Você está na página 1de 141

Marcelo A.

Cabral
ANOTAÇÕES EM FARMACOLOGIA E FARMÁCIA CLÍNICA

Prefácio

Este singelo trabalho nasceu da necessidade acadêmica do autor-aluno em ter sempre à


mão um resumo simples e consolidado (se é que isso é possível, em face da amplidão das Ciências
Farmacêuticas), de tópicos importantes sobre farmacologia clínica. Trata-se de uma compilação
pessoal dos textos contidos em diversas obras de referência em farmacologia, e com uma visão
estritamente voltada para os mecanismos de ação dos principais fármacos empregados no
cotidiano da Atenção Farmacêutica. Desta maneira, não foram abordados neste resumo os
conceitos básicos de farmacocinética, farmacodinâmica e demais áreas afetas aos medicamentos.
Respeitando-se a finalidade deste resumo, as patologias abordadas aqui foram explicitadas
de maneira suscinta, geralmente no início de cada capítulo, com objetivo de facilitar a
compreenção quanto às bases da terapêutica farmacológica.
Mais uma vez é importante resaltar, que este trabalho artesanal não possui outra pretensão
se não a de satisfazer a necessidade pessoal do autor quanto à aquisição de conhecimentos na área
da Farmacologia. Contudo, é muito gratificante imaginar a possibilidade de que as informações
aqui contidas possam algum dia vir a beneficiar outros acadêmicos.

Marcelo A. Cabral
Nova Friburgo, 04 de janeiro 2010.
ANOTAÇÕES EM FARMACOLOGIA E FARMÁCIA CLÍNICA

Indice
Capítulo 1 – Medicamentos Colinérgicos

Capítulo 2 – Medicamentos Adrenérgicos

Capítulo 3 – Fármacos Antinflamatórios não Esteroidais – AINES

Capítulo 4 – Fármacos Glicocorticóides

Capítulo 5 – Fármacos Anti-hipertensivos

Capítulo 6 – Fármacos Antidiabéticos

Capítulo 7 – Fármacos para Tratamento das Dislipidemias

Capítulo 8 – Fármacos para Tratamento da Asma

Capítulo 9 – Fármacos na Quimioterapia do Câncer

Capítulo 10 – Fármacos Ansiolíticos e Hipnóticos

Capítulo 11 – Fármacos Antipsicóticos

Capítulo 12 – Fármacos Antidepressivos

Capítulo 13 – Fármacos Antiepilépticos

Capítulo 14 – Tratamento Farmacológico das Anemias e Leucemias

Capítulo 15 – Tratamento Farmacológico da Dor com Opióides

Capítulo 16 – Agentes Anestésicos Gerais

Capitulo 17 – Agentes Anestésicos Locais

Capítulo 18 – Farmacologia da Insuficiência Cardíaca

Capítulo 19 – Farmacologia das Disritmias Cardíacas

Capítulo 20 – Farmacologia da Isquemia Cardíaca

Capítulo 21 – Fármacos Antialérgicos

Capítulo 22 – Fármacos Antivirais

Capítulo 23 – Fármacos Antifúngicoss

Capítulo 24 – Fármacos Anti-helminticos

Capítulo 25 – Fármacos Antiprotozoários

Capítulo 26 – Fármacos nos Distúrbios da Hemostasia

Capítulo 27 – Fármacos nos Distúrbios Neurodegenerativos

Capítulo 28 – Farmacologia do TGI

Capítulo 29 – Fármacos no Tratamento da Artrite Gotosa

Capítulo 30 – Fármacos no Tratamento do Glaucoma

Capítulo 31 – Fármacos no Tratamento da Tuberculose

Capítulo 32 – Fármacos Antibióticos


ANOTAÇÕES EM FARMACOLOGIA E FARMÁCIA CLÍNICA

1) medicamentos que atuam no sistema nervoso autônomo - colinérgicos


1) – Síntese, liberação e metabolismo da acetilcolina

A síntese da acetilcolina, que é o neurotransmissor do


sistema nervoso parassimpático, se dá nos terminais pré-
sinápticos, quando a colina e a acetilCoA combinam-se
formando a acetilcolina, reação catalisada pela colina
acetiltransferase.

A despolarização do neurônio colinérgico pré-sináptico


permite a abertura dos seus canais de Ca+. O aumento da
concentração intracelular de cálcio causa a exocitose da
acetilcolina na fenda sináptica.

A cetilcolina se difunde pela fenda sináptica e se combina


com os receptores especializados, levando a um aumento
localizado da permeabilidade iônica (receptores nicotínicos) ou Os receptores nicotínicos são canais iônicos regulados
a ativação de segundos mensageiros intracelulares (receptores por ligantes (subtipos Nn e Nm). A ligação simultânea de
muscarínicos). duas moléculas de acetilcolina em sua subunidade alfa
deflagra uma alteração na conformação do receptor que, por
Por outro lado, a acetilcolinesterase está presente na
sua vez, cria um poro seletivo para cátions (entrada de Na+ e
membrana pós-sináptica, e é a responsável pela degradação da
saída de K+ que despolarizam a célula).
acetilcolina em colina e acetato.
Na placa motora, os receptores nicotínicos pré-sinápticos
2) - Receptores colinérgicos aumentam a entrada de cálcio no neurônio pré-sináptico,
aumentando assim a fusão das vesículas e liberação de
Existem dois tipos principais de receptores colinérgicos: os acetilcolina (retro-alimentação). Os receptores nicotínicos
receptores nicotínicos, que são canais iônicos dependentes de pós-sinápticos são excitatórios através da despolarização
ligantes; e os receptores muscarínicos, que pertencem à celular.
superfamília das proteínas G. A ligação da ACh liberada pelos neurônios motores alfa
para os receptores nicotínicos na membrana da célula
2.1 - Receptores nicotínicos muscular resulta em despolarização (entrada de Na+) da
placa motora terminal (geração do potencial de placa
Os receptores nicotínicos estão diretamente acoplados aos terminal – PPT), com conseqüente aumento da condutância
canais iônicos e medeiam a transmissão sináptica excitatória dos canais de Ca+ nas células musculares, que promoverão a
rápida na junção neuromuscular, nos gânglios autônomos e ligação actina/miosina – contração muscular.
em vários locais no SNC. O mecanismo de ação, tanto na placa Nos gânglios, a acetilcolina despolariza o axônio pós-
motora quanto nos gânglios, é baseado no fato de que esse sináptico com conseqüente formação de um novo potencial
receptor para a cetilcolina é também um canal iônico para Na+ e de ação (transmissão neuroquímica).
K+. A baixa afinidade do receptor nicotínico para acetilcolina
permite a rápida dissociação da ACh do receptor e a volta da
Quando o receptor nicotínico é ativado pela acetilcolina, o configuração do receptor ao estado de repouso.
canal se abre e ambos, Na+ e K+, fluem por ele, reduzindo os
A ocupação prolongada dos receptores nicotínicos por um
respectivos gradientes eletroquímicos (o Na+ entra na célula e o
agonista anula a resposta efetora, isto é, o disparo do neurônio
K+ saí dela), isso causa a despolarização da membrana celular.
pós-ganglionar cessa (efeito ganglionar), e a célula do músculo
Com a despolarização da membrana, ocorrem o disparo
neuronal (nos gânglios) e contração do músculo esquelético esquelético relaxa (efeito da placa terminal neuromuscular).
Dessa maneira, verifica-se a indução de um estado de “bloqueio
(placa motora).
despolarizante”, que é refratário à reversão por outros
agonistas. Esse efeito pode ser explorado para a produção de
paralisia muscular. Quando os níveis de acetilcolina
A liberação de acetilcolina na fenda sináptica, através da permanecem elevados, os receptores nicotínicos colinérgicos
fusão de vesículas (exocitose), depende da despolarização da podem sofrer rápida dessensibilização.
terminação axônica (despolarização pré-sináptica) e da
abertura dos canais de cálcio dependentes de voltagem. A
entrada de Ca+ no axônio pré-sináptico facilita a ligação das 2.2 - Receptores muscarínicos
proteínas que medeiam a fixação e a fusão das membranas
vesiculares. Os receptores muscarínicos são receptores acoplados à
proteína G. Os subtipos M1, M3 e M5 estão acoplados à
proteína G responsáveis pela estimulação da fosfolipase C,
com conseqüente formação de IP3 e DAG – aumento da

1 Marcelo A. Cabral
ANOTAÇÕES EM FARMACOLOGIA E FARMÁCIA CLÍNICA

concentração de Ca+ e ativação da proteína cinase C que


fosforiza proteínas intracelulares, ativando-as. troponina C, a tropomiosina retorna à sua posição de repouso,
Por outro lado, os subtipos M2 e M4 estão acoplados a bloqueando o local de ligação para a miosina na actina.
proteínas G responsáveis pela inibição da adenilil cliclase e
ativação dos canais de K+ (hiperpolarização da célula). Com 4) - Neurotransmissão Ganglionar
isso, os subtipos M2 e M4 pré-sinápicos inibem a entrada de
Ca+ no neurônio pré-sináptico, diminuindo a fusão das No sistema nervoso autônomo os gânglios simpáticos se
vesículas e a liberação de acetilcolina. localizam próximos à medula espinhal, e os gânglios
parassimpáticos se localizam nos órgãos alvos ou em suas
Os receptores M1 (neuronais) produzem excitação lenta proximidades.
dos glânglios; os receptores M2 (cardíacos) produzem redução
da freqüência e da força de contração cardíacas; os receptores Os neurônios pré-ganglionares parassimpáticos se
M3 (glandulares) causam secreção, contração da musculatura originam em núcleos do tronco encefálico (nervos facial,
lisa visceral e relaxamento vascular. glossofaríngeo, oculomotor e vago) e segmentos sacrais da
Os receptores muscarínicos são encontrados medula espinhal (origem crânio-sacral). Por outro lado, os
principalmente nos órgãos efetores (coração, pulmão, bexiga, neurônios pré-ganglionares simpáticos possuem origem toraco-
sistema gastrintestinal, olhos, glândulas lacrimais, glândulas lombar.
sudoríparas) e nas células endoteliais da vasculatura.
Embora os receptores muscarínicos como classe possam De maneira simplificada, a neurotransmissão ganglionar se
ser ativados seletivamente e apresentem acentuada dá da seguinte forma:
estereosseletividade entre agonistas e antagonistas, o uso
- despolarização da membrana neuronal pré-sináptica
terapêutico dos agentes colinomiméticos é limitado pela
ganglionar, com liberação de acetilcolina por exocitose,
escassez de drogas seletivas para subtipos específicos de
receptores muscarínicos. Essa falta de specificidade, - ativação dos receptores nicotínicos pós-sinápticos
combianda aos efeitos de amplo espectro da estimulação ganglionares pela acetilcolina, com conseqüente abertura dos
muscarínica sobre diferentes sistemas orgânicos, torna o uso canais de Na+;
terapêutico das drogas colinomiméticas um verdadeiro
desafio, de modo que a cuidadosa análise das propriedades - a abertura dos canais de Na+ despolariza a membrana do
farmacocinéticas das drogas desempenha papel neurônio ganglionar pós-sináptico, dando origem ao potencial
importante na tomada de decisões terapêuticas. excitatório pós-sináptico (PEPS);

3) - Neurotransmissão colinérgica na Junção - quando o PEPS atinge uma amplitude crítica, dá-se
Neuromuscular origem ao potencial de ação no nervo pós-sináptico;

Na junção neuromuscular, os neurônios motores inervam - o potencial de ação é transmitido pelo neurônio até sua
um grupo de fibras musculares. A área das fibras musculares terminação (sinapse) simpática ou parassimpática;
inervadas por um neurônio motor individual é conhecida como
- a ativação neuronal pós-ganglionar parassimpática, ativa
região de placa terminal. Múltiplas terminações pré-sinápticas
os receptores muscarínicos nos órgãos alvos causando os efeitos
estendem-se a partir do axônio do neurônio motor. Quando um
que estão relacionados na tabela 1.2.
neurônio motor é despolarizado, suas vesículas fundem-se com
a membrana pré-sináptica, liberando acetilcolina na fenda - a ativação neuronal pós-ganglionar simpática, ativa os
sináptica. Os receptores de acetilcolina na junção receptores adrenérgicos (alfa e beta) e produz, entre outros
neuromuscular são exclusivamente nicotínicos, e a estimulação efeitos, taquicardia; midríase; constipação, diminuição do tônus
desses receptores resulta em despolarização da membrana da e da motilidade gastrintestinal; retenção urinária; xerostomia;
célula muscular e em geração de um potencial de placa terminal. acomodação para visão para longe.
O potencial de placa terminal gerado despolariza os No Sistema Nervoso Somático, as fibras inervam
Túbulos T, causando a abertura dos canais de Ca+ no retículo diretamente seus alvos, os músculos esqueléticos, causando
sarcoplasmático. Isso proporciona o aumento da concentração contração muscular através da ativação dos receptores
intracelular do íon, que por sua vez se liga à troponina C, nicotínicos.
causando sua mudança conformacional. A mudança
conformacional da troponina C faz a tropomiosina (que estava A glândula supra-renal faz parte do sistema nervoso
bloqueando a interação entre a actina e miosina) mover-se, de simpático, apesar de ser ativada através de receptores
modo que a ligação miosina-actina ocorra, formando as nicotínicos.
chamadas pontes cruzadas. A formação dessas pontes está
associada à hidrólise de ATP e à geração de força. A transmissão ganglionar é muito complexa. Os agonistas
ganglionares (nicotina, tetrametilamônio - TMA e
O relaxamento ocorre quando o Ca+ é reacumulado no dimetilfenilpiperazino – DMPP) podem produzir efeitos
retículo sarcoplasmático pela Ca+ATPase de sua membrana. simpáticos ou parassimpáticos, além de poderem estimular ou
Assim a concentração de Ca+ diminui, não sendo possível mais inibir a transmissão ganglionar, dependendo da dose (bloqueio
a sua ligação à troponina C. quando o cálcio é liberado da despolarizante em altas doses).

2 Marcelo A. Cabral
ANOTAÇÕES EM FARMACOLOGIA E FARMÁCIA CLÍNICA

O bloqueio dos receptores nicotínicos ganglionares resulta


em resposta dos órgãos efetores opostas àquelas produzidas pelo 7.1 – Agonistas colinérgicos
tônus autônomo normal (se predominante o simpático ou o
parassimpático). O bloqueio não despolarizante ganglionar (que Ao se ligarem aos receptores muscarínicos, esses fármacos
pode ser produzido clinicamente pelo trimetafano e pela geram potencial pós-sináptico excitatório nos órgãos inervados
mecamilamina) de tônus predominantemente simpático pode pelo parassimpático. No sistema cardiovascular destacam-se
causar vasodilatação com hipotensão, aumento do fluxo bradicardia e diminuição da velocidade de condução do
sanguíneo periférico, dilatação das veias com redução do débito estímulo elétrico, particularmente no nódulo atrioventricular,
cardíaco, redução do suor e diminuição da estimulação do trato que pode ter sua condução bloqueada por altas doses de um
genital. Por outro lado, o bloqueio ganglionar de tônus parassimpaticomimético. Nos vasos, onde há receptores
predominantemente parassimpático pode causar taquicardia; muscarínicos a despeito da mínima inervação parassimpática, os
midríase; ciclopegia – visão à distância; redução do tônus, das parassimpaticomiméticos produzem típica vasodilatação
secreções e da motilidade gastrintestinais, retenção urinária, intermediada pelo estímulo à liberação de óxido nítrico, com
xerostomia, inibição da ereção peniana. conseqüente queda da pressão arterial. Os
parassimpaticomiméticos aumentam a motilidade, tono e
Os fármacos bloqueadores ganglionares são utilizados atividade secretora no sistema gastrintestinal, incluindo o trato
clinicamente para o controle inicial da pressão arterial em biliar. No sistema urinário, estimulam a motilidade uretral,
pacientes com aneurisma aórtico dissecante agudo, ou para contraem o músculo detrusor e relaxam o músculo esfíncter
produzir uma condição de hipotensão controlada visando interno. Promovem broncoconstrição e aumento da secreção
diminuir hemorragia em cirurgias, sobretudo aquelas realizadas nasal e traqueobrônquica. No globo ocular, promovem miose
em vasos sanguíneos. por estímulo ao músculo constritor da pupila e perda da
capacidade de acomodação por contração do músculo ciliar.
5) – Neurotransmissão colinérgica nos Órgão Efetores
Os agonistas dos receptores nicotínicos são utilizados
A estimulação neuronal pós-ganglionar parassimpática,
clinicamente para indução de paralisia muscular.
ativa os receptores muscarínicos nos órgãos alvos, causando os
efeitos que estão relacionados na tabela 1.2. Os agonistas colinérgicos raramente são administrados por
injeção IM ou IV, visto que são quase imediatamente
6) – Efeitos da acetilcolina no SNC
degradados por colinesterases presentes nos espaços
As funções da acetilcolina no SNC consistem intersticiais, bem como no interior dos vasos sanguíneos. Além
principalmente em modulação do sono, estado de vigília, disso, os agonistas colinérgicos atuam rapidamente e podem
aprendizagem e memória; supressão da dor ao nível da medula provocar uma crise colinérgica (superdose do fármaco,
espinhal. Esta última pode ser comprovada clinicamente através resultando em fraqueza muscular extrema e possível paralisia
da injeção de inibidores da acetilcolinesterase no líquido dos músculos utilizados na respiração).
cefalorraquidiano.
Os principais medicamentos agonistas colinérgicos são:
7) – Medicamentos Colinérgicos
- Acetilcolina, Betanecol, Carbacol e Pilocarpina.
Os parassimpaticomiméticos podem ser diretos e indiretos.
A utilidade terapêutica da Acetilcolina é limitada em
Os primeiros estimulam diretamente os receptores muscarínicos
virtude de sua falta de seletividade como agonista para
e nicotínicos (agonistas colinérgicos). Os indiretos atuam por
diferentes tipos de receptores colinérgicos e de sua rápida
meio da inibição de acetilcolinesterase (anticolinesterásicos),
degradação por colinesterases. Essa dificuldade foi
preservando a ação da acetilcolina endógena.
superada, em parte, pelo desenvolvimento de três derivados
de ésteres de colina: Metacolina, Carbacol e Betanecol.

Fig. 02 - Estimulação colinérgica Betanecol é empregado para estimular a motilidade


gastrintestinal em quadro de íleo paralítico e a micção em
casos de bexiga neurogênica ou retenção urinária não
obstrutiva. Também serve, junto com metacolina, como
alternativa à pilorcapina para promover salivação em casos
de xerostomia. O betanecol é um agonista seletivo dos
receptores muscarínicos e resistente à degradação pelas
colinesterases.

Acetilcolina (solução a 1%) e carbacol (solução de


0,01 à 3%) têm uso intraocular em cirurgia para produzir
miose. Carbacol e pilocarpina (solução de 0,25 a 1%) são
eficazes no tratamento do glaucoma (miótico), visto que a
contração do músculo ciliar traciona a rede trabecular,
aumentando a sua porosidade e permeabilidade ao efluxo
do humor aquoso. A contração do esfíncter da íris pela
pilocarpina afasta a íris periférica da rede trabecular,
3 Marcelo A. Cabral
ANOTAÇÕES EM FARMACOLOGIA E FARMÁCIA CLÍNICA

abrindo assim, a via para o efluxo de saída do humor


aquoso. O carbacol é menos seletivo para receptores acetilcolina. O acúmulo de acetilcolina na fenda sináptica
muscarínicos, porém é resistente à colinesterases. resulta numa maior ativação dos receptores nicotínicos e
muscarínicos. Os agentes anticolinesterásicos são divididos
A metacolina possui seletividade pelos receptores em duas categorias, segundo a duração do bloqueio da
muscarínicos, é resistente à pseudo-colinesterase e pouco acetilcolinesterase:
suscetível à ação da colinesterase. A metacolina é utilizada
para identificar a presença de hiper-reatividade brônquica - reversíveis: ambemônio, donepezil, edrofônio,
em pacientes sem asma clinicamente aparente. Para essa neostigmina, fisostigmina, piridostigmina e tacrina.
indicação, o fármaco é administrado por inalação, e os
pacientes que podem desenvolver asma geralmente Os agentes anticolinesterásicos reversíveis bloqueiam a
apresentam contração exagerada das vias aéreas. Ao degradação da acetilcolina durante minutos ou horas, ao
terminar o teste, pode-se administrar um broncodilatador passo que o efeito bloqueador dos agentes irreversíveis
(agonista beta-adrenérgico) para anular o efeito perdura por vários dias ou semanas. Isto se dá devido ao
broncoconstritor. tipo de ligação química que ocorre entre os medicamentos e
a acetilcolinesterase.
Esses efeitos são produzidos pela ativação dos
receptores muscarínicos (ver tabela 1.2). - irreversíveis: os agentes anticolinesterásicos
irreversíveis exercem efeitos de longa duração e são
Todas as drogas são muito hidrofílicas e não utilizados basicamente como inseticidas tóxicos e pesticidas
atravessam as membranas, uma vez que retêm o (carbamatos e organofosforados) ou como gás dos nervos
grupamento amônio quaternário do componente colina da na guerra química. Apenas um deles possui utilidade
acetilcolina. terapêutica: o ecotiopato.

A pilocarpina é um alcalóide colinomimético de Os agentes anticolinesterásicos possuem utilidade


ocorrência natural. Trata-se de uma amina terciária que terapêutica no tratamento do glaucoma e de outras
atravessa as membranas com relativa facilidade. Por condições oftalmológicas, bem como na facilitação da
conseguinte, é rapidamente absorvida pela córnea do olho e motilidade gastrintestinal e vesical; além disso, influenciam
tem a capacidade de atravessar a barreira hematoencefálica. a atividade na junção neuromuscular do músculo
Ela é um agonista puro dos receptores muscarínicos e não é esquelético, aumentando a força muscular na miastenia
afetada pela colinesterase. A pilocarpina deve ser utilizada gravis. Os agentes anticolinesterásicos que atravessam a
no lugar de inibidores da AChE para o tratamento do barreira hematoencefálica demonstraram ter eficácia
glaucoma de ângulo fechado. limitada no tratamento da doença de Alzheimer.

A metacolina, o betanecol e a pilocarpina são agonistas Portanto, os locais de ação dos anti–CHE de
seletivos dos receptores muscarínicos, enquanto o carbacol importância terapêutica incluem o SNC (doença de
e a acetilcolina podem ativar os receptores muscarínicos e Alzheimer - tacrina, donepezil, rivastigmina e galantamina
nicotínicos. - ), o olho (glaucoma - ecotiopato), o intestino (íleo
paralítico e atonia da bexiga - neostigmina) e a junção
A hipotensão potencialmente perigosa produzida pela neuromuscular da musculatura esquelética (miastenia
ativação dos receptores muscarínicos representa uma gravis – piridostigmina, neostigmina e ambemônio).
importante limitação para administração sistêmica de
agonistas muscarínicos. Com administração de baixas doses No olho, os anticolinesterásicos causam hiperemia
de agonistas muscarínicos, essa hipotensão desencadeia a conjuntival e miose (pela contração do músculo esfíncter da
ativação de uma estimulação reflexa simpática pupila), acomodação da visão para perto (devido constrição
compensatória do coração. A estimulação simpática do músculo ciliar), e redução da pressão intra-ocular
aumenta a freqüência cardíaca e o tônus vasomotor, quando alta (facilitação do escoamento do humor aquoso).
anulando, em parte a resposta vasodilatadora direta. Por
conseguinte, a taquicardia provocada por agonistas No trato gastrintestinal a neostigmina intensifica as
muscarínicos é indireta e paradoxal. Com o aumento da contrações gástricas e aumenta a secreção de ácido gástrico,
dose, a ativação dos receptores M2 no nodo AS e nas fibras além de aumentar a atividade motora do intestino delgado e
AV passam a predominar, causando bradicardia e redução grosso.
da velocidade de condução AV. Doses muito altas de
agonistas muscarínicos podem produzir bradicardia letal e Os agentes anti-ACHE revertem o antagonismo
bloqueio AV. causado por agentes bloqueadores neuromusculares
competitivos (antagonistas colinérgicos). A neostigmina
A succinilcolina é utilizada para produzir paralisia não é eficaz contra a paralisia da musculatura esquelética
muscular em cirurgia devido ao seu efeito de bloqueio causada pela succinilcolina, visto que este agente provoca
despolarizante sobre os receptores nicotínicos. bloqueio neuromuscular por despolarização.

7.2 – Anticolinesterásicos O edrofônio, um agente quaternário cuja atividade se


limita às sinapses do sistema nervoso periférico, tem
Os agentes anticolinesterásicos bloqueiam a ação da afinidade moderada pela acetilcolinesterase e possui
enzima acetilcolinesterase, impedindo a degradação da eliminação renal rápida, o que explica sua curta duração de
4 Marcelo A. Cabral
ANOTAÇÕES EM FARMACOLOGIA E FARMÁCIA CLÍNICA

ação. Já a tacrina e o donepezil têm maior afinidade pela


ACHE, são mais hidrofóbicos (mais lipofílicos) e Pode ser difícil definir se o paciente está apresentando
atravessam a barreira hematoencefálica, inibindo a ACHE uma resposta tóxica ao medicamento colinérgico (dose
no sistema nervoso central. excessiva) ou uma crise miastênica (fraqueza muscular
extrema e grave dificuldade respiratória). Pode-se utilizar o
Os efeitos muscarínicos de utilização clínica dos
edrofônio (que é reversível – de curta duração) para
anticolinesterásicos são os mesmos dos agonistas
diferenciar um efeito farmacológico tóxico de uma crise
colinérgicos. A neostigmina pode ser empregada em
miastênica. Se houver melhora após o uso da injeção de
quadros de íleo paralítico e atonia de bexiga. A
edrofônio, a causa é a miastenia, e indica-se mais
fisostigmina tópica (colírio) é usada em associação com
anticolinesterásico. Se não houver melhora, deve-se
agonistas colinérgicos no tratamento do glaucoma.
diminuir a dose de anticolinesterásico. Quando
Os anticolinesterásicos também são utilizados no administrado o edrofônio, é preciso ter a disposição
tratamento das intoxicações por fármacos antagonistas aparelho de aspiração, oxigênio, ventilação mecânica e
colinérgicos (como a atropina), antidepressivos tricíclicos, medicamentos de emergência (como atropina) em caso de
pelos alcalóides da beladona e pelos narcóticos. Nesses possível ocorrência de crise colinérgica.
casos, se houver manifestações centrais, deve-se usar
7.4 - Efeitos adversos dos medicamentos
fisostigmina que ultrapassa a barreira hematoencefálica.
colinérgicos:
Os anticolinesterásicos tacrina, donezepil,
Devido à sua ligação a receptores presentes no sistema
rivastigmina e galantamina, vêm sendo utilizados
nervoso parassimpático, os agonistas colinérgicos podem
também no tratamento da demência de Alzheimer.
produzir efeitos adversos em qualquer órgão inervado pelos
A doença de Alzheimer caracteriza-se por nervos parassimpáticos, tais como: náuseas, vômitos,
acentuada atrofia do córtex cerebral e perda de neurônios cólicas e diarréias, visão turva, bradicardia, hipotensão
corticais e subcorticais. A base anatômica do déficit arterial, dispnéia, freqüência urinária aumentada, aumento
colinérgico é a atrofia e degeneração dos neurônios da salivação e sudorese.
colinérgicos subcorticais. Da constatação deste fato surgiu
7.5 – Bloqueadores colinérgicos
a “hipótese colinérgica”, segundo a qual uma deficiência
de acetilcolina é decisiva na gênese dos sintomas da DA. Os medicamentos bloqueadores colinérgicos
Porém, é necessário assinalar que o déficit observado na (anticolinérgicos) interrompem os impulsos nervosos
DA é complexo, envolvendo múltiplos sistemas parassimpáticos no SNC e no sistema nervoso autônomo-
neurotransmissores, incluindo a serotonina, o glutamato, são antagonistas competitivos da acetilcolina em receptores
além de apresentar destruição dos neurônios corticais e do muscarínicos.
hipocampo.
Os principais anticolinérgicos são os alcalóides da
Já os efeitos nicotínicos dos anticolinesterásicos são beladona: atropina, beladona, homatropina, sulfato de
empregados para reverter bloqueio neuromuscular hiosciamina, bromidrato de escopolamina, glicopirrolato,
produzido por relaxantes musculares periféricos propantelina, benztropina, trexifenidil, etopropazina e
competitivos (não despolarizantes) e no tratamento da oxibutinina.
miastenia gravis.
Os anticolinérgicos são frequentemente utilizados no
As reações adversas associadas aos anticolinesterásicos tratamento dos distúrbios GI e suas complicações, tais
são: náusea, vômitos, diarréia, dispnéia, respiração sibilante como condições espásticas ou hiperativas do trato GI e das
e convulsões. vias urinárias, visto que relaxam os músculos e diminuem
as secreções GI. Os compostos de amônio quaternário,
É importante saber que, em concentrações terapêuticas,
como a propantelina, constituem os fármacos de escolha
os inibidores da AChE não ativam os receptores
para estas condições, pois causam menos reações adversas
colinérgicos em locais que não recebem estimulação
do que os alcalóides da beladona.
sináptica colinérgica, como os receptores muscarínicos
endoteliais, de modo que o seu uso não está associado ao O controle do acesso aos receptores muscarínicos no
mesmo risco de produzir respostas vasodilatadora sistema nervoso central por uma amina terciária (atropina,
acentuada. escopolamina, ciclopentolato e tropicamida) versus
grupamento de amônio quaternário (ipatrópio,
7.3 - Diagnóstico diferencial da miastenia
glicopirrolato, propantelina) é fundamentalmente
A miastenia é uma falha na transmissão importante na seleção de agentes antimuscarínicos.
neuromuscular, cuja causa é uma resposta auto-imune que
Os medicamentos anticolinérgicos são administrados
provoca perda dos receptores nicotínicos da acetilcolina na
por injeção antes dos exames de endoscopia ou
junção neuromuscular. Ocorre acentuada melhora clínica
sigmoidoscopia para relaxar a musculatura lisa do trato GI.
com neostigmina (7,5 mg), piridostigmina (30 a 60 mg) ou
Eles ainda são administrados antes de uma cirurgia para:
ambemônio (2,5 a 5 mg), administrados oralmente.
reduzir as secreções orais e gástricas; reduzir as secreções
no sistema respiratório; e impedir queda na freqüência
5 Marcelo A. Cabral
ANOTAÇÕES EM FARMACOLOGIA E FARMÁCIA CLÍNICA

cardíaca causada por estimulação nervosa vagal durante a


anestesia. A atropina e a escopolamina são utilizados como
antiespasmódicos, visando o controle de cólicas intestinais,
Embora os agonistas muscarínicos tipicamente não
renal e uterina.
apresentem seletividade para os receptores muscarínicos,
alguns antagonistas muscarínicos são seletivos na sua Os anticolinérgicos (ciclopentolato e tropicamida) são
capacidade de bloquear determinados subtipos de usados também como ciclopégicos (paralisam os músculos
receptores muscarínicos. ciliares) e como midriáticos para dilatar as pupilas. A
pressão intra-ocular pode aumentar perigosamente em
Tabela 1.1 - Efeitos dos agentes bloqueadores
pacientes com glaucoma de ângulo estreito.
muscarínicos

Tecido ou sistema Efeitos


Os alacalóides da beladona atuam como antídotos
contra drogas colinérgicas e agentes anticolinesterásicos. A
Pele Inibição da sudorese; rubor. atropina é o fármaco escolhido para o tratamento do
envenenamento por pesticidas organofosforados. A atropina
Visual Ciclopegia; midríase; aumento também neutraliza os efeitos dos agentes bloqueadores
da PI. neuromusculares.

Gastrintestinal Diminuição da salivação e Os fármacos antagonistas dos receptores muscarínicos


secreções; redução do tônus e (hioscina e escopolamina) bloqueiam a ação da acetilcolina nos
motilidade do TGI. receptores muscarínicos localizados na zona do vômito.
A hioscina mostra-se eficaz contra náuseas e vômitos
Urinário Retenção urinária; relaxamento de origem labiríntica e contra os vômitos causados por
do ureter. estímulos locais no estômago, porém é ineficaz contra
substâncias que atuam diretamente sobre a ZGQ. Ela é o agente
Respiratório Dilatação brônquica e mais potente disponível para prevenção da cinetose, embora
diminuição das secreções.
seja menos útil uma vez instalada a náusea. Sua ação
Cardiovascular Bradicardia em baixas doses; antiemética torna-se máxima 1 - 2 horas após sua ingestão. Pode
taquicardia em altas doses. causar sonolência e ressecamento da boca. A escopolamina
(fármaco antagonista muscarínico similar à atropina e que
Sistema nervoso central Diminuição concentração, atravessa a barreira hematoencefálica) também é indicada como
memória; sonolência; sedação. profilaxia em cinetose cujos estímulos são de curta duração
(viagem de 4 a 6 horas), porém provoca alta incidência de
A atropina e outros antagonistas dos receptores efeitos adversos, sendo assim os antagonistas H1 apesar de
muscarínicos produzem efeitos mínimos sobre a circulação menos potentes, são agentes de escolha na profilaxia da
na ausência de agonistas muscarínicos circulantes. Isso cinetose. O mecanismo farmacológico consiste no bloqueio dos
porque o endotélio vascular não é inervado pelo sítios colinérgicos nos núcleos vestibulares e na formação
parassimpático, mas possui receptores muscarínicos. Não reticular.
existindo agonistas circulantes, não haverá alteração no
estado de relaxamento endotelial. Por sua vez, os fármacos Os antagonistas dos receptores muscarínicos (triexifenidil,
antagonista por si só carecem de atividade intrínseca. benzotropina e difenidramina) são utilizados também no
tratamento da doença de Parkinson e no tratamento dos
A atropina é uma mistura racêmica de DL- sintomas extrapiramidais causados por medicamentos. Isso pode
hiosciamina, em que apenas o isômero levorrotatório ser explicado pelo fato de que os receptores muscarínicos da
constitui a forma farmacológica ativa. Ela constitui o acetilcolina exercem um efeito excitatório, oposto ao da
fármaco escolhido para tratar a bradicardia sinusal e as dopamina, sobre os neurônios estriatais, bem como um efeito
arritmias causadas por anestésicos. A acetilcolina liberada inibitório pré-sináptico sobre as terminações nervosas
das fibras nervosas parassimpáticas ativa os receptores dopaminérgicas. Por conseguinte, a supressão desses efeitos
muscarínicos (M2) no nodo SA e AV. A ativação desses compensa, em parte, a falta de dopamina. Esses fármacos
receptores inibe a adenilato ciclase, além de aumentar a diminuem mais o tremor do que a rigidez ou a hipocinesia. Seus
condutância do canal de K+. Como resultado, o nodo SA é efeitos colaterais são boca seca, constipação, retenção urinária e
despolarizado com menos freqüência e dispara menos visão turva. Os efeitos indesejáveis são sonolência e confusão.
potenciais de ação por unidade de tempo (diminuição da
freqüência cardíaca). Quando se administra atropina, o Além da atropina e da escopolamina, diversos
medicamento compete com a acetilcolina pela sua ligação fármacos possuem propriedades antimuscarínicas, incluindo
aos receptores colinérgicos presentes nos nodos SA e AV. antidepressivos tricíclicos, fenotiazinas e anti-histamínicos. A
Bloqueando a ação da acetilcolina, a atropina acelera a fisostigmina tem sido utilizada no tratamento da intoxicação
frequência cardíaca. Além disso, esse fármaco é usado em aguda por esses agentes.
quadro de infarto do miocárdio, acompanhado de
Os antagonistas da acetilcolina são utilizados
hiperatividade vagal, com bradicardia e hipotensão.
principalmente no tratamento da doença de Parkinson em
pacientes que recebem agentes antipsicóticos (que são
antagonistas da dopamina e que, portanto, anulam o efeito da
levodopa).
6 Marcelo A. Cabral
ANOTAÇÕES EM FARMACOLOGIA E FARMÁCIA CLÍNICA

Além disso, o brometo de ipratrópio é empregado na


profilaxia e tratamento da asma e da bronquite. micção e defecação involuntárias. Efeitos na placa motora
exteriorizam-se inicialmente por fasciculação, seguindo-se
Os fármacos antagonistas nicotínicos (D-tubocurarina, paralisia flácida. Manifestações centrais incluem confusão,
pancurônio, vecurônio e mivacúrio) são utilizados para causar ataxia, diminuição dos reflexos, convulsões, coma e
bloqueio neuromuscular não despolarizante (bloqueio paralisia do centro respiratório. A morte sobrevém em
competitivo com a acetilcolina) durante procedimento cirúrgico tempo que varia de 5 minutos a 24 horas. O tratamento da
– produzem paralisia flácida semelhante à miastenia. Seus intoxicação é feito com medidas gerais, anticolinérgicos
efeitos podem ser revertidos pelos inibidores da (atropina) e regeneradores da acetilcolinesterase
acetilcolinesterase. O trimetafano pode ser utilizado para (pralidoxima, IH6). A oxima deve ser administrada antes de
produzir bloqueio ganglionar no tratamento da hipertensão em ocorrer o “envelhecimento” da acetilcolinesterase, (que é
pacientes com dissecação da aorta, pois atenuam os reflexos perda de um grupamento alcóxi da enzima fosforilada). A
simpáticos. pralidoxima é uma enzima quaternária, por isso não
atravessa a barreira hematoencefálica e, portanto, não é útil
7.5.1 - Cuidados especiais com bloqueadores na reativação das colinesterases no SNC. A atropina pode
colinérgicos antagonizar todos os efeitos produzidos em receptores
muscarínicos (porque ela não antagonisa os efeitos da
Como os bloqueadores colinérgicos retardam a ativação dos receptores nicotínicos?). Injetam-se
passagem dos alimentos e das drogas pelo estômago (por inicialmente 2 a 4 mg, por via intravenosa, seguidos de 2
inibirem a motilidade gastrintestinal), estas permanecem mg a cada 5 -10 minutos, até o desaparecimento dos efeitos
em contato prolongado com a mucosa do TGI. Esse efeito muscarínicos.
eleva a quantidade do fármaco absorvido e, portanto,
aumenta o risco de efeitos adversos. 8.2 – Toxina botulínica
Os agentes bloqueadores muscarínicos são contra- A toxina botulinica é uma proteína produzida pelo
indicados no glaucoma de ângulo fechado. Além disso, é bacilo Clostridium botulinum. Ela bloqueia a liberação de
preciso ter cautela em indivíduos com glaucoma de ângulo acetilcolina dos terminais pré-sinápticos, ao interferir na
aberto ainda não tratado, cardiopatia, hipertireoidismo ou ação fisiológica da VAM, da SNAP-25 e da SINTAXINA,
hipertrofia prostática. Além disso, esses fármacos não que são as proteínas de membranas envolvidas no
devem ser administrados em pacientes com infecções mecanismo de mobilização e migração das vesículas. A
gastrintestinais, visto que essas drogas diminuem a intoxicação botulínica provoca paralisia motora e
motilidade gástrica e promovem a retenção dos parassimpática progressiva, com ressecamento da boca,
microrganismos infecciosos no TGI. turvação da visão e dificuldade na deglutição, juntamente
com paralisia respiratória progressiva. O tratamento com
O risco da toxicidade da digoxina aumenta quando é antitoxina só é eficaz quando administrado antes do
administrada juntamente com um bloqueador colinérgico. aparecimento dos sintomas, visto que , quando a toxina está
Isto se dá devido ao aumento da absorção da digoxina no ligada, sua ação não pode ser revertida. A taxa de
TGI e também ao bloqueio da ação do nervo vago, o que mortalidade é elevada, e a recuperação leva várias semanas.
causa um aumento da freqüência cardíaca (taquicardia). Os anticolinesterásicos e as drogas que aumentam a
liberação de transmissores (tetrametilamônio) são
A absorção de comprimidos de nitroglicerina
ineficazes na restauração da transmissão. A toxina
colocados sob a língua é reduzida quando ingeridos com
botulínica, injetada localmente em músculos, é utilizada no
bloqueador colinérgico, devido à inibição das glândulas
tratamento de uma forma de espasmo palpebral persistente
salivares.
e incapacitante (blefarospasmo), bem como em outros tipos
7.5.2- Reações adversas dos anticolinérgicos de espasmo muscular local, como, por exemplo, na
espasticidade.
Esses fármacos possuem uma margem de segurança (ou
janela terapêutica) estreita. As principais reações adversas são 8.3 – Curare
boca seca, visão borrada, redução das secreções brônquicas,
O curare é uma mistura de alcalóides de ocorrência
aumento da freqüência cardíaca e diminuição da sudorese.
natural, que são encontrados em diversas plantas da
8) – Toxicologia Colinérgica América do Sul, são utilizados como veneno para flechas
pelos índios desta região. Ele compete com a acetilcolina
8.1 – Organofosforados pelos receptores da placa motora, em doses máximas
produz paralisia dos músculos respiratórios e morte.
Inseticidas organofosforados têm grande importância
toxicológica. As manifestações de intoxicação aguda são 8.4 – Beta-bungarotoxina
explicadas pelos efeitos da acetilcolina em receptores
muscarínicos e nicotínicos, centrais e periféricos. Em casos A beta-bungarotoxina é uma proteína contida na
leves e moderados, destacam-se o aumento da secreção e a peçonha de várias serpentes da família das cobras; possui
constrição da musculatura lisa dos tratos respiratórios e ação semelhante à da toxina botulínica.
gastrintestinal, salivação, miose, dor ocular e dificuldade
visual. Nos casos graves, há bradicardia, hipotensão,
7 Marcelo A. Cabral
ANOTAÇÕES EM FARMACOLOGIA E FARMÁCIA CLÍNICA

8.5 - Toxina tetânica


- betanecol – promove a motilidade do TGI e do trato
A toxina tetânica (tetanospasmina) tem principalmente urinário.
ação central, pois é transportada de modo retrógrado ao - pilocarpina – agente miótico, e tratamento da xerostomia.
longo do neurônio motor até o seu corpo na medula
espinhal. A partir daí, a toxina migra para os neurônios • Agonistas nicotínicos:
inibitórios que fazem sinapse com o neurônio motor e - succinilcolina – utilizada para produzir paralisia em
bloqueia a exocitose do neurônio inibitório. O bloqueio do cirurgia devido ao efeito de bloqueio despolarizante.
neurotransmissores inibitórios (glicina e o GABA) dá
origem ao tétano ou paralisia espástica: estado de hipertonia • Antagonistas muscarínicos:
com espamos e contraturas dolorosas. O tratamento é - atropina – utilizada para induzir midríase (exames
realizado, além da administração de soro antitetânico e oftalmológicos); reverter bradicardia sinusal; inibir excesso
gamaglobulina, com a administração de miorrelaxantes salivação e de secreção de muco; impedir reflexos vagais
potentes, como o curare. induzidos por traumatismo cirúrgicos em órgãos viscerais, e
anular envenenamento muscarínico. Possui pouca afinidade
8.6 - Toxina da viúva negra pelos receptores nicotínicos.
- escopolamina (hioscina) – prevenção e tratamento da
A toxina do veneno da aranha viúva-negra (alfa-
cinetose; náusea associada à quimioterapia.
latrotoxina) se liga às neurexinas, proteínas
- metescopolamina e glicopirrolato – diminuição das
transmembranas existente na membrana da terminação
secreções orais; tratamento de úlceras pépticas; redução do
nervosa, o que dá origem a uma exocitose maciça de
espasmo do TGI.
vesículas sinápticas colinérgicas. Isso causa mialgia,
- brometo de ipatrópio – tratamento da DPOC. Tratamento e
sudorese profusa e agitação psicomotora, dor abdominal,
profilaxia da asma e bronquite.
priapismo, hipertensão e taquicardia.
- oxibutinina, propentalina, terodilina, tolterodilina –
9 - Lista dos principais fármacos colinérgicos e suas tratamento da bexiga hiperativa.
aplicações clínicas:
Obs: os antimuscarínicos são contra-indicados aos pacientes
• Toxina botulínica – (degrada a sinaptobrevina, com glaucoma, hipertrofia prostática e em individuais
impedindo a fusão da vesícula sináptica com a membrana idosos.
do neurônio pré-sináptico) estrabismo, torcicolo, acalasia,
rugas e blefaroespasmo. • Antagonistas nicotínicos:
São utilizados para causar bloqueio neuromuscular não
• Anticolinesterásicos: despolarizante (bloqueio competitivo com a ACh) durante
- neostigmina, edrofônio, fisostigmina, piridostigmina e procedimento cirúrgicos – produzem paralisia flácida
ambemônio – tratamento da miastenia. semelhante à miastenia. Seus efeitos podem ser revertidos
- fisostigmina – reverte envenenamento de agente pelos inibidores da acetilcolinesterase.
anticolinérgico – penetra no cérebro e medula por ser uma - D-tubocurarina
amina terciária. - pancurônio
- tacrina, donepezina, rivastigmina e galantamina – - vecurônio
tratamento da doença de Alzheimer. - mivacúrio
- trimetafan – utilizado para produzir bloqueio ganglionar
* agonistas muscarínicos: no tratamento da hipertensão em pacientes com dissecação
- metacolina – utilizada apenas para o diagnóstico da asma; da aorta, pois atenua os reflexos simpáticos.
- carbacol – uso tópico para tratamento glaucoma (produz
miose – facilita esvaziamento

8 Marcelo A. Cabral
Tabela 1.2 - Principais efeitos da ativação dos receptores muscarínicos:

Local Efeito Fisiologia


Vasculatura vasodilatação A estimulação dos receptores muscarínicos M3, localizados nos
vasos sanguíneos, ativa o sistema de segundo mensageiro de Ca+ e
promove a entrada direta de Ca+ no citosol. O aumento de Ca+ ativa
o complexo de Ca+-calmodulina, que estimula a óxido nítrico sintase
endotelial, uma enzima que catalisa a formação de NO a partir da l-
argenina. O óxido nítrico ativa a guanil ciclase, uma enzima que
aumenta a concentração de GMPc. O GMPc ativa a miosina
fosfatase, que desfosforila a cadeia leve de miosina, impedindo a
formação de pontes cruzadas de actina-miosina, causando o
relaxamento do músculo liso vascular.

Obs: os agentes bloqueadores ganglionares também provocam


vasodilatação, pois inibem a inervação simpática pós-ganglionar que
chega aos vasos sanguíneos.
Iris Contração e miose O tamanho da pupila é controlado reciprocamente por dois músculos
da Iris: o dilatador da pupila (radial) e o constritor da pupila
(esfíncter). O músculo dilatador da pupila é controlado pela
inervação simpática através de receptores alfa1. A ativação desses
receptores provoca a contração do músculo radial e a dilatação da
pupila, ou midríase.
O músculo constritor da pupila é controlado pela inervação
parassimpática, através de receptores muscarínicos. A ativação
desses receptores provoca a contração do músculo esfíncter da
pupila, levando à constrição da pupila, ou miose.
Músculo ciliar Acomodação da visão para A contração do músculo ciliar, através da ativação dos receptores
perto muscarínicos, leva o cristalino a um maior grau de “arredondamento”
e a um aumento em seu poder de refração.
Glândula salivar Aumento de Secreção rala Os nervos cranianos VII (facial) e IX (glossofaríngeo) liberam
aceltilcolina que ativam os receptores muscarínicos nas células
acinares e ductais, responsáveis pela formação da saliva. O aumento
na formação de IP3 e Ca+ produzem a ação fisiológica de secreção
salivar aumentada.
Brônquios Constrição e aumento das Constrição do músculo liso brônquico.
secreções
Coração Bradicardia Dois fatores são responsáveis pela diminuição da contratilidade atrial
causada pela estimulação parassimpática, através da ativação dos
receptores muscarínicos M2:
1) a acetilcolina diminui a corrente de entrada de Ca+ durante
o platô do potencial de ação; e
2) a acetilcolina aumenta a corrente de saída de K+, portanto
encurtando a duração do potencial de ação e diminuindo
indiretamente a corrente de entrada de cálcio.
Juntos, esses dois efeitos diminuem a quantidade de Ca+ que
penetra nas células atriais durante o potencial de ação,
diminuindo o cálcio disparador e diminuindo a quantidade de
Ca+ liberado do retículo sarcoplasmático.
TGI Aumento do tônus, das Aumento do tônus: a ativação dos receptores muscarínicos aumenta a
secreções e relaxamento dos freqüência e a força das contrações gástricas, da mesma forma que
esfíncteres. aumenta a contração do músculo liso intestinal.
Aumento das secreções: quando a acetilcolina liberada pelo nervo
vago se liga aos receptores muscarínicos M1 das células parietais do
estômago, ativa-se a fosfolipase C. Esta enzima libera DAG e IP3
dos fosfolipídeos de membrana e, a seguir, o IP3 libera cálcio dos
estoques intracelulares. O Ca+ e o DAG ativam proteína-cinases que
produzem a ação fisiológica final: a secreção de H+ pelas células
parietais para formação de HCl. Além disso, a inervação
parassimpática também estimula a secreção pancreática.
Bexiga Aumento da atividade – micção. O nervo sacral número 3 libera acetilcolina que ativa os receptores
muscarínicos localizados na bexiga, causando a contração do
músculo detrusor (contração da bexiga) e relaxamento do esfíncter
interno.
Trato reprodutor Ereção A estimulação parassimpática resulta na liberação de óxido nítrico,
que provoca o relaxamento do músculo liso trabecular dos corpos
cavernosos. O óxido nítrico ativa a guanil ciclase, uma enzima que
aumenta a concentração de GMPc, que provoca o relaxamento do
músculo liso. Esse relaxamento possibilita o influxo de sangue para o
interior dos seios dos corpos cavernosos sob pressões que se
aproximam das pressões do sistema arterial.
A ejaculação e o relaxamento peniano possuem inervação simpática.
Útero Variável
Dor Modulação - Diminuição da Acredita-se que a acetilcolina liberada pelos neurônios colinérgicos
dor. liga-se aos receptores muscarínicos localizados em neurônios
sensitivos secundários em via sensitivas aferentes (medula espinhal),
resultando em supressão do disparo de potenciais de ação nessas
células e, consequentemente, em analgesia.

* O bloqueio dos receptores muscarínicos produz ações inversas as acima citadas.

Referências Bibliográficas

1) RANG, H. P. et al. Farmacologia. 4 edição. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2001;


2) KATZUNG, B. G. Farmacologia: Básica & Clinica. 9 edição. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan,
2006;
3) CRAIG, C. R.; STITZEL, R. E. Farmacologia Moderna. 6 edição. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan,
2005;
4) GOLAN, D. E. et al. Princípios de Farmacologia: A Base Fisiopatológica da Farmacoterapia. 2
edição. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2009;
5) FUCHS, F. D.; WANNMACHER, L.; FERREIRA, M. B. C. Farmacologia Clínica. 3 edição. Rio de
Janeiro: Guanabara Koogan, 2004.
6) GILMAN, A. G. As Bases farmacológicas da Terapêutica. 10 edição. Rio de Janeiro: Mc-Graw Hill,
2005.
7) CONSTANZO, L. S. Fisiologia. 2 edição. Rio de Janeiro: Elsevier, 2004.
8) PORTH, C. M. Fisiopatologia. 6 edição. Rio de Janeiro: Ganabara Koogan, 2004.

ЖЖЖЖЖЖ
ANOTAÇÕES EM FARMACOLOGIA E FARMÁCIA CLÍNICA

2) medicamentos que atuam no sistema nervoso autônomo - adrenérgicos


Síntese, armazenamento, liberação e metabolismo da Receptores adrenérgicos
noradrenalina
A principal classificação farmacológica divide os
A noradrenalina é sintetizada através da conversão da receptores adrenérgicos em alfa e beta. Por sua vez, existem
L-tirosina em DOPA pela tirosina hidroxilase nos os subtipos alfa-1 e alfa-2, beta1, beta2 e beta3, todos
neurônios catecolaminérgicos. Por sua vez, a DOPA é pertencentes à super-família dos receptores acoplados à
convertida em dopamina pela descarboxilase. Em seguida, proteína G.
a dopamina é convertida em noradrenalina pela dopamina-
beta-hidroxilase, localizada nas vesículas sinápticas. Na Os receptores alfa-1 ativam a fosfolipase C,
medula supra-renal, a noradrenalina é convertida em produzindo assim, IP3 e DAG como segundos mensageiros;
adrenalina pela feniletanolamina-N-metil transferase. os receptores alfa-2 inibem a adenilato ciclase e, portanto,
diminuem a formação de AMPc; todos os tipos de
A noradrenalina é armazenada em vesículas sinápticas, receptores beta estimulam a adenilato ciclase.
juntamente com ATP e cromogranina, e seu transporte para
o interior das vesículas é realizado por transportador
(VMAT – transportador de monoamina vesicular) que pode
ser bloqueado pela reserpina. Atualmente a reserpina não
possui utilidade clínica devido ao seu efeito irreversível
sobre o VMAT e de sua associação com depressão
psicótica.

A liberação do neurotransmissor ocorre normalmente


por exocitose mediada por Ca2+ (geração de um potencial
de ação – despolarização da membrana – abertura dos
canais de cálcio – entrada de cálcio – fusão da vesícula e
descarga por exocitose), e é controlada pela
retroalimentação auto-inibitória, mediada pelos receptores
alfa-2. Essa liberação de catecolaminas é iniciada por sinais
que se originam em um conjunto de áreas de processamento
no SNC, particularmente no sistema límbico. Esses
neurônios do SNC projetam axônios que fazem sinapse em
neurônios pré-ganglionares simpáticos nas colunas
intermédio-laterais da medula espinhal. Os axônios pré-
ganglionares projetam-se para os gânglios simpáticos, onde
liberam acetilcolina. Esse neurotransmissor inicia
potenciais pós-sinápticos excitatórios nos neurônios pós-
ganglionares, ativando os receptores nicotínicos de
acetilcolina. Os axônios pós-ganglionares simpáticos
formam varicosidades ou sinapses nos órgãos-alvos ou
sobre eles. A chegada de um potencial de ação nessas
terminações abre os canais de Ca+ regulados por voltagem,
e o consequente influxo de cálcio deflagra o processo de
exocitose das vesículas sinápticas contendo catecolaminas.
A noradrenalina sofre rápida difusão da varicosidade pré-
sináptica e regula localmente as respostas teciduais através
da ativação dos receptores adrenérgicos pós-sinápticos.

A noradrenalina modula numerosas funções vitais,


incluindo a frequência e a força da contração cardíaca, a
resistência dos vasos sanguíneos e bronquíolos, a liberação
de insulina e a degradação da gordura.

A ação desse neurotransmissor é interrompida


principalmente por recaptação pelas terminações nervosas,
através do transportador de noradrenalina (NET). Essa
captação é bloqueada por antidepressivos tricíclicos, pela
fenoxbenzamina, cocaína e anfetaminas. Além disso, as Os principais efeitos da ativação dos receptores
catecolaminas (noradrenalina, dopamina e serotonina) são adrenérgicos estão relacionados na tabela 1.1, em anexo.
metabolizadas pelas enzimas MAO e pela COMT.
1 Marcelo A. Cabral
ANOTAÇÕES EM FARMACOLOGIA E FARMÁCIA CLÍNICA

Efeitos dos fármacos simpaticomiméticos sobre sistemas e


órgãos g) trato geniturinário: o útero humano possui receptores alfa
e beta-2. a ativação dos receptores beta-2 do útero produz
a) vasos sanguíneos: O tônus do músculo liso vascular é
relaxamento. A ativação dos receptores alfa da bexiga, uretra e
regulado por receptores adrenérgicos. Os receptores alfa
próstata promovem a continência urinária.
aumentam a resistência arterial, enquanto os receptores beta-2
promovem o relaxamento do músculo liso. Os vasos cutâneos h) glândulas exócrinas: as glândulas salivares contêm
apresentam receptores alfa e sofrem contração na presença de receptores adrenérgicos, e sua ativação causa redução da
adrenalina e noradrenalina. Os vasos no músculo esquelético produção da saliva (boca seca). Por outro lado, as glândulas
podem contrair-se ou dilatar-se, dependendo da ativação dos sudoríparas que se localizam na palma das mãos são
receptores alfa ou beta. Portanto, os efeitos globais de um estimuladas pelos simpaticomiméticos. Essas glândulas estão
agente simpaticomimético sobre os vasos sanguíneos dependem associadas ao estresse psicológico.
das atividades relativas das drogas nos receptores alfa e beta.
e) efeitos metabólicos: a ativação dos receptores beta
b) coração: os efeitos diretos sobre o coração são adrenérgicos nas células adiposas resulta em aumento da
determinados, em grande parte, pelos receptores beta-1, lipólise, com liberação aumentada de ácidos graxos livres e
embora estejam envolvidos os receptores beta-2 e, em menor glicerol no sangue. Por outro lado, a ativação dos receptores
grau, os receptores alfa. A ativação dos receptores beta resulta alfa-2 dos lipócitos inibe a lipólise. Os receptores alfa e beta
em aumento do influxo de cálcio nas células cardíacas, com adrenérgicos expressos nas ilhotas pancreáticas tendem a
consequências tanto elétricas quanto mecânicas: aumento da aumentar e a diminuir a secreção de insulina, respectivamente,
frequência e força de contração cardíacas. embora o principal regulador da liberação de insulina seja a
concentração plasmática de glicose.
c) pressão arterial: os efeitos das drogas simpaticomiméticas
sobre a pressão arterial podem ser explicados com base nos h) função endócrina e leucocitose: a secreção de renina é
seus efeitos sobre o coração, a resistência vascular periférica e estimulada pelos receptores beta-1 e inibida pelos receptores
o retorno venoso. Um agonista alfa puro (fenilefrina) aumenta alfa-2. a adrenalina e agentes relacionados em altas
a resistência arterial periférica e diminui a capacitância concentrações causam leucocitose, em parte, ao promover a
venosa, além de poder exercer uma ação inotrópica positiva desmarginação dos leucócitos sequestrados da circulação geral.
moderada. Por outro lado, a resposta da pressão arterial a um
agonista puro dos receptores beta aumenta o débito cardíaco i) efeitos sobre o sistema nervoso central: a ação dos agentes
(ativação dos receptores beta-1), além de reduzir a resistência simpaticomiméticos sobre o sistema nervoso central varia
periférica ao ativar os receptores beta-2, produzindo acentuadamente, dependendo de sua capacidade de atravessar a
vasodilatação em certos leitos vasculares. O efeito final barreira hematoencefálica. As catecolaminas são quase
consiste em manter ou elevar levemente a pressão sistólica, totalmente excluídas por essa barreira. Por outro lado, as não
permitindo, ao mesmo tempo, uma queda da pressão catecolaminas de ação indireta, como as anfetaminas, que
diastólica. penetram facilmente no SNC a partir da circulação, produzem
desde leve estado de alerta, elevação do humor, insônia, euforia,
d) olho: a ativação dos receptores alfa do músculo dilatador anorexia e até um comportamento psicótico. Esses efeitos não
da pupila da íris (fenilefrina) provoca midríase. Os são facilmente atribuídos a ações mediadas pelos receptores alfa
estimulantes alfa e beta adrenérgicos exercem efeitos e beta e podem representar uma intensificação dos processos
importantes sobre a pressão intra-ocular. Os agonistas alfa mediados pela dopamina ou outros efeitos dessas drogas no
aumentam o efluxo de humor aquoso do olho, enquanto os sistema nervoso central.
antagonistas beta diminuem a produção de humor aquoso.
Essas classes de fármacos são usadas no tratamento do 1) Medicamentos adrenérgicos:
glaucoma (brimonidina + timolol).
Os medicamentos adrenérgicos são também
e) trato respiratório: o músculo liso brônquico contém denominados simpaticomiméticos em virtude de sua capacidade
receptores beta-2 que causam relaxamento. A ativação desses de produzir efeitos semelhantes aos produzidos pelo sistema
receptores resulta em broncodilatação. Os vasos sanguíneos da nervoso simpático.
mucosa das vias respiratórias superiores contêm receptores
alfa. A ação dos descongestionantes dos receptores A capacidade dos agonistas dos receptores
adrenérgicos é clinicamente útil. adrenérgicos de iniciar uma sinalização distal é proporcional ao
número de receptores ativados. Por conseguinte, a ocorrência de
f) trato gastrintestinal: é possível produzir relaxamento do mudanças na densidade dos receptores existentes sobre a
músculo liso gastrintestinal com agentes alfa e beta superfície celular irá alterar a eficácia aparente de um agonista.
estimulantes. Os receptores beta, que parecem estar Assim, as alterações tanto em curto prazo (dessensibilização)
localizados diretamente nas células musculares lisas, medeiam quanto em longo prazo (infra-regulação) no número de
o relaxamento através de hiperpolarização e diminuição da receptores adrenérgicos funcionais são importantes na regulação
atividade em espícula nessas células. Os agonistas alfa-2 da resposta do tecido. Quando um agonista ativa o receptor
diminuem a atividade muscular indiretamente através da adrenérgico, a dissociação das proteínas G heterotriméricas leva
redução pré-sináptica da liberação de acteilcolina e de outros a uma sinalização distal, bem como a um mecanismo de
estimulantes do sistema nervoso entérico. retroalimentação negativa que limita as respostas dos tecidos. O
2 Marcelo A. Cabral
ANOTAÇÕES EM FARMACOLOGIA E FARMÁCIA CLÍNICA

acúmulo das subunidades BY na membrana recruta uma cinase


do receptor acoplado à proteína G (GRK), que fosforila o A noradrenalina e a adrenalina apresentam efeitos
receptor nos resíduos da extremidade C-terminal, que atuam semelhantes sobre os receptores beta-1 do coração, com
como importantes alvos de proteínas inativadoras potência também semelhante nos receptores alfa. A
(dessensibilização). Alternativamente, a proteinocinase A e a noradrenalina tem pouco efeito sobre os receptores beta-2. Por
proteinocinase C podem fosforilar as proteínas G. o estado conseguinte, a noradrenalina aumenta a resistência periférica e a
fosforilado de uma proteína G pode ligar-se a outra proteína pressão arterial tanto sistólica quanto diastólica.
denominada B-arrestina, que inibe estericamente a interação
receptpr-proteína G, silenciando efetivamente a sinalização do A noradrenalina também aumenta a freqüência cardíaca,
receptor. Em uma escala temporal maior, o complexo receptor- porém esse efeito é tipicamente superado pela atividade vagal
b-arrestina é seuqestrado, através de um mecanismo dpendente reflexa em resposta à elevação da pressão arterial. Ela é
de clatrina, em um compartimento endocítico para utilizada com frequência no tratamento de emergência do
internalização, um processo denominado infra-regulação. Cada choque distributivo (caracterizado pela queda do tônus
um desses processos é importante na regulação da vasomotor por vasodilatação e hipovolemia relativa – comum
responsividade do tecido em curto ou em longo prazo. acontecer em choque séptico, depressão do SNC, traumatismos
graves, etc).
Os simpaticomiméticos ditos indiretos promovem
a liberação do neurotransmissor para a fenda sináptica, por O isoproterenol é um agonista muito potente dos
deslocá-lo de vesículas de armazenamento. Já os diretos receptores beta, que exerce pouco efeito sobre os receptores
acoplam-se a receptores simpáticos pós-sinápticos. Os alfa. A droga possui ações cronotrópica e inotrópica positivas. O
medicamentos adrenérgicos produzem seus esfeitos ao estimular isoproterenol é um potente vasodilatador, pois atua
os receptores alfa e/ou beta adrenérgicos. Eles são classificados exclusivamente sobre os receptores betas.
em dois grupos segundo as suas estruturas químicas: as
catecolaminas e as não-catecolaminas. A dopamina, precursor metabólico imediato da
noradrenalina, ativa os receptores D1 em vários leitos
a) Catecolaminas: são os simpaticomiméticos com vasculares, resultando em vasodilatação. O fenoldopam
núcleo catecólico (o-diidroxibenzeno). As catecolaminas mais também é um agonista dos receptores D1, sendo indicada sua
comuns são a dobutamina, dopamina, adrenalina, administração intravenosa para o tratamento da hipertensão
noradrenalina, cloridrato e sulfato de isoproterenol. grave. A dopamina é administrada em baixas doses para
melhorar o fluxo sanguíneo dos rins, uma vez que faz dilatar os
As catecolaminas não podem ser administradas por via vasos sanguíneos renais. Neste caso, os receptores
oral, visto que são destruídas pelas enzimas digestivas, por outro dopaminérgicos D1 ativam a adenilil ciclase nas células
lado, são absorvidas rapidamente quando administradas por via musculares lisas vasculares, resultando em aumento dos níveis
sublingual. A absorção por via SC é lenta, pois esses fármacos de AMPc e em vasodilatação. Em concentrações
provocam constrição dos vasos sanguíneos ao redor do local de suprafisiológicas, a dopamina também pode atuar como
aplicação. A absorção IM é mais rápida devido a menor agonista nos receptores alfa-1(vasoconstrição) e beta-1
constrição dos vasos sanguíneos locais. (inotropismo positivo). Em face disso, a dopamina é utilizada no
tratamento do choque, particularmente nos estados de choque
A adrenalina em baixas concentrações possui efeitos
causados por baixo débito cardíaco e acompanhados de
predominantemente beta-adrenérgicos, ao passo que, em altas
comprometimento da função renal, resultando em oligúria
concentrações, predominam os efeitos alfa. É um vasoconstritor
(volume da urina excretada menor que o necessário para
e estimulante cardíaco muito potente. Promove a elevação da
eliminação de catabólitos). Apesar de a dopamina ser um
pressão arterial sistólica devido suas ações inotrópica e
neurotransmissor proeminente do SNC, a sua administração
cronotrópica positivas (ativação dos receptores beta-1) e pela
sistêmica tem poucos efeitos sobre o SNC, visto que ela não
vasoconstrição induzida em muitos leitos vasculares (ativação
atravessa facilmente a barreira hematoencefálica.
receptores alfa). A adrenalina também ativa os receptores beta-2
existentes em alguns vasos (vasos sanguíneos do músculo As catecolaminas que estimulam os receptores alfa são
esquelético), resultando em sua dilatação. Por conseguinte, a utilizadas no tratamento da hipotensão. As catecolaminas que
resistência periférica total pode diminuir, explicando a queda da estimulam os receptores B1 são utilizadas no tratamento da
presão diastólica após injeção de adrenalina. A ativação dos bradicardia, do bloqueio cardíaco e no tratamento da taquicardia
receptores beta-2 relaxa a musculatura lisa brônquica, aumenta nodal ou atrial paroxística noturna (surto de frequência cardíaca
as concentrações de glicose e de ácidos graxos livres no sangue. rápida).
A adrenalina é utilizada no tratamento da crise asmática As drogas B1 adrenérgicas (isoproterenol e adrenalina)
aguda e anafilaxia. Aplicada localmente em altas doses provoca também são usadas no tratamento da fibrilação ventricular, na
vasoconstrição e prolonga a ação dos anestésicos locais. Ela assistolia e na parada cardíaca. Já as drogas que possuem
possui rápido início e breve duração de ação, sendo ineficaz por atividade B2 (isoproterenol e dobutamina) são utilizadas no
via oral. O aumento da excitabilidade cardíaca induzido pela tratamento da asma brônquica, enfisema, bronquite e nas
adrenalina pode levar a arritmias cardíacas, e a acentuada reações de hipersensibilidade aguda às drogas.
elevação da pressão arterial pode provocar hemorragia cerebral.
As reações adversas às catecolaminas podem incluir:
inquietação, ansiedade tonteira, cefaléia, palpitações, arritmias
3 Marcelo A. Cabral
ANOTAÇÕES EM FARMACOLOGIA E FARMÁCIA CLÍNICA

cardíacas, hipotensão, hipertensão, AVC, angina e aumento da


glicemia. As reações adversas às não-catecolaminas são:
cefaléia, inquietação, ansiedade, irritação, tremor, sonolência,
b) Não-catecolaminas: Os principais representantes
insônia, aturdimento, convulsão, hipertensão, hipotensão,
são: mefentermina, metaraminol, metoxamina, fenilefrina,
bradicardia, taquicardia, parada cardíaca, etc.
albuterol, salbutamol, efedrina, terbutalina e metaproterenol.

A fenilefrina é um agonista alfa relativamente puro. Como 2) Medicamentos bloqueadores adrenérgicos:


não se trata de um derivado catecólico, a fenilefrina não é Esses fármacos atuam ao bloquear a transmissão dos
inativada pela COMT e apresenta duração de ação muito mais impulsos nos neurônios adrenérgicos ou nos receptores
prolongada que as catecolaminas. Trata-se de um midriático e adrenérgicos.
descongestionante eficaz, que pode ser utilizado para elevar a
pressão arterial. De acordo com seu local de ação, os
medicamentos bloqueadores são classificados em:
A efedrina é encontrada em várias plantas e vem sendo
utilizada na China há mais de 2.000 anos. Como se trata de uma - bloqueadores alfa-adrenérgicos; e
fenilpropanolamina não-catecólica, a efedrina possui alta
biodisponibilidade e duração de ação relativamente longa. - bloqueadores beta-adrenérgicos.
Devido a seu acesso ao SNC, atua como estimulante leve. A
pseudo-efedrina, um dos quatro enantiômeros da efedrina, é Efeitos dos antagonistas alfa-adrenérgicos
disponível sem prescrição médica como componente de muitas
misturas descongestionantes. Como o tônus das arteríolas e das veias é determinado,
em grande parte, pelos receptores alfa no músculo liso
O metaraminol provoca vasoconstrição e é utilizado vascular, as drogas antagonistas dos receptores alfa produzem
no tratamento da hipotensão em casos de choque grave redução da resistência vascular periférica e da pressão arterial.
(ativação dos receptores alfa-1). A ritodrina e a terbutalina são Os antagonistas dos receptores alfa podem causar hipotensão
administradas para interromper o trabalho de parto pré-termo postural e taquicardia reflexa. A hipotensão postural é devida
(ativação dos receptores beta-2). ao antagonismo da estimulação dos receptores alfa-1 pelo
sistema nervoso simpático no músculo liso venoso. A
O salbutamol, salmeterol, ritodrina e a terbutalina são taquicardia pode ser mais pronunciada com agentes que
agonistas seletivos dos receptores beta-2 adrenérgicos, isentos, bloqueiam os receptores alfa-2 pré-sinápticos no coração.
nas doses usuais, de efeitos estimulantes cardíacos. Por efeito de
relaxamento das musculaturas brônquica e uterina, são Os efeitos de menor importância que indicam bloqueio
utilizados clinicamente para alívio da crise de asma, e dos receptores alfa em outros tecidos incluem miose e
administrados intravenosamente no trabalho de parto prematuro. congestão nasal. O bloqueio dos receptores alfa-1 da base da
Com aumento da dose ocorrem efeitos beta-1, e a taquicardia, bexiga e da próstata está associado a uma redução da
tremores e nervosismo são os principais efeitos adversos. resistência ao fluxo de urina.

Os medicamentos adrenérgicos não catecolaminas são Fármacos antagonistas alfa-adrenérgicos


utilizados para:
Os principais fármacos antagonistas alfa-adrenérgicos
- produzir a contração local ou sistêmica dos vasos são a fentolamina, a tolazozina, a fenoxbenzamina, prazosina,
sanguíneos (mefentermina, metaraminol, metoxamina e terazosina e doxazosina.
fenilefrina) (receptores alfa-1);
A fentolamina, derivado imidazólico, é um potente
- descongestão nasal e ocular, e dilatação dos bronquíolos antagonista competitivo no nível dos receptores tanto alfa-1,
(salbutamol, efedrina, isoetarina, metaproterenol e terbutalina) quanto alfa-2. A fentolamina produz redução da resistência
(receptores beta-2); periférica através do bloqueio dos receptores alfa-1 e,
possivelmente, dos receptores alfa-2 no músculo liso vascular.
- relaxamento do músculo liso (ritodrina e terbutalina) A estimulação cardíaca induzida pela fentolamina é devida à
(receptores alfa-2 e beta-2). ativação da estimulação simpática do coração em resposta a
mecanismos barorreflexos. O antagonismo dos receptores
É importante lembrar que os agonistas alfa-2 alfa-2 pré-sinápticos pode provocar aumento da liberação de
adrenérgicos seletivos têm importante capacidade de reduzir a noradrenalina dos nervos simpáticos (inibição da
pressão arterial através de ações no sistema nervoso central, retroalimentação).
embora sua aplicação local direta a um vaso sanguíneo possa
causar constrição. Como exemplo desses fármacos pode-se citar Os principais efeitos adversos da fentolamina estão
a clonidina, a metildopa, a guanfacina e o guanabenz. relacionados à estimulação cardíaca, que pode causar
taquicardia intensa, arritmias e isquemia do miocárdio,
Os agentes alcalizantes da urina, como a particularmente após administração intravenosa.
acetazolamida e o bicarbonato de sódio, retardam a excreção
dos medicamentos não-catecolaminas, prolongando sua ação. Este fármaco tem sido utilizado no tratamento do
feocromocitoma (intra-operatório) bem como da disfunção
4 Marcelo A. Cabral
ANOTAÇÕES EM FARMACOLOGIA E FARMÁCIA CLÍNICA

erétil masculina através de injeção intra-cavernosa e


administração oral. doses convencionais, geralmente não causam hipotensão em
indivíduos sadios com pressão arterial normal.
A fenoxibenzamina liga-se de forma covalente ao
receptor alfa, causando bloqueio irreversível de longa duração. Os antagonistas dos receptores beta execem efeitos
A droga também inibe a recaptação da noradrenalina liberada proeminentes sobre o coração. Os efeitos inotrópicos e
pelas terminações nervosas adrenérgicas pré-sinápticas. A cronotrópicos negativos são previsíveis, com base no papel
fenoxibenzamina bloqueia os receptores histamínicos H1, de desempenhado pelos receptores adrenérgicos na regulação
acetilcolina e de serotonina, bem como os receptores alfa. O dessas funções. No sistema vascular, o bloqueio dos receptores
aspecto mais importante do seu uso consiste na capacidade da beta opõe-se à vasodilatação mediada por beta-2. As drogas
fenoxibenzamina de atenuar a vasoconstrição induzida pelas beta-bloqueadoras antagonizam a liberação da renina induzida
catecolaminas. O seu principal uso é encontrado no tratamento pelo sistema nervoso simpático. De qualquer modo, enquanto os
do feocromocitoma. Os efeitos adversos mais comuns do seu efeitos agudos dessas drogas podem incluir um aumento da
uso são a hipotensão postural, taquicardia, fadiga, sedação e resistência periférica, a sua administração crônica resulta em
náusea. queda da resistência periférica em pacientes com hipertensão.

