredos e mentiras regem o destino trágico do herói antes do seu
nascimento biológico.
Que casal é este como modelo de relação afetiva e social? Édipo está travado na procura
de sua verdade histórica, guardada na sua cripta mental (Abraham; Torok, 1995). Ele não pode
pensar sobre si mesmo - desliga os fatos e os símbolos - nem alinhava com a função narrativa os
elos (elementos alfa), que lhe permitiriam alcançar a verdade para promover a mudança
catastrófica (Bianchedi,1999) na sua história. Ele evita a ansiedade catastrófica (Meltzer, 1984)
que o precipita à catástrofe.
Pensar é fazer relações (Segal, 1992) e o primeiro modelo de relação afetiva é o casal
parental. Jocasta erotiza o filho narcisicamente e o induz ao incesto. Ela não é mensageira da
relação erótica sexual e genital com o marido porque não há o estatuto de um outro diferente- seu
homem- no mundo interno (Athanasiu, 1982).
Laio estava condenado à infertilidade segundo a voz do oráculo de Delfos. Ele é o pai
narcisista, onipotente, que decide tiranicamente sobre a vida e morte do filho. O pai intruso que
se apropria de seu destino. Édipo é seu duplo narcisista, sem tempo e espaço psíquico próprio. O
único objeto narcisista para o pai e o filho é a mesma mulher: Jocasta. Ele não pode conceber um
projeto identificatório exogâmico, para que Édipo venha a ser um Homem. Laio intenta matar o
filho duas vezes. Após o nascimento e na encruzilhada existencial da passagem geracional,
provocando-o sem reconhecê-lo. O pé é novamente ferido. A angústia de precipitação
(Houzel,1991) − impensável e inominável −, do secreto filicídio na catástrofe psíquica primitiva
da não integração (Bick,1968; Winnicott,1956; Tustin,1984; Bion,1977; Bianchedi, 1999), é
reavivada.
A profecia oculta, o não dito, a mentira, (Bianchedi,1997) está na gênese do filicídio, a
partir da gestação e gerando a posterior adoção do herói. Ele perde as referências genealógicas ao
ignorar a identidade dos objetos edípicos. Os pais reais não só são pais desconhecidos como são
pais que não podem conceber um filho numa filiação simbólica. Os pais adotantes não instauram
uma relação simbólica de parentesco que possibilite a transcendência.
Os pais adotantes, Mérope e Pólibo, denegam a adoção, sem poder lidar com a dor mental
ante o luto pela perda do filho próprio pela esterilidade (Lisondo, 2002).
Laio e Jocasta, ao transgredir e desafiar a proibição divina, não podem aceitar a castração
estruturante denegando a lei divina e superior. Jocasta não aceita o rompimento do namoro, não
pode aceitar a separação.
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A prisão narcísica condena aos pais biológicos, adotantes e à Édipo e sua descendência ao
destino trágico. O pai amarra os pés e a vida a uma sinistra sepultura, tece o projeto
identificatório de um transgressor assassino sem perspectiva de alteridade humana, sem a criação
de um espaço psíquico potencial. A mãe é cúmplice da trama.
O bebê perde a função protetora da mãe e do pai. Não há uma relação simbólica de
parentesco. Édipo não pode construir a própria identidade. Ser homem como o pai, perder a mãe
como objeto erótico (Freud,1923) e, paradoxalmente, ser diferente do pai. Na adolescência, num
outro nascimento metafórico, a sexualidade humana é re-estruturada. Ele pergunta ao oráculo
sobre o por vir, o futuro, o destino, quando se depara com a evidência da adoção. A pergunta do
jovem e a resposta do Deus enigmaticamente silenciam a profunda questão inconsciente passada-
presente de sua origem, de seu nascimento. “Quem sou eu? De onde eu venho? (Freud,1913;
Lisondo,1996). Onde está a função paterna estruturante (Dor, 1998)? Onde está a função
materna capaz de criar uma mente ao nomear as agonias primitivas? ( Lisondo, A., 1992).
Numa outra versão do mito, Laio está proibido de conceber um filho pela
homossexualidade perversa e não pelo estado mental homossexual comum na cultura grega
(Meltzer,1974). A psicanálise discrimina entre estados perversos- que se devem a bisexualidade
estruturante da sexualidade humana- e a estrutura patológica perversa centrada na destrutividade
do Outro. Esta é a lição de Sofócles. Édipo é um homicida porque foi assassinado na sua
subjetividade quando infans e vida afora. Esta é uma oportuna contribuição da psicanálise para o
direito de família, no que diz respeito à adoção. Além dos critérios jurídicos, sociais, legais,
médicos, deveria se ter em conta critérios psicanalíticos ante a complexidade da adoção tal qual
revela nossa preocupação no apêndice sobre “Adoção simbólica e adoção diabólica”.
A teoria e a técnica no trabalho psicanalítico para dar “pensabilidade” à função materna e
paterna será no nosso projeto posta em prática com a criação de um grupo de pais biológicos,
adotantes, e familiares que exerçam a função materna e paterna, aberto à comunidade.
Não se trata de responsabilizar unicamente os pais pelo sofrimento psíquico da doença
mental assim como parece ter sido enfatizado por uma mítica cultura psicanalítica. Os
paradigmas científicos contemporâneos (ciências da complexidade) apontam para a aceitação da
incerteza indo muito além das interpretações de causas e efeitos diretas e lineares.
Os pais condenam-se culpam e censuram a si próprios pela desgraça. Libertá-los desta
prisão imobilizadora faz parte do desafio psicanalítico.
A questão em foco trata de ampliar a percepção dos pais para possibilitar o
reconhecimento e a continência intrapsíquica das próprias histórias, tomando mais consciência
das fantasias, defesas e desejos inconscientes ao invés de atuá-los e/ou repeti-los
compulsivamente nos filhos, visando a evitar a perpetuação do desnecessário sofrimento mental.
A teoria inspira e sustenta a técnica. Os pais tem sido, às vezes, eternos pacientes sem ter
podido realizar a pré-concepção psicanalítica da personalidade. Isto quer dizer que não tem tido a
oportunidade de se beneficiar da psicanálise em seu viés terapêutico e preventivo.
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Figura 6 - Estruturação da Subjetividade - Diagrama Alícia Beatriz Dorado de Lisondo
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Trata-se da construção de uma verdade histórica representada pela organização dos traços
depositados pelas vicissitudes do destino pulsional e da relação intersubjetiva. Assim o mestre
articula sua hipótese onto e filogenética. A hipótese é de que pode haver neste infans uma maior
vulnerabilidade e fragilidade psíquica já ao nascer. Ante a falta do objeto continente conhecido e
compreensivo, o infans bebê é forçado a uma exigência de sobreadaptação prematura na procura
e encontro com outro objeto. Este bebê traumatizado será mais sensível ao trauma do
desencontro. Mesmo no momento das identificações adesivas há um contato íntimo, como, por
exemplo, nos estados autísticos (Meltzer,1984). As marcas destas emoções cruéis que emanam
deste soma em sofrimento estão no núcleo do inconsciente (Andrade,1998; Anzieu,1995).
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A adoção é uma situação traumática que deve ser compreendida tendo em conta a
predisposição, a precipitação e a perpetuação (Pollock,1967). Há fatores na história de um sujeito
que, sem serem em si traumáticas, podem precipitar um transbordamento de angústia, por ser ele
mais sensível, isto é, estar predisposto. As respostas à situação traumática podem se perpetuar se
o bebê está exposto à repetição da situação. As experiências de separação vida afora podem ser
vividas como traumáticas.
