Você está na página 1de 206

SENADO IMPERAL

ANAIS DO SENADO

ANNO DE 1823
LIVRO 4
Annaes do Parlamento Brazileiro
ASSEMBLÉA CONSTITUINTE DO IMPÉRIO DO BRAZIL

Secretaria Especial de Editoração e Publicações - Subsecretaria de Anais do Senado Federal

TRANSCRIÇÃO
1823

ASSEMBLÉA GERAL CONSTITUINTE E LEGISLATIVA DO IMPERIO DO BRAZIL

SESSÃO EM 1 DE AGOSTO DE 1823. 1º Se a materia se dava por discutida. –


Venceu-se que sim.
PRESIDENCIA DO SR. CAMARA. 2º Se estava concluida a 1ª discussão. –
Venceu-se que sim.
Reunidos os Srs. deputados pelas 10 horas da 3º Se passava á 2ª discussão. – Venceu-se
manhã, fez-se a chamada, e acharão-se presentes tambem que sim.
65, faltando por doentes os Srs. Rocha Franco, Passou-se á discussão do regimento da
Pereira da Cunha, Xavier de Carvalho, Ferreira assembléa que tinha sido dado em segundo lugar
Barreto, e Andrada e Silva; e sem ella os Srs. Ribeiropara a ordem do dia; e começou-se pelo art. 102. (1)
Campos e Ribeiro de Andrada. Art. 102. O modo de apoiar cada uma das
O Sr. Presidente declarou aberta a sessão, e alterações é levantar-se depois do secretario acabar
lida a acta da antecedente foi approvada. de a Iêr.
O Sr. Secretario França leu o boletim do O Sr. Ribeiro de Sampaio offereceu a emenda
cirurgião assistente de Sua Magestade o Imperador: seguinte:
Sua Magestade Imperial continua a passar Acabar de a lêr, propondo o presidente o
bem. apoiamento. – Ribeiro de Sampaio.
Paço da imperial quinta da Boa Vista, 1 de Foi apoiada.
Agosto de 1823. – O cirurgião da imperial camara e Depois de algum debate, e julgando-se assaz
assistente a Sua Magestade o Imperador. – discutido, propoz o Sr. presidente:
Domingos Ribeiro dos Guimarães Peixoto. – Foi 1º Se passava o artigo tal qual. – Não passou.
ouvido com muito especial agrado. 2º Se passava com a emenda. – Foi
O Mesmo Sr. Secretario disse que tinha alli os approvado com ella.
diplomas dos Srs. Miguel Calmon du Pin e Almeida, Art. 103. Entre cada uma das tres discussões
e Antonio Calmon du Pin e Almeida. – Forão de qualquer proposta devem mediar, pelo menos,
remettidos á commissão de poderes. tres dias.
Deu tambem parte da offerta que fazia á Foi approvado.
assembléa Renato Pedro Boiret, da traducção do Art. 104. Nas discussões de qualquer proposta
exame critico dos direitos do homem e do cidadão – fallará em primeiro lugar a favor della em geral, ou de
por Bentham, remettendo os precisos exemplares cada artigo em particular, a pessoa que a tiver feito.
para se distribuirem por todos os Srs. deputados. – O Sr. Maia offereceu a emenda seguinte:
Foi recebida a offerta com muito agrado. Nas discussões de qualquer proposta terá
Passou-se á ordem do dia, cuja 1ª parte era o direito
projecto para os Srs. deputados não poderem
durante a deputação exercer outro algum emprego. ––––––––––––––––––
(Veja-se a sessão de 21 de Julho.) (1) No debate sobre os artigos do regimento que se
E como não houvesse quem o combatesse; discutirão nesta sessão pouco ha do que escreveu o
perguntou o Sr. presidente: tachygrapho Possidonio que possa entender-se; e disso
provém a falta de fallas a que outras se referem.
6 Sessão em 1 de Agosto de 1823

de fallar em 1º lugar a pessoa que a tiver feito. – nessas commissões geraes poderá fallar todas as
Maia. vezes que quizer. Isto sustento eu, não por confundir
Foi apoiada. a camara dos communs da Inglaterra com a nossa
O SR. CARNEIRO DE CAMPOS: – O que o assembléa do Brazil, como quiz significar o illustre
illustre preopinante quer é tirar a idéa da obrigação preopinante, o Sr. Montesuma, como se não
de fallar em primeiro lugar, que o artigo indica pela conhecesse a differença; mas só por adoptar uma
fórma em que está concebido; mas isto consegue-se boa doutrina pela sua utilidade, seja ella donde fôr; e
accrescentando a palavra querendo depois de tanto assim que os mesmos nobres deputados desta
fallará. Creio que nada mais se precisa. augusta assembléa negando a necessidade do artigo
Foi approvado com o additamento do Sr. em questão involuntariamente o approvão, quando
Carneiro de Campos, ficando prejudicada a emenda dizem que para conferir-se sobre alguma medida
do Sr. Maia. costumão destacar-se aqui mesmo em conversações
Art. 105. Todos os deputados da assembléa com uns e com outros collegas. Mas isto mesmo
têm direito de fallar a respeito de qualquer proposta prova a necessidade deste artigo, que certamente só
em geral, de cada artigo em particular, e das será preciso em algum caso importante, como é para
alterações que se fizerem. Na primeira e terceira a assembléa instruir a alguma commissão de certas
discussão duas vezes, e na segunda tres vezes. noticias, ou pontos essenciaes, que ella deverá
Ficou adiado por se entrar em duvida sobre o redigir: tal foi o caso do Rio Grande do Sul sobre o
que já se achava vencido a respeito da sua doutrina. novo juramento das tropas, do qual se fez uma
Art. 106. O deputado que quizer explicar sessão secreta, e bem podia ter tambem lugar uma
alguma expressão que se não tenha tomado no seu commissão geral, para fallar-se com mais
verdadeiro sentido, ou produzir um facto familiaridade; e por isso mesmo é que os autores
desconhecido á assembléa, terá faculdade de fallar costumão dizer que é quando a assembléa está em
mais uma vez além das que se lhe concedem no art. conversação. Póde ser que raras vezes aconteça;
105. mas uma só vez que seja preciso basta para nós o
Ficou approvado; sendo regeitada uma adoptarmos.
emenda que lembrára o Sr. Montesuma. Depois do debate (em que nem uma palavra
Art. 107. No debate entre dous opinantes se entendeu do tachygrapho) foi o artigo supprimido.
aquelle que primeiro tiver fallado tem a prioridade na Art. 110. Nas propostas precedidas de
replica; e não se consentirá que outra pessoa entre representações fallará em primeiro e ultimo lugar a
na discussão sem que os dous opinantes (querendo) favor dellas o relator da commissão a cujo exame
tenhão fallado as vezes que lhe é permitido. tiverem sido encarregadas.
Foi approvado. Foi approvado
Art. 108. No fim de cada uma das discussões com o augmento da palavra querendo, como
será permittido ao autor da proposta o fallar mais se fizera no art. 104 com o qual tinha analogia.
uma vez a favor della, querendo. Art. 111. Se no progresso das discussões
Ficou adiado por depender do art. 105. occorrer a um deputado alguma alteração a respeito
Art. 109. Quando porém a assembléa se de qualquer artigo da proposta sobre que se
constituir em acto de commissão geral, o debate será delibera, poderá propôl-a, declarando que se lhe
livre podendo cada deputado fallar as vezes que suscitou naquelle momento, escrevendo-a, e
quizer. entregando-a ao secretario para seguir os termos
O SR. MONTESUMA: – (Não se entendeu o das outras (quando não tiver occorrido na ultima
tachygrapho). discussão).
O SR. GAMA: – Eu tive a honra de ser o Depois de algum debate foi approvado
redactor deste regimento interno: então fiquei mudando-se as palavras entregando-a ao secretario,
convencido, e ainda estou, que a chamada para as seguintes remettendo-a para a mesa.
commissão geral ás vezes é necessaria; por cuja Art. 112. Para serem admittidas as alterações
causa na redacção attendi, não sómente ás que occorrerem na terceira discussão é necessario
doutrinas do nosso Macedo (de quem tiramos a que sejão apoiadas por dez deputados pelo menos.
maior parte dos artigos) mas tambem attendi á Foi approvado.
pratica de outras assembléas da Europa, como é a Art. 113. Em todo o processo da deliberação
da camara dos communs, e a da republica de não se admittiráõ alterações estranhas á questão.
Genebra, que traz Bentham no fim da sua tactica das Foi approvado.
assembléas deliberativas: e julguei que não seria Art. 114. Para votar electivamente sobre as
fóra de proposito ajuntar aqui este artigo, visto alterações (art. 89), o presidente porá a votos,
tratarmos do numero das vezes que deve fallar cada d'entre todas as que se reportarem ao mesmo
deputado, segundo a natureza e ordem das
discussões, declarando-se que
Sessão em 1 de Agosto de 1823 7

objecto, aquellas que tiverem sido mais debatidas. do seu cofre no fim de Junho, para que sendo tudo
Adoptada essa, ficão todas as outras regeitadas. presente á assembléa geral constituinte e legislativa
Não sendo admittida, o presidente porá a votos as deste imperio, se haja de deliberar como parecer
outras, segundo a ordem da maior discussão. mais conveniente.
O SR. GAMA: – As materias, de que falla o Deus guarde a V. Ex. Paço, 1º de Agosto de
artigo, para o Sr. presidente pôr á votos, entendem- 1823. – Manoel Jacintho Nogueira da Gama. – Sr.
se as emendas da mesma natureza e qualidade do Manoel José de Souza França.
objecto em questão, e não todas as emendas que se Remettido tudo á commissão de fazenda.
apresentarem sobre aquelle artigo. O Sr. Gomide offereceu uma indicação para se
Os iIlustres deputados que me têm precedido, mandar regressar o batalhão de milicias da comarca
cuido que querem abranger todas as emendas em do Rio das Velhas que se achava destacado na
geral para dellas escolher-se uma para a votação, e Bahia; e requereu a urgencia que foi apoiada.
por isso apontão os exemplos ao projecto do Sr. O SR. CARNEIRO DE CAMPOS: – Eu não
Pereira da Cunha sobre as leis adoptaveis no Brasil, sou ministro da guerra, mas alguma cousa sei deste
pelas palavras de – ecclesiasticas, e militares etc.– negocio, parece-me que estão dadas as providencias
como emendas mais amplas do que a restricta a este respeito; e por isso julgo desnecessaria a
palavra politicas, mas eu entendo que isto são indicação.
addições, e não emendas por isso que abrangem O SR. ANDRADA MACHADO: – Eu estarei
mais objectos do que a palavra politicos, e não são sempre prompto para lembrar ao governo o
estas certamente as que estão no caso do artigo em cumprimento dos seus deveres quando elle fôr
questão, que falla só das emendas debatidas, e não pouco diligente em os desempenhar; mas como não
das addições. sabemos se neste caso tem sido negligente com
Depois de algum debate, offereceu o Sr. esses milicianos, não vejo necessidade de lhe
Montesuma a seguinte: lembrar o que é da sua obrigação.
Convém ser economico de taes advertencias,
EMENDA isto é, não havendo precisão dellas, pois havendo-a
não quero economia.
1º Proponho que se mudem as palavras que O illustre deputado que fallou antes de mim e
tiverem sido mais debatidas substituindo-se-lhes que deve estar ao facto do negocio, tambem
aquellas que forem mais amplas e depois as menos concorda em que não ha necessidade da indicação;
amplas. portanto quando nos constar que se não derão
2º Proponho igualmente que se supprimão as ordens então trataremos de advertencias.
palavras d'entre as que se reportarem ao mesmo Foi retirada a indicação pelo seu illustre autor.
objecto ficando a oração – porá á votos todas as O SR. MONTESUMA: – Eu offereço á
emendas pertencentes e relativas á materia do artigo consideração da assembléa o que li no Diario do
– O deputado Montesuma. Governo n. 24 de 29 de Julho passado.
Foi apoiada em ambas as partes. E' uma portaria de 31 de Dezembro de 1822
O Sr. Almeida e Albuquerque mandou á mesa que mostra que não temos liberdade de imprensa.
a seguinte emenda: Eu já tinha ouvido dizer a alguns Srs.
Peço a suppressão do artigo. – Albuquerque. deputados que não havia tal liberdade; mas não
Não foi apoiada. entrando na indagação dos motivos da sua asserção,
O Sr. Presidente declarou adiado o artigo pela tomava isto por um dito vago que se referia ao facto
hora. de fallarem só os escriptores que seguem uma certa
O Sr. Secretario França pedio a palavra para especie de doutrinas, como se essas fossem as
lêr um officio do ministro dos negocios da fazenda, approvadas pelo governo, sem comtudo me lembrar
que acabava de receber: que houvesse ordem que coarctasse aquella
Illm. e Exm. Sr. – De ordem de S. M, o liberdade.
Imperador remetto a V. Ex. o officio incluso do Porém agora não posso duvidar, nem esta
governo provisorio da provincia da Bahia, em data de assembléa duvidará, de que ha restricções
17 de Julho do corrente anno, participando ter aberto ordenadas pelo ministerio.
um emprestimo de quatrocentos e quarenta e quatro Eu estou convencido que um Diario do
contos cento cincoenta e sete mil oitocentos Governo deve ser um papel mui circumspecto,
sessenta e sete réis, afiançado e segurado o seu entrando nelle sómente escriptos cujas doutrinas
pagamento aos mutuantes, afim de poder acudir ás sejão analogas á natureza do mesmo governo; mas
necessidades do exercito pacificador. Igualmente nem por isso vejo que possa um ministro de estado
remetto a V. Ex. a demonstração da receita e arrogar-se o direito de inspeccionar e rever a folha,
despeza da thesouraria geral do mesmo exercito, e o para não sahir nella senão o que
balanço
8 Sessão em 1 de Agosto de 1823

elle muito quizer; servindo-se para isso do nome de pela secretaria de estado dos negocios estrangeiros
S. Magestade, que eu estou certo que não quer encarregar ao official da mesma secretaria, Luiz
envolver-se em questões de liberdade de imprensa. Moutinho Lima Alvares e Silva, da inspecção e
Em todos os governos constitucionaes se tem regular revisão das materias que tiverem cabimento
destinado o exame dos abusos desta liberdade a um na mesma folha, no que procederá com o devido
corpo separado; sómente julgão delles os jurados; e zelo, e discreta imparcialidade.
com esta instituição me conformo o mais que é Paço, em 31 de Dezembro de 1822. – José
possivel... Bonifacio de Andrada e Silva.
Lembrei-me pois de apresentar uma indicação O SR. CARNEIRO DE CAMPOS: – Os termos
para que o governo declare os motivos que fizerão em que a portaria está concebida abonão o que
expedir a citada portaria, e se saiba se ella está acabei de dizer.
ainda em vigor, como ha de constar na repartição O Diario do Governo é propriedade da
dos negocios estrangeiros. secretaria dos negocios estrangeiros; e encarregou-
se a um dos officiaes della de rever os artigos para
INDICAÇÃO que não sahissem cousas indignas do titulo que tem
aquella folha; isto não é coarctar a liberdade da
Proponho que se peção ao governo imprensa, é querer a dignidade do Diario; o autor do
informações sobre a portaria de 31 de Dezembro do artigo que se não aceite não fica inhibido de o
anno passado, pela qual se determinou que publicar; ninguem lhe prohibe que o imprima; o que
inspeccionasse e revesse a folha do Diario do se lhe diz simplesmente é – não o queremos inserir
Governo para então ser impressa. – O deputado, no Diario; – e eu creio que isto póde dizer o dono de
Montesuma. qualquer folha sem fazer aggravo á liberdade da
O SR. CARNEIRO DE CAMPOS: – A portaria imprensa.
não foi expedida por mim, mas pelo meu antecessor; O SR. FRANÇA: – Opponho-me á indicação,
e parece-me que o illustre deputado não tem razão essa folha chamada Diario do Governo é um
alguma de dizer que com ella se coarctou a liberdade periodico da propriedade dos officiaes da secretaria
da imprensa. de estado dos negocios estrangeiros e guerra; elles
Haver um revisor para que não entrem na como autores, ou como proprietarios da folha, gozão
folha artigos indecorosos, não é coarctar a liberdade do direito da liberdade de imprensa: se querem
de imprimir; e talvez se houvesse mais escrupulo na porém ceder desse direito, e sugeitar-se a uma
escolha das materias se terião evitado injustas indevida revisão da sua folha, embora seja ella
imputações ao governo, suppondo-se, pelo que tem revista por quem o ministro quizer. Isso são
apparecido no Diario, que elle favorece certos convenções que nos não importão.
principios, como eu já aqui disse quando se tratou do Importar-nos-ha se o ministro abusando da
attentado da tropa de Porto-Alegre. sua autoridade lhes agrilhoar essa liberdade, e elles
Se um escriptor remette qualquer artigo ao usarem do direito de petição contra tão despotico
redactor do Diario do Governo, e este lhe responde procedimento; então pronunciaremos no caso como
que o não publica, nenhum ataque se faz nisto á a questão o pedir; por ora não ha que providenciar.
liberdade de imprensa, porque o escriptor póde O SR. ANDRADA MACHADO: – (Não se
publical-o em outra folha, ou imprimil-o em separado; entendeu o tachygrapho.)
do contrario se seguiria a obrigação de inserir Julgou-se afinal a materia discutida; e posta á
naquelle jornal quantas cartas de descomposturas se votação foi regeitada.
lhe remettessem, e quaesquer outros artigos O Sr. Presidente assignou para a ordem do
indecentes; o que me parece que ninguem julgará dia: 1º, a eleição da mesa: 2º a 1ª discussão do
que seja justo. projecto da lei sobre a revogação da provisão da
Portanto entendo que a dita revisão se mesa da consciencia e ordens de 28 de Dezembro
estabeleceu para não passar artigo que não fosse de 1754: 3º, regimento da assembléa.
decente; e isto me parece indispensavel Levantou-se a sessão ás 2 horas da tarde. –
principalmente entendendo-se em geral que o Diario José Ricardo da Costa Aguiar de Andrada,
do Governo é a gazeta ministerial, ainda que secretario.
realmente o não seja.
O SR. MONTESUMA: – Eu requeiro a leitura RESOLUÇÕES DA ASSEMBLÉA
da portaria para desenganar o illustre deputado.
O Sr. Secretario França leu a portaria PARA JOAQUIM GONÇALVES LEDO
concebida nestes termos.
Convido que o Diario do Governo que ora vai A assembléa geral constituinte e legislativa
publicar-se nesta côrte se faça digno do governo e
do publico: manda S. M. o Imperador,
Sessão em 2 de Agosto de 1823 9

do imperio do Brazil manda participar a V. S. que de Santo Amaro e Ribeiro de Andrada, o 1º com 18
achando-se legal o seu diploma póde vir tomar parte votos e o 2º com 9; e entrando por isso em 2º
nos trabalhos da mesma assembléa, como deputado escrutinio sahio eleito o Sr. barão de Santo Amaro
pela provincia do Rio de Janeiro, uma vez que, em com a pluralidade absoluta, de 33 votos.
conformidade das instrucções de 19 de Junho de Passou-se finalmente á eleição dos
1822, se mostre sem crime que o inhiba de ter secretarios, e sahirão eleitos para effectivos os Srs.
assento neste augusto congresso, visto que no seu França e Costa Aguiar com 39 votos: Fernandes
proprio requerimento confessa ter sido obrigado a Pinheiro com 32: Carvalho e Mello com 23: e para
retirar-se desta cidade por motivos politicos. Deus supplentes os Srs. Maia com 21 e Muniz Tavares
guarde a V. S. – Paço da assembléa, em o 1º de com 19.
Agosto de 1823. – Manoel José de Souza França. Como os Srs. França e Costa Aguiar tinhão
obtido igual numero de votos, consultou-se á sorte, e
SESSÃO EM 2 DE AGOSTO DE 1823 ficou para 1º secretario o Sr. Costa Aguiar e o Sr.
França para 2º.
PRESIDENCIA DO SR. CAMARA. O SR. FRANÇA: – Eu requeiro que a
assembléa tome em consideração que eu sirvo
Reunidos os Srs. deputados pelas 10 horas da desde as sessões preparatorias, e que me acho até
manhã fez-se a chamada, e acharão-se presentes incommodado, para que haja de dispensar-me deste
66, faltando por doentes os Srs. Pereira da Cunha, lugar onde creio que tenho assaz trabalhado.
Xavier de Carvalho, Ferreira Barreto, Andrada e O SR. COSTA AGUIAR: – Se a assembléa
Silva, Cruz Gouvêa e Alvares da Silva. dispensar o Sr. França, requeiro que me dispense a
O Sr. Presidente declarou aberta a sessão, e mim tambem, porque tenho soffrido o mesmo
lida a acta da antecedente foi approvada. incommodo.
O Sr. Secretario França leu o seguinte officio O SR. ANDRADA MACHADO: – Nenhum dos
do thesoureiro mór do thesouro publico: senhores deve ser dispensado; o que é reeleito torna
Illm. e Exm. Sr. – Tendo feito alguns trabalhos a servir; o que provavelmente succederá é haver
em materias de impostos, pertencentes á fazenda attenção ao que se allega, na seguinte eleição para
publica, e fazendo imprimir parte delles, vou se não votar no Sr. França; mas por esta vez tenha
offerecer os exemplares juntos á consideração da paciencia, ha de servir; a lei assim o manda.
augusta assembléa deste imperio, afim de que se O SR. COSTA AGUIAR: – Eu não me escuso,
possa providenciar por meio de competente mas digo que se o Sr. França fôr dispensado,
legislação, que requerem os differentes objectos de tambem eu o devo ser porque estou nas mesmas
que trato, ao augmento da renda publica sem circumstancias.
vexame dos contribuintes, ou pelo menos para se O SR. FRANÇA: – Eu creio que não são as
haver maior renda, e menor vexame. Se a illustre mesmas; porque sirvo desde a abertura da
commissão que examinar o meu trabalho exigir assembléa, e soffri eu só todo o trabalho por um
qualquer ulterior esclarecimento, ou solução de mez; além disto não sei porque não ha de correr este
duvida, prestar-me-hei á cooperação necessaria para serviço por todos em lugar de carregar sobre um só;
esse effeito, como cidadão zeloso da publica parece-me isto falta de justiça; e eu espero que se a
prosperidade. assembléa tomar o que digo em consideração me
Deus guarde a V. Ex. Rio de Janeiro, 2 de dispensará do serviço de um lugar que nem posso
Agosto de 1823 . – lllm. e Exm. Sr. presidente da bem satisfazer por incommodado.
assembléa geral legislativa e constituinte do imperio Emfim, como eu faço este requerimento,
do Brazil. – O thesoureiro mór do thesouro publico, queira V. Ex. pôr á votação para a assembléa
José Caetano Gomes. resolver.
Foi recebido com particular agrado, O Sr. Presidente propôz o que o nobre
remettendo-se á commissão de fazenda os deputado tinha requerido; e venceu-se que
exemplares offerecidos. continuasse a servir.
Passou-se á nomeação da mesa, e Entrou-se, segundo a ordem do dia, na 1ª
principiando pela eleição do presidente obtiverão os discussão do projecto de lei para a revogação da
Srs. barão de Santo Amaro e bispo capellão-mór a provisão da mesa da consciencia e ordens de 28 de
maioria relativa de votos; o 1º com 16 e o 2º com 10; Dezembro de 1754, que fôra apresentado na sessão
pelo que entrarão em 2º escrutinio, e sahio eleito o de 9 de Julho.
Sr. bispo capellão-mór com a pluralidade absoluta de O SR. CARVALHO E MELLO: – Sr.
32 votos. presidente, o projecto que se apresenta hoje á
Seguio-se a eleição de vice-presidente, e discussão contém materia vasta e importante.
obtiverão a pluralidade relativa os Srs. barão Pretende-se
10 Sessão em 2 de Agosto de 1832

nelle reformar uma parte das providencias decretadas Verdade é, que muitos abusos se têm
no regimento da provedoria dos ausentes. introduzido, que muitas fraudes, e até, por desgraça,
Neste celebre regimento se estabelecerão roubos se têm praticado, pelos mesmos a cujo cargo
peculiar e especialmente determinações mui positivas e estava a honra e a probidade de bem executar o que
circumstanciadas afim de prevenir extravios, e acautelar lhes era incumbido pela lei.
a segurança dos cabedaes dos ausentes, e, por Mas devemo-nos admirar que assim
conseguinte, os direitos de propriedade. acontecesse? Não é esta a marcha das cousas
Mui justo era que aquelles a quem tocavão humanas? Qual foi ainda a lei que apenas promulgada
heranças, e não podião pela sua ausencia apossar-se não desse lugar á fraude e dolo, e até á maldade, não
dellas, fossem soccorridos com todos os meios legaes, só de a não executar, mas ainda de postergal-a?
que afastassem a delapidação e prejuizos E por ventura, Sr. presidente, autorisarão estes
occasionados, umas vezes pelo desleixo, e outras pela motivos a ser logo por isso revogada e cassada a lei?
voracidade e má fé daquelles a quem incumbia a Não, por certo.
arrecadação, administração e guarda de taes heranças. Sou eu o primeiro convencido de que se devem
Mui justo era, torno a dizer, que se acautelassem derogar muitas das cousas que estão neste regimento,
e firmassem os direitos de propriedade de subditos, que injustas e ainda inuteis, pela differença das
por sua ausencia merecião muito mais a protecção das circumstancias e tempo; direi mesmo, que estando
leis, ou elles fossem herdeiros nomeados por separado este imperio de Portugal, e não sendo por
testamento, ou por successão legitima, e até para que isso nem tantas as heranças, nem tanto o cabedal
não ficassem abandonados os bens á sorte dos arrecadado, nem sendo necessario remettel-o, pois que
desamparados, e porque muito convém á ordem e a este imperio viráõ ou mandaráõ receber os herdeiros
regularidade da sociedade que não estejão jámais os de Portugal o que lhes competir, convém mesmo que
dominios incertos, sendo este o primordial motivo por se acabe com este juizo particular dos ausentes, mal
que se estabeleceu em geral a ordem das successões acreditado, desautorisado pela opinião publica, e
legitimas. Era além disto necessario acautelar todos os marcado com o ferrete de má e fraudulenta
casos, que por qualquer maneira pudessem damnar os administração.
interesses dos ausentes; por este justo motivo, em Por isso, porém, não direi jámais que desde já se
todas as legislações, em todos os codigos das nações mettão a derribar um edificio alçado pelas da
polidas ha providencias estabelecidas para arrecadar e necessidade e utilidade, e menos que se lance por terra
administrar heranças jacentes, e os bens que por morte sem acautelar que a sua queda, esmagando muitos
de algum possuidor tocão a herdeiros que estão fóra do interesses, semêe o chão de ruinas, sem estarem
lugar onde elles existem. erguidas as providencias que devem substituil-o.
Entre nós ha a providencia geral, para este fim Os autores deste projecto tiverão em vista
decretada na ordenação, onde se encontra o que é de revogar aquella parte prejudicial, dizem elles, aos
direito necessario para se acautelar quanto fica credores de dividas, que pela antiga provisão de 1754
recontado. se não podião pagar, sem ir demandar os herdeiros,
Foi, porém, necessario formar um regimento observando nesta determinação muita injustiça contra o
peculiar, porque sendo a maior parte dos povoadores direito dos credores, e até contra a utilidade que
deste vasto continente nascidos em Portugal, onde provém ao publico de não estarem empatados os
existião pela maior parte os seus herdeiros, e sendo cabedaes, a maior parte dos quaes, por pertencerem a
mui grandes os cabedaes que amontoavão, por effeito proprietarios de Portugal, estão em sequestro.
de sua industria e comercio, os quaes por sua morte Mas não ha tambem injustiça da parte dos
devião ser arrecadados e remettidos a seus herdeiros, devedores?
começarão a não ser bastantes as providencias geraes Não devem estes ser ouvidos para allegarem os
estabelecidas na lei, e a recrescerem fraudes e motivos que tiverem para serem desobrigados?
descaminhos, que motivarão a necessidade do Não consiste a pratica da justiça universal em ser
regimento mais largo o mais explicito. Nelle se igual para todos?
encontrão judiciosas providencias, que ainda depois se Não é uma das principaes garantias do direito de
forão augmentando, á proporção que os encarregados propriedade o não ser condemnado sem ser ouvido?
da sua execução fizerão ver que cumpria dar novas A formula dos processos não é uma garantia do
decisões, ou declarações das que já existião. direito de propriedade, segundo disse o sabio
Quem as lê com os olhos limpos de prevenções Montesquieu?
encontra a cada passo medidas justas e sabias para Sr. presidente, sejamos justos. O legislador
estabelecer certeza na arrecadação, exacta fiscalização nunca é parcial em suas vistas; ajunta, sim, a utilidade
da guarda, remessa e entrega dos cabedaes a seus com a justiça, mas esta é geral para todos: tanto direito
legitimos donos. tem para ser protegido o
Sessão em 2 de Agosto de 1823 11

credor, como o devedor; aos olhos da lei os direitos de o requerimento de Manoel José Fernandes, Luiz
todos são iguaes para serem attendidos. Fernandes, José Francisco da Quinta e Marianna das
Um herdeiro é obrigado ás dividas daquelle de Neves, em que pedem á esta assembléa que mande
quem lhe vem a herança, mas é preciso para as pagar, subir á sua presença quatro autos de assignação de
que, ou as confesse, ou seja condemnado, depois de dez dias, em que os supplicantes são autores, os quaes
ser ouvido e convencido. por chicanas dos escrivães se têm demorado por
Por todos estes ponderosos motivos não deve tal espaço de dous annos: é de parecer que não compete
projecto passar á segunda discussão, porque tem por a esta assembléa o conhecimento deste objecto, sem
base a utilidade dos credores sem attender à justiça que as partes tenhão procurado os recursos ordinários
dos devedores. – Paço da assembléa, 1 de Agosto de 1823. – D.Nuno
Usem os credores do seu direito pelo meio da lei; Eugenio de Locio. – José Teixeira da Fonseca
citem-se os devedores por cartas precatorias, no caso Vasconcellos. – Estevão Ribeiro de Rezende. – Lucio
de se saber o lugar da sua existencia, ou por editos, no Soares. Teixeira de Gouvêa.
caso contrario, como é determinado na lei. Assim se Foi approvado
attende á justiça; assim se guarda a lei existente; e mui O Sr. Montesuma pedio a palavra e mandou á
digno é desta assembléa um procedimento tão regular. mesa a seguinte:
Quando fôr tempo, quando estiver já constituido este
imperio, quando estiver consolidado e puder haver lugar INDICAÇÃO
a legislação particular, com mão prudente e amestrada
se revogará inteiramente o regimento dos ausentes, Proponho que se chamem para tomar assento
substituindo-lhe immediatamente providencias nesta assembléa, pela provincia da Bahia, todos os Srs.
analogas, que mantenhão os rectos desse edificio deputados supplentes por aquella provincia, e que se
collosal prostrado, e dêm outras judiciosas e sabias, achão aqui residentes até completar o numero de onze.
que acautelem os descaminhos, arraiguem a – O deputado Montesuma.
arrecadação e administração de bens de ausentes, e Depois de curta discussão, resolveu-se que
firmem e segurem os direitos de propriedade. fosse a indicação remettida á commissão de poderes
O SR. GONDIM: – (Não o ouvio o tachygrapho.) para dar sem demora o seu parecer, vista a natureza da
O Sr. Presidente declarou adiada a discussão materia e a necessidade de completar-se a
por ter dado a hora da leitura dos pareceres de representação da dita provincia.
commissões. A commissão retirou-se para ordenar o parecer.
O Sr. Ribeiro de Rezende, como relator da O Sr. Teixeira de Vasconcellos, como relator da
commissão de poderes, leu o seguinte: commissão de saude publica leu o seguinte:

PARECER PROJECTO DE LEI

A commissão dos poderes examinando os A assembléa geral constituinte e legislativa


diplomas dos Srs. João Severiano Maciel da Costa, decreta:
deputado pela provincia de Minas Geraes, Miguel 1º O director da academia medico-cirurgica
Calmon du Pin e Almeida, deputado pela provincia da mandará passar cartas aos alumnos, depois de feitos
Bahia,.e Antonio Calmon du Pin e Almeida, que tem o os ultimos exames do quinto anno, verificando-se por
primeiro lugar na ordem dos supplentes, e que se elles o complemento do curso academico.
apresenta para substituir o deputado ausente Felisberto 2º Serão passadas e subscriptas as cartas pelo
Caldeira Brant Pontes, e combinando os referidos secretario, assignadas pelo director e selladas com o
diplomas com as actas geraes das mencionadas sello academico.
provincias os acha conformes com o decreto e 3º Com esta carta, e sem dependencia de outro
instrucções de 3 e 19 de Junho de 1822: é de parecer algum exame, poderá cada alumno exercitar a praxe
que os mesmos deputados e supplente tomem assento medico-cirurgica neste imperio. – Paço da assembléa,
nesta assembléa. – Paço da assembléa, 2 de Agosto 31 de Julho de 1823. – Como relator, José Teixeira da
de 1823. – Estevão Ribeiro de Rezende. – Manoel Fonseca Vasconcellos.
Jacintho Nogueira da Gama. – Antonio Carlos Ribeiro Ficou para 2ª leitura.
do Andrada Machado e Silva. O SR. RIBEIRO CAMPOS: – Sr. presidente,
Foi approvado. cousa alguma parece mais injusta, e até barbara, do
O Sr. Lopes Gama, como relator da de petições, que deixar em desgraça, não digo uma villa, ou um
leu tambem seguinte: pequeno povo, mas ainda um cidadão qualquer,
consentindo que soffra os males que necessariamente
PARECER traz comsigo a falta de protecção das leis, cujo benigno
influxo deve igualmente
A commissão de petições examinando
attentamente
12 Sessão em 2 de Agosto de 1823

ser derramado por todos os que tacita ou em circumstancias taes que, julgando que os
expressamente se ligarão para constituir a nação deputados que sahissem daquella comarca e que
brazileira; e se este quasi axioma é verdadeiro, tivessem presenciado todos os seus absurdos havião
relativamente a um individuo, o que deverá ser fallar, e que por isso lhes acontecia algum damno,
relativamente a muitos, relativamente a milhares? assentarão que deverão matar a todos os deputados
A sociedade, Sr. presidente, é ou funda-se em que de lá sahissem e deu principio a essa desgraça
um contracto; e eu não entendo contractos sem pelo ex-deputado nas côrtes de Lisbôa Manoel Felix
reciprocidade de interesses: quem presta commodos de Veras que na vespera da sua sahida o atacarão
deve gozar de commodos; soffrer tão sómente publicamente, que o deixarão por morto!
incommodos quem presta commodos é barbara E o mesmo me ia acontecendo se eu já não
cousa. estivesse álerta.
Deixar que no seio do Brazil, no meio da O governo de Pernambuco está ao facto de
massa social, exista uma porção de povo no estado tudo isto, porque os corregedores daquella comarca
de barbaridade, é rematado desatino… Mas, não lhes têm participado tudo e até lhe têm remettido as
amontoarei principios e provas, onde são culpas daquelles homens e pedido providencias.
desnecessarios argumentos. Eu mesmo lhes instei agora quanto foi possivel
A villa de Pajeú de Flôres, e todo o povo da para darem algumas providencias áquelles
comarca do sertão de Pernambuco apresentão hoje desgraçados povos: porém o governo diz que não
o quadro que acabei de esboçar; eu sou seu sabe o que ha de fazer e eu concordo nisso, porque
representante, e por isso seria imperdoavel minha aquelles homens são as unicas autoridades que ha
incuria se os deixasse no estado de abandono em naquelles sertões, que para os prender é preciso
que existem. Alli não ha leis, Sr. presidente, ou não mandarem uma grande tropa de linha não só sujeita
vingão; alli reina tão sómente o capricho de alguns a muitas desordens, como a um transtorno de uma
mandões, capitães-móres e ;juizes ordinarios, que viagem de mais de cem leguas pelo centro; e se os
atropellão os mais sagrados direitos dos cidadãos manda chamar politicamente como ha pouco
pacificos daquelle paiz, e até com mortes, roubos e aconteceu para ver se dão com elles na praça, elles
assassinios, como tem feito e está fazendo o cá não vêm, porque andão desconfiados; e
capittão-mór Joaquim Nunes de Magalhães e seus finalmente continuão com os mesmos procedimentos
filhos, o sargento-mór Sebastião José Nunes de e o desgraçado povo é quem padece.
Magalhães, João Luiz Nunes de Magalhães e outros, Aquella porção de povo, pois, Sr. presidente,
reunidos com alguns de seus parentes, homens vive no estado de barbaridade no centro da
todos rusticos e malvados, que diariamente sociedade que queremos felicitar: elle concorre com
commettem naquelles desgraçados sertões os mais os rendimentos, producto de seu suor, para a
tremendos e escandalosos delictos, já matando e felicidade da nação por meio de dízimos e outros
roubando a uns, como fizerão ao capitão Manoel muitos tributos e nenhuma utilidade lhe reverte em
Lopes Barros que publicamente o arrancarão dos troco de seus sacrificios e dos commodos que
braços de sua esposa e filhos, e rigorosamente lhe prestão.
derão a morte e roubarão; e da mesma fórma o Emfim, Sr. presidente, são escravos e
praticarão com o capitão Joaquim Ferreira Rabello e escravos de uns poucos de homens barbaros; e se
Luiz Carlos de tal, e a outros muitos, que todo o os deixarmos nesse estado poderemos nós neste
tempo seria pouco para expôr. augusto recinto fallar em liberdade?
O corregedor alli, unica autoridade que podia Não, Sr. presidente, este sagrado nome não
obstar a semelhantes procedimentos, não tem deve aqui ser proferido emquanto existir entre nós
forças, e se o quer fazer por via do crime, incorre na um só escravo.
mesma pena de assassinio como ia acontecendo Para evitar pois tantos males, Sr. presidente, o
com o honrado ministro Thomaz Antonio Maciel unico meio que ha é crearem-se naquelles sertões
Monteiro, que querendo proceder como procedeu a algumas autoridades; e para isso mando á mesa
algumas devassas contra semelhantes homens, foi este projecto e depois de lido instarei pela urgencia:
necessario retirar-se para o fim da comarca em
distancia de mais de 50 leguas e de lá mandar PROJECTO DE LEI
occultamente chamar testemunhas para os ditos
procedimentos em que sahirão todos criminosos; A assembléa geral constituinte e legislativa do
elles apenas souberão que aquelle ministro estava imperio do Brasil decreta:
procedendo contra elles, disserão publicamente que 1º Haverá na comarca do sertão de
o mandavão assassinar, de sorte que sendo o dito Pernambuco um commandante militar da nomeação
ministro avisado no mesmo instante retirou-se da do imperador, que execute na dita comarca as
comarca para Pernambuco e lá mais não voltou até o ordens do governo da provincia e organise
presente.
Finalmente, Sr. presidente, estão estes
homens
Sessão em 2 de Agosto de 1823 13

alli tropas milicianas e de 1ª linha, se fôr preciso, 1º Todo o estrangeiro que d'ora em diante se
para todo o tempo auxiliar as autoridades civis; cujo quizer estabelecer no territorio do imperio e gozar
commandante terá sua residencia na villa de Pajeú dos fóros e garantias de cidadão brazileiro poderá
de Flôres, cabeça da mesma comarca. obter do poder executivo a competente carta de
2º Haverá na mesma villa de Flôres um juiz de naturalisação.
fóra letrado. 2º Esta carta comtudo o não habilita para os
3º Erigir-se-ha uma villa no julgado de empregos e honras do imperio, sem que pela
Tacaratú, outra no julgado de Cabrobó e um julgado constituição seja marcado o tempo da necessaria e
no arraial do Exú. não interrompida residencia neste imperio.
Paço da assembléa, 2 de Agosto de 1823, 2º 3º Debaixo da palavra estrangeiro se
da independencia e do imperio. – O deputado, comprehende não só todo o portuguez que até a
Antonio Ribeiro Campos. data deste se não achar estabelecido no Brazil, mas
O Sr. Presidente propoz a urgencia porque a os que tiverem emigrado para não adherirem á
requereu o illustre autor do projecto; e sendo apoiadasagrada causa da nossa independencia.
e afinal vencida, fez-se 2ª leitura e resolveu-se que Paço da assembléa, 2 de Agosto de 1823. – O
fosse remettido á commissão de estatistica para lhe deputado, Henriques de Rezende.
accrescentar o que conviesse á mesma materia. O Sr. Presidente propoz a urgencia. – Foi
O SR. HENRIQUES DE REZENDE: – Uma apoiada.
nação que se constitue, uma nação nova collocada O SR. ANDRADA MACHADO: – Não vejo
como a nação brazileira em um territorio immenso, precisão alguma de se fazer uma lei.
com mais de mil leguas de costa e um fundo Já se sabe que é estrangeiro todo o portuguez
indefinido, onde a natureza prodigamente ostenta um que entrar de novo e tambem o que tiver entrado
apparato da mais pomposa e magnifica vegetação e depois da declaração da nossa independencia;
uma riqueza inexhaurivel no reino mineral, seria a quanto aos requisitos da naturalisação a constituição
mais feliz nação do mundo, quando lhe não o decidirá em mui breve tempo; e pelo que pertence
faltassem os braços para pôr em acção tantos á dar-se ao executivo o poder de naturalisar, digo
recursos. que disso Deus nos livre e nos guarde: nós e mais
Mas, Sr. presidente, de que nos serve tanta ninguem. Voto portanto contra a urgencia.
vegetação, tantas riquezas em minas, se tão vasto O SR. CARNEIRO: – Sou da mesma opinião e
continente é pobremente matizado por uma serei sempre de parecer que se não trate do que faz
população apenas de quatro ou cinco milhões de objecto de artigos constitucionaes.
habitantes; e essa toda heterogenea e pela maior A constituição está a sahir e não convém
parte escrava? legislar provisoriamente sobre materias que ella ha
de estabelecer definitivamente. Voto por isso contra
E’ pois preciso franquear o nosso territorio, a
nossa riqueza e abrir os nossos braços a todo o a urgencia.
estrangeiro, que se quizer estabelecer entre nós, e O SR. VERGUEIRO: – Voto igualmente contra
prestar-lhe toda a segurança e garantia e todas as a urgencia.
nossas vantagens, afim de fazer crescer a nossa Convenho na necessidade que ha de
população. procurarmos por todos os meios augmentar a nossa
Mas, Sr. presidente, será justo que uns população: mas devemos partir deste principio:
novamente vindos, outros que nos abandonarão para estrangeiros bons não vêm cá emquanto não
ir em seguimento do engodo de uma côrte velha e tivermos constituição (apoiados); depois que a
corrompida, outros que emigrarão para não adherir á fizermos, se elles virem que lhes garante os seus
sagrada causa da nossa independencia, e que forão direitos individuaes, com pouco mais que se lhes
fazer-nos de longe a mais crua guerra, venhão agora prometta elles viráõ.
occupar no Brazil as honras e os empregos, em O SR. HENRIQUES DE REZENDE: – Estava
detrimento daquelles que cá ficarão, que trabalharão bem persuadido da necessidade deste projecto
e que concorrerão todos os riscos da nossa luta? quando o formei; e apezar do que se tem dito ainda
Talvez. Sim, talvez, porque não sei que o prohiba. insisto em que elle seja admittido.
E’ pois debaixo desta consideração que eu Não vejo fundamento solido ao inconveniente
concebi um projecto de decreto, que mando á mesa. que ouço dizer que ha em dar o governo essas
Se elle merecer a consideração da assembléa cartas, uma vez que seja para isso autorisado por lei.
requeiro urgencia mesmo do regimento. Sr. presidente, eu julgo necessaria este
projecto; ha mui pouco tempo que proclamamos a
PROJECTO nossa independencia e ainda ha gente que não está
a isto acostumada; ainda pelo habito pensão que
A assembléa geral constituinte e legislativa do Portugal e o Brazil não são nações distinctas.
imperio do Brazil decreta provisoriamente o seguinte:
14 Sessão em 2 de Agosto de 1823

Ha mesmo muita gente que estava aqui PARECER


estabelecida com bens e que emigrou; e que
mudadas as cousas em Portugal hão de querer para A commissão de fazenda examinando o
cá tornar e para os mesmos lugares, o que é tanto requerimento de Joaquim José Gomes da Silva e
mais facil succeder por não haver lei que o prohiba. Castro sobre a arrematação do contracto das sizas
Portanto ainda insisto que seja admittido o projecto. da villa de Campos arrematado pela junta da fazenda
O SR. ANDRADA MACHADO: – E eu da provincia do Espirito-Santo e não encontrando
continúo na minha opinião, que não ha necessidade materia nova que faça mudar a sua opinião, confirma
de tal lei: basta a de direito publico. o seu parecer dado á dezesete do mez ultimo no
Os portuguezes desde o acto da nossa requerimento de Manoel dos Santos Pereira e
independencia são estrangeiros e até estrangeiros outros.
inimigos; se o poder executivo cahir no absurdo de Paço da assembléa, 1º de Agosto de 1823. –
os empregar, é da nossa obrigação denuncial-o á José de Rezende Costa. – José Arouche de Toledo
esta assembléa; mas nada de pôr em questão esta Rendon. – Manoel Jacintho Nogueira da Gama. –
materia; isto é ponto decidido… O Brazil declarou-se Barão de Santo Amaro.
nação independente; nós havemos de conservar-lhe Por haver quem fallasse contra o parecer,
a independencia a despeito de qualquer poder ficou adiado.
injusto e barbaro que nos queira violentar. O SR. CARNEIRO DA CUNHA: – Parece
O SR. CARNEIRO DA CUNHA: – Eu apoiei a espantoso que depois de ter a nação brazileira
urgencia para que discutida ella se firmasse bem a declarado solemnemente a sua independencia ainda
opinião da assembléa; mas no mais concordo em se pretenda insinuar duvidas sobre esta declaração
tudo com os nobres deputados que têm fallado principalmente em escriptos publicos! Todavia nada
contra aquella urgencia. ha mais certo.
O Sr. Presidente propoz a urgencia á votação. No Diario do Governo se publicou hontem
– Foi rejeitada e ficou o projecto para 2ª leitura. debaixo do artigo noticias nacionaes uma
Entrarão neste tempo na sala os membros da proclamação do rei de Portugal como se elle ainda
commissão de poderes que se tinhão retirado para dominasse no Brazil.
formar o seu parecer sobre a indicação do Sr. Talvez pareça isto a alguns escrupulo de mais,
Montesuma; e o Sr. Ribeiro de Rezende, como mas eu estou persuadido que é necessario
relator da mesma commissão, leu o seguinte: manifestar muito claramente que não temos ligação
alguma com Portugal desde que nos separamos e
PARECER que será eterna a nossa separação (apoiados) e que
não admittimos que pessoa alguma tenha nem se
A commissão dos poderes revendo a acta quer a lembrança de dar a suspeitar o contrario.
geral das eleições dos deputados á esta assembléa (Muitos apoiados.)
pela provincia da Bahia, acha, que para encher a Por estes principios eu vi com espanto que um
representação daquella provincia faltão ainda os artigo privativo de Portugal se inserisse com o titulo
dous deputados ausentes Cypriano José Barata de de noticias nacionaes como se este paiz fizesse
Almeida e Francisco Agostinho Gomes, e que parte daquelle reino e formassemos com os seus
achando-se nesta cidade os supplentes José da filhos uma só nação.
Silva Lisboa e Luiz Pedreira do Couto Ferraz, aquelle Isto não poderia consentir-se em qualquer
nomeado em 4º lugar e este em 9º lugar: é de escripto particular, mas muito menos no Diario do
parecer que emquanto não chegão os deputados Governo, pois não me admirará que nas provincias
proprietarios, sejão chamados a tomar assento na se tome esta classificação de noticias, não pela
mesma assembléa os dous supplentes, visto que expressão do modo de pensar de um individuo, mas
não ha nenhum outro nesta côrte, que os prefira em da intenção do governo por se lêr naquella folha.
numero de votos. Peço portanto que a assembléa tome isto em
Paço da assembléa, 2 de Agosto de 1823. – consideração até para justificação do governo que
Estevão Ribeiro de Rezende. – Antonio Carlos estou certo não tem parte alguma no negocio. Eu
Ribeiro de Andrada Machado e Silva. – Manoel tenho aqui o Diario queira V. Ex. mandal-o buscar
Jacintho Nogueira da Gama. para a mesa.
Foi approvado O SR. FRANÇA: – Qualquer que seja a
O Sr. Ribeiro de Andrada leu tambem o intenção do nobre deputado deve por causa da
seguinte parecer da commissão de fazenda: ordem remetter á mesa uma indicação; e a
assembléa decidirá do seu destino.
O SR. CARNEIRO: – Primeiro que tudo
examinemos se ha materia em que recaia indicação.
O illustre deputado diz que se acha uma
proclamação do rei de Portugal no artigo de –
noticias nacionaes; – será bom que se veja isso.
Sessão em 2 de Agosto de 1823 15

O SR. ANDRADA MACHADO: – Vem na Usar do termo el-rei, não póde ser mais que
columna de noticias nacionaes actos do governo de um lapso de penna; além de que nós dizemos muitas
Portugal que não é parte da nossa nação, e por isso vezes – el-rei de Napoles, el-rei de Hespanha; –
deverião ter lugar na columna das notícias emfim eu não cuido que nisto haja maldade, nem me
estrangeiras; mas como vem acompanhado com parece provavel que elle tivesse semelhante
outros artigos póde ser que não haja nisto mais que atrevimento.
um engano de collocação na ordem das materias. O que elle quiz foi mostrar ao outro
O SR. ALENCAR: – Eu não vejo nisto cousa periodiqueiro que não tinha mentido; não creio que
que mereça attenção; mas confesso que ha gente tivesse nisto outra tenção Não se suspeite porém
que tudo acredita e de tudo tem receio; se não fosse que sou seu advogado; ao contrario na minha
assim não haveria quem acreditasse em feitiços. O opinião não é das melhores cousas; vai com gosto
que me parece é que não devemos gastar tempo para o corcundismo; mas neste caso confesso que
com a resolução do negocio. não lhe diviso crime.
O SR. ANDRADA MACHADO: – A ordem é O SR. CARNEIRO DA CUNHA: – Póde V. Ex.
esta. O Sr. deputado denunciou este papel á mandar buscar a indicação que acabo de fazer sobre
assembléa; e cumpre agora ver se ella quer que seja este objecto.
remettido á commissão para o examinar, e decidir se O Sr. Secretario França leu a indicação
é ou não atacada nelle a nossa independencia. O concebida nestes termos.
nobre deputado fez o que podia; e a nós pertence
agora dar-lhe direcção. INDICAÇÃO
O SR. CARNEIRO DA CUNHA: – Eu não fiz
indicação porque podia ser que a assembléa não Proponho que a assembléa geral constituinte
tomasse a materia em consideração, e então de tomando em consideração o Diario do Governo de
nada servia; o que fiz foi apresentar o Diario para ver hontem, no artigo – noticias nacionaes – remetta
o juizo da assembléa sobre elle; nem sei porque não este mesmo diario á commissão de constituição para
ha de ser lido para se tomar conhecimento do que dar o seu parecer sobre o mesmo objecto. – Paço da
expuz. assembléa, 2 de Agosto. – Carneiro da Cunha.
O SR. COSTA AGUIAR: – O illustre deputado O SR. ANDRADA MACHADO: – Pouco a
deve mandar por escripto isso mesmo que pretende; pouco e á surdina se abala o edificio: arteiramente se
eu não quero escrever os pensamentos dos outros introduzem idéas de união. Fallemos claro para não
sem os ver escriptos, nem quero questões amanhã continuarmos a ser ludibriados como já o fomos ha
ao ler a acta; e se não quer ter o trabalho de pouco em um papel publico onde em lugar de
escrever, diga que eu vou escrevendo. sermos tratados por cidadãos brazileiros, seus ou
O SR. VELLOSO SOARES: – Sr. presidente, dos termos – habitantes do Brazil –…… Eu não
eu peço em nome de toda a assembléa que se lêa quero que isto do Diario fosse, como ouvi dizer, um
esse papel; quero ouvir, quero saber o que vai. O Sr. lapso de penna; desconfio de tudo; e vejo o
deputado não póde embaraçar por si só a vontade procedimento do governo de Portugal, que mal póde
dos outros: eu quero ouvir ler para poder formar a vibrar as azinhas já quer voar.
minha opinião. (Apoiado.) Faz muito bem, não póde existir sem nós;
O Sr. Secretario França leu o artigo do Diario. trabalha pela sua existencia; e nós pelo contrario
O SR. ANDRADA MACHADO: – A expressão bem podemos existir sem elle. Em todas as ultimas
– proclamação de el-rei – merece alguma noticias de recebimentos amigaveis ás nossas
consideração; porque nós só dizemos el-rei quando embarcações só vejo maneiras de nos amaciar, e
fallamos de rei nosso, e aquelle não o é; talvez o enganar; e estou certo que para a extincção do
seja do redactor; meu não, nem quero nada com elle. passado systema havia de servir a promessa de facil
O SR. FRANÇA: – Igualmente é só o que noto e repentina união com o Brazil.
também: pois quanto ao lugar em que se acha vejo Por fim até nesse periodico de um estrangeiro
que está alli para prova do que o redactor assevera. que se metteu a dar-nos conselhos (um tal Grondoni)
O SR. ALENCAR: – Não acho do que fazer nos lembrão que devemos especar o nosso velho
crime ao redactor: elle o que quiz foi apresentar ao pai, para fazermos de bons filhos. Portanto de tudo
do Correio uma prova de não ter mentido. Debaixo desconfio; embora pareça excessiva a minha
do titulo – noticias nacionaes – deu em primeiro lugar suspeita.
o estado de saude de Sua Magestade; e depois A classificação das noticias já me não agrada,
começa a descompôr o Correio, e apresenta para o e o emprego do termo el-rei ainda menos. Comtudo
desmentir a proclamação do rei de Portugal. não affirmo que o fizesse por maldade esse
miseravel escriptor; talvez fosse descuido; mas
sempre é bom que se declare, e que todo o mundo
saiba que somos brazileiros e que
16 Sessão em 4 de Agosto de 1823

havemos de ser brazileiros até dar a ultima pinga de secretarios effectivos José Ricardo da Costa Aguiar,
sangue. Manoel José de Souza França, José Feliciano
O SR. MONTESUMA: – Eu acho que o Fernandes Pinheiro e Luiz José de Carvalho e Mello;
redactor quiz justificar-se do que dissera delle o do e para supplentes José Antonio da Silva Maia, e
Correio, e esse artigo da sua justificação collocou-o Francisco Muniz Tavares. O que V. Ex. levará ao
debaixo do titulo de – noticias nacionaes – como conhecimento de S. M. Imperial. – Deus guarde a V.
devia fazer; depois seguiu-se o documento que Ex. Paço da assembléa, 2 de Agosto de 1823. –
abonava o que tinha dito, isto é, a proclamação, e Manoel José de Souza França.
ficou esta por consequencia tambem debaixo do
mesmo titulo. PARA JOÃO SEVERIANO MACIEL DA COSTA
Não ha pois nisto, a meu ver, nada que seja
objecto de deliberação da assembléa; mas se A assembléa geral constituinte, e legislativa do
querem vá a uma commissão; ella dará o seu imperio do Brazil manda participar a V. S. que
parecer e a assembléa verá se deve ou não achando-se legal o seu diploma, deve vir quanto
conformar-se com elle. antes tomar assento neste augusto congresso, e ter
O SR. ANDRADA MACHADO: – O que vejo é parte nos seus trabalhos, como deputado á mesma
que deve ficar adiado. assembléa pela provincia de Minas-Geraes. – Deus
O SR. MONTESUMA: – Se continúa a sessão guarde a V. S. Paço da assembléa, em 2 de Agosto
quero fallar. Decida a assembléa se fica adiado. de 1823. – Manoel José de Souza França.
Declarou-se adiada a discussão por ter dado a
hora. SESSÃO EM 4 DE AGOSTO DE 1823.
O Sr. Presidente assignou para a ordem do
dia: 1º O projecto de lei sobre a revogação da PRESIDENCIA DO SR. BISPO CAPELLÃO-MÓR.
provisão da mesa de consciencia de 28 de
Dezembro de 1754. 2º O projecto para o melhor Reunidos os Srs. deputados pelas 10 horas da
tratado de educação. 3º Regimento da assembléa. manhã, fez-se a chamada e acharão-se presentes
Levantou-se a sessão ás 2 horas da tarde. – 66, faltando com causa os Srs. Pereira da Cunha,
José Ricardo da Costa Aguiar d’Andrada, Secretario. Ferreira Barreto, Teixeira da Fonseca, Cruz Gouvêa,
Rodrigues da Costa e Carneiro.
RESOLUÇÕES DA ASSEMBLÉA O Sr. Presidente declarou aberta a sessão, e
lida a acta da antecedente foi approvada.
PARA JOÃO VIEIRA DE CARVALHO O SR. HENRIQUES DE REZENDE: – Eu retiro
da mesa esse projecto de que faz menção a acta; e
Illm. e Exm. Sr. – A assembléa geral deixo para o tempo resolver o problema se elle era
constituinte e legislativa do imperio do Brazil, sendo- ou não necessario.
lhe presente o parecer da commissão de marinha e Foi-lhe restituido.
guerra sobre a necessidade de se restituirem á sua O Sr. Secretario Costa Aguiar leu o seguinte
patria as milicias da provincia de S. Paulo, ora officio do ministro dos negocios do imperio:
existentes no sul, sendo substituidas por milicias de Illm. e Exm. Sr.– Participo a V. Ex. para ser
outras provincias, manda participar ao governo que presente á assembléa geral constituinte e legislativa
precisa, para as suas deliberações, que lhe sejão deste imperio, que pelo officio que me foi dirigido em
transmittidas informações sobre este objecto. O que 2 do corrente, ficou Sua Magestade o Imperador
V. Ex. levará ao conhecimento de S. M. Imperial. – sciente das pessoas eleitas para servirem neste mez
Deus guarde a V. Ex. Paço da assembléa, em 2 de até o dia 3 de Setembro, os cargos de presidente,
Agosto de 1823. – Manoel José de Souza França. vice-presidente e secretario da mesma augusta
assembléa.
PARA JOSÉ JOAQUIM CARNEIRO DE CAMPOS Deus guarde a V. Ex. – Paço, em 4 de Agosto
de 1823. – José Joaquim Carneiro de Campos. – Sr.
Illm. e Exm. Sr. – A assembléa geral José Ricardo da Costa Aguiar.
constituinte e legislativa do imperio do Brazil, tendo Ficou a assembléa inteirada.
procedido hoje á nomeação de presidente, vice- O Sr. Secretario França deu conta de uma
presidente e secretarios para o mez que decorre do representação de Felisberto Ignacio Januario
dia de amanhã até 3 de Setembro, manda Cordeiro que pedia se exigissem dos Srs. deputados
communicar ao governo que tem eleito para Andrada e Silva, Ribeiro de Andrada, Andrada
presidente o Rvm. bispo capellão-mór, para vice- Machado, e Rezende Costa, do ministro de estado
presidente o barão de Santo Amaro, para Caetano Pinto de Miranda Montenegro e dos
desembargadores Sebastião Luiz Tinoco da Silva e
João Ignacio da Cunha as Memorias Politicas
Sessão em 4 de Agosto de 1823 17

e Economicas que lhes dirigira em cartas cerradas, exigirem os procuradores fiscaes em consequencia
afim de serem presentes á assembléa. da mesma provisão assim a citação dos herdeiros ou
Depois de ligeiras observações, decidiu a devedores peIa maior parte residentes em Portugal,
assembléa que o representante, se quizesse, cousa impraticavel nas circumstancias actuaes da
mandasse cópias das referidas memorias; e ao guerra com aquelle reino, como a restricção de
mesmo tempo os Srs. Andrada Machado e Ribeiro pagamento até 200$000 por escriptura publica:
de Andrada disserão que apresentarião as que Não attendendo porém a commissão no seu
tinhão recebido, o que o Sr. Andrada e Silva declarou projecto aos outros pontos da minha indicação, não
não poder fazer por terem passado aquelles papeis menos interessantes, devem necessariamente
com os mais da secretaria para o seu successor. continuar todos os males que apontei, sem que
Annunciou-se que estavão na sala immediata valhão as providencias, que ella diz se achão dadas
os Srs. Miguel Calmon du Pin e Almeida e Antonio pelas leis, quando pela pratica invariavel e constante
Calmon du Pin e Almeida, deputados pela provincia que se segue naqueIIe juizo dos ausentes, só se
da Bahia, e o Sr. João Severiano Maciel da Costa, observão as dilapidações e abusos, que submetto
pela de Minas-Geraes; e sendo introduzidos na outra vez á consideração desta assembléa para dar
fórma do estylo, prestarão juramento e tomarão lugar o remedio que julgar conveniente.
na assembléa. O SR. FRANÇA: – O projecto de lei em
Passou-se á ordem do dia e começou-se pelo discussão não satisfaz, segundo entendo, aos
projecto de lei sobre arrecadação da fazenda de requisitos da indicação que lhe dera origem, e é por
defuntos e ausentes, que ficára adiado na sessão isso sómente que eu votarei contra elle. Na indicação
antecedente. se pretendia cortar pelos damnos que tem trazido até
O SR. MAIA: – (Não se entendeu o agora ao nosso paiz a legislação regulamentar do
tachigrapho.) juizo administrativo da fazenda dos defuntos e
O SR. REZENDE COSTA: – Em 4 de Julho ausentes, negando o embolso dos credores das
passado representei a esta illustre assembléa os heranças arrecadadas a menos que se não habilitem
enormes abusos praticados pela repartição dos com citação dos herdeiros dellas, as mais das vezes
defuntos e ausentes, a multidão informe e incertos e desconhecidos. O projecto porém induz
contradictoria das suas leis e regimentos emanados sómente a ampliação da provisão de 28 de
da mesa da consciencia e ordem de Lisboa; ajuntei Dezembro de 1754, que faculta aquelle mesmo
para corroborar esta minha asserção a excellente embolso dos credores até 200$000 nos contractos
memoria feita em 1780 pelo desembargador do Porto escripturados, não excedendo de 100$000 nas
José João Teixeira para instrucção do governo da dividas não escripturadas: o que vem a ser uma meia
provincia de Minas-Geraes, em que mostra, com medida, que não remedêa cumpridamente o mal. Eu
exemplos e factos, grandes heranças absorvidas conheço que os herdeiros das heranças jacentes têm
pelos thesoureiros e officiaes daquella repartição; a posse civil dellas, que lhes transfere o alvará de 9
herdeiros redusidos a pedir esmolas; pratas e joias e de Novembro de 1754 com todos os effeitos da
trastes mais ricos occultados por elles; os escravos natural, e que o direito dos mesmos herdeiros
applicados aos serviços dos thesoureiros, havendo ausentes se póde por ventura lesar nos pagamentos
estes das heranças ao mesmo tempo a comida e que se houverem de fazer de sua propriedade sem
vestuario destes escravos. elles serem ouvidos: mas sei tambem, que existindo
Mostrei os grandes prejuizos que resultavão a em voga o direito do dito alvará, se publicou todavia
todo o imperio do Brasil pela provisão de 28 de e se tem observado o outro de 17 de Junho de 1766,
Dezembro de 1754, a qual só permitte pagar as que em beneficio do commercio affrouxou todo o
dividas dos finados até 200$000 sendo por escriptura rigor das leis peculiares do juizo dos ausentes,
publica, e as que o não fossem limitadas a 100$000, pagando-se por administrações temporarias da junta
sendo obrigados os credores a habilitarem-se pelo do commercio todas e quaesquer dividas, que tem a
juizo de India e Mina em Portugal para poderem presumpção de certeza por meio de justificações
cobrar maiores quantias. pronunciadas, e o exemplo de uma classe de
Exigi que se remettesse á commissão de credores é bom argumento para se generalisar o
legislação esta minha indicação, para se darem as remedio em um systema da igualdade de direitos:
necessarias reformas: porém no seu projecto só vejo pois se o activo commerciante merece a protecção
attendido um unico ponto, na verdade interessante, das leis, não a merece menos o laborioso lavrador e
qual o de revogar-se a provisão de 28 de Dezembro o intelligente artista, que fornecem os objectos de
de 1754, de que emanão os grandes vexames, que consumo sobre que exercita o commercio a sua
soffrem os credores dos defuntos e ausentes, que acção.
requerendo no thesouro publico, onde se achão Ou se ha de pois dizer que é injusto o alvará
depositados mais de dous milhões de cruzados de 1766, ou que o são as leis, que ella derogou,
pertencentes aos mesmos ausentes, são indeferidos
os seus requerimentos e inhibidos de cobrar o que
se lhes deve, por
18 Sessão em 4 de Agosto de 1823

e que estas merecem de ser corrigidas, segundo a Lembrárão os illustres preopinantes que ha
norma daquelle, conciliando-se quanto fôr possivel o excepções desta regra com as heranças dos que
direito muitas vezes certo e conhecido do credor exercerão o commercio, onde nem entra o juizo dos
presente com o incerto do herdeiro ausente. ausentes, nem se deixão de pagar dividas por falta
A meu vêr portanto cumpre fazer-se uma lei de audiencia dos herdeiros; accrescentando que não
que, considerando a materia em todas as suas deve ser melhor a condição dos commerciantes do
relações, haja de pôr termo á estagnação de que a dos agricultores e proprietarios, a quem a lei
capitaes que podem e devem influir para a massa deve contemplar com igual consideração.
dos fundos circulantes da nação, facilitando-se o Verdade é, que assim se acha estabelecido
embolso dos credores das heranças jacentes, e em favor do commercio, que muita protecção
fiscalisando-se todavia nisso quanto fôr possivel o merece; mas esta concessão tão especial não é só
direito dos herdeiros que possão de futuro apparecer porque este manancial da riqueza publica mereça
habilitados: e como a este intento não satisfaz o mais contemplação e preferencia do que os outros,
projecto em discussão, voto por isso que não passe mas foi em attenção a que as casas commerciaes
e que a illustre commissão se encarregue de uma pelo seu complicado giro e consistencia demandão
nova redacção que desempenhe o intento. mais particular administração, e se não fossem
O SR. CARVALHO E MELLO: – Sr. sugeitas a ella se perderião os capitaes em prejuizo
presidente, por mais que se esforcem os illustres dos herdeiros e credores, e da bondade da
preopinantes e autor do projecto em questão, em administração é proprio e necessario o arrecadar e
sustental-o como necessario e util, por mais pagar afim de liquidar-se o que puramente vier a
brilhantes e energicas que sejão as razões com que pertencer a seus legitimos donos.
pretendem tornal-o justo, nunca o poderáõ conseguir Cumpre pois não accrescentar novas e
á vista dos fundamentos que produzi quando fallei a privilegiadas concessões; e quem não vê que seria
primeira vez deste objecto em tão respeitavel recinto. contradictorio fiar tando dos thesoureiros, e por
Os principios elementares de justiça e legislação desgraça até dos provedores, quando os mesmos
universal em que estribei a minha opposição existe illustres preopinantes e todos os taxão de
em pé, e nenhumas razões até aqui expostas os immoralidade e fraudulenta administração!
derribárão ainda. Fallemos sem rebuço, se este projecto
Quem não vê que só a utilidade dos credores passasse e chegasse a ter força de lei, quantas
não póde bastar para que contra a regra geral se mancommunações recrescerião entre credores e os
proceda a um juiz summario, aonde sem audiencia thesoureiros e provedores dos ausentes? Quantas
dos verdadeiros interessados se mandem pagar dividas phantasticas não existirião por accordo
dividas do fallecido devedor originario? unanime dos fingidos credores, e perfidos fiscaes?
Falta a audiencia daquelle que em virtude da Quanto acabo de expôr, Sr. presidente, é solido, é
lei tem dominio e posse nos bens da herança; e fundado nos direitos imprescriptiveis do cidadão, e
offende-se este direito, que lhe deu a natureza e a na salvaguarda, que a lei estabelece para o direito
lei, só para aproveitar ao credor, que legitimamente de propriedade por meio das formulas forenses.
se não póde dizer tal sem as provas legaes e sem a Deve portanto não passar este projecto á
sentença que o declare, depois da contradicção que ulterior discussão, e esperar-se o tempo opportuno,
oppuzer o herdeiro. em que convenha destruir-se de uma vez este juizo
A audiencia do thesoureiro do juizo não póde particular, e marcado com o ferrete da fraude e da
supprir a daquelle. O thesoureiro é um fiscal para injustiça, e substituir-se-lhe legislação propria, justa e
mais solemnisar este juizo peculiar e fazer mais adaptada ás circumstancias da materia, e conforme
solidas as suas deliberações; esta assistencia porém ao regulamento que houver de dar-se á ordem e
não só não exclue a audiencia do herdeiro, mas fórma judiciaria.
sabem todos que nos negocios maiores, e O SR. LOPES GAMA: – (Não se entendeu o
principalmente nos de pagamento pelos bens de tachygrapho.)
herança, devem sempre ser ouvidos os herdeiros. Julgou-se a materia discutida, e propoz o Sr.
Por força dos principios acima referidos o declarou presidente:
assim o regimento, e muitas posteriores ordens e 1º Se a assembléa julgava finda a 1ª
provisões o estabelecerão de novo. discussão. – Venceu-se que sim.
Nos negocios em que se controvertem direitos 2º Se passava á 2ª discussão. – Venceu-se
da corôa e da fazenda, são ouvidos os procuradores tambem que sim.
de uma e outra como fiscaes, mas nem por isso Entrou-se na 2ª parte da ordem do dia, que
deixão de ser chamados a juizo os interessados era a 2ª discussão do projecto sobre o premio para o
nelles: o mesmo acontece nos negocios de todos os melhor tratado de educação, e o Sr. secretario Costa
mais tribunaes em que ha fiscaes nomeados, como é Aguiar leu o art. 1º do theor seguinte:
na junta do commercio e na dos arsenaes. Art. 1º Será reputado benemerito da patria,
Sessão em 4 de Agosto de 1823 19

e como tal condecorado com a ordem imperial do premio honorifico, que é de alta valia, e subido
Cruzeiro, ou nella adiantado, se já a tiver, aquelle quilate para almas generosas, e que tenhão alguns
cidadão que até o fim do corrente anno apresentar á meios de viver; outros porém cedendo a este motivo
assembléa o melhor tratado de educação physica, solido e brilhante, talvez a seu pezar, queirão
moral e intellectual, para a mocidade brazileira. comtudo o pecuniario para acudir ás precisões da
O SR. CARVALHO E MELLO: – Na sessão vida; e os que por fim relevarem a todo o custo o
em que se tratou da primeira discussão deste valor do dinheiro, só por este principio preferiráõ
projecto, fallando em geral sobre a utilidade delle, Sr. sordidamente a acquisição delle.
presidente, eu disse quanto se me antolhou naquella De qualquer modo porém o estado consegue o
occasião ácerca da necessidade e utilidade que que pretende, convém a saber, que hajão muitos que
temos em promover a educação geral dos nossos com a mira no premio se dêm a este genero de
concidadãos. trabalho. Guiado por estes principios offereço a
Depois de estabelecida a necessidade de seguinte:
haver um bom plano de educação regular, adaptado
ás nossas circumstancias, convém que este se EMENDA
regule por uma maneira convinhavel ao estado de
falta de luzes em que nos achamos, e nenhum meio Aquelle cidadão que apresentar dentro de um
é mais conducente a esse fim do que o procurar anno á assembléa o melhor tratado de educação
conseguir um plano geral, que abranja todas as physica, moral e intellectual para a mocidade
regras da educação publica, e da particular; que se brazileira, será reputado benemerito da patria, e
dêm preceitos para a educação physica, e para a como tal condecorado com a ordem do Cruzeiro, ou
litteraria, que se reduza o ensino áquellas materias, nella adiantado se já a tiver; ou remunerado com
que são proprias da idade em que se acharem os uma porção pecuniaria por uma vez sómente, a qual
educandos; e que afinal em collegios se ensinem as se determinará em quantidade pela commissão
sciencias maiores, e as artes liberaes. respectiva. (Ao art. 1º do projecto de 16 de Junho de
Para conseguir-se o que desejamos, é mister 1823.) – O deputado Carvalho e Mello.
que por força se convidem por meio de premios os Foi apoiada.
cidadãos, que vivem no retiro, e que além de premio O SR. FRANÇA: – Além da emenda de que
geral, que é o ser util á sua patria, tenhão o particular tratou o illustre deputado ainda ha outra que me
de serem declarados benemeritos da patria, e parece digna de attenção: e é, ou supprimir-se a
condecorados com a ordem do Cruzeiro. clausula que marca o praso dentro do qual se ha de
Estes premios, muito analogos ao exaltado dar ao prelo a obra; ou ampliar-se o mesmo praso,
amor da patria e verdadeira gloria, que é ingenito aos porque o tempo que se deve consumir na
brazileiros, produzindo a emulação farão por certo composição, e na impressão segundo o estado das
que muitos genios se esforcem por conseguir nossas typographias, deve exceder muito além do
distincções tão honrosas. Mas ha muitos que ainda marcado pelo artigo do projecto; com o que vem a lei
que possuidos de sentimentos tão briosos, a ser inutil, porque requer ou promove uma obra que
necessitão comtudo de estimulos de outra natureza é moralmente impossivel praticar-se dentro do tempo
pelo estado de sua acanhada fortuna. que assigna.
Um homem a quem faltem meios de O Mesmo Sr. Deputado mandou á mesa uma
subsistencia, por mais brioso que seja, preferirá os emenda na conformidade do que expendera; mas
premios pecuniarios; e uma fita e medalha não logo a retirou por se achar prejudicada pela
assentão bem em velha casaca. Deve portanto antecedente.
accrescentar-se, que se dará ao autor do melhor O SR. MONTESUMA: – Sr. presidente! Eu
plano as distincções estabelecidas no projecto, ou não duvido que a ordem do Cruzeiro seja bastante
uma porção de dinheiro, cuja quantidade marcará a para condecorar o que apresentar o melhor tratado
commissão. de educação para a mocidade brazileira, mas eu
Os autores do projecto do codigo civil e prefereria o que têm adoptado em taes casos as
criminal em Lisboa preferirão o premio pecuniario, na outras nações como o mais proprio, isto é, uma
persuasão de que seria mais geralmente estimado, medalha particular e relativa ao serviço feito com
porque, por via de regra, as riquezas não aquelle trabalho; e como este me parece o melhor
acompanhão sempre os talentos. offereço uma emenda para se adoptar o mesmo
Eis-aqui porque eu julgo que a alternativa entre nós, reservando-se a ordem do Cruzeiro para
convém, porque no arbitro fica do premiado escolher outros serviços.
o que mais vantajoso lhe fôr, e assim haverá por
certo maior numero de oppositores, por assim dizer, EMENDA
a este concurso, levados uns do
Proponho que se supprimão as palavras –
condecorados com a ordem imperial do Cruzeiro, ou
nella adiantado, se já a tiver – substituindo-lhes
20 Sessão em 4 de Agosto de 1823

– condecorado com uma medalha propria que marque o bom deixar ao cidadão que fìzer o tratado que se
serviço feito, e relate a obra approvada. pretende a escolha livre entre a condecoração da
Proponho que se substitua á palavra – cidadão – ordem do Cruzeiro, e alguma remuneração pecuniaria
pessoa. – O deputado Montesuma. em dinheiro ou no valor de uma medalha. Com esta
Foi apoiada. idéa fiz a seguinte:
O SR. ALENCAR: – Sr. presidente, concordando
sobre a utilidade do projecto, não posso approvar o que EMENDA
a commissão propõe para premio de quem fizer esta
obra que eu considero de mui alto valor, porque estou Proponho que se dê ao que publicar o tratado
persuadido que é um fraco estimulo para se exigido a ordem do Cruzeiro, ou uma remuneração
emprehender semelhante trabalho. Eu não duvido que pecuniaria conteúda em uma medalha do dito valor, ou
seja muito respeitavel a ordem do Cruzeiro, mas não a em numerario. – Andrada Machado.
acho acommodada a esse fim: sou desta opinião desde Depois de vir á mesa, o seu illustre autor a
que se leu este projecto. retirou.
O illustre preopinante que me precedeu disse O SR. VELLOSO SOARES: – A nação não
que deviamos estabelecer uma medalha; eu sou do gasta o seu thesouro em interesses particulares; o
mesmo voto, mas não me contento com isto. Quem se dinheiro que tem não é para mandriões; vão estes
encarregar deste trabalho ha de consumir com elle buscal-o onde quizerem, ou procurem outra vida. Nós
muito tempo, e até fazer despezas; e por isso me estamos em tempos constitucionaes, e assim mesmo
parece indispensavel arbitrar-lhe alguma pensão ao todos estão olhando para o thesouro; pois saibão que
menos por tempo determinado; lembrei-me de marcar o não ha para comedores.
espaço de 10 annos, mas julgo conveniente que seja O SR. FRANÇA: – O illustre deputado bem sabe
determinado o quantitativo pela commissão da fazenda. que o dinheiro do thesouro é applicado a bem da
Eu mando á mesa a minha emenda; devendo nação, e que é um bem de grande importancia o ter um
advertir que estabeleci que a medalha fosse de prata, bom tratado de educação.
por me lembrar que póde haver trabalho de maior O SR. VELLOSO SOARES: – Torno a dizer, o
monta para o qual se deverá designar uma de ouro. dinheiro do thesouro não é para os particulares,
emquanto se puder guardar é o melhor.
EMENDA O SR. RODRIGUES DE CARVALHO: – Eu não
consinto que passe uma tal proposição. Para quem
1º Será reputado benemerito da patria, e será o dinheiro do thesouro, será para as almas do
condecorado com uma medalha de prata com esta outro mundo? Não sei o que pensa o illustre
legenda – A patria agradecida ao autor do plano de preopinante quando diz que o dinheiro do thesouro não
educação physica, moral e intellectual, para a é para particulares! Pois aos que servem á nação não
mocidade brazileira – a qual poderá trazer pendente ao se lhes paga? E não será fazer-lhe um bom serviço
pescoço. apresentar um perfeito tratado de educação publica? Eu
2º Terá uma pensão por espaço de 10 annos, a julgo que é preciso confundir todas as noções de
qual será estipulada pela commissão de fazenda. economia para dizer que dar uma recompensa a um tal
Paço da assembléa, 4 de Agosto de 1823. – O cidadão é sustentar comedores. Se o illustre deputado
deputado Alencar. reflectir verá que é pelo contrario fazer da fazenda
Foi apoiada a 2ª parte, julgando-se a 1ª publica a mais vantajosa applicação.
comprehendida na emenda antecedente. O SR. ANDRADA MACHADO: – Eu sei o que o
O Sr. Henriques de Rezende pediu a palavra e nobre deputado quiz dizer, e é que as obras de espirito
depois de algumas reflexões (que o tachygrapho não não se pagão com dinheiro; todavia convém tomar
ouviu) offereceu tambem a seguinte: todos os meios para estimular, porque a obra é de
summa importancia. Além disso nós não estamos no
EMENDA caso de outras nações onde se não precisava do
estimulo do dinheiro nem para os maiores serviços; os
Proponho que a emenda do Sr. Carvalho e Mello antigos romanos fazião á patria os mais custosos
seja reunida como tença á emenda do Sr. Montesuma. sacrificios e contentavão-se com uma corôa de louro;
– Henriques de Rezende . mas nós não somos esses romanos; o dinheiro é um
Foi regeitada. poderoso estimulo e convém applical-o para termos o
O SR. ANDRADA MACHADO: – Tambem penso tratado. Eu creio que a questão não merece ser mais
que além da gloria litteraria deve haver algum estimulo debatida; arbitre-se o que se julgar sufficiente, e
pecuniario, até mesmo porque em geral os litteratos são acabemos com isto.
sempre os maiores pobretões. A ordem do Cruzeiro é O SR. LOPES GAMA: – Eu considero esta
talvez a que temos menos enxovalhada; mas assim
mesmo penso que será
Sessão em 4 de Agosto de 1823 21

materia como uma das mais importantes que se têm O Sr. Presidente propoz se estava
offerecido nesta assembléa, vista a necessidade que sufficientemente discutido o artigo. – Venceu-se que
temos de promover a educação publica; e por isso sim.
deve ser tratada com todo o cuidado embora se gaste Passou-se á leitura das indicações:
mais algum tempo. Lembro-me de que a obra póde ter O SR. MONTESUMA: – Sr. presidente, eu vejo
pouca extracção, e que seu autor fazendo as despezas que os trabalhos da assembléa vão crescendo, e que
da impressão póde não lucrar; em contemplação a vai apparecer em poucos dias o projecto de
isto, julgo conveniente que sejão pagos os gastos da constituição; assento por isso que seria conveniente
impressão pela fazenda, e o producto da venda todo augmentar mais uma hora de trabalho cada dia
do autor. E’ o que digo neste additamento que vou entrando mais cedo. Esta assembléa está installada ha
mandar á mesa. mais de trez mezes, e ainda não appareceu uma só lei,
talvez porque tambem concorrem para isso alguns
ADDITAMENTO defeitos do nosso regimento na parte das discussões.
Gasta-se um tempo immenso para se concluir
O producto da venda desta obra será todo de qualquer artigo de um projecto; e por isso entendo que
seu autor, sem delle se deduzir as despezas da com cada artigo da constituição o mesmo succederá, e
imprensa, que serão feitas pela fazenda publica. – O é exactamente o que não convém; portanto
deputado Lopes Gama. trabalhemos mais uma hora, no que me parece que
Foi apoiado. não ha inconveniente, e façamos assim a possivel
O Sr. Marianno Cavalcanti pedio a palavra, e diligencia para acabarmos com a nossa tarefa o mais
offereceu a seguinte: depressa que pudermos, já que a nação tanto precisa
de reformas.
EMENDA Eu julgo em minha consciencia que é pouco o
tempo que trabalhamos, visto que a nação nos paga e
1º A pessoa que apresentar no prazo de um que devemos satisfazer mais depressa aos nossos
anno contado da promulgação deste projecto um plano deveres. Fundado nestes principios offereço a
de educação physica, moral e intellectual, se fôr seguinte:
cidadão do Brazil será declarado benemerito da patria,
e como tal attendido aos postos e empregos INDICAÇÃO
nacionaes, segundo a sua classe ou profissão: se fôr
estrangeiro terá os agradecimentos da nação e um Proponho que se augmente os trabalhos da
premio pecuniario; e quer seja estrangeiro quer assembléa a cinco horas; principiando ás 9 horas da
cidadão do Brazil dar-se-lhe-ha uma medalha manhã, e acabando ás 2 horas da tarde. – O deputado
distinctiva. Montesuma.
2º Crear-se-ha um segundo premio pecuniario O SR. CARNEIRO DE CAMPOS: – Todas as
para aquelle que apresentar um plano de educação razões que ponderou o illustre preopinante já forão
sómente physica, ou moral ou intellectual. presentes a esta assembléa, e apezar dellas não se
Paço da assembléa, 4 de Agosto de 1823. – O alterou a ordem. Isto é uma materia já decidida; e tanto
deputado Marianno Cavalcanti. basta para não ter lugar a indicação. Já se tem dito
Foi apoiada. nesta assembléa, e com muita razão, que decidir hoje
O Sr. Vergueiro offereceu tambem o seguinte o contrario do que se resolveu hontem, só serve para
additamento: nos fazer perder a força moral, quando muito convém
Proponho que seja tambem premiado o tratado que se conheça que nenhuma cousa se decide neste
que merecer o – accessit. – Vergueiro. congresso sem toda a madureza e circumspecção.
Foi apoiado. Depois de se terem feito todas as precisas
O Sr. Andrada e Silva igualmente offereceu a considerações resolveu-se, sem que se marcasse a
seguinte hora precisa da entrada, que durassem as sessões
sómente quatro horas. Quando a materia fôr urgente
EMENDA de tal modo que se precise prompta decisão, declara-
se permanente a sessão, e não sahimos daqui sem
Será reputado, etc, que até ao fim do anno de estar tudo concluido. Voto portanto contra a indicação.
1824, etc. Além deste premio honorifico terá uma ajuda O SR. COSTA AGUIAR: – Para intelligencia do
de custo de duzentos mil réis; não havendo porém illustre deputado eu vou ler o que se decidiu na sessão
obra que mereça completamente ambos estes de 12 de Junho sobre o artigo 37 do regimento. Eis-
premios, o autor da obra immediata em merecimento aqui o que diz a acta:
será condecorado com a ordem imperial do Cruzeiro, O artigo 37 não passando tal como estava,
sem mais ajuda de custo – Andrada e Silva. propoz o Sr. presidente se deveria marcar-se no
Foi apoiada. regimento a hora em que as sessões deverião
principiar e acabar; e venceu-se que não, decidindo-se
22 Sessão em 4 de Agosto de 1823

que ficasse ao arbitrio da assembléa. Propoz mais na Europa onde se soffre mais tempo de trabalho;
se deveria marcar-se o espaço de tempo que deve aqui não póde supportar-se mais de quatro horas de
durar cada uma das sessões: e vencendo-se que fadiga de espirito; e a isto se attendeu quando a
sim, propoz se deveria ser de 5 horas, conforme se assembléa resolveu que fossem sómente quatro as
acha no artigo; decidiu-se que não, julgando-se horas da sessão; se o espirito se cansa de mais não
sufficiente – quatro.– póde examinar os objectos como é preciso.
A’ vista disto é claro que implica a indicação Eu creio que não ha necessidade de
com o que está vencido, e que portanto não tem augmentar o tempo da sessão; o que é
lugar. indispensavel é aproveital-o bem e não se faIlar a
O SR. MONTESUMA: – Nas côrtes de cada artigo 4 e 5 vezes, como aqui se faz por
Portugal quando foi maior a affluencia dos negocios, costume; isto é o que leva tempo; se evitarmos
deliberou-se o augmento das horas de trabalho; nós estes abusos não precisamos estar aqui mais uma
estamos nas mesmas circumstancias e creio que o hora.
mesmo se deve praticar. Disse um illustre deputado O Sr. Presidente propoz a indicação: e foi
que as razões que eu dei já tinhão sido regeitada.
anteriormente apresentadas e que não forão O SR. RIBEIRO DE ANDRADA: – Peço a
attendidas; mas eu respondo que talvez quando se palavra para offerecer a seguinte:
offerecerão não houvessem tão fortes motivos para
se fazer a alteração que eu requeiro. INDICAÇÃO
O estar já decretado pela assembléa o que se
pratica, é verdade que me faz pezo, porque eu sou Proponho que se peça ao governo uma lista
escravo da lei, mas eu peço a alteração por de todas as pessoas que percebem vencimentos do
circumstancias extraordinarias que a fazem precisa. thesouro a titulo de pensões, gratificações, ajudas
Muita gente pensa como eu; e por isso requeiro a de custo, etc., por portarias ou avisos das
consideração da assembléa sobre a minha secretarias de estado, e provisões do mesmo
indicação. thesouro, com a declaração de quaesquer outros
O SR. ARAUJO LIMA: – Se estivessemos vencimentos que cada uma das ditas pessoas haja
em um paiz mais frio eu votaria que trabalhassemos de receber de mais por titulos legaes – Ribeiro de
cinco horas; mas não é possivel com tão grande Andrada.
calor aturar mais trabalho. Além disto como está Como já se decidiu nesta assembIéa que ao
decidido que segundo a urgencia nos devemos deputado escrivão da junta da fazenda do Espirito
regular, quando hajão circumstancias Santo se não continuasse o pagamento das ajudas
extraordinarias nós estaremos em sessão o tempo de custo que vencia, dando-se por motivo não
necessario. serem legaes os titulos que as conferirão, por
O SR. LOPES GAMA: – Eu confesso, Sr. deverem sómente ser considerados taes os
presidente, que se gasta aqui o tempo sem se saber firmados pelo monarcha, entendo, Sr. presidente,
em que; e é por isto que não tem apparecido lei que devendo a justiça ser igual para todos, cumpre
alguma, como acabou de dizer o illustre autor da generalisar aquella disposição para que se
indicação. Se nos limitassemos aos negocios comprehendão nella todos os que estiverem nas
urgentes, o tempo das quatro horas nos chegaria; mesmas circumstancias.
mas como se toma conhecimento de quantas Com este fim propuz a minha indicação que
propostas exoticas e superfluas se apresentão, com espero seja tomada em consideração por esta
ellas se gasta o tempo que nos falta para o que é assembléa, para que cessem todas as pensões,
indispensavel. ajudas de custo, ou gratificações, que tiverem sido
O SR. ANDRADA MACHADO: – O exemplo concedidas por titulos que não são legaes, como a
das côrtes de Portugal não tem lugar para nós; o mesma assembléa já reconheceu. Requeiro justiça
seu regimento nunca se discutiu; á proporção que igual para todos; isto não póde ser desattendido.
apparecião os inconvenientes se corrigia, ou Como ninguem pedisse a palavra, propoz o
accrescentava; mas o nosso governa como lei; e Sr. presidente a indicação, e foi approvada.
por isso só por outra póde ser revogado. O SR. LOPES GAMA: – Ha uma indicação
Portanto a indicação do nobre deputado para que ficou adiada na sessão antecedente: e creio
ser tomada em consideração, devia reduzir-se a que será melhor concluir a sua discussão do que
projecto de lei; sem isto não póde ter lugar; e tratar-se de alguma nova.
parece-me que o melhor seria deixar-nos de O SR. COSTA AGUIAR: – A indicação que
semelhantes discussões. ficou adiada é a do Sr. Carneiro da Cunha sobre o
O SR. ALENCAR: – Como se propoz uma artigo – noticias nacionaes – do Diario do Governo,
indicação quero dizer alguma cousa sobre ella. Nós em cujo artigo se incluio a proclamação do rei de
estamos debaixo da zona torrida, não estamos Portugal. (Veja-se a sessão de 2 do corrente.)
O SR. LOPES GAMA: – A leitura da
indicação
Sessão em 4 de Agosto de 1823 23

mostra que o seu objecto não é da competencia acho que o redactor só deve publicar nella o que fôr
desta assembléa; aqui tomão-se sómente proprio do governo. A indicação que para este fim
resoluções legislativas, e esta materia pertence ao tenho feito é concebida nestes termos.
juizo dos jurados. Que vai fazer isto á commissão, o
que póde esta dizer? INDICAÇÃO
Será o homem chamado para responder, e
para ser julgado. Proponho que se diga ao governo que não
Eu creio que nada ha mais claro do que a consinta que na folha intitulada – Diario do Governo
incompetencia da assembléa para deliberar sobre – se escreva o que não é acto do governo –
semelhante negocio; e por isso entendo que deve Vergueiro.
ser regeitada a indicação. O SR. MONTESUMA: – Sr. presidente, sou
O SR. ANDRADA MACHADO: – O illustre inimigo pelos meus principios de tudo quanto
deputado que propoz a indicação não propoz o que restringe a liberdade do cidadão, principalmente em
diz o Sr. Lopes Gama, que em verdade seria um enunciar os seus pensamentos, e por isso não
absurdo; o que propoz foi que se mandasse o Diario posso apoiar a indicação. Eu sei que o Diario
do Governo a uma commissão para dar o seu chamado do governo é propriedade dos officiaes de
parecer sobre o artigo apontado, e não para se duas secretarias, e portanto nelle podem publicar o
julgar o homem, todos nós sabemos que somos que quizerem, seja relativo a magistrados, ou á
legisladores e não magistrados. Porém tambem politica, emfim o que lhe der na vontade. Não acho
ninguem ignora que a assembléa tem o direito de por isso fundamento algum para se pretender que
attender a tudo o que é do interesse da nação; e é elles só publiquem peças officiaes. Isto seria atacar
por isso que o nobre deputado propoz a sua a liberdade da imprensa.
indicação. Elle desconfia da tenção com que se O SR. VERGUEIRO: – Não vejo em que a
inserio naquella folha o artigo indicado; e eu acho a minha indicação se opponha á liberdade da
sua desconfiança bem fundada... imprensa: o redactor póde escrever o que quizer,
Embora se interprete mal esta minha opinião; mas faça-o debaixo de outro titulo; o que eu
sempre hei de dizer o que sinto seja contra quem pretendo é que não entrem no Diario senão artigos
fôr. officiaes, porque a folha tem o titulo de ministerial.
O SR. LOPES GAMA: – Eu direi só duas O SR. ANDRADA E SILVA: – A indicação do
palavras. Supponhamos que a commissão no seu Sr. Vergueiro não póde ter lugar. A parte principal
parecer declara o homem criminoso, se a do Diario compõe-se de portarias e decretos do
assembléa approva o parecer por força ha de governo, e só para o completar entrão outros
remetter o homem aos jurados; e se estes o artigos; ora, estes necessariamente são da escolha
absolvem, será isto airoso para a assembléa? do redactor ou dos donos da folha, porque têm
Quanto a mim acho-o mui indecoroso. direito de publicar o que lhes parecer n’um jornal
O SR. CARNEIRO DA CUNHA: – (Não o que é seu. Se o governo fizesse as despezas da
ouvio o tachygrapho.) folha, então devia ter lugar o que lembra o nobre
O Sr. Presidente propoz á assembléa a preopinante; mas como os officiaes da secretaria
indicação, e decidiu-se que fosse com o Diario á são os que as fazem, hão de escrever o que muito
commissão de constituição para dar o seu parecer. quizerem. Portanto não tem lugar a indicação
O SR. VERGUEIRO: – Por occasião de se porque não se podem ordenar semelhante
fallar em Diario do Governo eu tenho que propôr limitações.
uma indicação. Tem-me parecido, e tambem a O Sr. Presidente, por não haver mais quem
alguns outros senhores, que o redactor do Diario do fallasse sobre a materia da indicação, propoz esta á
Governo não se lhe dá de introduzir idéas contrarias votação, e foi regeitada.
á nossa independencia; ora, ninguem negará que é O SR. CARNEIRO DA CUNHA: – Sr.
dever nosso vigiar com cuidado sobre este ponto, e presidente: tenho por objecto muito importante o
conhecer de tudo que se dirigir contra ella. regular-se o numero de tropa da 1ª linha para que
Parecia-me pois acertado que se não haja falta nem demasia; e como aquelles que
determinasse que o redactor daquella folha não expoem a sua vida em defesa da patria,
inserisse nella mais que os actos do governo; seria empregados pela nação para quem alcanção honra
bom que se limitasse a isto, e que se quizesse e gloria; merecem toda a nossa contemplação,
escrever outras cousas o fizesse debaixo de outro porque são elles os que nos defendem dos nossos
titulo. inimigos internos e externos, cumpre que sejão bem
É vergonhoso, a meu ver, que se insirão pagos, até para que prestem de melhor vontade
naquelle Diario os artigos que alli vêm seus serviços. Talvez se diga que a nação não está
constantemente, e que o têm desacreditado na em circumstancias de fazer despezas; mas eu
opinião geral. Portanto uma vez que esta folha é a respondo que ella deve ser
ministerial
24 Sessão em 4 de Agosto de 1823

grata a quem por ella derrama seu sangue, a quem a PARECER


livra de Madeiras e de outros malvados semelhantes, e
que por isso deve sugeitar-se a algum sacrificio. Por A commissão de fazenda tomando em
estes motivos, e outros que ainda podia accrescentar consideração o officio do ministro da fazenda, que
offereço a seguinte: acompanhou o do actual governo provisorio da
provincia da Bahia, pelo qual se participava a S. M. o
INDICAÇÃO Imperador haver o ex-conselho interino do governo
encarregado ao commandante em chefe do exercito
Proponho: pacificador de abrir um emprestimo de 444:557$867
1º Que a commissão de guerra regule o numero réis para pagamento e vestuario da tropa; e attendendo
de tropas da 1ª linha que deve haver no imperio, tanto ás circumstancias criticas da referida provincia, á
no tempo de guerra como no tempo de paz. urgente precisão de satisfazer quanto antes as
2º Que igualmente regule o soldo das tropas de extraordinarias despezas que comsigo trouxerão as
todas as provincias com os das tropas da capitaI. calamidades da guerra, não obstante a conhecida
Paço da assembléa, 4 de Agosto de 1823. – incompetencia e abuso das autoridades que, ou se
Carneiro da Cunha. ingerirão ou tomarão parte em semelhante emprestimo;
Depois de breve debate, resolveu-se que fosse é de parecer, que por esta vez sómente se approve, e
remettida á commissão de marinha e guerra para dar o reconheça por divida nacional, entrando a commissão
seu parecer. incumbida de o promover no thesouro daquella
O Sr. Araujo Lima pediu a palavra e leu por parte provincia com as quantias que fôr arrecadando;
das commissões de constituição e estatistica o outrosim, que o actual governo remetta sem perda de
seguinte: tempo ao ministro da fazenda o estado da receita e
despeza da provincia, da sua divida activa e passiva, o
PARECER total dos soldos, etapes, vestuarios devidos a tropa, e
as condições especiaes com que foi aberto o dito
As commissões reunidas de constituição e emprestimo, para a assembléa á vista de tudo, e com
estatistica, tomando em consideração a representação pleno conhecimento, poder deliberar o que convier
de Vicente José Mascarenhas, procurador da camara particularmente á promoção e complemento do mesmo
de Sergipe de El-Rei, na qual se revoga a determinação emprestimo, e em geral ao bem futuro da mencionada
do numero dos deputados que deve competir áquella provincia.
provincia depois da sua separação da provincia da Paço da assembléa, 4 de Agosto de 1823 –
Bahia succedida posteriormente ás instrucções de 19 Martim Francisco Ribeiro de Andrada. – Manoel
de Junho de 1822, que acompanharão o decreto de 3 Jacintho Nogueira da Gama. – Barão de Santo Amaro.
de Junho do mesmo anno: são de parecer que a dita – José Arouche de Toledo Rendon. – José de Rezende
provincia eleja dous deputados, como representantes Costa.
seus na actuaI assembIéa, visto que pelos mappas Por haver quem fallasse contra elle, ficou adiado.
estatisticos não consta que o numero de homens livres O Sr. Presidente assignou para a ordem do dia:
lhe dê direito a maior representação: por esta occasião 1º O projecto sobre a apresentação de um tratado de
examinando as commissões o numero dos deputados educação. 2º O projecto sobre isenção de dizimos e
dados pelo Reconcavo, e vendo que por um lado decima na Bahia.
unidos estes deputados aos de Sergipe prefazem o Levantou-se a sessão ás 2 horas e meia da
numero concedido á provincia então formada das duas, tarde. – Manoel José de Souza França, secretario.
e por outro lado reconhecendo que a cidade ficava sem
representação, embora estivesse evacuada, e a maior RESOLUÇÕES DA ASSEMBLÉA
parte da sua povoação já votasse no Reconcavo, são
comtudo de parecer que a cidade da Bahia possa PARA MANOEL JACINTHO NOGUEIRA DA GAMA
eleger um representante.
Paço da assembléa, em 4 de Agosto de 1823. – Illm. e Exm. Sr. – A assembléa geral constituinte
Pedro de Araujo Lima. – Antonio Carlos Ribeiro de e legislativa do imperio do Brazil manda participar ao
Andrada Machado e Silva. – José Bonifacio de Andrada governo que precisa que lhe seja remettida uma lista de
e Silva. – José Ricardo da Costa Aguiar de Andrada. – todas as pessoas que percebem vencimentos do
Barão de Santo Amaro. – Martim Francisco Ribeiro de thesouro publico a titulo de pensões, gratificações,
Andrada. – Francisco Muniz Tavares. – Manoel Ferreira ajudas de custo, ou outra qualquer denominação, por
da Camara. – Manoel Jacintho Nogueira da Gama. avisos ou portarias das secretarias de estado, ou
Foi approvado. provisões do mesmo thesouro, declarando-se tambem
O Sr. Ribeiro de Andrada, como relator da quaesquer outros vencimentos que cada uma das
commissão de fazenda leu tambem o seguinte:
Sessão em 5 de Agosto de 1823 25

ditas pessoas receber por titulo legal. O que. V. Ex. conhecimento de causa; o tal livro não é feito por
levará ao conhecimento de S. M. Imperial. – Deus Montesquieu ou Rousseau, mas por um grande
guarde a V. Ex. Paço da Assembléa, em 4 de Agosto homem que além de ter mui vastos conhecimentos tem
de 1823. – José Ricardo da Costa Aguiar. demais a mais a qualidade de ser brazileiro, é o Sr.
João Severiano Maciel da Costa.
PARA LUIZ PEDREIRA DO COUTO FERRAZ Tenho mais uma carta particular em que se
dizem muitas cousas que me agradão; e eu quero que
A assembléa geral constituinte e legislativa do a assembléa saiba tudo; vi um viveiro de idéas que
imperio do Brazil manda participar a V. S. que tem devemos ter em vista para fazer o bem do Brazil, que é
resolvido que deve vir quanto antes tomar assento o que nos trouxe aqui.
neste augusto congresso e ter parte nos seus Santa Apollonia diz que se mandavão para os
trabalhos como deputado á mesma assembléa pela deputados da sua provincia 25:000$000; e que
provincia da Bahia. – Deus guarde a V. S. Paço da passarão do Tejuco 7,252 quilates de diamantes, de
assembléa, em 4 de Agosto de 1823. – José Ricardo que ninguem deu conta, mas que constão dos officios
da Costa Aguiar. que aqui estão.
Na mesma conformidade e data a José da Silva Este homem não nos convém que saia dalli;
Lisboa. devemos antes aproveital-o no lugar em que está; elle
não ha de levar para a sepultura as riquezas que tem;
SESSÃO EM 5 DE AGOSTO DE 1823. e por este modo ganha o imperador, ganha a
provincia, emfim ganha tudo.
PRESIDENCIA DO SR. BISPO CAPELLÃO-MÓR. Não quero tomar mais tempo á assembléa: eu
mando para a mesa as cartas e officios para que se
Reunidos os Srs. deputados pelas 10 horas da leião.
manhã, fez-se a chamada, e acharão-se presentes 67, Na assembléa se tem lido muitas vezes papeis
faltando por doentes os Srs. Pereira da Cunha, inuteis; e não se ha de chorar o bocadinho de tempo
Navarro de Abreu, Ferreira Barreto, Alencar, Carneiro que se gastar em ler o que escreveu um homem como
de Campos, Furtado de Mendonça, Carneiro e Maciel este.
da Costa. Aqui estão os dous mappas; um é mais perfeito
O Sr. Presidente declarou aberta a sessão, e do que o outro; fique a assembléa com elles; são
lida a acta da antecedente foi approvada. propriedade minha; mas já que eu não valho nada dou-
Foi á mesa a seguinte declaração de voto: os de propriedade á assembléa que fará delles o uso
Declaro que na ultima sessão votei para que que quizer.
não fosse a commissão alguma o Diario do Governo O SR. FRANÇA: – Creio que deve ir tudo como
accusado pelo Sr. Carneiro da Cunha. está para a commissão que se designar.
Paço da assembléa, 5 de Agosto de 1823. – O O SR. VELLOSO SOARES: – Como tenho
deputado Lopes Gama. fallado muito pouco, quero dizer hoje mais alguma
O SR. VELLOSO SOARES: – Peço a palavra cousa. Aqui tem-se mandado ler outras cousas mais
para fallar da entrega que tenho de fazer nesta insignificantes; portanto não chore a assembléa o
assembléa de uma cousa feita por mão habil, a qual bocadinho de tempo que gastar com estes papeis.
tenho escrupulo de conservar por tanto tempo em meu (Lerão-se.)
poder. O SR. FRANÇA: – Esses papeis devem ser
Quando me nomeárão para passar a Portugal remettidos á commissão de estatistica.
remetterão-me, estando eu no Rio de Janeiro, uns O SR. VELLOSO SOARES: O deputado de que
mappas estatisticos da provincia de Minas que me se trata é conhecido por um da primeira ordem; eu,
parecerão muito perfeitos. verdade é, não valho nada; em tudo lhe sou inferior,
Eu que vi logo de principio que nada ia fazer a isto é, em materia de conhecimentos, porque em
Portugal resolvi não ir, e por desconfiado não levei a materia de patriotismo não sou inferior a nenhum dos
surra que levarão os outros meus collegas e patricios; senhores: peço por isso que seja aceito com especial
felizmente escapei! agrado.
Correm os tempos, e escolhe o Brazil os O SR. ANDRADA MACHADO: – Seja recebido
membros para a sua assembléa legislativa braziliense desse modo por ser apresentado por um Sr. deputado;
e entre elles elege o Sr. Francisco Pereira de Santa mas não por ser do Sr. Santa Apollonia que não é
Apollonia que me tinha mandado os ditos mappas; elle deputado; é um simples cidadão emquanto não vier
me desculpará de os não ter enviado para Lisboa, e de tomar assento a assembléa.
os guardar para apresentar por mimo a esta O SR. PRESIDENTE: – Pergunto se a
assembléa, pois não sou ladrão de serviço alheio. assembléa approva que seja recebido com especial
Domingo passado me veio á mão um livro em agrado?
que vi louvado o Sr. Pereira de Santa Apollonia por um Decidiu-se que sim; e que se remettesse á
grande homem que não falla sem commissão de estatistica.
Annunciou-se que estava á porta do salão o
26 Sessão em 5 de Agosto de 1823