A prazosina é eficaz no tratamento da hipertensão. É b) efeitos sobre o trato respiratório:


altamente seletiva para os receptores alfa-1. Isso pode explicar a
ausência relativa de taquicardia observada com o uso da O bloqueio dos receptores beta-2 no músculo liso
prazosina, em comparação com a relatada com a fentolamina e a brônquico pode determinar um aumento da resistência das vias
fenoxibenzamina. A prazosina provoca relaxamento do músculo aéreas, particularmente em pacientes com asma. Os antagonistas
liso tanto arterial quanto venoso, devido ao bloqueio dos dos receptores beta-1, como o metoprolol ou o atenolol, podem
receptores alfa-1. ter alguma vantagem sobre os antagonistas beta não-seletivos
quando se deseja um bloqueio dos receptores beta-1 no
A terazosina é outro antagonista alfa-1 seletivo e coração, enquanto o bloqueio dos receptores beta-2 não é
reversível que se mostra eficaz na hipertensão. Foi também desejável.
aprovada para uso em homens com sintomas urinários causados
por hiperplasia prostática benigna (HPB). c) efeitos sobre o olho:

A doxazosina mostra-se eficaz no tratamento da Vários agentes beta-bloqueadores reduzem a pressão


hipertensão e da HPB. Difere da prazosina e da terazosina, pela intra-ocular, particularmente em olhos com glaucoma. Em geral,
sua meia-vida mais prolongada, cerca de 22 horas. o mecanismo relatado consiste em diminuição da produção de
humor aquoso.
As drogas antagonistas alfa-adrenérgicas são utilizadas
no tratamento do feocromocitoma (fenoxibenzamina e d) efeitos metabólicos e endrócrinos:
fentolamina), e no tratamento da hipertensão crônica. A
fentolamina tem sido utilizada para reverter a vasoconstrição Os antagonistas beta, como o propranolol, inibem a
local intensa causada por infiltração inadvertida de agonista alfa estimulação da lipólise pelo sistema nervoso simpático. A
no tecido subcutâneo durante a administração intravenosa. O glicogenólise no fígado humano seja, pelo menos parcialmente,
antagonista alfa é administrado por infiltração local no tecido inibida após bloqueio dos receptores beta-2. Os antagonistas
isquêmico. Diversos estudos demonstraram a eficácia de vários beta adrenérgicos devem ser usados com muita cautela em
antagonistas dos receptores alfa-1 em pacientes com HPB. Os pacientes diabéticos insulino-dependentes, visto que as
antagonistas alfa-2 têm relativamente pouca utilidade clínica. catecolaminas podem constituir os principais fatores na
estimulação da liberação da glicose pelo fígado, em resposta à
Efeitos dos antagonistas beta-adrenérgicos hipoglicemia. Os antagonistas beta-adrenérgicos são muito mais
seguros em pacientes com diabete tipo 2 que não apresentam
Os efeitos dessas drogas são devidos, em sua maior episódios de hipoglicemia.
parte, à ocupação e ao bloqueio dos receptores beta. Entretanto,
algumas ações podem resultar de outros efeitos, incluindo O uso crônico de antagonistas dos receptores beta-
atividade de agonista parcial nos receptores beta e ação adrenérgicos tem sido associado a um aumento das
anestésica local, que diferem entre os beta-bloqueadores. Os concentrações plasmáticas de colesterol das VLDL e uma
principais fármacos bloqueadores beta adrenérgicos são o redução das concentrações de colesterol da HDL. Ambas as
propranolol, o metropolol, atenolol, nadolol, labetalol, alterações são potencialmente desfavoráveis em termo de risco
carvedilol, esmolol e o timolol. de doença cardiovascular.

a) efeitos sobre o sistema cardiovascular: A ação anestésica local, também conhecida como ação
“estabilizadora das membranas”, constitui um efeito
Os fármacos beta-bloqueadores, quando administrados proeminente de vários beta-bloqueadores. Explicar esta merda...
de forma crônica, reduzem a pressão arterial em pacientes com
hipertensão. Os mecanismos envolvidos podem incluir efeitos
sobre o coração e os vasos sanguíneos, supressão do sistema
renina-angiotensina e, talvez, efeitos sobre o sistema nervoso
central. Em contraste, essas drogas, quando administradas em
5 Marcelo A. Cabral
ANOTAÇÕES EM FARMACOLOGIA E FARMÁCIA CLÍNICA

Fármacos antagonistas beta-adrenérgicos


observados. Essa classe de fármacos também se mostra eficaz
O propranolol é o protótipo das drogas beta- no tratamento das arritmias ventriculares e supra-ventriculares.
bloqueadoras. Sua biodisponibilidade é baixa e dose-
dependente, em virtude do extenso metabolismo de primeira Verificou-se que a administração de beta-bloqueadores
passagem no fígado. reduz a pressão intra-ocular em pacientes com glaucoma. O
mecanismo parece envolver uma diminuição da produção de
O metropolol e o atenolol são membros do grupo humor aquoso pelo corpo ciliar, que é fisiologicamente ativada
beta-1 seletivo. Esses fármacos podem ser mais seguros para pelo AMPc. O timolol mostra-se apropriado para uso local no
pacientes que apresentam broncoconstrição em resposta ao olho, visto que carece de propriedade anestésica local.
propranolol. Como a sua seletividade beta-1 é bastante limitada,
esses fármacos devem ser utilizados com muita cautela, ou até Vários estudos demonstram um efeito benéfico do
mesmo ser evitados em pacientes com história de asma. Os propranolol na redução da freqüência e da intensidade da
antagonistas beta-1 seletivos podem ser preferíveis em pacientes enxaqueca.
com diabete ou com doença vascular periférica, quando há
necessidade de terapia com beta-bloqueador, visto que os A cafeína é um antagonista competitivo dos receptores
receptores beta-2 são provavelmente importantes no fígado de adenosina no SNC. Esses receptores, que estão localizados
(recuperação da hipoglicemia) e nos vasos sanguíneos em neurônios noradrenérgicos pré-sinápticos, quando ativados
(vasodilatação). pela adenosina, atuam para inibir a liberação da noradrenalina
em sinápses no SNC. O antagonismo desses receptores de
O nadolol é notável pela sua duração de ação muito adenosina pela cafeína faz com que a liberação de noradrenalina
longa. Seu espectro de ação se assemelha ao do timolol. O não seja inibida, produzindo os efeitos estimulantes
timolol é um fármaco não-seletivo desprovido de atividade característicos da droga.
anestésica local. Possui excelentes efeitos hipotensores oculares
quando administrado topicamente no olho. Por outro lado, o Inibidores da síntese de catecolaminas
esmolol é um antagonista dos receptores adrenérgicos beta-1
seletivos de ação ultra-curta. O esmolol é potencialmente muito os inibidores da síntese de catecolaminas possuem
mais seguro do que os antagonistas de ação mais longa para utilidade clínica limitada, visto que esses agentes inibem de
pacientes criticamente enfermos que necessitam de antagonista modo inespecífico a formação de todas as catecolaminas. A
dos receptores beta-adrenérgicos. O esmolol pode ser útil no alfa-metiltirosina é um análogo estrutural da tirosina que é
controle das arritmias supraventriculares, das arritmias transmportado nas terminações nervosas, onde inibe a tiroxina
associadas à tireotoxicose, da hipertensão peri-operatória e da hidroxilase, a primeira enzima na via de biossíntese das
isquemia do miocárdio em pacientes agudamente doentes. catecolaminas. Esse agente é utilizado em certas ocasiões no
tratamento da hipertensão associada ao feocromocitoma.
O carvedilol é um antagonista não-seletivo dos
receptores beta que tem alguma capacidade de bloquear os A tiramina é uma amina, presente na dieta, normalmente
receptores alfa-1 adrenérgicos. Esse fármaco antagonisa as metabolizada no trato gastrintestinal e no fígado pela MAO. Em
ações das catecolaminas com mais potência nos receptores beta pacientes que fazem uso de inibidores da MAO (IMAO), a
do que nos receptores alfa. tiramina é absorvida no intestino, transportada pelo sangue e
captada por neurônios simpáticos, onde é transportada até as
As drogas antagonistas beta-adrenérgicas são utilizadas vesículas sinápticas pelo VMAT. Através desse mecanismo, um
no tratamento da hipertensão, geralmente em associação com estímulo agudo com grandes quantidades de tiramina (como a
um diurético. Os bloqueadores beta-adrenérgicos reduzem a ingestão de queijo envelhecido e vinhos)
freqüência dos episódios de angina e melhoram a tolerância ao
exercício em muitos pacientes com angina. Essas ações estão Pode provocar deslocamento agudo da
relacionadas ao bloqueio dos receptores beta cardíacos, noradrenalina vesicular e liberação não-vesicular maciça de
resultando em diminuição do trabalho cardíaco e da demanda de noradrenalina das terminações nervosas, através da reversão do
oxigênio. A redução da freqüência cardíaca e a sua NET.
regularização podem contribuir para os benefícios clínicos

6 Marcelo A. Cabral
Tabela 1.1 - Efeitos da ativação dos receptores alfa-1 adrenérgicos: 1) Agonista se liga ao receptor α1, 2) mudança
conformacional proteína Gq– substituição de GDP por GTP e liberação da subunidade αq – 3) ativação da fosfolipase C que catalisa a liberação de IP3 e DAG a
partir do PIP2 – 4) IP3 provoca liberação de Ca+ dos retículos endoplasmáticos – 5) o Ca+ liberado e o DAG ativam a proteína cinase C que fosforila proteínas
– 6) as PTN fosforiladas produzem ações fisiológicas finais.

Local Efeito fisiológico Mecanismo

Músculo liso Contração Estimulação dos receptores alfa-1 aumenta a concentração de Ca+ intracelular
vascular devido a geração de IP3, ativação da calmodulina, fosforilação da cadeia leve de
miosina, interação de actina e miosina é aumentada provocando a contração
muscular.

Músculo liso
intestinal

Músculo liso
genitourinário

Coração Aumento do
inotropoismo e
excitabilidade.

Fígado Glicogenólise e
gliconeogênese.

Efeitos da ativação dos receptores alfa-2 adrenérgicos: 1) O agonista se liga ao receptor α2 – 2) mudança conformacional da
proteína Gi– substituição de GDP por GTP e liberação da subunidade αi – 3) a subunidade αi se une e inibe a adenilato ciclase causando uma diminuição dos
níveis de AMPC. Além disso, os rcpts α2 ativam os canais de K+ e inibem os canais de Ca+ controlados pela proteína G (subunidades By da ptn Gi) levando à
hiperpolarização da membrana celular - produção da ação fisiológica final (relaxamento, diminuição das atividades).

Local Efeito fisiológico Mecanismo

Terminações Inibição da transmissão Atuam como auto-receptores para mediar a inibição da transmissão sináptica
pré-sinápticas sináptica. por retroalimentação.

Células beta do Inibição da liberação


pâncreas de insulina

Plaquetas Inibição da agregação


plaquetária

SNC Diminuição da Diminuição da liberação de noradrenalina nas terminações simpáticas, causando


descarga simpática na diminuição da contração do músculo liso vascular - diminuição da pressão
periferia arterial.

Efeitos da ativação dos receptores beta-1 adrenérgicos: 1) Agonista se liga ao receptor β1 , 2) mudança conformacional proteína Gs–
substituição de GDP por GTP e liberação da subunidade αs – 3) ativação da adenilato ciclase que catalisa conversão de ATP em AMPC – 4) o AMPC ativa as
proteínas cinases. Estas por sua vez fosforilam proteínas, incluindo canais iônicos, produzindo ações fisiológicas finais.

Local Efeito fisiológico Mecanismo

Coração Aumeto do O efeito inotrópico é mediado pela fosforilação dos canais de Ca+, incluindo os
cronotropismo e canais de cálcio no sarcolema. O aumento do cronotropismo resulta de um
inotropismo = aumento aumento mediado pelos receptores beta-1 na taxa de despolarização da fase 4
do débito cardíaco. das células marca-passo do nodo sinoatrial.

Coração Aumento da velocidade O aumento da entrada de cálcio estimulado pelos receptores beta-1 aumenta a
de condução AV. taxa de despolarização das células do nodo atrioventricular.

Células Secreção de renina.


justaglomerulares
renais
Efeitos da ativação dos receptores beta-2 adrenérgicos: 1) Agonista se liga ao receptor β1 , 2) mudança conformacional proteína Gs–
substituição de GDP por GTP e liberação da subunidade αs – 3) ativação da adenilato ciclase que catalisa conversão de ATP em AMPC – 4) o AMPC ativa as
proteínas cinases. Estas por sua vez fosforilam proteínas, incluindo canais iônicos, produzindo ações fisiológicas finais.

Local Efeito fisiológico Mecanismo

Músculo liso Relaxamento A proteinocinase A fosforila diversas proteínas contráteis, especialmente a


cinase da cadeia leve de miosina. Essa fosforilação diminui a afinidade da
cadeia leve de miosina pela cálcio-calmodulina, resultando em relaxamento do
aparelho contrátil.

No músculo liso brônquico, o efluxo aumentado de K+ leva a hiperpolarização


das células musculares lisas e, portanto, opõe-se à despolarização necessária
para produzir contração.

Fígado Glicogenólise (...) e Nos hepatócitos, a ativação da cascata de sinalização dá início a uma série de
gliconeogênese (...). eventos de fosforilação intracelulares, que resultam em ativação da glicogênio-
fosforilase e catabolismo do glicogênio. Por conseguinte, o resultado da
estimulação dos hepatócitos pelos receptores beta-2 consiste em aumento dos
níveis plasmáticos de glicose.

Músculo Glicogenólise e A ativação das vias de sinalização intracelular estimula a glicogenólise e


esquelético captação de K+. promove a captação de K+.

Tecido adiposo Lipólise. A ativação dos receptores beta-3...


– receptores
beta-3.

Referências Bibliográficas

1. RANG, H. P. et al. Farmacologia. 4 edição. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2001;


2. KATZUNG, B. G. Farmacologia: Básica & Clinica. 9 edição. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2006;
3. CRAIG, C. R.; STITZEL, R. E. Farmacologia Moderna. 6 edição. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2005;
4. GOLAN, D. E. et al. Princípios de Farmacologia: A Base Fisiopatológica da Farmacoterapia. 2 edição. Rio de Janeiro: Guanabara
Koogan, 2009;
5. FUCHS, F. D.; WANNMACHER, L.; FERREIRA, M. B. C. Farmacologia Clínica. 3 edição. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan,
2004.
6. GILMAN, A. G. As Bases farmacológicas da Terapêutica. 10 edição. Rio de Janeiro: Mc-Graw Hill, 2005.
7. CONSTANZO, L. S. Fisiologia. 2 edição. Rio de Janeiro: Elsevier, 2004.

ЖЖЖЖЖЖ
ANOTAÇÕES EM FARMACOLOGIA E FARMÁCIA CLÍNICA

3) ANTINFLAMATÓRIOS NÃO-ESTEROIDAIS
A reação inflamatória está presente em quase vasodilatadoras) e os tromboxanos (TXA2 – que possui
todas as lesões produzidas no organismo humano. ação trombótica e vasoconstritora, além de atraírem os
Traumas, lesões térmicas, infecções, isquemia, reações leucócitos para o local da lesão).
imunitárias a agentes externos e processos auto-imunes As prostaglandinas estão mais consistentemente
acompanham-se, em maior ou menor grau, de reações envolvidas no processo inflamatório, e além de
inflamatórias. promoverem a vasodilatação, elas sensibilizam os
As manifestações clínicas do processo inflamatório são nociceptores e estimulam os centros hipotalâmicos de
dor, hiperalgesia, eritema, edema e limitação funcional. termo regulação (febre).
Os antiinflamatórios só são indicados quando
o desconforto advindo das manifestações inflamatórias Ações farmacológicas dos AINEs
(dor, edema, limitação funcional) suplanta o benefício Os AINEs possuem três ações principais, todas as
da regeneração tecidual determinado pela reação quais decorrem da inibição das cicloxigenases (COX-1
inflamatória. Em trauma e em infecção não parece e COX-2) do ácido araquidônico das células
racional antagonizar a inflamação, componente inflamatórias, e da conseqüente redução na síntese de
indispensável à reparação tecidual no primeiro caso e à prostanóides (PGE2 e PGI2 e tromboxanos):
defesa do organismo no segundo. O tratamento, então,
deve ser direcionado especificamente à gênese do • Ação antinflamatória: os AINEs inibem a ciclo-
problema (por exemplo, administração de oxigenase e, consequentemente, provocam a
antimicrobianos na infecção). redução das prostaglandinas vasodilatadoras
Os AINES são medicamentos sintomáticos e (PGE2 e PGI2) o que está associada a menor
inespecíficos, sendo assim, não modificam a história vasodilatação e, indiretamente, menos edema. Não
natural da doença. há redução do acúmulo de células inflamatórias,
A ação antiinflamatória dos AINEs decorre da porém os AINES impedem a saída do exsudato
inibição da síntese de prostaglandinas, efetuada (enzimas, células de defesa, citocinas, proteínas do
mediante a inativação das cicloxigenases constitutiva complemento). O paracetamol não possui ação
(COX-1) e induzível (COX-2). A primeira é antinflamatória considerável.
responsável pelos efeitos fisiológicos das
prostaglandinas em sítios gástricos e renais. A segunda • Ação antipirética: Devido, em parte, à diminuição
surge nos locais de inflamação. Os AINES podem ser da prostaglandina do tipo “E” (PGE2) que é
seletivos ou não para COX-2. responsável pela elevação do ponto de ajuste
Tendo como sítio de ação as cicloxigenases, hipotalâmico para o controle de temperatura na
os AINES não inibem a via das lipoxigenases, não febre. Os estímulos inflamatórios ativam o
suprimindo a formação dos leucotrienos, que possuem hipotálamo e este induz a expressão de COX2 que
ação broncoconstritora e aumentam a permeabilidade por sua vez produz as prostaglandinas. Os
vascular. antipiréticos só estão indicados quando a
temperatura acerca-se de 39ºC.
Classe Medicamentos
Salicilatos AAS, Diflunisal.
Propiônicos Ibuprofeno, Naproxeno
Oxicams Peroxicam, Tenoxicam
Pirazolônicos Dipirona, Fenilbutazona
Ácido Acético Diclofenacos
Outros Paracetamol, Nimesulida,
etc.

• Ação analgésica: A diminuição na produção de


prostaglandinas significa menor sensibilização das
Síntese de prostanóides: terminações nervosas nociceptivas a mediadores
O fosfolipídio de membrana das células inflamatórios, como a bradicinina. O alívio da
lesadas é metabolisado pela enzima fosfolipase A2, cefaléia é provavelmente devido à menor
resultando em araquidonato e liso-glicerol vasodilatação cerebral mediada pelas
fosforicolina. Por sua vez, o araquidonato pode ser prostaglandinas. As prostaglandinas são
metabolisado pelas enzimas cicloxigenases originando responsáveis por diminuir o limiar de
os prostanóides. excitabilidade dos nociceptores das fibras C e Ag
O termo “prostanóides” abrange as responsáveis pela sensação de dor.
prostaglandinas (que são, em sua maioria,

Marcelo A. Cabral
ANOTAÇÕES EM FARMACOLOGIA E FARMÁCIA CLÍNICA

Principais classes de AINES: câncer de colo e do reto.


A aspirina tem sido classificada por alguns
Todos os AINEs não seletivos possuem autores como droga cardiovascular devido á importante
eficácia antiinflamatória similar. A escolha deve ação antiplaquetária (acetila irreversivelmente a enzima
basear-se visando a menor intensidade dos efeitos cicloxigenase, único AINE que inibe a agregação
adversos. Desta maneira, os derivados da pirazolona plaquetária e a desgranulação de forma irreversível),
(dipirona e fenilbutazona) só devem ser administrados diminuindo a incidência de angina pectoris e infarto do
como último recurso. miocárdio em pacientes predispostos a estas doenças.
Nas gestantes, os AINEs não são Enquanto com os demais AINEs o efeito somente é
recomendados. Se forem necessários, o AAS em baixas mantido enquanto estes fármacos permanecem no
doses é provavelmente o mais seguro, pois não está plasma, com o uso da aspirina a recuperação da
associado à teratogênese. Todavia, deve ser suspenso hemostasia normal depende da produção de novas
antes do prazo previsto para o parto a fim de evitar plaquetas funcionais, que ocorre após 7 a 10 dias (fato
complicações como trabalho de parto prolongado, que deve ser lembrado antes de cirurgias).
aumento de hemorragia pós-parto e fechamento intra- Estudos recentes têm verificado que doses de aspirina
uterino prematuro do ducto arterial. Um outro AINE superiores a 325 mg provocam a inibição da síntese de
indicado durante a gestação é o paracetamol. prostaciclinas no endotélio, provocando, portanto,
efeito contrário à prevenção do infarto agudo do
Salicilatos (AAS - aspirina, diflunisal): miocárdio, pois, a prostaciclina inibe a agregação
O ácido salicílico (um ceratolítico, plaquetária e leva a vasodilatação.
antisséptico, bacterisotático e antifúngico) foi O uso externo é indicado para hiperqueratoses,
originalmente descoberto devido às suas ações calos e erupções causadas por fungos.
antipirética e analgésica. Desde 400 a.C, que se sabe Efeitos adversos:
que a casca do salgueiro possuía estas propriedades. Desconforto epigástrico – náuseas - vômitos –
Em 1827, o seu princípio ativo, a salicilina, foi isolado. em infecções virais pode provocar em crianças < 2
Dele se extrai o álcool salicílico, que pode ser oxidado anos a Síndrome de Reye, que consiste em hepatite
para o ácido salicílico. fulminante associada a edema cerebral que pode levar
Porém, descobriu-se depois que este ácido ao óbito (Usar em crianças o paracetamol). A aspirina é
pode ter uma ação corrosiva nas paredes do estômago. absorvida principalmente no meio ácido do estomago.
Para contornar isto foi adicionado um radical acetil à Não pode ser utilizada em pacientes hemofílicos ou
hidroxila ligada diretamente ao anel aromático, dando que usam heparina ou anticoagulantes orais, devido ao
origem a um éster de acetato, chamado de ácido acetil- risco de hemorragias. A ingestão de salicilatos causa o
salicílico (AAS), menos corrosivo mas também menos prolongamento do tempo de sangramento. Este efeito é
potente. devido à acetilação irreversível da cicloxigenase
A aspirina provoca inativação irreversível da COX1 e plaquetária e à conseqüente redução da formação de
COX2. tromboxano A2. Para a restauração da agregação
A aspirina também se mostra eficaz, em baixas plaquetária é necessária a produção de novas plaquetas
doses, em distúrbios cardiovasculares devido sua ação contendo nova cicloxigenase.
antiplaquetária. Deve-se tomar cuidado ao empregar os
Os tipos de dor que habitualmente são salicilatos em pacientes que apresentem lesões
aliviadas pelos salicilatos são de pouca intensidade e hepáticas, hipoprotrombinemia, deficiência de vitamina
originam-se mais de estruturas tegumentares que das K, hemofilia ou quando tomam anticoagulantes orais. A
vísceras, especialmente cefaléia, mialgia e artralgia. inibição da hemostasia plaquetária pode resultar em
Este fármaco esta epidemiologicamente ligado a um hemorragia severa.
tipo de encefalite (Síndrome de Reye) quando Devido a possibilidade da trombocitopenia
administrado a crianças com infecções virais. (diminuição da quantidade de plaquetas), e risco de
Se for administrada junto com a varfarina, a hemorragia, os salicilatos não devem ser administrados
aspirina pode causar aumento potencialmente perigoso a pacientes que estejam com a suspeita da doença
no risco de sangramento. Além disso, ela interfere no Dengue.
efeito dos agentes uricosúricos como a probenecida e Em homens, principalmente com idade
sulfimpirazona, portanto o medicamento não deve ser superior a 30 anos tem ocorrido alguns casos de
usado na gota. idiossincrasia com a aspirina como a crise asmática,
Nos últimos 10 anos proliferaram os AINES, embora ainda não seja explicado este mecanismo,
nenhum deles sobrepujando a eficácia do ácido possivelmente, pode estar relacionado ao fato das
acetilsalicílico. prostaglandinas (principalmente a prostaciclina) sejam
potentes broncodilatadores, ação inibida pela aspirina.
Acido acetil salicílico - Aspirina
Usos: Anti-inflamatório – antipirético – analgésico – A aspirina e a doença Dengue
aumenta ventilação alveolar (doses terapêuticas) – A doença Dengue é causada pelos quatros
diminui a agregação plaquetária – prevenção da angina subtipos de Flavivírus. A doença pode ser do tipo
pectoris e do infarto do miocárdio – prevenção do clássica ou hemorrágica. Esta última se caracteriza por

Marcelo A. Cabral
ANOTAÇÕES EM FARMACOLOGIA E FARMÁCIA CLÍNICA

hemoconcentração e trombocitopenia, o que pode levar


a um estado de choque e causar a morte do paciente. A Reduz a captação de iodo pela tireóide podendo levar
forma clássica da doença apresenta um quadro mais ao hipotireoidismo.
leve (cefaléia, dor articular, lombalgia, e, outros), mas Os efeitos mais graves são a agranulocitose e a
também pode desenvolver hemorragias, por exemplo, anemia aplástica. Têm ocorrido casos de agranulocitose
gengivais ou epistaxe. Os salicilatos, como por com o uso da dipirona (alguns autores denominam de
exemplo, o ácido acetilsalicílico, não devem ser metamizol) com doses baixas, assim como, após
utilizados no tratamento da doença Dengue por possuir diversas semanas de tratamento ou quando volta a usar
propriedade antiagregante plaquetária. O ácido a medicação após a suspensão durante algum tempo.
acetilsalicílico provoca a acetilação da enzima Tem sido criticado o uso da dipirona como analgésico,
cicloxigenase plaquetária, inibindo a formação do recomendando que somente deve ser utilizado em
tromboxano A2, o que leva a uma redução na formação convulsões febris em crianças ou em doenças que
de plaquetas, podendo agravar o quadro de provoquem a febre e não seja possível controlar a febre
trombocitopenia, que favorece as hemorragias. por outro meio ou fármaco.

Adalimumab (Humira) – é um antiinflamatório Paracetamol


resultante da biotecnologia destinado ao tratamento da Usos:
artrite reumatóide, artrite psoriáica e espondilite Analgésico – antipirético. Utilizado em crianças em
anquilosante grave. O adalimumab é um anticorpo infecções virais (incluindo a catapora), pois não
monoclonal que foi desenhado para reconhecer e se provoca a Síndrome de Reye.
ligar a uma estrutura específica (segundo mensageiro) Pode ser usado em pacientes com a doença Gota.
denominada fator de necrose tumoral (TNF). O TNF Apresenta fraca ação anti-inflamatória porque em
está envolvido no processo de inflamação e encontra-se tecidos periféricos tem menor efeito sobre a
em níveis elevados nos doentes com artrite reumatóide, cicloxigenase (alguns autores não consideram o
artrite psoriática e espondilite anquilosante. Seu paracetamol como AINE verdadeiro), mas, no SNC
principal papel está relacionado à regulação e tem ação efetiva sendo utilizado como analgésico e
equilíbrio da ação das células imunes. Através do antipirético.
bloqueio do TNF, o adalimumab melhora a inflamação Não apresentam também ação plaquetária e nem tem
e outros sintomas destas doenças. efeito no tempo de coagulação, e apresenta a vantagem
O medicamento deve ser administrado sobre a aspirina de não ser considerado irritante para o
associadamente com o metotrexato, na dose única trato gastrintestinal.
subcutânea de 40 mg em semanas alternadas, ou toda A via de administração é oral.
semana quando administrado isoladamente. (o Efeitos adversos:
metrotexato é um antagonista do ácido fólico com Em doses terapêuticas são mínimos os efeitos adversos,
atividade citotóxica e imunossupressora, que possui como erupções cutâneas e reações alérgicas que
forte ação anti-reumatóide). raramente ocorrem.
Em longo prazo pode provocar necrose tubular renal e
Fenilbutazona e Dipirona coma hipoglicêmico.
Usos: O risco mais grave ocorre com doses altas que pode
Potente ação antiinflamatória, mas são discretos como provocar a hepatoxicidade e levar ao óbito (devido a
analgésicos e antipiréticos. Não devem ser utilizados reações bioquímicas com os grupamentos sulfidrila das
por mais de uma semana devido aos efeitos adversos. proteínas hepáticas, formando reações covalentes, o
Alguns autores não consideram a dipirona como que leva a formação do metabólito
fármaco de potente ação antiinflamatória, referindo-se Nacetilbenzoquinona).
a este medicamento apenas como bom analgésico e Os sintomas da toxicidade do paracetamol são:
antipirético devido sua ação no SNC. Náuseas, vômitos, dores abdominais, sonolência,
Administração: oral – retal – parenteral excitação, e, desorientação.
Efeitos adversos: Em casos de uso de doses altas, dentro de dez horas
Em metade dos pacientes tratados ocorre após a administração do paracetamol, a administração
efeito adverso, pois, a fenilbutazona é transformada de N-acetilcisteína pode ser salvadora, pois a N-
pelo fígado em oxifenilbutazona, e ambas são acetilcisteína contém grupamentos sulfidrila aos quais
lentamente excretadas pelo rim devido à ligação às o metabólito tóxico pode ligar-se.
proteínas plasmáticas.
Provocam retenção de sódio, cloro e água ao
nível renal, reduzindo o volume urinário e aumentando DERIVADOS DO ÁCIDO ACÉTICO
o volume plasmático, o que pode levar a alteração Indometacina
cardíaca. Usos:
Os efeitos adversos mais freqüentes são: Potente anti-inflamatório (mais do que a aspirina) – em
náuseas, vômitos, erupções cutâneas e desconforto casos agudos dolorosos como artrite gotosa aguda,
epigástrico. Pode também ocorrer diarréia, insônia, espondilite anquilosante e osteoartrite coxo-femural,
vertigem, visão turva, euforia ou nervosismo e controle da dor associada a uveíte e/ou pós-operatório
hematúria. de cirurgia oftalmológica.

Marcelo A. Cabral
ANOTAÇÕES EM FARMACOLOGIA E FARMÁCIA CLÍNICA

Em neonatos prematuros a indometacina tem sido


utilizada para acelerar o fechamento do ducto arterioso diclofenaco) e as penicilinas, é denominada Síndrome
patente. de Nicolau. Trata-se de uma dermatite de observação
(Geralmente, não deve usado para baixar a febre, pouco freqüente, descrita inicialmente por Nicolau em
exceto quando a febre é refratária a outros antipiréticos referência a injeção intra-arterial acidental de sais de
como na Doença de Hodgkin). A via de administração bismuto em suspensão oleosa, na era pré-penicilínica,
é oral ou retal. para o tratamento da sífilis. Posteriormente, foram
Efeitos adversos: descritos casos relacionados à aplicação de outros
Metade dos pacientes tratados apresenta efeitos fármacos distintos do bismuto.
adversos, tais como: náuseas, vômitos, anorexia, Embora sua etiologia não esteja
diarréia e dor abdominal, podendo levar a ulceração do completamente elucidada, a Síndrome de Nicolau
trato gastrintestinal (TGI), inclusive perfuração e muitas vezes está associada à injeção intra-arterial
hemorragia. acidental do medicamento. Os sintomas e sinais
No SNC pode provocar a cefaléia frontal, tontura, clínicos da Síndrome incluem dor imediata no local da
vertigem e confusão mental. aplicação, seguida de escurecimento e edema; sintomas
O uso prolongado de indometacina e fenilbutazona em de embolia arterial ocorrem nas extremidades
pacientes acometidos pela osteoartrose no quadril pode inferiores, podendo evoluir para necrose; alguns
levar à necrose asséptica na cabeça femural. pacientes podem desenvolver complicações graves,
Embora raramente, pode também ocorrer pancreatite incluindo septicemia e coagulação intravascular
aguda, hepatite, icterícia, neutropenia, trombocitopenia, disseminada. Acidentes isquêmicos após injeções
e, anemia aplásica. intramusculares não são raros e, devido à relativa
Como interações medicamentosas, a indometacina ineficácia das medidas terapêuticas existentes, os
pode reduzir o efeito anti-hipertensivo de inibidores da efeitos podem ser graves e mutilantes.
enzima de conversão da angiotensina (por exemplo, o Em pesquisa na literatura, foram encontrados
captopril), da prazosina, da hidralazina, do propranolol, 33 casos descritos de Síndrome de Nicolau
e da ação de diuréticos como da furosemida e da relacionados ao diclofenaco intramuscular. Destes
hidroclorotiaziada. casos, dezesseis ocorreram no Brasil, 22 após a
O uso de penicilinas (em geral) pode aumentar a administração de apenas uma dose de 75 mg (uma
toxicidade da indometacina. ampola); 19 envolveram a região glútea e quatro
pacientes faleceram em decorrência da reação.
Diclofenaco (Voltaren) (Cataflam) Os prescritores devem avaliar cuidadosamente
Também é um derivado do acido acético, e, tem a relação risco/benefício antes de indicarem o uso do
atividade analgésica, antipirética e antiinflamatória, diclofenaco intramuscular. Este medicamento não
sendo útil para o tratamento de curta duração das lesões deve ser usado para condições triviais ou quando a
musculoesqueléticas agudas, das tendinites, das administração oral for possível. A via retal
bursites, da dor do pós-operatório e da dismenorréia, e (supositórios) deveria ser considerada como primeira
pode ter uso crônico em pacientes com Artrite alternativa, antes da via intramuscular, quando o alívio
Reumatóide, Osteoartrite e Espondilite anquilosante. da dor for inadequado pela via oral. Reações adversas
Além da via oral e retal, também é usado por via sérias são menos comuns com o uso da via retal.
oftálmica. Interações medicamentosas do diclofenaco:
Cerca de 40 a 50% do diclofenaco são Aumenta o efeito dos anticoagulantes orais e da
biotransformadas na primeira passagem pelo fígado heparina; aumenta a toxicidade da digoxina, do lítio e
(meia-vida curta) em 4-hidroxidiclofenaco que tem dos diuréticos poupadores de potássio; diminui o efeito
fraca ação antiinflamatória, embora a concentração nos terapêutico de outros diuréticos. Pode aumentar ou
locais inflamados tenha a duração de 12 a 24 horas. diminuir os efeitos de hipoglicemiantes orais.
Assim, pela via de administração intramuscular, o
fármaco alcança maior concentração sistêmica e no DERIVADOS DO ÁCIDO ENÓLICO ou
local da inflamação. OXICAMS:
Alguns estudos indicam que o diclofenaco potássico Possui a vantagem de ter a meia-vida mais
(sal potássico) tem ação mais rápida (sendo inclusive longa, e, apenas cerca de 20% dos pacientes apresenta
mais indicado para a dismenorréia), e que o efeitos adversos, entretanto, aumenta o tempo de
diclofenaco sódico (sal sódico) tem ação mais coagulação e pode interferir na eliminação renal de
duradoura. Por via oral, o diclofenaco tem melhor lítio. O piroxicam tem a meia-vida de 50 horas (faixa
absorção na presença de alimentos. de 30 a 86 horas), o tenoxicam tem a meia-vida
Efeitos adversos: plasmática de 70 horas, e o meloxicam tem a meia-vida
Apresenta efeitos gastrintestinais semelhantes aos de cerca de 20 horas.
demais AINEs e pode provocar aumento dos níveis de Além de serem usado para o tratamento das
enzimas hepáticas. doenças inflamatórias,o piroxicam é também utilizado
Síndrome de Nicolau. no tratamento das lesões músculo esqueléticas, na
A necrose tecidual local induzida pela aplicação dismenorréia e na dor do pós-operatório.
intramuscular de certos fármacos, como os O piroxicam e o tenoxicam podem levar as
antiinflamatórios não esteroidais (incluindo o interações medicamentosas semelhantes as que

Marcelo A. Cabral
ANOTAÇÕES EM FARMACOLOGIA E FARMÁCIA CLÍNICA

ocorrem com o diclofenaco, mas o meloxicam não


interage com a maioria dos medicamentos que endógena do tromboxano A2, que é o principal produto
interagem com o diclofenaco, como a digoxina, da enzima COX-1 plaquetária, causando a agregação
furosemida e outros. plaquetária, vasoconstrição e proliferação vascular.
No ano de 2004, o fabricante do Rofecoxib
DERIVADOS DO ÁCIDO FENILANTRANÍLICO: (Vioxx) retirou do mercado este medicamento devido à
Ácido mefenâmico (Ponstan) incidência de efeitos adversos tromboembólicos graves
O principal uso tem sido na dismenorréia devido a ação (infarto agudo do miocárdio e AVC isquêmico), e
antagonista nos receptores da PGE2 e PGF2alfa. estudos recentes têm demonstrado que a COX-2 é a
A via de administração é oral. principal geradora da prostaciclina (uma das
A limitação tem sido a diarréia e inflamações prostaglandinas) no endotélio que inibe a agregação
intestinais, e, tem sido relatados casos de anemia plaquetária, causa a vasodilatação, e inibe a
hemolítica. proliferação de células do músculo liso vascular (in
vitro).
DERIVADOS DO ÁCIDO PROPIÔNICO (ou ácido Assim, a inibição da síntese da prostaciclina
fenilpropiônico): (provocada por estes inibidores da COX-2) pode levar
NAPROXENO (Naprosyn)(Flanax) - IBUPROFENO ao aumento da pressão arterial e aceleração da
(Artril)(Artrinid)(Dalsy) aterogênese (devido à ação do tromboxano que tem a
CETOPROFENO (Profenid) – FLURBIPROFENO produção estimulada enzima COX-1 e que não é
(Ocufen) (Targus) inibida pelo coxibe), sendo recomendada cautela com o
INDOPROFENO (Flosin) – FLURBIPROFENO uso dos demais fármacos deste grupo.
(Ocupen) (Targus) O alto custo também tem limitado o uso destes
FENOPROFENO (Algipron) (Trandor) – medicamentos.
LOXOPROFENO (Loxonin)
PRANOPROFENO (Difen) Efeitos indesejáveis dos AINEs:
Usos:
Apresentam potência semelhante à a) distúrbios gastrointestinais (diarréias, náusea,
indometacina como anti-inflamatório, analgésico e vômito, lesão gástrica devida à inibição das
antipirético, e a baixa toxicidade leva a melhor prostaglandinas protetoras do estômago – PGE2). A
aceitação por alguns pacientes, com menor incidência administração oral de análogos das prostaglandinas,
de efeitos adversos do que a aspirina e a indometacina. como o misoprostol, pode diminuir a lesão gástrica
O naproxeno sódico é absorvido mais induzida pelos AINES;
rapidamente, e o pico da concentração plasmática b) Efeitos renais (insuficiência renal aguda em
ocorre em período mais curto do que a forma não indivíduos susceptíveis). Os AINEs inibem a síntese de
sódica. prostaglandinas que servem para manter a perfusão
Alteram a função plaquetária e o tempo de renal em pacientes com fluxo sangüíneo renal e volume
sangramento, especialmente o naproxeno. sangüíneo diminuídos. Nesses pacientes, a
Não alteram os efeitos dos hipoglicemiantes orais. administração de AINEs pode precipitar
Efeitos adversos: descompensação renal evidente, reversível após a
Semelhantes aos da aspirina, porém em incidência suspensão do tratamento.
muito menor. Os AINEs podem diminuir a eficácia dos diuréticos e
Pode reduzir o efeito anti-hipertensivo de diuréticos de outros fármacos anti-hipertensivos.
tiazídicos, de alça (furosemida), de agentes beta- Os fármacos seletivos para a COX-2 (Celocoxib,
bloqueadores e de inibidores de ECA. rofecoxib, nimesulida, etodolaco) apresentam menores
complicações gastrintestinais associadas, e possuem
INIBIDORES SELETIVOS DA ENZIMA eficácia analgésica e antiinflamatória similar à dos
CICLOXIGENASE-2: demais AINEs.
NIMESULIDA (Nisulid) (Scaflam) – CELECOXIB
(Celebra)
ETORICOXIB (Arcoxia) – VALDECOXIB (Bextra)
Estes fármacos têm a ação específica sobre a enzima
cicloxigenase-2 (COX-2) sendo também conhecidos
como coxibes.
Usos:
Antiinflamatórios – analgésicos – antipiréticos
Devido à ação seletiva sobre a cicloxigenase-
2, a incidência de efeitos gastrintestinais é inferior a
20% dos casos, entretanto, os coxibes não são mais
eficazes como antiinflamatório e analgésico do que os
AINEs convencionais, e não tem ação plaquetária,
portanto não podem substituir a aspirina na prevenção
de doença coronariana, pois não reduzem a produção

Marcelo A. Cabral
ANOTAÇÕES EM FARMACOLOGIA E FARMÁCIA CLÍNICA

Referências Bibliográficas

1. RANG, H. P. et al. Farmacologia. 4 edição. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2001;


2. KATZUNG, B. G. Farmacologia: Básica & Clinica. 9 edição. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2006;
3. CRAIG, C. R.; STITZEL, R. E. Farmacologia Moderna. 6 edição. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2005;
4. GOLAN, D. E. et al. Princípios de Farmacologia: A Base Fisiopatológica da Farmacoterapia. 2
edição. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2009;
5. FUCHS, F. D.; WANNMACHER, L.; FERREIRA, M. B. C. Farmacologia Clínica. 3 edição. Rio de Janeiro:
Guanabara Koogan, 2004.
6. GILMAN, A. G. As Bases farmacológicas da Terapêutica. 10 edição. Rio de Janeiro: Mc-Graw Hill, 2005.
7. CONSTANZO, L. S. Fisiologia. 2 edição. Rio de Janeiro: Elsevier, 2004.

ЖЖЖЖЖЖ

Marcelo A. Cabral
ANOTAÇÕES EM FARMACOLOGIA E FARMÁCIA CLÍNICA

4) GLICOCORTICÓIDES
- Sobre as gorduras: causam efeito permissivo sobre os
hormônios lipolíticos e redistribuição da gordura (Sindrome de
O emprego dos glicocorticóides na terapêutica deve-se Cushing: caracterizada pela presença de corcova de búfalo,
principalmente ao fato destes apresentarem poderosos efeitos hipertensão, pele fina, braços e pernas finos devido atrofia
antinflamatórios e imunossupressores. Eles inibem muscular, cataratas, face de lua cheia com bochechas vermelhas,
manifestações tanto iniciais quanto tardias da inflamação, isto é, aumento da gordura abdominal, equimoses e cicatrização
não apenas a vermelhidão, o calor, a dor e o edema iniciais, mas deficiente das feridas).
também os estágios posteriores de cicatrização e reparo de
feridas e reações proliferativas observadas na inflamação
crônica.
Síndrome de Cushing:
Estes fármacos têm atividade sobre todos os tipos de
reações inflamatórias, sejam elas causadas por patógenos
invasores, por estímulos químicos ou físicos ou por respostas
imunes inadequadamente desencadeadas, como as observadas
na hipersensibilidade ou na doença auto-imune.

Quando usados clinicamente para suprimir a rejeição de


enxertos, os glicocorticóides suprimem o desencadeamento e a
produção de uma nova resposta imune com mais eficiência do
que uma reposta já estabelecida, na qual já ocorreu proliferação
clonal.

Os fármacos glicocorticóides, de uma maneira geral,


apresentam vários efeitos adversos, uma vez que eles interferem
no metabolismo geral do organismo. Estes compostos são
capazes de reduzir a captação e utilização da glicose e aumentar
a gliconeogênese, desencadeando glicemia de rebote, com
conseqüente glicosúria, além de aumentar o catabolismo e
reduzir o anabolismo protéico.

O principal estímulo fisiológico para a síntese e liberação


dos glicocorticóides endógenos é a presença de corticotropina
(ACTH) secretada pela glândula adeno-hipófise.
- Sobre os íons: reduzem a absorção de Ca+ e aumentam a
Principais drogas glicocorticóides: excreção de Ca+ ocasionando um balanço negativo de cálcio
com perda desse íons nos ossos – osteoporose. O aumento de
De ação curta (8 a 12 horas): cortizona e hidrocortizona; glicocorticóides produz ação mineralcorticóide o que significa
De ação intermediária (12 a 36 horas): predinisona, retenção de sódio e excreção de K+ resultando em hipertensão
prednisolona e metilprednisolona; e edema periférico.
De longa ação (36 a 72 horas): dexametasona, betametasona,
fluticasona e mometasona. Ações reguladoras dos glicocorticóides:

A potência dos GC é avaliada pela sua afinidade aos - Sobre o hipotálamo: ação de retroalimentação negativa,
receptores citoplasmáticos e pela duração de ação. Neste resultando em diminuição da liberação dos glicocorticóides
sentido, a dexametasona e a betametasona possuem maior endógenos;
potência antinflamatória (tanto é são administradas em doses
menores em relação aos demais GC). - Sobre os eventos musculares: vasodilatação reduzida e
diminuição de exsudação de líquidos;
Ações metabólicas dos glicocorticóides:
- Sobre os eventos celulares: redução do influxo e da atividade
dos leucócitos, redução da atividade das células mononucleares;
- Sobre os carboidratos: os glicocorticóides produzem redução diminuição da expansão clonal das células Th. Redução da
da captação e utilização da glicose e aumento da função dos osteoblastos e maior atividade dos osteoclastos o que
gliconeogênese, resultando em hiperglicemia; significa osteoporose.

- Sobre as proteínas: produzem aumento do catabolismo e - Sobre os mediadores inflamatórios: diminuição na produção e
redução do anabolismo com perda de massa muscular. ação das citocinas, diminuição da produção de eicosanóides

1 Marcelo A. Cabral
ANOTAÇÕES EM FARMACOLOGIA E FARMÁCIA CLÍNICA

(prostaglandinas, leucotrienos e tromboxanos), diminuição da


produção de IgG, diminuição dos componentes do complemento
no sangue. Menor produção de histamina. inibe a fosfolipase A2 que é a responsável pela degradação dos
fosfolipídeos da membrana celular com formação de ácido
Efeitos globais dos glicocorticóides: redução da inflamação arquidônico. Este ácido é o substrato das ciclo-oxigenases na
crônica e nas reações auto-imunes; entretanto, ocorre também formação dos eicosanóides: quimiotaxinas, lipoxinas,
deteriorização da cicatrização e diminuição nos aspectos prostaglandinas, tromboxanos, leucotrienos. Além disso, inibe a
protetores da resposta inflamatória. síntese de outras substâncias tais como a COX-2, fator de
necrose tumoral alfa (TNF-alfa), interleucina-1, interleucina-4,
Os glicocorticóides agem em todas as fases da as citocinas e NOS.
inflamação e afetam todos os tipos de reação inflamatória. São
indicados no tratamento da Doença de Addison, terapia Efeitos indesejáveis dos glicocorticóides:
antinflamatória ou imunossupressora (asma, hipersensibilidade,
artrite, enxertos, transplantes e dermatite), doenças neoplásicas, Os efeitos indesejáveis são observados principalmente
e ainda na terapia de reposição em pacientes com deficiência da com uso sistêmico prolongado como agentes antiinflamatórios
supra-renal e renal. ou imunossupressores (caso em que todas as ações metabólicas
tornam-se indesejáveis), mas não habitualmente com terapia de
Mecanismo de ação dos glicocorticóides: reposição. Os mais importantes são: supressão da resposta à
infecção; supressão da síntese de glicocorticoídes endógenos
O glicocorticóide cruza a membrana citoplamática por (atrofia da supra-renal); ações metabólicas; osteoporose;
difusão passiva, se liga ao receptor intracelular que sofre, então, Síndrome de Cushing iatrogênica; catarata; hipertensão;
uma mudança conformacional expondo o domínio de ligação hipertensão craniana e equimoses.
com o DNA. Em seguida, o complexo GC-receptor forma A interrupção abrupta do tratamento com
dímeros, migra para o núcleo e se liga ao DNA. Ocorre então a glicocorticóides pode resultar em insuficiência supra-renal
repressão e a indução de genes específicos responsáveis pela aguda (Síndrome de Addison iatrogênica), visto que o
síntese de proteínas envolvidas na inflamação (COX-2, hipotálamo e a hipófise necessitam de várias semanas a meses
citocinas, NOS, lipocortina-1). para o restabelecimento da produção adequada de hormônio
adeno-corticotrófico (ACTH). Durante esse período, a doença
Em outras palavras, os glicocorticóides interagem com subjacente pode agravar-se, devido à desinibição do sistema
receptores intracelulares; os complexos esteróides-receptor imune. Para impedir estas últimas complicações, a dose de
resultantes formam dímeros (pares) e a seguir, interagem com o glicocorticóides deve ser reduzida lentamente no processo de
DNA. Com isso, modificam a transcrição gênica, induzindo a interrupção do tratamento.
síntese de algumas proteínas, como a lipocortina-1 que é
importante na retroalimentação e como antiinflamatório pois

Referências Bibliográficas

1. RANG, H. P. et al. Farmacologia. 4 edição. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2001;


2. KATZUNG, B. G. Farmacologia: Básica & Clinica. 9 edição. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2006;
3. CRAIG, C. R.; STITZEL, R. E. Farmacologia Moderna. 6 edição. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2005;
4. GOLAN, D. E. et al. Princípios de Farmacologia: A Base Fisiopatológica da Farmacoterapia. 2 edição. Rio de
Janeiro: Guanabara Koogan, 2009;
5. FUCHS, F. D.; WANNMACHER, L.; FERREIRA, M. B. C. Farmacologia Clínica. 3 edição. Rio de Janeiro: Guanabara
Koogan, 2004.
6. GILMAN, A. G. As Bases farmacológicas da Terapêutica. 10 edição. Rio de Janeiro: Mc-Graw Hill, 2005.
7. CONSTANZO, L. S. Fisiologia. 2 edição. Rio de Janeiro: Elsevier, 2004.

ЖЖЖЖЖЖ

2 Marcelo A. Cabral
ANOTAÇÕES EM FARMACOLOGIA E FARMÁCIA CLÍNICA

5) FÁRMACOS ANTI-HIPERTENSIVOS
A hipertensão representa a elevação da pressão arterial no túbulo contorcido distal. Aumentam a perda de K+ e
sistólica e/ou diastólica. O diagnóstico de hipertensão é feito reduzem a perda de Ca+.
quando a pressão arterial sistólica atinge valor igual ou
superior a 140 mm Hg e a pressão diastólica um valor igual ou Indapamina
superior a 90 mm Hg. Acredita-se que a patogenia da
hipertensão essencial resida: A indapamida é um diurético derivado indólico da
a) no rim e no seu papel de regular o volume vascular através clorossulfonamida. Embora feqüentemente classificada no
da eliminação de sal e água; grupo das tiazidas, a indapamida não possui o anel tiazídico
b) no sistema renina-angiotensina-aldosterona através dos seus na molécula.
efeitos sobre o tono vascular sanguíneo, regulação do fluxo Seu efeito anti-hipertensivo deve-se, basicamente, a uma
sanguíneo renal e metabolismo de sais; e ação vascular direta: inibição da hiperreatividade às aminas
c) no sistema nervoso simpático, que regula o tono dos vasos vasopressoras, aumento da síntese das prostaglandinas
de resistência. vasodilatadoras, inibição da síntese de tromboxano A 2 e
As medicações utilizadas no tratamento da hipertensão inibição do fluxo de íons cálcio nas fibras musculares lisas,
exercem seus efeitos através de um ou mais desses reduzindo a resistência vascular periférica. Sua ação
mecanismos reguladores, e podem ser classificadas em hipertensiva tem início em doses nas quais suas propriedades
diuréticos, agonistas alfa-2 de ação central, vasodilatadores diuréticas são mínimas.
diretos, antagonistas dos canais de cálcio, inibidores da ECA e Os efeitos renais da indapamida manifestam-se
antagonistas dos receptores de angiotensina-2. clinicamente apenas em doses superiores à dose de 2,5mg/dia,
Os pressoreceptores arteriais (de alta pressão), que que é a dose onde o efeito anti-hipertensivo é máximo. No
efetuam o controle fisiológico da pressão arterial, participam rim, age no tubo contornado distal, inibindo a reabsorção de
do mecanismo reflexo mais importante para o controle da sódio. A indapamida é rapidamente absorvida no trato
pressão momento a momento, e geram potenciais de ação pelas digestivo após administração oral e fixa-se preferencialmente
variações na forma da parede dos vasos, que são conduzidos ao à parede vascular, devido à sua natureza lipofílica. Sofre
núcleo do trato solitário no sistema nervoso central. Esses transformação hepática em vários metabólitos ativos, que são
eventos promovem como resposta o aumento da atividade eliminados principalmente por via urinária, com meia-vida de
vagal, redução da atividade simpática para o coração e vasos, 16 horas. Diferentemente dos demais tiazídicos, a indapamida
diminuição da freqüência e contratilidade cardíacas, da não interfere no perfil lipídico nem no metabolismo da
resistência vascular periférica e da capacitância venosa. glicose, mesmo em longo prazo.
A hipertensão não controlada produz demandas
aumentadas sobre o coração (resultando em hipertrofia Diuréticos poupadores de potássio (túbulo distal):
ventricular esquerda e insuficiência cardíaca), bem como sobre espirolactona, triantereno e amilorida. Atuam nos túbulos
os vasos do sistema arterial (levando a aterosclerose, doença coletores e são diuréticos muito fracos. A amilorida e o
renal e derrame). triantereno atuam ao bloquear os canais de Na+ controlado
pelo mediador protéico da aldosterona. Já a espirolactona é
A) Diuréticos: Os diuréticos exercem ação anti-hipertensiva um antagonista do receptor de aldosterona. A função principal
mediante diminuição da volemia. Promovem a excreção da aldosterona é a manutenção do volume de fluido
de sódio e potássio, diminuindo assim a osmalaridade extracelular, por conservação do Na+ corporal; a sua
plasmática com conseqüente diminuição do volume produção depende de aferências renais, estimuladas quando é
plasmático. detectada uma redução no volume de fluido circulante.
Os diuréticos podem ser classificados de acordo com os Quando há redução do sódio extracelular, a diminuição
efeitos predominantes em diferentes pontos do néfron. Cada do volume plasmático e do fluido extracelular diminui o fluxo
categoria, em função de intensidade de efeito diurético e das e a pressão de perfusão renais, o que é detectado pelas células
propriedades farmacocinéticas, é usada preferencialmente em justaglomerulares renais, que segregam, como resposta,
determinadas patologias. Os diuréricos de alça, tiazídicos e renina para a circulação periférica. A renina converte o
poupadores de potássio são utilizados no tratamento da angiotensinogênio em angiotensina-I que, depois, é clivada
hipertensão. pela enzima conversora de angiotensina (ECA) presente em
muitos leitos capilares (pricipalemente no pulmão), originado
Diuréticos de alça (alça ascendente de Henle): furosemida, angiotensina-II. A agiotensina-II fixa-se a receptores
bumetanida, ácido etacrínico, torasemida, piretanida. Atuam membranares específicos à nível supra-renal, produzindo
ao inibir o co-transportador Na+/K+/2Cl- na alça ascendente segundos mensageiros como o Ca+ e derivados do IP3. a
espessa. Aumentam a perda de K+ e Ca+. ativação da proteinocinase C altera a expressão enzimática,
favorecendo a síntese de aldosterona.
Diuréticos tiazídicos (porção proximal do túbulo distal):
bendroflumetiazida, benzotiazida, clorotiazida, clortalidona, Diuréticos osmóticos (túbulo proximal, alça ascendente de
hidroclorotiazida, hidroflumetiazida, indapamida, Henle e túbulo coletor): manitol. Formam um complexo com
meticlotiazida, metolazona, politiazida, quinetazona, a água e impedem sua reabsorção no interior do túbulo. Não
triclorometiazida. Atuam ao inibir o co-transportador Na+/Cl- se mostram úteis no tratamento de condições associadas à
retenção de sódio. São usados em elevação aguda da pressão

1 Marcelo A. Cabral
ANOTAÇÕES EM FARMACOLOGIA E FARMÁCIA CLÍNICA

intracraniana ou intra-ocular e prevenção da insuficiência


renal aguda.
Apresentam baixa eficácia como monoterapia, devendo
Diuréticos inibidores da anidrase carbônica (túbulo ser utilizados em associação com outros anti-hipertensivos.
contornado proximal): acetalozamida, diclorfenamida, Podem induzir o aparecimento de tolerância farmacológica,
metazolamida e brinzolamida. São usados no tratamento de que obriga o uso de doses crescentes. Têm a vantagem de
glaucoma e não mais como diuréticos. propiciar melhora do metabolismo lipídico (discreta) e da
urodinâmica (sintomas) de pacientes com hipertrofia
Diuréticos uricosúricos (túbulo proximal, alça ascendente de prostática. Os efeitos indesejáveis mais comuns são:
Henle e porção inicial do túbulo distal): ticrinafem, ácido hipotensão postural (mais evidente com a primeira dose),
indacínico. Agem ao inibir a reabsorção de urato no túbulo palpitação e, eventualmente, astenia.
contorcido proximal. Podem ser usados no tratamento da
gota, porém foram suplantados pelo alopurinol. Bloqueadores beta (propanolol, atenolol, esmolol, timolol,
pindolol e nadolol): Efeitos resultantes de bloqueio dos
receptores beta-1 incluem diminuição de freqüência e força
contrátil cardíacas, consequentemente reduzindo o débito e
consumo de oxigênio cardíacos, justificativa para uso desses
bloqueadores em cardiopatia isquêmica, insuficiência
cardíaca, hipertensão arterial e arritmias cardíacas. O efeito
anti-hipertensivo é ainda atribuído ao bloqueio de receptores
beta pré-sinápticos, desse modo diminuindo a transmissão
adrenérgica.
Entre as reações indesejáveis dos betabloqueadores
destacam-se: broncoespasmo, bradicardia excessiva (inferior a
50 bat/min), distúrbios da condução atrioventricular,
depressão miocárdica, vasoconstrição periférica, insônia,
pesadelos, depressão psíquica, astenia e disfunção sexual. Do
ponto de vista metabólico, podem acarretar intolerância à
B) Agonistas alfa-2 de ação central (clonidina, glicose, hipertrigliceridemia e redução do HDL-colesterol.
guanabenzo e metildopa)
C) Vasodilatadores diretos: A hidralazina exerce efeito anti-
A clonidina (Atensina) estimula os receptores alfa-2 hipertensivo por relaxamento direto da musculatura lisa
adrenérgicos no SNC, inibindo a liberação de noradrenalina arteriolar, cujo mecanismo molecular não é conhecido. A
nas terminações nervosas simpáticas (retroalimentação vasodilatação associa-se, por reflexo barorreceptor-mediado,
negativa), reduzindo a atividade simpática e promovendo a poderoso estímulo do sistema nervoso simpático, resultando
sedação e diminuição do tônus vasomotor e da freqüência em aumento de freqüência e contratilidade cardíaca.
cardíaca. Hidralazina aumenta a liberação de noradrenalina pelos
terminais nervosos simpáticos. Também aumenta a atividade
A eficácia anti-hipertensiva desse grupo de de renina plasmática e a retenção hídrica. Esses efeitos
medicamentos como monoterapia é, em geral, discreta. Até o neutralizam o efeito anti-hipertensivo da hidralazina, exigindo
presente momento, não existe experiência clínica suficiente terapia combinada com agentes que diminuem os aumentos
em nosso meio com o inibidor dos receptores compensatórios no tônus simpático e a retenção de sal e água.
imidazolidínicos. Essas drogas podem ser úteis em Outros vasodilatadores: nitroprussiato, minoxidil e diazóxido.
associação com medicamentos de outras classes terapêuticas,
particularmente quando existem evidências de hiperatividade D) antagonistas dos canais de cálcio: o nitrendipino inibe o
simpática. influxo do íon através dos canais de cálcio no músculo liso
vascular e cardíaco, resultando em dilatação de artérias e
Entre os efeitos indesejáveis, destacam-se aqueles arteríolas periféricas e vasos cerebrais. Com alto grau de
decorrentes da ação central (pela inibição da ação simpática), seletividade para o músculo liso vascular, diminui a
como sonolência, sedação, boca seca, fadiga, hipotensão resistência vascular periférica e reduz a pressão sanguínea.
postural e impotência. Especificamente com a alfametildopa, Outros antagonistas dos canais de cálcio: diltiazem, nifedipina
pode ocorrer ainda, com pequena freqüência, galactorréia, e verapamil.
anemia hemolítica e lesão hepática. O emprego da
alfametildopa é contra-indicado na presença de disfunção E) Inibidores da ECA (captropil, enalapril e benazepril):
hepática. No caso da clonidina, destaca-se a hipertensão inibidores da enzima conversora de angiotensina (IECA)
rebote, quando da suspensão brusca da medicação. antagonizam os efeitos da angiotensina II e são
potencializadores dos efeitos da bradicinina. Esta última é
Bloqueadores alfa-1 (prazosina, terazosina e doxazosina): responsável por alguns dos efeitos adversos dos IECA, como
O bloqueio de receptores alfa-1 adrenérgicos inibe a a tosse (mecanismo: supressão da atividade da cininase II com
vasoconstrição induzida por catecolaminas, podendo ocorrer conseqüente acúmulo de bradicinina e substância P – a
vasodilatação arteriolar e venosa, com queda da pressão bradicinina estimula as vias nervosas envolvidas no evento da
arterial devida à diminuição da resistência periférica. tosse, além de estimular as células inflamatórias e os

2 Marcelo A. Cabral
ANOTAÇÕES EM FARMACOLOGIA E FARMÁCIA CLÍNICA

peptídeos pró-infamatórios. A inflamação localizada


determina um quadro irritativo nas vias aéreas, com ECA do endotélio pulmonar, para angiotensina II; a
estimulação dos receptores nervosos e o reflexo vagal da angiotensina II é então levada para seus órgãos-alvo (artérias,
tosse. A tosse produzida pelos IECA tem melhora com os coração e rins) pela corrente sangüínea, onde produz a devida
antinflamatórios sulindaco e indometacina). Inibidores da resposta fisiológica (vasoconstrição e liberação de
ECA reduzem a pressão arterial por diminuir a resistência aldosterona, que aumenta a absorção de sódio).
vascular periférica, com mínimo ou nenhum efeito sobre a
freqüência e débito cardíacos ou volume arterial circulante. Mecanismo de ação
Fisiologicamente, o angiotensinogênio circulante de Bloqueio dos receptores AT1 da angiotensina II, inibindo
origem hepática é rapidamente convertido em angiotensina 1 a ação do eixo da renina. O mensageiro final do eixo renina-
por renina, enzima de origem renal, seqüestrada pelas células angiotensina é a angiotensina II, que ligando-se ao receptor
da parede arterial. Angiotensina 1, decapeptídeo AT1 causa vasoconstricção e retenção hídrica, ambos levando
intermediário, se transforma em angiotensina 2 ao aumento da pressão arterial. O bloqueio do receptor AT1
(octapeptídeo), por ação da enzima conversora ou convertase, resulta na redução da pressão arterial e nos efeitos benéficos
presente na face luminal das células endoteliais. Angiotensina na ICC. Portanto os efeitos são similares aos inibidores da
2 é um potente vasoconstritor e libera aldosterona que enzima conversora, com as vantagens de não atuar sobre a
aumenta a reabsorção tubular distal e proximal de sódio. Com bradicinina e de atuar sobre o ponto final do eixo renina
isso, diminui a excreção urinária de sódio e água e aumenta a angiotensina, e portanto, sobre a angiotensina II resultante das
caliúria. vias não dependentes da enzima conversora.
Além de alterar a resistência vascular periférica e a
função renal, a angiotensina 2 também provoca mudanças na Farmacocinética
estrutura cardíaca, por meio de migração, hipertrofia e As quatro drogas do grupo possuem caracteristicas
hiperplasia de células vasculares e cardíacas e aumento de próprias.
matriz protéica extracelular por células musculares lisas e Lozartan e Candersartan possuem metabólitos ativos,
fibroblastos cardíacos. Ainda aumenta a pré e pós-carga, enquanto Valsartan e Ibersartan não. Todos têm metabolismo
contribuindo para a hipertrofia e remodelagem do coração. de eliminação basicamente hepático, mas o candersartan
Dessa forma participa em várias doenças cardiovasculares. possui dupla eliminação hepática e renal. As meia-vidas
Os iECAS são aparentemente menos eficazes na redução diferem entre todos, sendo 5 horas para o Lozartan, 6 horas
da pressão arterial em pacientes negros, do que em pacientes para o Valsartan, 13 horas para o Ibersartan e 10 horas para o
Candersartam. Todos os medicamentos desse grupo são usados
não negros. Isso ocorre, possivelmente, devido a uma maior em dose única diária.
prevalência de níveis plasmáticos reduzidos de renina na
população negra hipertensa. Uso Clínico
Os inibidores da ECA também são de primeira escolha Eficaz como monoterapia para a HAS, no entanto não
nos pacientes hipertensos que não sejam negros ou idosos. são tão eficazes na redução da PA quanto os IECA. Tem
Como referimos, são indicados em pacientes hipertensos indicação atual de substitutos do IECA, nos pacientes com
diabéticos, graças aos efeitos benéficos na prevenção da indicação de uso dessa droga, mas com intolerância devida
glomeruloesclerose progressiva, e porque não alteram o efeitos colaterais. São úteis também no tratamento da
metabolismo de carboidratos. insuficiência cardíaca, mas atualmente também tem a mesma
indicação de uso como substitutos do IECA, como na
Os iECAS não devem ser usados em mulheres grávidas. hipertensão arterial.
São contra-indicados durante o 2º e 3º trimestres de gravidez
devido ao risco de hipotensão fetal, anúria e insuficiência renal Efeitos colaterais
algumas vezes associados à má-formação fetal e morte. São Efeitos colaterais são raros e com taxas semelhantes ao
também contra-indicados em pacientes hipertensos com placebo nos estudos realizados. Tosse seca ocorre em menos
estenose da artéria renal bilateral ou com rim único. de 1% enquanto com o IECA chega a 5.5%. Efeitos adversos
raros atribuídos ao uso dos bloqueadores AT1 incluem:
F) antagonistas dos receptores de angiotensina-2- hepatotoxicidade, edema angioneurótico, e sintomas
(Losartan , Valsartan, Ibesartan, Candersartan): neuropsiquiátricos.
O sistema renina-angiotensina é visto,
tradicionalmente, como um sistema endócrino clássico. A Precauções
renina em circulação, de origem renal, atua sobre o
angiotensinogênio (de origem hepática) para produzir a Estenose renal bilateral, estenose renal em rim único.
angiotensina I no plasma; por sua vez, a angiotensina I é Contra-indicação absoluta na gravidez.
convertida, tanto pela ECA circulante no plasma, quanto pela

Referências Bibliográficas

1. RANG, H. P. et al. Farmacologia. 4 edição. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2001;


2. KATZUNG, B. G. Farmacologia: Básica & Clinica. 9 edição. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2006;

3 Marcelo A. Cabral
ANOTAÇÕES EM FARMACOLOGIA E FARMÁCIA CLÍNICA

3. CRAIG, C. R.; STITZEL, R. E. Farmacologia Moderna. 6 edição. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2005;
4. GOLAN, D. E. et al. Princípios de Farmacologia: A Base Fisiopatológica da Farmacoterapia. 2 edição. Rio de
Janeiro: Guanabara Koogan, 2009;
5. FUCHS, F. D.; WANNMACHER, L.; FERREIRA, M. B. C. Farmacologia Clínica. 3 edição. Rio de Janeiro: Guanabara
Koogan, 2004.
6. GILMAN, A. G. As Bases farmacológicas da Terapêutica. 10 edição. Rio de Janeiro: Mc-Graw Hill, 2005.
7. CONSTANZO, L. S. Fisiologia. 2 edição. Rio de Janeiro: Elsevier, 2004.

ЖЖЖЖЖЖ

4 Marcelo A. Cabral
ANOTAÇÕES EM FARMACOLOGIA E FARMÁCIA CLÍNICA

6) FÁRMACOS ANTIDIABÉTICOS
- o aumento da concentração intracelular de cálcio promove a
O diabetes é um distúrbio do metabolismo dos exocitose da insulina que estava armazenada em vesículas. A
carboidratos, proteínas e lipídeos, decorrente de desequilíbrio insulina também pode ser liberada por certos aminoácidos,
entre a disponibilidade de insulina e a necessidade desta. Pode estímulo vagal e outros açúcares;
constituir deficiência absoluta de insulina, distúrbio da - a insulina liberada ganha a circulação e liga-se a receptores
liberação da insulina pelas células beta pancreáticas, receptores especializados presentes nas membranas da maioria dos tecidos.
para insulina inadequados ou defeituosos, ou produção de Os tecidos-alvos primários são o fígado, o músculo e o tecido
insulina inativa ou de insulina destruída, antes que possa adiposo;
exercer sua ação. Uma pessoa com diabetes não-controlado é
incapaz de transportar glicose para as células adiposas e
musculares; em conseqüência disso, as células entram em
inanição e aumenta a decomposição dos lipídeos e proteínas.
O diabetes é classificado em tipo 1 e tipo 2. O diabetes
mellitus do tipo 1 caracteriza-se pela destruição imunológica
das células beta pancreáticas em indivíduos geneticamente
suscetíveis com deficiência absoluta de insulina. O diabetes
mellitus tipo 2 caracteriza-se pelo distúrbio de secreção de
insulina, pela resistência à insulina nos tecidos alvos ou pela
dessensibilização dos receptores de insulina, ou seja, ocorre
hiperglicemia em jejum apesar da disponibilidade de insulina.
O diagnóstico do diabetes mellitus baseia-se nos sinais
clínicos da doença (polidipsia, polifagia, poliúria e visão turva)
níveis sanguíneos de glicose em jejum (> 126 mg/dL), medidas
ao acaso da glicose plasmática (> 200 mg/dL) e resultados do
teste de tolerância à glicose (resultado maior de 200 mg/dL
quando ingeridos 75g de glicose). Um nível de glicose em
jejum entre 110 mg/dL e 126 mg/dL, ou teste de tolerância
com valores entre 140 a 200 mg, são significativos, sendo
definidos como distúrbio da glicemia em jejum. Atualmente, o - após ligar-se aos receptores, a insulina desencadeia uma rede
valor normal para a glicemia em jejum é de menor que 100 de fosforilação no interior das células e resulta em múltiplos
mg/dL. efeitos, incluindo a translocação dos transportadores da glicose
As três principais complicações agudas do diabetes são a (particularmente o GLUT-4) para a membrana celular, com
cetoacidose diabética (CAD), síndrome hiperglicêmica conseqüente aumento da captação de glicose; atividade da
hiperosmolar não-cetótica (HHNC) e hipoglicemia. As glicogênio sintetase e aumento na formação de glicogênio;
complicações crônicas do diabetes consistem em neuropatias, múltiplos efeitos sobre a síntese de proteína, a lipólise e a
distúrbios da microcirculação (neuropatias, nefropatias e lipogênese; a ativação de fatores de transcrição que aumentam a
retinopatias), complicações macrovasculares e úlceras do pé. síntese de DNA e o crescimento e a divisão das células;
Há duas categorias de drogas antidiabéticas: a insulina e
as medicações orais.

1) Insulina: a insulina é um hormônio essencialmente


anabolizante (de síntese), propicia a utilização periférica da
glicose nos tecidos muscular e adiposo, inibe a glicogenólise e
a neoglicogênese hepáticas e aumenta as sínteses protéica e
lipídica. A insulina humana é de escolha para o controle
crônico do diabetes mellitus tipo 1 e dos pacientes com
diabetes tipo 2 não controlados por dieta, exercícios ou
antidiabéticos orais.
A insulina é um hormônio produzido pelas células beta das
Ilhotas de Langhans. O principal mecanismo de liberação da
insulina se dá da seguinte forma:
- a glicose circulante se liga ao receptor GLUT-2 na membrana
das células beta, sendo transportada para o interior dessas
células;
- o metabolismo da glicose ocorre no interior da célula beta e o
ATP, um dos produtos desse metabolismo, promove o
fechamento dos canais de potássio e abertura dos canais de
cálcio;

1 Marcelo A. Cabral
ANOTAÇÕES EM FARMACOLOGIA E FARMÁCIA CLÍNICA

Portanto, a insulina promove o armazenamento de


gordura e de glicose no interior das células-alvos
especializadas e influencia o crescimento celular e as funções células beta, o que reduziria a progressão da disfunção do
metabólicas de uma ampla variedade de tecidos (músculos, pâncreas.
fígado e tecido adiposo).
2.5 - Incretinas (sintéticas): o fosfato de sitagliptina é uma
2) Antidiabéticos orais: os medicamentos para o diabetes forma sintética da própria incretina GLP-1. Atua imitando sua
agem de duas maneiras: estimulando diretamente o pâncreas ação no organismo e não é substrato da DPP-4. A origem desse
a fabricar insulina ou melhorando a ação da insulina, ao princípio ativo é inusitada: o composto foi sintetizado de uma
diminuir a resistência do corpo à sua ação. substância derivada da saliva do Monstro de Gila.

2.1 - Secretagogos: agem primeiramente pelo estímulo da Observação: o glucagom é utilizado no tratamento de
secreção de insulina pelas células beta do pâncreas. Ligam-se emergência das reações hipoglicêmicas graves que ocorrem em
a receptores nessas células, inibindo o canal de potássio ATP pacientes com diabetes tipo-1, pois ele estimula o fígado a liberar
dependente (K-ATP). A estabilização do efluxo de potássio glicose na corrente sanguínea.
(fechamento da saída de K+) causa despolarização e ativação A disfunção progressiva das células beta é responsável
do canal de cálcio tipo L. O influxo de cálcio, por sua vez, pela deterioração do controle da glicemia em pacientes com
estimula a fase 1 (rápida) de liberação de insulina. diabetes tipo-2. O declínio é de aproximadamente 4% ao ano,
Entre os secretagogos, temos o grupo das independentemente do tratamento.
sulfoniluréias como exemplo a clorpropamida,
glibenclamida, glipirida, glimepirida entre outros,
medicamentos com os quais se tem uma longa experiência de
utilização.
Mais recentemente, com a importância que tem sido
dada ao controle da glicemia pós prandial, secretagogos de
ação curta, como as meglitinidas (repaglinida e
nateglinida), têm se destacado para o melhor controle da
glicemia após as refeições, minimizando o problema de
hiperinsulinização
proporcionado pelas drogas de ação mais prolongadas.

2.2 - Diminuidores da resistência à insulina –


tiazolidionas (glitazonas): a metformina é um anti-
hiperglicêmico oral (diminui a produção de glicose hepática,
não é hipoglicemiante) do grupo das biguanidas que melhora
o controle glicêmico em pacientes com diabetes melito não-
insulino dependente ou diabetes do tipo 2. Diminui a
produção de glicose hepática (gliconeogênese) e sua
absorção intestinal de glicose, aumenta a sensibilidade
periférica à insulina e a utilização celular de glicose.