O “objeto buraco” (Quinodoz,1996), que corresponde a um “sujeito buraco”, faz
referência a um objeto vivido, na transferência, como inexistente gerando “buracos de
ansiedade”. É um objeto sem representação, um “buraco na fantasia”. A autora exemplifica tal
conceito, na situação clínica, através da paciente para quem os pais biológicos eram inexistentes e
não ausentes, tanto quanto a analista na transferência. “Eu nasci quando tinha seis meses de
idade”. Através de mecanismos defensivos bastante primitivos, tais como: negação, onipotência e
cisão; a paciente amputava a origem traumática de sua vida e o sentimento de ser inexistente
para os pais biológicos. Nascer do Nada é ser Nada. Ela repetia em atuações a tragédia de sua
origem (Lisondo,1992), que era irrepresentável, inominável. O Projeto “Minha história de vida”
pretende registrar através do álbum fotográfico e dos filmes, a passagem do infans, criança e
adolescentes pela Vila das Pipas. A figurabilidade e o contorno das experiências emocionais
registradas, aquilo que o olhar pode resgatar, se transforma em matéria prima para a
representação, como forma imagética.
A experiência traumática pode obliterar o repertório emocional. Um sobrevivente de um
campo de concentração explica: "a experiência vivida... tem sido invivível.” (Semprun, 1997, p.
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desamparo - angústia automática - angústia sinal. Não raras vezes os bebês dados em adoção são
comparados a sobreviventes de um campo de concentração.
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A criança chega mais ou menos sempre tarde à família adotiva. O bebê entra em uma
outra encruzilhada identificatória com os pais adotivos (Garma,1985). A intolerância pré e pós-
natais às sensações, percepções e proto-pensamentos, pela turbulência emocional que geram,
pode ser excessiva e realizar-se em ódio para a realidade interna e externa. Trata-se de uma
intolerância excessiva à frustração e à dor provocadas nestas crianças pelo abandono inicial e
pelo peculiar espaço psíquico a ocupar na mente dos pais adotivos.
Dos pais adotivos também é exigido um esforço de adaptação ao receber um bebê
desconhecido, estranho. Eles dão nome a um corpo desconhecido (Garma,1985). Os pais adotivos
podem vivenciar enormes dificuldades na função materna e paterna para garantir o
imprescindível contato afetivo e mental na simbiose fusional primária e, na situação edípica
(Mac Donnell,1981), para construir a subjetividade. O espaço mental para o bebê pode estar
obstruído. Essas falhas primárias não permitem ao bebê a criação da mente humana na vivência
de continuidade do ser.
A filiação simbólica (Geffray,1990), a identidade masculina e feminina e a relação
intersubjetiva entre os pais e com o bebê como alteridade (Matos, O.,1996) são decisivas no
destino da adoção (Schechter,1967; Zavaschi,1988).
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Figura 7 - "As Cruzes", 1950 - Candido Portinari
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Figura 8 - "Maternité" - Picasso
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A psicanálise amplia realmente o leque de patologias ao seu alcance. Isto não é uma
audácia nosológica. É afirmar que só um tratamento capaz de criar a estrutura psíquica pode vir a
dar condições para o verdadeiro processo de humanização: aprendizado, pensamento e
simbolização. É lamentável que após 100 anos da existência desta ciência o mundo acorde para a
existência das perturbações emocionais ante a existência de jovens bombas, o homicídio de
índios no Brasil por jovens e/ou o caso Susane, a adolescente que com o namorado planeja e
realiza o assassinato dos pais, ou ainda, os adolescentes que usam seringas contendo sangue
contaminado como ameaça aos outros.
Desde seu início de vida, o Infans já estabelece um contato visual com a figura materna,
reconhece sua voz e cheiro, busca contato e vida. Além de se sentir gratificado e tranqüilizado,
esses contatos despertam seu interesse vital que darão força em direção ao seu crescimento.
Só o fato de ouvir o som da voz humana que lhe é familiar, o infans desenvolve a
capacidade de discriminar uma voz de outra, de responder ritmicamente, aliviar assim sua
angústia e desfrutar prazerosamente dessa comunicação. Esta experiência o provê com
instrumentos a serem utilizados para padrões posteriores, de prazer, de gratidão, que tecem uma
base para o amor. Os impedimentos que interferem no desenvolvimento emocional de uma
identificação normal, interferem também no processo de desfrutar a satisfação, o belo, a alegria
de viver. As conjunções construtivas e criativas da mente inspiradas em EROS se diferenciam,
das uniões bizarras, úteis apenas para os aspectos sádicos e onipotentes da vida psíquica, ao
serviço de Thanatos.
Falhas na maternagem no nível bem primitivo poderão propiciar a entrada da doença
mental, que avança sobre o ser em formação, atacando e inibindo funções psíquicas que
desembocam em psicopatias e/ou psicose. Distúrbios em outras áreas, da inteligência ou
somáticas, poderão camuflar estados mentais patológicas graves.
O autismo, por exemplo, pode ser compreendido como uma negação onipotente de um
relacionamento simbiótico do bebê com a mãe, ou seja, autismo e simbiose são extremos opostos.
No autismo a criança se defende do contato humano.
A angústia de queda sem fim leva o bebê a agarrar-se na figura materna e estabelecer uma
dependência simbiótica normal. Se ele não encontra essa mãe, ele agarra-se a si mesmo que
corresponde a formação da “falsa pele”, uma conseqüência da dependência simbiótica patológica,
que com sua imobilização e controle, paralisa o funcionamento dinâmico projeção – introjeção.
Novamente ressaltamos a importância da constância dos cuidados com o bebê. A pulsão
conclama o objeto. Se o infans é o centro, é a mãe o contorno. Numa figuração geométrica, a
mãe precisa ser contida para o exercício de sua função por outro círculo concêntrico e maior. É
neste contorno específico que o serviço de Psicologia Psicanalítica pretende agir. O grupo com
pais para criar a função materna e paterna pensante é uma das atividades planejadas para o ano
2003. A assistência domiciliar psiquicamente qualificada é a atividade a ser desenvolvida com o
amadurecimento da equipe de aprimorandos e estagiários nos anos sucessivos para acompanhar
os familiares adotantes. Assim, não só a criança externada do abrigo será psiquicamente tratada.
A família será ajudada na detecção precoce e assistência psíquica através do método de
intervenção precoce na infância (Lebovici,1999). Esta técnica pressupõe o conhecimento e
experiência com o método de Observação de bebês de Esther Bick (2000).
Muitas vezes essas mães não estão disponíveis levando a criança a destruir seus próprios
egos a fim de sobreviver. (Meltzer,1984)
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Com a separação traumática da mãe, cria-se um conflito que poderá causar um sentimento
intolerável de arrancamento. O autista vai construir sua concha de auto-sensualidade para não
sofrer esta dor. No interior dessa concha, poderá negar toda experiência emocional de separação,
de distanciamento, de espera, de frustração, de alteridade. A fantasia de arrancamento é um
processo dinâmico de aspiração num buraco negro que absorve toda matéria e toda energia que
cae em seu campo gravitacional.