Sr. José da Silva Lisboa, deputado supplente pela pelos que depois de nós vierem, com uma approvação
provincia da Bahia; e sendo introduzido na fórma do e applauso igual ao enthusiasmo de bem servir á patria,
estylo, prestou juramento, e tomou lugar na assembléa. com que deliberamos agora em materia tão importante.
Passou-se á ordem do dia, continuando-se a Eu mando á mesa a emenda que fiz sobre este objecto:
discussão adiada na sessão antecedente, do art. 2º do
projecto para um tratado de educação. EMENDA
O SR. RIBEIRO DE ANDRADA: – Sr.
Presidente, quando na 1ª discussão se tratou deste Que se declare que os sete cidadãos nomeados
projecto eu disse á assembléa as razões que me para o exame dos tratados de educação sejão tirados
moverão a votar para que elle passasse á 2ª discussão. de pessoas de fóra, e de membros desta assembléa e
Tendo passado, e havendo-se já discutido o 1º artigo, e da comissão propria (Ao § 2º do projecto de 16 de
não sendo este 2º mais que uma consequencia Junho de 1823.) – O deputado Carvalho e Mello.
daquelle julgo que tambem não póde deixar de passar. Foi apoiada.
No 1º tratou-se do premio correspondente á obra O SR. RIBEIRO DE ANDRADA: – A commissão
de um tratado completo de educação physica, moral, e teve em vista, como já disse, haver um tratado de
intellectual para a mocidade brazileira, por se julgar educação physica, moral e intellectual, pelo meio que
necessario e conhecer-se a falta delle; agora neste aponta; e teve tambem em vista o não tolher a
trata-se do juiz do merecimento da obra; creio que não liberdade da assembléa na escolha das pessoas que
póde deixar de passar. devião encarregar-se do exame do tratado; por isso não
A commissão entendeu que devia marchar como declarou que fossem da assembléa ou de fóra.
costuma marchar a assembléa; e por isso julgou que o Entendeu porém que devião ser homens de
juizo daquelle trabalho devia ser encarregado a uma reconhecido patriotismo e litteratura, porque é
commissão de litteratos conhecidos. indispensavel ter os conhecimentos necessarios para
Nestes termos parece que nenhuma duvida póde ajuizar de cada uma das suas partes. Taes homens são
haver em que passe o art.2º... raros, e por isso julgou a commissão que a assembléa
O SR. CARVALHO E MELLO: – Trata-se, Sr. devia ser inteiramente livre na eleição delles.
presidente, da nomeação das pessoas que em O SR. ALMEIDA E ALBUQUERQUE: – Eu
commissão hão de julgar o merecimento dos tratados achava que era melhor incumbir o trabalho da
de educação, que vierem a concurso. nomeação á commissão de instrucção publica; parece-
Assenta-se, que se escolhão pessoas de fóra da me que a faria com mais facilidade, podendo
assembléa em quem concorrão as partes de bom igualmente escolher pessoas de dentro da assembléa,
saber, litteratura e juizo, para bem avaliarem o ou de fóra; é por isso que fiz a seguinte:
merecimento de cada um dos planos que se
propuzerem. EMENDA
Medida é esta mui acertada; mas parece que
conviria melhor ajuntar á nomeação dos cidadãos de Uma commissão composta de sete cidadãos
fóra da assembléa alguns dos membros deste nomeados pela commissão de litteratura, e approvados
congresso, e da commissão de instrucção publica. pela assembléa decidirá, etc.– Albuquerque.
Conheço que fóra da mesma assembléa ha Foi apoiada.
cidadãos instruidos, e que ao cabedal de lilteratura e O SR. RIBEIRO DE ANDRADA: – Que a
saber, ajuntão o amor da patria e desejos de que ella commissão de instrucção publica proponha a que ha de
prospere em diffusão de luzes, e conhecimentos, mas julgar do merito do tratado, póde ser; mas que seja a
não serão tantos quanto bastem; e convém que entrem commissão quem nomêe os individuos, não approvo.
no numero delles alguns membros da commissão de A assembléa deve conservar o poder de admittir
instrucção publica, os quaes forão primeiro designados por escolha sua as pessoas que julgar proprias para
pelos povos da sua provincia, e depois escolhidos, pelo este fim. Portanto proponha á commissão, se quizerem,
voto desta assembléa. mas que fique a assembléa com a liberdade que lhe
Desta arte se conseguirá, que o juizo sobre que compete.
assentar a proposta da commissão, seja formado por O SR. COSTA BARROS: – Sr. presidente, nós já
mais solidas bases, e terá esta assembléa outras mui temos na commissão de instrucção publica cinco
qualificadas e seguras para deliberar afinal sobre a pessoas capazes de julgar do merecimento deste
escolha do que ha de regular o bem geral da educação trabalho, resta-nos procurar duas para preenchermos o
nacional. numero de sete de que o artigo trata; e como é possivel
Sr. Presidente, quanto a este respeito fizermos, que fóra da assembléa existão essas duas pessoas
será marcado pelos nossos contemporaneos, e com tanta ou mais instrucção do que alguns dos
membros da commissão de instrucção publica, parece-
me conveniente
Sessão em 5 de Agosto de 1823 27

que fique ao arbitrio desta assembléa o poder approxima tanto ao seu ideal de perfeição, que a
nomear de fóra os ditos dous membros. Proponho tenha pela melhor possivel; e póde julgar que se
por esse motivo a seguinte: affasta do mesmo ideal, mas que tem muitas cousas
excellentes; no 1º caso a obra é digna do premio
EMENDA estabelecido; no 2º sempre merece contemplação.
Ora, isto é que em verdade se não acha bem
Os sete membros que devem compôr a concebido no artigo; e seria por isso talvez preciso
commissão de que trata o 2º artigo do programma acrescental-o... Lembro tambem que por algumas
sejão cinco os já nomeados pela assembléa para a emendas talvez se julgue prejudicado o artigo se
commissão de instrucção publica; os outros dous ellas se vencerem, mas eu penso que se devem
poderáõ ser nomeados ou de dentro ou de fóra da antes julgar prejudicadas as emendas por serem
assembléa. – Costa Barros. apresentadas fóra de ordem e de lugar.
Foi regeitada. O SR. ANDRADA E SILVA: – Quando se
O SR. VERGUEIRO: – (Não o ouvirão os julga do merecimento de qualquer obra, ainda que
tachygraphos.) appareção dous ou tres concurrentes, sempre se
O Sr. Rodrigues de Carvalho pediu a palavra e fórma o juizo pelo ideal da perfeição com o qual se
offereceu a emenda seguinte: compárão as obras apresentadas, para se escolher a
Ao art. 2º Em lugar de – cidadãos – membros. quem mais se approxima a elle; nem sei que se
– Rodrigues de Carvalho. tenha posto em programma algum de academia
Foi apoiada. artigo semelhante. Se apparece uma só obra, e
O Sr. Lopes Gama tambem offereceu a corresponde ao ideal de perfeição leva o premio, se
seguinte: não satisfaz em tudo, abraça-se o que se acha
melhor e regeita-se o que não se approva; o mesmo
EMENDA fará a commissão quando se apresente um só
tratado; examina-o, faz o seu relatorio e offerece-o á
Se até o fim do anno de 1824, fôr apresentado consideração da assembléa que se não achar nelle a
ao poder executivo o tratado de que faz menção o perfeição que se requer, mas cousas boas,
artigo antecedente, não estando já esta assembIéa conceder-lhe-ha as honras da impressão. Isto é o
em exercicio, aquella que se lhe seguir em qualquer que se pratica em todas as academias do mundo;
tempo preencherá o disposto neste artigo. – O nem ha necessidade de tal artigo; são miudezas com
deputado Lopes Gama. que ninguem se cansa.
Foi apoiada. O SR. RIBEIRO DE ANDRADA: – (Não se
Julgou-se a materia discutida, e passou-se ao entendeu o tachygrapho.)
art. 3º e ultimo do projecto. Julgando-se a materia discutida, propôz o Sr.
Art. 3º Não havendo concurrencia, e presidente:
apparecendo um só tratado, ainda assim verificar-se- 1º Se a assembléa dava por finda a 2ª
ha o premio determinado pelo § 1º se a commissão o discussão. Venceu-se que sim.
julgar digno de imprensa. 2º Se o projecto passava á 3ª discussão.
O SR. RIBEIRO DE ANDRADA: – Este art. 3º Venceu-se tambem que sim.
é uma ampliação do 1º. A commissão reconheceu Seguio-se a 2ª parte da ordem do dia, que era
quanto era difficil e espinhoso este trabalho, e a primeira discussão do projecto sobre a isenção de
suppoz por isso que talvez houvesse falta de dizimos e decima a favor dos habitantes da Bahia,
concurrentes, e que apparecesse um só tratado. offerecido pelo Sr. Montesuma na sessão de 29 de
Neste caso como a commissão não tinha a que dar Julho.
preferencia ficava manco o art. 2º, e para prevenir O SR. MONTESUMA: – A attenção com que
isto ajuntou este art. 3º em que se estabelece o que devo considerar tudo o que respeita á provincia que
deve fazer-se se apparecer um só tratado... me nomeou seu deputado, me determinou a propôr
O SR. ANDRADA MACHADO: – Diz o nobre este projecto, que tem por fim curar, por assim dizer,
preopinante que não se póde conhecer da as chagas dolorosas que lhe abrio o despotismo
preferencia não havendo concurrentes; mas, ainda militar das tropas lusitanas. Duvido porém que o
que os não haja sempre se póde conhecer se enche projecto satisfaça e por isso pretendo fazer-lhe
o fim a que se propõe, porque ha o ideal de perfeição algumas emendas. Considerei, depois de o ter
com o qual se pôde comparar, e com que realmente proposto, os inconvenientes que se seguirião se a
se comparão todas as obras. Logo, se a commissão isenção do pagamento de dizimos e decimas se
tiver esse ideaI da perfeição de um tal tratado, tem o verificasse nos annos comprehendidos nas
padrão bastante para a comparação do merecimento arrematações já feitas, e por isso quero estabelecer
da obra que se lhe offerecer. A commissão tem dous que sómente se não paguem no anno immediato
juizos a fazer; póde julgar que a obra se áquelle em que ellas terminão; de outro modo por um
lado se originarião demandas
28 Sessão em 5 de Agosto de 1823

que farião talvez gastar mais aos proprietarios do da renda publica, commettendo erros que talvez
que se não tivessem o favor da lei, e por outro seria sejão contra a mesma provincia.
necessario exigir da fazenda publica dinheiros já Estou bem persuadido de que os habitantes
recebidos, o que é sujeito a graves difficuldades: da Bahia merecem nossa contemplação, e
destas alterações resulta a suppressão do ultimo necessitão de soccorro: mas tambem estou
artigo. Quanto á conveniencia do projecto em geral persuadido de que esta assembléa, que sempre
creio que não será combatida, pois ninguem ignora procede com maduresa e sisuda circumspecção,
que aquella provincia tem soffrido todos os horrores sómente lhe dará, depois que tiver conhecimento dos
da guerra, e que os seus infelizes proprietarios e seus males, para poder applicar-lhes o remedio.
lavradores victimas das maiores calamidades, e Sabemos, que alguns dos lavradores e senhores de
reduzidos muitos delles á indigencia, precisão de fabricas de assucar soffrerão gravissimos prejuizos
algum beneficio. Se elles se unirão á causa do Brazil, com a guerra, que tão injustamente nos fizerão as
se elles sustentarão a guerra com suas propriedades tropas lusitanas, perdendo os seus engenhos,
e pessoas, como é possivel que a assembléa os não fazendas, e estabelecimentos: mas tambem
contemple, para lhes alliviar parte de seus males? sabemos, que outros os conservarão, por estarem
Mas talvez se diga que por isso mesmo que fóra do alcance do inimigo: e ainda que tivessem
acabão de uma guerra são estes impostos precisos prejuizos com a suspensão dos seus trabalhos
para as despesas, porque tirados elles acabão-se as ruraes, emquanto se prestavão com os seus
rendas, não é assim; a alfandega da Bahia é mui escravos e gados á defeza da provincia, como
pingue, e além do seu rendimento tem outros muitos fizerão; ainda que não achassem meios de
igualmente consideraveis. Emfim é necessario vender seus generos em razão da occupação da
favorecer sobretudo a classe agricola, da qual todos cidade, não póde haver comparação entre os males
sabemos os grandes interesses que resultão ao de uns e outros, e muito convém classifical-os, para
estado. receberem o competente remedio: é portanto
Chamo pois a consideração da assembléa extemporanea a providencia apontada, nem esta
sobre a sorte desgraçada daquella provincia, para assembléa póde entrar na boa distribuição de
que não se veja abandonada em paga de ter feito os soccorros, nem obter exactas informações.
mais penosos sacrificios para sustentar a causa que Demais semelhante proposta de suspensão do
todos temos jurado defender. pagamento de impostos, ainda que pudesse ter
Eu mando á mesa a minha emenda que é do lugar, sem que por isso faltassem os meios de
theor seguinte: satisfazer as indispensaveis despezas da provincia,
aproveitaria mais aos que menos soffrerão os
EMENDA estragos da guerra aos que conservarão seus
estabelecimentos, aos que continuarão seus
Art. 1º Não pagaráõ dizimos, e outros direitos trabalhos ruraes, aos que têm generos de sua
estabelecidos, as safras de assucar e demais industria, ou com facilidade os podem ter, sem de
productos da lavoura da provincia da Bahia no anno modo algum poder aproveitar aos que perderão, ou
seguinte ao em que terminarem os confractos em totalidade ou em parte, os seus estabelecimentos
nacionaes já feitos a este respeito. ruraes, e fabricas de assucar, e se achão sem
Art. 2º Que se mudem as palavras 1822 e edificios, sem escravos, sem gados, e sem meios de
1823 para 1824. emprehender novos trabalhos, com que possão ter
Art. 3º Proponho que se supprima este artigo generos, que fiquem isentos do pagamento dos
inteiramente. – O deputado Montesuma. impostos.
Foi apoiada. Não menos se oppõe a este projecto a falta,
O SR. NOGUEIRA DA GAMA: – Ainda que que por elle, haverá de meios para a satisfação das
este projecto mereça bastante contemplação, por despezas de uma provincia, que por tanto tempo
tender a alliviar os males dos habitantes de uma soffreu uma guerra, que necessariamente poria em
provincia, que soffreu os estragos da guerra, parece- muito máo estado as rendas publicas: eu mesmo
me, Sr. Presidente, ser extemporaneo, emquanto como ministro da fazenda, e por ordem do imperador
esta assembléa não tiver uma conta exacta e apresentei á esta assembléa um officio do governo
circumstanciada destes estragos, e do estado da da provincia da Bahia, em que dava parte de haver
fazenda publica da provincia da Bahia; emquanto aberto um emprestimo de quatro centos e tantos
não soubermos, quaes sejão os productos das contos de réis, para acudir ás indispensaveis
actuaes rendas, e quaes as despezas despezas, que tinha a fazer, e ao pagamento da
indispensaveis, não devemos supprimir, ainda que tropa, pedindo a approvação desta tão extraordinaria
temporariamente, alguns dos artigos que formão as medida: ora, se nós vemos este passo dado pelo
rendas da provincia, sem que vamos de encontro governo da Bahia, que só póde ser desculpado pela
aos principios da boa administração extrema necessidade de meios, em que se achava
como poderemos admittir sem prévias informações
Sessão em 5 de Agosto de 1823 29

qualquer proposta de diminuição das actuaes rendas destes predios? Aos que ficarão habitando nellas?
publicas? E como se póde ser obrigado a pagar dizimos
Embora se diga, que a deliberação desta de fructos que não se receberão?
assembléa seja temporaria, nisto mesmo julgo que Não se trata aqui, torno a dizer, de apresentar
vamos contra os bons principios: seria grande erro o um plano de finanças; lembro um expediente de
fazer leis provisorias relativas á fazenda publica. diminuir de algum modo os males da minha
(Muitos apoiados.) provincia, que se acha no maior estado de
Se os impostos apontados são oppressivos e abatimento, e precisa de novos recursos.
ruinosos; devem ser supprimidos em toda a extensão Não se trata de innovações; do que se trata é
do imperio, e não devem continuar, ainda que desta de dizer aos povos, não fação pagamentos que não
suppressão resulte grande diminuição da renda podem, e a que não devem ser obrigados.
publica, uma vez que immediatamente se A agricultura soffreu emtanto, e tambem os
estabeleção outras fontes de renda, que supprão proprietarios; alguns dos quaes despenderão quasi
uma tal falta: mas convém primeiramente discutir todas as suas rendas nesta guerra; e até os pobres
este objecto, que é de summa importancia, para soffrerão, cada um conforme suas posses e
marcharmos segundo os bons principios da mais circumstancias. Portanto a deliberação deve ser
bem entendida economia politica: se não são geral e abranger tanto o rico como o pobre e o da
oppressivos e ruinosos não vejo razão sufficiente classe média.
para a sua suspensão, e nem mesmo temporaria, Se nós tratassemos de uma lei de contribuição
como se tem proposto para a provincia da Bahia com aos vencidos, para serem resarcidas as despezas da
o fim de auxiliar os seus habitantes, esquecendo-se guerra, então tinha lugar o que disse o nobre
o illustre deputado que teve esta lembrança, da preopinante, isto é, saber os que merecerião maior
necessaria diminuição da renda pubIica da mesma compaixão; mas agora não se trata disto; o beneficio
provincia, e da desigualdade com que se de que fallamos é necessario que chegue a todos,
aproveitarião os seus habitantes de uma semelhante rico, pobre e médio, sem que seja preciso saber o
suppressão. que soffreu mais ou menos.
Se os honrados e dignos defensores da Passe pois o projecto á 2ª discussão, e o
independencia de uma tão preciosa parte do territorio illustre preopinante apresentará então as suas
do Brazil merecem, como se não póde duvidar, emendas para serem tomadas em consideração,
soccorro para repararem os estragos e prejuizos que mas não pretenda que o projecto se regeite, porque
soffrerão, todas as provincias do imperio, todos os isso seria o mesmo que não tomar esta augusta
que se honrão com o nome de brazileiros devem assembléa na devida consideração o estado em que
concorrer para reparar estes estragos e prejuizos, se acha aquelle infeliz povo.
não parecendo decoroso para o brio brazileiro o O SR. HENRIQUES DE REZENDE: – Sr.
deixar uma das provincias do imperio unicamente presidente, pensei que ficasse adiada a discussão
entregue aos seus proprios recursos. (Muitos deste projecto; mas, como se trata de votar, quero
apoiados.) motivar o meu voto.
O SR. MONTESUMA: – O illustre preopinante Tem-se dito que este projecto é extemporaneo
que acabou de fallar atacou o projecto, afim de que e injusto, e eu digo que elle é tambem ruinoso.
não passe á 2ª discussão e fique regeitado por Chamo-lhe ruinoso, porque irá dar aso a que muitos
algumas razões que expendeu, e ás quaes vou desejem muitas guerras no Brazil, porque têm a
responder. Eu acho que não póde prevalecer a ganhar e não a perder na guerra.
opinião do illustre preopinante; porquanto não Vai esta lei dispensar dous annos de dizimos á
tratamos de legislar sobre as finanças da provincia Bahia, em attenção aos prejuizos que soffrerão seus
da Bahia, tratamos de dizer ao povo, que não habitantes; e que succederá ? As fazendas que ficão
podendo pagar dizimos não os pague. mais remontadas, nada ou pouco perderáõ;
Eu estou convencido que os não pagão, e que concorreráõ com algum gado e algum comestivel, e
será talvez mais facil sequestrar tudo e tirar de cada muitas vezes á força, como disse um nobre
um delles quanto têm e ficarem nús, do que pagarem deputado; e por este pouco e forçado vinhão a
tanto o dizimo das safras, como a decima das casas. ganhar muito nos dizimos que não pagassem: isto é,
Confesso que não sei como se crê, que um tiravão vantagens da guerra, entretanto que aquelles
cidadão possa ser obrigado a pagar decima de uma cujos engenhos ficarão de fogo morto, nada têm a
casa, de que não recebeu renda! aproveitar, porque tão cedo não têm safras a colher,
Muitos dos proprietarios das casas da Bahia e, portanto, nem dizimos a pagar; e nestes termos
forão para o Reconcavo, e nellas ficarão habitando lhes não aproveitava esta lei, nem a outros muitos
os lusitanos, soldados, e paizanos. Uns fugirão para que perderão muito em bens, e que poucos dizimos
Portugal, e outros desgraçadamente para o Rio de darião.
Janeiro. Além disto era premiar áquelles que não só
Onde se ha de ir buscar o importe das rendas não se prestarão, ou o fizerão com muita
repugnancia,
30 Sessão em 5 de Agosto de 1823

mas até derão soccorros ao inimigo; não importando Sr. deputado neste caso compete o reciproco direito de
que fosse por influencia das autoridades ou por livre demandar ao supplicante.
vontade desses povos; o certo é que derão soccorros. Paço da assembléa, em 5 de Agosto de 1823. –
Se, pois, estes entrassem neste indulto, elles Pedro de Araujo Lima. – Antonio Carlos Ribeiro de
desejarião sempre uma guerra em que tudo ganhavão e Andrada Machado e Silva. – Francisco Muniz Tavares.
nada perdião. – Manoel Ferreira da Camara. – José Bonifacio de
E' tambem injusto este projecto, porque só Andrada e Silva. – José Ricardo da Costa Aguiar de
tiravão partido delle os agricultores, quando não só Andrada.
elles tiverão prejuizo; muitos artistas irião para o campo Ficou adiado por haver quem o quizesse
da batalha, muitos perderião seus haveres, e, impugnar.
entretanto, ficavão excluidos do bem da indemnisação O Sr. Carvalho e Mello, em nome da commissão
que tem em vista este projecto. de colonisação, civilisação e catechese dos indios, leu o
Digo, pois, que fique suspenso até receberem-se seguinte:
informações, que facilitem o meio de acudir só aos que
tiverão os prejuizos, e não a todos indistinctamente. PARECER
Julgando-se a materia discutida, propoz o Sr.
Presidente se o projecto passava á 2ª discussão. – A commissão de colonisação, civilisação e
Venceu-se que não, e ficou por isso regeitado. catechisação dos indigenas do Brazil, para começar e
Chegada a hora da leitura dos pareceres de bem dirigir a ordem dos trabalhos, de que está
commissões, leu o Sr. Araujo Lima, como relator da de encarregada, e que muito deseja adiantar e acabar,
constituição, os seguintes pareceres: entende que lhe é, primeiro que tudo, necessario ter
presente o estado em que ora se achão as providencias
PRIMEIRO determinadas nas cartas regias de 13 de Maio e 2 de
Dezembro de 1808 dirigidas ao governador e capitão-
A commissão de constituição, tendo em general da capitania de Minas-Geraes, bem como o das
consideração a indicação do Sr. deputado Carneiro da diversas aldêas estabelecidas nesta provincia, para á
Cunha, em que pedia examinasse ella o Diario do vista do resultado daquellas ordens, e da situação e
Governo n. 27, donde nascia alguma suspeita de circumstancias em que estiverem as cousas relativas a
querer-se inculcar sorrateiramente a união com este negocio, e dos planos que se têm apresentado e
Portugal e abandono da independencia do imperio, é de forem apresentados, poder formar trabalhos regulares
parecer que o dito Diario não constitue fundamento neste objecto de publica utilidade, cumprindo por estes
sufficiente a que a assembléa tome ulteriores motivos que a assembléa peça ao governo as
providencias; não deixa, comtudo, a commissão de illustrações necessarias a este respeito, exigindo-as
elogiar o zelo do illustre deputado, que sempre teve o das repartições competentes.
fim de avivar o ardor patriotico brasiliense, e o afinco á Igualmente são necessarias ao conhecimento da
independencia, sem a qual não póde este paiz commissão duas consultas da junta do commercio, já
prosperar. resolvidas, em que se ponderarão e decretarão
Paço da assembléa, 5 de Agosto de 1823. – providencias de semelhante natureza, ácerca das terras
Pedro de Araujo Lima. – Antonio Carlos Ribeiro de e estradas visinhas ao rio Doce, por se tratar ahi de
Andrada Machado e Silva. – Francisco Muniz Tavares. cousas analogas aos assumptos encarregados á
– Manoel Ferreira da Camara. – José Bonifacio de commissão, que requer se peção ao governo na fórma
Andrada e Silva. – José Ricardo da Costa Aguiar de acima ponderada.
Andrada. Paço da assembléa, 4 de Agosto de 1823. – Luiz
Foi approvado. José de Carvalho e Mello. – José Feliciano Fernandes
Pinheiro. – João Gomes da Silveira Mendonça. –
Segundo Manoel Rodrigues da Costa. – Antonio Gonçalves
Gomide.
A commissão de constituição, examinando o Decidiu-se que se officiasse ao governo na
requerimento de Marcos Thomaz de Oliveira em que conformidade do parecer.
requer poder continuar o curso de uma demanda que O Sr. Ribeiro de Andrada, como relator da
tinha com o Sr. Deputado Jacintho Furtado de commissão de fazenda leu tambem o seguinte:
Mendonça, vendo que a isso se oppõe o art. 179 do
cap.12 do regimento interno da assembléa, mas por PARECER
outra parte considerando que nenhuma injuria se faz a
quem quer e consente, é de parecer, que uma vez que A commissão de fazenda para dar o seu parecer
o Sr. deputado queira renunciar o direito adquirido pelo sobre o requerimento de Francisco Duarte Nunes fiel
dito artigo do regimento, possa continuar o supplicante pagador do thesouro publico, em que pede ser
a demanda pendente, e que ao dito aposentado com o ordenado por inteiro e providencias
para ficar desonerado do alcance que houve de seis
contos e oitocentos
Sessão em 6 de Agosto de 1823 31

mil réis, necessita que se mande vir a consulta do RESOLUÇÕES DA ASSEMBLÉA


conselho da fazenda, que foi resolvida, remettendo o
supplicante em ambas estas pretenções á deliberação PARA JOSÉ JOAQUIM CARNEIRO DE CAMPOS
da assembléa.
Paço da assembléa, 4 de Agosto de 1823. – Illm. e Exm. Sr. – A assembléa geral constituinte
Martim Francisco Ribeiro de Andrada. – Barão de e legislativa do imperio do Brasil, approvando o
Santo Amaro. – Manoel Jacintho Nogueira da Gama. – parecer das commissões reunidas de constituição e
José Arouche de Toledo Rendon. – José de Rezende estatistica, sobre o numero de deputados que devem
Costa. – Decidio-se que se pedisse ao governo a representar a provincia de Sergipe de El-Rei, como foi
consulta indicada. requerido, na qualidade de procurador, por Vicente
O Sr. Ribeiro de Rezende, como relator da de José Mascarenhas, manda participar ao governo que
poderes, leu, finalmente, este: tem resolvido que a dita provincia eleja dous
deputados para seus representantes nesta assembléa,
PARECER visto que pelos mappas estatisticos não consta que o
numero de homens livres lhe dê direito a maior
A commissão de poderes, examinando o representação. O que V. Ex. levará ao conhecimento
requerimento do Sr. Francisco Pereira de Santa de Sua Magestade Imperial. – Deus guarde a V. Ex. –
Apollonia, deputado nomeado pela provincia de Minas Paço da assembléa em 5 de Agosto de 1823. – José
Geraes, que pretende ser escuso de vir tomar assento Ricardo da Costa Aguiar de Andrada.
nesta soberana assembléa, em razão da avançada
idade de oitenta annos, e das graves molestias que PARA O MESMO
padece, o que tudo comprova com a certidão de seu
baptismo e duas attestações de professores, que junta, Illm. e Exm. Sr. – A assembléa geral
e com que verifica o deduzido em seu requerimento, e Constituinte e legislativa do imperio do Brasil,
que exporia a sua existencia, se, em uma idade tão approvando o parecer das commissões reunidas de
decrepita, emprehendesse tão dilatada jornada, e se constituição e estatistica, sobre o numero de
viesse residir no clima desta cidade, tão opposto ao deputados que deve eleger a cidade da Bahia, manda
patrio onde vive, é de parecer, que vistas tão participar ao governo, que considerando por um lado
justificadas razões lhe seja concedida a escusa que que os deputados já dados pelo Reconcavo da
pede, e que continue a ser substituido pelo 1º provincia da Bahia juntos aos de Sergipe de El-Rei
supplente, o Sr. Antonio Gonçalves Gomide, que já prefazem o numero concedido áquella provincia,
tem assento nesta assembléa, e que com as suas quando formada das duas, e por outro lado, que a
luzes bem conhecidas póde igualmente fazer grandes cidade da Bahia ficava sem representação, se não se
serviços á nação. augmentasse o dito numero tem resolvido que a
Paço da assembléa, 5 de Agosto de 1823. – referida cidade possa eleger um deputado para a
Estevão Ribeiro de Rezende. – Antonio Carlos Ribeiro representar neste congresso. O que V. Ex. levará ao
de Andrada Machado e Silva. – Manoel Jacintho conhecimento de Sua Magestade Imperial. – Deus
Nogueira da Gama. guarde V. Ex. – Paço da assembléa, em 5 de Agosto
Foi approvado. de 1823. – José Ricardo da Costa Aguiar de Andrada.
Não havendo mais leituras novas de pareceres,
entrou em discussão o da fazenda, sobre o SESSÃO EM 6 DE AGOSTO DE 1823.
emprestimo aberto na Bahia, para supprir as despezas
da tropa, cujo parecer ficára adiado na sessão PRESIDENCIA DO SR. BISPO CAPELLÃO-MÓR.
antecedente.
Houve sobre este parecer um longo debate, Reunidos os Srs. deputados pelas 10 horas da
como consta da acta desta sessão, mas nada manhã, fez-se a chamada e acharão-se presentes 68,
escreverão delle os tachigraphos. faltando com causa participada os Srs. Pereira da
O parecer ficou de novo adiado. Cunha, Ferreira Barreto, Andrada e Silva, Dias,
O Sr. Presidente assignou para ordem do dia: Ferreira Nobre, Furtado de Mendonça, Camara e
1º A continuação da discussão do dito parecer Maciel da Costa.
da commissão de fazenda. O Sr. Presidente declarou aberta a sessão, e
2º A 2ª discussão do projecto sobre a prohibição lida a acta da antecedente foi approvada.
de exercerem os deputados da assembléa outro algum O Sr. Secretario Costa Aguiar leu o seguinte
emprego durante a sua deputação. officio do marechal Joaquim de Oliveira Alvares,
3º A urgencia da materia do projecto de nomeado para membro da commissão de fóra de
revogação do alvará de 5 de Novembro de 1808, marinha e guerra:
relativo a boticarios. Illm. e Exm. Sr. – Por molestia grave, que até
4º Regimento da assembléa. me impossibilitou de escrever, não
Levantou-se a sessão depois das 2 horas da
tarde. – Manoel José de Souza França, secretario.
32 Sessão em 6 de Agosto de 1823

accusei a recepção da portaria de 16 de Julho supplente pela provincia da Bahia; e sendo


proximo passado, em que a assembléa constituinte e introduzido na fórma do estylo, prestou juramento, e
legislativa do imperio se servio mandar-me remetter tomou lugar na assembléa.
a relação dos membros da commissão de fóra de O SR. CARVALHO E MELLO: – Sr.
marinha e guerra, e o regulamento de seus futuros presidente, o parecer da commissão sobre a
trabalhos; bem como a da portaria de 26 do referido approvação do emprestimo que contrahio o governo
mez, em que a mesma assembléa me mandou da Bahia, e sua applicação, é tão sensato e justo,
participar a primeira juncção da commissão. Mais que me admiraria sobre maneira se elle não
alliviado tenho a honra de pôr na presença de V. Ex. merecesse a sancção desta augusta assembléa. O
para que suba ao conhecimento da assembléa, que governo fez no estado em que se achava a Bahia a
logo que cesse o impedimento, eu cumprirei com os melhor administração de fazenda e economia
meus deveres, quanto as minhas forças o publica; tinha de vestir a tropa que se achava na
permittirem. ultima nudez; tinha de pagar soldos a esses bravos e
Deus guarde a V. Ex. Rio de Janeiro, em 6 de briosos militares, que á ponta de bayoneta e a tiro de
Agosto de 1823. – Illm. e Exm. Sr. Manoel José de canhão afugentarão, e expellirão do solo brazileiro os
Souza França. – Joaquim de Oliveira Álvares. – portuguezes, e desaffrontarão a patria destes
Ficou a assembléa inteirada. encarniçados inimigos; tinha que reparar muitos
Deu tambem conta de uma felicitação dirigida outros males, que esta guerra intestina tinha
ao congresso pelos membros da junta administrativa produzido; não havia dinheiro nos cofres publicos; e
dos diamantes. – Foi recebida com particular agrado. lembrou-se então do recurso, que é obvio, e costuma
Passou-se á ordem do dia, que era, na 1ª praticar-se; contrahio o emprestimo de que se trata,
parte, a discussão do parecer da commissão de e negociantes se prestárão a fazel-o sem premio, na
fazenda sobre o emprestimo contrahido na Bahia: boa fé de acudirem assim á necessidade publica, e
cuja discussão ficára adiada na sessão antecedente, na esperança de serem pagos, porque não poderião
tendo sido o parecer apresentado na sessão de 4 do jámais duvidar de que a nação e os seus
corrente. administradores recuzassem approvar medida tão
O SR. MONTESUMA: – Eu creio que não justa como necessaria.
póde approvar-se tal qual o parecer da commissão, Eu disse, Sr. presidente, que o governo da
porque não vejo necessidade de se reconhecer por Bahia tinha feito a melhor operação de fazenda que
divida nacional a totalidade do emprestimo. Diz-se era possivel nestas circumstancias: contrahir em
que é preciso salvar o credito do governo; estou por caso de tanto aperto e urgencia um emprestimo
isso; mas approvando-se o emprestimo até a somma gratuito, não é remediar um mal que insta e aperta,
que se tiver arrecadado quando lá chegar a com o mais suave de todos os remedios politicos?
deliberação da assembléa, está salvo o credito. A Ninguem ouzará negal-o; porque em taes
Bahia forçosamente devia lançar mão de todos os apertos contrahil-o com juros e mingua no capital é
meios precisos para repellir os inimigos, e deve um bem, e os estados a cada passo o praticão
resarcir-se dos damnos causados por uma guerra quando as rendas não chegão, e ha deficit atrazado.
offensiva e deffensiva; mas a medida propria para se Accresce, que o governo fez de tal dinheiro o
verificar esta indemnisação não é a do emprestimo é emprego o mais justo e o mais louvavel.
uma contribuição militar; imponha-se esta sobre os Desapprovar tão justa medida seria impolitico e
nossos inimigos europêos, e tudo será pago. injusto: o governo deveria resentir-se de semelhante
Deste modo não se arrisca o credito das desapprovação: e os habitantes da Bahia, que tanto
autoridades constituidas, que se comprometterão têm soffrido pela causa publica, e tantas provas têm
para o emprestimo, e não se reconhece uma tão dado do seu patriotismo, estranharião de certo que
grande divida. se não approvasse, que se não curassem com este
Eu mando á mesa a emenda que fiz e que é balsamo salutar e benigno as feridas abertas
concebida nestes termos: daquella povoação que ainda gotejavão sangue.
Quanto porém se disse ha pouco sobre
EMENDA contribuição militar é materia estranha e alheia do
simples ponto de que trata o parecer da commissão.
Proponho que se approve tão sómente o Levantei-me por isso, Sr. presidente, para sustental-
emprestimo na quantia em que se achar realisado ao o pelos motivos referidos, e porque convém
tempo de chegar a resolução da assembléa; e sustentar a reputação e dignidade desta assembléa,
emquanto ao mais se imponha uma contribuição não desacreditando o governo da Bahia, que
militar sobre os que devem por direito soffrel-a. – O praticou no extremo em que se achou uma operação
deputado, Montesuma. de credito necessaria e justa.
Annunciou-se então que estava á porta da
sala o Sr. Luiz Pedreira do Couto Ferraz, deputado
Sessão em 6 de Agosto de 1823 33

Tudo quanto fosse ainda modificar esta O SR. SILVA LISBOA: – Sr. presidente,
approvação geral seria a meu ver uma injustiça, e o levanto-me para dar meus agradecimentos á esta
que se allega a respeito de se dever reputar augusta assembléa, tanto pela honra, com que se
contribuição militar o que não estiver ainda dignou mandar expedir ordem para vir tomar parte
verificado do emprestimo, entendo que se não deve nos seus trabalhos, como tambem pela quasi
adoptar, porque é faltar ao credito e á boa fé da unanimidade, com que na deliberação adiada para
convenção que contrahio o governo; porque não é hoje, se considerou justo e necessario o expediente
averiguado e decidido, que os que emprestárão do emprestimo que o governo provisorio da
devem ser comprehendidos na contribuição militar provincia da Bahia (a qual me elegeu para um dos
por seu máo comportamento, e porque este objecto supplentes da sua deputação) adoptou, e começou
é estranho ao ponto de que se trata e só póde ser a realizar, pela urgencia das circumstancias, credito
examinado e discutido por meio de uma indicação, do mesmo governo, o restabelecimento da
que deve propôr, se quizer, o illustre deputado autor confiança publica entre todas as classes de
da emenda. Em consequencia de quanto tenho cidadãos. Eu tambem, reconhecendo a força destes
expendido conclúo, que esta assembléa obra com principios, voto pela pura e simples approvação do
justiça e com exactidão approvando o que praticou parecer da commissão da fazenda a esse respeito,
o governo da Bahia. sem alguma das indicadas emendas.
O Sr. Presidente perguntou se se apoiava a Estando exhauridas as razões capitaes
emenda do Sr. Montesuma. – Não foi apoiada. allegadas pelos membros deste corpo legislativo,
O SR. VERGUEIRO: – Sr. presidente, eu que sustentarão o dito parecer com tanta clareza e
concordo em geral com o parecer da commissão, energia, com venia só addirei algumas razões de
mas não admitto a ordem em que estão dispostas congruencia. O governo da Bahia reconhece no seu
as deliberações. A commissão diz que se approve o officio a propria incompetencia para proceder á
emprestimo, e que o actual governo da Bahia medida do emprestimo, allegando a extrema
remetta as condições com que se contrahio, o necessidade deste recurso, para a satisfação e
estado de receita e despeza, e da sua divida activa supprimento indispensavel do exercito pacificador; o
e passiva, importancia de soldos, etc., para pleno que igualmente reconhece a commissão de
conhecimento da assembléa; e eu penso que fazenda.
devem vir primeiro as informações, e depois Não póde haver a menor duvida de ser essa
deliberar o congresso. prerogativa das attribuições, e uma das mais
E’ incontestavel que a esta assembléa importantes, do poder legislativo: devendo-se haver
pertence determinar taes emprestimos, mas para como a chave mestra do edificio constitucional.
isso ter lugar cumpre conhecer antes a urgencia de Sem duvida a assembléa, nem por sombra,
os contrahir; eu estou bem persuadido que este jámais ha de tolerar invasão deste seu direito de
abrio-se por necessidade, mas não quizera que se préviamente conhecer e decidir sobre a urgencia da
approvasse sem se justificar essa necessidade. Se causa publica, que legitime o tirar-se qualquer
o governo da Bahia tivesse proposto a precisão do porção da propriedade do povo, a titulo de tributo,
emprestimo, então podia approvar-se já, mas como ou emprestimo. Por isso não é estranho o zelo dos
só participa que o abrio, entendo que não deve ser poucos deputados, que se oppuzerão á approvação
approvado sem haver o preciso conhecimento das do parecer da commissão.
circumstancias que motivárão esta medida, bem Além de que, em geral, é saudavel a
que já possa dar-se a entender que ha de ser opposição que se faz nestes corpos politicos;
approvado segundo a grandeza da necessidade. mostrando a experiencia ser forte principio vital para
Para este fim offereço a seguinte: saude publica, ainda sendo feita contra medidas de
justiça ou equidade manifesta, afim de que a nação
EMENDA se convença que os seus interesses são
vigilantemente defendidos. Porém no caso de que
Proponho: 1º. Que se diga ao governo que se trata, sobre a irresistivel evidencia da precisão do
esta assembléa ha de approvar o emprestimo em emprestimo, a extraordinariedade das
questão no que fôr conforme á exigencia das circumstancias, e a distancia da côrte não admittião
circumstancias exigindo para final deliberação ser remedios demorados, tendo-se aliás o remedio
esta assembléa informada circumstanciadamente immediato, e que se proporcionava no paiz sem
1º, da necessidade do emprestimo para satisfação violencia pela solicitude do governo local.
da divida e despezas, 2º, da insufficiencia dos O effeito do emprestimo não só foi de
recursos ordinarios, 3º, das condições do beneficio ao exercito, tão digno da attenção da
emprestimo. assembléa pelos seus sacrificios, mas tambem aos
2º. Que se supprimão as expressões que habitantes da provincia, por dar movimento á
censurão o governo. – Vergueiro. estagnada circulação do paiz.
Não foi apoiada.
34 Sessão em 6 de Agosto de 1823

Affirmou-se que esta medida não fôra do governo, moderação e conciliação dos partidos divergentes
mas só do general do exercito. Isto não é em guerra civil ou estrangeira; tanto mais que, em
compativel com a letra do officio do mesmo taes calamidades, é difficilimo e quasi impossivel
governo: mas, dado que assim fosse, basta que discernir os inimigos resolutos e encarniçados, dos
fizesse seu o acto alheio, tomando a que só manifestarão apparente hostilidade, pelo
responsabilidade ao proprio cargo. Ainda que o justo temor do incerto exito do partido que afinal
facto procedesse inteiramente do general, ou sem prevaleceria, como bem notou um dos poetas
conselho e assenso do governo, a desapprovação latinos, descrevendo o estado de Roma invadido
da assembléa seria de pessimas consequencias, pelos carthagineses:
entretanto que a sua approvação immediata Ad confligendum venientibus undique Pœnis,
occasionará a mais aprazivel impressão no exercito, Omnia cum belli trepido concussa tumultu
e no povo, e no corpo do commercio; devendo em Horrida contremucre sub altis ætheris auris,
consequencia daqui em diante toda a provincia In dubio que fuit sub utrorum regna cadendum
olhar com summa confidencia para este augusto Omnibus humanis esset, terrá que marique.
congresso, como o assessor da fé publica, e LUCRECIO L. 3.º
providente reparador dos males da guerra. Tanto
mais que, supposto hajão cessado os damnos das Quanto mais que é certo que a maior parte
hostilidades pela fugida do inimigo, todavia, dos dissidentes da causa do Brazil procederão pelo
achando-se ainda pendente a grande lide do louvavel principio de patriotismo, que tambem os
imperio do Brazil, podendo sobrevir novos perigos, é brazileiros ostentarão ao principio, quando se
obvia a prudencia, que a politica dicta, para se dar proclamou a nova causa constitucional de Portugal
plena confiança ao general, a quem está entregue a e contra o qual só reclamarão quando se
defeza de tão importante porção do mesmo imperio. convencerão da perfidia dos dictadores das côrtes
Estamos em circumstancias de seguir o luzitanas.
grande exemplar do sabio governo de Roma nas Além de que é notado até por um moderno
crises do estado. Eis a formula da confiança do escriptor de Inglaterra no seu tratado das
governo ao eleito general: – Receba o exercito: no Harmonias da natureza, que o patriotismo dos
mais obre como entender a bem da republica. – Em portuguezes tem mui extraordinaria exaltação. Elle
monarchia regular, e muito mais na constitucional, é cita o facto de D. João de Castro, referido pelo
congruente o firme systema de confiança nas escriptor da Asia Portugueza, que depois de tantas
autoridades publicas, emquanto não se prova o victorias na India; só olhava para o seu solar de
abuso. Se não se autorisasse o emprestimo a Cintra.
pretexto das anomolias indicadas, sendo a principal Tambem nota que os judêos de Hollanda,
o não constar das condições a occorrerem identicas oriundos das familias expulsas de Portugal pelo
conjuncturas, a provincia, tão exposta á invasão terrivel intitulado Santo Officio, ainda pela tradicção
maritima, correria o risco de perdição. O estadista de seus maiores, têm tal predilecção á Portugal e a
não é mercador, que duvida e regatêa a cada grão e seu torrão natal, que delle têm mandado vir terra,
pesada. A virtual e essencial condição do que resguardão para com ella se enterrarem.
emprestimo subentende-se ser conforme á dos Estas cordas de coração são da natureza que
outros, que se têm feito no paiz pela mesma a politica não póde cortar. Camões já o disse no seu
fazenda nacional. Quanto á proposta emenda de poema das armas e varões assignalados:
substituir-se ao emprestimo o expediente da ....................... Não ha gloria tamanha
contribuição de guerra contra os dissidentes da Do que o ver patricio em terra estranha.
causa do Brazil e fautores dos inimigos, é Portanto harmonia e mais harmonia é o meio
inadmissivel por todos os principios da segurança mais efficaz presentemente da salvação geral e da
publica, e do reconhecido systema do nosso união de todas as partes integrantes do imperio do
augusto imperador, que, sem recahir sobre mim a Brazil.
nota de fazer panegyrico, é o genio da harmonia, O SR. FRANÇA: – A males extraordinarios,
manifesto em tantos factos notorios. remedios tambem extraordinarios. Tal é a indole ou
Nem a citada doutrina de Vattel tem natureza do emprestimo cuja approvação se nos
applicação; porque não se póde considerar a propõe.
invadida provincia como conquistado paiz Todos nós sabemos qual era a critica
estrangeiro, bem que miseravelmente apresentasse situação em que se achava a tropa brazileira do
o aspecto de paiz inimigo, por terem principalmente Reconcavo da Bahia empenhada na briosa luta da
os domiciliados luzitanos em grande parte expulsão da tropa portugueza que occupava a
sustentado o partido da causa de Portugal. capital daquella provincia; no que respeita a soldo e
Sem de modo algum justificar os seus mais fornecimentos das suas praças: falta de quasi
procedimentos, digo, que foi sempre de bom todo o preciso, é o que eu geralmente tenho ouvido
conselho politico, não se abusar da victoria e dizer.
ostentar E' pois nestas circumstancias que evacuada a
Sessão em 6 de Agosto de 1823 35

cidade de seus oppressores entra nella a mesma fallou, que elle tambem já tinha cingido a espada e
tropa brazileira e soffreria a humanidade e a justiça não era estranho neste negocio.
que logo e logo se não vestisse o soldado nú, que Eu não duvido que cingisse a espada, mas o
não achasse este, depois das suas arduas fadigas que vejo é que não entrou bem no conhecimento da
da guerra e de tantas privações, cumprido allivio de miseria da tropa, quasi sempre falta de sustento e
seus males no seio dos seus concidadãos! de todo o necessario, e muito principalmente em
Não certamente. tempo de guerra; quando bem se conhece a sua
Urgentes pois e mui imperiosas forão as triste condição não se duvida que deva ser prompto
circumstancias em que se o dito emprestimo esse seu acanhado pagamento, para ao menos
contrahio para vestir o soldado nú e pagar-lhe os trazel-os contentes com a pontualidade dessa
seus soldos que bem vencerão. bagatella por que servem.
A legitimidade do emprestimo esteve na lei da Eu não conheço nada mais duro do que
necessidade, que é a suprema de todas as leis; e derramar o soldado o seu sangue para manter a
illegalmente procederiamos se quizessemos nossa independencia e liberdade, e negar-se-lhe
chamal-o á dependencia das formulas ordinarias, ainda esse pouco que lhe é devido, ou demorar-lhe
com que aliás de ora ávante cumpre que sejão o seu pagamento quando nada mais têm do que
contrahidos taes empenhos da fazenda publica. essa migalha por que espera.
Por outra parte os mutuantes emprestarão o A commissão reconheceu pois a necessidade
seu dinheiro na boa fé de serem pagos; apezar de da providencia do emprestimo, porque não havia
que o credito publico esteja entre nós outro meio de supprir as despezas occasionadas
bastantemente abatidos pelos abusos do antigo pela guerra, a que era necessario occorrer sem
governo em materia de finanças. demora e este solido fundamento que faz, por assim
Não se diga pois que nós aggravamos a sua dizer, desapparecer a illegalidade da medida na
fraqueza e que os representantes da nação verdade tomada incompetentemente pelas
brazileira entendem pouco do muito que vale o autoridades que della lançarão mão, é para mim de
credito publico a bem do estado. Voto portanto pelo sobejo pezo para votar a favor do parecer da
parecer da commissão. commissão, que approvo nos mesmos termos em
Pague-se o que se deve e fiscalise-se o que que está concebido.
se gasta. Esta é a maxima que deve seguir um bom Julgou-se a materia discutida e posto o
governo. parecer á votação foi approvado.
O SR. ALMEIDA E ALBUQUERQUE: – Não Entrou-se na 2ª parte da ordem do dia que
posso deixar de approvar o parecer da commissão era a 2ª discussão do projecto de lei para não
pelas razões que se têm aqui expendido, que são exercerem os deputados da assembléa constituinte
as mesmas apontadas no parecer e mui sufficientes outro algum emprego durante o tempo da sua
para me decidir a concordar com elle. deputação.
Eu vejo que a lei da necessidade obrigou o O Sr. Secretario Costa Aguiar leu o artigo 1º,
governo a lançar mão daquelle meio; e feito este concebido nos termos seguintes:
ajuste seria vergonhoso não o ratificar. Art. 1º Os deputados á assembléa
Os pobres negociantes derão o seu dinheiro constituinte não poderáõ exercer qualquer outro
na boa fé e agora o que faltava era não se approvar emprego durante o tempo da sua deputação.
o emprestimo; supponhamos mesmo que a medida O SR. CARVALHO E MELLO: – Sr.
não era boa, ainda assim era preciso approval-a presidente, o art. 1º do projecto de lei que se
pelos seus uteis effeitos. discute, contém a doutrina de não poderem os
Voto portanto a favor do parecer que deputados desta assembléa exercer
considero fundado em mui justos principios. conjunctamente outro qualquer emprego durante o
O SR. COSTA BARROS: – Depois do que se tempo da sua deputação.
tem fallado nesta assembléa sobre esta materia O illustre autor deIle teve em vista a
pouco ou nada poderei accrescentar; todavia incompatibilidade que resulta de exercer um
sempre exporei as minhas idéas. deputado as funcções soberanas de legislador e ao
Todos sabem a necessidade com que se mesmo tempo as que pertencem a outro qualquer
contrahio o emprestimo e portanto o governo e o emprego, que por certo é inferior ao primeiro; teve
commandante da tropa obrarão como devião obrar, mais em vista, que aquellas funcções laboriosas e
mostrando este segundo que conhece o que são importantissimas absorverião todo o tempo, não
tropas e quanto convém não lhes faltar com o deixando lugar a poder se exercer com satisfação
preciso. dos deveres que lhe são inherentes, os trabalhos de
Eu creio ter ouvido aqui dizer na sessão de outro qualquer emprego.
hontem que a tropa bem podia esperar pela paga, Materia é esta, que julgo mais propria para se
accrescentando o illustre deputado que assim discutir e estabelecer no projecto de constituição; e
é o mais importante e o mais principal dos objectos
da nossa tarefa. Então se discutiráõ com maduro e
serio exame se convém que
36 Sessão em 6 de Agosto de 1823

se reunão em um deputado mais empregos e se nesta EMENDA


thése geral convém exceptuar algum pelo mesmo
interesse da causa publica. Art. 2º Não poderáõ outrosim aceitar no
Diversas instituições a este respeito têm os sobredito tempo emprego algum, salvo se competir por
codigos constitucionaes dos povos illuminados e livres, lei na carreira de suas profissões. – O deputado,
as quaes se hão de pezar ouro e fio na balança dos Araujo Vianna.
interesses, quando houver de estabelecer-se Foi apoiada.
constitucionalmente a mencionada regra. Julgou-se discutida a materia e passou-se ao
Emtanto porém julgou-se urgente, que para os artigo seguinte:
actuaes deputados houvesse esta decisão, para que Art. 3º Exceptua-se do 1º art. os actuaes
não se sobrecarregasse com diversos e penosos ministros e secretarios de estado e o intendente geral
deveres, a que não poderia satisfazer um honrado e da policia; e do 2º o caso extraordinario de se achar a
zeloso funccionario publico. patria em perigo.
Pesando como convém estas delicadas O SR. HENRIQUES DE REZENDE: – Por bem
considerações, tenho que o artigo deve passar como da ordem requeiro que se não falle contra a 1ª
se acha enunciado, para acautelar as consequencias excepção deste artigo por ser materia já vencida.
já expostas, uma das quaes é certamente muito Fallarão alguns Srs. deputados (de cujos
poderosa. discursos nada diz o tachygrapho) e depois pediu a
Eu não sei, Sr. presidente, como possa exercer- palavra o Sr. Montesuma e offereceu a seguinte
se outro lugar trabalhoso, que occupe tempo no exame emenda:
dos negocios e no seu expediente, exercendo-se o de Proponho que se supprima o artigo 3º. – O
deputado, que exige estudo e meditações, e occupa as deputado Montesuma.
manhãs do todos os dias. Não foi apoiada.
Tão convencido estou desta verdade, que pedi O SR. SILVA LISBOA: – Sr. presidente,
serventuario para o lugar da alfandega de que sou juiz parece-me ter lugar fazer-se excepção do emprego
proprietario, por julgar que era em mim incompativel dos deputados que seja compativel com as horas da
exercer ao mesmo tempo os dous empregos, e porque assembléa, mórmente não tendo commissão especial.
tive sempre muito pundonor em satisfazer quanto em Noto porém a excepção que se resolveu só em
mim cabe aos deveres de que me encarrego. favor dos actuaes ministros de estado, por parecer que
O SR. FRANÇA: – Por duas razões entendo contém parcialidade.
que não cumpre aos deputados da nação terem Entendo que a regra devia ser geral para todos
accumulação de exercicio das funcções de poder os ministros de estado, em todas as legislaturas;
executivo. porque são como procuradores do poder executivo
A 1ª é porque convém que a condição dos para defeza de suas prerogativas e assim vem a ser
mesmos deputados seja a mais independente possivel; como os laços da união e harmonia com o poder
sendo elles os fiscaes como devem ser da legislativo. Além de que a sua presença traz economia
administração publica em geral, para cujo bom de tempo, visto que logo podem informar á assembléa
andamento é mister que não sejão interessados nos sobre objectos do governo, que se possão e devão
abusos da mesma administração, que é necessario propalar sem as delongas e inuteis trabalhos de
corrigir. officios, com requisitorias e respostas. Esta
A 2ª é porque são incompativeis os trabalhos consideração, por si só, é de immensa vantagem.
diarios de um deputado com o exercicio de qualquer Dizia o celebrado physionomista Lavater, que
emprego do executivo. depois de Deus nada mais respeitava, que o tempo.
Se um deputado tiver grandes talentos não lhe Tem-se dito não convir a presença dos ministros na
faltará em que os empregue no seio da representação assembléa pela ingerencia de um poder no de outro,
nacional, em grande proveito da sua patria; nada se pelo influxo e perigo de intimidação nos votos, e
perde em o não divertir a outras funcções alheias do porque não poderião bem servir simultaneamente ao
seu alto ministerio. Esta é a minha opinião. povo, e ao monarcha.
Fallarão tambem os Srs. Araujo Vianna e Mas a sciencia politica ainda não mostrou o typo
Andrada Machado, mas não forão ouvidos pelo de perfeita divisão, e balança ouro fio, dos poderes:
tachygrapho Silva. sem duvida elles têm, por assim dizer, pontos
Julgou-se afinal a materia discutida e passou-se subintrantes na sua correlação. A regra da autoridade
ao 2º artigo do theor seguinte: de cada um a respeito de sua communicação é, e deve
Art. 2.º Não poderáõ outrosim ser nomeados no ser, modice confusa.
sobredito tempo para qualquer emprego. Assim é que se póde verificar a feliz
O Sr. Araujo Vianna pediu a palavra para redigir combinação que Tacito intitula – consociata reipublicœ
novamente este artigo com a seguinte fórma. Por este expediente póde haver a triade
harmonica sendo os poderes socios, e não inimigos,
Sessão em 6 de Agosto de 1823 37

para o bem da nação. A simples influencia dos E' portanto que eu requeri que se não fallasse
ministros não é compulsoria nos deputados. contra ella por ser materia vencida ha bem poucos
A fortaleza deve ser uma das virtudes cardeaes dias. Não é que eu queira que nenhum Sr. deputado
dos representantes do povo. Quem não tem coragem occupe outros lugares, mas é que eu quero que não
para arrostar a face dos ministros, não se assente na percamos a força moral, que não demos uma prova de
assembléa dos legisladores. A maioridade que decide, levianos.
se presume ter o valor necessario a resolver o que é Digo pois que deve ficar esta primeira
do interesse nacional. Sem duvida é natural, e de excepção, e que se supprima a segunda, porque a lei
razão, algum pendor dos ministros para a autoridade não deve de ante-mão suppôr esses casos
do monarcha, bem como o de cada deputado para os extraordinarios. Quando elles occorrem, então a
commitentes dos respectivos districtos; todavia, tendo assembléa tomará medidas tambem extraordinarias.
honra a perder, isto não obsta a que votem na Este é o meu voto e por isso offereço a seguinte
deliberação definitiva pelo que se mostrar ser do pról emenda:
commum. Parece-me portanto que nesta parte admitta Proponho a suppressão da segunda excepção
redeliberação a resolução da assembléa. que vem no terceiro artigo. – Henriques de Rezende.
O SR. HENRIQUES DE REZENDE: – Sr. Foi apoiada.
presidente, como eu fui o que requeri que se não O SR. SILVA LISBOA: – Sr. presidente, não me
fallasse contra a primeira excepção, cumpre-me convenci da razão do nobre membro que impugnou a
arredar uma suspeita que sobre mim quiz lançar um minha opinião, dizendo que seria leveza na assembléa
nobre deputado. alterar o resolvido Parece-me que não convém
Não se entenda que eu sou patrono da esquecer jámais a boa regra velha, que é do sabio
infallibilidade da assembléa, nem que tenha por mudar de conselho. Estou ainda na opinião que
inalteravel a bondade de uma cousa, mudadas mesmo manifestei, e que é sustentada, a meu vêr,
as circumstancias: o que ha é que eu sendo muito victoriosamente, não só pelo exemplo de Inglaterra,
coherente em meus particulares sentimentos, comtudo como tambem pela egregia dissertação que faz. Mr.
em minha conducta externa vou sempre conforme a Dumont, insigne commmendador de Bentham, na
geral opinião. Eu fui de voto que os Srs. deputados recente obra da Tactica das Assembléas. Quanto ao
não erão elegiveis para empregos, e depois votei que que disse o outro illustre membro Sr. Montesuma,
sendo eleitos, e aceitando, ficassem seus lugares fundado em Benjamin Constant, declaro que este
vagos na assembléa: mas ella decidiu tudo pelo escriptor não é o meu homem; pois ainda que sustente
contrario. a dita opinião, é pelo seu insidioso systema de fazer o
Coherente com esta decisão, eu votei contra a ministerio ter as attribuições do poder executivo,
urgencia deste projecto, mas a assembléa julgou que figurando ao monarcha constitucional mero poder
elle era urgente, e tratando-se agora deste terceiro neutro, que, no meu entender, viria a ser, a pretexto de
artigo, eu sou de voto que se não falle contra a sagrado e inviolavel, uma autoridade nulla.
excepção primeira nelle comprehendida, pela razão Sobre isto direi o que sentir quando se tratar de
que vou expender, e não porque eu goste. estabelecer na constituição a divisão dos poderes.
Sr. presidente, comquanto esta assembléa não Julgando-se discutida a materia propoz o Sr.
seja infallivel, ella deve comtudo sustentar as sua presidente:
decisões, uma vez que não appareça uma razão nova, 1º Se a assembléa julgava, concluida a 2ª
que se não havia previsto, porque do contrario seguir- discussão. – Venceu-se que sim.
se-hia o grande inconveniente de perdermos a força 2º Se o projecto passava a 3ª discussão. –
moral e a opinião, dando uma amostra de que Venceu-se que sim.
decidimos inconsideradamente e com precipitação. Por ser chegada a hora das indicações leu o Sr.
Ora, esta assembléa ha bem poucos dias Rodrigues de Carvalho a seguinte:
decidio que os Srs. deputados erão elegiveis e podião
servir ambos os lugares, em consequencia do que INDICAÇÃO
alguns senhores occupão o ministerio e outro o lugar
de intendente da policia; e como não apparece razão Proponho:
diversa para que elles larguem um dos lugares, seria a 1º Que a assembléa em nome da nação dê
assembléa inconsequente se tal mandasse agora. E’ agradecimentos e louvores ao commandante, officiaes
por isto que dizendo o art. 1º deste projecto, que e soldados da 1ª e 2ª linha, que compunhão o exercito
nenhum Sr. deputado poderá exercer outro emprego pacificador da Bahia, tanto pelo valor e constancia com
durante o tempo da deputação, estes senhores serião que pugnarão até obrigar as tropas inimigas a evacuar
destituidos se a primeira excepção do artigo 3º não a cidade, como pelo pacifico comportamento com que
passasse. se houverão na entrada.
2º Que se estabeleça uma medalha para
38 Sessão em 6 de Agosto de 1823

condecorar esses defensores da patria e assignalar apresentada a esta assembléa, não apparecendo
seus honrosos feitos, autorisando-se o governo para assignatura reconhecida, nem do representante nem
determinar o padrão, legenda, fita, etc., e marcar as dos accionistas.
differenças que devem haver entre as graduações 2º Que alguns dos artigos dos referidos
dos officiaes pelo numero e perigos das acções. estatutos são pouco conformes com a mente
3º Que o governo convide os cidadãos daquella lei organica.
honrados para se levantar um monumento na praça 3º Que na conformidade do art. 7º § 2º da
da Piedade, da cidade da Bahia, á memoria dos mesma, a approvação de taes sociedades competia
cidadãos que morrerão no campo da batalha, á junta administrativa das minas, que para este
defendendo a santa causa da nossa independencia. effeito se devia crear.
4º Que ás viuvas dos que perecerão se 4º Que bem que esta junta se não instalasse,
conceda o soldo de seus maridos ou o que lhes todavia esta parte das suas funcções foi
competiria se fossem da tropa da 1ª linha, havendo expressamente regulada no art. 1º dos estatutos que
muita contemplação com os filhos até que cheguem acompanhão a carta regia de 12 de Agosto de 1817
á idade de 18 annos. em que se ordena que estas sociedades devem ser
5º Que as tres villas da Cachoeira, Santo estabelecidas debaixo da autoridade do governador
Amaro e S. Francisco gozem de titulos honorificos, e capitão-general da provincia. Portanto é de
em premio de serem as primeiras que se unirão para parecer, que este negocio não compete a esta
proclamar na provincia a independencia do imperio. assembléa.
– 6 de Agosto de 1823. – O deputado Rodrigues de Paço da assembléa, 5 de Agosto de 1823. –
Carvalho. João Gomes da Silveira Mendonça. – José Teixeira
Houve discussão entre os Srs. Andrada da Fonseca Vasconcellos. – Diogo Duarte Silva.
Machado e o autor da proposta, da qual nada se Foi approvado.
entende do tachygrapho Possidonio.
O Sr. Henriques De Rezende pediu que se Segundo
fizessem extensivas estas providencias ás outras
provincias do imperio que estivessem em iguaes As commissões reunidas de commercio,
circumstancias. agricultura, industria e artes, e a de marinha e
O Sr. Xavier de Carvalho pediu a palavra para guerra, virão o requerimento de José Simpliciano de
ler a seguinte: Souza Barreto, em que pede uma ajuda de custo
para estabelecer em grande uma fabrica de selins
INDICAÇÃO rasos á maneira dos inglezes, tendo em vistas servir
com elles utilmente a remonta da cavallaria, e
Proponho que os louvores dados pela igualmente sustar a exportação de immensas
assembléa ao commandante e exercito que operou sommas de numerario, que por este artigo levão os
contra os inimigos na Bahia sejão extensivos ás estrangeiros.
provincias que generosamente concorrerão com As commissões observão que este ramo de
contingentes. – Xavier de Carvalho. industria não é novo e nem particular ao supplicante,
Sendo requerida a urgencia da indicação do antes muito vulgarisado já pelos correeiros que a
Sr. Rodrigues de Carvalho foi apoiada e vencida; igual titulo reclamarião a mesmo graça: que o meio
assim como tambem foi approvada a do Sr. Xavier mais seguro para estancar a introducção de artigos
de Carvalho, e decidiu-se que fosse tudo remettido á estrangeiros é produzil-os melhores em qualidades e
commissão de legislação. preço; o que só se deve esperar com o tempo do
Passou-se aos pareceres das commissões, e incremento das luzes e consequente progresso da
o Sr. Silveira de Mendonça por parte da de industria nacional. Portanto é o seu parecer que a
agricultura e commercio, leu os seguintes: pretenção do supplicante não tem lugar.
Paço da assembléa, 4 de Agosto de 1823. –
Primeiro João Gomes da Silveira Mendonça. – José Arouche
de Toledo Rendon. – Pedro José da Costa Barros. –
A' commissão de commercio, agricultura, José Teixeira da Fonseca Vasconcellos. – Diogo
industria e artes, foi presente a pretenção de Antonio Duarte Silva. – Manoel Jacintho Nogueira da Gama.
de Avila Bitancourt requerendo a aprovação de uns Foi approvado.
estatutos, que apresenta em dez artigos, para a Leu mais o mesmo Sr. deputado a seguinte
organisação de uma companhia de accionistas, que proposta da dita commissão de commercio:
se destinão á exploração e excavação de minas de
ouro, na conformidade do alvará de 13 de Maio de PROPOSTA
1803 e estatutos que acompanhão a carta regia de
12 de Agosto de 1817. A tal respeito notou a A commissão de commercio, agricultura,
commissão: industria e artes considerando a gravidade, a
1º Que esta pretenção foi incurialmente importancia e vasta extensão de cada um dos
Sessão em 6 de Agosto de 1823 39

seus ramos e o diminuto numero de seus membros, de Campos, que os supplicantes contractadores
propõe o seguinte: Manoel dos Santos Pereira & C.ª pedem se declare
1º Que se augmente o numero de seus valioso e subsistente, fazendo-os nelle reempossar,
membros. eu já dei o meu parecer como conselheiro da
2º Que para auxiliar os trabalhos se nomêem fazenda na consulta a que se procedeu pela
commissões de fóra relativas a cada um dos seus denuncia offerecida por Joaquim José Gomes da
ramos. Silva e Castro, que com pretextos de dolo na
Paço da assembléa, 10 de Julho de 1823. – arrematação destas sizas, e lesão da fazenda
João Gomes da Silveira Mendonça. – José Teixeira publica pretendeu, depois de ter já decorrido mais de
da Fonseca Vasconcellos. – Diogo Duarte Silva. um anno da arrematação, que esta se declarasse
Consultada a assembléa approvou-se a nulla, e se lhe conferisse a renda das mencionadas
proposta, devendo ser feita a nomeação da sizas por um preço mais do duplo que forão
commissão de fóra pela commissão de dentro, mas arrematadas: ou se lhes concedesse a administração
confirmada pela assembléa. com 5 por cento, promettendo fazer sempre seguros
O Sr. Secretario Costa Aguiar leu o parecer da para a fazenda publica quarenta contos de réis no
commissão de fazenda sobre o requerimento de triennio. E tão convencido estava eu da justiça com
Manoel dos Santos Pereira & C., cuja discussão que votei, e do parecer de todo o conselho, unanime
ficára adiada na sessão antecedente. em sustentar o contracto que me encheu da maior
O SR. FRANÇA: – Trata-se no parecer, sorpreza a resolução que teve este negocio.
segundo ouvi, de um contracto celebrado em fórma Por isso muito me lisongeio com a occasião
entre a fazenda publica e um rendeiro, a quem por que se me proporciona de apresentar em publico os
decreto ou resolução de consulta se invalidou e principios que me dirigirão nesta materia, e á vista
annullou depois o mesmo contracto, estando elle já delles esta augusta assembléa com a sua
de posse da renda. costumada imparcialidade e sabedoria resolverá se
Sejão quaes forem as razões de direito que eu insisto na minha opinião, conformando-me com o
houvessem para se annullar o dito contracto, as parecer da commissão, por amor proprio, ou por ser
quaes bem creio que haverião, é um procedimento ella firmada em fundamentos inabalaveis.
que resabe ás violencias do antigo governo Não é preciso ser profundo jurisconsulto para
despotico, preterir as formulas salutares da justiça, reconhecer á primeira vista a impossibilidade moral
annullando-se um contracto por decretos do poder de se dissolver sem consentimento da outra parte
executivo. contractante a venda deste ramo da renda publica,
A fazenda publica personalisada em que havia já adquirido a sua perfeição legal, pelo
contrahente deve religiosamente observar os pactos mutuo consenso dos contractantes sobre o preço e
com o cidadão contrahidos, salvas as excepções por cousa vendida; muito mais estando já este contracto
direito estabelecidas, cujo conhecimento pertence ao em execução por ambas as partes, e por isso em
poder judiciario, guardada a fórma do processo termos de não ser dissolvido, nem mesmo pelo
prescripta pela lei: quero dizer, se a fazenda publica mutuo dissenso. Pelo que só o dolo poderia annular
foi lesada, deve o procurador della legitimamente esta venda ou a lesão enorme a rescindir.
autorisado reclamar a lesão em juizo contradictorio Examinemos pois se nesta arrematação se
com citação e audiencia da parte interessada na verifica algum destes vicios. O denunciante não
acção: e só por sentença do mesmo juizo cumpre ser mostrou, nem mesmo allegou que houvesse conloio
pronunciado o seu bom direito de reclamação. Dir- da parte dos arrematantes, nem que a junta da
se-ha que o dolo é manifesto, que o damno é fazenda da provincia do Espirito-Santo, perante
evidente, e a causa publica privilegiada. quem se fez a arrematação, deixasse de a fazer com
Respondo que a causa publica mais as formalidades legaes; quer porém que a junta
importante que ha na sociedade de um governo procedera dolosamente no orçamento para
constitucional é guardar as formulas tutelares da determinar o justo preço do contracto; porque em vez
justiça, á sombra das quaes repousa o direito do de ser calculado pelo rendimento médio do triennio
cidadão aliás indefeso. Isto por uma parte: por outra proximo antecedente, como elle entende, fundando-
parte não concebo como a evidencia do dolo, e se no decreto de 14 de Novembro de 1803, a junta
malicia que houve n'um contracto possa tirar o direito foi procurar o rendimento médio de nove annos ou
de ser ouvido o contractador em sua defesa: e é de tres triennios.
realmente o que se praticou annullando-se o Porém nisto enganou-se redondamente o
contracto em questão por um decreto do poder denunciante, e bem mostra que não leu o decreto, ou
executivo; voto pois pelo parecer da commissão; se o leu, não o entendeu, nem tem idéa da natureza
porque o contrario encontra as regras da justiça. da renda de que se trata. 1º O decreto trata somente
O SR. CARNEIRO DE CAMPOS: – Sr. das rendas em fructos, e
presidente, sobre este contracto das sizas da villa de
S. Salvador
40 Sessão em 6 de Agosto de 1823

a siza não se paga em fructos, mas sim em dinheiro: se provém de terem por má intelligencia, ou malicia
2º. Se o denunciante entendesse o decreto, percebido rendimentos, que não sendo
reconheceria que este se acha em perfeita contemplados no seu contracto lhes não podião
contraposição ao que elle se propõe a demonstrar. O competir; pois só no primeiro caso poderia ter lugar a
denunciante assevera que a junta fixou um preço acção rescisoria, e não no segundo, que
médio muito baixo, porque em vez de formar o seu comprehende lucros absolutamente alheios do
calculo sobre a renda do triennio proximo ao contracto.
contracto, tomou por base nove annos: e o decreto Com estes rendimentos cobrados
entende que calculando-se sobre mais annos do que abusivamente é que se figura o excessivo interesse
os tres mais proximos seria tão exorbitante o preço que têm os contractadores obtido deste contracto, e
médio que embaraçaria as arrematações, e para não elles induzirão ao denunciante a fazer os seus
desanimar os lançadores, manda que nas rendas em grandes e francos offerecimentos, na esperança de
fructos o orçamento do preço se faça sempre pelo do que ao menos uma boa parte delles lhe caberia.
triennio proximo ao contracto. Portanto na Não fallando das dolosas avenças que alguns
supposição do decreto, mais diminuto deveria sahir o rendeiros de relaxada consciencia praticão nas sizas
preço da siza se fosse calculado sobre o triennio de pagamentos a prazos, verificou-se que os
proximo, e fosse esta renda da mesma natureza da contractadores das sizas de campos, talvez por má
que trata o decreto: 3º. E' bem diversa a renda em intelligencia do seu contracto, cobravão a siza não só
fructos da siza; aquella é quasi sempre regular, do preço dos bens de raiz mas tambem dos moveis e
porque tudo que depende em grande parte das utensilios que a estes erão annexos, autorisando-se
forças productivas da natureza segue sempre uma com uma provisão que, não sei por que principio
norma constante; nisto as anomalias são tão raras justificado, pois tem de encontro a lei, assim o
que jámais devem entrar em linha de conta: os mandou praticar na Bahia na venda de um engenho.
annos de esterilidade não succedem uns aos outros, A cobrança de taes sizas, quando tenha lugar,
e o mesmo se observa nos de superabundancia; a (pois eu não admitto interpretações extensivas em
natureza compensa sempre a escassez com a impostos) jámais podia competir aos supplicantes
liberalidade da terra. Donde se vê que o calculo contractadores; porque no contracto que com elles
sobre os tres annos proximos das rendas desta celebrou a junta da fazenda da provincia não podia
natureza, póde dar sem inconveniente um entrar um rendimento proveniente de uma provisão,
rendimento médio justo e proporcionado ao dos tres que aquella junta não fôra intimada, nem della tinha
annos subsequentes que se vende. Não acontece o noticia; mórmente sendo o contracto celebrado com
mesmo na renda das sizas, que de sua natureza é as mesmas condições, com que anteriormente se
nimiamente inconstante. Procede esta renda das havião arrematado no conselho da fazenda as sizas
vendas dos bens de raiz e escravos ladinos, estas desta provincia do Rio de Janeiro, e nesta
vendas são tão eventuaes, que póde mui bem arrematação certamente não entrarão semelhantes
acontecer que em annos successivos hajão muitas, rendimentos.
n'outros mui poucas e até nenhumas; e não se Eis-aqui o motivo porque o conselho da
verificando a regularidade de que se encontra fazenda, posto que considerasse os interesses dos
infallivelmente nos fructos, muito bem procedeu a contractadores muito superiores ao preço da
junta tomando um periodo mais amplo do que o do arrematação, não entendeu que esta se devia
triennio, porque naquelle encontraria annos rescindir; porque tendo estes interesses avultados
prosperos que compensarião os mingoados ou pelos rendimentos estranhos ao contracto pela
nullos, e neste acharia ou todos prosperos ou abusiva cobrança delles não se podia dizer lesivo um
escassos, e se arriscaria a fixar um preço mui baixo, contracto, que reduzido aos seus justos termos fazia
que prejudicasse a fazenda publica, ou mui alto que desapparecer todos esses excessivos lucros, que em
afugentasse os lançadores: 4.º Finalmente não se tão pouco tempo houverão os contractadores, e não
póde arguir a junta de calcular sobre nove annos, deixando de prover aos interesses da fazenda
não só porque segundo fica demonstrado o decreto publica que administra, lembrou que devião ser
não é applicavel á siza, mas porque sendo a junta intimados os contractores para reporem o que
subordinada immediatamente ao thesouro publico, perceberão, já por virtude daquella provisão, já pelas
não podia deixar de obedecer á uma provisão, que reprovadas avenças, na parte que excedesse no
este lhe expedira para assim o praticar. triennio arrematado, no caso de se provar legal e
Quanto á lesão enorme, para não se competentemente, que taes avenças se praticarão.
confundirem cousas bem distinctas, cumpre Pelo que se a resolução se conformasse com
examinar, se esse avultadissimo rendimento, que se a consulta, respeitaria os direitos dos contractadores
diz terem recebido os contractadores, procede do e zelaria os interesses da fazenda; mas
que justamente lhes toca, em virtude do seu desgraçadamente não aconteceu assim; o ministro
contracto, e condições com que o ajustarão, ou que a aconselhou e a referendou consultou
Sessão em 6 de Agosto de 1823 41

sómente o grande zelo com que promove a o negocio, e não o remetteria ao governo por
arrecadação das rendas publicas e os interesses do consulta, aonde só aconselha, dá parecer, e não
thesouro, e fascinado pelas promessas do julga, nem decide.
denunciante, concorda com o conselho na parte que Tambem não houve, como se affirma, um voto
diz respeito ás restituições lembradas, e com separado de um dos conselheiros, e quando o
injuridica, injusta, impolitica e anti-constitucional houvesse não faria regular a decisão que teve este
decisão, manda terminar o contracto, dal-o por negocio. A consulta está na mesa, e o illustre
acabado no segundo anno do triennio, declarando-o preopinante que assevera que houve um voto
dolosamente celebrado, contra o parecer unanime do separado póde facilmente reconhecer o seu engano,
conselho. querendo tomar o trabalho de a ler; pois então
Sim, senhores, esta decisão é injuridica, achará que esse conselheiro concordou com o
porque se o contracto foi celebrado dolosamente, conselho, quanto á subsistencia do contracto, e
como se assevera, então se devia declarar nullo reposições que devião fazer os contractadores;
desde o principio, e não o fazer subsistente até ao sómente se separou na parte em que o conselho
segundo anno: injusta, porque fundando-se em falsa entendeu que o denunciante havia procedido de má
causa offende desapiedadamente o direito que fé, e accrescentou que a junta da fazenda da
tinhão os contractadores ao rendimento de mais de provincia do Espirito Santo merecia ser severamente
anno, que ainda restava para acabar o tempo da sua reprehendida pelo desleixo, que mostrara em não ter
arrematação: impolitica porque abala a fé da hasta vedado a arrecadação que fazião os contractadores,
publica, e o credito da fazenda nacional. na fórma da provisão expedida á Bahia, que não fôra
Quem jámais quererá contractar com a contemplada no contracto. Portanto insisto no meu
fazenda publica, depois de tão injusta e arbitraria voto, conformando-me inteiramente com o parecer
decisão? Como se manterá o credito do thesouro da commissão.
nacional, se por uma simples resolução do governo, (Fallarão tambem os Srs. Ribeiro de Andrada
por uma deliberação ministerial, sem audiencia da e Vergueiro, mas nada se pôde colligir do que
outra parte contractante, dá-se por acabado antes de escreveu o tachygrapho.)
preenchido o tempo um contracto legalmente Por dar a hora ficou de novo adiada a
celebrado, aperfeiçoado, e até já posto em execução discussão.
por mais de um anno? E’ finalmente anti- O Sr. Presidente assignou para a ordem do
constitucional, porque se neste contracto occorrião dia:
suspeitas de dolo, ou indicios e mesmo provas de 1º A nomeação dos novos membros para a
lesão enorme, competia ao poder judicial, e não ao commissão de commercio.
governo, o conhecimento e decisão deste negocio. O 2º A continuação do debate sobre a urgencia
governo ingerio-se n’um poder alheio, e cortou um do projecto de revogação do alvará de 5 de
nó, que sem difficuldade se desataria pelo poder Novembro de 1808, relativo a boticarios.
competente. 3º Segundas leituras de propostas.
Tenho ouvido fallar em privilegios da fazenda Levantou-se a sessão ás 2 horas e meia da
publica, para justificar a resolução, e arredar a idéia tarde. – Manoel José de Souza França, secretario.
da ingerencia do poder judicial. Os privilegios da
fazenda publica, como já advertio o illustre deputado RESOLUÇÕES DA ASSEMBLÉA
o Sr. França, consistem em ter o seu juizo privativo,
e uma fórma particular, com que são processadas as PARA JOSÉ JOAQUIM CARNEIRO DE CAMPOS
suas causas, mas não autorisão a confusão de
poderes; se tal privilegio ella tivesse, deveria caducar Illm. e Exm. Sr. – A assembléa geral
logo que se abraçou o systema constitucional, como constituinte e legislativa do imperio do Brazil manda
incompativel com uma fórma de governo, que participar ao governo que, para começar e bem
essencialmente exige a mais distincta separação de dirigir a ordem de trabalhos de que está encarregada
poderes. a commissão de colonisação, civiIisação, e
Diz-se que houve processo, tanto peior, catechisação dos indigenas do Brazil precisa de
porque se houvesse processo foi juiz o governo, e informações tanto sobre os resultados das
decidio sem citação nem audiencia da parte. Não providencias determinadas nas cartas regias de 13
confundamos os termos, ninguem nunca chamou de Maio e 2 de Dezembro de 1808 dirigidas ao
processo judicial ás informações e exames, á que governador da capitania de Minas-Geraes, como
um tribunal manda proceder, para dar o seu parecer sobre o estado das diversas aldêas estabelecidas
com pleno conhecimento de causa; ora, isto é o que naquella provincia; e que lhe sejão remettidas duas
praticou o conselho da fazenda, exercendo consultas da junta do commercio, já resolvidas, em
jurisdicção voluntaria, porque se exercesse a judicial que se ponderarão e derão providencias de
ou contenciosa, então outros serião os termos, o semelhante natureza
conselho decidiria
42 Sessão em 7 de Agosto de 1823