2.3 - Inibidores da alfa-glicosidase (arcabose e miglitol): o


inibidor de alfaglicosidade disponível no Brasil é a arcabose,
o primeiro agente direcionado especificamente à
hiperglicemia pós-prandial. Esse agente inibe a ação das
glucosidases intestinais, limitando a quebra de
oligossacarídeos em monossacarídeos, retardando a absorção
da glicose e proporcionando uma menor excursão glicêmica
pós-prandial.

2.4 -Inibidores da dipeptidil peptidase-4 (DPP-4): a


vildagliptina inibe uma enzima de nome DPP-4, resultando
no aumento dos níveis de incretina. Com a inibição da DPP-
4, a vida média do GLP-1 (que é um dos tipos de incretinas
produzidas pelo intestino) aumenta e a secreção de insulina
no pâncreas fica estimulada. As incretinas são hormônios
produzidos pelas células do aparelho digestório e ativam o
funcionamento das células pancreáticas responsáveis pela
produção da insulina e reduzem a produção exagerada de
glucagom pelas células alfa das ilhotas pancreáticas.
Acredita-se que as incretinas desempenham papel na
prevenção de mudanças estruturais que levam à morte das

2 Marcelo A. Cabral
ANOTAÇÕES EM FARMACOLOGIA E FARMÁCIA CLÍNICA

Referências Bibliográficas

1. RANG, H. P. et al. Farmacologia. 4 edição. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2001;


2. KATZUNG, B. G. Farmacologia: Básica & Clinica. 9 edição. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2006;
3. CRAIG, C. R.; STITZEL, R. E. Farmacologia Moderna. 6 edição. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2005;
4. GOLAN, D. E. et al. Princípios de Farmacologia: A Base Fisiopatológica da Farmacoterapia. 2 edição. Rio de
Janeiro: Guanabara Koogan, 2009;
5. FUCHS, F. D.; WANNMACHER, L.; FERREIRA, M. B. C. Farmacologia Clínica. 3 edição. Rio de Janeiro: Guanabara
Koogan, 2004.
6. GILMAN, A. G. As Bases farmacológicas da Terapêutica. 10 edição. Rio de Janeiro: Mc-Graw Hill, 2005.
7. CONSTANZO, L. S. Fisiologia. 2 edição. Rio de Janeiro: Elsevier, 2004.
8. PORTH, C. M. Fisiopatologia. 6 edição. Rio de Janeiro: Ganabara Koogan, 2004

ЖЖЖЖЖЖ

3 Marcelo A. Cabral
ANOTAÇÕES EM FARMACOLOGIA E FARMÁCIA CLÍNICA

07) FÁRMACOS PARA TRATAMENTO DAS DISLIPIDEMIAS

Dislipidemia é a alteração nos níveis plasmáticos dos


lipídeos, tais como o colesterol, triglicerídeos e fosfolipídeos. Tratamento farmacológico das dislipidemias
As lipoproteínas (que são complexos macromoleculares de
lipídeos e proteínas) transportam os lipídeos e o colesterol 1) Inibidores da HMG-Coa redutase – Estatinas
através da corrente sanguínea. Esse tipo de sistema de transporte (sinvastatina, pravastatina, lovastatina, atorvastatina):
é essencial à vida, porém concentrações excessivas no plasma Esses fármacos inibem a enzima HMG-Coa redutase, enzima
de uma importante classe de lipoproteínas, conhecida como chave na síntese do colesterol, levando à redução na síntese do
lipoproteínas de baixa densidade – LDL, aumenta o risco de colesterol hepático e ao aumento da expressão dos receptores
cardiopatia isquêmica e aterosclerose. da LDL na superfície do fígado. Consequentemente, haverá
As lipoproteínas se dividem segundo as suas dimensões menor síntese das VLDL e LDL pelo fígado, além de
e densidades em: lipoproteína de alta densidade (HDL); aumentar a remoção dessas lipoproteínas. As vastatinas
lipoproteína de baixa densidade (LDL); lipoproteína de elevam também o HDL-C em 5 – 15% e reduzem os TG em 7
densidade muito baixa (VLDL); e quilomicrons. As – 30%, podendo assim também ser utilizadas nas
lipoproteínas de maior interesse são a LDL, que transporta o hipertrigliceridemias leves a moderadas.
colesterol do fígado para os vasos sanguíneos e para o tecido Podem ocorrer níveis elevados das enzimas hepáticas
adiposo e muscular; e a HDL que é responsável pelo transporte em pacientes submetidos a terapia prolongada com
de colesterol dos tecidos periféricos de volta ao fígado. lovastatina, sendo necessário monitorizar os resultados das
As dislipidemias podem ser classificadas em primárias provas de função hepática.
– que são geneticamente determinadas; e secundárias – que Principais efeitos adversos das estatinas: cefaléia,
representam a conseqüência de outras condições, como o flatulência, dispepsia, dores musculares, prurido, e
diabetes melito, alcoolismo, síndrome nefrótica, insuficiência hepatotoxicidade. Estão conhtra-indicadas aos pacientes
renal crônica, hipotireoidismo, hepatopatia e administração de portadores de doenças hepáticas.
drogas, como por exemplo antagonistas dos receptores beta-
adrenérgicos e diuréticos tiazídicos.
As dislipidemias primárias podem ser causadas por um
aumento da produção da lipoproteína pelo fígado ou diminuição
do catabolismo da VLDL, isto é, redução do processo de
lipólise da lipoproteína, catalisado pela lípase. Pode ainda ser
causada pela diminuição da síntese da lípase ou diminuição da
sua atividade. O acúmulo de LDL no plasma resulta em
hipercolesterolemia, devido a defeito no gene do receptor de
LDL, diminuindo o catabolismo da lipoproteína pelo fígado.
As dislipidemias são um fator de risco para a
aterosclerose, que é um processo dinâmico, evolutivo, a partir
de dano endotelial de origem multifatorial, com características
de reparação tecidual. A doença aterosclerótica é a principal
causa de morte no Brasil. Na aterosclerose, os fatores de risco
são capazes de lesar o endotélio vascular, causando disfunção
endotelial. A partir do dano vascular, ocorre a expressão de
moléculas de adesão que mediarão a entrada de monócitos em
direção ao espaço intimal, que por sua vez englobarão
lipoproteínas modificadas, originando células espumosas.
Diferentes mediadores inflamatórios são liberados no espaço
intimal, perpetuando e ampliando o processo, levando
finalmente à formação da placa aterosclerótica. As placas
podem ser estáveis ou instáveis. O LDL-C é fator causal e
independente de aterosclerose sobre o qual devemos agir para
diminuir a morbidade e a mortalidade.

Classificação laboratorial das dislipidemias:


a) hipercolesterolemia isolada – colesterol total (CT) maior
que 240 mg/dL; e/ou LDL-C maior que 160 mg/dL; 2) Resinas de ligação de ácidos biliares (colestiramina e
b) hipertriglicidemia isolada - triglicerídeo maior que 200 colestipol): a colestiramina e o colestipol são resinas de troca
mg/dL; aniônica, e são utilizadas para o tratamento da
c) hiperlipidemia mista – colesterol total e triglicerídeo hipercolesterolemia. Quando administradas por via oral,
maiores que 240 e 200 mg/dL respectivamente; seqüestram ácidos biliares do intestino e impedem sua
d) diminuição do HDL-C para menos que 40 mg/dL. absorção e recirculação enterohepática. O resultado consiste
em redução da absorção do colesterol exógeno e no aumento
1 Marcelo A. Cabral
ANOTAÇÕES EM FARMACOLOGIA E FARMÁCIA CLÍNICA

do metabolismo do colesterol endógeno em ácidos biliares no


fígado. Este processo resulta em maior expressão dos
receptores de LDL nos hepatócitos e, portanto, em aumento na
remoção das LDL do sangue e redução das concentrações 5) Omega-3
plasmáticas de LDL-C. Essas drogas são utilizadas em Reduz a concentração plasmática de triglicerídeos, porém
associação com uma estatina. aumenta o colesterol, além de aumentar o tempo de
As resinas interferem na absorção das vitaminas sangramento.
lipossolúveis (A, D e K) e de certas drogas, como clorotiazida,
digoxina e varfarina que por conseguinte devem ser ingeridas 6) Orlistat
pelo menos uma hora antes ou 4-6 horas depois da resina. O orlistat atua exclusivamente na luz intestinal ligando-se
As resinas não devem ser usadas quando já houver covalentemente aos sítios catalíticos das lípases gástrica e
hipertrigliceridemia pois elas agravam essa situação. As pancreática. Com a inibição da lípase, a lipólise do triglecerídeo
resinas são as únicas drogas permitidas para crianças e dietético é substancialmente reduzida e, como conseqüência,
adolescentes que apresentam hipercolesterolemia resistente às cerca de 30% dos triglicerídeos ingeridos são excretados
medidas de restrição alimentar. inalterados nas fezes.

3) Fibratos (clofibrato, bezafibrato, fenofibrato, 7) inibidores da absorção de colesterol - Ezetimibe


genfibrosila, etofibrato e ciprofibrato) são fármacos derivados
do ácido fíbrico. Não se conhece ainda seu mecanismo exato de O ezetimibe diminui o tranmsporte de colesterol das
ação. micelas para os enterócitos através da inibição seletiva da
captação de colesterol por uma proteína da borda em escova,
Eles estimulam a síntese de PPAR-alfa via ativação de denominada NPC1L1.
um receptor nuclear de transcrição gênica (receptor PPAR - Em concentrações terapêuticas, o ezetimibe diminui em
peroxisome proliferator activated receptor), a atividade de beta- cerca de 50% a absorção intestinal de colesterol, sem reduzir a
oxidação de lípideos dos peroxisomas celulares. Estimulam a absorção de triglicerídios ou de vitaminas lipossolúveis. O
enzima lipase das lipoproteínas, destruindo os VLDL e resultado final consiste na redução das concentrações
libertando os lípidos para consumo nos músculos. plasmáticas de colesterol LDL. A redução da absorção de
colesterol diminui o conteúdo de colesterol dos quilomicrons e,
Os derivados de ácido fíbrico produzem um risco portanto, reduz o moviemnto do colesterol do intestino para o
aumentado de sangramento quando administrados com um fígado. No interior do fígado, o colesterol derivado dos
anticoagulante oral. remanescentes de quilomicrons contribui para o colesterol
Principais efeitos adversos dos fibratos: efeitos acondicionado nas partículas de VLDL. Por conseguinte, a
gastrintestinais, diminuição da libido, fraqueza muscular, inibição da absorção de colesterol diminui a sua incorporação
distúrbios do sono, alteração nos níveis das enzimas hepáticas e em VLDL e também diminui as concentrações plasmáticas de
creatinina. colesterol LDL. Além disso, o conteúdo hepático diminuído de
colesterol leva à supra-regulação do receptor de LDL, que
4) Ácido nicotínico - Niacina, acipimox também contribui para o mecanismo de redução das LDL por
Inibe a atividade das lipases hormônio-sensíveis, inibidores da absorção de colesterol.
diminuindo a liberação de ácidos graxos livres para o fígado e a O ezetimibe, em dose diária única, reduz as
síntese de VLDL; estimula a síntese e secreção de HDL e de concetrações de colesterol LDL em cerca de 15 a 20%, além de
apo A1, o que contribui para o aumento dos valores de HDL- diminuir as concentrações de triglicerídios em cerca de 8% e
colesterol. A administração é VO e a eliminação é urinária. A eleva em pequeno grau (cerca de 3%) o colesterol HDL. A
tolerância é baixa devido seus para-efeitos: rubor facial, prurido, associação do ezetimibe com uma estatina aumenta em 15% a
arritmia atrial, dores abdominais, aumento das enzimas eficácia da terapêutica farmacológica, em relação à
hepáticas, da glicemia e da uricemia e raramente acantose administração somente de estatinas.
nigricans.
É indicado na hipertrigliceridemia endógena, nas
hiperlipidemias mistas e também na hipercolesterolemia isolada,
como alternativa as vastatinas e fibratos.

Referências Bibliográficas

1. RANG, H. P. et al. Farmacologia. 4 edição. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2001;


2. KATZUNG, B. G. Farmacologia: Básica & Clinica. 9 edição. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2006;
3. CRAIG, C. R.; STITZEL, R. E. Farmacologia Moderna. 6 edição. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2005;
4. GOLAN, D. E. et al. Princípios de Farmacologia: A Base Fisiopatológica da Farmacoterapia. 2 edição. Rio de
Janeiro: Guanabara Koogan, 2009;
5. FUCHS, F. D.; WANNMACHER, L.; FERREIRA, M. B. C. Farmacologia Clínica. 3 edição. Rio de Janeiro: Guanabara
Koogan, 2004.
6. GILMAN, A. G. As Bases farmacológicas da Terapêutica. 10 edição. Rio de Janeiro: Mc-Graw Hill, 2005.
7. CONSTANZO, L. S. Fisiologia. 2 edição. Rio de Janeiro: Elsevier, 2004.

2 Marcelo A. Cabral
ANOTAÇÕES EM FARMACOLOGIA E FARMÁCIA CLÍNICA

8. PORTH, C. M. Fisiopatologia. 6 edição. Rio de Janeiro: Ganabara Koogan, 2004

ЖЖЖЖЖЖ

3 Marcelo A. Cabral
ANOTAÇÕES EM FARMACOLOGIA E FARMÁCIA CLÍNICA

08) TRATAMENTO FARMACOLOGICO DA ASMA

A asma é uma doença caracterizada pela inflamação


crônica das vias aéreas, envolvendo particularmente
mastócitos, eosinófilos e linfócitos T. Em indivíduos
suscetíveis, esta inflamação causa episódios recorrentes de
broncoespasmos, dispnéia, opressão torácica e tosse
predominantemente noturna ou no início da manhã. Estes
sintomas estão invariavelmente associados à limitação
generalizada do fluxo aéreo, que pode reverter-se
espontaneamente ou sob tratamento. A inflamação está
relacionada também com a hiper-reponsividade brônquica a
vários estímulos alérgicos e não alérgicos. Seu curso clínico é Broncodilatadores:
caracterizado por exacerbações e remissões.
a) Agonistas beta2-adrenérgico (salbutamol – Aerolin,
terbutalina – Brycanil, salmeterol, fenoterol – Berotec):

Os agonistas dos receptores beta-adrenérgicos são os


melhores fármacos para aliviar os ataques repentinos de asma
(fármacos de resgate) e prevenir os ataques que o exercício
possa causar. Ao estimularem os receptores beta-adrenérgicos,
causam a broncodilatação e inibição da função de várias
células inflamatórias. Esses fármacos estimulam receptores do
tipo beta2-adrenérgicos da membrana celular, resultando em
aumento do AMPC intracelular, que causa relaxamento da
musculatura lisa, aumento da freqüência do batimento ciliar e
redução da viscosidade do muco. Por causa da presença dos
receptores beta2-adrenérgicos em muitos tecidos, efeitos
indesejáveis ocorrem pela absorção sistêmica destes agonistas.
A prevenção de tais efeitos pela redução da concentração
plasmática da droga é uma das vantagens da administração
dos beta-agonistas por via inalatória.
Os broncodilatadores que atuam seletivamente sobre os
receptores beta2-adrenérgicos, que se encontram, sobretudo
nas células pulmonares, têm poucos efeitos nos restantes dos
órgãos. Esses broncodilatadores, como o albuterol, provocam
menos efeitos secundários que os broncodilatadores que atuam
sobre todos os receptores beta-adrenérgicos (como no caso da
adrenalina, que atualmente não é mais usada para esse fim).
Nesse último caso, o efeito adverso mais comum são:
- tremor: devido à ativação dos receptores beta2 no
músculo esquelético;
- taquicardia e arritmia: devido à vasodilatação com
taquicardia reflexa, e estímulo beta2 no coração; e
- vasodilatação periférica.

Os agonistas podem ser classificados ainda em agentes de


ação curta ou longa. Essa subdivisão é útil sob o ponto de
vista farmacológico, porque os agonistas de ação curta
(albuterol, metaproterenol, terbutalina e pirbuterol) são usados
apenas para o alívio sintomático da asma, enquanto os de ação
longa (salmeterol) são utilizados profilaticamente no controle
Tratamento farmacológico: O tratamento
da doença.
farmacológico da asma consiste basicamente na administração
É importante ressaltar que a estimulação dos receptores
por aerossóis de:
beta2-adrenérgicos inibe a função de várias células
1) Broncodilatadores: agonistas beta2-adrenérgicos,
inflamatórias, incluindo os mastócitos, basófilos, eosinófilos,
xantinas e antagonistas dos receptores muscarínicos; e
neutrófilos e linfócitos. Em geral, a estimulação dos
2) Antiinflamatórios: glicocorticóides.
receptores beta2-adrenérgicos dessas células provoca elevação
do AMPc celular, desencadeando uma série de reações de

1 Marcelo A. Cabral
sinalização que levam à inibição da liberação dos mediadores ligeiramente melhor e mais prolongada do que a conseguida
inflamatórios e das citocinas. com apenas um desses agentes na asma basal.

b) Xantinas (teofilina, aminofilina) – inibidores das


Antiinflamatórios:
fosfodiesterases.
A teofilina é outro fármaco que produz broncodilatação, a) Glicocorticóides:
porém menos eficaz do que os agonistas beta-adrenérgicos. A Os pacientes asmáticos que necessitam de 4 ou mais doses
teofilina inibe as enzimas fosfodiesterases (PDE) III e IV, que semanais de agonistas beta2-adrenérgicos inalados são
são as responsáveis por catalizarem a decomposição do AMPc
considerados como candidatos aos glicocorticóides inalados,
e do GMPc. Isso aumenta os níveis de AMPc e GMPc nas tais como abeclometasona, triancinolona, flunisolida e
células da musculatura lisa brônquica e nas células
fluticasona.
inflamatórias, o que facilita a transdução dos sinais efetivada
por estas vias. Os corticosteróides evitam a resposta inflamatória do
organismo e são excepcionalmente eficazes para reduzir os
Além disso, a teofilina também é um antagonista sintomas da asma. Esses agentes não relaxam a musculatura lisa
competitivo dos receptores da adenosina, que pode atuar como das vias respiratórias e, por essa razão, têm pouco efeito na
autacóide. Geralmente, administra-se por via oral e encontra-
bronco constrição aguda. Por outro lado, esses fármacos são
se em várias apresentações, desde comprimidos de ação especialmente eficazes para inibir a inflamação das vias
imediata e xaropes, até cápsulas e comprimidos de libertação respiratórias. Quando são tomados durante períodos
controlada e ação prolongada. Nos EUA, esse fármaco foi
prolongados, os corticosteróides reduzem, gradualmente, as
praticamente relegado como uma terceira opção para os probabilidades dos ataques de asma, tornando as vias aéreas
pacientes com asma difícil de controlar com outros menos sensíveis a certos estímulos.
mediadores. Quando se verifica um ataque grave de asma,
pode administrar-se a teofilina por via endovenosa. O glicocorticóide se liga ao receptor intracelular e este
sofre uma mudança conformacional expondo o domínio de
O valor da teofilina no sangue pode ser medido em ligação com o DNA. Forma dímeros, migra para o núcleo e se
laboratório e deve ser rigorosamente controlado por um liga ao DNA. Ocorre então a repressão de genes específicos
médico (manter entre 10 a 20 microgramas/mililitro), dado
responsáveis pela síntese de algumas proteínas envolvidas na
que uma quantidade muito reduzida do fármaco no sangue inflamação tais como a COX-2 e citocinas, além de indução da
proporciona escassos resultados, enquanto uma quantidade sínteses de lipocortina-1 que é importante na retroalimentação e
excessiva pode provocar uma freqüência cardíaca anormal ou
como antiinflamatório, pois inibe a fosfolipase A2, que é a
convulsões potencialmente mortais. Uma pessoa com asma responsável pela degradação dos fosfolipídeos da membrana
que toma teofilina pela primeira vez pode sentir náuseas
celular com formação de ácido arquidônico. Esse mecanismo de
ligeiras ou nervosismo. Ambos os efeitos secundários ação promove uma redução na formação das citocinas,
desaparecem, geralmente, quando o organismo se adapta ao particularmente aquelas produzidas pelos linfócitos Th2,
fármaco. Quando se tomam doses maiores, produz-se muitas
diminuição da ação dos eosinófilos e outras células
vezes um aumento da freqüência cardíaca ou palpitações. A inflamatórias, e formação reduzida de prostaglandinas.
pessoa pode também experimentar insônia, agitação, vômitos
e convulsões.

c) Antagonistas de receptores muscarínicos (atropina,


ipratrópio)
Os fármacos anticolinérgicos, como a atropina e o
brometo de ipratrópio, impedem que a acetilcolina provoque
a contração do músculo liso e a produção de mucosidade
excessiva nos brônquios. Estes fármacos ajudam a alargar
ainda mais as vias aéreas nos doentes que já receberam
agonistas dos receptores beta2-adrenérgicos. Contudo, são
pouco eficazes para o tratamento da asma.

O subgrupo de pacientes asmáticos que apresentam


exacerbações psicogênicas pode ter resposta particularmente
favorável ao ipatrópio. A broncodilatação produzida pelo
ipatrópio nos pacientes asmáticos desenvolve-se mais
lentamente e, em geral, é menos intensa do que a induzida
pelos agonistas adrenérgcos. A variabilidade da resposta dos
indivíduos asmáticos ao ipatrópio reflete provavelmente as
diferenças de potência do tônus parassimpático e no grau
com que a ativação reflexa das vias colinérgicas participa da
geração dos sintomas de cada paciente. Desta forma, a
utilidade do ipatrópio deve ser avaliada caso a caso por uma
experiência terapêutica.

O tratamento simultâneo com ipatrópio e agonistas


beta2-adrenérgicos possibilita uma broncodilatação
Esses fármacos são mais utilizados profilaticamente fazem com que as vias aéreas sejam menos propensas a
para controlar a asma, em vez de para reverter os sintomas contrair-se. São úteis para prevenir os ataques, mas não para os
agudos da doença. Ao estabelecer a dose ideal do fármaco, tratar. Estes fármacos são especialmente úteis nas crianças e nos
deve-se ter em mente que o grau máximo de melhora da função doentes que sofrem de asma induzida pelo exercício. São muito
pulmonar pode ocorrer apenas depois de várias semanas de seguros, mas relativamente caros e devem ser tomados
tratamento. regularmente, inclusive quando a pessoa está livre dos sintomas.
No entanto, o uso prolongado de corticosteróides, por via
oral ou em injeção, pode provocar escassa capacidade de cura Antagonistas dos receptores de leucotrienos: Zafirlukast,
das feridas, desenvolvimento insuficiente do crescimento das Prankulast e Montelukast
crianças, perda de cálcio dos ossos, hemorragia no estômago,
cataratas prematuras, elevadas concentrações de açúcar no Esses agentes funcionam, bloqueando a interação dos
sangue, fome, aumento de peso e perturbações mentais. Os leucotrienos (LTs) com o receptor cis-LT1, bloqueando, assim,
a resposta do órgão-alvo aos LTs.
principais efeitos colaterais incluem: rouquidão, candidíase de
boca ou garganta, além dos já citados para os corticosteróides A evidência para o papel dos cisteinil-LTs (LTC4,
sistêmicos. LTD4, e LTE4) na asma é a presença deles no pulmão humano,
após broncoprovocação e a capacidade de induzir características
Os corticosteróides por via oral ou injetados (sistêmicos) da asma, como broncoespasmo, secreção de muco, transporte de
podem ser administrados durante uma ou duas semanas para muco diminuído, migração de eosinófilos para o pulmão e
aliviar um ataque grave de asma. proliferação de músculo liso. Além disso, o desenvolvimento
Geralmente, prescrevem-se corticosteróides por inalação para dos antagonistas de receptores somou dados sobre o papel
uso prolongado, dado que esta forma fornece 50 vezes mais importante desses mediadores na asma.
fármaco aos pulmões do que ao resto do organismo.
Inibidores de síntese de leucotrienos – Zileuton
Os corticosteróides por via oral prescrevem-se para um
tratamento de longa duração somente quando nenhum outro Uma abordagem também promissora para o tratamento
tratamento consegue controlar os sintomas. de asma é diminuir a formação dos leucotrienos. Os cisteinil-Ts
são derivados do metabolismo do ácido aracdônico pela 5-
b) Cromogligato dissódico - Cromolim: lipoxigenase (5-LO). Várias drogas que inibem a ação da 5-LO
O cromoglicato dissódico, parece ser capaz de reduzir a estão em desenvolvimento e testes, por exemplo ZD-2138 e
liberação de mediadores por sua ação sobre a membrana dos ABT-761. O zileuton está disponível para o uso clínico e é o
mastócitos e basófilos. Trata-se de fármaco de uso profilático inibidor da 5-LO mais estudado, incluído em vários trabalhos
que não deve ser usado durante as crises. clínicos. O tratamento com zileuton proporcionou melhora da
O cromoglicato e o nedocromil inibem a liberação, por função pulmonar, redução dos sintomas, redução do uso de b-
parte dos mastócitos, de substâncias químicas inflamatórias e agonistas e das exacerbações de asma.

Referências Bibliográficas

1. RANG, H. P. et al. Farmacologia. 4 edição. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2001;


2. KATZUNG, B. G. Farmacologia: Básica & Clinica. 9 edição. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2006;
3. CRAIG, C. R.; STITZEL, R. E. Farmacologia Moderna. 6 edição. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2005;
4. GOLAN, D. E. et al. Princípios de Farmacologia: A Base Fisiopatológica da Farmacoterapia. 2 edição. Rio de
Janeiro: Guanabara Koogan, 2009;
5. FUCHS, F. D.; WANNMACHER, L.; FERREIRA, M. B. C. Farmacologia Clínica. 3 edição. Rio de Janeiro: Guanabara
Koogan, 2004.
6. GILMAN, A. G. As Bases farmacológicas da Terapêutica. 10 edição. Rio de Janeiro: Mc-Graw Hill, 2005.
7. CONSTANZO, L. S. Fisiologia. 2 edição. Rio de Janeiro: Elsevier, 2004.
8. PORTH, C. M. Fisiopatologia. 6 edição. Rio de Janeiro: Ganabara Koogan, 2004.

ЖЖЖЖЖЖ
ANOTAÇÕES EM FARMACOLOGIA E FARMÁCIA CLÍNICA

9) QUIMIOTERAPIA DO CÂNCER
O câncer é uma doença caracterizada pela multiplicação e
propagação descontroladas no corpo de formas anormais das
próprias células corporais.
Existem três abordagens principais para o tratamento do
câncer: excisão cirúrgica, irradiação e quimioterapia.
Atualmente têm sido pesquisadas outras abordagens
para o tratamento do câncer, tais como: imunoterapia, uso de
inibidores da angiogênese, terapia com genes e modificadores
da resposta biológica.
Ao ser comparada à quimioterapia das doenças
bacterianas, a quimioterapia do câncer apresenta um complicado
problema. Em termos bioquímicos, os microrganismos diferem
das células humanas tanto do ponto de vista quantitativo quanto
qualitativo, ao passo que as células cancerosas e as células
normais, por serem tão semelhantes em inúmeros aspectos,
dificultam a pesquisa de diferenças bioquímicas gerais
exploráveis entre elas.
Para compreendermos como atuam os agentes
antineoplásicos atuais, é importante considerarmos mais
detidamente as características especiais da célula cancerosa.
As células cancerosas apresentam em graus variáveis
quatro características que as distinguem das células normais:
- proliferação descontrolada;
- desdiferenciação e perda da função;
- poder de invasão; e Outra característica das células cancerosas é a perda da
- metástases. capacidade de diferenciação, ocasionando a perda da sua
Inicialmente as células normais são estimuladas a função. Além disso, elas apresentam poder de invadir outros
sofrer divisão pelos fatores de crescimento. Com isso, a tecidos sem sofrer a ação dos fatores apoptóticos. As células
progressão através do ciclo celular é determinada por um normais, ao invadirem outros tecidos senão aquele que lhe é
sistema de controle do ciclo celular constituído por duas próprio, sofrem apoptose. As células cancerosas não apenas
famílias de proteínas – as ciclinas e suas respectivas quinases perdem os fatores de restrição (apoptose) que atuam sobre as
ciclina-dependentes (cdks) – codificadas pelos proto-oncogenes células normais, como também secretam as enzimas
nucleares. A ação das ciclinas e das cdks é modulada por várias (metaloproteinas) que decompõem a matriz extracelular,
forças negativas, como por exemplo o gene p53 e o gene do permitindo sua introdução nesse espaço e a criação de novos
retinoblastoma (Rb). Há dois pontos de controle, um entre G1 e vasos sanguíneos (angiogênese) necessários à nutrição do
S (ponto 1) e o outro entre G2 e M ( ponto 2). Se houver lesão tumor.
do DNA, esses inibidores interrompem o ciclo no ponto de As metástases são tumores secundários formados por
controle 1, permitindo o reparo. Se o reparo falhar, inicia-se o células que foram liberadas pelo tumor inicial ou primário e
processo de apoptose. A apoptose refere-se ao mecanismo atingiram outros locais através dos vasos sanguíneos e linfáticos
intrínseco de autodestruição da célula, que consiste numa ou em decorrência de sua descamação em cavidades corporais.
seqüência geneticamente programada de eventos bioquímicos Uma célula normal transforma-se em célula cancerosa
que levam à morte celular. Ela atua como defesa de primeira em conseqüência de uma mutação no seu DNA, que pode ser
linha contra mutações – removendo as células com DNA herdada ou adquirida com o tempo. Existem duas categorias
anormal que poderiam se tornar malignas. principais de alterações genéticas que levam ao
desenvolvimento de câncer:
Nas células cancerosas, ocorre perda do controle do - inativação dos genes supressores tumorais (que identificam
ciclo celular em conseqüência de: alterações na formação do DNA, quando interrompem o ciclo
celular para que haja o devido reparo, ou caso contrário,
- anormalidade na função dos fatores de crescimento; defragam a apoptose – exemplo proteína p53); e
- função anormal da ciclina e cdks; - ativação de proto-oncogenes (que controlam o crescimento e a
- síntese anormal de DNA em decorrência da atividade de diferenciação normal) em oncogenes. Os oncogenes são os que
oncogenes; e conferem malignidade a uma célula.
-diminuição anormal das forças reguladoras negativas, devida a
ocorrência de mutações dos genes supressores tumorais As neoplasias que contêm células bem diferenciadas,
(p53/retinoblastoma). agrupadas em uma única massa são consideradas benignas. Já as
neoplasias malignas são menos diferenciadas e têm a habilidade
de se destacar, entrar nos sistemas circulatório ou linfático, bem
como formar tumores malignos em outros locais

1 Marcelo A. Cabral
ANOTAÇÕES EM FARMACOLOGIA E FARMÁCIA CLÍNICA

Os tumores benignos são designados por terminação


“oma” (por exemplos, adenoma, osteoma etc). Os tumores
malignos são designados por “carcinoma” (por exemplo, inibitório específico sobre o poder invasivo, a perda da
adenocarcinoma). Os malignos de origem mesenquimal são diferenciação ou sobre a tendência a sofrer metástase. Isso se
designados por “sarcoma” (por exemplo, osteossarcoma). torna um grande problema para a quimioterapia pois as células
As neoplasias benignas são caracterizadas por taxa de um tumor sólido podem ser divididas em três
lenta e progressiva de crescimento que pode se manter ou compartimentos:
regredir, modo expansivo de crescimento, presença de cápsula O compartimento A, que consiste em células em
fibrosa bem definida e por não formar metástases. São divisão que, possivelmente, estão continuamente no ciclo
compostas por células bem diferenciadas que se assemelham às celular;
células do tecido de origem. Os tumores benígmos parecem ter O compartimento B, que consiste em células em
perdido a habilidade de suprimir o programa genético para repouso (na fase Go – células quiescentes) – células que, apesar
replicação celular, mas conservam o programa para de não estarem se dividindo, são potencialmente capazes de
diferenciação celular normal. fazê-lo; e
As neoplasias malignas tendem a crescer O compartimento C, constituído por células que não
independentemente de sua localização original. Devido à sua são mais capazes de sofrer divisão, mas que contribuem no
rápida taxa de crescimento, os tumores malignos tendem a volume do tumor. Praticamente apenas as células que se
comprimir vasos sanguíneos e impedir o fluxo sanguíneo, encontram no compartimento A, que podem constituir apenas
causando isquemia e necrose tissular; privar os tecidos normais 5% de alguns tumores sólidos, são suscetíveis aos principais
dos seus nutrientes essenciais; e liberar enzimas e toxinas que fármacos atualmente disponíveis. As células do compartimento
destroem os tecidos tumoral e normal. A natureza destrutiva dos C não representam um problema – é a existência de células no
tumores malignos é relacionada a sua falta de diferenciação compartimento B que torna difícil a quimioterapia do câncer,
celular, características celulares, taxa de crescimento e visto que essas células não são muito sensíveis aos agentes
habilidade de se espalhar e formar metástases. Seu crescimento citotóxicos, mas têm tendência a retornar ao compartimento A
é invasivo por infiltração. depois de um curso de quimioterapia.
O termo anaplasia é usado para descrever a falta de Além disso, como o efeito principal dos agentes
diferenciação celular no tecido canceroso. antineoplásicos citotóxicos é exercido sobre a divisão celular,
Em muitos tipos de câncer, a primeira evidência de eles irão afetar todos os tecidos normais que se dividem
doença disseminada é a presença de células tumorais nos rapidamente, podendo produzir, em maior ou menor grau, os
linfonodos que drenam a área tumoral. Como os canais seguintes efeitos tóxicos gerais:
linfáticos têm acesso ao sistema venoso, as células cancerosas - toxicidade da medula óssea, com redução da produção de
que sobrevivem podem, eventualmente, soltar-se e passar ao leucócitos e, portanto, menor resistência à infecções;
sistema venoso. Um dos primeiros sinais de alerta do câncer - cicatrização deficiente de feridas;
colorretal é o sangramento nas fezes. - queda dos cabelos (alopecia);
- lesão do epitélio gastrintestinal;
O sistema de classificação TNM classifica o câncer em - depressão do crescimento em crianças;
estágios usando três componentes tumorais: - esterilidade;
- teratogenicidade.
T – indica a extensão do tumor primário: - podem causar câncer;
Tx = o tumor não pode ser avaliado corretamente; - deposição de uratos nos túbulos renais causando lesão renal;
T0 = sem evidência do tumor primário; - náuseas e vômitos.
Tis = carcinoma in situ (existente no local);
T1-4 = aumento progressivo em tamanho ou envolvimento do Exemplos de estratégias para contornar os principais efeitos
tumor. indesejáveis dos quimioterápicos:

N – indica o envolvimento dos linfonodos: ANTINEOPLÁSICOS


Nx – linfonodos não podem ser avaliados corretamente;
N0 = sem evidências de metástases;
N1 – 3 = linfonodos regionais. PLAQUETAS LEUCÓCITOS HEMÁCEAS

M – indica metástases:
Mx = não avaliado corretamente; TRANSFUSÃO FATOR DE ERITROPOETINA
M0 = sem metástases distantes; CRESCIMENTO
M1 – presença de metástases distantes.
ANTINEOPLÁSICOS
Princípios gerais de ação dos agentes antineoplásicos
citotóxicos:
MUCOSITE CANDIDÍASE NÁUSEAS DIARRÉIA
Os agentes antineoplásicos são, em sua maioria,
antiproliferativos, danificam o DNA e, portanto, desencadeiam BICARBONATO ANTIFÚNGICOS ANTIEMÉTICOS ATROPINA
o processo da apoptose. Eles agem somente no processo de SÓDIO LOPERAMIDA
divisão celular. Esses fármacos não exercem nenhum efeito SUCRALFATO

2 Marcelo A. Cabral
ANOTAÇÕES EM FARMACOLOGIA E FARMÁCIA CLÍNICA

As principais classes de fármacos utilizados na


quimioterapia oncológica são: - Mostardas nitrogenadas: por exemplo, a ciclofosfamida, a
qual é ativada produzindo aldofosfamida, que é então convertida
- Agentes alquilantes – ciclofosfamida, lomustina e cisplatina em mostarda de fosforamida. A mielosupressão causada pela
– esses fármacos se ligam ao DNA causando a ruptura da ciclofosfamida afeta particularmente os linfócitos. Devem ser
cadeia, ou a sua replicação defeituosa, o que deflagra a usados doadores de sulfidrila, como N-acetilcisteína ou mesna
apoptose, Atuam durante todas as fases do ciclo celular. (sulfonato de sódio-2-mercapto-etano) para reduzir as náuseas e
os vômitos.
- Agentes antimetabólicos – metrotexato, fluorouracil,
citarabina, mercaptopurina, fludarabina e pentostatina – esses - Nitrosuréias: por exemplo, a lomustina pode atuar sobre as
fármacos bloqueiam a síntese de DNA ao bloquear as enzimas células que não estão se dividindo; pode atravessar a barreira
necessárias a esse processo, ou ao fraudarem seus substratos. hematoencefálica; e causar mielotoxidade cumulativa tardia. Já
Agem na fase S do ciclo celular. a cisplastina provoca ligação intra-filamento no DNA resultando
na ruptura das pontes de hidrogênio entre as bases guanina e
- Antibióticos citotóxicos – doxorrubicina, bleomicina, citosina o que impede a duplicação do DNA que é essencial à
dactnomicina e mitomicina – inibem a síntese de DNA ao divisão celular; possui baixa mielotoxidade, mas provoca
intervirem nas enzimas envolvidas no processo (DNA-girase, náuseas e vômitos intensos (o que pode ser contornado com
RNA polimerase) ou através da formação de um agente ondasetrona – antagonista dos receptores 5-HT3) e pode ser
alquilante; nefrotóxica. Revolucionou o tratamento de tumores nas células
germinativas (ovários e testículos).
- Derivados de vegetais - vincristina, etoposida, paclitaxel e
irinotecano – esses fármacos agem sobre a enzima 2) Agentes Antimetabólicos: Esses fármacos bloqueiam ou
topoisomerase, ou se ligam a tubulina ou aos microtúbulos, subvertem a síntese de DNA.
inibindo a mitose ou a formação do DNA. Interferem na
formação do fuso mitótico durante a fase M do ciclo celular. - antagonistas do folato – os folatos são essenciais para a
síntese de nucleotídeos de purina e do timidilato, os quais por
Com freqüência, embora o tumor primário possa sua vez são indispensáveis para a síntese de DNA e a divisão
responder de modo satisfatório à quimioterapia, as células celular. O metotrexato inibe o diidrofolato redutase, impedindo
metastáticas mais diferenciadas respondem de modo precário. A a produção de tetraidrofolato; a principal conseqüência consiste
disseminação metastática frequentemente representa um sinal de na interferência na síntese de timidilato. O metotrexato é
prognóstico sombrio. captado nas células pelo transportador de folato e, a exemplo
De uma forma geral, os tumores são mais sensíveis à deste último, é convertido na forma de poliglumato. As células
quimioterapia quando apresentam crescimento rápido. Além normais afetadas por altas doses podem ser resgatadas com
disso, oc cânceres que expressam uma p53 selvagem são muito ácido folínico. Efeitos adversos: mielosupressão, possível
responsivos à quimioterapia (câncer de testículos, leucemias e nefrotoxidade.
os linfomas). Por outro lado, os câneceres que apresentam uma
mutação em p53 (câncer de pâncreas, de pulmão ou de cólon) - análogos da pirimidina – o fluorouracil é convertido num
exibem uma resposta mínima ou mesmo são resistentes aos nucleotídio fraudulento e inibe a síntese de timidilato e, por
fármacos que produzem lesão ao DNA. conseguinte, na síntese de DNA. A citarabina na sua forma
trifosfato inibe a DNA polimerase; trata-se de um potente
Fármacos usados na quimioterapia do câncer: mielossupressor.

1) Agentes alquilantes: esses fármacos possuem grupo alquil - análogos da purina – a mercaptopurina é convertida num
que pode formar ligações covalentes com substituintes nucleotídio fraudulento. A fludarabina na sua forma trifosfato
celulares; o intermediário reativo é um íon carbônico, que é inibe a DNA polimerase (que é a responsável pela
altamente reativo e reagem instantaneamente com um doador de polimerização das novas fitas de DNA); possui efeito
elétrons, como os grupos amina, -OH e –SH que são mielossupressor. A pentostatina inibe a adenosina desaminase –
encontrados no DNA. A maioria apresenta dois grupos uma via essencial no metabolismo das purinas.
alquilantes e pode formar ligações cruzadas entre dois sítios
nucleofílicos, como o N7 da guanina no DNA. A ligação 3) Antibióticos citotóxicos:
cruzada pode causar replicação defeituosa, devido ao
pareamento de alquilguanina com timina, resultando em A doxorrubicina inibe a síntese de DNA e de RNA; o
substituição de GC por AT, ou excisão da guanina e ruptura da efeito sobre o DNA decorre principalmente da interferência na
cadeia. ação da topoisomerase II (ou DNA girase, que é responsável
Seu principal efeito é observado durante a síntese de pelo espirilamento do DNA). Efeitos adversos: náusea e vômito,
DNA; a lesão resultante do DNA desencadeia o processo da mielossupressão, queda de cabelo; é cardiotóxica em altas
apoptose. Os efeitos adversos incluem mielosupressão, doses. A bleomicina causa fragmentação de cadeias de DNA.
esterilidade e risco de leucemia não linfocítica. Portanto, esses Pode atuar sobre as células que não estão se dividindo. Efeitos
agentes alteram o DNA em formação provocando o processo adversos: febre, alergias, reações mucocutâneas, fibrose
apoptótico da célula. pulmonar. Praticamente não produz mielossupressão. A
Os principais agentes alquilantes são: dactnomicina intercala-se no DNA, interferindo na RNA

3 Marcelo A. Cabral
ANOTAÇÕES EM FARMACOLOGIA E FARMÁCIA CLÍNICA

polimerase e inibindo a transcrição. Interfere também na


topoisomera II.
A mitomicina é ativada, produzindo um metabólito alquilante. - tamoxifeno para tumores de mama;
- análogos do GnRH para tumores de próstata e de mama;
4) Agentes antineoplásicos derivados de vegetais: a - antiandrogênios para câncer de próstata;
vincristina inibe a mitose na metáfase ligando-se à tubulina. - inibidores da síntese de hormônios sexuais para o câncer de
Relativamente atóxica, mas pode causar efeitos mama pós-menopáusico;
neuromusculares indesejáveis.
A ectoposida inibe a síntese de DNA por agir sobre a 6) agentes antineoplásicos diversos:
topoisomerase II; além disso, inibe a função mitocondrial. Os A procarbazina inibe a síntese de DNA e RNA e interfere na
efeitos adversos comuns incluem vômitos, mielossupressão e mitose;
alopécia. A crisantaspase mostra-se ativa contra células da leucemia
O paclitaxel estabiliza os microtúbulos, inibindo a linfoblástica aguda que não podem sintetizar asparagina.
mitose; relativamente tóxico; ocorrem reações de A hidroxiuréia inibe a ribonucleotidio redutase.
hipsersensibilidade. A ansacrina atua sobre a topoisomerase II.
O irinotecano liga-se a topoisomerase I e a inibe; A mitoxantrona provoca ruptura na cadeia do DN
ocorrem relativamente poucos efeitos tóxicos. O mitotano interrompe a síntese de esteróides cortiço-supra-
renais.
5) hormônios e isótopos radioativos: os hormônios ou seus
antagonistas são utilizados em tumores sensíveis a hormônios:

- glicocorticóides para leucemias e linfomas;

Resumo dos mecanismos e locias de ação dos principais antineoplásicos:

4 Marcelo A. Cabral
ANOTAÇÕES EM FARMACOLOGIA E FARMÁCIA CLÍNICA

Referências Bibliográficas

1. RANG, H. P. et al. Farmacologia. 4 edição. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2001;


2. KATZUNG, B. G. Farmacologia: Básica & Clinica. 9 edição. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2006;
3. CRAIG, C. R.; STITZEL, R. E. Farmacologia Moderna. 6 edição. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2005;
4. GOLAN, D. E. et al. Princípios de Farmacologia: A Base Fisiopatológica da Farmacoterapia. 2 edição. Rio de
Janeiro: Guanabara Koogan, 2009;
5. FUCHS, F. D.; WANNMACHER, L.; FERREIRA, M. B. C. Farmacologia Clínica. 3 edição. Rio de Janeiro: Guanabara
Koogan, 2004.
6. GILMAN, A. G. As Bases farmacológicas da Terapêutica. 10 edição. Rio de Janeiro: Mc-Graw Hill, 2005.
7. CONSTANZO, L. S. Fisiologia. 2 edição. Rio de Janeiro: Elsevier, 2004.
8. PORTH, C. M. Fisiopatologia. 6 edição. Rio de Janeiro: Ganabara Koogan, 2004

ЖЖЖЖЖЖ

5 Marcelo A. Cabral
ANOTAÇÕES EM FARMACOLOGIA E FARMÁCIA CLÍNICA

10 ) FÁRMACOS ANSIOLÍTICOS E HIPNÓTICOS

Os fármacos ansiolíticos são utilizados no tratamento dos desenvolvimento de dependência. Em virtude dos sintomas
sintomas da ansiedade, enquanto os fármacos hipnóticos são físicos da abstinência (aumento da ansiedade, tremor e
utilizados no tratamento da insônia. Apesar dos objetivos vertigem), os pacientes têm dificuldade em abandonar o uso
clínicos serem diferentes, as mesmas drogas são dos benzodiazepínicos. A tolerância é diminuída em relação
frequentemente usadas para ambas as finalidades, variando-se aos barbitúricos. Além disso, eles se ligam fortemente às
neste caso somente a dose para cada fim, devido ao fato de proteínas plasmáticas e muitos se acumulam gradualmente na
que as drogas que aliviam a ansiedade geralmente produzem gordura corporal em virtude da sua elevada solubilidade
certo grau de sedação e sonolência, que é um dos principais lipídica. Os principais efeitos colaterais dos BZD consistem
inconvenientes do uso clínico dos ansiolíticos. em sonolência, confusão, amnésia e comprometimento da
Os principais grupos de agentes ansiolíticos e hipnóticos coordenação motora.
são: os benzodiazepínicos, os agonistas dos receptores de 5- Quando os benzodiazepínicos são administrados juntamente
HT, os barbitúricos (obsoletos) e os antagonistas dos com outros depressores do SNC (álcool e anticonvulsivantes),
receptores beta-adrenérgicos (propanolol). o resultado consiste em aumento dos efeitos sedativos e
depressores do SNC, incluindo perda da consciência,
1 – Benzodiazepínicos: diminuição da coordenação muscular, depressão respiratória e
morte.
Os benzodiazepínicos são usados como ansiolíticos e
hipnóticos (triazolam, midazolam, zolpidem, lorazepam, 2 – Barbitúricos (pentobarbital, fenobarbital e tiopental):
alprazolam, nitrazepam, diazepam, clordiazepóxido,
flurazepam, e clonazepam). Esses medicamentos não exercem Todos os barbitúricos exercem atividade depressora sobre o
efeitos antidepressivos. sistema nervoso central, produzindo efeitos semelhantes aos
Os benzodiazepínicos agem através de sua ligação a um sítio dos anestésicos de inalação. Causam morte por depressão
regulador específico sobre o receptor GABAa respiratória e cardiovascular se forem administrados em
potencializando, assim, o efeito inibitório do GABA. O grandes
aumento na condutância dos íons de cloreto, induzido pela doses, constituindo um dos motivos pelos quais são
interação dos benzodiazepínicos com o GABA, assume a atualmente pouco utilizados como agentes ansiolíticos e
forma de um aumento na freqüência de abertura dos canais. hipnóticos.
Afetam principalmente o sistema límbico (unidade Os barbitúricos que continuam sendo utilizados amplamente
responsável pelas emoções). são os que exibem propriedades específicas, como o
O GABA é o principal neurotransmissor inibitório do fenobarbital – utilizado por sua atividade anticonvulsivante, e
cérebro, pois ao se ligar aos seus receptores, aumenta a o tiopental – amplamente utilizado como anestésico
freqüência de abertura dos canais de cloreto (Cl-). A entrada intravenoso.
de cloreto no neurônio ocasiona a sua hiperpolarização com Os barbitúricos compartilham com os benzodiazepínicos a
conseqüente queda da excitabilidade celular. Existem subtipos capacidade de potencializar a ação do GABA; entretanto,
do receptor GABAa em diferentes regiões do cérebro, que ligam-se a um sítio diferente no receptor de gaba/canal de
diferem na sua sensibilidade aos benzodiazepínicos. cloreto, e sua ação parece ser muito menos específica.
Os benzodiazepínicos ansiolíticos são agonistas nesse local Parecem aumentar a duração da abertura dos canais de cloreto
regulador. Outros benzodiazepínicos, como por exemplo, o regulados pelo GABA.
flumazenil, são antagonistas e impedem as ações dos Além do risco da superdosagem perigosa, as principais
benzodiazepínicos ansiolíticos. O flumazenil pode ser usado desvantagens dos barbitúricos residem no fato de que induzem
no caso de superdosagem de benzodiazepínicos, e para um elevado grau de tolerância e de dependência; além disso,
reverter a ação sedativa dos benzodiazepínicos administrados induzem acentuadamente à síntese do citocromo P-450
durante a anestesia. O flumazenil não antagoniza a ação dos hepático e das enzimas de conjugação. Portanto, aumentam a
barbitúricos e do etanol. velocidade de degradação metabólica de muitas outras drogas,
Os benzodiazepínicos causam: dando origem a diversas interações farmacológicas
- redução da ansiedade e da agressão; potencialmente incômodas.
- sedação, resultando em melhora da insônia; A tolerância – que consiste numa diminuição da
- relaxamento muscular e perda da coordenação motora; responsividade a determinada droga após exposição repetida –
- supressão das convulsões (efeito antiepilético). constitui uma característica comum dos sedativos-hipnóticos.
Os benzodiazepínicos são ativos por via oral e diferem A tolerância pode ser explicada em parte pelo aumento do
principalmente quanto à sua duração de ação. Os agentes de metabolismo da droga no caso dos barbitúricos, e devido a
ação curta (lorazepam e temazepam) são utilizados como infra-regulação dos receptores de benzodiazepínicos no
pílulas para dormir. Alguns agentes de ação prolongada cérebro.
(diazepam e clordiazepóxido) são convertidos em metabólitos A dependência fisiológica pode ser descrita como um estado
ativos de ação prolongada (convertidos em nordazepam). fisiológico alterado que exige a administração contínua da
Os benzodiazepínicos são relativamente seguros em droga para impedir o aparecimento de uma síndrome de
superdosagem. Suas principais desvantagens consistem em abstinência. No caso dos sedativos-hipnóticos essa síndrome
interação com álcool, efeitos prolongados de ressaca e caracteriza-se por estados de maior ansiedade, insônia e

1 Marcelo A. Cabral
excitabilidade do SNC, que podem progredir para convulsões.
Os sedativos-hipnóticos são em sua maioria capazes de
produzir dependência fisiológica quando utilizados de modo 4 – Antagonistas dos receptores beta-adrenérgicos
crônico. (propranolol):

Essas drogas são utilizadas no tratamento de algumas formas


Canal de Cloreto: de ansiedade, particularmente quando os sintomas físicos são
incômodos, como sudorese, tremor e taquicardia. Sua eficácia
depende mais do bloqueio das respostas simpáticas periféricas
do que de qualquer efeito central. Algumas vezes são usados
por atores e músicos para reduzir os efeitos do medo do palco.

OBS: a injeção letal, utilizada nos EUA para a execução da


pena de morte, é composta por tiopental (para sedar) + bometo
de pancurônio (para paralisar o diafragma) + brometo de
potássio (para paralisar o coração).

3 – Agonistas dos receptores 5-HT (buspirona, ipsapirona


e gepirona):

Além da via do GABA, muito outros neurotransmissores e


moduladores foram implicados na ansiedade e no distúrbio do
pânico, particularmente a 5-HT, a noradrenalina e os
neuropeptídeos. A serotonina possui efeitos inibitórios e
excitatórios no SNC.

A buspirona é um potente agonista (apesar de não ser


seletivo) a nível do receptores 5-HT1A (inibitórios da
serotonina). Porém, ela não possui ação hipnótica,
anticonvulsivante ou miorelaxante. A ipsapirona e a gepirona
são semelhantes. Eles atuam sobre os receptores pré-
sinápticos inibitórios, reduzindo assim a liberação de 5-HT e
de outros mediadores. Além disso, inibem a atividade dos
neurônios noradrenérgicos do lócus celúreos, e desta maneira,
interferem nas reações de reatividade. Entretanto, são
necessários dias ou semanas para que a buspirona produza seu
efeito no homem, sugerindo um mecanismo de ação indireto
mais complexo, o que também torna o fármaco inapropriado
para o tratamento da ansiedade aguda. A buspirona é ineficaz
nos episódios de pânico. Esses medicamentos não causam
sedação nem descoordenação motora, e não foram relatados
efeitos de abstinência.
Referências Bibliográficas

1. RANG, H. P. et al. Farmacologia. 4 edição. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2001;


2. KATZUNG, B. G. Farmacologia: Básica & Clinica. 9 edição. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2006;
3. CRAIG, C. R.; STITZEL, R. E. Farmacologia Moderna. 6 edição. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2005;
4. GOLAN, D. E. et al. Princípios de Farmacologia: A Base Fisiopatológica da Farmacoterapia. 2 edição. Rio de
Janeiro: Guanabara Koogan, 2009;
5. FUCHS, F. D.; WANNMACHER, L.; FERREIRA, M. B. C. Farmacologia Clínica. 3 edição. Rio de Janeiro: Guanabara
Koogan, 2004.
6. GILMAN, A. G. As Bases farmacológicas da Terapêutica. 10 edição. Rio de Janeiro: Mc-Graw Hill, 2005.
7. CONSTANZO, L. S. Fisiologia. 2 edição. Rio de Janeiro: Elsevier, 2004.
8. PORTH, C. M. Fisiopatologia. 6 edição. Rio de Janeiro: Ganabara Koogan, 2004.

ЖЖЖЖЖЖ
ANOTAÇÕES EM FARMACOLOGIA E FARMÁCIA CLÍNICA

11) FÁRMACOS ANTIPSICÓTICOS

As psicoses são caracterizadas por uma ou mais das A teoria envolvendo o glutamato e receptores NMDA,
seguintes manifestações: perda de encadeamento lógico do que também tenta explicar a etiopatologia da esquizofrenia,
pensamento, incapacidade de julgamento, percepção incorreta baseia-se no fato da fenciclidina (um antagonista dos receptores
da realidade, alucinações, ilusões, excitação extrema, e NMDA) induzir sintomas positivos e negativos da
comportamento violento. esquizofrenia; enquanto testes realizados com agonistas dos
receptores NMDA combatem os sintomas da doença (ver figura
Os tipos mais importantes de psicose são: 03).
- a esquizofrenia; Na atualidade são conhecidas cinco vias ou sistemas
- distúrbios afetivos (depressão e mania); dopaminérgicos importantes no cérebro.
- psicoses orgânicas (causados por traumatismo, álcool ou A primeira via – a mais estreitamente relacionada ao
outras doenças orgânicas). comportamento – é a via mesolímbico-mesocortical, que se
A esquizofrenia é uma doença psicótica caracterizada projeta dos corpos celulares próximos da substância negra para
por delírios e distúrbio do pensamento (sintomas positivos), o sistema límbico e neocórtex.
juntamente com isolamento social e achatamento das respostas A segunda via – a via nigroestriatal – consiste em
neurônios que se projetam da substância negra até o caudado e o
emocionais (sintomas negativos).
putame; essa via está envolvida na coordenação dos
Atualmente, uma das hipóteses mais aceitas como movimentos voluntários.
sendo relacionadas na patogenia da esquizofrenia fala de uma A terceira via – o sistema tuberoinfundibular – liga os
combinação de hiperfunção da dopamina e hipofunção dos núcleos arqueados e neurônios periventriculares ao hipotálamo e
glutamatos no sistema neuronal, juntamente com um à hipófise posterior. A dopamina liberada por esses neurônios
envolvimento pouco esclarecido dos receptores da serotonina inibe fisiologicamente a secreção de prolactina.
(5HT2) e um balanço entre esses receptores com os receptores A quarta via dopaminérgica – a via medular-
dopamínicos (D2). periventricular – consiste em neurônios no núcleo motor do
vago, cujas projeções ainda não estão bem definidas. Esse
Os fármacos antipsicóticos são usados para o sistema pode estar envolvido no comportamento da
tratamento da esquizofrenia. Os principais fármacos alimentação.
antipsicóticos típicos (bloqueiam somente os receptores D2) A quinta via – a via incerto-hipotalâmica – estabelece
são: Clorpromazina conexões entre a zona incerta medial e o hipotálamo e a
Levomepromazina amígdala.
Triflupromazina
Tioridazina Figura 01 – Vias dopaminérgicas no SNC:
Flufenazina
Trifluoperazina
Perfenazina
Pipotiazina
Tiotixeno
Haloperidol
Droperidol
Triperidol.
A expressão “antipsicótico atípico” é utilizada para
descrever os agentes mais efetivos e associados a riscos
significativamente menores de efeitos extrapiramidais, e por
bloquearem os receptores D2 e de outras monoaminas, tais
como os de 5HT-2. Os representantes deste grupo são:
Clozapina
Olanzapina
Quetiapina
Respiridona, em pequenas doses.
Dentre os antipsicóticos tradicionais, clorpromazina
foi o representante fenotiazínico selecionado como referência
pelo efeito mais sedativo, útil no surto psicótico, e haloperidol
para tratamento de manutenção.
A causa da esquizofrenia continua indefinida, porém Acredita-se que a ação antipsicótica seja produzida
envolve uma combinação de fatores genéticos e ambientais. A pela capacidade das drogas de bloquear a dopamina nos
“teoria da dopamina”, apesar de ser controversa, prevê que há sistemas mesolímbico e meso-cortical. Além disso, o
uma hiperatividade da dopamina no cérebro dos pacientes antagonismo da dopamina no sistema nigro-estriatal explica o
esquizofrênicos. Por outro lado, a hipoatividade da dopamina efeito indesejável do parkinsonismo provocado por esses
nos gânglios da base é a principal causa da doença de fármacos.
Parkinson.
1 Marcelo A. Cabral
ANOTAÇÕES EM FARMACOLOGIA E FARMÁCIA CLÍNICA

A hiperprolactinemia, que acompanha o tratamento


com fármacos antipsicóticos, é causada pelo bloqueio do efeito Na fase de manutenção, objetiva-se manter o paciente
inibitório tônico da dopamina sobre a liberação de prolactina assintomático ou ainda melhorar o nível de funcionamento e a
1
pela hipófise. Por conseguinte, a mesma ação farmacodinâmica qualidade de vida , além de reduzir as recaídas. Em pacientes
pode ter consequências psiquiátricas, neurológicas e com pouca adesão ao tratamento, formas intramusculares de
endocrinológicas distintas. depósito - que permitem grande espaçamento entre doses –
As pesquisas atuais são orientadas para a descoberta de constituem alternativa.
compostos antipsicóticos atípicos que sejam mais seletivos para Quando o paciente não responde a tentativas adequadas
o sistema mesolímbico (a fim de reduzir seus efeitos sobre o (4 a 6 semanas com doses plenas) de pelo menos dois
sistema extrapiramidal). antipsicóticos, fica caracterizada a refratariedade, indicação
para uso de clozapina. Em pacientes com contra-indicação ao
Via Corpo Celular Inervação Resposta Doença emprego desse medicamento, pode-se considerar o uso de
s Associada
olanzapina ou a associação de antipsicóticos com lítio,
Mesolímbica Mesencéfalo Sistema Emociona Dependência e carbamazepina, ácido valpróico ou benzodiazepínico.
(Área Ventral) Límbico is e Via Esquizofrenia
do prazer Os sintomas positivos da esquizofrenia (delírios e
distúrbios do pensamento) são mais passíveis de responder à
Mesocortical Mesencéfalo Córtex Emoção e Esquizofrenia
(Área Ventral) Frontal Cognição
terapia com antipsicóticos típicos. Já os sintomas negativos
Córtex (isolamento social e diminuição das respostas emocionais)
Temporal respondem mais favoravelmente às drogas antipsicóticas
Túbero- Hipotálamo Hipófise Endócrin Patologias
atípicas.
Infundibular as endócrinas:
Plasil® - Mecanismo de ação das drogas antipsicóticas:
Antiemético
estimulador da
lactação –
Todas as drogas antipsicóticas típicas são antagonistas
inibe PIH. ao nível dos receptores D2 pós-sinápticos da dopamina. Os
antipisicóticos atípicos também bloqueiam outros receptores de
Nigro-Estriatal Substância Corpo Controle Parkinson monoaminas, particularmente 5HT. A clozapina também
Negra Estriado motor
bloqueia os receptores D4.
fino
A ativação pela dopamina dos receptores D2 pós-
sinápticos inibe a produção de adenilato ciclase através das
Vários outros transmissores, particularmente a 5-HT – proteínas Gi, o que impede a conversão de ATP em AMPc, e
que exerce um efeito modulador sobre as vias da dopamina -, a consequentemente, interrompe a ativação da proteína cinase C.
noradrenalina e o glutamato, interagem fortemente com as vias Além disso, ativa os canais de K+ (hiperpolarização celular) e
da dopamina e podem ser importantes em relação às ações das suprime as correntes dos canais de Ca+ controlados por
drogas antipsicóticas e, possivelmente também, na etiologia da voltagem, caracterizando um efeito inibitório (ver figura 02A).
esquizofrenia. Apesar dos neurolépticos tradicionais A inibição desses receptores pelos fármacos
bloquearem receptores adrenérgicos, serotoninérgicos, antipsicóticos faz com que o ATP passe a ser convertido em
colinérgicos e histaminérgicos, todos eles têm em comum a AMPc e este aumente a atividade da proteína cinase C. A PKC
ação farmacológica de bloquear os receptores dopaminérgicos. por sua vez fosforila os canais de K+, determinando seu
É em relação a estes últimos que os estudos têm fechamento e a repolarização sináptica. O resultado desse
demonstrado os efeitos clínicos dos neurolépticos. O bloqueio evento é o favorecimento dos processos de despolarização da
dos outros receptores, além dos dopaminérgicos, estaria membrana com a conseqüente inibição dos sintomas positivos
relacionado mais aos efeitos colaterais da droga do que aos da doença (ver figura 02B).
terapêuticos. Por outro lado, os autoreceptores D2 (pré-sinápticos)
A esquizofrenia e transtornos esquizofreniformes suprimem a síntese de dopamina ao reduzir a fosforilação da
podem ser manejados em dois momentos distintos: fase aguda e tirosina-hidroxilase (enzima necessária à síntese de dopamina a
fase de manutenção. partir da tirosina). Além disso, limitam a liberação de dopamina
Na fase aguda (surto psicótico), o objetivo do através da modulação dos canais de K+ e Ca+. O aumento da
tratamento é o alívio e redução dos sintomas, com melhora do abertura dos canais de K+ resulta em uma maior corrente que
funcionamento social do indivíduo. O tratamento visa evitar hiperpolariza o neurônio, de modo que é necessária uma maior
danos advindos da agressividade e permitir rápido retorno a despolarização para atingir o limiar de descarga. A diminuição
melhor nível de funcionamento. Medicamentos antipsicóticos da abertura dos canais de Ca+ resulta em níveis diminuídos de
(principalmente os mais sedativos) são indicados em quase Ca+ intracelular. Como o cálcio é necessário para o
todos os episódios psicóticos agudos. Os benzodiazepínicos deslocamento da vesícula sináptica e sua fusão com a membrana
podem ser administrados juntamente com antipsicóticos para pré-sináptica, a diminuição das concentrações intracelulares de
evitar os efeitos colaterais nesta fase. cálcio resulta em liberação diminuída de dopamina. Esses
Embora seja importante que o paciente participe da receptores são alvos das pesquisas de novos fármacos para o
decisão quanto ao uso de medicamentos, no surto psicótico sua tratamento da esquizofrenia.
administração costuma ser feita independentemente do desejo Os antipsicóticos levam dias ou semanas para exercer
do paciente. Do ponto de vista de eficácia e segurança, os seus efeitos. Isto se dá devido ao fato de possuírem uma meia-
antipsicóticos convencionais e alguns dos novos, como a vida longa, e pelo fato de que um fármaco alcança níveis
risperidona, são opções para tratamento inicial da esquizofrenia. estáveis somente após aproximadamente 5 tomadas.
2
ANOTAÇÕES EM FARMACOLOGIA E FARMÁCIA CLÍNICA

No homem, o efeito das drogas antipsicóticas consiste


em produzir um estado de apatia e menor iniciativa. O indivíduo A incidência das distonias agudas e da discinesia tardia
mostra menos emoções, demora a responder a estímulos é menor com os agentes antipsicóticos atípicos, sendo
externos e tende a adormecer. Entretanto, é facilmente particularmente baixa com a clozapina
despertado e pode responder com precisão a eventuais Os distúrbios endócrinos consistem no aumento da
perguntas, não havendo nenhuma perda acentuada da função liberação de prolactina, com consequente amnorréia,
intelectual. As tendências agressivas são fortemente inibidas. galactorréia, teste falso-positivo de gravidez, ginecomastia e
diminuição da libido nos homens.
Efeitos colaterais dos antipsicóticos: A sedação, a hipotensão e o aumento do peso corporal
também são comuns. Esses efeitos são secundários ao bloqueio
Muitos dos efeitos adversos dos antipsicóticos são dos receptores da dopamina.
provavelmente mediados pela ligação desses fármacos aos Outros efeitos colaterais, tais como: boca seca, visão
receptores D2 nos núcleos da base e na hipófise. turva e hipotensão, são devido ao bloqueio de outros receptores,
Os efeitos colaterais comuns à maioria das drogas particularmente dos alfa-adrenérgicos e dos receptores
antipsicóticas consistem em distúrbios motores extrapiramidais muscarínicos de acetilcolina.
e os distúrbios endócrinos. A síndrome maligna antipsicótica é uma reação
O sistema extrapiramidal é constituído pelas vias idiossincrásica rara, porém potencialmente perigosa.
motoras que conectam o córtex cerebral com as vias dos nervos Clinicamente se observa um grave distúrbio extrapiramidal
espinhais. Quando estimulados produzem síndrome acompanhado por intensa hipertermia (de origem central) e
Parkinsoniptica, acatisia (inquietação incontrolável) e reações distúrbios autonômicos. Leva a óbito numa proporção de 10%
distônicas agudas. dos casos.
As distonias agudas consistem em movimentos Como os tecidos adiposos liberam lentamente os
involuntários, tremor e rigidez que provavelmente são metabólitos fenotiazídicos acumulados no plasma, as
conseqüentes ao bloqueio dos receptores de dopamina fenotiazidas podem produzir efeitos por um período de até três
nigroestriais. meses após sua interrupção.
A discinesia tardia caracteriza-se principalmente por
movimentos involuntários da face dos membros, aparecendo Observações: muitos fármacos antagonistas da dopamina
dentro de vários meses ou anos depois do tratamento (fenotiazinas, metoclopramida) possuem atividade antiemética
antipsicótico. Pode estar associada à proliferação de receptores pois existem receptores D2 na área do bulbo (zona do gatilho
de dopamina no corpo estriado. quimiorreceptora) associados ao desencadeamento do vômito.

Figura 02 - Mecanismo e ação dos receptores D2 da dopamina:

A) - Ativação dos receptores D2: em condições normais a dopamina se liga ao receptor D2 que ativa a subunidade alfa da
proteína G que se desloca e liga-se à adenilciclase inibindo-a. Este mecanismo impede a conversão do ATP em AMPc e a
sinalização de segundos mensageiros, no caso a proteína cinase C (PKC). Esta cascata de eventos mantém os canais de K+ abertos,
do que resulta a hiperpolarização da membrana celular. O incremento da função dopaminérgica promove os sintomas
característicos da esquizofrenia.
B) - Bloqueio de receptores D2: neste caso, não ocorre a ativação da proteína G e ligação da subunidade alfa à adenilciclase. O
ATP passa a ser convertido em AMPc e este aumenta a atividade da PKC. A PKC por sua vez fosforila os canais de íons K+,
determinando seu fechamento e a repolarização da membrana sináptica. O resultado destes eventos é o favorecimento dos
processos de despolarização da membrana com a consequente inibição dos sintomas positivos da doença.
Figura 03 – Circuitos neuronais e neurotransmissores envolvidos na esquizofrenia:

3
ANOTAÇÕES EM FARMACOLOGIA E FARMÁCIA CLÍNICA

Esquema representativo dos circuitos neuroniais e neurotransmissores que participam na gênese da esquizofrenia. Projeções
glutamatérgicas corticais (excitatórias) ativam as vias dopaminérgicas na área tegmental ventral. A dopamina atua inibindo o estriado
ventral e este o tálamo, estrutura que transmite as informações sensoriais para o córtex. Se um excesso da transmissão tálamocortical
ocorrer, devido à diminuição da atividade glutamatérgica e aumento da função dopaminérgica (desinibição da via dopaminérgica
mesolímbica), sintomas positivos podem aparecer. Sinal + indica sinápses excitatórias e sinal – sinápses inibitórias. DA- dopamina;
glu- glutamato e GABA- ácido gama-aminobutírico.

Figura 04 – representação da hipofunção cortical dos receptores glutamatérgicos tipo NMDA:

Representação hipotética associando a hipofunção cortical (redução da atividade de receptores NMDA) e os sintomas da
esquizofrenia. A hipofunção cortical repercute sobre o sistema dopaminérgico mesolímbico determinando a desinibição do sistema
mesolímbico e o consequente aparecimento dos sintomas positivos. A atividade dos neurônios mesolímbicos depende da estimulação
de vias descendentes corticais de forma que a hipofunção cortical (associada aos déficits cognitivos) determina o predomínio da
atividade dopaminérgica no sistema límbico (sintomas positivos). Isto pode explicar o aparecimento sequencial de sintomas positivos e
negativos no curso da esquizofrenia.

4
ANOTAÇÕES EM FARMACOLOGIA E FARMÁCIA CLÍNICA

Referências Bibliográficas

1. RANG, H. P. et al. Farmacologia. 4 edição. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2001;


2. KATZUNG, B. G. Farmacologia: Básica & Clinica. 9 edição. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2006;
3. CRAIG, C. R.; STITZEL, R. E. Farmacologia Moderna. 6 edição. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2005;
4. GOLAN, D. E. et al. Princípios de Farmacologia: A Base Fisiopatológica da Farmacoterapia. 2 edição. Rio de
Janeiro: Guanabara Koogan, 2009;
5. FUCHS, F. D.; WANNMACHER, L.; FERREIRA, M. B. C. Farmacologia Clínica. 3 edição. Rio de Janeiro: Guanabara
Koogan, 2004.
6. GILMAN, A. G. As Bases farmacológicas da Terapêutica. 10 edição. Rio de Janeiro: Mc-Graw Hill, 2005.
7. CONSTANZO, L. S. Fisiologia. 2 edição. Rio de Janeiro: Elsevier, 2004.
8. PORTH, C. M. Fisiopatologia. 6 edição. Rio de Janeiro: Ganabara Koogan, 2004.

