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12, no 1, 28– 42
Resumo
As pesquisas sobre neuroplasticidade têm implicações para os modelos conceituais de correlação estrutura-
função no cérebro e para a compreensão dos mecanismos de recuperação funcional. A reativação de
aferências é considerada um dos principais mecanismos de plasticidade sináptica. O principio de “São
Mateus” prevê que quanto maiores os recursos pessoais e interpessoais disponíveis, previamente e após a
lesão, melhor o prognóstico. Três modelos conceituais, não excludentes, são reconhecidos em reabilitação
neuropsicológica: restituição, substituição e compensação. A abordagem enfatizada no processo de
reabilitação deve ser formulada individualmente de acordo com os dados disponíveis sobre os mecanismos
lesionais, recuperação funcional e fatores individuais relacionados ao prognóstico. De um modo geral, a
restituição funcional é enfatizada no início e a compensação adquire maior relevância com o tempo. Uma
perspectiva do desenvolvimento também é útil, ajudando a identificar as trilhas em que a auto-realização
permanece viável e os objetivos pessoais que o cliente pode perseguir.
Palavras chave: neuroplasticidade, reabilitação, neuropsicologia.
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Artigo apresentado no curso Fundamentos conceituais e metodológicos da reabilitação neuropsicológica da XXXII Reu-
nião Anual da Sociedade Brasileira de Psicologia, 2002.
Apoio Financeiro: FAPEMIG
Endereço para correspondência: Av. Antonio Carlos 6627, 31270-901, Belo Horizonte, e-mail: haase@fafich.ufmg.br
29 V. G. Haase e S. S. Lacerda
pende em grande parte da presença de depres- cam uma melhoria da eficácia sináptica depen-
são funcional concomitante em áreas homólo- dente de estimulação específica (Hebb, 1949).
gas do hemisfério direito (e.g., Weiller e Herr- As evidências experimentais, tanto em animais
mann, 1999). Segundo Pöppel e von Steinbü- quanto humanos, indicam que regimes especí-
chel (1992), a diasquise decorre de um dese- ficos de estimulação seletiva e repetitiva po-
quilíbrio entre excitação e inibição entre as dem induzir importantes modificações nas con-
diferentes áreas cerebrais após uma lesão. O figurações sinápticas cerebrais. A correlação
desaparecimento gradual deste desequilíbrio temporal, com retardo de fase da ordem de al-
não significa, portanto, um mecanismo genuíno guns milissegundos, desempenha um papel
de recuperação funcional, mas de desmascara- importante neste processo (Wang, Merzenich,
mento de uma potencialidade funcional que Sameshima e Jenkins, 1995). Os resultados de
havia sido comprometida transitoriamente. Wang e cols. indicam que, de acordo com a
previsão de Hebb, a estimulação sincrônica de
(b) Supersensibilidade (pós-sináptica) de desnervação e/ grupos neuronais tende a reforçar sua conecti-
ou hiperatividade pré-sináptica vidade sináptica fazendo com que eles passem
Imaginemos um neurônio idealizado e a funcionar como uma unidade funcional ou
suas conexões aferente e eferente, tais como assembléia neuronal.
representados na Figura 1. Gradualmente está se acumulando infor-
Figura 1. Representação de uma cadeia de mação sobre os mecanismos bioquímicos en-
volvidos na chamada sinapse de Hebb. As evi-
dências indicam a participação de diversas
A B C substâncias, tais como polipeptídeos denomina-
-----< -----< -----< dos fatores de crescimento neural ou neurotro-
finas, bem como de terceiros mensageiros co-
mo as substâncias ativadoras de genes de ex-
pressão precoce e que modificam a regulação
três neurônios genética da síntese proteica no controle deste
Suponhamos que o neurônio B seja des- processo (e.g., Kandel, 1998).