ácerca das terras e estradas visinhas ao Rio-Doce. O de comparecer neste augusto congresso, resolveu,
que V. Ex. levará ao conhecimento de S. M. Imperial. – deferindo á representação de V. S. na conformidade do
Deus guarde a V. Ex. Paço da assembléa, em 6 de parecer da commissão de poderes dispensal-o de vir
Agosto de 1823. – José Ricardo da Costa Aguiar tomar parte nos seus trabalhos, como deputado pela
d’Andrada. provincia de Minas-Geraes, continuando a ser
substituido o seu lugar pelo primeiro supplente que já
PARA MANOEL JACINTHO NOGUEIRA DA GAMA tem assento nesta assembléa. O que participo a V. S.
para sua intelligencia. – Deus guarde a V. S. Paço da
IIIm. e Exm. Sr. – A assembléa geral constituinte assembléa, em 6 de Agosto de 1823. – José Ricardo
e legislativa do imperio do Brazil manda participar ao da Costa Aguiar de Andrada.
governo que, para deliberar sobre o requerimento de
Francisco Duarte Nunes, fiel pagador do thesouro SESSÃO EM 7 DE AGOSTO DE 1823.
publico que pede ser aposentado com o seu ordenado
por inteiro, e providencias para ser desonerado do PRESIDENCIA DO SR. BISPO CAPELLÃO-MÓR.
alcance de seis contos e oitocentos mil réis, precisa
que lhe seja remettida a consulta do conselho da Reunidos os Srs. deputados pelas 10 horas da
fazenda, em cuja resolução se ordenou que recorresse manhã, fez-se a chamada e acharão-se presentes 66,
o supplicante á esta assembléa. O que V. Ex. levará ao faltando com causa participada os Srs. Pereira da
conhecimento de S. M. Imperial. – Deus guarde a V. Cunha, Martins Bastos, Gondim, Ribeiro de Rezende,
Ex. Paço da assembléa, em 6 de Agosto de 1823. – Ferreira Barreto, Andrada e Silva, Dias, Furtado de
José Ricardo da Costa Aguiar d’Andrada. Mendonça, Cavalcanti de Lacerda, Rodrigues da Costa
e Maciel da Costa.
PARA O MESMO O Sr. Presidente declarou aberta a sessão, e
lida a acta da antecedente foi approvada.
Illm. e Exm. Sr. – A assembléa geral constituinte O Sr. Secretario Costa Aguiar leu os seguintes
e legislativa do imperio do Brazil, approvando o parecer officios do ministro dos negocios do imperio:
da commissão de fazenda sobre o officio do actual Illm. e Exm. Sr. – Havendo a camara da villa de
governo provisorio da provincia da Bahia, de 17 de Santa Maria de Baependy representado a Sua
Julho deste anno, relativo ao emprestimo de Magestade o Imperador a necessidade de se crear
quatrocentos e quarenta e quatro contos quatrocentos uma nova comarca do Rio Verde para maior utilidade
e cincoenta e sete mil oitocentos sessenta e sete réis, dos habitantes das tres villas, que deve comprehender,
que se abrira para satisfazer ás extraordinarias e que são: a referida de Baependy, da Campanha da
despezas originadas das calamidades da guerra: tem Princeza e de S. Carlos de Jacuhy, ficando a 1ª
resolvido que, por esta vez sómente, se approve e considerada cabeça de comarca. O mesmo augusto
reconheça por divida nacional o referido emprestimo, senhor me ordena que remetta a V. Ex. para ser
entrando a commissão, que na cidade da Bahia se presente na assembléa geral constituinte e legislativa
incumbio de o promover, no thesouro daquella deste imperio, a mencionada representação da dita
provincia com as quantias que fôr arrecadando; e que o camara, afim de decidir sobre aquelle objecto o que
mesmo governo provisorio remetta sem perda de julgar conveniente.
tempo á repartição dos negocios da fazenda o estado Deus guarde a V. Ex. Palacio do Rio de Janeiro,
da receita e despesa da provincia, e da sua divida em 5 de Agosto de 1823. – José Joaquim Carneiro de
activa e passiva, o total dos soldos, etapes e Campos. – Sr. José Ricardo da Costa Aguiar. –
vestuarios, devido á tropa, e as condições especiaes Remettido ás commissões reunidas de constituição e
com que foi aberto o dito emprestimo, para que a estatistica.
assembléa possa, á vista de tudo, e com plena Illm. e Exm. Sr. – Em cumprimento das ordens
instrucção, deliberar o que convier tanto em particular á que pela secretaria de estado dos negocios do imperio,
promoção e complemento do mesmo emprestimo, se expedirão ás differentes autoridades e repartições
como em geral ao bem futuro da mencionada provincia. publicas, afim de serem transmittidas á assembléa
O que V. Ex. levará ao conhecimento de S. M. Imperial. geral constituinte e legislativa deste imperio as
– Deus guarde a V. Ex. Paço da assembléa, em 6 de convenientes informações sobre escolas e
Agosto de 1823. – José Ricardo da Costa Aguiar de estabelecimentos litterarios. Sua Magestade o
Andrada. Imperador me ordena que remetta a V. Ex. para serem
presentes na mesma augusta assembléa a consulta
PARA FRANCISCO PEREIRA DE SANTA APOLONIA inclusa da mesa do dezembargo do paço, e o officio do
director da aula de botanica desta côrte, e do seu
A assembléa geral constituinte e legislativa do jardim correspondente, que forão entregues na
imperio do Brazil, tomando em consideração os mencionada secretaria de estado.
motivos allegados por V. S. para ser dispensado
Sessão em 7 de Agosto de 1823 43

Deus guarde a V. Ex. Palacio do Rio de de 36:828$030 e no de 1820 a de 45:136$460, que


Janeiro, em 5 de Agosto de 1823. – José Joaquim progredira a não ser a retirada de el-rei para
Carneiro de Campos. – Sr. José Ricardo da Costa Portugal.
Aguiar. – Foi remettido á commissão de instrucção Esta simples exposição basta para mostrar a
publica. barbaridade de ligar com penas um vendedor para
Illm. e Exm. Sr. – Havendo a mesa do não poder minorar no mercado o preço de seu
dezembargo do paço consultado sobre a genero que eu liberalmente franquearia no projecto
representação do governo provisorio da provincia de se a multiplicidade dos medicamentos, e a sua venda
S. Paulo, em que requeria que todo o ferro fabricado muitas vezes incumbida a pessoas faltas de
na fundição de S. João de Ypanema fosse isento dos instrucção, e de inteireza me não induzissem a pôr
direitos de sahida para fóra da mesma provincia, e um limite aos preços, que exigissem: eu sei que em
dos de entrada em outras. Sua Magestade o contrario se allega que esta absurda providencia é
Imperador me ordena que remetta a V. Ex. para ser para que os boticarios não falsifiquem ou troquem as
presente na augusta assembléa geral constituinte e drogas e possão por isso apromptar os remedios por
legislativa deste imperio a mencionada consulta, menor preço, suppondo-se que só podem ser
visto pertencer-lhe a decisão do objecto de que trata. perfeitos sendo compostos das do excessivo preço
Deus guarde a V. Ex. Palacio do Rio de do regimento, como se tivessem um preço fixo, e não
Janeiro, em 5 de Agosto de 1823. – José Joaquim fossem susceptiveis das variações do mercado,
Carneiro de Campos. – Sr. José Ricardo da Costa como qualquer outro genero?
Aguiar. – Foi remettido á commissão de fazenda. Quem não vê a futilidade desta razão? De que
Passou-se á ordem do dia, e tratou-se em servem as visitas das boticas e as pesquizas feitas
primeiro lugar da eleição dos 4 membros para a pelos delegados na physicatura-mór?
commissão de commercio; e procedendo-se á Quem não antevê que o espirito do alvará foi
votação sahirão eleitos os Srs. Silva Lisboa com 60 estabelecer o monopolio forçando todos os boticarios
votos, Maciel da Costa com 42, Carvalho e Mello a regular-se segundo o interesse dos que fizerão o
com 44, Vergueiro com 37. regimento?
Seguio-se a 2ª parte da ordem do dia, que era Portanto, Sr. presidente, eu considero o meu
a continuação da discussão da urgencia de projecto como da maior urgencia, attentos os
competencia do projecto para a revogação do alvará grandes damnos, que resultão da observancia do
de 5 de Novembro de 1808, sobre os preços das alvará de 5 de Novembro de 1808.
drogas das boticas. (Veja-se a sessão de 18 de O SR. CARVALHO E MELLO: – Sr.
Junho.) presidente: Trata-se da urgencia do projecto em
O SR. REZENDE COSTA: – Eu não tenho, Sr. questão, em que se pretende abolir o alvará de 5 de
presidente, novas razões que accrescentar ás que Novembro de 1808, no qual se estabeleceu o preço
dei no meu projecto para que se revogasse o alvará dos medicamentos para os boticarios, e propõe-se
de 5 de Novembro de 1808 que manda observar o regulamentos novos para esta materia. Fallarei
regimento que regula os preços das drogas e primeiro da urgencia, e depois farei algumas
medicamentos dos boticarios, e lhes commina pena reflexões sobre a materia.
de pagarem o dobro do abatimento que fizessem nos O juramento que prestámos foi para se fazer a
preços nelle estabelecidos. lei constitucional, que ha de servir de codigo
Ninguem ignora, Sr. presidente, os fundamental da nação brazileira, primeira obrigação
desmarcados preços que forão arbitrados no que nos impuzerão os nossos constituintes; e além
regimento e porque são vendidos nas boticas: uma da constituição sómente aquellas reformas urgentes
prova incontestavel, e já por mim exposta, é a que e necessarias.
temos no thesouro publico, cujo presidente A urgencia e a necessidade consiste em que
conhecendo a exorbitancia porque erão vendidos as cousas que se pretendem reformar contém
nas boticas os remedios para as enfermarias dos abusos e damnos taes que cumpre logo remediar
criados e criadas do Sr. D. João VI e rainha de afim de que se não continuem a seguir prejuizos á
Portugal mandou arrematar o seu supprimento a sociedade. Quem não vê, Sr. presidente, que a
quem por menos o fizesse; o mesmo boticario da materia proposta não é desta natureza? Basta
casa real se offereceu a fazel-o com o abatimento de encaral-a para se conhecer, que não é este objecto
cincoenta e seis por cento dos preços estabelecidos da natureza daquelles, em que convém desde já
no regimento, que foi feito por elle mesmo, como me entender.
confessou, e que regula em todo o imperio do Brazil; A taxa é geralmente desprezada por todos que
arbitrio em que de modo algum devia ter parte como entendem da theoria dos preços: em economia
interessado no alto preço pelo grande supprimento politica são elles sempre relativos á abundancia ou
que tinha de fazer á casa real, pelo qual se pagou no falta dos generos, e á maior ou menor exigencia
thesouro publico no anno de 1818 a quantia de delles; seguindo-se disto o maior ou menor valor,
25:248$855, no de 1819 a que elles vêm a ter no mercado.
44 Sessão em 7 de Agosto de 1823

Os boticarios compõem os seus remedios de deixemos cada um vender os seus generos


grande quantidade de diversos simples, que fazem conforme as circumstancias do tempo: ha muitos
vir da Europa e Asia, e por diversas circumstancias boticarios onde se podem ir provêr os que necessitão
póde haver ora abundancia, ora falta, e eis aqui de suas drogas, as mais das vezes perniciosas pela
como póde uma vez valerem mais, e outras vezes impericia dos que as receitão, e por ignorancia e
menos, e como poderá nestas circumstancias taxar- fraude dos que as fabricão.
se um preço certo e regular, nem convém pratical-o. Emfim é claro, que não ha principalmente
Quando um só homem póde fazer um urgencia, e tanto bastava para não entrar em
monopolio de generos de primeira necessidade em discussão o projecto de que se trata.
um paiz pequeno, e onde não ha concurrentes, então Quando fôr tempo opportuno se tratará esta
convirá fazer algum regulamento para que se não materia com as considerações de que é digna,
torne o vendedor monopolista, e tire partido das estabelecendo-se então doutrina geral e ampla, em
precisões dos consumidores, que só têm aquelle que conformidade do que tenho exposto, e a inspecção
lhes offerece os provimentos. que demanda objecto de tanto interesse, e a saude
Aqui ha immensos boticarios e talvez de publica.
sobejo. A regra neste caso, que é natural e O SR. ANDRADA MACHADO: – Sr.
praticamente seguida é, que cada um vai compraI-os presidente, eu tambem voto contra a urgencia; mas
onde lhes dão os remedios melhores e mais baratos. se me servisse dos principios que acaba de expôr o
Eu creio, que desta superintendencia resulta um illustre preopinante tiraria por conclusão que era
grande perigo á saude publica. urgente o projecto.
Podem mesmo os pharmaceuticos, para Se o systema de taxação é tão iniquo, o aIvará
darem os remedios por menos preço substituir uns onde elle se acha estabelecido deve revogar-se; e he
remedios aos outros ao seu arbitrio para chegar-se de urgencia destruiI-o. Assim o entendeu o nobre
ao preço da taxa: póde mesmo substituir um genero autor do projecto, e o propoz pelas mesmas razões
inferior a outro posto que da mesma natureza, como, de que se serviu o illustre preopinante para votar
por exemplo, usando da quina do Brazil em lugar da contra a urgencia. O que eu acho, Sr. presidente, é
do Perú, e eis-aqui um remedio, que não enche as que não devemos estender a marteIIo as urgencias...
vistas do professor que o receitou. Se nós fossemos a revogar todas as leis
Segue-se de quanto tenho dito, que pelo podres serião precisos immensos projectos: o alvará
menos não ha necessidade, e menos urgencia de se é em verdade uma peste, contrario aos principios
fazer mais uma lei: porque não havendo necessidade mais vulgares de economia politica, e até mui
é sempre um córte na liberdade do cidadão, e peior singular na sua disposição, porque é novo impôr
quando ella póde ser prejudicial. penas a quem quer vender por menos; marcar preço
Eu sei, Sr. presidente, que o illustre para se não vender por mais, entendo eu; mas para
preopinante por zelar muito os interesses da fazenda se não vender por menos, é uma lembrança exotica
publica lembrou-se deste projecto por que houve um só digna do reformador que a teve. Todavia, em
boticario, que se offereceu fazer por menos 50 por iguaes circumstancias estão outras muitas leis; e nós
cento os remedios para os hospitaes. Mas póde por não podemos remediar já todos os males; alguma
ventura deduzir-se deste facto, que outros o poderião cousa ha de ficar para os que vierem depois de nós.
tambem fazer pelo mesmo preço? O SR. RIBEIRO DE ANDRADA: – Levanto-me
Não póde por certo tal affirmar-se; porque para sustentar a urgencia. O alvará de que se trata é
ainda prescindindo dos abusos de que já fallei póde cheio de absurdos de tal natureza que a sua
muito bem acontecer, que motivos particulares o disposição altera a marcha geral da venda dos
pudessem pôr nas circumstancias de poder dar os generos. Toda a nossa legislação abunda do
remedios por menos, já porque tivesse os de mais absurdo das taxas; mas taxar o genero para se não
valor em abundancia, e quizesse dar-lhe consumo, vender por menos é mais que absurdo; prohibir ao
ou por outras quaesquer causas de interesse proprio. proprio dono da cousa que a possa dar por preço
O remedio para semelhantes males não está no inferior á taxa, creio que ainda não lembrou a
estabelecimento das taxas; não diminuamos muito o legislador nenhum. Ouvi dizer que o arbitramento do
preço em uma materia na qual a mão avarenta do alto preço das drogas se fizera para evitar
fabricante póde regular com perfidia, e damno da falsificações; mas quem não vê que os que falsificão
saude publica, os seus interesses: não nos são os velhacos, e que estes sempre o fazem em
intromettamos a pôr taxa, de que pódem zombar os ambos os casos, não servindo o alvará senão para
pharmaceuticos: não ponhamos a saude publica nas lhe dar mais lucro, emquanto elles vão vendendo
mãos da fraude: gato por lebre, como lhe é facil com qualquer
conhecimento de chimica.
Sessão em 7 de Agosto de 1823 45

Portanto se nada ha tão absurdo como este alvará, é adoptada essa até o fim seria supprimido. – Venceu-
urgente que se revogue, para evitar que continuem a se que sim.
reger suas extravagantes disposições. Entrou depois em discussão o art. 105,
Julgou-se a materia discutida; e posta á tambem adiado na mesma sessão do 1º de Agosto.
votação a urgencia, ficou regeitada. O SR. CARNEIRO DE CAMPOS: – Sr.
Passou-se á 3ª parte da ordem do dia, isto é, presidente, eu creio estar bem lembrado do que ha
ás 2ª leituras; e o Sr. secretario Costa Aguiar leu o estabelecido sobre esta materia. Na 1ª discussão se
projecto sobre a fórma, de se passarem as cartas trata do projecto em geral, e póde cada um dos Srs.
aos alumnos da academia medico-cirurgica desta deputados fallar duas vezes; e na 2ª e 3ª debate-se
côrte, proposto pela commissão de saude publica na por artigos, com a differença de se poder na 3ª
sessão de 2 do corrente. tambem discutir em geral; entendendo-se que nas
O Sr. Presidente perguntou se a materia era duas ultimas são relativas a cada artigo as vezes
digna de deliberação. Venceu-se que sim, e por isso permittidas para fallar.
se ordenou que fosse impresso para se distribuir, e Portanto nós não podemos emendar o que já
entrar em discussão. se acha vencido; pelo menos é feio estarmos a fazer
O Sr. Secretario Costa Aguiar pediu a palavra uma cousa hoje e outra amanha. Não olhemos tanto
para ler o seguinte officio do ministro dos negocios para o tempo que se gasta para que saião as cousas
da guerra: com perfeição; antes nos devemos regosijar, e dar
Illm. e Exm. Sr. – Levei á presença de S. M. o por bem empregado o que gastarmos em cousas
Imperador o seu officio de 2 deste mez; e manda o bem acabadas. As pressas nas decisões dos
mesmo senhor, que eu responda a V. Ex., para ser negocios só servem para que saião mal pensadas, e
presente á assembléa geral constituinte e legislativa o damno que disto resulta é irreparavel.
do imperio do Brazil, que no anno de mil oitocentos e O SR. ANDRADA MACHADO: – Estou
dezesete marcharão para o sul setecentos e onze admirado de não ver considerar a questão no seu
praças de tropas milicianas da provincia de S. Paulo, verdadeiro ponto de vista. Do que se trata é de
formando tres corpos de cavallaria; dous com o titulo assentar se as vezes que na 2ª e 3ª discussão
de – Voluntarios de milicias a cavallo – e outro com o podem fallar os Srs. deputados se devem continuar a
titulo de – Voluntarios reaes da Curitiba – os quaes entender de cada artigo em especial; eu digo que
tendo feito muito bons serviços, achão-se fazendo não, e não vejo que disto se siga o mal que apontou
parte do exercito que bloqueia a praça de o illustre preopinante. Se o deputado vier preparado
Montevidéo, onde existe ainda guarnição lusitana. para poder fallar sobre cada um dos artigos, tendo
Deus guarde a V. Ex. Paço, em 7 de Agosto estudado, como deve, a materia, não ha o
de 1823. – João Vieira de Carvalho. – Sr. José inconveniente que se teme, porque mui bem
Ricardo da Costa Aguiar. discutido fica o projecto fallando-se em geral na 1ª
Foi remettido á commissão de guerra e discussão, e dizendo-se depois na 2ª o que se
marinha. entender sobre o 1º, 2º, 3º artigo, e indo assim
O SR. PRESIDENTE: – Como ainda falta enfiadamente expondo-se razões sobre todos elles:
muito para a hora da leitura dos pareceres de Esta foi a mente dos autores do regimento, e
commissões, continuemos a discussão dos artigos até o contrario é um grande absurdo. Decidiu-se
do regimento. comtudo este absurdo, que é o mesmo que querer
O Sr. Secretario Costa Aguiar leu o art. 114 eternisar os projectos. Quando se diz que se falla
com a emenda do Sr. Montesuma offerecida na enfiadamente pelos artigos não se estorva ao
sessão do 1º de Agosto, em que ficára adiada a deputado o dizer o que lhe parecer sobre elles;
discussão do mesmo artigo. assim como onde nada achar que dizer, póde calar-
Depois de breves reflexões e julgando-se se, porque tambem não se força ninguem a fallar.
discutida a materia, propoz o Sr. presidente: Mas se as vezes que póde fallar um deputado se
1º Se o artigo passava tal qual. – Venceu-se julgão relativas a cada artigo, então temos perda de
que não. tempo sem nos resultar bem algum. Um projecto fica
2º Se a 1ª parte do artigo passava com a 1ª muito bem analysado logo que os Srs. deputados
parte da emenda, isto é, com as palavras aquellas têm direito de fallar trez vezes na 2ª discussão a
que forem mais amplas e depois as menos amplas. – respeito de todos os artigos; e segundo o que está
Venceu-se que sim. vencido temos o grande mal de se multiplicarem as
3º Se passava a 2ª parte da emenda. – Não tres vezes concedidas para fallar pelo numero dos
passou. artigos, durando assim os projectos uma eternidade,
4º Se o resto do artigo desde as palavras e sem proveito. Esta
46 Sessão em 7 de Agosto de 1823

foi, como já disse, a mente dos redactores do deve limitar-se este numero a duas vezes em cada
regimento; nem vejo que isto se não dedusa discussão. Eu confesso que em algumas discussões
claramente da letra do artigo. O que eu entendo é tenho fallado mais; mas será muito conveniente
que este methodo exige boa comprehensão; mas evitarmos este abuso; e por isso offereço a seguinte:
quem a não tem não venha ser deputado.
O SR. CARNEIRO DE CAMPOS: – Se é EMENDA
absurdo, os illustres autores do projecto o
produzirão. O que é que se pratica na 2ª discussão? Proponho que se supprima a 2ª parte do art.
Lê-se um artigo; versa sobre elle o debate; e depois 105, substituindo-se-lhes – cada um dos deputados
pergunta o Sr. presidente se está sufficientemente poderá fallar duas vezes sómente em cada uma das
discutido esse artigo para se passar ao seguinte; ora, discussões; o que dever-se-ha entender mesmo no
se sem esta pergunta se não passa adiante, como se caso de ser adiada a materia. – O deputado,
ha de fallar de uma vez sobre o 2,º 3,º 4,º 5,º e os Montesuma.
mais que tiver o projecto? Se quando se propõe; á Foi apoiada.
discussão qualquer projecto, se lê um só artigo, O SR. ALMEIDA E ALBUQUERQUE: – Eu de
parece-me claro que sobre elle unicamente se ha de nenhum modo posso concordar com a pratica
fallar; isto é tanto assim que tenho visto aqui muitas estabelecida. Quero que seja livre aos Srs.
vezes quando algum Sr. deputado ataca um artigo deputados o fallar no projecto em geral, ou em cada,
mais em baixo, levantar-se outro e dizer – este não é artigo em particular. Não acho razão alguma para se
o objecto de que se trata agora, isso pertence a tal fallar em um só artigo sem se poder fallar em outro
artigo. ou em outros; quero que esteja o projecto todo em
Disse o nobre deputado que esta pratica discussão, porque então fallarei em geral ou no
nascia de se ter decidido um absurdo: mas eu não artigo que me convier. Fallando sobre o projecto todo
supponho que a assembléa seja capaz de adoptar vou fazendo as minhas reflexões com ordem; e até
absurdos: se o ha, provêm dos autores do regimento, isto me parece mais simples. Sendo assim póde
segundo o qual pondo-se em discussão um só artigo, permittir-se o fallar-se tres vezes. E’ como entendo
estou inhibido de fallar em outro qualquer; e se o que deve praticar-se.
fizer fallo fóra da ordem. O SR. RODRIGUES DE CARVALHO: – Sr.
O SR. ANDRADA MACHADO: – Como só se presidente, na 1ª discussão trata-se sómente da
diz, mas não se mostra, que o absurdo se dedusa do utilidade ou inutilidade do projecto, e mais nada: mas
regimento, não me canso a responder; direi só que não é assim na 2ª discussão porque então é licito
uma cousa é votar e outra discutir; fazendo-se a aos Srs. deputados fallar por artigos e fazer a elles
devida differença entre estes dous actos, não se as suas observações; mas porque não hão de os
póde achar absurdo no que está estabelecido no Srs. deputados dizer logo o que têm a observar, para
regimento; da pratica é que elle nasce, e contra ella se não fazerem eternas as discussões? (Não o ouvio
sempre têm fallado os autores do regimento. Agora a mais o tachygrapho.)
questão que temos a propôr é, se deve ir por diante O SR. MONTESUMA: – Sr. presidente, o que
a pratica conhecidamente absurda, ou se deve antes eu quero é que a votação seja clara: que fique
seguir-se o que requer a justa economia do tempo; decidido se um Sr. deputado ha de fallar sobre cada
por outra, se queremos attender á preguiça que póde artigo em particular ou sobre todos; se deve propôr-
ter cada um dos Srs. deputados, ou ao bem geral se á discussão artigo por artigo, ou propôr logo todos
com o conveniente regulamento de trabalho. Esta é a para os Srs. deputados fallarem.
unica questão que resta a decidir; no mais não ha O SR. GAMA: – Eu me persuado, Sr.
duvida. presidente, que toda a divergencia de opiniões
O SR. MONTESUMA: – Alguns Srs. têm contrarias a este artigo procede de se haver
tomado por fundamento da sua opinião a economia confundido o acto de propôr-se com o acto de votar-
do tempo; mas eu creio que não deve attender-se se, como se fossem a mesma cousa, e seguissem a
tanto a ella que se falte ao que é necessario para os mesma marcha, sendo elles mui diversos entre si.
debates, nem tambem despendel-o inutilmente. Eu já Quando o Sr. presidente propõe uma segunda
quiz propôr uma emenda a este respeito; mas não o discussão se qualquer lei, é para fallar-se em geral,
fiz por se dizer que estava já vencido o contrario do digo, é para cada um dos Srs. deputados discutir de
que eu propunha. Pedi então que se lesse a acta em todos os artigos propostos os que lhe parecer. Mas
que se tratava esta materia; e ficou de se examinar; quando o Sr. presidente passa a recolher os votos,
requeiro portanto que se me declare se já se então divide os artigos para se votar no fim de cada
examinou a acta, porque quero ver se tem lugar a um. Foi esta a mente dos redactores deste
minha emenda. (O Sr. presidente disse que podia regimento: e por esta rasão
propôr.) Como eu acho inteiramente desnecessario
fallar tres vezes em cada artigo, porque isto só serve
para eternisar os debates, entendo que
Sessão em 7 de Agosto de 1823 47

digo, que entre a proposta e a votação não póde que fui encarregado, que participar com grande jubilo
entrar em duvida a discussão; porque esta segue que hoje tirei pela ultima vez o apparelho de
necessariamente a natureza da proposta do segundo ligaduras, e Sua Magestade Imperial se acha
debate, que é para todos os artigos em projecto, sem perfeitamente bom, não tendo a mais pequena lesão
restringir-se á fórma da votação, que deve ser artigo em seus movimentos, que executa livremente. –
por artigo. Paço da imperial Quinta da Boa-Vista, 7 de Agosto
O SR. RODRIGUES DE CARVALHO: – Fosse de 1823. – O cirurgião da imperial camara e
qual fosse a mente dos redactores do regimento, nós assistente á Sua Magestade o Imperador. –
não o entendemos assim; e como não se explicarão, Domingos Ribeiro dos Guimarães Peixoto.
entendem elles de uma fórma e nós de outra. Eu Foi ouvido com muito especial agrado.
julgo que tambem sei alguma cousa da minha lingua. O SR. FRANÇA: – Assim como temos
Os Srs. da commissão não nos explicarão isto; mandado por outros motivos deputações á Sua
e pela leitura do regimento o que se vê é que na 1ª Magestade julgo que nesta occasião não devemos
discussão se debate a conveniencia ou deixar de lhe dirigir uma, com a nossa justa
desconveniencia do projecto: na 2ª, cada artigo da congratulação pelo seu restabelecimento.
proposta; e na 3ª, o projecto em geral e por artigos. (Apoiados.)
Não é o que diz o regimento: e na pratica o mesmo O SR. ANDRADA MACHADO: – Devemos
se tem seguido; se não foi esta a mente dos illustres dirigir-lhe a nossa felicitação.
redactores do regimento não sei: mas creio que dos O SR. FRANÇA: – Creio que deve ir uma
termos em que elle está concebido não se póde deputação de 12 membros.
deduzir outra cousa. O SR. ANDRADA MACHADO: – Quando se
O SR. CARNEIRO DA CUNHA: – Para evitar resolveu que estas deputações fossem de 12
precipitação sou de parecer que se debata artigo por membros attendeu-se a não estar completa a
artigo; pois é melhor que haja mais alguma demora representação nacional; mas agora não sei se já
do que precipitar-se a decisão, o que é sempre póde seguir-se o regimento que determina que sejão
perigoso. 24.
Embora leve mais tempo a discussão, o O SR. FRANÇA: – Julgo que não podemos
resultado é melhor, e por isso voto pelo artigo. mandar 24, porque ainda não estamos todos; e se
Julgando-se a materia discutida propôz o Sr. faltarem alguns senhores póde não haver sessão.
presidente se passava o artigo qual se achava. – O SR. HENRIQUES DE REZENDE: – A lei
Venceu-se que não. que nos regula nesta materia manda que a
Fizerão-se algumas reflexões sobre o modo de deputação seja de 24 membros, portanto deve
offerecer á votação a materia; e depois dellas o Sr. observar-se; nós não mandamos, quem manda é a
presidente a propoz da maneira seguinte: lei. Emquanto a dizer-se que talvez não haja sessão,
1º Quantas vezes qualquer Sr. deputado tem julgo que não tem lugar, porque tirando 24 membros
direito de fallar na 1ª discussão? – Venceu-se que ainda restão 53, e para haver sessão basta que
duas. estejão 46.
2º Falla-se na 2ª discussão sobre todos os O SR. COSTA AGUIAR: – Eu não me
artigos em geral, ou sobre cada um em particular? – opponho a que seja a deputação de 24 membros,
Venceu-se que fosse sobre cada um em particular. mas tambem julgo muito provavel que não haja
3º Quantas vezes se fallará sobre cada um sessão; alguns senhores estão doentes e não é de
dos artigos em particular? – Venceu-se que duas. admirar que faltem mais de sete, que é quanto basta
4º Na 3º discussão quantas vezes terá direito para não haver sessão.
de fallar? – Venceu-se que poderia fallar duas unicas O SR. DUARTE SILVA: – Quando se venceu
vezes, quer fallasse sobre os artigos em geral, quer que fosse a deputação de 24 membros, parece que
sobre cada um delles em particular. se fez a conta á quarta parte do total da
Em consequencia destes vencimentos ficou representação; e portanto, podemos agora fazer a
prejudicada a emenda do Sr. Montesuma. mesma conta, e formar a deputação da quarta parte
O Sr. Secretario Costa Aguiar leu o seguinte do numero existente: deste modo não póde haver
boletim do cirurgião assistente á Sua Magestade receio de não termos sessão.
Imperial: O Sr. Presidente propoz se a deputação seria
Tendo a satisfação de haver participado no dia de 24 membros. – Venceu-se que não.
1º de Agosto as melhoras que acompanhavão a Sua Passou depois a fazer a nomeação e elegeu
Magestade Imperial a tal ponto que se tornarão os Srs. França, Carvalho e Mello, Almeida e
publicas pelas sahidas do mesmo augusto senhor á Albuquerque, Silva Lisboa, Locio e Seilbitz, Ribeiro
sua chacara, nada mais me resta para complemento da Costa, Accioli, Fortuna, Gama, Carneiro
da honrosa tarefa de
48 Sessão em 7 de Agosto de 1823

de Campos, Navarro de Abreu e Nogueira da Gama. para nunca poderem encampar os contractos por
Chegada a hora da leitura dos pareceres qualquer destes titulos.
entrou em discussão o da commissão de fazenda Se, pois, isto é assim a favor da fazenda
sobre o requerimento de Joaquim José Gomes da publica, como ha de esta rescindir o contracto,
Silva e Castro, adiado na sessão antecedente, e quando o contractador tem a fortuna de ganhar
apresentado na de 2 do corrente. muito?
O SR. AROUCHE RENDON: – Sr. presidente, Tambem poderia perder muito.
parece superfluo que eu ainda diga alguma cousa, e Tudo isto é o que elle poderá allegar, se quizer,
sobre uma materia que já me parece assás debatida; quando o demandaram; e antes disso deve estar na
porém, eu sou um dos da commissão, que assignei o posse do seu contracto.
parecer della; por isso para que se não supponha que A lei de Dezembro de 1761 no tit. 3º dá ao
o fiz com precipitação, convém que eu dê os motivos tribunal do conselho da fazenda a jurisdicção
e fundamentos do meu parecer. contenciosa para estes e semelhantes casos; e a lei
Eu, Sr. presidente, na minha mocidade estudei de Junho de 1808, que creou o erario e o tribunal do
jurisprudencia; mas é verdade que ha 30 annos conselho da fazenda, nesta côrte, manda observar
fechei as Pandectas e ordenações, de modo que hoje aquella lei de 1761. E, portanto, temos o tribunal
nem ao menos affecto de jurisconsulto. Comtudo as onde devia o arrematante ser convencido; alli se
regras geraes não me esquecerão; por ellas me guiei determina a fórma summarissima do processo; mas
neste parecer. nunca se denega a citação da parte, e audiencia,
Pelo contracto de compra e venda, que é um porque são cousas indispensaveis, e que faltando
contracto bilateral e obrigatorio por ambas as partes, nunca se podem supprir. Conclúo, que confirmo o
o vendedor de uma cousa transfere o dominio della parecer da commissão.
ao comprador, e este transfere ao vendedor o O SR. CARVALHO E MELLO: – Sr.
dominio do preço que lhe entrega, ou o direito de presidente, para se fazer uma idéa justa da materia
exigir-lhe esta quantia no tempo estipulado. Isto que se controverte, será necessario que eu exponha
mesmo se verifica em hasta publica, que não é senão com brevidade e clareza o facto que se discute, para
uma especie de compra e venda, pela qual a apparecer a descoberto a questão, que faz objecto
autoridade que preside á praça transfere o dominio desta discussão que se tem tornado mui renhida e
áquelle que dá o ultimo lanço, mandando-lhe entregar porfiosa.
o ramo pelo porteiro. Fez-se o contracto do arrendamento das sizas
Daqui se vê que o arrematante do contracto de que se trata, perante a junta da fazenda do
das sizas da villa de Campos tinha o dominio e districto, conforme as ordens estabelecidas.
posse. Por este contracto se fez uma venda judicial
Como, pois, se lhe tirou tanto a posse como o por arrematação, por um certo tempo, do direito que
dominio, sem ser pelos meios determinados em o soberano tinha de cobrar aquelle redito. Empossou-
direito? se o contractante, e em virtude da arrematação e
Disserão que houve lesão enormissima, e que posse, cobrava os rendimentos como lhe cumpria.
neste caso o contracto é nulIo; concedo a regra, mas Quizerão depois desfazel-o, por se dizer que
onde estão as provas, e onde está a sentença. houve fraude; porque se tinha ido procurar uma
Nada disso ha, Sr. presidente. estimação de nove annos, quando devia ser
Para se annullar este contracto era preciso que unicamente por tres.
o homem fosse citado, ouvido e convencido por uma Queixa-se o arrematante de que lhe
sentença que passasse em julgado. annullassem o contracto por tal principio, e o
Em sua defeza elle poderia allegar: 1º, que não ministerio mandou consultar o tribunal encarregado
houve lesão; 2º, que a lesão foi enorme e não da administração das rendas publicas, que é o
enormissima, em cujo caso não é nullo o contracto, conselho da fazenda.
porque o arrematante tem o direito de ficar com o Obrou o ministro como devia, porque aos
contracto, repondo o que de mais valia a sua tribunaes dos diversos ramos da administração é a
arrematação. quem o soberano, na fórma actual do nosso governo,
Podia mais allegar, que este contracto é de pede o seu parecer.
lucro contingente, como é, por exemplo, a compra de Nelles se examina o negocio, ouvidas as
uma herança, em cujos casos, em razão do risco de partes ambas, e o fiscal, que por bem do publico
perder muito, tambem se não admitte a acção por examina e fiscalisa os direitos do governo.
lesão. Assim o conselho da fazenda tem por fiscal o
A lei de Dezembro de 1761 obriga aos procurador della; o desembargo do paço, o
arrematantes das rendas publicas a renunciarem os procurador da corôa; as juntas de commercio e dos
casos solitos e insolitos, cogitados e não cogitados arsenaes, os seus respectivos fiscaes, que são
magistrados designados com este mesmo nome, e o
estabelecimento destes é a salvaguarda dos direitos
do governo.
Sessão em 7 de Agosto de 1823 49

Os magistrados destes tribunaes não têm voto com este homem, o que fez por um decreto. Fez-se
deliberativo, mas sómente consultivo, e dão por isso por consequencia manifesta injustiça e violencia: 1º,
o seu parecer, á vista do examinado e provado sobre porque por um decreto se determinou o que só podia
as materias em que são consultadas. desfazer-se em discussão judicial, e esta já não tinha
E’ livre ao governo approvar ou regeitar o lugar por ter passado o termo da lei, além de se não
parecer, mas quando é este fundado em justiça e na ter intentado; 2º, vê-se o mesmo soberano, que por
lei; por via de regra não se afasta delle o governo, seus agentes publicos tinha vendido estas rendas a
para não dar uma decisão que ataque em frente a este contractador, e que por conseguinte era parte
justiça do negocio. Assim aconteceu com o facto de deste contracto, desfazer por si só, e com autoridade
que se trata. de soberano, aquelle em que elle tinha entrado como
Disse isto, para mostrar que não se tratou no parte contractante. Tenho portanto, Sr. presidente,
caso presente de disputa judicial e contenciosa, o que muito justo é que o contractante viesse
que teria lugar no juizo dos feitos da corôa e soccorrer-se a esta assembléa da deliberação do
fazenda. governo executivo, que foi assentada com injustiça, e
Mandou-se consultar o conselho, quer dizer, contra os seus direitos adquiridos; e a ella só é a
que desse este o seu parecer sobre o requerimento quem devia recorrer; que tendo toda a autoridade
do contractante e sobre o estado do negocio. O para fazer-lhe justiça, póde revogar a decisão de que
conselho disse: – este contracto não se deve se queixa este recorrente, com tanta razão como
annullar. – E porque? Porque foi feito o contracto justiça.
com boa fé e em hasta publica. E’ pois o meu parecer que este contractante
Por via de regra, os productos das sizas das deve tornar a ser empossado no seu contracto para
compras e vendas, não são sempre os mesmos, o administrar por todo o tempo ajustado e que para
nem o podem ser, porque é dependente de resarcir os prejuizos que possão provir á fazenda
circumstancias imprevistas o deliberar-se alguem a publica, o conselho tome todas as medidas
vender a sua propriedade; e muitas vezes não ha necessarias para indemnisal-a desses prejuizos. E
vendas semelhantes senão as que são forçadas, e como foi este o parecer da commissão, sou de
por effeito de execuções ou dividas. conformidade com elle.
Ora, isto é absolutamente incerto, e não se O SR. FRANÇA: – O homem de razão não
póde, portanto, dizer que possa haver regra para o abraça nunca uma doutrina sem que primeiro se
calculo destes productos, em annos certos. Por estes convença da sua verdade; mas depois de a abraçar
motivos fui sempre de opinião, que era mais facil e convencido, sustenta os seus principios até morrer;
conveniente o cobrar esta renda por administração as suas expressões são todas marcadas pelo cunho
do que por arrematações. na sua consciencia.
O conselho disse mais, que a junta da fazenda E' pois, senhores, por este canon de boa
tinha obrado com excesso em cobrar certas moralidade que eu já uma vez disse e ainda agora
prestações, contra uma ordem que havia; e que por repito neste augusto congresso, que deve passar o
isso devia repôr o que recebera de mais. Eu parecer da commissão, que debatemos.
accrescentaria: que os membros da junta paguem e Eu conheço que no contracto de que se trata
sejão responsaveis por este prejuizo, se se houverão houve lesão da fazenda publica e que demais a mais
com manifesto dolo. foi elle celebrado com positiva transgressão do
Este parecer do conselho era são, solido e decreto de 14 de Novembro de 1803, que manda
justo. O contrario seria arrancar por força, das mãos arrematar semelhantes rendas por lanços que
de um homem, o direito que tinha adquirido com boa cubrão o producto médio dellas nos ultimos tres
fé, e á sombra da hasta publica e autoridade do annos immediatos ao contracto e não dos tres
soberano. ultimos triennios, como no caso se praticou: e sei
Como se poderá jámais contractar com os mais que a junta da fazenda não devia fazer a
administradores da fazenda publica, se houver o arrematação pela maneira que fez; ainda que ordem
exemplo de que a um que contractou com elles em lhe fosse para esse effeito do erario, porque ordens
boa fé, e se empossou no seu contrato, vão arrancar contra direito expresso em materia de arrecadação
aquillo que é já sua propriedade adquirida com o devem ser sempre duvidadas pelo juramento que
mais justo de todos os titulos? todos os empregados publicos dão de bem servir.
Deveria o governo conformar-se com o Mas essa não é a questão; a questão é se
parecer do conselho, por ser fundado em justiça e devemos consentir na atropellação dos direitos do
razão; e, toda a resolução que não fosse o dizer que cidadão adquiridos por cada um em materia de
este homem continuasse no contracto em que se contractos, sanccionando um tão terrivel exemplo do
tinha empossado, seria uma injustiça manifesta. poder executivo cortar com espada de Alexandre o
A resolução de uma consulta é um decreto; nó gordio que vinculára a convenção das partes e
tem esta força, porque é uma deliberação assignada firmára a autoridade da lei;
pelo soberano; por isso, quando elle mandou
desfazer o que tinha elle mesmo contractado
50 Sessão em 8 de Agosto de 1823

quando nesta estão marcados os meios lentos, as participo a V. Ex. para que sabendo de Sua
formulas salutares de se desatar o mesmo nó. Magestade o dia, lugar e hora em que determinar
Eu me opporei sempre a que isso se faça. recebel-a, V. Ex. m’o communique para eu o fazer
A salvação publica do estado, a imperiosa lei presente á mesma augusta assembléa – Deus
da necessidade, são as unicas causas que podem guarde a V. Ex. – Paço da assembléa, em 7 de
autorisar o desvio da lei positiva. Aqui não se dão Agosto de 1823. – José Ricardo da Costa Aguiar de
essas causas. Andrada.
A fazenda publica tem um juizo privativo, tem
um procurador autorisado; e é um contendor SESSÃO EM 8 DE AGOSTO DE 1823.
poderoso: bastantes meios tem ella pois de
reivindicar seus direitos contra a lesão que se lhe PRESIDENCIA DO SR. BISPO CAPELLÃO-MÓR.
fez, não necessita de golpes de autoridade que
podem constituir pela pratica o abuso em direito: não Reunidos os Srs. deputados pelas 10 horas da
autorisemos uma usurpação dos direitos do cidadão manhã, fez-se a chamada e acharão-se presentes
por salvarmos uma extemporanea reparação de 49, faltando com causa participada os Srs. Gomide,
damno da fazenda publica. Rocha Franco, Pereira da Cunha, Ribeiro de
Outros tempos, outros costumes: cesse o Rezende, Ferreira Barreto, Dias, Carneiro de
arbitrio, e domine a lei. Campos, Costa Aguiar, Furtado de Mendonça; e sem
Com estes fundamentos reprovo a medida ella os Srs. Andrada Machado, Martins Bastos,
violenta que se tomou pelo ministerio em se annullar Ribeiro Campos, Gondim, Pinheiro de Oliveira,
o contracto sem que todavia duvide da boa fé e das Duarte Silva, Alencar, Ferreira Nobre, Arouche
rectas intenções com que nisso se houve. Rendon, Marianno Cavalcanti, Andrade Lima,
Meus principios constitucionaes que uma vez Albuquerque, Ribeiro de Andrada, Rodrigues da
tenho abraçado me impellem á esta conclusão; Costa, Oliveira Maciel, Henriques de Rezende,
apezar dos sentimentos da minha vontade. Vergueiro, Alvares da Silva, Ferreira França.
A lei deve ser uma e igual em todos os casos O Sr. Presidente declarou aberta a sessão, e
semelhantes. lida a acta da antecedente foi approvada.
O Sr. Presidente, por estar chegada a hora, O Sr. Secretario França leu o seguinte officio
declarou adiada a discussão. do ministro dos negocios do imperio:
O Sr. Costa Barros pediu a palavra e fez a Illm. e Exm. Sr. – Tendo levado á augusta
indicação seguinte: presença de S. M. o Imperador o officio que V. Ex.
Proponho que a assembléa em nome da me dirigiu hontem, participando-me ter a assembléa
nação agradeça os generosos esforços que pela geral constituinte e legislativa deste imperio resolvido
salvação da patria tem prestado a esquadra dirigir ao mesmo senhor uma deputação, para lhe
brazileira. significar os puros sentimentos de prazer que a
Paço da assembléa, 7 de Agosto de 1823. – animão pelo feliz restabelecimento de sua preciosa
Costa Barros. saude, e esperando saber o lugar, dia e hora da sua
Foi approvada. solemne recepção, S. M. o Imperador me ordena que
O Sr. Presidente assignou para ordem do dia: responda a V. Ex. para ser presente na mesma
1º. A continuação da discussão do mesmo parecer assembIéa, que terá todo o prazer de receber tão
que se acabava de adiar. 2º A 2ª discussão do distincta deputação no dia segunda-feira 11 do
projecto sobre os empregados publicos da Bahia. 3º corrente, á hora do meio dia, no palacio da imperial
Regimento da assembléa. Quinta da Boa-Vista.
Levantou-se a sessão ás 2 horas da tarde. – Deus guarde a V. Ex. – Paço, em 8 de Agosto
Manoel José de Souza França, secretario. de 1823. – José Joaquim Carneiro de Campos. – Sr.
José Ricardo da Costa Aguiar de Andrada.
RESOLUÇÕES DA ASSEMBLÉA Ficou a assembléa inteirada.
Passou-se á ordem do dia e começou-se pelo
PARA JOSÉ JOAQUIM CARNEIRO DE CAMPOS parecer da commissão de fazenda sobre os
requerimentos de Manoel dos Santos Pereira & Cª, e
lllm. e Exm. Sr. – A assembléa geral Joaquim José Gomes da Silva e Castro, que ficára
constituinte e legislativa do imperio do Brazil resolveu adiado na sessão antecedente.
na sessão de hoje enviar uma deputação á Sua O SR. SILVA LISBOA: – Sr. presidente, bem
Magestade Imperial para lhe significar os puros que reconheça que o zelo da fazenda publica foi o
sentimentos de prazer que a animão pelo feliz que dictou as vehementes fallas dos illustres
restabelecimento de sua preciosa saude. O que deputados que sustentarão a resolução do
Sessão em 8 de Agosto de 1823 51

ministro da fazenda contra a consulta do conselho que no publico se duvidasse da validade das
da fazenda, que manteve o contracto da respectivas arrematações; e nesta côrte se effectuou
arrematação, á que procedera a junta da provincia por nove annos a do contracto das cartas de jogar,
do Espirito-Santo, em execução da provisão do por se considerar inutil a sua administração e não se
thesouro; comtudo não posso deixar de assentir ao acharem licitantes só por triennio.
dito parecer, tendo a complacencia de ver O mesmo aconteceu no contracto dos dizimos
sustentados por outros eloquentes membros, os da provincia do Rio Grande do Sul.
grandes pilares da civilisação, isto é, os principios da Mostra-se que tudo se fez com certa sciencia
ordem civil, que devem reger com exacção e firmeza e positiva ordem de el-rei o Sr. D. João VI. E ainda
na monarchia constitucional, para se consolidar o que, quanto a este contracto, os fiscaes da fazenda
credito do governo. depois o destratassem, cedendo os contractadores,
Sr. presidente, seja-me licito dizer que a fé que se esperançavão de excessivos lucros, comtudo
publica deve ser a virgem pura do imperio do Brazil; tal foi a justiça e honra daquelle soberano, que em
e que especialmente convém ser inviolavel, quando alvará que promulgou pouco antes de seu regresso
emana immediatamente da autoridade do throno, e a Portugal, dando providencia sobre esta repartição,
da solemnidade da hasta publica. declara que só o fizerão por louvavel desistência; o
Nada podendo eu addir de essencial ao que que importa um reconhecimento do direito que elles
foi ponderado pelos illustres deputados que votarão tinhão á manutenção do seu contracto, se nisso
pelo parecer, submetto á alta consideração desta insistissem.
augusta assembléa algumas observações sobre as Como pois o conselho da fazenda poderia
razões em contrario allegadas e que se substancião com decóro dar conselho na consulta a que se
em nullidade, lesão e dolo do contracto; procedeu para, em systema constitucional, o poder
arbitrariedade do ministro da fazenda, que mandou executivo commetter o acto arbitrario e despotico de
proceder á arrematação por nove annos contra a lei usar do direito do mais forte, exercendo (perdôe-se
fundamental da fazenda, que annulla arrematações assim dizer) a monstruosidade juridica de fazer-se
das rendas do estado por mais de triennio e por isso justiça pelas proprias mãos, quando aliás, na
a junta da fazenda da provincia não devia, nesta consulta se reservou o direito ao thesouro de
parte, cumprir a provisão que admittiu os lanços por rescindir o contracto pelo juizo da corôa, reclamando
9 annos: finalmente incompetencia desta todos os direitos, que fossem os arrematantes
assembléa, que, não tendo poder judiciario, não citados, ouvidos e convencidos, para serem
póde decidir sobre causa desta natureza. despojados do beneficio do seu titulo legitimo e
Quanto á nullidade pelo motivo indicado, oneroso: devendo-se considerar a fazenda como
supposto que seria congruente que se observasse a uma das partes contrahentes, tendo todas igualdade
lei fundamental da fazenda tambem no ponto de de direito aos olhos da lei?
triennio, comtudo é não menos inquestionavel que Sr. presidente, não convém haver em finanças
no governo da monarchia absoluta, o presidente do differente regra da diplomacia. Quem dá credito,
erario tinha a regalia de ser immediato e lugar- responde. Se o plenipotenciario conclue uma
tenente da real pessoa, da qual recebia as ordens, negociação na conformidade da sua credencial e
ainda de dispensa da lei para o expediente; em instrucções, não se póde depois deixar de ratificar o
virtude do que se remettião provisões do erario ás ajuste, sem se comprometter a honra do governo,
estações subalternas das juntas de fazenda, que era que autorisou a mesma negociação.
estylo cumprirem-se sem duvida alguma e assim E' proverbio nas praças: vender e arrepender.
convinha á ordem publica, a não se mostrar com Isto é intoleravel em governo regular; nem tão máo
evidencia gravissimo inconveniente ou grande mal estylo praticão ou supportão os negociantes de
irreparavel. caracter, que muitas vezes fazem negocios de
As representações contra taes provisões se grande monta, unicamente sob palavra de honra e
podem fazer sem indecencia na côrte, em tempo que se considerarião deshonrados se a
opportuno; mas nas provincias não se póde retractassem por considerações de interesses.
estranhar ás juntas de fazenda a peremptoria Quanto á inculcada lesão, é, na pratica, uma
execução das ordens superiores, sendo antes chimera. Arrematações de rendas publicas são de
incurial o erigirem-se em juizes da nullidade dellas, natureza semelhante, senão identica, á dos
attenta a regra politica de convir haver de longe a contractos aleatorios, como o do lanço de rede,
maior reverencia ao governo como bem diz Tacito – fundada em calculo de probabilidades, mas fallivel;
et maior ex longiquo reverentia. sendo não menos certo em philosophia que em
Do contrario quem tratará com o thesouro? economia publica, que dos futuros contingentes não
Quem receberá provisões para pagamento de se dá determinada verdade.
suas letras de cambio, como era estylo? Disse um dos nobres deputados da opposição
E’ notorio que, no mesmo tempo pouco mais ao parecer, que o recrescente progresso da
ou menos, se relaxou o estylo do triennio, sem
52 Sessão em 8 de Agosto de 1823

riqueza do Brazil devia augmentar a estipulação da o direito da demanda ordinaria aos fiscaes da fazenda.
renda da siza e não diminuil-a dos annos anteriores. Deve-se confiar que naquelle juizo se
Mas nem em todas as provincias houve igual proporção administrará imparcial justiça; certo de que só em
no progresso; e o exemplo da Bahia que mostrava governo de bom principe é que se dá sentença contra o
estado progressivo de prosperidade com velocidade fisco, pela evidencia do direito dos particulares; o que é
accelerada, bem mostra quão precaria é a felicidade de summa gloria ao imperante, como bem disse Plinio
publica, pela inopinada calamidade que sobreveio e no imperio romano, elogiando no senado ao imperador
que sem duvida transtornou os calculos dos Trajano. – Maxima hoce est tua gloria, Coesar, soepe
arrematantes das respectivas rendas. vincitur fiscus, cujus nunguam malo causa est, nisi sub
Em particular, a renda das sizas dos predios é a bono principe.
que mais decahe com a prosperidade recrescente do Como não houvesse quem pedisse a palavra,
paiz; pois então só prodigos vendem bens de raiz, que perguntou o Sr. presidente se estava discutida a
com tal prosperidade sobem de valor, e redito. Até as materia, decidiu-se que sim; e propondo o parecer a
leis actuaes favorecem aos proprietarios de taes bens votação foi approvado.
contra as execuções dos seus credores, concedendo a Seguio-se a 2ª parte da ordem do dia, que era
equidade de só se pagarem pelos reditos, quando a segunda discussão do projecto sobre os empregados
divida não excede á metade do valor. Quanto ao dolo publicos da Bahia, e leu-se o 1º artigo concebido neste
da arrematação, é certo, que, por direito, não é termos:
procedente a sua allegação, quando não se mostra ter Art. 1º Todos os empregados publicos que forão
elle dado causa ao contracto. nomeados pelo governo da Bahia no tempo da sua
Ainda nas ordinarias compras e vendas é livre occupação pelas tropas lusitanas ficão demittidos, e
aos contrahentes usarem do seu juizo, como pessoas como se nunca fossem ou tivessem tido taes
sui juris, e reciprocamente fazerem boa a sua condição nomeações.
no ajuste. O SR. RODRIGUES DE CARVALHO: – Sr.
Nas arrematações da fazenda os presidente, não posso approvar a doutrina deste art. 1º
contractadores, ainda que tenhão grandes privilegios, do modo que está concebida. Em Setembro de 1822 foi
tambem correm grandes riscos; e nem todos os que se estabeleceu o governo no Reconcavo, e o
capitalistas se querem implicar com contas da fazenda governo creado pelo povo continuou a existir e tem em
publica, que, pelas leis existentes, começa as suas si muitos brazileiros benemeritos; ora, parece que
demandas por sequestros. todos os que forão nomeados por este governo têm
Por isso todos se propoem ganhos direito a serem conservados; agora depois que elle se
extraordinarios. Sem duvida são frequentes os conloios dissolveu, está bem, porque desde então governavão
em taes actos entre os maiores capitalistas, que achão os inimigos. Portanto para passar o artigo precisa, na
sua conta em antes dar sociedade a rival, do que tel-o minha opinião, da seguinte:
por competidor nos lanços.
Este monopolio é natural, e irremediavel, e tem EMENDA
dado causa a que varias das casas ricas de Portugal e
do Brazil tenhão feito vastas fortunas por taes Todos os empregados publicos que forão
contractos. Assim continuará, a não se mudar desse nomeados pelo governo da Bahia, depois da
systema financeiro; o que é difficil no Brasil em ramos dissolução do governo nomeado pelos povos. –
de complicada arrecadação. Rodrigues de Carvalho.
Quanto á incompetencia desta augusta Foi apoiada.
assembléa, considero sem fundamento tal allegação, O Sr. Montesuma depois do discurso que fez (e
não estando ainda demarcados os poderes pela que se não transcreveu porque não se entendeu o
constituição, e não se tratando de julgar das tachygrapho Possidonio) mandou á mesa a seguinte:
particularidades do caso, mas de fazer uma declaração
legislativa e politica, desapprovando-se a força publica, EMENDA
feita contra a fé publica e authentica enunciativa do Sr.
D. João VI no precitado alvará, e só afim de simples Proponho a emenda ao art. 1º.
recuperação da posse, espoliativamente tirada aos Entender-se-ha occupada a cidade desde 6 de
contractadores pelo ministerio, que resolveu o caso de Setembro de 1822, em que na Cachoeira se installou o
mero seu arbitrio contra uma justissima consulta do governo da provincia para sustentar a acclamação de
conselho da fazenda, que nada decidio sobre objectos Sua Magestade o Imperador. – O deputado,
de maior indagação, cujo conhecimento reservou ao Montesuma.
juizo contencioso da corôa. Foi apoiada.
Tanto mais que o conselho deu logo providencia O SR. FRANÇA: – Posto que nós não
contra o abuso dos mesmos contractadores, quanto ao tenhamos ainda constituição escripta, que marque a
que obrarão depois na collecta em prejuizo do povo e
thesouro, deixando salvo
Sessão em 8 de Agosto de 1823 53

divisão dos poderes politicos, é todavia certo, que Foi apoiada.


praticamente observamos, e justamente, as O Sr. Galvão mandou á mesa a seguinte:
analogias dos governos representativos já
constituidos, quando temos de discorrer sobre EMENDA
objectos de attribuições dos mesmos poderes, e por
isso cuido, que ainda ninguem poz em duvida nesta Ficão inhabeis para servir cargo algum no
assembléa, que o provimento dos empregos imperio do Brazil aquelles empregados que
pertencia á repartição do executivo,ou seja vitalicio, exercerão as suas nomeações, ou ellas
ou temporal; assim como os actos de demissão, e dimanassem do governo de Portugal
suspensão dos respectivos empregados, segundo immediatamente, ou de seus delegados na Bahia
as causas marcadas pela lei. depois da inauguração do Sr. D. Pedro I ao throno
Estabelecido este principio, e vindo ao caso do Brazil. – Galvão.
dos empregados publicos da cidade da Bahia, não Foi apoiada.
vejo que haja necessidade da assembléa decretar, O SR. CARNEIRO: – Sr. presidente, tem-se
ou fazer direito novo ao dito respeito; primeiro dito que é preciso esquecer o passado, e lançar
porque esse direito induziria uma disposição balsamo nas feridas abertas pela guerra civil.
retroactiva, que é contraria aos principios da Convenho de muito boamente neste principio,
jurisprudencia nomotetica propria de um povo livre: e posto eu seja tambem uma das grandes victimas
segundo porque se encontraria talvez na applicação das funestas perturbações da minha provincia, não
delle as regras da justiça; quando aliás deixando-se sei respirar vinganças; conheço quanto é facil que o
ao poder executivo a acção livre que lhe compete erro ou a violencia das paixões nos cegue e
de demittir dos empregos ás pessoas suspeitas precipite no meio das commoções politicas, e nada
segundo entender, se preenche o fim de satisfazer appeteço tanto como ver já restabelecida a
ao andamento da causa publica pela cooperação harmonia e perfeita concordia entre os animos
dos agentes secundarios da sua administração, sem dissidentes.
que para isso se ultrapassem os limites do justo. Ha porém um outro principio, que é preciso
Eu encaro o objecto pelo lado de mera conciliar com aquelle primeiro, é o principio da
prevenção a respeito do futuro; pois no que toca ao segurança e propria conservação – serva te ipsum,
preterito eu não sei extremar bem pelos factos os nemo tenetur se ipsum tradere.
sentimentos das pessoas: e não me animaria nunca As côrtes de Lisbôa, tirando finalmente a
a increpar um empregado publico só pelo simples mascara havião mostrado em toda a evidencia o
facto de ficar no serviço da cidade no tempo do systema de machiavelismo e oppressão com que
governo oppressor, nem menos de aceitar-lhe pretendião recolonisar o Brazil, e encherão a cidade
nomeação. da Bahia de batalhões armados; não obstante isso
Esses procedimentos equivocos podião alguns habitantes daquella provincia, em vez de
nascer de mui diversas causas, em que nem deplorar em silencio os males da patria natural ou
levemente influisse a desaffeição á causa da adoptiva, quando abertamente a não pudessem
independencia. defender, o que a muitos foi forçoso, pelo contrario,
O homem obra quasi sempre segundo as ou illudidos pela magica sympathia de algumas
circumstancias que de mais perto o impellem; e o maximas abstractas com que os novos legisladores
partido da escolha nem sempre é o da vontade livre. encobrião seus fins sinistros, ou esperançados em
Por que justificado motivo pois decretará ora premios e remunerações das côrtes, fizerão muito
a assembléa, que se demittão todos os empregados ostensiva e escandalosamente causa commum com
publicos que farão nomeados alli pelo governo as tropas por ellas enviadas, e não duvidarão
oppressor? aggravar a calamidade do paiz que os vira nascer,
Eu não o vejo; o serviço em regra é feito á ou que os alimentára e enriquecera. Taes homens,
causa publica da sociedade a que pertence o a serem conservados em empregos, e muito mais
empregado; e não á pessoa do que governa. nos de alguma importancia, não podem deixar de
O merito, ou demerito pois do sugeito para inspirar muita desconfiança, e de excitar a mais viva
continuar, ou ser despedido do emprego que indignação nos bons cidadãos que têm arriscado
occupa fique ao conhecimento e livre escolha do sua tranquillidade, seus haveres, e a mesma vida
poder executivo; o ministerio deve tambem como pela causa da independencia do imperio.
nós acautelar no exercicio da administração publica Qual será porém o meio de conhecer aquelles
que lhe incumbe, a applicação no serviço de inimigos declarados, e separal-os dos outros pelos
sugeitos que mal a merecem: obre elle portanto quaes a razão, a justiça, e a equidade reclamão
como fôr justo; e não demos com as nossas leis toda a tolerancia e indulgencia?
occasião a justas queixas, tanto do governo, como Será preciso que se recorra aos odiosos
dos empregados. Eis-aqui a minha emenda. procedimentos de devassas, ou arbitrarias listas de
Voto pela suppressão do artigo. – O proscripção?
deputado, França. De sorte nenhuma: longe de mim a idéa de
Sessão em 8 de Agosto de 1823 54

propôr semelhantes horrores, que abrindo uma porta definir e marcar bem a força da palavra urgencia que
franca á injustiça, e vinganças, removerião para vem no juramento.
época muito distante toda a esperança de Não chamarei urgente uma providencia que vá
reconciliação. fazer um bem maior; um bem maior suppõe um
Todavia occorre-me um expediente, que eu menor, e nós devemo-nos contentar com este,
julgo ter o criterio de perfeita evidencia, e que não esperando occasião opportuna para obter aquelle.
podendo deixar de parecer moderado pelo pequeno Chamarei providencia urgente aquella que vai evitar
numero de individuos a que é applicavel, conciliará um grande mal, um mal de consequencias
quanto é possivel em negocio tão melindroso, a irreparaveis ou de natureza a perturbarem o
segurança e conservação da provincia com o justo andamento da nossa causa politica.
desejo da concordia e esquecimento dos aggravos O orador foi interrompido por um Sr. deputado
passados. Portanto proponho a seguinte: que disse que a assembléa já tinha decidido que a
materia do projecto era urgente, e que só podia
EMENDA fallar-se sobre o 1º artigo, e o orador disse:
As minhas observações forão geraes, mas eu
Todos os empregados publicos da provincia passo ao artigo. A respeito da sua materia entendo:
da Bahia que forão nomeados, ou pelo governo do 1º Que ella não é da competencia da assembléa e
reino de Portugal depois que a provincia proclamou o pertence exclusivamente ao imperador. A assembléa
Sr. D. Pedro I e a sagrada causa da independencia, não governa é a mesma idéa que lembrou o illustre
ou pelo general Madeira, e governos subsequentes á preopinante que me precedeu, o Sr. França: e a
dissolução do governo civil da capital da provincia assembléa não deve invadir o dominio do poder
ficão demittidos, e se declarão inhabeis para servir executivo de que está revestido o imperador com
emprego algum publico durante a presente luta da todas as attribuições que tinhão seus predecessores
nossa independencia. – Francisco Carneiro. que nos governárão até sua acclamação e elevação
Não foi apoiada. á dignidade de monarcha imperial constitucional: 2.º
Entrárão então na sala os Srs. Ferreira França Que além disso a materia do projecto é um fóco de
e Paula e Mello, e tomarão os seus assentos. desordem, perturbação e de lagrimas para o infeliz
O SR. MACIEL DA COSTA: – Sr. presidente, povo da Bahia, sobre o qual tem pezado tão
a primeira cousa que sobresaltou o meu coração cruelmente calamidades de todo o genero, ao passo
logo que tive ainda na Europa a noticia da installação que a assembléa deve enxugar lagrimas e derramar
desta assembléa, foi o receio de que ella, não um balsamo consolador sobre feridas tão profundas,
traçando a esphera dentro da qual fossem e não aggraval-as e ensanguental-as.
irremissivelmente circumscriptos seus trabalhos, Que desordem, Sr. presidente! Os
cahisse nos tropeços e embaraços em que cahirão empregados publicos nomeados pelo chamado
as côrtes de Portugal, e forão causa original de sua governo intruso serão já absolutamente demittidos:
perda. os nomeados pelo antigo legitimo governo
O furor de legislar arrastou-as a mecher em suspensos: os empregados que servirão no
todas as instituições; abolirão umas, alterarão Reconcavo occuparáõ os lugares dos suspensos até
essencialmente outras, sem substituirem cousa que elles se justifiquem!!!
capaz de promover o andamento da administração Veja, Sr. presidente, o que por aqui vai! E o
publica. O resultado foi o que se devia esperar: em peior é quererem que a assembléa proceda sem
pouco tempo ninguem se entendia; não apparecerão mais averiguação, averiguação que só póde fazer o
os fructos anciosamente desejados pela nação, o governo! Porém o que mais arduo parece é o genero
descontentamento foi geral, e o edificio foi á terra. de justificação a que o projecto obriga os suspensos
Deste sobresalto fiquei eu desabafado quando de seus empregos.
prestei o juramento do estylo ao entrar nesta Um dos Srs. secretarios interrompeu
assembléa, porque nelle vi cifrado o methodo de novamente o orador dizendo que a materia de que
seus trabalhos de um modo que faz honra a quem o tratava pertencia ao artigo segundo, e que este não
redigio e á assembléa que o approvou. Organisar a fazia ainda objecto de discussão. O orador não quiz
constituição politica do imperio, e fazer as reformas continuar.
indispensaveis e urgentes, tal é a tarefa que se nos O Sr. Montesuma em um longo discurso
prescreve. dirigido a justificar os motivos em que fundára a
He indispensavel, Sr. presidente, não exorbitar proposta do projecto, e a refutar os argumentos do
deste circulo sob pena de nos precipitarmos no Sr. Maciel da Costa, pretendeu sustentar que o
mesmo abysmo em que cahirão as côrtes de mesmo illustre deputado avançára, no que expuzera,
Portugal. proposições anarchicas e subversivas. (E’ o que em
As instituições sociaes jogão todas umas com summa se póde colligir do que escreveu o
outras; e leis e providencias destacadas não podem tachygrapho Possidonio.)
ter harmonia. E' preciso, Sr. Presidente, O SR. MACIEL DA COSTA: – Sr. presidente,
não
Sessão em 8 de Agosto de 1823 55

pediria segunda vez a palavra se fosse atacado em Felizmente não procedeu assim o povo
defeito de raciocinio, persuadido como estou que brazileiro, e Sua Magestade Imperial tem governado
cada um tem sua logica que reputa melhor que a e continúa a governar no mesmo pé em que se
dos outros, e que sobre os mais claros objectos achava até que a assembléa marque por leis
cada um vai para seu lado, e as questões podem ser fundamentaes as regras de conducta que os
interminaveis. Levanto-me sómente para repellir a monarchas brazileiros devem seguir. Não vejo onde
expressão de principio anarchico que empregou o está aqui anarchia.
illustre preopinante. O Sr. Araujo Vianna tambem produzio
Se a minha proposição é anarchica, protesto differentes argumentos para provar que não se
que é por erro de entendimento e não da vontade: podia admittir que installada a assembléa Sua
sou incapaz de professar e menos de proclamar, Magestade continuasse a legislar; e reprovou o fallar
com conhecimento de causa, principios anarchicos. o nobre preopinante de predecessores do imperador
Mas na realidade não vejo que minha proposição quando na qualidade de monarcha do Brazil
tenha a qualidade de anarchica. Não estive no Brazil considerado este como nação separada e
nessa época da sua revolução, quando o povo independente, não se conhecia nenhum que o
justissimamente indignado contra as medidas das precedesse.
côrtes de Portugal, ou antes de um punhado de O SR. MACIEL DA COSTA: – Não respondo
jacobinos perdidos que as infestavão, proclamou á segunda reflexão porque o não merece, e está
sua independencia e acclamou seu imperador respondido no corpo do discurso; respondo sómente
constitucional ao Sr. D. Pedro de Alcantara, então á primeira que muito de proposito, e bem em guarda
principe regente, e não sei as condições que se sobre minhas palavras, não fallei em legislar, e só
ajustarão. Não sei que se marcassem as barreiras fallei em governar, porque disso é que se trata, isto
dentro das quaes elle devia continuar a governar- é, de querer o projecto que a assembléa se ingira
nos. O que vejo é que Sua Magestade mesmo nos em materia propria do governo quando se deve
convoca e nos propõe a organisação de uma limitar ás attribuições legislativas.
constituição politica, que regule para o futuro a O SR. SILVA LISBOA: – Sr. presidente, o
distribuição e jogo dos poderes magestaticos ou deputado que propoz este projecto é de exaltado
soberanos. patriotismo, e uma das victimas da perseguição do
Que indica isto senão que elle governa hoje, invasor Madeira, por isso não é de admirar, que
como governavão seus predecessores, até que a dorido das desgraças da patria, tanto insistisse em
constituição futura designe a nova fórma? Onde está um projecto, que entendeu de justiça, necessidade,
aqui a profissão e proclamação da anarchia? Uma e politica. Mas, attentas as razões expendidas por
prova temos bem recente de que o governo não teve varios membros desta assembléa, e informação de
nova direcção, nem se lhe prescreverão novas alguns da deputação daquella provincia, não posso
fórmas, e é a questão que se excitou e decidio sobre convir na sua opinião, bem que muito o respeite, por
ser ou não permittida a Sua Magestade a sancção me parecer o expediente que indica,
nas leis administrativas que a assembléa fôr inconstitucional, desnecessario, e incompativel com
fazendo. o generoso systema do imperador, contra a politica
E emfim nós não somos uma nação que se prudencial, e contra a boa razão nas actuaes
constitue a primeira vez; eramos já um povo com circumstancias.
leis e governo; nada mais fizemos do que declarar O objecto é da prerogativa do poder
que nos separavamos do reino de Portugal, e elevar executivo, visto que, como a fonte da honra nos
ao throno particular do Brazil o herdeiro de toda a governos constitucionaes, tem o direito de provêr ou
monarchia. Nesta elevação ficou Sua Magestade demittir os empregados publicos. Emquanto na
investido do poder soberano para governar-nos constituição esperada não se legislar sobre este
como nos governava até então, salvo a sugeitar-se respeito, está em vigor a ordenação do reino liv. 1º
ás mudanças que o povo mostrou que desejára, tit. 99, que declara, que o imperante tem direito de
mudanças que se marcarião na constituição politica remover dos officios aos que os servem, sem dar
que seus representantes ião fazer. satisfação, nem indemnisação, porque ás vezes os
Não fez pois o povo brazileiro o que fizerão os providos não correspondem á confiança do governo;
jacobinos em Portugal, que declararão o Sr. D. João e por isso se insere nas cartas de mercê a clausula
VI despojado da realeza para legislarem e – Emquanto eu não mandar o contrario, – bem que,
governarem elles sós, e quando se virão por via de regra, isso se não effectuasse, sem erro
embaraçados com a sua inopinada presença de officio, julgado em juizo competente.
naquelle reino, apenas (porque não podião mais) o Agora, depois, do schisma civil, cumpre deixar
constituirão executor espurio das suas ordens, sem essa regalia inteiramente ao imperador, tendo-se na
nenhum arbitrio no andamento do governo, o que foi sua sabedoria, e bondade, inteira
em grande parte causa das desordens que
recrescerão e excitarão um descontentamento geral.
56 Sessão em 8 de Agosto de 1823

confidencia, e de que fará a esse respeito as os mais affectos á causa não sahirão por bem publico,
discriminações convenientes, reintegrando, mantendo, afim de não desampararem os seus postos; o que daria
ou provendo nos dignos, excluindo os indignos com mais occasiões ás violencias dos inimigos, não tendo
toda a justiça e equidade, com prévias informações do quem defendesse, de algum modo, a causa publica,
governo local. para não irem aos extremos.
E’ além disso prudente, que a assembléa nem O expediente das justificações indicadas no
faça leis sobre o passado, nem se exponha ás projecto, não póde ser o criterio da verdade, e só
consequencias do descontentamento, que resultarião, servirá para trafico de juramentos judiciaes, que é bem
se tomasse conhecimento de particularidades odiosas, sabido terem a inutilidade de corrogata testimonia, á
e quando todo o Brazil olha para ella, como a ancora que quasi todos se prestão a titulo de bem fazer. Será
da salvação brazileira, na legislação sobre objectos obvio e facil o conloio com os complices, o justificante,
futuros da felicidade publica. Cada poder carregue com e as testemunhas, reciprocando entre si seus bons
o peso de suas attribuições. E’ desnecessario o officios. E’ desnecessario accumular mais razões, não
projecto, porque consta, que o restabelecido governo sendo conforme á boa razão usar de severo escrutinio
da Bahia já dera conta sobre este identico objecto ao sob opiniões politicas, e praticas irregulares nas
governo imperial, e portanto, de certo modo, está mudanças de systema civil, onde muita gente é
(como se diz no fôro) preventa a jurisdicção, para se implicada em culpa e cada partido a imputa ao outro.
esperar todo o bem praticavel pelas mãos do mesmo Cumpre antes seguir a regra da sã jurisprudencia, de
governo. não punir geraes offensas – quid quid multis peccatur,
Não só o governo local, mas tambem a opinião inultum.
publica, por notorios e decisivos factos, marcará os O SR. COSTA BARROS: – Eu julgo, Sr.
inimigos mais encarniçados e influentes, que presidente, que a assembléa está dividida sobre a
permanecerão, para serem retirados, ou vigiados; bem utilidade deste projecto; e a maior parte parece regeital-
que seja de presumir, que os mais criminosos fugirão o absolutamente; por isso achava, para não gastarmos
com o Madeira. Diverso expediente faria o remedio inutilmente o tempo, que seria conveniente que V. Ex.
peior que o mal. Sua Magestade Imperial, depois da propuzesse ao congresso se deve continuar a
acclamação do titulo de defensor perpetuo do Brazil, discussão.
promulgou o decreto de amnistia, que é uma O SR. FRANÇA: – O que lembra o illustre
consequencia de seu direito de agraciar, e ainda em preopinante não tem lugar porque é contra o regimento:
jurisprudencia, as graças dos principes são na 2ª discussão discute-se artigo por artigo, se alguns
naturalmente ampliaveis: e depois da recuperação da senhores têm discorrido em geral sobre o projecto, têm
Bahia, aquella graça convém ser extensiva com fallado fóra da ordem.
epicheia. Julgou-se discutida a materia, e passou-se ao
Em convulsões politicas, os caracteres dos artigo 2º do theor seguinte:
homens não se manifestão, prevalece a dissimulação, Artigo 2º Todos os antigos empregados publicos
e poucos aspirão á palma do martyrio, ainda os que na cidade da Bahia jurárão a constituição de
melhores cidadãos estremecem á vista do violento, a Portugal, e ainda se achavão dentro da cidade tres dias
maior virtude desfallece, quando se diz, – aqui está o antes da evacuação das tropas inimigas, e entrada do
atormentador – (ecce tortor adest.) Somos catholicos, e exercito pacificador do Reconcavo, e interior da
não pareça estranho deste lugar lembrar o exemplo de provincia, ficão suspensos sem vencimento de
S. Pedro, que não deixou de ser principe dos ordenado, até se justificarem.
apostolos, bem que antes, ostentando amor e valor ao O Sr. Rodrigues de Carvalho sustentou com
Divino Mestre, depois o negou repetidas vezes no differentes razões que não podia passar o artigo,
perigo imminente, não restando-lhe senão o porque era injustissimo que se tomasse como crime o
arrependimento, e amargo pranto – flevit amaré. juramento da constituição de Portugal prestado pelos
O dito decreto ainda agora será o mais saudavel empregados publicos. Todos jurarão (disse o illustre
balsamo para confortar todos os espiritos, e produzir a deputado) e eu não jurei porque não estava servindo
desejada unanime união na causa do Brazil. Tem-se nesse tempo, aliás fazia o mesmo que os outros
dito que os amantes da causa do Brazil devião, em fizerão.
prova de sua adherencia, refugiarem-se no Reconcavo. Quantos homens desses que jurárão a
Mas como era isto possivel a todos os cidadãos, constituição fizerão sacrificios de dinheiro e derão os
e maiormente aos empregados, vendo a seus escravos para a defeza da causa do Brazil? E só
circumvallação da cidade por mar e terra, e tantos porque jurárão hão de sahir dos seus empregos? Como
perigos e dispendios dos que se retirarão? havião alguns delles deixar de o fazer? Como se podia
Entre nós tal difficuldade é extrema, tendo o evadir ao juramento um desembargador da relação ou
chefe da familia numerosos domesticos, e até as que outro empregado semelhante, havendo ordem para
chamamos crias, que se não podião abandonar, nem jurar?
provêr. Sem duvida alguns dos empregados Portanto, Sr. presidente, não posso admittir
Sessão em 8 de Agosto de 1823 57

o artigo na fórma que está redigido, e só julgo que Sr. presidente que não se passava ao art 3º por
esta disposição póde ter lugar a respeito daquelles estar chegada a hora destinada para as indicações.
empregados que por factos se mostrárão inimigos O SR. MONTESUMA: – Sr. presidente, não é
do Brazil. esta a primeira vez que tenho mostrado nesta
O Mesmo Sr. Deputado offereceu ao artigo assembléa quaes são os meus principios e
uma emenda, mas reconhecendo logo que se intenções sobre a conservação de harmonia e
achava comprehendida na que tinha feito na 1ª intelligencia entre os dous grandes poderes politicos,
discussão o Sr. Ferreira de Araujo, immediatamente legislativo o executivo; e agora não posso deixar de
a recolheu. patentear o prazer que se apossou do meu coração
O SR. FRANÇA: – O segundo artigo do no momento em que li a proclamação de Sua
projecto impõe uma pena sobre um facto preterito, e Magestade, que se acaba de distribuir aqui, sobre o
um facto que foi consequencia de um dever. procedimento da tropa de Porto Alegre relativamente
Estabelece que os antigos empregados publicos da ao veto-absoluto, que ella assentou que devia
cidade da Bahia, que jurárão a constituição de marcar sem fazer caso dos poderes que a nação
Portugal, e ainda se achavão dentro da cidade tres nos delegou para formarmos a constituição politica
dias antes da evacuação das tropas inimigas e do imperio, onde se ha de designar aquella
entrada do exercito pacificador, ficão suspensos attribuição.
sem vencimento de ordenado até se justicarem. A Sr. presidente, o modo porque Sua
doutrina seria talvez boa para se proclamar em Magestade se expressa é digno de um coração
tempo opportuno aos habitantes daquella cidade, verdadeiramente constitucional, e sou de voto que
mas não tem ora nenhum lugar para della se fazer esta assembléa dê alguma demonstração de
uma lei. agrado; não é porque antes disto nós não
O juramento da constituição de Portugal e a estivessemos certos da sua constitucionalidade,
permanencia dos empregados publicos dentro da mas parece-me justo que neste congresso se
cidade no exercicio dos seus cargos, são actos de applauda a publicação de principios tão verdadeiros
sua natureza innocentes; ainda que talvez servissem e que tanto cumpre espalhar, e que se veja assim
indirectamente á causa contraria da nossa que nós vamos de mãos dadas com o poder
independencia. Eu não sei fazer crimes de opiniões executivo. Eu tenho sobre este objecto para
politicas em tempo de revoluções, onde os actos da offerecer á consideração da assembléa a seguinte:
vontade recebem a sua moralidade dos
acontecimentos futuros. Nada ha mais barbaro e INDICAÇÃO
iniquo do que pretender que o miseravel cidadão no
meio das oscillações dos partidos de uma revolução Proponho que se lêa a proclamação de Sua
politica faça virtude de acertar com aquelle que ha Magestade o Imperador aos brasileiros, entregue
de vencer e dominar. hoje aos Srs. deputados, e que no fim da leitura se
Os empregados da Bahia emquanto jurárão a dêm vivas á Sua Magestade o Imperador e ás suas
constituição de Portugal e permanecerão constantes intenções constitucionaes. – O deputado,
no exercicio dos seus cargos, não fizerão mais do Montesuma.
que desempenhar os deveres do antigo pacto social, O SR. FRANÇA: – Opponho-me, Sr.
seguindo a voz do governo oppressor que lhes tirava presidente, á indicação do illustre preopinante. Não
o arbitrio de adherirem ao partido da justa revolução há nada para mim tão indecoroso como que os
que nos separava de Portugal. Não duvido que representantes de uma nação, entre os quaes deve
muitos de coração se voltassem á causa contraria, reinar a calma das paixões e sobresahir a virtude da
mas nem dahi lhes assaco culpa de que julgue se prudencia, se levantem a dar vivas com o
devão justificar. enthusiasmo de meninos de escola. O modo porque
Depois de uma luta politica, como a nossa, esta assembléa deve significar o seu prazer em
pede a prudencia que se premêem as acções dos qualquer conjunctura, tem outra norma. Além de que
briosos vencedores, e se esqueção as dos vencidos. não vejo aqui motivo de attenção.
Assim se acalmão as paixões agitadas e facilmente O governo cumpriu com o que devia,
voltão todos ao remanso da paz e á unidade da proclamando aos povos segundo lhe fôra
acção pelo imperio da lei. Mando por isso á mesa a recommendado por esta assembléa: isto fez, e
seguinte emenda: agora da imprensa nos vem como propina o
Voto pela suppressão do art. 2º – O deputado exemplar da proclamação. Nada de singular e
França. extraordinario nisso descubro que nos enthusiasme.
Foi apoiada. O SR. MONTESUMA: – Quando fiz esta
(Fallarão tambem os Srs. Carneiro da Cunha, indicação, não suppuz que me assemelhava a
Montesuma, Costa Barros, mas não se entendeu o
tachygrapho Silva.)
Julgando-se a materia discutida, declarou o
58 Sessão em 8 de Agosto de 1823

meninos de escola, como disse o Sr. França, a quem requerimento de José Maria Ribeiro Paes, soldado
pretendo responder. do 1º regimento de infantaria de milicias, em que se
Eu ainda não tinha visto da parte de Sua queixa da demora da ultima sentença do processo,
Magestade escripto algum em que tão claramente que se lhe formou; e o mesmo senhor manda que eu
expendesse as suas idéas e principios responda a V. Ex., para ser presente á assembléa
verdadeiramente constitucionaes, accrescendo o geral constituinte e legislativa do imperio do Brazil,
mostrar zelosamente o seu descontentamento pela que no dia 21 do mesmo mez, tinha sido confirmada
deliberação da tropa de Porto-Alegre; e portanto a sentença final que absolveu aquelle réo.
considerando quanto precisamos de força moral, e O governo querendo promover a prompta
que esta só se adquire pela harmonia dos poderes, expedição dos processos, e conhecendo que para
lembrei-me que seria util manifestar o nosso prazer esse fim não bastava um auditor, nomeou-lhe um
por uma tal proclamação, e mostrar assim ajudante, e não sendo ainda sufficiente, autorisou a
publicamente a harmonia que reina entre a nomeação dos capitães dos corpos para o serviço de
assembléa e o poder executivo. Não sei que nisto auditor, nos casos pouco complicados e que menos
nos pareçamos com rapazes de escola. exigissem conhecimentos juridicos.
O SR. RODRIGUES DE CARVALHO: – A Como não baste ainda vai o governo nomear
leitura desta proclamação não me deu idéas novas; outro ajudante do auditor interinamente; digo
achei o que já sabia, o que Sua Magestade tem interinamente por ser de esperar que brevemente
proclamado por muitas vezes. Eu nunca duvidei que acabe a grande affluencia de processos que tem
Sua Magestade fosse constitucional, e creio havido, sendo isto causado pelas circumstancias
firmemente que a maior parte dos brasileiros estão politicas em que se tem visto o imperio, as quaes
persuadidos disto mesmo, sem ser necessario para têm posto o governo na necessidade de mandar
isso que lessem esta proclamação. processar a uns por accusações produzidas e
Quanto ao que disse um nobre deputado que conceder o processo a outros que têm desejado
Sua Magestade não fez mais do que aquillo que a mostrar illibada a sua conducta.
assembléa tinha resolvido, digo que não é assim, A não ser esta circumstancia extraordinaria, o
porque a assembléa não resolveu que o governo governo não vê motivo de processos accumulados
proclamasse aos povos, limitou-se á provincia de S. senão por motivos de deserção. As fortes penas
Pedro e nada mais. fulminadas contra este crime pelo regulamento de
Todavia sou tambem de opinião que se não 1763, parecerão desproporcionadas, e ellas forão
dêm os vivas; nada ha de novo na declaração destes mitigadas pelas novas ordenações de 9 de Abril de
principios; todos nós conhecemos que Sua 1805; assim mesmo continuarão as deserções, de
Magestade os professa. maneira que o governo só vê o remedio em duas
O SR. CARNEIRO DA CUNHA: – Como o medidas; a primeira que é geral, na instrucção
nobre deputado requereu que se lesse a publica, que torne os homens menos propensos ao
proclamação, julgo que deve decidir-se se tem lugar crime e a opinião publica mais severa, para não
a leitura. consentir um desertor em qualquer parte que
O SR. FRANÇA: – O melhor é cada um lêl-a appareça; e a segunda é particular, isto é, dar ao
na sua casa para se fazer juizo della. soldado o maior soldo possivel á vista do estado de
O Sr. Presidente propoz á votação a indicação finanças da nação, para que a vida do soldado seja
e foi regeitada. procurada por voluntarios e gente de melhor
O Sr. Souza e Mello pediu a palavra e educação, e para que assim possa ser mantida com
offereceu a seguinte: a severidade necessaria a disciplina nos corpos.
Deus guarde a V. Ex. – Paço, em 7 de Agosto
INDICAÇÃO de 1823. – João Vieira de Carvalho. – Sr. José
Ricardo da Costa Aguiar.
Proponho que se lêa e se declare vista com Ficou a assembléa inteirada.
muito especial agrado a proclamação de Sua O SR. MIGUEL CALMON: – Sr. presidente,
Magestade o Imperador hoje apparecida, que tenho que offerecer á consideração desta assembléa
desapprova com principios de harmonia as um projecto de lei; a sua materia está dentro da
ingerencias das camaras do norte e da tropa de esphera das nossas attribuições, porque se trata de
Porto-Alegre sobre as deliberações desta uma reforma urgente. Eu apresento a idéa, e a
assembléa. – Souza Mello. sabedoria do congresso a desenvolverá.
Foi regeitada.
O Sr. Secretario França pediu a palavra para PROJECTO DE LEI
lêr o seguinte officio do ministro dos negocios da
guerra: A assembléa geral constituinte e legislativa do
Illm. e Exm. Sr. – Levei á presença de Sua imperio do Brazil decreta:
Magestade o Imperador o seu officio de 24 do mez
de Julho acompanhado da cópia do
Sessão em 9 de Agosto de 1823 59