ЖЖЖЖЖЖ

5
ANOTAÇÕES EM FARMACOLOGIA E FARMÁCIA CLÍNICA

12) FÁRMACOS ANTIDEPRESSIVOS


pré-sinápticas através de sua competição pelo sítio de ligação da
Os distúrbios afetivos caracterizam-se mais por alterações proteína transportadora. Foi sugerido que a melhora dos
do humor (depressão ou mania) do que por distúrbios do sintomas emocionais reflete principalmente uma potencialização
pensamento. A depressão constitui a manifestação mais comum, da transmissão mediada pela 5-HT, e o alívio dos sintomas
podendo variar de uma condição muito discreta, formando uma biológicos resulta da facilitação da transmissão noradrenérgica.
fronteira com a normalidade, até a depressão grave – algumas Parece haver também, com o uso prolongado dos ADT, uma
vezes denominada depressão psicótica – acompanhada de diminuição do número de receptores pré-sinápticos do tipo
alucinações e delírios. Alfa-2, cuja estimulação do tipo feedback inibiria a liberação de
Os sintomas da depressão incluem componentes NE
emocionais e biológicos: Os TCA produzem acentuada potencialização dos
- sintomas emocionais: aflição, apatia e pessimismo, baixa auto- efeitos do álcool por motivos que ainda não estão bem
estima, sentimento de culpa, inadequação e feiúra, indecisão e esclarecidos, podendo ocorrer a morte devido depressão
perda da motivação; incapacidade de vivenciar o prazer. respiratória. Os TCA também interagem com vários agentes
- sintomas biológicos: retardo do pensamento e da ação, perda anti-hipertensivos tendo conseqüências potencialmente
da libido, distúrbio do sono e perda do apetite. perigosas, razão pela qual sua administração a pacientes
A mania é, na maioria dos aspectos, exatamente o hipertensos exige rigorosa monitorização. Além disso, não
oposto, com exuberância excessiva, entusiasmo e autoconfiança, devem ser administrados junto com IMAO.
acompanhados de ações impulsivas. Esses sinais estão Os ADT são potentes anticolinérgicos e por esta
geralmente combinados com irritabilidade, impaciência e característica seus efeitos colaterais são explicados.
agressividade, e, algumas vezes, com delírios de grandeza do Efeitos colaterais importantes: sedação (bloqueio H1);
tipo napoleônico. hipotensão postural (bloqueio dos receptores alfa-adrenérgicos),
Existem dois tipos distintos de síndrome depressiva: a boca seca, visão turva, constipação (bloqueio muscarínico).
depressão unipolar, em que as flutuações do humor ocorrem
sempre na mesma direção, e o distúrbio afetivo bipolar, em que b) inibidores seletivos da captação de 5-HT (fluoxetina,
a depressão alterna com a mania. fluvoxamina, paroxemina, sertralina, citalopram):
A principal teoria bioquímica da depressão é a hipótese As drogas desse tipo (denominadas SSRI – inibidores seletivos
da monoamina, que estabelece ser a depressão causada por um da recaptação de serotonina) incluem a fluxetina, a
déficit funcional dos transmissores das monoaminas fluvoxamina, a paroxetina e a sertralina. Na atualidade a
(noradrenalina e/ou 5-HT) em certos locais do cérebro, ao passo fluoxetina é o agente antidepressivo mais prescrito. Além de
que a mania resulta de um excesso funcional. Apesar de a exibir seletividade para a captação de 5-HT em relação a
hipótese da monoamina em sua forma mais simples não ser captação de noradrenalina, tem menos tendência a causar efeitos
mais sustentável como explicação para a depressão, a colaterais anticolinérgicos em comparação com os TCA e são
manipulação farmacológica da transmissão de monoaminas menos perigosos em superdosagem. O efeito antidepressivo dos
continua sendo a abordagem terapêutica mais bem sucedida. ISRS parece ser conseqüência do bloqueio seletivo da
O aumento de neurotransmissores na fenda sináptica se recaptação da serotonina (5-HT).
dá através do bloqueio da recaptação da NE e da 5HT no Os efeitos colaterais comuns consistem em náuseas,
neurônio pré-sináptico ou ainda, através da inibição da anorexia, insônia, perda da libido e falta de orgasmo. Pode
Monoaminaoxidase (MAO) que é a enzima responsável pela ocorrer uma perigosa “reação da serotonina” (hipertermia,
inativação destes neurotransmissores. Será, portanto, nos rigidez muscular, colapso cardiovascular) se forem
sistemas noradrenérgico e serotoninérgico do Sistema administrados com IMAO
Límbico o local de ação das drogas antidepressivas empregadas
na terapia dos transtornos da afetividade.
Os fármacos antidepressivos são classificados nas c) Inibidores da MAO (fenelzina, tranilcipromina, iproniazida,
seguintes categorias: pargilina, clorgilina, selegilina, moclobemida):
- antidepressivos tricíclicos (TCA): imipramina e amitriptilina. A monoamina oxidase, juntamente com a catecol-O-
Trata-se de inibidores não seletivos da captação de monoaminas metil transferase, são as principais enzimas de degradação das
(noradrenalina e serotonina); catecolaminas.
- inibidores seletivos da captação de 5-HT: fluoxetina, No interior dos neurônios simpáticos, a MAO controla
fluvoxamina, paroxetina, sertralina; o conteúdo de dopamina e noradrenalina, e a reserva liberável
- inibidores da MAO: fenelzina, tranilcipromina – que não são de noradrenalina aumenta quando a enzima é inibida.
seletivos para MAO-A/MAO-B; clorgilina e moclobemida, que O principal efeito dos IMAO consiste em aumentar as
são MAO-A seletivos. concentrações citoplasmáticas das monoaminas (5-HT,
- antidepressivos atípicos: nomifensiva, maprotilina, mianserina, noradrenalina e dopamina) nas terminações nervosas
bupropiona e trazodona. (principalmente do cérebro), sem afetar acentuadamente as
reservas vesiculares que formam o reservatório passível de
a) Antidepressivos tricíclicos (imipramina, desipramina, liberação com a estimulação nervosa. Nos seres humanos
clomipramina, amitriptilina, nortriptilina, protriptilina): normais, os IMAO causam aumento imediato da atividade
O principal efeito do TCA consiste em bloquear a recaptação de motora, e verifica-se o aparecimento de euforia e de excitação
aminas (noradrenalina e/ou 5-HT) pelas terminações nervosas no decorrer de poucos dias. Isto se opõe à ação dos TCA, que só
1 Marcelo A. Cabral
ANOTAÇÕES EM FARMACOLOGIA E FARMÁCIA CLÍNICA

causam sedação e confusão quando administrados a indivíduos


sem depressão. pode provocar deslocamento agudo da noradrenalina vesicular e
A ação desses medicamentos é de longa duração liberação não vesicular maciça de noardrenalina das
(semanas), em virtude da inibição irreversível da MAO. A terminações nervosas, através de reversão do NET
moclobemida possui curta duração. (transportador de noradrenalina – transporta, normalmente,
Os principais efeitos colaterais são a hipotensão noradrenalina da sinápse para o meio intracelular).
postural (bloqueio simpático), efeitos semelhantes ao da Os IMAO não devem ser administrados juntamente
atropina, aumento do peso corporal, estimulação do SNC, com os TCA e SSRI.
causando inquietação, insônia, lesão hepática (rara). A
superdosagem aguda causa estimulação do SNC, e algumas
vezes convulsões. d) Antidepressivos atípicos (nomifensina e maprotilina,
Pode ocorrer uma resposta hipertensiva grave a mianserina, trazodona e bupropiona):
alimentos contendo tiramina (Reação do queijo) A tiramina é Esses fármacos são heterogêneos. Não possuem um
normalmente metabolizada pela MAO localizada no trato mecanismo de ação em comum. Alguns são bloqueadores fracos
gastrintestinal e no fígado. Em pacientes que fazem uso dos da captação de monoamina, ao passo que outros atuam através
inibidores da MAO, a tiramina é absorvida no intestino, de mecanismos desconhecidos. A maioria é de ação bastante
transportada pelo sangue e captada por neurônios simpáticos, curta. Os efeitos indesejáveis e a toxidade aguda variam, mas
onde é transportada até as vesículas sinápticas pelo VMAT são menores do que a dos TCA.
(transportador vesicular de monoaminas – transporta
noradrenalina citosólica para o interior das vesículas). Através
desse mecanismo, um estímulo agudo com grandes quantidades
de tiramina (como acontece na ingestão de queijos e vinhos)

Referências Bibliográficas

1. RANG, H. P. et al. Farmacologia. 4 edição. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2001;


2. KATZUNG, B. G. Farmacologia: Básica & Clinica. 9 edição. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2006;
3. CRAIG, C. R.; STITZEL, R. E. Farmacologia Moderna. 6 edição. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2005;
4. GOLAN, D. E. et al. Princípios de Farmacologia: A Base Fisiopatológica da Farmacoterapia. 2 edição. Rio de
Janeiro: Guanabara Koogan, 2009;
5. FUCHS, F. D.; WANNMACHER, L.; FERREIRA, M. B. C. Farmacologia Clínica. 3 edição. Rio de Janeiro: Guanabara
Koogan, 2004.
6. GILMAN, A. G. As Bases farmacológicas da Terapêutica. 10 edição. Rio de Janeiro: Mc-Graw Hill, 2005.
7. CONSTANZO, L. S. Fisiologia. 2 edição. Rio de Janeiro: Elsevier, 2004.
8. PORTH, C. M. Fisiopatologia. 6 edição. Rio de Janeiro: Ganabara Koogan, 2004

ЖЖЖЖЖЖ

2 Marcelo A. Cabral
ANOTAÇÕES EM FARMACOLOGIA E FARMÁCIA CLÍNICA

13) FARMACOS ANTIEPILEPTICOS


transaminase (vigabatrina) ou uso de drogas com
O evento característico da epilepsia é a convulsão, que propriedades diretas GABA-agonistas; e
está associada à descarga episódica de alta freqüência de
b) inibição da função dos canais de sódio, reduzindo a
impulsos por um grupo de neurônios no cérebro. O local da
excitabilidade elétrica das membranas celulares, possivelmente
descarga primária e a extensão de sua propagação é que
através do bloqueio uso-dependente dos canais de sódio
determinam os sintomas, que vão desde um breve lapso de
(fenitoína, carbamazepina, valproato e lamotrigina).
atenção até uma crise convulsiva completa, que dura vários
minutos. Os sintomas particulares produzidos dependem da Mais recentemente foi observada a importância de fármacos
função da região cerebral que está afetada. que inibem os canais de cálcio tipo T e HVA no tratamento da
epilepsia.
A classificação clínica aceita da epilepsia reconhece
duas categorias: as crises convulsivas parciais e as
convulsões generalizadas, embora haja alguma superposição
e muitas variedades em cada uma.
As convulsões parciais são crises em que a descarga
começa localmente e, com freqüência, permanece localizada.
As convulsões generalizadas envolvem todo o cérebro,
incluindo o sistema reticular, produzindo, assim, uma
atividade elétrica anormal em ambos os hemisférios. A
perda imediata da consciência é característica das
convulsões generalizadas. As principais categorias são as
convulsões tônico-clônicas e as ausências. A convulsão
tônico-clônica consiste numa vigorosa contração inicial de
toda a musculatura, causando espasmo extensor rígido. A
respiração é interrompida, e, com freqüência, ocorrem
defecção, micção e salivação. Essa fase tônica tem duração
de cerca de um minuto e é acompanhada de uma série de
espasmos sincrônicos violentos, que desaparecem
gradualmente em 2 – 4 minutos. O paciente permanece
inconsciente durante alguns minutos e, a seguir, recupera-se
Locais de ação de alguns fármacos antiepilépticos, e
gradualmente, sentindo-se mal e confuso.
aumento da transmissão sináptica do GABA:
As crises de ausência ocorrem em crianças; são muito
menos dramáticas, mas podem ocorrer mais freqüentemente
do que as crises tônico-clônicas. O paciente interrompe
bruscamente o que quer que esteja fazendo, parando
algumas vezes de falar no meio de uma frase, e demonstra
um olhar fixo e vazio por alguns segundos, com pouco ou
nenhum distúrbio motor. O paciente não tem consciência
daquilo que o cerca e recupera-se subitamente, sem nenhum
pós-efeito.
A descarga epiléptica repetida pode causar morte
neuronal (excitotoxicidade).
Do ponto de vista farmacológico, existe uma distinção
clara entre os fármacos que são eficazes nas crises de
ausência e os que são eficazes em outro tipo de epilepsia,
apesar de a maioria exibir pouca seletividade com relação às
outras subdivisões clínicas.
Com a terapia farmacológica ótima, a epilepsia é
totalmente controlada em cerca de 75% dos pacientes.
Dois mecanismos principais parecem ser importantes na
ação das drogas anticonvulsivantes:
a) potencialização da ação do GABA
(neurotransmissor inibitório). Isto pode ser obtido por uma
potencialização da ação pós-sináptica do GABA
(fenobarbital e benzodiazepínicos), inibição da GABA

1 Marcelo A. Cabral
ANOTAÇÕES EM FARMACOLOGIA E FARMÁCIA CLÍNICA

Fármacos antiepilépticos:
Talvez em virtude de seus numerosos locais potenciais
Fenitoína e Carbamazepina
de ação, o ácido valpróico é um dos agentes antiepilépticos
A fenitoina atua diretamente sobre os canais de Na+, mais efetivos no tratamento de pacientes com síndromes de
diminuindo a velocidade de recuperação do canal de seu epilepsia generalizada com tipos mistos de convulsão.
estado inativado para o estado fechado. O canal de sódio
Gabapentina
existe em três conformações – fechada, aberta e inativada, e
a probabilidade de um canal existir em cada um desses A gabapentina é um análogo estrutural do GABA, e visa
estados depende do potencial de membrana. Ao diminuir a aumentar a inibição mediada pelo GABA. Todavia, o
velocidade de recuperação do estado inativado para o estado principal efeito anticonvulsivante da gabapentina parece
fechado, a fenitoína aumenta o limiar dos potenciais de ação ocorrer através da inibição dos canais de cálcio HVA,
e impede a descarga repetitiva. O efeito resultante é a resultando em diminuição da liberação de
estabilização do foco da convulsão ao impedir o desvio neurotransmissores (glutamato e aspartato).
despolarizante paroxístico que inicia a convulsão parcial.
A gabapentina não parece ser um agente antiepiléptico
Além disso, a fenitoína impede a rápida propagação da
particularmente efetivo para a maioria dos pacientes.
atividade convulsiva para outros neurônios, respondendo
pela sua eficácia nas convulsões secundariamente
generalizadas.
Benzodiazepínicos: Diazepam, Lorazepam,
A fenitoina atua sobre os canais de sódio de uma Midazolam e Clonazepam
maneira dependente do uso, por conseguinte, apenas os
Os benzodiazepínicos aumentam a afinidade do GABA
canais que estão abertos e fechados em alta freqüência têm
pelo receptor GABAa e intensificam a regulação do canal de
probabilidade de serem inibidos. Essa dependência diminui
GABAa na presença de GABA, aumentando, assim, o
os efeitos da fenitoína sobre a atividade neuronal espontânea
influxo de Cl- através do canal . Essa ação tem o duplo
e evita muito dos efeitos adversos observados com os
efeito de suprimir o foco Ada convulsão (através da
potencializadores do GABAa (que não são dependentes do
elevação do limiar do potencial de ação) e de fortalecer a
uso).
inibição circundante.
Esse fármaco é utilizado no tratamento das convulsões
Esses fármacos são apropriados para o tratamento das
parciais e tônico-clônicas. Não é utilizada nas crises de
convulsões parciais e tônico-clônicas, porém devido aos seus
ausência.
efeitos colaterais são empregados tipicamente apenas para
A carbamazepina atua de maneira semelhante à interrupção aguda das convulsões.
fenitoína, sendo utilizada nas convulsões parciais devido a
O diazepam, administrado por via intravenosa, é
sua ação dupla na supressão dos focos convulsivos e
utilizado no tratamento do estado de mal epiléptico, uma
prevenção da propagação da atividade.
condição potencialmente fatal, em que ocorrem crises
Etossuximida epilépticas quase sem interrupção. Sua vantagem nessa
situação reside na sua ação muito rápida em comparação
A etossuximida reduz as correntes dos canais de cálcio
com outros agentes antiepilépticos. A maioria dos
tipo T de baixo limiar de maneira dependente da voltagem.
benzodiazepínicos possui efeito sedativo demasiado e efeito
O canal de cálcio do tipo T é despolarizado e inativado
antipsicótico muito curto, o que inviabiliza o seu emprego na
durante o estado de vigília. Nas crises de ausência, acredita-
terapia antiepiléptica de manutenção.
se que a hiperpolarização paroxística ativa o canal no estado
de vigília, iniciando as descargas que caracterizam esse tipo
de convulsão. Barbitúricos: Fenobarbital
A etossuximida é utilizada nas crises de ausências não
O fenobarbital liga-se a um sítio alostérico no receptor de
complicadas, não sendo efetiva para o tratamento das
GABAa e, portanto, potencializa a ação do GABA endógeno ao
convulsões parciais ou generalizadas secundárias.
aumentar acentuadamente a duração de abertura dos canais de
Ácido Valpróico Cl-. Esse aumento da inibição mediada pelo GABA, semelhante
ao dos benzodiazepínicos, pode explicar a eficiência do
O ácido valpróico diminui a velocidade de recuperação
fenobarbital no tratamento das convulsões parciais e tônico-
dos canais de Na+ do estado inativado. Em concentrações
clônicas.
ligeiramente mais altas, limita a atividade do canal de cálcio
Esse fármaco é utilizado primariamente como fármaco
do tipo T de baixo limiar.
alternativo no tratamento das convulsões parciais e tônico-
Outro mecanismo de ação proposto ocorre em nível do clônicas. Entretanto, devido a seus efeitos sedativos
metabolismo do GABA. Ele aumenta a atividade da ácido pronunciados, o uso clínico de fenobarbital diminui com a
glutâmico descarboxilase, a enzima responsável pela síntese disponibilidade de medicações antiepilépticas mais efetivas.
do GABA, enquanto inibe a atividade das enzimas que
degradam o GABA. Acredita-se que esses efeitos em Inibidor dos receptores de glutamato: Felbamato
conjunto, aumentam a disponibilidade de GABA na sinápse
e, portanto, aumentam a inibição mediada pelo GABA. Os receptores de glutamato ionotrópicos medeiam os efeitos do
glutamato, o principal neurotransmissor excitatório do SNC. A
ativação excessiva das sinapses excitatórias constitui um
2 Marcelo A. Cabral
ANOTAÇÕES EM FARMACOLOGIA E FARMÁCIA CLÍNICA

componente essencial da maioria das formas de atividade


convulsiva. Desta forma, estudos demonstram que a inibição felbamato esteve associado a certo número de casos de anemia
dos subtipos NMDA e AMPA de receptores de glutamato pode aplásica fatal e insuficiência hepática, de modo que, hoje em
inibir a geração de atividade convulsiva e proteger os neurônios dia, seu uso está essencialmente restrito a pacientes com
da lesão induzida pela convulsão. Entretanto, nenhum dos epilepsia extremamente refratária.
antagonistas específicos e potentes dos receptores de glutamato Duas drogas foram recentemente introduzidas no
tem sido utilizado clinicamente de modo rotineiro para o tratamento da epilepsia:
tratamento das convulsões, devido a seus efeitos adversos A vigabatrina, que atua ao inibir a enzima GABA
inaceitáveis sobre o comportamento. transaminase, que é a responsável pela inativação do GABA; e a
O felbamato possui uma variedade de ações, incluindo tiagabina, que inibe a recaptação do GABA.
a inibição seletiva dos receptores NMDA que possuem Por conseguinte, ambas potencializam a ação do
subunidades NR2B. Como essa subunidade particular do GABA como transmissor inibitório. Esses fármacos são
receptor não é expressa de maneira ubíqua no cérebro, o utilizados para o tratamento das crises parciais (com ou sem
antagonismo dos receptores NMDA pelo felbamato não é tão generalização secundária) não controladas satisfatoriamente
disseminado quanto aquele observado com outros antagonistas com outros medicamentos antiepilépticos.
NMDA. Essa seletividade relativa pode explicar por que o
felbamato carece dos efeitos adversos comportamentais
observados com o uso dos outros agentes. ЖЖЖЖЖЖ
O felbamato é um agente antiepiléptico extremamente
potente e também possui o benefício adicional de não apresentar
os efeitos sedativos comuns a muitos outros fármacos utilizados
no tratamento da epilepsia. Entretanto, foi constatado que o

Referências Bibliográficas

1. RANG, H. P. et al. Farmacologia. 4 edição. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2001;


2. KATZUNG, B. G. Farmacologia: Básica & Clinica. 9 edição. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2006;
3. CRAIG, C. R.; STITZEL, R. E. Farmacologia Moderna. 6 edição. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2005;
4. GOLAN, D. E. et al. Princípios de Farmacologia: A Base Fisiopatológica da Farmacoterapia. 2 edição. Rio de
Janeiro: Guanabara Koogan, 2009;
5. FUCHS, F. D.; WANNMACHER, L.; FERREIRA, M. B. C. Farmacologia Clínica. 3 edição. Rio de Janeiro: Guanabara
Koogan, 2004.
6. GILMAN, A. G. As Bases farmacológicas da Terapêutica. 10 edição. Rio de Janeiro: Mc-Graw Hill, 2005.
7. CONSTANZO, L. S. Fisiologia. 2 edição. Rio de Janeiro: Elsevier, 2004.
8. PORTH, C. M. Fisiopatologia. 6 edição. Rio de Janeiro: Ganabara Koogan, 2004

ЖЖЖЖЖЖ

3 Marcelo A. Cabral
ANOTAÇÕES EM FARMACOLOGIA E FARMÁCIA CLÍNICA

14) TRATAMENTO FARMACOLOGICO DAS ANEMIAS E LEUCEMIAS


normalidade). É importante observar que na
As anemias são laboratorialmente definidas pela esferocitose o CHCM geralmente é elevado.
diminuição da concentração de hemoglobina, em geral
• RDW (Red Cell Distribution Width): é um índice
acompanhada da diminuição da hematimetria e do que indica a anisocitose (variação de tamanho), sendo o normal
hematócrito, e classificada pela produção de reticulócitos e de 11 à 14%, representando a percentagem de variação dos
pela alteração do volume das hemácias (VCM).
volumes obtidos. Nem todos os laboratórios fornecem o seu
• Hematimetria – a hematimetria (H ou E) é a resultado no hemograma. RDW aumentado sugere patologia
contagem de eritrócitos por milímetro cúbico. Valores eritróide. A principal função dos eritrócitos consiste em
de referência (M/microlitro) para homens 5,3 (+-0,8) e transportar oxigênio, e esta capacidade depende de seu conteúdo
para mulheres 4,7 (+- 0,6). As populações negras têm de hemoglobina. Cada grama de hemoglobina possui 3,3mg de
números aproximadamente 5% inferiores; residentes ferro, e a produção de hemoglobina depende do suprimento de
em áreas muito acima do nível do mar, pelo estímulo ferro. A hemoglobina é composta por 4 grupos heme. Cada
eritropoetínico causado pela baixa tensão de oxigênio, gupo heme tem a capacidade de transportar uma molécula de
têm elevação da ordem de 0,2 a 0,3 M/microlitro por oxigênio, que se liga reversivelmente ao ferro e a um resíduo de
Km de altitude. histidina. Esta ligação reversível constitui a base do transporte
de oxigênio.
• Hematócrito – (Hct) é volume da massa de eritrócito
de uma amostra de sangue, expressa em porcentagem
(ou através de fração decimal) do volume desta A anemia com aumento da produção de reticulócitos
amostra. Valores de referência (%): homens 47 (+- 7,0) (reticulocitose) possui resposta medular adequada. As anemias
e mulheres 42 (+- 6,0). hemolíticas causadas por defeitos das hemácias
(hemoglobinopatias, membranopatias e enzimopatias) e por
• Hemoglobina: (Hb) segundo a Organização Mundial “agressão” às hemácias, imunológica e física (fragmentação),
de Saúde é considerado anemia quando um adulto são os melhores exemplos.
apresentar Hb < 12,5g/dl, uma criança de 6 meses a 6
A anemia com diminuição da produção de reticulócitos
anos Hb < 11g/dl e crianças de 6 anos a 14 anos, uma
(reticulocitopenia) possui resposta medular inadequada. É
Hb < 12g/dl.
prontamente classificada pela alteração do volume das hemácias
• VCM (Volume Corpuscular Médio): é o índice que em microcíticas (anemia ferropênica) e macrocíticas (anemia
ajuda na observação do tamanho das hemácias e no megaloblástica).
diagnóstico da anemia: se pequenas (devido à falta de Por fim, as anemias normocíticas com reticulocitopenia
conteúdo) são consideradas microcíticas (< 82fl, para são associadas às doenças sistêmicas (doença renal crônica,
adultos), se grandes consideradas macrocíticas(> 98fl, doenças inflamatórias e doenças endrócrinas) e às doenças
para adultos) e se são normais, normocíticas (82 - medulares (aplasia pura de eritroblastos e anemia
98fl). Anisocitose: é denominação que se dá quando há sideroblástica).
alteração no tamanho das hemácias. As anemais
microcíticas mais comuns são a ferropriva e as Por outro lado, a aplasia de medula óssea pode
síndromes talassêmicas. As anemias macrocíticas mais acometer as demais classes celulares do sangue (principalmente
comuns são as anemias megaloblástica e perniciosa. O linfocitopenia, neutropenia, plaquetopenia).
resultado do VCM é dado em fentolitro. A macrocitose Tratamento Farmacológico da anemia e da neutropenia:
e a microcitose assumiram a posição de parâmetros
mais importantes para o diagnóstico diferencial Os fatores de crescimento hematopoiéticos (epoetina
laboratorial das anemias. No alcoolismo o VCM não alfa) orientam a divisão e a maturação da progênie das células
excede 106 fL. A macrocitose alcoólica não se nota ao primordiais pluripotentes. A eritropoetina, produzida pelos rins,
microscópio, sendo um achado da tecnologia. é o fator que regula a linhagem eritrocitária, e o sinal para sua
produção consiste em perda de sangue e/ou baixa tensão
• HCM (Hemoglobina Corpuscular Média): é o peso tecidual de oxigênio.
da hemoglobina na hemácia, ou em outras palavras, a Os fatores de estimulação de colônias (sargramostin,
quantidade média de hemoglobina por eritrócito. Seu filgrastim) regulam as divisões mielóides (neutrófilos) da
resultado é dado em picogramas. O intervalo normal é linhagem de leucócitos, sendo a infecção o principal estímulo
26-34pg para sua produção. A falta de fatores de estimulação de colônias
propicia a instalação de infecções bacterianas e virais. Desta
• CHCM (Concentração de Hemoglobina
maneira, a avaliação do hemograma, e quando necessário, do
Corpuscular Média): é a concentração da
mielograma, é importante para se chegar às causas de base de
hemoglobina dentro de uma hemácia. O intervalo
infecções recorrentes e de difícil erradicação, como aquelas que
normal é de 32 - 36g/dl. Como a coloração da hemácia
ocorrem em recém-nascidos (causadas por P. aeruginosa) que
depende da quantidade de hemoglobina elas são
apresentam deficiência dos elementos da linhagem de
chamadas de hipocrômicas (< 32), hipercrômicas (>
leucócitos, devido à falta de fatores de crescimento.
36) e hemácias normocrômicas (no intervalo de

1 Marcelo A. Cabral
ANOTAÇÕES EM FARMACOLOGIA E FARMÁCIA CLÍNICA

1) Epoetina Alfa
malformação fetal, ocasionando defeito no tubo neural e
O fármaco mimetiza a ação da eritropoetina natural, sendo
constituindo-se numa das mais comuns alterações congênitas. A
usada nas anemias associadas a uma resposta eritropoiética
deficiência de vitamina B12 inibe a função da metionina sintase
deficiente (anemia da insuficiência renal crônica). A
e da L-metilmalonil-coA mutase, gerando Hcy (homocisteína) e
eritropoetina alcança a medula óssea através da circulação
comprometendo as reações de metilação que levarão ao
sanguínea e estimula os precursores de hemácias a
desenvolvimento de patologias principalmente cérebrais e
proliferarem e diferenciarem, aumentando assim o número de
cardiovasculares de diferentes graus de severidade, podendo até
hemácias circulantes.
mesmo tornarem-se irreversíveis.
Sargramostim (GM-CFS) A principal causa de deficiência de vitamina B12
consiste em redução da absorção da vitamina, devido à
Estimula a mielopoiese. Tem sido usado para encurtar carência de fator intrínseco ou a condições que interferem na
o período de neutropenia e reduzir a morbidade em pacientes sua absorção no íleo. O fator intrínseco é uma proteína
submetidos à quimioterapia intensiva. Também é usado em secretada pelo estômago (células parietais) essencial para
pacientes submetidos a transplante de medula óssea autóloga. absorção da vitamina B12. Sua falta causa “anemia
Além disso, estimula a mielopoise em alguns pacientes com perniciosa”.
neutropenia cíclica, mielodisplasia, anemia aplásica ou
neutropenia associada a AIDS. A deficiência de folato é uma complicação comum de
doença do intestino delgado, que interfere na absorção do
2) Filgrastim (G-CSF) folato alimentar e na absorção do folato pelo ciclo
O fármaco estimula o fator de unidade formadora de enteroepático. Os folatos são essenciais para a síntese de DNA
colônias para granulócitos (CFU-G) para aumentar a produção visto que atuam como co-fatores na síntese de purinas e
de neutrófilos, além de intensificar as funções fagocíticas e pirimidinas. O álcool promove ação tóxica sobre as células
citotóxicas dos neutrófilos. É eficaz no tratamento da parenquimatosas do fígado (células responsáveis pela captação
neutropenia grave que surge após transplante de medula óssea de folato), constituindo a causa mais comum de eritropoiese
autóloga e quimioterapia em altas doses. Utilizado também megaloblástica por deficiência de folato A deficiência de
para converter a neutropenia resultante do tratamento de folato nunca ou raramente esta associada a anormalidades
aidéticos com zidovudina (AZT). neurológicas.
3) Trombopoetina Humana Recombinante (RHUTPO) Os preparados de vitamina B12 para uso terapêutico
contêm cianocobalamina ou hidroxicobalamina, visto que
Protótipo de fármaco (ainda em teste) que estimula apenas esses derivados permanecem ativos após
seletivamente a megacariocitopoiese, com conseqüente armazenamento. A vitamina B12 é disponível na forma pura
aumento do número de plaquetas. para injeção ou administração oral. A escolha de um preparado
5) Sulfato Ferroso deve basear-se sempre no reconhecimento da causa da
deficiência (dieta deficiente, deficiência de fator intrínseco,
É o mais barato dos preparados de ferro, e constitui o doença ileal) – em adultos, raramente a causa é dieta deficiente.
tratamento de escolha para a deficiência de ferro. A dose
máxima de ferro no tratamento da anemia ferropriva é de 200
mg por dia administrados em 3 doses de 65 mg para adultos. A Deve-se ter em mente o potencial de tratar incorretamente
injeção de ferro dextrano (intravenoso ou intramuscular) é um paciente portador de deficiência de vitamina B12 com ácido
utilizada quando há má absorção do ferro, intolerância grave ao fólico. A administração de grandes doses de ácido fólico pode
ferro oral e em pacientes com doença renal tratados com resultar em melhora aparente de anemia megaloblástica,
eritropoetina. A vitamina C estimula a absorção de ferro pelo entretanto, a terapia com folato não impede nem alivia os efeitos
instestino. Por outro lado, a tetraciclina forma um quelato neurológicos da deficiência de B12 que podem progredir e se
insolúvel de ferro, resultando em comprometimento da tornar irreversíveis. Por conseguinte, é importante determinar se
captação de ambas as substâncias. uma anemia megaloblástica é devida a uma deficiência de folato
ou de vitamina B12. A quantificação laboratorial de MMA
Perdas hemorrágicas pequenas e repetidas não causam (ácido metl-malônico) e Hcy (homocisteína) poderia ser útil
quadro de anemia aguda, mas esgotam as reservas de ferro, devido à possibilidade de diferenciação entre deficiência de
originando a anemia microcítica característica. vitamina B12 e deficiência de folatos. O MMA estará elevado
6) Vitamina B12 (cianocobalamina) e ácido fólico apenas na insuficiência de vitamina B12, enquanto a Hcy se
(ácido pteroilglutâmico) eleva na deficiência de vitamina B12 e também na de folatos.
São usados no tratamento da anemia megaloblástica
(eritrócitos macrocíticos anormais). A deficiência de vitamina Leucemias
B12 e/ou de ácido fólico resulta em síntese defeituosa de DNA
em qualquer célula em que estejam ocorrendo replicação e As neoplasias do tecido hematopoético são proliferações
divisão dos cromossomos. Como os tecidos dotados de maior clonais, originadas de células que sofre mutações na seqüência
taxa de renovação celular são os que exibem as alterações mais de bases do DNA, rearranjos cromossômicos com expressão
proeminentes, o sistema hematopoiético é especialmente inadequada de oncogenes, e/ou inibição de mecanismos de
sensível à deficiência dessas vitaminas. controle proliferativo. Sabe-se que elas decorrem de
Além disso, a deficiência de B12 provoca danos neuronais. predisposição genética, da interferência de retrovírus, da ação
A deficiência de vitamina B12 em gestantes aumenta o risco de
2 Marcelo A. Cabral
ANOTAÇÕES EM FARMACOLOGIA E FARMÁCIA CLÍNICA

prévia de drogas antiblásticas ou de exposição à radiação


ionizante. - dores reumáticas em crianças; e
As células neoplásicas amadurecem lenta e - gengivite hipertrófica.
incompletamente, mostram-se inapropriadas às funções
normais e desenvolvem desvios funcionais deletérios ao Na leucemia aguda o hemograma mostra pancitopenia,
microambiente, à proliferação das células normais e o diagnóstico diferencial de anemia aplásica se faz através
remanescentes e à global do organismo. Essas proliferações do exame clínico (dor óssea ou organomegalias). Além
culminam por desenvolver um acúmulo de células disso, pode apresentar blastos, promielócitos com bastões de
neoplásicas que, quando são próprias da medula, ou Auer.
invadem a medula, substituem parcial ou totalmente a
mielopoese normal. Leucemia Mielóide Crônica
Neoplasias, tanto linfóides como mielóides, quando se A LMC é a neoplasia decorrente da proliferação clonal
oiginam ou precocemente disseminam-se na medula óssea de célula hematopoética primitiva que sofreu a translocação
e, de modo sistemático ou usual, invadem o sangue recíproca em que os genes BCR e ABL passam a formar um
periférico, são ditas leucemias. Estas podem ser gene de fusão no cromossomo 22, denominado cromossomo
classificadas em leucemias agudas ou crônicas. Nas Ph (Philadélphia). O produto do gene BCR-ABL é uma
leucemis agudas, a proliferação faz-se a partir de células tirosinoquinase anormal que interfere de modo
primitivas da mielopoese ou de precurores linfóides, que leucemogênico na proliferação celular. A progênie
perdem a capacidade maturativa; a expansão dos clones é leucêmica conserva capacidade maturativa e tem
rápida e causa insuficiência hematopoética fatal se não for predominância proliferativa sobre a mielopoese normal, a
contida pelo tratamento. Nas leucemias crônicas, embora qual substitui progressivamente na medula, invade o sangue,
possam originar-se igualmente de evento oncogênico em e expande-se ao baço e ao fígado. Com o passar dos meses
células primtivas, a capacidade maturativa é mantida, a ou anos, surgem novas alerações cromossômicas, com
insuficiência hematopoética é tardia e a sobrevida medida subclones de malignidade progressiva, até que a medula fica
em meses ou anos. tomada de uma proliferação blástica, refratária a tratamento,
que leva rapidamente ao óbito por insuficiência
Leucemia Linfóide e Mielóide Agudas hematopoética.
A leucemia aguda (LA) pode ter origem linfóide (LLA) A leucemia mielóide crônica é rara na infância; a
ou mielóide (LMA). Na infância, predomina a LLA (85% incidência aumenta a partir da terceira década. A sobrevida
dos casos); no adulto a LMA (80% dos casos). A LA não mediana histórica é inferior a quatro anos. O transplante de
tratada causa insuficiência hematopoética progressiva, medula óssea (TMO), quando há doador compatível, pode
rapidamente fatal. A quimioterapia com protocolos de ser curativo. Com a evolução da doença, o paciente começa
indução, seguidos de longo período de manutenção, leva à a apresentar os sinais de doença crônica: astenia, anorexia,
remissão duradoura e à cura de 70% dos casos de LLA. emagrecimento, suores notunos; o diagnóstico é suspeitado
Com quimioterapia agressiva de indução, seguidas de doses ao notar-se esplenomegalia. Nessa altura o hemograma é
de consolidação, obtém-se redução de 70% dos casos de esclarecedor: há anemia, trombocitose, grande leucocitose à
LMA em pacientes abaixo de 60 anos; as recidivas, custa de toda a série mielóide, e basofilia, geralmente
contudo, são a regra, de modo que a curabilidade é inferior a acentuada. Faz-se exame citogenético para o cromossomo
20%. Havendo doador compatível, o transplante de medula Ph, ou exame de biologia molecular para a fusão BCR-
óssea é, muitas vezes, indicado e pode ser curativo. Em ABL, e com isso omprovar o diagnóstico e justificar o
pacientes idosos, as perspectivas de cura são quase nulas. tratamento medicamentoso e/ou TMO, ambos de preço
considerável.
Deve-se pensar em leucemia aguda quando forem notados:
O tratamento apropriado normaliza o quadro. Após
- empalidecimento ou outros sinais de anemia de rápida meses ou anos de manutenção eficaz, nota-se uma mudança
instalação, sem perda de sangue que a justifique; no aspecto do hemograma e uma progressiva deterioração
clínica. Surge anemia refratária, trombocitose, grande
- púrpura recente;
basofilia; a seguir, o hemograma converte-se aos poucos em
- febre ou outros sinais de infecção – é a apresentação um quadro semelhante ao de leucemia aguda: persiste a
clássica de LA; são sinais de pancitopenia (anemia, basofilia, surge anemia, trombocitopenia e um número
trombocitopenia e neutropenia); crescente de blastos. Este estágio caracteriza-se pela
refratariedade ao tratamento e a sobrevida usual é de três a
- dor óssea (40% dos casos) – pesquisá-la pela pressão seis meses.
digital do esterno;
Leucemia Linfocítica Crônica
- linfonodomegalias – presente em 60% dos casos de LLA e
raros em LMA; A LLC usual é uma proliferação clonal de linfócitos B,
com acúmulo de linfócitos pequenos de aspecto maduro, na
- esplenomegalia – o baço é palpável em 70 % dos casos de medula óssea, no sangue, nos órgãos linfóides,
LLA e em 30% de LMA; eventualmente noutros órgãos.
3 Marcelo A. Cabral
ANOTAÇÕES EM FARMACOLOGIA E FARMÁCIA CLÍNICA

A LLC é virtualmente inexistente na infância, raríssima


antes dos 30 anos, e aumenta de incidência com a idade, Atividade antitumoral demonstrada em
sendo muito comum após os 60 anos; predomina no sexo monoterapia;
masculino. Em um paciente assintomático, o hemograma
Diferentes mecanismos de ação;
indicado por motivo fortuito, mostra linfocitose de
moderada a considerável, sem outras alterações Toxicidades diferentes sobre tecidos normais;
significativas. Outras vezes o paciente consulta já por
Ausência de resistência cruzada.
sintomas da doença: mal-estar, perda de peso, suores
noturnos; há linfonodomegalias e esplenomegalia. Com o
envolvimento extenso da medula óssea, surgem anemias e
trombocitopenia progressivas. O número de linfócitos no
sangue pode ultrapassar 400.000/microlitro. Pode ocorrer
suscetibilidade a infecções.

A leucemia linfocítica crônica é incurável, mas, como


muitos casos são indolentes, a sobrevida mediana é de sete
anos. A quimioterapia, por ser paliativa, só deve ser
indicada para controlar sintomas e sinais que interfiram na
qualidade de vida do paciente. São drogas eficazes:
clorambucil, fludarabina, 2-cloro-deoxiadenosina e
combinações similares às usadas para a quimioterapia de
linfomas.
Tratamento farmacológico das Leucemias
1) Leucemia Linfocítica Aguda:

Tratamento de indução: vincristina mais prednisona.


Manutenção da remissão: mercaptopurina, metotrexato e
ciclofosfamida em várias associações.
Outros fármacos valiosos: asparginase, daunorrubicina,
carmustina, doxorrubicina, citarabina, alopurinol,
radioterapia cranioespinhal com metrotexato.
2) Leucemia Mielóide Aguda:
ЖЖЖЖЖЖ

Poliquimioterapia: citarabina e mitoxantrona ou


daunorrubicina ou idarrubicina.
Outros fármacos valiosos: metotrexato, tioguanina,
mercaptopurina, alopurinol, mitoxantrona, azacitidina,
ansacrina e etoposida.
3) Leucemia Linfocítica Crônica:

Clorambucil e prednisona, fludarabina.


Outros fármacos valiosos: alopurinol, doxorrubicina,
cladribina.
4) Leucemia Mielóide Crônica:

Imatinib, bissulfato ou interferon, transplante de medula


óssea.
Outros fármacos valiosos: vincristina, mercaptopurina,
hidroxiuréia, melfalan, interferon, alopurinol.
Associações de antineoplásicos resultam em maior taxa
de resposta. Para realizá-lo, os fármacos combinados devem
ter:

4 Marcelo A. Cabral
ANOTAÇÕES EM FARMACOLOGIA E FARMÁCIA CLÍNICA

Referências Bibliográficas

1. RANG, H. P. et al. Farmacologia. 4 edição. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2001;


2. KATZUNG, B. G. Farmacologia: Básica & Clinica. 9 edição. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2006;
3. CRAIG, C. R.; STITZEL, R. E. Farmacologia Moderna. 6 edição. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2005;
4. GOLAN, D. E. et al. Princípios de Farmacologia: A Base Fisiopatológica da Farmacoterapia. 2 edição. Rio de
Janeiro: Guanabara Koogan, 2009;
5. FUCHS, F. D.; WANNMACHER, L.; FERREIRA, M. B. C. Farmacologia Clínica. 3 edição. Rio de Janeiro: Guanabara
Koogan, 2004.
6. GILMAN, A. G. As Bases farmacológicas da Terapêutica. 10 edição. Rio de Janeiro: Mc-Graw Hill, 2005.
7. CONSTANZO, L. S. Fisiologia. 2 edição. Rio de Janeiro: Elsevier, 2004.
8. PORTH, C. M. Fisiopatologia. 6 edição. Rio de Janeiro: Ganabara Koogan, 2004
9. R, Failace. Hemograma: Manual de Interpretação. 4 edição. Rio de Jnaeiro: ARTMED, 2003.

ЖЖЖЖЖЖ

5 Marcelo A. Cabral
ANOTAÇÕES EM FARMACOLOGIA E FARMÁCIA CLÍNICA

15) TRATAMENTO FARMACOLÓGICO DA DOR COM OPIÓIDES

A dor é uma sensação protetora (fisiológica) bem como químicos. As vias neo-espinotalâmica e paleoespinotalâmica são
perturbação física e emocional desagradável, originada em usadas para transmitir a informação dolorosa ao cérebro.
receptores de dor (nociceptores) que respondem à muitos
O cérebro modula a dor, mediante vias eferentes
estímulos e ameaças a integridade tissular.
inibitórias neuroanatômicas, servindo-se dos peptídeos
Existem duas vias para a transmissão da dor: opióides endógenos. Assim, a sensação dolorosa é resultante
desses dois processos (transmissão dos impulsos nervoisos
- a via para dor rápida, discriminada de modo preciso, que se
pela via aferente e sua modulação pela via eferente).
movimenta diretamente do nociceptor para a medula espinhal
usando fibras Aб mielinizadas e a partir da medula espinhal Toda essa atividade nervosa está vinculada à presença
para o tálamo, usando o trato neo-espinotalâmico. de neurotransmissores, tanto na vias aferentes (substância P,
GABA, colecistocina, somatostatina e encefalinas) quanto
- a via para a dor conduzida de forma lenta e contínua,
nas eferentes (acetilcolina, dopamina, noradrenalina,
transmitida do nociceptor à medula espinhal utilizando fibras C
serotonina e encefalinas). É possível atuar sobre essas
não mielinizadas, e, a partir da medula espinhal para o tálamo,
substâncias endógenas. Assim, clonidina, agonista alfa-2-
empregando o trato paleoespinotalâmico com maior riqueza de
adrenérgico, produz significativa analgesia quando
circuitos e condução mais lenta.
administrada no líquido cefaloraquidiano; antidepressivos
O processamento central das informações de dor inclui: tricíclicos, preservadores de serotonina, modulam impulsos
descendentes do cérebro, reduzindo dor neuropática;
a) a transmissão do tálamo ao córtex somatossensorial,
baclofeno, composto gabaérgico, produz analgesia no
onde as informações de dor são percebidas e tratamento da neuralgia do trigêmeo não-responsiva a outros
interpretadas; agentes.
b) ao sistema límbico, em que os componentes
A reatividade emocional à dor corresponde à
emocionais da dor são vivenciados; e interpretação afetiva dessa sensação, de caráter individual,
c) transmissão aos centros do tronco cerebral, onde as influenciada por estados ou traços psicológicos, experiências
respostas do sistema nervoso autônomo são recrutadas. prévias e fatores culturais, sociais e ambientais. Esses fatores
são capazes de filtrar, modular ou distorcer a sensação
A modulação da experiência de dor ocorre por meio do dolorosa, que é aproximadamente igual em todos os
centro analgésico endógeno no mesencéfalo, nos neurônios indivíduos que possuem as vias nervosas íntegras.
noradrenérgicos pontinos e o núcleo da rafe magno na medula,
que envia sinais inibitórios aos neurônios do corno dorsal na No caso de muitas condições patológicas, a lesão
medula espinhal. O corno dorsal funciona como uma estação tecidual constitui a causa imediata da dor, havendo
relé (liga-desliga) de transmissão da dor. A transmissão no conseqüente liberação local de uma variedade de agentes
corno dorsal está sujeita a diversas influências moduladoras, químicos que se supõe irão atuar sobre as terminações
constituindo o mecanismo de “controle do portão”, ou seja, este nervosas, ativando-as diretamente ou potencializando sua
sistema regula a passagem de impulsos das fibras aferente sensibilidade a outras formas de estimulação.
periféricas para o tálamo através de neurônios de transmissão Levando-se em conta a intensidade da dor, a dor leve é
que se originam no corno dorsal. Os interneurônios inibitórios
preferencialmente tratada com analgésicos não opióides
são ativados por neurônios inibitórios descendentes ou por (AINES – AAS 1000mg ou paracetamol 1000mg). Para a
estimulação aferente não nociceptiva. Essa inibição descendente dor moderada ou para leve não responsivas às primeiras
é mediada principalmente por encefalinas, 5-HT, noradrenalina
medidas, usam-se associações entre analgésicos opióides e
e adenosina. Os opióides causam analgesia por ativar essas não-opióides (codeína 30mg e paracetamol 500mg). No
vias descendentes da dor, por inibir a transmissão aferente tratamento de dor intensa ou moderada não responsiva, são
do corno dorsal e por inibir a excitação das terminações preferíveis os analgésicos opióides (morfina intravenosa).
nervosas sensoriais da periferia.
É mais fácil prevenir a dor ou tratá-la bem
Cientificamente, a dor é encarada dentro do contexto precocemente do que tentar reverter a dor já instalada. O
da nocicepção. A nocicepção se refere à atividade do sistema
tratamento da dor instalada (analgesia) é mais difícil, pois já
nervoso aferente (que transporta o sinal da periferia ao SNC), foram desencadeados mecanismos envolvidos na
induzida por estímulos nocivos, tanto exógenos (mecânicos, sensibilidade dolorosa, intensificando a dor.
químicos, físicos e biológicos) quanto endógenos (inflamação,
aumento de peristaltismo, isquemia tecidual). Sua recepção em Realiza-se analgesia quando se atinge um estado em
nível periférico se dá em estruturas específicas, situadas nas que o indivíduo não sente mais dor. Já a anestesia significa
terminações nervosas livres denominadas nociceptores. Os a perda da sensação dolorosa e de outras sensações,
nociceptores são terminações nervosas receptivas que associada ou não a perda da consciência. Os analgésicos
respondem aos estímulos mecânicos, térmicos e químicos. suprimem a dor enquanto os anestésicos suprimem a
sensibilidade. Analgésicos e anestésicos atuam em diferentes
Os neurônios nociceptivos transmitem impulsos aos locais, desde o nociceptor periférico até o córtex cerebral,
neurônios do corno dorsal empregando neurotransmissores passando por estruturas de condução nervosa de dor.

1 Marcelo A. Cabral
ANOTAÇÕES EM FARMACOLOGIA E FARMÁCIA CLÍNICA

Mecanismos da dor e nocicepção:


sobre os receptores AMPA). Os impulsos nervosos
Os nociceptores polimodais (PMN) constituem o conduzidos pelas fibras Aб (de condução rápida e
principal tipo de neurônio sensorial periférico que responde localizada) são transportados do corno dorsal da medula
a estímulos nocivos. A maioria consiste em fibras C não espinhal ao córtex cerebral através da via neoespinotalâmica,
mielinizadas, cujas terminações respondem a estímulos enquanto os impulsos conduzidos pelas fibras C (de
térmicos, mecânicos e químicos. Os estímulos químicos que condução lenta) são comunicados ao córtex cerebral através
atuam sobre os PMN causando dor incluem a bradicinina, a da via paleoespinotalâmica.
5-HT e a capsaicina.
Os PMN são sensibilizados pelas prostaglandinas
(abaixam o limiar de excitabilidade), o que explica o efeito
dos AINES que inibem a ciclo-oxigenase (COX-1 e COX-2)
do ácido araquidônico das células inflamatórias
(araquidonato), e consequentemente reduzem a síntese de
prostanóides (PGE2 e PGI2).
Portanto, as prostaglandinas em si não causam dor, mas
potencializam acentuadamente o efeito de outros agentes na
produção da dor, como a 5-HT ou a bradicinina. Elas
sensibilizam as terminações nervosas a outros agentes, por
inibir os canais de potássio e ao facilitar a abertura dos
canais de cálcio (Ca+).
É importante assinalar que a própria bradicinina causa
liberação de prostaglandinas e, por conseguinte, exerce um 4) no córtex somatossensorial as informações de dor
poderoso efeito de “auto-sensibilização” sobre os aferentes são percebidas e interpretadas; já no sistema límbico os
nociceptivos. componentes emocionais da dor são vivenciados; e nos centros
De forma simplificada, o mecanismo de transmissão da do tronco cerebral, as respostas do sistema nervoso autônomo
dor pode ser explicado da seguinte maneira: são recrutadas.
1) os estímulos nocivos endógenos ou exógenos que
agem sobre o corpo causam a liberação pelas células locais
de substâncias (substância P, bradicinina, prostaglandinas,
neurocinina A e neurocinina B etc.) que incidirão sobre os
nociceptores ativando-os e/ou modulando sua atividade
excitatória.
2) os neurônios nociceptivos ativados transmitem
impulsos elétricos aos neurônios do corno dorsal da medula
espinhal através de fibras Aб e C.

5) O cérebro modula a dor diretamente mediante as


vias eferentes inibitórias, e indiretamente através da
Substância Gelatinosa. Essa modulação ocorre no corno
dorsal localizado na medula e denomina-se “sistema de
controle do portão”. Os neurônios inibitórios descendentes
utilizam principalmente a 5-HT para exercerem as suas
3) os corpos celulares dos neurônios nociceptivos sinápses. A substância ‘gelatinosa consiste em
efetuam sinapses com os neurônios do trato espinotalâmico interneurônios inibitórios curtos (utilizam encefalinas e
ao nível da medula espinhal, servindo-se para isso de GABA como neurotransmissores) que regulam a
neurotransmissores (principalmente do glutamato que age
2 Marcelo A. Cabral
ANOTAÇÕES EM FARMACOLOGIA E FARMÁCIA CLÍNICA

transmissão na primeira sinapse da via nociceptiva entre as


- o glutamato é liberado de neurônios aferentes primários e,
fibras nervosas primárias (Aб e C) e os neurônios de
ao atuar sobre os receptores AMPA, é responsável pela
transmissão do trato espinotalâmico. A substância gelatinosa
transmissão sináptica rápida na primeira sinapse no corno
é ativada pelos neurônios inibitórios descendentes ou por
dorsal.
estimulação aferente não nociceptiva. Por outro lado, ela é
inibida pelos estímulos nociceptivos das fibras C, de modo - o GABA é liberado por interneurônios da medula espinhal.
que a atividade persistente das fibras C (dor crônica) facilita Inibe a liberação de transmissores por terminações aferentes
a excitação dos neurônios do trato espinotalâmico que primárias no corno dorsal.
encaminham o impulso de dor ao cérebro.
- a 5-HT é o transmissor dos neurônios inibitórios que vão
desde o NRM (núcleo da rafe magna) até o corno dorsal.
- a noradrenalina é o transmissor da via inibitória do lócus
ceruleus até o corno dorsal e, possivelmente também, de
outras vias antinociceptivas.
- a adenosina tem dupla atividade ao regular a transmissão
nociceptiva, em que a ativação dos receptores A1 provoca
analgesia, enquanto a ativação dos receptores A2 exerce
efeito inverso.
Receptores opióides:
Existem três tipos de receptores opióides, denominados
µ, б e κ (mu, delta e capa), que medeiam os principais
efeitos farmacológicos dos opiácidos, inclusive alguns
efeitos indesejáveis tais como depressão respiratória,
euforia, sedação e dependência. Os opióides analgésicos são
em sua maioria agonistas dos receptores µ.
Os receptores б são provavelmente mais importantes na
6) as ações do sistema nervoso autônomo em resposta
periferia, mas também podem contribuir para analgesia,
ao impulso da dor consistem principalmente em elevação da
além de constituirem o local de ação de certos agentes
freqüência cardíaca, sudorese, etc.
psicoticomiméticos.
7) os opióides promovem analgesia ao excitar
Os receptores κ contribuem para a analgesia ao nível
indiretamente (através do núcleo da rafe magna – NRM) os
medular e podem induzir sedação e disforia, porém
neurônios da via descendentes que por sua vez ativam a
produzem relativamente poucos efeitos indesejáveis e não
substância gelatinosa; agem também diretamente nas
contribuem para a dependência. Alguns analgésicos são κ-
sinápses do corno dorsal e sobre as terminações periféricas
seletivos.
dos neurônios aferentes nociceptivos.
Todos os receptores opióides estão ligados através das
Mediadores químicos na via nociceptiva:
proteínas G à inibição da adenilatociclase. Além disso,
Os principais grupos de substâncias que estimulam as facilitam a abertura dos canais de K+ (causando
terminações nervosas na pele são a 5-HT, histamina, hiperpolarização) e inibem a abertura dos canais de Ca+
acetilcolina, bradicinina, ácido láctico, ATP, ADP, K+, (inibindo a liberação de transmissores).
prostaglandinas (potencializam a ação da bradicinina) e a
capsaicina (substância encontrada em pimentões e pimenta
malagueta). Fármacos não opióides (AAS, AINES, PARACETAMOL):
Transmissores e moduladores na via nociceptiva: Os medicamentos analgésicos não narcóticos por via
oral mais comuns são a aspirina, outros AINES e o
Dentre as substâncias destacam-se as taquicinas
paracetamol. A aspirina ou ácido acetilsalicílico atua em
(substância P, a neurocinina A e a neurocinina B) que estão
nível central e periférico, bloqueando a transmissão dos
distribuídas no sistema nervoso central e periférico, e
impulsos dolorosos. Também possui ação antipirética e anti-
possuem os seus respectivos receptores: NK1, NK2 e NK3.
inflamatória. A aspirina e outros AINES inibem várias
Esses receptores são um potencial alvo para novas drogas
formas de prostaglandinas através da inibição da
analgésicas (antagonismo), apesar de ainda só terem sido
ciclooxigenase. O paracetamol é uma alternativa aos
desenvolvidas em modelos animais de dor inflamatória.
AINES. Embora considerado como um equivalente da
Uma outra classe de moduladores são os peptídeos aspirina como agente analgésico e antipirético, não possui
endógenos beta-endrofina, met-encefalina, leu-encefalina e a propriedades anti-inflamatórias.
dinorfina. Esses peptídeos estão amplamente distribuídos no
Fármacos analgésicos semelhantes à morfina (opióides):
cérebro.
O termo opióide aplica-se a qualquer substância, seja
Outros mediadores:
endógena ou sintética, que produz efeitos semelhantes aos

3 Marcelo A. Cabral
ANOTAÇÕES EM FARMACOLOGIA E FARMÁCIA CLÍNICA

da morfina, que são bloqueados por antagonistas como a


deflagração dos interneurônios inibitórios. Os locais de
naloxona.
ligação de opióides nas vias descendentes moduladoras da
Análogos da morfina: são compostos cuja estrutura está dor são de importância particular, incluindo a medula rostral
intimamente relacionada com a da morfina, que são ventral, o lócus cerúleus e a área da substância cinzenta
frequentemente sintetizados a partir da morfina. Podem ser periaquedutal do mesencéfalo. Nesses locais, bem como em
agonistas (morfina, diamorfina ou heroína , e codeína), outras regiões, os opióides inibem diretamente os neurônios;
agonistas parciais (nalorfina e lrvalorfan) ou antagonistas todavia, os neurônios que enviam projeções para a medula
(naloxona). espinhal e inibem os neurônios transmissores da dor são
ativados pelas drogas. Foi constatado que essa ativação
Derivados sintéticos com estruturas não relacionadas (indireta) resulta da inibição de neurônios inibitórios em
com a morfina: petidina ou meperidina, fentanil, vários locais.
metadona, dextropropoxifeno, pentazocina, ciclazocina,
etorfina e buprenorfina.
Mecanismo de ação: todos os opióides agem através dos
seus receptores que estão amplamente distribuídos no
cérebro, e que pertencem à família dos receptores acoplados
à proteína G. Inibem a adenilato ciclase, reduzindo assim o
conteúdo intracelular de AMPC. Todos os três subtipos de
receptores exercem esse efeito, além de exercerem efeitos
sobre canais iônicos através de um acoplamento direto da
proteína G ao canal. Através desse mecanismo, os opióides
promovem a abertura dos canais de potássio e inibem a
abertura dos canais de cálcio regulados por voltagem, que
constituem os principais efeitos observados ao nível da

membrana. Esses efeitos sobre a membrana reduzem tanto a


excitabilidade neuronal (visto que a condutância do potássio Ação periférica-local
provoca hiperpolarização da membrana) quanto à liberação
de transmissores (devido à inibição da entrada de cálcio). A injeção de morfina na articulação do joelho após
Por conseguinte, o efeito global é inibitório ao nível celular. cirurgia produz analgesia eficaz, abalando o antigo princípio
de que a analgesia é exclusivamente um fenômeno central.
Os opióides possuem ação espinhal, supra-espinhal e Essa hipótese é sustentada pela identificação de receptores
periférica. “mu" funcionais nas terminações periféricas de neurônios
Ação espinhal sensitivos. Além disso, a ativação desses receptores
periféricos resulta em diminuição da atividade dos neurônios
Os agonistas opióides inibem a liberação de sensitivos e da liberação de transmissor.
transmissores excitatórios a partir dos nervos aferentes
primários e inibem diretamente o neurônio transmissor de Portanto, os opióides se ligam aos seus receptores e
dor do corno dorsal. Por conseguinte, os opióides exercem com isso causam analgesia por inibir a transmissão da via
um poderoso efeito analgésico diretamente na medula aferente no corno dorsal, por ativar as vias descendentes da
espinhal. dor, e por inibir a excitação das terminações nervosas
sensoriais na periferia,. Além disso, podem interferir na
interpretação afetiva da dor, devido sua ação ao nível do
sistema límbico.
Os principais efeitos farmacológicos da morfina são:
analgesia, euforia e sedação, depressão respiratória e
supressão da tosse, náusea e vômitos, constrição pupilar,
redução da motilidade gastrintestinal e liberação de
histamina causando broncoconstrição e hipotensão. Os
efeitos indesejáveis mais incômodos consistem em
constipação e depressão respiratória.
Agonistas e antagonistas dos receptores opióides:
Os opiódes variam não apenas na sua especificidade
com os diversos tipos de receptores, como também na sua
eficácia ao nível dos diferentes tipos de receptores. Assim,
alguns agentes atuam como agonistas em um tipo de
Ação supra-espinhal receptor e como antagonistas ou agonistas parciais em
Entretanto, os opióides aumentam a atividade em outros, produzindo um quadro farmacológico muito
algumas vias neuroniais, presumivelmente ao suprimir a complicado.

4 Marcelo A. Cabral
ANOTAÇÕES EM FARMACOLOGIA E FARMÁCIA CLÍNICA

Agonistas puros: este grupo inclui a maioria das drogas


Em geral, a dor aguda intensa (traumatismo,
típicas semelhantes à morfina. Todas possuem alta afinidade
queimaduras, dor pós-operatória) é tratada com fármacos
pelos receptores µ e, em geral, menor afinidade pelos
opióides potentes (morfina, fentanil) administrados por
receptores б e κ. Alguns fármacos deste tipo (codeína,
injeção. A dor inflamatória leve (artrite) é tratada com
metadona e dextropropoxifeno) são denominados agonistas
agentes anti-inflamatórios não-esteroidais (aspirina,
fracos, visto que seus efeitos máximos, tanto analgésicos
paracetamol), suplementados por agentes opióides fracos
quanto indesejáveis, são menores do que o da morfina e não
(codeína, dextropropoxifeno, pentazocina) administrados por
produzem dependência. Como exemplo de agonistas parciais
via oral.
e agonistas-antagonistas mistos são a nalorfina e
pentazocina. Dentre os antagonistas, os representantes são a A dor intensa (dor do câncer, a artrite grave, ou a
naloxona e a naltrexona. lombalgia) é tratada com opióides potentes administrados
por via oral, intratecal, epidural ou por injeção subcutânea. É
Tolerância e dependência:
comum o uso de sistemas de infusão controlados pelo
A tolerância aos opióides (isto é, aumento da dose paciente.
necessária para produzir determinado efeito farmacológico),
Fármacos adjuvantes no tratamento da dor:
desenvolve-se rapidamente. A dependência é um fenômeno
que envolve dois componentes separados: a dependência São medicamentos como os antidepressivos tricíclicos,
física e a dependência psicológica. A dependência física está os anticonvulsivantes e agentes ansiolíticos. As medicações
relacionada a uma síndrome de abstinência fisiológica e que antidepressivas tricíclicas (imipramina, amitriptilina e
parece estar estreitamente relacionada com a tolerância. A doxepina), que bloqueiam a remoção da serotonina da fenda
morfina também produz uma acentuada dependência sináptica, são capazes de produzir o alívio da dor em
psicológica, manifestada na forma de desejo mórbido pela algumas pessoas, principalmente nas neuralgias pós-
droga. herpéticas.
Uso clínico dos agentes analgésicos: A dor neuropática crônica frequentemente não
responde aos opióides, sendo tratada com agentes
A escolha e a via de administração dos agentes
antidepressivos tricíclicos (amitriptilina) ou outras drogas,
analgésicos dependem da natureza e da duração da dor. Com
como a carbamazepina e fenitoína.
freqüência, utiliza-se uma abordagem progressiva,
começando-se com agentes anti-inflamatórios não
esteroidais, suplementados em primeiro lugar por
analgésicos opióides fracos e, a seguir, por opióides fortes.

Referências Bibliográficas

1. RANG, H. P. et al. Farmacologia. 4 edição. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2001;


2. KATZUNG, B. G. Farmacologia: Básica & Clinica. 9 edição. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2006;
3. CRAIG, C. R.; STITZEL, R. E. Farmacologia Moderna. 6 edição. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2005;
4. GOLAN, D. E. et al. Princípios de Farmacologia: A Base Fisiopatológica da Farmacoterapia. 2 edição. Rio de
Janeiro: Guanabara Koogan, 2009;
5. FUCHS, F. D.; WANNMACHER, L.; FERREIRA, M. B. C. Farmacologia Clínica. 3 edição. Rio de Janeiro: Guanabara
Koogan, 2004.
6. GILMAN, A. G. As Bases farmacológicas da Terapêutica. 10 edição. Rio de Janeiro: Mc-Graw Hill, 2005.
7. CONSTANZO, L. S. Fisiologia. 2 edição. Rio de Janeiro: Elsevier, 2004.
8. PORTH, C. M. Fisiopatologia. 6 edição. Rio de Janeiro: Ganabara Koogan, 2004.

ЖЖЖЖЖЖ

5 Marcelo A. Cabral
ANOTAÇÕES EM FARMACOLOGIA E FARMÁCIA CLÍNICA

16) AGENTES ANESTÉSICOS GERAIS

Os anestésicos gerais são usados clinicamente em 2) diminuição da resposta pós-sináptica por hiperpolarização
procedimentos cirúrgicos para tornar o paciente inconsciente da membrana através da ativação dos canais de K+; e
e insensível à estimulação dolorosa. São administrados
3) ativação direta dos receptores GABAa aumentando o
sistemicamente e exercem seus principais efeitos sobre o
fluxo de cloreto.
sistema nervoso central, diferente dos anestésicos locais, que
atuam ao bloquear a condução de impulsos nos nervos A região do cérebro mais sensível aos anestésicos
sensoriais periféricos. parece ser constituída pelos núcleos de transmissão
sensoriais talâmicos e pela camada profunda do córtex para
Os anestésicos podem ser divididos didaticamente em
a qual se projetam esses núcleos. Isto constitui a via seguida
duas classes, conforme sua via de administração: anestésicos
pelos impulsos sensoriais que alcançam o córtex , razão pela
inalatórios e anestésicos intravenosos. Os anestésicos
qual a ocorrência de inibição pode resultar em falta de
inalatórios geralmente são utilizados para a manutenção da
percepção do estímulo sensorial. À medida que aumenta a
anestesia. Os anestésicos intravenosos são empregados para
concentração de anestésico, todas as funções cerebrais são
induzir a anestesia, fornecer anestesia complementar ou
afetadas, incluindo o controle motor e a atividade reflexa, a
permitir anestesia nos procedimentos operatórios curtos.
respiração e a regulação autônoma. Por conseguinte, não é
Nas últimas décadas, foram reunidas evidências possível identificar um local alvo fundamental no cérebro,
consideráveis de que o principal alvo molecular de muitos responsável por todos os fenômenos da anestesia.
anestésicos gerais é o canal de cloreto-receptor GABAa, um
O estado anestésico, para fins clínicos consiste
importante mediador de transmissão sináptica inibitória. Os
em três componentes principais, que são a perda da
anestésicos inalatórios, os barbitúricos, os
consciência, a analgesia e o relaxamento muscular. Na
benzodiazepínicos, o etomidato e o propofol facilitam a
prática, esses efeitos são produzidos mais com uma
inibição mediada pelo GABA.
combinação de drogas do que com um agente anestésico
Além das ações sobre os canais de cloreto-GABA, foi único. Um procedimento comum seria produzir rápida
relatado que os anestésicos inalatórios causam inconsciência com um agente de indução por via intravenosa
hiperpolarização da membrana através da ativação dos (tiopental), manter a inconsciência e produzir analgesia com
canais de potássio regulados por ligantes. um ou mais agentes inalatórios (óxido nitroso, halotano),
que poderiam ser suplementados com um agente analgésico
Os neurônios na substância gelatinosa do corno dorsal
intravenoso (um opiácido), e produzir paralisia muscular
da medula espinhal são muito sensíveis à concentração
com um bloqueador neuromuscular (antracúrio).
relativamente baixa de anestésicos. A interação com
neurônios nessa região interrompe a transmissão sensitiva no A técnica anestésica varia, dependendo do tipo
trato espinotalâmico, incluindo a transmissão de estímulos proposto de intervenção diagnóstica, terapêutica ou
nociceptivos (sistema do portão). cirúrgica. Para procedimentos menores, utiliza-se a
denominada anestesia monitorizada ou sedação consciente,
Em nível celular, o efeito dos anestésicos consiste
que consiste na administração de sedativos por via oral ou
principalmente em inibir a transmissão sináptica, não sendo
parenteral em associação a anestésicos locais. Essa técnica
provavelmente importante na prática nenhum efeito sobre a
proporciona analgesia profunda, enquanto o paciente
condução axonal. A inibição na transmissão sináptica pode
conserva sua capacidade de manter as vias aéreas
ser devida a uma redução da liberação de
desobstruídas e de responder a comandos verbais. Para
neurotransmissores, inibição da ação do transmissor ou
procedimentos cirúrgicos mais extensos, a anestesia
redução da excitabilidade da célula pós-sináptica. Embora
frequentemente inclui a administração pré-operatória de
todos os três efeitos tenham sido descritos, a maioria dos
benzodiazepínicos, indução da anestesia com tiopental ou
estudos sugere que a redução da liberação de transmissor e a
propofol por via intravenosa e manutenção da anestesia com
resposta pós-sináptica diminuída constituem os principais
uma associação de fármacos anestésicos inalatórios e
fatores.
intravenosos.
De modo simplificado, podemos dizer que os
Efeitos farmacológicos dos agentes anestésicos:
anestésicos gerais agem em nível celular através de
interações com componentes da membrana (ainda não A anestesia envolve três alterações neurofisiológicas
totalmente identificados) que por sua vez alteram a ação dos principais: perda da consciência, perda da resposta a
canais de íons regulados por ligantes. Além disso, o estímulos dolorosos e perda dos reflexos.
principal alvo de muitos anestésicos gerais é o canal de
Em doses supra-anestésicas, todos os agentes
cloreto mediado pelos receptores GABAa. De tudo isso
anestésicos podem causar morte em conseqüência da perda
resulta a inibição da transmissão sináptica em locais
dos reflexos cardiovasculares e da paralisia respiratória.
específicos do SNC, uma vez que ocorre:
Em nível celular, os agentes anestésicos afetam mais a
1) a redução da liberação de transmissores excitatórios;
transmissão sináptica do que a condução axonal. Tanto a
liberação de transmissores excitatórios quanto a resposta dos
1 Marcelo A. Cabral
ANOTAÇÕES EM FARMACOLOGIA E FARMÁCIA CLÍNICA

receptores pós-sinápticos são inibidas. A transmissão


Efeitos sobre o sistema cardiovascular:
inibitória mediada pelo GABA é potencializada por alguns
anestésicos. O halotano, o desfluano, o enflurano e o sevoflurano
reduzem a pressão arterial média em proporção direta à sua
Embora todas as partes do sistema nervoso sejam
concentração alveolar.
afetadas pelos agentes anestésicos, os principais alvos
Os anestésicos inalatórios alteram a freqüência cardíaca
parecem ser o hipotálamo, o córtex e o hipocampo.
diretamente ao alterar a freqüência de despolarização do
A maioria dos agentes anestésicos provoca depressão nodo sinusal, ou, indiretamente, ao deslocar o equilíbrio da
cardiovascular através de efeitos sobre o miocárdio e os atividade do sistema nervoso autônomo. Com freqüência
vasos sanguíneos, bem como no sistema nervoso. Os agentes verifica-se a ocorrência de bradicardia com o uso do
anestésicos halogenados provavelmente causam disritmias halotano, provavelmente através de uma estimulação vagal.
cardíacas, acentuadas pelas catecolaminas circulantes. Quando o nervo vago é estimulado, ocorre a liberação de
acetilcolina que ativa os receptores muscarínicos M2. A
Agentes anestésicos inalatórios: acetilcolina diminui a corrente de entrada de Ca+ durante o
Anestésicos inalatórios são administrados por via platô do potencial de ação; e aumenta a corrente de saída de
inalatória nas fases de indução e manutenção da anestesia. K+, portanto encurtando a duração do potencial de ação e
Incluem o halotano, enflurano, isoflurano, sevoflurano e diminuindo indiretamente a corrente de entrada de cálcio.
desflurano e óxido nítroso. Juntos, esses dois efeitos diminuem a quantidade de Ca+ que
penetra nas células atriais durante o potencial de ação,
Os pulmões constituem a única via quantitativamente diminuindo o cálcio disparador e diminuindo a quantidade
importante através da qual os anestésicos inalatórios de Ca+ liberado do retículo sarcoplasmático.
penetram no corpo e dele saem. Os anestésicos inalatórios Todos os anestésicos inalatórios tendem a aumentar a
são, sem exceção, moléculas lipossolúveis pequenas, que pressão atrial direita de um modo relacionado à dose,
atravessam com grande facilidade a membrana alveolar. Por refletindo a depressão da função miocárdica.
conseguinte, é a velocidade de liberação da droga para os
pulmões e a partir deles, através do ar inspirado e da Efeitos respiratórios:
corrente sanguínea, que determina o comportamento cinético À exceção do óxido nitroso, todos os anestésicos
global de um anestésico. A razão pela qual os anestésicos inalatórios atualmente utilizados provocam diminuição dose-
variam quanto ao seu comportamento cinético é que suas dependente do volume corrente e aumento da freqüência
solubilidades relativas no sangue e na gordura corporal respiratória. Todos os anestésicos inalatórios são depressores
variam de uma droga para a outra. A profundidade da respiratórios, sendo o sevoflurano e o enflurano os mais
anestesia é determinada pelas concentrações dos anestésicos depressores.
no sistema nervosos central, e este, por conseguinte, é
diretamente proporcional à presão parcial inspirada (PI). Os anestésicos inalatórios também deprimem a função
mucociliar nas vias aéreas. Por conseguinte, a anestesia
As velocidades de indução e a de recuperação são prolongada pode levar a um acúmulo de muco, resultando
determinadas por duas propriedades do anestésico: posteriormente em atelectasia (colapso de um segmento, lobo ou
solubilidade no sangue (medida pelo coeficiente de todo o pulmão) e infecções respiratórias.
partição sangue/gás que mede sua afinidade relativa pelo
sangue em comparação com o ar) e lipossolubilidade. Outros efeitos:
Os agentes com baixos coeficientes de partição Os anestésicos inalatórios diminuem a taxa metabólica do
sangue/gás, ou seja, baixa solubilidade no sangue, produzem cérebro. Todos os anestésicos inalatórios diminuem em graus
rápida indução e também rápida recuperação (óxido nitroso, variáveis, a taxa de filtração glomerular e o fluxo plasmático
desflurano), enquanto que os agentes com coeficientes de renal efetivo. Eles também reduzem o fluxo sanguíneo hepático,
partição sangue/gás elevados apresentam indução e variando de 15 a 45% do fluxo pré-anestesia.
recuperação lentas (halotano).
Toxicidade:
Os fármacos que possuem pequeno coeficiente
Os anestésicos gerais são fármacos perigosos, haja vista
sangue/gás também possuem menor potência anestésica.
que não possuem antagonistas farmacológicos para neutralizar
Os agentes com alta lipossolubilidade (halotano) níveis acidentalmente altos administrados ao paciente, e
acumulam-se gradualmente na gordura corporal e podem também por possuírem uma estreita janela terapêutica.
produzir ressaca prolongada se forem utilizados para uma
O halotano pode raramente causar hepatite grave num
operação de longa duração.
pequeno subgrupo de pacientes, que pode ser fatal.
Alguns anestésicos halogenados (halotano e
O metabolismo do enfurano e do sevoflurano resulta na
metoxiflurano) são metabolizados. Isto não é muito
formação de íons de fluoreto, levantando a questão de
importante na determinação de sua duração de ação, porém
nefrotoxicidade desses anestésicos.
contribui para a toxidade.
A hipertermia maligna é um distúrbio genético
A administração de respiração artificial com oxigênio
autossômico dominante dos canais de Ca+ dos retículos
diminui o tempo necessário para a recuperação de um estado
sarcoplasmáticos do músculo esquelético que afeta
anestésico.
indivíduos suscetíveis submetidos a anestesia geral com
agentes inalatórios e relaxantes musculares. Na síndrome da
2 Marcelo A. Cabral
ANOTAÇÕES EM FARMACOLOGIA E FARMÁCIA CLÍNICA
hipertermia maligna ocorre saída descontrolada de Ca+ dos
retículos, o que causa o rápido início de taquicardia e
hipertensão, rigidez muscular intensa (tetania), hipertermia, consciência, com hipotensão mínima, sem alteração na
hipercalemia e desequilíbrio ácido-básico com acidose. A freqüência cardíaca e com baixa incidência de apnéia.
hipertermia maligna representa uma causa rara, porém Mecanismo de ação: facilita a inibição mediada pelo GABA.
importante, de morbidade e mortalidade por anestésicos. O
tratamento consiste na administração de dantroleno (que
O propofol também se assemelha ao tiopental nas suas
impede a liberação de cálcio do retículo sarcoplasmático) e
propriedades; entretanto, tem a vantagem de sofrer
medidas apropriadas para reduzir a temperatura corporal e
metabolismo muito rapidamente, permitindo assim rápida
restaurar o equilíbrio eletrolítio e ácido-básico.
recuperação sem qualquer efeito de ressaca. A ocorrência de
Agentes anestésicos intravenosos: náusea e vômito no pós-operatório é menos comum. Ele
provoca acentuada redução da pressão arterial sistêmica
Os agentes anestésicos intravenosos pertencem a
durante a indução da anestesia, além de exercer efeitos
diferentes grupos farmacológicos, com estruturas químicas e
inotrópicos negativos acentuados sobre o coração.
mecanismos de ação diversificados. Compreendem os
Mecanismo de ação: facilita a inibição mediada pelo GABA.
barbitúricos (tiopental, metoexital), benzodiazepínicos
(midazolam, diazepam e lorazepam), propofol, etomidato, A cetamida não exerce seus efeitos através da
cetamida e analgésicos opióides (fentanil, sufentanil, facilitação da função do receptor GABAa, todavia pode
alfentanil, remifentanil, meperidina e morfina). atuar através do antagonismo da ação do neurotransmissor
excitatório, o ácido glutâmico, sobre o receptor NMDA. É o
Até mesmo os anestésicos inalatórios de ação mais
único anestésico intravenoso que possui propriedades
rápida, como o óxido nitroso, levam alguns minutos para
analgésicas e produz estimulação cardiovascular. Em geral,
agir, causando um período de excitação antes de a anestesia
a frequência cardíaca, a pressão arterial e o débito cardíaco
ser produzida. Já os anestésicos intravenosos atuam muito
estão significativamente aumentados. A cetamida produz
mais rapidamente, produzindo inconsciência em cerca de 20
estimulação cardiovascular através de excitação do sistema
segundos, logo que a droga atinge o cérebro a partir de seu
nervoso simpático central e, possivelmente, inibição da
local de injeção. Normalmente o tiopental, etomidato e o
recaptação de noradrenalina nas terminações nervosas
propofol são utilizados para indução da anestesia.
simpáticas. Este fármaco aumenta acentuadamente o fluxo
Outras drogas utilizadas como agentes de indução por sanguíneo cerebral, o cosumo de oxigênio e a pressão
via intravenosa incluem certos benzodiazepínicos, como o intracraniana, sendo potencialmente perigoso para aqueles
diazepam e o midazolam, que atuam menos rapidamente pacientes com pressão intracraniana já aumentada. Em
que as drogas citadas anteriormente, e possuem propriedades virtude da elevada incidência de fenômenos psíquicos pós-
sedativas e amnésicas. Mecanismo de ação: ativação dos operatórios associados ao seu uso, a cetamida não é
receptores GABAa. comumente utilizada em cirurgia geral.
Os analgésicos opióides em altas doses têm sido
utilizados para obter anestesia geral, particularmente em
pacientes submetidos à cirurgia cardíaca ou outra cirurgia de
grande porte, quando a reserva circulatória é mínima. Os
opióides causam analgesia por ativar as vias descendentes da
dor, por inibir a transmissão aferente do corno dorsal e por
inibir a excitação das terminações nervosas sensoriais da
periferia.
O droperidol, um antagonista da dopamina
relacionado com os agentes psicóticos pode ser utilizado em
combinação com um analgésico opiácido, como o fentanil
para produzir um estado de sedação profunda e analgesia
(conhecido como neuroleptanalgesia), em que o paciente
permanece responsivo a comandos e questões simples, mas
não responde a estímulos dolorosos nem tem qualquer
lembrança do procedimento. Essa técnica é utilizada para
pequenos procedimentos cirúrgicos, como endoscopia.
O tiopental pertence à classe dos barbitúricos
depressores do sistema nervoso central, sendo o único de
maior importância em anestesia. As ações do tiopental sobre
o sistema nervoso são muitos semelhantes à dos anestésicos
inalatórios, embora não possua nenhum efeito analgésico.
Mecanismo de ação: ativação dos receptores GABAa.
O etomidato passou a ser preferido ao tiopental em
virtude de sua maior margem entre a dose anestésica e a
dose necessária para produzir depressão respiratória e
cardiovascular. Este fármaco produz rápida perda de

3 Marcelo A. Cabral
ANOTAÇÕES EM FARMACOLOGIA E FARMÁCIA CLÍNICA

Referências Bibliográficas

1. RANG, H. P. et al. Farmacologia. 4 edição. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2001;


2. KATZUNG, B. G. Farmacologia: Básica & Clinica. 9 edição. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2006;
3. CRAIG, C. R.; STITZEL, R. E. Farmacologia Moderna. 6 edição. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2005;
4. GOLAN, D. E. et al. Princípios de Farmacologia: A Base Fisiopatológica da Farmacoterapia. 2 edição. Rio de
Janeiro: Guanabara Koogan, 2009;
5. FUCHS, F. D.; WANNMACHER, L.; FERREIRA, M. B. C. Farmacologia Clínica. 3 edição. Rio de Janeiro: Guanabara
Koogan, 2004.
6. GILMAN, A. G. As Bases farmacológicas da Terapêutica. 10 edição. Rio de Janeiro: Mc-Graw Hill, 2005.
7. CONSTANZO, L. S. Fisiologia. 2 edição. Rio de Janeiro: Elsevier, 2004.
8. PORTH, C. M. Fisiopatologia. 6 edição. Rio de Janeiro: Ganabara Koogan, 2004.

