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IDENTIDADE CULTURAL
Anatomia da formação
SILVIANO SANTIAGO
RESUMO
JOGOS
TRILHOS
Logo após a Segunda Grande Guerra Mundial, o Primeiro Mundo atravessa uma
fase de grande euforia econômica e social e, de repente, é questionado nas
raízes pelo drama político das diversas nações colonizadas do continente
africano, de que foi exemplo maior a Guerra da Independência Argelina (1954-
1962). As colônias lutam a ferro e fogo contra o poder metropolitano. Buscam a
independência das potências colonizadoras europeias, conquistada pelos
brasileiros ainda no século 19.
OCEANO
Com o corpo tomado por virose pós-colonial, deliro. Instruído pelos intelectuais
e escritores africanos e pela França, apaixono-me pela poesia de Aimé Césaire.
Leio as revistas "Temps Modernes" e "Présence Africaine".
IMPULSO
Sem ser mero silêncio, o outro brasileiro não seria --embora estivesse sendo
dado pela tradição eurocêntrica-- o mesmo europeu. Duplicata. Por essa
fórmula simplificada, fui levado a questionar o conceito de identidade e a
conjurar, enfatizando-a, a noção de diferença, de que Jacques Derrida será o
grande teórico a partir de 1967.
Jogava e, munido das fichas de jogador, fiz uma aposta. Catava metáforas no
texto da época colonial e, a partir delas, apreendia o modo como cada uma
servia para montar e revelar, na superfície meramente descritiva do texto, as
manobras eficientes do colonizador, embora enrustidas a olho nu e ainda
cercadas de mistério nas primeiras narrativas historiográficas que iluminavam o
Brasil.
COBAIA
Minha primeira cobaia foi a "Carta de Pero Vaz de Caminha", que líamos na
edição em português arcaico e moderno dos Nossos Clássicos, evitando com
cuidado a poderosa edição de Jaime Cortesão. Intuía que, pelo privilégio
concedido a certa(s) metáfora(s), o texto da carta abria uma fascinante
descendência na história da cultura e da literatura brasileira, cujos tataranetos
no modernismo brasileiro são "Macunaíma" (Mário de Andrade) e "Poesia Pau-
Brasil" (Oswald de Andrade).
Foi naquela época que tive a ideia de introduzir nos estudos sobre literatura
comparada a noção de "entre-lugar", espaço negociável de leitura das
literaturas latino-americanas e das que passaram por processos semelhantes
de colonização, cujo principal intuito era dar o troco pela diferença (pela
originalidade), valor sempre neutralizado pela literatura comparada tradicional.
MILÊNIO
A exaustão do paradigma não o aliena. Assinala, antes, que ele está a perder a
condição de prioritário. Novas condições materiais definem o novo milênio
brasileiro. Elas passam a exigir outro feixe amplo e crítico de discursos afins e
complementares, que constituirão novo paradigma --o da "inserção" do Brasil
no conjunto das nações.
Nota: Versão mais longa deste texto será apresentada pelo autor na
Universidade Tres de Febrero, em Buenos Aires, no dia 2/10, em simpósio que
o homenageia