1º Ficão extinctas as mesas de inspecção de Depois de curto debate, por ter dado a hora,
assucar, tabaco e algodão, e por consequencia novamente ficou adiado.
revogadas todas as leis e regulamentos ora existentes O Sr. Presidente
sobre taes mesas. assignou para a ordem do dia: 1º, o projecto
2º O lavrador é responsavel ao primeiro sobre os empregados publicos da Bahia; 2º, regimento
comprador pela qualidade especifica e dolo que se da assembléa.
verificar no fabrico e beneficio do producto da sua Levantou-se a sessão ás 2 horas da tarde. –
lavoura; e bem assim pelos ferros e marcas de que se Manoel José de Souza França, secretario.
servir para designar como seu o genero vendido.
3º Todas as questões que se suscitarem sobre SESSÃO EM 9 DE AGOSTO DE 1823.
esta responsabilidade serão ventiladas ante as justiças
ordinarias de cada uma praça de commercio, para as PRESIDENClA DO SR. BISPO CAPELLÃO-MÓR.
quaes devolver-se-ha provisoriamente a parte de
jurisdicção contenciosa que competia ás sobreditas Reunidos os Srs deputados pelas 10 horas da
mesas. manhã, fez-se a chamada, e acharão-se presentes 63,
Paço da assembléa, 6 de Agosto de 1823. – O faltando com causa participada os Srs. Rocha Franco,
deputado Miguel Calmon du Pin e Almeida. Rodrigues Velloso, Pereira da Cunha, Martins Bastos,
Ficou para segunda leitura. Araujo Gondim, Gama, Ferreira Barreto, Andrada e
O SR. TEIXEIRA DE GOUVÊA: – Sr. presidente, Silva, Dias, Cruz Gouvêa, Furtado de Mendonça,
já é passado bastante tempo desde a installação desta Velloso Soares, Ribeiro de Andrada e Oliveira Maciel.
assembléa e ainda não appareceu o projecto de O Sr. Presidente declarou aberta a sessão, e lida
constituição. Os illustres membros da commissão a acta da antecedente foi approvada.
encarregada de tão importante trabalho não podem O Sr. Secretario Costa Aguiar leu o seguinte
seguramente desempenhal-o com brevidade sendo officio do ministro dos negocios do imperio:
obrigados a assistir ás sessões; o tempo que lhes resta Illm. e Exm. Sr. – Havendo S. M. o Imperador
é pouco e nada assim se adianta. mandado expedir na data de 30 de Julho proximo
Como nós presentemente já somos bastantes, passado as convenientes ordens á administração do
julgo que sem inconveniente poderáõ ser dispensados correio, para se evitar a violação do segredo das cartas,
os mesmos Srs. deputados de comparecer nesta objecto recommendado pelo officio que V. Ex. me
assembléa até que apresentem o projecto de que estão dirigio em 29 do dito mez, me manda participal-o a V.
incumbidos. A este fim offereço a seguinte: Ex. para o fazer presente na assembléa geral
constituinte e legislativa deste imperio do Brazil.
INDICAÇÃO Deus guarde a V. Ex. Paço, em 7 de Agosto de
1823. – José Joaquim Carneiro de Campos. – Sr. José
Proponho que sejão dispensados de vir ás Ricardo da Costa Aguiar de Andrada.
sessões os illustres membros da commissão de Ficou a assembléa inteirada.
constituição para que ultimem com mais brevidade o Leu depois uma participação de molestia do Sr.
projecto de constituição. deputado Dias. – Ficou a assembléa igualmente
Paço da assembléa, 8 de Agosto de 1823. – inteirada.
Teixeira de Gouvêa. Passou-se á ordem do dia, cuja 1ª parte era o
O SR. FRANÇA: – Creio que a indicação não projecto sobre os empregados publicos da Bahia no 3º
tem lugar; a assembléa bem conhece quanto é util a artigo concebido nos seguintes termos:
apresentação do projecto, mas nós não temos Art. 3º A justificação versará: 1º Se em sua
autoridade de dispensar membro algum de assistir ás conducta mostrárão sempre por factos adhesão á
sessões da assembléa. causa augusta da independencia do Brazil, e fórma
O SR. ARAUJO LIMA: – Eu já declaro que não monarchico-representativa por elle adoptada e
aceito o favor da dispensa. proclamada: 2º Se houve coacção positiva no juramento
O SR. MONTESUMA: – Eu acho que o melhor é da constituição de Portugal: 3.º Se não se retirou para o
deixar isto ao cuidado da illustre commissão. Ella Reconcavo e interior da provincia, ou para outra
conhece a importancia de apresentar ao Brazil a sua lei qualquer parte do imperio não invadida pelo inimigo por
fundamental, e não ha de descuidar-se; creio que nada uma justificada e legitima impossibilidade physica ou
mais é preciso. moral.
O Sr. Presidente propoz á assembléa a O SR. CARNEIRO: – Sr. presidente, tenho
indicação e foi regeitada. ouvido fallar no perigo dos tempos presentes e na
O Sr. Secretario França leu o parecer adiado da precisão de não aggravar feridas; convenho: mas vejo
commissão de constituição sobre o requerimento de por outro lado, como já disse, que
Marcos Thomaz de Oliveira, que fôra apresentado na
sessão de 5 do corrente.
60 Sessão em 9 de Agosto de 1823

tambem é necessario sustentar o principio da O SR. ANDRADA MACHADO: – Parecia-me


defesa natural. que esta emenda ficava melhor no 1º artigo.
Nós estamos ainda no principio da lide, O SR. CARNEIRO: – Entendo que mesmo
sejamos moderados porque o patriotismo não aqui póde ter lugar; todavia admitta-se em qualquer
autorisa a ultrapassar as raias da razão; mas não outro se parecer mais conveniente.
nos entreguemos nas mãos dos principaes e mais O SR. CARNEIRO DA CUNHA: – Eu tinha
activos chefes do partido contrario. votado por este artigo por me parecer que estas
Eu não serei nunca de parecer que a providencias erão necessarias; mas depois do que
administração publica da provincia lhes seja tenho ouvido a alguns Srs. deputados que têm
confiada, e desejára que se dessem providencias a illustrado a materia, mudei de opinião. O negocio é
este respeito. Conheço que o governo póde tomar mui complicado, e exige miudas informações; nem
algumas medidas, mas julgo que são todavia sei como a assembléa se ha de haver nelle com
necessarias algumas providencias legislativas, e por justiça; portanto voto pela suppressão.
isso offereço esta emenda ao art. 3º: O SR. ANDRADA MACHADO: – Eu tambem
Todas as pessoas que aceitárão empregos voto pela suppressão do artigo; mas é porque quero
na provincia da Bahia por nomeação do governo do servi-me de outra bitola. A emenda do Sr. Carneiro
reino de Portugal e Algarves desde a acclamação é muito boa, mas o seu lugar proprio, como já
do Sr. D. Pedro I, declaração da nossa lembrei, é o art. 1º; e além disso nas duas classes
independencia, ou do general Madeira e das juntas indicadas na mesma emenda não são
do governo e fazenda debaixo de sua violenta comprehendidos os despachados antes da
influencia desde a época em que o mesmo general proclamação da nossa independencia, e que depois
assumiu a si uma autoridade dictatorial até a mostrarão por factos decisivos serem inimigos da
evacuação de suas tropas, são demittidos de seus nossa regeneração; e julgo que estes não merecem
empregos, e se declarão inhabeis para servir ficar de fóra.
quaesquer outros, durante a presente luta de nossa Eu quero que se castiguem sómente actos
independencia. – Paço da assembléa, 9 de Agosto decisivos de hostilidades; porque muita gente
de 1823. – Francisco Carneiro. haverá que ainda que não praticassem acções de
Esta emenda tem muita semelhança com a patriotismo, não fossem inimigos da causa; nunca
que hontem apresentei ao art. 1º, mas não é a quererei que se applique a mesma regra aos
mesma. Já então eu desapprovei o procedimento inimigos, aos descontentes, e aos indifferentes.
das devassas e de listas arbitrarias, e agora não (Não se ouvio o resto.)
posso tambem approvar o plano das justificações O SR. CARNEIRO: – Quando propuz a minha
offerecidas neste artigo; taes justificações se fazem emenda só tive em vista salvar o principio da
sempre com muita facilidade, e reduzindo-se a mero segurança e evitar reacções; jámais me occorrerão
formulario, não se conseguirá o fim a que nos planos de castigos em que ouço fallar. Estes
propomos. suppoem sempre mais ou menos processos
Os que aceitarão nomeações de Portugal inquisitorios e outros vexames que, como já disse,
depois da acclamação do Sr. D. Pedro e declaração estou muito longe de approvar; com a base
da independencia, e muito mais os que as offerecida na minha emenda julgo salva a
receberão do general Madeira, ou das ephemeras tranquillidade, e conciliados os interesses da justiça
juntas provisorias e da fazenda que com elle e equidade.
servirão nas ultimas convulsões da provincia, O SR. FRANÇA: – Quando eu falIei
abertamente mostrarão que preferião o partido das ultimamente sobre esta materia disse: que para
côrtes, e que estavão promptos a levar ao fim seus estes empregados serem removidos por culpa que
nefarios projectos de escravidão do Brazil. tivessem commettido, não era mister fazer-se uma
O governo do reino debaixo da violencia das lei nova; por que devem ser julgados pelo direito
côrtes, e Madeira com os seus coIlegas, em preexistente á culpa.
circumstancias de aperto não procederão áqueIlas Se já porém a sua remoção se deve
nomeações sem haverem as mais sérias e exactas considerar como uma medida politica, e não como
informações sobre os individuos que escolhião. pena de delicto, ao governo incumbe pratical-o;
Tomando por base estes factos teremos um porque da sua attribuição é tomar todas as
criterio de toda a segurança para que se não providencias de segurança publica, que lhe não são
introduzão no serviço publico os que têm contra si a vedadas por direito, como é a remoção dos agentes
decidida opinião da provincia, e se previnão os do poder executivo; Senhores, ou o governo vai de
descontentamentos, sobre o que a assembléa deve boa fé, como supponho, na causa da nossa
providenciar. independencia, ou não.
O Sr. Presidente propoz a emenda do Sr. Se elle quer que effectivamente subsista o
Carneiro, e foi apoiada. imperio, e se resguarde a segurança publica das
traições de empregados suspeitos, não necessita
Sessão em 9 de Agosto de 1823 61

de lei nova para os remover, como, e quando lhe o que é tanto assim que em todas as provisões, e
parecer; e se póde por ventura suppôr-se que não mesmo cartas chamadas de propriedade de officios,
vai de boa fé, então do que serviráõ as leis que no se costumão pôr clausulas a este respeito
caso houvermos de decretar? De cousa nenhuma: concebidas nos seguintes termos: – servirá por
ou antes de algum mal á opinião que se deve ter da tanto tempo se eu antes não mandar o contrario: e
assembléa; porque não faltaráõ máos que havendo eu por bem de lhe tirar o officio, lhe não
interpretem malignamente os actos do nosso mais responderá a fazenda por cousa alguma. – Não vejo
puro patriotismo ao dito respeito, e que até nos portanto que em o governo tirar um officio a um
chamem demagogos. Voto portanto que se deixe ao empregado, de quem suspeita mal no serviço da
governo obrar no caso segundo entender, em salvo causa da independencia, não vejo, digo, que lhe
do direito existente. faça alguma injuria; pratica aquillo que póde
O SR. CARNEIRO DE CAMPOS: – Sr. praticar, e que, digamol-o assim, estipulou de
presidente, quero unicamente fazer uma explicação, praticar com o mesmo empregado por clausula
sem entrar na questão que se debate. O nobre expressa no titulo do seu provimento.
deputado pareceu dar a entender em uma parte do A razão é clara; os empregados publicos não
seu discurso que não está bem certo se o governo constituem, nem devem constituir nunca patrimonio
procede de accordo com esta assembléa, e para de particulares, como já abusivamente o forão: elles
explicar isto é que me levantei. pertencem á nação; e o governo applica ao seu
O governo, Sr. presidente, tanto está de serviço os cidadãos que lhe parecem azados para
accordo com esta assembléa que tendo a junta elles; assim como os deve remover quando elles
provisoria da Bahia participado que procedera á mostrão menos sufficiencia, do que aquella que a
demissão dos empregados conhecidos por inimigos principio se lhes presumio; e prouvera a, Deus que
declarados da causa do Brazil, e nomeados pelo assim sempre o fizesse, visto que com a clausula –
Madeira ou pela ultima junta do governo civil creada emquanto bem servir – se lhe passão tambem os
por ordens de Portugal, e que se via embaraçada provimentos.
para substituição delles por não saber se daria a Não é pois jogo de empurra o que opino; é
preferencia aos que forão encarregados de mandar a seu dono aquillo que nos não pertence;
commissões interinas na Cachoeira, ou aos que seja bom, ou máo o expediente, o governo que
estando servindo na cidade se retirarão para o carregue com elle.
Reconcavo sem nota, respondeu-se-Ihe que O SR. CARNEIRO DE CAMPOS: – Chamei a
achando-se este negocio affecto á assembléa por isto jogo de empurra porque ouvi dizer – vá o
meio de um projecto, devia esperar-se a sua negocio ao governo para não darmos occasião a
decisão; e que entretanto cumpria proceder com que os máos nos chamem demagogos. – Quanto á
toda a circumspecção e prudencia. outra proposição que acabou de enunciar o illustre
Creio que não é preciso mais para mostrar preopinante tambem a não admitto. Ha officios que
que o governo está de accordo com a assembléa. o governo nunca deve tirar, sem se mostrar que a
Tambem direi que não approvo outra pessoa que o serve commetteu crime que o
proposição que ouvi ao mesmo illustre deputado, inhabilite de continuar a exercel-o (Apoiado.)
isto é, que mandassemos o negocio ao governo Ha outros porém que póde tirar a seu arbitrio;
para não se criminar pelo resultado este congresso. tal é, por exemplo, uma commissão; della póde
Se o negocio pertence ao governo elle o remover a pessoa a quem a confiou, ou porque não
decida; mas se pertence á assembléa não seja mais precisa, ou por não desempenhar á sua
joguemos o jogo do empurra. Nós estamos aqui vontade; mas deixar livre ao governo a faculdade de
para deliberarmos sobre as materias da nossa tirar todo e qualquer emprego quando queira, não,
competencia, declarando as nossas opiniões sem senhor; não admitto tal doutrina; haja sentença que
receio de juizos alheios; eu digo sempre o que me mostre a pessoa inhabil de continuar a servir; sem
dita a minha consciencia, e cumpro assim o meu ella de modo nenhum.
dever. Portanto, torno a dizer, decida o negocio Tambem não quero dar tamanha extenção ás
quem o deve decidir, mas nada de jogo de empurra. clausulas das cartas; estas clausulas são postas
O SR. FRANÇA: – Engana-se o illustre para declarar que a propriedade de um officio não é
preopinante emquanto suppõe que ha jogo no meu uma propriedade ordinaria em que ha a livre
modo de pensar, com que carreguemos sobre o disposição da cousa, e o direito de herança, como
governo aquillo que lhe não pertence: o contrario é se entendia antes de abolido o chamado direito
que se poderia talvez qualificar de jogo, e jogo consuetudinario.
indevido; porque eu estou convencido de que ao Da que diz respeito a tirar-se o officio e não
governo pertence empregar, e destituir ad libitum os haver direito á indemnisação não se deduz que o
officiaes publicos dos seus empregos, tanto governo possa arbitrariamente tirar os officios a
vitalicios, como temporaes; sem que se possa dizer, quem os possue: isto refere-se ao caso de ser
que nisso lhes commette injuria:
62 Sessão em 9 de Agosto de 1823

por utilidade publica abolido o emprego, e não a policia não é juiz contencioso; e o acto é
poder o governo destituir qualquer empregado sem contencioso, é um perfeito processo. Não sei
processo, conservar o officio, e dal-o a outrem. portanto como se dão no projecto ao intendente
O SR. MONTESUMA: – Levanto-me para me attribuições que lhe são estranhas; quando se
oppôr ás idéas do Sr. França pelas quaes parece tratasse destas justificações não podia isto ter lugar
entender que os nossos inimigos não merecem senão em juizo criminal da terra onde se tivessem
castigo algum, fundando-se em não haver lei de dar. (No resto não se entendeu o tachygrapho.)
existente para o caso de que se trata. Pelos seus O SR. MONTESUMA: – A jurisdicção do
principios devem elles viver entre nós, gozar de intendente geral da policia é civil e criminaI; e alli se
todos os fóros e privilegios em tranquillidade, até preparão os processos para se remetterem para
que achem occasião de pôr em pratica seus onde compete. Emquanto á 2ª parte do artigo, se eu
nefandos projectos. disse que poderá haver vista da justificação o
Será isto muito justo, mas não para mim. cidadão que a quizer contrariar, foi para destruir a
Como diz o illustre preopinante que não ha lei idéa de poderem taes justificações serem filhas de
applicavel? Pois não ha lei que ordene a punição do amisades, pois muitas vezes tenho ouvido que ellas
traidor á patria? E não estão estes homens têm o perigo de serem feitas por dez ou doze
comprehendidos na lei por sua conducta? Eu pessoas que o justificante allicia para esse fim; ora,
entendo que sim, e por isso não posso approvar o para evitar isto é que puz a segunda parte.
que acaba de dizer o illustre deputado, nem Emfim, Sr. presidente, segundo o plano em
conformar-me... (Não foi ouvido o resto do seu que fundamentei o projecto eu quiz não só lançar
discurso.) fóra dos empregos os inimigos da nossa causa, mas
O SR. MIGUEL CALMON: – Depois do que tambem chamar para elles os que se tivessem
se tem dito pouco terei que accrescentar. A palavra mostrado a favor da patria, e não tivessem servido á
justificação suppõe crime ou falta de que alguem causa de Portugal.
deve purificar-se: e eu declaro, Sr. presidente, que Poderá nisto occorrer algum inconveniente;
olho com horror para estes meios de julgar os mas esse mal sempre será muito menor do que
homens; detesto essas devassas, e tribunaes que conservar nos empregos publicos homens que são
se erigem, e que eu considero de pura inimigos da nossa causa, e que pertencem a uma
inconfidencia. Esta medida como é proposta se não nação cujos interesses quererão sempre advogar e
é impolitica, é injusta... e por isso voto contra o favorecer.
artigo. O SR. CARNEIRO DE CAMPOS: – O illustre
Quereria porém que se lhe substituisse a preopinante não desfez com as razões que deu as
emenda do nobre deputado o Sr. Carneiro, objecções oppostas. Sr. presidente, a lei deve ser a
declarando-se inaptos para exercer empregos os mais clara possivel, e esta não tem a devida clareza;
que forão nomeados por nossos inimigos depois da por exemplo, neste artigo diz-se que as justificações
declaração da independencia do imperio. Se ao serão feitas perante o magistrado que servir de
governo pertence fazer isto elle que o faça; e se intendente da policia, e isto mesmo não é claro;
pertence á assembléa despojal-os desse direito de devia dizer-se perante o magistrado delegado do
cidadão que os habilitava para o exercicio de intendente, ou o magistrado da policia daquella
qualquer emprego, tratemos de o declarar. Temos cidade; – mas isto é o menos. O argumento do Sr.
obrigação de nos guardarmos de empregados Antonio Carlos ainda está em pé, e vem a ser: uma
publicos nossos inimigos, que praticárão actos pelos justificação é uma especie de processo, ha nelle
quaes se conhece que nunca nos derão a mão, que sentença, e o intendente da policia não profere
nunca nos ajudarão. sentenças; logo, dá-se ao intendente uma attribuição
Taes são os indicados na emenda do que lhe não compete.
Sr.Carneiro. E quem é que não sabe na Bahia A isto respondeu o nobre deputado que alli se
quaes são os que Madeira escolheu? Mas, – Sr. prepara sómente o processo, e se remette depois ao
presidente, não quero dizer mais, porque talvez eu juiz competente; mas se era essa a intenção do
seja um juiz suspeito, incitado pela lembrança do illustre autor devia declaral-a, porque do modo que
mal que fizerão á minha provincia. Todavia alguma está dá lugar a interpretações, e cada um o
providencia é necessaria... (O resto não o ouvio o entenderá como lhe parecer. Portanto acho manco o
tachygrapho.) artigo, e por isso voto que não passe.
Julgou-se a materia discutida, e passou-se ao O SR. MONTESUMA: – Eu respondo
art. 4º concebido nestes termos: unicamente ao nobre preopinante, e direi mui pouco.
Art. 4º Estas justificações serão feitas perante Sem duvida, as leis devem ser claras, e não digo
o magistrado que servir de intendente geral da que este artigo tenha toda a clareza necessaria;
policia, da qual poderá haver vista o cidadão que a porém elle é feito para ser entendido por pessoas
pretender contrariar.
O SR. ANDRADA MACHADO: – Este artigo
não póde passar como está. O intendente geral da
Sessão em 9 de Agosto de 1823 63

de lei, por magistrados, e não pelo povo; e estou sabe que deve escolher homens affectos á causa
persuadido que o intendente ha de entender muito do Brazil para os empregos; isto é, como se diz,
bem o artigo. Todavia não duvido que se lhe faça ensinar o Padre-Nosso ao vigario. Eu estou muito
toda e qualquer declaração para que fique bem persuadido que o governo ha de dar os empregos a
explicada a lei; e só não concordo na suppressão. pessoas que tiverem prestado serviços á nossa
O SR. CARNEIRO DE CAMPOS: – E' um causa; e por isso parece feio dizer-lhe o que elle
principio falso o que suppõe que a lei é só para o deve saber; se elle não é capaz de fazer isto, sem
juiz; a lei é geral para todo o mundo (muitos se lhe dizer, então não é governo, não é nada. Por
apoiados); a sua determinação deve ser tão clara estes principios offereço a seguinte emenda:
que qualquer a entenda, e que o magistrado não Peço a suppressão do 6º artigo. – Andrada
tenha duvidas quando tratar de a applicar, porque a Machado.
lei não póde ser supprida por ninguem. (Apoiado.) Foi apoiada.
A’ vista desta o mesmo juiz diria – a lei não O SR. MONTESUMA: – Não julguei que este
está clara, portanto é preciso suppril-a onde tem artigo encontrasse tantas objecções; mas é muito
falta; – ora, isto é o que eu não quero, porque dá certo que nas occasiões de precisão desejão-se e
lugar a arbitrios; e por isso não admitto o artigo. estimão-se os serviços, mas depois ha poucos que
O SR. FRANÇA: – A discussão limita-se á os agradeção. Eu procurei por este artigo arredar os
doutrina do artigo; restringirei a ella o meu discurso; empregados publicos que erão máos, e chamar os
e pergunto: E' um crime, ou não é, o ter exercitado bons; mas não terá lugar pelo principio que acabei
algum emprego publico na cidade da Bahia durante de enunciar; depois dos serviços feitos ninguem se
o governo do dictador Madeira? lembra mais de quem sacrificou seus commodos,
Se é um crime, ha juiz competente para fazenda e vida, para se conseguir o bem que se
conhecer delle; e se não é um crime, não temos desejava. Porém se este artigo não tem lugar,
nada que innovar sobre isto. Portanto o artigo é tambem os outros o não têm, e o melhor é pedir a
ocioso, até porque vai conferir aos agentes suppressão de todos.
ministros da policia uma attribuição de que não O SR. ANDRADA MACHADO: – Eu pedi a
gozão por direito. Eu mando á mesa a minha suppressão deste artigo pela superfluidade da sua
emenda. doutrina, defeito que devemos evitar com todo o
Voto pela suppressão do artigo. – O deputado cuidado nas leis; nada mais se faz nelle, como já
França. disse, do que insinuar ao governo qual é a sua
Foi apoiada. obrigação, o que não posso admittir. Eu não sou
Julgou-se a materia discutida, e passou-se ao amigo do governo, talvez eu seja antes taxado do
art. 5º do theor seguinte: sentimento contrario; porém todas as vezes que eu
Art 5º. O processo de taes justificações será o julgo que a materia é attribuição sua não quero que
das causas summarias. nos mettamos nella. Para que havemos suppôr que
O SR. ANDRADA MACHADO: – (Não o o governo não ha de provêr nos empregos as
ouvirão os tachygraphos.) pessoas que fizerão serviços á nação, que
O Mesmo Sr. Deputado mandou á mesa a arriscárão a sua vida, que perderão bens, e que são
emenda seguinte : aptos para satisfazer ás obrigações desses lugares?
Suppressão do 5º artigo. – Andrada Eu ao menos não o creio; e por isso
Machado. considerando isto como ordem acho-a
Foi apoiada. despropositada, e como conselho um
Julgou-se a materia discutida, e passou-se ao intromettimento. O governo ha de fazer, sem se lhe
art. 6º concebido nestes termos: insinuar, o que dispõe o artigo: se elle quer
Art. 6º Durante taes suspensões deveráõ continuar a ser governo não deve chocar a opinião
servir os empregos os que servião no Reconcavo; e publica nem atacar a justiça; ora, atacaria uma e
caso não se fação taes justificações, ou decaião outra cousa se não desse os empregos aos que se
dellas aquelles que as intentarem serão preferidos expuzerão a tudo para salvar aquella provincia, uma
sempre para a continuação e vitalicio exercicio dos vez que sejão aptos para os servir. Eis-aqui porque
empregos os que houverem prestado serviços á pedi a suppressão.
causa no Reconcavo e interior da provincia, que O SR. MONTESUMA: – Eu tambem estou
serão logo providos segundo sua aptidão. convencido que o governo ha de escolher os mais
O SR. ANDRADA MACHADO: – Este artigo habeis cidadãos, e cada um destes para o que
só tem por fim dar regras ao governo, o que em melhor lhe competir; mas tambem não vejo em que
verdade não tem lugar algum, porque elle bem a materia do artigo offenda o governo; bem pelo
contrario, penso que não o ataca, e que honra a
assembléa que faz esta declaração; com ella ficão
os povos satisfeitos; segura-se a opinião
64 Sessão em 9 de Agosto de 1823

publica; e nós nada perdemos. Eis aqui porque a traz bem estudada, póde combater as opiniões
sustento o artigo. expendidas e como não se lhe refuta o que elle diz em
Julgou-se a materia discutida e passou-se ao favor da sua opinião, podem os argumentos de que
artigo 7º do theor seguinte: elle se servir, por isso que não são combatidos, ter
Art. 7º Debaixo da palavra empregados grande influencia para a votação; e julgo isto contrario
comprehende-se igualmente os militares para ter sobre á boa ordem.
elles a mesma applicação. O SR. ANDRADA MACHADO: – Sr. presidente,
Como ninguem pedisse a palavra, deu-se por se é por ter o autor do projecto estudado a lição em
discutida a materia do artigo. casa, eu digo que os outros Srs. deputados tambem a
Propoz então o Sr. presidente: estudão; pois creio que ninguem vem para aqui sem
1º Se estava concluida a 2ª discussão. – ter ordenado mais ou menos as suas idéas sobre o
Venceu-se que sim. projecto, porque não se trata delle logo que se
2º Se passava á 3ª discussão. – Venceu-se que apresenta, sempre se passão alguns dias que se
não; ficando por isso rejeitado o projecto. concedem mesmo para esse fim, para que se esteja
O Sr. Secretario Costa Aguiar pediu a palavra mais senhor da materia.
para lêr o seguinte officio do ministro dos negocios do Se concedermos este privilegio não ha de ser
imperio: para começar-se novo debate, ha de ser pelo contrario
Illm. e Exm. Sr. – Tendo o barão da Laguna com prohibição de ninguem mais fallar depois delle;
dirigido á presença de Sua Magestade o Imperador, sem esta condição serei de voto que não se conceda
pelo officio de 28 de Fevereiro do corrente anno, o tal graça; falle então cada um sem distincção as vezes
obstaculo que se offerece para a reunião dos que lhe competem: quando não, póde o autor servir-se
deputados pela provincia Cisplatina á assembléa geral de alguma razão nova, outro pede a palavra para a
constituinte e legislativa do imperio do Brazil, em contrariar, e eis-aqui uma nova questão, ainda que não
cumprimento da portaria que lhe foi dirigida em data de haja nada de novo para dizer e que sómente se repitão
5 de Janeiro antecedente: o mesmo augusto senhor as mesmas idéas.
me ordena que remetta a V. Ex., para ser presente na Portanto, ou falle por ultimo de todos, ou
mesma assembléa o referido officio, afim de decidir supprima-se o artigo.
sobre este objecto o que lhe parecer conveniente. O SR. CARNEIRO DE CAMPOS: – Eu sou de
Deus guarde a V. Ex. – Palacio do Rio de voto que se deve conceder ao autor do projecto fallar
Janeiro, em 5 de Agosto de 1823. – José Joaquim mais uma vez do que outros, destinada esta vez que
Carneiro de Campos. – Sr. José Ricardo da Costa se lhe concede a elIe fazer como um epilogo de todos
Aguiar. – Foi remettido á commissão de constituição. os argumentos que têm havido e a responder ás
Passou-se á 2ª parte da ordem do dia, que era o duvidas que se tenhão suscitado, porque elIe deve
regimento da assembléa, e entrou em discussão o estar mais certo do que qualquer dos outros na
artigo 108 que na sessão do 1º de Agosto ficára materia, e mais em termos de responder. Mas como
adiado por depender a sua decisão da que tivesse o depois delle nunca deverá fallar outro deputado, para
artigo 105. que se evite o inconveniente de se alongar em
O Sr. Araujo Lima pediu a palavra e offereceu a demasia o debate, cumpre declarar que só poderá
emenda seguinte: gozar desta graça no fim da discussão quando mais
Na ultima discussão poderá o autor fallar uma ninguem quizer fallar, aliás ficaria ao arbitrio do autor
vez mais, querendo. – Araujo Lima. acabar a discussão quando quizesse: fallava as vezes
Foi apoiada. permittidas a todos e depois quando lhe parecesse
O SR. ANDRADA MACHADO: – Concedendo- pedia a palavra e como mais ninguem podia fallar
se esta graça ao autor do projecto eu desejára que terminava a discussão.
fosse no fim quando se julga discutida a materia, de Para evitar isto é que eu quero que se declare
sorte que depois delle ninguem mais fallasse; porque a (bom é que tudo se estabeleça com clareza) que elle
não ser assim começa-se um novo debate e não tem deve fallar no fim da discussão. Quando o Sr.
fim a discussão. Portanto seja-lhe permittido fallar essa presidente, olhando para a assembléa vê que mais
vez mais, como para fazer uma resenha das razões ninguem quer fallar e que por isso se entende que a
que teve quando estabeleceu a doutrina do projecto, materia está discutida, é então que o autor do projecto
mas não para debate novo. póde pedir a palavra; mas antes disso nunca.
O SR. FRANÇA: – Eu tambem não me opponho Eis-aqui a emenda que para esse fìm proponho,
a que se conceda esta graça ao autor do projecto, mas salva a redacção:
opponho-me a que fiquem inhibidos os outros Srs.
deputados de fallar depois sobre a matéria EMENDA
O autor que tem visto a lição em casa e que
Quando o presidente fôr a propôr se a materia
Sessão em 9 de Agosto de 1823 65

se acha sufficientemente discutida, poderá o autor sempre ha de fazer peso a favor dos que delle se
do projecto pedir a palavra para fallar mais uma vez servirem; e isso é o que não convém.
das permittidas. – Carneiro de Campos. Depois de algumas reflexões foi approvado.
Foi apoiada. Art. 116. Durante a discussão nenhum
O SR. VERGUEIRO: – Eu sou de opinião que deputado poderá referir-se a documento que não
se supprima o artigo, porque não sei bem como ha esteja presente.
de ter lugar o fallar o autor no fim da discussão. Só Foi approvado.
se entende que está finda a discussão quando a Art. 117. Ainda que não haja quem falle a
assembléa vota que o projecto está discutido respeito das propostas e que por isso não se
sufficientemente, e se está discutido para que se verifique a discussão, sempre se procederá a votos
precisa ouvir o autor do projecto? como nos arts. 86, 91 e 96.
Nada me parece mais inutil. Se elle é quem O SR. CARNEIRO DE CAMPOS: – Parece-
deve estar mais bem preparado, mais instruido na me que este artigo precisa de reforma; quando não
materia, tambem é quem póde melhor que outro ha discussão não sei como possa perguntar-se se a
qualquer desenvolver suas idéas nas duas vezes. materia está discutida! Será melhor dizer-se se
Mas, disse um Sr. deputado, será póde passar-se ao artigo seguinte.
conveniente que elle afinal faça um epilogo dos O SR. FRANÇA: – O que o Sr. presidente
argumentos expendidos; respondo que para isso deve propôr é se a assembléa ha o artigo por
póde muito bem reservar a segunda vez que lhe discutido.
toca, sem lhe ser necessaria a do privilegio. O SR. CARNEIRO DE CAMPOS: – Isso é o
Portanto, parecendo-me inutil este artigo mesmo; se elle se não discutiu, como ha de o Sr.
porque no meu entender para nada serve, voto que presidente perguntar se o ha por discutido? Antes
se supprima, e por isso mando á mesa a seguinte se diga se alguem ha que queira fallar e depois se
emenda: póde passar-se ao artigo seguinte; mas sem haver
Que se supprima o artigo. – Vergueiro. discussão perguntar se está discutido entendo que
Não foi apoiada. não tem lugar.
Julgou-se a materia discutida e o Sr. O SR. VERGUEIRO: – Esta questão é
presidente propoz: meramente de palavras; que nos importa que seja
1º. Se o artigo seria supprimido. – Venceu-se esta ou aquella a formula da expressão?
que não. O que se quer dizer é que se não ha
2º. Se passava com a emenda do Sr. discussão se passa a votar; – e isto faz-se bem por
Carneiro de Campos. – Venceu-se que sim; ficando esta mesma formula sem precisão de innovar uma
por isso prejudicada a emenda do Sr. Araujo Lima. só para este caso.
O SR. ARAUJO LIMA: – Não entendo o Posto á votação o artigo foi approvado.
vencimento; e preciso saber o que se venceu. Por ser chegada a hora da leitura dos
O SR. FRANÇA: – Venceu-se que passava o pareceres de commissões, não continuou a
artigo com esta emenda do Sr. Carneiro de Campos discussão do regimento e entrou em debate o
(leu-a). parecer da commissão de constituição sobre o
O SR. ARAUJO LIMA: – Creio que a materia requerimento de Marcos Thomaz de Oliveira, que
está proposta com alguma confusão; é preciso fôra apresentado na sessão de 5 do corrente e
saber se o autor do projecto póde fallar mais uma ficará adiado na antecedente.
vez no fim da discussão de cada artigo, ou se é só O SR. CARVALHO E MELLO: – Na sessão
no fim de tudo, depois de todos terem fallado. antecedente houverão differentes opiniões a favor e
O Sr. Presidente propoz novamente se a vez contra este parecer da commissão, o qual versa
de fallar que de mais se concedia ao autor do sobre ser licito a qualquer dos illustres deputados
projecto na 2ª discussão respeitava a cada um dos renunciar o priviIegio de não poder ser demandado
artigos; venceu-se que não; e por isso ficou decidido nem demandar, durante o tempo desta legislatura.
que a tivesse no fim da discussão de todos os Os que seguem a affirmativa, fundão-se na
artigos. regra geral de direito, de que é licito a qualquer
Art. 115. Durante a discussão não poderá renunciar o privilegio que lhe é concedido, porque é
allegar-se nem fazer-se menção do voto do poder tambem uma regra certa, que os favores e graças
executivo. não se concedem aos constrangidos, ou mais claro,
O SR. FRANÇA: – Julgo escusado este que ninguem deve por força ser obrigado a aceitar
artigo, e proponho a sua supressão. qualquer graça ou isenção.
O SR. ANDRADA MACHADO: – Este artigo Este principio juridico comtudo, tem uma
tem por fim evitar que entre para fortificar excepção fundada em direito publico, convém a
argumentos o voto do poder executivo, porque este saber, que só ella deve ter lugar quando o privilegio
ou isenção não tem por fim o bem, ou o
66 Sessão em 9 de Agosto de 1823

interesse da causa publica, porque então é á todas que todos soffremos de bom grado, e que são
as luzes manifesto, que não está no arbitrio do pequenos, a par da gloria que nos resulta de tão
cidadão renunciar a uma mercê ou graça que não lhe honrosa nomeação, e da que nos ha de caber em
é só peculiar, mas tem relação com algum bem da partilha, quando virmos erguido, levantado,
sociedade. consolidado e aformoseado o grande edificio social,
Eu entendo, Sr. presidente, que os illustres a que nos propuzemos. Sei tambem que o illustre
deputados desta augusta assembléa, que formarão o deputado com quem versa esta contenda, de bom
regimento para o seu governo interno, quando animo, e de mui boa vontade, se offerece a ceder
estabelecerão as regras de que nenhum deputado deste privilegio.
podia demandar nem ser demandado durante o A sua bem conhecida honra e probidade
tempo de suas funcções, não tiverão em vista jámais afiançava de antemão esta generosa sessão, mas o
o conceder esta isenção por favor especial a cada que elle faz por principios de generosidade e
um delles, mas tiverão em vista o bem que disto decencia, póde-o fazer por principios de direito? Esta
podia resultar ao interesse publico. Além de que esta é a questão, e sobre ella é que eu assento o meu
devia ser a principal vista de legisladores; é juizo.
manifestamente claro que graça e mercê se não Firme nos principios do mais escrupuloso
podia entender, vista a primeira parte da referida dever, tenho que o parecer da commissão não é
regra, isto é, – não poder demandar. cingido e cortado ao espirito do artigo do regimento,
Quem não vê que é isto privar de um direito que se controverte.
que toca a cada um de ir propôr a juizo os seus Não abramos a porta ás suspeitas de
interesses? condescendencias contra o bem publico, não
Um deputado, que fôr proprietario não tem revoguemos já o que ha pouco foi estabelecido; e
muitas occasiões de intentar acções, já para cobrar seria vista esta interpretação com principios sinistros
dividas, rendimentos dos seus predios, defeza e malignos sentimentos.
ácerca da propriedade destes, servidões, acções de Conheço, Sr. presidente, que esta materia
força e outras que se derivão dos direitos, que a póde ser debatida com mais extensão quando ella
cada um assistem segundo a lei? fôr objecto de particular discussão.
Não ha muitas destas acções que até Quando houver de estabelecer-se, em lugar
prescrevem em certo tempo? proprio do codigo constitucional, a serie das
E chamar-se-ha graça e mercê, uma prerogativas dos deputados desta augusta
prohibição, que tolhe direitos e produz damnos e assembIéa, então examinando-se, com profundeza e
prejuizos? circumspecção, muitos dos argumentos por mim
Não, por certo. referidos, e outros que occorreráõ, fixar-se-ha a
E' portanto, evidentissimo, que o motivo que regra que se julgar mais conforme aos verdadeiros e
se antolhou a estes sabios legisladores, foi o bem justos direitos de todos os cidadãos.
publico, que soffreria se pessoas revestidas de O SR. ANDRADA MACHADO: – Eu sou
tamanha autoridade fossem inquietar o cidadão inteiramente opposto á opinião do nobre preopinante.
pacifico que soffreria talvez pela opposição de tão Disse, entre outras cousas, que a regra estabelecida
grande e duro contendor: este se abaixaria do gráo a no regimento tem por fim o bem da causa publica;
que foi elevado de representante da nação, para ir mas creio que póde dizer-se o mesmo de quaesquer
aos auditores de justiça fazer-se parte. Os juizes outros privilegios porque, sempre abrangem cousas
olharião com algum respeito offensivo da que têm relação com a causa publica... Além disto
imparcialidade os direitos do deputado e talvez terião cuido que os motivos por que se concedeu isto aos
condescendencias criminosas com mingua dos que deputados, não forão os que apontou o nobre
de direito pertencessem aos seus contrarios. preopinante: ao menos eu não sei que se
E não era justo que se acautelassem estes comprometta a dignidade do deputado em
males, que offendem e vão de encontro ás garantias comparecer perante a justiça; o mais graduado de
que a lei pretende estabelecer ácerca dos direitos todos os cidadãos é tão grande como os outros,
individuaes de todos os cidadãos? perante as autoridades estabelecidas pela nação;
Estes mesmos fundamentos, são os que todos são iguaes na presença da lei...
induzirão o sabio autor da tactica das assembléas, Quanto ao que interessa á causa publica, em
para aconselhar o estabelecimento desta regra, e não se distrahir o deputado de suas funcções, digo
são os mesmos fundamentos, torno a dizer, os que que uma vez que elle possa ao mesmo tempo cuidar
decidirão a algumas nações illustradas a abraçar dos seus negocios, é justo que elle o faça; o vedar-
esta opinião. lhe que trate delles, quando o póde fazer sem faltar
Eu sei que é dura esta prohibição para nós ás obrigações que contrahio com a nação, é muito
outros deputados, que podemos soffrer mingua nos duro, e até o considero um absurdo.
nossos direitos; porém é este mais um sacrificio, que Na Inglaterra não têm os deputados tal
fazemos á causa publica; e este importante emprego privilegio;
acarreta alguns outros prejuizos,
Sessão em 9 de Agosto de 1823 67

respondem em todas as demandas, e só não podem O SR. CARNEIRO DE CAMPOS: – Sr.


ser presos... Na America do Norte tambem só gosam presidente, não posso concordar com o illustre
do mesmo; e portanto, não sei por que havemos preopinante, que acaba de fallar sustentando o parecer
sujeitar a esta lei os que não querem aproveitar-se do da commissão.
favor della. Não ha duvida que o privilegio por via de regra é
Eu não vejo razão alguma solida para o pessoal; porém cumpre distinguir, se o privilegio de
despojar de um direito que lhe compete. que tratamos tem por fim beneficiar ao deputado, ou se
O SR. CARVALHO E MELLO: – Quando eu elle se dirige mais á causa publica, do que ao beneficio
disse, Sr. presidente, que o privilegio não era pessoal, e interesse da pessoa, a quem foi conferido.
nem do cidadão em particular, fiz ver com evidentes No primeiro caso, eu conviria com o illustre
razões, que elIe era estabelecido pelo interesse da deputado; porque uma regalia ou isenção concedida a
causa publica. Elles são tão manifestos e alguem, em remuneração dos seus prestantes
convincentes, que não podem ser destruidos. serviços, não ha duvida que tem por objecto principal o
Embora se produza o exemplo de algumas beneficio particular da pessoa privilegiada; e nestes
nações, nas quaes é permittido aos deputados termos não se lhe póde negar o direito de poder
demandar e ser demandados, no tempo em que durão renunciar um beneficio, que lhe é proprio, todas as
as funcções da legislatura: porque outras ha, como vezes que bem lhe parecer, mórmente indo elle de
disse na sessão antecedente, que o prohibem, e como encontro com seus interesses.
tambem disse, que assim o aconselhão escriptores de Mas eu encaro de uma maneira bem diversa o
boa nota. Além disto, motivos particulares deduzidos privilegio conferido ao deputado para não ser
do genio, costumes e legislação dessas nações as demandando. Neste não se trata de beneficiar o
decidirão áquelle estabelecimento. deputado, procura-se segurar o interesse nacional: é á
Se nós consultamos a pratica da nossa ordem causa publica e não ao deputado que se attende.
judiciaria e vicios de administração de justiça, achamos A nação tem o maior interesse na mais absoluta
que podem recrescer da regra que estabelece o independencia do seu representante, para que elle
parecer da commissão os inconvenientes que referi. possa mui livremente lembrar e promover o bem geral;
A elles accresce o tempo que perderão os esta independencia não será inteira e absoluta, se o
deputados em tratar de negocios forenses, quando deputado estiver sujeito a outro poder, que não seja o
devião empregar seus disvellos nas serias meditações, desta augusta assembléa. Ora, aquelle que demanda
que exigem as soberanas funcções de que estão ou é demandado está dependente do seu juiz, e se
encarregados. considerarmos os homens como elles geralmente são,
Que todo o privilegio seja odioso, é certo em o amor que necessariamente tem qualquer ao que lhe
these geral e abstracta; mas em séria meditação, só pertence, ou se persuade pertencer-lhe, forçosamente
tem a particular intelligencia, quando se trata de o conduzirá a empregar os meios de obter as
isenção concedida pessoalmente, ou mais claro, disposições favoraveis dos seus juizes, ou pelo menos
quando com offensa da lei, se outorgão isenções a será mui cauteloso em os não indispôr contra si.
despeito della, e em favor de uma pessoa que se diz Em taes circumstancias a nação não tem uma
privilegiada. garantia, que lhe afiance que o seu representante
Nesta hypothese não póde ser comprehendido levantará neste augusto recinto para accusar e fazer
o chamado privilegio de que se trata, porque já fiz ver reprimir qualquer abuso que descubra no poder
que não era pessoal; nem para um só deputado; mas judicial, e em que por ventura estejão incursos os seus
que tinha o fim do interesse publico. juizes.
E poder-se-ha chamar absurda esta opinião, Além disto o deputado deve dedicar-se todo ao
que tem por base tão delicados e solidos exame, meditação e estudo de quanto importa á causa
fundamentos? Só o amor de defender a sua opinião publica; uma demanda, ainda sendo tratada por
poderia suggerir a extravagante idéa de se chamar procurador, não deixaria de absorver grande parte do
absurdo o que é coherente com os depurados tempo que deve ser empregado no desempenho das
principios de direito publico. augustas funcções, de que elle se acha encarregado.
Demais disto, Sr. presidente, eu disse, e torno a Estas considerações, pois, bem persuadem que
dizer, que não era conveniente, que por uma o privilegio de não ser demandado, bem longe de ser
interpretação de um simples caso particular, se conferido em beneficio pessoal do deputado, é mais
derogasse já a regra estabelecida no regimento ha tão antes uma garantia que possuem os seus constituintes
pouco tempo: e que só em lugar e tempo competente de que achando-se elle absolutamente independente,
se deveria controverter, discutir e examinar esta olhará sómente para o maior interesse publico, sem
questão importante, decidindo-se em regra geral o que outra alguma contemplação, e que desembaraçado de
se julgar mais justo, util e conveniente.
68 Sessão em 9 de Agosto de 1823

todos os cuidados, que aliás poderião absorver a sem que este se possa justificar peremptoriamente
sua attenção, a empregará toda em promover o em juizo?
bem e prosperidade geral. Portanto se este Não se póde considerar maior desgraça do
privilegio é do interesse peculiar da nação, jámais que converter-se o beneficio da lei em maleficio da
convirei que o deputado o possa renunciar. pessoa. Quando, findo o tempo da actual
O SR. VERGUEIRO: – Se eu entendesse que legislatura, o diffamado comparecer na justiça,
isto era um privilegio, diria que era um privilegio poderá sim confundir ao diffamador; mas este
pessoal, embora o motivo por que se concedeu seja recurso será de tardio effeito, e talvez não repare o
a causa publica; mas eu estou persuadido que não mal. Pelo que voto pelo parecer da commissão,
é privilegio. para o deputado poder dar immediatamente defeza
Temos a lei geral que estabelece que todo o em juizo, á bem da sua reputação, querendo usar
cidadão póde chamar e ser chamado a juizo e deste indulto.
temos agora a limitação em que se exceptua o O SR. ALMEIDA E ALBUQUERQUE: – Não
deputado, para nem poder chamar nem ser posso de modo algum concordar com o parecer da
chamado. Aqui não ha privilegio, ha uma excepção commissão; deveria negar a licença, ou dizer que
da lei geral, uma excepção que de fórma alguma podia conceder-se: porém deixar ao arbitrio do
póde ser considerada como privilegio concedido á deputado acho que não póde ter lugar.
pessoa do deputado, porque é estabelecida para O artigo do regimento diz assim: – Emquanto
utilidade publica, para não se distrahirem os Srs. durarem as sessões não póde o deputado
deputados das suas obrigações, que na verdade demandar nem ser demandado civilmente, nem ser
são muito sérias, e não admittem distracção executado por dividas. – Ora, deixando isto o
alguma. Porém, póde haver casos em que seja parecer da commissão ao arbitrio do deputado, será
conveniente uma dispensa; estou por isso; mas melhor supprimir este artigo.
então trate-se dessa outra questão, que é ver se O deputado, em tal caso, quando lhe fizer
estamos ou não no caso de haver essa dispensa, conta, diz que quer demandar, e quando lhe parecer
pois ainda não ouvi apontar razões algumas, com que o entrar em demanda lhe é prejudicial diz que
que se prove a necessidade della. não quer; ora isto não é possivel conceder-se.
Portanto, da fórma que o parecer está Portanto, se ha de passar o parecer estabelecendo
redigido, voto contra elle. este arbitrio, então supprima-se o artigo do
O SR. SILVA LISBOA: – Sr. presidente, não regimento; e se este deve conservar-se, então voto
contestando a regra de não poder o membro de contra o parecer pela injusta desigualdade que
alguma corporação renunciar ao privilegio dado á estabelece.
communidade por motivo de interesse publico, O SR. RODRIGUES DE CARVALHO: –
todavia entendo que o privilegio concedido aos Parece-me que quando se redigio o projecto de
representantes desta augusta assembléa, de não regimento não houve tenção de conceder no citado
poderem activa e passivamente ser inquietados com art. 179 um privilegio pessoal. Esta doutrina é tirada
demandas, tem igual razão ao semelhante privilegio do regimento das côrtes de Portugal, e quando lá se
concedido ao ausente por causa da republica, como estabeleceu foi por se pensar que havia neste caso
os ministros ou enviados de missão diplomatica a mesma razão que se dava para conceder isto
para tratarem dos negocios do estado. mesmo a nossa ordenação aos embaixadores, isto
Não me recordo ter lido que elles não possão é, a ausencia por causa da repubIica. Nem isto se
renunciar a tal privilegio, seguindo suas demandas concedeu propriamente para o deputado que fosse
por procurador, a considerarem ser assim do proprio natural da terra onde a assembléa trabalhasse;
interesse. mas, em attenção aos das outras provincias em que
O caso de que se trata não é de interesse de se verificava a razão da ausencia por causa da
bens, mas da melhor de todas as propriedades, o republica, concedeu-se geralmente a todos.
bom nome, e credito do deputado em lide pendente; Se a assembléa quer isto, que foi tirado das
visto ser diffamado com atrozes imputações no côrtes de Portugal, as quaes tambem o tirarão da
requerimento que o seu contendor offereceu, e se nossa ordenação, não póde admittir-se o parecer.
leu nesta assembléa; o que fez sinistra impressão. Os deputados são homens como todos os
O epico latino bem disse, que a fama adquire mais; deixemo-nos agora de nos suppôrmos de
forças na carreira – vires adquirit eundo: – mas a natureza angelica; se deixarmos isto ao arbitrio do
infamia corre ainda mais veloz. deputado, será este privilegio (se assim o querem
Como póde o vulgo, e ainda os deputados chamar) origem de males incalculaveis, em lugar de
desta assembléa, olhar com serenos olhos para um produzir bens, porque então o deputado demanda
legislador (que tambem é magistrado) achando-se só quando quer e lhe faz conta, e quando não quer
arguido de caracter violento, e espoliador, não demanda; ao mesmo tempo em que é evidente
que não foi com o fim de privilegiar o deputado que
isto se estabeleceu,
Sessão em 9 de Agosto de 1823 69

mas por se considerar no mesmo caso, como já providencias a bem dos povos do seu districto: é de
disse, do que está ausente por causa da republica. parecer.
Voto, portanto, contra o parecer da commissão. A respeito do 1º artigo, que sendo commum a
O SR. MAIA: – Fosse qual fosse a intenção necessidade de uma activa policia a todos os
dos autores do projecto de regimento, quizessem ou districtos deste imperio, o da villa de Aquiráz
não quizessem que isto fosse um privilegio, parece aproveitará as providencias geraes, que
que o não é por isso que não póde ser livre o opportunamente se hão de dar sobre este ramo da
renuncial-o facultando-se o ser demandado: tal é a publica administração devendo entretanto as
determinação do art. 179, á vista do qual não póde competentes autoridades, a cujo cargo se acha a
passar o parecer. policia da terra, observar, e fazer observar, como
Esta disposição tem um fim geral, foi feita com lhes cumpre, todas as leis e ordens existentes.
vistas na felicidade e no bem da nação, e a esta lei Emquanto ao 2º, que sobre educação publica
de interesse publico devem ceder todas as outras, e nada ha a providenciar, quando esta augusta
todos os interesses individuaes: quando se trata da assembéa já tem manifestado a energia e desvelo,
salvação da patria todos os cidadãos concorrem com que se occupa em tão importante materia.
sacrificando, se preciso é, seus commodos e Pelo que pertence ao 3º; que seria
vantagens particulares; e trata-se com effeito da intempestivo e ocioso tratar-se de providencias, que
salvação publica quando se organisa uma facilitasse a introducção de escravos naquelle
constituição e se trabalha em uma assembléa districto, emquanto se não sabe as alterações, e
legislativa fazendo as leis regulamentares. Portanto a restricções, que ha de ter semelhante trafico neste
isto só se deve attender, e por isso serem imperio; e por isso se não toma por ora, em
desembaraçados de todas as distracções os consideração.
deputados incumbidos pelos povos destes A respeito do 4º, que para obstar aos furtos de
importantes trabalhos. Em tal caso é indispensavel gados, se não precisão novas providencias, por
sacrificar o bem particular ao bem geral da nação, e serem bem sufficientes as que se achão nas leis
este sacrificio não será muito custoso quando se existentes.
considerar que é mui pequeno comparado com a Sobre o 5º, que será justo conceder-se a feira
felicidade nacional. franca, que requerem, por serem conhecidas as
Julgando-se a materia discutida propoz o Sr. vantagens que de taes estabelecimentos colhe o
presidente o parecer á votação, e foi regeitado. commercio, a agricultura, e a civilisação dos povos; e
O Sr. Maia, como relator da commissão de que para isso, concedendo esta augusta assembIéa,
legislação leu os seguintes pareceres: o que lhe compete pela parte legislativa, isto é, a
franqueza da feira, a sobredita camara se dirija ao
Primeiro governo para determinar o lugar, tempo e duração
della depois de tomadas as necessarias
A commissão de legislação, vendo o informações.
requerimento de Luiz Caetano, que se queixa de ser Ao 6º; que não tem lugar a loteria requerida a
constrangido a pagar a quantia de 12$800 réis por beneficio das despezas do conselho, porque quando
uma licença annual para poder dar café, em bebida, se tratar das providencias, e reformas geraes se
aos passageiros, a que dá comida em uma taberna, proverá a respeito de taes despezas pelos meios
que tem na villa de Itaguahy, e pela qual já paga competentes e legaes.
4$800 réis a titulo de licença; é de parecer que por Paço da assembléa, 7 de Agosto de 1823. –
ora não compete a esta assembléa o deferimento, Antonio Rodrigues Velloso de Oliveira. – Bernardo
que deve procurar o supplicante do governo. José da Gama. – D. Nuno Eugenio de Locio. – João
Paço da assembléa, 7 de Agosto de 1823. – Antonio Rodrigues de Carvalho. – José Antonio da
Antonio Rodrigues Velloso de Oliveira. – D. Nuno Silva Maia. – José Teixeira de Fonseca
Eugenio de Locio. – José Teixeira da Fonseca Vasconcellos.
Vasconcellos. – João Antonio Rodrigues de O SR. ALENCAR: – Requeiro que fique
Carvalho. – José Antonio da Silva Maia. – Bernardo adiado, porque versa sobre negocios da minha
José da Gama. provincia que conheço mui de perto, e quero fallar
Foi approvado. sobre elles.
O SR. ALMEIDA E ALBUQUERQUE: – Eu
Segundo tambem requeiro o mesmo porque tenho que dizer
contra o parecer.
A commissão de legislação examinando os 6 Ficou adiado.
artigos de que se compõe a memoria da camara da O Sr. Presidente assignou para ordem do dia:
villa de Aquiráz da provincia do Ceará, e que contém 1º A 3ª discussão do projecto para o melhor tratado
objectos sobre que exige de educação: 2º Regimento da assembléa.
70 Sessão em 11 de Agosto de 1823

Levantou-se a sessão ás 2 horas da tarde. – por um genero livre, póde fazer prodigios em favor
José Ricardo da Costa Aguiar de Andrada, da liberdade nascente, dando-lhe muitos e muito
secretario. vigorosos e illustrados defensores. Baste isto quanto
á grandeza e importancia do projecto. E porque o
SESSÃO EM 11 DE AGOSTO DE 1823. programma é, para assim dizer, a lei que deve
regular essa especie de transacção que vai formar-
PRESIDENCIA DO SR. BISPO CAPELLÃO-MÓR. se entre a assembléa proponente e os
emprehendedores da resolução delle, é preciso que
Reunidos os Srs. deputados pelas 10 horas da vão ahi clara e exactamente enunciados o objecto do
manhã, fez-se a chamada, e acharão-se presentes trabalho e suas condições.
73, faltando com causa participada os Srs. Rodrigues Ora, um tratado de educação póde ser
Velloso, Andrada e Silva, Dias e Ribeiro de Andrada. theorico ou pratico, ou ambas as cousas juntamente.
O Sr. Presidente declarou aberta a sessão, e O theorico comprehende a philosophia dos preceitos
lida a acta da antecedente foi approvada. e regras, e é uma verdadeira analyse scientifica: o
O Sr. Muniz Tavares disse que se retirava da pratico contém simplesmente esses preceitos e
sessão por incommodado. regras que se devem executar, e é verdadeiramente
Passou-se á ordem do dia, e entrando na 3ª uma synthese. Assim, por exemplo, no tratado de
discussão o projecto de lei para o melhor tratado de hygiene que entra no plano de educação physica,
educação, foi lido pelo Sr. secretario França o art. 1º póde muito bem o autor parar em anaIysar causas
com as suas respectivas emendas. geraes e dellas tirar inducções geraes sem descer
O SR. MACIEL DA COSTA: – A proposição aos preceitos particulares por onde se governem os
deste programma faz honra ao seu autor e bem pais e mãis de familias: póde v. g. demonstrar pela
assim á assembléa que o admittiu á discussão. Em natureza de nossa organisação physica que a rapida
um governo despotico a educação publica deve mudança do frio para o calor, e vice-versa, nos póde
estender-se a muito pouco; quem vive debaixo do ser fatal, e que a ella se não deve expôr o feto que
capricho e arbitrariedade, necessita apenas de sahe do utero materno como de um banho morno,
forças physicas para aguentar os trabalhos sem comtudo descer a designar qual será o gráo de
ordenados pelo tyranno, e de paciencia e resignação calor que deve ter a athmosphera que ha de respirar
e silencio para não irrital-o. o recem-nascido, se ha de ser recebido em pannos
O contrario passa em um governo livre, quentes, se ha de ser lavado logo, se ha de ser
fundado sobre os direitos de todos os individuos, lavado em vinho, como aconselhão alguns, se em
onde os cidadãos illustrados são por lei fundamental agua pura, etc., etc.
admittidos a tomarem parte na legislação do seu Ora, já se vê que estes diversos generos de
paiz; onde todos os homens têm accesso a todos os tratados devem differir muito quanto ao trabalho que
empregos; onde emfim é preciso formar um espirito devem custar e quanto á extensão de utilidade. O
publico, que é a mais solida barreira e o mais que reunir as duas partes theorica e pratica, custará
inexpugnavel baluarte da liberdade contra as muito mais, e sua utilidade será muito mais geral.
machinações do despotismo e da ambição de O simplesmente theorico póde apenas servir
inimigos assim domesticos como estranhos. aos homens instruidos, que em qualquer nação são
Em um governo tal, Sr. presidente, é em menor numero; o simplesmente pratico que
indispensavel que a educação seja capaz de contém regras e preceitos sem analyse, estende-se
desenvolver fortemente nossas faculdades e de a um maior numero de individuos; mas uma pratica
crear cidadãos vigorosos, intelligentes, honestos e cega morre, para assim dizer, com os individuos, e
eminentemente sociaes. A educação nas mãos de não tem a segurança que só lhe póde dar a
um despota astucioso é arma perigossima, com ella explicação das regras e preceitos, convencendo os
póde radicar e consolidar o despotismo de maneira que executão da necessidade ou utilidade delles.
que, para derribal-o e extinguil-o, sejão precisos Que quererá pois a assembléa? Um tratado
seculos de fadigas e convulsões, e largas torrentes simplesmente theorico ou simplesmente pratico, ou
de sangue e lagrimas. conjunctamente theorico e pratico? Eis o que é
Assim vimos modernamente que Napoleão, preciso explicar.
emquanto primeiro consul de uma republica, propoz Se ella assim o entende, eu votaria pelo
instituições liberaes, mas á proporção que foi tratado theorico-pratico, e accrescentaria esta
ganhando terreno sobre a liberdade dos francezes, declaração ao programma. Tambem accrescentaria
foi tambem graduando o servilismo do ensino publico ás palavras – educação physica, moral e intellectual
para preparar uma geração que apoiasse e – a palavra – social. – Nossas faculdades são
defendesse a sua desmedida tyrannia. Esta mesma physicas, moraes, intellectuaes e sociaes. As
arma tão perigosa nas mãos de um despota, sendo physicas consistem nas funcções de nossos orgãos
manejada para conservar o corpo e dispôl-o para executar
docilmente, se me posso explicar
Sessão em 11 de Agosto de 1823 71

assim, as ordens da vontade; as moraes pertencem – de um e outro sexo. – Maciel da Costa.


ao coração e produzem nossas affeições e nossas Foi apoiada.
paixões; as intellectuaes formão o dominio do O SR. FERREIRA FRANÇA: – Sr. presidente,
espirito e vêm a ser a origem de nossos desejava dar tambem o meu parecer sobre o premio
conhecimentos; as sociaes são verdadeiramente destinado ao que offerecer o tratado; e como julgo
applicações das moraes e intellectuaes á arte de que se deve dar uma medalha de ouro, acho
viver com os homens e forçal-os a concorrer para o tambem que deverá ter de um lado a effigie do Brazil
nosso bem concorrendo nós para o delles. São quasi e do outro a do autor do tratado, e isto cercado com
as formaes palavras de um dos autores modernos uma legenda apropriada ao objecto do premio; e
mais acreditados pelo seu saber e pratica de educar como o autor póde ser brasileiro e póde não o ser,
a mocidade em França, em o seu Tratado de refere-se a legenda ao amigo ou ao cidadão do
Educação, sem duvida o mais completo que tem Brazil. (Não se ouviu mais.) No fim do discurso
apparecido. mandou á mesa a seguinte:
Parece-me facil de conceber que nós temos
qualidades a desenvolver, cujo effeito é mais de EMENDA
nosso interesse pessoal e tem mais exercicio no
circulo estreito da vida familiar e particular do que no Para cercar a effigie do Brazil de uma banda
vastissimo da vida social. No numero destas da medalha – A assembléa constituinte e legislativa
metteremos, com o mesmo autor, o amor da ordem, do Brazil decretou esta medalha ao amigo ou ao
a força da alma, a prudencia, a temperança, etc.: nocidadão do Brazil.
numero das sociaes metteremos a civilidade, a Para cercar a effigie do autor da outra banda
tolerancia, o patriotismo, etc. da medalha. (Nome do autor) que ensinou a crear o
Ora, póde muito bem um autor encarregado de filho do Brazil forte, sabio, bom. – Ferreira França.
dar um tratado de educação publica, parar no Foi apoiada.
desenvolvimento das faculdades intellectuaes e (Fallárão tambem os Srs. Montesuma,
moraes para formar o homem instruido e probo, Vergueiro, Andrada Machado e Gomide, mas não se
como fontes das sociaes, e não descer ao entendeu o tachygrapho Silva.)
desenvolvimento destas aliás necessario, porque Por ser chegada a hora da partida da
deixar este desenvolvimento ao acaso e tratar, e deputação a cumprimentar Sua Magestade Imperial
occupar-se delle positivamente, são cousas muito pelo seu restabelecimento, sahirão da assembléa os
differentes e de resultados muito desiguaes. membros de que ella se compunha.
Accrescentaria tambem ás palavras – mocidade Julgando-se discutida a materia, propôz o Sr.
brasileira – as seguintes – de um e outro sexo. presidente se o artigo passava tal qual estava
Eu estou convencido de que nem o autor do redigido. – Venceu-se que não.
projecto nem esta assembléa quizerão excluir as Seguiu-se portanto propôr as emendas, e
mulheres do beneficio da educação publica, e nem começando, segundo o determinado no regimento,
julgo necessario demonstrar quantos e quão graves pela mais ampla que era a do Sr. Maciel da Costa,
inconvenientes se seguirião de privar uma tão propôz:
grande e tão interessante porção do genero humano, 1º. Se á palavra tratado se accrescentaria
destinada pela natureza e pela sociedade a tão theorico-pratico. – Venceu-se que sim.
importantes funcções, sem a educação conveniente; 2º Se ás palavras physica, moral e intellectual
mas é preciso declaral-o, porque um autor poderia se accrescentaria social. – Venceu-se que não.
muito bem parar na educação dos homens sómente, 3º. Se ás palavras mocidade brasileira se
para formal-os bons cidadãos. accrescentaria de um e outro sexo. – Venceu-se que
Verdade é que muitas das regras geraes para sim.
a educação dos homens têm applicação ás Quanto ao praso para a apresentação do
mulheres, mas é incontestavel que a differença tratado propôz o Sr. presidente:
physica de sua organisação e a differença dos 1º. Se devia ser o do presente anno de 1823.
destinos dellas, assim naturaes como sociaes, – Venceu-se que não.
exigem imperiosamente mudanças essenciaes no 2º. Se seria o prazo marcado na emenda do
plano de educação que a ellas se destinar. Eis-aqui a
Sr. Andrada e Silva. – Venceu-se que sim.
minha: 3º Se tinha lugar o additamento do Sr. Lopes
Gama offerecido ao segundo artigo. – Venceu-se
EMENDA que sim.
Quanto ao premio merecido pelo autor do
1º Deve-se ajuntar á palavra – tratado – tratado, propôz o Sr. presidente:
theorico-pratico. 1º Se serião supprimidas as palavras com a
2º Ajuntar ás palavras – physica, moral, ordem imperial do Cruzeiro, segundo a emenda do
intellectual – a outra – social. Sr. Montesuma. – Venceu-se que sim.
3º Ajuntar ás palavras – mocidade brasileira 2º Se lhe seria substituido o que propuzera
72 Sessão em 11 de Agosto de 1823

o Sr. Marianno Cavalcanti na primeira parte da sua não quer, logo que por este artigo decreta que dê
emenda. – Venceu-se que não se approvava como uma commissão o seu juizo; aliás seria ocioso o
estava. artigo, pois para simplesmente informar já tinha em
3º. Se o premio seria pecuniario e dado por seu seio a commissão de instrucção publica. Voto
uma vez sómente. – Venceu-se que fosse dado por portanto contra a emenda do Sr. Lopes Gama.
uma vez, e que a commissão designasse a quantia. (Fallarão os Srs. Montesuma, Vergueiro, e
4º. Se além disso se deveria dar uma Marianno Cavalcanti, mas não se entendeu o
medalha. – Venceu-se que se désse uma medalha tachygrapho Possidonio).
de ouro. Julgou-se a materia discutida, propoz o Sr.
5º. Se esta medalha se traria como insignia de presidente se o artigo passava tal qual se achava
condecoração. – Venceu-se que não. redigido. – Venceu-se que sim, ficando por isso
6º. Se devia declarar-se o valor da medalha. prejudicadas todas as emendas a ellas relativas.
– Venceu-se que sim, e que o arbitrasse a Passou-se ao art. 3º e ultimo.
commissão. O SR. VERGUEIRO: – Parece-me que não
Propoz mais o Sr. presidente passando ás tem lugar o dizer-se neste artigo digno de imprensa,
outras emendas: a assembléa o que quer é que se julgue do
1º. Se devia adoptar-se a legenda indicada merecimento da obra, e por isso se deve dizer que
pelo Sr. Ferreira França. – Venceu-se que sim, e que terá o premio designado se a commissão julgar o
a commissão a redigisse. trabalho digno delle, ainda que não haja
2º. Se passava o additamento do Sr. Lopes concurrencia de obras. E’ por isso que offereço esta
Gama. – Venceu-se que sim, e que a commissão emenda suppressiva.
determinasse o numero dos exemplares. Que se supprima – de imprensa. – Vergueiro.
3º. Se ao desempenho deste trabalho serião Foi apoiada.
tambem admittidos os estrangeiros. – Venceu-se que (Fallarão os Srs. Montesuma, Costa Barros e
sim. Rodrigues de Carvalho, mas nada se entendeu do
4º. Se o premio para elles seria o mesmo mesmo tachygrapho.)
indicado aos nacionaes. – Venceu-se que sim. Julgou-se a materia discutida, e propoz o Sr.
5º. Se passava o additamento do Sr. presidente:
Vergueiro. – Venceu-se que sim, mas que a 1º. Se passava a emenda suppressiva. – Não
commissão determinasse a quantidade do premio. passou.
6º. Se passava a 2ª parte da emenda do Sr. 2º. Se o artigo passava tal qual. – Venceu-se
Marianno Cavalcanti. – Venceu-se que não. que sim.
Entrou em discussão o artigo 2º com as suas 3º. Se attenta a multiplicidade das emendas
respectivas emendas. devia o projecto voltar á commissão para o redigir de
O Sr. Lopes Gama pediu a palavra e mandou novo. – Venceu-se que sim, ficando adiado até voltar
para a mesa a seguinte: redigido.
Era chegada a hora das indicações, mas como
EMENDA as não houvesse, leu o Sr. Araujo Lima como relator
da commissão de constituição, os seguintes
Em lugar de decidirá substitua-se proporá com pareceres:
o seu parecer á mesma assembléa. – O deputado,
Lopes Gama. Primeiro
Foi apoiada.
O SR. HENRIQUES DE REZENDE: – Sr. A commissão de constituição tendo em
presidente, o exame de um plano de educação que consideração a indicação do Sr. deputado Rocha
se haja de apresentar á assembléa demanda Franco em que pede se officie ao governo para que
trabalhos continuados, e tempo applicado a esse só sejão postos em liberdade o vigario Antonio Pereira
cuidado, as commissões de dentro estão Ribeiro e outros, presos no Rio Grande por terem
sobrecarregadas de trabalhos, o que se vê pelas opinado contra o veto absoluto, uma vez que não
demoras que têm em apresentar alguns dos que lhe sejão accusados de outro crime. E’ de parecer que
têm sido encarregados. Se a isto se reunisse o não ha necessidade desta recommendação ao
exame de um plano de educação ficava o plano governo, porque este sabe que ninguem deve ser
eterno. Voto portanto que este artigo passe como preso senão por crime; e o facto de que se trata não
está, e unicamente com a emenda do Sr. Almeida e está classificado como tal.
Albuquerque. Paço da assembléa, 11 de Agosto de 1823. –
O SR. DUARTE SILVA: – A assembIéa Pedro de Araujo Lima. – Manoel Ferreira da Camara.
nomeando uma commissão especial para julgar do – Antonio Carlos Ribeiro de Andrada Machado e
merecimento da obra, não tem que ingerir-se na Silva. – Antonio Luiz Pereira da
materia se não quer erigir-se em juiz; e nesse caso
seria mister que a obra entrasse em discussão; o
que me parece que assembléa
Sessão em 11 de Agosto de 1823 73

Cunha. – José Ricardo da Costa Aguiar de Andrada. tão fausto motivo não são o suffragio de uma
Foi approvado. cançada etiqueta, que se limita a enfadonho
formulario, onde por ventura se liberalisão
Segundo expressões affectuosas, mas vazias de realidade,
onde não poucas vezes um coração indifferente e
A commissão de constituição, tomando em mudo manda á bocca involuntaria forçados conceitos
consideração o requerimento de José Fernandes que ataviados de emprestadas côres, arremedão
Barboza, o qual achando-se na cidade do Porto, para talvez a phrase do sentimento, mas que deslembrão
onde tinha ido por causa de negocio, e não podendo sempre ao passo que se exprimem.
regressar para o Brazil dentro dos seis mezes, Não, senhor, a amisade, esse dom celestial,
marcados na proclamação de 8 de Janeiro de 1823, por mais que lhe apropriem a origem de uma
pediu ao governo uma prorogação de mais seis sympathia gratuita da natureza, não póde aos olhos
mezes; e tendo por despacho que requeresse á da razão negar-se de filha legitima do interesse
assembléa, recorre agora para o mesmo fim, é de reciproco daquelles que a cultivão. Este foi, e será
parecer que antes de se deferir a este requerimento, sempre a mola real que avincula os homens em
se peção informações ao governo sobre o dito José sociedade, e que estreitando ora os laços de
Fernandes Barboza, para se conhecer se é ou não intimidade entre V. M. Imperial e o generoso povo
suspeito, e se está no caso de merecer a graça brasileiro deve por uma necessaria consequencia
pedida. fazer sentir á V. M. Imperial os males da nação,
Paço da assembléa, 11 de Agosto de 1823. – assim como a esta os males que a V. M. Imperial por
Pedro de Araujo Lima. – Antonio Carlos Ribeiro de ventura possão acontecer.
Andrada Machado e Silva. – Manoel Ferreira da Tal é, e será sempre a feliz sorte dos principes
Camara. – Antonio Luiz Pereira da Cunha. – José humanos, que correndo, como V. M. Imperial, o
Ricardo da Costa Aguiar de Andrada. nobre estadio das virtudes sociaes, se identificarem
Fizerão-se algumas reflexões, e o Sr. com os interesses dos seus povos, unico caminho de
Vergueiro certificou serem verdadeiras as diligencias avançarem seu nome á immortalidade. Praza aos
referidas pelo requerente; mas sendo posto o céos de conservar á V. M. Imperial duradouros dias,
parecer á votação foi approvado. que sejão na posteridade bem lembrados pelos
O Sr. Secretario Costa Aguiar deu parte das netos da geração presente deste imperio, como
felicitações dirigidas á assembléa pelo governador dizem, ou fabulão os antigos, que o forão para os
das armas de Goyas, Raymundo José da Cunha Egypcios agradecidos os do seu Sesostris.
Mattos, pela camara da villa de S. João d'El-Rei, e Taes são os ardentes votos da assembléa
pela camara da villa de S. Bento de Tamanduá. nacional, taes são os nossos, e taes deveráõ ser os
Forão recebidas com particular agrado. de todos aquelles que se honrão do nome brasileiro.
Entrou então (era uma hora) a deputação que Finda a leitura, disse o mesmo Sr. deputado
fôra cumprimentar Sua Magestade, e o orador della o que Sua Magestade lhe dera a resposta que ia ler
Sr. França repetiu o discurso que lhe dirigira, escripta pelo mesmo imperador, e do theor seguinte:
concebido nos termos seguintes: As provas de amor á minha imperial pessoa, e
Senhor! Os illustres representantes da briosa de interesse pela minha saude, que a assembléa
nação brasileira, sempre iguaes e constantes nos geral constituinte e legislativa deste imperio tem
seus sentimentos da mais cordial adhesão á augusta dado, são tantas além desta, que penhorão meu
pessoa de V. M. Imperial, não podião deixar de ouvir imperial coração, e o obrigão a agradecer-lhe, e
com o mais extremado jubilo e alvoroço a fausta certificar-lhe, que emquanto vida tiver hei de
noticia que ultimamente lhes foi communicada do defender a patria dos inimigos internos e externos,
perfeito restabelecimento de V. M. Imperial ao seu as attribuições que de direito me competem como
antigo estado de saude. imperador constitucional e defensor perpetuo do
Seria mister conhecer bem a intenção da Brazil o decoro da mesma assembléa, e os
magua que impressionára seus animos estremecidos interesses da briosa nação brasileira, que tão
pelo desastroso successo, que poz em risco a vida credora é de todos os sacrificios que puderem fazer
de V. M. Imperial, para exactamente concluir quão aquelles que verdadeiramente amarem o Brazil, e
grande ora seja o prazer que n'alma se lhe derrama forem tão brazileiros como eu o sou e me preso ser.
ao ver passado esse periodo de crise que tão graves Paço, 11 de Agosto de 1823. – Imperador
consequencias nos antolhava. Constitucional e Defensor Perpetuo do Brazil.
Senhor, orgão fiel dos puros sentimentos da Foi ouvido com muito especial agrado.
assembléa nacional, que nos ha encarregado de tão O SR. CARNEIRO DE CAMPOS: – Pedi a
honrosa missão, nós termos de protestar a V. M. palavra
Imperial, que as suas felicitações por
74 Sessão em 11 de Agosto de 1823

para declarar que hoje faltou a guarda de honra que em direitos reciprocos, só assim se poderia constituir
é do estylo acompanhar as deputações, mas esta segura, feliz e permanente a monarchia composta
falta procedeu sómente de eu ser ainda noviço no dos tres reinos de Portugal, Brazil e Algarves,
lugar de ministro de estado, e deixar por isso de vangloriando-se de que a marcha firme e regular de
expedir á repartição da guerra as participações seus procedimentos, e deliberações, assaz se
necessarias. Eu fui só o culpado desta commissão. manifestava no desempenho de suas augustas
Ficou a assembléa inteirada. funcções, e se patenteava na reforma dos abusos
O SR. PEREIRA DA CUNHA: – Peço a que opprimião a nação.
palavra para ler o projecto de proclamação de que Lisongeado o Brazil com as vantagens que lhe
estava incumbida a commissão de constituição; e promettia um governo monarchico representativo,
peço igualmente licença á assembléa para a ler mandou logo seus deputados; e á proporção que
sentado, pois debilitado pela minha molestia não estes ião chegando, as côrtes augmentavão seus
posso lêl-a de pé. máos tratamentos, e estreitavão o plano de nossa
Foi-lhe concedida a licença, e fez a leitura nos recolonisação, destruindo a força moral e physica
termos seguintes: deste estado, declarando provincias de Portugal, do
A assembléa geral constituinte e legislativa do cabo de S. Roque até o Amazonas. Segurarão a
imperio do Brazil aos brasileiros. Bahia na sua obediencia; e mandando tropas para
Manifestando os portuguezes sua unanime cumprir suas ordens, concederão governos
resolução de restabelecer uma nova fórma de tumultuarios ás provincias, promoverão a anarchia, e
governo da monarchia, promettendo uma declararão benemeritos da patria os que puzessem
constituição sabia e liberal que fosse o germen em execução seu terrivel decreto de 18 de Abril de
productivo de nossa commum prosperidade, muito 1821. Excluirão os brazileiros dos lugares de
era de esperar que abraçassemos tambem a causa diplomacia, e dos postos do exercito na grande
de uma nação de que faziamos parte, e de quem promoção, negarão aos deputados do Brazil todas as
eramos descendentes. suas justas requisições e afinal mandarão recolher
Para pôr em pratica seus projectados fins, para Portugal o augusto regente, distruir os
Portugal julgou indispensavel convocar côrtes geraes tribunaes, e reduzir tudo ao antigo estado de colonia.
extraordinarias, e constituintes, lançando mão do Não contentes as côrtes de Lisboa com tão
methodo que a Hespanha outr’ora adoptara para offensivas, e odiosas deliberações, declararão guerra
salvar-se dos horrores da anarchia, a que a havião ao Brazil, requerendo á Inglaterra que não
precipitado a emigração de seu legitimo soberano, e consentisse a venda de munições para este reino,
as pretenções injustas de um jugo estrangeiro. E ordenando a S. A. Real que remettesse a Portugal as
pondo em viva actividade os emissarios que no embarcações nacionaes que estivessem em estado
Brazil havião d'ante-mão espalhado, conseguirão os de navegar. E ultimamente propuzerão ás nações
portuguezes, que estes assalariados aventureiros estrangeiras trocar por exercitos parte do territorio
adquirissem partido na gente superficial, os quaes brazileiro para poderem subjugar a outra parte, e
associados com a tropa européa derão o grande reduzir á escravidão um paiz, que desde a sua
impulso que estava a seu alcance, e afinal descoberta pelos portuguezes os tratou com as
conseguirão que el-rei, e os brasileiros jurassem maiores liberalidades offerecendo-lhes todas as suas
obedecer, e observar uma constituição que ainda se riquezas, e todos os meios de os engrandecer.
achava na massa das possibilidades. E quem não vê Esta serie de traições, e vis procedimentos
a invalidade deste coacto juramento! das côrtes de Lisboa, erão mais que sufficientes para
Convencido então o Sr. D. João VI, de que que o Brazil desde logo rompesse o nexo politico que
devia cumprir a real promessa solemnemente feita o ligava a Portugal; porém outra foi sua generosa, e
no seu decreto de 26 de Novembro de 1807, e que moderada conducta em crise tão arriscada.
sua real presença acalmaria as inquietações Representarão suas provincias, pelos seus
agitadas em Portugal, as quaes propendião para deputados, que o Brazil na attitude, e categoria em
uma guerra civil que seu magnanimo coração queria que se achava não podia deixar de ter um delegado
evitar, deliberou regressar para Lisboa, deixando por do poder executivo, ainda maior do que o Sr. D. João
sua grande politica ficar entre nós o augusto VI havia, concedido em seu regimento ao augusto
successor do throno, repartindo pelo modo possivel a regente; que não convinha ao explendor do Brazil, e
séde da monarchia. á opulencia de sua riqueza, e producções prescindir
Entretanto as côrtes portuguezas proclamarão de um commercio livre e franco de que gozava
ao Brazil para o convencer dos justificados motivos desde o anno de 1808: que lhe era doloroso e
que decidirão Portugal a tomar uma medida tão oppressivo ter em seu seio tropas européas, as
extraordinaria, convidando aos brazileiros para que quaes tão longe estavão de segurar o territorio, e a
entrassem como parte principal da nação em novo
pacto social que estavão deliberando, e que tendo
nelle igual partilha
Sessão em 11 de Agosto de 1823 75

paz interna do paiz, que antes promovião a para preservar o bello paiz que habitamos dos
desorganisação do governo, ameaçando e estragos e desolação de que o ameaçavão os
insultando os nacionaes, excitando a guerra civil, e a barbaros da lusitania, vós o sabeis brazileiros, e em
publica inquietação. premios de seus magnanimos esforços, tendo-lhe
Devendo as côrtes de Lisbôa reconhecer seus d’antes offerecido o glorioso titulo de vosso defensor
erros, e a condescendencia sem limites do Brazil, perpetuo que por elle fôra aceitado, vós lhe
sustentarão seu orgulho e perversidade, expedirão concedeste por unisona acclamação a corôa do
mais tropas para atacarem nossa liberdade, vida e imperio. Reconheceu a nação brasileira, que
propriedade; negarão o poder executivo como lhes reassumindo seus mais caros e imprescriptiveis
fôra proposto, e decretarão absolutamente que o direitos podia praticar os mesmos actos de soberania
augusto successor do throno regressasse a Portugal como os velhos portuguezes tinhão feito quando em
para ser mais uma victima da infame demagogia que 1139 acclamarão rei de Portugal a D. Affonso
o governava. Henriques, e quando em 1385 elevarão D. João I ao
Neste conflicto tendo o Brazil de deliberar, se throno lusitano e em 1640 a D. João IV quebrados os
queria continuar a ser reino, ou passar de novo a ser ferros da tyrannia hespanhola.
colonia, ser nação livre e independente, ou conquista Declarada solemnemente nossa
de Portugal; dar a si proprio a lei, ou recebel-a, de independencia, acclamado e coroado nosso augusto
mão inimiga: decidiu-se, e proclamou briosamente imperador constitucional e defensor perpetuo, se
sua emancipação. Tão nobre resolução apoiada no desligou o Brazil de toda a sujeição a Portugal e
voto corajoso dos valentes paulistas, sendo achou-se na rigorosa obrigação de ordenar suas leis
apresentada pela camara desta capital ao inclyto politicas e civis, que dessem estabilidade e fórma
regente, e reconhecendo este suas vantagens e liberal ao governo e por meio de bases invariaveis
justiça, declarou pelo modo mais firme e generoso consolidasse o imperio.
que ficava no Brazil no dia 9 de Janeiro de 1822; dia Brazileiros, o primeiro passo de uma nação
para sempre fausto e memoravel que fixa o momento que se quer solidamente emancipar, e constituir é
feliz da fundação deste imperio, e que será estabelecer uma autoridade publica, que marque a
abençoado pelos nossos vindouros, como a pedra linha dos poderes politicos, que faz a base essencial
angular do magestoso edificio da nossa do systema constitucional, para que cada um delles
independencia. saiba o que lhe compete, e deve fazer para o bem da
Então a tropa portugueza estacionada nesta sociedade. Nesta autoridade tutelar delega a nação
côrte, com a maior perfidia e ouzadia pega em armas parte da sua soberania para que esta lance os
toma posições vantajosas, dispõe-se de uma fundamentos de seu novo pacto social.
maneira hostil, e o chefe intruso deste indigno partido Taes são os altos fins para que foi convocada
intenta levar ávante o insultante systema de sujeição esta assembléa de representantes da nação: ella
ao Brazil, e atreve-se sacrilegamente a desobedecer deve formar uma constituição em que se estabeleção
ás ordens do governo, querendo praticar os mesmos as leis fundamentaes do imperio, que hão de regular
actos de violencia que impunemente havia d'antes os direitos, e obrigações do imperante, e dos
exercitado; mas o augusto regente desenvolvendo subditos. Este é o objecto da nobre e augusta
seus talentos, e as heroicas virtudes que o adornão, commissão de que estamos hoje encarregados.
repellio esta tropa insubordinada e insolente, Collocados vossos deputados entre a nação e
fazendo-a embarcar para seu paiz natal: reenvia seu augusto monarcha, como arbitros de seus
para Portugal a que depois chegou com iguaes poderes, e de vossas garantias, nosso vigilante zelo
pretenções; vôa ás provincias centraes, e dissipa nos escudará dos extremos para que se estabeleça
com sua augusta presença os partidos facciosos; a maxima liberdade civil unida á maxima segurança
ouve em conselho os procuradores geraes das individual, e não aconteça que pela falta das
provincias, as quaes se ião colligando á proporção necessarias prerogativas fique sem o vigor, energia e
que lhe constava da pessima conducta das côrtes de lustre precisos o throno imperial.
Lisboa: manda convocar a pedido dos povos esta A constituição do imperio manterá (segundo o
assembléa constituinte e legislativa, augmenta e que jurámos) a religião catholica apostolica romana e
reforma a tropa e marinha nacional, economisa e firmará a successão da corôa imperial na legitima
fiscalisa as rendas do estado e todos os outros dynastia do Sr. D. Pedro de Alcantara, a quem a
ramos de publica administração; e para remate de nação por geral e unanime espontaneidade, e sem
tão gloriosos feitos declara á face do mundo inteiro, coacção alguma escolheu, e acclamou seu primeiro
que a sua patria é o Brazil e que em sua defensa imperador constitucional, e seu defensor perpetuo.
derramaria a ultima gotta de seu sangue. Marcará as attribuições do poder executivo, a
Os sacrificios a que se votou este joven inviolabilidade da pessoa augusta do soberano
principe baluarte da independencia brazilica, suas
energicas medidas e ajustadas providencias
76 Sessão em 11 de Agosto de 1823

da nação, e a responsabilidade effectiva dos ministros externo, sem se roubarem braços á lavoura, e á
de estado, e agentes do mesmo executivo, industria com recrutamentos violentos, e muitas vezes
prescrevendo-lhes suas funcções, e obrigações, e as desnecessarios em uma monarchia constitucional,
penas a que ficão sugeitos excedendo-as ou aonde a lei e a força moral devem vigorar a harmonia
confundindo-as. dos diversos ramos da publica administração, e manter
Determinará ao poder judiciario o systema, e a paz e segurança interna da sociedade,
fórma de seu exercicio, fazendo-o responsavel pelas estabelecendo-se ao mesmo tempo dignas
prevaricações, abusos de jurisdicção e ingerencia nos recompensas para animar o valor, e virtudes marciaes.
outros poderes do estado, afim de que a justiça se A assembléa prestando sua particular attenção a
administre a todos pelo modo mais simples e facil, mais todos os objectos, que contribuir podem para a
prompto e seguro. felicidade da nação, aceitará e acolherá
Indicará quaes sejão os direitos do cidadão agradavelmente todos os projectos e memorias; todas
brazileiro por nascimento, naturalisação e visinhança; as representações e notas; todas as supplicas e
quando se suspendem ou os perde, e quando os queixas de qualquer qualidade e natureza que sejão,
reassume. Estabelecerá o methodo, e regulamento na fazendo examinar tudo por commissões para isso
administração, e arrecadação das rendas do estado determinadas para dar a taes respeitos aquellas
para terem sua devida applicação, segundo o mais bem providencias que forem da sua competencia.
entendido systema de economia politica. Sobre estas bases, brazileiras, a assembléa
A constituição fixará o direito, e designará os organisará os vinculos, e reciprocas obrigações que
casos em que se deve fazer a guerra, quem a póde deve encerrar o nosso pacto social. Oh! e quanto nos
declarar e quem ha de convencionar os tratados de magôa não ver ainda em nosso seio os representantes
paz, tregua e neutralidade; assim como os de alliança, de algumas provincias, que a providencia separando do
commercio e navegação com as nações estrangeiras. continente da Europa pela extensão immensa do
Firmará o direito inalienavel de protecção aos occeano, quiz que fossem comnosco a mesma familia.
subditos do imperio, e os casos a que se estende aos Louvores sejão dados aos briosos habitantes da
estrangeiros emquanto nelle residirem; estabelecendo Bahia, que em porfiosa luta, apezar dos maiores
até onde chegão os officios de hospitalidade para com sacrificios, e com o soccorro das valorosas tropas das
os subditos das outras nações. Conservará illeza a leaes provincias que os auxiliarão, souberão
integridade, soberania e independencia deste vasto dignamente ostentar seu patriotismo, defender a honra
imperio. de suas pousadas, e vencer com o mais denodado
O exercicio da liberdade da imprensa, como um heroismo a pertinaz resistencia do vandalismo lusitano.
dos mais respeitaveis direitos do cidadão, será mantido, Nesta gloria deve ter igual parte todo aquelle que
e seus abusos serão punidos por lei regulamentar. A cooperou para tão glorioso fim, e adherio sinceramente
policia, companheira inseparavel dos povos civilisados, á sagrada causa da nossa independencia, seja oriundo
depondo seus habitos de arbitrariedade e despotismo, de um ou de outro emispherio.
exercitará suas funcções com zelo e franqueza, velando O lugar do nascimento não é que influe
sem cessar sobre a segurança e tranquillidade do essencialmente para o desenvolvimento das relações
cidadão e do estado. que a natureza gravou em nossa alma para com os
A assembléa tomará as mais adequadas entes da nossa especie. Seja qual fôr nosso destino,
medidas para promover o augmento da população e nós somos sempre acompanhados de um intimo
aproveitamento das terras deste fertil paiz, conservação sentimento para o melhoramento de nossa condição,
e melhoramento das instituições de caridade. Fundará que nos induz a abraçarmos como patria, ou o proprio
as universidades que mais convier para cultivar as paiz aonde pela primeira vez vimos a luz do dia, ou
sciencias, e difundir as luzes facilitando todos os meios aquelle que por motivos de interesse individual ou
de publica educação para adoçar os costumes, adiantar familiar faz a nossa felicidade.
as artes, favorecer a industria e engrandecer o Contrahido porém tacita, ou expressamente este
commercio como fontes perennes da riqueza das pacto social, é tão injusto ser privado o cidadão das
nações. vantagens a que elle tem direito pelo acto da sua
Por opportunos estabelecimentos será a marinha associação como é criminosa e execravel a
levada ao maior auge que nossas circumstancias transgressão dos deveres sagrados a que elle
permittirem para conservarmos em respeito as extensas voluntariamente se prestou.
costas maritimas deste imperio; sustentarmos Lancemos para longe toda a qualidade de
energicamente a dignidade do pavilhão nacional; e prevenção que vai em opposição com os principios de
protegermos como é mister nossa marinha mercante. justiça, e liberalidade. Afastemos de nosso paiz
A grandeza do nosso exercito será graduada prejuizos e rivalidades que não podem ter lugar entre
com a possivel exacção, e economia, quanto preciso fôr povos civilisados. Sejão
para repellir qualquer ataque
Sessão em 11 de Agosto de 1823 77

sómente as virtudes civicas e moraes os signaes Paço da assembléa, 8 de Agosto do 1823. –


caracteristicos de nossa distincção. Antonio Luiz Pereira da Cunha. – Antonio Carlos
A confraternidade dos cidadãos, e a união das Ribeiro de Andrada Machado e Silva. – Manoel
provincias do Brazil é que devem firmar a Ferreira da Camara. – Pedro de Araujo Lima. – José
tranquillidade e grandeza deste nascente imperio e Ricardo da Costa Aguiar de Andrada.
com ella a força physica e moral para rebatermos as O SR. PEREIRA DA CUNHA: – Eu a mando á
agressões de nossos inimigos internos e externos. mesa, e a assembléa deliberará sobre o seu destino
A prosperidade brazilica consiste sobretudo na se lhe parecer digna de consideração.
observancia exacta de sua constituição que é o Depois de algumas reflexões decidiu-se que
paladio de sua liberdade civil e ao abrigo do qual se accrescentasse no alto da primeira folha as
todo o cidadão brazileiro deve gozar das palavras – projecto de proclamação, – e que se
commodidades da vida social. Uma vez feita a lei imprimisse para ser distribuido e examinado pelos
fundamental do estado por delegação da soberania Srs. deputados e deliberar sobre elle a assembléa.
nacional, ella deve ser religiosamente cumprida e os O Sr. Costa Aguiar leu um parecer da
poderes politicos nella marcados se não devem commisão de legislação sobre providencias exigidas
ultrapassar. pela camara da villa de Aquiráz da provincia do
Mas nossas fadigas serão frustradas e se Ceará, que fôra proposto e ficára adiado na sessão
tornaráõ inuteis nossos trabalhos se não de 9 do corrente.
conspirarmos: todos cordialmente para seu O SR. ALENCAR: – Eu fui o que pedi o
complemento, reunindo nossas forças e opiniões que adiamento deste parecer, por ser de summo
devem ter por unico objecto o amor da patria. interesse um dos objectos delle, que é a instrucção
Brazileiros! Embora affectados liberaes publica, de que tanto precisa a minha provincia, onde
trabalhem por separar-nos, armai-vos de indignação sendo a sua população de tantas mil almas, até lhe
e declarai-lhes interminavel guerra; a luta é pela faltão os mestres de primeiras letras.
liberdade; lembrai-vos disso, e repulsareis seus Eu quizera que a assembléa ou mandasse pôr
embustes. Não vos deixeis seduzir por esses em observancia o que ha na nossa legislação a este
monstros da intriga e da perfidia que só têm por alvo respeito, ou que se propuzesse um projecto para
seu unico e pessoal interesse. Attendei que a este fim. Já não digo que por ora tenhão mestres até
anarchia será o fructo de vossa inconsideração, seus as villas mais pequenas, mas ao menos trate-se de
horrores o premio de vossa desunião. que os haja nas mais principaes, e depois se cuidará
Confiai na assembléa constituinte e legislativa nas outras.
que se empenha em boa fé e com a maior franqueza Foi sempre sorte do Brazil existir no meio das
e lealdade em deliberar a constituição do imperio e riquezas, e não tirar partido dellas para a instrucção;
as reformas indispensaveis para ser o Brazil e desejava que isto não continuasse a succeder no
opulento, e entrar na ordem das grandes nações do nosso tempo. Este mal é remediavel, e é mui digno
mundo. Ella fará que sejamos admirados pelos dos nossos cuidados... (Não se ouviu o resto.)
povos mais bem constituidos, os quaes O SR. RODRIGUES DE CARVALHO: – Ha
ambicionando nossa amisade, celebraráõ com o falta de providencia nesta parte, isso é innegavel:
nosso paiz estreita liga, respeitando todavia nossa mas quem deve dál-a é o governo. Em todas as
independencia. villas ha mestres; mas como pelo antigo systema se
Descançai no zelo infatigavel e paternal entendia que não se devião cultivar as sciencias no
solicitude do Sr. D. Pedro de Alcantara, nosso 1º Brazil, achárão um meio de levar ávante o systema
imperador constitucional e defensor perpetuo, que sem infringir a ordenação, isto é, não pagavão aos
tendo dado provas incontestaveis da sua mestres; quando estes requerião seus ordenados
constitucionalidade ha de ver com animo sereno e dizia-se-lhes que não podia ser, e elles quando se
firmeza de seu augusto caracter promulgar uma desenganavão desamparavão as cadeiras, estava
constituição justa e adequada ás circumstancias do conseguido o fim. Portanto se o nobre deputado quer
Brazil que deve marcar a época afortunada da que se enchão as cadeiras, proponha uma indicação
prosperidade de seus subditos a quem ama com o para que o governo faça pagar aos mestres, e com
carinho de pai, e lisongêa, com o honroso titulo de isto está remediado o mal que se deseja
irmão; e que ha de igualmente executar as leis e os providenciar.
fóros da nação com aquella integridade que deve O SR. CARVALHO E MELLO: – Sr.
corresponder ás suas imperiaes virtudes. presidente, sempre que se tratar de estabelecer e
Brazileiros! A constituição vos será difundir instrucção publica acharei justiça e proveito.
brevemente apresentada; por ella conhecereis as Em todos os estados é esta a base da civilisação e
verdades que vos são annunciadas, e vos moralidade e o caminho por meio do qual se
convencereis dos nobres sentimentos de vossos
representantes, que só têm em vista os principios da
justiça e a felicidade nacional.
78 Sessão em 12 de Agosto de 1823

consegue prover a sociedade de homens habeis O Sr. Presidente acenou para a ordem do dia:
para os empregos civis, politicos e militares. 1ª A 2ª discussão do projecto sobre arrecadação da
Se muitos cuidados têm a este respeito fazenda de defuntos e ausentes: 2º. Regimento da
nações illustradas, com o não se dirá necessario e assembléa.
util neste imperio nascente? Por desgraça e Levantou-se a sessão ás 2 horas da tarde. –
desventura nossa a mãi patria se descuidou de Manoel José de Souza França, secretario.
estabelecimentos litterarios por muito tempo; e
quando se instituirão cadeiras para nellas se RESOLUÇÕES DA ASSEMBLÉA
ensinarem os primeiros elementos da educação
scientifica se ordenou que se puzessem professores PARA MANOEL JACINTHO NOGUEIRA DA GAMA
nas cidades e villas, e cuidava eu que não faltavão
em algumas dellas, pelo menos os de primeiras Illm. e Exm. Sr. – A assembléa geral
letras e assim estive persuadido em todo o tempo em constituinte e legislativa do imperio do Brasil manda
que fui director dos estudos. Mas com que maravilha participar ao governo que approvando o parecer da
e espanto ouvi agora ao illustre deputado o Sr. commissão de fazenda tanto sobre o requerimento
Alencar dizer que em uma villa tão notavel não os de Manoel dos Santos Pereira e C.ª, contractadores
havião nem ainda o de primeiras letras. das sizas da villa de Campos, em que se queixárão
Sei que pela maior parte se dá por motivo ou da resolução da consulta de 27 de Setembro de
desculpa desta falta o não chegar para as despezas 1822, que mandou terminar o contracto naquelle
a renda do subsidio litterario particularmente anno que era o segundo do triennio arrematado,
destinada para o pagamento dos professores como sobre a representação de Joaquim José
publicos. É porém esta causa, ou antes pretexto, Gomes da Silva e Castro, que pediu que subsistisse
inattendivel; porque semelhante imposto deveria ser a dita determinação. Tem resolvido que os
unido á massa geral dos rendimentos publicos, e se arrematantes devem ser conservados na posse do
devião della tirar as despezas para o contracto que arrematárão perante a junta da
estabelecimento e paga dos mestres propostos para fazenda da provincia do Espirito-Santo, de que não
o publico ensino da mocidade brazileira. podião ser privados por um meio extraordinario, mas
Quem não vê, que é esta despeza uma das sómente depois de se mostrar por sentença proferida
mais urgentes, e das de primeira necessidade em no juizo competente a nullidade desta arrematação;
um estado? Conheço e é justissimo, que se deve tendo antes disso unicamente lugar a intimação de
fazer um regulamento geral nesta materia, que tenha dever pertencer nos contractadores tão sómente a
por base um plano regular de educação, o qual cobrança da siza comforme a pratica antiga, ficando
deverá ser o objecto dos cuidados legislativos como pertencendo á fazenda publica tudo quanto elles
mui urgente e necessario. Devemos comtudo recebessem de excesso sobre esta pratica; e
providenciar aos casos que instão como é do que ha intimando-se-lhes igualmente que ficarião tambem
pouco se lembrou o mesmo illustre deputado, e na obrigados á reposição das siza de vendas a prazos,
verdade é por extremo escandaloso ouvir dizer que que excedessem o triennio arrematado, no caso de
há uma villa que o mereceu ser, na qual não ha se provar legal e competentemente que contravierão
professor de primeiras letras. ao disposto no paragrapho terceiro das condições do
A regra que ha para ser qualquer julgado ou seu contracto. O que V. Ex. levará ao conhecimento
lugar erigido em villa é, que nelle tenha crescido a de S. M. Imperial. – Deus guarde a V. Ex. Paço da
povoação a par do augmento da agricultura, industria assembléa, em 11 de Agosto de 1823. – José
ou commercio, e estes justos fundamentos são Ricardo da Costa Aguiar de Andrada.
tambem os que induzem a crer, que nellas devem
haver por força os necessarios professores. Em os SESSÃO EM 12 DE AGOSTO DE 1823.
não haver na villa referida e em outras de igual
caracter falta-se ao cumprimento da lei e ordens PRESIDENCIA DO SR. BISPO CAPELLÃO-MÓR.
existentes, e é por certo esta falta mui digna de ser
attendida. Tenho pois, Sr. presidente, que se deve Reunidos os Srs. deputados pelas 10 horas da
quanto antes tratar de um regulamento geral para manhã, fez-se a chamada, e acharão-se presentes
este negocio de tamanha importancia, e emtanto 69; faltando com causa participada os Srs. Pereira
estou de accordo com o voto do illustre deputado o da Cunha, Rodrigues Velloso, Xavier de Carvalho,
Sr. Alencar porque o acho mui judicioso e Navarro de Abreu, Andrada e Silva, Dias, Ribeiro de
circumspecto. Andrada e Rodrigues da Costa,
(Fallárão tambem os Srs. Maia e Carneiro da
Cunha, mas não se entendeu o mesmo
tachygrapho.)
Por dar a hora ficou o parecer outra vez
adiado.
Sessão em 12 de Agosto de 1823 79