ЖЖЖЖЖЖ

4 Marcelo A. Cabral
ANOTAÇÕES EM FARMACOLOGIA E FARMÁCIA CLÍNICA

17) AGENTES ANETÉSICOS LOCAIS

Os anestésicos locais são fármacos que bloqueiam com muito mais afinidade ao sítio alvo de ligação do
reversivelmente a condução do impulso nervoso, entre eles, fármaco, o que lhe confere maior tempo de duração
aqueles envolvidos com estímulos nociceptivos. Seu anestésica. Alguns fármacos não-ionizáveis, como a
mecanismo de ação está ligado ao bloqueio dos canais de benzocaína, são permanentemente neutros, mas ainda têm a
sódio (Na+), impedindo a despolarização neuronal, capacidade de bloquear os canais de sódio e os potenciais de
mantendo a célula em estado de repouso. A anestesia local ação. Todavia, no caso desses fármacos, o bloqueio é fraco e
atua paralisando as terminações nervosas sensitivas não depende do pH extracelular.
periféricas, ou então, interrompendo a transmissão da
Introdução à fisiologia dos canais de sódio:
sensibilidade à dor entre as terminações nervosas
nociceptivas e o encéfalo. Como o próprio nome indica, são A propriedade de excitabilidade elétrica é que
utilizados principalmente para produzir bloqueio nervoso possibilita às membranas das células nervosas e musculares
local. gerar potenciais de ação propagados, que são essenciais para
a comunicação no sistema nervoso e para dar início à
Dentre os principais agentes anestésicos locais de
atividade mecânica no músculo cardíaco e estriado. Essa
emprego clínico encontram-se:
excitabilidade elétrica depende da existência de canais
- lidocaína: possui início de ação rápido e duração iônicos regulados por voltagem na membrana celular,
média (1 -2 horas) devido sua hidrofobicidade moderada. principalmente canais de Na+ que são regulados de tal
Sua ligação amida impede a degradação por esterases; maneira quando a membrana é despolarizada tornando-se
seletivamente permeável ao Na+.
- bupivacaína: possui início de ação lento e duração
prolongada (2 – 3 horas), pois é altamente hidrofóbica (> As duas maneiras pelas quais a função dos canais pode
potência). A levobupivacaína é um enantiômero da ser modificada são:
bupivacaína e possui maior segurança e menor efeito
- através do bloqueio dos canais; e
cardiotóxico;
- através da modificação do comportamento do
- prilocaína: possui início de ação médio e média
mecanismo de comporta.
duração, além de apresentar ação vasoconstritora intrínseca;
e Assim, o bloqueio dos canais de Na+ reduz a
excitabilidade, enquanto o bloqueio dos canais de K+ tende
- tetracaína (início de ação muito lento e duração
a aumentar. De forma semelhante, um agente que afeta o
prolongada).
sistema de comporta do Na+ de modo a aumentar a abertura
A benzocaína é um anestésico local peculiar de do canal tenderá a aumentar a excitabilidade, e vice-versa.
solubilidade muito baixa, usado na forma de pó seco para
Durante o início fisiológico ou propagação de um
tratamento de úlceras cutâneas dolorosas. A droga é liberada
impulso nervoso, o primeiro evento consiste numa pequena
lentamente e produz anestesia de superfície de longa
despolarização da membrana, produzida pela ação de
duração.
transmissores ou pela aproximação de um potencial de ação
Química dos anestésicos locias passando ao longo do axônio. Isso abre os canais de Na+,
possibilitando o fluxo de uma corrente de íons de Na+
Todos os anestésicos locais possuem três estruturas:
dirigida para o interior da célula, que despolariza ainda mais
um grupo aromático, um grupo amina e uma ligação éster ou
a membrana.
amida unindo esses dois grupos. A estrutura do grupo
aromático influencia a hidrofobicidade (lipossolubilidade)
do fármaco, a natureza do grupo amina influencia a
velocidade de início e a potência do fármaco, e a estrutura
do grupo amida ou éster influencia a duração de ação e os
efeitos colaterais do fármaco.
O acréscimo de substituintes ao anel aromático ou ao
nitrogênio amino pode alterar a hidrofobicidade do fármaco,
que por sua vez afeta a facilidade com que o fármaco
atravessa as membranas das células nervosas para alcançar o
seu alvo, que é o lado citoplasmático do canal de sódio
regulado por voltagem. Um anestésico local efetivo deve
distribuir-se e difundir-se na membrana e, por fim, dissociar-
se dela; as substâncias que têm mais tendência a sofrer esses
processos possuem hidrofobicidade moderada.
Os anestésicos locais neutros atravessam as membranas
com muito mais facilidade do que as formas com cargas
positivas. Todavia, as formas com cargas positivas ligam-se
1 Marcelo A. Cabral
ANOTAÇÕES EM FARMACOLOGIA E FARMÁCIA CLÍNICA

Por conseguinte, o processo é regenerativo, e o


corpo, devido à circulação limitada nessas áreas favorecer a
aumento na permeabilidade ao Na+ é suficiente para trazer o
ocorrência de hipóxia tecidual.
potencial da membrana próximo ao ENa+. Os canais de K+
abrem-se depois dos canais de Na+, e devido às O cloridrato de fenilefrina é um agonista alfa-
concentrações intracelulares elevadas e extracelulares baixas adrenérgico puro que é ocasionalmente usado para o
do íon K+ ocorre uma corrente dirigida externamente bloqueio subaracnóide e é comercializado com a procaína
(corrente de saída repolarizante), que ocorre depois da para uso odontológico. Possui pouco efeito cardíaco direto.
interrupção da corrente de entrada de Na+, contribuindo para
Principais efeitos indesejáveis dos anestésicos locais:
o rápido término de potencial de ação.
Os principais efeitos indesejáveis dos anestésicos
Mecanismo de ação dos anestésicos locais:
locais afetam o sistema nervoso central e o sistema
Os anestésicos locais bloqueiam o início e a cardiovascular, constituindo a principal fonte de risco
propagação dos potenciais de ação, impedindo o aumento na quando os anestésicos locais são utilizados clinicamente.
condutância de Na+ voltagem-dependente. Apesar de
O principal efeito dos anestésicos locais sobre o
exercerem uma variedade de efeitos inespecíficos sobre a
sistema nervoso central consiste, paradoxalmente, em
função da membrana, sua principal ação consiste em
produzir estimulação (agitação e tremor que progridem para
bloquear os canais de Na+, o que fazem fisicamente ao
convulsões e depressão respiratória). A lidocaína e a
tampar o poro transmembrana através da sua ligação à parte
prilocaína possuem efeitos centrais menos pronunciados.
interna do canal, interagindo com radicais do domínio da
hélice transmembrana. Os efeitos cardiovasculares dos anestésicos locais
decorrem da depressão do miocárdio e da vasodilatação. A
A atividade anestésica local depende acentuadamente
redução da contratilidade miocárdia provavelmente resulta
do pH, sendo aumentada na presença de pH alcalino (isto é,
da inibição da corrente de Na+ no músculo cardíaco. A
quando a proporção de moléculas ionizadas é baixa – os
conseqüente redução do Na+ , por sua vez, diminui as
anestésicos locais são bases fracas) e vice-versa. Isto decorre
reservas intracelulares de Ca+, reduzindo a força de
do fato de que o composto precisa penetrar na bainha do
contração. A vasodilatação afeta principalmente as arteríolas
nervo e na membrana axônica para alcançar a extremidade
devido ao efeito direto sobre o músculo liso vascular e da
interna do canal de Na+ (onde se encontra o sítio de ligação
inibição do sistema nervoso simpático. A depressão
dos anestésicos locais). Como a forma ionizada não permeia
miocárdica e a vasodilatação combinadas levam a uma
a membrana, a sua penetração é muito precária em pH ácido.
queda da pressão arterial, que pode ser súbita ou
Uma vez no interior do axônio, é a forma protonada da potencialmente fatal, ou até mesmo parada cardíaca. A
molécula anestésica local que se liga ao canal, pois quando injeção intravascular inadvertida resulta em grande
ionizado o anestésico local possui maior afinidade pelos quantidade de anestésico na circulação sistêmica, e esses
canais de Na+. Essa dependência em relação ao pH pode ser fármacos se ligam rapidamente aos tecidos em
clinicamente importante, visto que os tecidos inflamados são despolarização (tecido cardíaco), ocasionando a depressão
freqüentemente ácidos e, portanto, levemente resistentes aos do músculo cardíaco.
agentes anestésicos locais.
Algumas vezes podem ocorrer reações de
Os anestésicos locais bloqueiam a condução na hipersensibilidade, geralmente na forma de dermatite
seguinte ordem: pequenos axônios mielinizados, axônios alérgica e, em raras ocasiões, como reação anafilática aguda.
não mielinizados, grandes axônios mielinizados. Por
As reações alérgicas ocorrem quase que apenas com os
conseguinte, a transmissão nociceptiva e simpática é
anestésicos locais do tipo éster: cocaína, benzocaína,
bloqueada em primeiro lugar.
cloroprocaína, procaína e tetracaína. Isso acontece porque o
Os anestésicos locais podem atuar como agentes metabolismo de todos os anestésicos locais ligados ao éster
antiarrítmicos, em virtude de sua capacidade de prevenir a leva à formação do PABA, um conhecido alergênico para
taquicardia ventricular e a fibrilação ventricular. Além disso, alguns indivíduos. Os anestésicos locais derivados de aminas
esses fármacos podem reduzir a contratilidade cardíaca pela são essencialmente isentos de propriedades alérgicas, tais
redução das reservas intracelulares de cálcio e diminuição da como o cloridrato de lidocaína (que é o anestésico local mais
entrada de cálcio. usado), o cloridrato de bupivacaína, o cloridrato de
levobupivacaína, a ropivacaína, o cloridrato de etidocaína, o
Os vasoconstritores (agentes simpaticomiméticos) são
cloridrato de mepicacaína e o cloridrato de prilocaína.
frequentemente adicionados aos anestésicos locais para
retardar a absorção sistêmica do anestésico no seu local de Curisodidade: a tetrodotoxina (TTX) é produzida por
injeção. Como retardam a absorção, esses medicamentos uma bactéria marinha e acumula-se nos tecidos do baiacu.
reduzem a toxicidade sistêmica do anestésico e o mantém
Ao se consumir o baiacu, seu fígado e ovários devem
em contato com as fibras nervosas por mais tempo,
ser retirados para se evitar envenenamento acidental pela
aumentando, portanto, o tempo de ação do medicamento.
tetrodotoxina, que se manifesta por fraqueza intensa,
Nesse sentido, a adrenalina é a mais empregada. Deve-se ter
evoluindo para paralisia total e morte. Essa toxina atua pelo
cuidado quando os anestésicos locais contendo essa amina
lado externo das membranas, diferentemente dos anestésicos
são administrados em pacientes com hipertensão.
locais.
Os vasoconstritores não são utilizados quando os
anestésicos locais são administrados nas extremidades do
2 Marcelo A. Cabral
ANOTAÇÕES EM FARMACOLOGIA E FARMÁCIA CLÍNICA

Referências Bibliográficas

1. RANG, H. P. et al. Farmacologia. 4 edição. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2001;


2. KATZUNG, B. G. Farmacologia: Básica & Clinica. 9 edição. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2006;
3. CRAIG, C. R.; STITZEL, R. E. Farmacologia Moderna. 6 edição. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2005;
4. GOLAN, D. E. et al. Princípios de Farmacologia: A Base Fisiopatológica da Farmacoterapia. 2 edição. Rio de
Janeiro: Guanabara Koogan, 2009;
5. FUCHS, F. D.; WANNMACHER, L.; FERREIRA, M. B. C. Farmacologia Clínica. 3 edição. Rio de Janeiro: Guanabara
Koogan, 2004.
6. GILMAN, A. G. As Bases farmacológicas da Terapêutica. 10 edição. Rio de Janeiro: Mc-Graw Hill, 2005.
7. CONSTANZO, L. S. Fisiologia. 2 edição. Rio de Janeiro: Elsevier, 2004.
8. PORTH, C. M. Fisiopatologia. 6 edição. Rio de Janeiro: Ganabara Koogan, 2004

ЖЖЖЖЖЖ

3 Marcelo A. Cabral
ANOTAÇÕES EM FARMACOLOGIA E FARMÁCIA CLÍNICA

18) FARMACOS UTILIZADOS NA INSUFICIÊNCIA CARDÍACA

A insuficiência cardíaca é a incapacidade do coração de agentes simpaticomiméticos (agonistas beta-adrenérgicos)


manter fluxo sanguíneo suficiente para atender às demandas provocam aumento do influxo de cálcio através de sua ação
metabólicas sem aumento anormal de pressões de sobre esses canais. Por outro lado, os bloqueadores do canal
enchimento ventricular. A insuficiência cardíaca pode de cálcio reduzem esse influxo e diminuem a contratilidade.
decorrer de anormalidades de esvaziamento ou de
O ciclo do cálcio e a contratilidade do miocárdio nos
enchimento ventricular (sístole ou diástole). Trata-se de uma
miócitos cardíacos são regulados por três mecanismos
condição altamente letal, cuja taxa de mortalidade de 5 anos
principais de controle:
é estimada, convencionalmente, em cerca de 50%.
- no sarcolema, o fluxo de cálcio é mediado por
A insuficiência cardíaca pode ser causada por diversas
interações entre a bomba de sódio e o trocador de sódio-
condições subjacentes, tais como a coronariopatia que
cálcio
resulta em infarto agudo do miocárdio; hipertensão;
cardiopatia valvar; condições degenerativas do músculo - no retículo sarcoplasmático, os canais e as bombas de
cardíaco; e excessiva necessidade de trabalho do coração cálcio regulam a extensão da liberação e recaptação de
decorrente de insuficiência renal ou em estados hiper- cálcio.
metabólicos. Esses processos mórbidos podem levar à
disfunção ou morte dos miócitos, com conseqüente - as influências neuro-humorais, particularmente a via
substituição do miocárdio por tecido fibroso e de sinalização beta-adrenérgica, também rmodulam o ciclo
do cálcio através desses canais e transportadores.
comprometimento da contratilidade.
A fisiologia da insuficiência cardíaca envolve interação Tratamento farmacológico da IC
entre dois fatores: O tratamento da insuficiência cardíaca objetiva
diminuição de sintomas, melhora da qualidade de vida e
a) a incapacidade do coração com insuficiência em
manter um débito cardíaco suficiente para sustentar as aumento da sobrevida.
funções corporais; e Quando a insuficiência cardíaca se torna moderada a
grave, a polifarmácia passa a ser um tratamento padrão e
b) o recrutamento de mecanismos compensatórios
visando à manutenção da reserva cardíaca, tais como: inclui, com frequência, diuréticos, digoxina, inibidores da
aumento da frequência cardíaca, contratilidade cardíaca e ECA e drogas bloqueadoras beta-adrenérgicas.
resistência vascular periférica, retenção de sal e água. Os Por outro lado, simpaticomiméticos e inibidores da
efeitos negativos dos mecanismos compensatórios devem ser fosfodiesterase aumentam a mortalidade de pacientes com
levados em consideração no tratamento farmacológico da insuficiência cardíaca, a despeito de seu efeito inotrópico
insuficiência cardíaca. positivo.
Os sintomas cardinais da insuficiência cardíaca são a A escolha dos fármacos é determinada em
dispnéia, cansaço, taquicardia, cardiomegalia, tosse, decorrência dos problemas causados pelos distúrbios
sintomas digestivos, anorexia, terceira bulha, estertores cardíacos (disfunção sistólica ou diastólica) e os
pulmonares e edema periférico. ocasionados pela ativação dos mecanismos
A insuficiência cardíaca pode ser classificada em compensatórios (retenção excessiva de líquido, ativação
direita, quando o sangue acumula-se na circulação sistêmica, inadequada dos mecanismos simpáticos, etc).
causando edema periférico e congestão dos órgãos
abdominais. Por outro lado, a insuficiência cardíaca 1) - Fármacos para tratamento dos distúrbios cardíacos:
esquerda ocorre quando o coração esquerdo não consegue
mover o sangue da circulação pulmonar para a circulação Os digitálicos (digoxina) têm sido um tratamento
sistêmica, conseqüentemente o sangue acumula-se na reconhecido da ICC há centenas de anos. As diversas formas
circulação pulmonar ocasionando edema pulmonar. de digitálicos são designadas como digitálicos cardíacos.
Eles melhoram a função cardíaca através:
Contratilidade do miocárdio
a) Do aumento da força e da potência da
A contração do músculo cardíaco decorre da interação
do cálcio com o sistema actina-troponina-tropomiosina, contração cardíaca (efeito mecânico dos
liberando, assim, a interação actina-miosina. Esse cálcio digitálicos); e
ativador é liberado do retículo sarcoplasmático. A b) Da diminuição da atividade do nodo sinoatrial
quantidade liberada depende da quantidade armazenada no e da condução através do nodo atrioventricular
retículo e da quantidade de cálcio desencadeante que penetra (efeitos elétricos dos digitálicos), o que reduz
na célula durante o platô do potencial de ação. Por sua vez, a a freqüência cardíaca e aumenta o tempo de
quantidade de cálcio desencadeante que penetra na célula enchimento diastólico.
depende da disponibilidade de canais de cálcio
(principalmente do tipo L) e da duração de sua abertura. Os
1 Marcelo A. Cabral
ANOTAÇÕES EM FARMACOLOGIA E FARMÁCIA CLÍNICA

Portanto, além de seus efeitos sobre a contratilidade do


miocárdio, a digoxina exerce efeitos autônomos através de Em outras palavras, o mecanismo básico de ação dos
sua ligação à bomba de sódio nas membranas plasmáticas glicosídeos cardíacos consiste em aumento da atividade
dos neurônios no sistema nervoso central e sistema nervoso vagal (retardando a condução atrioventricular) e inibição da
periférico. Esses efeitos consistem em inibição do efluxo bomba Na+/K+, aumentando assim a corrente de entrada de
nervoso simpático, sensibilização dos barorreceptores e Na+ e diminuindo a extrusão de cálcio pela troca Na+/Ca2+.
aumento do tônus parassimpático (estimulação vagal). O cálcio livre no interior da célula é responsável, entre
outras funções, pela contração do músculo cardíaco ao
Em virtude de seus efeitos bradicárdicos e inotrópicos
interagir com a troponina C. Ou seja, a interação entre os
combinados, a digoxina é um fármaco particularmente útil
filamentos de actina e miosina é normalmente bloqueada
para pacientes com IC e fibrilação atrial.
pela tropomiosina ligada ao filamento de actina, portanto,
Nas células cardíacas, as drogas digitálicas agem quando ocorre ligação do cálcio à troponina C, a
através da sua ligação à sódio-potássio-ATPase na conformação do complexo de troponina modifica-se e, em
membrana celular, inibindo a “bomba de sódio-potássio”. consequência, a tropomiosina desloca-se, permitindo a
Quando o sódio intracelular aumenta devido à inibição da ligação de pontes cruzadas de miosina à actina,
bomba de sódio-potássio pelos digitálicos, a troca de cálcio desencadeando o processo de contração.
intracelular por sódio extracelular realizada por um segundo
Os efeitos adversos são comuns e podem ser graves.
canal trocador de íons é inibida; em conseqüência disso,
Um dos principais inconvenientes do uso clínico dos
ocorre o aumento da concentração de cálcio no citoplasma.
glicosídeos cardíacos é a sua estreita margem entre a
Esse aumento de concentração facilita a interação do Ca+
eficácia e a toxicidade. A DL50 da digoxina é de 10 – 15 mg
com o complexo actina-troponina-tropomiosina
para adultos, e de 6 – 10 mg para crianças. A concentração
(aumentando força de contração muscular) além de
plasmática terapêutica da digoxina é de aproximadamente 1
aumentar as reservas do retículo sarcoplasmático.
ng/mL, sendo os efeitos tóxicos apresentados a partir de 2
O relaxamento do músculo cardíaco se dá mediante a ng/mL.
recaptação do Ca+ para o retículo sarcoplasmático, o que é
A digoxina administrada por via oral possui uma
realizado pela cálcio-ATPase.
biodisponibilidade de cerca de 75%. Uma minoria de
A bomba de sódio e potássio é uma das estruturas pacientes apresenta uma flora intestinal que metaboliza a
pertencentes ao sistema de regulagem hidroeletrolítica da digoxina ao metabólito inativo, a diidrodigoxina. Nesses
célula, sendo responsável, como o próprio nome diz, pela pacientes, é algumas vezes necessária a co-administração de
manutenção das concentrações iônicas do sódio e do antibióticos para descontaminar o intestino e, portanto,
potássio. A bomba localiza-se na membrana plasmática e facilitar a absorção oral da digoxina. Cerca de 70% do
depende de ATP para o transporte desses íons, fármaco são excretados de modo inalterado pelos rins (isso
principalmente do potássio, cujo trajeto vai contra um mostra a importância da preservação da função renal para
gradiente osmótico (o potássio é transferido do meio que não ocorra toxicidade farmacológica).
extracelular, onde é encontrado em pouca quantidade, para o
A digoxina interage com muitos fármacos. Os
interior da célula, que possui cerca de 30x mais potássio que
antagonistas beta-adrenérgicos diminuem a condução do
o meio externo). Essa bomba eletrogênica permite manter o
nodo AV, e o uso combinado de antagonistas beta e
potencial de membrana em torno de – 70 mV, através do
digoxina pode aumentar o risco de desenvolvimento de
carreamento de íons contra o gradiente de concentração. De
bloqueio AV de alto grau. Tantos os antagonistas beta
fato, bombeia-se um maior número de cargas positivas para
quanto os bloqueadores dos canais de Ca+ podem diminuir a
fora da célula (3 íons Na+ para o exterior, em contrapartida a
contratilidade cardíaca e atenuar os efeitos da digoxina. Os
2 íons K+ para o interior), deixando-se um déficit real de
diuréticos não poupadores de K+ podem aumentar a
íons positivos no interior, o que produz carga negativa na
afinidade da digoxina pela Na+/K+-ATPase e, portanto,
face interna da membrana celular.
predispor à toxicidade da digoxina. A co-administração de
digoxina com verapamil, quinidina ou amiodarona pode
aumentar os níveis de digoxina, devido ao impacto desses
fármacos sobre o volume de distribuição e/ou depuração
renal da digoxina.
O tratamento da toxicidade da digoxina baseia-se na
normalização dos níveis plasmáticos de K+ e na redução do
potencial de arritmias ventriculares. Além disso, a
toxicidade potencialmente alta da digoxina pode ser tratada
com anticorpos antidigoxina. Esses anticorpos formam
complexos com a digoxina, que são rapidamente eliminados
do organismo.
Cedilanide
O deslanósido é um dos glicosídios naturais da
Digitalis lanata; aumenta a contratilidade cardíaca, diminui a

2 Marcelo A. Cabral
ANOTAÇÕES EM FARMACOLOGIA E FARMÁCIA CLÍNICA

freqüência cardíaca (pela prolongação do período refratário


do nódulo AV) e alivia a sintomatologia clínica da Os diuréticos de alça atuam inibindo o transporte do
insuficiência cardíaca (congestão venosa, edema periférico, cloreto de sódio para fora do túbulo e para o interior do
etc.). A ação terapêutica começa entre 5-30 minutos após tecido intersticial ao inibir o transportador Na+/K+/2Cl- na
injeção intravenosa e o efeito máximo é obtido em 2-4 membrana luminal. Os diuréticos, em geral, promovem a
horas. excreção de sódio e potássio, diminuindo assim a
osmolaridade plasmática com consequente diminuição do
O cedilanide está indicado na insuficiência cardíaca
volume plasmático.
congestiva aguda e crônica de todos os tipos.
A espirolactona – diurético poupador de K+ - também
pode ser usada quando se quer evitar disritmias por perda
2) - Fármacos utilizados no tratamento dos distúrbios desse íon, verificada com os demais diuréticos. A
ocasionados pela ativação dos mecanismos espirolactona inibe competitivamente a ligação da
compensatórios: aldosterona aos receptores citosólicos de mineralcorticóides
nas células epiteliais do túbulo distal terminal e ducto
A diminuição do fluxo sanguíneo renal, provocada pela coletor do rim. A aldosterona intensifica a retenção de sal e
ICC, faz com que os rins produzam hormônios no intuito de de água à custa de uma excreção renal aumentada de
restabelecer o volume sanguíneo normal, pois nessa potássio e hidrogênio. A espirolactona aumenta a diurese ao
situação o órgão interpreta a diminuição do fluxo como se bloquear a retenção de sódio e de água, enquanto retém o
houvesse uma hemorragia aguda. Sendo assim, os rins potássio. Deve-se ter cuidado ao administrar a espirolactona
produzem renina, que circula até o fígado, onde converte o juntamente com IECA, pois estes também promovem a
angiotensinogênio em angiotensina-I. Esta circula para os retenção de potássio (hiperpotassemia).
pulmões onde é convertida em angiotensina-II pela ECA. A
Os inibidores da ECA (enalapril, captopril), que
angiotensina-II liga-se ao seu receptor e aumenta a
impedem a conversão da angiotensina I em angiotensina II
concentração intracelular de cálcio. Esse aumento provoca
pela ECA, além de inibirem a degradação das cininas que
vasoconstrição pelas células musculares lisas vasculares,
são agentes vasodilatadores, têm sido usados com eficácia
secreção de aldosterona pelas células da supra-renal e
no tratamento da insuficiência cardíaca, pois foi constatado
elevação do fluxo simpático central, além de aumentar a
que a maneira de melhorar a sobrevida desses pacientes não
sede.
consistia em corrigir diretamente a bomba cardíaca
Esses mesmos mecanismos adaptativos são prejudiciais
enfraquecida, mas em reverter a vasoconstrição periférica
na ICC. Nesse sentido, os diuréticos estão entre as
inapropriada em decorrência da ativação neuro-humoral.
medicações mais frequentemente prescritas para a
insuficiência cardíaca. Promovem a excreção do líquido de A atividade da renina eleva-se com frequência na
edema bem como ajudam a manter o débito cardíaco e a insuficiência cardíaca, em consequência da diminuição do
perfusão tecidual pela redução da pré-carga e por fluxo sanguíneo renal. O resultado final é um aumento da
possibilitar ao coração operar numa parte mais ideal da angiotensina II, o que causa vasoconstrição e aumento da
curva de Frank-Starling (“um aumento no volume diastólico produção da aldosterona, com um aumento subsequente na
final do ventrículo esquerdo leva a um aumento do volume retenção do sal e água pelo rim. Ambos os mecanismos
sistólico ventricular durante a sístole” – o volume tornam maior a carga de trabalho do coração. Alguns
diastólico aumentado aumenta o comprimento da fibra estudos mostraram que os inibidores da ECA podem aliviar
miocárdica. Em conseqüência, uma maior fração do os sintomas e aumentar a sobrevida em pessoas com ICC
comprimento do filamento de actina é exposta em cada sintomática.
sarcômero e, portantanto, torna-se disponível para a
Os bloqueadores dos receptores para a angiotensina
formação de pontes cruzadas de miosina quando o
II (losartan e valsartan) mais recentes têm a vantagem de
cardiomiócito é despolarizado – em outras palavras, a
não causar tosse, que para muitas pessoas é um efeito
tensão desenvolvida pelos miócitos cardíacos durante a
colateral problemático dos IECA. Os BRA foram
contração está diretamente relacionada com o
desenvolvidos pois descobiru-se que outras enzimas
comprimento das unidades sarcoméricas antes da
celulares (que não a angiotensina-I), como as cinases e a
contração.). São usados diuréticos tiazídicos
tripsina, também podem elaborar angiotensina-II.
(hidroclorotiazida) e de alça (furosemida, bumetanida,
ácido etacrínico, torasemida, piretanida) que são os mais O mecanismo de ação dos bloqueadores dos receptores
poderosos de todos os diuréticos. Em emergências como para a angiotensina pode ser explicado pelo bloqueio dos
edema pulmonar agudo, podem-se administrar por via receptores AT1 da angiotensina II (receptor acoplado à
endovenosa diuréticos de alça, como a furosemida ou proteína G), inibindo a ação do eixo da renina. O mensageiro
bumetanida. Quando administrados por via endovenosa, final do eixo renina-angiotensina é a angiotensina II, que se
essas drogas agem rapidamente, reduzindo o retorno venoso liga ao receptor AT1 causando vasoconstrição e retenção
por vasodilatação, de modo que o débito ventricular direito hídrica, ambos levando ao aumento da pressão arterial. O
e as pressões vasculares pulmonares diminuem. Essa bloqueio do receptor AT1 resulta na redução da pressão
resposta à administração endovenosa de drogas é extra- arterial e nos efeitos benéficos na ICC.
renal e precede o início da diurese.
Os Beta-bloqueadores com eficácia clínica
Os diuréticos tiazídicos atuam ao inibir o co-
comprovada no tratamento da IC são: carvedilol, bisoprolol
transportador Na+/Cl- no túbulo contorcido distal.
e succinato de metoprolol. A terapia prolongada com os
3 Marcelo A. Cabral
ANOTAÇÕES EM FARMACOLOGIA E FARMÁCIA CLÍNICA

bloqueadores beta-adrenérgicos reduz a morbidade e a


mortalidade em pessoas com insuficiência cardíaca crônica, porque não aumenta significativamente o consumo de
pois a disfunção ventricular esquerda associa-se à ativação oxigênio, aumenta o débito tendo discreta alteração da
do sistema nervoso simpático e do sistema renina- freqüência cardíaca.
angiotensina-aldosterona. Por outro lado, a elevação crônica A ação da dobutamina no tratamento da ICC ocorre devido
dos níveis de noradrenalina foi demonstrada como causando a ativação da adenil-cliclase, responsável pela produção de
a morte das células musculares cardíacas e disfunção AMP cíclico - ativa a proteína-quinase - estimula a
ventricular esquerda progressiva, associando-se a mau fosforilação do canal de cálcio - aumenta o influxo de cálcio
prognóstico na insuficiência cardíaca. Os efeitos resultantes para o interior da célula muscular cardíaca - levando ao
de bloqueio dos receptores beta-1 incluem diminuição de aumento da contração do miocárdio.
freqüência e força contrátil cardíacas, consequentemente Devido aumentar a condução atrioventricular, deve ser
reduzindo o débito e o consumo de oxigênio cardíacos, utilizada com cuidado na fibrilação atrial. Pode ocorrer
justificativa para uso desses bloqueadores em cardiopatia tolerância com o uso prolongado, e, possui outros efeitos
isquêmica, insuficiência cardíaca, hipertensão arterial e adversos semelhantes aos da adrenalina.
arritmias cardíacas. O uso de fármacos betagonistas no tratamento da
insuficiência cardíaca deve ser encorajado apenas em situações
Agonistas beta-adrenérgicos agudas e refratárias (quando não ocorre melhora significativa
A dobutamina, agonista dos receptores B1, é usada na com digitalicos, diuréticos e vasodilatadores) para adequação
insuficiência cardíaca congestiva aguda quando tenta-se a hemodinâmica a curto prazo, sempre lembrando que a maioria
redução urgente da pressão capilar pulmonar e da pressão de destes fármacos induz taquifilaxia e não apresenta efeitos
enchimento do átrio direito, juntamente com um aumento do benéficos validados sobre desfechos clínicos. A via de
débito cardíaco (se este estiver reduzido). A dobutamina administração é intravenosa em infusão. Não deve ser diluída
possui vantagem sobre outros fármacos simpaticomiméticos em solução alcalina.

Referências Bibliográficas

1. RANG, H. P. et al. Farmacologia. 4 edição. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2001;


2. KATZUNG, B. G. Farmacologia: Básica & Clinica. 9 edição. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2006;
3. CRAIG, C. R.; STITZEL, R. E. Farmacologia Moderna. 6 edição. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2005;
4. GOLAN, D. E. et al. Princípios de Farmacologia: A Base Fisiopatológica da Farmacoterapia. 2 edição. Rio de
Janeiro: Guanabara Koogan, 2009;
5. FUCHS, F. D.; WANNMACHER, L.; FERREIRA, M. B. C. Farmacologia Clínica. 3 edição. Rio de Janeiro: Guanabara
Koogan, 2004.
6. GILMAN, A. G. As Bases farmacológicas da Terapêutica. 10 edição. Rio de Janeiro: Mc-Graw Hill, 2005.
7. CONSTANZO, L. S. Fisiologia. 2 edição. Rio de Janeiro: Elsevier, 2004.
8. PORTH, C. M. Fisiopatologia. 6 edição. Rio de Janeiro: Ganabara Koogan, 2004

ЖЖЖЖЖЖ

4 Marcelo A. Cabral
ANOTAÇÕES EM FARMACOLOGIA E FARMÁCIA CLÍNICA

19) TRATAMENTO FARMACOLÓGICO DA DISRITMIA CARDÍACA

A contração e o relaxamento rítmicos do coração Fase 3 – ocorre a corrente de saída de K+ repolarizando a


baseiam-se no funcionamento das células especializadas do célula; e
sistema de condução do coração. As células especializadas
Fase 4 – ocorre a estabilidade elétrica dos miócitos atriais e
do nodo SA têm a mais rápida freqüência intrínseca de
ventriculares, com potencial de membrana em repouso
geração de impulsos e atuam como marcadoras do ritmo
sustentando em -90 mV e mantido pela corrente de fuga de
cardíaco. Os impulsos provenientes do nodo SA seguem
saída de K+ e pelos trocadores iônicos. Nessa fase os canais
através dos átrios até o nodo AV e daí ao feixe AV e ao
de Na+ necessários para a despolarização dos miócitos
sistema ventricular de Purkinje. O nodo AV constitui a única
atriais e ventriculares se recuperam completamente.
conexão entre os sistemas de condução dos átrios e
ventrículos. As implicações clínicas da ativação cardíaca
desordenada variam de palpitações assintomáticas a arrtimia
Os átrios e os ventrículos funcionam
fatal. O controle farmacológico das arritmias utiliza
independentemente uns dos outros, ao ser bloqueada a
medicamentos que exercem efeitos diretamente sobre as
condução do nodo AV.
células cardíacas inibindo a função de canais iônicos
específicos (canais de Na+ e de Ca+) ou alterando o aporte
autônomo do coração (bloqueio dos receptores beta-
Fig. 01 – Sistema de condução cardíaco
adrenérgicos).

Fig. 02 – Relação entre o eletrocardiograma e o potencial de


ação ventricular

O potencial de ação do músculo cardíaco é dividido em


cinco fases:
Fase 0 – representa a despolarização rápida do miócito
induzida pela abertura dos canais de sódio controlados por
voltagem. Esses canais se fecham após 1 a 2 milissegundos;

Fase 1 – é o período de repolarização curto e rápido que


ocorre no pico de subida do potencial de ação, devido à
inativação da corrente de entrada do Na+;

Fase 2 – ocorre o equilíbrio final entre as correntes iônicas


de entrada (despolarização) e de saída (repolarização)
mantendo o miócito em um estado despolarizado. Durante O eletrocardiograma é utilizado para demonstrar
essa fase, o Ca+ entra na célula causando a liberação de mais alterações nos impulsos cardíacos através do registro de
Ca+ das reservas intracelulares e vinculando a potenciais elétricos em vários locais na superfície do corpo.
despolarização elétrica à contração mecânica do músculo, O registro do ECG reflete alterações na excitação do
em virtude da ação da actina e miosina; miocárdio. A compreensão básica do ECG é útil para
discutir as aplicações clínicas dos diversos agentes
antiarrítmicos.
1 Marcelo A. Cabral
ANOTAÇÕES EM FARMACOLOGIA E FARMÁCIA CLÍNICA

O eletrocardiograma normal contém três formas de


ondas elétricas: a onda P, o complexo QRS e a onda T. a Fisiopatologia da disfunção elétrica
onda P representa a despolarização atrial; o complexo QRS
Os distúrbios do ritmo cardíaco ocorrem em
representa a despolarização ventricular; e a onda T
conseqüência dos distúrbios na geração ou condução dos
representa a repolarização ventricular. O ECG não mostra de
impulsos do coração.
modo explícito a repolarização atrial, visto que a
repolarização atrial é “dominada” pelo complexo QRS. O 1) Defeitos na geração do impulso elétrico:
ECG também contém dois intervalos e um segmento: o
1.1 - automaticidade alterada em condições fisiológicas –
intervalo PR, o intervalo QT e o segmento ST. O intervalo
ocorre em função da estimulação provocada pelas
PR estende-se do início da onda P (despolarização inicial
catecolaminas sobre os receptores beta-1, ocasionando o
dos átrios) até o início da onda Q (despolarização inicial dos
aumento da freqüência cardíaca; ou pela estimulação do
ventrículos). Por conseguinte, o comprimento do intervalo
nervo vago que libera acetilcolina, ativando os receptores
PR varia de acordo com a velocidade de condução através
muscarínicos, com consequente diminuição da freqüência
do nodo AV. por exemplo, se um paciente tiver um bloqueio
cardíaca.
elétrico nodo AV, a velocidade de condução através do nodo
AV diminui, e o intervalo PR aumenta. O intervalo QT 1.2 automaticidade alterada em condições patológicas –
começa no inicio da onda Q e termina no final da onda T, nessa situação, as células marca-passo latentes assumem o
representando toda a seqüência de despolarização e papel do nodo sinuatrial como marca-passo do coração.
repolarização ventriculares. O segmento ST começa no final
da onda S e termina no início da onda T. Esse segmento, Um batimento ectópico ocorre quando as células
que representa o período durante o qual os ventrículos estão marca-passo latentes desenvolvem uma freqüência de
despolarizados, corresponde à fase do platô do potencial de disparo intrínseca, que é mais rápida do que a freqüência no
ação ventricular. nodo sinuatrial.

No ritmo sinusal normal, uma onda P precede cada A lesão tecidual direta (como o infarto) pode causar
complexo QRS, e os intervalos RR permanecem desorganização estrutural na membrana celular. As
relativamente constantes ao longo do tempo. membranas acometidas são incapazes de manter gradientes
iônicos, que são de suma importância na manutenção dos
Fig. 03 - Eletrocardiograma potenciais de membrana apropriados.
A perda da conectividade da junção comunicante
constitui outro mecanismo pelo qual a lesão tecidual resulta
em alteração da automaticidade.
1.3 – atividade deflagrada – uma pós-despolarização ocorre
quando um potencial de ação normal deflagra
despolarizações anormais adicionais. Se uma pós-
despolarização precoce for sustentada, pode resultar em um
tipo de arritmia ventricular, denominada “torsades de
pointes”, que representa emergência médica.

2) – Defeitos na condução do impulso


As disritmias cardíacas constituem distúrbios do ritmo
cardíaco relacionados a alterações na automaticidade, A função cardíaca normal requer a propagação
excitabilidade, condutibilidade ou refratariedade das células desobstruída e tempestiva de um impulso Elétrico através
especializadas no sistema de condução do coração (células dos miócitos cardíacos. Em condições patológicas, a
do nodo Sinoatrial, nodo Atrioventricular e Fibra de alteração da condução do impulso pode resultar de uma
Purkinje). combinação de três mecanismos: reentrada, bloqueio da
condução e vias acessórias.
Automaticidade designa a capacidade de geração
espontânea de um potencial de ação por parte das células Ocorre reentrada de um impulso elétrico quando um
marcadoras do ritmo cardíaco. Normalmente, o nodo circuito elétrico auto-sustentado estimula uma área do
sinoatrial é o marcador do ritmo do coração devido à sua miocárdio de modo repetitivo e rápido.
automaticidade intrínseca. Excitabilidade é a capacidade do O bloqueio da condução é caracterizado quando um
tecido cardíaco de responder a um impulso e gerar um impulso não consegue se propagar, devido à presença de
potencial de ação. Condutividade e refratariedade uma área de tecido cardíaco inexcitável. Essa área de tecido
constituem a capacidade do tecido cardíaco de conduzir os inexcitável pode consistir em tecido normal que ainda está
potenciais de ação. A condutividade relaciona-se à refratário, ou pode apresentar um tecido lesado por
capacidade de condução dos impulsos do tecido cardíaco e a traumatismo, isquemia ou cicatrização.
refratariedade indica as interrupções temporárias na
condutividade relacionadas à fase de repolarização do As vias acessórias são constatadas pela presença do
potencial de ação. Feixe de Kent, que é uma faixa do miocárdio que conduz
impulsos diretamente dos átrios para os ventrículos,
transpondo o nodo átrio-ventricular. O tecido ventricular
2 Marcelo A. Cabral
ANOTAÇÕES EM FARMACOLOGIA E FARMÁCIA CLÍNICA

desses pacientes recebe impulsos tanto da via de condução


normal quanto da via acessória. bloqueio seletivo dos canais de sódio ou de cálcio das células
despolarizadas.
Devido ao seu potencial de interferir na ação de
bombeamento do coração, as disritmias que se originam dos
ventrículos são consideradas mais graves do que as que se
Fármacos utilizados nas disritmias:
originam nos átrios.
As drogas antidisrítmicas agem modificando a
As disritmias sinusais originam-se do nodo SA,
formação e condução desordenadas dos impulsos que podem
consistindo na bradicardia sinusal (freqüência cardíaca < 60
induzir à contração do músculo cardíaco. Essas drogas são
batimentos por minuto), taquicardia sinusal (freqüência
classificadas em quatro grupos principais de acordo com o
cardíaca > 100 batimentos por minuto), parada sinusal
efeito da droga sobre o potencial de ação das células
(assistolia) e síndrome da doença sinusal (alternância de
cardíacas. Embora tenham efeitos semelhantes sobre a
períodos de bradicardia e taquicardia).
condução, drogas de uma categoria podem variar
As disritmias atriais originam-se de alterações na significativamente quanto aos seus efeitos hemodinâmicos.
geração de impulsos que ocorrem nas vias de condução ou
As drogas da classe I agem bloqueando os canais
no músculo dos átrios. Consistem em contrações atriais
rápidos de Na+, da mesma maneira que fazem os anestésicos
prematuras, flutter atrial (freqüência de despolarização atrial
locais. As drogas da classe I ligam-se aos canais mais
de 240 a 450 batimentos por minuto) e fibrilação atrial.
fortemente quando estes se encontram no estado aberto ou
As alterações na condução dos impulsos através do refratário e menos fortemente aos canais no estado de
nodo AV acarretam distúrbios na transmissão dos impulsos repouso. Por conseguinte, sua ação mostra a propriedade de
dos átrios aos ventrículos (bloqueio cardíaco de primeiro, “dependência do uso”, isto é, quanto mais frequentemente os
segundo e terceiro graus). canais são ativados, maior o grau de bloqueio produzido.
Elas afetam a condução dos impulsos, a excitabilidade e a
As alterações na condução dos impulsos do feixe de
automaticidade em graus variáveis, sendo, por isso,
HIS e do sistema de Purkinje causam alargamento e
divididas, ainda, em três grupos: IA, IB e IC.
alterações na configuração do complexo QRS do ECG.
As drogas da classe IA (quinidina, procainamida,
As disritmias ventriculares consistem em contração
disopiramida, moricizina) diminuem a automaticidade,
ventricular prematura (CVP) que é causada por um marcador
deprimindo a fase 4 do potencial de ação, tornam menor a
do ritmo ventricular ectópico, a taquicardia ventricular
condutividade, prolongando moderadamente a fase 0, e
(frequência de 70 a 250 batimentos por minuto) e a
prolongam a repolarização, estendendo a fase 3 do potencial
fibrilação ventricular (freqüência > 350 batimento por
de ação. Por serem eficazes na supressão dos focos ectópicos
minuto) que será fatal se não for tratada com êxito pela
e no tratamento das disritmias reentrantes, as referidas
desfibrilação.
drogas são usadas nas disritmias supraventriculares e
Em geral as bradiarritmias não são controladas com a ventriculares.
terapia farmacológica de longo prazo e podem demandar
As drogas da classe IB (lidocaína, fenitoína, tocainida,
estimulação elétrica cardíaca permanente (implantação de
mexiletina, aprindina) diminuem a automaticidade,
marca-passo). As taquiarritmias frequentemente podem ser
deprimindo a fase 4 do potencial de ação; têm pouco efeito
aliviadas com a terapia clínica de longo prazo.
sobre a condutividade, diminuem a refratariedade, tornando
Mecanismos gerais dos agentes antiarrítmicos menor a fase 2, e abreviam a repolarização, diminuindo a
fase 3. As drogas desse grupo são usadas unicamente no
Como as arritmias são causadas por uma atividade tratamento das disritmias ventriculares e têm pouco ou
marca-passo anormal ou por uma anormalidade na nenhum efeito sobre a contratilidade miocárdica.
propagação dos impulsos, a terapia das arritmias tem por
objetivo reduzir a atividade marca-passo ectópica e As drogas da classe IC (flecainida, encainida,
modificar a condução ou a refratariedade em circuitos de re- propafenona, indecainida) diminuem a condutividade,
entrada para impedir movimento circular. Os principais deprimindo acentuadamente a fase 0 do potencial de ação,
mecanismos disponíveis para atingir esses objetivos são: mas têm pouco efeito sobre a refratariedade ou a
repolarização. As drogas dessa classe são usadas nas
1 - o bloqueio dos canais de sódio; taquicardias supraventriculares e disritmias ventriculares
2 - o bloqueio dos efeitos autônomos simpáticos no coração; com risco de vida.
3 - o prolongamento do período refratário efetivo; e As drogas da classe II (propanolol, nadolol, atenolol,
timolol, acebutol, pindolol, esmolol) são drogas
4- o bloqueio dos canais de cálcio. bloqueadoras beta-adrenérgicas que agem amortecendo o
Os fármacos antiarrítmicos diminuem a automaticidade efeito sobre o coração da estimulação do sistema nervoso
dos marca-passos ectópicos em maior grau do que a do nodo simpático.
sinuatrial. Além disso, reduzem a condução e a Embora o coração seja capaz de bater por si próprio
excitabilidade e aumentam o período refratário nos tecidos sem inervação do sistema nervoso, as fibras tanto simpáticas
despolarizados em maior grau do que no tecido normalmente quanto parassimpáticas inervam o nodo SA e o nodo AV e,
polarizado. Isso é efetuado principalmente através do portanto, alteram a freqüência de automaticidade. A
estimulação simpa´tica libera noradrenalina, que se liga aos
3 Marcelo A. Cabral
ANOTAÇÕES EM FARMACOLOGIA E FARMÁCIA CLÍNICA

receptores beta1 adrenérgicos nos tecidos nodais. A ativação


desses receptores no nodo SA desencadeia um aumento na potencial de ação diminui a reentrada. Como potente agente
corrente marcapasso, que aumenta a freqüência de da classe I, a amiodarona bloqueia os canais de Na+ e,
despolarização da fase 4 e, consequentemente, leva a um portanto, diminui a freqüência de disparo nas células
disparo mais freqüente do nodo. A estimulação dos marcapasso; exibe bloqueio dos canais de Na+ dependente
receptores beta1 no nodo AV aumenta as correntes de Ca+ e de uso através de sua ligação preferencial aos canais que
K+, aumentando, assim, a velocidade de condução e estão na conformação inativada. A amiodarona exerce
diminuindo o período refratário do nodo. atividade antiarrítmica de classe II através do antagonismo
não-competitivo dos receptores alfa-adrenérgicos e beta-
Portanto, os antagonistas beta-1 afetam os potenciais
adrenérgicos. Como bloqueador dos canais de Ca+ (classe
de ação dos nodos SA e AV através das seguintes ações:
IV), a amiodarona pode causar bloqueio significativo do
a) Diminuem a freqüência de despolarização da fase nodo atrioventricular e bradicardia, embora, felizmente, o
4; e seu uso esteja associado a uma incidência relativamente
baixa de “torsade de pointes”.
b) Prolongam a repolarização.
O amplo espectro de ação da amiodarona é
A diminuição da freqüência da despolarização da fase 4 acompanhado de um conjunto de efeitos adversos graves,
resulta em automaticidade diminuída, o que, por sua vez, quando o fármaco é utilizado por longos períodos ou em
reduz a demanda de oxigênio do miocárdio. A repolarização altas doses, tais como: hipotensão, diminuição da
prolongada do nodo AV aumenta o período refratário contratilidade cardíaca, diminuição da função do nodo AV
efetivo, diminuindo ancidência de reentrada. ou SA, pneumonite, hiper ou hipotireoidismo, elevação das
Essas drogas diminuem a automaticidade, deprimindo a enzimas hepáticas, neuropatia periférica, disfunção testicular
fase 4 do potencial de ação; tornam menor a freqüência e a e pigmentação cutânea.
contratilidade cardíacas. O sotalol antagoniza não-seletivamente os receptores
Tais medicações são eficazes no tratamento das beta-adrenérgicos (ação de classe II) e também aumenta a
disritmias e taqui-disritmias supraventriculares secundárias à duração do potencial de ação ao bloquear os canais de K+
atividade simpática excessiva, mas não muito eficazes no (ação da classe III). Esse fármaco é utilizado nas arritmias
tratamento das disritmias graves, como a taquicardia ventriculares graves, particularmente em pacientes que não
ventricular recorrente. conseguem tolerar os efeitos colaterais da amiodarona. A
exemplo de outros antagonistas beta, o sotalol pode causar
As diferentes gerações de antagonistas beta- fadiga e bradicardia; e, à semelhança de outros agentes
adrenérgicos produzem graus variáveis de efeitos adversos. antiarrítmicos da classe III, pode induzir torsades de pointes.
Três mecanismos gerais são responsáveis pelos efeitos
adversos desses fármacos. Em primeiro lugar, o O bretílio, à semelhança da guanetidina, concentra-se
antagonismo dos receptores beta-2 adrenérgicos provoca nas terminações nervosas dos neurônios simpáticos,
espasmo do músculo liso, resultando em broncoespasmo, causando a liberação inicial de noradrenalina; todavia, a
extremidades frias e impotência. Esses efeitos são mais seguir, inibe a liberação adicional de noradrenalina. Esse
comumente causados pelos antagonistas beta não seletivos fármaco efetua uma simpatectomia química e, portanto,
de primeira geração (propanolol). Em segundo lugar, a exerce um efeito anti-hipertensivo. O bretílio também
exageração dos efeitos terapêuticos do antagonismo dos aumenta a duração do potencial de ação nas células
receptores beta-1 pode levar a efeitos inotrópicos negativos cardíacas normais e isquêmicas. Os locais de atividade
excessivos, bloqueio cardíaco e bradicardia. Em terceiro antiarrítmicas consistem principalmente nas fibras de
lugar, a penetração do fármaco no SNC pode provocar Purkinje e, secundariamente, nos miócitos ventriculares.
insônia e depressão. Não exerce efeito sobre o tecido atrial.
Cabe lembrar que, a acetilcolina diminui a freqüência As drogas da classe IV (verapamil, diltiazem,
cardíaca, devido à ação agonista sobre os receptores nifedipina, bepridil, nitrendipina, isradipina, nicardipina)
muscarínicos do nodo SA; por outro lado, a noradrenalina agem bloqueando os canais de cálcio sensíveis à voltagem,
aumenta a frequência ao ativar os receptores beta- deprimindo, assim, a fase 4 e alongando as fases 1 e 2.
adrenérgicos no nodo SA. Bloqueando a liberação intracelular dos íons cálcio,
As drogas da classe III (amiodarona, bretílio, sotalol, essas drogas reduzem a força de contração do miocárdio e
n-acetilprocainamida – NAPA) agem ampliando o potencial diminuem, assim, a necessidade miocárdica de oxigênio. São
de ação cardíaco e a refratariedade. São usadas no usadas para retardar a resposta ventricular nas taquicardias
tratamento das disritmias ventriculares graves. atriais e fazer cessar as taquicardias supraventriculares
paroxísticas reentrantes, quando o nodo AV funciona como
A amiodarona é principalmente um agente via de reentrada.
antiarrítmico de classe III, mas também atua como agente
das classes I, II e IV. Seu mecanismo de ação se dá através Esses fármacos atuam preferencialmente nos tecidos
da alteração da membrana lipídica na qual se localizam os nodais SA e AV, visto que esses tecidos marcapasso
canais iônicos e os receptores. Em todos os tecidos dependem das correntes de Ca+ para a fase de
cardíacos, a amiodarona aumenta o período refratário efetivo despolarização do potencial de ação. Em contrapartida, os
através do bloqueio dos canais de K+ responsáveis pela bloqueadores dos canais de Ca+ exercem pouco efeito sobre
repolarização da célula. Esse prolongamento da duração do
4 Marcelo A. Cabral
ANOTAÇÕES EM FARMACOLOGIA E FARMÁCIA CLÍNICA

os tecidos dependentes dos canais de Na+ rápidos, como as


fibras de Purkinje e o músculo atrial e ventricular. usados no controle das disritmias, como a taquicardia atrial,
flutter atrial e fibrilação atrial.
Como diferentes tecidos expressam subtipos diferentes
de canais de Ca+, e diferentes subclasses de bloqueadores A adenosina, um nucleosídeo endógeno presente em
dos canais de Ca+ interagem preferencialmente com todas as células, é usada para o tratamento endovenoso
subtipos diferentes de canais de Ca+, os diversos emergencial da taquicardia supra-ventricular paroxística que
bloqueadores dos canais de Ca+ exercem efeitos diferenciais envolve o nodo AV. Ela hiperpolariza o tecido de condução
em diferentes tecidos. A nifedipina exerce um efeito cardíaco interrompendo a condução nodal AV e torna mais
relativamente maior sobre a corrente de Ca+ no músculo liso lenta a descarga do nodo SA.
vascular, enquanto o verapamil e o diltiazem são mais
efetivos nos tecidos cardíacos.
Os agentes da classe IV podem provocar bloqueio
nodal AV ao reduzir excessivamente a velocidade de
condução. A administração de verapamil intravenoso a
pacientes em uso de beta-bloqueadores pode precipitar
ЖЖЖЖЖЖ
insuficiência cardíaca grave e levar a uma dissociação
eletromecânica irreversível.
Dois outros tipos de droga antidisrítmica, os
glicosídeos cardíacos e a adenosina, não são incluídos nesse
esquema de classificação.
Os glicosídeos cardíacos lentificam a freqüência
cardíaca (através do aumento da atividade vagal), sendo

Referências Bibliográficas

1. RANG, H. P. et al. Farmacologia. 4 edição. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2001;


2. KATZUNG, B. G. Farmacologia: Básica & Clinica. 9 edição. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2006;
3. CRAIG, C. R.; STITZEL, R. E. Farmacologia Moderna. 6 edição. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2005;
4. GOLAN, D. E. et al. Princípios de Farmacologia: A Base Fisiopatológica da Farmacoterapia. 2 edição. Rio de
Janeiro: Guanabara Koogan, 2009;
5. FUCHS, F. D.; WANNMACHER, L.; FERREIRA, M. B. C. Farmacologia Clínica. 3 edição. Rio de Janeiro: Guanabara
Koogan, 2004.
6. GILMAN, A. G. As Bases farmacológicas da Terapêutica. 10 edição. Rio de Janeiro: Mc-Graw Hill, 2005.
7. CONSTANZO, L. S. Fisiologia. 2 edição. Rio de Janeiro: Elsevier, 2004.
8. PORTH, C. M. Fisiopatologia. 6 edição. Rio de Janeiro: Ganabara Koogan, 2004

5 Marcelo A. Cabral
ANOTAÇÕES EM FARMACOLOGIA E FARMÁCIA CLÍNICA

20) FARMACOLOGIA DA ISQUEMIA CARDÍACA

A cardiopatia isquêmica é decorrente de balanço Já o infarto de um segmento miocárdio se dá quando há


inadequado entre a oferta e o consumo de oxigênio pelo o bloqueio de um vaso coronariano por trombose. Os
miocárdio. É causada por situações de diminuída oferta de miócitos cardíacos dependem do metabolismo aeróbico e, se
oxigênio (aterosclerose, trombose e espasmo coronariano) seu suprimento de oxigênio permanecer abaixo de um valor
ou de consumo excessivo de oxigênio (miocardites e crítico, sobrevém uma seqüência de eventos que conduzem à
acentuada hipertrofia miocárdica). Delas, a predominante é a morte celular por necrose, ou também por apoptose.
aterosclerose coronariana, associada ou não a trombose. Na
A extensão da necrose do miocárdio após lesão
prática médica, cardiopatia isquêmica é sinônimo de doença
isquêmica depende da ,massa do miocárdio suprida pela
arterial coronariana. É uma doença crônica, de origem
artéria ocluída, do tempo decorrido com oclusão total da
multifatorial, e com componente inflamatório bem definido.
artéria e do grau de circulação colateral.
A isquemia miocárdica resulta em angina ou infarto
A necessidade de oxigênio do miocárdio aumenta
do miocárdio.
quando ocorrem aumentos da freqüência e contratilidade
A angina de peito é a principal manifestação clínica da cardíacas, da pressão arterial ou aumento do volume
cardiopatia crônica. Ela ocorre quando o suprimento de ventricular. Esses eventos ocorrem frequentemente durante
oxigênio ao miocárdio é insuficiente para atender as suas exercícios físicos e durante a descarga simpática.
necessidades. A dor tem uma distribuição característica no
Tanto da fisiopatologia quanto a abordagem clínica da
tórax, braço e pescoço, sendo desencadeada pelo esforço ou
cardiopatia isquêmica em pacientes com coronáriopatia
pela excitação.
crônica (angina estável) diferem daquelas de pacientes com
Clinicamente são reconhecidos três tipos de angina: síndromes coronarianas agudas (angina instável, e infarto do
miocárdio com ou sem elevação do segmento ST do ECG).
- a angina estável caracteriza-se por dor previsível com o
esforço. É produzida pelo aumento da demanda sobre o Tratamento farmacológico da angina estável
coração, sendo devida a um estreitamento fixo dos vasos
Os três principais grupos de fármacos atualmente
coronarianos, quase sempre por ateroma.
aprovados para uso na angina estável (beta-bloqueadores,
- a angina instável é reconhecida por dor que ocorre com bloqueadores dos canais de cálcio e nitratos orgânicos)
esforços cada vez menores, culminando com o aparecimento diminuem a necessidade de oxigênio do miocárdio, ao
de dor em repouso. É causada por trombo de plaqueta- diminuir os determinantes da demanda do oxigênio:
fibrina associada a ruptura de placa ateromatosa, porém sem
- a freqüência cardíaca;
oclusão completa do vaso.
- a tensão da parede ventricular; e
- a angina variante é incomum e ocorre em repouso, sendo
causada por espasmo da artéria coronária, geralmente em - a contratilidade cardíaca.
associação com doença ateromatosa.
O tratamento da angina tem como principais objetivos
terapêuticos interromper ou evitar um episódio agudo e
aumentar a capacidade do paciente de efetuar exercícios
físicos. Esses objetivos podem ser atingidos ao se reduzir a
demanda global de oxigênio do miocárdio ou se aumentar o
suprimento de oxigênio em áreas isquêmicas.
1) As drogas bloqueadoras beta-adrenérgicas
(atenolol, propanolol, esmolol, nadolol e metaprolol) agem
como antagonistas que bloqueiam as funções do sistema
nervoso simpático mediadas pelos beta-receptores. Há dois
tipos de receptores beta: beta1 e beta2. Os receptores beta-1
são encontrados principalmente no coração, enquanto os
receptores beta-2 estão presentes nos músculos lisos
(brônquios, vasculatura, etc) e em outras partes do corpo. Na
angina, os principais benefícios das drogas bloqueadoras
beta-adrenérgicas derivam de seus efeitos sobre os
receptores beta-1 no coração, reduzindo a demanda de
oxigênio ao diminuir a freqüência e a contratilidade
cardíacas.
Os beta-bloqueadores não devem ser administrados
juntamente com os bloqueadores dos canais de cálcio. Além
disso, podem exacerbar o broncoespasmo em pacientes que

1 Marcelo A. Cabral
ANOTAÇÕES EM FARMACOLOGIA E FARMÁCIA CLÍNICA

apresentam asma ou obstrução crônica das vias respiratórias.


Os efeitos colaterais de ocorrência comum dos antagonistas A insuficiência cardíaca descompensada constitui uma
beta consiste me fadiga, letargia, insônia e impotência, contra-indicação para o uso de certos bloqueadores de
sendo está última ocasionada pelo bloqueio da vasodilatação cálcio, em virtude de seus efeitos inotrópicos negativos.
periférica mediada pelos receptores beta2-adrenérgicos.
3) A nitroglicerina (trinitrato de gliceril) e os
2) As drogas bloqueadoras dos canais de cálcio
nitratos de ação prolongada (mononitrato de isossorbida) são
(verapamil, diltiazem e nifedipina) são, às vezes, designadas
usados no alívio da dor anginal (ataque agudo) e da isquemia
como antagonistas do cálcio. O cálcio intracelular livre serve
miocárdica silenciosa. Constituem drogas vasodilatadoras
para ligar muitos eventos iniciados na membrana a respostas
que relaxam os vasos venosos e arteriais. A dilatação venosa
celulares, como a geração dos potenciais de ação e a
diminui o retorno venoso ao coração (pré-carga), reduzindo,
contração muscular. O músculo liso vascular não é provido
assim, o volume ventricular e a compressão dos vasos
do retículo sarcoplasmático e outras estruturas necessárias
subendocárdicos. Essas drogas também diminuem a tensão
para o armazenamento intracelular adequado de cálcio; em
na parede do ventrículo esquerdo, de tal modo que é
vez disso, baseia-se no influxo de cálcio do líquido
necessária menor pressão para bombear o sangue. O
extracelular para a célula, a fim de desencadear e manter a
relaxamento das artérias reduz a pressão contra a qual o
contração. No músculo cardíaco, a lenta corrente de cálcio
coração tem de bombear (pós-carga). Além dos seus efeitos
internamente dirigida contribui para o platô do potencial de
vasodilatadores, os nitratos são considerados como tendo um
ação e contratilidade cardíaca. A lenta corrente de cálcio é
efeito inibitório sobre a ativação e agregação das plaquetas
particularmente importante à atividade de marcação do ritmo
que pode contribuir para seus efeitos benéficos em pessoas
do nodo sinoatrial e às propriedades de condução do nodo
com coronariopatia.
atrioventricular. O efeito terapêutico dos antagonistas do
cálcio decorre da dilatação arterial coronária e periférica, O mecanismo de ação pode ser explicado pela
bem como da redução do metabolismo miocárdico associada liberação de óxido nítrico (NO) nas células do músculo liso
à diminuição da contratilidade miocárdica. Os bloqueadores vascular que estimula a enzima guanilil ciclase, responsável
dos canais de cálcio diminuem a força de contração pelo aumento dos níveis do segundo mensageiro GMPc e,
miocárdica, o que, por sua vez, reduz as necessidades de conseqüentemente, resulta no relaxamento do músculo liso
oxigênio do miocárdio. A inibição da entrada de cálcio no pela desfosforilação da cadeia leve da miosina. A
músculo liso arterial está associada a uma redução do tônus nitroglicerina relaxa todos os tipos de músculo liso,
arteriolar e da resistência vascular sistêmica, resultando em independentemente da causa do tônus muscular preexistente.
diminuição das pressões arterial e intraventricular. Como Ela praticamente não exerce nenhum efeito direto sobre o
resultado de todos esses efeitos, o estresse da parede músculo cardíaco ou esquelético.
ventricular esquerda diminui, com conseqüente redução nas
necessidades de oxigênio do miocárdio. Fig. 01 – Mecanismo de ação da Nitroglicerina
Os bloqueadores dos canais de cálcio diminuem a
demanda de oxigênio do miocárdio ao diminuir a resistência
vascular sistêmica e a contratilidade cardíaca. Em outras
palavras, a ligação da droga nos canais de cálcio tipo L
reduz a freqüência de abertura em resposta à despolarização.
Em conseqüência, observa-se acentuada redução na corrente
de cálcio transmembranosa associada, no músculo liso
vascular, a um relaxamento prolongado; e no músculo
cardíaco, a uma redução da contratilidade em todo o coração
e diminuição na freqüência do marca-passo do nodo sinusal
e na velocidade de condução no nodo atrioventricular. Disso
resulta a redução do metabolismo miocárdico com
conseqüente diminuição do consumo de oxigênio, e
relaxamento das artérias coronárias com conseqüente
aumento do influxo sanguíneo ao músculo cardíaco.
Cada uma das classes de antagonistas dos canais de
cálcio liga-se à subunidade alfa-1 do canal de Ca+ cardíaco,
porém em sítios distintos, cada um dos quais interage de
modo alostérico entre si e com a estrutura de comporta do
canal, impedindo indiretamente a difusão do Ca+ através de
seu poro no canal aberto.
Esses fármacos são empregado, sobretudo, no
tratamento do vaso espasmo coronariano crônico. Os
bloqueadores dos canais de cálcio aliviam o vasoespasmo
dos vasos coronários através da dilatação das artérias
coronárias epicárdicas e dos vasos de resistência arteriolares.

2 Marcelo A. Cabral
ANOTAÇÕES EM FARMACOLOGIA E FARMÁCIA CLÍNICA

A nitroglicerina é absorvida pela circulação portal e


destruída no fígado, quando administrada por via oral; por As estatinas inibem a enzima HMG CoA redutase, que
isso, é administrada por pílulas sublinguais ou aerossóis que é fundamental para a síntese hepática de colesterol. Essa
contornam a circulação portal. A absorção sublingual é redução na síntese de colesterol resulta em aumento da
rápida, e o alívio da dor tem início geralmente em 30 expressão hepática dos receptores LDL e, portanto, aumenta
segundos. A tolerância é uma consideração importante no a depuração das partículas de lipoproteína contendo
uso dos nitratos. A dor torácica que não é aliviada com 2 ou colesterol na corrente sanguínea. Os inibidores da HMG
3 comprimidos dentro de 30 minutos pode ser causada por CoA redutase estão contra-indicados para mulheres que
infarto agudo do miocárdio. estão grávidas ou em fase de lactação ou passíveis de
engravidar.
Outro aspecto importante é o fato de que o sindenafil
(viagra – que atua ao aumentar o GMPc, inibindo a sua
degradação pela isoforma 5 da fosfodiesterase) potencializa
Tratamento farmacológico da angina instável e do
a ação dos nitratos utilizados para a angina. Foi relatada a
infarto agudo do miocárdio sem elevação do segmento
ocorrência de hipotensão grave e de alguns casos de infarto
ST
do miocárdio em homens que fazem uso de ambas as drogas.
Recomenda-se um intervalo de pelo menos 6 horas entre o O tratamento farmacológico dessas formas de
uso de um nitrato e a ingestão de sildenafil. coronariopatia tem por objetivo aliviar os sintomas
isquêmicos e evitar a formação adicional de trombo no local
4) Aspirina
de ruptura da placa. Tipicamente são utilizados aspirina,
Como a ativação das plaquetas possui importância heparina, nitroglicerina e antagonistas beta-adrenérgicos.
crítica no processo de formação do trombo, os agentes Outros agentes antiplaquetários (por exemplo, antagonistas
antiplaquetários desempenham um papel central no GPIIb-IIIa e antagonistas do receptor de ADP das plaquetas)
tratamento de pacientes com coronariopatia. A aspirina inibe estão indicados para pacientes de alto risco, a fim de evitar a
irreversivelmente a cicloxigenase plaquetária, uma enzima formação adicional de trombos. Os agentes trombolíticos
necessária para ageração do composto pró-agregante, o estão contra-indicados para pacientes com angina instável e
tromboxano A2 (TXA2). Por conseguinte, a inibição do infarto agudo do miocárdio sem elevação do segmento
plaquetária que ocorre após a administração de aspirina ST.
persiste durante o tempo de sobrevida das plaquetas (cerca
Tratamento farmacológico do infarto agudo do
de 10 dias). Esse fármaco é utilizado para prevenir a
miocárdio com elevação do segmento ST
trombose arterial que resulta em acidente vascular ecerbral e
ataque isquêmico transitório, bem como o infarto do O tratamento farmacológico para esse tipo de patologia
miocárdio. A aspirina é mais efetiva como agente tem por objetivo a reperfusão imediata da artéria coronária
antiplaquetário seletivo quando administrada em baixas epicárdica ocluída. A aspirina e a heparina constituem o
doses e/ou a intervalos infreqüentes. Está contra-indicada tratamento padrão. Entretanto, quando utilizados
para pacientes com alergia conhecida ao fármaco; nesta isoladamente, esses agentes não são suficientes para
situação, indica-se o clopidogrel (um antagonista do receptor recanalizar uma artéria coronária ocluída. Existem duas
de ADP das plaquetas) como agente alternativo. abordagens terapêuticas: trombólise farmacológica; e
realização de angioplastia ou derivação da artéria coronária
5) Agentes hipolipêmicos (Sinvastatina e
de emergência.
Provastatina)
Para a realização da trombólise são empregadas a
A administração de fármacos que reduzem os níveis
estreptoquinase, a ateplase, tenecteplase e a reteplase.
séricos de colesterol LDL diminui o risco de eventos
cardiovasculares isquêmicos. A seleção de um agente
hipolipêmico específico baseia-se tanto em dados
provenientes de estudos clínicos quanto ao fenótipo lipídico
do paciente.