truído por algum processo patológico. Nas pri- Um modelo bastante plausível da sinap-
meiras horas e dias após a lesão, os neurônios A se de Hebb sugere o envolvimento de um re-
e C podem ter sua atividade funcional deprimida ceptor específico para o neurotransmissor glu-
(diasquise). Com o tempo voltam a recuperar e tamato, o qual funciona como um detector de
até mesmo exacerbar o seu nível de atividade. O coincidências temporais (Snyder e Bredt,
fenômeno da supersensibilidade foi descrito 1992). Quando o nível de despolarização na
como “lei da desnervação” por Cannon e Rosen- membrana pós-sináptica ultrapassa determina-
blueth em 1949 (cf. Pöppel e von Steinbüchel, do limiar, são desencadeadas mudanças alosté-
1992). Junto com a hiperatividade pré-sináptica ricas no receptor NMDA. O receptor NMDA é,
estes mecanismos representam um aspecto da portanto, considerado um detector de coinci-
atividade autopoiética ou auto-Oganizatória do dências, uma vez que só é ativado no momento
sistema nervoso, que como toda matéria viva, em que, simultaneamente, tanto o terminal pré-
tende compensar endogenamente por toda per- sináptico está ativo e liberando neurotransmis-
turbação funcional. A relevância clínica dos sor na fenda sináptica, quanto o terminal pós-
mecanismos de supersensibilidade de desnerva- sináptico exibe atividade suficiente para despo-
ção ou de hiperatividade pré-sináptica é desco- larizar a membrana até um certo limiar.
nhecida. A partir destas modificações na estrutura
(c) Reativação de aferências inativas e/ou preservação tridimensional do receptor NMDA é possibili-
de colaterais tado o influxo de íons cálcio para o citoplasma.
A preservação de colaterais foi descrita O cálcio age como um segundo mensageiro
por Cajal em 1928 (cf. Pöppel e von Steinbü- desencadeando uma cascata de reações quími-
chel, 1992). Tanto a preservação de colaterais cas, as quais regulam a atividade de determina-
quanto a reativação de aferências inativas impli-
32 Neuroplasticidade e reabilitação neuropsicológica
não pode agachar-se para pegar o jornal na porta mente antes da lesão que causou a amputação.
devido a uma hemiplegia, pode servir-se de uma Memória esta que seria preservada em circui-
garra especialmente desenhada que o auxilie tos dedicados à representação do membro am-
nesta tarefa, preservando sua autonomia e inde- putado. A partir destas observações foi sugeri-
pendência funcional. do que a dor poderia ser prevenida através de
Do ponto de vista prático, o mecanismo uma anestesia periférica do membro, imedia-
de reativação de aferências, explorando o prin- tamente antes da amputação (Ramachandran e
cípio da correlação temporal dos padrões de Blakeslee, 2002).
descarga nos terminais pré- e pós-sináptico, é o Os dados disponíveis sobre os mecanis-
que tem sido mais explorado experimentalmen- mos neuroplásticos envolvidos na recuperação
te. Dados clínicos indicam que após amputa- funcional de lesões do sistema nervoso central
ções de partes do corpo, como por exemplo, a indicam, portanto, que a recuperação pode
mama ou o membro superior, ocorrem amplos decorrer tanto de modificações estruturais
processos de remapeamento da representação (regeneração) quanto de mecanismos funcio-
cortical dos órgãos amputados (Aglioti, Corte- nais (reativação de aferentes, substituição fun-
se e Franchini, 1993, Ramachandran, 1993). cional e substituição comportamental). Mu-
Grupos de neurônios que antes eram funcional- danças comportamentais indicam recuperação
mente alocados à representação do membro funcional, mas a reOganização estrutural só
amputado passam, com o tempo, a representar pode ser estudada com métodos neurobiológi-
regiões contíguas do corpo. Desta forma, é cos, como p. ex., a neuro-imagem funcional.