O Sr. Presidente declarou aberta a sessão, e Art. 1º Fica revogada a provisão do tribunal da
leu-se a acta da antecedente. mesa da consciencia e ordens de 28 de Dezembro
O SR. VERGUEIRO: – Parece-me que ha na de 1754, na parte em que ordena que se pague
acta uma expressão que me diz respeito, e que não sómente a quantia de duzentos mil réis das que se
é exacta. Sobre o parecer da commissão de mostrarem por justificações.
constituição relativo a José Fernandes Barbosa, eu O SR. VERGUEIRO: – Logo que se
não disse que o abonava, disse o que sabia a apresentou este projecto eu vi que a ser admittido
respeito daquelle facto porque estava presente e vi devia ser muito emendado; porque o remedio nelle
as diligencias que elle fez para embarcar quando eu estabelecido não tem a precisa extenção, não
sahi para o Rio de Janeiro; por isso me parece que abrange todo o mal; e ficão portanto abertas as
ha alguma falta de exactidão. portas aos mesmos abusos que se pretende
O SR. FERNANDES PINHEIRO: – O Sr. prevenir. Por estes motivos offereço a esta
deputado disse que este Fernandes Barbosa fìzera assembléa uma emenda em que julgo ter acautelado
todas as diligencias para vir, e que o não conseguira a maior parte dos inconvenientes que se encontrão
por não haver lugar no navio, e é o que quer dizer a sempre nesta qualidade de negocios, com
expressão abonou as diligencias, de que eu usei; gravissimos prejuizos das partes interessadas:
mas se isto se não julga exacto eu emendarei.
O SR. ANDRADA MACHADO: – O que se diz EMENDA
na acta é que abonou a realidade das diligencias, e
creio que nada ha a mudar. Supprima-se o artigo 1º.
Consultou-se a assembléa, e foi approvada a Ao art. 2º – 1º Nos casos em que o juizo da
acta. (1) provedoria dos defuntos e ausentes, deve pelo seu
O SR. VERGUEIRO: – Tenho para offerecer a regimento arrecadar as heranças dos faIlecidos, a
esta assembléa dous exemplares de uma memoria provedoria do domicilio do fallecido nos 5 annos que
anonyma que tem por titulo – Esboço do systema se seguirem ao dia do fallecimento, é juizo
politico natural com algumas applicações ao Brasil. – competente, para nelle se habilitarem os herdeiros, e
Notão-se neste escripto algumas inexactidões, mas serem intentadas todas as acções, que competirem
tem lugares em que trata objectos importantes. Eu contra a herança, com a unica citação do thesoureiro
desejo que um dos exemplares seja remettido á do juizo.
commissão de constituição e outro á de colonisação. 2º Se houver pessoa, que queira fornecer
O SR. PRESIDENTE: – Pergunto se a offerta allegações, ou provas a favor da herança, o
ha de ser recebida, simplesmente com agrado ou thesoureiro será obrigado a aceital-as, e fazer uso
com especial agrado. dellas, sob pena de responsabilidade.
O SR. FRANÇA: – Ha exemplos de recepção 3º Quando a herança fôr convencida será
com especial agrado á offerta feita por um Sr. condemnada nas custas.
deputado. 4º As sentenças contra heranças não terão
O SR. COSTA AGUIAR: – As offertas dos Srs. final execução, sem que o exequente preste fiança
deputados são recebidas com especial agrado, e idonea a restituir a cousa vencida com o rendimento
assim se tem praticado em casos semelhantes. ou juro da lei, se a sentença fôr embargada dentro
Consultou-se a assembléa; e foi recebida com de 5 annos do § 1º, e fôr afinal revogada: direito que
especial agrado. fica salvo aos herdeiros.
O Sr. Velloso Soares tambem offereceu outra 5º O provedor, logo que tiver noticia do
memoria. – Foi recebida igualmente com especial fallecimento da pessoa, cuja herança deve
agrado; e ficou sobre a mesa para se lhe dar a arrecadar, fará um processo informatorio, em que
direcção conveniente. averigue o nome, estado, idade e origem do
Passou-se á ordem do dia, e entrou em 2ª fallecido, e nome e residencia das pessoas, que se
discussão o projecto de lei sobre a arrecadação da presumir serem herdeiros; do qual remetterá uma
fazenda dos defuntos e ausentes. cópia á secretaria de estado dos negocios da justiça.
6º A secretaria mandará publicar no Diario do
–––––––––––––––––– Governo o resultado das averiguações sobre o
(1) Na acta desta sessão não se aponta a leitura da fallecido; e enviará o resultado de todas as
antecedente nem a sua approvação; mas este curto averiguações aos juizes dos districtos dos
debate prova assaz que se leu, e que por fim se approvou. presumidos herdeiros, incumbindo-lhes que o fação
constar aos mesmos.
7º O provedor, logo que fizer o processo
informatorio, mandará citar por edictos geraes as
pessoas que entenderem ter direito á
80 Sessão em 12 de Agosto de 1823

herança, para que se habilitem por herdeiros, e peculiar do juizo das provedorias dos defuntos e
respondão ás acções que houverem de ser ausentes, e o systema geral da legislação estante, a
intentadas contra a herança. respeito daquella não fez menção, de todas as
Art. 4º As acções que não excederem o valor provisões identicas á materia que se pretende
de 200$000 serão intentadas por justificações; as alterar: e a respeito destas que regulão em juizo a
que excederem por libello. – Vergueiro. validade das acções, nenhuma foi expressada.
O SR. ANDRADA MACHADO: – Por bem da Uma doutrina bem sabida em jurisprudencia é
ordem, o que se acabou de ler não é emenda, é um que para uma lei ser por outra revogada é
novo projecto; as emendas são respectivas a cada necessario que della se faça expressa e declarada
um dos artigos, e isto é um projecto inteiramente menção: ora, este projecto querendo ampliar a
novo, e até concebido sobre bases differentes. determinação da mesa da consciencia e ordens (que
O SR. VERGUEIRO: – E’ certo que a emenda limitava o pagamento dos credores das heranças
é muito extensa, porém não alterei a base; o que fiz arrecadadas pelo juizo das provedorias até a quantia
foi accrescentar garantias do direito de propriedade, de 200$000 no caso de constar a divida por
do direito dos herdeiros, etc., mas conservei o escriptura publica) facultando esse pagamento sem
principal. nenhuma limitação de quantia, e sem dependencia
O SR. COSTA AGUIAR: – E' preciso decidir de escriptura publica, e nem mesmo particular,
se é um novo projeto ou se é emenda. revogou-se para esse fim a provisão que vem citada
O SR. MAIA: – O que eu creio é que o nobre de 28 de Dezembro de 1754; quando ha outras mais
deputado não deve ser privado do direito que lhe dá que se achão registradas nas diversas provedorias, e
o regimento; se cinco Srs. deputados a considerarem que contendo identicas disposições daquella,
como emenda deste projecto, deve ser como tal poderáõ suppôr-se em vigor por dellas se não fazer
considerada para se discutir, na conformidade do expressa e declarada menção.
regimento. Ninguem ignora que o tribunal da mesa da
O SR. ANDRADA MACHADO: – Perdôe o consciencia e ordens legisla peculiariamente para as
illustre deputado, ninguem tem o direito de fazer do diversas provedorias de ausentes dirigindo a cada
preto branco nem do branco preto; ha na verdade o uma dellas provisões conformes á occurrencia dos
direito de apoiar, mas só se verifica sobre emendas; casos, ás vezes repetidos em diversas épocas, e
o que o não fôr nem 5 nem 50 o fazem ser. Cabe sobre a mesma materia, segundo as representações
neste caso a questão previa, se isto deve ser olhado que chegavão ao mesmo tribunal: donde resultou
como emenda ou como projecto; se é emenda tem expedirem-se as mesmas ordens em provisões de
lugar o ser apoiada, se é projecto segue-se outra datas differentes, como succedeu ácerca deste
marcha. objecto dos pagamentos: havendo por isso, como ha,
O SR. RODRIGUES DE CARVALHO: – Eu outras provisões, além da citada; e são, das que
convenho no que diz o illustre preopinante; mas creio tenho noticia e que se achão registradas no juizo das
que o Sr. Vergueiro póde muito bem ir applicando as duas provedorias da comarca do Ouro Preto, a de 28
differentes partes da sua emenda aos artigos do de Outubro de 1753, a de 29 de Abril de 1757, e a de
projecto á medida que se forem discutindo. Não vejo 27 de Agosto de 1801, que se devião mencionar
nisto inconveniente algum. tambem no projecto; resalvando ainda quaesquer
Pedio-se votação, e propondo o Sr. presidente outras que talvez existão nos cartorios das diversas
se devia considerar-se projecto ou emenda, venceu- comarcas e provincias.
se que não podia considerar-se como emenda Com mais razão ainda devia o projecto
simples; mas que podia seu nobre autor offerecer a revogar todas as leis, que regulão o systema das
sua doutrina á proporção que se discutissem os citações em juizo, e das acções propostas: porque
artigos. levando tudo pelos ares com a permissão de
O SR. GONDIM: – Sr. presidente, quando este poderem ser condemnados sem citação os herdeiros
projecto de lei appareceu e foi discutido em globo, eu ou donos das heranças e bens arrecadados pelo
fui de opinião que elle não passasse á 2ª discussão: juizo dos ausentes, ou sequestrados pelo juizo de
e bem que pelos illustres deputados, que de igual sequestros, manda que as acções corrão naquelles
sentimento forão, se tivessem produzido mui juizos com a citação sómente dos thesoureiros e
plausiveis razões, eu accrescentei algumas, e fiscaes, que não são as proprias pessoas a quem
segundo me recordo forão por ser inexacto e respeitão as ditas heranças e bens: por ser esta
defeituoso, injusto, e anti-constitucional: disse que disposição diametralmente opposta a muitas leis e
era inexacto e defeituoso, porque alterando-se por particularmente á que se acha na ord. do liv. 3 tit. 75
este projecto a disposição da legislação que annulla toda
Sessão em 12 de Agosto de 1823 81

a sentença proferida sem citação da parte: e a qual para qualquer reposição, quando fossem julgados e
por ser tendente á defesa, que provém do direito convencidos de falsos credores: e este projecto
natural, se não póde supprir como declara a do tit. 63 manda pagar sem limitação de quantia, não acautela
§ 5º do mesmo livro: e como não forão estas leis com fiança e não deixa aos herdeiros o regresso de
especialmente revogadas no projecto ficão ainda poderem convencer de falsos os credores.
subsistindo, e em notoria contradicção com elle. E o mais é que apezar de ser nesta parte tão
Portanto é o dito projecto inexacto e amplo o projecto, foi restricto para outros credores a
defeituoso, e com imperfeição que induz quem pela presumpção de verdadeiras as suas
improcedência. dividas, como de comestiveis, vestir e calçar,
Disse tambem que elIe não devia passar por assistencias de medicos e remedios se mandavão
ser injusto; porque ia em opposição ao direito mais pagar, não excedendo a 50$000 sem dependencia
sagrado e á justiça universal – que não consente que de justificação, pelas provisões de 21 de, Outubro de
alguem seja condemnado sem ser ouvido e 1713 e de 13 de Fevereiro de 1741, afim de se
convencido. – Direito que firma as garantias facilitarem aquelles soccorros com a certeza do
pessoaes e da propriedade e que deve fazer o nobre pagamento não oneroso de custas, o que este
empenho desta illustre assembléa para que sejão projecto não attendeu, obrigando a justificações as
sustentadas. quantias até 100$000 apezar de que taes
E como pois, Sr. presidente, sem a citação dos justificações em nada essencial differem dos libellos
herdeiros e proprietarios, hão de estes ser com citação sómente dos thesoureiros, que pelos
condemnados no juizo dos ausentes ou dos motivos já expressados fazem commumente as suas
sequestros? contrariedades e treplicas por negação e afinal o que
Sem esta citação, que é o fundamento de todo vale são as testemunhas que produz o credor, e
o juizo? então quem vem a ser mais despotico?
Com que espanto se não lerá este projecto, Disserão alguns Srs. deputados que não era
onde quer que infelizmente elle appareça! justo ter tanta contemplação com esses herdeiros e
A que depredações não ficarião expostas as proprietarios porque erão portuguezes nossos
heranças e os bens sequestrados? inimigos: ao que respondo: primeiramente que não é
Fica por ventura acautelado o seu prejuizo de um governo justo fazer leis injustas; em 2º lugar
com a mera citação dos thesoureiros e dos fiscaes os Srs. deputados que tal proferirão laborão em um
que de ordinario nenhumas instrucções têm, nem engano ou olvidação, emquanto dão a entender que
podem ter por ignorarem os contractos e os direitos no juizo de ausentes se arrecadão heranças e bens
daquelles a quem pertencem as heranças ou bens, sómente de portuguezes; quando é certo que se
como pessoas estranhas? arrecadão igualmente de brazileiros, no caso de
Ainda que, apezar dos immensos factos que ausentarem-se para diversas provincias e alli
depõem contra elles (fallo em geral), se fallecerem sem testamento e nem terem herdeiros
suppuzessem uns e outros da melhor inteireza e legitimos a quem pertença a successão desses bens,
probidade, não podem de fórma sufficiente defender pelo que a disposição do projecto comprehende
as heranças e bens sequestrados, como os próprios tambem a brazileiros e por consequencia os expõe
interessados, das ciladas e immensas fraudes que ás mesmas depredações.
os suppostos credores, certos de que homem morto A isto pois que disse, Sr. presidente, para não
ou ausente não falla, costumão empregar; quando passar o projecto, accrescentarei agora mais, que
mesmo não houvesse, como ha, o perigo de se elles elle não satisfaz em grande parte ao fim a que se
colloiarem. dirigiu, que foi principalmente occorrer de remedio ao
Se pois a mesa da consciencia com aquella mal que representou o illustre deputado Sr. José de
faculdade limitada facilitou os abusos, de que tanto Rezende Costa, isto é, de se achar no thesouro
se tem fallado e eu não defendo; se ella foi despotica publico estagnada uma grandiosa somma, e
em mandar pagar até aquella quantia de 200$000 segundo minha lembrança, de mais de dous milhões,
sem audiencia dos proprios interessados com menos remettida dos juizes das provedorias, pertencente a
conta daquellas leis e do systema geral da diversos herdeiros ausentes em Portugal de
jurisprudencia, esta augusta assembléa, com aquelle heranças arrecadadas e cujos credores não podião
projecto reduzido a lei, iria escancarar de todo as ser embolçados pela falta da citação dos herdeiros,
portas aos mesmos abusos e depredações; e se sobre o que nada providenciou o referido projecto,
tornaria ainda mais despotica, que a mesa da que apresentou a commissão encarregada para
consciencia que se tem reputado por isso tão odiosa:
porque esta assim mesmo receiosa e com mão
parca e cautelosa limitou sómente o pagamento até
a somma de 200$000 e obrigou a uma fiança
82 Sessão em 12 de Agosto de 1823

o dito fim; pois que a providencia que dá é só de depositados nos seus cofres: e que as requisições
futuro e nada sobre o objecto da indicação do Sr. dos credores que apresentavão precatorios para a
Rezende Costa, que é sobre as heranças já cobrança de dividas que justificavão, erão
arrecadadas e remettidas ao thesouro, a respeito das desattendidas e escusadas em consequencia da
quaes nada ha que tratar no juizo das provedorias, provisão de 28 de Dezembro de 1754, allegada pelos
por ficarem aquellas heranças extinctas com a procuradores fiscaes, a qual restringe o pagamento
remessa dos dinheiros e dos papeis e cadernos das dividas dos finados á quantia de 200$000 por
respectivos. escriptura publica e á de 100$000 as que não
Pelo que, fica sendo manco nesta parte e tivessem escriptura, por faltarem as citações de
muito manco porque nada remediou e nem herdeiros, que todos sabem quanto são difficeis.
providenciou sobre a dita indicação que lhe deu o Sendo estes os motivos não sei porque o
principal motivo; e portanto voto que não passe o illustre preopinante membro da commissão, julga que
projecto e que não gastemos mais o tempo com elle eu na minha indicação só fallei dos dinheiros dos
e que se remetta á commissão para formar outro, defuntos e ausentes, depositados no thesouro
que não destruindo os principios da legislação e da publico para mostrar o mal e não para lhe dar o
justiça universal, abranja a sua disposição o objecto remedio, nem a razão que tivesse para a mesma
da mencionada indicação. commissão, como elle diz, assentar que não era
O SR. MAIA: – Parece-me que o illustre tempo de o dar. Quanto a mim deve com a maior
preopinante que acabou de fallar se fundou em urgencia ser já subministrado.
alguns principios que nada têm com o projecto. Julgou se discutida a materia e passou-se ao
Quando o nobre deputado, autor da indicação, artigo seguinte:
lembrou esta estagnação de dinheiros no thesouro Art. 2º. Todos os subditos deste imperio que
publico, creio que teve só em vista mostrar aquelle forem credores de pessoas fallecidas ou ausentes,
mal, mas não o pedir o remedio delle; nem a cujos bens estejão em arrecadação ou sequestro,
commissão entendeu que devia tratar dos meios de poderáõ demandar os seus pagamentos, qualquer
o dar; talvez fosse melhor que se tornasse a lêr a que seja a qualidade e quantidade das dividas
indicação para se não formarem hypotheses perante os juizes e com as formalidades que se
arbitrarias nem se argumentar fóra da ordem. declarão nos artigos seguintes.
O que a commissão teve em vista foi attender Como ninguem pediu a palavra, houve-se por
aos graves prejuizos que soffrem os grandes discutida a materia do artigo.
credores de quantias avultadas quando pretendem Art. 3º. Serão juizes competentes para
cobral-as, não se fez cargo de apresentar uma conhecer dos feitos e acções por que se pedirem
determinação geral ou um regimento para o juizo da estas dividas os provedores nos seus districtos
provedoria, cuidou do que era mais urgente, de emquanto os bens estiverem na arrecadação do
facilitar as cobranças de quaesquer dividas de que juizo e os juizes dos sequestros dos bens dos
fossem credores os subditos deste imperio, subditos de Portugal, quando já estejão
ampliando a faculdade de pagar quando estava sequestrados, tendo uns outros neste caso a alçada
restringida á quantia de duzentos mil réis provada até cem mil reis.
por escriptura e á de cem por justificação, revogando Tambem nenhum Sr. deputado pediu a
para isso a provisão. palavra, e por isso deu-se por discutida a materia.
Este art. 1º não tem outro objecto e sobre isto Art. 4º. Para se pedirem e poderem ser pagas
sómente é que se deve fallar. as dividas que não excederem a quantia de cem mil
O SR. REZENDE COSTA: – Os principaes reis, bastaráõ justificações summarias feitas pelos
motivos, Sr. presidente, que me moverão a fazer credores, com citação e audiencia ou do thesoureiro
esta indicação forão, a saber: que se achavão mais das provedorias ou dos fiscaes dos sequestros; e
de dous milhões de cruzados pertencentes aos para se demandarem os de maiores quantias se
defuntos e ausentes, recolhidos nos cofres do formaráõ processos ordinarios de acções
thesouro publico desta côrte até o fim do anno competentes com a mesma citação e audiencia dos
passado, além de mais de trinta contos de réis, em sobreditos fiscaes.
que orço as entradas deste anno: que pelas juntas O SR. FRANÇA: – O maior mal que descubro
de fazenda das provincias do Rio Grande de S. na providencia do artigo é estabelecer-se pessoa
Pedro e de Santa Catharina, em razão da falta de certa que haja de responder a todas as acções
rendimentos para acudir ás suas despezas, erão propostas contra a herança jacente; e que seja esta
empregados com consentimento do presidente do pessoa o thesoureiro das provedorias dos ausentes.
thesouro, os dinheiros dos mesmos ausentes As muitas malversações daquelles que têm
exercitado este officio em prejuizo das heranças
arrecadadas, abonão pouco da experiencia os
sugeitos que são nelles empregados para que se
Sessão em 12 de Agosto de 1823 83

lhe abra a porta ao interesse da collusão em que até alvará de 30 de Outubro de 1793. – Teixeira de
agora erão inhibidos de entrar com suppostos Gouvêa.
credores dos defuntos para fraudarem o direito dos Não me limitei inteiramente ás provas por
herdeiros ausentes. escriptura publica, porque são attendiveis as
Dir-me-hão que se taes habilitações de dividas difficuldades que ha no Brazil a cada passo para se
estão autorisadas pelo alvará de 17 de Junho de chamar um tabellião, que existe muitas vezes 30 e
1766 a favor da classe dos negociantes, não ha 40 leguas distante do lugar em que delle se precisa;
motivo para que se não estenda o mesmo favor a é a razão por que inclui tambem as dividas provadas
respeito dos mais credores. por escriptos particulares.
Mas a differença é que pelo dito alvará são Propoz-se a emenda e foi apoiada.
nomeados pela junta do commercio negociantes de O SR. MAIA: – Tambem proporei uma
reconhecido credito e as mais das vezes credores emenda, aproveitando as idéas do Sr. Vergueiro,
tambem do defunto para lhe administrar a casa e pois me parece conveniente marcar um tempo para
responder á vista dos seus assentos ás acções que os herdeiros dos defuntos possão vir oppôr-se
propostas; e a experiencia tem mostrado, que não ás sentenças: prestando sempre os credores fiança
são elles capazes, em regra, de taes traficancias. idonea ás quantias que receberem... (Não se ouviu o
Demais disso, as transacções commerciaes resto.)
têm uma norma certa de sua correnteza, segundo a O Mesmo Sr. Deputado mandou á mesa o
qual se apura facilmente a verdade do debito e seguinte:
credito do devedor fallecido; e ainda assim quando
as mesmas transacções se desvião do curso ADDITAMENTO
ordinario, e que por taes se não podem liquidar
summariamente é o negocio remettido á discussão (Depois do art. 4.º) – Art. 5º Os credores serão
ordinaria ouvidos os herdeiros. De sorte que o obrigados a prestar fiança ao que vencerem; os
exemplo no caso do dito alvará não póde de herdeiros poderáõ dentro de dous annos haver vista
nenhuma maneira servir á regra que se pretende das sentenças para que não tiverem sido ouvidos; e
estabelecer no artigo, para se convencer a herança os juizes deveráõ appellar ex-officio para o tribunal
por sentença proferida contra parte certa, que nella da mesa da consciencia, nos casos que excederem
não tem interesse, qual é o thesoureiro da provedoria a sua alçada. – Maia.
e isto em toda e qualquer quantia. Foi apoiado.
Eu reconheço, como já outr’ora reconheci O SR. TEIXEIRA DE GOUVÊA: – Parece-me
fallando deste projecto, que o mal de se não necessario um artigo addicional, porque convém
pagarem as dividas das heranças arrecadadas pelas acautelar todas as duvidas; não posso, porém, deixar
provedorias dos ausentes, era grande; mas vejo que de dizer que é lastima que o illustre membro que
o remedio que se lhe pretende applicar é peior. Alli contrariou este projecto attendesse sómente ao
perdia, digamol-o assim, um credor de boa fé a sua direito do devedor, sem lhe importar com o do
divida pela difficuldade de a cobrar; aqui entrega-se credor, obrigado a seguir immensos recursos, e
a fazenda indefeza do herdeiro nas mãos da fraude e muitas vezes para nada obter. Eu mando á mesa o
do conloio, que maneja a espada de dous gumes, a referido artigo, mas salva a redacção, porque o redigi
cujos golpes nenhuma fiscalisação da lei póde aqui á pressa.
resistir. Não approvo pois o artigo. Artigo addicional. – Os credores que
O SR. TEIXEIRA DE GOUVÊA: – Como creio executarem as sentenças obtidas na fórma do art. 4º
que o maior perigo que ha a temer por este artigo é a prestaráõ fiança idonea a repôrem no prazo de tres
facilidade de provas para dividas falsas, proponho annos, quando nelle compareção os herdeiros e
uma emenda com que me parece ter providenciado tenhão obtido melhoramento da sentença por
aquelle risco: é concebida nos seguintes termos: embargos á sentença que se lhes deverá conceder
Para se pedirem e poderem ser pagas as por via de restituição, que lhes fica competindo. –
dividas que não excederem a quantia de cem mil réis Teixeira de Gouvêa.
bastaráõ justificações summarias, com citação e Foi apoiado.
audiencia do thesoureiro das provedorias ou dos O SR. GONDIM: – Eu direi só duas palavras
fiscaes do sequestro, admittindo-se neste caso as ao que ouvi ao nobre deputado que chamou lastima
provas de direito commum; para se demandarem ao que propuz, dizendo que eu só attendia á
porém as de maiores quantias se formaráõ propriedade dos devedores, sem me importar com a
processos ordinarios com a mesma citação e dos credores.
audiencia dos fiscaes: mas neste caso só serão Não sei, Sr. presidente, como se pretende
attendidas as provas de escriptura publica ou alterar todas as formulas requeridas em direito,
escriptos particulares, nos termos do prejudicando as heranças com a falta de citação da
parte interessada.
Lastima seria se, em tempos constitucionaes,
84 Sessão em 12 de Agosto de 1823

quando se trata de garantir a propriedade individual, documento qual uma escriptura publica que é de fé
sahissem desta assembléa leis incompativeis com as provada ainda mesmo que se admitta a disposição
maximas fundamentaes do systema que estamos do alvará de 30 de Outubro, porque apparece um
estabelecendo, e que levassem os negocios para titulo por onde se mostra credor.
fóra da marcha ordinaria, e dos principios Não ha duvida que desta maneira unicamente
constantemente seguidos na ordem do processo, é que se póde observar igualdade, e parece-me ser
como é o de ninguem ser condemnado sem ser a materia de que tratamos muito digna desta
convencido. assembléa, pois que as obrigações e os direitos são
Eis-aqui porque tenho combatido a falta de correlativos se um tem direito para cobrar o outro
citação, pois entendo que ninguem póde perder o tem obrigação de pagar; e, quando ache o devedor
direito a uma herança que lhe compete sem ser que foi obrigado a pagar injustamente, então valha-
ouvido. A isto chamo eu ordem e justiça; e o se do meio que se faculta, venha revogar aquella
contrario é que é lastima. sentença e fazer que fique de nenhum effeito: seguro
O SR. TEIXEIRA DE GOUVÊA: – Eu não como está, com a confiança, não se lhe faz injustiça;
tenho culpa que o illustre deputado me não está attendido com perfeita igualdade tanto o
entendesse. Eu disse, e ainda digo, que é lastima devedor como o credor. Esqueça-se de uma vez
que no tempo presente, em que devemos observar esse systema de sacar o dinheiro do Brazil para
perfeita igualdade, se trate sómente de segurar o Portugal, onde não ha semelhante juizo, que foi
direito do devedor, desattendendo-se o do credor, particularmente creado para esse fim, ao menos eu
demorando-se o seu embolso, e talvez originando-se estou convencido disto, como disse o illustre
dessa demora a impossibilidade de se realisar. deputado que me precedeu.
Ao herdeiro do devedor nada toca emquanto O SR. ROCHA FRANCO: – Como me parece
não estiverem satisfeitas as dividas, e um legitimo que a fiança só se faz precisa no caso da falta de
credor tem todo o direito a ser satisfeito, sem as bens do credor, pois havendo-os seguro está o
delongas que se apontão: creio que o nobre embolso do herdeiro se demandar e vencer, por isso
preopinante não negará esta verdade. offereço a seguinte:
Um homem que contrahe uma divida póde
ajustar-se, com a condição de ser paga neste ou EMENDA
naquelle tempo, ou com alguma outra, em que
convenhão ambas as partes; mas nunca será com a A’ fiança, porém, só será obrigado o credor
de não poder ser pago pelos bens do devedor, no que não fôr estabelecido com bens de raiz
caso deste faltar, sem o consentimento dos equivalentes á quantia demandada. – Rocha Franco.
herdeiros. Foi apoiada.
Com o que proponho, torno a dizer, só quero O SR. SILVA LISBOA: – Sr. presidente, ainda
que se observe perfeita igualdade, attendendo-se que tenha duvida de por ora alterar-se uma
aos prejuizos que se podem seguir da marcha legislação que é complicada com varios
contraria, em que se falta ás garantias que se devem estabelecimentos, comtudo, a passar o projecto de
a todo o cidadão. lei, parece-me legitima a emenda do nobre membro
Finalmente já não estamos no tempo em que que se funda no alvará de 30 de Outubro de 1793
se creou este juizo unicamente favoravel ao systema privativo ao Brazil que tirou a antiga restricção da
colonial, pois nada mais se teve em vista do que ordenação do reino, ampliando as quantias que se
chamar os capitaes para Portugal. podião julgar até á somma alli prefixa; entendo,
Por estas razões é que me opponho e me porém, que a mesma emenda deve ser ampliada
opporei sempre á opinião do nobre preopinante. para toda a quantia, tanto nas letras que têm força
O SR. TEIXEIRA DE VASCONCELLOS: – Eu de escriptura publica como tambem para as
ia a dizer o mesmo porém por differentes palavras; obrigações chirographarias reconhecidamente
mas accrescentarei unicamente que os herdeiros verdadeiras e sem o encargo da requerida fiança que
ausentes de ordinario são os luzitanos, que nos é mui oneroso, difficil e ás vezes impossivel, porque
prejudicão por differentes maneiras e nos tirão por prejudicaria ao credor pelo menos no empate da
assim dizer a nossa riqueza; teremos, pois, a cobrança; parecendo não ser de boa razão que a
fraqueza de a deixar ir para um paiz estranho que ausencia e frequentemente a incerteza da existencia
presentemente é nosso inimigo, que está em guerra do herdeiro tolha o seu pagamento pela herança
comnosco, ao mesmo tempo que deixamos um jacente quando aliás o herdeiro fica com direito
credor legitimo para attendermos aos direitos desses salvo, quando apparecer habilitado a mostrar a
devedores ausentes? falsidade ou paga do credito, se tiver havido.
Isto não tem lugar; elles não podem dizer que O dito alvará foi feito em tempo, onde a
não são ouvidos, porque pela providencia que se dá, riqueza do Brazil não era tão grande; sendo hoje de
está tudo acautelado, e por consequencia não se
lhes faz injuria alguma, muito principalmente quando
o credor apresenta um
Sessão em 12 de Agosto de 1823 85

menor consideração a quantia que antes era notavel. leis, alvarás, provisões, e quaesquer outras
A razão do mesmo alvará foi o ser o Brazil em resoluções que se oppuzerem ao disposto nesta lei.
grande parte um paiz de commercio; e este pela Como não houvesse quem pedisse a palavra
liberdade de commercio é hoje mais activo, e é houve-se por discutida a sua doutrina.
notoria a facilidade que honra o mesmo paiz, com O Sr. Presidente propoz então:
especialidade do corpo de commercio das praças 1º Se estava concluida a 2ª discussão. –
principaes, de fazer credito, e em grandes sommas, Venceu-se que sim.
até sem clareza de prova legal, e por mera conta de 2º Se passava á 3ª discussão. – Venceu-se
livros. tambem que sim.
O que se diz sobre preferencia do direito da Seguia-se a 2ª parte da ordem do dia, que era
propriedade do herdeiro ao direito do credor, além de o regimento da assembléa, e leu-se o art. 118 do
ser contra a igualdade de direitos, não parece mesmo regimento.
fundada; porque é regra de jurisprudencia, que Art. 118. Cada um dos deputados da
herança não se entende senão deduzidas as dividas. assembléa póde propôr que seja adiada a discussão
A lei patria, por mera ficção dos direitos em qualquer estado em que ella estiver.
suppõe transferida a posse natural e civil da herança Foi approvado.
a quem tem direito a ella; porém os jurisconsultos Art. 119. Para se pôr a votos o adiamento é
são quasi unanimes em que o jus hereditario não é necessario que seja motivado e apoiado por cinco
de direito natural, e só de direito civil; mas é deputados, pelo menos. Na terceira discussão
incontestavel que o direito do credor emana do deverá ser apoiado por dez deputados, pelo menos.
contracto, fundamento da civilisação que é de O SR. MONTESUMA: – Parece-me, Sr.
primario direito natural. presidente, que é pouca a gente que se exige para
A’ sociedade interessa em que, depois de apoiar um adiamento, porque não é cousa de tão
estabelecida a desigualdade das condições, entre o pequena consideração.
que accumulou os fundos, e os destituidos delles, as Bem vejo que a materia é discutida depois de
leis facilitem as operações de credito; afim de quem algum tempo; mas tambem vejo que a assembléa é
tem o cabedal o empreste a quem o não tem, para o composta de 100 deputados, e que vem a passar o
exercicio da geral industria, segurando a execução adiamento só pelo voto de 5. Eu achava que devia
dos contractos de boa fé, assistindo a justiça em ser apoiado por 15 na 1ª ou 2ª discussão, e por 20
todo o tempo a quem mostra ser credor legitimo. na 3ª; o numero estabelecido parece-me pequeno.
Tudo o que obsta aos desenvolvimentos deste O SR. ANDRADA MACHADO: – Sr.
principio, da paralysia ao corpo politico. presidente, esta alteração não póde ter lugar.
O SR. MONTESUMA: – A doutrina do artigo O illustre deputado diz que deste modo, em
deve sustentar-se com a emenda e additamento do uma assembléa de 100 deputados, vem o negocio a
Sr. Teixeira de Gouvêa. decidir-se por 5; mas, Sr. presidente, apoiar não é
Eu não quero que a propriedade de um seja mais que mostrar que um certo numero de Srs.
mais privilegiada do que a de outro: tudo é deputados pede o adiamento, porém este é depois
propriedade; e, atacal-a de qualquer modo, é um posto á votação, e a assembIéa é que decide se tem
attentado; e eu diria que se praticava um se ou não lugar o adiamento apoiado. Portanto voto
olhassemos mais para o direito do credor do que pelo artigo como está, pois nisto o que se tem em
para o do herdeiro, o que succederia se não se vista é evitar que se esteja muitas vezes gastando o
estabelecesse a fiança; porque quando houvesse tempo inutilmente.
herdeiro legitimamente habilitado para herdar e Posto á votação foi approvado como estava.
alguem tivesse recebido incompetentemente alguma Art. 120. Não se poderáõ propôr adiamentos
somma, ou se tivesse deixado estragar alguns bens, indefinidos.
como se satisfaria o herdeiro não havendo por onde Depois de algumas reflexões foi approvado.
se pagasse? Este inconveniente que é de natureza Art. 121. Não se discutiráõ projectos de corpos
mui grave só póde ser remediado pela fiança. de leis sem que tenhão sido impressos, e reservados
Eu bem vejo que ainda assim muitas de um anno para outro, attenta a extensão do
difficuldades occorreráõ, e que póde acontecer que imperio.
apezar desta cautela o herdeiro não cobre quando O Sr. Vergueiro requereu a suppressão do
tenha direito para receber; mas evitar este mal em artigo, e sustentando-a com diversos argumentos,
todos os casos, sem correr outros perigos, não sei lembrou que até podia ser necessario adoptar-se
como possa verificar-se. Portanto apoio a emenda e provisoriamente algum codigo de leis, e que por isso
o additamento. seria bom tirar-se esta restricção, muito
Julgando-se a materia discutida passou-se ao
5º artigo.
Art. 5º Ficão revogados todos os regimentos,
86 Sessão em 12 de Agosto de 1823

mais sendo grandes os males actuaes e precisando Julgou-se discutida a materia, e posto á
de prompto remedio. votação o artigo passou tal qual estava redigido.
O SR. ANDRADA MACHADO: – Eu não Art. 123. Por tres maneiras se podem dar os
considero inutil este artigo. Um codigo de leis não se votos: 1ª pelo methodo symbolico: 2ª pelo nominal
póde discutir sem que passe tempo e muito tempo, de sim ou não: 3ª por escrutinio secreto.
porque é necessario medital-o no todo e nas suas Foi approvado.
partes. Agora o que diz o illustre deputado sobre a Art. 124. Em geral, o modo ordinario e mais
adopção de um codigo de leis é cousa differente; prompto de approvar ou reprovar qualquer objecto, é
talvez seja preciso adoptar-se aIgum que tenha por o symbolico, dizendo o presidente da assembléa que
si a opinião publica para entretanto nos regermos por – os Srs. deputados que votarem a favor se
elle; mas deste caso não é que falla o artigo; elle levantaráõ e os que votarem contra ficaráõ sentados.
trata de projectos que mandarmos imprimir para se O SR. ANDRADA MACHADO: – Não approvo
discutirem; e por isso assento que deve conservar- a redacção deste artigo; eu creio que as leis não
se. ensinão, mandão; e isto está como se fosse escripto
Julgando-se discutido propoz o Sr. presidente: por um doutor, quando o é por um legislador. Julgo
1º Se o artigo seria supprimido. – Venceu-se por isso que deve passar salva a redacção.
que não. Foi approvado salva a redacção.
2º Se passava tal qual. – Venceu-se que sim. Art. 125. Se o resultado dos votos fôr tão
Art. 122. Todos os assumptos para cuja manifesto que á primeira vista se conheça a sua
decisão não estiver determinado numero certo de pluralidade, o presidente o publicará; mas se não fôr
votos, serão decididos pela pluralidade absoluta. logo manifesta, ou se parecer a algum deputado que
O SR. FRANÇA: – Eu entendo que é esta a o resultado publicado pelo presidente não é exacto,
occasião opportuna de fixar o numero de votos poderá pedir que se contem os votos, usando da
preciso para a decisão das materias constitucionaes. formula seguinte. – Requeiro que se contem os
Por ora os negocios que se discutem na votos.
assembléa decidem-se por pluralidade absoluta, mas Foi approvado.
acho que com artigos de constituição deve haver Art. 126. Tanto em um como em outro caso
alguma differença. contar-se-hão os votos, escolhendo o presidente de
Posto isto, será muito a proposito determinar- cada um dos lados da assembléa dous deputados,
se agora o numero de votos para a resolução de taes um que tenha votado pela affirmativa e outro peIa
materias, e parece-me que não deve ser menos dos negativa os quaes contaráõ cada um de seu lado os
dous terços dos deputados presentes. que forem de voto contrario ao seu; e cada turno dirá
O SR. CARNEIRO DE CAMPOS: – Não sigo em voz alta o numero de votos pró e contra; e então
semelhante opinião. O vencimento das materias pelo o presidente publicará o resultado. Comtudo o meio
voto das duas terças partes envolve um absurdo mais prompto e o mais usado é o serem contados
encoberto, que é a resolução do negocio pelo menor pelo secretario.
numero. O SR. MONTESUMA: – Eu adoptaria antes o
Quando fazemos uma lei apresentamos a methodo que se tem seguido até agora aqui; nem sei
expressão da vontade geral, ora, admittindo-se que como se póde estabelecer isto sem mostrar certa
para passar uma lei sejão necessarios os votos das desconfiança da mesa, que na verdade não existe,
duas terças partes pelo menos, segue-se que póde o mas que o artigo faz apparecer. Voto portanto que
numero menor desfazer a opinião do maior, isto é, a seja supprimido o artigo, accrescentando-se ao
vontade geral. antecedente o que indico na seguinte:
Eis-aqui porque me opponho ao parecer do
nobre preopinante. EMENDA
O SR. ANDRADA MACHADO: – O illustre
deputado que acabou de fallar prevenio-me Proponho a suppressão do artigo; e que em
realmente. Este artigo é dos mais importantes e deve seu lugar se accrescentem ao artigo antecedente as
conservar-se como está. palavras – e dois secretarios contaráõ os votos cada
Se passasse a opinião do Sr. França a um de seu lado. – O deputado Montesuma.
constituição seria feita pela minoridade, e não pela Foi apoiada.
maioria da assembléa. O SR. ANDRADA MACHADO: – Realmente
Montesquieu diz mui claramente que deve este artigo é mui defeituoso, porque propõe dous
sempre prevalecer o voto da maioridade para se não modos, e não diz qual delles deve ser preferido;
cahir em absurdo; e a tactica de Bentham é tão clara portanto escolha-se o mais asisado e mais prompto,
a este respeito que não deixa duvida alguma. (Não
se ouvio o resto.)
Sessão em 12 de Agosto de 1823 87

e marque-se o que fôr adoptado para seguir-se, sem apparecerem outras devem ser logo despresadas.
se apontarem ambos no artigo, que é um defeito O SR. COSTA AGUIAR: – Pois então declare-
muito grande. se agora que quando vier carta anonyma seja logo
O SR. VERGUEIRO: – Parece-me acertado regeitada por não merecer consideração; mas sem
que os votos sejão contados por dous Srs. se ter assim deliberado só podia fazer o que fiz, isto
secretarios, contando um os votos contra e outro os é, consultar á mesa a qual decidio que se abrisse
a favor. para ser presente á assembléa.
Assim se praticava em Lisboa, e acho muito O SR. MONTESUMA: – Sr. presidente, eu não
bom methodo. sou de opinião que se recebão escriptos anonymos
O Sr. Presidente, julgando discutida a materia, nem que elles sejão lidos nesta assembléa; mas
propôz: quereria que se dissesse que nós despresamos este,
1º Se passava a suppressão. – Venceu-se que não pela materia, mas pela fórma com que nos foi
não. dirigido. Que o redactor do Diario do Governo
2º Se tinha lugar a doutrina da emenda. – merece ser punido é para mim indubitavel; mas
Venceu-se que sim. tambem conheço que não é por nós que o ha de ser;
3º Se seria unida ao antecedente ou em o que desejaria é que não ficasse impune pelo que
separado. – Venceu-se que em artigo separado. pratica todos os dias.
Art. 127. Para se pôr em pratica a votação O SR. ANDRADA MACHADO: – Nós
nominal se formaráõ duas listas, uma pelo secretario regeitamos a carta porque é anonyma; dirigir-nos
da direita para os deputados que approvão, e outra cartas anonymas é fazer-nos uma injuria muito atroz;
pelo secretario da esquerda para os que reprovão, é suppôr que não temos liberdade.
fazendo-se a chamada de cada nome pela ordem Sr. presidente, se ha homens que pedem
alphabetica. providencias a este respeito e a materia é digna da
Concluido o acto perguntará o secretario da nossa consideração, appareção, assignem seus
direita por duas vezes – se falta alguem para votar. nomes; não sei porque temem onde nada ha que
Depois de algumas reflexões foi posto á temer.
votação e approvado, redigindo-se de maneira mais Somos os defensores da liberdade nacional, e
conforme ao estado em que se achava a mesa, pois se julgão que podemos pouco, talvez os
estava com quatro secretarios em lugar de dois. desenganaremos. Mas entregar-nos cartas
Art. 128. Os dois secretarios sommaráõ os anonymas ou para melhor dizer, zombar comnosco,
votos com o presidente, e logo publicaráõ os nomes não deve admittir-se de modo nenhum.
dos que votarão em suas respectivas listas, O SR. ALENCAR: – Eu pedi a palavra para
declarando o presidente afinal o resultado do que se dizer tambem que esta carta não deve por nós ser
venceu. aceita, tanto pela materia como pela fórma. Quanto á
Foi approvado. materia digo que o Diario do Governo não nos
Art. 129. Emquanto ao terceiro modo de votar pertence; se transgredir os seus limites, se avançar
que é por escrutinio, este se fará por ceduIas idéas ou opiniões claramente contrarias ao systema
escriptas e lançadas em urnas, que correráõ o estabelecido a autoridade competente que deve
porteiro-mór e seus subalternos por todos os cuidar disso, o chamará aos jurados; e quanto á
deputados e apresentaráõ na mesa. fórma julgo igualmente que não deve ser aceita pelas
Depois de breves reflexões foi approvado. razões já expostas por outros illustres membros;
Não continuou pela hora a discussão dos quem tem alguma cousa que dizer deve abertamente
artigos do regimento; e o Sr. Costa Aguiar pediu a dirigir-se a esta assembléa ou publicar o que lhe
palavra e leu a seguinte carta anonyma dirigida á parecer por meio da imprensa. Até seria bom que
assembléa: houvesse quem escrevesse e rebatesse estas idéas
Soberana assembléa. – Até quando o redactor que se espalhão em opposição da opinião geral.
do Diario do Governo promoverá impune rebelliões Agora temos felizmente liberdade no Rio de
contra a integridade do Brazil e do systema Janeiro: não escreve quem não quer escrever.
constitucional! Não é acaso um ataque directo ao Quando se installou a assembléa era, na
systema representativo chamar heróes aos que o verdade, outra cousa; mas agora podem escrever
derribarão em Portugal! O ultimo artigo do uns em um sentido e outros em outro. Portanto sou
supplemento junto falla por mim... O S. A. do M. vigie de parecer que merecem todo o desprezo estas
e proteja nossa liberdade. – Magrisso. cartas anonymas, que suppoem não estarmos no
O SR. VERGUEIRO: – Isto nem devia ter pleno goso da nossa liberdade.
apparecido aqui. Nós nenhum caso devemos fazer O SR. VERGUEIRO: – Eu creio que não deve
de uma carta anonyma porque é cousa que não haver discussão; o que ha simplesmente para decidir
merece consideração alguma; e se para o futuro é se a carta merece ou não ser despresada.
Consulte-se a assembléa, e ella resolva.
88 Sessão em 12 de Agosto de 1823

O Sr. Presidente fez a proposta, e decidiu-se O SR. VERGUEIRO: – Eu sou do mesmo


que este e quaesquer outros papeis anonymos se parecer. Se a assembléa tem de deliberar, deve
não tomassem em consideração, até por ser isto conhecer a materia da sua deliberação, e se esta
conforme ao que se determina no regimento. não é necessaria, como creio que é, deixe-se á mesa
O Sr. Secretario França leu a seguinte a eleição. Pretender-se-ha por ventura que a
proposta da mesa sobre os lugares de porteiro e assembIéa assigne de cruz neste negocio? Julgo ao
ajudantes da secretaria da assembléa: contrario que se deve querer que sempre se delibere
Os secretarios actuaes da assembléa com todo o conhecimento de causa. Portanto, no
propoem para porteiro da secretaria José Antonio de caso presente é necessario saber o que ignoramos,
Oliveira Guimarães; ajudantes do porteiro José isto é, quem são os tres concurrentes, suas
Joaquim Borges, José de Almeida Saldanha. qualidades e serviços, e comparaI-os com os outros;
Observação. – Não se comprehende na para o que a mesa devia mandar uma relação de
proposta o lugar de official-maior da secretaria, por todos elles, porque só assim poderá a assembléa
se não poder ainda despensar o serviço do official- deliberar.
maior interino Theodoro José Biancardi, ficando A mesa merece-me toda a confiança; mas
portanto reservada a proposta do mesmo lugar para para a assembléa proceder com ordem, é
tempo opportuno. indispensavel preparar-se com todo o possivel
Paço da assembléa, 12 de Agosto de 1823. – conhecimento de causa, até para que se não diga
José Ricardo da Costa Aguiar de Andrada. – Manoel que obramos sem saber o que é necessario para nos
José de Souza França. – José Feliciano Fernandes determinar.
Pinheiro. – Luiz José de Carvalho e Mello. Requeiro pois que a proposta seja
O SR. HENRIQUES DE REZENDE: – Não me acompanhada de uma lista de todos os concurrentes
opponho á proposta; mas julgo que deverião vir e que se peze o que elles allegão em seus
juntos os requerimentos porque me parece que já requerimentos.
isto aqui se venceu. O SR. CARNEIRO DE CAMPOS: – O illustre
O SR. FRANÇA: – Não me lembra que a preopinante diz que não póde resolver-se a approvar
assembléa assim resolvesse; e até seria muito a proposta porque não conhece os escolhidos; eu
singular que se ajuntassem os requerimentos para tambem os não conheço; mas confio muito na
se lerem, depois de ter a mesa feito a escolha para proposta porque confio muito nos Srs. deputados
ser approvada pela assembléa. Nesse caso seria que a fizerão.
desnecessaria a proposta. Se acaso eu visse que algum dos preferidos
O SR. CARNEIRO DE CAMPOS: – Este caso pela mesa não devia ser empregado eu me opporia a
é igual ao de que ha pouco tratamos, em que é que passasse a proposta, mas não sabendo de
preciso ter confiança na mesa; se algum Sr. nenhum delles cousa que os torne indignos dos
deputado se oppuzesse á proposta então teria lugar lugares para que são eleitos, nenhuma duvida tenho
a leitura dos requerimentos, mas não havendo em approvar a proposta pela confiança que faço da
ninguem que se opponha devemos estar na boa fé mesa: o contrario até merece ser notado como falta
de que os Srs. secretarios escolherão com justiça, e de delicadeza, pois é de certo modo suppôr que
propuzerão o que lhes pareceu melhor. haveria algum interesse particular em nomear
O SR. MONTESUMA: – Sr. presidente, eu não aquelles homens.
sei como se ha de votar cegamente! No meu O SR. MONTESUMA: – Eu peço a palavra
entender, ou a proposta se ha de confiar sómente para dizer que eu tambem confio na mesa e
inteiramente da mesa sem carecer de approvação da tanto que eu já disse que o melhor seria que ella
assembléa, ou devem ler-se os requerimentos, para désse só por si estes lugares, mas para eu votar digo
se haver o preciso conhecimento do negocio. Acho que quero ter conhecimento do que é objecto da
inteiramente irrisorio approvarmos nós uma cousa de votação.
que não temos idéa alguma; eu pelo menos que não O SR. VERGUEIRO: – E’ muito estranho para
conheço quasi ninguem no Rio de Janeiro, não sei mim reputar-se falta de delicadeza o não querer
como hei de votar? approvar cousas de que não tenho conhecimento;
A's cegas, não estou por isso. Logo, é creio que mais natural é achar falta de delicadeza na
necessario que se leião os requerimentos se a nossa proposição do illustre preopinante. A mesa não é
approvação é precisa, e quando não, faça a mesa, infallivel, e se não ha infallibilidade nas suas
sem depender de outra confirmação, a nomeação decisões, póde errar; portanto cegamente não
que lhe parecer; e na verdade ella a póde fazer approvo o que outros fazem, e não sei o que tenha
melhor do que a assembléa porque tem todos os de offensivo este modo de proceder! Estou antes
esclarecimentos necessarios. persuadido, quando assim obro, que nada mais faço
do que cumprir com o meu dever.
O SR. FRANÇA: – Officios ha que exigindo
industria pessoal e pedindo a boa administração
Sessão em 12 de Agosto de 1823 89

que se confirão ao mais apto, cumpre por isso talvez teve a mesa, para eu poder approvar ou regeitar a
provêl-os em concurso. Não é porém dessa natureza proposta: só porque foi feita por ella, certamente a
o emprego de um continuo. Proposto um sujeito para não approvo: e por isso a não ter as illustrações
elle, qualquer homem vulgar que seja, se vicios não precisas não voto, porque não sei votar desse modo.
tem que o excluão, justamente póde ser proposto O SR. COSTA AGUIAR: – A meu vêr a
sem desar para servir o mesmo emprego. Isto por questão acaba-se ficando a proposta em cima da
uma parte: por outra parte não ha lugar no nosso mesa o tempo que os Srs. deputados julgarem
caso a innovação no modo de provêr, porque necessario para o exame do negocio, porque a fallar
estando resolvido que seja da mesa a proposta, não a verdade, largo tempo se gastaria em tirar os nomes
ha mais a fazer-se pela assembléa do que approvar dos concurrentes e referir as circumstancias em que
ou regeitar a mesma proposta; ou admittir-lhe uma se achão, porque ha um milhão de requerimentos.
emenda: é isto mesmo o que se tem praticado outras Creio que deste modo está decidida a questão.
vezes. O SR. DUARTE SILVA: – Pedi a palavra para
Demais, quando a assembléa preferir o meio requerer o mesmo que propôz o illustre preopinante,
de concurso para o provimento dos officios da casa, isto é, que fique adiada a proposta para podermos
fará da sua resolução uma lei ou artigo de regimento votar com todo o conhecimento de causa.
que a commissão da mesa observará nas propostas O SR. PRESIDENTE: – Não basta propôr o
que houver de fazer para o futuro; por agora fez-se o adiamento, é necessario marcar-lhe prazo. Serão
que estava resolvido e deve ir ávante porque é feito sufficientes tres dias?
em regra, isto é, approve-se, rejeite-se ou se O SR. FRANÇA: – Eu acho que são precisos,
emende a proposta. Bem me tinha ou querido pelo menos, 15 dias, porque ha 160 requerimentos, e
dispensar desta tarefa enfadonha, quando á de todos se hão de querer informações.
assembléa pedi já uma vez a minha dispensa do O SR. VERGUEIRO: – Requeiro que se
lugar de secretario, mas emfim não fui dispensado; e offereça tambem a minha proposição, isto é, que
como fiz com os mais senhores o meu officio, com a proposta da mesa venhão as razões que a
cumpre-me sustentar que o fizemos em regra, assim moverão a dar a preferencia a estes.
como que deve ser decidida a questão em regra. O SR. FRANÇA: – Não tem lugar o meio que
O SR. ANDRADA MACHADO: – Eu acho que se aponta. Os pretendentes são muitos: a assembléa
o que disse o Sr. Vergueiro é muito razoavel, mas não os conhece todos: a preferencia não póde ser
creio que tudo se póde remediar. Pedem-se os avaliada senão sobre a fé de um, dous ou mais Srs.
nomes dos propostos e cada um dos Srs. deputados deputados: e em tal caso o que se viria a fazer era
se informa a seu respeito, pedindo até á mesa as menosprezar o conceito que se deve ter nos
illustrações necessarias sobre a aptidão delles, membros da mesa, para seguir a de um, ou outro
porque a aptidão é o ingrediente essencial; depois deputado; mas quem não vê que isso é illegal, que é
della é que entrão em linha de conta os serviços odioso, e indecoroso?... Não ha meio, repito: ha de
prestados á nação, e se acontecer reunirem-se em se approvar, regeitar, ou emendar a proposta,
um sugeito estas duas qualidades, esse deve ser porque é essa a marcha de todos as mais propostas.
preferido a todos os que requererão e que se não O Sr. Presidente propoz o adiamento, que foi
achão nas mesmas circumstancias. Portanto o que apoiado: resolvendo-se que por oito dias ficassem na
julgo preciso é pedir o adiamento para se obterem secretaria os requerimentos para serem examinados
informações das qualidades e serviços dos pelos Srs. deputados que os quizessem ver.
propostos e requerentes para se deliberar com Propoz tambem o Sr. presidente se a proposta
acerto. viria motivada para ser offerecida á votação, como
O SR. FRANÇA: – A mesa não tem empenho requerera o Sr. Vergueiro. – Venceu-se que não.
em que a proposta se approve. Entre os que se O Sr. Secretario Costa Aguiar leu o parecer da
apresentarão preferiu estes tres e talvez outros commissão de legislação sobre uma representação
tenhão os mesmos ou equivalentes serviços e igual da camara de Aquiráz, que ficára adiado na sessão
aptidão; mas como só se precisão tres não podia antecedente tendo sido apresentado na de 9 do
escolher meia duzia; deu a preferencia aos que corrente.
julgou que desempenharião melhor as obrigações O SR. COSTA BARROS: – A assembléa tem
dos lugares. Isto é o que fez a mesa, mas nem a ella mostrado mui louvavel zelo para que appareça
importa nem a mim que se approve ou regeite a
proposta; porém se fôr regeitada de certo não fará
outra.
O SR. VERGUEIRO: – Se me não fôr
permittido o informar-me primeiro das qualidades dos
individuos peço ser dispensado de votar, porque o
não posso em consciencia fazer sem conhecimento
de causa. Preciso saber os motivos que
90 Sessão em 12 de Agosto de 1823

quanto antes um systema de educação, unico meio propria patria, que sendo uma villa notavel, e das
de que póde esperar-se o bem tão necessario da mais antigas do Brazil, nunca teve um só professor
instrucção publica. Todavia este meio tem comsigo publico; e no decurso de quasi um seculo apenas se
um grande inconveniente: o largo tempo que leva a podem contar cinco naturaes que tivessem educação
apresentação desse plano completo. litteraria, além do conhecimento das primeiras letras,
E emquanto não apparece deverá ficar a dos quaes sou eu o ultimo, que para esse effeito
mocidade sem educação? A minha provincia, Sr. houve de sahir do seio da minha familia em tenra
presidente, ha quatro annos que não tem um só idade, e com grandes despezas, para vir ao longe
mestre de latim; não é porque haja falta de mestres, mendigar com grave incommodo a escassa
mas porque não corresponde o pagamento; é elle instrucção que alli se negava a todos os meus
tão mesquinho que ninguem se affouta a ser mestre conterraneos.
de grammatica latina, nem mesmo de primeiras Em todas as povoações da vasta, rica e
letras; e se algum ha que se propõe a isto, é sempre opulenta provincia de S. Pedro que eu conheço, por
um miseravel como o que eu conheço, que anda muito tempo se soffreu o mesmo mal, e ainda
embrulhado em um timão grosso, que está continúa fóra da capital de Porto Alegre, podendo-se
carregado de filhos e que não sabe ler nem escrever. com verdade dizer, que em todo o Brazil, com as mui
Com effeito quem quererá ser mestre por poucas excepções das grandes cidades maritimas,
quarenta mil réis annuaes, que não chegão nem para vai a educação publica pelo mesmo fio. Que
o necessario de um homem só, quanto mais para havemos pois fazer em tal caso? Esperar que a
quem tiver mulher e filhos? E será possivel que uma assembléa adopte este ou aquelle systema de
villa tão rica, como Aracaty que faz tão grande instrucção da mocidade, para então ter lugar a
commercio em algodão, sóla, couros salgados etc. providencia do ensino publico das primeiras letras
não tenha meios de pagar bem a um mestre, que é indispensavel a todo o cidadão.
havendo para isto o subsidio litterario? Bem é de Methodos e systemas, são na verdade cousas
presumir que se lhe dê differente applicação. boas para abreviar os trabalhos da educação em
Portanto eu peço, Sr. presidente, por tudo o qualquer ramo do saber; mas não é a sua perfeição
que ha de mais sagrado, que se tomem medidas a meio indispensavel para se adquirir a sciencia: é
este respeito, e medidas geraes. Eu não sou só melhor saber alguma cousa em dez annos de
deputado do Ceará, sou deputado do Brazil inteiro; e estudo, que ser por toda a vida ignorante.
por isso requeiro que quanto antes esta assembléa Mettamos, senhores, mão intrepida á obra de
dê as providencias que estiverem ao seu alcance, diffundir as luzes na vasta extenção de nosso
fazendo-as extensivas a todas as provincias do territorio; communiquemos o nervo optico ao corpo
imperio. moral da nação, principiando por multiplicar, e
O SR. FRANÇA: – Todos nós sabemos que o generalisar desde já o ensino das primeiras letras, e
antigo governo tinha por maxima estabelecer entre do latim; dando ordenados sufficientes a cidadãos
nós a ignorancia systematica, com o que vinhão a benemeritos que zelosamente se empreguem nessa
ser de mero apparato todas as instituições publicas tarefa: isto não deve soffrer demora: fiquem as leis
necessarias á conveniente educação dos membros de methodo reservadas para seu tempo; assim como
da sociedade. Dessa maxima é que procede dar-se a dos systemas de doutrina.
40$ de ordenado a um mestre de primeiras letras, Nos governos despoticos é a ignorancia dos
quando importunado pelo requerimento dos povos, vassallos a base do systema assim como nos
que bom tributo pagavão e pagão para a instrucção governos constitucionaes o é a instrucção dos
de seus filhos, tinha emfim o mesmo governo de dar- subditos. Mais vale nestes pouca instrucção que
lhes uma cadeira de ensino dos primeiros elementos nenhuma. Concluo pois que ao governo se
do saber. recommende mui positivamente; que haja de prover
Temos disso bom testemunho nas muitas immediatamente todas as cadeiras vagas que
villas, e povoações notaveis do nosso continente ás estiverem creadas, e que estabeleça todas as que
quaes nunca se deu uma cadeira de ensino, nem forem necessarias de primeiras letras e latim;
ainda de primeiras letras: donde resultou e ainda propondo á assembIéa os ordenados que segundo
resulta o menosprezo em que somos conceituados as localidades dellas se possão reputar sufficientes á
pelas nações da Europa, e ainda mesmo pela nação congrua sustentação dos mestres que as regerem,
portugueza de que fizemos parte; havendo-nos por para em competente lei serem sanccionados.
ignorantes em regra; e até por incapazes de Isto não é fazer direito novo, é fazer observar
conhecermos a bondade das fórmas de governo, e a com a conveniente energia e extensão, as leis
condigna preferencia dos mais arrasoados systemas existentes. Os povos pagão um tributo
da administração publica. especialmente consignado de tempo immemorial
Eu tenho exemplo desta miseria na minha
Sessão em 12 de Agosto de 1823 91

para se provêr a educação da mocidade. Elle é povoações estavão nos termos de merecer a
rendoso, e sobeja para o fim que se paga. Ao creação de cadeiras; mas torno a dizer, todas as
menos dê-se-lhes escolas de primeiras letras e vezes que se requererão forão concedidas,
latim, emquanto lhes não facilitamos o accesso ás verificando-se as circumstancias necessarias. Agora
sciencias maiores, por uma regular distribuição de o que eu julgo indispensavel é o augmento dos
cadeiras em todas as povoações mais notaveis do ordenados, porque sem boa paga não ha mestres.
nosso continente. A irresolução é o peior dos vicios Com pequenos ordenados, e sem ter nada de
de um governo: sejamos pois activos, quando assim melhoramento a esperar, pois não mudão de
convém, como no presente caso. Esta a minha condição ainda que tenhão trinta ou quarenta annos
opinião, e conforme a ella offereço a seguinte: de serviço, veremos sempre o mesmo mal, isto é,
desampararem os mestres as cadeiras.
EMENDA Julgo por isso mui digno da consideração da
assembléa o augmento dos ordenados
Ao 2º artigo do parecer da commissão dou a estabelecidos, para que tenhamos, ao menos, em
emenda que se officie ao governo para que com todas as villas mestres de ler e escrever.
toda a efficacia promova a educação publica O SR. DUARTE SILVA: – Por julgar a
segundo as leis existentes fazendo provêr as discussão fóra da ordem não pedi antes a palavra;
cadeiras vagas, e creando as que faltarem em todas porém vendo que se trata em geral da falta de
as villas e lugares em que forem mister, informando escolas primarias em todas as provincias, e de
a assembléa dos motivos que obstarem ao meios de facilitar a instrucção publica, não posso
progresso da mesma educação. deixar de declarar ante esta augusta assembléa que
Paço da assembléa, 12 de Agosto de 1823. – nenhuma provincia do imperio póde com mais razão
O deputado, França. – Foi apoiada. do que a minha queixar-se deste abandono; seria
O SR. CARNEIRO DE CAMPOS: – Deixando até criminoso se guardasse silencio em semelhante
de fallar sobre o parecer da commissão, só quero discussão, e não levantasse a voz neste augusto
dizer alguma cousa sobre o que ouvi a respeito da recinto.
escassez dos ordenados estabelecidos para os Não ha em toda a minha provincia uma só
mestres, e falta de provimento de cadeiras, com que cadeira publica de primeiras letras. Uma que havia
se censura o governo. Eu não duvido que os de grammatica latina está vaga ha muitos annos,
ordenados sejão pequenos, e tanto que eu sou de porque como não se pagão os ordenados ninguem
voto que devem ser augmentados; mas cumpre as quer occupar. E procederá isto de não ser na
reparar que este mal é muito antigo, e que não é mesma provincia sufficiente o subsidio litterario
privativo dos mestres, pois delle soffrem quasi todos applicado a esta despeza?
os empregados, e se nunca se cuidou em Não, Sr. presidente, ao contrario,
augmentar em geral os ordenados foi por se receiar sobejamente chega. Portanto voto pela emenda do
que se viesse a fazer assim uma despeza tal que Sr. França, ou se considere como tal, ou como
não pudesse a fazenda publica satisfazel-a. Quanto indicação, e quando se não adoptem sobre este
a dizer-se que não se tem cuidado de provêr as objecto medidas geraes, eu as requererei
cadeiras, devo observar que não é tanto assim particularmente para a minha provincia.
como se affirma. O SR. SOUZA MELLO: – A falta de cadeiras
Eu servi muitos annos na secretaria de ou escolas de primeiras letras que se diz haver em
estado, e sei que quando havião cadeiras a provêr, muitas provincias do Brazil não póde deixar de
procedia-se ao seu provimento segundo as leis, e o proceder de omissão de alguns governos;
mesmo se tem continuado a fazer. Além disto, se porquanto na provincia das Alagôas, a que eu
para os lugares em que não havião cadeiras se pertenço, o governo constitucional della, logo no
pedia a creação dellas, logo se mandava informar, e principio da sua installação, desviou dalli
se vinha boa informação, e se conhecia que a semelhante mal, como origem de todos nos estados
população do lugar merecia contemplação, que se querem civilisar e constituir; e fundado na
mandava-se immediatamente crear e provêr, e é primeira lei da necessidade creou e proveu, por
tambem isto o que actualmente se está praticando, meio de concursos e exames, escolas de primeiras
de sorte que se algumas villas não têm mestres letras, não em todas as villas, mas em todas as
como tenho aqui ouvido affirmar, é pelo seu proprio freguezias da provincia, porque algumas ha
descuido a este respeito. bastantemente distantes da villa a cujo districto
Não se pense porém que eu quero justificar pertence; e dando a cada mestre o ordenado de
inteiramente o governo, antes lhe noto falta de cem mil réis annuaes, affectou o negocio ás côrtes
cuidado em não mandar proceder a um exame geral de Lisboa, a quem este imperio se achava ainda
para saber que villas ou unido; donde se expediu a ordem de autorisação de
taes creações, assignando os ordenados de cento e
cincoenta mil réis annuaes a cada mestre,
92 Sessão em 12 de Agosto de 1823

emquanto não baixava o plano regulamentar a tal devemos decretar despezas sem conhecermos o
respeito, e como por este modo se acha semelhante estado da nação, e principalmente estas que não
mal remediado na dita provincia, emquanto tambem podem deixar de ser muito grandes: pois ainda que
se não conclue o plano de que se trata a esse não demos igual honorario a todos os mestres,
respeito nesta augusta assembléa por meio da porque segundo os lugares em que estão
commissão competente, eu julgo conveniente que o estabelecidas as cadeiras são differentes os meios
mesmo methodo e ordem se faça extensiva a todas de subsistencia, comtudo como é necessario
as provincias que necessitão. estabelecel-as em todas as provincias do Brazil,
Entretanto, como ouvi aqui declarar-se que porque todos são brazileiros e todos têm direito a
algumas provincias não podião, sem especiaes gosar de uma boa educação; montão
ordens, sustentar esses estabelecimentos tão necessariamente estas despezas a uma grande
amplos pela caixa dos subsidios litterarios, que a somma.
elles são applicados, por serem diminutos, eu não Eu tambem sou de voto que a tudo se deve
sei que possa haver inconveniente algum em se dar remedio, mas não cegamente, aliás nos veremos
mandar com effeito abonar esses ordenados pela em terriveis embaraços.
caixa geral quando aquella parcial não baste, porque As provincias que tanto tempo têm soffrido,
devemos começar quanto antes pela instrucção soffrão mais algum, que não poderá ser longo;
publica. dentro de um mez apparecerá o plano de educação
O SR. ANDRADA MACHADO: – Eu creio que primaria e póde ser que então tenhamos os olhos
se tem clamado muito contra a falta de educação mais abertos sobre este negocio.
sem se pesarem as razões que a causão. Approvo por isso o parecer da commissão.
O Brazil todo soffre esta falta; eu sou nascido O SR. GOMIDE: – A commissão occupa-se
em uma villa junto do mar, grande, rica e de muito com todo o cuidado de apresentar a esta assembléa
commercio e por longo tempo não houve alli um um plano regular de educação primaria; e não
mestre de primeiras letras, porque ninguem o queria tardará muito que o não offereça á consideração
ser pelo insignificante ordenado que se lhe dava; o deste sabio congresso.
mesmo aconteceu em todas as mais provincias. O SR. DUARTE SILVA: – Uma vez que a
Mas não nos admiremos: os portuguezes illustre commissão declara que se occupa
queixão-se como nós; ha villas inteiras em Portugal actualmente do plano geral de instruccão primaria e
onde não ha uma só pessoa que saiba ler nem que será em breve apresentando, voto que sobre
escrever para poder servir os cargos das camaras. O este objecto nada se delibere até que appareça o
mal era geral porque provinha da falta dos meios do plano indicado pela mesma commissão.
governo portuguez, que desperdiçava por um lado e Por dar a hora declarou-se o parecer
economisava por outro com detrimento publico; mas novamente adiado.
não de seguir o systema de não querer educar o O Sr. Presidente assignou para a ordem do
povo; era muito desleixado para ter systema e na dia: 1º A 1ª discussão do projecto de lei sobre o
verdade nunca o teve. modo de passar cartas aos alumnos da academia
Os bens e males que fazia erão acasos; e por medico cirurgica; 2º O parecer adiado da commissão
isso o mal que nos fez foi sem saber, nem mesmo de legislação sobre a representação da camara de
reparar no que fazia. Porém a questão não é esta; é Aquiráz; 3º Segundas leituras de propostas e
outra muito differente. regimento da assembléa.
E’ possivel ter os empregados necessarios Levantou-se a sessão ás 2 horas da tarde. –
para a educação da mocidade, sendo tão grande o Manoel José de Souza Franca, secretario.
numero das villas de todas as provincias?
Eis-aqui o que se precisa saber. RESOLUÇÕES DA ASSEMBLÉA
Não bastão desejos, é necessario que hajão
meios aliás não lhe podemos dar remedio. PARA JOSÉ JOAQUIM CARNEIRO DE CAMPOS
Poderemos decretar que hajão mestres em
todas as villas e que todas as cadeiras vagas sejão Illm. e Exm. Sr. – A assembléa geral
providas, mas isto ficará só em decreto se não constituinte e legislativa do imperio do Brazil sendo-
tivermos meios de supprir as despezas. Lembremo- lhe presente o requerimento de José Fernandes
nos por exemplo que só a minha provincia tem Barbosa em que expondo achar-se na cidade do
algumas 40 villas, e que a tomarmos essa medida Porto para onde fôra por causa de negocio e não
deve abranger todas ellas, porque não são uns filhos poder regressar para o Brazil dentro dos 6 mezes
outros enteados; ora, isto merece alguma marcados na proclamação de 8 de Janeiro deste
consideração antes de decretarmos. anno, pede uma prorogação de mais 6 mezes:
Não vamos tanto ás carreiras; nós não manda participar ao governo que precisa que lhe
sejão transmittidas informações sobre o supplicante
Sessão em 13 de Agosto de 1823 93

afim de se conhecer se elle é ou não suspeito e se da camara da cidade de S. Paulo, em que, para
está no caso de merecer a graça que pede. O que proceder ao indispensavel atterro da estrada do
V. Ex. levará ao conhecimento de S. M. Imperial. – Carmo, pede permissão para estabelecer uma
Deus guarde a V. Ex. – Paço da assembléa, em 12 contribuição a favor daquella obra, por ser o dito
de Agosto de 1823. – José Ricardo da Costa Aguiar caminho uma das estradas mais publicas da cidade,
de Andrada. ou que a esta despeza seja applicado o dinheiro do
caminho de Santos: S. M. Imperador me ordena que
SESSÃO EM 13 DE AGOSTO DE 1823. remetta a V. Ex. para ser presente na assembléa
geral constituinte e legislativa do imperio do Brazil, a
PRESIDENCIA DO SR. BISPO CAPELLÃO-MÓR. mencionada consulta, afim de decidir sobre o seu
objecto o que julgar conveniente.
Reunidos os Srs. deputados pelas 10 horas Palacio do Rio de Janeiro, em 12 de Agosto
da manhã, fez-se a chamada, e acharão-se de 1823. – José Joaquim Carneiro de Campos. – Sr.
presentes 72, faltando com causa participada os José Ricardo da Costa Aguiar de Andrada.
Srs. Pereira da Cunha, Rodrigues Velloso, Navarro Foi remettido á commissão de fazenda e
de Abreu, Andrada e Silva e Dias. commercio.
O Sr. Presidente declarou aberta a sessão, e Illm. e Exm. Sr. – Tendo Sebastião Teixeira
lida a acta da antecedente foi approvada. de Leão, e outros negociantes de molhados do
O Sr. Secretario Costa Aguiar leu os arraial de Itabira, termo da villa nova da Rainha e
seguintes officios do ministro de estado dos comarca de Sabará, requerido a S. M. o Imperador
negocios do imperio: o serem desonerados de um imposto, que pagão ha
Illm. e Exm. Sr. – De ordem de S. M. o mais de 20 annos com o titulo de subsidio
lmperador remetto a V. Ex., para ser presente na voluntario, applicado para a reedificação do palacio
augusta assembléa geral constituinte e legislativa de Nossa Senhora d’Ajuda em Portugal: de ordem
do imperio do Brazil, o officio incluso do governo do mesmo senhor remetto V. Ex., para ser presente
provisorio da provincia de Goyaz, na data de 2 de na augusta assembléa geral constituinte e
Abril do corrente anno, dirigido ao procurador geral legislativa deste imperio, o mencionado
da mesma provincia no conselho de estado, e requerimento afim de decidir sobre o seu objecto o
incluindo um requerimento dos povos do arraial e que fôr conveniente.
julgado de Nossa Senhora do Pilar, em que pedem Palacio do Rio de Janeiro, em 12 de Agosto
ser alliviados da decima das casas e do dizimo dos de 1823. – José Joaquim Carneiro de Campos. – Sr.
fructos, pela grande miseria em que se achão; visto José Ricardo da Costa Aguiar de Andrada.
pertencer á mesma augusta assembléa a decisão Foi remettido á commissão de fazenda
deste objecto. Illm. e Exm. Sr. – Havendo os povos do
Deus guarde a V. Ex. Palacio do Rio de arraial e districto das Flôres, comarca de S. João
Janeiro, em 12 de Agosto de 1823. – José Joaquim das Duas Barras, representado a S. M. o Imperador
Carneiro de Campos. – Sr. José Ricardo da Costa o deploravel estado em que se acha aquelle
Aguiar de Andrada. districto, apontando as providencias que julgão
Foi remettido á commissão de fazenda. necessarias para seu melhoramento: de ordem do
Illm. e Exm. Sr. – Havendo a camara, clero, mesmo senhor remetto á V. Ex. para ser presente
nobreza e povo da villa da Campanha da Princeza na augusta assembléa geral constituinte e
representado a S. M. o Imperador a necessidade de legislativa deste imperio, a mencionada
se crear no seu termo uma nova comarca, representação, por lhe pertencer a decisão de
desmembrada da de S. João d’El-Rei, pelos alguns dos objectos de que trata.
motivos, que circumstanciadamente apontão, para Deus guarde a V. Ex. Palacio do Rio de
maior utilidade de seus habitantes: o mesmo Janeiro, em 12 de Agosto de 1823. – José Joaquim
augusto senhor me ordena que remetta a V. Ex. Carneiro de Campos. – Sr. José Ricardo da Costa
para ser presente na assembléa geral constituinte e Aguiar de Andrada.
legislativa deste imperio, a mencionada Foi remettido á commissão de agricultura e
representação, afim de decidir sobre aquelle objecto commercio.
o que julgar conveniente. O Mesmo Sr. Secretario deu conta de uma
Deus guarde a V. Ex. Palacio do Rio de felicitação da camara da cidade de S. Paulo.
Janeiro, em 12 de Agosto de 1823. – José Joaquim Foi recebida com particular agrado.
Carneiro de Campos. – Sr. José Ricardo da Costa Passou-se á ordem do dia, e entrou em 1ª
Aguiar de Andrada. discussão o projecto de lei sobre o modo de passar
Foi remettido á commissão de constituição as cartas aos alumnos da academia-medico
unida á de estatistica. cirurgica desta côrte, offerecido na sessão de 2 do
Illm. e Exm. Sr. – Havendo a mesa do corrente.
desembargo do paço consultado sobre a
representação
94 Sessão em 13 de Agosto de 1823

O SR. CARNEIRO DE CAMPOS: – Nada medico-cirurgica desta côrte pela lei da sua creação
tenho que dizer contra o projecto. Esta providencia o fazerem uso da sua arte pelos meros exames
é precisa, ou antes indispensavel, porque tendo os classicos em que fossem approvados termos da
alumnos acabado o curso dos seus estudos, o mesma lei, faltou nesta a providencia de designar a
passar-lhes cartas é como uma divida que se lhes qualidade do titulo que os devia habilitar para esse
paga. Porém eu não diria (só por maior clareza de effeito: donde se abrio caminho á mal entendida
expressão) que se lhes passassem as suas cartas fiscalisação do cirurgião-mór do reino pretender
depois de feitos os exames, mas depois de obrigar os mesmos alumnos a um novo exame de
approvados afinal por elles. Parece-me isto assim sufficiencia perante elle, e á extracção de uma
mais exacto, e por isso offereço a seguinte: carta, ou provisão sua de licença para elles
curarem; assim, e da mesma fórma que a tirão
EMENDA quaesquer empiricos approvados pelo seu juizo.
A isto se recusarão os mesmos alumnos
Ao § 1º – depois de jeitos – mude-se para – fundados no privilegio da lei que os habilitava pela
depois de approvados pelos ultimos exames. – approvação dos seus exames classicos; e não
Carneiro de Campos. obtendo do governo decisão terminante ao dito
Foi apoiada. respeito recorrerão com petição á assembléa, a
O Sr. Teixeira Vasconcellos, approvando qual, ouvida a commissão respectiva, houve por
tambem a necessidade da providencia do projecto, fundada a sua supplica; e para curialmente prover
offereceu a seguinte: no caso, ordenou que a mesma commissão
redigisse um projecto de lei, que declarando a da
EMENDA instituição da academia, fixasse o modo com que se
devião passar aos alumnos as suas competentes
Os directores das academias medico- cartas, em virtude da approvação dos seus exames
cirurgicas mandaráõ passar as cartas, etc. classicos: este projecto é o que ora se nos offerece
verificando-se por elles o complemento do curso á discussão; a sua utilidade está portanto já
academico, e a sua approvação. – Vasconcellos. reconhecida: deve passar á 2ª discussão.
Foi apoiada. Julgou-se afinal discutida a materia, e o Sr.
O Sr. Galvão pedio tambem a palavra, e presidente propoz:
discorrendo sobre a materia, mandou á mesa a 1º Se estava concluida a 1ª discussão. –
seguinte emenda e additamento: Venceu-se que sim.
2º Se passava o projecto á 2ª discussão. –
EMENDA Venceu-se que sim.
Seguio-se o parecer da commissão de
Os directores da academia medico-cirurgica legislação sobre a representação da camara da villa
mandaráõ passar cartas aos alumnos approvados de Aquiráz da provincia do Ceará com a emenda do
nos ultimos exames. – Galvão. Sr. França offerecida na sessão antecedente.
Foi apoiada. (Fallárão os Srs. Carneiro da Cunha
Rodrigues de Carvalho e Alencar; mas não se
ADDITAMENTO entendeu o tachygrapho Possidonio.)
O SR. SOUZA MELLO: – Como já ouvi dizer
1º Sejão observados os estatutos da que se examine na tabella das leis das côrtes de
universidade de Coimbra nas academias medico- Lisboa, que se cumprirão no Brazil, a qualidade e
cirurgicas em tudo que se não achar positivamente forças da que trata das escolas de primeiras letras
legislado emquanto se fazem estatutos proprios. que eu tenho mencionado, para se saber qual a
2º Fique o cirurgião-mór do imperio prohibido applicação que deve ter, devo dizer que a indicada
de approvar cirurgiões, conforme lhe era permittido providencia não baixou por meio de lei, ou decreto,
antes da creação das ditas academias pelo seu mas sim por uma ordem expedida das côrtes, que
regimento, que nesta parte fica derogado. passou pelo ministerio; cuja ordem mandava
3º O governo entre os lentes da academia da estabelecer as ditas creações e ordenados
cidade da Bahia nomêe um para director della, que emquanto se não decretavão ou se concluião os
terá a mesma autoridade que o do Rio de Janeiro planos de instrucção publica de que se ficava
sem ordenado algum. – Galvão. tratando: portanto a referida ordem incluida em uma
Foi apoiado. portaria existe nos governos das provincias, e póde
O SR. FRANÇA: – O projecto não póde não estar na tabella das leis extrahida da
deixar de passar á 2ª discussão, porque chancellaria-mór.
implicitamente já tem a approvação da assembléa,
que o mandou redigir. O caso é, que sendo
facultado aos alumnos da academia
Sessão em 13 de Agosto de 1823 95

Accrescento, porque estou bem ao facto mercado estrangeiro, e evitar as fraudes com que
deste negocio, que a ordem das côrtes de Lisboa de alguns dos particulares levados só do seu pequeno
que se trata, autorisava não só a creação de interesse, infamavão a sua bondade, fazendo com
cadeiras mas o augmento de ordenados; e isto em isto, que nos mercados de fóra perdessem a
consequencia das representações que houverão reputação de melhores, com que sobrepujavão os
sobre aquelle objecto, e que forão á commissão das nações concurrentes.
competente; esta deu o seu parecer, e sendo Havia além desta razão, que não é de
approvado pelas côrtes ordenou-se que emquanto pequena monta, outra assaz consideravel, convém
não se davão outras providencias, ou não baixava o a saber, que havendo neste estabelecimento a
plano regulamentar se creassem as necessarias designação do assucar em tres ou quatro
cadeiras de primeiras letras com 150$000 cada qualidades, e havendo tambem a taxa para estes,
uma: isto está expresso na ordem, como já disse, e seguio-se, que era este um meio mui proporcionado
nos governos consta. á certeza das contas, que os commissarios que os
Julgando-se discutida a materia propoz o Sr. recebião nos portos d’onde tem a extracção para
presidente o parecer á votação, e foi approvado fóra, costumão dar aos proprietarios que lh'os
ficando por isso regeitada a emenda. envião, porque ficando certos nos livros da
Passou-se ás segundas leituras de projectos, inspecção as qualidades e preços de cada um anno,
e leu-se o do Sr. Miguel Calmon sobre a extincção não podião falsificar as contas que devião remetter.
das mesas de inspecção de assucar, tabaco, e Ficou portanto indecisa a materia, que agora
algodão, apresentado na sessão de 8 do corrente. se renova; e a provincia da Bahia insta pela
O SR. CARVALHO E MELLO: – Sr. extincção das mesas allegando mais os damnos
presidente, E' objecto da presente discussão, se que soffrem com a inspecção do tabaco. Dizem os
convém ou não, que continue o estabelecimento proprietarios que fica a arbitrio de homens
das mesas de inspecção nas diversas provincias ignorantes ou corrompidos avaliar o seu tabaco,
deste imperio, A indicação do illustre membro que a refugando o que lhes apraz só para que os
propoz, tende a mostrar, que não só ellas são commerciantes, que enviavão tabacos para a costa
inuteis, mas até prejudiciaes. Esta pretenção por da Mina para onde não ião senão os refugados por
parte da provincia da Bahia, foi já por duas vezes dever serem vendidos os melhores aos
proposta ao governo, que a mandou consultar no contractadores de Lisboa, viessem assim por meio
tribunal da junta do commercio, que era o proprio de fraudes illicitas a ter, com vantagem sua, maior
para esta materia. quantidade, e de melhor estimação para o seu
Nelle depois das necessarias informações, se negocio de escravos.
discutirão todas as razões que apadrinhavão a Eu tenho, Sr. presidente, que as razões
pretenção do serem derribadas, e todas as que geraes por estes recorrentes allegadas, são mui
pugnavão pela sua conservação, pelo menos conformes ás regras do dominio e direito de
temporariamente, até que circumstancias mais propriedade; tenho tambem que a economia politica
favoraveis, e depois de se ter legislado prescreve como regras fundamentaes, que cada um
opportunamente sobre materias de agricultura e póde e deve vender os generos de sua agricultura,
commercio, dessem lugar a que esta questão se industria e trabalho pelos preços que lhe convier,
decidisse com pleno conhecimento de causa, e com que sempre são o resultado da maioria da exigencia
attenção aos sagrados direitos de propriedade, de dos compradores, e dos vendedores, o que faz a
mãos dadas com o interesse geral da agricultura e carestia ou barateza do mercado; que cada um que
commercio nacional. compra deve examinar a natureza e qualidade dos
Em consulta do referido tribunal se propoz generos que se lhes vendem; e que na amplissima
que supposto fossem certos os principios, que a liberdade do commercio em particular e em geral
cada um dos proprietarios dos generos sugeitos á consiste o verdadeiro interesse publico.
inspecção tocava a faculdade de dispôr dos seus Estes principios hoje em dia abraçados pelos
generos como, quando, e por que preço quizessem, celebres economistas não erão comtudo os que
e que era o principio mais fecundo do augmento e vogavão nos tempos em que se creou este
prosperidade do commercio a liberdade, e que o estabelecimento; e o celebre marquez de Pombal,
preço era filho das circumstancias e das que o instituio abraçava as maximas do systema
convenções de vendedor e comprador, todavia não restrictivo e commercial; e tomava por modelos
podia deixar de considerar-se utilidade publica na Colbert e outros. Julgavão estes grandes coryphêos
continuação deste estabelecimento. da sciencia do governo, que convinha a este entrar
Não era a mais attendivel razão, o com amiudados preceitos no systema de
qualificarem-se os generos para extremar os bons commercio: não se lembravão, que a nimia
dos máos, e acreditar assim a qualidade delles no ingerencia destes em semelhantes materias damna
ao progresso do commercio, que melhor é dirigido
pelo interesse individual dos que nelle entrão.
96 Sessão em 13 de Agosto de 1823