Referências Bibliográficas

1. RANG, H. P. et al. Farmacologia. 4 edição. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2001;


2. KATZUNG, B. G. Farmacologia: Básica & Clinica. 9 edição. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2006;
3. CRAIG, C. R.; STITZEL, R. E. Farmacologia Moderna. 6 edição. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2005;
4. GOLAN, D. E. et al. Princípios de Farmacologia: A Base Fisiopatológica da Farmacoterapia. 2 edição. Rio de
Janeiro: Guanabara Koogan, 2009;
5. FUCHS, F. D.; WANNMACHER, L.; FERREIRA, M. B. C. Farmacologia Clínica. 3 edição. Rio de Janeiro: Guanabara
Koogan, 2004.
6. GILMAN, A. G. As Bases farmacológicas da Terapêutica. 10 edição. Rio de Janeiro: Mc-Graw Hill, 2005.
7. CONSTANZO, L. S. Fisiologia. 2 edição. Rio de Janeiro: Elsevier, 2004.
8. PORTH, C. M. Fisiopatologia. 6 edição. Rio de Janeiro: Ganabara Koogan, 2004

3 Marcelo A. Cabral
ANOTAÇÕES EM FARMACOLOGIA E FARMÁCIA CLÍNICA

21) Fármacos utilizados no tratamento das alergias

As reações de hipersensibilidade constituem mecanismos Quadro semelhante, porém não mediado por IgE, é
imunológicos que, ao mesmo tempo, são promotores de defesa e denomindo de reação anafilactóide.
de destruição tecidual. Quando o antígeno (o elemento estranho)
Tratamento paramédico deve incluir a injeção de adrenalina
é combatido pelo anticorpo ou pela célula diretamente, surgem
(que causa relaxamento do músculo liso bronquiolar ao atuar
reações teciduais que podem variar de um simples prurido
sobre os receptores beta-2 e contração do músculo vascular ao
(coceira) até destruição completa, com necrose; essas reações
agir sobre os receptores alfa-1, aliviando tanto o broncoespasmo
são ditas "reações de hipersensibilidade".
quanto a hipotensão), administração de oxigênio e, se
Os vários tipos de hipersensibilidade podem ser classificados necessária, entubação durante o transporte até um hospital. Se
segundo a forma de reação imunológica: há angioedema profuso, uma traqueostomia de emergência pode
ser requerida para manter a oxigenação. O tratamento clínico da
1. Hipersensibilidade do tipo I - os anticorpos (IgE) reagem anafilaxia por um médico e no hospital objetiva tratar a reação
rápida e imediatamente à presença do antígeno; essa reação de hipersensibilidade celular, tanto quanto os sintomas. Drogas
provoca a ativação dos mastócitos, com liberação da histamina e antihistamínicas (que inibem os efeitos da histamina nos
de outras enzimas vasoativas, provocando vasodilatação e receptores desta substância) são frequentemente requeridas. A
exsudação; são reconhecidas duas formas de hipersensibilidade hipotensão é tratada com fluidos intravenosos e às vezes com
do tipo I: a imediata, cerca de 15 a 30 minutos após o contato drogas vasoconstritoras (noradrenalina).
com o antígeno, em que vemos as alterações anteriormente
citadas, e a tardia, observada 6 a 8 horas após o contato com o Em casos graves, tratamento imediato com adrenalina
antígeno, sendo caracterizada pela exsudação celular, pode ser essencial para salvar a vida do paciente. A dose de
principalmente de basófilos, eosinófilos, monócitos etc. O ataque é de 0,5 mL em solução milisemal por via subcutânea ou
choque anafilático é um exemplo de hipersensibilidade do tipo I intramuscular. Nos casos muito graves, recomenda-se injetar na
imediata, e exige intervenção clínica urgente. veia , lentamente, 0,1 mL de solução de adrenalina, diluído em
10 mL de solução salina 0,85%. A infusão intra-venosa deve ser
A Anafilaxia é uma reação alérgica sistêmica, severa e estabelecida antes do colapso vascular. Ocorrendo obstrução das
rápida, a uma determinada substância, chamada alergênico ou vias aéreas e não havendo tempo suficiente para esperar pela
alérgeno, caracterizada pela diminuição da pressão arterial, melhora em resposta à injeção intramuscular de adrenalina, e se
taquicardia e distúrbios gerais da circulação sanguínea, as vias não forem de fácil acesso, aplicar 0,5 mL de adrenalina,
acompanhada ou não de edema de glote. A reação anafilática diretamente na musculatura da lingua. Cuidados de suporte com
pode ser provocada por quantidades minúsculas da substância ventilação mecânica também podem ser requeridos
alergênica. O tipo mais grave de anafilaxia — o choque imediatamente. Em seguida, pode-se entrar com os corticóides
anafilático — termina geralmente em morte caso não seja (hidrocortisona, 100 mg de 6 em 6 horas) ou os antihistamínicos
tratado. (de 6/6 horas). Se a pressão ainda se encontrar em declínio ou se
já se encontrar em níveis críticos, pode-se adicionar ao soro uma
O chamado choque anafilático é uma emergência ou duas ampolas de noradrenalina.
médica em que há risco de morte, por causa da rápida constrição
das vias aéreas, que muitas vezes ocorre em questão de minutos Fig. 01 tratamento inicial do choque anafilático.
após o início do quadro. Os primeiros socorros adequados ao
choque anafilático consistem em obter cuidado médico
avançado imediatamente.
Os sintomas podem incluir estresse respiratório,
hipotensão, desmaio, coma, urticária, angioedema (inchaço da
face, pescoço e garganta) e coceira. Os sintomas estão
relacionados à ação da imunoglobulina e da anafilatoxina, que
agem para liberar histamina e outras substâncias mediadoras de
degranulação. A histamina induz à vasodilatação e ao
broncoespasmo (constrição das vias aéreas), entre outros efeitos.
Pode haver um colapso cardiovascular o que constitui uma das
manifestações clínicas mais graves. Aí encontraremos isquemia
miocárdica e arritmias ventriculares, ambas podendo causar ou
serem causadas por hipotensão.
É sabido também que a hipotensão com bradicardia é
2. Hipersensibilidade do tipo II - os anticorpos reagem contra
reação vagal; hipotensão com taquicardia é reação anafilactóide.
antígenos localizados nas membranas das células humanas
O rubor e a pele quente sugerem anafilaxia incipiente, sobretudo
normais ou alteradas; participam diretamente dessa reação o
se aparece um exantema. Palidez e pele fria sugerem reação
sistema complemento, provocando lise celular e tornando a
vasovagal, sobretudo quando acompanhadas por sudorese.
célula susceptível a fagocitose, e participam também as
imunoglobulinas do tipo G.
1 Marcelo A. Cabral
ANOTAÇÕES EM FARMACOLOGIA E FARMÁCIA CLÍNICA

3. Hipersensibilidade do tipo III - originada do complexo vênulas pós-capilares, o aumento do Ca+ citosólico provoca
formado pelo antígeno e o anticorpo quando estão ligados. Esse relaxamento do músculo liso ao induzir a síntese do óxido
complexo pode originar reações teciduais por ativar o sistema nítrico. Os receptores H1 são expressos primariamente nas
complemento, fazendo com que acione o seu mecanismo de células endoteliais vasculares e nas células musculares lisas.
cascata. Esses recpetores medeiam reações inflamatórias e alérgicas. As
respostas específicas à estimulação dos receptores H1 incluem:
4. Hipersensibilidade do tipo IV - são as hipersensibilidades edema, broncoconstrição e sensibilização das terminações
tardias, mediadas diretamente por células, mais especificamente nervosas aferentes primárias. Os receptores H1 também são
pelos linfócitos T. É a que ocorre na tuberculose e na maioria expressos em neurônios histaminérgicos pré-sinápticos no
dos granulomas causados por microorganismos de baixa núcleo túbero-mamilar do hipotálamo, onde atuam como auto-
virulência. O linfócito T entra em contato com antígenos dos receptores para inibir a liberação adicional de histamina. Esses
microorganismos, transformando-se em T1 e passando a neurônios podem estar envolvidos no controle dos ritmos
secretar uma série de citocinas que atuam diretamente no tecido, circadianos e no estado de vigília.
destruindo-o. Acredita-se que os linfócitos T sejam recrutados
pelos macrófagos para o local agredido. A histamina estimula a secreção de ácido gástrico e
estimula a função cardíaca através de sua ação sobre os
A hipersensibilidade ainda pode ser classificada em receptores H2. A ativaçãos desses receptores no estômago leva
imediata ou tardia, dependendo do tempo necessários para que a um aumento de Ca+ intracelular nas células parietais e resulta
os sintomas clínicos se tornem manifestos após exposição do em sercreção aumentada de ácido clorídrico pela mucosa
hospedeiro ao antígeno sensibilizante. gástrica. Nas células cardíacas, a histamina promove o influxo
de Ca+ nos miócitos, o que resulta em inotropismo positivo; e o
O tratamento da alergia (hipersensibilidade) consiste, aumento da taxa de despolarização da fase 4 produz aumento
conforme o caso, na administração de: cronotrópico.
a) antihistamínicos (hidroxizina, prometazina, loratadina, Ocorre prurido se a histamina for injetada na pele ou
cetiriza, fexofenadina etc); aplicada à base de uma vesícula. O prurido é causado pela
estimulação das terminações nervosas sensoriais.
b) agonistas adrenérgicos (adrenalina);
Em resumo, as principais funções fisiopatológicas da
c) estabilizadores de mastócitos (cromoglicato dissódico);
histamina são:
d) agentes imunossupressores (azatioprina e metotrexato);
a) atuar como estimulante da secreção de ácido gástrico (tratada
e) corticosteróides (dexametasona, prednisona, prednisolona e com antagonistas dos receptores H2 – cimetidina e ranitidina); e
betametasona);
b) atuar como mediador de reações de hipersensibilidade do tipo
f) vacinas para dessensibilização (aminovac). 1, como urticária, febre do feno (tratadas com antagonistas dos
receptores H1), ocasiões em que a liberação de histamina
Fármacos antihistamínicos: endógena provoca ardência e prurido cutâneos, seguidos de
acentuado calor e eritema, queda da pressão arterial e aumento
A histamina é encontrada na maioria dos tecidos do da freqüência cardíaca.
corpo, porém está presente em altas concentrações no pulmão e
na pele e em concentrações particularmente elevadas no trato A histamina é secretada quando os componentes do
gastrintestinal. Em nível celular, é encontrada em mastócitos e complemento C3a e C5a interagem com receptores de
basófilos, nas células enterocromafins da mucosa gástrica e em membrana específicos, ou quando o antígeno interage com IgE
certos neurônios do SNC que utilizam a histamina cono fixada a células.
neurotransmissor.
As vias oxidativas do fígado degradam rapidamente a
A histamina produz a sua ação por intermédio de um histamina circulante a metabólitos inertes. Um importante
efeito sobre receptores histamínicos específicos, que são de três metabólito da histamina, o ácido imidazolacético, pode ser
tipos principais: H1, H2 e H3. medido na urina, e o nível desse metabólito é utilizado para
estabelecer a quantidade de histamina liberada sistemicamente.
O receptor H1 ativa a hidrólise do fosfatidilinositol
mediada pela proteína G, resultando em aumento do IP3 e Antagonistas histamínicos compreendem bloqueadores
DAG. O IP3 desencadeia a liberação de Ca+ das reservas de diferentes receptores e inibidores da liberação mastocitária.
intracelulares, sumentando a concentração citosólica de Ca+ e Antagonistas H1 ou anti-histamínicos clássicos bloqueiam
ativando as vias distais. O DAG ativa a proteinocinase C, reversível, seletiva e competitivamente receptores H1, por
resultando em fosforilação de numerosas proteínas-alvo apresentarem semelhança estrutural com o agonista. Sua ação
citosólicas. Em alguns tecidos, como músculo liso brônquico, o preventiva é mais marcada que a curativa. Essa última é
aumento do Ca+ citosólico provoca contração do músculo liso limitada porque grandes quantidades de histamina já foram
em decorrência da fosforilação da cadeia leve de miosina liberadas (aumento do agonista nos receptores) e desencadeiam
mediada por Ca+/calmodulina. Em outros tecidos, reações não mais mediadas por histamina. Seus efeitos
particularmente nos esfíncteres arteriolares pré-capilares e farmacológicos podem advir de bloqueio H1 ou serem

2 Marcelo A. Cabral
ANOTAÇÕES EM FARMACOLOGIA E FARMÁCIA CLÍNICA

independentes dele, como os efeitos sedativos, os


anticolinérgicos e o orexígeno. Esses compostos têm utilidade Fármaco simpaticomimético:
no manejo das reações de hipersensibilidade imediata e no Os fármacos simpaticomiméticos (por exemplo, a
antagonismo aos efeitos de histamina anormalmente elevada no adrenalina) estimulam os receptores alfa-1 vascular (produzindo
organismo. Os antagonistas H1 ocupam um lugar importante e vasoconstrição), os receptores beta-1 cardíacos (produzindo
bem estabelecido no tratamento sintomático de várias reações efeito cronotrópico positivo), além de atuarem sobre os
de hipersensibilidade imediata. Além disso, as propriedades receptores beta-2 (produzindo broncodilatação). O representante
centrais de alguns fármacos da primeira geração são de valor usado no tratamento do choque anafilático, reações
terapêutico para a supressão da cinetose (prometasina) ou para anafilactóides ou outras reações alérgicas graves é a adrenalina.
sedação.
Seu mecanismo de ação é exercido através da ativação
O mecanismo de ação dos anti-histamínicos pode ser dos receptores alfa-1 e beta-1 adrenérgicos, os quais pertencem
explicado através da inibição competitiva e reversível sobre os à família dos receptores ligados à proteína G. Desta maneira, a
receptores de histamina (H1 e H2) que pertencem a superfamília adrenalina promove o antagonismo dos efeitos
dos receptores acoplados à proteína G. Os receptores H1 estão farmacodinâmicos da histamina.
acoplados a fosfolipase C, e a sua ativação leva à formação de
IP3 e DAG. O IP3 induz rápida liberação do Ca+ do retículo Seus efeitos alfa-1 adrenérgicos na árvore respiratória
endoplasmático. O diacilglicerol ativa a proteinocinase C e o determinam vasoconstrição da mucosa, diminuição de edema da
Ca+ ativa as proteinocinases Ca+/calmodulina dependente e mucosa e de secreção brônquica, podendo reverter crises de
fosfolipase A2 na célula alvo, gerando a resposta característica. asma brônquica em casos selecionados. Operando como
Por outro lado, os receptores H2 estão ligados à estimulação da antagonista de efeito de histamina e outros autacóides, reverte
adenililciclase e, portanto à ativação da proteinocinase AMPc broncoespasmo, edema de glote e hipotensão.
dependente na célula alvo.
Glicocorticoídes:
Mais recentemente, elaborou-se a hipótese de que os
receptores H1 coexistem em dois estados de conformação – os Os corticosteróides são úteis no tratamento das alergias
estados inativo e ativo – que estão em equilíbrio conformacional a imunocomplexos, do tipo III, devido principalmente às suas
entre si. A histamina atua como agonista para a conformação propriedades antiinflamatórias. Nos casos graves pode-se
ativa do receptor H1 e desvia o equilíbrio para a conformação administrar azatioprina ou ciclofosfamida
ativa. Os anti-histamínicos atuam como agonistas inversos, que (imunosupressores), a fim de suprimir a resposta imune e
se ligam à conformação inativa do receptor H1 e a estabilizam, permitir o uso de quantidade reduzida de esteróides. O uso
desviando, assim, o equilíbrio para o estado inativo do receptor. contínuo de corticosteróides em doses farmacológicas pode
causar supressão adrenal e hiperadrenocorticismo. O risco de
Os anti-histamínicos podem ser classificados em de supressão renal depende da dose, bem como da duração da ação
primeira geração (doxepina, difenidramina, piriliamina, da droga específica e da duração do tratamento. A prednisona e
clorfeniramina, hidroxizina, prometazina e cipro-heptadina), e a prednisolona, por exemplo, provocam menos complicações
em de segunda geração (cetirizina, loratadina, fexofenadina). em comparação à betametasona e a dexametasona. De fato, a
administração de uma droga de ação curta por período breve
Mesmo em doses terapêuticas, antagonistas H1 de geralmente não causa toxicidade significativa. Costuma-se
primeira geração produzem efeitos em sistema nervoso central, adotar a administração oral de corticosteróides em regime de
como sonolência, redução do estado de alerta, incoordenação dias alternados. Os pacientes sofrem menos reações adversas
motora e prejuízo de função cognitiva. Para reduzir a com este regime e causam menos supressão renal.
repercussão desses efeitos, devem ser usados à noite.
Antagonistas de segunda geração em doses usuais têm O mecanismo de ação dos glicocorticóides pode ser
notadamente menor efeito sedativo que os de primeira, visto que explicado por sua ligação ao receptor intracelular, fazendo com
não atravessam de modo apreciável a barreira hematoencefálica que este último sofra uma mudança conformacional expondo o
(são fármacos mais polares). No entanto, o aumento de dosagem domínio de ligação com o DNA. Forma dímeros, migra para o
acarreta prejuízo das funções de sistema nervoso central. núcleo e se liga ao DNA. Ocorre então a repressão ou indução
de genes específicos responsáveis pela síntese de proteínas
A sonolência induzida pelos anti-histamínicos de (cox-2, citocinas, NOs, lipocortina-1).
primeira geração pode ser causada pela inibição da transmissão Em outras palavras, os glicocorticóides interagem com
envolvendo os neurônios do núcleo túbero-mamilar. receptores intracelulares; os complexos esteróides-receptor
resultantes formam dímeros (pares) e a seguir, interagem com o
Os efeitos antimuscarínicos produzidos por esses DNA. Com isso, modificam a transcrição gênica, induzindo a
fármacos consistem em ressecamento da boca e das vias síntese de algumas proteínas, como a lipocortina-1 que é
respiratórias, retenção urinária e disúria. Foi também relatada a importante na retroalimentação e como antiinflamatório pois
ocorrência de náusea, vômitos, constipação ou diarréia, tontura, inibe a fosfolipase A2 que é a responsável pela degradação dos
insônia, nervosismo e fadiga. Pode-se verificar o fosfolipídeos da membrana celular com formação de ácido
desenvolvimento de tolerância a certos anti-histamínicos após arquidônico. Este ácido é o substrato das ciclo-oxigenases na
administração prolongada. formação dos eicosanóides: quimiotaxinas, lipoxinas,
prostaglandinas, tromboxanos, leucotrienos. Além disso, inibe a

3 Marcelo A. Cabral
ANOTAÇÕES EM FARMACOLOGIA E FARMÁCIA CLÍNICA

síntese de outras substâncias tais como a COX-2, as citocinas e


NOs. inflamatórias, tais como IL-2, IL-3, IL-4 e TNF-alfa. Essa
ativação é mecanismo cálcio-dependente que inclui ainda dois
Outros fármacos usados no tratamento da alergia:
tipos de proteínas: a calmodulina e as imunofilinas.
O cromoglicato sódico impede a desgranulação dos Essas últimas foram assim denominadas por atuarem como
mastócitos. O fármaco estabiliza o sistema de adenilciclase- receptores de substâncias inibidoras da calcineurina.
cAMP, ao inibir a corrente de cloreto, mas não exerce nenhum O tacrolimo foi descoberto em 1987 por pesquisadores
efeito direto sobre a ação da histamina autacóides relacionados. japoneses que detectaram a produção de um macrolídeo com
O cromoglicato sódico é apenas útil como agente local; em propriedades imunossupressoras por uma bactéria denominada
geral, é utilizado na forma de pó, que é insuflado como aerossol Streptomyces tsukubaensis, daí o nome tacrolimo (tsukuba
ou depositado diretamente nas narinas. O fármaco foi também macrolide immunosuppressant). Embora inicialmente
submetido a ensaios terapêuticos preliminares em pacientes com sintetizado para uso sistêmico na prevenção da rejeição de
colite ulcerativa, doença com possível alteração do processo transplantes de órgãos sólidos, foi desenvolvida uma
imune. formulação de uso tópico com intuito de obter benefícios
imunomoduladores locais sem desenvolvimento de efeitos
Os agentes imunossupressores que inibem a produção de colaterais sistêmicos. Como conseqüência, hoje seu uso é
auto-anticorpos e fagocitose são utilizados no tratamento das aprovado para controle dos processos eczematosos alérgicos.
hipersensibilidades auto-imunes graves do tipo II. Com O tacrolimo penetra na membrana das células
freqüência, os corticosteróides e a azatioprina ou metotrexato envolvidas na inflamação da DA. Ao se ligar à calmodulina,
são utilizadas em associação. Doses elevadas de inibe a síntese de calcineurina nos linfócitos, células dendríticas,
glicocorticóides podem ser úteis na atenuação do espasmo basófilos e eosinófilos. As ações imunológicas que se seguem
brônquico e do edema laríngeo. Nesta situação, os foram observadas em estudos experimentais e in-vitro,
glicocorticóides também atuam no sentido de aumentar a evidenciando-se:
contração cardíaca e realçar os efeitos vasculares das . nos linfócitos T, a redução da transcrição e síntese de IL-2, IL-
catecolaminas. Contudo, os efeitos máximos dos 3, IL-4, IL-5, GM-CSF (fator de estímulo ao crescimento de
glicocorticóides não ocorrem se não varias horas após a monócitos e granulócitos), fator de necrose tumoral e interferon
administração. A inibição exercida por glicocorticóides sobre gama;
fenômenos imunológicos pode resultar de uma ou mais ações . diminuição das células dendríticas, que atuam como
sobre as células linfóides: alteração na produção ou liberação de apresentadoras de antígenos e auxiliam no desencadeamento da
células da medula óssea, modificação de sua capacidade de resposta inflamatória alérgica;
migrar até zonas de reações imunológicas ou inflamatórias, . diminuição da síntese de mediadores de mastócitos e basófilos
remoção de células da circulação por destruição ou seqüestro produzidos pela via da calcineurina;
em diversos compartimentos teciduais ou supressão direta de . diminuição da liberação de histamina por basófilos periféricos
suas funções fisiológicas, tais como a produção de linfocinas e (estudos in vitro);
anticorpos. Outro mecanismo pode compreender a inibição da . redução dos níveis de substância P e fator de crescimento
fagocitose e subseqüente digestão do antígeno por macrófagos, neuronal produzido pelos queratinócitos, colaborando para a
ocorrência indispensável ao desenvolvimento de algumas redução do prurido.
respostas imunológicas. A hidrocortisona interfere com a Essas ações permitem o controle do processo inflamatório, pois
migração de neutrófilos e fagócitos mononucleares para o local os linfócitos T estão menos ativados e as células dendríticas
da resposta alérgica (inflamação); a capacidade fagocitária e expressam menor quantidade de receptores de alta afinidade
digestiva dos macrófagos também é reduzida. Finalmente, a para IgE.
hidrocortisona inibe a formação de tecido de granulação por
retardar a proliferação capilar e fibroblástica e a síntese de Mecanismo da Imunoterapia:
colágeno (reduz a capacidade de cicatrização das feridas).
O mecanismo da dessensibilização ainda não está bem
Inibidores da calcineurina – Tacrolimo e Pimecrolimo esclarecido. São conhecidas somente as mudanças imunológicas
ocorridas durante o tratamento: aumento de IgG, diminuição de
Os inibidores da calcineurina de ação tópica surgiram IgE específica, diminuição da atividade dos mastócitos e
da necessidade de utilizar medicamentos que controlem com basófilos, e aumento de linfócitos T supressores.
eficácia o processo inflamatório e sejam bem tolerados sem o
A dessensibilização consiste na administração de
desenvolvimento de efeitos adversos, inclusive a longo prazo.
vacinas contendo proteínas de vários tipos de alérgenos
São utilizados em dermatites.
(exemplo: aminovac).
A calcineurina é uma proteína citoplasmática presente
em diversas células, incluindo linfócitos e células dendríticas.
Após ativação, atua como um fator de transcrição de IL

4 Marcelo A. Cabral
ANOTAÇÕES EM FARMACOLOGIA E FARMÁCIA CLÍNICA

Referências Bibliográficas

1. RANG, H. P. et al. Farmacologia. 4 edição. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2001;


2. KATZUNG, B. G. Farmacologia: Básica & Clinica. 9 edição. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2006;
3. CRAIG, C. R.; STITZEL, R. E. Farmacologia Moderna. 6 edição. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2005;
4. GOLAN, D. E. et al. Princípios de Farmacologia: A Base Fisiopatológica da Farmacoterapia. 2 edição. Rio de
Janeiro: Guanabara Koogan, 2009;
5. FUCHS, F. D.; WANNMACHER, L.; FERREIRA, M. B. C. Farmacologia Clínica. 3 edição. Rio de Janeiro: Guanabara
Koogan, 2004.
6. GILMAN, A. G. As Bases farmacológicas da Terapêutica. 10 edição. Rio de Janeiro: Mc-Graw Hill, 2005.
7. CONSTANZO, L. S. Fisiologia. 2 edição. Rio de Janeiro: Elsevier, 2004.
8. PORTH, C. M. Fisiopatologia. 6 edição. Rio de Janeiro: Ganabara Koogan, 2004

5 Marcelo A. Cabral
ANOTAÇÕES EM FARMACOLOGIA E FARMÁCIA CLÍNICA

22) Fármacos antivirais

Os vírus consistem em DNA e RNA de filamentos Com a exposição ao agente, a infecção pode ser
simples ou duplo circundado por um envoltório protéico,
facilitada por fadiga excessiva, distúrbios emocionais e
denominado capsídeo. Alguns vírus também possuem um alérgicos.
envelope lipoprotéico que, da mesma forma que o capsídeo,
pode conter proteínas antigênicas. A maioria dos vírus contém
ou codifica enzimas essenciais à replicação viral no interior de A gripe
uma célula hospedeira. Como os vírus não dispõem de
É uma infecção respiratória aguda causada por um
maquinaria metabólica própria, usurpam a da célula hospedeira.
virus específico, denominado INFLUENZA, que ocasiona
Os agentes antivirais eficazes devem inibir eventos
febre, prostação, coriza, tosse, dor de cabeça, dor de ganganta.
específicos da replicação do vírus ou inibir preferencialmente a
síntese de ácidos nucléicos ou de proteínas dirigidas pelo vírus, Existem vários tipos de vírus influenza. Todos
e não aquelas dirigidas pela célula hospedeira. apresentam moléculas em sua superfície que reconhecem as
Em geral, os vírus de DNA penetram no núcleo da células animais para aderi-las, invadi-las e se replicar. As
célula hospedeira, onde o DNA viral é transcrito em mRNA moléculas são duas: hemaglutinina e neuraminidase. São
pela mRNA polimerase da célula hospedeira; o mRNA é conhecidos atualmente 16 tipos diferentes de hemaglutinina e 9
traduzido de forma habitual pela célula hospedeira em proteínas tipos de neuraminidase. Sendo assim, os diferentes tipos de
específicas do vírus. Uma exceção a essa estratégia é vírus influenza são clasificados conforme a apresentação das
representada pelo poxvírus, que tem sua própria RNA formas de hemaglutinina e neuraminidase (exemplo: H1N1 –
polimerase e consequentemente replicam-se no citoplasma da gripe espanhola; H5N1 – gripe aviária, H3N2 – gripe clássica, e
célula hospedeira. Os vírus de DNA incluem o poxvírus etc)
(varíola), herpesvírus (varicela, zoster, herpes), adenovírus
(conjuntivite, faringite), hepadnavírus (hepatite B) e papiloma Mecanismos gerais de ação dos fármacos antivirais
vírus (verrugas). Uma vez que os vírus compartilham muitos dos
Quanto aos vírus de RNA, a estratégia de replicação processos metabólicos da célula hospedeira, é difícil encontrar
na célula hospedeira depende das enzimas contidas no virion (a fármacos que sejam seletivos para o patógeno. Todavia, existem
partícula viral infecciosa completa) para sintetizar seu mRNA, enzimas que são específicas do vírus, servindo, assim, de alvos
ou do RNA viral, que ele próprio passa a atuar como mRNA. O potenciais para fármacos.
mRNA é traduzido em diversas proteínas virais, incluindo a
RNA polimerase, que dirige a síntese de mais mRNA viral. Os agentes antivirais atualmente disponíveis são, em
Determinados vírus como o influenza, necessitam de transcrição sua maioria, apenas eficazes enquanto o vírus está se replicando.
ativa no núcleo da célula hospedeira (é a exceção dos vírus de Nesse sentido, é importante o fato de que os herpesvirus, que
RNA). Os exemplos dos vírus de RNA incluem o vírus da são os cuasadores do herpes zoster, herpes genital e a esofagite,
rubéola (sarampo alemão), os rabdovírus (raiva), os possuem a capacidade de se manterem latentes (sem replicação).
picornavírus (poliomielite, meningite, resfriados), os arenavírus Em seguida, os vírus podem sofrer reativação muito tempo
(meningite, febre lassa), os arbovírus (febre amarela, encefalite depois da infecção primária, causando doença.
transmitida por artrópodes, e diversas febres como a febre Os fármacos antivirais atuam através dos seguintes
amarela) os ortomixovírus (influenza) e os paramixovírus mecanismos:
(sarampo, caxumba).
Os retrovírus possuem uma atividade enzimática de a) Inibição da transcrição do genoma viral:
trasncriptase reversa, que produz uma cópia de DNA a partir do - inibidores da DNA polimerase;
modelo de RNA viral. A seguir, a cópia de DNA é integrada no
genoma do hospedeiro, quando passa a ser denominada pró- - inibidores da transcriptase reversa;
vírus; é transcrita tanto no RNA genômico quanto no mRNA
- inibidores da protease.
para tradução em proteínas virais, dando origem à geração de
novas partículas virais. O Vírus da AIDS é um exemplo de b) Inibição da penetração na célula do hospedeiro
retrovírus.
Dentre as doenças mais comuns causadas econtram-se
o “resfriado” e a gripe. Apesar da sintomatologia dessas duas Inibidores da DNA polimerase (cidoforvir, penciclovir,
doenças serem muito semelhantes, são causadas por tipos foscarnete e aciclovir)
diferentes de vírus.
O cidofovir inibe a síntese do DNA viral ao retardar e,
O Resfriado por fim, interromper o alongamento da cadeia. O cidofovir é
metabolizado em sua forma difosfato ativa por enzimas
É uma infecção aguda virótica (os rinovírus são os celulares; os níveis de metabólitos fosforilados são semelhantes
principais agentes causadores), geralmente sem febre, na qual as nas células infectadas e não-infectadas (possui pouca
principais manifestações clínicas envolvem as vias aéreas seletividade). O difosfato atua tanto como inibidor competitivo
superiores, com secreção nasal (coriza) ou obstrução nasal como quanto como substrato alternativo para a DNA polimerase do
sintoma predominante. citomegalovírus e do herpesvírus.

1 Marcelo A. Cabral
ANOTAÇÕES EM FARMACOLOGIA E FARMÁCIA CLÍNICA

O Penciclovir é um inibidor da síntese de DNA viral.


Nas células infectadas por herpesvírus ou pelo vírus da varicela- Inibidores da transcriptase reversa:
zoster, o penciclovir é inicialmente fosforilado pela A transcriptase reversa é uma enzima viral que
timidinocinase viral. O trifosfato de penciclovir atua como polimeriza moléculas de DNA a partir de moléculas de RNA do
inibidor competitivo da DNA polimerase viral. próprio vírus, exatamente o oposto do que geralmente ocorre
normalmente nas células, nas quais é produzido RNA a partir de
O Foscarnete inibe a síntese de ácidos nucléicos virais
DNA. Após a entrada do retrovírus na célula hospedeira, a
através de sua interação direta com a DNA polimerase do
transcriptase reversa utiliza os nucleotídeos presentes no
herpesvírus ou transcriptase reversa do HIV. Este fármaco
citoplasma para montar uma fita de DNA senso negativo a partir
bloqueia reversivelmente o local de ligação do pirofosfato da
de sua fita de RNA senso positivo, utilizando como primer um
polimerase viral de forma não competitiva e inibe a clivagem do
tRNA presente no nucleocapsídeo, associado ao genoma. Após
pirofosfato a partir dos trifosfatos de desoxinucleotídeos. O
a síntese do duplex RNA/DNA, uma ribonuclease (RNAse H) é
foscarnet exerce um efeito inibitório aproximadamente 100
incumbida de degradar a fita de RNA viral por hidrólise, a partir
vezes maior contra as DNA polimerases dos herpesvírus do que
da extremidade 3', deixando a fita simples de (-) DNA solta no
contra a DNA polimerase alfa celular.
citoplasma. A transcriptase reversa completa essa fita de DNA,
Além dos fármacos acima citados, existem ainda tornando-a uma dupla hélice de deoxinucleotídeos. Esta dupla
valaciclovir, fanciclovir, trifluridina, ganciclovir, eribavirina, fita de DNA viral, denominada provírus, poderá ser integrada ao
todos atuam através da inibição da DNA polimerase viral com DNA da célula hospedeira com auxílio da enzima integrase.
conseqüente bloqueio da síntese de DNA. Uma vez integrada ao DNA da célula hospedeira, ocorre a
transcrição de proteínas virais, necessárias à sua replicação.
Aciclovir
Zidovudina
O aciclovir possui atividade clínica contra o vírus do
herpes simples (HSV – 1-2) e contra o da varicela-zoster. São Atua como inibidor ativo da transcriptase reversa. É
necessárias três etapas de fosforilação para ativação do fosforilada por enzimas celulares à forma trifosfato, forma esta
aciclovir. Inicialmente, o aciclovir é convertido no derivado que compete pela transcriptase reversa do vírus com trifosfatos
monofosfato pela timidina cinase específica do vírus e, a seguir, celulares equivalentes que constituem substratos essenciais para
nos compostos di e trifosfato pelas enzimas celulares do a formação do DNA pró-viral. Sua incorporação no filamento
hospedeiro. Devido à necessidade da cinase viral para a sua de DNA viral em crescimento resulta em término da cadeia. A
fosforilação inicial, o aciclovir é seletivamente ativado e só se zidovudina é utilizada na prevenção e tratamento da AIDS.
acumula nas células infectadas (seletividade). O trifosfato de
aciclovir inibe a síntese de DNA viral através de dois Didanosina
mecanismos: inibição competitiva do desoxiGTP para a DNA Na célula do hospedeiro, a didanosina é fosforilada no
polimerase viral, com ligação ao molde de DNA na forma de trifosfato, didesoxiadenosina, a forma que atua como elemento
complexo irreversível, e interrupção da cadeia após de término da cadeia e inibidor da transcriptase reversa viral. A
incorporação no DNA viral. didanosina é utilizada no tratamento da AIDS.
Fig. 01 – Local de ação do aciclovir, vidarabina, foscarnet e
Zalcitabina
ganciclovir.
A zalcitabina é utilizada em associação com a
zidovudina na terapia da AIDS. Trata-se de um inibidor da
transcriptase reversa, que é ativado na célula T por uma via de
fosforilação diferente daquela da zidovudina.

Efavirenz

É um inibidor da transcriptase reversa não-análogo de


nucleosídeo. Teve a sua patente quebrada em maio de 2007,
passando a ser importado da Índia e, em seguida, produzido nos
laboratórios brasileiros (FIOCRUZ). O fármaco é utilizado
como parte da terapia antiretroviral da AIDS.

Inibidores dos eventos pós-tradução – inibidores da protease


(indinavir, saquinavir)

Saquinavir e indinavir

Os RNAm do hospedeiro codificam diretamente


proteínas funcionais; todavia, no HIV, o RNA é traduzido em
uma poliproteína bioquimicamente inerte. Em seguida, uma
2 Marcelo A. Cabral
ANOTAÇÕES EM FARMACOLOGIA E FARMÁCIA CLÍNICA

protease específica viral converte a poliproteína em várias para exercer seu efeito terapêutico. A principal característica de
proteínas estruturais e funcionais através de clivagem nas seu modo de ação é inibição seletiva de neuraminidases, que são
posições apropriadas. Como essa protease é viral, trata-se de um glicoproteínas de liberação dos vírions. O medicamento não
bom alvo para intervenção quimioterápica. Os fármacos impede a contaminação com o vírus e é usado no tratamento da
inibidores de protease (saquinavir e indinavir) e o seu uso em infecção.
associação com inibidores da transcriptase reversa,
transformaram o tratamento da AIDS. Fig. 03 – Local de ação da amantadina e osetalmivir

Inibidores da penetração na célula do hospedeiro

Amantadina

A amantadina bloqueia o canal iônico de H+ do vírus


(proteína de membrana viral M2), impedindo assim a
acidificação do interior do virion e a dissociação da proteína da
matriz. Com isso, susta-se o desnudamento do vírus e a sua
penetração no núcleo da célula. Esse fármaco apresenta
atividade exclusiva contra o vírus da influenza A.

Quadro resumo da aplicação clínica dos antivirais.

Anti-herpéticos Aciclovir, cidofovir, docosanol,


fanciclovir, foscarnet, fomivirsen,
ganciclovir, idoxuridina, penciclovir,
trifluridina, brivudina, valaciclovir,
valganciclovir, vidarabina.
Ribavirina Anti-influenza Amantadina, oseltamivir (tamiflu®),
rimantadina, zanamivir, peramivir.
A ribavirina é um nucleosídeo sintético, que consiste de D-
ribose acoplada a 1,2,4 triazole carboxamida. Esta droga tem
Anti-hepatite Adefovir, lamivudina, entricitabina
um largo espectro de atividade antiviral in vitro contra os vírus
do RNA e DNA.
Inibidores Saquinavir, indinavir,
A droga é prontamente transportada para dentro das de proteases atazanavir, ritonavir,
células e então convertida por enzimas celulares a 5-mono-, di-, nelfinavir, amprenavir,
e derivados de trifosfato, os quais são responsáveis por inibir lopinavoir.
certas enzimas virais envolvidas na síntese do ácido nucleico
viral. A Ribavirina produz seu efeito antiviral principalmente Anti-retrovirais Inibidores Zidovudina, didanosina,
por alterar os agrupamentos de nucleotídeos e formação de da estavudina, zalcitabina,
RNA mensageiro normal, o qual pode ser responsável por sua transcriptase lamivudina, abacavir,
eficácia contra os vírus de RNA e DNA. A droga é fosforilada reversa neviparina, efavirenz,
ativamente de modo intracelular em mono-, di-, e trifosfatos. O delavirdina, tenofovir e
monofosfato é um inibidor da inosina-monofosfato adefovir.
desidrogenase, que é envolvida na síntese de guanosina-
monofosfato.

Oseltamivir Quimioterapia de combinação no tratamento do HIV

Oseltamivir é um fármaco antiviral seletivo contra o A quimioterapia de combinação (coquetéis) tornou-se o


vírus influenza dos tipos A e B, produzido pelos laboratórios padrão de tratamento para os indivíduos infectados pelo HIV.
Roche sob o nome comercial Tamiflu®. O medicamento feito a Os coquetéis são mais eficazes do que os agentes isolados e
partir deste princípio ativo foi o primeiro a ser usado na produzem maiores reduções na carga viral do HIV. Esse
epidemia de gripe suína, que teve como país de origem o esquema de tratamento também diminui o desenvolvimento de
México, em 2009. resistência, e reduz a toxicidade dos fármacos, pois podem ser
administrados em suas doses mais baixas. Entretanto, os
O oseltamivir é considerado uma pró-droga, ou seja, fármacos anti HIV só atacam os vírus em replicação e não os
ela é biotransformada dentro do organismo em outra substância vírus latentes, os quai podem permanecer no corpo durante
anos.
3 Marcelo A. Cabral
ANOTAÇÕES EM FARMACOLOGIA E FARMÁCIA CLÍNICA

Referências Bibliográficas

1. RANG, H. P. et al. Farmacologia. 4 edição. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2001;


2. KATZUNG, B. G. Farmacologia: Básica & Clinica. 9 edição. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2006;
3. CRAIG, C. R.; STITZEL, R. E. Farmacologia Moderna. 6 edição. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2005;
4. GOLAN, D. E. et al. Princípios de Farmacologia: A Base Fisiopatológica da Farmacoterapia. 2 edição. Rio de
Janeiro: Guanabara Koogan, 2009;
5. FUCHS, F. D.; WANNMACHER, L.; FERREIRA, M. B. C. Farmacologia Clínica. 3 edição. Rio de Janeiro: Guanabara
Koogan, 2004.
6. GILMAN, A. G. As Bases farmacológicas da Terapêutica. 10 edição. Rio de Janeiro: Mc-Graw Hill, 2005.
7. CONSTANZO, L. S. Fisiologia. 2 edição. Rio de Janeiro: Elsevier, 2004.
8. PORTH, C. M. Fisiopatologia. 6 edição. Rio de Janeiro: Ganabara Koogan, 2004.
9. UJVARI, Stefan Cunha. Pandemias: a humanidade em risco. São Paulo: Editora Contexto, 2011.

4 Marcelo A. Cabral
ANOTAÇÕES EM FARMACOLOGIA E FARMÁCIA CLÍNICA

23) Fármacos antifúngicos


As infecções por fungos são denominadas micoses e,
de modo geral podem ser divididas em infecções superficiais Anfotericina
(que afetam a pele, as unhas, o couro cabeludo ou as A anfotericina é um antibiótico macrolídeo de estrutura
mucosas) e infecções sistêmicas (que afetam os tecidos e complexa, caracterizado por um anel de átomos de carbono
órgãos mais profundos). Muitos dos fungos passíveis de com múltiplos membros. A anfotericina B persiste como o
causar micoses vivem em associação com o homem como agente mais eficaz para infecções fúngicas sistêmicas.
comensais e estão presentes no meio-ambiente.
Mecanismo de ação:
As infecções fúngicas superficiais podem ser
A anfotericina liga-se às membranas celulares e
classificadas em dermatomicoses e candidíase. As
interfere na permeabilidade e nas funções de transporte.
dermatomicoses são infecções da pele, dos cabelos e das
Forma um poro na membrana, criando com a parte central
unhas causadas por dermatófitos. As mais comuns são
hidrofílica da molécula um canal iônico transmembrana.
produzidas por microrganismos do gênero Tinea,
Uma das conseqüências disso é a perda de íons potássio
responsáveis por vários tipos de tinha. Tinea capitis afeta o
intracelulares. A anfotericina exerce uma ação seletiva,
couro cabeludo, Tinea cruris, virilha, Tinea pedis, o pé e
ligando-se avidamente às membrans de fungos e de alguns
Tinea corporis, o corpo. Na candidíase superficial, o
protozoários e com menor avidez às células de mamíferos,
microrganismo leveduriforme infecta as mucosas da boca
não havendo nenhuma ligação às bactérias. A especificidade
(afta) ou da vagina ou pele.
relativa por fungos pode ser devida à maior avidez da droga
As micoses profundas podem envolver orgãos internos pelo ergosterol (o esterol da membrana dos fungos) do que
ou acometer todo organismo do hospedeiro, produzindo pelo colesterol, que é o principal esterol encontrado na
variado quadro anatomo-patológico. Os fungos dimórficos membrana plasmática de células animais. A anfotericina
estão muito frequentemente associados a esta condição. mostra-se ativa contra a maioria dos fungos e leveduras.
A maioria dos fármacos antifúngicos convencionais
Quando administrada por via oral, a anfotericina é
atua sobre a membrana plasmática do fungo, interferindo,
pouco absorvida, razão pela qual só é administrada por esta
em grande parte das vezes, no metabolismo do ergosterol.
via para infecções fúngicas do trato gastrintestinal. Nas
infecções sistêmicas, é complexada com desoxicolato de
Fig. 01 – Alvos celulares dos agentes antifúnigicos:
sódio e administrada na forma de suspenção por injeção
intravenosa lenta.
Os efeitos adversos associados à anfotericina B podem
ser divididos em três grupos: reações sistêmicas imediatas
(tempestade de citocinas), efeitos renais (toxicidade renal) e
efeitos hematológicos (anemia secundária à diminuição da
produção de eritropoetina pelos rins).
A toxidade renal constitui o efeito indesejável mais
comum e mais gave da anfotericina. Observa-se um certo
grau de redução da função renal em mais de 80% dos
pacientes aos quais se administra o fármaco. Outros efeitos
indesejáveis incluem comprometimento da função hepática,
trombocitopenia e reações anafiláticas.
Nistatina
A nistatina é um antibiótico macrolídeo poliênico de
estrutura semelhante à da anfotericina e com o mesmo
mecanismo de ação. Praticamente não ocorre nenhuma
absorção pelas mucosas do corpo ou a partir da pele, e seu
uso limita-se a infecções fúngicas da pele e do trato
gastrintestinal.
Flucitosina
A flucitosina é um agente antifúngico sintético que,
quando administrada por via oral, mostra-se ativa contra
uma gama limitada de infecções fúngicas sistêmicas, sendo
principalmente eficaz naquelas causadas por leveduras.
Quando administrada isoladamente, é comum o
desenvolvimento de resistência à droga durante o
tratamento, razão pela qual costuma ser associada com
anfotericina para infecções graves, como a meningite

1 Marcelo A. Cabral
ANOTAÇÕES EM FARMACOLOGIA E FARMÁCIA CLÍNICA

criptocócica. Isto se dá devido ao fato de ocorrer mutações


da varfarina e reduzir potencialmente a eficácia dos
na citosina permease ou citosina desaminase do fungo.
contraceptivos orais com baixo teor de strogênio. A
O fármaco é captado seletivamente pelas células griseofulvina deve ser evitada durante a gravidez, visto que
fúngicas através de permeases específicas de citosina, que foram relatadas anormalidades fetais.
são apenas expressas nas membranas dos fungos.
Azóis
Mecanismo de ação:
Os azóis constituem um grupo de agentes fungistáticos
A flucitosina é convertida no antimetabólito 5- sintéticos, com amplo espectro de atividade. Os principais
fluorouracil nas céluas dos fungos, mas não em células fármacos disponíveis incluem fluconazol, itraconazol,
humanas. O 5-FU inibe a timidilato sintetase e, portanto a cetoconazol, miconazol e econazol.
síntese de DNA. Em geral, a flucitosina é administrada por
Mecanismo de ação:
infusão intravenosa, mas também pode ser usada por via
oral. Os azóis inibem as enzimas P450 fúngicas (por exemplo,
a esterol desmetilase) responsáveis pela síntese do
Fig. 02 – Ação da flucitosina nos fungos:
ergosterol, o principal esterol encontrado na membrana das
células fúngicas. A conseqüente depleção de ergosterol
altera a fluidez da membrana, interferindo na ação das
enzimas associadas à membrana. O efeito global consiste em
inibição da replicação. Outra conseqüência é a inibição da
transformação das células da levedura cândida em hifas, a
forma invasida e patogênica do parasita (dimorfismo).
a) Cetoconazol:
O cetoconazol foi o primeiro azol a ser administrado
por via oral no tratamento das infecções fúngicas sistêmicas.
Mostra-se eficaz contra vários tipos diferentes de fungos
todavia, é tóxico. Ele é bem absorvido pelo trato
gastrintestinal. O principal risco do cetoconazol é a
hepatotoxidade, que é rara, mas que pode se tornar fatal. A
rifanpicina, os antagonistas dos receptores H2 e os
antiácidos diminuem a absorção do cetoconazol e, por
conseguinte, reduzem sua concentração plasmática.
b) Fluconazol:
O fluconazol pode ser administrado por via oral ou por
via intravenosa. Atinge altas concentrações no líquido
cefalorraquidiano e líquidos oculares, podendo tornar-se o
fármaco de primeira escolha na maioria dos tipos de
meningite fúngica. São também alcançadas concentrações
A vantagem farmacocinética dese agente reside no seu fungicidas no tecido vaginal, saliva, pele e unhas.
grande volume de distribuição, com excelente penetração no
SNC, olhos e trato urinário. Os efeitos adversos depende da Apesar do seu alto custo, o fluconazol é, hoje em dia, o
dose e consistem em supressão da medula óssea, que resulta agente antifúngico mais amplamente utilizado.
em leucopenia e trombocitopenia, em náusea, vômitos, Os efeitos indesejáveis, que geralmente são leves,
diarréia e disfunção hepática. incluem náusea, cefaléia e dor abdominal.
Griseofulvina c) Itraconazol:
A griseofulvina é derivada do Penicilinum O itraconazol é administrado por via oral e, após
griseofulvum e inibe a mitose dos fungos através de sua absorção, sofre extenso metabolismo hepático. Não penetra
ligação à tubulina e a uma proteína associada aos no líquido cefalorraquidiano. Os efeitos indesejáveis
microtúbulos, rompendo, assim, a organização do fuso consistem em distúrbios gastrintstinais, cefaléia e tonteiras.
mitótico. Foi também relatado que p fármaco inibe a síntese Os efeitos indesejáveis raros consistem em hepatite,
de RNA e de DNA pelo funfo. A griseofulvina acumula-se hipocalemia e impotência.
nas células precursoras de queratina e liga-se firmemente à
queratina nas células diferenciadas. A associação prolongada d) Miconazol:
da griseofulvina com a queratina permite o novo O miconazol é administrado por via oral para o
crescimento da pele, dos cabelos ou das unhas livres de tratamento das infecções do trato gastrintestinal. Atinge
infecção por dermatófitos. concentrações terapêuticas no osso, nas articulações e no
O fármaco não é efetivo contra leveduras e contra tecido pulmonar, mas não no SNC. Mais comunmente, este
fungos dimóricos. Como a griseofulvina induz as enzims fármaco é utilizado para uso tópico contra fungos
hepáticas do citocromo P450, pode aumentar o metabolismo patogênicos e oportunistas.
2 Marcelo A. Cabral
ANOTAÇÕES EM FARMACOLOGIA E FARMÁCIA CLÍNICA

Os efeitos indesejáveis são relativamente raros, e os


mais comuns consistem em distúrbios gastrintestinais, Tratamento farmacológico das micoses superficiais:
embora se tenha relatado a ocorrência de prurido, discrasias
sanguíneas e hiponatremia. Devido a possibilidade de O tratamento da maioria das micoses muco-cutâneas
interações adversas, deve-se evitar a administração superficiais pode ser feito com medicações tópicas. Apenas
concomitante de antagonistas dos receptores H1, terfenadina em algumas situações são necessários fármacos sistêmicos.
e astemizol.
Antifúngicos tópicos:
e) Clotrimazol, econazol, tioconazol e sulconazol:
- agentes imidazólicos (butoconazol, clotrimazol,
Esses fármacos são angentes antifúngicos azóis
cetaconazol, econazol, isoconazol, miconazol, oxiconazol e
utilizados apenas para aplicação tópica. O clotrimazol
tioconazol).
interfere no transporte de aminoácidos para o interior do
microrgnismo através de uma ação sobre a membrana -terconazol, nistatina, ciclopirox, haloprogina, tolnaftato,
celular. Mostra-se ativo contra uma ampla variedade de iodo e terbinafina.
fungos, incluindo microrganismo do gênero Cândida.
Os antifúngicos imidazólicos, equivalentes entre si, são
Terbinafina os fármacos de primeira escolha para o tratamento tópico da
maioria das micoses cutâneas. Esses compostos são
A terbinafina é um composto fungicida ceratinofílico virtualmente ativos contra todos os fungos causadores de
altamente lipofílico, que exibe atividade contra uma ampla infecções superficiais da pele e mucosas. São muito eficazes,
variedade de patógenos cutâneos. pouco tóxicos, com baixos níveis de resistência e pouco
custo financeiro.
Mecanismo de ação:
Nas infecções de pele, os agentes imidazólicos devem
Atua ao inibir seletivamente a enzima esqualeno
ser aplicados uma (oxiconazol) ou duas vezes ao dia (todos
epoxidase, que está envolvida na síntese do ergosterol a
os demais fármacos dessa classe), por 2 a 3 semanas. Em
partir do esqualeno na parede celular dos fungos. O acúmulo
pele espessa, aplicar 3 a 4 vezes ao dia, por 21 dias ou mais.
de esqualeno no interior da célula é tóxico para o fungo.
Nas infecções de couro cabeludo e unhas, imidazólicos
A terbinafina é utilizada no tratamento de infecções
tópicos podem ser utilizados como adjuvantes, mas é
fúngicas das unhas. Quando administrada por via oral, é
necessário tratamento sistêmico com griseofulvina ou com
rapidamente absorvida e captada pela pele, unhas e tecido
os próprios imidazólicos.
adiposo. Quando administrda topicamente, penetra na pele e
nas mucosas. Ocorrem efeitos indesejáveis em 10% dos A candidíase vaginal responde bem a uma aplicação
indivíduos, que costumam ser leves e autolimitados. Incluem diária de clotrimazol por 7 dias, ou de econazol, por 3 a 5
distúrbios gastrintestinais, exantema, prurido, cefaléia e dias.
tonteira.
A candidíase oral pode ser tratda com gel oral de
Echinocandinas: miconazol, em 4 aplicações diárias, por 10 a 14 dias ou
mais.
As enchinocandinas constituem a classe mais nova de
agentes antifúngicos. Trata-se de grandes peptídeos cíclicos A terbinafina está disponível para uso tópico ou oral,
ligados a um ácido graxo de cadeia longa. A caspofungina, a sendo eficaz no tratamento de micoses superficiais da pele e
micafungina e a anidulafungina são os fármacos aprovados das unhas, porém possui baixa atividade contra infecções
nessa categoria de antifúngicos. A caspofungina é apenas causadas pela cândida albicans.
disponível numa forma intravenosa.
O ciclopirox e a haloprogina são eficazes no tratamento
Mecanismo de ação: de dermatofitoses e ptiriase versicolor, além de atingirem
também a cândida.
A caspofungina atua na parede celular do fungo ao
inibir a síntese de beta-glucano. Essa inibição resulta em A nistatina é utilizada somente no tratamento de
ruptura da parede celular e morte do fungo. A caspofingina é infecções cutâneas e mucosas superficiais por cândida.
extremamente bem tolerada e a ocorrência de efeitos
colaterais gastrintestinais mínimos e rubor têm sido
relatados infrequentemente.
ЖЖЖЖЖЖ
Atualmente, a caspofungina só é aprovada para terapia
de recuperação em pacientes com aspergilose invasiva que
não respondem à anfotericina B.

3 Marcelo A. Cabral
ANOTAÇÕES EM FARMACOLOGIA E FARMÁCIA CLÍNICA

Referências Bibliográficas

1. RANG, H. P. et al. Farmacologia. 4 edição. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2001;


2. KATZUNG, B. G. Farmacologia: Básica & Clinica. 9 edição. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2006;
3. CRAIG, C. R.; STITZEL, R. E. Farmacologia Moderna. 6 edição. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2005;
4. GOLAN, D. E. et al. Princípios de Farmacologia: A Base Fisiopatológica da Farmacoterapia. 2 edição. Rio de
Janeiro: Guanabara Koogan, 2009;
5. FUCHS, F. D.; WANNMACHER, L.; FERREIRA, M. B. C. Farmacologia Clínica. 3 edição. Rio de Janeiro: Guanabara
Koogan, 2004.
6. GILMAN, A. G. As Bases farmacológicas da Terapêutica. 10 edição. Rio de Janeiro: Mc-Graw Hill, 2005.
7. CONSTANZO, L. S. Fisiologia. 2 edição. Rio de Janeiro: Elsevier, 2004.
8. PORTH, C. M. Fisiopatologia. 6 edição. Rio de Janeiro: Ganabara Koogan, 2004

4 Marcelo A. Cabral
ANOTAÇÕES EM FARMACOLOGIA E FARMÁCIA CLÍNICA

24) Fármacos anti-helmínticos

Os seres humanos constituem os hospedeiros primários filarioses causam obstrução dos vasos linfáticos, produzindo
elefantíase; outras doenças relacionadas incluem a
(definitivos) na maioria das infecções helmínticas; em outras
palavras, os helmintos, em sua maioria, têm a sua oncocercíase (cegueira devido microfilárias presentes no
reprodução sexual no hospedeiro humano, produzindo ovos olho) e aloíase (inflamação da pele e outros tecidos).
ou larvas que são eliminados do corpo e infectam o Alguns nematódeos que vivem habitualmente no trato
hospedeiro secundário (intermediário).
gastrintestinal de animais podem infectar os seres humanos
Existem dois tipos clinicamente importantes de e penetrar nos tecidos. Uma infestação cutânea, denominada
infecções por helmintos: infecções em que o verme vive no “erupção serpiginosa” ou “larva migrans cutânea”, é causada
tubo digestivo do hospedeiro e aquelas em que o verme pelas larvas dos ancilóstomos de gatos e cães. A toxiocaríase
ou “larva migrans visceral” é causada por larvas de
estabelece residência em outros tecidos do hospedeiro.
nematódeos de gatos e cães do gênero Toxocara.
Os principais exemplos de verme que vivem no tubo
digestivo do hospedeiro são: Farmacos anti-helminticos:

Uma droga, para ser considerado fármaco anti-


- Tênias (Taenia saginata, Taenia solium, etc.): os
helmíntico eficaz, precisa ser capaz de penetrar na cutícula
hospedeiros habituais dessas duas tênias mais comuns são o
gado bovino e o suíno, respectivamente. Os seres humanos do verme ou ter acesso a seu trato alimentar.
tronam-se infectados ao consumir carne crua ou mal cozida O anti-helmíntico pode atuar ao produzir paralisia do
contendo as larvas que se encistaram no tecido muscular do verme ou ao lesar a sua cutícula, resultando em digestão
animal. Em algumas circunstâncias, pode ocorrer
parcial ou rejeição do verme por mecanismos imunológicos.
desenvolvimento do estágio larvar de Taenia solium nos Os agentes anti-helmínticos podem também interferir no
seres humanos, resultando em cisticercose, uma doença metabolismo do verme e, como as necessidades
caracterizada por larvas encistadas nos músculos e nas
metabólicas desses parasitas variam acentuadamente de uma
vísceras ou, nos casos mais graves, nos olhos ou no cérebro. espécie para outra, as drogas que se mostram altamente
- Nematódeos intestinais tais como Ascaris lubricoides, eficazes contra determinado tipo de verme podem ser
ineficazes contra outros tipos.
Enterobius vermiculares, Trichuris trichiuria, Strongiloydes
stercolaris, Necator americanus e Ankyslostoma duodenale Muitos agentes anti-helmínticos modulam a atividade
são responsáveis por um número muito grande de infecções. neuromuscular dos parasitas através do aumento da
Os principais exemplos de vermes que vivem nos sinalização inibitória, do antagonismo da sinalização
tecidos do hospedeiro são: excitatória (bloqueio não despolariante) ou da estimulação
tônica da sinalização excitatória (bloqueio despolarizante).
- Trematódeos (Schistosomas) causam esquistossomose. Os
vermes adultos de ambos os sexos vivem e acasalam-se nas Benzimidazóis:
veias ou vênulas da parede intestinal ou da bexiga. A fêmea Os anti-helmínticos benzimidazóis incluem o
põe ovos que passam para bexiga ou o intestino e causam
mebendazol, tiabendazol e o albendazol. Esses compostos
inflamação desses órgãos, resultando em hematúria no são agentes de amplo espectro, que formam um dos
primeiro caso e, em certas ocasiões, em perda de sangue nas principais grupos de anti-helmínticos utilizados na clínica.
fezes, no segundo caso. Os ovos eclodem na água após
serem eliminados do organismo e liberam miracídios, que Mecanismo de ação:
penetram no hospedeiro secundário – uma determinada
espécie de caramujo. Depois de um período de Os benzimidázois ligam-se à beta-tubulina livre,
desenvolvimento neste hospedeiro, surgem as cercárias que inibindo a sua polimerização e, assim, interferem na
nadam livremente. Estas possuem a capacidade de infectar o captação de glicose dependente de microtúbulos. Exercem
homem ao penetrar na sua pele. ação inibitória seletiva sobre a função microtubular dos
helmintos, sendo 250 – 400 vezes mais potentes nos
- Nematódeos teciduais (Trichinella spiralis, Dracunculus helmintos do que nos tecidos de mamíferos. O efeito leva
medinensis e as filárias). algum tempo para se manifestar, e os vermes podem não ser
expelidos durante vários dias.
As filárias adultas vivem nos vasos linfáticos, no tecido
conjuntivo ou no mesentério do hospedeiro e produzem O mebendazol é administrado em dose única para os
embriões vivos ou microfilárias, que alcançam a corrente oxiúrus e duas vezes ao dia durante três dias para as
sanguínea. Depois de certo período de desenvolvimento no infecções por ancilóstomos e nematódeos. Seus efeitos
interior do hospedeiro intermediário (mosquitos ou outros indesejáveis são poucos, todavia em certas ocasiões, podem
hematófagos), as larvas passam para as peças bucais do ocorrer distúrbios gastrintestinais.
inseto e são reinjetadas nos seres humanos. As principais

1 Marcelo A. Cabral
ANOTAÇÕES EM FARMACOLOGIA E FARMÁCIA CLÍNICA

O tiabendazol é administrado duas vezes ao dia,


durante três dias, para infestações por Dracunculus e por
Pirantel
estrongilóides, e por um período de até cinco dias para
triquinose e para a larva migrans cutânea. Os efeitos Acredita-se que o pirantel atue ao despolarizar a junção
colaterais com o tiabendazol são mais freqüentes do que neuromuscular dos helmintos, causando espasmo e paralisia.
com o mebendazol, porém geralmente transitórios; os mais Este fármaco é geralmente considerado droga segura. Os
comuns incluem distúrbios gastrintestinais, embora se tenha efeitos indesejáveis são leves e consistem principalmente em
relatado a ocorrência de cefaléia, tonteira e sonolência, distúrbios gastrintestinais. O pirantel foi substituído, em
podendo ocorrer reações alérgicas. grande parte, pelos benzimidazóis.
O albendazol, o benzimidazol mais recentemente Niclosamida
introduzido no mercado, é um anti-helmíntico de amplo
espectro. É administrado por via oral. A concetração A niclosamida era a droga de escolha para o tratamento
plasmática do metabólito ativo é 100 vezes maior do que a da teníase; todavia, foi em grande parte suplantada pelo
do mebendazol. Os efeitos indesejáveis – principalmente praziquantel.
distúrbios gastrintestinais – não são comuns e, em geral, não
exigem a interrupção do fármaco. Mecanismo de ação:

Praziquantel A niclosamida lesa irreverssivelmente o escólex


(cabeça do verme com órgãos que se fixam às células
O praziquantel é um anti-helmíntico de amplo intestinais do hospedeiro) e o segmento proximal. O verme
espectro. Trata-se da droga de escolha para o tratamento de separa-se da parede intestinal e é expelido.
todas as espécies de esquistossomo, sendo eficaz na
cisticercose, que antigamente não tinha tratamento eficaz. Para a T. solium a droga é administrada em dose única
após uma refeição leve, seguida de purgativo duas horas
Mecanismo de ação: mais tarde. O purgativo se faz necessário porque os
segmentos lesados da tênia podem liberar ovos, que não são
O praziquantel atua ao alterar a homeostasia do cálcio afetados pelo medicamento, existindo, portanto, uma
nas células do verme. Isso provoca contração da musculatura possibilidade teórica de desenvolvimento de cisticercose.
e, por fim, resulta em paralisia e morte do helminto. Para outras infecções por tênias, não há necessidade de se
administrar um purgativo após a administração da
O praziquantel afeta não apenas os esquitossomos niclosamida. Os efeitos indesejáveis são poucos,
adultos, como também as formas imaturas e as cercárias – a infrequentes e transitórios. Podem ocorrer náuseas e
forma do parasita que infecta o homem ao penetrar na sua vômitos.
pele. Por outro lado, ele não exerce nenhum efeito
farmacológico no homem na posologia indicada. Oxamniquina
Ocorrem efeitos indesejáveis leves que consistem em A oxamniquina mostra-se ativa contra Schistossoma
distúrbios gastrintestinais, tonteira, dor muscular e articular, mansoni, afetando as formas maduras quanto imaturas. O
erupções cutâneas e febre baixa. mecanismo de ação pode envolver a intercalação no DNA, e
sua ação seletiva pode estar relacionada com a capacidade
Piperazina de o parasita concentrar a droga.
A piperazina pode ser utilizada no tratamento de Os efeitos indesejáveis consistem em tonteira e cefaléia
infecções pela lombriga e pelo oxiúrus. transitórias, cuja ocorrência é relatada em 30 – 95% dos
pacientes. Podem ocorrer sintomas causados pela
Mecanismo de ação:
estimulação do SNC, incluindo alucinações e episódios
A piperazina inibe reversivelmente a transmissão convulsivos.
neuromuscular no verme, provavelmente ao atuar como o
GABA, o neurotransmissor inibitório sobre os canais de Levamisol
cloreto operados por GABA no músculo do nematódeo. Os O levamisol mostra-se eficaz nas infecções por
vermes paralisados são expelidos ainda vivos. lombriga. Exerce ação semelhante à da nicotina,
estimulando e, posteriormente, bloqueando as junções
A piperzina é administrada por via oral. Seus efeitos
neuromusculares. Os vermes paralizados são então
indesejáveis são raros; todavia em certas ocasiões, ocorrem
eliminados nas fezes. Os ovos são destruídos.
distúrbios gastrintestinais, urticária e broncoespasmo, e
alguns pacientes apresentam tonteira, parestesias, vertigem e O levamisol atravessa a barreira hematoencefálica. Os
descoordenação. Quando utilizada no tratamento de efeitos indesejáveis são poucos. Consistem em distúrbios
infecções por nematódeos, é usada em dose única. Para os gastrintestinais, tonteira e erupções cutâneas.
oxiúros, é necessário um curso mais prolongado (sete dias)
com doses menores. A piperazina foi susbtituida, em grande
parte, pelos benzimidazóis.

2 Marcelo A. Cabral
ANOTAÇÕES EM FARMACOLOGIA E FARMÁCIA CLÍNICA

Ivermectina
Mecanismo de ação:
A ivermectina é um agente semi-sintético derivado de
um grupo de substâncias naturais, as avermectinas, obtidas Acredita-se que a droga paralisa o verme ao abrir os
de um actinomiceto. Esse fármaco possui potente atividade canais de cloreto mediado pelo GABA e ao aumentar a
anti-helmíntica contra microfilárias no homem, constituindo condutância do cloreto regulada pelo glutamato. O resultado
a droga de escolha no tratamento da oncocercose, que causa consiste em bloqueio da transmissão neuromuscular e
a “cegueira dos rios”. Porém, a droga não mata as filarias paralisia do verme.
dultas. O fármaco é empregado para prevenir a lesão ocular
mediada pelas microfilárias e diminuir a transmissão entre A iermectina não interage com os receptores de GABA
seres humanos e vetores, entretanto, não tem a capacidade nos vertebrados, porém a sua afinbidade pelos receptores
de curar o hospedeiro humano com infestação por GABA dos invertebrados é de cerca de 100 vezes maior. Os
Onchocerca volvulus. cestódeos e os trematódeos carecem de receptores de
ivermectina de alta afinidade, o que pode explicar a
Como a ivermectina não é curativa, é tipicamente resistência desses organismos ao fármaco. A ivermectina
administrada a indivíduos infestados a cada 6 a 12 meses não atravessa a barreira hematoencefálica, motivo pelo qual
para a espectativa de vida dos vermes adultos (de 5 a 10 também não atua sobre os receptores gabaergicos humano.
anos).
Os efeitos adversos da ivermectina são habitualmente
A droga também produziu bons resultados na infecção atribuídos a respostas inflamatórias ou alérgicas às
por Wuchereria bancrofti, que causa elefantíase. microfilárias que estão morrendo (reação de tipo Mazzoti) e
consistem em erupções cutâneas, febre, tonteira, cefaléia e
A ivermectina reduz em até 80% a incidência da
dores musculares, articulares e nos linfonodos, fraqueza, dor
cegueira por oncocercose. A droga também exibe atividade
abdominal e hipotensão. Em geral, a droga é bem tolerada.
contra infecções por alguns nematódeos: ascaris, trichuris,
enterobios, mas não contra os ancilóstomos.

ЖЖЖЖЖЖ

Referências Bibliográficas

1. RANG, H. P. et al. Farmacologia. 4 edição. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2001;


2. KATZUNG, B. G. Farmacologia: Básica & Clinica. 9 edição. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2006;
3. CRAIG, C. R.; STITZEL, R. E. Farmacologia Moderna. 6 edição. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2005;
4. GOLAN, D. E. et al. Princípios de Farmacologia: A Base Fisiopatológica da Farmacoterapia. 2 edição. Rio de
Janeiro: Guanabara Koogan, 2009;
5. FUCHS, F. D.; WANNMACHER, L.; FERREIRA, M. B. C. Farmacologia Clínica. 3 edição. Rio de Janeiro: Guanabara
Koogan, 2004.
6. GILMAN, A. G. As Bases farmacológicas da Terapêutica. 10 edição. Rio de Janeiro: Mc-Graw Hill, 2005.
7. CONSTANZO, L. S. Fisiologia. 2 edição. Rio de Janeiro: Elsevier, 2004.
8. PORTH, C. M. Fisiopatologia. 6 edição. Rio de Janeiro: Ganabara Koogan, 2004

ЖЖЖЖЖЖ

3 Marcelo A. Cabral
ANOTAÇÕES EM FARMACOLOGIA E FARMÁCIA CLÍNICA

25) Fármacos antiprotozoários

Os principais protozoários que produzem doenças no espécies resulta em debilitação crônica, porém mais
homem são os que causam malária, amebíase, leishmaniose, raramente em morte.
tripanossomíase e tricomoníase. Os principais parasitas que causam a malária são:
Plamodium vivax, que causa a malária terçã benigna; e
a) A malária (impaludismo, maleita, febre- terçã)
Plasmodium falciparum, que causa a malária terçã maligna.
A malária é causada por diversas espécies de
plasmódios, dentre eles o P. falciparum, o P. vivax, P. Contágio e ciclo evolutivo da malária
malarie e P. ovale. Segundo a OMS, a malária mata uma O mosquito anófeles fêmea infectado injeta
criança africana a cada 30 segundos, e muitas crianças que esporozoítas (forma assexuada do parasita), que podem
sobrevivem a casos severos sofrem danos cerebrais graves e desenvolver-se no fígado humano em:
têm dificuldades de aprendizagem. As crianças menores de
cinco anos representam 85% dos casos de malária em todo o - esquizontes teciduais (estágio pré-eritrocítico), que
mundo. A África concentra cerca de 80% dos casos de liberam merozoitas. Infectam os eritrócitos, formando
malária no mundo. trofozoítas móveis que, após o seu desenvolvimento,
liberam outro lote de merozoítas que infectam eritrócitos e
A malária causada pelo protozoário P. falciparum
causam febre; isso constitui o ciclo eritrocítico. Os episódios
caracteriza-se inicialmente por sintomas inespecíficos, como
periódicos de febre que caracterizam a malária são devidos à
dores de cabeça, fadiga, febre e náuseas. Estes sintomas ruptura periódica sincronizada dos eritrócitos, com liberação
podem durar vários dias (seis para P.falciparum, várias de merozoítas e restos celulares. A elevação da temperatura
semanas para as outras espécies).
está associada a um aumento na concentração plasmática do
Mais tarde, surgem acessos periódicos de calafrios e fator de necrose tumoral (TNF); e
febre intensos que coincidem com a destruição maciça de - hipnozoítas dormentes, que podem liberar
hemácias e com a descarga de substâncias imunogénicas posteriormente merozoítas (estágios exoeritrocíticos).
tóxicas na corrente sangüínea ao fim de cada ciclo
reprodutivo do parasita. Estas crises paroxísticas, mais - um pequeno número de merozoítas podem sofrer
frequentes ao cair da tarde, iniciam-se com elevação da maturação, diferenciando-se em gametócitos que serão
temperatura até 39-40C°. São seguidas de palidez da pele e masculinos e femininos, os quais serão ser ingeridos por
tremores violentos durante cerca de 15 minutos a uma hora. outros mosquitos.
Depois cessam os tremores e seguem-se duas a seis horas de
febre a 41C°, terminando em vermelhidão da pele e suores
abundantes. O doente sente-se perfeitamente bem depois e
até à crise seguinte, que ocorre dalí dois a três dias.

Se a infecção for de P. falciparum, denominada


malária maligna, pode haver sintomas adicionais mais
graves como: choque circulatório, síncopes (desmaios),
convulsões, delírios e crises vaso-oclusivas. A morte pode
ocorrer a cada crise de malária maligna. Pode também
ocorrer a chamada malária cerebral: a oclusão de vasos
sanguíneos no cérebro pelos eritrócitos infectados causa
défices mentais e coma seguidos de morte (ou défice mental
irreversível). Danos renais e hepáticos graves ocorrem pelas
mesmas razões. As formas causadas pelas outras espécies
("benignas") são geralmente apenas debilitantes, ocorrendo
raramente a morte.

Sintomas crônicos incluem a anemia, cansaço,


debilidade com redução da capacidade de trabalho e da
inteligência funcional, hemorragias e infartos de incidência
muito aumentada, como infarto agudo do miocárdio e AVCs
(especialmente com P. falciparum).

Se não diagnosticada e tratada, a malária maligna


causada pelo P. falciparum pode evoluir rapidamente,
resultando em morte. A malária "benigna" das outras

1 Marcelo A. Cabral
ANOTAÇÕES EM FARMACOLOGIA E FARMÁCIA CLÍNICA

Os eritrócitos infectados expressam proteínas que polimerizada à hemozoína pela heme-polimerase. Se não for
promovem sua adesão ao endotélio, reduzindo a polimerizada, a ferriprotoporfirina provoca lesão lisossomal
probabilidade de depuração dessas células infectadas por e toxicidade para o plasmódio.
seqüestro esplênico. A deposição pode afetar qualquer órgão
como o cérebro, os pulmões e os rins. A lesão desse órgão A cloroquina também inibe a heme polimerase. A
resulta em hipóxia teci dual, necrose focal, e hemorragia. cloroquina é uma base fraca que penetra no vacúolo
digestivo do plasmódio (que é um meio ácido), sendo
Agentes antimaláricos protonada rapidamente. Isso impede sua saída do vacúolo
digestivo. Em conseqüência, a cloroquina se acumula em
Os agentes antimaláricos atualmente disponíveis atuam grande quantidade e se liga a ferriprotoporfirina IX e inibe a
contra alvos constituídos por quatro vias fisiológicas dos metabolização desse metabólito do heme, que normalmente
plasmódios: é realizado pela heme-polimerase. A ferriprotoporfirina não
polimerizada leva à lesão oxidativa da membrana, sendo
- o metabolismo do heme (cloroquina, quinina, tóxica para o parasita. Por conseguinte, a cloroquina
mefoclina e artmisina); envenena o parasita ao impedir a destoxificação de um
produto do metabólismo tóxico da hemoglobina.
- o transporte de elétrons (primaquina);
Na atualidade o P. falciparum tornou-se resistente a
- a tradução de proteínas (oxicilina, tetraciclina e
cloroquina na maior parte do mundo.
clindamicina); e
A cloroquina possui poucos efeitos adversos quando
- o metabolismo do folato (sulfadoxima-pirimetamina e
administrada para quiomioprofilaxia. Com uso de doses
proguanil).
mais altas no tratamento agudo, podem ocorrer náusea,
Clinicamente, os agentes antimaláricos são vômitos, tonteira, visão turva, cefaléia e sintomas de
classificados quanto à sua ação contra os diferentes estágios urticária. Em altas doses pode provocar retinopatias. A droga
do ciclo de vida do parasita: é considerada segura para gestantes.