A etiologia do autismo poderá ser encontrada no diálogo interdisciplinar. Devido ao
vértice psicanalítico, estamos focalizando mais os fatores psicológicos no desenvolvimento
mental, relacionadas às experiências dolorosas primitivas na ligação materna. O problema da
interação familiar e dos pais com dificuldades emocionais são os motivos mais identificados no
desenvolvimento de quadros de deterioração mental em crianças: psicose, psicopatias, problemas
de aprendizagem etc.
As concepções de Bick foram expandidas por Meltzer (1984), Athanassiou (1982),
Anzieu (1987) que analisaram a estruturação do psiquismo infantil e desenvolveram interessantes
idéias relacionadas à dimensionalidade da mente em quatro categorias quanto à evolução das
identificações: espaço unidimensional, bidimensional, tridimensional e tetradimensional.
1 – Um espaço unidimensional (quando o self e objeto são apenas um ponto), é o que se
define como e pelo impulso, que chega, toca e se vai. Tempo e espaço se fundem em uma
dimensão linear do self e o objeto. Os objetos são atrativos ou repelentes e o tempo não se
distingue da distância, um tempo fechado, uma mescla de distância e velocidade. O ponto
unidimensional é o modelo do encontro da boca com o seio.
2 – Um espaço bidimensional, quando graças à relação de objeto, o sujeito pode
constituir uma identificação adesiva, um espaço de contatos, de superfícies. Depende das
qualidades sensuais que podem ser captadas em sua superfície, e com isso o self também é
vivenciado como uma superfície sensitiva. O pensamento não pode desenvolver-se porque falta
um espaço dentro da mente, um espaço para o pensamento experimental, no qual pudesse ter
lugar a fantasia. O tempo é vivido como circularidade. Daí a importância do sensorial como
matéria prima para a passagem à dimensão mental.
3 – Um espaço tridimensional – quando o mundo interno pode estabelecer a identificação
projetiva e o objeto foi vivenciado como resistente à penetração, constituindo o conceito de
orifícios no objeto e no self. O tempo é vivido como oscilatório através da fantasia de entrar e sair
do objeto, uma tendência direcional própria, um movimento inexorável de dentro para fora do
objeto.
Todas essas três abordagens têm a característica comum relacionada com a
inautenticidade ou com uma certa ingenuidade.
4 – Um espaço tetradimensional é a forma acabada de identificação, a identificação
introjetiva, e inclui uma escolha de objeto e uma capacidade do ego de introjetar o objeto,
conservá-lo dentro de si apesar da ausência e interiorizá-lo. Esse tipo de identificação se funda
em uma concepção do tempo e do espaço de que o tempo passa mas não volta, e reconhece a
existência e a autonomia do objeto (o outro). É quando se instala o tempo do luto pelo objeto.
Essas idéias estão relacionadas ao desenvolvimento infantil no primeiro ano de vida e
como as noções de espaço e tempo são construídas na criança. Estes são os fundamentos para a
aprendizagem das disciplinas escolares como história, geografia, português etc.
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Sabemos que o somático interfere no psiquismo infantil e enfocando a doença grave dos
portadores de HIV positivo a. precocidade da doença irá interferir de diferentes formas e graus no
processo de subjetivação, na formação de identidade, de acordo com a capacidade emocional de
cada criança.
O desprazer, a dor, a ameaça da morte que provem do corpo doente causam uma confusão
em seu esquema corporal, afetando de diversas formas seu processo de identificação normal.
Representa um esforço extra, muitas vezes devastador para a difícil tarefa de estruturação
psíquica da subjetividade.
Numa perspectiva reversível podemos afirmar que a criança deprimida pode vir a
deprimir as defesas imunológicas na desistência de viver/continuar vivo. As infecções podem
ocupar o lugar da vitalidade psíquica.
Algo que possa sair tão errado na vida do Infans trará muitas implicações e danos graves
no seu desenvolvimento como ser humano. O modo como eles serão cuidados terá a maior
importância no sentido preventivo de psicopatologias graves.
Quando a perda é prematura, os processos de luto geralmente tomam um curso
patológico. A saudade e a raiva ficam sem elaboração, a angústia de separação e a privação
causam uma condição emocional que não é uma simples carência, mas um verdadeiro
desapossamento conforme definiu Winnicott (1975)
A maior parte das influências de formação da personalidade, são aquelas recebidas nos
primeiros anos de vida, especialmente na relação com a mãe e no contexto familiar. O infans é
impelido por sentimentos tanto de amor quanto de ódio em relação aos pais e aos irmãos. Daí a
importância dada à rivalidade entre irmãos e ao ciúme edipiano. O fundamental aqui é que dessa
ambivalência entre amor e ódio, o conflito resultante seja tolerado. Assim, a ansiedade e a culpa
engendradas possam ser sentidas de modo saudável levando a um crescimento da vida psíquica.
O mesmo conflito básico entre amor e ódio reflete-se no conflito intra-psiquico entre os
impulsos sexuais e agressivos e também entre os instintos de vida e de morte.
O conflito é uma condição normal das transações humanas e se o infans seguir um
caminho favorável, recebendo amor e proteção de sua mãe e de seu pai, crescerá sem uma
pressão exagerada de seus anseios libidinais e sem uma propensão para odiar. Com isso, se
sentirá apto a dirigir e controlar no seu íntimo seus impulsos contraditórios.
O perigo está nas condições adversas que interceptam o desenvolvimento emocional
como a perda dos cuidados maternos e de um meio familiar típico. Muitos desvios parecem
resultar de uma experiência traumática desse gênero levando a formação de uma personalidade
perturbada. Através de manobras defensivas que propiciam evasões, o conflito é negado ao invés
de aparecer e ser enfrentado. O infans e a criança se adaptam falsamente a situação distanciando-
se de seus sentimentos e tornando-se indiferentes ao próprio sofrimento.
Assim podemos compreender o quanto sentimentos como raiva, ódio, saudade, desespero,
ficam sufocados em seu íntimo, mas potencialmente ativos. O trauma vivido favorece a um
ressentimento e aos sintomas de tendências anti-sociais.
Se esta situação emocional, traumática, não for cuidada adequadamente, poderá evoluir
para estados de ansiedade e para a doença depressiva e\ou a formação do caráter delinqüente a
uma personalidade psicopática.
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Nos abrigos podem proliferar perigosos e contagiantes virus mentais tais como:
•As fantasias, desejos, e angustias em “TER QUE SALVAR”
•A CARIDADE.
•A PATOLOGIA DA ASSISTÊNCIA, vítima inconsciente de um suposto saber e poder sobre a
vida de um OUTRO.
- A denegação das reais possibilidades para abordar a deterioração mental.
O paciente que sofre de Aids como a nova praga de TEBAS pode nos defrontar com
a culpa e o conseqüente castigo ante os desvios sinistros da sexualidade humana.
A equipe profissional pode então clivar a própria parte psicótica que convive com a
parte não psicótica, (Bion, 1957). Sempre serão encontrados alvos dentro dos
quais projetar esta parte psicótica: O governo, o sistema de saúde, os pais das
crianças, etc. serão os responsáveis de plantão. A questão está no uso que se pode
vir a fazer das instituições, da equipe de saúde, dos familiares, dos parceiros. Isto
não invalida uma postura científica transformadora. A recusa à realidade dolorosa
pode ser uma forma de bloquear o trabalho psíquico possível para transformar essa
dor.
É imprescindível discriminar para efeito deste projeto:
A) A vida de uma família estruturada “suficientemente boa”, na qual os irmãos, sendo
seres diferentes, aprendem a conviver com os pais, cobiçados objetos primários de
amor. ( Fig. 9)
B) A vida de irmãos biológicos sem a experiência contínua da convivência psíquica.