Todavia, como a melhor regra para guia do principios de justiça e utilidade commum, e
legislador, é o amoldar-se ás circumstancias; e o conserve o que fôr de jurisdicção consular e
interesse publico é quem os deve impellir, não é de mercantil.
todo sem fundamento, que se fizessem Fico portanto, Sr. presidente, que será util e
estabelecimentos com o fim de conservar intacta a justo remetter-se esta indicação ou proposta á
reputação dos generos, que vão ter concurrencia commissão de commercio e agricultura, debaixo do
nos mercados da Europa com os das outras designio que deixo indicado.
nações. Ha pouco tempo que os nossos algodões (Fallárão tambem os Sr. Carneiro da Cunha,
de Pernambuco e Maranhão, que tinhão a primazia Montesuma e Vergueiro; mas não se entendeu o
nos mercados da Inglaterra sobre os dos tachygrapho Silva.)
americanos inglezes, começarão a decahir pelas O SR. SILVA LISBOA: – (Diz o mesmo
fraudes, que os nossos praticavão, não só na tachygrapho que o não ouvio.)
lavoura mas no arranjamento das saccas, e o que é Julgando-se discutida a materia propoz o Sr.
peior, na introducção de caroços e outros generos presidente á votação a urgencia, e foi approvada.
que augmentavão o pezo, e diminuião por O illustre autor do projecto requereu outro que
conseguinte a rama. fosse remettido á commissão de commercio e
A inspecção pois, prevenindo o cuidado do agricultura. – Assim se decidiu.
agricultor, e estimulando o seu interesse, concorre O SR. FRANÇA: – Eu requeiro que se peção
para a reputação do genero e seu maior valor, e ao governo todas as representações, consultas e
augmento da extracção; e eis-aqui um principio mais papeis relativos ás mesas de inspecção, para
fecundo em augmentar o interesse nacional. A taxa que tenha a commissão todas as instrucções
do preço é de sua natureza ridicula e até inutil, mas necessarias.
nada faz ao caso porque por si mesma se destróe. Resolveu a assembléa que se officiasse ao
Nesta provincia perdeu por si mesma o uso, e na governo para o dito fim.
Bahia tanto faz que exista como não, porque é Era chegada a hora da leitura dos pareceres,
costume, que os tempos naturalmente comsigo mas o Sr. Costa Aguiar pedio a palavra, e leu o
trouxerão, de ajustarem os contractantes os tostões, seguinte officio do ministro dos negocios da
que lhes parece, sobre o ferro. fazenda:
Além do principio já estabelecido de utilidade Illm. e Exm. Sr. – Fazendo presente a Sua
geral, accresce o outro já tambem exposto, de servir Magestade o Imperador o officio de V. Ex. datado
de regra para a seguridade das contas, e o que de 6 do corrente, em que de ordem da assembléa
mais é, temos de attender, que por leis modernas geral constituinte e legislativa do imperio participa
aqui mesmo estabelecidas se unio a estas mesas ao governo a precisão que a mesma assembléa tem
jurisdicção consular e mercantil. São os delegados da consulta do conselho da fazenda relativa á
da junta do commercio; exercem jurisdicção nas reforma do fiel pagador do thesouro publico
mesmas leis outorgada, e por conseguinte não Francisco Duarte Nunes e providencias ácerca do
podem desde já ser desmanchadas sem perigar a alcance de 6:800$000 afim de poder tomar sobre
ordem publica para a decisão judicial de negocios estas pretenções a conveniente deliberação:
mercantis. mandou o mesmo augusto senhor, que se
A' vista do exposto, é claro, Sr. presidente, remettesse a referida consulta a qual V. Ex. achará
que esta materia não deve instantaneamente ser inclusa.
nem regeitada nem admittida; que deve ser Deus guarde a V. Ex. Paço, 12 de Agosto de
examinada e maduramente discutida na commissão 1823. – Manoel Jacintho Nogueira da Gama. – Sr.
do commercio, onde existem membros da junta do José Ricardo da Costa Aguiar d'Andrada.
commercio versados nestes principios de economia Foi remetido á commissão de fazenda.
politica, na sciencia pratica do objecto em questão, O Sr. Cavalcanti de Albuquerque, offereceu á
porque foi muitas vezes materia de suas assembléa uma memoria sobre reformas de
deliberações e conselhos, os quaes fazendo vir por alfandegas do Brasil.
ordem desta augusta assembléa, todas as consultas Foi recebida com especial agrado; e
e papeis relativos, que existem na mesma junta do remettida as commissões de commercio e fazenda.
commercio, examinaráõ com profunda indagação as O Sr. Maia leu, como relator da commissão
razões de conveniencia e desconveniencia, e de legislação, o seguinte:
proporáõ um projecto de lei, de convinhavel ás
circumstancias presentes, e ás melhores regras dos PARECER
mestres da materia e em que se attenda aos direitos
e interesses particulares, tendo em vista os geraes, A commissão de legislação para entrar no
e de interesse publico; e talvez então seja a conhecimento da justiça do requerimento de João
deliberação principal proscrever abusos, fomentar o Gonçalves Duarte Pereira, e outros
interesse geral e substituir a este estabelecimento
algum que se chegue mais aos
Sessão em 14 de Agosto de 1823 97

commerciantes desta praça credores do fallecido tão sómente nos de maior importancia a
José Teixeira Mello; precisa, que se exija do governo requerimento de algum deputado com a approvação
a consulta do tribunal da junta do commercio, em da assembléa; e o terceiro methodo é proprio das
consequencia da qual foi indeferido o requerimento, eleições.
porque os sobreditos supplicarão a prorogação de O SR. FRANÇA: – Eu sou de voto que se não
praso na administração dos bens daquelle fallecido a exclua a votação secreta, porque muitas hypotheses
beneficio do seu embolso; e por isso o representa a occorreráõ em que a assembléa a julgue talvez
esta augusta assembléa para que assim se delibere. conveniente. As boas leis sempre são filhas da
Paço da assembléa, 13 de Agosto de 1823. – experiencia; e as mais bellas theorias vêm a ser
José Antonio da Silva Maria. – José Teixeira da muitas vezes erros praticos.
Fonseca Vasconcellos – D. Nuno Eugenio de Locio. O SR. RIBEIRO DE ANDRADA: – Sou de
– Estevão Ribeiro de Rezende. – opinião inteiramente contraria. Que somos nós? Os
Foi approvado. representantes da nação. Logo, devemos patentear
O Sr. Ribeiro de Andrada, por parte da a nossa conducta á nação em geral, e a cada
commissão de fazenda, leu tambem o seguinte: provincia em particular, porque cada uma tem direito
a saber como se corresponde á confiança que poz
PARECER nos que nomeou para zelar os seus interesses.
Se a votação fôr secreta não se sabem as
Antonio Joaquim dos Reis Portugal, chefe de opiniões dos deputados, e a conhecel-as têm os
esquadra da armada nacional representa por seu povos um direito incontestavel.
procurador, que tendo servido 44 annos, e achando- Além disto, tal modo de votar só póde agradar
se em avançada idade, e onerado de familia, aos que tiverem receio de expôr em publico o seu
requerera uma pensão de 600$000 com modo de pensar; mas eu não temo declarar o que
sobrevivencia a sua mulher, e filhas, em me dicta a minha consciencia, e por isso direi
remuneração dos seus serviços, que forão sempre o meu voto sem temer o juizo do publico.
mandados decretar, e se achão na secretaria de Julgando-se discutido, poz-se á votação, e foi
estado dos negocios do imperio desde o anno de approvado.
1821, e que impedido de o fazer pela falta de meios, O Sr. Presidente, assignou para a ordem do
e despeza, recorre á assembléa, a exemplo do que dia: 1º O projecto de lei para não poderem os Srs.
concedeu a outro lhe conceda a graça que pretende. deputados exercer outro emprego durante a sua
A commissão de fazenda é de parecer, que se deputação: 2º Segundas leituras de propostas: 3º
exija da secretaria de estado dos negocios do Regimento da assembléa.
imperio os requerimentos e documentos allegados Levantou-se a sessão ás 2 horas da tarde.–
pelo supplicante para á vista delles informar ao dito Manoel José de Souza França, secretario.
respeito.
Paço da assembléa, 12 de Agosto de 1823. – SESSÃO EM 14 DE AGOSTO DE 1823.
Martim Francisco Ribeiro de Andrada. – José
Arouche de Toledo Rendon. – Barão de S. Amaro. – PRESIDENClA DO SR. BISPO CAPELLÃO-MÓR.
Manoel Jacintho Nogueira da Gama. – José de
Rezende Costa. Reunidos os Srs. deputados pelas 10 horas da
Foi approvada. manhã, fez-se a chamada, e acharão-se presentes
Por não haverem mais pareceres leu-se a 69, faltando com causa participada os Srs. Pereira
indicação que o Sr. Andrada Machado mandára á da Cunha, Rodrigues Velloso, Navarro de Abreu,
mesa, concebida nos termos seguintes: Andrada e Silva, Dias, Carneiro de Campos, Almeida
e Albuquerque e Pedreira do Couto.
INDICAÇÃO O Sr. Presidente, declarou aberta a sessão, e
leu-se a acta da antecedente.
Proponho que se peção informações ao O SR. MARIANNO CAVALCANTI: – Eu sou
ministerio da justiça, ou a qualquer outra repartição contado na acta entre os Srs. que faltárão; e eu não
sobre o requerimento de João José Martins faltei, compareci logo depois de feita a chamada.
Pamplona Côrte Real. – Andrada Machado. O SR. FRANÇA: – Como entrou depois da
Resolveu a assembléa na fórma da indicação. sessão começada não reparei, e por isso o não
O Sr. Presidente, por não ter dado a hora, risquei do numero dos que faltárão.
propoz á discussão o artigo 130 do regimento da O SR. PRESIDENTE: – Por occasião desta
assembléa que é do theor seguinte: advertencia lembro que será conveniente que
Art. 130. Os dous primeiros methodos dizem
respeito á legislação; o da votação symbolica nos
casos ordinarios; o da nominal
98 Sessão em 14 de Agosto de 1823

os Srs. deputados que chegarem depois de feita a entre as legislaturas ordinarias, e esta actual
chamada, digão ao Sr. Secretario que são chegados, legislatura; mas de novo me explicarei para que
aliás não é possivel que se dê fé das suas entradas, ninguem ignore os meus sentimentos, nem seja
como é preciso para se fazer a nota competente. Se calumniado por pessoas que me não entendem, nem
não ha mais nada a observar está approvada a acta. me podem entender, porque o espirito precisa ser
Declarou-se approvada. cultivado.
O Sr. Secretario Costa Aguiar, leu uma Eu estou persuadido que se aqui se
participação de molestia do Sr. Almeida e estabelecesse a these em geral como se
Albuquerque.– Ficou a assembléa inteirada. estabeleceu nas côrtes de Portugal, iriamos
Participou tambem ter recebido um introduzir um fóco perenne de revoluções, estou
requerimento do padre Antonio Francisco de persuadido que a lei que vedasse a entrada, dos
Sampaio, procurador geral eleito pela provincia do deputados no ministerio seria um machado que
Ceará, em que declarava ter-lhe adiantado o deceparia a liberdade publica, e arruinaria pelos seus
thesouro daquella provincia um conto de réis para as alicerces a sociedade.
despezas do seu transporte para o Rio de Janeiro, e Os perigos de semelhante medida são claros
pedia, pelos grandes gastos já feitos, o ser 1º perigo: inimizade decidida entre o poder legislativo
desonerado da obrigação de repôr a referida quantia. e os agentes da execução; porque como os
– Foi remettido á commissão de petições. deputados nunca poderião aspirar a ser membros do
Passou-se á ordem do dia, que era a 3ª governo, havião sempre podal-o, e mutilal-o, porque
discussão do projecto de lei para não exercerem dirião em tal caso, aquillo que nunca me ha de caber
outro algum emprego os deputados durante o tempo não valha nada; e dando-lhe cada legislatura golpes
da sua deputação, o qual foi lido com as suas continuados, acabarião de todo com o poder
respectivas emendas. executivo. 2º perigo: despreso mal entendido do
O Sr. Carneiro da Cunha, pediu a palavra, e legislativo para o executivo. A soberania nacional, Sr.
leu a emenda seguinte: presidente, torna orgulhosos os que a representão;
E aquelle que fizer ficará inhibido de occupar nas assembléas de elemento popular, é natural
cargos publicos. Paço da assembléa, 14 de Agosto olhar-se como por cima do hombro para um poder
de 1823. – Carneiro da Cunha. que lhe parece subordinado, e que se figura mais
Não foi apoiada. servo do publico do que outra cousa; veriamos
O SR. MONTESUMA: – Levanto-me para repetidas as supposições forjadas pelo orgulho dos
accrescentar uma palavra á emenda do Sr. Araujo antigos cidadãos romanos que até se julgarião
Vianna. Eu quizera que não só se não pudessem abatidos casando com as filhas dos reis; o cidadão
aceitar empregos, mas que igualmente se não romano reputava-se o unico soberano do mundo,
pudessem aceitar graças; acho que é muito ficando-lhe tudo o mais subordinado; ora, este
conveniente fechar tambem esta porta. Eis-aqui o orgulho embaraça, e estorva a marcha, ou
meu additamento que se refere ao art. 2º. andamento dos negocios, o que não succede
Proponho que se accrescente á emenda do quando estes membros podem esperar de fazer
Sr. Araujo Vianna depois da palavra – tempo – a parte do outro corpo porque olhão para elle com
palavra – graças. – O deputado Montesuma. mais igualdade, e tomão interesse em que não seja
Foi apoiado. acabrunhado, ou abatido. 3º perigo: enervar almas
O SR. CARNEIRO DA CUNHA: – Na emenda elevadas. Sr. presidente, muitas ha, sem duvida
do Sr. Araujo Vianna diz-se que não poderáõ aceitar incapazes de repouso, e feitas para governar; ora
emprego algum além do que lhe competir por lei na (sendo natural que entre os deputados hajão muitas
carreira de suas profissões; e na do Sr. Montesuma dessas almas), se lhe tiramos a possibilidade de
accrescenta-se que não poderáõ tambem aceitar seguir o seu destino, obrigamol-as de certo modo a
graças; mas como se não declara que não poderáõ destruirem a fórma de governo, onde as suas
pedir para outrem, não ficão inhibidos de pedir pretenções não têm, nem podem ter realidade.
qualquer das cousas para seus filhos, pais, ou Emfim, Sr. presidente, nas actuaes
irmãos; portanto deve-se declarar que não podem circumstancias, tanto na Europa, como entre nós,
pedir para si, nem para quaesquer outras pessoas. não póde ter segurança o governo senão por meio
Eu mando á mesa o additamento seguinte: de influencia moral; a força é fraca; serve para
E nem pedir graças ou empregos para si ou pouco; e as mais das vezes falha; ora, como ha de
para outra pessoa. Paço da assembléa, 14 de ter influencia o poder executivo se acaso se não ligar
Agosto de 1823. – Carneiro da Cunha. com o corpo legislativo? Além disto, não havendo
Foi apoiada. opposição facilitão-se as reformas; servem para isso
O SR. ANDRADA MACHADO: – Sr. as relações entre o poder legislativo e os agentes do
presidente, eu já na primeira discussão mostrei poder executivo; por ellas o legislativo obra
quaes erão as minhas idéas a este respeito, fazendo docemente sobre o executivo e
distincção
Sessão em 14 de Agosto de 1823 99

verifica-se sem transtorno, e sem salabancos o que ainda com o risco de ser logrado no fim de contas, e
se julga necessario. de não se lhe dar o que se lhe offereceu.
Portanto, tudo o que se oppuzer a esta Portanto acho que no segundo paragrapho do
harmonia, ou tender a diminuil-a, é nocivo, e até projecto se conserve o ser nomeados, ajuntando-se
contradictorio com a natureza do governo a excepção que lhe fez o nobre autor, porque não é
representativo. (Aqui o orador mostrou como a justo que ninguem perca o que lhe compete em sua
doutrina devia ser considerada relativamente ás respectiva carreira.
assembléas constituintes, e ás meramente Eu não tenho carreira porque abandonei a
legislativas; mas não se pôde ordenar os argumentos minha; não é por mim que eu fallo; mas muitos dos
pelo que disse o tachygrapho João Caetano que não meus illustres collegas têm carreira já na tropa, e já
se entendeu nesta parte.) na magistratura, e seria manifesta, injustiça que um
Direi agora, Sr. presidente, alguma cousa tenente-coronel que lhe cabia ser coronel, visse por
considerando os artigos de per si. O 1º não deixa de ser deputado saltar por cima delle o seu inferior; ou
parecer-me injusto, porque ha nelle uma especie de um magistrado por estar servindo á nação ser
effeito retroactivo a respeito dos empregados, que preterido. No 3º admitto tambem a excepção feita em
são hoje deputados, com os quaes se exercita assim favor dos illustres deputados que exercem os lugares
extrema severidade. O 3º que contém uma excepção do ministerio, e o de intendente geral da policia; mas
do 1º me parece assaz odioso pela parcialidade da quero, como já disse, que se declare que no mesmo
doutrina; não sei porque os nossos collegas que ora caso estão os outros todos que exercem empregos
têm lugar no ministerio, e o que é intendente geral da que não são incompativeis, e dos quaes por isso não
policia, hão de ser tratados com tanta indulgencia, e devem ser privados, porque não ha Deus para uns e
os outros que tambem têm empregos, com tão diabo para outros; isso por nenhum modo; sou amigo
pouca, quando talvez não sejão taes empregos da igualdade, e aborreço o reinado do privilegio, que
incompativeis com o de deputado. para mim é da injustiça.
Accresce a isto que estes forão eleitos pelo Não vejo uma razão ao menos de politica para
povo sabendo-se que já os occupavão e os outros esta distincção, e como não a vejo, ou ninguem ha
forão eleitos quando os não exercião; de sorte que de poder exercer outros empregos, ou então hão de
eu os considero agora deputados por graça desta continuar a ter exercicio os meus illustres collegas
assembléa; e portanto favorece-se com a excepção que antes o tinhão, uma vez que seus empregos não
as pessoas que menos direitos têm á ella. sejão incompativeis.
Por conseguinte, eu quererei que neste artigo Eu já disse que não tenho emprego algum;
se accrescente depois das palavras – intendente mas não quero que se despoje ninguem sem razão
geral da policia – as seguintes – e aquelles que daquillo que antes tinha, nem que o mal seja só para
exercem outros empregos não incompativeis – uns, e não para todos. Eu mando á mesa a emenda
quanto ao art. 2º, não admittindo a redacção da ao art. 2º, e o additamento ao 3º.
emenda que a elle fez o illustre autor do projecto,
approva a excepção. Acho pouco exacta a EMENDA
expressão, pois fica ainda aberta a porta á
corrupção; e por isso prefiro que se diga não poder Art. 2º Não poderáõ outrosim ser nomeados
ser nomeado em lugar de não poder aceitar; porque no sobredito tempo para qualquer emprego á
neste caso ainda posso fazer os meus ajustes com o excepção daquelles que lhe couberem na sua
governo na certeza de poder aceitar depois que sahir carreira respectiva. Outrosim não poderáõ receber
daqui, e vender assim a minha consciencia, o que graças para si, ou seus filhos ou pais. – Andrada
não succede dizendo-se que não posso ser Machado.
nomeado, porque é o mesmo que dizer que tal
nomeação é nulla no caso que a haja. Emquanto ás ADDITAMENTO
graças, digo o mesmo; não basta que não possa
aceitar durante o tempo da deputação, porque posso Ao art. 3º Accrescente-se depois de –
ajustar graças como paga da minha indignidade, intendente geral da policia – e aquelles que ora
para depois de finda a legislatura; e por isso quero exercem outros empregos não incompativeis. –
tambem que sejão nullas, que não possão em tempo Andrada Machado.
algum surtir effeito. Foi apoiada a emenda e o additamento.
Eu não sei que se me póde dizer que ninguem O SR. NOGUEIRA DA GAMA: – Sr.
será capaz de taes ajustes; não é assim; talvez que presidente, ouvi dizer ao illustre preopinante que os
alguem haja que queira ajustar premios que depois dois deputados desta assembléa que forão
devem ter effeito, nomeados para o ministerio só continuavão a ser
deputados por graça da mesma assembléa; e não
posso
100 Sessão de 14 de Agosto de 1823

accommodar-me com esta proposição porque a julgo o contrario, e eu portanto fiquei vencido, mas não
contraria ao meu decoro, e destructiva daquillo que convencido.
assento que me compete de direito. Estou persuadido que nenhuma autoridade
A nação, ou o povo da provincia do Rio de governa no meu modo de pensar; devo sim
Janeiro, escolheu-me para advogar os seus obedecer, mas para que eu me persuada da justiça
interesses neste congresso; aceitei com prazer este das suas decisões é preciso convencer-me, e neste
lugar, bem que conhecesse as minhas poucas forças ponto confesso que não me convenceu.
de saude e escassas luzes para bem o Ainda estou pelas minhas theorias a esse
desempenhar; aceitei-o, torno a dizer, com grande respeito; ainda penso que quando um povo elege
satisfação e maior agradecimento, e jámais uma pessoa, a considera tal qual ella existe com
consentirei que se pretenda despojar-me desta todos os motivos que lhe inspirão confiança, e que
dignidade; porque o imperador se lembrou de se por qualquer modo perder alguns desses motivos,
chamar-me para o ministerio não devo perder um não confiará nella como d'antes.
lugar que tanto prezo: assim o disse francamente Eis o que disse, e não ouvi razões que me
quando aqui mesmo recebi a participação. fizessem mudar de opinião. Os nobres deputados
Não consentirei pois que em minha presença quando forão para aqui eleitos não tinhão a
passe a proposição de que, se sou deputado é por qualidade de ministros de estado; esta qualidade
graça do deputado que acabou de fallar. póde alterar muito a confiança que nelles fez o povo;
Eu não reconheço na assembléa o direito (e o homem que ora esta aqui não é aquelle homem
desejarei que se mostre) de repellir do seu seio um que o povo elegeu; assim como se o povo elegesse
membro nomeado pela nação, salvo o caso de um homem verde, e depois ficasse azul, este homem
commetter crime e desmerecer o conceito publico. azul não era o verde que tinha sido eleito.
Enganou-se o nobre deputado se pensou que O povo quando elegeu os nobres deputados
só pela sua influencia e seus sophismas o podia foi considerando em um o Sr. Manoel Jacintho
fazer; e quizera que me provasse que eu e o outro Nogueira da Gama, e em outro o Sr. José Joaquim
meu collega, o Sr. Carneiro de Campos estamos Carneiro de Campos; esta simples qualidade é que
aqui por graça sua ou de alguns outros senhores; os povos tiverão em vista, e não as que hoje os
quizera eu saber se ha autoridade para me expulsar condecorão. Por estes meus principios continúo a
desta assembléa, e se eu tenho feito crime para isso; julgar nulla a eleição (á ordem, á ordem); achão-se
quanto á lei que se pretende fazer a semelhante revestidos de uma qualidade que não tinhão quando
respeito, essa regula para o futuro, e de modo o povo os elegeu, e que se a tivessem talvez os não
nenhum para o passado; e não sei que houvesse elegesse; portanto outra vez a vontade do povo
alguma que prohibisse que os deputados tivessem devia ser consultada. (A' ordem, á ordem.)
empregos publicos fóra do congresso. Estes principios são adoptados em toda a
Que importa a esta assembléa que se sirvão parte, onde os ministros de estado, têm assento na
outros lugares não faltando ás obrigações de assembléa. (No resto não se entendeu o
deputado? tachygrapho João Caetano.)
Que lhe importa que eu me occupe em outro O SR. CARNEIRO DA CUNHA: – Por causa
serviço fóra desta casa (Muitos apoiados.) da ordem consentiu-se o Sr. Manoel Jacintho fallar
Que tem a assembléa com o que eu faço na contra a ordem; o Sr. Antonio Carlos fallou tambem
minha casa? (Apoiados.) contra a ordem, e deste modo estaremos aqui sem
Lá está o poder executivo para me chamar ao fazer nada na ordem; eu a requeiro, Sr. presidente!
desempenho de meus lugares quando eu não O SR. NOGUEIRA DA GAMA: – Eu fallei para
cumprir minhas obrigações. responder porque me offenderão.
E’ para mim summamente alambicado o O SR. ANDRADA MACHADO: – Eu tambem
querer pôr os deputados na crise de entes creio que fui contra a ordem, mas não era possivel
imaginarios, e obrigal-os a toda a qualidade de deixar de ser assim.
privações: nós não temos nada com o que se faz O SR. VERGUEIRO: – Eu voto a favor do 1º
fóra desta casa; nem compete a esta assembléa artigo em toda a sua extensão, porque conheço que
regular o trabalho dos deputados fóra della. este decreto é provisorio; são doutrinas
Portanto desejo que se decida se estou aqui constitucionaes, e não podem valer além da
por graça especial do Sr. deputado, ou porque me constituição, onde terão o seu lugar; por isso não me
nomeou a nação. farei cargo de responder miudamente aos
O SR. ANDRADA MACHADO: – Sr. argumentos que se fizerão; limitar-me-hei a algumas
presidente, o nobre preopinante sahiu muito fóra da observações.
ordem; e apezar do que elle disse, fiquei da mesma Eu quizera que os ministros de estado, como
opinião. agentes do poder executivo fossem excluidos de
Eu votei contra a sua conservação,
determinado pelo interesse da causa; a assembléa
julgou
Sessão em 14 de Agosto de 1823 101

fazer parte da assembléa; porque ella deve Não se deve porém daqui deduzir
fiscalisar a responsabilidade desses agentes do argumentos para os outros que estão na regra
outro poder; e não póde fazel-o bem sendo elles geral; se houver algum em quem concorrão motivos
membros, e fazendo parte da assembléa. de servir ao mesmo tempo dous empregos, faça ver
Tambem não acho, como disse um nobre esses motivos, e eu votarei em seu favor; mas é
deputado, que isto offenda tanto as almas grandes; necessario um conhecimento especial do negocio
o ser deputado não inhabilita para ser empregado para se poder deliberar, porque não estão no caso
senão emquanto se occupa este lugar: depois que dos outros sobre os quaes já se decidio. E' o que
acaba póde qualquer de nós ser empregado, e tinha a dizer.
procurar a elevação a que o chama o seu espirito; O SR. MUNIZ TAVARES: – Sr. presidente, é
portanto não ficão impossibilitadas essas almas bem conhecido que este projecto tem dous fins
nobres de proseguir na sua carreira, e de nutrir interessantes á causa publica: 1º evitar que os Srs.
esperanças de occupar os grandes empregos. deputados que têm empregos publicos sejão
Quando ao 2º artigo tambem o approvo com distrahidos por objectos estranhos á sua missão;
o additamento relativo ás mercês ou graças. Ainda isto é indispensavel attendendo á pequena
que com effeito devemos considerar como caso capacidade humana, e este fim consegue-se
muito raro, que alguem desça da sua dignidade approvando o 1º artigo: voto por isso em favor delle.
para pedir empregos, todavia como póde acontecer, O 2º fim é tornar todos os Srs. deputados tão
a lei deve prevenil-o; ora, o mesmo que entendo a independentes quanto fôr possivel; mas pergunto
respeito dos empregos deve entender-se a respeito eu, poder-se-ha conseguir este fim tão sómente
das graças; embora, como já disse, seja caso pela doutrina expendida no 2º artigo?
extraordinario, e que seguramente nenhum dos Respondo que não; de que servirá não
actuaes membros seja capaz de tal baixeza; a razão poderem os Srs. deputados ser nomeados, nem
pede que se supponha que póde ser que haja aceitar empregos, se elles nesse tempo puderem
alguem que sacrifique assim o seu dever, e que por solicital-os para outrem?
isso se previna. A dependencia continúa da mesma maneira;
Quanto ao 3º eu voto pela excepção; é um um deputado tem irmãos, tem parentes, tem
caso particular que foi tomado em consideração por amigos; e por esta regra quasi geral de todos
esta assembléa; é uma questão que já aqui se pensarem que qualquer deputado tem sempre
decidio. Um illustre preopinante disse que os Srs. valimento para com o ministerio, e que póde
deputados que servião agora os cargos de ministros conseguir tudo, rogão, e instão a ponto de que por
e secretarios de estado, continuavão a ser muito escrupuloso que seja um Sr. deputado, talvez
deputados, por uma graça especial da assembléa (á se veja na necessidade de ceder, e ir pedir; ora, se
ordem, á ordem), eu estou na ordem. consegue o que pediu já se deixa vêr que fica por
Eu quero provar o inverso disto, e não o motivo de gratidão obrigado a fechar os olhos a
posso fazer sem fallar. certas cousas.
Eu entendo que esta asserção não é exacta, Eis-aqui o mal que devemos remediar, e por
supponho, pelo contrario, que no ministerio é que isso approvo a emenda do Sr. Carneiro da Cunha.
elles estão por graça especial da assembléa, e não Emquanto ao 3º artigo approvo-o igualmente
no exercicio de deputados. O fazer deputados com a excepção, não obstante ter dito um nobre
pertence individualmente aos cidadãos; para elles preopinante, que havendo razão para estes tres
estarem por uma graça especial em exercicio nesta deve haver para os demais; porque a isto respondo
assembléa, era necessario que tivessem perdido o que para estes tres houve votação, e deliberação
titulo que lhes confiou a nação; ora, não havendo particular da assembléa, e para os demais não
autoridade que os possa privar deste lugar, segue- houve.
se que nunca estiverão demittidos, nem privados de O SR. MAIA: – Na certeza de que nas leis
ser deputados. deve haver toda a clareza, e parecendo-me que
O que me parece é que a assembléa esta como se acha concebida póde dar lugar a
concedeu uma graça especial, que fez uma algumas duvidas, entendo que será conveniente
excepção da regra, para elles poderem servir no uma declaração que me lembra.
ministerio, ainda que esta graça seja fundada na Como ha empregados cuja promoção
razão universal, na razão da conveniencia; e por depende de antiguidade, e póde acontecer que
isso na occasião da nomeação sustentei que elles algum deputado seja um destes e que o despacho
não podião aceitar, mas que esta assembléa podia se verifique ou antes da sua nomeação para a
dispensar para que elles aceitassem. Com effeito assembléa, ou já no tempo de estar aqui servindo,
deliberou-se que pudessem servir, e como a deve declarar-se que em taes casos a falta de
assembléa consentiu é uma cousa feita que não posse não prejudica a antiguidade; porque não é
devemos agora contrariar. justo que por se servir á nação se fique de peior
condição. Offereço por isso a seguinte:
102 Sessão em 14 de Agosto de 1823

EMENDA ou graças nem para si nem para qualquer outra


pessoa.
No caso porém de terem sido nomeados O SR. ANDRADA MACHADO: – Eu não sei
antes da deputação, ou no tempo della nos casos se fui bem entendido; o que quero é que taes
exceptuados, e não haverem tomado posse, não empregos ou mercês, no caso de se darem, fiquem
serão por isso prejudicados na sua antiguidade. – nullas, não lhes sirvão para nada.
(Salva a redacção.) – Maia. O SR. COSTA AGUIAR: – Então na segunda
Foi apoiada. parte da emenda, em lugar de dizer – Outrosim não
O Sr. Carneiro da Cunha pediu novamente a poderáõ receber graças – fica deste modo –
palavra para offerecer um additamento ao art. 2º; e Outrosim serão nullas as graças que receber para
depois de ter exposto os seus fundamentos, o si, ou seus filhos ou pais.
mandou á mesa concebido nos termos seguintes: O SR. ANDRADA MACHADO: – Não ha
Ao art. 2º Accrescente-se – senão passado duvida; mas nesta segunda parte cabe a mesma
um anno depois da legislatura. – Paço da excepção da emenda do Sr. Araujo Vianna, porque
assembléa, 14 de Agosto de 1823. – Carneiro da ainda que eu não fallei em empregos, todavia quero
Cunha. que sejão comprehendidos; e como os filhos ou os
Não foi apoiado. pais podem tambem estar em alguma carreira, o
O SR. FRANÇA: – Sr. presidente, a que por ella lhe competir deve ser exceptuado. Por
accumulação de empregos em um mesmo sugeito isso eu requeiro sempre salva a redacção.
sempre foi entre nós materia de reprovação. O SR. ALENCAR: – Eu não o entendo assim;
A' excepção dos officios, que por e declarando primeiro que tudo, que não tenho pai
insignificantes manda a lei que sejão servidos por nem filhos, digo que não posso approvar que a
um e unico official, todos os mais se não podem qualidade de pai ou de filho de um deputado lhe
accumular, porque ha leis mui positivas que o seja tão prejudicial que annulle qualquer graça que
prohibem, e cominão penas contra a sua o chefe da nação se lembre de lhe fazer por seus
transgressão. serviços ou merecimentos; na verdade nada me
E como eu não faço distincção entre parece tão injusto. Que o deputado fique inhibido de
empregos de nomeação popular, qual é a nossa, e pedir, concedo; mas que meu pai ou meu filho não
de nomeação do poder executivo, qual é a de todos possa receber as recompensas a que lhe dão direito
os officiaes encarregados da administração publica, os seus merecimentos, só porque eu sou deputado,
porque a uns e outros lhes vem a autoridade da é cousa durissima. Eu não tinha reparado nesta
mesma fonte, que é a nação, ou mediata ou doutrina, por isso quero declarar o meu voto.
immediatamente; não sei que neste assumpto Passou então a prôpor o Sr. presidente:
possa haver questão: pois só teria esta lugar se não 1º Se passava a emenda do illustre autor do
houvera lei que prohibisse a accumulação dos projecto. – Venceu-se que sim.
officios: mas havendo-a, como ha, entendo que só 2º Se se approvava o additamento do Sr.
com derogação della é que um Sr. deputado póde Montesuma. – Venceu-se que sim.
ao mesmo tempo exercer o officio de legislador, e 3º Se passava a segunda parte da emenda
de agente do poder executivo. Toda a lei que ora do Sr. Andrada Machado. – Venceu-se que não.
haja de prohibir este duplicado exercicio é na minha 4º Se passava o additamento do Sr. Carneiro
opinião quando muito declaratoria das que já da Cunha. – Venceu-se que sim.
existem; não faz por si direito novo. 5º Se passava a emenda do Sr. Maia. –
O SR. MARIANNO CAVALCANTI: – (Não o Venceu-se que sim, salva a redacção.
ouvio o tachygrapho.) A primeira parte da emenda do Sr. Andrada
Julgando-se discutida a materia, propoz á Machado, julgou-se comprehendida no vencimento
votação o Sr. presidente o preambulo. – Passou da emenda do autor do projecto, e por isso não
com a suppressão da palavra – provisoriamente. entrou em votação.
Propoz depois o art. 1º. – Foi approvado sem Seguiu-se o art. 3º, e o Sr. presidente propoz:
alteração. 1º Se passava a primeira parte até a palavra
Seguiu-se o 2º, e propoz se passava salvas – policia. – Venceu-se que sim.
as emendas. – Venceu-se que sim. 2º Se a segunda parte seria supprimida,
O SR. COSTA AGUIAR: – A primeira como tinha proposto o Sr. Henriques de Rezende. –
emenda é do illustre autor do projecto; a ella Venceu-se que sim.
accrescentou o Sr. Montesuma a palavra – graças – 3º Se passava o additamento do Sr. Andrada
e o Sr. Carneiro da Cunha augmentou a declaração Machado. – Venceu-se que sim.
de se não poder pedir empregos Perguntou então o Sr. presidente:
1º Se a assembléa julgava concluida a 3ª
discussão. – Venceu-se que sim.
Sessão em 14 de Agosto de 1850 103

2º. Se deveria sanccionar-se o projecto? Franco para a abolição da junta chamada de


O SR. FERREIRA FRANÇA: – Parece-me que administração geral na provincia de Minas Geraes, que
como se acha não está capaz, e que é preciso redigir- fôra apresentado na sessão de 26 de Junho.
se primeiro, porque está composto de partes O SR. ROCHA FRANCO: – Sr. presidente, como
contradictorias e repugnantes, que só póde perder na persisto na persuasão de que toda a reforma que tem
redacção. por fim alliviar de leis gravosas os subditos deste
Os Srs. Henriques de Rezende e Araujo Lima imperio é urgente, ainda me parece tal a que proponho
forão da mesma opinião. na revogação do decreto de 18 de Março de 1801,
Afinal decidiu-se que fosse á commissão de emquanto mando tirar os por cento aos executados
legislação para o redigir, e voltasse depois á assembléa devedores fiscaes a favor dos officiaes de fazenda aliás
para o sanccionar. assalariados e muito bem assalariados; lei que eu não
O Sr. Secretario Costa Aguiar annunciou ter cessarei jámais de caracterisar de injusta, arbitraria,
recebido do ministro dos negocios do imperio o gravosa e oppressiva dos povos.
seguinte officio: E como a urgencia eu a deduzo destes principios
Illm. e Exm. Sr. – De ordem de Sua Magestade o por isso passo a verifical-os.
Imperador remetto a V. Ex. para ser presente na Pareceu duro na presente discussão á um illustre
augusta assembléa geral constituinte e legislativa deste deputado que eu taxasse de injusta esta lei, mas não
imperio o officio incluso do Revm. bispo capellão-mór, me combateu senão com a mora dos devedores. Ora,
em data de 9 do corrente mez, no qual, em prescindindo de que esta mora é muito bem expiada
cumprimento das ordens que lhe forão expedidas pela pelos rigores de uma execução fiscal, e pela infallivel
secretaria de estado dos negocios do imperio, sobre a condemnação das custas, eu perguntára ao illustre
informação do estado actuaI do seminario de S. José deputado se toda a mora tem o cunho da injustiça? Se
desta côrte, se refere á que anteriormente dera a este tambem são injustos e puniveis os que não pagão
respeito aos membros da commissão de instrucção porque não podem, para fazermos da sua desgraça um
publica da mesma assembléa. patrimonio aos Srs. da administração, e como se estes
Deus guarde a V. Ex. Palacio do Rio de Janeiro, não vencessem bom ordenado?
em 12 de Agosto de 1823. – José Joaquim Carneiro de Nem basta, Sr. presidente, para que se
Campos. - Sr. José Ricardo da Costa Aguiar de considere justa qualquer medida ou disposição penal,
Andrada. qual reputo o citado decreto na parte que respeita aos
por cento, que ella produza algum bem, como é
OFFICIO DO REVERENDO BISPO CAPELLÃO-MÓR doutrina de um publicista; é demais disso mister que
ella seja necessaria, quero dizer, que se não possa
Illm. e Exm. Sr. – Pela portaria da secretaria de obter por outro meio o fim que a lei se propõe.
estado dos negocios do imperio, de 31 de Julho Ora, sendo este o estimular ao pagamento o
proximo passado, me mandou Sua Magestade que devedor fiscal, quem não sabe que um tal fim se
quanto antes remettesse pela mesma secretaria uma consegue principalmente pelos meios Iegaes do
informação circumstanciada do estado do seminario de sequestro, penhora e outros de execução?
S. José desta côrte, e dos mais estabelecimentos E diremos que é justa uma lei que reputa de má
litterarios e de educação que me fossem subordinados, fé a todos os contractadores, e promiscuamente com
para ser presente na assembléa constituinte e estes os seus herdeiros, que são muitas vezes os
legislativa que assim o exigia. Não conheço executados?
estabelecimento algum desta natureza que me seja E diremos que é justa uma lei que não distingue
subordinado, senão o seminario de S. José, e toda a entre o dólo e a boa fé? Que manda tirar
informação que eu podia dar a respeito do estado em indistinctamente a uns e outros mais daquillo a que se
que actualmente se acha, já eu a tinha obrigarão por força de seus contractos?
espontaneamente apresentado aos membros da Disse de outra vez um illustre deputado que se
commissão de instrucção publica da mesma podião considerar estes homens obrigados por um
assembléa, juntamente com outros trabalhos tendentes quasi contracto, e emfim que a ignorancia de direito não
ao mesmo fim, antes de receber a sobredita portaria. E' favorece; mas, quanto a mim, a primeira asserção é
o que posso informar. Sua Magestade Imperial arbitraria, e a segunda me parece para aqui
determinará o que lhe parecer mais acertado. inapplicavel, e até repugnante áquella regra dos
Deus guarde a V. Ex. Residencia episcopaI do consultos, segundo a qual não são vistos consentir os
Rio de Janeiro, em 9 de Agosto de 1822. – Illm. e Exm. que ignorão – Non videntur qui ignorant, consentire. – E
Sr. José Joaquim Carneiro de Campos. – Bispo sempre ouvi dizer, Sr. presidente, que o consentimento
Capellão-Mór. é tão necessario em materias de contractos, como o
Passou-se ás segundas leituras de projectos, na corpo de delicto em materias
conformidade da ordem do dia; e o mesmo Sr.
secretario leu o projecto de lei do Sr. Rocha
104 Sessão em 14 de Agosto de 1823

crimes; até é principio de logica que ninguem quer o que contractarão, como é de obrigação, porque
que não conhece – Nihil volitum quin prœcognitum. – ninguem se compromette senão por livre vontade;
Depois disto, sabemos que são actualmente portanto os que entrarão nos contractos estão
executados muitos que contractarão antes que viesse o obrigados a cumpril-os, e se o não fazem soffrão a
decreto citado de 1801. pena da sua falta.
Ora, como havemos de considerar estes homens Julgo, portanto, o projecto inteiramente
ligados a uma lei posterior aos seus contractos? Que desnecessario.
consentimento lhes poderemos suppôr? Salvo se O SR. ROCHA FRANCO: – (Não o ouvirão os
quizermos dar áquella lei a força retroactiva; mas este tachygraphos.)
principio já foi aqui regeitado. Julgando-se a materia discutida, propoz o Sr.
Temos, pois, que não é sem fundamento que presidente se era urgente o projecto. – Venceu-se que
taxo de injusta semelhante lei; mas ella é tambem não, ficando por isso regeitado.
arbitraria, e para o reconhecer basta attentar na Seguiu-se a terceira parte da ordem do dia que
variação da legislação a tal assumpto. era a discussão dos artigos do regimento da
O alvará de 1753 estabelecia os por cento á assembléa, e leu-se o seguinte:
custa da fazenda publica, o de 1760 os mandou tirar á Art. 131. Se o numero de votos achados no
custa dos devedores morosos, que o fossem daquella escrutinio não combinar com o numero dos deputados,
data em diante; o de 1753 tirava dez, o de 1760 seis, o repetir-se-ha o escrutinio até que combine ou se
de 1801 manda tirar quatro, seis e oito por cento, conheça o motivo da differença.
segundo os annos decorridos depois do vencimento Foi approvado.
dos contractos. Art. 132. Havendo empate de votos, votar-se-ha
Esta variação basta a provar a imbecilidade da segunda vez; havendo segundo empate põe-se a
lei, e que não a dirige alguma razão solida, mas materia segunda vez em discussão, e torna-se a pôr a
sómente o vario arbitrio do legislador: fica pois claro votos; se houver terceiro empate fica a materia
que além de iniqua ella é tambem arbitraria. regeitada.
Quanto seja gravosa semelhante lei, se prova O SR. HENRIQUES DE REZENDE: – Diz o
desta só reflexão, que no espaço de vinte e um annos artigo que se houver terceiro empate fica a materia
havião rendido os por cento extorquidos aos regeitada. Ora, isto é dar a um numero preponderancia
executados, além do preço dos seus contractos, para sobre outro, senão ambos iguaes; o que é contra toda a
cima de cincoenta e nove contos de réis; e isto não em ordem da votação.
prol da fazenda nacional, mas de officiaes assalariados Neste caso a minha opinião seria que ficasse a
com muito bons ordenados. materia adiada, além disto acho muito geral a forma em
Finalmente, que esta lei é oppressiva dos povos que está concebido.
só duvidará quem noticia não tiver dos graves abusos Supponhamos que se offerecia uma emenda
que á sombra della se commettem; abusos tão para se alterar uma ou outra palavra, e que havia
insanaveis quanto aquelles que os devião de combater, empate na votação; por isso deveriamos regeitar a
são os proprios interessados na sua conservação e materia do artigo?
mantença: aqui os réos são juizes; como, pois, corrigir Eu acho isto muito incompetente e digo que
taes abusos? E para me cingir á phrase do evangelho: neste caso fique a materia adiada para entrar em
se o sal se tem corrompido, com que outra coisa se ha discussão. A esse fim offereço a seguinte:
de salvar? Conclúo, pois, Sr. presidente, que a materia
do projecto é urgente, porque a lei que elle combate é EMENDA
injusta, arbitraria, gravosa e oppressiva dos povos; e se
não é urgente a reforma, que tem por fim desopprimir a Proponho que se mude a palavra regeitada em a
estes, não sei qual outro o seja. palavra adiada. – Henriques de Rezende.
O SR. ALENCAR: – Eu acho que este projecto Foi apoiada.
não só não é urgente, mas nem necessario. O SR. COSTA BARROS: – Parece-me
Creio que o illustre preopinante confundiu os realmente muito conforme á razão, o voto do Sr.
direitos dos povos com os interesses de alguns Venancio.
individuos, e por consequencia confundiu duas coisas Havendo 2º empate, diz o artigo, que torna a
que nada têm de commum entre si. discutir-se a materia e a votar-se.
Iriamos favorecer os povos se, por exemplo, os Ora, que mostra este 2º empate? Que a
livrassemos de algum tributo; mas com isto unicamente assembléa está ainda da mesma opinião que a primeira
vamos favorecer quatro pessoas e de má fé, porque as vez.
de boa fé cumprem com o E para que ha nova votação? Para ver se por
este meio muda algum Sr. deputado de parecer; mas se
continúa a reinar a mesma opinião, sendo metade pró e
metade contra, não acho motivo nenhum para que a
assembléa rejeite a materia; fique antes adiada, porque
no decurso de 3, 5 ou 8 dias, podem alguns Srs.
deputados mudar de opinião e passar a materia.
Sessão em 14 de Agosto 1823 105

Alguns Srs. deputados lembrarão que havendo O SR. FERNANDES PINHEIRO: – Este artigo
segundo a emenda do Sr. Henriques de Rezende, 4ª parece-me que contém a mesma doutrina que o art.
votação, podia haver 4º empate e que era preciso 122 e por isso offereço a seguinte:
providenciar este caso.
O Sr. Henriques de Rezende offereceu o EMENDA
seguinte:
Comparando este artigo com o artigo 122, acho
ADDITAMENTO redundante um dos dous e portanto proponho a
suppressão de um delles, qual parecer mais
E quando pela 4ª vez fique empatada, a conveniente á assembléa. – Fernandes Pinheiro.
assembléa decidirá se a materia será regeitada. – Foi apoiada.
Henriques de Rezende. O SR. FRANÇA: – Parece-me que deve
Foi regeitado. conservar-se a doutrina neste lugar porque é onde cabe
O SR. VERGUEIRO: – O artigo diz: Havendo bem por se tratar de votações.
empate de votos votar-se-ha 2ª vez; ora, parece-me, O SR. FERREIRA FRANÇA: – Este artigo é o
que devemos tirar esta 2ª votação, como inteiramente mesmo que o art. 122, e portanto um deve supprimir-se;
inutil; porque acabando nós de fazer uma votação e mas no que eu tenho duvida é sobre o que se entende
votando-se outra vez é de esperar que seja empatada por pluralidade absoluta.
do mesmo modo, e não que se mude de opinião sem Aqui tenho ouvido dizer que a pluralidade
haver algum intermedio de tempo; por isso achava que absoluta é da assembléa que se acha presente quando
se devia tirar esta 2ª votação immediata. se vota: mas a isto não posso accommodar-me porque
Continúa o artigo: havendo 2º empate põe-se a não entendo por pluralidade absoluta a maioria de votos
materia 2ª vez em discussão e torna-se a pôr a votos. quando se acharem presentes, por exemplo, pouco
Eu entendo que será melhor ficar a materia mais da metade do numero total dos deputados.
adiada para o dia seguinte, porque havendo tempo para O SR. ANDRADA MACHADO: – O que acaba
pensar, podem alguns deputados mudar de opinião por de dizer o illustre preopinante parece ser de razão, mas
haver reflectido mais seriamente na materia; mas sendo não tem lugar; e não ha remedio senão seguir o que se
logo posta em discussão até póde acontecer que por pratica, porque é o que convém; se o não seguissemos
pundonor não se mude de opinião; por isso digo deve estariamos a cada momento a não poder decidir cousa
ficar adiada para o dia seguinte, e então admittir-se 2.ª alguma por falta de votantes.
votação; e se ainda ficar novamente empatada desta 2ª A nação quando elege um certo numero de
vez, parecia-me justo que a materia fosse rejeitada, pessoas para a representar entende que nenhuma
porque entendo que é melhor não obrar do que obrar faltará sem impossibilidade real e por isso tambem já
mal, e uma vez que não ha votos para que se vença um conta que por maioria da assembléa será considerada a
artigo de lei na 1ª e 2ª votação, é melhor que não da parte que estiver presente.
passe. Por estes principios fiz a seguinte: Além disto, supponhamos que se estabelecia,
que a maioria da assembléa fosse de 46 votos, na
EMENDA materia em que houvessem 45 não se vencia por um; o
que seguramente não póde ter lugar. Portanto, tomem-
Havendo empate ficará a materia adiada, e se as cousas como na realidade são; a maioria da
entrará novamente em discussão; havendo 2º empate assembléa entende-se dos que estão presentes que
fica a materia regeitada. – Vergueiro. são os que votão e não dos que estão ausentes.
Foi apoiada. O SR. FERREIRA FRANÇA: – Mas, pergunto
Julgando-se a materia discutida o Sr. presidente eu, póde dizer-se a legislação feita pelos que não
propoz: concorrerão para ella?
1º Se passava o artigo, salvas as emendas. – E póde decidir-se qualquer negocio de uma
Venceu-se que sim. provincia, sem estar presente quem a representa? Eu
2º Se passava a emenda do Sr. Vergueiro, em não entendo isto.
ambas as partes em que era dividida. – Approvarão-se O SR. ANDRADA MACHADO: – E' porque o
ambas as partes, ficando por isso prejudicada a do Sr. illustre deputado cuida que é só constituido pela
Henriques de Rezende. provincia da Bahia; mas engana-se, está constituido
Por ser chegada a hora da leitura das indicações pela nação inteira.
perguntou o Sr. presidente se havia alguma; e como Os deputados da Bahia, Pernambuco ou outra
não houvesse quem pedisse a palavra, declarou que qualquer provincia, não são só os deputados dessas
continuava a discussão dos artigos do regimento. provincias, são da nação.
Art. 133. A maioria absoluta decide em todas as
materias em que não houver marcada outra fórma.
106 Sessão em 14 de Agosto de 1823

Não ha um só escriptor que assim o não não achar em toda ella razão alguma que o incline
entenda; ora, sendo elles da nação, a maioria obriga mais para um partido do que para outro, é preciso
a toda elle e esta maioria é dos que estiverem que seja perfeitamente estupido.
presentes. Se alguns faltão sem motivo tenha E’ esta a razão por que acho que a doutrina
paciencia a nação que escolheu deputados vadios, deve passar.
madraços, ou incapazes de desempenhar suas Julgou-se sufficientemente discutido e posto á
funcções; e se a causa é a de molestia, é inevitavel a votação foi approvado.
falta, e o interesse publico exige que apezar della a Artigo 136. Em caso proprio é inhibido de
obra vá por diante. votar, dizendo o presidente: – O Sr. F… não póde
O SR. FRANÇA: – Senhores, é necessario votar.
fazer distincção entre a verdade puramente Depois de algumas reflexões foi approvado.
theoretica e aquella que só o é na pratica. Artigo 137. Se o projecto fôr composto de
Nas sciencias moraes e principalmente na muitos artigos, votar-se-ha separadamente sobre
sciencia do governo é mister muitas vezes substituir cada artigo.
á uma realidade uma ficção, para a coherencia dos O SR. FRANÇA: – Na conformidade deste
principios que se têm admittido por base de um artigo é que eu requeri uma vez, estando em 3ª
systema. discussão um projecto, que se propuzesse cada
De nenhuma outra maneira se poderia sahir artigo de per si, e não o projecto em globo. Entendo
nunca das difficuldades praticas que se apresentão á que a doutrina deve passar como uma das mais
marcha do espirito humano, quando este procede na essenciaes, porque cada artigo deve vencer-se com
contextura das partes, com que deve preencher os a sua approvação especial.
traços de um todo systematicamente organisado. O SR. MONTESUMA: – E eu acho que não é
E' por isso que se deve admittir como uma necessario tal artigo e que só serve para nos
verdade que o vencido pela maioria dos Srs. confundir, porque já temos a sua doutrina no capitulo
deputados presentes, está igualmente vencido pela antecedente. Alli está estabelecida a fórma de fazer
maioria dos ausentes, que parece comprometter a as discussões e a maneira de propôr á votação,
causa publica no juizo daquelles. portanto não sei a que vem agora aqui este artigo?
Julgou-se discutida a materia e venceu-se que O SR. ANDRADA MACHADO: – Este artigo é
se supprimisse o art. 122 e subsistisse este: muito preciso: e não sei como se confundem duas
Art. 134. Não poderá votar-se por acclamação. cousas tão differentes como são votação e
Foi approvado. discussão. Na 1ª discussão não póde haver senão a
Art. 135. Nenhum deputado presente poderá decisão da urgencia ou competencia da materia; na
escusar-se de votar, salvo não tendo assistido ao 2ª discussão a decisão é para passar ou não, para a
debate. 3ª discussão; e só nesta, depois de concluida, é que
O SR. FERREIRA FRANÇA: – Se houver ha votação propriamente tal; ora, esta é que o
quem entenda que a materia não está bem discutida regimento manda aqui que seja por artigos.
e a chamada maioria entender que está, não sei ao Não sei, torno a dizer, como se confundem
votar que caminho ha de seguir o que julgar que duas cousas tão differentes; no capitulo antecedente
ainda devia discutir-se, visto que não póde tratou-se do modo de deliberar e neste trata-se do
dispensar-se de votar. modo de votar.
O SR. ANDRADA MACHADO: – Como o O SR. MONTESUMA: – O illustre preopinante
nobre deputado que não julga a materia bem não percebeu o que eu disse; eu não fiz tal confusão.
discutida, tem ouvido as razões que se expenderão, Todo o mundo sabe, e até uma criança de 7
resolve-se por aquellas em que lhe parece que ha annos sabe, que discussão e votação são cousas
mais probabilidade de acertar, ainda que não tenha inteiramente differentes; o que eu disse foi que era
certeza. desnecessario este artigo, porque para nos
O SR. FERREIRA FRANÇA: – Mas não tendo regularmos já tinhamos doutrina estabelecida no
certeza nem probabilidade, fico na duvida do capitulo antecedente e que a conservação deste
caminho que devo seguir. artigo produziria confusão para o modo de decidir as
O SR. ANDRADA MACHADO: – Depois da materias.
discussão o caso de duvida é rarissimo porque O SR. ANDRADA MACHADO: – Não é inutil
sempre ha motivo que faz inclinar para um ou outro nem confuso; confuso é o illustre preopinante porque
lado; para não succeder assim seria necessario olha para as cousas muito de leve; é necessario vêl-
suppôr uma perfeita estupidez da parte dos as mais de vagar.
deputados; em verdade para um deputado, depois Não se trata de votação propriamente tal
de ter ouvido uma discussão, senão na ultima discussão; nas mais não se faz
senão passar de uma para outra; a votação decisiva
Sessão em 14 de Agosto de 1823 107

só ha na 3ª discussão. Portanto, longe de ser inutil o não é digna da nossa approvação não passa á 2ª
artigo é indispensavel. discussão; e creio que o nobre deputado só quer
O SR. MONTESUMA: – O que eu vejo é que fallar da 3ª, que é a decisão finaI.
o illustre preopinante sendo um dos redactores do O SR. ARAUJO LIMA: – Parece-me que está
projecto de regimento não sabe o que fez. Disse bem visto que os illustres autores do projecto
agora que eu olho as cousas de leve; bem leve me fallárão neste lugar da 3ª discussão, e por isso não
tem parecido o nobre deputado neste debate. apoio as emendas; lembra-me como util o ligar este
O SR. ANDRADA MACHADO: – Eu requeiro artigo ao 96 do capitulo antecedente, para termos
a ordem. Se o illustre deputado fallar com pouca então uma norma fixa e clara propôr na 3ª
delicadeza, eu saberei responder-lhe do mesmo discussão as materias á votação. E' isto o que
modo. escrevi nesta emenda que mando á mesa:
O SR. VERGUEIRO: – Ainda que na ultima Proponho que o § 137 se una na redacção ao
discussão haja a votação decisiva, julgo que nas § 96. – Araujo Lima.
outras tambem ha votação, aliás não sei que nome Foi apoiada.
lhe hei de dar. O SR. FRANÇA: – Eu sou de opinião
Eu sei o que está determinado no capitulo absolutamente contraria; e entendo que as
das deliberações; mas como temos casos em que doutrinas conteúdas nos dous artigos 96 e 137
ha votação sobre o todo da materia e casos em que respeitão a diversa votação, que é necessario haver
a ha por artigos, deve distinguir-se para clareza; e quando um projecto de lei contém mais de um
por isso offereço a seguinte: artigo. Eu me explico. A votação que se recebe a
cada artigo de um projecto separadamente não é
EMENDA sufficientemente para dar a conhecer a vontade
legislativa da assembléa: porque póde a maioria
Quando a discussão fôr em globo a votação o desta rejeitar um projecto, e todavia approvar na
será tambem; quando fôr por artigos a votação será votação muitos dos seus artigos, quando é
por artigos. – Vergueiro. interrogada sobre a sua doutrina destacadamente.
Foi apoiada. Pelo menos tenho a experiencia em mim
O SR. RIBEIRO DO ANDRADA: – Eu creio mesmo ao dito respeito. Projectos têm apparecido
que se tem entendido este artigo muito nesta assembléa, que eu absolutamente os reprovo,
confusamente. A lei diz que em cada projecto são ou porque os julgo impoliticos no todo; ou porque os
tres as discussões. O que se trata na 1ª? Trata-se não considero opportunos por alguma circumstancia
unicamente das vantagens ou inconvenientes da presente. Todas as vezes pois que se me perguntar
materia, e propõe-se se deve passar á 2ª discussão. se approvo o projecto, direi que não; quando porém
Na 2ª o que é que se põe a votos? É se está me perguntarem se approvo a doutrina deste ou
concluida, e se a materia passa á 3ª. Logo, nesta 3ª daquelIe artigo direi que sim: porque o meu voto em
é que se vota definitivamente sobre cada artigo, e tal caso leva implicita esta condição. – No caso de
por isso é que neste lugar diz o regimento que se o passar o projecto contra que eu opino. – Bem se vê
projecto fôr composto de differentes artigos se ha de portanto que nesta differença de votação procedem
votar separadamente sobre cada um delles. coherentemente as doutrinas dos dous artigos de
Portanto nesta ultima é que ha votação sobre a que se trata. O art. 137 trata de votação especial a
materia; nas outras vota-se sobre as discussões. cada artigo quando o projecto tem mais de um, e
Não sei que tenha outra intelligencia o artigo. todavia não destróe a votação sobre o projecto
O SR. CARNEIRO: – A discussão que tem integralmente que é a de que trata o art. 96: o que
havido sobre este artigo basta para mostrar que elle bem se deprehende até da phrase do mesmo art. 96
dá lugar a duvidas; mas creio que todas acabão quando diz: – A assembléa sancciona a proposta.
redigindo-se o artigo com o additamento que eu O Sr. Presidente, por ter dado a hora,
tenho concebido. Acho que é melhor adoptar declarou adiada a discussão do artigo.
alguma alteração do que estarmos a dizer que elle é O Sr. Secretario Costa Aguiar pedio a palavra
claro, quando na realidade o não é. Eis aqui o meu: para ler o seguinte officio do ministro de estado dos
negocios da fazenda:
ADDITAMENTO Illm. e Exm. Sr. – Em cumprimento das
ordens de S. M. o Imperador remetto a V. Ex. um
Se o projecto fôr composto de muitos artigos officio do governo provisorio da provincia de
pelo que toca ao merecimento da materia votar-se- Pernambuco datado de 9 de Abril ultimo,
ha separadamente sobre cada artigo. – Francisco informando sobre augmento de ordenado dos
Carneiro. officiaes da sua secretaria; outro da junta da
Foi apoiado. fazenda do Rio-Grande do Norte ácerca de
O SR. VERGUEIRO: – Não me parece exacta supprimentos, e venda de páo-brazil para
esta redacção, porque na 1ª discussão tambem se
vota sobre o merecimento da materia, pois se
108 Sessão em 16 de Agosto de 1823

occorrer ás despezas da provincia; e uma mil réis em remuneração dos seus serviços: manda
representação da villa da Atalaia requerendo a participar ao governo que precisa que lhe sejão
suppressão de varios impostos, afim de ser tudo remettidos os requerimentos e documentos que tiver
presente á assembléa geral, constituinte e legislativa o supplicante na repartição dos negocios do imperio
do imperio, a quem compete a sua decisão. sobre aquelle objecto para poder com as
Deus guarde a V. Ex. Paço, em 12 de Agosto convenientes noções resolver o que fôr justo. O que
de 1823. – Manoel Jacintho Nogueira da Gama. – Sr. V. Ex. levará ao conhecimento de S. M. Imperial. –
José Ricardo da Costa Aguiar de Andrada. Deus guarde a V. Ex. Paço da assembléa, em 14 de
Foi remettido á commissão de fazenda. Agosto de 1823. – José Ricardo da Costa Aguiar
O Sr. Presidente assignou para a ordem do d’Andrada.
dia: 1º A 3ª discussão do projecto sobre a
arrecadação de fazenda de ausentes: 2º Regimento PARA O MESMO
da assembléa.
Levantou-se a sessão ás 2 horas da tarde. – Illm. e Exm. Sr. – A assembléa geral
Manoel José de Souza França, secretario. constituinte e legislativa do imperio do Brazil,
approvando o parecer da commissão de legislação
RESOLUÇÕES DA ASSEMBLÉA sobre a memoria da camara da villa de Aquiráz da
provincia do Ceará, em que pediu diversas
PARA JOSÉ JOAQUIM CARNEIRO DE CAMPOS providencias a bem dos povos do seu districto:
manda participar ao governo que quanto á feira
Illm. e Exm. Sr. – A assembléa geral franca que entre as ditas providencias foi requerida,
constituinte e legislativa do imperio do Brazil, sendo- resolveu, pelas conhecidas vantagens que de taes
lhe presente o parecer da commissão de legislação estabelecimentos resultão ao commercio, agricultura
sobre o requerimento de João Gonçalves Duarte e civilisação dos povos, conceder-lhe a franqueza da
Pereira, e outros commerciantes desta praça, feira, devendo o governo, como lhe compete,
credores do fallecido José Teixeira Mello: manda designar-lhe o lugar, tempo e duração depois de
participar ao governo que precisa que lhe seja tomar as necessarias informações. O que V. Ex.
remettida a consulta do tribunal da junta do levará ao conhecimento de S. M. Imperial. – Deus
commercio, por cuja resolução forão indeferidos os guarde a V. Ex. Paço da assembléa, em 14 de
supplicantes, negando-se-lhes a prorogação de Agosto de 1823. – José Ricardo da Costa Aguiar
praso que pedirão na administração dos bens d’Andrada.
daquelle fallecido a beneficio do seu embolço. O que
V. Ex. levará ao conhecimento de S. M. Imperial. – SESSÃO EM 16 DE AGOSTO DE 1823.
Deus guarde a V. Ex. Paço da assembléa, em 14 de
Agosto de 1823. – José Ricardo da Costa Aguiar PRESIDENCIA DO SR. BISPO CAPELLÃO-MÓR.
d'Andrada.
Reunidos os Srs. deputados pelas 10 horas da
PARA O MESMO manhã, fez-se a chamada, e acharão-se presentes
51, faltando com causa participada os Srs. Pereira
Illm. e Exm. Sr. – A assembléa geral da Cunha, Rocha Franco, Rodrigues Velloso, Xavier
constituinte e legislativa do imperio do Brazil manda de Carvalho, Navarro de Abreu, Ribeiro Campos,
participar ao governo que para o acerto de suas Gama, Duarte Silva, Lopes Gama, Fortuna, Andrada
deliberações precisa que lhe sejão remettidas as e Silva, Rodrigues de Carvalho, Carneiro de
consultas, ou outros quaesquer papeis relativos á Campos, Maia, Silveira Mendonça, Couto Saraiva,
extincção das mesas da inspecção do assucar, Carneiro da Cunha, Furtado de Mendonça, Teixeira
tabaco e algodão, que tenhão sido presentes ao de Gouvêa, Rodrigues da Costa, Oliveira Maciel,
mesmo governo. O que V. Ex. levará ao Costa Barros, Carneiro, Miguel Calmon, Pedreira do
conhecimento de S. M. Imperial. – Deus guarde a V. Couto e Dias.
Ex. Paço da assembléa, em 14 de Agosto de 1823. – O Sr. Presidente declarou aberta a sessão, e
José Ricardo da Costa Aguiar d'Andrada. lida a acta da antecedente foi approvada.
O Sr. Andrade Lima mandou á mesa a
PARA O MESMO seguinte declaração de voto:
Declaro que na sessão do dia 14 votei contra o
Illm. e Exm. Sr. – A assembléa geral additamento offerecido pelo Sr. Andrada Machado,
constituinte e legislativa do imperio do Brazil sendo- ao 3º artigo, no qual additamento permitte a qualquer
lhe presente o parecer da commissão de fazenda Sr. deputado o exercicio dos empregos que ora
sobre o requerimento de Antonio Joaquim dos Reis exercem, não sendo estes incompativeis com o
Portugal, chefe de esquadra da armada nacional, exercicio da actual deputação.
que requereu uma pensão de seiscentos Paço da assembléa,16 de Agosto de 1823.
Sessão em 16 de Agosto de 1823 109

– Luiz Ignacio de Andrade Lima. – Carneiro da e por fim fazem penhora, e arrematão os bens.
Cunha. – Francisco Gê Acayaba Montesuma. – Conclúo disto, que os bens dos ausentes
Antonio Ferreira França. – José da Costa Carvalho. – devem ser excluidos deste projecto. Mas diz este §
Candido José de Araujo Vianna. – Pedro de Araujo 2º – cujos bens estejão em arrecadação ou
Lima. – Antonio José Duarte de Araujo Gondin. sequestro. Os sequestradores, Sr. presidente, taes
O Sr. Secretario Costa Aguiar leu uma como agora os subditos de Portugal, em cujos bens
participação de molestia do Sr. Carneiro da Cunha. – se fez sequestro por occasião da guerra, estão em
Ficou a assembléa inteirada. differentes circumstancias.
O SR. ANDRADA MACHADO: – Sr. Eu não sei porque estando elles ausentes os
presidente os illustres membros da commissão de credores se não queixavão, nem requerião, e só
constituição, a que pertenço, tendo acabado a porque forão sequestrados suppoem-se com o direito
grande obra do projecto da constituição, tiverão a de lhes tirarem os bens sem serem citados! Pelo
bondade de eleger-me para redactor; peço por isso contrario o sequestro melhorou a condição do credor,
15 dias de licença para o redigir e apresentar a esta porque antes disso podia ser illudido pelo devedor, a
augusta assembléa. quem não era prohibido alienar os bens por seu
Forão-lhe concedidos. procurador, e pelo contrario feito o sequestro têm os
Passou-se á ordem do dia, e entrou em 3ª credores a sua divida segura a demandarem quando
discussão o projecto de lei sobre o juizo de defuntos puderem.
e ausentes, com as emendas dos Srs. Teixeira de No art. 3º acha algum inconveniente, delle se
Gouvêa, Maia e Rocha Franco, offerecidas na deve excluir a parte que falla dos sequestrados pelas
sessão de 12 do corrente; e leu-se o art. 1º. razões que acabo de dizer ao 2º artigo: e acho não
O SR. AROUCHE RENDON: – Ainda não ser conveniente taxar aqui a alçada dos juizes em
entrou em duvida, Sr. presidente, que existe um mal, cem mil réis. Eu não direi agora qual é a alçada
e que é preciso remedial-o: em realidade ha muita desses magistrados, mas como se não trata de uma
differença entre o Brazil e Portugal, no Brazil ha um lei regulamentar que taxe as alçadas dos julgadores,
enxame de portuguezes, e em Portugal poucos acho escusado determinal-a aqui a respeito destes
brazileiros: no Brazil vende-se a credito com juizes, os quaes podem continuar com a alçada que
demasiada facilidade, em Portugal com mais cautela, têm, porque seja grande, ou pequena pouco ou nada
segue-se daqui que em Portugal poucas pessoas influe no direito do credor.
serão prejudicadas quando morrem os devedores Tambem do artigo 4º pelas razões ditas se
com herdeiros no Brazil, e aqui é pelo contrario, deve excluir a parte que trata de sequestros: e a
como já se tem feito ver. Existe o mal, é preciso primeira parte em que estabelece simples
remedio, mas este projecto de lei será sufficiente justificação para demandar até cem mil réis me
para o fim proposto? parece muito impolitica, porque se nós temos por lei
Eu, Sr. presidente, acho-lhe muitos a ordem do processo, que determina acção ordinaria
inconvenientes; examinemol-o com vagar. No 1º para todos os casos não exceptuados, para que é
artigo vejo que se revoga a provisão da mesa da fazer uma legislação nova só para este caso? Não
consciencia de 28 de Dezembro de 1754, e aqui ha acho proporção nenhuma, Sr. presidente, entre uma
um inconveniente; porque ainda que passe este lei que me autorisa a tirar cem mil réis do meu
projecto, eu quizera que a revogação fosse da lei devedor só por uma justificação em que elle não é
primordial que creou o juizo dos ausentes, ouvido, e outra lei que me obriga a citar um meu
ordenando que os credores só fossem pagos em devedor de 3$200, e a demandal-o por via ordinaria.
Lisboa, pois que aquella provisão não é senão uma Tal legislação iria fazer um transtorno, e desordem
excepção da regra, a revogação não deve ser da em tudo.
excepção, mas sim da regra. Pelo que acabo de dizer vê-se que não serei
Quando ao artigo 2º digo que é muito justo dar de voto que passe este projecto. Mas se existe a
remedio aos credores dos fallecidos, visto que necessidade qual deve ser o remedio? Sr.
ordinariamente o credor nem sabe quem são os presidente, emquanto houver lei escusado é fazer
herdeiros, como se chamão, nem onde estão, mas outra. Nós temos o alvará de 17 de Junho de 1766,
quanto aos ausentes, não é assim; porque ausente em que nos casos de fallecidos sem testamento
chamo eu a um homem, que por qualquer motivo ordena a favor do commercio, que não tenha lugar o
que seja desappareceu, e se não sabe onde está, e juizo dos ausentes, sem que se nomêe um dos
nem se é vivo. Os bens deste homem, para se não credores para administrador o qual pague as dividas,
perderem, devem ser arrecadados pela autoridade e o resto vá para o juizo dos ausentes.
publica, mas os credores têm o remedio na Temos mais o alvará de 10 de Novembro de
legislação existente provão a incertesa do lugar onde 1810, que ampliou o antecedente tambem para os
existem, citão-n’o por carta de editos, seguem o seu fallecidos com testamento cujos herdeiros estão
processo, ausentes.
110 Sessão em 16 de Agosto de 1823

Ora, se no mesmo juizo dos ausentes era licito em Portugal. Foi portanto necessario aquelle
pagar 200$ sem citação d regulamento peculiar e proprio para se conseguirem
a parte, cuja quantia não se póde chamar os fins referidos.
pequena, porque ser pequena, ou grande é relativa Acautelarão-se nelle com muita
ao estado da herança: se pelos citados alvarás é circumspecção e siso todos os damnos, que então
licito pagar a todos os credores negociantes sem se antolharão ao legislador, e muitas outras
citação da parte, quer as quantias sejão grandes providencias se forão continuamente dando, que as
quer pequenas, se contra estas leis nunca ouvi circumstancias dos tempos mostrarão ser
queixas, e se têm reputado justas, porque talvez necessarias, na bem fundada esperança e provavel
tenhão salvado a alguns negociantes de fallirem, que persuasão de que semelhantes heranças se não
razão haverá para que se não amplie ao lavrador, ao perderião, nem se desfalcassem, e voltasse o seu
artista, e a qualquer outro? Com taes providencias producto apurado quanto antes para Portugal.
salva-se a parte de engenhos, e lavouras em grande Verdade é, que nem todos estes meios
e do aniquillamento de muitas familias. determinados encherão aquelle fim, e que muitos
Pela minha opinião tanto se deve favorecer o damnos surgirão e recrescerão das mesmas
commercio como a agricultura em um paiz, cuja providencias, porque se forão estas complicando, e
riqueza consiste na agricultura; e se deve haver difficultando a execução, e quasi sempre resurgem
differença, só deve ser a favor desta, porque é as fraudes do seio das mesmas leis por meio da
preciso que primeiro haja lavoura para haver maldade humana, que inventa sempre para illudir as
commercio: primeiro lembra plantar para o nosso leis. Mas nem por isso devemos criminar seus
consumo, e quando ha sobejos lembra então o autores, nem pretender desde logo derrocar e
commercio: este animo a agricultura, mas não lhe dá derribar um edificio fundado sobre os alicerces da
principio: a agricultura é quem crea o commercio. justiça e utilidade commum, e que adquirio forças
Ultimamente, Sr. presidente, a lei deve com o andar dos tempos.
comprehender o bem geral, e é por isso que eu Estes variarão, e na situação presente das
votaria por esta providencia da ampliação dos dous cousas não se póde absolutamente dizer de summa
alvarás a favor de toda a qualidade de credores, Eu necessidade o referido estabelecimento, porque nem
deveria offerecer isto como emenda, mas não vejo são tantos a passar as riquezas, que forão
aonde elIa caiba, pois que mais parece um novo diminuindo á proporção de que se não amontoão
projecto. com tanta rapidez pela diminuição do producto das
E por isso limito-me em dizer que será minas, e porque continuando, a fixar-se neste paiz os
conveniente propôr a materia, porque se ella passar habitantes de Portugal, forão casando e deixando
póde o projecto voltar a ser novamente redigido. por conseguinte herdeiros, e porque estabelecido
O Sr. Vergueiro mandou para a mesa nesta côrte o tribunal da mesa da consciencia e
emendas aos artigos 1º, 2º e 4º. (São as offerecidas ordens, não se remetterão mais para Portugal os
na sessão de 12 do corrente e na mesma cabedaes das heranças em virtude do seu
transcriptas.) regimento, e aqui vêm fazer as competentes
O SR. CARVALHO E MELLO: – Sr. habilitações os herdeiros, sem os incommodos das
presidente, quando a primeira vez fallei da materia demoras e distancias de Portugal.
deste projecto de lei, disse com muita extensão, qual Esta nova ordem de cousas, que simplifica a
foi a origem e motivo da instituição deste pratica do regimento dos ausentes e provisões
estabelecimento de arrecadação, e disse largamente posteriores, e remove as difficuldades de que estava
quanto me occorreu sobre o seu progresso e sobre o erriçado este juizo, faz ver a todas as luzes, que não
estado em que actualmente se acha. Não convém é urgente a necessidade de reformal-o, e menos em
portanto agora repetir o que já foi dito, importa porém parte.
dizer que um dos principaes motivos de tal E' evidente, e eu já disse, que elle deveria ser
instituição, foi acautelar por todos os meios possiveis de todo derribado, e substituido pela regra geral que
o extravio das heranças, que tocavão a subditos deve servir para a arrecadação das heranças
residentes em Portugal. jacentes, como é determinado na lei do reino, como
Todos sabem, que os naturaes daquelle reino, o augmento e extensão que fôr necessario e se acha
erão os que vinhão a este vasto paiz amontoar estabelecido nos codigos modernos das nações
riquezas com o designio de as carregar depois para illuminadas.
o seu patrio ninho. Sorprendia-os a morte; e como Para ter lugar esta providencia, além do muito
erão muito e muito grandes os cabedaes que a que se tem dito, sobrava não existirem as
riqueza das minas e grandes proveitos da agricultura circumstancias, que fizerão necessario o
lhes produzião, não erão bastantes os meios estabelecimento daquelle peculiar e privativo
ordinarios que as leis tinhão estabelecido para uma regimento.
exacta arrecadação, guarda e remessa para os Mas por isto devemos já declarar urgente e
herdeiros estabelecidos necessaria uma reforma parcial, só porque se diz
que é favoravel aos credores das heranças?
Sessão em 16 de Agosto de 1823 111

Fal-o-hemos com razão e utilidade commum, não assiste á primeira discussão em que se devia
calcando aos pés os principios imprescriptiveis da debater a urgencia deste projecto; não sei portanto o
justiça universal? que a este respeito se disse.
Offenderemos as garantias dos direitos Do que tenho ouvido vejo que se não tem
individuaes do cidadão, que versão sobre a sua tomado a materia pelo lado que me parece o mais
propriedade? importante; e como nesta 3ª discussão é permitido
Revogaremos a lei geral, que determina que retocar esta materia, eu direi o que entendo.
ninguem seja condemnado a largar o que é seu sem Tem-se feito bellos, enfaticos e patheticos
ser ouvido, convencido, e condemnado por sentença discursos sobre o sagrado direito da propriedade,
legal? sobre os abusos e prevaricações do juizo dos bens
Sr. presidente, o direito dos credores e o dos dos defuntos e ausentes, mas nada disso convence
devedores são reciprocos; ambos são iguaes aos da indispensabilidade e urgencia da providencia que
olhos da lei, e merecem a mesma consideração. se propõe, que é a barreira com que esta augusta
Quanto por varias vezes tenho dito nesta assembléa muito sabiamente quiz circumscrever
materia, tende a firmar o direito de propriedade, e a nossos trabalhos, e que me parece de summa
não fazer uma nova lei contra elle, só por se dizer importancia respeitar. Que vai fazer a providencia
que o credor é prejudicado pela espera. proposta?
Não poderá acontecer que os herdeiros, Conceder aos credores das heranças
chamados, a juizo, mostrem não fundada a arrecadadas a cobrança de uma somma maior do
pretenção do credor, ou já paga e extincta a divida? que a permittida até agora, e dar-lhes mais
Succederá: a malicia humana é fertil destes facilidades para a cobrança.
projectos, e quem tem uso de julgar, o tem visto Esta simples exposição mostra que,
muitas vezes. Tenho ouvido dizer, que as fianças comquanto se faça um bem e se evite um mal, não
poderião acautelar este mal, ficando obrigados os ha aqui o caracter de indispensabilidade e urgencia
fiadores á reposição, quando os herdeiros mostrem o que a assembléa requer nas nossas reformas.
seu bom direito: mas para que multiplicar Não ha indispensabilidade, porque até agora
demandas? passámos sem essa providencia; não ha urgencia,
Para que multiplicar meios de ficar duvidoso o porque não vemos um mal irreparavel e de funestas
dominio e dar lugar a mil trapaças? consequencias que seja absolutamente preciso
Fechemos a porta a estes e outros acautelar já.
embaraços, deixando de legislar até que por Fallou-se muito sobre a difficuldade e mesmo
legislação uniforme, e que mais quadre ao caso, se impossibilidade que occorre de se demandarem
estabeleça jurisprudencia regular e exacta. herdeiros em Portugal, e não ha duvida que é uma
Era além disto o que se pretende estabelecer, objecção; creio porém que isso acabará
contrario ao que se pratica em um caso bem promptamente, visto o estado presente daquelle
analogo. Supponhamos que morre um homem com reino.
testamento, mas tem herdeiros em Portugal, que não Então ou os portuguezes persistem no
são dos chamados herdeiros necessarios; neste desarrasoado e impolitico systema de quererem ser
caso não tem lugar a administração dos ausentes, e nossos inimigos ou não: no 1º caso, tratal-os-hemos
o testamenteiro arrecada, e administra os bens da como taes e então as providencias sobre este
herança. Qualquer credor póde exigir a sua divida; negocio de heranças pertencentes aos subditos
mas deve citar os herdeiros ausentes, e não póde daquelle reino serão promptas e decisivas; no 2º
citar só o testamenteiro; logo, porque motivo, quando caso será indispensavel fazer com elles convenções
a herança estiver em poder dos ausentes, ha de o especiaes, porque havendo brazileiros estabelecidos
credor citar só o thesoureiro? em Portugal e portuguezes estabelecidos no Brazil, e
Era isto uma excepção contraria á lei e aos muitos e ricos, necessariamente haverá por muitos
principios elementares de que por vezes me tenho annos transmissões de heranças de um para outro
lembrado. continente.
Demais disto, sempre se derão precatorias Em uma palavra, Sr. presidente, se a
para citar os herdeiros ausentes, ou na sua pessoa providencia proposta passa como indispensavel e
quando se sabe a sua existencia certa, ou por editos urgente, então infinitas outras devem tambem passar
quando esta não consta. porque estão na mesma categoria, e lá se vai a
Guarde-se portanto a lei e a pratica; sobre- ordem marcada pela assembléa para nossos
esteja-se em reformas parciaes e acelleradas; e trabalhos, e vamos cahir n’um labyrintho.
estabeleça-se em tempo competente jurisprudencia Se todavia a assembléa entender que os
solida, depois de maduro e circumspecto exame, males deste ramo de administração são taes, que as
qual convém á dignidade e magestade da lei, e ao reformas devão ser immediatamente feitas, nesse
serio caracter proprio dos que se assentão neste caso eu quereria mais do que propõe a commissão,
augusto recinto. quereria que reunidos os materiaes necessarios para
O SR. MACIEL DA COSTA: – Sr. presidente, entrar com perfeito
112 Sessão em 16 de Agosto de 1823

conhecimento no fundo da materia, se fizesse um Muito desejára. Sr. presidente, que esta
trabalho completo, e, ou fosse inteiramente abolido o assembléa se penetrasse bem do perigo que
systema actual dessa arrecadação, ou fosse correremos em desmantelar o edificio que temos de
melhorado com methodo e coherencia em todas reformar antes de bem examinarmos suas partes e o
suas partes; temendo muito que providencias seu todo, para não augmentarmos estorvos e
legislativas destacadas vão augmentar a desordem e difficuldades, que paralysem nossas providencias
fazer novos embaraços que só na pratica com descredito nosso e desgosto dos povos.
apparecem. Estamos no principio da nossa carreira, e
Nós temos, Sr. presidente, outros muitos segurarmo-nos bem nos primeiros passos é de
trabalhos e grandes de que nos devemos occupar, e summa necessidade.
todos de natureza que não fazem esses estorvos e Tenho toda a minha vida lido politicas, tenho
embaraços que temo, e são indispensaveis para visto nações estrangeiras, e confesso que quando
prepararem e a limparem, para assim dizer, os encaro com o edificio que devemos reformar, tremo,
caminhos para as grandes reformas de que somos Sr. presidente, e receio que as cousas que
encarregados, e que necessariamente hão de passar substituirmos não ajustem e quadrem bem.
ás seguintes legislaturas; porque não nos devemos A nossa ordem v. g. judiciaria tem defeitos; eu
lisongear de fazermos nós sós um todo completo de convenho, mas não sei se poderemos substituir
leis administrativas. cousa melhor, e assim em quasi tudo.
Do numero desses trabalhos são v. g. procurar Conclúo que é preciso não nos afastarmos da
um esboço geral do estado do imperio em todos os marcha prescripta pela mesma assembléa para a
seus ramos: mandar folhear esses archivos ordem dos nossos trabalhos, insistindo em não fazer
provinciaes donde nos venhão documentos e outras reformas, salvo as que tiverem o cunho da
materiaes que nos instruão do que temos em indispensabilidade e urgencia, e bem assim de evitar
providencias administrativas; evitar que passem para providencias legislativas destacadas e parciaes
o erario fundos de particulares, como esses de sobre materias que se achão insystemadas, para
ausentes de que tratamos, etc., etc., porque vejo por não irmos complicar o mal e crear novos embaraços,
experiencia que esta augusta assembléa tem grande que só na pratica bem se podem conhecer.
massa de conhecimentos theoricos de legislação, O Sr. Vergueiro sustentou com diversas e
mas não sei se terá o conhecimento necessario das fortes razões a necessidade do projecto contra o que
localidades de cada uma das provincias do imperio e dissera o Sr. Maciel do Costa, mostrando os graves
de tudo quanto fórma a legislação municipal e damnos resultados de tão injusta legislação, cuja
administrativa de cada uma dellas, que deve achar- reforma não podia por isso deixar de ser considerada
se em seus archivos particulares, e de que era quasi pela assembléa como urgente e indispensavel;
impossivel a um particular nem formar idéa no refutou depois em particular tanto o argumento de
systema do governo antigo. De mim confesso que que se servira o mesmo illustre deputado quando
pouco ou nada sei disso. (A’ ordem.) suppuzera que não haveria no congresso necessario
Sr. presidente, esta pequena digressão não se conhecimento das localidades de cada uma das
póde absolutamente dizer fóra da ordem: eu fallo da provincias, para tratar da materia em questão; como
necessidade de nos não afastarmos da regra o que fundára no receio de acontecer-nos o mesmo
marcada pela assembléa para nossos trabalhos, que que succedera nos corpos legislativos de outras
me parece da ultima urgencia, para nos não nações se o congresso se afastasse da regra
acontecer o que vimos em outros corpos legislativos marcada sobre a urgencia das materias; e rebateu
de França, Hespanha e Portugal. este ultimo com a demonstração de que a assembléa
Os planos e projectos mais bellos no gabinete não podia ser mais circumspecta do que era com as
e que parecião não encontrar difficuldades na propostas que se lhe offerecião para serem tomadas
pratica, apenas postos em execução encontrárão mil em consideração.
tropeços, complicárão as cousas, aggravárão os O SR. SOUZA MELLO: – Sr. presidente, votei
males, descontentárão o povo, attenuárão a força pela urgencia do presente projecto de lei, e para que
moral das assembléas legislativas e prepararão a passasse da 1ª á 2ª e 3ª discussões sem ter
dissolução dellas? escrupulo algum de que elle ataque o direito de
Que bens não pareceu ás côrtes de Portugal propriedade, como se debateu; porquanto estou
que promettia a abolição dos capitães-móres? inteiramente convencido que logo que ha herança
Abolio-os com applauso geral e encarregou as jacente, ou attinente a herdeiros ausentes, o direito
camaras do recrutamento da tropa; novos de propriedade é mais certo da parte do credor
embaraços, novas queixas; e por fim passou esta sabido, do que da parte de quem apenas tem a
incumbencia aos coroneis de milicias, contra os presumpção para addir á herança; regra que tambem
quaes se allegavão ainda mil cousas. milita a respeito do mutuario que se ausentou por
O resultado foi que pretendendo as côrtes ter tempo tal
um exercito prompto para fazer face ao inimigo
externo e interno, achou-se sem recrutamento.
Sessão em 16 de Agosto de 1823 113

que seus bens se devolvem á arrecadação judicial. O Sr. Presidente, por ter dado a hora da leitura
Occorrem-me porém duas observações a dos pareceres de commissões, declarou adiada a
fazer sobre o mesmo projecto, e já fui em parte discussão.
prevenido por um nobre preopinante. O Sr. Ribeiro de Andrada, como relator da
Umas das minhas observações é que commissão de fazenda, leu os seguintes pareceres:
concordo na suppressão do primeiro artigo do
projecto por outras razões em que me fundo, e vem Primeiro
a ser, todos sabem que a legislação regulamentar da
repartição dos defuntos e ausentes consta toda de A commissão da fazenda, para poder emittir o
provisões da mesa da consciencia e ordens seu parecer sobre o requerimento de Sebastião
expedidas por motivos requeridos, ou representados, Teixeira Leitão, e outros negociantes de molhados
e mesmo a de que se trata teve lugar por uma do arraial de Itabira na provincia de Minas Geraes,
representação do governador da provincia de Goyaz, em que pedem a suppressão do imposto por elles
a que ella se refere, e muitas vezes uma mesma pago, ha mais de 20 annos, a titulo de subsidio
determinação é expedida em diversas épocas, e voluntario para a reedificação do palacio de N. S.
para diversos lugares; em consequencia não julgo d’Ajuda, precisa que pela repartição do thesouro se
conveniente que passe o 1º artigo fazendo menção exijão da junta da fazenda daquella provincia as
da provisão de 28 de Dezembro de 1754, cuja necessarias informações sobre a especialidade, ou
materia que se quer agora revogar ou ampliar poderá generalidade do referido subsidio, sua importancia
estar determinada por outra expedida em outra data, annual e actual applicação, e se lhe remettão: requer
e para outro lugar, o que se acautela perfeitamente portanto que nesta conformidade se officie ao
supprimindo o dito 1º artigo, e ficando o 5º e ultimo governo.
que diz – ficão revogados todos os regimentos, leis, Paço da assembléa, 16 de Agosto de 1823. –
alvarás, provisões e quaesquer outras resoluções Martim Francisco Ribeiro d' Andrada. – Barão de
que se oppuzerem ao disposto nesta lei. Santo Amaro. – José de Rezende Costa. – Manoel
A segunda reflexão de que me faço cargo é Jacintho Nogueira da Gama. – José Arouche de
sobre o 4º artigo quando nelle se determina que as Toledo Rendon.
acções ou feitos se ordenem com audiencia e Foi approvado.
citação ou dos thesoureiros das provedorias, ou dos
fiscaes dos sequestros, versando toda a minha Segundo
duvida na alternativa, e conjuncção disjunctiva – ou –
pois ainda que o caso projectado diz respeito a duas A commissão de fazenda para poder interpôr o
arrecadações diversas como em cada uma delIas ha seu parecer sobre o requerimento de D. Henriqueta
o thesoureiro que é mero procurador, ou curador ad Emilia Moreira de Figueiredo e D. Manoela Adelaide
bona, e um promotor ou fiscal que é curador ad litem;Moreira, filhas do fallecido conselheiro Manoel
eu proponho que a citação primordial seja feita a Moreira de Figueiredo, precisa ter presente a
ambos, accrescentando-se no art. 4º – Citação do consulta da junta do commercio, de que as
thesoureiro, e promotor das provedorias com a supplicantes fazem menção, e consta do documento
conjunção atativa e cumulativa – e – em lugar da que apresentão; e para esse fim requer a mesma
disjunctiva – ou – que se deve reformar. Eu mando á commissão que se officie ao governo para que
mesa a minha: remetta a esta assembléa a sobredita consulta.
Paço da assembléa, 16 de Agosto de 1823. –
EMENDA Barão de Santo Amaro. – Martim Francisco Ribeiro
d'Andrada. – José de Rezende Costa. – Manoel
Proponho a suppressão do 1º artigo; e que no Jacintho Nogueira da Gama. – José Arouche de
4º artigo se declare – com citação e audiencia do Toledo Rendon.
thesoureiro e promotor das provedorias. – Souza Foi approvado.
Mello.
Foi regeitada. Terceiro
O Sr. Teixeira Vasconcellos, depois de um
longo discurso (em que nada se entendeu o A commissão de fazenda, tendo lido a
tachygrapho Possidonio) mandou á mesa a emenda representação de Rufino José Felizardo e Costa;
seguinte: administrador da fabrica de ferro de S. João de
Fica ampliada a provisão etc. – Vasconcellos. Ypanema, tendo examinado todos os documentos
Foi apoiada. que se exigirão do governo a este respeito, e
Fallarão tambem os Srs. Montesuma e achando-se bem instruida da importancia daquelle
Andrada Machado; mas não se entendeu o mesmo grande estabelecimento, do seu estado estacionario
tachygrapho. e das causas que retardão os seus progressos,
conhece perfeitamente quaes as providencias que se
devem dar, para que não
114 Sessão em 16 de Agosto de 1823

só utilise os seus accionistas, no numero dos quaes As miseraveis provincias de Goyaz e Matto
entra a fazenda publica, mas tambem influa no bem Grosso, que pela sua pobreza, tendo boas minas de
geral da nação brasileira, produzindo a bom mercado ferro, não têm fabricas, devem de necessidade ser
um genero de primeira necessidade, e de que soccorridas com este genero de primeira
depende o progresso da agricultura, e das artes. necessidade pelo mais baixo mercado possivel, afim
Taes providencias devem ser dadas, umas por esta de crescer a sua lavoura, e com menos despeza
augusta assembléa, e outras pelo governo, a quem applicarem-se á excavação das minas, que são o
pertencem. Não basta comtudo que ellas sejão seu mais consideravel patrimonio. E’ um erro crasso
pedidas em geral pelo administrador: é preciso que em politica conservar naquellas provincias os
sejão especificadas, e requeridas pelos accionistas, embaraços que impedem a felicidade publica. Como
ouvido o governo de S. Paulo que deve fiscalisar sem milagre, ha de prosperar uma provincia, que não
pela parte publica e nacional. A commissão portanto, tem mais do que a agricultura e mineração, quando
reservando-se para quando taes remedios e se lhe impedem os meios de comprar mais barato o
providencias forem pedidas, limita-se nesta occasião ferro, sem o qual não póde plantar nem tirar ouro?
a dar o seu parecer sobre a especificada proposta do Quantos braços ociosos se não vêm nessas
administrador, em que pede isenção dos direitos da opprimidas provincias por não terem uma enxada,
sahida, e entrada em outra provincia, impostos sobre um almocafre?
o ferro produzido naquella fabrica, por espaço de dez Portanto é a commissão de parecer que se
annos. conceda á fabrica de Ypanema a isenção de
Esta mesma supplica já foi feita a Sua quaesquer direitos impostos sobre o ferro alli
Magestade Imperial pelo governo de S. Paulo no 1º fabricado, não só na exportação como na importação
de Abril do anno proximo passado: e indo a consultar para outras provincias, e que o mesmo se estenda a
ao conselho da fazenda, subio a consulta a favor da quaesquer outras fabricas de ferro fundadas ou que
pretenção, a 9 do mez passado; e sem ser resolvida se houverem de fundar no imperio do Brazil.
foi a sua decisão remettida a esta assembléa, como Paço da assembléa, 16 de Agosto de 1823. –
convinha. Razões as mais convenientes se deduzem José Arouche de Toledo Rendon. – Martim Francisco
na representação do governo de S. Paulo, e na Ribeiro de Andrada. – Barão de Santo Amaro. – José
consulta, ás quaes a commissão se dispensa de de Rezende Costa. – Manoel Jacintho Nogueira da
repetir por serem fundadas em principios de Gama.
economia politica tão generalisados nesta illuminada O SR. CARVALHO E MELLO: – Levanto-me,
assembléa. Ninguem hoje ignora, que convém Sr. presidente, para fallar na materia do projecto em
perder 10 para ganhar 100. Mas como, além de questão, não para combatel-o porque as razões
razões geraes ha cousas particulares taes como expostas na representação e as que produzem no
direitos a favor das provincias centraes de Minas, seu parecer os sabios membros da commissão são
Goyaz e Matto-Grosso, julga a commissão da maior força e evidencia; mas só para
conveniente, que ella diga alguma cousa sobre esta accrescentar-lhe que tão justo e util é o que se pede,
materia, que convém de uma vez elucidal-a. e o que julga a mesma commissão, que já é
A commissão será constante no seu voto de geralmente estabelecido em muitas leis e decretos a
que taes direitos de portos seccos (á excepção de favor das nossas fabricas em geral.
rarissimos casos) de uma provincia para outra são Foi decidido já em Portugal em favor das
outros tantos absurdos originados do velho systema manufacturas nacionaes que os productos dellas
do despotismo para conservar as provincias isoladas apresentados nas alfandegas com attestações
e rivaes umas das outras, afim de que nunca se competentes que próvem ser nacionaes, são isentos
pudessem unir nem considerar-se irmãs de uma de direitos. Mas clara e legalmente o declarou o
mesma familia. E posto que pareça á primeira vista, alvará de 28 de Abril de 1808, no § 2º, que veio
que esta extincção dos direitos do ferro irá causar estabelecer em regra geral o que estava
um deficil nas rendas daquellas tres provincias, estabelecido em diversas ordens. No registro da
comtudo a commissão pensa que em lugar de um alfandega desta côrte se achão muitas ordens
mal esta providencia fará um bem immediato não só semelhantes até sobre pequenos objectos como foi
á fabrica de Ypanema, como ás referidas tres sobre as solas preparadas em cortumes particulares
provincias que podem consumir os seus productos. A das provincias.
de Minas Geraes já tem tantas fabricas, posto que Quem não vê, que a respeito dos productos da
pequenas, que pouco ferro será preciso ir de fóra. A fabrica de ferro de Ypanema, versão razões iguaes,
experiencia mesmo tem feito ver que algum ferro que senão maiores?
de Ypanema tem entrado para aquella provincia é só Além da regra geral, de que as manufacturas
do da melhor qualidade e mais bem refinado, e que nacionaes devem ser animadas para poderem soffrer
se destina para obras mais delicadas. a concurrencia das estrangeiras, mais apuradas pela
facilidade e divisão de trabalho, accresce, que as
nossas estão em mais atrazado estado, até porque
antes do alvará de 5 de Abril
Sessão em 16 de Agosto de 1823 115

de 1808, que levantou todas as prohibições, era Sr. presidente, isto é urgentissimo: 1º para que
defeso neste vasto paiz instituir manufactura alguma; a assembléa não acabe de perder a força moral: 2º
e necessitão portanto todas as providencias, que para que os povos se desenganem que o monarcha
puderem animal-as. A de que se trata, é de mais está prompto a fazer executar as leis desta
disto recommendada, por ser de trabalhos de ferro, o assembléa, que tão escrupulosamente segue em
mais necessario de todos os metaes para qualquer seus negocios a marcha que a justiça assignala. O
ramo de industria, e mui justo é que tendo nós tantas povo está em expectação, é preciso que conheça a
e tão ricas minas de ferro, tenhamos tambem meios verdade. Eu vou ler com permissão da assembléa
não só de extrahil-o, mas de trabalhal-o por quantas uma indicação que offereço sobre este objecto.
maneiras concorrerem para o augmento da sua
manufactura; e um dos meios de diminuir-lhe o INDICAÇÃO
carestia da mão d’obra é por certo a isenção de
direitos, maiormente nas alfandegas do paiz, no que Requeiro que se proponha: 1º. Se a
concordão os mais sabios dos economistas politicos; assembléa deve marcar o dia determinado em que a
e convém portanto que esta providencia seja commição de legislação deve apresentar redigida a
transcendente a todas as fabricas deste genero lei que ha de regular a promulgação das demais: 2º.
erectas, e que se erigirem para o futuro neste vasto e Se este deve ser o mais breve possiveI, que poderá
ditoso paiz. ser na segunda-feira proxima. – Francisco Muniz
Fallarão tambem os Srs. Andrada Machado, Tavares.
Montesuma e Muniz Tavares, mas não se puderão O SR. HENRIQUES DE REZENDE: – Sr.
ordenar os discursos pelo que escreveu o dito presidente, já em outra occasião eu fui o que fiz
tachygrapho; apenas se colligiu que se fizerão resuscitar este que bem se podia chamar defunto
reflexões tanto para se decidir o negocio pelo projecto, que com outros estava em abandono; e por
simples parecer da commissão, como para se reduzir isso não posso deixar de apoiar esta indicação.
a um projecto de lei. Seria necessario não termos jurado fazer as
O Sr. Presidente, em attenção a estas reformas indispensaveis, e não termos encetado esta
opiniões, propoz se o parecer devia ser posto á carreira; seria preciso termos adoptado o parecer de
votação, ou remettido á commissão para o reduzir a um nobre deputado, que se dessem férias á
projecto. – Venceu-se que se remettesse á assembléa até que apparecesse o projecto da
commissão para formar um projecto. constituição, e que este projecto não tivesse ha tres
O Sr. Ribeiro de Andrada pedio então a mezes sido pesadamente arrastado, sem ter jámais
palavra e leu a seguinte: apparecido. Seria, finalmente, necessario não termos
tido em expectação os povos com discussões vãs, e
INDICAÇÃO sem sentido, e que lhes tivessemos dito: – Nós nada
faremos senão a constituição.
Proponho que a commissão encarregada de Mas, emfim, já foi encetada a carreira; agora
redigir o projecto de lei para isenção de direitos do seria ridiculo arripial-a. Appareção esses decretos já
ferro fabricado neste imperio, o amplie a outras feitos e este de que se trata, sem o qual os outros
quaesquer minas que não sejão de ouro. – Ribeiro não podem dar-se á luz.
de Andrada. Já por ahi se diz, Sr. presidente, que nós nada
Foi approvada. temos feito ha tanto tempo, tempo consumido sem
O SR. MUNIZ TAVARES: – Sr. presidente, se saber em que.
julgo do meu dever noticiar a esta assembléa que Talvez alguns senhores recêem algumas
tem chegado aos meus ouvidos que pessoas, contestações por causa do art. 3º do tal decreto; eu
seguramente mal intencionadas, se servem da não as temo nem creio que as haja; creio antes que
demora que tem havido em apparecer o projecto ha algum diabolus in rota, que fomenta intrigas para
sobre a promulgação das leis, para espalhar nesta excitar divisões, espalhando rumores que cheguem
cidade, e talvez communicar para as provincias, que até nós; que a assembléa vai ser dissolvida; que o
o monarcha não está disposto a fazer executar as imperador não aceita as leis: e sabe Deus o que
leis desta assembléa. Parece-me da maior urgencia elles têm ido dizer de cá para lá! E tudo para no meio
remediar este mal. das discordias tirarem o seu partido e conseguirem
Eu sei que o imperante, cujos interesses estão os seus premeditados fins!
identificados com a nação, e que tem dado Estão enganados; jámais o conseguiráõ.
constantes provas da sua firme adhesão aos Se, comtudo, é preciso satisfazer o receio
principios constitucionaes, nenhuma duvida ha de ter desses senhores... (A’ ordem.) Bem sei que é fóra da
em assignal-as; mas como se espalhão estas ordem; então digo que se supprima esse terceiro
noticias com o fim de indispôr os dous poderes e artigo antes do que ficarem paralysados
alterar-lhe a harmonia cumpre quanto antes destruil-
as; o que só póde conseguir-se apparecendo o
projecto.
116 Sessão em 18 de Agosto de 1823