possível observar a eliciação de sensações no
membro fantasma a partir de outras regiões do 3. Variáveis que afetam a recuperação funcional
corpo. Do ponto de vista terapêutico, Rama- O prognóstico quanto à recuperação
chandran e Hirstein (1998) demonstraram que funcional após lesões do sistema nervoso pa-
manipulações indutoras de ilusões ópticas po- rece obedecer a uma lógica perversa denomi-
dem reduzir consideravelmente e persistente- nada de “Princípio de São Mateus” (Günther,
mente as sensações de membro fantasma. Haller, Holzner e Kryspin-Exner, 1997). O
Ramachandran tem procurado explorar prognóstico é indicado pelos recursos disponí-
também as conseqüências destes fenômenos de veis ao indivíduo tanto antes quanto depois da
neuroplasticidade para explicar a dor muitas lesão. Os dados de pesquisa indicam que, de
vezes presente em casos de membro fantasma um modo geral, o sexo feminino, a juventude,
(Ramachandran e Blakeslee, 2002). Os dados o nível educacional, o status sócio-econômico,
disponíveis indicam que apenas o fenômeno de a menor severidade da lesão, a preservação da
remapeamento não parece ser suficiente para capacidade de insight, a ausência de transtor-
explicar o surgimento da dor. Uma observação nos psicopatológicos ou adição a álcool/
clínica relatada por Ramachandran e Blakeslee drogas etc., são todos fatores correlacionados
diz respeito à capacidade de movimentação do
membro fantasma. Muitos pacientes referem Tabela 2. Variáveis que afetam a
que podem mover o membro fantasma, ou que, recuperação funcional
por vezes, o membro se move independente-
Localização da lesão
mente da sua vontade. Em outras ocasiões, o
Extensão e severidade do comprometimento
membro fantasma fica imobilizado, muitas ve- neuropsicológico
zes em posições que causam desconforto. A Etiologia e curso de progressão do processo patológico
sugestão de Ramachandran é de que, nestes últi-
mos casos o membro fantasma pode ter perma- Idade de início
necido imobilizado em um aparelho gessado, Tempo transcorrido desde o início do quadro
antes da amputação funcional. Variações na Oganização cerebral das funções
A hipótese sugerida, portanto, é de que
muitos fenômenos experienciados no caso de Condições ambientais, sócio-demográficas e estilo de
vida
membros fantasmas podem refletir uma memó- Fatores agravantes internos ou externos
ria do estado funcional do membro imediata-
34 Neuroplasticidade e reabilitação neuropsicológica
com melhor êxito após lesão cerebral adquirida espanto, quando é referido sobre experimentos
(e.g., Gauggel, Konrad, Wietasch, 1998, Ker- e trabalhos clínicos evidenciando recuperação
tesz, 1993, Meier, Strauman e Thompson, funcional no caso de hemianopsias causadas
1987). por lesões cerebrais isquêmicas (Zihl e von
Além do conhecimento dos fenômenos Cramon, 1985, 1986). A experiência acumula-
neurobiológicos fundamentais de plasticidade da indica, entretanto, não apenas que isto possí-
neural é preciso levar em consideração também vel, mas também que o prognóstico é muito
algumas variações interindividuais que afetam a mais favorável no caso de crianças do que a-
recuperação funcional após lesões do sistema dultos (Kasten, Schmielau, Behrens-Baumann,
nervoso central (Meier, Strauman e Thompson, Wüst e Sabel, 1997, Werth e Möhrenschläger,
1987). As quais podem ser sistematizadas da 1997). Apesar de estes dados serem bastante
seguinte maneira (vide Tabela 2). animadores, eles indicam que a localização
lesional ainda é um fator a ser considerado na
(a) Localização da lesão
determinação do prognóstico. O comprometi-
A localização lesional é um dos fatores
mento dos lobos frontais é decisivo, como ve-
prognósticos decisivos em neurologia (Irle,
remos a seguir.