C) O destino dos irmãos com e sem contaminação de HIV e sem a experiência
contínua da convivência psíquica. O vírus é um significante que marca a presença
do sinistro já na origem da vida: a relação sexual / genital dos progenitores, a
transmissão da doença, o descuido durante a gestação.
D) O complexo fraterno - filhos de sangue e filhos adotivos.
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Figura 9 - "A Adoração da Criança" - Gherardo Delle Notti
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O sexo do filho desejado pelos pais, os sonhos tecidos já na terna infância sobre a
paternidade e a maternidade, o sentido atribuído a concepção, os desejos que pairam sobre filho,
a qualidade da relação entre os progenitores, o projeto identificatório tecido para o infans, o nome
escolhido, a constelação psíquica dos pais no momento da concepção, o lugar que se ocupa na
prole, entre outros fatores tem o poder de tecer diferentes tendências no destino humano. Assim
como Heráclito traz à humanidade a consciência da mudança e o movimento quando afirma que
ninguém toma banho duas vezes no mesmo rio, podemos afirmar que os irmãos nunca habitam o
mesmo útero mental porque os pais não podem ser iguais para todos os filhos. Não é o mesmo,
ser o primogênito homem sonhado, que ser “fêmea, raspa de tacho”.
Os pais com os filhos constróem a própria história nesta mítica rede de relações
familiares. Condições materiais tem sentidos e significações que podem se sufocar e/ou exilar
justamente porque estão enraizadas em complexos relacionais inconscientes fontes de dor e
sofrimento. Os inventários judiciais, por exemplo, são sempre e necessariamente inventários
afetivos que implicam o reconhecimento da morte dos progenitores, a vivência de desamparo
ante o infantil, e uma re-significação das relações familiares. Os bens a dividir e herdar tem valor
afetivo.
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Um ser humano pode construir vida mental e só assim será capaz de sentir dor,
compaixão, sofrimento, e conquistar a consciência possível ante a diferença entre a própria vida
e a dos irmãos.
Será que na tentativa de evitar a dor necessária e o sofrimento ante a privação de uma
família, ante a praga herdada, ameaça permanente à vida, que marginaliza, isola a um ser
humano, não se sepulta o destino do irmão salvo do HIV , dificultando, postergando, e/ou
barrando a adoção?
Se na família, primeiro modelo social, a convivência é perturbada, essa deterioração
transcende na sociedade através de todas as patologias mentais, que não encontram nem
acolhimento, nem compreensão, nem tratamento específico, e assim sendo, a ordem, a vida
civilizada almejada pela Lei é difícil de alcançar.
A situação de gêmeos merece atenção especial.
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Helena (34 meses)
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Figura 10 - "Jardim das Delícias"- Bosch
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2º A criança descobre que o outro não é um ser real, mas uma imagem.
3º A criança tem a revelação de que aquela imagem refletida é dela própria. É um
momento de intenso júbilo e ela passa a brincar com os movimentos do próprio corpo no
espelho.
Esta fase situa-se no registro imaginário e a captação que o infans faz do ser pela imagem
humana refletida no espelho, permite-lhe que se delineie os contornos do reconhecimento de si,
momento inaugural da identificação.
O reflexo do próprio corpo favorece as noções de unidade e localização espaço-temporal,
transformando o sentimento de despedaçamento da fase anterior. Nesse estádio, desenrola-se todo
o drama da relação dual que o priva da consciência da sua subjetividade.
Lacan também entende que o espelho é uma metáfora do vínculo entre a mãe e o filho que
vai da ilusão de completude onipotente até o da dimensão simbólica com o domínio da palavra. O
advento da ordem simbólica ocorre com o afastamento da mãe pelo interdito do pai. A criança
renuncia a onipotência de seu desejo e aceita uma Lei que limita e organiza. É a saída do
complexo de Édipo, configurando-se a singularidade juntamente com a aquisição da linguagem
verbal.
A oposição imaginário – simbólico encontra-se em todos os graus do desenvolvimento
humano. A essência do imaginário é uma relação dual, um desdobramento em espelho que
dissimula a si mesmo e se perde nos reflexos. É a dimensão psíquica desenfreada da vida afetiva,
dos sentidos e das idéias.
A passagem da relação dual, imaginária à uma relação triádica, edípica, simbólica, efetua-
se progressivamente, por etapas, cada vez mais formadoras e decisivas. Esta ultrapassagem da
relação dual alienante para a ordem simbólica triádica é a essência do Édipo.
A potência fundadora da ordem simbólica é o interdito, vindo da Lei do pai. A Lei torna-
se então libertadora. Separada da mãe, a criança dispõe de si mesma, orienta-se em relação a um
futuro, insere-se em seu lugar na família, no social, na cultura.
Winnicott, inspirou-se em Lacan para desenvolver o tema do espelho como sendo o rosto
da mãe.
Desde as primeiras fases do desenvolvimento emocional, gradativamente o bebe vai
saindo de um estado indiferenciado e vivendo a separação entre eu/não-eu . Essas modificações
realizam-se principalmente, quando a mãe vai sendo percebida como objeto externo,
objetivamente falando, separada dele.
Se esta mãe com sua atitude estável e contínua não está ali como referência, a tarefa em
termos do desenvolvimento emocional torna-se muito complexa. ( Fig. 11)
Quando um bebê está mamando, ele não olha para o seio, ele olha para o rosto da mãe e
vê a si mesmo, recebendo de volta o que estão dando. O bebê é manejado (handling), deve ser
segurado (holding) de tal forma que sua experiência legítima de onipotência não seja violada e
ele não perca essa ilusão. Ele usa o objeto-mãe como se fosse um objeto subjetivo, criado por ele.
Depois é que ele vai se acostumando com a idéia de que, quando olha, o que é visto é o rosto da
mãe, que não é o espelho.
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Figura 11 - "Mãe Preta"- Laser Segall
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Da mão do mestre quando a sua preocupação clínica e teórica era fazer consciente
inconsciente, o nosso desafio atual com os infans, crianças e adolescentes privados da função
materna e paterna , seja transformar o sinistro preto do abismo da desesperança lá onde a vida
perde o sentido de ser nas patologias do vazio, numa luz esperançosa que possa construir o
sentido possível para uma vida humana. Para Lutenberg (1999), o vazio mental corresponde a
uma ausência da condição humana dentro da mente.
Não é a intenção aqui negar a revolução tecnológica, comparada à invenção da imprensa
neste novo século. Para a psicanálise a questão é sobre o USO que se faz da TV e/ou do
computador que pode estar enraizado em EROS ou disfarçadamente em THANATOS porque há uma
cumplicidade patológica, numa sociedade autista. É normal segundo critérios estatísticos.
Nas patologias do vazio sempre há uma “fome psíquica” de experiências reais, autênticas.
Quando há uma confusão entre a realidade virtual e a realidade ”real”, a experiência de assistir
TV. ou se debruçar sobre a realidade virtual, é de um maior e mais profundo vazio. Criatividade
mental e vazio mental são pares antitéticos. A tentativa de preencher com realidade virtual o
vazio existencial é trágica.