os nossos trabalhos. (A' ordem.) Já reconheci que O Sr. Presidente declarou aberta a sessão, e
era fóra da ordem. lida a acta da antecedente foi approvada.
Eu não desejo essa suppressão, mas digo que O Sr. Secretario Costa Aguiar deu conta de ter
se é preciso isso para que appareção as leis já recebido uma participação de molestia do Sr. Araujo
feitas, não terei duvida em convir. Não é que eu tema Gondim. – Ficou a camara inteirada.
contestações, nem creia que as haja; o que temo é Entrou-se na ordem do dia, e continuou a 3ª
que por causa deste projecto fiquem os outros em discussão do projecto sobre o juizo dos ausentes,
abandono, porque tendo feito algumas leis que adiada na sessão antecedente.
julgamos urgentes: deixal-as assim era chamar sobre O SR. MACIEL DA COSTA: – Sr. presidente,
nós o ridiculo, a vergonha e a ignominia, dando uma na sessão passada depois de fallar o Sr. Vergueiro,
idéa de receio; era perdermos a força moral e a fazendo uma analyse miuda do meu discurso sobre o
reputação, porque os povos acreditarião que a mesmo objecto que discutimos hoje, pedi a palavra,
precipitação e o desaccordo têm presidido ás nossas não para fazer uma analyse da analyse do dito
resoluções. senhor, porque estou persuadido que sendo o fio das
Isto é o que eu temo. Digo, pois, que appareça idéas facil de escapar em discussão verbal,
o decreto de que se trata porque sem elle não argumenta-se eternamente com prejuizo do serviço
podem apparecer os outros. publico e cada um fica na sua, e mesmo porque esse
Fizerão-se mais algumas ligeiras observações; modo de discutir tem um certo tom de magisterio,
e afinal convidou o Sr. presidente á illustre que não convém em uma assembléa onde ha
commissão para que quanto antes, e, a poder ser, na igualdade de condição e de direitos e offende o amor
segunda ou terça-feira seguintes, apresentasse proprio individual, o que é de grandes
redigido o projecto. inconvenientes.
O Sr. Presidente assignou para a ordem do Não seguirei, pois, passo a passo o discurso
dia: 1.º O projecto sobre o juizo dos ausentes. 2.º do dito Sr. deputado, e contentar-me-hei em dizer
Regimento da assembléa succintamente qual foi o fio das minhas idéas
Levantou-se a sessão ás 2 horas da tarde. – deixando ao juizo da assembléa e do publico o
Manoel José de Souza França, secretario. decidir se mereço a imputação de contradicções e
absurdos que se me attribuirão, e por fim procurarei
RESOLUÇÕES DA ASSEMBLÉA destruir as duas proposições do Sr. Vergueiro que
me offenderão profundamente, e me parecerão
PARA CAETANO PINTO DE MIRANDA tendentes a inspirar na assembléa uma opinião
MONTENEGRO desfavoravel contra mim.
Propuz-me provar, Sr. presidente, que o
Illm. e Exm. Sr. – A assembléa geral projecto em questão não devia passar por não achar
constituinte e legislativa do imperio do Brazil sendo- nelle os caracteres de indispensabilidade e urgencia,
lhe presente o requerimento de João José Martins e produzi as razões que me occorrerão.
Pamplona Côrte Real, em que queixando-se de se Disse em bom som que se todavia a
achar preso na Barra Grande de Santos ha mais de assembléa julgasse que os males dessa repartição
sete mezes, sem que se lhe tenha declarado crime de ausentes devião ser já reformados, nesse caso eu
nem admittido a defeza que tem requerido, pede queria mais que a mesma commissão, queria que
declaração do seu crime, e faculdade para se poder em vez de uma providencia destacada se reunissem
justificar, manda participar ao governo que precisa os materiaes necessarios, e a assembléa mettendo
que lhe sejão transmittidas as necessarias profundamente a mão nesse miseravel ramo de
informações sobre este objecto. O que V. Ex. levará administração fizesse um trabalho completo e uma
ao conhecimento de Sua Magestade Imperial. – reforma total.
Deus guarde a V. Ex. Paço da assembléa, em 16 de Assim é manifesto que tudo quanto se disse
Agosto de 1823. – José Ricardo da Costa Aguiar de sobre a primeira parte da minha proposição sómente
Andrada. não destróe o todo della.
Chegado a este ponto e parecendo-me que
SESSÃO EM 18 DE AGOSTO DE 1823. devia carregar a mão para bem penetrar a
assembléa dos poderosos motivos que me obrigarão
PRESIDENCIA DO SR. BISPO CAPELLÃO-MÓR. a opinar contra o projecto, generalisei idéas e disse
que nos não illudissemos com o brilhante apparato
Reunidos os Srs. deputados pelas 10 horas da dos projectos de reformas legislativas que parecendo
manhã fez-se a chamada e acharão-se presentes 72, admiraveis e sem nenhuns inconvenientes, na
faltando com causa participada os Srs. Pereira da pratica erão inexequiveis, ião augmentar as
Cunha, Gondim, Andrada e Silva, Carneiro da Cunha difficuldades e complicar a legislação com descredito
e Andrada Machado. dos legisladores e desgosto dos povos.
Occorreu o exemplo da abolição dos capitães-
móres
Sessão em 18 de Agosto de 1823 117

em Portugal, que pareceu um rasgo de genio, mas pretendi assustar a assembléa com os exemplos das
havendo necessidade de recrutamento forão delle desgraças das outras assembléas legislativas.
encarregadas as camaras, e logo apparecerão tantos Quanto á primeira, não pensei que nenhum
inconvenientes que as córtes passarão esta homem de letras fizesse um ponto de honra de ter
incumbencia aos coroneis de milicias; apparecerão perfeito conhecimento das difficuldades physicas e
novos inconvenientes e o resultado foi que o inimigo moraes que devem existir nas muitas e vastas
externo achava-se no territorio hespanhol e até no provincias do imperio, e que devem influir nas
norte de Portugal sublevado, e não havia com que providencias legislativas que devemos dar,
completar o exercito. conhecimento (lembro-me perfeitamente ter
Não vejo, Sr. presidente, as contradicções que accrescentado) que nos tempos passados era quasi
me forão emprestadas. impossivel adquirir por falta de meios.
Prevendo a objecção de que levados os Lembro-me perfeitamente que me colloquei na
nossos trabalhos com este rigor, a assembléa não cabeceira do rol dos que suppunha não terem tal
teria que fazer, devendo aliás preparar os caminhos conhecimento, apesar de ter nascido em uma das
para as novas reformas, disse que tinhamos muito provincias e ter visitado algumas outras; isto bastava
de que nos occuparmos, que esses trabalhos me para afastar a idéa de querer injuriar os membros
parecião de uma natureza preparatoria, e produzi desta assembléa.
alguns exemplos. Quanto á segunda, que pretendi assustar a
E esta rapidissima digressão que escripta não assembléa. A paraphrase desta proposição é que
daria meia duzia de linhas, parecendo a um ou dois pretendi empregar a arma do medo para perturbar a
senhores uma reprehensivel infracção da ordem, fui razão dos meus honrados collegas, para fascinal-os
a ella chamado; mas não me parecendo assim, e e arrastal-os ao meu partido.
não decidindo o contrario quem tinha para isso Mereço eu que se me attribua uma tal
autoridade, continuei. temeridade? Ha, por ventura, algum facto que
Pareceu-me que o advertir a um deputado de autorise mesmo uma conjectura? Não.
que o seu discurso se aparta do ponto principal era Mas que disse eu, Sr. presidente? Apontei os
só concedido ao Sr. presidente, e não me enganei á escolhos onde os outros naufragarão, mostrei os
face do nosso regimento, e com este chamamento estragos do naufragio, propondo que nos servissem
injusto demorei-me então mais do que eu queria para de fanal, para não esbarrarmos nos mesmos
encarecer a necessidade de não desmantelarmos o escolhos. Não será isso permittido a um deputado,
edificio social, que temos de reformar senão com interessado no bem da sua patria e obrigado a
muito geito e prudencia; encarecimento que só a trabalhar para elle?
superficialidade em politica póde taxar de indiscreto, Se isto se chama metter susto, ou se este
confundindo este receio saudavel com o respeito susto não é fundado, então erro eu, mas com os
supersticioso por antigas instituições, só por serem mestres de politica, antigos e modernos. Que bellas
antigas. cousas não diz Cicero a este respeito!
Não sei, Sr. presidente, vista a exposição que Entre os modernos temos Bacon, que diz e
acabo de fazer, em que e por que mereceu o meu demonstra que as reformas das instituições de um
discurso tão severa censura, e por que razão as povo são mais obras do tempo do que do gabinete;
generalidades que produzi forão arrastadas para se temos Montesquieu, João Jacques, Montlosier,
applicarem á especie particular do projecto em Benjamin Constant, que supponho hoje nas mãos de
discussão, cuja applicação forçada não podia deixar todos, os quaes trovejão sobre a circumspecção com
de apresentar incongruencias e mesmo absurdos. que se deve tocar em um edificio social para
Quando disse que o immoderado furor de reformal-o.
legislar sem consideração á que as novações e Dizer-se que isto é paixão por velhas
providencias legislativas destacadas, ainda as que instituições, não merecia resposta, e contento-me
parecião mais bem combinadas, tinhão feito um com dizer que, nos dous extremos, antes a taxa de
labyrintho prejudicial ao andamento dos novos apaixonado por antigas instituições, que não forem
systemas politicos em França, em Hespanha e em incompativeis com a liberdade que todos desejamos
Portugal, quiz, por ventura, attribuir a queda delles á do que a de innovador temerario e demagogo; que
esta causa exclusivamente? Não, Sr. presidente: entre um respeito supersticioso e idolatra por antigas
para que, pois, emprestar-me cousas que eu não instituições e um furor temerario de innovações ha
disse nem era possivel que dissesse? um meio; este é o da circumspecção e da prudencia,
Vamos ás duas proposições que julgo que eu muito desejo que seja adoptado por esta
offenderem-me pessoalmente: 1ª, que de algum assembléa, porque sou brazileiro e interessado como
modo (disse o Sr. Vergueiro) injuriei os membros os que o são na gloria della.
desta assembléa negando-lhes conhecimento das Fico na minha opinião de que no projecto em
localidades das provincias brazileiras; 2ª, que discussão é preciso toda a circumspecção; que a
providencia proposta não me pareceu
118 Sessão em 18 de Agosto de 1823

indispensavel e urgente, mas que se a assembléa O SR. ALVARES DA SILVA: – Sr. presidente,
julga indispensavel tocar nesta administração, faça longe de mim o arrogante pensamento de querer que
trabalho completo, vá ao todo della e não a partes tambem as minhas opiniões prevaleção nesta
destacadas. augusta assembléa, á vista de tão illustres e sabios
O SR. ARAUJO LIMA: – Sr. presidente, se o Srs. deputados, perante quem sou um atomo
illustre deputado se occupasse em refutar os pontos imperceptivel; mas porque já se tem primeira,
que visse não erão conformes aos seus principios, segunda e terceira vez discutido este projecto de lei
em lugar de nos dizer o que esta assembléa devia sobre os abusos que ha nesta administração, fallarei,
fazer, ensinando-nos a circumspecção com que ainda que muito passageiramente sobre elles, visto
devemos proceder, como se não fossemos que não vim aqui fazer a minha vontade, que seria
circumspectos e marchassemos sem ordem, eu não nada fallar, mas sim a da minha provincia.
me levantaria; mas insistir na sessão passada sobre Sr. presidente, são taes os abusos que têm
isto, e seguir hoje a mesma estrada, de sorte que no havido nesta administração, ao menos pelo que sei
seu novo discurso sómente repetio o que já tinha dos da minha provincia, ainda que estou que nas
dito, obriga-me a justificar esta assembléa de que eu mais será o mesmo, porém fallo da minha, são taes
tenho a honra de ser membro. os abusos que têm havido, que julgo muito
Se o Sr. deputado reparasse no nosso seriamente dever-se em grande parte a esse tribunal
juramento acharia que não é novo para nós o que a ruina da minha provincia; porquanto quando morre
nos pretende ensinar. alguma pessoa rica ab-intestato póde-se dizer que é
Nós vamos conformes com o nosso regimento uma descoberta para os escrivães, procuradores e
e com o juramento que prestámos, em todas as thesoureiros; é uma mina que para elles appareceu.
propostas. Muitas vezes, de casos muito insignificantes
Temos 1ª e 2ª leitura; debate-se se é da nossa resultão grandes pleitos que só servem para
competencia, se tem a urgencia que exige o nosso chicanar no fôro daquelle juizo; muitas vezes pela
juramento; depois passa a materia pela 1ª, 2ª e 3ª pequena quantia de mil e duzentos ou de novecentos
discussão, em que se tem procedido sempre com réis, se fazem custas aos devedores desses ab-
essa circumspecção tão recommendada pelo nobre instestatos de trinta e de quarenta mil réis; ora,
deputado, preferindo-se antes adiar a discussão do sendo assim por estas diminutas quantias, póde
que terminal-a sem a certeza de estar tudo inferir-se o que será pelas grandes!
considerado com madureza; emfim nenhum objecto Finalmente, têm chegado ao ponto de
proposto deixou até agora de ser mui seriamente consumirem em custas grossos cabedaes. Por isso
considerado por esta assembléa. direi que me parece justissimo ou abolir inteiramente
Como pois pretende o Sr. deputado instar que este juizo ou marcar bem as attribuições dos
ella não vai coherente com as regras estabelecidas, escrivães, procuradores, thesoureiros e de todos
apresentando factos que, ainda que relativos á quantos entrão nesta administração para se evitarem
outras assembléas não podem deixar de ser estes terriveis prejuizos que soffrem os bens dos ab-
desagradaveis, bem que se fizessemos a historia intestatos e aquelles que têm por qualquer fórma
dessas assembléas muito haveria que dizer; mas direito a elles, o que póde conseguir-se por meio
com isso perderiamos tempo em narrar o que todos deste projecto fazendo-se-lhe as alterações que se
sabemos. julgarem convenientes a este fim.
Se o nobre deputado nos dissesse que o O SR. DIAS: – Este juizo dos ausentes é todo
projecto tinha estes ou aquelles inconvenientes e de utilidade para os escrivães e thesoureiros, sem
indicasse quaes erão os requisitos que devia ter e as que de modo algum favoreça os herdeiros ou
uteis alterações que precisava, então fallaria em credores do finado; aquelles lá se enchem como bem
fórma e mostraria saber o regimento; mas dizer-nos lhes parece, ao mesmo tempo que nada ha que não
que devemos ser circumspectos sem mostrar que já seja contra os segundos.
deixassemos de o ser, é muito má logica. Logo que se sabe da morte do sugeito correm
Explique-nos quaes são os obstaculos que as pessoas encarregadas de fazer a arrecadação
póde ter na pratica esta reforma e o que devemos para esta se verificar; se toca isto a um ministro
substituir-lhe por melhor do que o proposto; mas não honrado (que bem poucos ha) inda vai menos mal o
nos diga só que a reforma vai soffrer inconvenientes caso e alguma cousa se previne, mas fóra disto
sem dizer quaes elles são, porque isto não póde depennão tudo; os melhores trastes vão-se na praça;
destruir o que se tem produzido em seu favor. arrematão-se por uma avaliação muito inferior ao seu
Conclúo portanto que nada disse sobre a valor; e ainda que hajão pessoas que queirão dar
materia e que só fallou fóra da ordem, limitando-se a mais são comtudo arrematados para o Sr. Fulano de
generalidades que tanto podem applicar-se a este tal; eu sei de trastes... (A’ ordem, á ordem.) Estou
projecto como a qualquer outro.
Sessão em 18 de Agosto de 1823 119

na ordem: muitas vezes acontece que trastes e seu voto nas actas, apresentando-o no termo de
fazendas que forão compradas e não se pagarão, vinte e quatro horas e sem ser motivado.
são vendidas por morte do ab-intestato em praça e O SR. MONTESUMA: – Sr. presidente, esta
vão parar á mão de outros possuidores, estando declaração de votos é essencialissima sem duvida,
vivos seus verdadeiros donos, que nem podem porque ainda que os Diarios da assembléa fação
recebel-os, nem cobrar o seu dinheiro, pelo pessimo conhecer ao publico as opiniões dos Srs. deputados,
estabelecimento; ora, estes e outros males precisão comtudo deve sempre constar das actas, quando
de remedio e com muita promptidão. cada qual quizer, a fórma e causa porque adoptarão
Igualmente se deve providenciar que como se ou rejeitárão este ou aquelle artigo. Porém o artigo
recebem pequenas quantias se receba qualquer como está é imperfeito; e parece-me que deve
divida uma vez que se preste caução. (Não se ouvio estabelecer-se que todo o deputado póde declarar o
o resto.) seu voto na acta quando elle fôr contrario á decisão
O SR. FRANÇA: – Sr. presidente, a doutrina da assembléa, porque quando o não fôr subentende-
do projecto está tão complicada com as emendas se que o seu voto é o mesmo que o da maioria; e
offerecidas ultimamente, que eu julgo indispensavel portanto quando não é contrario ao da assembléa
o adiamento para que ellas se imprimão e se possa acho inteiramente desnecessario gastar tempo e
fazer de espaço o competente juizo, combinando-as papel, porque deste modo um a dizer – quero
com o mesmo projecto, antes de se proceder á declarar o meu voto – outro – quero declarar o meu
votação. voto – pouco será o tempo para fazer taes
Fizerão-se algumas observações sobre o que declarações, com que se augmentará o trabalho dos
requereu o Sr. França; e afinal propondo o Sr. Srs. secretarios, sem se tirar utilidade alguma.
presidente o adiamento requerido, resolveu a Offereço por isso a seguinte:
assembléa que se imprimissem as emendas e que o
Sr. presidente, depois de impressas, marcasse dia EMENDA
para se proceder á discussão e votação.
Passou-se á 2ª parte da ordem do dia que era Proponho que se accrescentem ao artigo 138
o regimento da assembléa; e entrou em discussão o depois da palavra – actas – as seguintes – quando
art. 137 que ficára adiado na sessão de 14 do tiver sido contrario ao que deliberou a assembléa. –
corrente. O deputado Montesuma.
O Sr. Montesuma pediu a palavra e mandou á Foi apoiada.
mesa a seguinte: O SR. DIAS: – Já se decidiu o contrario e por
isso não tem lugar o que propõe o illustre deputado;
EMENDA além de que eu acho que se não deve de nenhum
modo tirar ao deputado o direito sagrado de declarar
Proponho que se accrescentem ao art. 137 as o seu voto, ou seja do partido da maioria ou da
seguintes palavras – Na ultima discussão. – O minoridade da assembléa.
deputado, Montesuma. O SR. MONTESUMA: – Eu cuido que se não
Foi apoiada. decidiu de todo. Cuido que esta deliberação foi
O SR. FRANÇA: – Eu acho que se póde tomada emquanto se não resolvesse sobre a materia
conservar o que já está sanccionado pela definitivamente; duvidou-se quando um Sr. deputado
assembléa, e que bastará só conformar a doutrina que tinha seguido a maioria apresentou o seu voto
deste artigo bem claramente com a do art. 96; o que na mesa, se devia ser recebido; mas não se decidiu
me parece conseguir-se com este additamento. para fazer artigo de regimento; porque então
escusado era pôr-se em discussão este artigo. Uma
ADDITAMENTO vez que se discute, devo entender que a decisão que
houve foi sómente interina; e portanto não póde ter
E depois desta votação especifica da doutrina lugar o que diz o illustre deputado.
dos artigos perguntará o presidente – A assembléa O SR. ARAUJO LIMA: – Sr. presidente, eu de
sancciona a proposta com as alterações (no caso de maneira nenhum, posso concordar com esta
têl-as havido)? – Conforme o que fica disposto no emenda.
art. 96. – O deputado, França. Esta emenda diz que nenhuma Sr. deputado
Foi apoiado. poderá declarar o seu voto senão quando elle fôr
Julgando-se afinal discutido propoz o Sr. contrario á decisão da assembléa.
presidente: Eu acho que isto é tirar ao deputado um direito
1º Se o artigo passava tal qual estava redigido. mui precioso; qual é o de fazer conhecer a sua
– Venceu-se que não. opinião.
2º Se passava a emenda do Sr. França. – Ora, póde ser que em alguma occasião seja
Venceu-se que sim, ficando por isso prejudicadas necessario saber qual foi o voto de um Sr. deputado,
todas as outras. e deste modo não se saberá porque
Artigo 138. Todo o deputado póde inserir o
120 Sessão em 18 de Agosto de 1823

falta a declaração da sua opinião. Pergunto eu, qual Quem lêr a acta do dia daquella discussão
é a razão porque se instituiu o Diario da assembléa? necessariamente vê o que o deputado declarou
Para se conhecerem as discussões e saber-se nesta ou naquella parte e qual foi o seu modo de
quem foi desta ou daquella opinião. pensar. Agora, se não fez emenda então está em pé
Para que é a votação nominal? que votou decididamente ou a favor ou contra e
E’ para o mesmo fim de se saberem os votos tambem está declarada a sua opinião.
dos Srs. deputados; ora, se a votação geral com a Quanto ao que disse o illustre deputado sobre
declaração de voto na acta produz esse mesmo a votação nominal acho que é nullo, porque pelo que
effeito da votação nominal, porque se ha de vedar ao acabei de dizer se conhece que ainda não havendo a
deputado o direito de declarar o seu voto? votação nominal não se tira de nenhum modo o
Na votação nominal ainda sendo o meu voto direito de declarar o voto, antes pelo contrario
conforme a decisão da assembléa, sabe-se qual é e sempre fica livre e illeso.
não estou comprehendido na prohibição de o Demais, se um deputado não olha a materia
declarar; mas quando a assembléa decidir que a do mesmo modo que a assembléa a considera,
votação não seja nominal, se eu estou prohibido de porque não se levanta e dá o seu parecer? Porque
declarar o meu voto, segue-se que a assembléa não não se oppõe á deliberação, e faz por este modo
quer que se saiba qual elle é. O prohibir-se que haja conhecer em que se aparta do voto da assembléa?
esta declaração de voto é seguramente tirar um dos Portanto digo que é desnecessario encher a
direitos mais sagrados que tem o homem, que é de acta de immensidade de declarações que poderáõ
fazer conhecer a sua opinião; e se isto passasse apparecer todos os dias; embora se diga que não
seria o deputado obrigado, para fazer conhecido o apparecem, e que a pratica tem mostrado o
seu voto, a mandal-o inserir em algum periodico. contrario, pois talvez isto seja porque ainda não
Quanto ao que disse o illustre deputado sobre tivemos uma deliberação igual a esta, e porque tem
o tempo que se gasta e sobre o augmento do serviço havido receio que a assembléa, considerando a
dos Srs. secretarios, parece suppôr que todos os questão como devia considerar, declarasse
dias appareceráõ immensas declarações de votos; positivamente que não admittia semelhantes
porém a pratica tem mostrado o contrario, nós temos declarações de voto, e tambem por não se ter
visto que bem poucas são as vezes que ha querido estender os trabalhos dos Srs. secretarios,
declarações de voto. que a passar este artigo como está, se hão de
Julgo sufficiente o que digo para provar o estender por força; porque abusos apparecem
contrario do que disse o illustre deputado. sempre.
O SR. MONTESUMA: – Eu pedi a palavra Se acaso se julga porque não tem apparecido
para sustentar a emenda. Quando eu a propuz até agora muitas declarações que não ha de
considerei duas maneiras de votar. Ou o Sr. apparecer este abuso, então direi que muitos artigos
deputado é decididamente a favor do parecer da do regimento não são necessarios, e que devemos
assembléa e então sem declaração se entende que regeital-os, por só terem em vista prevenir abusos:
votou pelo que ella decidiu, ou reprova e opina direi que devemos fiar-nos em pessoas que forão
decididamente contra o parecer da assembléa e escolhidas pela nação, e são inteiramente da
então póde declarar o seu voto. Mas dir-se-ha que confiança della; e que nem a illustre commissão que
póde em parte votar pela decisão da assembléa e apresentou o regimento tinha necessidade de redigir
póde em parte votar contra ella. semelhantes artigos.
Eu a isto digo que assim mesmo não se tira ao Porém estes artigos existem, e nós os
Sr. deputado o direito sagrado de declarar o seu voto approvámos; o que mostra que foi para prevenir
que é da essencia do direito de votar; eu vou proval- abusos.
o apresentando uma hypothese. Ora, se alguns delles que são de menor
Nós temos declarado e está decidido que consequencia do que este, forão adoptados por esta
nenhum Sr. deputado póde apresentar emenda que prevenção, julgo que com maior razão deve ser
não seja por escripto. Quando um Sr. deputado votar adoptada esta emenda declaratoria porque ainda
parte a favor e parte contra naturalmente apresenta que nós fossemos anjos, deveriamos suppôr que
ou deverá apresentar uma emenda e por este meio algumas vezes haverião abusos. Portanto voto pela
declara o seu modo de pensar; porque pela emenda minha emenda como se acha redigida.
que apresenta se conhece qual é a sua opinião e O SR. FRANÇA: – Eu estou inteiramente pela
como ella existe na acta, é uma expressa declaração opinião que expendeu o Sr. Araujo Lima, e pelas
de voto. razões em que fundou, e por isso voto a favor do
Por consequencia nem ainda neste caso se artigo. A todo o Sr. deputado deve ser licito o
tira o direito de declarar o voto e fica inutil declaral-o declarar o seu voto; e não se deve coarctar esta
segunda vez, visto que já o está pela emenda que liberdade por evitar trabalho aos Srs. secretarios. O
apresentou. que julgo é que esta materia não merece tanta
discussão.
Sessão em 18 de Agosto de 1823 121

O SR. ARAUJO LIMA: – Disse o illustre O SR. MONTESUMA: – Como é isso o que está
deputado que ainda que não appareça na acta a vencido, peço a votação sobre a emenda.
declaração do voto de qualquer Sr. deputado, póde O SR. ALMEIDA E ALBUQUERQUE: – Diz-se
todavia saber-se qual elle foi; porque se vota parte pró, neste artigo que a declaração de voto será feita no dia
e parte contra, manda uma emenda, e expõe as razões seguinte. Eu quero saber qual é a razão porque só hei
em que se funda; porém, Sr. presidente, nem todos de poder declarar o meu voto dentro deste praso;
sabem declarar deste modo qual é o seu voto, porque quando até póde ter o inconveniente de não haver
nem todos são oradores, antes o dom de o ser não é sessão no dia seguinte, e deste modo fico prohibido de
muito vulgar. Podem muitos Srs. deputados formar fazer a minha declaração; julgo por isso que deve
grandes planos por seus talentos em seus gabinetes, e declarar-se que se faça na primeira sessão.
não serem capazes de os apresentar nesta augusta O Sr. França, apoiando o que dissera o Sr.
assembléa. Almeida e Albuquerque offereceu e mandou á mesa a
Portanto quando algum Sr. deputado não seguinte:
apresentar emenda, nem propuzer as suas objecções,
não sei qual será o meio de fazer conhecer o seu voto. EMENDA
Eu só vejo o da declaração. Igualmente não sei
como se verifica o que disse o nobre deputado que Em lugar da clausula – apresentando-o no termo
tambem podia ter lugar quando qualquer visse que a de 24 horas – se substitua est’outra – apresentando-o
opinião da assembléa diversificava da sua; segundo a até á sessão subsequente. – O deputado, França.
ordem dos trabalhos prescriptos do regimento, depois Foi apoiada.
que o Sr. presidente propõe a materia á votação, não Julgou-se discutida a materia, e o Sr. presidente
tem o deputado lugar de dizer que vota parte pró, e propoz:
parte contra; se acontece que approva uma parte, e não 1º Se passava o artigo como estava redigido. –
outra do artigo, faz conhecel-o pela declaração de voto. Venceu-se que não.
(Não se ouvio o resto.) 2º Se se approvava a emenda do Sr.
O SR. FRANÇA: – Sr. presidente! O illustre Montesuma. – Foi regeitada.
deputado o Sr. Montesuma, segurou que pela acta se 3º Se se approvava a do Sr. França. – Venceu-
podião conhecer os votos dos Srs. deputados, e eu se que sim; e com ella ficou approvado o artigo.
levantei-me para destruir esta hypothese; porque pela Art. 139. A eleição do presidente e vice-
lição da acta, sabe-se os deputados que vierão á presidente será feita á pluralidade absoluta por
assembléa, mas não se sabe os que votarão; póde-se escrutinio secreto (art. 129). Se no primeiro escrutinio
muito bem julgar que um votou a favor, tendo votado se não tiver obtido a maioria absoluta, passaráõ para
contra, e que outro votou contra, tendo votado a favor; e segundo escrutinio os dous que tiverem obtido maior
tambem julgar-se que votou de alguma das duas numero de votos; e se houver mais de dous com votos
fórmas sem ter votado de nenhuma; porque póde iguaes, a sorte decidirá quaes os dous que devem
acontecer ter vindo á assembléa, e não votar, por estar entrar no segundo escrutinio.
lá dentro e não assistir á votação. O SR. MONTESUMA: – Este artigo tem duas
Portanto não podendo verificar-se a hypothese partes, e eu me opponho tanto a uma como a outra.
que formou o illustre deputado, porque, como acabei de (Leu.) Opponho-me a que seja feita a eleição do
dizer, não é possivel saber pela lição da acta, os que presidente por pluralidade absoluta, porque só serve de
votarão pró, e os que votarão contra, sou de parecer augmentar o processo, sem que tenha resultado algum
que passe o artigo para que haja inteira liberdade de bom; quando não ha cousa mais natural do que ser por
declarar cada um o seu voto na acta. pluralidade relativa; o objecto não é de tanto receio e
O SR. MONTESUMA: – Eu peço a palavra. ponderação que para se evitar algum grande mal, se
O SR. ANDRADA MACHADO: – Por bem da requeira a eleição por pluralidade absoluta, em que se
ordem o illustre preopinante não póde mais fallar. gasta muito mais tempo com as repetições de
O SR. MONTESUMA: – Como se não falla sobre processos nas occasiões de empates. Eis porque eu
o artigo, mas sobre a emenda, creio que ainda posso digo que é preferivel a pluralidade relativa para a
fallar outra vez. nomeação do presidente e vice-presidente; e por isso
O SR. COSTA AGUIAR: – Se deve subsistir o voto contra a 1ª parte. Emquanto á 2ª tambem me
que está vencido, já o nobre deputado fallou as vezes opponho a ella porque não vejo necessidade alguma de
que lhe tocavão; agora se a assembléa quer decidir ser feita a eleição por escrutinio secreto. Offereço por
outra cousa, se quer permittir que se falle mais vezes isso a seguinte:
póde-o fazer.
EMENDA

Proponho que se mude a palavra absoluta


122 Sessão em 18 de Agosto de 1823

para relativa, e se supprima a palavra secreto. – O O Sr. Presidente, por ter dado a hora das
deputado, Montesuma. indicações e pareceres, declarou adiada a discussão.
O SR. CARNEIRO DA CUNHA: – A emenda O SR. ROCHA FRANCO: – Em tempos em
tem duas partes, é preciso propôr cada uma dellas. que é tão preconisada a igualdade de direitos, não
O Sr. Presidente propoz a emenda dividida; e posso, Sr. presidente, observar sem estranheza que
nenhuma das suas partes foi apoiada. emquanto os lavradores desta provincia do Rio de
Julgou-se discutido o artigo e posto á votação, Janeiro e de algumas outras só pagão o dizimo dos
foi approvado. generos que exportão, na provincia de Minas e cuido
Art. 140. A eleição para secretarios e seus que em outras centraes, se continue a pagar como
supplentes será feita á pluralidade relativa. Os dous d´antes; sem que até aqui lhes tenha podido ser util o
que tiverem maior numero de votos serão os decreto de 16 de Abril de 1821 que mandou pagar o
secretarios; e os que se lhe seguirem serão seus dizimo sómente dos generos exportados nas
supplentes. entradas das villas e cidades. E’ esta a razão porque
O SR. MAIA: – Como já está decidido que proponho uma indicação que julgo fundada em toda
sejão quatro os secretarios e dous os supplentes, justiça.
julgo que deve redigir-se o artigo nesta
conformidade; e por isso offereço a seguinte: INDICAÇÃO

EMENDA Proponho: 1º. Que se mande observar na


provincia de Minas Geraes o decreto de 16 de Abril
A 2ª parte do artigo. – Os quatro que tiverem de 1821, por officio ao governo.
maior numero de votos serão os secretarios: e os 2º Que a commissão de fazenda tomando em
dous que se lhes seguirem, serão seus supplentes. – attenção as difficuldades objectadas pela junta da
Maia. fazenda daquella provincia sobre a execução do
Julgando-se discutido, propoz o Sr. presidente: mesmo decreto, em representação official que pela
1º Se passava o artigo como estava. – repartição do thesouro poderá exigir, dê quanto antes
Venceu-se que não. o seu parecer sobre o meio de aplanar as mesmas
2º Se se approvava com a emenda do Sr. difficuldades de fórma que se possa obviar ao
Maia. – Venceu-se que sim. empenho da provincia. – Rocha Franco.
Art.141. A eleição do presidente e secretarios O SR. FRANÇA: – Esta indicação versa sobre
será communicada ao governo pelo secretario, que materia de dizimos e entendo que deve ir á
actualmente servir. commissão de fazenda porque só tomando ella
Foi approvado. conhecimento do negocio, e dando o seu parecer,
Art. 142. A eleição dos membros de todas e poderemos nós entrar na questão. Este decreto,
quaesquer commissões, tanto permanentes como segundo penso, tem soffrido embaraços na pratica;
especiaes ou ad hoc, tanto d´entre deputados como ha tambem queixas de povos a este respeito;
de pessoas de fóra, será feita da mesma maneira portanto vá á commissão da fazenda para se ter
que a dos secretarios (art. 140 ). perfeito conhecimento do que ha na materia, e poder
O SR. TEIXEIRA DE GOUVÊA: – Eu creio que deliberar.
este artigo não póde ficar como está quanto ás Resolveu-se que fosse remettida á commissão
commissões de fóra; mas que poderá passar com a de fazenda para dar o seu parecer, fazendo-o
emenda seguinte, salva a redação: extensivo a todas as provincias, como requererão
E as de fóra á proposta das commissões de alguns Srs. deputados.
dentro. – Teixeira de Gouvêa. O SR. MONTESUMA: – Lendo o diario da
Foi apoiada. assembléa de 22 de Maio achei uma indicação do Sr.
O SR. MAIA: – Assim se tem aqui praticado; barão de Santo Amaro em que requereu que se
mas eu sempre queria que se conservasse no artigo exigisse do governo uma informação do estado
para as eleições a pluralidade relativa, porque actual em que se acha a nação, comprehendendo-se
convém que assim se faça: e por isso offereço a todos os ramos da administração publica e
seguinte: indicando-se os abusos que mais carecessem de
reforma.
EMENDA Eu já em outra occasião fallei da necessidade
desta informação pela sua importancia; e agora
A eleição dos membros de todas e quaesquer parecendo-me de novo que é indispensavel
commissões tanto permanentes como especiaes ou offerecerei uma indicação para que o governo faça
ad hoc, tanto d'entre os deputados como de pessoas executar a do Sr. Barão de Santo Amaro.
de fóra, á proposta das respectivas commissões de
dentro, será feita etc. – Maia. INDICAÇÃO
Foi apoiada.
Proponho que se torne a exigir do ministerio
Sessão em 18 de Agosto de 1823 123

as informações respectivas do estado actual do Sr. barão de Santo Amaro, considerei primeiro que
imperio sobre as suas differentes repartições, na tempo tinha tido o ministerio para apresentar este
fórma porque já foi pedido pelo Sr. deputado barão trabalho, porque o ministerio do Brazil não principiou
de Santo Amaro. – O deputado Montesuma. agora. Estou convencido que os ministros de estado
O SR. FRANÇA: – Julgo desnecessario nova que tinhão as rédeas do governo quando se installou
indicação, é bastante repetir-se o officio que se a assembléa não podia deixar de ver que havia de
expediu. ser necessario apresentar o estado do imperio.
O SR. CARNEIRO DE CAMPOS: – Quando Todos sabem que em Portugal quando se
se trata de lembrar ao governo que faça executar installarão as côrtes, logo Manoel Fernandes
qualquer cousa que lhe foi recommendada, convém Thomaz apresentou um relatorio do estado do reino
que se conheça primeiro que se póde pôr em para instrucção das mesmas côrtes; e eu julguei que
execução com a promptidão que se exige e que o os illustres ministros de estado se tivessem
governo tem sido descuidado. preparado da mesma maneira e expedido as ordens
Um secretario de estado que nada acha na necessarias, em uma palavra que estivessem no
sua repartição (pois nem mappas ha da população tempo da installação da assembléa quasi promptos a
do paiz) como ha de promptamente informar do apresentar o resultado dos seus trabalhos.
estado da agricultura, industria, artes ou commercio? Digo quasi, por não dizer que era obrigação
Não tendo recursos alguns sobre que bases se ha de sua mostrar o estado em que se achava o imperio
trabalhar? Se a assembléa quer que se fação quando elles tomarão conta das rédeas do governo,
trabalhos de cabeça, então poderá meditar-se em o que estou convencido que podia dizer sem ser
casa, e depois dizer sobre agricultura, ou outro taxado de falta de justiça. Deve pois prevalecer o
qualquer ramo – parece-me que se acha neste ou que acabei de dizer, principalmente havendo mais de
naquelle estado: – mas para dar uma conta exacta tres mezes que se fez esta indicação sem se ter
como se quer é necessario que se hajão informações apresentado resultado algum a esta assembléa.
que não temos. No ministerio antecedente já se Eu estou pelo que disse o illustre preopinante,
pedirão e até se ordenou que se dessem as não digo que os trabalhos venhão exactissimos, mas
providencias precisas para se proceder a uma ao menos venhão as informações que estão mais ao
estatistica geral do imperio mas essas informações alcance do ministerio. Se não se preencher tudo
ainda não vierão e sem ellas não póde o governo quanto é necessario para ter um conhecimento
apresentar um trabalho perfeito. exacto do nosso estado actual, appareça ao menos
Portanto julgo desnecessaria a advertencia aquillo que existe.
sobre esta materia. Disse o illustre preopinante que a assembléa
O SR. VERGUEIRO: – Se a demora fosse de officiando ao governo, e lembrando-lhe novamente
15 ou 20 dias, ou de um mez, teria desculpa o que nos deve mandar as informações já requeridas é
governo, mas o officio expedio-se em 23 de Maio, e o mesmo que dizer que o governo tem sido
parece-me assaz largo o prazo que tem decorrido descuidado. Não ha tal, não se quer dizer isto. O que
até hoje. Se a assembléa para ter informações deve se quer que se diga é que julgando a assembléa da
esperar que se fórme essa estatistica, então só as maior urgencia que o governo dê informações do
teremos daqui a dous annos, e entretanto estaremos estado actual do imperio, e não as tendo recebido
sem saber o que ha sobre a materia. pede que lh’as mande. Isto não é senão patentear a
Eu não duvido que o governo não possa necessidade dellas, e não dizer que foi innegligente,
presentemente dar uma informação muito exacta, ou descuidado, se eu quizesse dizer isso, eu o
mas nem por isso deve ficar desonerada de dar as proporia de outra maneira, eu usaria de expressões
que estiverem ao seu alcance. Muitas cousas hão de mais fortes, de termos mais claros, porque sempre
constar nas secretarias, por exemplo, o estado de fallo com franqueza. O que quero sómente repetir é
finanças sobre o qual julgo não ser necessario pedir que se precisa saber o estado do imperio, até para
informações ás provincias porque hão de constar no que a nação conheça que a assembléa longe de se
erario as rendas de cada uma, o estado da força esquecer deste trabalho o reputa antes por cousa de
armada etc. Portanto se não póde dar informação primeira necessidade, mas não se pretende arguir o
circumstanciada em todas as suas partes, dê alguma governo.
para facilitar os nossos trabalhos, porque se Taes são as razões porque fiz a indicação, e
esperarmos por tantas exactidões, como estas não estou convencido que não se poderá taxar por ella a
chegão tão cedo, aqui estaremos sem nada assembléa de precipitada, porque só exige aquillo
podermos adiantar. que não tem, e que precisa, e que já pediu ha tres
O SR. MONTESUMA: – Sr. presidente, mezes, tempo que se conhece ser sufficiente para o
quando eu propuz que se mandasse dizer ao ministerio mandar algum resultado de seus
governo que désse execução á indicação proposta trabalhos.
pelo
124 Sessão em 18 de Agosto de 1823

O SR. RIBEIRO DE ANDRADA: – Sr. com o estado da sua divida activa e passiva, forças
presidente, eu me levanto para apoiar o que disse o da provincia, importancia de contribuições, etc...
Sr. Carneiro de Campos, o governo está instruido, e Portanto por parte da provincia de Goyaz posso dizer
sabe perfeitamente que deve remetter á assembléa que mandou o que o thesouro publico do Rio de
as informações que já se pedirão, e cada ministro a Janeiro lhe pedio, é muito de presumir que assim
quem compete dar estas informações o sabe. Só se tenha acontecido com outras provincias, porque
trata de conhecer se o governo tem sido negligente todas mesmo antigamente remettião seus balanços
porque a não se provar esta negligencia, parece-me taes quaes, de receita e despeza.
que não é necessario lembrar de novo aquillo de que A’ vista disto digo que sabendo o governo que
o governo se não esqueceu. O governo tanto sabia a assembléa se havia de installar devia já ter
que devia apresentar á assembléa esta informação, promptos ao menos nesta parte os seus trabalhos,
que em Agosto do anno passado pela repartição porém installou-se em 3 de Maio, ainda não
competente expedio ordens a todas as juntas de appareceu cousa alguma, portanto a meu ver não
fazenda das provincias deste imperio, para saber a merece desculpa.
importancia das contribuições directas, ou indirectas, O SR. RIBEIRO DE ANDRADA: – O que diz o
e o estado da divida passiva e activa. illustre preopinante póde ter acontecido, mas que
Desde Agosto de 1822 até agora não se tem posso affirmar, é que não ha uma só junta de
dado execução a esta ordem. Algumas das juntas fazenda a que o thesouro não tenha mandado que
disserão que remetterião, porém a maior parte dellas apresentasse o estado em que se achava sua
não remetterão: de sorte que mesmo pela repartição repartição, e que poucas, ou nenhumas o mandarão,
da fazenda se ignora isto. Demais a maior parte das e talvez que a de Goyaz tenha mandado; porém não
contas não estavão feitas; trabalharão-se no meu é sufficiente o seu relatorio nem o de duas outras
tempo, e ainda se trabalha agora. Ora, como é juntas de fazenda para se poder dar uma exacta
possivel, como ha de a repartição da fazenda informação.
apresentar o estado da receita e despeza, e o da sua Quanto á 1ª parte creio ter respondido. Agora
divida activa e passiva, sem ter acabado este quanto á outra em que se suppõe desleixo no
trabalho? ministerio, digo que elle tanto cuidou em apromptar a
Ha de fallar a verdade a esta augusta informação que já em Agosto de 1822 exigio as
assembléa? precisas noções das juntas de fazenda das
De que serviria o relatorio de cada uma das provincias como acabei de dizer. Diz o illustre
repartições, se por meio delle não pudesse a preopinante que antigamente se mandavão das
assembléa tomar um perfeito conhecimento do provincias os respectivos balanços ao erario; eu não
estado do imperio? Creio que de cousa nenhuma? me opponho a isso, mas seja-me permittido dizer
Senhores! Se o governo se não tem que balanços não são relatorios que possão servir
descuidado, se o governo não é negligente, se o para delles se tirarem exactas informações do estado
governo trabalha sobre esta materia, de que servirá da provincia, porque balanço não é outra cousa
2º officio, de que servirá lembrar-lhe que continue o senão a conta da receita e despeza de uma
trabalho de que está occupado, e de que em breve provincia.
apresentará os resultados? Eu já disse que pela Accrescenta-se que vierão algumas
repartição da fazenda se pedirão informações ás informações; eu quero conceder que viessem, mas
provincias, e tambem direi que pela repartição do estas informações não podem servir para se
imperio se pedirão da mesma maneira, porém as conhecer o estado geral do imperio, porque a este
ordens não forão cumpridas, e algumas informações conhecimento só se chega pela reunião de todas as
que vierão de muito poucas provincias são suas partes: ora como isto é o que a assembléa
imperfeitissimas: comtudo podem vir á assembléa se quer, o governo não póde por ora satisfazel-a. A
as quizer. Quando se pede o estado de qualquer unica cousa que a assembléa póde mandar é que o
repartição, é necessario que se apresente com todas governo apresente o que tem em seu poder, e isso
as circumstancias, ora, como póde isso fazer-se se então é objecto de nova indicação, mas se pede
faltão os dados principaes? informações do estado do imperio em todos os
E’ por isso que eu julgando mui digno da ramos de administração publica, pede o que se não
assembléa lembrar-se destes trabalhos, não julgo póde apresentar emquanto o governo não tiver os
necessario que se officie outra vez ao governo, e é a dados necessarios.
razão porque voto contra a indicação. O SR. FRANÇA: – Sr. presidente: eu conheço
O SR. GALVÃO: – Sr. presidente, acabo de o embaraço em que necessariamente se ha de achar
ouvir dizer que as provincias não têm mandado as o ministerio na diligencia de apresentar uma conta
informações requeridas pelo thesouro publico deste exacta do estado dos negocios publicos correntes
imperio; eu levanto-me para dizer que a junta de por cada uma das respectivas repartições do
Goyaz remetteu um balanço exacto, governo, assim como entendo
Sessão em 18 de Agosto de 1823 125

que esse embaraço não procede de facto do actual O SR. DUARTE SILVA: – Instado pelo meu
ministerio, senão do desleixo, com que os dever, e até por minha propria reputação pedi a
antecessores delle de longo têm tratado os negocios palavra para redarguir o nobre deputado o Sr.
que respeitão immediatamente ao corpo da nação. Ribeiro de Andrada na parte do seu discurso em que
Talvez a assembléa se não possa persuadir disse que sendo ministro da fazenda exigira das
da verdade de um facto, que agora lhe vou referir a provincias o relatorio do estado em que se achavão e
este respeito; e é que na repartição da fazenda não que não tinhão satisfeito.
ha um livro de proprios della, donde se não póde Como ignoro o procedimento dellas a este
saber o que está ou o que deixa de estar respeito não duvido que em geral assim tenha
encorporado nella, o que de longo tempo, ou de acontecido, mas a minha provincia satisfez
proximo possue, nem por que titulo. completamente e com promptidão a quanto lhe foi
Quando se creou o conselho da fazenda, e ordenado, respondendo a todos os quesitos com a
que eu ahi fui empregado, notando esta falta a maior clareza possivel.
representei, para que do archivo das extinctas Posso affirmar isto porque o sei como membro
provedoria e junta da fazenda desta provincia que se que fui da junta da fazenda; e até em meu poder
acha na casa do thesouro se houvessem os livros, tenho cópias das contas remettidas que posso
assentos, autos, sentenças, ou outros quaesquer apresentar se fôr preciso. Portanto a minha provincia
monumentos respectivos aos proprios da fazenda não foi omissa, nem póde entrar na generalidade
nacional, para dahi se tirarem as instrucções com que parece ter fallado o illustre preopinante.
convenientes a formar competente registro, e O SR. RIBEIRO DE ANDRADA: – Peço a
assentamento delles; praticando-se igual diligencia a palavra sómente para fazer uma explicação. Quando
respeito dos archivos das juntas de fazenda das disse que faltavão informações pedidas ás
provincias. provincias, não falIei geralmente de todas; e até
O conselho consultou sobre o assumpto; mas declarei que duas ou tres juntas as tinhão mandado.
que resultou dahi? Nada. Targini que então influia na Portanto não tem lugar algum contra mim a
repartição da fazenda, e cuja conducta official não observação do nobre deputado.
podia ter elemento proprio senão na absoluta O SR. NOGUEIRA DA GAMA: – Eu logo que
confusão da administração publica, obstou ao entrei na repartição da fazenda ordenei que se
progresso da consulta; que sendo ainda repetida, apromptassem as contas necessarias para se saber
teve o mesmo effeito e assim ficou o tal livro de o estado do thesouro publico. Continuei com estas
proprios em branco, de sorte que se não sabe quaes determinações e passados poucos dias recebi uma
são as possessões da fazenda publica, e o que se conta do estado da divida publica, não exacta mas
passa neste artigo é commum a quasi todos os approximada, pois a querer-se exacta só a
outros de que tenho noticia, pela pratica de serviço poderiamos ter depois de passar longo tempo.
que tenho tido. E' uma lastima ver de perto e como Não me contentei porém com o que veio; exigi
vão, e têm ido os negocios da nação! mais trabalho, e mandei fazer o orçamento que deve
Concluo portanto que o ministerio não póde servir de base ás minhas reflexões; e para que
apresentar conta exacta de todos os artigos de pudesse isto quanto antes apparecer determinei que
administração publica, porque lhe faltão elementos já se trabalhasse no thesouro até de tarde.
para o fazer. Portanto creio que não ha necessidade
Tudo o que delle devemos exigir é que nos vá alguma e ser indicada a urgencia, e de se renovar a
mandando aquillo que liquidamente fôr apurando; e recommendação de se apresentar este trabalho, pois
que dê providencia a emendar os erros dos seus no thesouro se está cuidando delle até de tarde
antecessores, de sorte que alfim haja conhecimento segundo as ordens que dei, e que já têm sido
do que somos, e do que fazemos, ao contrario do repetidas; e ainda que não possa dar, como já disse,
que até agora se queria, e se pensava, que era uma conta exacta, creio poder dal-a de modo que
occultar ao publico o que eramos, e o que faziamos. offereça uma idéa bem palpavel do nosso estado.
Não vou de encontro á indicação, porque entendo Se acaso me fosse encarregado o apresentar
que a assembléa não póde deliberar leis adaptadas uma conta do estado de todas as provincias do
ao bem publico da nação, sem conhecer os imperio, eu desde já diria que era impossivel, porque
elementos de que elle se compõe, os quaes nós o que temos é o balanço geral dos cofres das
exactamente só póde dar o governo, mas desejo que provincias, entradas e sahidas, e quando muito o
vamos nisso de accordo, e que se não exija de estado da sua divida tanto activa como passiva;
prompto, e talvez com censura, aquillo que só com o portanto só depois de muito tempo poderia
tempo se póde haver, pela negligencia com que os apparecer a dita conta, porque quasi todas as juntas
nossos antecessores da administração publica de fazenda, á excepção de duas ou tres, ainda não
tratarão os negocios della, segundo tenho dito. mandarão o
126 Sessão em 18 de Agosto de 1823

que dellas se exigio, e deste modo não podemos (houve grande riso na assembléa e o orador disse,
formar uma idéa geral do estado da fazenda publica senhores este riso me desconcerta, depois
do imperio do Brazil. continuou), sobre o estado da nação portugueza,
O SR. SILVA LISBOA: – Pela informação dos pouco depois de proclamada a nova ordem de
deputados ministros actuaes se certifica, que o cousas no reino; esse papel só servio de aniquillar
governo tem expedido as ordens necessarias a na Europa o pouco credito de Portugal. E' facil
terem-se das provincias as instrucções relativas á arranjar um quadro semelhante em tom de satyrico,
administração, para o governo poder apresentar censurando todas as repartições da administração
nesta augusta assembléa o estado da nação, que se publica. Mas isto não é o criterio do real estado da
exigio por officio de 23 de Maio. nação. Aquelle papel, e tudo o mais, só mostra o
O decoro do mesmo governo pois exige, que cunho da precipitação.
se lhe preste confiança, de que desempenhará esta O SR. VERGUEIRO: – Eu creio que a
funcção em tempo opportuno, sem urgencia de novo indicação deve passar, e que não ha precisão de
officio. Se o governo e tribunaes praticão essa outra. Pedem-se ao governo informações; se as não
decencia em via de regra com as autoridades póde dar mui exactas e circumstanciadas dê as que
subalternas, é incongrua a segunda canonica tiver ao seu alcance, refira o que souber. Quanto ao
admoestação, como se pratica para prevenir censura argumento de comparação que fez o illustre
ecclesiastica. Demais; só em 16 de Julho passado preopinante entre os estados e os negociantes, não
veio a noticia da restauração da Bahia; e as me parece applicavel ao Brazil.
provincias do norte, do Maranhão e do Pará, ainda Eu sei e todos sabem que não são por ora
estão no poder do inimigo. grandes as suas forças (nem tambem tão poucas
Se trata-se de saber do estado da nação como querem figurar); mas como todo o mundo
inteira, isto é, do imperio do Brazil em todas as suas conhece que é um paiz nascente, vê-se que as
partes integrantes, a execução do dito officio é augmenta cada dia, e progressivamente as
impossivel, e a exposição parcial sobre as provincias desenvolve. Portanto ainda que pelo estado da
livres não preencheria o fim do officio. nação se conheça que não temos grandes
A provincia de Goyaz sobre que fallou o cabedaes, não nos fica isso mal, nem nos
honrado deputado respectivo, está tão remota, que, desacredita.
para o destinado proposito, menos de tres mezes O que é certo é que não podemos trabalhar
decorridos é tempo inconsideravel. Além de que não sem informações e que por isso é preciso que venha
parece urgente a apresentação do estado da nação, o que puder vir: e não nos metta susto o saber-se o
ainda inteiro; porque a se publicar, só teria o effeito que se passa entre nós; aliás não se poderia
de mostrar as nossas chagas lazaras. trabalhar em estatistica, e despresariamos este
O Brazil é grande em possibilidade, e não em objecto que é hoje reconhecido por um dos da mais
actualidade, quanto a riqueza, população, e o que alta importancia.
constitue os estados conspicuos. Por ora tem grande O SR. HENRIQUES DE REZENDE: – Sr.
consideração, pelo que, physica e geographicamente presidente: pedi a palavra para fazer uma breve
avulta no mappa do mundo. O credito politico nisto reflexão. O nobre deputado que fallou hoje em
se funda. Talvez se minore com a publicação da primeiro lugar sobre esta materia disse que nada
realidade. Os estados são como os negociantes, cuja podiamos fazer sem informações do governo; e outro
reputação sobresahe mais pelo vasto credito, que illustre preopinante disse que as não devemos pedir,
por seu effectivo capital. e que até não convém que se saiba o seu conteúdo;
Depois da celebre Compte Rendu de Necker ora, sommadas estas duas opiniões acho que o
sobre o estado das finanças da França (que todavia producto é irmo-nos embora porque se nada
nada obstou á revolução), têm apparecido obras podemos fazer sem informações e não as devemos
litterarias principalmente em Inglaterra, sobre o pedir, que fazemos aqui? Livre-nos Deus que passe
estado da nação. Todavia o governo inglez não faz semelhante doutrina! E' dever nosso fazer as
esse manifesto official e circumstanciado, e só o rei necessarias reformas; e por isso deve o governo
na abertura do parlamento expõe in globo o mandar as informações que puder.
progresso da riqueza e potencia do paiz, e as suas Bem creio que algumas provincias terão sido
adversidades ou glorias. omissas; e talvez seja uma dellas a junta da fazenda
A formação de uma estatistica geral é obra de da minha provincia; mas torne-se a exigir e com
muito tempo, como foi a da França. O publico urgencia, porque até julgo que nos será difficultoso
litterario e os gabinetes dão-lhe muitos descontos. adiantar muito na constituição sem ellas; ao menos
Um honrado deputado da Bahia menciona a falla que eu assim penso. Voto pois pela indicação para que
fez o deputado Manoel Fernandes Thomaz (que se diga novamente ao governo que nos são precisas
Deus haja em gloria). as pedidas informações.
Sessão em 19 de Agosto de 1823 127

O SR. MONTESUMA: – Sr. presidente, A consequencia será desharmonia entre o corpo


levanto-me para me oppôr ao illustre deputado o Sr. legislativo e o poder executivo. Faça-se embora nova
Lisbôa que querendo destruir a urgencia da minha indicação para que o governo remetta a conta do que
indicação, fallou de algumas nações da Europa, e póde actualmente constar das secretarias de estado
trouxe o exemplo da França onde se desenvolveu sobre o objecto; mas forçal-o a executar o impossivel
mais o espirito revolucionario, depois que Necker de dar o inteiro estado da nação, é absurdo.
apresentou na assembléa o relatorio do estado em Por ter dado a hora declarou-se adiada a
que se achava a nação, e se vio qual era a sua discussão.
divida. O Sr. Presidente assignou para a ordem do
Porém, Sr. presidente, eu já creio que ha uma dia:
differença muito grande entre o estado do Brazil e o 1º. A 2ª discussão do projecto sobre o modo
das nações de que fallou o illustre preopinante. O de passar cartas aos alumnos da academia medico-
Brazil não era nação, hoje quer constituir-se tal, e as cirurgica: 2º. Segundas leituras de propostas. 3º.
outras nações de que fallou o illustre preopinante já Regimento da assembléa.
estavão constituidas; ora, como ha de o Brazil Levantou-se a sessão ás 2 horas da tarde.–
constituir-se sem saber o estado em que se acha? Manoel José de Souza França, secretario.
Não é possivel dar um só passo, sem essas prévias
noções; e portanto não se póde argumentar para SESSÃO EM 19 DE AGOSTO DE 1823.
aqui com o que se faz na Europa.
Sr. presidente, eu penso precisamente o PRESIDENClA DO SR. BISPO CAPELLÃO-MÓR.
contrario do illustre preopinante, entendo que
devemos ter franqueza e mostrar á nação em que se Reunidos os Srs. deputados pelas 10 horas da
emprega o seu suor, e o seu sangue; e é preciso que manhã, fez-se a chamada, e acharão-se presentes
os povos saibão que os seus representantes 70, faltando com causa participada os Srs. Pereira
procurão adquirir todos os conhecimentos da Cunha, Andrada Machado, Gondim, Ribeiro de
necessarios para poderem remediar os seus males. Rezende, Andrada e Silva, Marianno Cavalcanti e
Considero inteiramente absurdo dizer-se que Carneiro da Cunha.
devemos esconder á nação o seu estado. Deus nos O Sr. Presidente declarou aberta a sessão, e
livre que o façamos! Se o estado da nação fôr o do lida a acta da antecedente foi approvada.
moribundo, saiba-o a nação, desenvolva-se o Passou-se á ordem do dia que era 2ª
patriotismo, que faz do homem escravo homem livre, discussão do projecto sobre a fórma de passar
e busquem-se por sua vontade para evitar o cartas aos alumnos da academia medico-cirurgica,
precipicio, medidas energicas, ainda que sejão com as respectivas emendas offerecidas na sessão
custosas para se alcançarem as vantagens que 13 do corrente pelos Srs. Carneiro de Campos,
procuramos. Teixeira Vasconcellos e Galvão.
Além disto, Sr. presidente, todas as provincias Art. 1º. O director da academia medico-
ainda não se decidirão a favor da causa; falta Pará e cirurgica mandará passar cartas aos alumnos, depois
Maranhão, e a reunião destas provincias depende do de feitos os ultimos exames do 5º anno, verificando-
resultado dos nossos trabalhos. Procedamos pois se por elles o complemento do curso academico.
com franqueza, estabeleçamos a nossa liberdade e (Fallárão sobre a doutrina os Srs. Gomide,
facilmente se uniráõ a nós as que faltão para se Teixeira Vasconcellos e Montesuma; mas nada se
formar de todas uma só familia, e adquirir-se a entendeu do que escreveu o tachygrapho
necessaria força moral, sem a qual não Possidonio.)
conseguiremos ser verdadeiramente livres. E' por Julgada a materia discutida passou-se ao
isso que eu insisto para que se mande a indicação: artigo seguinte:
este será sempre o meu voto. Art. 2º. Serão passadas e subscriptas as
O SR. SILVA LISBOA: – Com duas duzias de cartas pelo secretario, assignadas pelo director, e
palavras sonoras se podem fazer eloquentes fallas. selladas com o sello academico.
Não contestei a conveniencia de saber a assembléa (Fallárão os Srs. Gomide, Galvão, Montesuma,
do estado da nação; mas a questão é sobre o decoro Araujo Lima e Henriques de Rezende; mas é
do governo, que entendo se desluz com a instancia inintelligivel o mesmo tachygrapho.)
da proposta feita para cumprir já o officio que a esse O SR. FERREIRA ARAUJO: – O
respeito se lhe expedio: disse convir esperar que o conhecimento da economia de differentes
governo faça o seu dever. Supponha-se que elle não academias, em que por mais de vinte annos tenho
satisfazia ao segundo officio. tido parte, me obriga a lembrar um additamento, que
Por ventura teria lugar a terceira canonica me parece conducente ao melhor desempenho do
admoestação? Supponha-se que tambem esta não objecto proposto.
tivesse logo resultado. Que recurso restará? O artigo determina que as cartas sejão
assignadas
128 Sessão em 19 de Agosto de 1823

sómente pelo director, e eu quereria que, a exemplo do Foi regeitado.


que se praticava em uma das academias em que tive a O Sr. Montesuma tambem offereceu a seguinte:
honra de servir, e que mais analogia tem com a
medico-cirurgica, fosse tambem necessaria a EMENDA
assignatura dos respectivos lentes. Duas são as
razões que me induzem a exigir esta condição. Proponho que se substituão ás palavras do art.
A primeira é conservar com esta dependencia o 3º – medico-cirurgica – as seguintes – cirurgica e
respeito dos lentes, classe desgraçada, á qual com medico-cirurgica neste imperio, na fórma dos arts. 14 e
razão se póde applicar o que da militar disse Voltaire, 15 dos estatutos das mesmas academias datados de
que é mais honrosa que honrada, e á qual ainda não 29 de Dezembro de 1815. – O deputado Montesuma.
chegarão as vantagens concedidas a todas as outras. Foi apoiada.
A segunda é constituir os mesmos lentes Julgou-se debatido o artigo, e passou-se aos
fiscaes da excepção da lei; porquanto, ainda que se additamentos do Sr. Galvão offerecidos na 1ª
deva presumir que todos os directores sejão ornados discussão.
das luzes e probidade indispensaveis, não seria novo O SR. MONTESUMA: – (Não se entendeu o
que se introduzisse com o tempo algum abuso com tachygrapho.) Depois do discurso mandou á mesa a
esta amplissima liberdade de autorisar por si só seguinte emenda ao additamento do Sr. Galvão:
aquelles de quem ha de depender a saude e a vida
dos cidadãos; e o mal que se quer extinguir, não EMENDA
fizesse mais do que tomar nova fórma.
Se os incapazes de progredir na carreira dos Proponho que ao additamento do Sr. Galvão se
estudos não viessem occupar os lugares devidos ao supprimão as palavras – emquanto se fazem estatutos
merecimento, talvez algum se habilitasse com mingua proprios – substituindo-se-Ihes – emquanto outra
de algum requisito, que não póde julgar superfluo em cousa se não determinar. – O deputado Montesuma.
materia de tanta importancia; o que jámais teria lugar Foi apoiada.
se o respectivo lente abonasse com a sua assignatura O SR. CARVALHO E MELLO: – (Não se
os conhecimentos do habilitado. Portanto espero que entendeu o tachygrapho.) No fim do seu discurso
seja bem recebida a emenda que offereço. mandou á mesa a emenda seguinte:
Depois da palavra – director – accrescente-se – Peço a suppressão de todo o additamento. –
e lentes. – Ferreira de Araujo. Carvalho e Mello.
Não foi apoiada. Foi apoiada.
O Sr. Rocha Franco mandou á mesa a emenda O Sr. Montesuma pediu novamente a palavra, e
seguinte: mandou á mesa as duas seguintes emendas:
Accrescente-se – serão passadas – 1º. – Proponho que ao § 1º do additamento do
gratuitamente. – Rocha Franco. Sr. Galvão se accrescentem as palavras. – Emquanto
Foi apoiada. á economia dos exames e passar das cartas.
O SR. ARAUJO LIMA: – (Não se entendeu o 2º. – Ao 3º § proponho que se supprima as
tachygrapho.) – No fim do seu discurso offereceu a palavras – cidade da Bahia – sendo a oração – os
seguinte: governos entre os lentes das academias nomearáõ
para seus directores um que terá, etc. – O deputado,
EMENDA Montesuma. – Forão ambas apoiadas.
O Sr. Galvão offereceu tambem uma emenda
Proponho que a commissão dê os formularios ao art. 2º do seu addittamento nos termos seguintes:
para as duas cartas que se devem passar aos
alumnos, e em nome de quem devem ser passadas. – EMENDA
Araujo Lima.
Foi apoiada. Devolvendo-se para as respectivas academias o
Julgando-se o artigo discutido, passou-se ao direito de approvar e facultar licença para curar aos
seguinte: que tiverem estudado nas academias estrangeiras, e
Art. 3º Com esta carta, e sem dependencia de vierem munidos dos competentes diplomas. – Galvão.
outro algum exame, poderá cada alumno exercitar a Foi apoiada.
praxe medico-cirurgica neste imperio. Julgou-se a materia discutida, e propoz o Sr.
O Sr. Lopes Gama offereceu o seguinte: presidente.
1º. Se a assembléa julgava concluida a 2ª
ADDITAMENTO discussão. – Venceu-se que sim.

Sendo todavia obrigado a registrar a dita carta


nas respectivas camaras onde quizer exercitar a sua
profissão. – O deputado Lopes Gama.
Sessão em 19 de Agosto de 1823 129

2º – Se passava o projecto á 3ª. – Venceu-se EMENDA


tambem que sim.
Seguiu-se a 2ª parte da ordem do dia, isto é, No art. 143 onde diz – ou se houver longo
segundas leituras de propostas; e o Sr. secretario impedimento – substitua-se-lhe – por espaço de 10
Costa Aguiar leu o projecto do Sr. Carneiro da Cunha dias. – Costa Barros.
sobre o córte de pau-brazil, offerecido na sessão de 28 Foi apoiada.
de Julho. O SR. COSTA AGUIAR: – Estou pelo parecer
Mas como seu illustre autor não estivesse do Sr. França, e reprovo a emenda do Sr. Andrade e
presente entrou em duvida se deveria discutir-se a Lima; é verdade que a ser admissivel poupariamos
urgencia; e apezar de sustentar o Sr. Araujo Lima que assim muito tempo; mas não póde ter lugar, tanto por
devia debater-se resolveu a assembléa que ficasse não estarmos todos reunidos como pelo motivo
adiada por oito dias a discussão da competencia da apontado pelo Sr. França; os papeis as eleições feitas
materia. nunca se guardarão porque nunca houve ordem para
Passou-se ao regimento da assembléa, e isso, e portanto não póde saber-se qual foi o
começou-se pelo art. 142 que ficára adiado na sessão immediato em votos.
antecedente com as emendas dos Srs. Teixeira de Quanto á emenda do Sr. Costa Barros, eu
Gouvêa e Maia. tambem sou de voto que se marque um prazo, mas
O SR. FRANÇA: – Este artigo precisa ser parece-me mui curto o assignado, e por isso proporei
alterado: 1º, porque se falla de commissões de fóra que seja de 15 dias. Eis-aqui a minha:
como se já dellas se tivesse tratado; quando nem no
capitulo das commissões uma só palavra se diz a seu EMENDA
respeito: 2º, porque é justo conservar o que já se
pratica sobre as ditas commissões de fóra. Por estas Em lugar dos 10 dias lembrados pelo Sr. Costa
razões offereço a seguinte: Barros substituo 15 dias. – Costa Aguiar.
Foi apoiada.
EMENDA Julgou-se discutido o artigo, e posto á votação
foi approvado tal qual estava redigido, ficando portanto
A eleição dos membros de todas as prejudicadas as emendas.
commissões interiores tanto permanentes como Art. 144. A escolha das deputações de que se
especiaes ou ad hoc será feita da mesma maneira que falla no capitulo das formalidades será feita pelo
a dos secretarios. (Art. 140.) presidente da assembléa.
Os membros das commissões de fóra serão O SR. TEIXEIRA DE GOUVÊA: – Parece-me
approvados sobre proposta das commissões interiores. que este artigo deve sofrer alteração, porque eu não
– O deputado França. sei que haja mais deputações do que aquellas de que
Foi apoiada. se falla no capitulo das formalidades, e a fórma porque
(Fallárão os Srs. Araujo Vianna, Montesuma e está redigido o artigo indica que temos outras, o que
Costa Aguiar, mas não se entendeu o tachygrapho não é assim.
Silva.) Portanto offereço a seguinte:
Julgando-se a materia discutida, propoz o Sr.
presidente: EMENDA
1º Se passava o artigo como estava redigido. –
Não passou. Proponho que se supprimão as palavras – de
2º Se a emenda do Sr. França se approvava. – que se falla no capitulo das formalidades. – Teixeira de
Foi approvada em ambas as suas partes; ficando por Gouvêa.
isso as outras prejudicadas. Foi apoiada.
Art. 143. Se vagar algum membro de Julgou-se discutida a materia e o Sr. presidente
commissão, ou se houver longo impedimento, será propoz:
eleito outro pela mesma fórma que os demais 1º Se o artigo passava como estava. – Venceu-
membros. se que não.
O Sr. Andrade Lima offereceu a seguinte: 2º Se passava com a emenda do Sr. Teixeira de
Gouvêa. – Venceu-se que sim.
EMENDA Art. 145. Haverá na assembléa commissões
permanentes e especiaes para a expedição dos
Substitua-se a – será eleito, etc. – supprirá o negocios que nella se tratem.
immediato em maioria de votos. Foi approvado.
Paço da assembléa, 19 de Agosto. – Luiz Art. 146. As commissões permanentes são: 1ª,
Ignacio de Andrade Lima. da constituição e sua redacção; 2ª, da legislação e
Foi apoiada. justiça civil e criminal; 3ª, de commercio, agricultura,
O Sr. Costa Barros tambem offereceu a industria e artes;
seguinte:
130 Sessão em 19 de Agosto de 1823

4ª, da marinha e guerra; 5ª, da fazenda nacional, 6ª, EMENDA


da instrucção publica; 7ª, de poderes; 8ª, do
ecclesiastico; 9ª, da estatistica e diplomatica; 10ª, da Requeiro que se accrescente ás commissões
redacção do Diario da Assembléa; 11ª, da policia e uma de minas e bosques. – O deputado Camara.
inspecção da casa em que são membros natos o O Sr. Maia pediu igualmente a palavra e
presidente e secretarios. offereceu á consideração da assembléa a proposta
O Sr. Costa Aguiar notando que no artigo se seguinte:
não tinha feito menção de algumas commissões mui Proponho que se ponha á votação se deve
necessarias, e que relativamente á da policia elle existir ou extinguir-se a commissão de politica
estava concebido na supposição de que a mesa se interna. – Maia. (*)
compunha de dous secretarios, quando agora tinha Fizerão-se algumas reflexões, e julgando-se
quatro, offereceu o seguinte: afinal discutida a materia, propoz o Sr. presidente:
1º Se passava o artigo como estava. – Não
ADDITAMENTO passou.
2º Se passava a emenda do Sr. Costa Aguiar.
Deve accrescentar-se ao numero das – Foi approvada.
commissões as seguintes – de petições – de saude 3º Se passava a do Sr. Carneiro de Campos. –
publica – de colonisação, cathechese e civilisação Foi approvada.
dos indios; e no fim do artigo depois da palavra 4º Se passava a do Sr. Araujo Lima. – Foi
presidente – e os dous primeiros secretarios, – Costa approvada.
Aguiar. 5º Se passava a do Sr. Camara. – Foi
Foi apoiado. approvada.
O SR. CARNEIRO DE CAMPOS: – Quando Depois de algumas observações em que se
no principio deste artigo se aponta a commissão de mostrou a necessidade da commissão de policia
constituição diz-se – e da sua redacção, – o que me interna, resolveu-se pelo que propuzera o Sr.
parece que deve supprimir-se porque este regimento deputado Maia, que della se fizesse menção no
tambem serve nas legislaturas futuras em que não artigo.
ha redacção de constituição, pois ha de ficar Art 147. Para os casos occurrentes que assim
acabada por esta assembléa constituinte. Para a o exigirem a assembléa nomeará todas as
suppressão das ditas palavras eu mando á mesa commissões especiaes que lhe parecerem.
uma emenda. O SR. FRANÇA: – Julgo necessario um artigo
Tire-se – e sua redacção. – Carneiro de addicional que a ser approvado deve ter lugar entre o
Campos. que está em discussão e o antecedente. Eu o mando
Foi apoiada. á mesa.
O SR. VERGUEIRO: – A commissão é que é Artigo addicional ao art. 146. – Além destas
indispensaveI ainda mesmo nas outras legislaturas commissões interiores haverão tantas commissões
para todos os negocios que disserem respeito á auxiliares de fóra quantas a assembléa julgar
constituição, pois por ella se devem examinar; mas necessarias á requisição das respectivas
quanto á emenda não tenho duvida em approval-a. commissões interiores. – O deputado França.
O Sr. Araujo Lima offereceu tambem a Foi apoiada.
seguinte: Por ser chegada a hora da leitura dos
pareceres declarou o Sr. presidente adiada a
EMENDA discussão; e o Sr. Ribeiro de Andrada leu por parte
das commissões reunidas de fazenda e commercio o
Proponho que se crêe uma commissão de seguinte:
redacção das leis. – Araujo Lima.
Foi apoiada. PARECER
O Sr. Camara disse que tambem tinha que
pedir a creação de uma nova commissão, e que para A commissão da fazenda e artes, tomando em
isso fizera a seguinte: consideração as representações da camara da
cidade de S. Paulo e de muitos de seus moradores
relativas ao dessecamento da vargea

(*) Na acta menciona-se como offerecida a este art. 146, uma emenda do Sr. Maia que começa – A eleição dos
membros, etc.; – mas sendo ella a mesma já proposta ao art. 142 na sessão de 18 do corrente, e não me parecendo ter
a sua doutrina applicação ao art. 146, entendo que o Sr. secretario se enganou julgando-a offerecida a este por achal-a
entre as mais emendas, como devia estar por ter passado da sessão antecedente para esta, em consequencia de ficar
adiado o artigo a que ella pertencia e que se decidiu na presente sessão, como se póde vêr na pagina 129 columna 1ª
desta sessão.
Sessão em 19 de Agosto de 1823 131

do Carmo e atterrado da ponte do mesmo nome; a Quanto á primeira, isto é, da aposentadoria,


consulta da mesa do desembargo do paço sobre tão reconheceu o conselho que não havia lei que
importante objecto; a planta e plano de trabalhos determinasse aposentadorias aos officiaes do thesouro;
offerecido pelo sargento-mór engenheiro Moreira, mas uniformemente entendeu que o supplicante a
encarregado de taes exames; e os fundos destinados merecia, porque um funccionario que servio á nação
para começo, continuação e complemento da referida pelo longo espaço de mais de cincoenta annos com
obra; o reconhecendo por um lado a necessidade de probidade, achando-se impossibilitado pela sua
enxugar a dita vargea, e fazer o aterrado para avançada idade de mais de oitenta e cinco annos para
commodidade dos viandantes, proveito dos continuar no exercicio do seu emprego, estava nas
proprietarios daquelles terrenos e salubridade do clima, circumstancias de ser attendido como pedia. E
e por outro lado a insufficiencia e inutilidade dos passando á outra parte do pedido do supplicante o
reparos projectados por delles se não poderem esperar conselho propoz o arbitrio de ficar applicada para o
os resultados que se desejão, é de parecer: pagamento daquella divida, metade do ordenado do
1º Que se não applique para a mencionada obra supplicante e os 680$000 que para quebras ou falhas
a contribuição voluntaria do caminho de Santos, visto recebe annualmente o thesoureiro-mór do thesouro,
ser esta renda não publica, porém particular, que não que é o primeiro responsavel por taes falhas, e que
póde ser distrahida do fim para que foi destinada, sem abonou a divida do supplicante.
consentimento dos contribuintes. Neste arbitrio não convierão dous conselheiros,
2º Que por ora se não sanccione a contribuição por ser negocio entre particulares, e recommendarão o
accordada em camara, por ser um conhecido gravame deferimento da supplica. O governo resolveu a
que não póde ser compensado com a utilidade futura consulta, dizendo que o supplicante devia recorrer a
daquelles povos. esta assembléa. Assim o faz o supplicante no
3º Que se remetta ao governo a memoria e requerimento junto, que foi remettido á commissão da
planta juntas do dito Moreira, e se lhe diga que haja de fazenda.
novamente encarregar exames de tanta entidade á A commissão tendo examinado as razões em
algum hydraulico habil e pratico, e que com as que é fundado o requerimento do supplicante e que se
observações deste, tanto sobre os trabalhos que se achão desenvolvidas no parecer do conselho da
devem fazer, como sobre a computação das despezas, fazenda dado na consulta junta; é de parecer que o
informe a assembléa para esta então deliberar quaes requerimento do supplicante é indeferivel, porque não é
os fundos que se devem destinar para tão interessante fundado em lei.
obra. Entende porém a commissão, que a
Paço da assembléa, 18 de Agosto de 1823. – aposentadoria que o supplicante pede, pelas
Martim Francisco Ribeiro de Andrada. – José Arouche circumstancias de que se acha revestida, póde fazer
de Toledo Rendon. – Barão de Santo Amaro. – Manoel objecto de uma deliberação desta assembléa, ainda
Jacintho Nogueira da Gama. – José de Rezende Costa. antes de dar as providencias geraes para que os
– José Teixeira da Fonseca Vasconcellos. – João empregados publicos que bem servem á nação não
Severianno Maciel da Costa. – Luiz José de Carvalho e morrão de fome, quando por idade avançada ou outra
Mello. – João Gomes da Silveira Mendonça. – Nicoláo impossibilidade, não possão continuar no exercicio dos
Pereira de Campos Vergueiro. – José da Silva Lisboa. seus empregos:
Foi approvado. Paço da assembléa, 17 de Agosto de 1823. –
Leu depois, por parte da commissão de fazenda, Barão de Santo Amaro. – José Arouche de Toledo
o seguinte: Rendon. – Manoel Jacintho Nogueira da Gama. – José
de Rezende Costa.
PARECER Por haver quem fallasse contra elle, ficou adiado.
O Mesmo Sr. Deputado, por parte da commissão
Francisco Duarte Nunes, fiel pagador do de instrucção publica, leu o seguinte:
thesouro publico, pediu ao governo a sua aposentadoria
com o mesmo ordenado que vence de 800$000, e PROJECTO DE LEI
outrosim providencia para poder pagar a divida de
6:800$000 que contrahiu para preencher o alcance de A assembléa geral constituinte e legislativa do
igual quantia em que achou o seu cofre em um dos Brazil decreta:
balanços semestraes do mesmo thesouro. O governo 1º Haverão duas universidades, uma na cidade
mandou consultar sobre este negocio o conselho da de S. Paulo e outra na de Olinda; nas quaes se
fazenda, que feitas as diligencias preliminares do estylo ensinaráõ todas as sciencias e bellas letras.
dividiu o pedido do supplicante em duas partes. 2º Estatutos proprios regularáõ o numero e
ordenados dos professores, a ordem e arranjamento
dos estudos.
3º Em tempo competente se designaráõ os
fundos precisos a ambos os estabelecimentos.
132 Sessão em 19 de Agosto de 1823

4º Entretanto haverá desde já um curso á do Sr. barão de Santo Amaro, offereço uma
juridico na cidade de S. Paulo para o qual o governo emenda indicando o que se deve agora pedir:
convocará mestres idoneos, os quaes se governaráõ
provisoriamente pelos estatutos da universidade de EMENDA
Coimbra, com aquellas alterações e mudanças que
elles, em mesa presidida pelo vice-reitor, julgarem Que o governo nos informe aquillo que fôr
adequadas ás circumstancias e luzes do seculo. possivel, visto o imperfeito conhecimento que o
5º Sua Magestade o Imperador escolherá mesmo governo deve ainda ter do estado em geral
d'entre os mestres um para servir interinamente de do imperio. – Alencar.
vice-reitor. Foi apoiada.
Paço da assembléa, 19 de Agosto de 1823. – O SR. CARNEIRO DE CAMPOS: – Já se tem
Martim Francisco Ribeiro d'Andrada. – Antonio aqui expendido as razões que impossibilitão o
Rodrigues Velloso d’Oliveira. – Belchior Pinheiro governo de dar por ora as informações exigidas pela
d'Oliveira. – Antonio Gonçalves Gomide. – Manoel indicação do Sr. barão de Santo Amaro, e lembradas
Jacintho Nogueira da Gama. de novo pelo Sr. Montesuma; agora vejo que se
Foi requerida a urgencia, e vencida pretende pela proposta do Sr. Alencar que o
unanimemente sem discussão; e fazendo-se logo a governo, visto que está demonstrado que as não
2ª leitura, venceu-se tambem que era objecto de póde dar exactas, as dê como puder.
deliberação, e mandou-se imprimir para ser debatido. Eu direi francamente, Sr. presidente, que
Entrou novamente em discussão a indicação noções imperfeitas de nada podem servir nesta
do Sr. Montesuma, debatida e adiada na sessão assembléa; creio que não se ha de trabalhar sobre
antecedente, para se pedirem ao governo bases falliveis, porque os resultados de taes
informações sobre o estado do imperio. trabalhos não podem ser seguros.
O SR. CARVALHO E MELLO: – (Não se As ordens para se obterem as informações
entendeu o tachygrapho Silva.) precisas já se expedirão, e quando o governo as tiver
O SR. COSTA BARROS: – Os nossos satisfará como deve ao requerido por esta
honrados collegas que são ministros de estado já assembléa; o que se quer exigir agora só póde servir
têm dado as razões da falta das informações para a precipitar em erros, quando pelo contrario
pedidas; e portanto creio que devendo nós mostrar nada deve sahir deste augusto recinto que não seja
aos povos que nos não esquecemos deste maduramente considerado e solidamente
importante objecto, justo é que façamos o possivel estabelecido. Opponho-me portanto ao que propôz o
para que o governo não descance sobre isto como nobre preopinante, e voto que se espere por
fez o passado, que sómente se occupou do que lhe informações exactas.
pareceu necessario a seus fins; mas esse mal já Por ter dado a hora ficou de novo adiada a
passou, e cuidemos do presente. discussão.
Nós não temos noções algumas dos O Sr. Presidente assignou para a ordem do
differentes ramos de administração publica, nem dia:
sabemos sequer qual é a nossa tropa de 1ª e 2ª 1º. Sessão secreta. 2º. O projecto da
linha; e desde que se pedirão informações geraes proclamação da assembléa aos brazileiros. 3º. A
sobre o estado actual da nação já havia tempo de proposta da mesa sobre varios empregados, adiada
nos mandarem alguma cousa, visto que não é na sessão de 12 de Agosto. 4º. Regimento da
possivel dar conta exacta de tudo. Ora, dizer isto ao assembléa.
governo não é certamente offendel-o, e como o julgo Levantou-se a sessão ás 2 horas da tarde. –
necessario voto que se lhe diga. Manoel José de Souza França, secretario.
O SR. ALENCAR: – A indicação que se fez
em Maio, e que por assim dizer se repete agora, RESOLUÇÕES DA ASSEMBLÉA
exige informações do estado do imperio em geral,
comprehendidas todas as repartições, mas tem-se PARA JOSÉ JOAQUIM CARNEIRO DE CAMPOS
aqui demonstrado que não é possivel satisfazer o
governo ao que delle se exigio, porque não tem os Illm. e Exm. Sr. – A assembléa geral
dados necessarios para apresentar um trabalho constituinte e legislativa do imperio do Brazil,
exacto e circumstanciado; e ao mesmo tempo approvando o parecer da commissão de fazenda
conhece-se que nos são indispensaveis algumas sobre o requerimento de D. Henriqueta Emilia
noções; diga-se pois ao governo que nos dê o que Moreira de Figueiredo e D. Manoela Adelaide
puder; e como para isso julgo que não serve a Moreira, filhas do fallecido conselheiro Manoel
indicação que se está debatendo, porque se refere Moreira de Figueiredo que pedirão os meios
inteiramente ordenados com que fôra aposentado o dito seu pai
em remuneração de seus serviços; manda participar
ao governo que para deliberar sobre
Sessão em 22 de Agosto de 1823 133

este objecto precisa que lhe seja remettida a outras semelhantes sempre se concederão por tarifa
consulta da junta de commercio relativa á mesma pela secretaria de estado dos negocios do imperio:
pretenção e resolvida em 17 de Julho do anno S. M. o Imperador me ordena que remetta a V. Ex.
passado. O que V. Ex. levará ao conhecimento de S. para serem presentes na augusta assembléa geral
M. Imperial. – Deos guarde a V. Ex. Paço da constituinte e legislativa, as mencionadas consultas,
assembléa, em 18 de Agosto de 1823. – José afim de resolver sobre este objecto o que entender
Ricardo da Costa Aguiar de Andrada. conveniente.
Deus guarde a V. Ex. Palacio do Rio de
PARA MANOEL JACINTHO NOGUEIRA DA GAMA Janeiro, em 19 de Agosto de 1823. – José Joaquim
Carneiro de Campos. – Sr. José Ricardo da Costa
Illm. e Exm Sr. – A assembléa geral Aguiar de Andrada.
constituinte e legislativa do imperio do Brazil Foi remettido á commissão de legislação.
approvando o parecer da commissão de fazenda Illm. e Exm. Sr. – Em cumprimento da
sobre o requerimento de Sebastião Teixeira Leitão, e resolução da assembléa geral constituinte e
outros negociantes de molhados do arraial de Itabira legislativa, que V. Ex. me participou em officio de 14
na provincia de Minas-Geraes, que pedem a do corrente mez, para que lhe fossem remettidos os
suppressão do imposto por elles pago, ha mais de 20 requerimentos e documentos pertencentes ao chefe
annos, a titulo de subsidio voluntario, para a de esquadra Antonio Joaquim dos Reis Portugal, que
reedificação do palacio de Nossa Senhora d’ Ajuda, existissem na repartição dos negocios do imperio,
em Portugal: manda participar ao governo que afim de poder com as convenientes noções deliberar
precisa, que pela repartição do thesouro se exijão da o que fôr justo sobre a pensão que requereu o
junta da fazenda da sobredita provincia as sobredito chefe de esquadra em remuneração de
necessarias informações sobre a especialidade, ou seus serviços: de ordem de S. M. o Imperador
generalidade do referido subsidio, sua importancia remetto a V. Ex. os mencionados requerimentos e
annual, e actual applicação, e que lhe sejão mais papeis relativos ao supplicante para que V. Ex.
remettidas afim de poder deliberar sobre esta se digne leval-os ao conhecimento da mesma
materia. O que V. Ex. levará ao conhecimento de S. augusta assembléa.
M. Imperial. – Deus guarde a V. Ex. Paço da Deus guarde a V. Ex. Palacio do Rio de
assembléa, 18 de Agosto de 1823. – José Ricardo Janeiro, em 19 de Agosto de 1823. – José Joaquim
da Costa Aguiar de Andrada. Carneiro de Campos. – Sr. José Ricardo da Costa
Aguiar d' Andrada.
SESSÃO EM 22 DE AGOSTO DE 1823. Foi remettido á commissão de fazenda.
Leu mais outro officio do ministro dos negocios
PRESIDENCIA DO SR. BISPO CAPELLÃO-MÓR. da justiça concebido nos termos seguintes:
Illm. e Exm. Sr. – Por ordem de S. M. o
Reunidos os Srs. deputados pelas 10 horas da Imperador participo a V. Ex. em resposta do seu
manhã fez-se a chamada, e acharão-se presentes officio de 16 do corrente, que João José Martins
66, faltando com causa participada os Srs. Pereira Pamplona Côrte Real é um dos passageiros da
da Cunha, Andrada Machado, Pinheiro de Oliveira, escuna Catharina apprehendida e sequestrada no
Andrada e Silva e Ribeiro de Andrada, e sem ella os porto de Santos em Dezembro do anno passado:
Srs. Muniz Tavares, Carneiro de Campos, Arouche sendo a conta desta apprehensão e sequestro, e os
Rendon, Rodrigues da Costa, Araujo Lima e Costa papeis achados á tripolação e passageiros que
Barros. ficarão presos na fortaleza da barra, dirigidos á
O Sr. Presidente declarou aberta a sessão, e secretaria de estado dos negocios do imperio, aonde
lida a acta do dia 19 (porque as sessões dos dias 20 estiverão demorados até 29 de Abril. Neste dia
e 21 tinhão sido secretas) foi approvada. expediu-me o ministro e secretario de estado
O Sr. Secretario Costa Aguiar leu o seguinte daquella repartição uma portaria com os ditos
officio do ministro dos negocios do imperio: papeis, para que sendo por mim dirigidos ao juiz de
Illm. e Exm. Sr. – Havendo a mesa do fóra de Santos, procedesse este na fórma da lei,
dezembargo do paço consultado sobre os dando livramento aos presos.
requerimentos de Antonio Tavares Corrêa, D. E porque no exame que fiz achasse a falta do
Joaquina, D. Anna e D. Joanna Marques de Lima, e passaporte, e inventario da escuna, e d' um
Manoel Marques de Souza, Felippe Antonio do requerimento com tres certificados feito pelo mestre
Amaral e Manoel Affonso Vellado, que pedem em Pernambuco, pedi estes documentos á mesma
dispensas de lapso de tempo para medição e repartição, e não existindo alli, forão-me ultimamente
confirmação de sesmarias; e não se julgando agora remettidos pelo da fazenda com portaria de 2 de
o governo autorisado para conceder as sobreditas Junho; expedindo eu então a competente ordem ao
dispensas, posto que estas e juiz de fóra em 10 do mesmo mez.
Depois de expedida esta ordem, chegou
134 Sessão em 22 de Agosto de 1823

uma informação do governo da provincia de S. Paulo decente usarmos de taes epithetos odiosos contra
sobre um requerimento do sobredito Pamplona, em autoridades constituidas pela vontade e poder da
que pedia ser transferido para esta côrte, para aqui nação; pois que facilmente tambem passão, no
se justificar, mas não podendo ser deferido, por conceito do vulgo, das pessoas a quem se impõe,
terem sido enviados os papeis que lhe dizião aos empregos que os não merecem; e de crer é, que
respeito, expedi em 18 de Julho segunda ordem se assim damos o exemplo de menospreço á
áquelle magistrado, para que désse prompta representação nacional, nelle viremos a incorrer
execução á de 10 de Junho, remettendo os autos e a daqui a pouco. Os erros, ou já a má vontade com
sentença que proferisse á secretaria de estado dos que obrarão as côrtes de Portugal a nosso respeito,
negocios da justiça. tiverão a sua boa e competente resposta no facto
Elle não deu ainda conta do cumprimento das com que, separando-nos da sua representação,
referidas ordens, nem eu posso dar a V. Ex. mais deixamos para sempre a communidade politica que
ampla informação, para chegar ao conhecimento da mantinhamos com o mesmo Portugal.
assembléa geral constituinte e legislativa deste A nação portugueza pois que se ressinta
imperio. embora por muito tempo da má politica dos seus
Deus guarde a V. Ex. Palacio do Rio de representantes nacionaes pela perda que ella lhe
Janeiro, em 20 de Agosto de 1823. – Caetano Pinto causou; assim como se resente ainda tambem de
de Miranda Montenegro. – Sr. José Ricardo da Costa outros erros do seu antigo governo, que de certo nos
Aguiar de Andrada. não foi mais favoravel, nem melhor do que o das
Foi remettido á commissão de legislação. suas ultimas côrtes: mas quanto á nós, respeitemos
Deu finalmente conta de duas felicitações, sempre, que assim cumpre, as autoridades
uma da camara da villa de Sorocaba, e outra da eminentes constituidas pelos povos como
camara da villa de Cantagallo, dirigidas á assembléa. depositarios do seu poder; estejão ellas nas mãos de
Forão recebidas com particular agrado. quem estiverem. Com dignidade e sangue frio, e não
Passou-se á ordem do dia, e entrou em pelo lado do odio contra as côrtes de Portugal, é que
discussão o projecto de proclamação da assembléa nos convém tratarmos com os nossos constituintes a
aos brazileiros. (Veja-se a sessão de 11 do corrente.) questão politica da nossa independencia, que já
O SR. FRANÇA: – Sr. presidente, é d'além muito bons e sobejos titulos de justiça tinha,
necessario que a assembléa tenha em consideração, para se ella proclamar, como foi proclamada; ainda
que é objecto muito serio a materia de uma mesmo quando mui generoso fôra comnosco esse
proclamação feita aos povos pelos seus congresso portuguez; cujas deliberações injustas a
representantes. A verdade mais que a força das respeito do nosso continente nada mais fizerão no
expressões é que ahi deve persuadir. meu conceito do que aggravar a influencia das
Circumspecta deve ser a marcha do discurso, causas permanentes, e accelerar o movimento
para que não avancemos talvez as nossas progressivo, com que este bello paiz, digno de
conjecturas por verdades de facto averiguadas. Ora, melhor sorte, tendia á sua emancipação já d'além
contra este Canon parece-me que pecca o seguinte marcada pelo dedo mestre da natureza; e que aos
contexto da proclamação – Convencido então o Sr. olhos de todo o mundo justificava, e proclamava o
D. João VI de que devia cumprir-se etc. – Nós de nosso actual engrandecimento em todas as fontes de
certo não sabemos, nem podemos dar por opulencia nacional, que abundantes regorgitarão
averiguados aos nossos constituintes os motivos que sempre contra os systematicos e positivos estorvos,
fizerão partir o Sr. D. João VI para Portugal, com que procurarão de as vedar, e encobrir os máos
deixando como deixou tão extemporaneamente o genios da politica machiavelica da antiga metropole.
Brazil: e de mais, fossem quaes fossem esses Conclúo portanto que examinemos de espaço
motivos que o lá levarão, pouco importão ao discurso o contexto da proclamação afim de que com estas e
da nossa proclamação para se nella animar de bom outras observações, que aos Srs. deputados
conceito entre os povos a causa da nossa occorreráõ, se evite a justa censura, em que aliás
independencia, e o affinco e enthusiasmo, com que a possa ella incorrer no juizo dos prudentes.
cumpre defender...Por outra parte aqui vejo uma O SR. COSTA AGUIAR: – Sr. presidente, se
expressão, que me parece pouco decorosa na boca voltar á commissão sem primeiro se estabelecerem
dos representantes da nação brazileira: e póde ser bases torna ella a apresentar outra proclamação e
até prejudicial á consideração politica, em que é succederá o que está agora succedendo; portanto
necessario que os povos tenhão a nova fórma de volte á commissão, como assento que deve voltar,
governo que temos abraçado: consideração que é o mas tome a assembléa em consideração o marcar
nervo da obediencia, e da força moral que mantém a as bases para se poder trabalhar; de outro modo vai
ordem nas sociedades; e vem a ser: – Porque a para a
demagogia das côrtes portuguezas. – Não me
parece politico, nem
Sessão em 22 de Agosto de 1823 135

commissão; o que vier póde não agradar; e não proclamação por ellas, que já lhe podem servir de
sahimos do embaraço em que nos achamos. bases para trabalhar. Do contrario se seguirá termos
O SR. FRANÇA: – Eu entendo que para não aqui um sem numero de emendas, sem se saber
perdermos mais tempo será conveniente que V. Ex. como se ha de sahir de semelhante labyrintho, até
convide os illustres membros desta assembléa a porque me persuado que quasi nenhuma emenda
fazer em papel separado os seus reparos ou virá sem ser motivada, e por isso ninguem se
emendas, para que, havendo sobre isso votação, vá entenderá aqui com tanto papel.
tudo á illustre commissão que refundirá a O SR. RODRIGUES DE CARVALHO: – Sr.
proclamação e a mandará novamente a esta presidente, creio poder dizer, sem que pretenda
assembléa. Segundo esta minha opinião, proponho o offender o nobre autor deste papel, que elle não é
adiamento na fórma seguinte: uma verdadeira proclamação. A parte historica é
Requeiro que os Srs. deputados que tiverem a inteiramente desnecessaria, como muito bem disse o
fazer reparos ou emendas suppressivas, additivas, Sr. Albuquerque; nós não queremos contar agora á
ou explicativas, salva a redacção, as fação e nação o que se tem passado e ella sabe, portanto
mandem á mesa por escripto até o dia segunda-feira, esta 1ª parte julgo que não haverá duvida que seja
para o que fica adiada a discussão. – O deputado supprimida, e só nos fica para discussão o que vai
França. do § 14 até o fim, que realmente é o que parece
Foi apoiado. proclamação.
O SR. ALMEIDA E ALBUQUERQUE: – Sr. Vejamos pois se nesta parte ha doutrina que
presidente, este projecto póde dividir-se em duas se julgue dever ser modificada ou mudada, e feitas
partes; a 1ª é uma narração dos successos que as nossas emendas vá de novo á commissão,
tiverão lugar e que todo o mundo já sabe, e portanto porque os seus illustres membros têm luzes de
inteiramente superflua; eu supprimiria por isso os 13 sobejo para depois a fazer sobre as bases que daqui
primeiros paragraphos, e principiaria a proclamação se lhe remettem.
no paragrapho 14, que fórma até o fim a 2ª parte. De outra fórma além da immensidade das
O SR. MONTESUMA: – O que queremos por emendas que se offerecerião, suscitavão-se duvidas
ora saber é se entra em discussão. que seria muito difficil decidir, e nos levarião um
O SR. ALMEIDA E ALBUQUERQUE: – A seu tempo immenso. Tirada a 1ª parte, o que resta não é
tempo o saberá; digo pois que se supprima a 1ª muito; e demais isto vai ser lido por toda a nação, é
parte, e que entre a 2ª em discussão, porque a 1ª, um papel da maior importancia, e merece que
como já disse, não sendo mais que uma narração tenhamos com elle o preciso trabalho para que saia
historica é escusada, porque nada vem para o caso. digno desta assembléa.
Eu mandarei á mesa uma emenda para este fim. O SR. HENRIQUES DE REZENDE: – Voto,
O SR. FRANÇA: – Deve haver algum espaço Sr. presidente, pela suppressão desta proclamação,
para que se possa examinar o projecto, e fazer as e duas são as razões que para isso allego: 1.º Ha
emendas que se julgarem convenientes. tres mezes que se julgou necessaria esta
O SR. CARNEIRO DA CUNHA: – Eu proclamação, e que a commissão foi encarregada de
desejaria que isto se decidisse hoje com os reparos a redigir, e nunca a apresentou senão agora, que vai
que se offerecerem: o que eu tinha a fazer era sobre apparecer o projecto da constituição, que quanto a
a 1ª parte, mas como o Sr. Albuquerque já fallou mim é a verdadeira proclamação que os povos
della refiro-me ao que elle disse; quanto á 2ª se a querem; o mais já agora de nenhum bem lhes serve,
assembléa deliberar que se discuta direi os meus porque elles querem cousas e não palavras. Era
sentimentos. naquelle tempo preciso fallar aos povos, mas como
O SR. FRANÇA: – Depois de apresentadas as passárão sem ella estes mezes, não sei o que vem
emendas a assembléa tomará em consideração se agora fazer esta proclamação! 2.º Este papel contém
devem ir á commissão, ou se logo se passará a votar duas partes; a 1ª é uma bicha de sete cabeças; é
e decidir á vista do que se offerecer. uma narração de cousas já ditas em outra occasião;
O SR. MONTESUMA: – Eu assento que todas impossivel de discutir-se pela sua complicação, e
as emendas poderáõ talvez encher um cartorio, inadmissivel: a 2ª; que se poderia chamar
porque além de muitas hão de ser extensamente proclamação, está em um estylo improprio, seria
motivadas; e teremos portanto na segunda-feira uma sempre necessario fazer outra em estylo
papellada immensa, que nem o Sr. secretario poderá competente. Portanto voto que se supprima; e para
ler para se tomar em consideração pela assembléa. isso fiz a seguinte:
Acho por isso mais conveniente que a
assembléa decida que feitas as emendas e EMENDA
approvadas vão á commissão para que novamente
redija a Proponho a suppressão desta proclamação. –
Henriques de Rezende.
Foi apoiada.
O SR. ALMEIDA E ALBUQUERQUE: – Não
136 Sessão em 22 de Agosto de 1823

posso approvar esta emenda de suppressão total; dizer que proclamações não valem nada, como já
ainda ha dous dias se assentou que era necessaria a fôra observado a respeito das proclamações de
proclamação, e por isso se mandou imprimir, e não Portugal; mas eu creio que isso succede quando
sei como se assenta agora que não é precisa. A ellas são contrarias á opinião publica; pois quando
parte historica, como já disse, é superflua, mas a vão acompanhadas com ella, servem de muito,
outra é necessaria; e portanto não tem lugar o votar illustrão os povos, e os encaminhão ao verdadeiro
pela suppressão. Eu mando á mesa a emenda que fim. Entendo portanto que se deve proclamar, como
indiquei, concebida nos termos seguintes: já está decidido, mas em sentido sempre conforme á
opinião publica.
EMENDA Quanto á emenda proposta sobre a
suppressão da parte historica, eu convenho nella, até
Proponho que se supprimão os 13 primeiros porque vejo logo no 2º paragrapho um facto que não
paragraphos, e principie a discussão no § 14 que é verdadeiro, e vem a ser que o Brazil adherio á
começa – Brazileiros etc. – Albuquerque. constituição de Portugal por emissarios de lá, e por
Foi apoiada. aqui espalhados; este facto não é verdadeiro, nem
O SR. HENRIQUES DE REZENDE: – O nobre ha documentos que provem; o Brazil não adherio a
deputado está enganado. Esta proclamação julgou- Portugal por causa desses aventureiros; adherio
se necessaria ha tres mezes, e a sua apresentação é porque amava a sua liberdade; e não foi por
que se fez ha poucos dias, e por isso se mandou solicitações de Portugal.
imprimir para se discutir; portanto eu estou Convém fazer-se esta declaração para que
discutindo, e voto pela suppressão. não passe esta falsidade visto que a proclamação
Torno, a dizer; naquelle tempo entendeu a está impressa. Supprima-se pois, como já disse, toda
assembléa que era preciso fallar aos povos, expôr- a parte historica porque não ha necessidade della; o
lhe os sentimentos de que estava possuida e quanto que temos a proclamar é o estado actual, e o que
estava disposta a procurar-lhes o maior bem vamos a fazer segundo as nossas intenções para
possivel; mas como nunca se fez, e agora vai que o povo saiba o que tem a esperar de nós;
apparecer o projecto da constituição, elle será para emquanto a factos passados o povo os sabe porque
os povos a melhor proclamação. E’ por isso que pedi todos são publicos; apenas se algum houvesse que
e ainda peço a suppressão della. precisasse illustração eu conviria que se
O SR. GOMIDE: – Eu julgo preciso continuar introduzisse, mas no estylo proprio de proclamação,
com o trabalho da proclamação, porque o seu fim é e não neste.
dirigir a opinião publica e firmar a confiança dos Agora o que me parece é que deve remetter-
povos; deve porém tomar-se por base o presente e se á commissão, isto é, não á uma especial como
não o passado que de nada serve para o fim aqui se lembrou, mas á mesma; qualquer dos seus
proposto, e apresentar-se a perspectiva de um futuro membros dando-lhe estas bases é muito capaz de a
vantajoso. Este trabalho deve encarregar-se a uma fazer; e portanto nenhuma necessidade ha de uma
commissão ad hoc, que seguindo estas idéas póde nova commissão para este trabalho.
desempenhal-o com proveito. Por estes principios fiz O SR. CARNEIRO DA CUNHA: – No mesmo
a seguinte: paragrapho que notou o illustre preopinante vejo uma
expressão que nos é assaz injuriosa quando diz que
EMENDA a gente superficial foi a que jurou a constituição. Não
era possivel consentirmos que isto passasse.
Volte á commissão para ser de novo redigida a O SR. GOMIDE: – Convenho de boa mente
proclamação, tomando por base a actualidade dos que volte á mesma commissão e neste sentido se
trabalhos desta augusta assembléa, e a esperança deve tomar a minha emenda.
eventual destes trabalhos. – Gomide. O SR. FRANÇA: – Não me admira que isto
Foi apoiada. assim succedesse, porque os membros da
O SR. VERGUEIRO: – O honrado membro commissão não tinhão dados para trabalhar, deixou-
que propoz a suppressão geral enganou-se quando se tudo á sua discrição; mas agora pelas emendas
disse que por se ter decidido que entrasse o projecto conhece-se a opinião da assembléa; e portanto
em discussão, agora se podia regeitar; este tirada a parte historica deve adiar-se a outra, como já
argumento a meu ver, não tem lugar, pois o que se propuz, até que se apresentem as emendas e se
decidiu foi que se proclamasse; e portanto póde sim discutão.
ser regeitada a proclamação, mas fica em pé a O SR. CARNEIRO DA CUNHA: – Eu pedi a
deliberação da assembléa, e por isso regeitada esta palavra para dizer o mesmo, por isso não fallo.
é necessaria outra.
Não tem pois lugar a suppressão, porque não
tem lugar o deixar de proclamar. Ouvi tambem
Sessão em 22 de Agosto de 1823 137