As drogas utilizadas para a quimioprofilaxia Mefloquina


(cloroquina, mefloquina, proguanil, pirimetamina,
A mefloquina é um composto esquizonticida sanguíneo
dapsona e doxiciclina), para a prevenção dos ataques de
que se mostra ativo contra P. falciparum e P. vivax.
malária numa área da doença, atuam sobre os merozoítas
Entretanto, não exerce nenhum efeito sobre as formas
que emergem das células hepáticas.
hepáticas dos parasitas, razão pela qual o tratamento das
As drogas usadas no tratamento agudo de malária (cura infecções por P. vivax deve ser acompanhado de um curso
clínica ou supressiva – quinina, mefloquina, halofantrina, de primaquina para erradicar os hipnozoítas.
sulfonas, pirimetamina) atuam sobre os parasitas no
A ação parasitária está associada à inibição da heme
sangue; podem curar infecções por parasitas que não
polimerase.
possuem estágio exoeritrocítico.
Quando a mefloquina é utilizada no tratamento agudo,
As drogas utilizadas para a cura radical (primaquina)
ocorrem distúrbios gastrintestinais em 50% dos pacientes.
são ativas contra os parasitos no fígado. Algumas drogas
Pode ocorrer toxicidade transitória do SNC – vertigem
atuam sobre os gametócitos e impedem a transmissão pelo
confusão, disforia, insônia. A mefloquina é contra-indicada
mosquito.
para gestantes e mulheres propensas a engravidar.
1) Fármacos usados na profilaxia da malária
2) Fármacoa usados no tratamento agudo da
Cloroquina malária

A cloroquina é um agente esquizonticida sanguíneo Quinina


muito potente, eficaz contra as formas eritrocíticas de todas
A quinina é um alcalóide derivado da casca da
as quatro espécies de plasmódios, mas que não exerce
chinchona. Trata-se de um agente esquizonticida sanguíneo,
efeitos sobre os esporozoítas, hipnozoítas ou gametócitos.
eficaz contra as formas eritrocíticas de todas as quatro
Possui um complexo mecanismo de ação que ainda não está
espécies de plasmódios, mas que carece de efeito sobre os
totalmente esclarecido. A cloroquina inibe a digestão da
gametócitos de P. falciparum.
hemoglobina pelo parasita e, assim, reduz o suprimento de
aminoácidos necessários à viabilidade do parasita. Os Assim como a cloroquina, seu mecanismo de ação está
plasmódios possuem capacidade limitada de síntese de associado à inibição da heme polimerase do parasita. Além
aminoácidos de novo; por isso, dependem dos aminoácidos disso, ela pode se ligar ao DNA do plasmódio, com
liberados pela digestão das moléculas de hemoglobina do conseqüente separação das fitas através do rompimento das
hospedeiro. A degradação da hemoglobina libera os pontes de hidrogênio, e impedimento da transcrição e
aminoácidos básicos e um metabólito do heme tóxico ao tradução desse DNA.
plasmódio, a ferriprotoporfirina IX. Esta última deve ser

2 Marcelo A. Cabral
ANOTAÇÕES EM FARMACOLOGIA E FARMÁCIA CLÍNICA

Dentre os efeitos adversos, apresenta-se o


Foram observados poucos efeitos indesejáveis. Foi
chinchonismo (náusea, tonteira, zumbido, cefaléia e visão
relatada a ocorrência de bloqueio cardíaco transitório,
turva), vômitos, liberação de insulina com hipoglicemia
redução transitória dos neutrófilos sanguíneos e episódios
agravada pelo consumo de glicose por parte do parasita.
breves de febre.
Halofantrina
3) Fármacos usados na cura radical da malária
A halofantrina é um agente esquizonticida sanguíneo.
O fármaco mostra-se ativo contra cepas de P. falciparum Primaquina
resistentes a cloroquina, à pirimetamina e à quinina. É eficaz Sua atividade antimalárica é provavelmente atribuível à
contra a forma eritrocítica de P. vivax, mas não contra quinona, um metabpolito da primaquina que interfere na
hipnozoítas. Seu mecanismo de ação permanece função da ubiquinona como transportador de elétrons na
desconhecido. cadeia respiratória. Sua ação é exercida contra hipnozoítas
hepáticos. Trata-se do único fármaco capaz de efetuar uma
Como efeitos indesejáveis podem ocorrer dor
cura radical das formas de malária nas quais os parasitas
abdominal, distúrbios gastrintestinais, cefaléia, elevação
possuem um estágio dormente no fígado – P. vivax e P.
transitória das enzimas hepáticas, prurido, alteração no ritmo
ovale. Sendo assim, a primaquina é o único fármaco que
cardíaco e tosse.
impede a recrudescência da malária.
Sulfadoxina-Pirimetamina
A primaquina não afeta os esporozoítas e exerce pouca
A sulfodoxina é um análogo do PABA, que inibe ou nenhuma ação contra o estágio eritrocítico do parasita.
competitivamente a diidropteroato sintetase dos parasitas, Entretanto exerce ação gametocida, constituindo o agente
uma enzima essencial na via de síntese do ácido fólico. A antimalárico mais eficaz na prevenção da transmissão da
pirimetamina é um análogo do folato que inibe doença por todas as quatro espécies de plasmódios. É quase
competitivamente a diidrofolato em tetraidrofolato. A invariavelmente usado em combinação com outra droga,
sulfadoxina e a pirimetamina, quando utilizadas em geralmente a cloroquina.
combinação, atuam de modo sinérgico, inibindo o
Os efeitos indesjáveis consistem principalmente em
crescimento dos parasitas da malária. Essa combinação é
distúrbios do trato gastrintestinal e, em altas doses,
altamente efetiva contra os estágios esquizontes sanguíneos
metemoglobinemia. Ocorre hemólise em indivíduos com
do P. falciparum, mas não contra os gametócitos.
deficiência genética de glicose-6-fosfato desidrogenase
Infelizmente, a resistência disseminada dos parasitas da eritrocítica, razão pela qual nunca deve ser administrada sem
malária a essa combinação limitou acentuadamente a sua antes se confirmar a presença de atividade dessa enzima.
utilidade. Nunca de ser administrada em gestantes.

As reações adversas mais comuns são: reações b) A Amebíase


cutâneas graves; efeitos hematológicos (anemia
A amebíase é uma infecção causada por Entamoeba
megaloblástica, leucopenia e trombocitopenia.
histolytica, produzida por ingestão de cistos desse
A sulfadoxina-pirimetamina não é utilizada como microrganismo. No intestino, os cistos desenvolvem-se em
agente quimioprofilático contra a malária. trofozoítas, que aderem às células epiteliais do cólon através
de uma lectina presente na membrana do parasita, que possui
Artemisina semelhanças com as proteínas de aderência do hospedeiro. A
seguir o trofozoíta lisa a célula do hospedeiro e invade a
A artemisina, um extrato químico obtido da artemísia, submucosa, onde pode secretar um fator que inibe os
é um esquizonticida sanguíneo de ação rápida, que tem sido macrófagos ativados pelo interferon-gama que, caso
eficaz no tratamento do ataque agudo da malária tanto vivax contrário o matariam. Esse processo pode resultar em
quanto falcípara. O artesunato, um derivado hidrossolúvel, e disenteria, o parasita pode invadir o fígado com conseqüente
os análogos sintéticos, artemeter e arteter, exibem maior desenvolvimento de abscessos hepáticos e granulomas
atividade e são mais bem absorvidos. O mecanismo de ação amebianos.
não é conhecido; pode envolver lesão da membrana do
parasita por radicais livres ou alquilação covalente de Os principais fármacos atualmente utilizados no
proteínas. Esses compostos não exercem nenhum efeito tratamento da amebíase são: metronidazol, tinidazol e
sobre os hipnozoítas hepáticos e não são úteis para a diloxanida. Esses agentes podem ser usados em combinação.
quimioprofilaxia. Devido à resistência disseminada dos
parasitas a outros agentes antimaláricos, a terapia de Metronidazol
primeira linha para a malária não-complicada e complicada
O metronidazol mata os trofozoítas de E. histolytica,
na África subsaariana envolve uma combinação de
porém não exerce nenhum efeito sobre os cistos. Trata-se da
artemisina com um segundo agente antimalárico, com
droga mais eficaz disponível para a amebíase invasiva
mecanismo de ação diferente e meia vida mais longa.
afetando o intestino ou o fígado.

3 Marcelo A. Cabral
ANOTAÇÕES EM FARMACOLOGIA E FARMÁCIA CLÍNICA

Acredita-se que o metronidazol atua através da lesão do


As principais drogas utilizadas na doença do sono
DNA, da membrana e células-alvos do trofozoíta por
africana são a suramina, com a pentamidina como alternativa,
produtos tóxicos de oxigênio (radicais livres) formados pelo
no estágio hemilinfático da doença, e o composto melarsopol
próprio parasita a partir da droga.
para o estágio avançado com comprometimento do SNC.
São observados poucos efeitos indesejáveis com o uso
As drogas utilizadas na doença de chagas incluem
de doses terapêuticas. Foram relatados distúrbios
primaquina e a puromicina, o nifurtimox e os benzimidazois.
gastrintestinais, tonteira, cefaléia, neuropatias sensoriais. A
Todavia, não há ainda nenhum tratamento eficaz para esta
droga interfere no metabolismo do álcool, de modo que é
doença.
preciso evitar estritamente o consumo de bebidas alcoólicas.
O metronidazol não deve ser utilizado durante a gravidez.
Suramina
Existem outros fármacos semelhantes, a exemplo do
tinidazol e o mimorazol. A suramina não mata imediatamente os parasitas,
porém induz alterações bioquímicas que levam à aliminação dos
Diloxanida microrganismos da circulação depois de um período de 24
horas.
A diloxanida e o furoato de diloxanida são eficazes
contra o parasita intestinal não invasivo da ameba. As drogas A droga liga-se firmemente às proteínas plasmáticas do
exercem ação amebicida direta, afetando as amebas antes do hospedeiro, e o complexo assim formado penetra no
encistamento. Não possuem graves efeitos adversos. tripanossomo por endocitose; a seguir, é liberado por proteases
lisossômicas. Possui ação seletiva sobre as enzimas
c) A Leishmaniose
tripanossômicas.
A leishmaniose é uma infecção causada pelo
A suramina é relativamente tóxica, sobretudo em
microrganismo do gênero Leishmania. O parasita ocorre em
pacientes desnutridos, exercendo efeito tóxico principalmente
duas formas – flagelada, encontrada no mosquito-pólvora
sobre os rins.
(inseto vetor) que se alimenta de animais de sangue quente; e
não flagelada, que ocorre no hospedeiro mamífero picado. Neste
e) Tricomoníase
último o parasita é capturado pelo sistema fagocítico
mononuclear, onde permanece vivo e viável. Existem vários O principal microrganismo do gênero Trichomonas que
tipos clínicos de leishmaniose – uma infecção cutânea simples, produz doenças no ser humano é o T. vaginalis. As cepas
que pode ter cura expontânea, uma forma mucocutânea (na qual virulentas provocam inflamação da vagina nas mulheres e,
podem surgir grandes úlceras nas mucosas) e uma forma algumas vezes, da uretra nos homens.
visceral (calazar). Nesta última, o parasita dissemina-se pela
corrente sanguínea e causa hepatomegalia, esplenomegalia, As principais drogas utilizadas na terapia são o
anemia e febre intermitente. metronidazol e o tinidazol.
Os principais fármacos para o tratamento da f) Toxoplasmose
leishmaniose são o estibogliconato de sódio e o antimoniato de
meglumina, que apresentam mecanismo de ação ainda não O Toxoplasma gondi é um protozoário que infecta
totalmente elucidado. Outros fármacos incluem a anfotericina e gatos e outros animais. Os oocistos nas fezes do animal
o metronidazol. infectado podem infectar o ser humano, dando origem a
esporozoítas, a seguir, a trofozoítas e, por fim, a cistos nos
d) Tripanossomiase tecidos. Em muitos indivíduos a toxoplasmose é autolimitada ou
até mesmo assintomática, porém a infecção pelo protozoário
Existem três espécies principais de tripanossomo que durante a gravidez pode causar grave doença no feto. Os
causam doenças no ser humano: o Tripanossoma gambiense e o indivíduos imunocomprometidos também são muito suscetíveis.
Tripanossoma rhodesiense, responsáveis pela doença do sono
na África, e Tripanossoma cruzi, responsável pela Doença de O tratamento de escolha consiste em pirimetamina-
Chagas. Em ambos os tipos da doença surge uma lesão local sulfadiazina (que deve ser evitado em gestantes); são também
inicial no ponto de entrada, seguida de surtos de parasitemia e utilizados o trimetoprima-sulfametoxazol ou a pentamidina
febre. O dano aos órgãos é causado pelas toxinas liberadas, parenteral. Mais recentemente, a azitromicina mostrou-se
afetando o SNC (na doença do sono), o coração e, algumas promissora.
vezes, o fígado, o baço, os ossos e o intestino (na Doença de
Chagas).

Referências Bibliográficas

1. RANG, H. P. et al. Farmacologia. 4 edição. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2001;


2. KATZUNG, B. G. Farmacologia: Básica & Clinica. 9 edição. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2006;
3. CRAIG, C. R.; STITZEL, R. E. Farmacologia Moderna. 6 edição. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2005;

4 Marcelo A. Cabral
ANOTAÇÕES EM FARMACOLOGIA E FARMÁCIA CLÍNICA

4. GOLAN, D. E. et al. Princípios de Farmacologia: A Base Fisiopatológica da Farmacoterapia. 2 edição. Rio de


Janeiro: Guanabara Koogan, 2009;
5. FUCHS, F. D.; WANNMACHER, L.; FERREIRA, M. B. C. Farmacologia Clínica. 3 edição. Rio de Janeiro: Guanabara
Koogan, 2004.
6. GILMAN, A. G. As Bases farmacológicas da Terapêutica. 10 edição. Rio de Janeiro: Mc-Graw Hill, 2005.
7. CONSTANZO, L. S. Fisiologia. 2 edição. Rio de Janeiro: Elsevier, 2004.
8. PORTH, C. M. Fisiopatologia. 6 edição. Rio de Janeiro: Ganabara Koogan, 2004

ЖЖЖЖЖЖ

5 Marcelo A. Cabral
ANOTAÇÕES EM FARMACOLOGIA E FARMÁCIA CLÍNICA

26) Fármacos utilizados nos distúrbios da hemostasia


A hemostasia é definida como interrupção da perda de Os principais fenômenos envolvidos na hemostasia
sangue de vasos lesados, é essencial à vida. Os distúrbios da são:
hemostasia são a hipercoagulabilidade e a hemorragia.
- adesão e ativação das plaquetas; e
Estados de hipercoagulabilidade: didaticamente,
podemos classificar os fatores envolvidos na - coagulação sanguínea (formação de fibrina).
hipercoagulabilidade em dois grupos principais: condições
que aumentam a função plaquetária e condições que causam O processo de coagulação sanguínea exige a presença
aceleração na atividade do sistema de coagulação. de plaquetas produzidas na medula óssea, do fator de von
Willhebrand produzido pelo endotélio, e dos fatores de
a) condições que aumentam a função plaquetária: coagulação sintetizados no fígado a partir da vitamina K.

- distúrbios do fluxo sanguíneo (aterosclerose, diabetes, Já a trombose é uma condição patológica decorrente da
tabagismo, dislipidemia e trombocitose); ativação inapropriada dos mecanismos homeostáticos. A
trombose venosa geralmente está associada com estase do
- lesão endotelial; sangue. O trombo venoso possui um pequeno componente
plaquetário e um grande componente de fibrina. A trombose
- aumento da sensibilidade das plaquetas aos fatores arterial está associada com aterosclerose, é composto do
que causam adesão e agregação; denominado trombo branco, que consiste principalmente em
plaquetas e leucócitos no interior de uma rede de fibrina.
b) condições que causam aceleração na atividade do
sistema de coagulação: O trombo pode desprender-se, seguir seu trajeto como
êmbolo e alojar-se mais adiante, causando isquemia e infarto.
- gravidez e puerpério;
As drogas afetam a hemostasia e a trombose de três
- anticoncepcionais orais; maneiras distintas:
- estado pós-cirúrgico; 1) ao modificar a coagulação sanguínea (formação de
fibrina) – anticoagulantes tais como heparina,
- imobilidade; warfarina e dicumarol;
- ICC; 2) ao modificar a função das plaquetas – antiplaquetários
tais como AAS, dipiridamol, sulfimpirazona e
- doenças malignas; e
ticlopidina; e
- diminuição da síntese dos fatores anticoagulantes.
3) ao afetar a remoção da fibrina (fibrinólise) – ateplase,
Distúrbios hemorrágicos: anistreplase e estreptoquinase.

Os distúrbios hemorrágicos são causados por defeitos


associados às plaquetas, aos fatores da coagulação e à
integridade vascular.

Os distúrbios na formação do tampão plaquetário


consistem na redução do número de plaquetas devido à sua
produção inadequada (disfunção medular), na destruição
excessiva das plaquetas (tombocitopenia), nas anormalidades
da função plaquetária (trombocitopatia) ou nos defeitos do
fator de von Willhebrand.

O comprometimento na etapa da coagulação é causado


por deficiência de um ou mais fatores da coagulação,
principalmente, pela falta de vitamina K, hepatopatia,
distúrbios hereditários (hemofilia A, hemofilia B e doença de
von Willhebrand). A deficiência do fator VII-FvW denomina-
se hemofilia A e a deficiência do fator IX, hemofilia B.

Os distúrbios da integridade dos vasos sanguíneos


resultam de fraqueza estrutural dos vasos ou lesão vascular
devido á inflamação e mecanismos imunes.
A coagulação sanguínea refere-se à transformação do
sangue líquido em gel sólido ou coágulo. O principal evento
1 Marcelo A. Cabral
ANOTAÇÕES EM FARMACOLOGIA E FARMÁCIA CLÍNICA

consiste na conversão do fibrinogênio solúvel em filamentos


A trombina (fator IIa) cliva o fibrinogênio, produzindo
insolúveis de fibrina, a última etapa de uma complexa cascata
fragmentos que sofre polimerização para formar a fibrina.
enzimática. A iniciação do processo de coagulação depende
Além disso, ativa o fator XIII, uma fibrinoligase, que reforça
da exposição do sangue a componentes que, normalmente,
as ligações entre uma fibrina e outra, estabilizando, assim, o
não estão presentes no interior dos vasos, em decorrência de
coágulo. Além de sua ação coagulante, a trombina também
lesões estruturais (injúria vascular) ou alterações bioquímicas
provoca agregação plaquetária, estimula a proliferação celular
(como liberação de citocinas). O fator tecidual é o principal
e modula a contração do músculo liso. Os efeitos da trombina
ativador da coagulação sanguínea.
sobre as plaquetas e musculatura lisa são desencadeados pela
Etapas da hemostasia: sua interação com receptores específicos de trombina, que
pertencem à superfamília dos receptores acoplados à proteína
a) espasmo vascular, de caráter efêmero (dura em G.
cerca menos de um minuto), devido à contração do músculo
liso da parede do vaso lesionado; A via via intrínseca (de contato) começa quando o
fator XII adere a uma superfície de carga negativa,
b) formação do tampão plaquetário, que envolve a convergindo para via in vivo (via extrínseca) no estágio de
adesão plaquetária, que é a ligação das plaquetas à camada ativação do fator X. Deste ponto em diante, e na presença do
subendotelial do vaso, ocorre quando o receptor plaquetário se fator Va, ocorre a ativação do fator II em fator IIa (trombina),
liga ao fator de von Willhebrand, produzido pelas células que por sua vez transforma o fribrinogênio em fibrina.
endoteliais, no local da lesão; e também a agregação
plaquetária, que consiste na ligação de outras plaquetas que se Esta cascata enzimática de aceleração deve ser
tornam viscosas devido a ação do ADP e TXA2 liberados controlada por inibidores, visto que, de outro modo, todo o
pelos grânulos das plaquetas iniciais. sangue do organismo se solidificaria em poucos minutos após
o início da hemostasia. Um dos inibidores mais importantes é
c) formação do coágulo de fibrina insolúvel, que a antitrombina III, que neutraliza todas as serina proteases na
ocorre quando a via de coagulação é ativada na superfície da cascata. O endotélio vascular também limita ativamente a
plaqueta e o fibrinogênio é convertido em fibrina. A cascata extensão do trombo.
de coagulação, que envolve vários fatores de coagulação, é
necessária para formar uma rede de fibrina que reterá os O cálcio é essencial para as três etapas, isto é, para as
componentes sanguíneos juntos (estabilização do tampão ações do fator IXa sobre o fator X; do fator VIIa sobre o fator
hemostático). X; e do fator Xa sobre o fator II (protrombina).

d) retração do coágulo, que consiste na expelição do São utilizadas drogas para modificar a cascata quando
soro do coágulo e união das bordas do vaso lesado. existe um defeito da coagulação ou quando ocorre coagulação
indesejável.
e) dissolução do coágulo (fibrinólise), que permite o
restabelecimento do fluxo sanguíneo e o reparo do tecido Os fatores ausentes podem ser supridos através da
permanente. Isto se dá principalmente pela ativação do administração de plasma fresco ou preparações concentradas
plasminogênio (presente no sangue) em plasmina que digere de fator VII ou de fator IX. Os defeitos adquiridos podem
as fibras de fibrina do coágulo. A plasmina circulante é exigir tratamento com vitamina K.
rapidamente inativada pelo inibidor da alfa2-plasmina, que
limita a fibrinólise ao coágulo local e impede a sua ocorrência 1) - Vitamina K
em toda a sua extensão. O inibidor do ativador de A vitamina K é essencial para a formação dos fatores
plasminogênio (alfa2-plasmina), quando presente em altas da coagulação II, VII, IX e X, pois participa como co-fator
concentrações, é associado à ocorrência de trombose venosa para a carboxilação do ácido y-carboxiglutâmico (GLa). Ela
profunda, coronariopatia e infarto do miocárdio. existe na natureza sob duas formas: K1 (fitomenadiona)
originadas nas plantas e, K2 sintetizada por bactérias do trato
Vias de coagulação
gastintestinal.
Existem duas vias principais para a cascata de
O composto natural pode ser administrado por via oral,
coagulação e conseqüente formação de fibrina. Uma delas
juntamente com sais biliares que facilitam sua absorção. A
tradicionalmente denominada “intrínseca” e outra
preparação sintética, o fosfato sódico de manadiol, é
“extrínseca”.
hidrossolúvel e não necessita de sais biliares, porém leva mais
A via extrínseca (in vivo) é desencadeada por um fator tempo para agir do que a fitomenadiona.
tecidual (tromboplastina) que ativará o fator VII em fator
As indicações clínicas da vitamina K incluem o
VIIa. Este, por sua vez, ativará os fatores IX e X. A
tratamento ou prevenção de sangramento devido ao uso de
coagulação prossegue através da produção adicional de fator
agentes anticoagulantes orais; doença hemorrágica do recém-
Xa pelo complexo IXa-VIIIa-cálcio-fosfolipídio.
nascido; e nas deficiências de vitamina K tais como o espru,
O fator Xa, na presença de cálcio, de fosfolipídeo e do doença celíaca, esteatorréia e ausência de bile.
fator Va, ativa a protrombina (fator II) em trombina (fator IIa),
principal enzima da cascata.
2 Marcelo A. Cabral
ANOTAÇÕES EM FARMACOLOGIA E FARMÁCIA CLÍNICA

2) - Anticoagulantes orais deprimem a flora intestinal que normalmente sintetizam a


vitamina K.
A doença trombótica e troboembólica é comum e
possui graves conseqüências, incluindo infarto do miocárdio, - as drogas que induzem o metabolismo hepático através da
acidente vascular cerebral, trombose venosa profunda e enzimas P450 aumentam a degradação da varfarina
embolia pulmonar. As principais drogas utilizadas para os (rifampicina, carbamazepina, barbitúricos, griseofulvina). Da
trombos brancos ricos em plaquetas são os agentes mesma forma, o hipotiroidismo diminui o efeito da varfarina
antiplaquetários (principalmente o ácido acetil-salicílico) e os devido ao fato da redução na degradação dos fatores de
agentes fibrinolíticos (ateplase, estreptoquinase e coagulação.
anistreplase), que são considerados adiante. Os principais
fármacos utilizados na prevenção ou tratamento dos trombos Os principais efeitos indesejáveis da varfarina são as
vermelhos são: hemorragias (particularmente a intestinal ou cerebral) e a
teratogenicidade. Os efeitos dos anticoagulantes orais podem ser
- anticoagulantes orais (varfarina e compostos revertidos com administração de fitomenadiona (vitamina K1).
relacionados);
3) - Anticoagulantes injetáveis
- anticoagulantes injetáveis (heparina e inibidores
mais novos da trombina). 3.1 - Heparina e heparina de baixo peso molecular

2.1 - Varfarina A heparina inibe a coagulação ao ativar a antitrombina


III, um inibidor natural que inativa o fator Xa e também a
A varfarina é a mais importante droga anticoagulante trombina (fator IIa). A atividade anticoagulante é devida a uma
oral. Seu mecanismo de ação baseia-se em impedir a redução da seqüência peculiar de pentassacarídios, com alta afinidade para
viatmina K e consequentemente inibem a y-carboxilação de a AT III. Por isso, a deficiência de antitrombina III representa
ácido glutâmico (glu) nos fatores da coagulação II, VII, IX e X. uma causa muito rara de resistência a heparinoterapia.

São necessários vários dias para o aparecimento de Por outro lado, as heparinas de baixo peso molecular
seus efeitos, devido ao tempo levado para a degradação dos aumentam apenas a ação da antitrombina III sobre o fator Xa,
fatores carboxilados que já se encontravam no sangue. mas não aumentam a ação da antitrobina III sobre a trombina,
como o faz a heparina.
Os anticoagulantes orais atravessam a placenta e não
devem ser administrados nos primeiros meses de gravidez, uma A heparina não é absorvida pelo intestino em virtude
vez que são teratogênicos. de sua carga e de suas grandes dimensões; por conseguinte, é
administrada por via intravenosa ou subcutânea.
A terapia é complicada não apenas devido ao fato de
que o efeito de uma determinada dose só é observado dois dias O efeito da heparina é monitorizado pelo tempo de
após a sua administração, mas também em virtude da existência tromboplastina parcial ativado (APTT), devendo a dose ser
de numerosas condições que modificam a sensibilidade à ajustada para uma faixa-alvo de 1,5 – 2,5 vezes o valor de
varfarina (hepatopatia que diminui a síntese dos fatores de controle. Já as heparinas de baixo peso molecular (LMWH) não
coagulação, febre e tireotoxicose que aumentam a degradação necessitam de monitorização quando utilizadas em uma dose
dos fatores de coagulação), além de interações com outras padrão em relação ao peso corporal do paciente
drogas. O tratamento com varfarina é monitorizado através da
determinação do tempo de protombina, que é expresso com O principal efeito indesejável é a hemorragia, que é
Relação Normalizada Internacional (INR). Em geral a dose é resolvida interrompendo-se o tratamento e, se necessário,
ajustada para fornecer uma INR de 2 – 4. administrando-se o sulfato de protamina. Este antagonista da
heparina, que é administrado por via intravenosa, é uma
As principais drogas que interagem com a varfarina proteína fortemente básica que forma um complexo inativo com
são: a heparina.

- agentes que inibem o metabolismo hepático: No uso clínico dos anticoagulantes orais, a heparina
cimetidina, imipramina, cloranfenicol, ciprofloxacina, (frequentemente na forma de LMWH) é utilizada de forma
metronidazol, amiodarona e azóis antifúngicos; aguda para ação em curto prazo, enquanto a varfarina é utilizada
para terapia prolongada.
- drogas que inibem a função plaquetária: AINES, aspirina;
O uso de heparina não-fracionada durante a realização
- drogas que deslocam a varfarina de seus sitos de ligação na de angioplastia coronariana com ou sem implante de stent é
albumina: hidrato de cloral e alguns AINES; mandatório.
- drogas que inibem a redução da vitamina K: cefalosporinas; 3.3 - Hirudina
- drogas que diminuem a disponibilidade de vitamina K: A hirudina é um inibidor específico e irreversível da
antibióticos de amplo espectro e algumas sulfonamidas, pois trombina obtido da sanguessuga, que atualmente é disponível
numa forma recombinante, como lepirudina.
3 Marcelo A. Cabral
ANOTAÇÕES EM FARMACOLOGIA E FARMÁCIA CLÍNICA

Sua ação não depende da antitrombina, o que significa


que ela pode alcançar e inativar a trombina ligada à fibrina nos 4.3 - Abciximab
trombos. A lepirudina exerce pouco efeito sobre as plaquetas ou O abciximab é um anticorpo monoclonal humanizado
sobre o tempo de sangramento. Deve ser monitorizada através dirigido contra o complexo IIb/IIIa, ou seja, é um antagonista
do TTPa. dos receptores IIb/IIIa. Este complexo de glicoproteína atua
como receptor, principalmente para o fibrinogênio e a
4) - Fármacos antiplaquetários (aspirina, clopidogrel,
fibronectina, mas também para a fibronectina e o fator de von
ticlopidina, abciximab)
Willebrand. A ativação desse complexo receptor constitui a “via
O endotélio vascular sadio impede a adesão das final comum” da agregação plaquetária. Os indivíduos que
plaquetas. As plaquetas aderem a áreas enfermas ou lesadas ou carecem desse receptor são portadores de um distúrbio
tornam-se ativadas, constituindo o foco de localização para a hemorrágico denominado trombastenia de Glanzmann. A
formação de fibrina. principal indicação dos antagonistas dos receptores IIb/IIa é no
tratamento adjuvante de pacientes submetidos a angioplastia
Quando ativadas, as plaquetas sofrem uma complexa coronariana.
seqüência de reações essenciais para a hemostasia e importantes
para cicatrização de vasos sanguíneos lesados (além de 4.4 - Dipiridamol
desempenharem atividade na inflamação), tais como adesão
O dipiridamol é um vasodilatador que inibe a função
através do fator de von Willebrand; alteração em sua forma que
plaquetária ao inibir a captação de adenosina (ADP) e a
passa a apresentar pseudópodes; secreção do conteúdo de
atividade da GMPc fosfodiesterase. Este fármaco é utilizado em
grânulos; biossíntese de mediadores lábeis; agregação das
associação com a aspirina na prevenção da isquemia vascular
plaquetas entre si através das pontes de fibrinogênio; e
cerebral. Pode ser também utilizado em associação com a
exposição de fosfolipídeos ácidos promovendo a formação de
varfarina.
trombina.
5) - Agentes fibrinolíticos (estreptoquinase,
Devido à atividade essencial das plaquetas na doença
anistreplase, ateplase, duteplase, uroquinase)
tromboembólica, as drogas antiplaquetárias possuem imenso
valor terapêutico potencial. Uma cascata fibrinolítica é iniciada concomitantemente
com a cascata da coagulação, resultando na formação, dentro do
4.1 - Ácido acetilsalcílico (Aspirina)
coágulo, de plasmina, que digere a fibrina. Diversos agentes
A aspirina altera o equilíbrio entre o TXA2, que promovem a formação da plasmina a partir de seu precursor
promove agregação, e a prostaciclina (PGI2), que a inibe. A plasminogênio (estreptoquinase e APSAC), ou agem através da
aspirina inativa a ciclooxigenase (age, sobretudo sobre a COX- ativação do plasminogênio tecidual (alteplase, reteplase,
1) através da acetilação irreversível de um radical de serina em duteplase).
seu sítio ativo. Isso reduz tanto a síntese de TXA2 nas plaquetas
Vários agentes fibrinolíticos (trombolíticos) são
quanto a síntese de prostaciclinas no endotélio. Entretanto, as
utilizados clinicamente, sobretudo para desobstruir a artéria
células endoteliais vasculares são capazes de sintetizar nova
coronária ocluída em pacientes com infarto agudo do miocárdio.
enzima, ao passo que as plaquetas são incapazes de fazê-lo.
Após a administração de aspirina, a síntese de TXA2 só se
5.1 - Estreptoquinase
recupera após substituição da coorte afetada de plaquetas em 7 –
10 dias. Portanto, a aspirina reduz a síntese do tromboxano A2 A estreptoquinase, que é uma droga originada da
nas plaquetas, que é o responsável pela agregação plaquetária. bactéria Estreptococus beta-hemolítico, liga-se ao
plasminogênio, expondo o sítio ativo de serina e resultando em
A administração intermitente de baixas doses de atividade da plasmina. Quando infundida por via intravenosa,
aspirina diminui a síntese de tromboxano A2 sem reduzir reduz a taxa de mortalidade no infarto agudo do miocárdio,
drasticamente a síntese de prostaciclina. sendo esse efeito benéfico aditivo com o da aspirina. Sua ação é
bloqueada por anticorpos antiestreptocócicos, que aparecem
A eficácia da aspirina é limitada pela existência de vias
cerca de quatro dias ou mais após a administração da dose
alternativas de ativação das plaquetas, idependentes do TXA2.
inicial. É necessário um intervalo de pelo menos um ano para
4.2 - Clopidogrel e ticlopidina que possa ser novamente utilizada, devido à produção de
anticorpos.
O clopidogrel e a ticlopidina reduzem a agreção
plaquetária ao inibir a via do ADP das plaquetas. Essas drogas 5.2 - Anistreplase
derivam da tienopiridina, que exercem seus efeitos
A anistreplase é uma pró-droga da estreptoquinase. A
antiplaquetários ao bloquear irreversivelmente o receptor de
meia vida de ativação dura cerca de duas horas, tanto no sangue
ADP nas plaquetas. Hoje em dia, o uso do clopidogrel ou da
quanto no trombo. A anistreplase é administrda por via
triclopidina na prevenção da trombose é considerado prática
intravenosa e sua atividade fibrinolítica persiste por 4 – 6 horas.
padrão em pacientes submetidos à colocação de uma
endoprótese coronária. A principal vantagem do clopidogrel em
relação à ticlopidina é sua maior tolerabilidade gastrintestinal e
menor risco de neutropenia.
4 Marcelo A. Cabral
ANOTAÇÕES EM FARMACOLOGIA E FARMÁCIA CLÍNICA

5.3 - Ateplase e duteplase risco de sangramento, como hemorragia após prostatectomia ou


extração dentária, na menorragia e após superdosagem de
Esses fármacos são ativadores do plasminogênio agente trombolítico.
tecidual recombinante. Sua atividade é potencializada na
presença de fibrina, isto é, são mais ativas sobre o Ácido aminocapróico
plasminogênio ligado à fibrina do que sobre o plasminogênio
plasmático, sendo, portanto, consideradas “seletivas de O ácido aminocapróico é um inibidor sintético da
coágulo”. O principal risco de todos os agentes fibrinolíticos fibrinólise. Inibe competitivamente a ativação do
consiste em sangramento, incluindo hemorragia gastrintestinal e plasminogênio. Este fármaco é utilizado clinicamente como
acidente vascular cerebral. Quando grave, o sangramento pode terapia adjuvante na hemofilia, como agente terapêutico no
ser tratado com ácido tranexâmico. sangramento decorrente da terapia fibrinolítica e como
profilaxia contra o ressangramento de aneurismas
6) - Agentes antifibrinolíticos e hemostáticos intracranianos.

O ácido tranexâmico inibe a ativação do plasminogênio


e, portanto, impede a fibrinólise. É utilizado no tratamento de
diversas condições nas quais ocorre sangramento ou existe o

Referências Bibliográficas

1. RANG, H. P. et al. Farmacologia. 4 edição. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2001;


2. KATZUNG, B. G. Farmacologia: Básica & Clinica. 9 edição. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2006;
3. CRAIG, C. R.; STITZEL, R. E. Farmacologia Moderna. 6 edição. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2005;
4. GOLAN, D. E. et al. Princípios de Farmacologia: A Base Fisiopatológica da Farmacoterapia. 2 edição. Rio de
Janeiro: Guanabara Koogan, 2009;
5. FUCHS, F. D.; WANNMACHER, L.; FERREIRA, M. B. C. Farmacologia Clínica. 3 edição. Rio de Janeiro: Guanabara
Koogan, 2004.
6. GILMAN, A. G. As Bases farmacológicas da Terapêutica. 10 edição. Rio de Janeiro: Mc-Graw Hill, 2005.
7. CONSTANZO, L. S. Fisiologia. 2 edição. Rio de Janeiro: Elsevier, 2004.
8. PORTH, C. M. Fisiopatologia. 6 edição. Rio de Janeiro: Ganabara Koogan, 2004

ЖЖЖЖЖЖ

5 Marcelo A. Cabral
ANOTAÇÕES EM FARMACOLOGIA E FARMÁCIA CLÍNICA

27) Farmacologia dos distúrbios neurodegenerativos

O tratamento farmacológico atualmente disponível para o nível de NO também aumenta, colaborando com a agreção
os distúrbios neurodegenerativos é sintomático e não altera o neuronal. A lesão produzida pela oclusão de uma artéria
cerebral importante é constituída de uma parte central na qual os
curso ou a evolução da doença subjacente. As terapias
sintomáticas mais eficazes são aquelas para a doença de neurônios sofrem rapidamente lesão irreversível e a partir da
qual a neurodegeneração se propaga no decorrer de várias horas
Parkinson.
ou mais, afetando áreas vizinhas.
Os distúrbios neurodegenerativos caracterizam-se pela
perda progressiva e irreversível de neurônios de regiões Tratamento farmacológico do Parkinsonismo
específicas do cérebro. Os protótipos dos distúrbios O mal de Parkinson é uma doença degenerativa dos
neurodegenerativos incluem a doença de Parkinson (DP) e a gânglios da base, que se manifesta por 4 características
doença de Huntington (DH), nas quais a perda de neurônios da fundamentais: bradicinesia (lentidão e escassez de movimentos),
estrutura dos gânglios da base resulta em anormalidades no
rigidez muscular, tremor em repouso (que desaparece
controle dos movimentos; a doença de Alzheimer (DA), em que habitualmente com o movimento voluntário) e
a perda de neurônios do hipocampo e do córtex leva ao comprometimento do equilíbrio postural, resultando em
comprometimento da memória e da capacidade cognitiva; e a
alterações da marcha e queda. É uma doença frequentemente
esclerose lateral amiotrófica (ELA), em que a fraqueza muscular idiopática, mas pode ocorrer após acidente vascular cerebral e
decorre da degeneração de neurônios motores espinhais, infecção viral, podendo ser também induzida por drogas
bulbares e corticais.
(reserpina e clorpromazina). A principal característica
A diversidade dos padrões de degeneração neuronal patológica da DP consiste numa perda dos neurônios
levou à proposta de que o processo de lesão neuronal deve ser dopaminérgicos pigmentados (perda de 70 a 80%) da parte
considerado como a interação de influências genéticas e compacta da substância nigra, com o aparecimento de inclusões
intracelulares conhecidas como corpúsculos de Lewy. Esses
ambientais com as características fisiológicas intrínsecas das
populações de neurônios afetados. neurônios são responsáveis pela síntese de dopamina que é
liberada na sinapse. A razão pela qual ocorre a degeneração dos
A morte neuronal pode se dá por necrose ou apoptose. neurônios dopaminérgicos ainda permanece desconhecida. A
Os principais mecanismos que levam a morte neuronal são: DP não compromete apenas o sistema motor do paciente, mas,
entre outras manifestações, provoca alterações cognitivas que
- a excitotoxicidade, que é a lesão neuronal que resulta podem estar presentes logo no início da doença. Essas
da presença de glutamato em quantidades excessivas no cérebro. alterações podem progredir com o avançar do tempo,
O excesso de glutamato eleva de maneira persistente a configurando um quadro de demência. Sem tratamento, a DP
concentração intracelular de cálcio. A elevação do cálcio progride no decorrer de 5 a 10 anos até um estado acinético
intracelular provoca morte celular por vários mecanismos, rígido em que o paciente é incapaz de cuidar de si próprio.
incluindo ativação de proteases, formação de radicais livres e
peroxidação de lipídios. A formação de NO e ácido É importante reconhecer que vários outros distúrbios,
araquidônico também está envolvida. além da DP, também podem produzir parkinsonismo, incluindo
acidente vascular cerebral e a intoxicação com bloqueadores dos
- apoptose neuronal, que é iniciada pela inexistência de receptores de dopamina. Os fármacos de uso clínico comum
fatores de crescimento particulares, resultando na alteração de passíveis de causar parkinsonismo incluem antipissicóticos,
transcrição de genes e ativação de proteínas específicas de como o haloperidol e a torazina, e antieméticos como a
“morte celular”. A apoptose está frequentemente associada à proclorperazina e a metoclopramida. O parkinsonismo
excitotoxicidade. decorrente de causas que não a doença de Parkinson costuma
ser refratário a todas as formas de tratamento.
- estresse oxidativo, apesar dos neurônios dependerem
do metabolismo oxidativo para sua sobrevida, uma Os neurônios acometidos na Doença de Parkinson são
conseqüência desse processo consiste na produção de principalmente os da chamada substância nigra, uma área do
compostos reativos como o peróxido de hidrogênio ou tronco cerebral que atua no controle dos movimentos, e que
oxirradicais. Essas espécies reativas, quando não controladas, fornece inervação dopaminérgica ao estriado. Esses neurônios
podem levar à lesão de DNA, peroxidação de lipídios da produzem dopamina. Com a morte dos neurônios, ocorre então
membrana e morte neuronal. uma falta de dopamina naquela região, causando a
inflexibilidade muscular, a lentidão dos movimentos e tremor,
A interrupção do suprimento sanguíneo para o cérebro efeitos característicos da doença.
desencadeia uma cascata de eventos neuronais responsáveis pela
morte celular e, que posteriormente, resulta em edema cerebral e A concentração normalmente elevada de dopamina
inflamação. A lesão cerebral isquêmica, causada por acidentes (neurotransmissor responsável pelos movimentos) nos gânglios
vasculares cerebrais, provoca despolarização dos neurônios e de base do cérebro encontra-se reduzida no parkinsonismo, e as
liberação de grandes quantidades de glutamato tentativas farmacológicoas de restaurar a atividade
(excitotoxicidade). Ocorre acúmulo de cálcio, em parte como dopaminérgica com levodopa e com agonistas dopamínicos têm
resultado da atuação do glutamato sobre os receptores NMDA; e
Marcelo A. Cabral
1
ANOTAÇÕES EM FARMACOLOGIA E FARMÁCIA CLÍNICA

sido bem sucedidas no alívio de muitas manifestações clínicas


Agonistas dos receptores de dopamina
da doença.
(bromocriptina, pergolida, lisurida).
As drogas que se mostram eficazes no tratamento do
Uma alternativa para a levodopa consiste no uso de
parkinsonismo são classificadas nas seguintes categorias:
fármacos que atuam como agonistas diretos dos receptores de
a) drogas que substituem a dopamina (levodopa) dopamina do estriado, uma abordagem que oferece várias
juntamente com inibidores da dopa descarboxilase de ação vantagens potenciais: não é necessária a conversão enzimática
periférica (carbidopa e benserazida); a própria dopamina não é para esses agentes; são mais seletivos do que a levodopa;
apropriada para o tratamento, pois não atravessa a barreira duração mais longa; e não produzem radicais livres, portanto
hemato-encefálica não favorecem o estresse oxidativo.

b) drogas que imitam a ação da dopamina – agonistas Os agonistas dopaminérgicos exercem seus efeitos
dos receptores dopaminérgicos (bromocriptina, pergolida, através da estimulação dos receptores dopaminérgicos
lisurida); (principalmente D1 e D2 – família dos receptores ligados à
proteína G) localizados nos neurônios pós-sinápticos.
c) inibidores da MAO-B (selegilina);
Atualmente, dispõe-se de 4 agonistas dos receptores de
d) drogas que liberam dopamina (amantadina); e dopamina: a bromocriptina e a pergolida (mais antigos e
derivados do esporão do centeio) e o ropinirol e pramipexol
e) antagonistas da acetilcolina (benztropina). (mais recentes). Diferem quanto a sua seletividade para os
receptores D1 e D2, porém possuem ações terapêuticas
Levodopa semelhantes, além de possuírem particular eficácia no
tratamento de pacientes que desenvolveram fenômenos de
A levodopa constitui o tratamento de primeira linha da liga/desliga.
doença de Parkinson e quase sempre é combinada com inibidor
da dopa-descarboxilase de ação periférica, a carbidopa ou O tratamento inicial com pergolida ou bromocriptina
benserazida, que reduz cerca de dez vezes a dose necessária e pode causar hipertensão profunda de modo que ambos os
diminui os efeitos colaterais periféricos (predominantemente a fármacos devem ser iniciados em baixa dose. Induzem
náusea, devido à loigação dessa dopamina aos receptores de frequentemente náuseas e vômitos no tartamento inicial.
dopamina na área postrema). A dopa-descarboxilase é a enzima
responsável por converter a levodopa em dopamina antes de Inibidores da COMT (tolcapona e entacapona)
esta chegar ao cérebro. A conversão em dopamina na periferia,
que de outro modo, corresponderia a cerca de 95% da dose de A COMT e a MAO são enzimas responsáveis pelo
levodopa, causando efeitos colaterais incômodos (náuseas), é catabolismo da levodopa e da dopamina. Quando se administra
impedida, em grande parte, pelo inibidor da descarboxilase. Por a levodopa por via oral, quase 99% do fármaco são
outro lado, a descarboxilação da levodopa continua ocorrendo metabolizados e não alcançam o cérebro. A maior parte é
rapidamente no cérebro (principalmente nas terminações pré- convertida pela L-aminoácidos aromáticos descarboxilase
sinápticas dos neurônios dopaminérgicos no estriado), visto que (AAD) em dopamina, que provoca náuseas e hipotensão.
esses inibidores da descarboxilase não penetram na barreira
hematoencefálica. A adição de um inibidor da AAD (dopa-
descarboxilase), como a carbidopa, reduz a formação de
Existem dois tipos de efeitos indesejáveis no dopamina, porém aumenta a fração de levodopa que é metilada
tratamento com levodopa: pela COMT. A principal ação terapêutica dos inibidores da
COMT (tolcapona e entacapona) consiste em bloquear a
- discinesia – são movimentos involuntários da cabeça conversão periférica da levodopa em O-metil-dopa, aumentando
e do tronco que aparecem na metade dos pacientes cinco anos tanto a meia-vida plasmática da levodopa quanto à fração de
após o início da terapia com levodopa. O fenômeno de cada dose que alcança o sistema nervoso central.
“desgaste” que surge com o passar dos anos faz com que seja
necessária uma dose maior de levodopa para evitar a rigidez e a Os inibidores da COMT atualmente disponíveis são a
acinesia que ocorrem no final do intervalo entre as doses. tolcapona e a entacapona. Ambos os fármacos diminuem o
Porém, o aumento da dose ocasiona a discinesia. metabolismo periférico da levodopa.

- efeito liga-desliga – são rápidas flutuações do estado A tolcapona parace atuar através da inibição central e
clínico, em que a hipocinesia e a rigidez podem agravar-se periférica da COMT. A hepatotoxicidade, devido ao aumento
subitamente por um período de alguns minutos até algumas dos níveis séricos de alanina aminotransferase e aspartato
horas (sem qualquer efeito benéfico das medicações), trasaminase, constitui um importante efeito adverso associado
melhorando em seguida. ao uso da tolcapona, e está deve ser somente prescrita para
pacientes que não responderam a outras terapias e com
Existe uma suspeita de que o metabolismo da monitoração apropriada para o possível desenvolvimento de
dopamina produza radicais livres que favorecem o estresse lesão hepática.
oxidativo e, portanto, a levodopa acabaria por acelerar o
processo de perda de neurônios dopaminérgicos. A ação da entacapona é atribuível principalmente à
inibição periférica da COMT. A entacapona não tem sido

Marcelo A. Cabral
2
ANOTAÇÕES EM FARMACOLOGIA E FARMÁCIA CLÍNICA

associada à hepatotoxicidade e não exige nehuma monitoração pulmonar, ocorre habitualmente dentro de 6 – 12 anos após a
especial, constituindo o inibidor da COMT mais amplamente instalação da doença.
utilizado.
A doença de Alzheimer caracteriza-se por acentuada
Inibidore seletivo da MAO-B (selegilina) atrofia do córtex cerebral e perda de neurônios corticais e
subcorticais. A base anatômica do déficit colinérgico é a atrofia
A selegilina é um inibidor da monoamina oxidase e degeneração dos neurônios colinérgicos subcorticais. Da
(MAO) seletivo para a MAO-B, que predomina em regiões que constatação deste fato surgiu a “hipótese colinérgica”, segundo
contêm dopamina no sistema nervoso central. Por conseguinte, a qual uma deficiência de acetilcolina é decisiva na gênese dos
carece dos efeitos periféricos indesejáveis dos inibidores não sintomas da DA. Porém, é necessário assinalar que o déficit
seletivos da MAO (fenelzina, tranilcipromina e isocarboxazida) observado na DA é complexo, envolvendo múltiplos sistemas
e, ao contrário destes, não provoca a “reação do queijo” neurotransmissores, incluindo a serotonina e o glutamato, além
(resposta hipertensiva grave a alimentos contendo tiramina) nem de apresentar destruição dos neurônios corticais e do
interage tão frequentemente com outras drogas. A inibição da hipocampo.
MAO-B protege a dopamina de degradação intraneuronal no
estriado tendo sido inicialmente utilizada como adjuvante da A despeito dos recentes progressos na compreensão do
levodopa. mecanismo de neurodegeneração na doença de Alzheimer,
ainda não existe nenhuma terapia eficaz.
Uma das desvantagens da selegilina é a formação de
um metabólito tóxico, a anfetamina, que pode causar insônia e Atualmente, a abordagem farmacológica para o
confusão, principalmente no idoso. tratamento da doença de Alzheimer baseia-se na administração
de anticolinesterásicos, tais como a tacrina, o donepezil, a
Amantadina - A amantadina foi introduzida como rivastigmina e a galantamina. Os agentes anticolinesterásicos
agente antiviral utilizado na profilaxia e no tratamento da bloqueiam a ação da enzima acetilcolinesterase, impedindo a
influenza A. Na atualidade a maioria dos autores sugere, sem degradação da acetilcolina. O acúmulo de acetilcolina na fenda
muita convicção, que o aumento da liberação de dopamina é sináptica resulta numa maior ativação dos receptores nicotínicos
primeiramente responsável pelos efeitos clínicos observados. A e muscarínicos.
amantadina é menos eficaz que a levodopa e que a
bromocriptina. O fármaco é utilizado no tratamento inicial da A tacrina é um potente inibidor da acetilcolinesterase
doença de Parkinson leve. de ação central. Devido a seu perfil de efeitos colaterias
consideráveis, a tacrina não é amplamente utilizada na prática
Antagonistas dos receptores muscarínicos clínica.
(triexifenidil, benzotropina e difenidramina)
O donepezil é um inibidor seletivo da AChE no SNC,
Os receptores muscarínicos da acetilcolina exercem um com pouco feito sobre a AChE nos tecidos periféricos. Possui
efeito excitatório, oposto ao da dopamina, sobre os neurônios meia vida longa, permitindo a administração de dose única ao
estriatais, bem como um efeito inibitório pré-sináptico sobre as dia. A rivastigmina e a galantamina são administrados duas
terminações nervosas dopaminérgicas. Por conseguinte, a vezes ao dia e produzem um grau semelhante de melhora
supressão desses efeitos compensa, em parte, a falta de cognitiva. Os efeitos adversos desses fármacos incluem náuseas,
dopamina. Esses fármacos diminuem mais o tremor do que a diarréia, vômitos e insônia, porém não estão associados a
rigidez ou a hipocinesia. Seus efeitos colaterias são boca seca, hepatotoxicidade que limita o uso da tacrina.
constipação, retenção urinária e visão turva. Os efeitos
indesejáveis são sonolência e confusão. Tratamento farmacológico da doença de
Huntington
Os antagonistas da acetilcolina são utilizados
principalmente no tratamento da doença de Parkinson em A doença de Huntington é um distúrbio hereditário que
pacientes que recebem agentes antipsicóticos (que são provoca degeneração cerebral progressiva. Surge na vida adulta
antagonistas da dopamina e que, portanto, anulam o efeito da e causa rápida deteriorização e morte. O gene alterado produz a
levodopa). proteína huntingtina que interage com as caspazes que
participam nos processos de excitotoxicidade e apoptose dos
Tratamento farmacológico do mal de Alzheimer neurônios do córtex e do estriado.
A doença de Alzheimer produz um comprometimento Nenhum fármaco atual consegue retardar a progressão
da capacidade cognitiva, de início gradual, mas de progressão da doença. O tratamento é sintomático, e necessário para
inexorável. Em geral, a primeira manifestação clínica consiste pacientes deprimidos (fluoxetina), irritáveis, paranóides ou
no comprometimento da memória recente, enquanto a psicóticos (clozapina ou carbamazepina), excessivamente
recuperação de memórias distantes é relativamente bem ansiosos e com distúrbios do movimento (antagonistas da
preservada durante a evolução da doença. A medida que o dopamina – clorpromazina, e agonista do GABA – baclofeno).
distúrbio progride, outras capacidades cognitivas são afetadas,
como a capacidade de fazer cálculos, as habilidades Tratamento farmacológico da Esclerose Lateral
visuespaciais e o uso de objetos e ferramentas comuns (apraxia Amiotrófica.
ideomotora). A morte, mais frequentemente por uma
complicação da imobilidade, como a pneumonia ou a embolia A ELA é um distúrbio dos neurônios motores do corno
ventral da medula espinhal e dos neurônios corticais que
Marcelo A. Cabral
3
ANOTAÇÕES EM FARMACOLOGIA E FARMÁCIA CLÍNICA

fornecem o impulso aferente. O distúrbio caracteriza-se por


O rilusol é um agente com ações complexas sobre o
fraqueza rapidamente progressiva, atrofia muscular e
sistema nervoso. Ele possui efeitos tanto pré-sinápticos como
fasciculações, espasticidade, disartria, disfagia e
pós-sinápticos. Inibe a liberação de glutamato, mas também
comprometimento respiratório. Em geral, a função sensorial é
bloqueia os receptores de glutamato pós-sinápticos do tipo
preservada, bem como as atividades cognitiva, autônoma e
NMDA e cainato, e também inibe os canais de sódio dependente
oculomotora. Em geral, a ELA é progressiva e fatal, com morte
de voltagem. Embora a magnitude do efeito do rilusol sobre a
da maioria dos pacientes acometidos por comprometimento
ELA seja pequena, o fármaco representa um marco terapêutico
respiratório e pneumonia dentro de 2 – 3 anos.
significativo no tratamento de uma doença refratária a todos os
A fisiopatologia apresenta perda proeminente de tratamentos anteriores.
neurônios motores da medula espinhal e do tronco encefálico
O agente mais útil para o tratamento sintomático da
que se projetam para os músculos estriados, bem como perda
espasticidade na ELA é o baclofeno, um agonista GABA-B.
dos grandes neurônios motores piramidais.
Além deste último, é também utilizada a tizanidina (agonista
Alfa2-adrenérgico de ação central).

Referências Bibliográficas

1. RANG, H. P. et al. Farmacologia. 4 edição. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2001;


2. KATZUNG, B. G. Farmacologia: Básica & Clinica. 9 edição. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2006;
3. CRAIG, C. R.; STITZEL, R. E. Farmacologia Moderna. 6 edição. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2005;
4. GOLAN, D. E. et al. Princípios de Farmacologia: A Base Fisiopatológica da Farmacoterapia. 2 edição. Rio de
Janeiro: Guanabara Koogan, 2009;
5. FUCHS, F. D.; WANNMACHER, L.; FERREIRA, M. B. C. Farmacologia Clínica. 3 edição. Rio de Janeiro: Guanabara
Koogan, 2004.
6. GILMAN, A. G. As Bases farmacológicas da Terapêutica. 10 edição. Rio de Janeiro: Mc-Graw Hill, 2005.
7. CONSTANZO, L. S. Fisiologia. 2 edição. Rio de Janeiro: Elsevier, 2004.
8. PORTH, C. M. Fisiopatologia. 6 edição. Rio de Janeiro: Ganabara Koogan, 2004

ЖЖЖЖЖЖ

Marcelo A. Cabral
4
ANOTAÇÕES EM FARMACOLOGIA E FARMÁCIA CLÍNICA

28) Farmacologia do trato gastrintestinal


Além de sua principal função na digestão e absorção dos péptica, de modo que a terapia desta condição envolve fármacos
alimentos, o trato gastrintestinal é um dos principais sistemas que modificam cada um desses fatores.
endrócrinos do corpo. Possui também sua própria rede O ácido clorídrico é secretado pelas células parietais
neuronal integrativa, o sistema nervoso entérico, que contém gástricas por uma bomba de prótons (K+/H+-ATPase). Os
aproximadamente o mesmo número de neurônios da medula estímulos principais para a secreção de ácido clorídrico são a
espinhal. As principais funções do trato gastrintestinal que são gastrina, a histamina e a acetilcolina. Simplificadamente, pode-
importantes do ponto de vista farmacológico são: se explicar o controle fisiológico da secreção de ácido clorídrico
da seguinte maneira:
- secreção gástrica; A célula parietal possui receptores H2 para histamina,
- vômito; receptores M2 para acetilcolina e receptores de gastrina. A
- motilidade do intestino e expulsão das fezes; estimulação dos receptores H2 aumenta o AMPc, enquanto a
- formação e excreção de bile. estimulação dos receptores M2 e de gastrina aumenta o cálcio do
citosol. Esses mensageiros atuam de modo sinérgico, produzindo
O trato gastrintestinal é inervado pelos plexos a secreção ácida. A gastrina e a acetilcolina, além de
mioentérico e submucoso. Os plexos estão interconectados, e estimularem diretamente as células parietais, promovem a
suas células recebem fibras parassimpáticas pré- secreção de histamina pelas células secretoras de histamina.
ganglionares do vago, que são principalmente colinérgicas e A acetilcolina é proveniente dos nervos colinérgicos, a
excitátórias. histamina provém das células secretoras de histamina e de
As fibras simpáticas que chegam são, em grande parte, mástócitos, enquanto a gastrina, produzida pelas células
pós-ganglionares e inervam os vasos sanguíneos, o músculo e endócrinas da mucosa do antro gástrico e duodeno, é liberada
células glandulares, além de possuírem terminações nos pela corrente sanguínea nas células parietais. A ação da
plexos, onde inibem a secreção de acetilcolina. acetilcolina é bloqueada pela atropina; a ação da histamina é
Os neurônios no interior dos plexos (que constituem o interrompida diretamente pelos antagonistas H2 (cimetidina), e a
sistema nervoso entérico) secretam acetilcolina, atropina inibe a secreção de histamina pelas células secretoras; a
noradrenalina, serotonina, purinas, óxido nítrico. O plexo ação da gastrina nos receptores das células parietais é inibida
entérico possui neurônios sensoriais que respondem a pela proglumida; as prostaglandinas E2 e I2 inibem diretamente
estímulos mecânicos e químicos. a produção de ácido clorídrico; o misoprostol inibe a produção
Os principais hormônios secretados pelo trato de ácido através da estimulação dos receptores de
gastrintestinal são: prostaglandinas das células parietais; e finalmente, os inibidores
- a gastrina, que possui como função principal estimular da bomba de prótons (omeprasol, etc) interrompem a atividade
a secreção de ácido gástrico pelas células parietais. Além da K+/H+ - ATPase (esta bomba é responsável pela troca do K+
disso, aumenta indiretamente a secreção de pepsinogênio (que por H+ no processo de formação de HCl – ou seja, nessa
é o responsável, juntamente com o HCl, pela digestão de ocasião, o K+ retorna ao interior da célula parietal em troca da
proteínas) e estimula o fluxo sanguíneo e a motilidade secreção de H+ necessário à formação do HCl).
gástrica. A secreção de gastrina é inibida quando o pH do
conteúdo gástrico vai para 2,5 ou menos.
- a histamina, que estimula as células parietais através
dos receptores H2. A histamina provém dos mastócitos
localizados nas células parietais. Ocorre liberação basal
uniforme de histamina, que aumenta sob a ação da gastrina e
da acetilcolina.
A acetilcolina, um neurotrasmissor, estimula receptores
muscarínicos específicos presentes na superfície das células
parietais e na superfície das células que contêm histamina.
O estômago secreta pepsinogênio, ácido clorídrico e fator
intrínseco, provenientes das células principais e parietais. O
muco é secretado por células especializadas localizadas entre
as células superficiais por toda a mucosa gástrica. Íons
bicarbonato também são secretados e aprisionados no muco,
criando um gradiente de pH de 1 – 2 na luz e 6 – 7 na
mucosa. O muco e o bicarbonato formam uma camada inerte,
semelhante a um gel, que protege a mucosa contra o suco
gástrico. O álcool e a bile podem destruir essa camada. As
prostaglandinas PgE2 e PgI2 produzidas localmente
estimulam a secreção de muco e de bicarbonato, e inibem a
secreção de ácido clorídrico.
Acredita-se qua os distúrbios nas funções secretórias
acima descritos estejam envolvidos na patogenia da úlcera
1 Marcelo A. Cabral
ANOTAÇÕES EM FARMACOLOGIA E FARMÁCIA CLÍNICA

Terapia farmacológica da disfunção secretória ácida

As principais condições patológicas nas quais é útil 3) Antiácidos (hidróxido de magnésio, trissilicato de
reduzir a secreção ácida são a ulceração péptica magnésio, gel de hidróxido de alumínio,
(provavelmente causada por H. pylori e pelo desvio no bicarbonato de sódio e alginatos)
equilíbrio entre mecanismos protetores e mecanismos
agressores da mucosa gástrica), a esofagite de refluxo (lesão Os antiácidos atuam ao neutralizar o ácido gástrico,
do esôfago provocada por suco gástrico) e a Síndrome de elevando, assim o pH gástrico. Isso só tem por efeito inibir a
Zollinger-Éllison (tumor produtor de gastrina). atividade péptica, que praticamente cessa com um valor de pH
A terapia anti-secretória da úlcera péptica e da esofagite de 5.
de refluxo envolve a diminuição da secreção de ácido com Os antiácidos de uso comum consistem em sais de
antagonistas dos receptores H2 ou inibidores da bomba de magnésio e de alumínio, que formam cloretos de magnésio e
prótons e/ou a neutralização do ácido secretado com cloretos de alumínio. Os sais de magnésio causam diarréia,
antiácidos. Todavia o tratamento da úlcera péptica deve enquanto os sais de alumínio provocam constipação, razão pela
incluir a erradicação do H. pylori com o emprego de qual podem ser utilizadas misturas desses dois sais para
antimicrobianos, tais como a amoxicilina e metronidazol, preservação da função intestinal normal.
além da administração do omeprazol e quelato de bismuto Apesar de o bicarbonato de sódio elevar rapidamente o
como protetor da mucosa gástrica. pH para 7, ocorre liberação de dióxido de carbono, causando
A bactéria H. Pylori produz a enzima urease, que eructação. O CO2 estimula a secreção de gastrina (o CO2 é
converte uréia em amônia e CO2 que posteriormente é encontrado em abundância nos refrigerantes) e pode resultar em
convertido em bicarbonato. A liberação da amônia é benéfica elevação secundária da secreção ácida. Como ocorre abasorção
para a bactéria, já que neutraliza parcialmente o ambiente de algum bicarbonato de sódio no intestino, o uso de grandes
ácido do estômago. Pensa-se que a amônia, juntamente com doses ou administração freqüente pode causar alcalose.
proteínas de H. Pylori, tais como, proteases, catalases e
fosfolipases, causem danos às células epiteliais. 4) Drogas que protegem a mucosa (quelato de
bismuto, sucralfato e misoprostol)

1) Inibidores H2 (cimetidina, ranitidina, nizatidina e O quelato de bismuto é usado em esquema de


famotidina) combinação no tratamento da infecção por H. pylori na úlcera
péptica. O fármaco possui efeito tóxico contra o bacilo, impede
Os antagonistas dos receptores H2 inibem sua aderência à mucosa, inibe as enzimas proteolíticas da
competitivamente as ações da histamina em todos os bactéria, reveste a base da úlcera, adsorve a pepsina, potencializa
receptores H2, porém sua principal aplicação clínica consiste a síntese local de prostaglandinas e estimula a solução de
na sua atuação como inibidores da secreção de ácido bicarbonato.
gástrico. Inibem a secreção gástrica estimulada pela O misoprostol é um análogo estável da prostaglandina
histamina e pela gastrina e reduzem a secreção ácida E1. Inibe a secreção ácida gástrica, tanto basal quanto a que
estimulada pela acetilcolina. Esses agentes reduzem a ocorre em resposta a alimentos, à histamina, pentagastrina e
secreção ácida basal e estimulada por alimentos, além de cafeína através de uma ação direta sobre a célula parietal.
promoverem a cicatrização das úlceras duodenais. Mantém o aumento do fluxo sanguíneo da mucosa e aumenta
Os efeitos indesejáveis são raros. A cimetidina inibe o também a secreção de muco e de bicarbonato. É utilizado na
citrocromo P450 e pode retardar o metabolismo (e assim prevenção da lesão gástrica que pode ocorrer com o uso
potencializar a ação) de anticoagulantes orais, fenitoína, crônico de AINES.
carbamazepina, quinidina, nifedipina, teofilina e Podem ocorrer diarréia, cólicas abdominais e contração
antidepressivos tricíclicos. Pode causar confusão no uterina.
indivíduo idoso.
Terapia farmacológica do vômito
2) Inibidores da bomba de prótons (omeprazol,
lanoprazol e pantoprazol) O ato de vomitar é um processo complicado e exige
atividade coordenada dos músculos respiratórios somáticos e
Esses fármacos agem através da inibição irreversível da abdominais, bem como dos músculos involuntários do trato
H+/K+-ATPase (bomba de prótons – ela é a responsável pela gastrintestinal. Consiste na expulsão abrupta do conteúdo
troca do K+ por H+ no processo de formação de HCl), que gastrintestinal através do esôfago relaxado, associada a
constitui a etapa final na via da secreção ácida. contrações sustentadas de diafragma e músculos abdominais, e o
Apesar de ter meia-vida de cerca de uma hora, a aumento da pressão intra-abdominal. A náusea é a sensação de
administração diária de uma dose única afeta a secreção urgência de vomitar, ocorrendo simultaneamente a perda de
ácida durante 2-3 dias, devido a seu acúmulo nos canalículos. tônus e peristalse gástricos, contração de duodeno e refluxo de
Com uma posologia diária, verifica-se um efeito anti- conteúdo intestinal para o estômago.
secretório crescente por um período de até cinco dias, quando Os vômitos repetidos em jato podem indicar a estenose
se atinge um platô. pilórica ou refluxo gastroesofágico. A obstrução do intestino
Os efeitos indesejáveis não são comuns. Incluem delgado alto por aderências duodenais causa o vômito bilioso.
cefaléia, diarréia e erupções cutâneas.

2 Marcelo A. Cabral
ANOTAÇÕES EM FARMACOLOGIA E FARMÁCIA CLÍNICA

A estrutura anatômica integradora do vômito é o centro


bulbar do vômito, localizado na formação reticular lateral. Esse São utilizados diferentes agentes antieméticos para
centro é estimulado por meio de duas vias. condições diferentes, embora possa haver alguma superposição.
Na primeira via, o estímulo provém de outro centro, As classes mais importantes de antieméticos são:
denominado zona do gatilho quimioreceptora (ZGQ), - antagonistas dos receptores H1;
localizado na área postrema do quarto ventrículo. A zona do - antagonistas dos receptores muscarínicos;
gatilho, por sua vez, é estimulada por substâncias endógenas e - antagonistas da serotonina;
exógenas que se ligam a receptores adrenérgicos, - fenotiazinas;
dopaminérgicos e opióides, razão pela qual os antagonistas - metoclopramida;
desses receptores têm efeito antiemético. Estímulos periféricos, - canabinóides;
tais como alterações em aparelho vestibular (como na cinetose, - esteróides.
por exemplo), e substâncias não-identificadas por receptor
específico (quimioterápicos, por exemplo) que desencadeiam Os agentes antieméticos são de importância particular
vômitos provavelmente atuam por meio de estimulação dessa como adjuvantes na quimioterapia do câncer para combater as
zona. náuseas e os vômitos provocados por numerosos agentes
A segunda via de estimulação do centro do vômito tem citotóxicos.
origem em sinais provenientes da faringe, trato gastrintestinal, Quando se utilizam drogas no tratamento do enjôo
mediastino e áreas do cérebro relacionadas à visão e ao olfato. matinal da gravidez, é preciso considerar o problema de lesão
As vias eferentes incluem os núcleos dorsal do vago e ambíguo, potencial do feto. Em geral, todas as drogas devem ser evitadas, se
nervo frênico, espinhais e viscerais que inervam, possível, durante os primeiros três meses de gravidez. A
respectivamente diafragma, musculatura abdominal, esôfago e prometazina mostra-se eficaz nas náuseas matinais da gravidez,
estômago. sendo administrada após o terceiro mês de gravidez.
Analgésicos opióides, glicosídeos cardíacos, estrógenos,
anticoncepcionais hormonais, anestésicos e agentes citotóxicos 1) Antagonistas dos receptores H1
são agentes emetizantes que também sensibilizam a zona do
gatilho. Não se conhece, até o momento, emético que aja Esses fármacos exercem pouca ou nenhuma atividade contra
diretamente no centro do vômito. Os quimioterápicos induzem o os vômitos produzidos por substâncias que atuam diretamente
aparecimento de náuseas e vômitos pelo menos em parte por sobre a ZGQ, porém são eficazes na cinetose e contra vômitos
estimularem a liberação de serotonina em neurônios de centro do causados por substâncias que atuam localmente no estômago. Os
vômito, zona do gatilho e células cromafínicas do trato exemplos incluem a cinarizina, a ciclizina, dimenidrinato e a
gastrintestinal. prometazina.
A ocorrência de episódio de vômito não requer obrigatória Os antagonistas dos receptores H1 são mais eficazes se
terapia antiemética, pois pode ser autolimitada e até resolutivo forem administrados antes do início da náusea e dos vômitos.
de alguma agressão externa. Por outro lado, o vômito requer
controle porque, além do desconforto, pode causar complicações 2) Antagonistas dos receptores muscarínicos
sistêmicas, como desidratação, alcalose hipoclorêmica e
pneumonia aspirativa, dentre outras. Sempre que possível, a Esses fármacos antagonizam a acetilcolina nos receptores
abordagem terapêutica deve ser voltada para o fator causal, pois muscarínicos localizados na zona do vômito.
a correção deste pode ser suficiente para a reversão do quadro, A hioscina mostra-se eficaz contra náuseas e vômitos de
prescindindo-se dos antieméticos. Isso adquire importância origem labiríntica e contra os vômitos causados por estímulos
quando se considera que esses agentes são apenas sintomáticos e locais no estômago, porém é ineficaz contra substâncias que atuam
sua toxicidade pode ser bastante acentuada. diretamente sobre a ZGQ. Ela é o agente mais potente disponível
para prevenção da cinetose, embora seja menos útil uma vez
instalada a náusea. Sua ação antiemética torna-se máxima 1 - 2
horas após sua ingestão. Pode causar sonolência e ressecamento da
boca. A escopolamina (fármaco antagonista muscarínico similar à
atropina) também é indicada como profilaxia em cinetose cujos
estímulos são de curta duração (viagem de 4 a 6 horas), porém
provoca alta incidência de efeitos adversos, sendo assim os
antagonistas H1 apesar de menos potentes, são agentes de escolha
na profilaxia da cinetose.
A cinetose (terror dos marinheiros recém embarcados!) é
uma forma de vertigem fisiológica normal, sendo provocada pela
estimulação rítmica e repetida do sistema vestibular. Esse sistema
é responsável por manter o equilíbrio através da detecção das
acelerações angulares e lineares da cabeça. A informação
sensorial, proveniente do sistema vestibular, é então usada para
prover uma imagem visual estável para a retina (enquanto a
cabeça se move) e fazer ajustes na postura para manter o
equilíbrio. O órgão vestibular localiza-se no interior do osso
temporal, adjacente ao aparelho auditivo.

3 Marcelo A. Cabral
ANOTAÇÕES EM FARMACOLOGIA E FARMÁCIA CLÍNICA

A vertigem, o mal-estar, a náusea e o vômito são os


principais sintomas da cinetose. Sinais autônomos, como Farmacologia nos distúrbios da motilidade gastrintestinal
hipotensão, taquicardia e transpiração excessiva, podem ocorrer.
Se o estímulo da cinetose persistir na mesma intensidade, Os fármacos que aumentam os movimentos incluem os
desenvolve-se tolerância ao fenômeno em 2 a 3 dias. purgativos, que aceleram a passagem do alimento através do
intestino, e os agentes que aumentam a motilidade do
músculo liso gastrintestinal, sem causar purgação.
3) Antagonistas da serotonina Os principais agentes que reduzem os movimentos são os
antidiarréicos e os antiespasmódicos.
A serotonina, que é liberada no SNC ou no intestino
(ZGQ e aferentes viscerais do TGI), atua como importante 1) Purgativos
transmissor no vômito. Antagonistas seletivos dos receptores
da serotonina, por exemplos a ondansetrona, a granisetrona O trânsito do alimento através do intestino pode ser
e a tropisetrona, são utilizados na prevenção e no tratamento acelerado por vários métodos diferentes:
dos vômitos cusados por agentes citotóxicos. Os efeitos - aumentando-se o volume dos resíduos sólidos não
indesejáveis consistem em cefaléia e distúrbios absorvíveis com laxativos de bolo fecal;
gastrintestinais. - aumentando-se o conteúdo de água com laxativos
osmóticos;
4) Antagonistas dos receptores dopaminérgicos - alterando-se a consistência das fezes com emolientes
fecais;
A metoclopramida, assim como as fenotiazinas - aumentando-se a motilidade e a secreção (purgativos
antipsicóticas (clorpromazina, proclorperazina e a estimulantes).
trifluoperazina) são antagonistas dos receptores
dopaminérgicos, que atuam na ZGQ. Seus efeitos indesejáveis 1.1 – laxativos formadores de bolo fecal
estão relacionados com o bloqueio de outros receptores
dopamínicos no SNC, e incluem distúrbios dos movimentos, Os laxativos formadores de bolo fecal incluem a
sonolência, fadiga, torcicolo espasmódico, crises oculógiras metilcelulose e certas resinas vegetais, como por exemplos
(movimentos involuntários rápidos dos olhos). A estercúlia, agar, farelo e casca de ispaghula. Esses agentes são
metoclopramida também possui ações periféricas, polímeros de polissacarídios, que não são degradados pelos
aumentando a motilidade do estômago e do intestino, sem processos normais da digestão. Atuam em virtude da sua
estimulação concomitante da secreção ácida gástrica, o que capacidade em reter água na luz intestinal, promovendo assim
contribui para seu efeito antiemético, podendo ser usada na o peristaltismo. Levam vários dias para exercer ação, mas não
terapia de distúrbios gastrintestinais. apresentam efeitos indesejáveis graves.