A gênese do vazio aninha a orfandade mental crônica: não se sentir querido de verdade
pelos pais, irmãos, avós, namorados, professores, cuidadores etc. A eterna “fome” pode criar uma
relação de tirania, de domínio e posse ante a atenção impessoal da maioria dos programas
televisivos regidos, quase exclusivamente pelo mercado quando os programas artísticos e
culturais são a exceção. Há uma recepção a- crítica de qualquer programa. Sobre estimulação
erótica, destrutividade, voyeurismo, banalização do sagrado, exibicionismo , consumismo, não
são alimento para a mente humana. Muito menos para um ser abrigado.
A construção da subjetividade exige viver a própria realidade psíquica e real. Substituir
esta realidade, pela virtual é cair na deteorização mental e potencializá-lo.
O pensamento nasce do sentimento. A ilusão surge do universo emocional e é o coração
da criatividade. O divorcio entre o sujeito e o coração emocional leva a incessante procura
errática do zapping num deambular sem meta para passar o tempo.
Os seres abrigados têm já perdido muito tempo no abismo infernal do desencontro
humano. Tem sobrevivido como exilados de campos de concentração a torturas psíquicas e
privações humanas. O tempo é ouro para a construção da subjetividade e para o trabalho mental.
Se a deteorização mental é como um câncer metafórico que carcome a vida, se trata e com
urgência de que o tempo não passe sem ser um marco para as experiências significativas plenas
de sentido.
A TV é uma falsa companhia porque mecânica, inanimada e “incondicional”. Ex : a Xuxa
não é uma mãe para os baixinhos telespectadores; não há uma relação humana singular, não há
frustração, nem amores, nem ódios. Há uma imitação de imagens superficiais que não leva a
identificação estruturante do aparelho psíquico, há uma amálgama fusionada com as figuras
oferecidas. Uma cascara é formada no EU de um ser vazio. Tudo é superficial sem profundidade e
transcendência. Cabe aqui questionar que modelo de feminilidade é a Xuxa para um ser abrigado
onde há uma carência de modelos humanos ?.
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Pai de uma criança do UAI em entrevista psicanalítica.
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Para Winnicott (1971), o crescimento humano possui relação direta com a provisão
ambiental, e é pela importância vital dada a ela que abordar o sentido de um abrigo psíquico para
a vida mental supõe que tomemos para os infans, as crianças e os adolescentes a perspectiva
inequívoca de um viver criativo.
Já em Freud (1911) é a arte que reconcilia o homem ao princípio de prazer, meio pelo
qual ele concede à sua vida anímica liberdade através da fantasia, sendo capaz contudo de
retornar à realidade, oferecendo aos outros homens novos tipos de verdades apreciadas e
valorizadas como obras que revelam os anseios mais profundos de sua própria natureza.
O trabalho cultural da humanidade é assim concebido como produto das transformações
da sua vida pulsional, onde forças de extraordinária grandeza deslocam a sua meta sexual para
outras metas, permitindo então que se realize a capacidade de sublimação, como uma forma bem
sucedida de renúncia a um objetivo instintual originário (Freud 1908).
Fora Freud ainda que ao observar a motivação que têm as crianças para o brincar,
encontra nessa atividade o mesmo sentido de realização cultural, que abarca a renúncia à
satisfação instintual, a capacidade de transformação de uma experiência psíquica em jogo e pelo
jogo, e a passagem da situação de passividade ao papel ativo. Segundo ele (1920), elas repetiriam
ao brincar todo o vivido que causa-lhes forte impressão, para tornarem-se assim menos
impactadas pela experiência, construindo através da brincadeira a possibilidade de que
significados sejam gerados.
Este ponto articula-se intimamente com a posição depressiva descrita por Klein (1935),
para quem o processo de formação simbólica está relacionado à mesma dinâmica. Nesta posição
o ego do bebê torna-se mais integrado, diminuindo os processos de projeção e permitindo-lhe a
percepção de sua realidade psíquica, que contém a ambivalência de seus próprios instintos.
Concomitante a isso o aumento de sua percepção da realidade externa e da mãe como objeto total
ambivalentemente amado dá origem a sentimentos de culpa e de auto-reprovação, trazendo-lhe
temores de que tenham sido causados danos a esse objeto, provocados por suas fantasias . O
sentimento de luto é experimentado pela criança, assim como os impulsos reparadores podem
agora ser desenvolvidos para restauração do objeto interna e externamente, o que consistiria nas
bases da criatividade e da sublimação.
Assim, os jogos infantis emergem como resultado dos progressos da diferenciação objetal,
convertendo-se em procedimentos simbólicos, para que a mente possa transformar as relações
penosas com as imagens introjetadas. O ego da criança é impelido a projetar, desviar, e distribuir
desejos e emoções, como condições prévias ao desenvolvimento exitoso das sublimações.
Dentro dessa compreensão, também Segal (1981) enfatiza a capacidade de lidar com a posição
depressiva como pré-condição tanto da maturidade genital como da artística, dando valor
preponderante à sublimação e aos aspectos reparadores na gênese da criatividade humana.
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As histórias, os brinquedos e as brincadeiras infantis permeiam uma terceira área que nem
é a da realidade psíquica interna ou a do mundo real em que vive a criança, mas uma área da
experiência no espaço potencial entre a criança e o meio ambiente, aquele espaço que é a um só
tempo o da separação e o da união entre dois seres, ligados numa experiência geradora de um
sentido para a existência. ( Winnicott-1971).
Assim contextualizadas, as histórias infantis ganham importância não pela função
pedagógica que exercem ou pelo caráter moralizante que possuem, mas porque oferecem, no
campo potencial, oportunidades de irem conferindo representabilidade à realidade emocional da
criança, nomeando, explicitando, ordenando e atribuindo sentidos às suas experiências.
Klein nos demonstra o quanto é essencial permitir à criança dar vazão à sua agressividade,
e reitera que por meio de brincadeiras e brinquedos ela pode vir a expressar a ampla variedade de
suas fantasias de destrutividade e culpa, assim como seus temores de retaliação, sentimentos de
frustração, rejeição, ciúmes, inveja e suas necessidades de reparação, numa linguagem própria do
jogo infantil (Klein-1953/55).
É pelo deslocamento que a criança opera dos impulsos sádicos, originalmente dirigidos ao
corpo da mãe, que para Klein (1930) a capacidade de brincar inaugura por assim dizer a
capacidade de formação de símbolos, processo pelo qual as ansiedades sofrem transformação,
conferindo ao seu mundo mental a experiência de alívio e prazer, permitindo ainda que o mundo
externo seja dotado de interesse.
No entanto, carrinhos, bonecas, bem como papéis e tintas não representam apenas coisas
que interessam as crianças por si mesmas. No seu brincar eles se investem de significados
simbólicos sagrados, gerados pelas suas fantasias, desejos e experiências como um modo arcaico
de expressão, familiar à linguagem dos sonhos, e que assim como nos sonhos tornam-se aptos a
irem sendo representados, ganhando sobretudo figurabilidade por imagens visuais (Freud 1900).
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Inseridas numa relação da criança com alguém cuja disponibilidade mental caracterize-o
como uma presença viva, as histórias podem se constituir num convite ao sonho, onde
paradoxalmente ao se tomar distância da concretude dos fatos e da força devastadora das
impressões sensoriais e das experiências emocionais (elementos beta), a criança encontra pela
continência do outro que a ela se dirige (Bion,1962), dotado de uma capacidade compreensiva,
uma aproximação de si mesma, transcendendo pela simbolização sua própria natureza anímica.