1990). Pequenas lesões, situadas em loci críti-
cos podem causar efeitos devastadores, como é (b) Extensão e severidade do comprometimento neu-
o caso de pequenos tumores ou malformações ropsicológico
que obstruam o fluxo liquórico causando hidro- Algumas lesões de crescimento lento
cefalia e hipertensão intracraniana. Por outro podem atingir proporções quase gigantescas
lado, lesões relativamente extensas podem se antes de manifestarem qualquer sintomatologia
desenvolver gradualmente durante anos nas mais nítida, como é o caso dos meningiomas
chamadas “áreas silenciosas”, como é o caso parasagitais frontais (Adams e Victor, 1993).
do lobo frontal direito, quase sem causar sinto- Na maioria dos casos, entretanto, a extensão e
matologia (Adams e Victor, 1993). Luria severidade de comprometimento, associadas à
(1973) acreditava que as lesões corticais primá- localização lesional, constituem um fator cruci-
rias tivessem efeitos mais deletérios na infância al para o prognóstico funcional (Irle, 1990).
do que na idade adulta. Seria o caso, por exem- Wilson (1999) relata diversos casos de amnésia
plo, da cegueira precocemente adquirida. O em que os próprios pacientes conseguiram,
déficit funcional primário acarretaria, através com ajuda da família e da terapeuta, sistemas
de um efeito “bottom-up”, uma indiferenciação compensadores bastante complexos e engenho-
morfofuncional das áreas secundárias e primá- sos que lhes permitem uma vida razoavelmente
rias. Inversamente, as lesões primárias poderi- independente. A implementação das compen-
am ser compensadas “top-down” devido ao sações mnemônicas requer, no entanto, a pre-
desenvolvimento completo e funcionamento servação da capacidade de planejamento e da
mais aperfeiçoado das áreas corticais secundá- motivação. A presença de comprometimentos
rias e terciárias. As lesões de áreas terciárias neuropsicológicos múltiplos, principalmente
acarretariam conseqüências menos drásticas na dos lobos pré-frontais, torna inviáveis os proce-
infância, como parecia ser o caso das afasias dimentos de compensação. Um estudo condu-
adquiridas e mais terríveis para o adulto. Luria zido por Hanks, Rapport, Millis e Deshpande
menciona uma “lei” da corticalização progres- (1999) obteve resultados indicando que o de-
siva das funções para explicar estas suas con- sempenho em testes de funções executivas é
clusões. um importante indicador prognóstico no con-
Estes conceitos estão, entretanto, mudan- texto da reabilitação neuropsicológica.
do. Evidências mais recentes (Rasmussen e Mil-
ner, 1977, Stiles e Thal, 1993, Teuber, 1977) (c) Etiologia e curso de progressão do processo patoló-
indicam que a recuperação das afasias adquiri- gico
das da infância pode, muitas vezes, ocorrer às Evidentemente, é de se esperar que a
custas de um sacrifício das funções viso- etiologia degenerativa e o curso progressivo de
espaciais e comunicacionais não-verbais do he- algumas doenças sejam fatores limitantes quan-
misfério direito. Em muitos círculos ainda causa to às possibilidades de recuperação funcional.
35 V. G. Haase e S. S. Lacerda
Esta verdade, não deve nos induzir, toda- (d) Idade de início
via, ao niilismo terapêutico. Diversas linhas de O princípio de Kennard (1936) anterior-
evidência (e.g., Erhardt e Plattner, 1999) indi- mente mencionado, nos permite formular em
cam que mesmo na doença de Alzheimer há termos gerais que “se você vai ter uma lesão
muita margem de atuação para as intervenções cerebral, seria melhor fazê-la logo”, uma vez
reabilitadoras. Após o diagnóstico, a sobrevida que as possibilidades de recuperação funcional
dos doentes de Alzheimer varia entre 6 a 9 anos. em indivíduos mais jovens são bem melhores.