5) Canabinóides 1.2 – laxativos osmóticos

A nabilona, derivado sintético do canabinol, diminui os Esses agentes mantêm por osmose um volume aumentado
vômitos provocados por agentes que estimulam a ZGQ, de líquido na luz do intestino, o que acelera a transferência do
provavelmente através dos receptores opióides. Seus efeitos conteúdo intestinal através do intestino delgado, resultando na
indesejáveis consistem em sonolência, tonteira e chegada de um volume inusitadamente grande no cólon. Isto
ressecamento da boca. Alguns pacientes sofrem alucinações e provoca distensão e conseqüente purgação em cerca de uma
reações psicóticas, lembrando o efeito de outros canabinóides. hora.
Atualmente, alguns países como os EUA, vêm liberando Os principais sais utilizados são o sulfato de magnésio e o
o uso da maconha (Cannabis sativa) com o objetivo de aliviar hidróxido de magnésio. São praticamente insolúveis;
os efeitos indesejáveis da quimioterapia no tratamento do permanecem na luz e retêm a água, aumentando o volume das
câncer. O tetraidrocanabinol (THC) é o principio ativo em fezes.
maior quantidade liberado com o fumo da maconha. O
emprego da maconha in natura (fumada) tem sido polêmica. 1.3 – emolientes fecais

6) Outros agentes antieméticos O docusato de sódio é um composto tensoativo, que atua


no trato gastrintestinal de modo semelhante a um detergente,
Os antipsicóticos não fenotiazínicos, haloperidol e produzindo feze de consistência mais mole.
droperidol produzem bons resultados contra agentes
citotóxicos fortemente eméticos (por exemplo, a cisplatina). A 1.4 – purgativos estimulantes
domperidona, um antagonista dos receptores D2 da
dopamina, também é utilizada como agente antiemético nos O sene possui atividade laxativa, visto que contém
vômitos pós-operatórios e contra agentes antineoplásicos derivados do antraceno (emodina) em combinação com
moderadamente emetogênicos. açúcares, formando glicosídios. A droga passa de modo
inalterado para o cólon, onde as bactérias hidrolisam a ligação
glicosídica, liberando os derivados de antracenos livres, que
são absorvidos e exercem efeito estimulante direto sobre o

4 Marcelo A. Cabral
ANOTAÇÕES EM FARMACOLOGIA E FARMÁCIA CLÍNICA

plexo mioentérico, resultando em atividade da musculatura lisa


e, portanto, defecação. alumínio). Os adsorventes atuam, provavelmente, ao adsorver
microrganismos e toxinas, ao alterar a flora intestinal ou ao
2) Drogas que aumentam a motilidade gastrintestinal revestir e proteger a mucosa intestinal.
Os principais opiáceos utilizados na diarréia são a
As drogas que aumentam a motilidade gastrintestinal são codeína, o difenoxilato e a loperamida.
a domperidona (cujo mecanismo de ação é desconhecido), a
metoclopramida que exerce um efeito estimulante local
significativo sobre a motilidade gástrica, causando acentuada 4) Agentes antiespasmódicos – Antagonistas
aceleração do esvasiamento gástrico, sem estimulação muscarínicos
concomitante da secreção ácida gástrica. Ela mostra-se útil no
tratamento do refluxo gastroesofágico e em distúrbio do As drogas que reduzem o espasmo no intestino são
esvaziamento gástrico, porém é ineficaz no íleo paralítico. importantes na síndrome do cólon irritável e na doença
A cisaprida estimula a liberação de acetilcolina no plexo diverticular. Nesse sentido, os antagonistas muscarínicos -
mioentérico, no trato gastrintestinal superior. Isto eleva a atropina, propantelina e diciclomina – diminuem o
pressão do esfíncter esofágico e aumenta a motilidade espasmo ao inibir a atividade parassimpática através do
intestinal. A cisaprida é utilizada na esofagite de refluxo e nos bloqueio dos receptores muscarínicos. Os efeitos
distúrbios do esvasiamento gástrico. Não exerce ação indesejáveis desses fármacos são boca seca, visão embaçada,
antiemética. pele seca, taquicardia e dificuldade de urinar, devidos à
inibição parassimpática de outros tecidos. São menos
3) Agentes antidiarréicos comuns e menos pronunciados com a diciclomina. A
mebeverina, um derivado da reserpina, exerce ação
A diarréia refere-se à eliminação freqüente de fezes relaxante direta sobre o músculo liso gastrintestinal. Seus
líquidas. Existem várias causas, incluindo agentes infecciosos, efeitos indesejáveis são poucos.
toxinas, ansiedade, drogas, etc. A diarréia envolve tanto o
aumento da motilidade do trato gastrintestinal, juntamente 5) Drogas que afetam o sistem biliar
com aumento da secreção, quanto a redução da absorção de
líquidos e conseqüente perda de eletrólitos (Na+) e água. A condição patológica mais comum do trato biliar
Existem três abordagens para o tratamento da diarréia consiste em colelitíase induzida por colesterol, isto é,
aguda grave: formação de cálculos biliares de colesterol. As drogas que
- manutenção do equilíbrio hidroeletrolítico; dissolvem os cálculos biliares são o ácido quenodesoxicólico
- uso de agentes antiinfecciosos; (CDCA) e o ácido ursodesoxicólico (UDCA). Esses agentes
- usos de agentes antidiarréicos não antimicrobianos. também reduzem a síntese hepática e a secreção de
A manutenção do equilíbrio hidroeletrolítico através de colesterol. A diarréia constitui o principal efeito indesejável.
reidratação oral constitui a primeira prioridade. Muitos casos A dor provocada pela passagem de cálculos biliares
não necessitam de nenhum outro tipo de tratamento. No íleo, através do ducto biliar (cólica biliar) pode ser muito intensa,
assim como em certas partes do néfron, ocorre o co-transporte exigindo alívio imediato. A morfina alivia a dor, porém é
de Na+ e de glicose através da célula epitelial; por preferível a utilização de buprenorfina. A atropina é
conseguinte, a glicose potencializa a absorção de sódio e, largamente utilizada para aliviar os espasmos, em virtude de
dessa maneira, a captação de água. O soro caseiro é muito útil sua ação antiespasmódica.
nesse sentido. É composto de uma pitada de sal e três pitadas
de açúcar em um copo de água filtrada e fervida, sendo
administrado à vontade, a cada 20 minutos, e após cada
evacuação líquida.
A administração de agentes antiinfecciosos não é ЖЖЖЖЖЖ
geralmente necessária na gastroenterite simples, visto que as
infecções são, em sua maioria, de origem viral, e as que são
de origem bacteriana geralmente sofrem resolução sem
qualquer terapia antibacteriana. Os casos graves podem exigir
o uso de eritromicina ou ciprofloxacina. A quimioterapia pode
ser necessária em alguns tipos de enterite (febre tifóide,
disenteria amebiana e cólera).
A diarréia do viajante é muitas vezes cusadas pela
Escherichia coli, produtora de enterotoxinas, e outros
microrganismos. As infecções são, em sua maioria,
autolimitadas, exigindo somente a reposição oral de líquidos e
sais.
Os agentes antidiarréicos não microbianos incluem
agentes antimotilidade (opiáceos e antagonistas dos
receptores muscarínicos), os adsorventes (caulim, pectina,
greda, carvão ativado, metilcelulose e salicatos de magnésio e

5 Marcelo A. Cabral
ANOTAÇÕES EM FARMACOLOGIA E FARMÁCIA CLÍNICA

Referências Bibliográficas

1. RANG, H. P. et al. Farmacologia. 4 edição. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2001;


2. KATZUNG, B. G. Farmacologia: Básica & Clinica. 9 edição. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2006;
3. CRAIG, C. R.; STITZEL, R. E. Farmacologia Moderna. 6 edição. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2005;
4. GOLAN, D. E. et al. Princípios de Farmacologia: A Base Fisiopatológica da Farmacoterapia. 2 edição. Rio de
Janeiro: Guanabara Koogan, 2009;
5. FUCHS, F. D.; WANNMACHER, L.; FERREIRA, M. B. C. Farmacologia Clínica. 3 edição. Rio de Janeiro: Guanabara
Koogan, 2004.
6. GILMAN, A. G. As Bases farmacológicas da Terapêutica. 10 edição. Rio de Janeiro: Mc-Graw Hill, 2005.
7. CONSTANZO, L. S. Fisiologia. 2 edição. Rio de Janeiro: Elsevier, 2004.
8. PORTH, C. M. Fisiopatologia. 6 edição. Rio de Janeiro: Ganabara Koogan, 2004

6 Marcelo A. Cabral
ANOTAÇÕES EM FARMACOLOGIA E FARMÁCIA CLÍNICA

29) tratamento farmacológico da artrite gotosa

A gota caracteriza-se pela deposição de cristais de Etiopatogênia


urato nas articulações e nos tecidos moles, resultando em artrite
e tofo característicos dessa condição. O urato tende a se Quanto a etiopatogenia, a gota pode ocorrer por 2 mecanismos
cristalizar em condições mais frias e mais ácidas. básicos:

O ácido úrico é um metabólito das purinas, adenina e Aumento na produção de ácido úrico: idiopático, defeito
guanina, com pouca solubilidade nos líquidos corporais. enzimático, alto turnover ácidos nucléicos, estresse
Normalmente, cerca de dois terços do ácido úrico produzido (trauma, cirurgia, infecção) e dieta rica em proteína.
cada dia são excretados pelos rins. O manejo renal normal do
ácido úrico envolve 3 etapas: filtração, reabsorção e secreção. Diminuição na eliminação de ácido úrico pelo rim:
Aproximadamente 85% dos portadores de gota apresentam
A hiperuricemia reflete um distúrbio metabólico dos um defeito específico na eliminação de ácido úrico (que
líquidos extracelulares, sendo definida como concentração independe da função renal global).
sérica de urato superior a 7mg/dl. Certos fármacos, Geralmente o mecanismo desencadeante da gota para um
particularmente os diuréticos tiazídicos e agentes dado paciente é misto.
imunossupressores (como exemplo, a ciclosporina), podem
comprometer a excreção de urato e, assim, aumentar o risco de Diagnóstico
gota.
Baseia-se em:
Pode ocorrer hiperuricemia devido à produção
excessiva do ácido úrico, excreção insuficiente do ácido úrico, História sugestiva: episódio de monoartrites sucessivas,
ou uma combinação das duas. A hiperuricemia é um achado podagra, sexo masculino, acima dos 40 anos, história
laboratorial, portanto, por si só não diagnostifica a presença de familiar de gota e urolitíase são elementos que surgerem
gota. Um diagnóstico definitivo de gota só pode ser feito fortemente o diagnóstico;
quando há cristais de urato no líquido sinovial. A análise do
Hiperuricemia;
líquido sinovial é útil para excluir o diagnóstico de artrite
séptica (presença de microrganismos), e artrite reumatóide. Achado de cristais de monourato de sódio em tofos,
líquido sinovial e sinóvia (principalmente se
O ataque de gota ocorre quando cristais de uratos
intracelulares): É o dado patognomônico para o
precipitam-se na articulação e desencadeiam resposta
diagnóstico;
inflamatória. Ocorre a fagocitose dos cristais de urato pelos
leucócitos polimorfonucleares, acarretando a morte dessas Quadro radiológico sugestivo: principalmente em
células e liberação das enzimas lisossômicas. Com a sacabocado;
continuação do processo, a inflamação causa a destruição da
cartilagem e do osso subcondral. O ataque típico de gota é Diagnóstico Diferencial
monoarticular e afeta geralmente a primeira articulação
metatarsofalangiana. As articulações do pé, tornozelo, 1. Artrite séptica: Na primeira crise é fundamental
calcanhar, joelho, punho, dedos das mãos, e cotovelos também punção articular para descarte de processo infeccioso
podem ser os locais inicialmente envolvidos. que também se manifesta como monoartrite aguda.

A gota inicia-se frequentemente à noite, podendo ser 2. Artrite reumatóide: Nesta o processo inflamatório é
precipitada por exercícios excessivos, certas medicações (AAS), poliarticular, simétrico e crônico. Mais frequente em
alimentos, álcool ou dietas ricas em purinas. O início da dor é mulheres.
tipicamente abrupto, observando-se rubor e edema.
3. Artropatias soronegativas: Também apresentam
Após a identificação dos cristais de urato no líquido sinovite crônica, via de regra oligo e poliarticular e
sinovial, a etapa seguinte é determinar se o distúrbio está com envolvimento frequente da coluna.
relacionado à produção excessiva ou à excreção insuficiente do
ácido úrico. Valores urinários de urato (durante 24 horas) Exames Complementares
superiores à faixa normal de 264 a 588 mg/dia indicam
produção excessiva do ácido úrico. A concentração sérica Exames laboratoriais
normal de urato é de 5 a 5,7 mg/dl em homens e de 3,7 a 5
mg/dl em mulheres. 1. Ácido úrico sérico maior que 7 mg/dl. Embora,
existam raros casos de portadores de gota com
uricemia normal;

1 Marcelo A. Cabral
ANOTAÇÕES EM FARMACOLOGIA E FARMÁCIA CLÍNICA

2. Provas de atividade inflamatória:


hemossedimentação, mucoproteina, proteina C reativa Alopurinol:
podem se elevar na fase aguda; Tanto o alopurinol quanto o seu metabólito primário, o
oxipurinol, inibem a xantina oxidase. Em baixas concentrações,
3. Hemograma: pode ocorrer leucocitose na fase aguda;
o alopurinol inibe de modo competitivo a xantina oxidase,
4. Excreção de ácido úrico (uricosúria): realizado em sendo um inibidor não-competitivo em altas concentrações;
urina de 24 horas. Serve para definir hiper, normo e também é um substrato para a xantina oxidase; o produto desta
hipoexcretores, dado utilizado na escolha e reação, o oxipurinol, é igualmente um inibidor não-competitivo
monitorização terapêutica; da enzima. A formação do oxipurinol, juntamente com a sua
longa permanência nos tecidos, é responsável por grande parte
5. Glicemia, colesterol e triglicérideos: podem estar da atividade farmacológica do alopurinol.
alterados no paciente com gota.
Convém lembrar que a xantina oxidase é importante
6. Líquido sinovial: presença de cristais de monourato de em duas etapas sequencias na degradação das purinas: a
sódio extra e intracelulares. Esses cristais são finos e oxidação da hipoxantina a xantina e a oxidação da xantina em
tem pontas afiladas; ácido úrico. Por conseguinte, a inibição da xantina oxidase
resulta em aumento dos níveis plasmáticos de hipoxantina e
7. Presença de polimorfonucleares em grande xantina. Ao contrário do ácido úrico, a hipoxantina e a xantina
quantidade na fase aguda; são moderadamente solúveis no sangue e podem ser filtradas
pelos rins, sem a deposição de cristais.
8. Anátomo patológico: presença de granulomas
envolvendo massas de cristais de urato em tofos e O alopurinol reduz a concentração dos uratos
articulações comprometidas. relativamente insolúveis e do ácido úrico nos tecidos, plasma e
na urina. A deposição de cristais de urato nos tecidos (tofos) é
9. Radiografia da articulação. revertida, com inibição da formação de cálculos renais. O
alopurinol constitui o fármaco de escolha no tratamento em
longo prazo da gota, porém é ineficaz no tratamento da gota
aguda e, com efeito, chega até a agravá-la.
Tratamento farmacológico da gota:
Agentes uricosúricos: probenecida e sulfimpirazona
Os objetivos do tratamento farmacológico da gota são
aliviar os sintomas do ataque agudo, diminuir o risco de ataques Os agentes uricosúricos aumentam a taxa de excreção
recorrentes e reduzir os níveis séricos de urato. O tratamento de ácido úrico. A probenecida e a sulfimpirazona são utilizados
tem como base a colchicina (atualmente considerada como o para inibir a reabsorção de urato no túbulo contorcido proximal
fármaco de segunda linha de tratamento), o alopurinol e os e, portanto, aumentar a sua excreção. No processamento do
agentes uricosúricos – a probenecida e a sulfimpirazona. ácido úrico pelos rins, a reabsorção predomina, e a quantidade
excretada corresponde à apenas 10% do que é filtrado. Esse
Os AINES, especialmente a indometacina e o processo é mediado por um transportador específico, que pode
ibuprofeno, são usados pata tratar os sintomas da artrite gotosa. ser inibido, através da competição com o urato.
As injeções intra-articulares de corticosteróides podem ser
usadas quando há apenas uma articulação envolvida e a pessoa Ambos os agentes, quando administrados em doses
não pode tomar um AINE. subterapêuticas, inibem, na verdade, a secreção de urato.
As drogas usadas no tratamento da gota aguda não Alguns agentes uricosúricos diminuem a secreção de
possuem efeito sobre o nível sérico de urato e são inúteis na penicilina e também podem ser utilizados para esse propósito.
gota tofácea (tofos são nódulos grandes e duros de cristais de
urato, e só aparecem cerca de 10 anos ou mais após o primeiro Protocolo farmacológico:
ataque de gota). A hiperurecemia é tratada depois de ter sido
aliviado o ataque agudo, e para isso são usados o alopurinol e os - AINES (ibuprofeno e indometacina) para resolver a dor e
agentes uricosúricos probenecida ou sulfimpirazona. O inflamação;
tratamento da hiperuricemia visa à manutenção dos níveis
normais de ácido úrico, e é vitalício. Se os níveis de ácido úrico - após resolução da gota aguda, fazer exame para medir a
estiverem normais e a pessoa não tiver ataques recorrentes de produção e a excreção de urato durante 24 horas;
gota poderão ser suspensas tais medicações.
- produção excessiva de urato: tratar com alopurinol, somente
Os salicilatos (AAS) não são usados no tratamento da depois da diminuição dos níveis de ácido úrico através de dieta
gota, pois inibem a secreção de uratos em doses situadas dentro e uricosúricos.
de sua faixa terapêutica, produzindo aumento nos níveis
sanguíneos de urato, além de aumentarem os riscos de cálculos - excreção diminuída: utilizar agentes uricosúricos tais como
renais. probenecida e sulfimpirazona.

2 Marcelo A. Cabral
ANOTAÇÕES EM FARMACOLOGIA E FARMÁCIA CLÍNICA

Referências Bibliográficas
1. RANG, H. P. et al. Farmacologia. 4 edição. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2001;
2. KATZUNG, B. G. Farmacologia: Básica & Clinica. 9 edição. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2006;
3. CRAIG, C. R.; STITZEL, R. E. Farmacologia Moderna. 6 edição. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2005;
4. GOLAN, D. E. et al. Princípios de Farmacologia: A Base Fisiopatológica da Farmacoterapia. 2 edição. Rio de
Janeiro: Guanabara Koogan, 2009;
5. FUCHS, F. D.; WANNMACHER, L.; FERREIRA, M. B. C. Farmacologia Clínica. 3 edição. Rio de Janeiro: Guanabara
Koogan, 2004.
6. GILMAN, A. G. As Bases farmacológicas da Terapêutica. 10 edição. Rio de Janeiro: Mc-Graw Hill, 2005.
7. CONSTANZO, L. S. Fisiologia. 2 edição. Rio de Janeiro: Elsevier, 2004.
8. PORTH, C. M. Fisiopatologia. 6 edição. Rio de Janeiro: Ganabara Koogan, 2004
9. GOODAM & GILMAN. Manual de Farmacologia e Terapêutica. Porto Alegre: AMGH editora Ltda, 2010.

ЖЖЖЖЖЖ

3 Marcelo A. Cabral
ANOTAÇÕES EM FARMACOLOGIA E FARMÁCIA CLÍNICA

30) farmacologia do glaucoma


O glaucoma é uma doença ocular para a qual não há numa base emergencial com fármacos, ou impedidas
através da remoção cirúrgica de parte da íris (iridectomia).
cura, mas sim controle por toda a vida do paciente.
Constitui uma importante causa de cegueira e possui grande A forma de glaucoma de ângulo aberto é uma condição
interesse farmacológico, visto que, em sua forma crônica, crônica, cujo tratamento é, em grande parte, farmacológico.
responde freqüentemente à terapia farmacológica. A
principal manifestação consiste em elevação da pressão Formação do humor aquoso
intra-ocular (PIO), que inicialmente não está associada a
qualquer sintoma. No Brasil, 50% dos portadores de O humor aquoso é um líquido transparente, formado
glaucoma não sabem que têm a doença e muitos chegam a por cerca de 98% de água e 2% de sais diluídos, que
um estágio avançado sem um diagnóstico. preenche o espaço entre a córnea e a Iris. Este líquido é
produzido pelo epitélio ciliar na câmara posterior e
Sem tratamento, o aumento da pressão intra-ocular atravessa a superfície anterior do cristalino e a superfície
resulta em lesão da retina e do nervo óptico na maioria dos posterior da íris, através da pupila e para dentro da câmara
pacientes, com restrição dos campos visuais e, por fim anterior. Sua saída se dá através do ângulo irideocorneano
cegueira. A PIO elevada é um fator de risco para o entre a íris e a esclerótica. Neste ponto ocorre a filtração
glaucoma. A pressão intra-ocular é facilmente medida através da rede trabecular, e o líquido penetra o canal de
como parte do exame oftalmológico de rotina. Schlemm, para retornar à circulação venosa. A secreção do
humor aquoso é um processo ativo que se continua
São reconhecidos dois tipos principais de glaucoma: de
independente da pressão exercida pelo líquido. A atividade
ângulo aberto e de ângulo fechado.
secretória do epitélio ciliar requer a enzima anidrase
carbônica.

Os principais exames para o diagnóstico do glaucoma


são:

- Tonometria – exame para a tomada da pressão


intraocular. Os valores de referência variam entre 10 a 19
mmHg;

- Gonioscopia – exame para classificar o tipo de


glaucoma, se de ângulo aberto ou fechado. Segundo a
classificação de Shaffer os valores são:

ângulo aberto (grau 4) - amplitude do ângulo 35-45º -


A forma de ângulo fechado está associada a uma impossível fechamento;
câmara anterior superficial, em que a íris dilatada pode
ocluir a via de drenagem de fluxo no ângulo entre a córnea ângulo aberto (grau 3) - amplitude do ângulo 20-35º -
e o corpo ciliar. Essa forma está associada a elevações impossível fechamento;
agudas e dolorosas da pressão, que devem ser controladas
1 Marcelo A. Cabral
ANOTAÇÕES EM FARMACOLOGIA E FARMÁCIA CLÍNICA

ângulo moderadamente estreito (grau 2) - amplitude


20º - possível fechamento; a) antagonistas beta-adrenérgicos (Timolol e Carteolol)
ângulo extremamente estreito (grau 1) - amplitude 10º- O olho humano apresenta uma grande concentração
provável fechamento; de receptores beta especialmente no epitélio não
pigmentado do corpo ciliar.
ângulo completamente ou parcialmente fechado (grau Os medicamentos atualmente empregados no controle
0) - amplitude 0º - fechamento presente ou iminente. do glaucoma, e que contêm drogas beta-adrenérgicas, reduzem
a produção de humor aquoso sem interferir em seu
- Paquimetria – Este exame é utilizado para medir escoamento. Possivelmente, diminuem a produção de AMPc
a espessura da córnea. Córneas grossas tendem a apresentar no epitélio não pigmentado do corpo ciliar. Podem reduzir em
pressões falsamente elevadas e córneas finas fazem o até 30% a produção do humor aquoso.
oposto. Muitas pessoas possuem pressão intra-ocular Os beta-bloqueadores apresentam muitos possíveis
elevada, porém com córneas grossas, o que muitas vezes efeitos colaterais. Pacientes devem ser inquiridos quanto à
descaracteriza o glaucoma. Espessura corneana média é de presença de hiper-reatividade brônquica, bloqueio cardíaco ou
555 microns; miastenia gravis antes de se iniciar a terapêutica, pois essas
doenças podem se agravar com o uso destes colírios.
- Biomicroscopia de fundo – exame para avaliar se O timolol diminui a PIO através da diminuição da
existe lesão do nervo óptico provocado pela pressão intra- formação do humor aquoso no epitélio ciliar ao bloquear os
ocular; e seus receptores beta-adrenérgicos. Dentre seus efeitos
adversos, cita-se: ceratite puntacta superficial, anestesia
- Campo visual - exame para avaliar se há perda do
corneana, danos à superfície ocular e olho seco, por
campo visual periférico.
enfraquecimento da camada da mucosa do filme lacrimal.
Tratamento farmacológico do glaucoma São comercializados no Brasil, atualmente: o Maleato
de timolol a 0,25% e 0.5% (Timolol®, Timoptol®,
A farmacoterapia atual é dirigida à diminuição da Glautimol®), o Betaxolol (Betoptic®) e o Levobunolol
produção de humor aquoso no corpo ciliar bem como para (Betagan®).
o aumento do fluxo de saída pela rede trabecular e vias b) análogos da prostaglandina (Latanoprost e
uveoescleróticas. Bimatoprost)
Como a pressão intra-ocular é uma função do Os análogos das prostaglandinas são substâncias que
equilíbrio entre a entrada de líquido e a sua drenagem fora atuam como agonistas em receptores específicos para
do globo ocular, as estratégias para o tratamento do prostaglandina Fa2. Após aplicação tópica, são
glaucoma de ângulo aberto podem ser divididas em duas biotransformadas em prostaglandinas, incluindo a PGE2, com
classes: grande potencial para ativar o sistema adenilato ciclase,
remodelando a matriz extracelular do músculo ciliar da íris.
- redução da secreção de humor aquoso; e
Aumentam por essa razão, a drenagem do humor aquoso pela
- aumento do fluxo aquoso. rota úveo-escleral. Eles são preferidos para o manejo do
glaucoma primário, pois têm efeito hipotensor ocular superior
O tratamento hipotensor ocular mantém relação direta ao de outros fármacos, sendo normalmente efetivos com uma
com a diminuição da incidência ou estabilização do única aplicação diária. Também oferecem vantagens, por
glaucoma, minimizando ou impedindo danos sobre o nervo serem rapidamente metabolizados e não causarem efeitos
óptico, a camada de fibras nervosas da retina e campo adversos cardiopulmonares.
visual.
A hiperemia conjuntival constitui um dos efeitos
Foi constatada a utilidade de cinco grupos gerais de colaterais mais comumente relatados, ocorrendo em maior
fármacos na redução da pressão intra-ocular: intensidade com o travaprost, comparativamente aos outros
colinomiméticos, agonistas alfa-adrenérgicos, beta- análogos das prostaglandinas. Estudo recente demonstrou que
bloqueadores, análogos da prostaglandina F2a e diuréticos. a hiperemia conjuntival é decorrente da liberação de óxido
Desses cinco grupos, os análogos da prostaglandina e os nitroso endotelial e não por eventos inflamatórios relacionados
beta-bloqueadores são os mais populares, pois sua à ação mediadora da inflamação pelas prostaglandinas.
administração é de uma ou duas vezes ao dia e poucos Análogos das prostaglandinas não são indicados em pacientes
efeitos adversos (exceto em pacientes com asma ou marca- com glaucoma secundário à uveíte, visto que o humor aquoso,
passo cardíaco ou com doença das vias de condução no nessas condições, já é rico em prostaglandinas.
caso dos beta-bloqueadores).
c) agonistas alfa2-adrenérgicos (Clonidina,
O uso de drogas no glaucoma de ângulo fechado agudo Apraclonidina e Brimonidina)
limita-se aos colinomiméticos, à acetazolamida e aos
fármacos antes da cirurgia. Os agonistas alfa-adrenérgicos reduzem a produção de
humor aquoso por vasoconstrição dos vasos ciliares.

A apraclonidina é um agonista seletivo para receptores


alfa-2 no epitélio não pigmentado do corpo ciliar. Ele é capaz
2 Marcelo A. Cabral
ANOTAÇÕES EM FARMACOLOGIA E FARMÁCIA CLÍNICA

de inibir a atividade da adenilato-ciclase, impedindo a


conversão do trifosfato de adenosina em monofosfato de A brinzolamida também é um inibidor da anidrase
adenosina. Com isso, diminui a produção de humor aquoso. A carbônica tipo II, com mecanismo de ação e
Brimonida apresenta-se mais seletiva para os receptores alfa-2 biodisponibilidade semelhantes aos da dorzolamida. A
do que a apraclonidina. inibição da anidrase carbônica nos processos ciliares dos olhos
diminui a secreção do humor aquoso, presumivelmente
A clonidina tem como principal desvantagem a
diminuindo a formação de íons de bicarbonato com a redução
capacidade de atravessar a barreira hemato-encefálica, mesmo
subsequente do transporte de sódio e fluidos oculares. Possui
em aplicações tópicas, produzindo severo efeito hipotensor
como reações adversas mais comuns (5 a 10% dos pacientes)
sistêmico, e por vezes sonolência, confusão mental e
a visão embaçada e o sabor amargo incomum na boca. Em
convulsões.
seguida, as reações adversas que ocorrem em 1 a 5% dos
A apraclonidina supera a clonidina por sua segurança e pacientes são: blefarite (inflamação das pálpebras), dermatite,
eficácia e foi desenvolvida no intuito de se minimizar esses olho seco, sensação de corpo estranho no olho, dor de cabeça,
efeitos centrais, pois praticamente não transpõe a barreira hiperemia, prurido e rinite ocular, etc.
hemato-encefálica, mas assim como em outros alfa-
e) Agonistas muscarínicos – “mióticos” (Pilocarpina,
adrenérgicos também se observam efeitos cardiovascular.
ecotiopato e carbacol)
O tartarato de brimonida apresenta uma seletividade para
Os nervos parassimpáticos para os olhos inervam o
os receptores alfa2-adrenérgicos cerca de dez vezes maior que
músculo constritor da pupila, que segue um trajeto
a clonidina e apraclonidina, e parece apresentar taquifilaxia
circunferencial na íris, e o músculo ciliar, que ajusta a
menor que a apraclonidina num tratamento em longo prazo.
curvatura do cristalino. A contração do músculo ciliar em
Ela atua ao diminuir a produção de humor aquoso e ao
resposta à ativação dos receptores muscarínicos é necessária
aumentar a saída do líquido pela via úveo-escleral. Apresenta
para a acomodação do olho para a visão de perto. Por outro
menor incidência de efeitos colaterais que os outros agonistas
lado, o músculo constritor da pupila é importante não apenas
alfa-2.
para ajustar a pupila em resposta a alterações da intensidade
Os agonistas alfa2-adrenérgicos devem ser administrados luminosa, mas também para regular a pressão intra-ocular.
com cautela aos pacientes em uso de IMAO, antidepressivos
No glaucoma agudo, a drenagem do humor aquoso é
tricíclicos, betabloqueadores, anti-hipertensivos e glicosídeos
impedida quando a pupila se dilata, visto que o dobramento do
cardíacos.
tecido da íris oclui o ângulo de drenagem, causando elevação
Os agentes alfa-adrenérgicos causam midríase que da pressão intra-ocular. Nessas circunstâncias, a ativação do
podem precipitar uma crise aguda de glaucoma de ângulo músculo constritor da pupila por agonistas muscarínicos reduz
fechado em indivíduos predispostos que apresentam câmara a pressão intra-ocular. O aumento da tensão causado por essas
anterior rasa e seio camerular estreito. drogas no músculo ciliar também pode influir na melhora da
drenagem ao realinhar as trabéculas de tecido conjuntivo
Os compostos relacionados com a adrenalina (Clonidina, através das quais passa o canal de Schlemm.
Apraclonidina e Bromonidina), eficazes na redução da pressão
intra-ocular, podem causar um fenômeno de rebote de A pilocarpina pode ser associada aos beta-
vasoconstrição-vasodilatação tornando o olho vermelho. bloqueadores, aos adrenérgicos e aos inibidores da anidrase
carbônica em efeito aditivo.
d) diuréticos inibidores da anidrase carbônica
(Acetazolamida, Dorzolamida e Brinzolamida)

Durante a produção de humor aquoso, íons bicarbonato


são transportados juntamente com o cátion sódio para a
câmara posterior do bulbo ocular, estabelecendo um gradiente
osmótico. Trata-se de condição cuja ocorrência depende da
enzima anidrase carbônica.

A acetazolamida tem uma eficácia significativa na


redução da PIO em até 50% da produção do aquoso, com
efeito redutor iniciando em uma hora. Pode ser usada em
situações de urgência. Porém, quando o sistema de drenagem
do humor aquoso não for suficiente para promover a saída de
pelo menos 50% de sua produção, a acetazolamida
individualmente administrada não normalizará a PIO. A Pilocarpina é a droga mais eficaz desta classe de
fármaco, pois atravessa a membrana conjuntival.
A dorzolamida é um inibidor da anidrase carbônica de uso
tópico, e reduz significantemente a PIO, com efeitos colaterais O Ecotiopato, um anticolinesterásico, também é utilizado
reduzidos. Esse fármaco age com maior seletividade inibindo no tratamento do glaucoma. Pode causar efeitos sistêmicos.
a anidrase carbônica tipo II, a qual é predominantemente
encontrada no epitélio do corpo ciliar.
3 Marcelo A. Cabral
ANOTAÇÕES EM FARMACOLOGIA E FARMÁCIA CLÍNICA

Dentre os efeitos indesejáveis, destacam-se: transtorno da


acomodação devido à miopia induzida por um tratamento O mecanismo hipotensor ocular dos hiperosmóticos, portanto,
longo; cefaléia; deslocamento de retina, possivelmente é baseado na elevação da concentração dos fluidos
associados à tração vítrea. Dessa forma, o uso dos mióticos intravasculares, o que cria um gradiente osmótico entre o
em pacientes que apresentem degenerações periféricas, plasma e o vítreo, e com isso provoca deflúvio de água do
achados frequentes em portadores de glaucoma pigmentar, vítreo para o espaço intravascular.
deve ser restrito aos casos em que não se pode utilizar uma Entre os efeitos colaterais descritos com o uso dessas
medicação alternativa. drogas estão a dor de cabeça, confusão mental, insuficiência
cardíaca aguda ou infarto do miocárdio, sendo essas duas
últimas com maior frequência especialmente após o uso
f) Agentes hiperosmóticos (Manitol, Glicerol e
endovenoso dos agentes hiperosmóticos. O glicerol pode
Isosorbida)
causar hiperglicemia e até ceto-acidose em pacientes
diabéticos. O paciente que receber manitol deverá permanecer
Devido sua velocidade de ação e eficácia, os agentes
em decúbito dorsal (deitado), pois a hipotensão arterial
hiperosmóticos são muitos úteis quando há uma elevação
abrupta ou a diminuição do líquido céfalo-raquidiano podem
repentina na pressão intraocular. As drogas usadas
promover severa cefaléia.
costumeiramente são o manitol, droga de uso endovenoso, o
glicerol e a isosorbida, de uso oral. A isosorbida pode ser
usada em pacientes diabéticos, enquanto o glicerol não, pois
sua metabolização final resulta em glicose.
Esses medicamentos são empregados para o controle
agudo da PIO, e raramente usados além de poucos dias.
Devem ser administrados rapidamente, para que se
estabeleça um aumento abrupto da osmolaridade plasmática.

Referências Bibliográficas
1. RANG, H. P. et al. Farmacologia. 4 edição. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2001;
2. KATZUNG, B. G. Farmacologia: Básica & Clinica. 9 edição. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2006;
3. CRAIG, C. R.; STITZEL, R. E. Farmacologia Moderna. 6 edição. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2005;
4. GOLAN, D. E. et al. Princípios de Farmacologia: A Base Fisiopatológica da Farmacoterapia. 2 edição. Rio de
Janeiro: Guanabara Koogan, 2009;
5. FUCHS, F. D.; WANNMACHER, L.; FERREIRA, M. B. C. Farmacologia Clínica. 3 edição. Rio de Janeiro: Guanabara
Koogan, 2004.
6. GILMAN, A. G. As Bases farmacológicas da Terapêutica. 10 edição. Rio de Janeiro: Mc-Graw Hill, 2005.
7. CONSTANZO, L. S. Fisiologia. 2 edição. Rio de Janeiro: Elsevier, 2004.
8. PORTH, C. M. Fisiopatologia. 6 edição. Rio de Janeiro: Ganabara Koogan, 2004
9. GOODAM & GILMAN. Manual de Farmacologia e Terapêutica. Porto Alegre: AMGH editora Ltda, 2010.

ЖЖЖЖЖЖ

4 Marcelo A. Cabral
ANOTAÇÕES EM FARMACOLOGIA E FARMÁCIA CLÍNICA

31) tratamento farmacológico da tuberculose


A tuberculose é uma doença infecciosa, causada por A prova tuberculina é feita por meio de inoculação
micobactérias, que atingem principalmente o pulmão. Após intradérmica de derivado purificado da fração protéica (PPD)
serem inalados, os bacilos atingem os alvéolos antigênica do bacilo. Tem por base a reação imunológica do
(primoinfecção), onde provocam uma reação inflamatória organismo à proteína estranha, exprimindo o contato do
exsudativa do tipo inespecífico. A infecção benigna pode indivíduo com o bacilo de Koch. Somente poucos indivíduos
atingir linfonodos e outras estruturas. Em aproximadamente tuberculino-positivos são doentes em atividade. Em adultos, o
90% dos indivíduos infectados o sistema imunológico teste é importante quando negativo, pois indica que o paciente
consegue impedir o desenvolvimento da doença. Em 5% dos não tem tuberculose. O teste pode ser igualmente positivo em
indivíduos observa-se a implantação dos bacilos no indivíduos vacinados com BCG e nos infectados, doentes ou
parênquima pulmonar ou linfonofodos, iniciando-se a não. Os chamados reatores fortes (10 mm ou mais de
multiplicação, originando-se o quadro de tuberculose endurecimento no local da inoculação, 48 – 72 horas após ser
primária. A tuberculose pós-primária ocorre em 5% dos feita, em imunocompetentes, e para imunossuprimidos o valor é
indivíduos infectados que já desenvolveram alguma de 5 mm) têm maior probabilidade de estarem infectados por M.
imunidade, através da reativação endógena ou por reinfecção tuberculosis ou de estarem com a doença.
exógena, sendo a forma pulmonar a mais comum. No Brasil, a tuberculose é doença prevalente. De cada
A forma extrapulmonar é mais frequente nos 100 pessoas que se infectam por contágio com um caso fonte,
hospedeiros com pouca imunidade, surgindo com maior 10 – 20 ficarão doentes, 80% dessas no primeiro ano. Em
incidência em crianças e indivíduos infectados por HIV. O média, 50% dos novos doentes serão bacilíferos. A partir desses
agente infeccioso é o Mycobacterium tuberculosis, também ocorrerá contágio por via inalatória (aerossóis produzidos por
chamado bacilo de Koch. Das outras 20 espécies do gênero tosse ou outro movimento expiratório). Pacientes com
Mycobacterium, somente o M. Bovis causa raramente tuberculose pulmonar não-bacilíferos e formas extrapulmonares
tuberculose em hospedeiro normal. Já imunodeprimidos de tuberculose não contagiam. Geralmente a fonte de infecção é
podem desenvolver doença a partir de infecção por várias paciente bacilífero, ainda não-tratado ou em tratamento há
espécies (M. kansai, M. fortuitum, M. avium). A AIDS tem menos de 2 semanas, que contamina, em média, 10 a 15 pessoas
sido associada a aumento marcado de infecção por complexo no período de um ano.
M. avium. Sendo um sério problema de saúde pública, o Programa
A pesquiza do Mycobacterium pode ser realizada por: Nacional de Controle da Tuberculose unificou os padrões de
- esfregaços (escarro, broncoscopia, líquido pleural, etc); diagnósticos, prevenção e tratamento, garantiu a distribuição
- coloração álcool-ácido-resistente (BAAR); gratuita de medicamentos antituberculosos e permitiu o acesso
- cultura (possibilita a identificação de uma bactéria não de toda a população às ações de controle da doença.
tuberculosa, teste para sensibilidade às drogas e Centralizou-se a assitência a pacientes tuberculosos para
identificação de contaminação cruzada da espécie); facilitar o controle e evitar que, atendidos por médicos em geral,
- testes moleculares (possui maior sensibilidade e sofressem erros de prescrição, com conseqüências individuiais e
especificidade. A detecção pode ser feita no mesmo dia – epidemiológicas. O médico que diagnostica um caso deve
melhor método); e notificar o serviço de controle epidemiológico e encaminhar o
- Cromatografia líquida gasosa ou de alto desempenho paciente à rede de atendimento padronizado.
(identifica rapidamente 90% das bactérias). A vacina BCG (Bacilo de Calmet Garing), após mais de 70
Na doença avançada, os exames hematológicos podem anos de seu desenvolvimento, continua sendo a única disponível
apresentar VHS elevado e anemia moderada. para prevenção de tuberculose. Reduz morbidade e mortalidade
No exame direto, pode-se encontrar a designação em crianças, mas tem pequeno efeito na doença pulmonar do
bacilo álcool-ácido-resistente (BAAR) que indica o gênero adulto.
Mycobacterium, por sua capacidade de resistir à Na quimioprofilaxia, utiliza-se isoniazida, indicada para
descoloração por essa mistura após tingimento com carbol- comunicantes de pacientes tuberculosos bacilíferos (que
fucsina. possuem duas baciloscopia direta positiva), especialmente
A identificação do germe se faz comumente por recém-nascidos e lactentes que não podem ser afastados do
microscopia direta das secreções broncopulmonares domicílio, crianças menores de 4 anos e reatores tuberculínicos
(baciloscopia do escarro), que se apresenta positiva somente fortes (cujo risco de adoecer é 2 vezes maior que o de
quando se eliminam pelo menos 5.000 bacilos por ml de comunicantes não-reatores). Em comunicantes com idade acima
escarro. Á baciloscopia negativa pode corresponder cultura de 35 anos, quimioprofilaxia se restringe a indivíduos com risco
positiva, pois esta é mais sensível, bastando 10 bacilos para definido de contrair a doença, pois essa faixa etária (35 – 45
gerar uma colônia na cultura. No entanto, exige 2 a 6 anos) está mais sujeita à hepatite induzida por isoniazida.
semanas de incubação e tem maior custo. Cultura também é Também pode se fazer quimioprofilaxia em indivíduos que
feita em lavado brônquico ou gástrico, líquido pleural, urina, possuem situações especiais de risco, como leucemias e
liquor e tecidos. Geralmente provas de sensibilidade não são linfomas, silicose, doença renal em estágio final, diabetes
necessárias, tendo em vista a alta eficácia dos agentes melito, AIDS, corticoterapia prolongada e uso de
antituberculosos (procedimento excetuado para retratamento imunossupressores. O Programa nacional de Controle da
e suspeita de resistência). Tuberculose recomenda quimiprofilaxia em comunicantes
recém-nascidos e nos menores de 5 anos.
1 Marcelo A. Cabral
ANOTAÇÕES EM FARMACOLOGIA E FARMÁCIA CLÍNICA

Algumas condições clínicas influenciam os esquemas A monoterapia com isoniazida leva a resistência. A
terapêuticos. É o que ocorre em insuficiência renal crônica, resistência resulta de mutações na catalase-peroxidase e
com fármacos excretados pelo rim em forma inalterada ou mutações nos genes envolvidos na biossíntese do ácido
como metabólitos ainda ativos. Se não houver ajuste das micólico.
doses ou intervalos entre administrações, aumentarão níveis O metabolismo da isoniazida depende de fatores genéticos
séricos do fármaco, com aparecimento de efeitos tóxicos. que determinam se o indivíduo é um acetilador lento ou rápido.
Doenças hepáticas não constituem contra-indicações para Isso explica a diminuição da concentração sérica do fármaco
uso de antituberculosos, apesar de sua toxicidade sobre o nos pacientes acetiladores rápidos.
fígado. Se houver hepatite ou os níveis de transaminases A piridoxina, vitamina B6 (10 a 50 mg/dia), é
estiverem mais de 5 vezes além dos valores normais em coadministrada com isoniazida para minimizar o risco de
pacientes assintomáticos, a isoniazida deve ser suspensa. neuropatia periférica e toxicidade do SNC em pacientes
Monitora-se a função hepática durante o tratamento. desnutridos e naqueles com predisposição à neuropatia
Os sintomas da tuberculose tais como a febre, mal-estar, (acetiladores lentos, idosos, gestantes, HIV, diabéticos,
anorexia e tosse devem involuir nas 2 primeiras semanas de alcoólicos e urêmicos). As reações adversas mais comuns são
tratamento. Ao fim desse período, pacientes bacilíferos não exantema, febre, icterícia e neurite periférica.
são mais infectantes. Bi ou trimensalmente pesquisa-se
involução das lesões radiológicas. A baciloscopia é repetida • Rifampicina:
mensalmente nos doentes bacilíferos enquanto houver
espectoração. A rifampicina é um derivado semissintético da rifamicina B.
Os efeitos adversos do tratamento farmacológico É uma poderosa droga ativa por via oral, que inibe a RNA
precisam ser controlados, apesar de aparecerem em pequeno polimerase das micobactérias. Induz as enzimas do metabolismo
número de casos e terem intensidade leve a moderada, hepático.
raramente determinando interrupção do tratamento. Os Pode-se verificar rápido desenvolvimento de resistência
problemas mais comuns são náusea, vômito, epigastralgia, devido às mutações na RNA-polimerase dependente de DNA,
erupção cutânea e prurido. que reduzem a ligação do fármaco à polimerase.
Na gestação, o tratamento antituberculoso pode As reações adversas mais comuns são exantema, febre,
continuar, pois os fármacos não se mostraram teratogênicos. náuseas e vômitos. Por ser um potente indutor das CYP
Só estão contra-indicadas estreptomicina, devido à lesão do hepáticas, a rifampicina diminui a meia-vida plasmática de
oitavo par craniano, e etionamida, que pode causar muitos fármacos, tais como digoxina, quinidina, propanolol,
malformações congênitas, principalmente no primeiro verapamil, inibidores das proteases do HIV, anticoagulantes
trimestre da gravidez. orais, etc.
A eficácia dos contraceptivos orais fica reduzida
durante o tratamento antituberculoso, e um controle • Etambutol:
alternativo do planejamento familiar deve ser oferecido.
Inibe o crescimento das micobactérias através da inibição das
arabinosil transferases envolvidas na biossíntese da parede
Fármacos utilizados no tratamento da tuberculose: celular.
A resistência ao etambutol desenvolve-se muito lentamente in
Terapia farmacológica composta: vitro, mas pode resultar de mutações de aminoácidos isolados
quando administrados isoladamente.
Primeira fase = duração de dois meses - isoniazida, É necessário efetuar um ajuste da dose em pacientes com o
rifampicina, pirazinamida e etambutol. comprometimento da função renal. O efeito coalteral mais
importante consiste em neurite óptica, resultando em
Segunda fase = duração de quatro meses – isoniazida e diminuição da cuidade visual e perda da capacidade de
rifampicina. distinguir o vermelho do verde. O fármaco pode aumetar a
concentração snguínea de urato em cerca de 50% dos pacientes.
• Isoniazida:
• Pirazinamida:
Possui atividade limitada à micobactérias. É
bacteriostática para os bacilos em repouso, e bactericida A pirazinamida exibe atividade bactericida in vitro apenas na
para os microrganismos em divisão celular. Seu mecanismo presença de pH levemente ácido, o que não representa nenhum
de ação consiste em inibir a síntese de ácidos micólicos problema, visto que o fármaco mata os bacilos da tuberculose
(que são componentes exclusivos da parede celular das que residem em fagossomos ácidos dos macrófagos. Oalvo da
micobactérias) através da formação do seu metabólito pirazinamida é o gene da acidograxo sintase I das micobactérias
tóxico – o ácido isonicotínico. Portanto, tarta-se de um pró- envolvido na biossíntese do ácido micólico. Verifica-se rápido
fármaco que é metabolisado pela catalase-peroxidase desenvolvimento de resistência se a pirazinamida é utilizada
micobacteriana. O alvo específico do derivado da como única medicação.
isoniazida é o enoil-ACP redutase da acido-graxo sintase II, A lesão hepática constitui o efeito colateral mais grave da
que converte os ácidos graxos insaturados em saturadosnna pirazinamida. Antes da administração de pirazinamida, todos os
biossíntese dos ácidos micólicos. pacientes devem ser submaetidos a provas de função hepática.

2 Marcelo A. Cabral
ANOTAÇÕES EM FARMACOLOGIA E FARMÁCIA CLÍNICA

O fármaco inibe a excreção de urato, precipitando raramente


um episódio agudo de gota. Outros efeitos adversos consistem 4. GOLAN, D. E. et al. Princípios de Farmacologia: A
em artralgia, náuseas, vômitos, disúria, mal-estar e febre. Base Fisiopatológica da Farmacoterapia. 2 edição. Rio
de Janeiro: Guanabara Koogan, 2009;
Sistema de tratamento farmacológico da tuberculose no 5. FUCHS, F. D.; WANNMACHER, L.; FERREIRA, M. B. C
Brasil Farmacologia Clínica. 3 edição. Rio de Janeiro: Guanabara
Koogan, 2004.
Segundo a Nota Técnica sobre as mudanças no tratamento 6. GILMAN, A. G. As Bases farmacológicas da Terapêutica.
da tuberculose no Brasil para adultos e adolescentes, do 10 edição. Rio de Janeiro: Mc-Graw Hill, 2005.
Programa Nacional de Controle da Tuberculose – Ministério da 7. CONSTANZO, L. S. Fisiologia. 2 edição. Rio de
Saúde, foi adotado um novo sistema de tratamento para a Janeiro: Elsevier, 2004.
tuberculose, a ser aplicado aos indivíduos com 10 anos ou mais 8. PORTH, C. M. Fisiopatologia. 6 edição. Rio de
de idade. A mudança consiste nas seguintes ações: Janeiro: Ganabara Koogan, 2004
- introdução do etambutol como quarto fármaco na fase 9. GOODAM & GILMAN. Manual de Farmacologia e
intensiva de tratamento (dois primeiros meses) do esquema Terapêutica. Porto Alegre: AMGH editora Ltda, 2010.
básico, e tem como justificativa a constatação do aumento da
resistência primária à isoniazida, e também a resistência ЖЖЖЖЖЖ
primária à isoniazida associada à rifanpicina.
- introdução da apresentação em comprimidos com dose
fixa combinada dos 4 fármacos (4 em 1) para a fase intensiva do
tratamento. Os comprimidos são formulados com doses
reduzidas de isoniazida e pirazinamida em relação às
anteriormente utilizadas no Brasil. As vantagens da mudança da
apresentação dos fármacos são, entre outras, o maior conforto
do paciente pela redução do número de comprimidos a serem
ingeridos; a impossibilidade de tomada isolada de fármacos, e a
simplificação da gestão farmacêutica em todos os níveis.
Para crianças até 10 anos continua sendo preconizado o
tratamento anterior que consiste na tomada de três fármacos
apenas (rifampicina, isoniazida e pirazinamida) na fase
intensiva de tratamento.

Esquema básico para dultos e adolescentes (2RHZE/4RH):

Preconiza-se a solicitação de cultura, identificação e teste


de sensibilidade em todos os casos e retratamento, e para
aqueles com baciloscopia positiva ao final do segundo mês de
tratamento.

Referências Bibliográficas
1. RANG, H. P. et al. Farmacologia. 4 edição. Rio de
Janeiro: Guanabara Koogan, 2001;
2. KATZUNG, B. G. Farmacologia: Básica & Clinica. 9
edição. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2006;
3. CRAIG, C. R.; STITZEL, R. E. Farmacologia Moderna.
6 edição. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2005;

3 Marcelo A. Cabral
ANOTAÇÕES EM FARMACOLOGIA E FARMÁCIA CLÍNICA

32) FÁRMACOS ANTIBIÓTICOS


paralisia espástica; e a toxina do cólera que induz a secreção de
A palavra infecção descreve a presença e a multiplicação de líquido na luz do intestino, provocando diarréia.
um organismo vivo sobre o hospedeiro ou dentro dele.
As endotoxinas não contêm proteínas, não são liberadas
Doença infecciosa são as lesões ou danos patológicos ativamente pela bactéria durante o crescimento, e não possuem
decorrentes de uma infecção parasitária. A gravidade de uma atividade enzimática. São constituídas de lipídios e
doença infecciosa pode variar de leve a acarretando risco de polissacarídeos, encontrados na parede celular das bactérias
vida para o indivíduo, dependendo de muitas variáveis, como a gram-negativas. As endotoxinas são potentes ativadores de
saúde do hospedeiro quando da infecção e a virulência do vários sistemas reguladores em seres humanos. Pequenas
microrganismo (potencial de produção de doença). Um grupo quantidades no sistema circulatório podem causar coagulação,
selecionado de microrganismos, designados como patógenos, é sangramento, inflamação, hipotensão e febre.
tão virulento que raramente são encontrados na ausência de
Fatores de aderência, fatores de evasão e fatores invasivos
doença.
são outras característica das células bacterianas que lhe
A evolução da doença infecciosa pode ser dividida em conferem seu grau de virulência.
vários estágios distinguíveis depois da entrada do patógeno no Os antibióticos são fármacos utilizados para o tratamento
hospedeiro: das infecções bacterianas. No sentido mais estrito, os
antibióticos são substâncias produzidas por diversas espécies de
- período de incubação = o patógeno inicia a replicação microrganismos que suprimem o crescimento de outros
ativa sem produzir sintomas. microrganismos. Porém, as sulfonamidas e as quinolonas são
exemplos de antibióticos sintéticos.
- estágio prodrômico = aparecimento inicial dos sintomas,
ou vaga sensação de mal estar. Febre baixa, mialgia, cefaléia, Os antibióticos são classificados de acordo com a sua
fadiga, processos mórbidos. Diz-se que a doença é insidiosa potência. Os antibióticos bactericidas destroem as bactérias,
quando a fase prodrômica é prolongada. enquanto os antibióticos bacteriostáticos evitam apenas que
aquelas se multipliquem e permitem que o organismo elimine as
- estágio agudo = o hospedeiro sofre impacto máximo do bactérias resistentes. Para a maioria das infecções, ambos os
processo infeccioso. Rápida proliferação e disseminação do tipos de antibióticos parecem igualmente eficazes; porém, se o
patógeno. Durante essa fase, subprodutos tóxicos do sistema imune está enfraquecido ou a pessoa tem uma infecção
metabolismo microbiano, a lise celular e a resposta imune grave, como uma endocardite bacteriana ou uma meningite, um
organizada pelo hospedeiro se combinam para produzir danos antibiótico bactericida costuma ser mais eficaz.
aos tecidos e inflamação.
Os quatros mecanismos básicos de ação dos antibióticos
- período de convalescença = contenção da infecção, são:
eliminação progressiva do patógeno, reparo tecidual e a
resolução dos sintomas associados. 1) Ruptura da parede celular bacteriana por inibição da
síntese de peptídeoglicanos (penicilina,
- resolução = é a eliminação total de um patógeno do corpo cefalosporinas, glicopeptídeos, monobactano e
sem sinais ou sintomas residuais de doença. carbapenens);

A virulência de um microrganismo pode ser medida através 2) Inibição da síntese das proteínas bacterianas
de fatores de virulência, que são substâncias ou produtos (aminoglicosídeos, macrolídeos, tetraciclinas,
gerados por organismos infecciosos que aumentam a sua cloranfenicol, oxizolidinonas, estrepetograminas e
capacidade de causar doenças. Os principais fatores de rifampicina);
virulência são:
3) Interrupção da síntese do ácido nucléico
- toxinas = são as substâncias que alteram ou destroem o (fluoroquinolona, ácido malidixico); e
funcionamento normal do hospedeiro ou de suas células. As
toxinas bacterianas podem ser divididas em exotoxinas e 4) Interferência no metabolismo normal (sulfonamidas
endotoxinas. e trimetoprima).

As exotoxinas são as proteínas liberadas pela célula Os mecanismos de resistência bacteriana consistem na
bacteriana durante o crescimento celular. As exotoxinas produção das enzimas que inativam os antibióticos (como as
inativam enzimaticamente ou modificam componentes beta-lactamases); mutações genéticas que alteram os locais de
celulares, ocasionando disfunção ou morte celular. Como ligação dos antibióticos; vias metabólicas alternativas que
exemplo, pode-se citar as toxinas botulínicas que diminuem a contornam a atividade antibiótica e alterações na qualidade de
liberação dos neurotransmissores pelos neurônios colinérgicos, filtração da parede celular bacteriana, que impede o acesso de
causando paralisia flácida; a toxina tetânica diminui a liberação antibióticos ao local alvo do microrganismo.
dos neurotransmissores pelos neurônios inibitórios, causando

1 Marcelo A. Cabral
ANOTAÇÕES EM FARMACOLOGIA E FARMÁCIA CLÍNICA

Principais classes de fármacos antibióticos: Mecanismo de ação: Todos os antibióticos betalactâmicos


interferem na síntese do peptidioglicano da parede celular
1) Sulfonamidas: (Sulfadiazina, Sulfametoxazol, bacteriana, após se ligarem à proteína de ligação da penicilina
Sulfametopirazina, Sulfasalazina) (PLP - transpeptidases e carboxipeptidases). Além disso, o
evento bactericida final consiste na inativação de um inibidor
Mecanismo de ação: as sulfonamidas competem com o PABA das enzimas autolíticas na parede celular, levando à lise da
pela enzima diidropteroato sintetase; sulfonamidas são análogos bactéria.
estruturais e antagonistas competitivos do ácido para- - As penicilinas podem ser destruídas por enzimas amidases
aminobenzóico, um precursor do ácido fólico, que por sua vez é e betalactamases (penicilinases). O estreptococos não
essencial para síntese dos precursores do DNA e RNA produz betalactamases;
bacterianos. - A resistência à penicilina pode ser devida à:
A ação da sulfonamida consiste em inibir o crescimento das • produção de betalactamases pela bactéria;
bactérias: é um bacteriostático. A eficácia terapêutica dos • redução na permeabilidade da membrana externa
antimicrobianos bacteriostáticos depende do estado imunológico (aquaporinas);
do hospedeiro. • modificação dos sítios de ligação à penicilina.
- A ação bacteriostática é impedida na presença de pus e
produtos de degradação tecidual, visto que contém timidina - O ácido clavulânico é utilizado juntamente com a penicilina
e purinas, que são utilizadas pelas bactérias para contornar devido seu efeito inibidor de betalactamases. Isso diminui a
a necessidade de ácido fólico; resistência bacteriana à penicilina.
- A resistência à sulfonamida é mediada por plasmídeo; - Penicilinas e outros antibióticos são haptenos, moléculas
- Aumento do PABA inibe ação antibacteriana das que são muito pequenas para suscitar resposta imunológica,
sulfonamidas. mas que podem se ligar a proteínas séricas e induzir a
produção de anticorpos IgE, com conseqüente produção de
2) Trimetroprima: reação de hipersensibilidade, e até mesmo anafilaxia.
-
Mecanismo de ação: A trimetroprima inibe a ação do folato,
impedindo a formação do tetraidrofolato e, consequentemente, 4) Cefalosporina: (Cefalexina, Cefuroxima, Cefotaxima,
impossibilitando a formação do DNA. Cefalotina)
- É bacteriostática.
- Ocorre ação sinérgica quando administradas sulfonamidas e - Mecanismo de ação: é idêntico ao das penicilinas –
trimetoprima em conjunto para inibir a síntese de DNA interferência na síntese de peptidioglicanos bacterianos
bacteriano, pois elas agem na mesma via metabólica, porém após ligação às proteinas de ligação de betalactâmicos.
em fases diferentes. - As cefalosporinas possuem sensibilidade variável a
betalactamases.
- Resistência bacteriana ocorre devido às betalactamases
codificadas por plasmídeos ou cromossomos;

5) Tetraciclinas: (Oxitetraciclina, Doxiciclina, Minociclina e


Tetraciclina)

- Mecanismo de ação: as tetraciclinas inibem a síntese de


proteínas ao competirem com tRNA pelo local de ligação.
São apenas bacteriostáticos.
- As tetraciclinas são quelantes de íons metálicos, portanto
não devem ser administradas juntamente com leite, anti-
ácidos ou preparações de ferro.
- Deposita-se nos ossos e dentes amarelando-os.

6) Cloranfenicol:

- Mecanismo de ação: o clanfenicol inibe da síntese protéica.


Liga-se à subunidade 50S do ribossomo bacteriano.
- O uso clínico do cloranfenicol deve ser reservado para
infecções graves nas quais os benefícios da droga são
maiores do que o risco de toxicidade. Não deve ser usado
em recém-nascidos.
- É um bacteriostático, exceto para Haemophilus Influenzae.
3) Penicilinas: (Benzilpenicilina, Fenoximetilpenicilina,
- A resistência é devido à produção de cloranfenicol
Cloxacilina, Meticilina, Ampicilina, Amoxicilina,
acetiltransferase, que é mediada por plasmídeo.
Carbenicilina e Pipericilina)

2 Marcelo A. Cabral
ANOTAÇÕES EM FARMACOLOGIA E FARMÁCIA CLÍNICA

- O cloranfenicol causa depressão da medula óssea


resultando em pancitopenia (diminuição dos elementos - Utilizada em infecções causadas por bacterióides, infecções
figurados do sangue). das articulações e ossos causadas por estafilococos, e em
conjuntivite estafilocócica.
7) Aminoglicosídeos: (Gentamicina, Estreptomicina, - Pode causar colite pseudomembranosa, que é a inflamação
Amicacina, Tobramicina, Netilmicina, Neomicina, aguda do cólon devido uma toxina necrosante produzida
Framicetina) pelo Clostridium dificile presente na flora intestinal.

- Mecanismo ação: os aminoglicosídios inibem a síntese de 10) Fluoroquinolonas: (Ciprofloxacina, Ofloxacina,


proteínas bacterianas. Sua penetração através da membrana Norfloxacina, Acrosoxacina, Pefloxacina)
celular da bactéria depende, em parte, do transporte ativo
oxigênio-dependente por um sistema transportador - Mecanismo de ação: as fluoroquinolonas inibem a
poliamínico. O cloranfenicol bloqueia esse sistema, topoisomerase II (DNA girase que é a enzima que produz
portanto, quando administrados concomitantemente, ocorre superespiralamento negativo no DNA), não permitindo a
antagonismo farmacocinético. transcrição ou a replicação do genoma bacteriano.
- A ciprofloxacina é a mais usada. É um antibiótico de amplo
- Resistência se dá pela falha na penetração do fármaco na espectro, eficaz contra microrganismo gram positivo e gram
parede celular, ou pela sua inativação por enzimas negativo. É particularmente ativa contra microrganismos
microbianas. gram negativos, incluindo os resistentes às penicilinas,
- Espectro antimicrobiano: os aminoglicosídios são eficazes cefalosporinas e aminoglicosídios. Surgiram cepas
contra microrganismos aeróbicos gram negativos e alguns resistentes de S. aureus e P. aeruginosa.
gram positivos. A gentamicina é o mais usado, porém a - Indicações clínicas: infecções complicadas das vias
tobramicina é mais indicada no combate a P. aeruginosa. urinárias, infecções respiratórias, otite externa invasiva
- São altamente polares e não são absorvidos no TGI. causada por P. aeruginosa (piercim), osteomielite bacilar
- São utilizados principalmente em septicemia. gram negativa, gonorréia, prostatite e cevicite.
- Podem causar ototoxidade e nefrotoxidade.
11) Glicopeptídeos: (Vancomicina - é um bactericida, exceto
8) Macrolídeos: (Eritromicina, Claritromicina, Azitromicina, estreptococos)
Anfotericina - antifúngico)
. - Mecanismo de ação: a vancomicina atua ao inibir a síntese
- Mecanismo de ação: os macrolídeos ligam-se à subunidade da parede celular. É eficaz contra bactérias gram positivas,
50S do ribossomo bacteriano inibindo a síntese de proteínas incluindo o MRSA (Staphilococus aureus resistente a
bacterianas através de um efeito sobre a translocação. meticilina. A meticilina é uma penicilina semi-sintética
Sofrem competição pelo cloranfenicol e pela clindamicina. resistente às betalactamases).
- A vancomicina age de modo sinérgico com
- Espectro de ação: Eritromicina – é uma alternativa à aminoglicosídios. Deve ser administrada por via
penicilina – bactérias gram positivas; intarvenosa. Ela só é administrada por via oral para
- Azitromicina – menos ativa contra gram combater o clostridium dificile, uma vez que não é
positivos, porém eficaz contra H. influenzae e toxoplasma absorvida pelo TGI.
gondii. Tratamento das infecções do trato respiratório - Uso clínico: colite pseudomembranosa e infecções por
inferior (faringite, tonsilite) e superior (pneumonia e estafilococos resistentes à múltiplas drogas. A vancomicina
bronquite), infecções da pele e tecidos moles e otite média. é opção nas infecções estafilocócicas graves em pacientes
Posologia: adultos, 1 dose diária de 500mg durante 3 dias, alérgicos a peniclina e cefalosporina.
ou tratamento de primeira dose de 500mg e depois mais
quatro doses diárias de 250mg. Crianças, vide bula
conforme peso. 12) Agentes antimicobacterianos:
- Claritromicina – H. influenzae,
Mycobacterium avium e H. pilori. - As principais infecções micobacterianas são: Tuberculose
- Utilizados no tratamento da difteria, coqueluche, (Mycobacterium tuberculosis) e hanseníase
pneumonia, diarréia bacteriana. (Mycobacterium leprae).
Claritromicina + amoxicilina + omeprasol –
tratamento do H. pilory. a) drogas utilizadas no tratamento da tuberculose:
- Terapia farmacológica composta: - primeira fase = duração
9) Lincosamidas (clindamicina): de dois meses - isoniazida, rifampicina, pirazinamida e
etambutol.
- Mecanismo de ação: a clindamicina inibe a síntese de - Segunda fase = duração de quatro meses – isoniazida e
proteína, semelhante ao observado para os macrolídios e o rifampicina.
cloranfenicol.
- A clindamicina é ativa contra cocos gram positivos, • ISONIAZIDA:
incluindo estafilococos resistentes à penicilina, e contra - Atividade limitada à micobactérias.
muitas bactérias anaeróbicas. - É bacteriostática.

3 Marcelo A. Cabral
ANOTAÇÕES EM FARMACOLOGIA E FARMÁCIA CLÍNICA

- Mecanismo de ação – inibe a síntese de ácidos micólicos,


que são componentes da parede celular. aqueles com baciloscopia positiva ao final do segundo mês de
tratamento.
- O metabolismo da isoniazida depende de fatores genéticos
que determinam se o indivíduo é um acetilador lento ou b) Fármacos utilizados no tratamento da hanseníase:
rápido.
- tratamento durante 6 meses com dapsona e rifampicina no
• RIFAMPICINA: caso de hanseníase paucibacilar (poucos bacilos);
- É uma poderosa droga ativa por via oral, que inibe a RNA - tratamento durante 2 anos com rifampicina, dapsona e
polimerase das micobactérias. Induz as enzimas do clofazimina no caso de hanseníase do tipo lepromatoso.
metabolismo hepático. Pode-se verificar rápido
desenvolvimento de resistência.
13) Outros antimicrobianos beta-lactâmicos:
• ETAMBUTOL:
- Inibe o crescimento das micobactérias. Pode surgir - Carbapenêmicos: Imipenem:
rapidamente a resistência.
Mecanismo de ação: atua da mesma forma que os outros
• PIRAZINAMIDA: agentes beta-lactâmicos: interfere na síntese do peptidioglicano
- É um agente tuberculostático contra micobactérias da parede celular bacteriana.
intracelulares. Rápida resistência.
- Monobactâmicos: Aztreonam:
Segundo a Nota Técnica sobre as mudanças no tratamento
da tuberculose no Brasil para dultos e adolescentes, do Mecanismo de ação: interfere na síntese do peptidioglicano da
Programa nacional de Controle da Tuberculose – Ministério da parede celular bacteriana. É apenas ativo contra bactérias Gram-
Saúde, foi adotado um novo sistema de tratamento para a negativas aeróbicas, e é resistente à maioria das beta-
tuberculose, a ser aplicado aos indivíduos com 10 anos ou mais lactamases.
de idade. A mudança consiste nas seguintes ações:
- introdução do etambutol como quarto fármaco na fase Locais de atuação das principais classes de antibióticos:
intensiva de tratamento (dois primeiros meses) do esquema
básico, e tem como justificativa a constatação do aumento da
resistência primária à isoniazida, e também a resistência
primária à isoniazida associada à rifanpicina.
- introdução da apresentação em comprimidos com dose
fixa combinada dos 4 fármacos (4 em 1) para a fase intensiva do
tratamento. Os comprimidos são formulados com doses
reduzidas de isoniazida e pirazinamida em relação às
anteriormente utilizadas no Brasil. As vantagens da mudança da
apresentação dos fármacos são, entre outras, o maior conforto
do paciente pela redução do número de comprimidos a serem
ingeridos; a impossibilidade de tomada isolada de fármacos e a
simplificação da gestão farmacêutica em todos os níveis.
Para crianças até 10 anos continua sendo preconizado o
tratamento anterior que consiste na tomada de três fármacos
apenas (rifampicina, isoniazida e pirazinamida) na fase
intensiva de tratamento.

Esquema básico para dultos e adolescentes (2RHZE/4RH):

Mecanismos bioquímicos de resistência a antibióticos:

- Produção de enzimas que inativam o fármaco: por exemplo, as


betalactamases, que inativam a penicilina; acetiltransferases,
que inativam o cloranfenicol; quinases e outras enzimas, que
inativam os aminoglicosídios.
- Alteração dos locais de ligação de fármacos: isto ocorre com
os aminoglicosídios, a eritromicina e a penicilina.
- Redução da captação do fármaco pela bactéria: por exemplo,
Preconiza-se a solicitação de cultura, identificação e teste tetraciclinas.
de sensibilidade em todos os casos e retratamento, e para - Alterações de enzimas: por exemplo, a diidrofolato redutase
torna-se insensível à trimetoprima.

4 Marcelo A. Cabral
ANOTAÇÕES EM FARMACOLOGIA E FARMÁCIA CLÍNICA

- Muitas bactérias patogênicas desenvolveram resistência aos


antibióticos comumente utilizados; são exemplos: prótese valvar) vancomicina + gentamicina
Algumas cepas de estafilococos e enterococos são Endocardite aguda (com Vancomicina + gentamicina +
resitentes a praticamente todos os antibióticos atuais – sendo a prótese valvar) rifanpicina
resistência transferida por transposons e/ou plasmídios. Esses Acne vulgaris Doxicilina, eritromicina,
microganismos podem causar infecções hospitalares graves e clindamicina – todas
praticamente intratáveis. associadas a isotretionina
Algumas cepas de Mycobacterium tuberculosis tópica
tornaram-se resistentes à maioria dos agentes antituberculose. Antraz cutâneo Penicilina G cristalina
O grave problema clínico acarretado pelos Ace rosásea Doxicilina, metronidazol
estafilococos com resistência devido à produção de (tópico)
betalactamases havia sido solucionado com o desenvolvimento Erisipela Penicilina G procaína ou
de penicilinas semi-sintéticas (como a meticilina) e novos benzatina, azitomicina,
antibióticos betalactâmicos (monobactâmicos e carbapenens), eritromicina
que não eram sensíveis à inativação por essas enzimas. Porém, Impetigo Amoxicilina/clavunato,
surgiram cepas resistentes à meticilina (MRSA – Stafilococos azitromicina, eritromicina
aureus resistentes a meticilina) que passaram a apresentar um Úlceras de decúbito infectadas Aminoglicosídeos anti-
sítio de ligação adicional de betalactâmicos. Até ultimamente, o pseudomonas + clindamicina
glicopeptídio vancomicina era o antibiótico de último recurso ou cloranfenicol. Usar
contra o MRSA, mas, ominosamente, em 1997, foram isoladas sulfadiazina de prata (tópico)
cepas de MRSA resistentes a esse fármaco. Mordedura de cão/gato Amoxicilina/clavunato,
ampicilina
Exemplos de tratamentos empíricos das infecções: Osteomielite (adultos) Penicilina antiestafilocócica,
cefalosporinas,
Infecção Fármacos primeira escolha fluorquinolonas
Bronquite crônica Amoxicilina/clavunato Artrite séptica (adultos) Clindamicina, vancomicina,
Pneumonias Penicilina G, vancomicina penicilina antiestafilocócica
Pneumonia por aspiração Clindamicina, penicilina G Tétano Penicilina G cristalina,
Coqueluche Eritromcina, trimetroprima tetraciclinas, eritromicina
Amigdalite e faringite Geralmente possui origem Leptospirose Penicilina G critalina,
viral doxicilina, tetraciclinas
Otite externa Gotas auriculares de Peste Estreptomicina, gentamicina,
Polimixina B + neomicina + cloranfenicol, doxicilina
hodrocortisona Septicemia (adultos) sem Cefalosporinas parenterais de
Otite média Amoxicilina/clavu, penicilina. situações especiais 3ª geração ou penicilinas anti-
Sinusite Amoxicilina/clavunato pseudomonas +
Gastrenterite (somente graves) Ampicilina, amoxicilina aminoglicosídeos anti-
Enterocolite (C. difficille) Vancomicina, metronidazol pseudomonas; ampicilina +
(oral) aminoglicosídeos anti-
Diarréia dos viajantes Fluorquinilonas, trimetropima pseudomonas + clindamicina
Úlcera duodenal (H. pylori) Amoxicilina/ metronidazol/ ou imipinem/cilastatina
claritromicina/ composto de Conjuntivite Neomicina/polimixin B
bismuto /gentamicina ou cirpofloxacina
Cólera Tetraciclinas em colírio
Febre tifóde Cloranfenicol, amoxicilina, Pé diabético Clindamicina ou cefalosporina
ciprofloxacina oral de 1ª geração
Infecção urinária aguda Trimetropima/sulfametoxazol, Pé diabético crônico Infecção leve: ciprofloxacina +
amoxicilina/clavunato, recorrente clidamicina;
azitromicina Infecção grave: penicilina anti-
Meningites (adultos) Penicilina G cristalina, estafilocócica +
clorafenicol, ampicilina aminoglicosídeos anti-
Gonorréia Penicilina G procaína, pseudomonas + clindamicina.
amoxicilina/probenecida
Sífilis Penicilina G benzatina Infecção Fármacos primeira escolha
Infecção Fármacos primeira escolha Doenças dos legionários Eritromicina
Uretrite Doxicilina, azitromicina Febre reumática Penicilina G benzatina (IM)
Cancro mole Azitromicina, Febre recorrente Doxicilina, rifampicina
amoxicilina/clavunato Salpingite – inflmação pélvica Clindamicina +
Escabiose Permetrina, benzoato de aminoglicosídeo anti-
benzila (tópicos) pseudomonas, cefalosporina +
Endocardite aguda (sem Penicilina G cristalina, tetraciclinas

5 Marcelo A. Cabral
ANOTAÇÕES EM FARMACOLOGIA E FARMÁCIA CLÍNICA

Referências Bibliográficas
1. RANG, H. P. et al. Farmacologia. 4 edição. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2001;
2. KATZUNG, B. G. Farmacologia: Básica & Clinica. 9 edição. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2006;
3. CRAIG, C. R.; STITZEL, R. E. Farmacologia Moderna. 6 edição. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2005;
4. GOLAN, D. E. et al. Princípios de Farmacologia: A Base Fisiopatológica da Farmacoterapia. 2 edição. Rio de
Janeiro: Guanabara Koogan, 2009;
5. FUCHS, F. D.; WANNMACHER, L.; FERREIRA, M. B. C. Farmacologia Clínica. 3 edição. Rio de Janeiro: Guanabara
Koogan, 2004.
6. GILMAN, A. G. As Bases farmacológicas da Terapêutica. 10 edição. Rio de Janeiro: Mc-Graw Hill, 2005.
7. CONSTANZO, L. S. Fisiologia. 2 edição. Rio de Janeiro: Elsevier, 2004.
8. PORTH, C. M. Fisiopatologia. 6 edição. Rio de Janeiro: Ganabara Koogan, 2004
9. GOODAM & GILMAN. Manual de Farmacologia e Terapêutica. Porto Alegre: AMGH editora Ltda, 2010.

ЖЖЖЖЖЖ

6 Marcelo A. Cabral

Você também pode gostar