Os clássicos contos de fada, transmitidos através de diversas gerações, revelam na sua
perenidade um sábio repertório sobre as verdades da condição humana. Eles são verdadeiras
realizações culturais repetidas com o peso da tradição oral e escrita que os revitaliza a cada nova
geração. A criança encontra neles alívio ante a possibilidade de dar figurabilidade, forma e
narrativa a seus conflitos mais profundos. As personagens das histórias se oferecem à criança
para com elas se identificar na célebre clivagem humana entre idealizadas princesas e bruxas
malvadas, o bem e o mal, o seio bom e o seio ruim, Eros e Thanatos. Um longo caminho precisa
ser percorrido até que o infans ou a criança aprenda a ser continente de suas próprias angústias e
ansiedades, e possa reconhecer que todo ser humano alberga o divino e miserável dentro de si.
Um fator básico, para Klein (1929), da tendência de personificação no jogo infantil é a
ocorrência dos mecanismos de identificação projetiva e introjetiva, através dos quais o conflito
intrapsíquico se expressa, e a criança busca encontrar alívio da pressão super-egóica pela
projeção de imagens extremamente bondosas ou cruéis, que se não fossem exteriorizadas
provocariam perseguição interna, ansiedade e sintomatologia. As histórias infantis personificam
dentro dessa mesma compreensão os prazeres pulsionais do ser humano, por vezes representados
nas figuras de animais, assim como suas próprias crises de desenvolvimento são simbolizadas nas
figuras de heróis com natureza humanizada, fadas bondosas ou bruxas perseguidoras
(Bettelheim-1980).
As recorrentes polarizações entre o bem e o mal expressam uma posição de cisão, que
permite num dado momento do desenvolvimento do self infantil, que os efeitos inibitórios dos
sentimentos de culpa se dissipem, aliviando as pressões do super-ego primitivo, permitindo que
as raivas sejam vivenciadas sem culpa, o que abre caminho para uma possibilidade maior de
integração do mundo mental. Pelos mesmos mecanismos de cisão e projeção, a existência nesses
contos de alguém que personifique a mãe boa idealizada que surge nas horas de dificuldade, pode
circunstancialmente ser o meio capaz de tornar para a criança a dor psíquica suportável, mesmo
nos momentos mais difíceis.
Muitas metáforas de morte falam às crianças da possibilidade de desapegos de velhos
modos de funcionamento psíquico e da possibilidade de se renascer em planos mais elevados da
existência: superação das fugas narcísicas, descoberta da alteridade.
A provisão ambiental suficientemente boa fornece enfim sustentação e compreensão às
indagações cruciais do ser humano, cujos contos de fadas podem instrumentalizar a tarefa
singular de cada um, em buscar sentidos que respondam às indagações:
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A QUESTÃO DA VERDADE
A questão da verdade sobre a origem da vida
De quem nasci? É diferente da pergunta sobre a origem das crianças, como a célebre
teoria sexual infantil apontada por Freud (1908-09). A sexualidade presente na origem de toda
vida e a morte são as eternas questões humanas. No bebê dado para adoção, ambas se
entrecruzam de forma peculiar. Um bebê, na origem de sua vida, é engendrado em uma singular
relação sexual em que Eros é arrastado e sufocado por Thanatos na auto-conservação da vida.
Esta relação entre Eros e Thanatos é um fator nada desprezível nas patologias traumáticas, pois o
apego ao trauma é um modo de extrema fixação introdutora do caos, oposta à ordem inerente a
Eros (Maldavsky, 1995). Esta relação biológica e psíquica com o bebê é clivada. A pulsão de
morte se faz mais ou menos presente quando se abandona ou se rechaça o filho não reconhecido
como uma obra criadora, transcendente e estética, como mostra Meltzer (1995). Aqui a questão
crucial é a fratura, quase impensável e irrepresentável, da relação primordial com os pais
biológicos, no primeiro triângulo edípico que dá origem à vida, que se entrecruza com a possível
“orfandade psíquica” (Lisondo, 1984) com os pais adotivos.
O filho adotivo pode estabelecer um vínculo narcisista com uma história anacrônica
anterior ao seu nascimento. O não reconhecimento dos pais adotivos como pais pode ser uma
forma de resistir narcisicamente à situação edípica (Zusman, 1996). A mentira pode ser o
mecanismo defensivo que exclui da integração evolutiva uma dolorosa área da origem de uma
vida.
O enfrentamento, a oposição e o ódio são necessários para o desenvolvimento psíquico e é
preciso diferenciá-los do ressentimento e da violência que figuram em Thanatos. O adolescente
adotado pode viver a re-significação edípica, tendo a sexualidade como alvo, com atroz
ressentimento fixado no primeiro triângulo que origina sua vida. O círculo do deterioro mental
demoníaco pode potencializar-se quando os pais adotivos são pais mortos, no dizer de Green
(1980), que repetem a tragédia original. Ante a ferida narcísica, Pólibo e Mérope, pais adotivos
de Édipo, evitam, afastam-se e isolam-se da questão da adoção. Ao não haverem elaborado o
gesto da adoção e ao não poderem enfrentar a dor mental, perdem o filho. Ao esconderem a
verdade, fonte permanente de dor, eles abandonam o filho à sentença oracular. Os buracos do
corpo do mítico “herói grego” - marca metafórica da ferida narcísica no ser - perpetuam-se
(Lisondo, 1992).
A verdade só é alimento para a mente humana se é uma verdade amorosa, dosada e
oportuna, que possa ser tolerada para permitir o desenvolvimento mental. A verdade sem amor é
crueldade (Bion, apud Rezende, 1996). Quando Édipo sabe a verdade de sua história, atua e
repete a diabólica tragédia de sua origem. Faltou ao criado a sabedoria, o timing, a arte para
transformar o impensável, o inominável, a sinistra sentença oracular numa triste melodia
significativa, capaz de tocar na ferida da alma, ser suportada e levar ao insight. O criado alimenta
o vínculo -K. A arrogância, a curiosidade voraz e invejosa e a estupidez (Bion, 1967) incendeiam
o ódio de uma relação parasitária mutuamente despojadora e destrutiva (Sapienza & Junqueira
Filho, 1996).
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A verdade capaz de alimentar a mente é a verdade humana, aquela que pode ser tolerada e
que pode ampliar a rede de significação de uma história, quando a frustração e a dor do
conhecimento em torno da origem podem ser suportadas. O sujeito alcança a consciência da
experiência emocional. Para Bion e Kant, a realidade última é desconhecida e incognoscível. A
dúvida precisa ser tolerada tanto quanto o sentido de infinito. A criança busca, curiosa, o saber,
através do instinto epistemofílico, quando as fantasias destrutivas em torno do corpo materno não
inibem o aprendizado, segundo Klein. O vínculo K, para Bion, representa um vínculo ativo numa
experiência emocional. Conhecer a verdade sobre si mesmo - a realidade psíquica - é uma função
psicanalítica da personalidade. Adquirir um conhecimento, resultado do trabalho de elaboração e
das transformações da dor, é diferente da possessão arrogante do conhecimento como baluarte
para evitar a dor.
A denegação, a evacuação mediante identificação projetiva não realista e a cisão, que
pretendem eliminar a penosa origem da adoção, implicam empobrecimento e perda da
contribuição vital que a configuração mental desta origem, sede dos arcaísmos, pode fazer à
personalidade total.