São descritos três períodos na história natural da Este princípio tem sido questionado (e.g., Kolb
doença: uma fase inicial em que a adaptação e Fantie, 1997), mas mantém-se como regra
psicossocial se mantém em um patamar razoá- geral. Os trabalhos experimentais de Kolb e
vel, uma fase intermediária em que começa a colaboradores (vide Kolb e Fantie, 1997), bem
deterioração comportamental e cognitiva e uma como observações clínicas, sugerem que mui-
fase final, de vida quase vegetativa. Os avanços tos efeitos das lesões pré-frontais precoces po-
reabilitadores ocorridos nos últimos permitem dem passar desapercebidos nos primeiros anos
descrever para as famílias por ocasião do diag- de vida. Algumas alterações cognitivas e com-
nóstico, um panorama mais otimista. Atualmen- portamentais decorrentes de lesões frontais
te, existem evidências empíricas de que os mé- podem se manifestar apenas a partir da idade
todos cognitivos e comportamentais de reabilita- escolar ou até mesmo da adolescência. O prog-
ção permitem postergar o início da fase de dete- nóstico para as lesões precoces pode não ser
rioração, apesar de não mudarem a expectativa tão bom, quanto anteriormente suposto, mas as
de vida (Günther, Haller, Holzner e Krispin- casuísticas clínicas indicam que a idade é um
Exner, 1997). fator decisivo (Stiles, 2000). A idade pode de-
A reabilitação de pacientes portadores de sempenhar um papel também no tipo de sín-
doenças cronicamente progressivas e incapaci- drome neuropsicológica apresentada. A inci-
tantes, tais como a doença de Alzheimer e a Es- dência de afasia de Broca é maior em indiví-
clerose Múltipla, é um dos maiores desafios duos mais jovens, enquanto indivíduos idosos
para a neuropsicologia contemporânea apresentam mais afasia de Wernicke (Basso e
(Thompson, 2000). A natureza progressiva de Pizzamiglio, 1999, Pedersen, JOgensen, Naka-
muitas doenças neurológicas torna remotos ou yama, Raaschou e Olsen, 1995). A afasia de
irreais os objetivos terapêuticos relacionados à Wernicke geralmente apresenta um prognósti-
restituição funcional. Mesmo assim, há razão co mais reservado, o qual se compõe com ou-
para otimismo. Diversos estudos indicam, por tros fatores de risco, tais como a presença de
exemplo, que tanto o treinamento aeróbico para lesões múltiplas e menor nível de escolariza-
reduzir a sintomatologia de fadiga (Petajan, ção.
Gappmaier, White, Spencer, Mino e Hicks, (e) Tempo transcorrido desde o início do quadro
1996), quanto o treinamento cogntivo (Jonsson, Algumas observações recentes citadas por Wil-
Korfitzen, Heftberg, RavnbOg, e Byskov- son (1999) indicam que, em casos excepcionais,
Ottosen, 1993).) podem ser altamente eficazes alguma recuperação funcional pode ocorrer até
na melhoria da qualidade de vida de portadores mesmo anos após a instalação da lesão. A expe-
de Esclerose Múltipla e que em alguns casos é riência prática indica, entretanto, que nos pri-
mesmo possível constatar melhorias objetivas meiros seis meses após a lesão ainda ocorre
na performance cognitiva (Plohmann, Kappos, muita recuperação espontânea e que a reabilita-
Ammann, Thordai, Wittwer, Huber, Bellaiche ção pode ser eficaz no sentido de produzir resti-
e Lechner-Scott, 1998). Mesmo no caso da do- tuição funcional até cerca de dois anos depois
ença de Alzheimer, há evidências quanto à efi- do insulto cerebral (Gauggel, Konrad e Wietas-
cácia, principalmente de intervenções que incor- ch, 1998). A natureza dos problemas enfrenta-
porem conceitos de qualidade de vida e de psi- dos pelos pacientes e pelas famílias muda tam-
cologia da saúde (Günther, Haller, Holzner e bém com o decorrer do tempo (e.g. Gauggel,
Krispin-Exner, 1997, Kasl-Godley e Gatz, Konrad e Wietasch, 1998). Nas fases iniciais,
2000). logo após a instalação de um quadro clínico a-.