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Figura 12 - Stefano Borsi Masaccio
Figura 13 - "O Caminho do Deterioro Mental" - Diagrama de Alicia Beatriz Dorado de Lisondo
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Família “suficientemente boa” Abrigo
A função “materna” é exercida, quando existe, por vários
A constância do Objeto à função materna exercida pela
cuidadores. Necessariamente cada um é diferente do
mãe permite a experiência de consensualidade, e o
outro. O infans perde as referências, em cada despedida há
reconhecimento do Objeto e de si mesmo.
uma vivência de não integração, de desintegração.
O pai real e simbólico é o Outro da mãe. O pai podeO pai real pode ser desconhecido, desaparecido, não
separar a necessária simbiose no início da vida quando areconhecido, rejeitado. A função paterna não é exercida a
mãe sabe que não é tudo e aceita a complementaridade dopartir do “lugar masculino”. O infans abandonado pode
Outro ao reconhecer sua identidade. ser prótese, fetiche, duplo de personalidades perturbadas.
O infans não é compreendido. O desespero se transforma
em desistência quando reiteradamente não encontra o
O infans é compreendido – O desespero é transformado
coração, o desejo, a mente da função materna e paterna.
em esperança de acolhimento quando encontra o coração
Deixar de chorar, a “passividade” não é o poder de estar
e a mente, o desejo na função materna e/ou paterna.
sozinho, é a retirada do mundo humano. O início das mais
sérias patologias. A paz do sepulcro mental.
A função materna exercida por vários cuidadores só pode
conseguir fazer integração precárias - não há um
A função materna integra. Há um aprendizado na e da
aprendizado pela experiência emocional. Aqui faz o
experiência emocional “uma colherada para a mamãe e
enraizamento dos problemas no aprendizado. A função
uma para o papai” – a função materna é um seio pensante.
materna é um seio material que não exerce a função do
modelo pensante.
O infans ocupa o “não lugar” da loucura. A origem
biológica deixa marcas no Inconsciente. O sinistro na
O infans ocupa um lugar na triangulação edípica ▲ que
triangulação edípica. Outro Triângulo se forma com os
garante a criação da perspectiva, o esforço mental para o
pais adotantes. O valor da vida do infans, o lugar psíquico
ser um Eu intérprete.
desqualificado é conseqüência da desvalorizaçãooo da
vida nos vínculos primários.
O infans pode se proteger ante a dor de não encontrar o
objeto disponível na auto-suficiência e sobre a adaptação
O infans pode vivenciar a dependência de um Outro.
para sobreviver. “Ser grande antes da hora” e “ser pai dos
pais”
A criança encontra a revelação ante a necessáriaA criança não encontra o sentido possível ante o
curiosidade sobre a sua origem. As perguntas sobre aimpensável, indizível do horror de sua origem.
sexualidade encontram os mitos familiares, albúns dePor que nasci?
fotos, filmes e história evocados e rememorados. Por que eu com HIV?
O infans desenvolve funções mentais na companhia vivaO infans inibe e sepulta funções mentais potenciais
do Outro, o diálogo, o brincar, as histórias, dramatizações,quando não encontra o Outro disponível para a criação de
personificações que permitem o desplegne da pulsãouma relação subjetiva. O outro pode ter uma companhia
epistemofílica. transitória, passageira, fugaz.
O infans inicia a criação de um aparelho mental obra do infans não cria um aparelho mental ou ele é frágil,
O
Outro. O EU é responsável de caras funções mentais: variável, sem espaço para as representações.
1.Percepção O Eu frágil não pode desenvolver as caras funções
mentais fundamentais para o aprendizado. A criança e o
2.Atenção adolescente não aprendem pela impossibilidade estrutural;
3.Julgamento Não há aparelho para pensar;
4.Atribuição Não aprender pode ser um sintoma psíquico que esconde
5.Discriminação verdades a serem recalcadas.
Não aprender pode ser obra de Thanatos, trabalho do
6.Memória negativo, do desligamento.
O infans e a criança ao invés da ausência, vivenciam a
Na alternância significativa da presença e da ausência, a
falta à privação do Objeto. Não há esperança de
criança constrói o símbolo. O jogo de esconde -esconde
reencontro, porque faltou a experiência continuada do
“O Fort-da”, anuncia esta conquista. O símbolo permite a
encontro. A criança não pode criar o símbolo, ela vive na
criação do objeto na ausência , no sentido de sobreviver.
concretude de um mundo sígnico.Zusman (1994).
O infans ante a experiência de frustração – não seioO infans além da frustração vive inevitáveis experiências
disponível pode criar a experiência alucinatória dede privação. Há uma “fome mental”. Ao invés de trabalho
gratificação, isto é, trabalho mental. mental, o infans evita a dor psíquica em refúgios
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Família “suficientemente boa” Abrigo
A “chupeta” pode alucinadamente ocupar o lugar do seiodefensivos como o isolamento.
até que a realidade da fome se impõe. O infans alucina negativamente, quando a mamadeira é
oferecida. É como se não existisse o que existe.
NEGATIVISMO/ANOREXIA.
O infans, criança e adolescente têm modelos de
Os pais são modelos de identificação:
identificação transitórios, descontínuos, “não
•cumprem a função anaclítica suficiente/bons”.
•O progenitor do mesmo sexo do infans é o rival na•O cuidador não pode cumprir a função anaclítica que
disputa do Objeto de amor até que na adolescência exige uma presença contínua.
num outro nascimento metafórico o jovem percorre o
•O infans, criança não vive a experiência de uma relação
caminho para encontrar seu próprio AMOR
amorosa entre um homem e uma mulher.
A sexualidade genital no adolescente não implica
profunda penetração afetiva coração a coração.
O adolescente pode usar de si e do outro como uma “coisa
em si mesma” num mundo superficial, sensual onde só
importa o próprio carnal do prazer em manipulações
mecânicas de uso.
A experiência emocional é transformada, banalizada,
vulgarizada em FATOS CONCRETOS, SENSUAIS. NA
PERVERSÃO A DESTRUTIVIDADE DO OUTRO É A
META.
O infans, a criança e o adolescente, pela carência de
relações afetivas significativas não integra o sentido, a
significação às vivências que ficam despojadas de
As impressões sensoriais são transformadas em emoções,
vitalidade psíquica.
afetos quando nomeadas em SENTIMENTOS. O sentido
Quando recebem uma doação, nem sempre há um vínculo
significativo é construído numa história de relações
com o doador que é um “fornecedor anônimo, sem rosto”.
afetivas. Por que te amo, te cuido.
A alegria do encontro, de se sentir amado e da gratidão
não se realizam, fica a gratidão momentânea e/ou as
manifestações de coisas, e não de gestos humanos.
A alteridade, o respeito pelo Outro, a reciprocidade se
É importante destinguir a “colagem adesiva” da relação
“mamam” no dia a dia. Ex: O controle da moral
afetiva. Estar grudado num outro não implica a
esfincteriona implica em adquirir os hábitos de higiene
diferenciação entre eu e não eu, muito menos uma relação
por AMOR a papai e mamãe e renunciar dos prazeres
de alteridade.
próprios.
Ante a desintegração do núcleo familiar, importa que um
SER humano possa vir a ser capaz de estruturar a
subjetividade para se relacionar. Antes de conservar os
vínculos fraternos é importante criar vínculos.
A exigência de adoção simultânea de irmãos inibe, limita
Na família se aprende com os irmãos a lidar com as
e dificulta à adoção. Um casal precisa de um profundo
profundas emoções que encara o rival, a inveja, o ciúmes.
trabalho de elaboração mental para criar uma fertilidade
A disputa é pelo Objeto de AMOR primários- os pais.
psíquica, para criar um filho adotado.
A adoção múltipla potencializa os obstáculos para a
criação da filiação simbólica. A criança adotada é um
SER já traumatizado.
Não é possível AMAR por decreto.
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PROPOSTAS CONCRETAS
1)Um diálogo interdisciplinar com todas as ciências implicadas nas atividades do abrigo do
Centro Corsini.
2)Inclusão da psicanálise no diálogo com as políticas de assistência social, porque consideramos
que a saúde mental ou a deterioração mental estão decisivamente em jogo no infans, na
criança e no adolescente abrigado.
3)O uso da televisão em diferentes constelações mentais:
4)Tal como fundamentam vários autores ( Soifer 1981, Vasconcelos 90, Reich, Toffer e Toszac,
1981 apud Soifer,1981) sustentamos que:
a) O infans não deveria assistir televisão.
b) Na primeira infância deve-se limitar o uso da televisão a 30 minutos por dia.
c)Na latência deve-se assistir três ou quatro vezes por semana por não mais de uma hora.
d) Aos adolescentes deve-se limitar o uso da TV a uma hora por dia ou no máximo duas
horas quando se assiste a filmes previamente escolhidos.
e) Muitas atividades podem substituir o tempo antes gasto com a televisão. Sugere-se além
das atividades desenvolvidas no núcleo as atividades sugeridas neste projeto no ítem “Histórias
infantis”.
5)Seria conveniente que os berços pudessem ter grades que possam ficar baixas, para que a
criança possa ter a visibilidade de todo o ambiente.
6)É importante que o cuidador converse, olhe no olho da criança, cante, e acaricie o seu corpo.
7)O infans que chora suplica por compreensão. É importante que o bebê seja acolhido, segurado
com firmeza, sustentado com o calor do corpo do cuidador, que um manto sonoro embrulhe o
bebê em melodioso canto para transformar o terror sem nome em esperança de acolhimento.
Não receber a sensibilidade do bebê é matá-lo psiquicamente.
8)É importante que os pais biológicos e os familiares possam visitar os filhos, sendo
acompanhados, mesmo quando destituídos do Pátrio Poder. É importante assinalar que esta
destituição é temporária, porque o ser humano não precisa ser eternamente condenado a esta
destituição. Quando a criança encontra novamente os pais biológicos necessariamente são
estranhos.
9)Filmar e fotografar cada criança para registrar através do álbum e do vídeo uma história
afetiva. A imagem, acompanhada das narrativas pode construir o sentido nutriente da mente
humana.
10)Colocar uma câmara para vídeo durante 4Hs alternadas entre os diferentes períodos do dia
para acompanhar e observar a vida do infans na Instituição.
11)É importante que a criança possa se entregar ao sono sendo acompanhado nessa passagem. O
canto, a narrativa e/ou leitura de histórias infantis no quarto, o beijo, a arrumação das roupas
de cama ajuda a elaborar as despedidas e entrar num estado que a humanidade tem
relacionado com a morte. Os pesadelos, a insônia , os terrores noturnos são evidências dos
severos transtornos do dormir.
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12)Ao regressar das atividades escolares é importante que alguém possa olhar, se interessar,
conversar sobre as atividades desenvolvidas, as conquistas no aprendizado. A atenção é
vivida pela criança e adolescente como manifestação de amor.
13)O infans, a criança e o adolescente precisam aprender a brincar com um adulto. Nos jogos
lógicos – quebra-cabeças, memória, construções, armar objetos, etc.- é importante colocar
desafios e alimento perturbador para a mente para o despertar das funções mentais.
14)Nas horas das refeições é importante poder propiciar o diálogo, compartilhar projetos,
conversar sobre visitas, saídas, peças de teatro etc.
15)É importante a presença sempre contínua, freqüente e estável, de ao menos uma figura
masculina. Que o residente em Pediatria toque, examine, converse, explique, para ser quem
sabe aquele que acompanha o crescimento, acordando a etimologia do ser pediatra.
16)O adolescente precisa ser acompanhado nos espaços culturais e sociais que lhe permitam se
abrir ao mundo, entrar com o conhecimento de outros grupos sociais etc.
17)É importante que o infans, a criança e o adolescente quando internado seja acompanhado e
visitado num horário a combinar, por um estagiário que possa brincar, desenhar, conversar,
perceber as questões e as angustias, saber dos desejos do internado, facilitar o diálogo com a
equipe médica para elucidar as inquietações sobre a doença.
18)É importante que os infans escutem música clássica, e que quando hospitalizadas possam
escutar as mesmas músicas para facilitar a vivência de continuidade da existência. Da mesma
forma é importante que o infans ou criança possa levar ao hospital o seu objeto de afeição
preferido, objeto transicional e ou autístico, fonte de segurança.
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I- ADOÇÃO
V.1252 Édipo: “Venha o que venha, quero conhecer a minha origem, por mais obscuro
que seja ... A sorte é minha mãe, o desenvolvimento dos meses de humanidade me fez grande.
Com tal princípio, o que me importa do resto? Porque não hei de saber da onde venho?”
Todo ser humano é adotado. A concepção e o nascimento biológico não garantem o
nascimento psíquico.
2. FILIAÇÃO SIMBÓLICA.
(Fig. 14)
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Figura 14 - “L'Efant au pigeon”, 1901 - Pablo Picasso
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3. FILIAÇÃO DIABÓLICA.
( Fig. 15)
A ADOÇÃO QUE PERPETUA A MÁ RELAÇÃO
V.1363 Édipo: “Ai de mim! Tudo é claro agora! Oh luz do dia, te vejo pela última
vez, eu que nasci de quem não deveria nascer, e me casei com quem não deveria casar-
me, e matei a quem não devia matar!...”
O destino do menino adotado corre o risco de deterioração mental quando a gênese
da adoção está permeada por uma constelação narcísica, pré-genital, perversa que não
pode oferecer condições psíquicas para a estruturação da subjetividade.
a) A perturbação mental dos pais se arraiga em uma constelação narcísica. A
paternidade psíquica está seriamente perturbada. O filho é objeto de possessão.
b) O filho aprisionado no registro imaginário, no tenebroso espelhismo narcísico,
precisa encarnar a continuidade dos pais para sepultar o limite e a morte. O
infans é condenado a atender os ideais egóicos paternos, herdeiros do
narcisismo, em uma identificação narcísica alienante. O infans precisa ser o
“baluarte” das realizações paternas. Não há reconhecimento dos filhos como o
Outro da alteridade.
c) Na adoção não há trabalho de elaboração do luto pela perda da função
procriativa, nem do sonhado filho biológico que, como sinistra sombra, pode
sepultar a vida do filho adotado.
d) O filho ocupa o lugar de um fetiche quando a castração é recusada. O infans é
privado de um lugar simbólico na configuração edípica e privado do processo
de humanização.
e) O filho pode estar prisioneiro a perpetuar a simbiose patológica no registro
imaginário dual, narcísico, sem permitir a entrada da função paterna e a
necessária triangulação edípica.
f) Os pais não permitem o conhecimento sobre a origem, a aproximação à verdade.
Não se trata de uma informação racional despojada de amor que pode ter o
efeito de uma bomba explosiva que dinamita o aparelho psíquico.A verdade
sem amor é crueldade. Quando o Édipo sabe “a verdade” provoca a cegueira,
porque não pode perceber a mais terrível das privações : a falta de amor.
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Figura 15 - Desenho feito por criança da UAI
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