36 Neuroplasticidade e reabilitação neuropsicológica
tem no uso de agendas, blocos de anotações, Psychosocial adaptation to disability and its
alarmes, bilhetes, pôsteres e, mais recentemen- investigation among persons with multiple
te, o neuropager. sclerosis. Social Science and Medicine, 44,
A análise clínica cuidadosa dos déficits 1099-1108.
apresentados pelo cliente, de suas característi- Bach, H. (1986). Die Psychologie in der
cas sócio-demográficas e de outras variáveis Rehabilitation behinderter Menschen –
relacionadas ao seu funcionamento cognitivo, Grundlagen, Aufgabenbereiche, Probleme.
psicossocial e recursos disponíveis na comuni- Em K.H. Wiedl (Org.),
dade permite formular um plano individualiza- Rehabilitationspsychologie (pp. 13-32).
do de reabilitação. De um modo geral, as três Stuttgart: Kohlhammer.
estratégias de restituição, substituição e com- Baltes, P. B. (1997). On the incomplete
pensação podem e devem ser empregadas. architecture of human ontogeny. Selection,
Gauggel, Konrad e Wietasch (1998) sublinham optimization, and compensation as
que o terapeuta não pode privar o cliente e sua foundation of developmental theory.
família da esperança de restituição funcional. American Psychologist, 52, 366-380.
Desta forma, Gauggel e cols. preconizam as Bandura, A. (1977). Self-efficacy: toward a
abordagens restituidoras principalmente nas unifying theory of behavioral change.
fases iniciais, logo após a instalação da lesão, Psychological Review, 84, 191-215.
quando os mecanismos restaurativos naturais Barnwell, A.M. e Kavanagh, D. J. (1997).
estão mais ativos. Com o passar do tempo, o Prediction of psychological adjustment in
papel do terapeuta é auxiliar o cliente e sua multiple sclerosis. Social Science e
família na construção de uma avaliação realista Medicine, 45, 411-418.
do perfil de funções comprometidas e preserva- Bartolic, E. I.; Basso, M. R.; Schefft, B. K.;
das. A partir da definição de quais trilhas te- Glauser, T. e Titanic-Schefft, M. (1999).
nham eventualmente se fechado e quais perma- Effects of experimentally-induced emotional
necem viáveis é possível passar para uma se- states on frontal lobe cognitive task
gunda fase no processo reabilitador, em que as performance. Neuropsychologia, 37, 677-
estratégias compensatórias ganham realce, 683.
principalmente pela sua eficácia na melhoria da Basso, A. e Pizzamiglio, L. (1999). Recovery of
qualidade de vida. cerebral functions. Em G. Denes e L.
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cits e de recursos preservados permite o empre- experimental neuropsychology (pp. 849-873).
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sucedido na idade adulta (Baltes, 1997) no con- Cicerone, K. D.; Dahlberg, C.; Kalmar, K.;
texto da reabilitação neuropsicológica. De a- Langebahn, D. M.; Malec, J. F.; Bergquisi,
cordo com o modelo SOC, o cliente pode a- T. F.; Felicetti, T.; Giacino, J. T.; Harley, J.
prender a selecionar as áreas em que é maior o P.; Harrington, D. E.; Herzog, J.; Kneipp,
seu potencial de desenvolvimento, como por S.; Laatsch, L. e Morse, P. A. (2000).
exemplo, a família, ou participação social, con- Evidence-based cognitive rehabilitation:
forme o caso, otimizar o seu funcionamento recommendations for clinical practice.
nestas áreas, e compensar os déficits que ocor- Archives of Physical Medicine and
rem nas áreas de maior prejuízo funcional. Rehabilitation, 81, 1596-1615.
Cotman, C. W. e Berchtold, N. C. (2002).
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40 Neuroplasticidade e reabilitação neuropsicológica