O SR. ALENCAR: – Quatro mezes se da Cunha, encarregado deste trabalho. E’ verdade


gastarão para apparecer este projecto de que ainda esta mesma que se apresentou não era do
proclamação; agora em discutil-o, é natural, agrado da commissão, mas o tempo instava e
gastemos outros quatro, e nestes quinze dias sahe o assentou-se de a offerecer assim á assembléa.
projecto de constituição; se esta proclamação é só Nestes termos se volta á commissão sem que haja
para dizer aos povos qual é a nossa intenção e qual uma base formal para sobre ella se trabalhar,
é a linha da conduta que temos a seguir, isto já lh’o seguindo estes ou aquelles principios, nada se faz.
vamos mostrar no projecto de constituição. Se ella Quanto á mim já declarei que não entro no
fosse apresentada logo no principio da nossa negocio porque tenho outras cousas a fazer; porém
reunião, muito bem; mas depois de quatro mezes ou vá á mesma commissão ou á outra especial, ou á
acho muito desnecessario. Precisa era ella quando quem parecer, sempre são precisas bases para a
foi proposta, mas hoje não sei para que sirva, redacção; aliás nada se faz.
estando a sahir o projecto de constituição. O SR. ALENCAR: – O Sr. Costa Aguiar
O SR. CAMARA: – O primeiro que se lembrou pareceu querer justificar o Sr. Pereira da Cunha,
de proclamação foi o Sr. Maia, que apresentou para como se o que eu fallei o atacasse, quando
ella uns apontamentos e a assembléa determinou no certamente a isso me não dirigi: dou esta satisfação
fim de Maio que se mandassem á commissão. Então porque eu tenho muito cuidado quando fallo e não
os seus membros não quizerão desprezar as idéas pretendo atacar pessoa alguma.
dadas para bases e servindo-se da sua materia Eu não disse que havia quatro mezes que se
appareceu a 1ª e a 2ª proclamação, porque esta já é tratava de uma proclamação, disse que havia perto
a 3ª que tem ido á bigorna pelo mesmo autor. de quatro mezes que estavamos reunidos e que se
A commissão assentou agora que estavão tratou logo nos primeiros dias de proclamar; ora,
preenchidos os fins e a assembléa julgará o que ninguem duvidará que a assembléa está installada
quizer; mas dêm-lhe as voltas que lhe derem, com ha quatro mezes e tambem que logo se tratou de
emendas ha de haver sempre que emendar; uma proclamar, e por isso disse que se nós só em
proclamação deve ser escripta pelo estylo de um só apresentar o projecto gastavamos quatro mezes,
homem; a assembléa tem muita gente capaz, póde gastariamos outros quatro na discussão, mas com
nomear o Sr. Albuquerque, o Sr. Gomide, ou outros isto, torno a dizer, nem quiz atacar a commissão em
quaesquer para que fação 3 ou 4 proclamações e geral nem algum dos seus illustres membros em
destas escolher a que melhor lhe parecer. particular. Eu nunca tenho taes idéas.
O SR. COSTA AGUIAR: – Sr. presidente, eu O SR. COSTA AGUIAR: – Nem eu tão pouco
fallo sempre com a franqueza que é propria do meu digo que o Sr. Alencar atacasse; fallei a respeito dos
caracter, eu não fiz nem cooperei para esta tres ou quatro mezes para mostrar que não havia
proclamação; não é obra minha, nem o podia ser esse tempo, e ainda mesmo que houvesse ataque
porque tenho estado effectivamente occupado na eu não tomava a defeza porque não sou defensor
mesa como secretario; foi incumbida a um dos publico.
membros da commissão o Sr. Pereira da Cunha, que Quanto ao tempo, no que eu disse fallei
tem sido assás increpado e que por não estar aqui verdade.
nada póde dizer em sua defeza. O SR. ALENCAR: – Eu digo que logo depois
O Sr. Alencar inda agora disse que havião da nossa installação se tratou da proclamação.
quatro mezes que se tinha encarregado á O SR. MAIA: – Eu não me persuadi, nem
commissão esta proclamação e outros Srs. fallarão nunca me podia persuadir que a assembléa me
em tres; mas não são quatro nem tres mezes. Logo fizesse a honra de tomar os meus apontamentos
depois da installação da assembléa apresentou o Sr. como bases para se dirigir por elles o trabalho desta
Maia os seus apontamentos para bases da proclamação; porém como alguns illustres deputados
proclamação, eu tenho boa memoria, não me que fallarão affirmão que a commissão se guiára
esqueço das cousas com facilidade, lembro-me bem pelo que tive a lembrança de offerecer, digo que
que na sessão de 28 de Maio á requisição do nesta proclamação apenas apparecem tres ou quatro
honrado membro o Sr. Rodrigues de Carvalho se fez linhas dos meus apontamentos.
a 2ª leitura dos apontamentos do Sr. Maia e forão Eu que não me julguei capaz de fazer uma
então para a commissão; e portanto não ha quatro proclamação, entendia que podia fazer ver o mais
mezes como se affirmou, nem tres. necessario de que ella precisava, para que não
Agora, quanto ao contexto da proclamação, houvesse occasião de se dizer que faltavão bases.
digo, que tendo sido remettidos aquelles papeis á Alli lembrei que o juramento das bases da
commissão julgou-se que por eles se devia formar a constituição de Portugal de que os povos do Brazil
proclamação e assim o fez o Sr. Pereira estavão de facto desligados, devia ser de direito
declarado nullo por esta assembléa, porque não
haviamos fazer a nossa constituição
138 Sessão em 22 de Agosto de 1823

fundada em bases de constituição alheia. Isto não sei formar juizo seguro; porém de modo nenhum
mesmo lá não vem; e portanto não sei como se posso votar a favor da proposta.
pretende dar por causa do mau exito deste trabalho Se fossem só tres os concurrentes quereria
a necessidade de se ligar a commissão ás idéas que que o que tem serviços fosse para o 1º lugar e os
eu apresentei, quando dellas nada se encontra no que não têm serviços para o 2º; mas como ha mais,
projecto de proclamação. voto então contra toda a proposta; é necessario que
Para tirar todas as duvidas estimaria que V. se comparem os serviços, que se examinem, e
Ex. tivesse a bondade de mandar lêr os meus attendida a capacidade devem ser preferidos
apontamentos. E’ o meio de se fazer certo o que aquelles que já têm feito algum serviço á nação; é
digo. por isso que voto contra toda a proposta.
Julgando-se a materia discutida propoz o Sr. O SR. FRANÇA: – Eu principiarei por onde
presidente: acabou o illustre preopinante.
1º. Se a assembléa approvava a suppressão Fallou em Sebastião José da Silva, mas com
total. – Venceu-se que não. falta de conhecimento de causa; porque esse sujeito
2º. Se approvava a dos 13 primeiros já foi contemplado, já está provido em um dos
paragraphos. – Venceu-se que sim. lugares de continuo da assembléa, segundo a
3º. Se approvava o additamento do Sr. França. proposta que delle fez a mesa. Tinha serviços com
– Venceu-se que não. os quaes pretendeu excitar a attenção da mesma
4º. Se approvava o do Sr. Gomide. – Venceu- mesa em seu favor; mas não foi pelos serviços que
se que sim. eu lhe dei o meu voto.
Seguiu-se a 2ª parte da ordem do dia que era Tinha delle mais algum conhecimento do que
a proposta da mesa sobre os empregados da dos outros pretendentes; e como o lugar não é dos
secretaria da assembléa, adiada no dia 12 do que exigem grande industria pessoal, julguei-o
corrente em que fôra apresentada. sufficiente e convim de o nomear para o emprego;
O SR. VERGUEIRO: – Como já fui arguido de pois que de mais era acondicionado desses serviços
falta de delicadeza, quando se fallou sobre esta que os mais concurrentes não tinhão. Já se o lugar
materia, continuarei com o mesmo defeito, que julgo dependera de maior industria e outro pretendente a
ser virtude no meu lugar, que é não querer decidir tivera maior do que elle, não havião de ser os
sem conhecimento de causa. serviços que me decidissem, porque esses não
Eu propuz que era necessario motivar a devem ser remunerados com prejuizo da causa
proposta, não foi isto attendido e assentou-se que publica, empregando homens que não têm toda a
ficassem na secretaria os requerimentos onde se sufficiencia para os officios que requerem.
podião examinar; fui á secretaria, examinei os A confiança pois que resulta do conhecimento
requerimentos e aqui tirei um breve apontamento do da sufficiencia do sugeito e não os seus serviços
que achei nos requerimentos dos tres nomeados, um feitos nesta ou naquella repartição, vem a ser a base
para porteiro e dous para ajudantes. em que fundei o voto que tive na nomeação e em
No do porteiro não achei documento algum, só que cuido deve assentar a deliberação da
diz o pretendente que tem capacidade para servir assembléa.
este emprego e mais nada; o de um dos ajudantes Mas, ainda concedendo que aqui estiveramos
estava concebido quasi na mesma fórma e outro a remunerar serviços e que por elles se dessem os
tinha documentos, allegava ter estado na junta da lugares do expediente da assembléa, vejamos que
fazenda do Rio Grande do Norte o ter feito grandes serviços se nos apresentão por parte desse
serviços, arranjado uma companhia civica e outras pretendente que abona o illustre deputado como
cousas mais, como ter servido na falta de contador, e preferente dos mais.
portanto eu me decidiria a favor deste em primeiro Eu examinei os seus documentos e ora os
lugar para porteiro, ficando os outros para ajudantes, relatarei á assembléa.
no caso de não haver mais concurrentes; mas folheei Produz primeiramente a publica-fórma de um
e achei muitos requerimentos documentados e documento com que pretende provar que fôra
outros não documentados. empregado na junta da fazenda do Rio-Grande do
Um Martinho Antonio que acompanhou o Norte em 1821.
archivo para Lisboa; um Nobrega, um Cardoso com Bem; não passa isso de um anno de serviço
serviços; Claudio José Freire da mesa da ordinario de uma contadoria de muito pouco
consciencia e ordens; um Chaves com alguns annos expediente.
de serviço militar; Luiz Sawter com 15; Sebastião de Um segundo documento diz que o mesmo
tal e outros muitos. pretendente alli se mostrára zeloso da causa publica
A' vista pois de tantos requerimentos da independencia, sendo o corretor que agenciava
documentados e com serviços como têm alguns e varias assignaturas de cidadãos para comporem
com estudos na academia e aula do commercio, que uma guarda civica. Eis-aqui tudo
sempre merecem tal ou qual preferencia;
Sessão em 22 de Agosto de 1823 139

quanto importa a sua allegação generica de serviços. senhores da mesa, que nesta parte forão
Publicas-fórmas e de taes serviços são o absolutamente da mesma opinião que eu; porque a
fundamento com que tanto se abona uma fallar a verdade todos queriamos escapar da tal
preferencia que deve excluir do officio um outro proposta; todos querião deixar acabar o seu mez;
cidadão, em que conhecidamente, ao menos por mas emfim a precisão instava, e era necessario
mim, se dá a maior sufficiencia para o emprego! cortar este nó gordio; tratou-se do negocio, e o Sr.
Embora se faça: da minha parte sustentarei o França, pelo conhecimento que tinha dos
contrario. pretendentes, propoz os que se achavão em
Eu sei bem que qualidades são as necessarias melhores circumstancias; eis-aqui como correu este
em o porteiro de qualquer repartição publica de negocio; agora, se a assembléa não quer approvar a
expediente; e muito mais quando lhe accresce, como proposta, não a approve; para mim é o mesmo, sou
ao da secretaria da assembIéa, o accessorio de completamente indifferente a isso.
guarda-Iivros. O SR. MONTESUMA: – As côrtes de Lisboa
Além de escrever elegante, desembaraçada e decretarão que os empregos publicos devião ser
correctamente é mister que tenha costumes e seja dados a homens de merecimento, e eu estou
affavel e cortez para com as partes, subordinado e persuadido desta verdade; é necessario que a
prompto ao mando dos seus superiores. assembléa tome em consideração um ponto de tanta
No pretendente que os Srs. secretarios circumstancia.
commigo escolherão concorrem todos estes Sr. presidente, são bases constitucionaes:
requisitos conhecidamente; no outro ainda que os 1º Que todo o cidadão tem direito aos
houvera não nos são conhecidos; além de assaz empregos publicos.
depôr contra a sua capacidade o facto de ter sido 2º Que é preferivel aquelle que mais
achado hontem nas galerias a ouvir a sessão merecimento tem.
secreta, como me communicou o Sr. Fernandes O illustre preopinante que fallou antes do Sr.
Pinheiro. Aguiar, não declarou de todo, mas deu a entender
Não tenho ao proposto nenhuma adherencia; que se não importava com serviços; e que com a
faço-lhe da minha parte a justiça que merece no meu parte mostrar que adheria a esta causa tambem se
conceito; e não terei duvida de ceder, quando outro não embaraçava: mas eu digo, que o que tem de
melhor acondicionado se apresente, porque em toda mais a mais a allegar bom serviço feito em qualquer
a parte os homens conhecidamente benemeritos são emprego deve preferir aos outros que não servirão
e serão os meus afilhados, e o devem ser de todos tanto, porque nesta assembléa não deve ser
os que têm influencia na administração publica. approvado senão aquelle que mais merecimentos
Eu nunca esperei que uma proposta desta tiver; e portanto o illustre preopinante não deveria
natureza soffresse tão renhida disputa; e que, sem propôr o nomeado emquanto não mostrasse que
se notarem defeitos á pessoa nomeada, se pretende tinha mais serviços do que os outros que tinhão
todavia que ella seja desattendida, para se dar lugar pedido o mesmo emprego.
a uma immerita preferencia de outra que não mostra Disse tambem que o propoz porque o
ter mais aptidão que o proposto, e que só se auxilia conhece; que o abona, que merece a sua confiança,
da inculca de serviços que não merecem nenhuma e que é necessario que a mereça para estar naquelle
attenção como já referi. Voto, portanto, pela lugar; se isto fosse assim seriamos obrigados a
proposta, que deve passar, porque não ha emenda mudar de empregados publicos todos os mezes,
que attender. assim como mudamos de secretarios, porque seria
O SR. COSTA AGUIAR: – Eu direi necessario admittir os que fossem da sua particular
unicamente duas palavras. confiança.
Que a proposta seja regeitada ou approvada Os empregados desta casa devem obter
para mim é o mesmo, é cousa com que me não confiança á medida que a merecerem, e não como
importa; ha onze annos que sahi desta cidade, diz o illustre deputado: só por virtudes e testemunho
quando era um bacharel de pouca idade, e, por publico o cidadão se recommenda.
consequencia não conhecia ninguem; fui Eu não digo que este tem ou não tem serviços;
despachado depois para tres lugares de mas se este os não tem tel-os-hão os dos
magistratura; volto agora, e estou na mesma razão, requerimentos que estão na secretaria; e o que tiver
não conheço ninguem; e por isso ainda que estavão maiores serviços é o que deve ser preferido.
na secretaria esses papeis, não olhei para elles. Não entenda a nação que nós queremos aqui
A proposta devia ser feita por um homem fazer patrimonio destes empregos, pois que elles só
sensato, e que conhecesse os pretendentes, e como são patrimonio publico, e cada um dos cidadãos tem
de entre nós quem tinha mais conhecimentos nesta direito a ser nomeado, comtanto que o mereça.
cidade era o Sr. França, elle se incumbiu destes Eu não vi papeis nenhuns, mas o Sr.
papeis, por accordo dos outros Vergueiro deu-se ao trabalho de examinar, e achou
alguns em circumstancias mais attendiveis.
O meu voto é inteiramente conforme ao seu;
140 Sessão em 22 de Agosto de 1823

nunca approvarei o que se tem apresentado, e nem um só documento de serviços apparece; diz
tambem não fallarei mais em semelhante negocio de unicamente que é cavalheiro da ordem de Christo e
preferencias, porque são enjoativas, e muito filho do coronel fulano, como se isto fossem motivos
contrarias ao meu modo de pensar. para ser porteiro da secretaria!
O SR. FERNANDES PINHEIRO: – Como o Sr. Comtudo este é o preferido, e nega-se o lugar
França disse que tinha ouvido de mim que um dos ao que mostra ter sido primeiro escripturario de uma
pretendentes estava vendo a sessão secreta, devo junta da fazenda e ter servido de contador, o que
dizer que eu não o vi; porém, fallando-se na sempre indica mais merecimento do que o outro que
secretaria sobre isto, o official-maior me disse que se nada prova, e que só é bom porque o Sr. França
contára que o Borges, pretendente ao lugar de assim o pensa.
porteiro, fôra achado nas galerias, e que estivera Accresce a isto que é prejudicial approvar o da
preso até o fim da sessão, mas que tambem se proposta, attenta a economia da fazenda publica,
soubera que elle tinha ido alli por lhe dizerem que já porque na qualidade de primeiro escripturario tem
se tinha acabado a dita sessão secreta. direito ao seu ordenado, e se agora lhe damos este
Esta é a fonte por onde o sei; e como é uma emprego a fazenda publica evita o fazer aquella
cousa que póde influir sobre a nomeação, por isso o despeza; e, portanto, tambem por esta razão elle
declaro a tempo. está mais nas circumstancias de ser attendido do
O SR. ALENCAR: – Eu tambem quero dizer que o outro.
alguma cousa sobre isto. Por ultimo, estou persuadido pelo
Sou de parecer, Sr. presidente, que a proposta conhecimento que delle tenho, que é muito capaz e
deve ser feita á vista dos documentos para se verdadeiro, e que será muito diligente naquillo de
compararem os serviços, sem comtudo se dispensar que fôr incumbido.
a capacidade. Talvez me engane no meu modo de pensar,
O Sr. França diz que conhece este segundo mas isso tambem já succedeu ao Sr. França, que se
proposto, que é um moço muito intelligente, que enganou na sua proposta de um tal Sebastião;
escreve muito bem; eu não conheço este senhor, porque realmente apregoando aqui o Sr. França que
mas não duvido do que o Sr. França diz sobre as preferia capacidade, não se acha nelle aptidão
suas qualidades; comtudo preferirei sempre o nenhuma; é um surdo, muito velho, o que nem ler
conhecimento de direito ao de tradicção. sabe...
Eu tambem conheço o outro; é um moço muito O SR. FRANÇA: – Mas tem serviços.
civil, muito capaz: e tambem escreve muito bem; O SR. ALENCAR: – Eu ainda estou fallando;
muitos senhores aqui o conhecem, e o julgão com mas respondo a isso, que se esse foi attendido por
mais razões para ser preferido, por ter de mais a serviços, não sei então por que só no outro se
mais os serviços que o outro não tem; já mereceu escurecem! Porém vamos adiante; pelos motivos
ser empregado em primeiro escripturario, e na vaga expostos eu sigo o que diz o Sr. Vergueiro, e prefiro
do contador serviu na contadoria o seu lugar; ora, Borges; porque vejo nelle capacidade e alguns
estas circumstancias sempre o recommendão para a serviços, e nos outros não vejo nenhuns.
approvação, e este que o Sr. França propõe só é Emquanto aos dous lugares de ajudantes não
approvado na sua consciencia, e não póde de modo sei se me decidirei por um que foi militar vinte annos,
algum ser preferivel ao outro. ou por um fulano Chaves, ou ainda por outros que
O facto que o Sr. França aponta da sessão de tambem apresentem mais documentos que os dous
hontem como influindo para a nomeação, não tem nomeados; mas o que não posso á vista disto é
lugar. approvar a proposta, e de fórma alguma votarei a
O SR. FRANÇA: – Eu não podia dizer tal. favor della.
O SR. ALENCAR: – Ainda não acabei. Este O SR. FRANÇA: – Disse um illustre deputado,
facto é muito posterior á proposta, e, portanto, nada que elle devia preferir aquelle dos pretendentes de
póde influir nella; e além disso já o Sr. Fernandes quem havia conhecimento... pois é por esse mesmo
Pinheiro contou como o soube, isto é, que indo para principio que os ou tres senhores secretarios,
as galerias lhe disserão que já se tinha acabado a commigo preferimos o nomeado a esse outro de que
sessão secreta, o que se suppoz ser assim por se ter se trata.
visto um Sr. deputado que tinha sahido fóra; ora, O illustre deputado segue em seu voto o
este acaso de modo algum o desacredita, nem lhe impulso da sua consciencia, e todavia quer que não
póde ser prejudicial, quando apresenta tão bons sigamos a nossa, e que despresando-a nos
papeis e consta da sua honrada conducta. resignemos antes na sua; mas isso é o que não deve
Vejamos agora os papeis do outro a que o Sr. ser. Comtudo, não se julgue que eu tenho algum
França dá grande peso; não apresenta nada; empenho em que seja approvada a proposta, e que
seja nomeado este ou aquelle, porque isso vem a ser
para mim indifferente; o que me não e indifferente
sim, é que se desvie
Sessão em 22 de Agosto de 1823 141

a obra do verdadeiro methodo com que deve ser cousa verdadeiramente injuriosa á mesa, e não
feita. conforme ao nosso regimento, onde se acha
Mettamos o negocio em marcha legal: determinado que as propostas não sejão motivadas;
pouparemos tempo e obraremos segundo cumpre. e é isto o que se tem praticado constantemente
Os Srs. deputados que se oppoem á proposta, nesta assembléa.
ou que têm por melhor uma emenda de preferencia Ora, exigir-se uma cousa que o regimento não
deste ou daquelle pretendente, que a mandem manda, e contraria a pratica constante, é injuriar a
motivada á mesa, e receber-se-ha sobre ella a mesa, por ser isto inteiramente novo e arbitrario.
votação, se não fôr approvada a mesma proposta. O SR. FRANÇA: – Quem quer julgar pelos
Este é o caminho de virmos á conclusão do debate, documentos que se apresentão da capacidade do
aliás estaremos a gastar aqui inutilmente o tempo em pretendente vai enganado; porque ha homens que
longos discursos, que afinal não concluem, e sobre sendo bons em um emprego são inhabeis em outro;
materia de tão pouca monta. e portanto a exposição do que contém os
A questão é breve, reduz-se a isto: ou a documentos de nada serve.
assembléa approva a proposta sobre informação dos Além disto o que requer o Sr. Vergueiro não
Srs. secretarios, a quem a lei concede a nomeação, póde admittir-se, porque é contra o que manda o
ou prefere ao juizo dos Srs. secretarios o juizo e regimento, e que temos praticado.
informação de um ou outro Sr. deputado, a quem a A proposta está feita pela mesa, e a
lei não concede a nomeação. assembléa inteirada do que ha; agora os Srs.
Se passa a proposta, estamos no primeiro deputados pódem votar pró ou contra e propôr outros
caso; se passa uma emenda, estamos no segundo. em lugar destes, o que, torno a dizer, me é
A assembléa decidirá. indifferente: mas a mesa reformar a proposta, isso
O SR. HENRIQUES DE REZENDE: – Eu não nunca.
duvido da integridade dos Srs. secretarios, mas A mesa já propoz, e não propõe mais, nem
como hei de votar, quero motivar o meu voto. reforma o que fez.
Reparo que os Srs. secretarios se esquecerão O SR. VERGUEIRO: – Não vejo no que
de uma cousa de que não era bom que se lembrei que se faça injuria alguma á mesa.
esquecessem. O SR. FERNANDES PINHEIRO: – Não só é
Eu vi todos os requerimentos que estavão injuria; é mais alguma cousa.
sobre a mesa; muitos dizião unicamente: – F... se O SR. HENRIQUES DE REZENDE: – Eu não
acha com aptidão para qualquer lugar da casa da sei de que se escandalisão tanto os Srs. secretarios!
assembléa. – Portanto; etc. Por ventura não se regeitão todos os dias pareceres
Um destes é o primeiro proposto. de commissões? Pois porque hão de os Srs.
Outros allegavão serviços com documentos, e secretarios ser mais melindrosos e mais sagrados do
serem pais de familias. que as illustres commissões, para se darem tanto por
Nós não devemos prescindir dos serviços offendidos? Por ventura a nomeação não é da
feitos á nação, nem da qualidade de pais de familias assembléa? Isto é querer coarctar a liberdade dos
para despresal-os, e favorecer a homens solteiros, e Srs. deputados, e que approvemos cegamente tudo
que não apresentão serviços. o que se nos propuzer. Eu mando á mesa a emenda
Bem sei que a primeira cousa que se deve de que ha pouco fallei.
procurar é a aptidão; mas concorrendo todas estas
qualidades em um mesmo sujeito não ha duvida que EMENDA
deve preferir; ora, ha uns com serviços, pais de
familias, e que allegão aptidão; porque não havião de Proponho que seja nomeado para porteiro e
ser preferidos? Não os conhecem os Srs. guarda-livros o que interinamente serve este lugar se
secretarios: eu tambem os não conheço, e na tiver capacidade. – Henriques de Rezende.
collisão de tantos pretendentes, lembro do que se Foi apoiada.
não lembrarão os Srs. secretarios. O Sr. Alencar mandou igualmente a sua:
Ha um homem que serve este lugar desde a
installação da assembléa, que já era ajudante do EMENDA
porteiro em outra secretaria, porque não foi elle
proposto para este lugar em que já serve, e se foi Proponho para porteiro e guarda-livros o que
buscar outro que nenhuns serviços tem? Voto pois está proposto para ajudante, isto é, a José Joaquim
se nomêe para o lugar de porteiro e guarda-livros o Borges, ficando os outros dous feitos ajudantes. –
que actualmente está servindo este lugar. E como se Alencar.
diz que se remetta á mesa como emenda assim o Foi apoiada.
farei. O SR. HENRIQUES DE REZENDE: – Peço a
O SR. FERNANDES PINHEIRO: – O que palavra para sustentar a minha emenda. Se a
exige o illustre preopinante, o Sr. Vergueiro é uma
142 Sessão em 22 de Agosto de 1823

assembléa se propõe a corrigir abusos é necessario tão grande numero de requerimentos para ver qual
que ella seja a primeira a dar o exemplo; que não dos pretendentes tem mais serviços, e qual mais
desprese serviços prestados á nação; que não aptidão, segue-se que se a proposta não fôr
abandone os que sustentão os pequenos cidadãos; motivada a assembléa assigna inteiramente de cruz,
os que creão os pequenos grellos que fazem as e portanto fica a proposta como feita e approvada só
esperanças da patria, para dar os lugares rendosos a pela mesa.
homens solteiros e sem serviços. Para evitar isto é que eu quero que venha
Dirão que esses solteiros têm capacidade e os motivada e circumstanciada, dizendo que fulano e
outros não; é o que eu não sei. fulano são propostos para estes empregos, porque
Vejo muitos requerimentos, e alguns além de tendo concorrido com fulanos forão preferidos por
serviços allegão que são pais de familias; no meio terem mais serviços, ou por isto ou por aquillo.
disto que faremos nós? A dar-se a um, clama outro Insisto pois que se receba a proposta do Sr.
que é injustiça, e outro que é violencia. Vergueiro, e peço a V. Ex. que convide o illustre
Nesta collisão bom é achar um expediente que deputado a mandal-a por escripto á mesa.
tape a boca a todos e salve a honra e credito da O SR. VERGUEIRO: – Uma vez que o illustre
assembléa. secretario o Sr. Fernandes Pinheiro disse que ao
Ha um homem que é ajudante do porteiro de propôr-se semelhante emenda era atacar á mesa, já
outra secretaria, e que está servindo aqui a não faço.
interinamente porque não ha de ser elle promovido a Eu entendia não fazer com ella injuria, por ser
este lugar? mui facil haver erros tanto sobre cousas como sobre
Tem a seu favor a presumpção de capacidade, pessoas, e poder tanto enganar-se uma commissão
e por este meio julgo sahirmos bem do embaraço. como a mesa: mas como isto se julga ataque e
Eu sei que elle não requereu; e talvez que por insulto, já a não faço.
isso os Srs. secretarios se não lembrassem delle; Julgando-se a materia discutida, propoz o Sr.
mas eu o lembro agora. presidente se a assembléa approvava a proposta da
O SR. DIAS: – Eu desejo que as nossas mesa.
acções se regulem sempre por normas de justiça, Foi approvada; ficando por isso regeitadas as
pois temos muitos olhos sobre nós; e por isso não emendas:
posso de modo algum convir em que se não Passou-se á 3ª parte da ordem do dia, que era
attendão serviços; isto me parece injusto, ao menos o regimento da assembléa, e continuou a discussão
a minha razão não póde digeril-o. do artigo proposto pelo Sr. França na sessão de 19,
Em circumstancias iguaes o que tiver serviços para ter lugar entre os arts. 146 e 147.
deve ser preferido; destes principios não me aparto; Depois de breves reflexões foi approvado.
e portanto entre os que estão propostos, sem Art. 147. Para os casos occurrentes que assim
menoscabar o juizo da mesa que muito respeito, o exigirem, a assembléa nomeará todas as
prefiro o que está em segundo lugar porque tem commissões especiaes que lhe parecerem.
serviços, e tambem deve ter capacidade visto que já Foi approvado.
esteve empregado em lugares de fazenda, e Art. 148. Para se nomear uma commissão
respondendo por uma contadoria. especial será necessario que haja quem a peça, e
Ouvi dizer que talvez não seja nomeado por que a petição seja apoiada por cinco deputados pelo
ser achado nas galerias no dia da sessão secreta; menos; e que se decida a votos se deve ou não
mas isto, além de ser um facto incerto, porque eu nomear-se.
como membro da commissão de policia fui examinar Foi approvado.
e não o achei, não póde prejudicar-lhe porque a ter Art. 149. Nomeada a commissão especial,
ido foi por suppôr que tudo estava acabado, e nisso póde qualquer deputado da assembléa propôr quaes
podia cahir qualquer homem de probidade. Voto são os pontos de que entende que ella deve tratar, e
portanto que elle seja o porteiro, como propoz o Sr. determinar-se-ha por meio de votos quaes hão de
Alencar. ser.
O SR. MONTESUMA: – Eu torno a fallar para Foi approvado.
sustentar a opinião do Sr. Vergueiro, que de maneira Art. 150. Nenhuma commissão será composta
nenhuma ataca a mesa, mas a que se deu má de menos de tres deputados, nem de mais de sete.
intelligencia. Foi approvado.
Aqui se disse que é contra o regimento a dita Art. 151. As commissões permanentes
emenda, porque nelle se manda que a proposta seja poderáõ pedir aos secretarios de estado, por meio do
feita pela mesa, e não motivada. secretario da assembléa, todas as noções que lhe
É verdade que o regimento assim diz; mas nós forem necessarias para o desempenho do seu
conhecemos pela pratica que não sendo possivel trabalho; e os secretarios de estado lh'as
tomar a assembléa conhecimento de communicaráõ todas, excepto aquellas cuja
divulgação fôr prejudicial ao serviço publico.
Sessão em 22 de Agosto de 1823 143

O Sr. Maia offereceu por emenda o seguinte: INDICAÇÃO


Proponho a suppressão da palavra –
permanentes. – Maia. Proponho que se officie ao poder executivo
Foi apoiada. para que mande ao governo da provincia de Goyaz
O Sr. Teixeira Vasconcellos offereceu tambem mandar fazer a ponte do Rio das Almas do caminho
o seguinte additamento: da Meia Ponte, assim como concertar ou fazer a do
Que lhe forem necessarias para o Urubú do caminho da capital da mesma provincia,
desempenho do seu trabalho – precedendo visto a decadencia em que se vai pondo o arraial
determinação da assembléa. – Vasconcellos. mais notavel da mesma provincia, que é Meia Ponte
Foi apoiada. por lhe faltar o commercio que então havia quando
O SR. MONTESUMA: – A segunda parte existião as ditas pontes, mandando pôr franco o seu
deste artigo não me agrada; eu quizera que se caminho por Jaraguá que tambem tem sentido a
reparasse que não fazemos o regimento para os mesma decadencia. – Silvestre Alvares da Silva.
ministros de estado a quem se indica neste artigo Foi approvada, ordenando-se que se officiasse
qual é o seu dever, que estou certo que hão de mui ao governo para providenciar o que julgasse
bem cumprir; e quando o não cumprão ha o meio de conveniente.
uma indicação para lh’o lembrar. Por isso approvo o O SR. MONTESUMA: – Sr. presidente, a
paragrapho só até á palavra trabalho; e é o que digo indicação do illustre deputado faz-me lembrar de
nesta emenda: outra que tambem não é de menor importancia.
Proponho que se supprimão as palavras Quando vindo para o Rio de Janeiro, passei pela
desde – e os secretarios – até o fim do artigo. – O provincia de Minas Geraes, observei tão propagado
deputado Montesuma. o contagio da morphéa, que arraiaes inteiros por
Foi apoiada. onde passei não tinhão uma casa onde se pudesse
Julgando-se discutida a materia, propoz o Sr. dormir, porque todas estavão contaminadas deste
presidente: mal. Estou persuadido que a causa deste contagio é
1º Se o artigo passava como estava. – não haverem estabelecimentos proprios como ha em
Venceu-se que não. todas as nações que têm fundado hospitaes para
2º Se passava a emenda do Sr. Maia. – Foi evitar a communicação com os mais cidadãos;
approvada. objecto este sobre que já o governo devia ter dado
3º Se passava a do Sr. Teixeira Vasconcellos. providencias. Já por vezes tenho querido propôr á
– Foi approvada. assembléa esta indicação; porém vendo-a tão
4º Se passava a do Sr. Montesuma. – Foi occupada com maiores negocios e de muita
tambem approvada. importancia que não queria interromper, não fallei a
Art. 152. Os archivos da assembléa franquear- este respeito; mas agora passo a propôl-a para que
se-hão ás commissões para os negocios da sua se officie ao governo, afim de tomar algumas
competencia. medidas para prevenir o progresso deste contagio.
Foi approvado. Talvez haja na cidade de Marianna alguma casa
Art. 153. As informações das commissões propria que possa servir de hospital, e se não a
serão assignadas por todos os membros, e se algum houver em Marianna, talvez se ache alguma em
discordar poderá dar o seu voto separado. Sabará. Eu submetto a materia á consideração desta
Foi approvado. assembléa; e julgo ser negocio de muita importancia;
Interrompeu-se a discussão do regimento por não só para evitar o progresso de um mal tão
ser chegada a hora da leitura de indicações e contagioso, mas tambem para mostrar aos povos
pareceres. que a assembléa procura promover quanto póde o
O Sr. Barão de Santo Amaro pediu a palavra bem ser da nação.
para offerecer á assembléa duas memorias
impressas pelo cidadão José Bernardino Baptista INDICAÇÃO
Pereira. – Forão recebidas com especial agrado, e
mandarão-se distribuir pelos Srs. deputados. Proponho que se indique ao governo para que
Igualmente se distribuirão dous balanços tome medidas salutares afim de evitar o progresso
impressos da receita e despeza do cofre da do contagio do mal da morphéa, já tão generalisado
intendencia geral da policia desde 1º de Abril até 17 na provincia de Minas Geraes. – O deputado
de Julho e desde 17 de Agosto até 30 de Setembro Montesuma.
de 1823. O SR. DIAS: – Eu acho que se deve remetter
O SR. ALVARES DA SILVA: – Sr. presidente, este negocio á commissão de saude publica, para
tenho para offerecer á consideração da assembléa que redigindo um projecto, ou dando as bases
uma indicação sobre objecto importante; é concebida principaes, e marcando os meios de que se deve
nos seguintes termos: servir o governo, passemos então a
144 Sessão em 22 de Agosto de 1823

mandar dar as providencias; além de que isto a progressão do mal. O que fará porém, Sr.
demanda despezas, e não se póde fazer sem presidente, o governo para remedial-o?
calcular a renda publica. Demais, ha muitos doentes Fará um hospital, que é um lazareto, e que
que são pessoas afazendadas, e que vivem de seus pelo meu modo de entender é sepultura de homens
bens; e a estes não havemos de despojar desses vivos.
bens para os obrigar a viver na cidade. Portanto sou Ah! Deixemos a estes miseraveis, emquanto
de voto que se dirija esta indicação á commissão de se não podem tomar as medidas necessarias, gosar
saude publica, para que apresente as bases sobre ao menos dos commodos de suas casas e dos
as quaes o governo deve regular as providencias. officios das suas familias.
O SR. MONTESUMA: – Eu cuido que o fim do Sr. presidente, eu conheço bem o que são
illustre preopinante é apresentar uma medida geral a hospitaes. A ostentação ahi é grande, mas a
este respeito. caridade de nenhuma maneira lhe corresponde.
Eu estou persuadido que a commissão está Deixemo-nos, Sr. presidente, de mal entendida
trabalhando com o maior cuidado sobre isto, mas caridade; emquanto não podemos acudir-lhe como
tambem estou persuadido que não tem dados por convém, deixemos esses cidadãos desfructar a sua
onde se possa reger. Não ha talvez um paiz mais vida o melhor que pódem, pois por mais triste que
miseravel sobre saude publica do que o nosso. seja a sua situação não será peior do que a de um
Portanto esta indicação não vai lembrar á hospital.
commissão de saude publica que cuide neste E que póde fazer o governo para remediar os
negocio em grande, nem ella deve interromper os abusos inveterados nos hospitaes? Não póde fazer
seus trabalhos. Isto é uma medida para se dar nada: e eu lhe dou um exemplo no mesmo hospital
alguma providencia provisoria; lembro-me que em dos lazaros que está no Rio de Janeiro. Quanto não
Sabará existe um hospital que póde muito bem servir darião muitos desses infelizes para se verem fóra
para este fim, e mandando o governo daquella daquelle lugar, onde sobremaneira se tem aggravado
provincia as informações do poder executivo, poder- a sua condição! É por isso, Sr. presidente, que não
se-hão dar as providencias necessarias pela posso deixar de votar que a indicação do illustre
repartição competente. preopinante, cujo zelo patriotico eu muito louvo, seja
Portanto eu achava, Sr. presidente, que mandada á commissão de saude publica, para que
remettendo-se este negocio ao governo, elle nos proponha algum meio conducente á melhor sorte
consultará o estado de finanças, e deliberará aquillo desses enfermos.
que fôr melhor. A commissão de saude publica não Porém remetter o assumpto ao governo acho
póde adiantar idéas sobre isto, antes mettendo-se desnecessario, porque o mais que poderá propôr é
neste negocio o que fará unicamente, é com que algum meio de se fazer um hospital, que como já
fique mais demorado, o que de modo nenhum disse, fará a sorte desses homens ainda mais
convém, porque é de muita consideração e miseravel.
importancia, pois se trata de livrar de tão contagioso Como não houvesse quem mais pedisse a
mal uma provincia inteira, muito rica, e que precisa palavra, propoz o Sr. presidente á consideração da
de braços: julgo isto bastante para lhe darmos toda a assembléa a indicação; e decidiu-se que fosse
attenção. Eu não sou representante della, mas como remettida á commissão de saude publica.
sou representante da nação inteira, e fui testemunha Entrou então em discussão a indicação
occular dos males que aquelles povos padecem, offerecida pelo Sr. Montesuma na sessão de 18 do
quando vim da Bahia para o Rio de Janeiro, lembrei- corrente que com a emenda do Sr. Alencar proposta
me de fallar nesta materia na assembléa, não só na de 19, ficára adiada; e que tinha por fim exigir-se
para que este objecto entre no grande plano de do governo a informação já requerida pelo Sr. barão
saude publica porque lhe pertence, mas tambem de Santo Amaro sobre o estado do imperio.
para que se desse desde já uma medida provisoria, O SR. MONTESUMA: – Eu requeiro a V. Ex.
determinada pelo governo, precedendo as precisas que os Srs. deputados que já tiverem fallado duas
averiguações. vezes não fallem mais, eu sou o primeiro que me
O SR. FRANÇA: – Os beneficios que a sugeito á lei, e só pedirei a palavra se fôr preciso
provincia de Minas Geraes deve esperar desta fazer alguma pequena explicação.
assembléa a respeito do mal que soffre cumpre que O SR. FRANÇA: – Eu peço a palavra na
lhe venhão de outra parte. ordem, porque não estou comprehendido no numero
Trata-se da progressão da morphéa. Que daquelles deputados de que fallou o illustre
medidas ha de a assembléa tomar agora a esse preopinante. Sr. presidente, levantei-me para dizer
respeito? A’ commissão de saude publica é que que se deve officiar ao governo, para que mande as
compete dar as informações necessarias, e apontar informações que precisamente nos forem
as medidas que se devem tomar para impedir necessarias.
Por exemplo, a respeito de fazenda, que se
nos mande uma relação de todas as propriedades
Sessão em 22 de Agosto de 1823 145

da nação, uma informação do estado da divida offereci á commissão de estatistica para a examinar;
publica, qual é a consolidada, e qual se presume ser e se a commissão achar que ella serve é
a fluctuante, a respeito de marinha o estado da sua desnecessario propôr novamente a que offerece o
força disponivel, o estado dos seus diversos Sr. França.
arsenaes etc:, a respeito da repartição da guerra, O SR. COSTA AGUIAR: – Porém o Sr.
que tropa ha, qual é a differença de seu soldo, a França, o que offereceu, propôl-o como emenda, e
razão dessa differença, etc. só o proporá como indicação, se não passar como
Tratando de empregados, quantos e quaes emenda.
são, que ordenados têm e que emolumentos os seus O SR. MAIA: – De nenhuma das fórmas tem
empregos, etc. lugar, porque o Sr. França quer que as commissões
Julgo que por não poder fazer-se uma indiquem quaes são os pontos sobre que se
informação geral não deve deixar de havel-a, necessita informação, e este trabalho já se acha
daquellas cousas que estão ao alcance do ministerio. feito, o que me parece ter lugar, é dizer-se á
Eu conheço, Sr. presidente, que nem todos os commissão de estatistica que dê o seu parecer sobre
negocios podem ser tratados publicamente, e que ha a minha indicação.
negocios de estado que devem tratar-se com O SR. FRANÇA: – O que eu proponho é que
reserva. Porém conheço tambem que é todas as commissões indiquem os pontos cardeaes
absolutamente necessario pedir algumas de que a assembléa precisa ser informada para
informações, e que os senhores das commissões depois se officiar ao governo.
indiquem os pontos cardeaes sobre que devem ellas O SR. MAIA: – O illustre preopinante não me
versar; porque poderáõ haver pontos cardeaes sobre entendeu. Eu disse que tinha feito uma indicação de
que possão ter os ministros exacto conhecimento, e todos esses pontos cardeaes abrangendo os
póde ser que não tenhão o mesmo conhecimento de diversos ramos de administração publica, de que o
outros pontos. Eu offereço a esse fim a indicação do governo nos póde dar conta, e accrescentei que uma
Sr. Montesuma, a seguinte: vez que fosse recebida esta indicação, era suficiente
e não se precisava outra nova.
EMENDA O SR. FRANÇA: – O trabalho do illustre
preopinante não póde ser tão extenso, que satisfaça
Proponho que as illustres commissões, cada a tudo. A minha indicação convida todas as
uma na parte que respeita aos negocios da sua commissões a que concorrão cada uma por sua
competencia, indique á assembléa os pontos parte a marcar os pontos cardeaes sobre que se
cardeaes a que se devem referir as informações do precisão informações; e por isso a do illustre
governo respeito á administração publica, para de preopinante necessariamente ha de ser menos
conformidade se officiar ao governo ao dito respeito, extensa, pois já marca pontos, e nesses póde ser
e não cegamente como se tem feito. – O deputado que não estejão comprehendidos todos. Por
França. consequencia esta indicação não prejudica a que o
Foi apoiada. illustre preopinante diz que fizera nem tem
O SR. MONTESUMA: – Peço a palavra para inconveniente em ser admittida.
fazer uma pequena explicação. A emenda que fez o O SR. MONTESUMA: – Pelo que tem dito o
Sr. França não póde ser admittida, porque a minha Sr. Maia, sou agora de parecer que de nenhum
indicação não é nova, nada mais faço que lembrar modo póde passar o que propõe o Sr. França.
unicamente que importa muito que se execute a Quando eu lembrei a indicação feita pelo Sr. barão
indicação proposta pelo nobre deputado o Sr. barão de Santo Amaro, foi unicamente para que contasse
de Santo Amaro, portanto o que o illustre que se estava esperando o resultado della. A
preopinante quer propôr póde apresental-o como assembléa já deliberou que se querião estas
nova indicação, mas não para ser admittido como informações, não só quando o Sr. barão de Santo
emenda á minha, porque não é nova como já disse, Amaro apresentou a sua indicação, mas tambem
é a mesma do Sr. barão de Santo Amaro, em que quando o Sr. Maia apresentou a sua nova, portanto
apontou a necessidade e urgencia de virem quanto digo que esta assembléa ainda está em expectativa,
antes estas informações. e que deve esperar que o governo cumpra, ou não
O SR. FRANÇA: – Como o illustre preopinante cumpra; nem sei como se póde receber uma
diz, que não póde servir como emenda a sua indicação que prejudica inteiramente outra que já se
indicação por ser a mesma já feita pelo ilIustre Sr. mandou pôr em execução. Isto de certo é deliberar
barão de Santo Amaro, não tenho duvida de a sem motivo. Poderá talvez dizer-se que serve o que
apresentar como nova. propõe o Sr. França como emenda á minha
O SR. MAIA: – Sr. presidente, eu tambem já indicação, para adiantar trabalho, isto é para facilitar
fiz uma indicação geral de todos os artigos de que ao governo a maneira de cumprir o que indicou o Sr.
nos diversos ramos de administração publica, se barão de Santo Amaro, mas
precisão informações do governo, e a
146 Sessão em 22 de Agosto de 1823

tendo o Sr. Maia, feito já a indicação de que tem do requerente merece ser attendida pela assembléa
fallado, então é inutil de todo, porque o resultado que para se tomar sobre ella alguma deliberação, e eu
póde ter, não sei que seja senão o que requereu o sou de voto que se diga ao governo que visto não
Sr. Maia; e portanto iriamos receber como novo o haver lei arbitre elle o ordenado que julgar
que já se tomou em deliberação. Além disto acho sufficiente, segundo sempre foi costume e pratica,
tambem desnecessario o que indica o Sr. França por pois antigamente tambem não havia lei; e todos os
uma nova razão, e vem a ser, que cada uma das dias se aposentavão cidadãos desde a primeira
commissões sabe qual é a sua obrigação, e se a ordem de ministros até o ultimo emprego com um
assembléa as convidar a que apresentem uma cousa ordenado correspondente ao seu emprego e
que é de sua obrigação, é o mesmo que dizer que serviços, e não póde deixar isso de ser assim porque
elles não cumprem com os seus deveres por isso o estado deve sustentar a quem serve e a quem tem
que não pedem informações sobre negocios que servido.
importão ao estado. O SR. REZENDE COSTA: – Sr. presidente,
Eu acho que é um ataque positivo que faz o este homem que conta mais de 80 annos de idade e
illustre preopinante ás commissões, quando ellas 50 de serviço, e é fiel do thesouro publico, achou no
cheias de verdadeiro patriotismo procuraráõ, quanto fim do anno passado uma falta de 6:800$000 no
fôr necessario fazer as suas obrigações, sem ser dinheiro que estava a seu cargo: a sua honra e
necessaria a proposta do Sr. França. Portanto se a inteireza são taes que só a descuido ou
minha indicação tem lugar approve-se; e se não tem esquecimento se póde ella attribuir. Nos exames a
lugar reprove-se, porém não deliberemos de novo que se procedeu encontrou-se uma addição desta
sobre o que está decidido... Ouvi dizer a um nobre importancia, sem designação da repartição a que se
deputado que o governo ha de cumprir com os seus destinava, sahida no dia 30 de Setembro; e como se
deveres, e que se não tem cumprido é porque não approximasse o balanço expuz ao thesoureiro-mór a
póde apresentar uma informação exacta que responsabilidade em que estava, a suspensão que
satisfaça a expectação da assembléa, e como talvez se lhe seguiria do emprego que exercia e o
a vista disto se decida que se não deve fazer nova sequestro nos seus bens a não preencher-se a falta
requisição, e neste caso a minha indicação não tem que se encontrava.
lugar, julgo então que se o governo, depois de Resultou disto o realisar-se debaixo da fiança
passado um certo tempo, nada mandar, poderá que prestou, o imprestimo feito pelo visconde do Rio
servir a emenda do Sr. França, como nova indicação. Secco ao fiel com hypotheca na chacara em que
Julgando-se afinal discutida a materia, propoz este vive, e de todos os seus bens, com o que se
o Sr. presidente: preencheu o cofre.
1º Se a assembléa approvava a indicação do Requereu elle immediatamente a sua reforma
Sr. Montesuma. – Foi regeitada. com o ordenado por inteiro, e o modo de indemnisar
2º Se passava a emenda do Sr. Alencar. – ao visconde do Rio Secco; a cujo respeito, como
Não passou. escrivão da mesa do thesouro publico, fui de parecer
3º Se o que propuzera o Sr. França tinha lugar que merecia pelos seus longos serviços, sua honra e
como emenda á indicação do Sr. Montesuma. – zelo, a aposentadoria com o ordenado por inteiro; e
Venceu-se que não. que percebendo o thesoureiro-mór 680$000 annuaes
4º Se tinha lugar como nova indicação. – Ficou para falhas e elle fiel 400$000, fosse por essas
a votação empatada. quantias indemnisado o seu credor; cotando-se
O SR. COSTA AGUIAR: – Seria bom que se desde 26 de Fevereiro de 1820, dia da posse
mandasse chamar os Srs. deputados que estão lá daquelle. O conselho da fazenda, ao qual foi este
dentro. objecto a consultar, só no tempo deferio do arbitrio
O SR. HENRIQUES DE REZENDE: – O que que apontei.
se venceu sobre o artigo 132 do regimento foi que O poder executivo julgando não competir-lhe a
havendo empate fica a materia adiada, portanto decisão deste objecto o submetteu á desta illustre
requeiro que assim se observe. assembléa, a quem o supplicante agora recorre na
O Sr. Presidente declarou que ficava adiada sua duplicada pretenção de reforma e pagamento do
na fórma do regimento, e que se passava a discutir o visconde.
parecer da commissão de fazenda sobre o A convicção em que estou da sua honra,
requerimento de Francisco Duarte Nunes, adiado na inteireza e virtudes, que todos reconhecem, e a
sessão antecedente em que fôra apresentado. necessidade e miseria a que ficará reduzido com sua
O SR. FRANÇA: – Diz a illustre commissão infeliz familia, faltando-lhes os recursos desses bens
que não ha lei que regule ordenados para estes que hypothecou, me obrigão a implorar a seu favor a
officiaes aposentados, mas que a supplica attenção desta assembléa, que revestida do poder
legislativo póde occorrer á falta de legislação que ha
para regular os ordenados dos officiaes
aposentados, como parece
Sessão em 23 de Agosto de 1823 147

á illustre commissão; acudindo-se assim a um homem apresentar uma felicitação de José de Araujo da Cunha
tão honrado e que conta mais de 50 annos de bons Alvarenga, capitão-mór da villa do Sabara.
serviços. Foi recebida com particular agrado.
Por ter dado a hora ficou outra vez adiado. O Sr. Ribeiro de Rezende annunciou que estava
O Sr. Presidente assignou para a ordem do dia: á porta do salão uma deputação da camara da villa de
1º. A continuação da 3ª discussão do projecto sobre o S. João d'El-Rei, que dirigia á assembléa uma
juizo de ausentes: 2º. Regimento da assembléa. felicitação pelo ex-juiz de fóra da dita villa Antonio
Levantou-se a sessão ás 2 horas da tarde. – Paulino Limpo de Abreu.
Manoel José de Souza França, secretario. Foi recebida com particular agrado; e sahirão
dous Srs. secretarios a agradecer em nome da
RESOLUÇÕES DA ASSEMBLÉA assembléa a felicitação da camara.
Passou-se á ordem do dia, que era a
PARA JOSÉ JOAQUIM CARNEIRO DE CAMPOS continuação da 3ª discussão do projecto sobre o juizo
dos ausentes, adiada na sessão de 18 do corrente.
Illm. e Exm. Sr. – A assembléa geral constituinte O Sr. Teixeira Vasconcellos, depois de um longo
e legislativa do imperio do Brazil, approvando o parecer discurso (que se não entendeu o que escreveu o
da commissão de fazenda sobre as representações da tachygrapho Possidonio) mandou á mesa a seguinte:
camara da cidade de S. Paulo e muitos dos seus
moradores, relativas ao dessecamento da vargea do EMENDA
Carmo e atterrado da ponte do mesmo nome; e tendo
resolvido que não se applique para a mencionada obra Ao § 2º Todos que forem credores de pessoas
a contribuição voluntaria do caminho de Santos, por ser fallecidas ou ausentes, etc.
renda particular que não póde ser distrahida do fim para Ao § 4º.... Fiscaes, os quaes deveráõ aceitar, e
que foi destinada, sem consentimento dos contribuintes, fazer uso de allegações e provas que qualquer pessoa
nem se sanccione por ora a contribuição accordada em haja de fornecer a favor das heranças ou dos
camara, por ser um conhecido gravame que não póde sequestros sob pena de responsabilidade. –
ser compensado com a utilidade futura daquelles Vasconcellos.
povos: manda remetter ao governo a memoria e planta Forão apoiadas ambas as partes.
offerecidas pelo sargento-mór engenheiro Francisco O Sr. Almeida e Albuquerque pediu a palavra e
Pedro Arbues Moreira, e participar-lhe que deve mandou á mesa a seguinte emenda aos arts. 2º e 3º do
novamente encarregar exame de tanta entidade a projecto:
algum hydraulico habil e pratico, e com as observações
deste, tanto sobre os trabalhos precisos, como sobre a EMENDA
computação das despezas, informar depois a esta
assembléa, para esta então deliberar quaes os fundos § 2º Que se principie pelas palavras. – Os
que se hão de destinar para tão interessante obra. O credores de pessoas fallecidas, etc.
que V. Ex. levará ao conhecimento de Sua Magestade § 3º Que se supprimão as palavras – e os juizes
Imperial. – Deus guarde a V. Ex. – Paço da assembléa, dos sequestros, etc., etc. – Albuquerque.
em 22 de Agosto de 1823. – José Ricardo da Costa Não foi apoiada em nenhumas das partes.
Aguiar de Andrada. O Sr. Rocha Franco igualmente offereceu a
seguinte:
SESSÃO EM 23 DE AGOSTO DE 1823.
EMENDA
PRESIDENCIA DO SR. BISPO CAPELLÃO-MÓR.
Ao n. 4 da addicção do Sr. Vergueiro: – A's
Reunidos os Srs. deputados pelas 10 horas da palavras – a cousa vencida – accrescente-se – ou o seu
manhã, fez-se a chamada e acharão-se presentes 68, equivalente.
faltando com causa os Srs. Pereira da Cunha, Andrada O n. 7 supprima-se. – Rocha Franco.
Machado, Ribeiro Campos, Andrada e Silva, Carneiro Não foi apoiada.
de Campos, Ferreira Nobre, Andrade Lima, Nogueira da O Sr. Velloso Soares pediu então licença para se
Gama e Ribeiro de Andrada. retirar por incommodado.
O Sr. Presidente declarou aberta a sessão, e lida (Fallárão tambem os Srs. Maia, Vergueiro,
a acta da antecedente foi approvada. Carvalho e Mello e Montesuma, mas nada se entendeu
O Sr. Araujo Vianna disse que tinha para do que escreveu o tachygrapho Possidonio.)
Por ser chegada a hora dos pareceres de
commissões, ficou adiada a discussão.
O Sr. Araujo Vianna, como relator da commissão
da redacção do Diario, leu o seguinte:
148 Sessão em 23 de Agosto de 1823

PARECER assembléa o não consentirá na sua sabedoria; mas


tambem me persuado que não entenderá que o
A commissão da redacção do Diario tendo de governo o deve aposentar uma vez que não ha lei que
formar um novo turno de tachygraphos para accelerar a regule as aposentadorias; faça-se essa lei, como
publicação do Diario propõe Joaquim Maria de Souza, entendo que é preciso e então terá o governo o direito
Manoel Fernandes Barreiro e Antonio de Araujo de aposentar os empregados segundo os seus
Gomes, e assigna por ora a cada um dos dous merecimentos e serviços; sem isso sempre me opporei
primeiros nomeados o ordenado de trinta mil réis, e ao ao principio de que o governo o aposente, porque este
terceiro vinte e cinco mil réis. acto é da attribuição do poder legislativo.
Paço da assembléa, 23 de Agosto de 1823. – O SR. FRANÇA: – Eu já disse que estava
Candido José de Araujo Vianna. – Antonio Gonçalves convencido de que o provimento, destituição, e
Gomide. – João Antonio Rodrigues de Carvalho.Agosto reformas dos empregados agentes do poder executivo
Foi approvado. pertencião á este, e não ao corpo legislativo: se me
Passou-se ao parecer da commissão de fazenda convencerem ora do contrario, e que ao corpo
sobre o requerimento de Francisco Duarte Nunes, que legislativo é que compete aposentar em hypothese os
ficára adiado na sessão antecedente. mesmos empregados, cedo da minha emenda, e então
O SR. FRANÇA: – Convencido eu de que o quero ter parte na deliberação porque deve ser
provimento, destituição, e reformas dos empregados aposentado o fiel do thesouro.
agentes do poder executivo são attribuições do mesmo O illustre preopinante parece-me que tem
poder nas hypotheses occurrentes, e não materia de confundido as graças feitas á custa da fazenda publica
competencia do corpo legislativo, quiz que soffresse com a justiça da continuação dos ordenados aos
uma emenda o parecer da commissão; afim de que se officiaes impossibilitados por idade, ou outras causas
ponha na marcha do seu respectivo andamento a physicas, de continuarem a servir; das quaes em regra
aposentação do fiel do thesouro Francisco Duarte. só póde conhecer o governo.
A nós compete-nos fazer leis que regulem as Mas ha nisso alguma differença: e casos ha em
aposentações em these, mas não cumpre aposentar que a aposentação vem a ser para o official um triste
em hypothese nenhum empregado. despacho, que elle desejaria de boa mente renunciar.
Diz-se porém que não há lei positiva que regule Seja porém como fôr, uma cousa é deliberar a
a aposentação: nem nós agora a havemos fazer para assembléa sobre o preterito, e outra é legislar sobre o
esse caso particular; siga o ministerio a esse respeito o futuro.
direito consuetudinario, ou do costume, com que taes A hypothese de uma aposentação não é
aposentações se têm feito até agora; que as de futuro hypothese nova, tem a correnteza de exemplos na
serão reguladas pelo direito escripto que se houver de administração publica; se não ha lei escripta que as
fazer. Deixemos confusões de poderes; faça cada um o regule, ha o direito de costume, e equidade, ou antes a
seu officio que no systema constitucional da sua divisão razão da justiça que a aconselhe, e autorise; portanto
lhe compete, e procederemos em regra. A minha siga a aposentação do fiel Francisco Duarte a norma
emenda é concebida nos seguintes termos: das outras que se tem feito, nisso se lhe guarda a
igualdade de direito muito embora a assembléa de
EMENDA futuro haja de legislar, que a ella sómente compete o
aposentar os empregados; havendo ser-lhe devida esta
Agosto que se autorise o governo para aposentar attribuição pelo que toca de gravame á fazenda publica,
o supplicante com o ordenado que lhe parecer justo, que eu sempre me esforçarei porque seja fiscalisada
assim como se tem praticado até agora; visto que se contra os desperdicios do governo; pois que a minha
reconhece não haver lei que regule as reformas, ou intenção não é advogar a causa deste contra os
aposentações dos empregados civis respeito á interesses da nação. Sou liberal naquillo que cumpre
continuação de ordenados. – O deputado sel-o; e só faço as partes da justiça e da razão segundo
França.Agosto entendo.
Foi apoiada. O SR. VERGUEIRO: – Que ao governo deve
O SR. MONTESUMA: – Quando se apresentou pertencer o nomear os empregados publicos, e tambem
este parecer da commissão ouvi dizer que o governo o aposental-os, é para mim indubitavel e sigo nisto os
não tinha o poder de aposentar os empregados principios do Sr. França; porém ha de aposental-os
publicos, porque só tinha o direito de os nomear, eu sou segundo a lei. A commissão no parecer diz que não ha
tambem desta opinião, porque tudo o que é despender lei para este requerente ser aposentado, logo, é
dinheiro deve ser estabelecido por lei. Trata-se porém consequencia que o governo o não podia aposentar, e
agora de saber se este homem que tem servido por por isso se remetteu a supplica a esta assembléa.
tantos annos á nação ha de ficar no resto dos seus dias
sem ter que comer; eu creio que a
Sessão em 23 de Agosto de 1823 149

Autorise-se pois o governo para o fazer; e porque é talvez a mais odiosa de todas, e a de que o
procedendo-se assim está conservada a divisão dos povo tem mais medo; não porque o fim da sua
poderes, porque se suppre a falta da lei para este caso.instituição seja máo, mas pelo que tem sahido della, de
Eu creio que toda a assembléa está de accordo revoltoso e despotico contra a segurança individual.
sobre esta providencia em favor de um homem que Diz-se, por exemplo, que se fazem despezas
conta 50 annos de serviços; e para que assim se com presos, mas não se sabe nem quantos são nem
verifique voto pela emenda do Sr. França que julgo quanto com cada um se gasta; igualmente se falla de
fundada na boa razão. pretos minas sem que se diga o seu numero, nem como
Julgando-se a materia discutida, propoz-se o se achão a cargo da policia; e eu creio que não é deste
parecer á votação e foi approvado para se proceder em modo que se dão contas para o publico saber em que
conformidade da emenda do Sr. França. se despendem as quantias alli apontadas.
Por não haver mais pareceres entrou em Ainda é mais digno de reparo o que se acha no
discussão a indicação do Sr. França para as verso das despezas com esta simples declaração –
commissões apontarem os objectos sobre os quaes despeza em diversos objectos a cargo da intendencia –
deveria o governo informar, proposta na sessão isto na verdade não sei o que é. Que serviços
antecedente e na mesma adiada por haver empate na extraordinarios e occultos são estes da intendencia?
votação. Este mysterio dá que suspeitar para a má parte,
(Fallárão os Srs. Vergueiro e Montesuma, mas principalmente havendo em geral, como já disse, uma
não se entendeu o tachygrapho Silva.) prevenção desfavoravel a esta repartição.
A’final julgando-se a materia discutida, foi posta Parece-me portanto muito conveniente que se
á votação e regeitada. peção esclarecimentos ao governo, pois este exigirá as
O Sr. Secretario Costa Aguiar, leu a seguinte competentes noções daquella repartição para nos
indicação offerecida pelo Sr. Vergueiro: informar; e fará a necessaria advertencia para que não
appareção para o futuro taes parcellas sem que venhão
INDICAÇÃO com a clareza precisa para que todo o mundo saiba a
applicação que tiverão quaesquer quantias
Proponho que as informações mandadas á esta despendidas. Eu mando á mesa uma indicação para o
assembléa e quaesquer outras peças de que convenha fim que acabo de mostrar ser necessario.
a publicidade sejão publicadas no Diario do Governo
ficando, a juizo da mesa escolher as que se devem INDICAÇÃO
publicar, quando a assembléa o não determinar. –
Vergueiro. Proponho que se peção ao governo informações
Fizerão-se algumas observações, e notou-se que sobre os balanços da intendencia geral da policia desde
não se publicando todas as autoridades que não vissem o 1º de Abril até 17 de Julho e desde 18 do mesmo até
as suas publicadas podião escandalisar-se, pelo que 31; visto que se achão muitas das suas parcellas mui
parecia ser melhor não imprimir nenhuma. genericamente concebidas, devendo aliás haver nesta
O Sr. Presidente propoz a indicação dividindo-a parte da publica administração a maior e mais exacta
em duas partes: a 1ª até ás palavras Diario do Governo; especificação e fiscalisação. – O deputado Montesuma.
e a 2ª desde ficando até o fim. – Forão ambas (Fallarão os Srs. Henriques de Rezende e
regeitadas. Vergueiro, mas não se entendeu o mesmo
O SR. MONTESUMA: – Sr. presidente, quando tachygrapho.)
qualquer cidadão deve ser fìscal da fazenda publica, Por ter dado a hora ficou adiada a discussão.
como o não será um deputado! Apresentarão-se aqui, e O Sr. Presidente assignou para a ordem do dia:
se distribuirão na sessão antecedente dous balanços de 1º. O projecto sobre o juizo dos ausentes. 2º.
receita e despeza do cofre da intendencia geral da Regimento da assembléa.
policia; e como delles não consta especificadamente Levantou-se a sessão ás 2 horas da tarde. –
em que se gastarão algumas quantias alli mencionadas, Manoel José de Souza França, secretario.
e isto me parece que devia vir bem claro, e não tão
generalisado, julgo do meu dever fazer algumas RESOLUÇÕES DA ASSEMBLÉA
observações, porque o publico tem direito de saber com
individuação em que se gastão as rendas da nação. PARA JOSÉ JOAQUIM CARNEIRO DE CAMPOS
Protesto desde já que nada tenho com as
pessoas encarregadas desta contadoria, fallo Illm. e Exm. Sr. – A assembléa geral constituinte
unicamente do que respeita á fazenda publica. Como e legislativa do imperio do Brazil sendo-lhe presente a
esta repartição não tem fiscal sejamos nós os fiscaes indicação do deputado Silvestre Alvares da Silva, sobre
della, muito principalmente a necessidade
150 Sessão em 25 de Agosto de 1823

de se proceder na provincia de Goyaz á construcção arrecadação dos bens dos ausentes conforme o seu
ou concerto das pontes do rio das Almas e do Urubú, regimento havia já sido reconhecido pelos
e de se pôr franco o caminho de Jaraguá que legisladores, e para o remediar, á beneficio dos
também se acha arruinado; manda remetter ao negociantes que tivessem tido sociedades ou fossem
governo a inclusa cópia da referida indicação para credores de quantias consideraveis aos que
dar sobre estes objectos as providencias que julgar fallecessem sem testamento, sahio á luz o alvará de
convenientes. O que V. Ex. levará ao conhecimento 17 de Junho de 1766, estabelecendo que nesse caso
de S. M. Imperial. – Deus guarde a V. Ex. – Paço da não tivesse lugar a arrecadação pelo juizo dos
assembléa, em 23 de Agosto de 1823. – José ausentes, mas se nomeassem, d'entre os socios ou
Ricardo da Costa Aguiar de Andrada. credores, administradores para se liquidarem as
sociedades e serem pagas as dividas; e observando-
SESSÃO EM 25 DE AGOSTO DE 1823. se depois a insufficiencia daquella providencia foi
ampliada pelo alvará de 10 de Novembro de 1810
PRESIDENCIA DO SR. BISPO CAPELLÃO-MÓR. mesmo para o caso de fallecerem com testamento
os socios ou devedores de negociantes.
Reunidos os Srs. deputados pelas 10 horas da Ora, pergunto eu, que razão haverá para que
manhã, fez-se a chamada e acharão-se presentes sejão os negociantes mais protegidos pelas leis na
72, faltando com causa os Srs. Ribeiro Campos, arrecadação de suas dividas, do que os lavradores,
Ferreira Barreto, Andrada e Silva, Alencar, Ferreira os artistas, os empregados, os homens de letras e
de Araujo. todas as mais classes da sociedade civil! Nenhuma
O Sr. Presidente declarou aberta a sessão, e certamente; isto se deve attribuir ás idéas
lida a acta da antecedente foi approvada. incompletas de economia politica que grassavão
Por não haver expediente entrou-se na ordem naquella parte.
do dia, que era a continuação da 3ª discussão do O conde de Oeiras que dominava no ministerio
projecto sobre fazenda de ausentes. de el-rei D. José, razão tinha em querer levantar a
O SR. CARNEIRO: – Sr. presidente, se eu corporação dos negociantes do abatimento em que
houvesse de votar em geral sobre esta materia, diria ella jazia pelos prejuizos transmittidos desde os
que convinha extinguir-se absolutamente o juizo dos romanos e nações barbaras que lhes succederão,
ausentes, por ser um juizo excepcional e de privilegio que sendo por constituição guerreiras, despresavão
muito odioso, que estabelece distincção absurda o commercio e outras profissões pacificas; porém
entre os direitos e vantagens do credor e devedor, para isso não era mister fazer leis parciaes a
antepondo o ausente que se não sabe quem seja, ao beneficio de uma só classe quando todas as outras
qual dá executivo para cobrar tudo quanto possa igualmente reclamavão a mesma protecção.
pertencer-lhe, ao presente, á quem não permitte A maxima economia que manda proteger o
cobrar senão minimas quantias e sem aquelle commercio deve entender-se do grande e geral
privilegio da execução; além de que a simples commercio ou circulação da nação, em cujo sentido
inspecção do regimento do juizo dos ausentes todos são de alguma sorte negociantes, tratando
mostra que elle é um dos ferretes do systema todos de trocar mutuamente seus bens, serviços e
colonial, destinado só para Guiné, Mina, Brazil, industria; até me animo a dizer que se a este
Açôres, e mais partes ultramarinas, das quaes se respeito alguma distincção se houvera de fazer de
pretendia facilitar a saca de capitaes para estes se classe a classe, a dos negociantes pelo que toca á
irem accumular no reino de Portugal, calculando-se arrecadação de dividas, precisa de menos protecção,
pouco com os inconvenientes e embaraços a que sendo muito mais difficultoso a qualquer cidadão das
ficavão sujeitos os moradores do ultramar que havião outras classes mandar á côrte cobrar suas dividas do
transigido com os antecessores dos ausentes; sendo que aos negociantes, que por via de suas
portanto evidente que aquelle regimento, além dos correspondencias estabelecidas têm para isso as
defeitos e desigual legislação que comprehende, é já maiores facilidades.
incompativel com a declaração da nossa Considerando agora o projecto em si, e com a
independencia, como monumento de um systema emenda feita pelo honrado membro o Sr. Vergueiro
que se acha proscripto, convindo em tal caso antes que já se acha apoiada, elle offerece todas as
instaurar-se a saudavel determinação das garantias tanto a favor dos ausentes, interessados
ordenações liv. 1º tit. 9º de que têm gozado sempre nas heranças ou bens sequestrados, pois por aquella
com vantagem os habitantes do reino de Portugal. emenda se mandão citar por editos e se determina a
Propondo-me porém a votar sobre o presente apresentação da fiança pelos credores vencedores,
projecto de lei, digo que elle se deve adoptar; porque como a beneficio dos credores das ditas heranças e
melhor é diminuir o mal, do que deixal-o subsistir em bens, aos quaes se offerece um meio de cobrar
toda a sua extensão. O vicio da completamente as suas dividas no lugar em que
forão contrahidas, sem perda das custas que ficão a
cargo da
Sessão em 25 de Agosto de 1823 151

herança e bens convencidos; o que é muito mais proficuo, e até mais natural para as
conforme á razão e justiça, praticando-se outro tanto circumstancias em que nos achamos.
ainda com os bens dos orphãos que não devem Sr. presidente, eu acabo de examinar a origem
reputar-se de peior condição que os dos ausentes e do juizo dos ausentes: eIle é um tribunal destacado
seqüestrados. de toda a legislação portugueza, é um tribunal
Só me cumpre notar sobre o n. 4 da emenda creado para as colonias, mas todo em favor de
do Sr. Vergueiro, primeiramente que ficasse livre ao Portugal: cuidou-se em que as heranças para lá
credor vencedor prestar fiança idonea, ou dar caução fossem intactas apezar do prejuizo que causava aos
de penhores ou hypothecas sufficientes; porque em que cá estavão. O resultado ultimo era, que ainda
quantias avultadas, ainda sendo os credores quando o herdeiro do Brazil ou o credor lá
abonados, será difficultoso ás vezes achar fiadores, arrecadava o que lhe pertencia, metade lá ficava.
e não parece justo que quem tem bens sufficientes Ora, sendo assim, como, e por que razão
ande a pedir favores a outrem; em segundo lugar conservaremos este juizo, cuja existencia faz mal
acho muito extenso o prazo de cinco annos e aos brazileiros, e só aproveita aos luzitanos nossos
bastarião talvez dous ou tres a arbitrio da assembléa. inimigos? E’ portanto o meu voto, que o projecto não
Com estas emendas fica o projecto muito passe: mas como o mal existe e é preciso remedio,
rasoavel, e servirá para segurar a propriedade de torne á commissão para formar o projecto de
cada um, e a facilidade das transacções, a que nada abolição do juizo dos ausentes; com o que ficará
tanto se oppõe como a incerteza e difficuldade dos curado o mal com a legislação existente, e que
embolsos. E’ incalculavel quanto obstão á circulação acautelão os casos das heranças, em que não ha
certas leis viciosas; umas vezes não empresta o herdeiros, dando-lhe um curador para poder ser
capitalista o seu dinheiro porque não é licito estipular citado a requerimento dos credores. Mandarei para a
francamente o interesse ou juro que aliás é corrente mesa esta emenda geral que laço ao projecto em
na praça, e ao qual até as mesmas nações se questão.
sugeitão quando contrahem emprestimos; outras
vezes occorre a idéa de que o devedor, ainda muito EMENDA
probo e abonado, póde morrer sem ajustar suas
contas, e vir talvez a arrecadação dos ausentes que Proponho como emenda geral que se mande
mette horror! Assim ficão immensos capitaes fazer novo projecto para extinguir o juizo dos
aferrolhados nos cofres que poderião á sombra de ausentes, com o que se remedêe o mal. – Arouche.
melhor legislação, ir animar boas emprezas de Foi apoiada.
agricultura e industria; assim se perpetuão os O SR. VERGUEIRO: – Não posso convir em
pantanos e se conservão as mattas cheias de que este projecto não passe, porque estou
jararácas, cascavéis e surucucús, quando podião persuadido que é de reconhecida utilidade, e que em
alimentar uma innumeravel povoação! Portanto voto nada ataca os direitos individuaes, principalmente
que passe o projecto com as principaes emendas sendo approvada a minha emenda, pois creio ter
apontadas. providenciado por ella tudo quanto requer a justiça.
O SR. AROUCHE RENDON: – Sr. presidente, Aqui ouvi que atacava o direito dos herdeiros pela
eu já aqui mostrei que este projecto não podia falta de citação, pois ninguem deve ser privado do
passar: então eu fiz ver miudamente os que lhe pertence, sem ser ouvido e convencido em
inconvenientes que delle resultavão; e agora tenho a juizo. Porém isto está acautelado na emenda, com a
satisfação de ver que o Sr. deputado Carneiro acaba citação que se faz quando se chamão pessoas
de lembrar, não só os mesmos inconvenientes que incertas, pois creio que estamos neste caso, e por
eu encontrei, mas tambem outros, que elle acaba de isso propuz a citação geral.
expender. O juiz não reconhece por herdeiros senão os
Por taes motivos, conhecendo eu que o mal habilitados; ainda mesmo que haja noticia de que
existia, e que o remedio deste projecto não seria existe algum, logo que não haja certeza e elle não
proficuo lembrei que o alvará de 10 de Novembro de esteja habilitado, não póde cobrar o que lhe
1810, com o que o precedeu podião ser ampliados pertence. A outra especie de citação tão longe está
para toda a qualidade de credores, porque em de fazer algum beneficio, que pelo contrario só serve
verdade, Sr. presidente, eu não descubro razão ordinariamente de augmentar consideravelmente a
conveniente porque o Brazil ha de attender mais aos despeza, que ás vezes chega a ser maior do que o
brazileiros negociantes, do que aos lavradores e importe da herança; porque, por via de regra, as
artistas, e em geral a todos. dividas pequenas são sempre em maior numero do
Porém examinando mais a materia, e que as grandes, e sendo necessario haver uma
pensando sobre ella, sou hoje de diversa opinião, demanda para cobrar cada uma das dividas
isto é, que esse não é o verdadeiro mal, o grande pequenas, ha um sem número de demandas, e a
mal que existe, e que nós devemos dar outro despeza é tal
152 Sessão em 25 de Agosto de 1823

que vêm as custas a importar mais do que o capital. A esta emenda se oppoz o nobre deputado o
Eis-aqui porque eu assento que deve haver Sr. Calmon, dizendo que ella causaria ainda maior
uma citação geral, para por este meio se chamarem mal, porque o novo projecto levaria muito tempo.
todas as pessoas que entenderem que têm direito á Engana-se o nobre deputado. E' mais facil e muito
herança. O uso da citação geral é portanto muito mais facil derrubar do que constituir de novo. Para
mais conveniente, sobretudo sendo feita por editos derrubar pouco tempo nos levaria, porque até ficava
para que chegue á noticia de todos. Emquanto remediado o vasio pela antiga legislação que ha a
estavamos sujeitos a Portugal, não havia remedio este respeito, emquanto não se desse outra
senão seguir o que se achava estabelecido, bem que providencia. Por isso digo, que visto ser o trabalho
se instituisse só para o Brazil, pela grande differença mais facil e o projecto em nada remediar os abusos
de colonia a metropole; mas agora não ha razão que existem é preferivel mandar formar um projecto
para que se sustente, nem injustiça em estabelecer pleno e completo, que aniquille até os vestigios deste
uma lei geral; injustiça será querer sustentar o monstruoso tribunal. (Apoiados.)
onus de colonia, quando já não somos mais colonia. O SR. SILVA LISBOA: – Sr. presidente, nada
Disse agora um nobre deputado que seria podendo addir de essencial ao que está ponderado
melhor fazer um projecto pelo qual se extinguisse pelos nobres membros sobre ser summamente
inteiramente este tribunal; eu convenho que deve ser impopular e odioso o juizo dos defuntos e ausentes,
abolido este monstruoso juizo em que se accumulão todavia ainda indicarei dous factos, que provão ter
tão grandes privilegios que atacão a propriedade esse juizo estabelecido o seu descredito sem fama e
individual; porém como se não apresentou um rumor em contrario. Dos nossos tratados com
projecto que tendesse a este fim, e só se tratou de Inglaterra e Hollanda ha perto de dous seculos, e
facilitar a cobrança das dividas addicionei o que se que se achão em impressas collecções de
apresentou para o generalisar nesta parte. (Não se convenções diplomaticas, consta que havendo
ouviu o resto.) estipulado os seus governos a liberdade de residirem
No fim do discurso mandou á mesa o seguinte e commerciarem os inglezes e hollandezes no Brazil,
additamento ao artigo 2º do projecto, e 1º das suas expressamente ajustarão que, fallecendo estes ahi o
emendas: dito juizo não entrasse na arrecadação dos bens do
Sejão citados por editos os interessados ou fallecido, mas os agentes das respectivas nações.
herdeiros. – Vergueiro. Na Bahia no principio deste seculo um negociante,
Foi apoiado. José Affonso de Carvalho, fazendo o seu testamento
O Sr. Calmon sustentou que em these a tendo em vista a Deus e a eternidade, declarou não
emenda do Sr. Arouche merecia a sua approvação, ter filhos nem herdeiros forçados, e por isso intituio
porque o juizo dos ausentes devia ser abolido por per universal herdeiro a um amigo a quem
odioso e injusto; mas que considerando o largo confidencialmente encarregou entregar a herança a
tempo que tinha levado a discussão deste projecto dous filhos naturaes que se achavão ausentes, um
que tendia sómente a remediar parte dos abusos do em Hollanda e outro em Portugal e a quem aliás já
mesmo juizo, se persuadia que seria eterna a de um havia reconhecido por seus filhos, por solemne acto
que se dirigisse a destruir de todo aquelle juizo; e na camara ecclesiastica, destinando-os para
não podia resolver-se a apoial-a. (Ajuntou a este entrarem nas ordens da igreja.
alguns outros argumentos que se não podem Assim viu-se o raro exemplo de uma
ordenar pelo que escreveu o tachygrapho Pedro instituição de herança fiduciaria, ou fidei-commissaria
Affonso.) da lei romana; e tudo só afim de que os bens do
O SR. GONDIM: – (Não o ouvirão os fallecido não fossem arrecadados pelo juizo dos
tachygraphos.) defuntos e ausentes. Mas como os seus fìscaes têm
O SR. ANDRADA MACHADO: – Ainda que os olfacto mais fino que os corvos em busca de
ataques feitos ás emendas não sejão tão valiosos cadaver, apenas falleceu o dito negociante, sabendo
como á primeira vista parecem, todavia é verdade o do reconhecimento referido, se ingerio na
que disse o nobre preopinante que tem embaraçado arrecadação (cujo inventario montou a cem contos
o projecto de tal maneira, e se lhe tem mettido tanta de réis) e annullou o testamento, confessando o dito
cousa estranha, que está reduzido a um labyrintho. amigo fiel á vontade confidencial do fallecido. Dahi
As emendas que se têm proposto, e mesmo o resultou tal barulho de pleitos pela intervenção de um
projecto todo, sómente dão um remedio por parcella; que se habilitou por herdeiro do mesmo fallecido por
e como eu sou inimigo de remedios por parcella, e cabeça de sua mulher em demanda de filiação, que
desejo remediar o mais que fôr possivel, votaria os filhos reconhecidos por seu pai ficarão até o
antes pela emenda proposta pelo Sr. Arouche, para presente defraudados e enredados ainda se achão
se acabar desde já com tal juizo de provedoria, que com litigios.
não faz parte essencial de nossa legislação, e que é
unicamente uma planta exotica.
Sessão em 25 de Agosto de 1823 153

Mas, Sr. presidente, será tudo isto bastante no congresso de Utrecht no principio do seculo
para já e já se alterar o regimento do dito juizo? passado: antes os inglezes e hollandezes tinhão o
Entendo que não, vistas tantas emendas que se têm commercio franco no Brazil, e estes já o havião
feito ao projecto e que bem mostrão a sua deixado, porque, segundo diz Mably no seu Direito
complicação e a difficuldade de reformar um systema Publico, os portuguezes navegavão com ainda maior
antigo, ainda que defeituoso e absurdo, sem pleno economia na carreira do Brazil a Portugal, e por isso
conhecimento de causa. As emendas propostas achavão mais conta irem buscar os generos do
excedem a dez, que requer o mestre da critica Brazil no deposito de Lisboa. Não duvido que
Horacio, perfectum decies non castigavit ad unguem. tambem depois as provisões da mesa da consciencia
Algumas dellas são dignas de se adoptarem quando tivessem por alvo o arranco dos capitaes do Brazil,
se fizer a reforma; outras não me parecem não pelo systema colonial, mas só pelo commum
coherentes. Mas, assim como na discussão que já erro de economia politica do tempo, pois esta
houve sobre o projecto de extincção da mesa da sciencia ainda está na infancia, visto que não se
inspecção, esta augusta assembléa determinou que advertia então no mal que se fazia á mesma
viessem as consultas do tribunal da junta do metropole com a falta dos capitaes circulantes nas
commercio sobre o requerimento dos povos a este colonias. Além de que as remessas do juizo erão
respeito, para se decidir com pleno conhecimento de mais em letras, que em moeda.
causa, parece coherente que o mesmo se pratique a Duas razões me occorrem para não se
respeito do tribunal da mesa da consciencia e proceder já á reforma do juizo. A 1ª é a manifesta
ordens, a quem por seu regimento e provisões de animosidade com que se considera o respectivo
resoluções de consulta, toca a inspecção da estabelecimento, como dictado pelo machiavelismo
arrecadação das heranças e bens dos defuntos e do systema colonial, e achando-se o Brazil tão
ausentes. aggravado pela injusta guerra que nos tem feito
Estamos, Sr. presidente, em systema de Portugal. Bem advertio o politico Tacito, que não
igualdade de lei. Se fallecendo negociantes sem convinha escrever a historia logo depois dos
testamento, ou com elle, tendo socios ou credores da successos; por se desfigurarem os factos pelos
praça, gozão estes do privilegio de cobrarem as suas partidos dos contendores, sendo então ella escripta
dividas no juizo do commercio, de qualquer quantia debaixo do influxo dos publicos rancores –
que sejão, sem previa citação de herdeiros ausentes, recentibus odiis composita, inter infensos, vel
nem encargo de fìança ao julgado, em virtude das obnoxios; neutris cura posteritatis. Esta regra não só
leis existentes (salvo o direito dos herdeiros) e desde por identidade, mas tambem por maioria de razão,
1766, em que se introduzio este direito, ninguem se deve prevalecer quando se fórma legislação. A 2ª
arripiou com essa anomalia juridica, attentas as razão tenho receio de declarar, por ter apparencia de
razões politicas em favor do commercio; porque nos incompativel com a moral universal; mas, com venia
arripiaremos de estender igual beneficio a todas as desta augusta assembléa, a submetto á sua
classes, interessando o estado na facilidade das equidade.
compras, vendas, transacções de credito dos Quando se propoz o projecto da nova lei entre
individuos, e quando aliás, pela liberdade do os seus principaes motivos foi a estagnação dos
commercio, ora as relações dos nossos concidadãos fundos que se achão em deposito no thesouro em
se têm estendido ao circulo maximo das nações mais de dous milhões de cruzados pertencentes aos
cultas, e ainda as conservamos nos defuntos e ausentes, que se não entregão aos
estabelecimentos que temos em Macáo e na India, credores, porque o regimento do juizo prohibe pagar
que é provavel se quererão unir ao imperio do além de duzentos mil réis, ainda sendo a divida de
Brazil? (Apoiados.) Sr. presidente: constituição, é o escriptura publica; mas essa mesma razão é a que
primeiro objecto desta augusta assembléa: ora muito prepondera no meu fraco espirito, para não
precisamos de saber a lei fundamental em que se alterar já tal regimento, attentas as actuaes
devemos viver. urgencias do estado. Sem duvida o credito publico
E' conveniente que vamos adiantando os reclama o actual pagamento das obrigações do
trabalhos sobre as urgentes reformas; mas, quanto thesouro.
ao definitivo no projecto em questão, convém se Mas é não menos notorio, que elle está
reserve para mais tranquillo tempo. Tenho ouvido exhausto, ou em grandes urgencias, por vazio
dizer que o juizo dos defuntos e ausentes foi do occasionado tanto pelas extraordinarias despezas da
invento machiavelico do systema colonial para guerra, como pelas desordens do governo anterior.
arrancar os capitaes do Brasil. Não penso assim. O O deposito é divida sagrada, quando é em dinheiro
estabelecimento na origem foi justo. Cada um de sacculo signato. Mas quando elle entra para a caixa
nós, estando ausente, não acharia bom que a justiça geral, e se confunde com o proveniente de outras
providenciasse á arrecadação de bens de sua arrecadações, tem a mesma natureza de conta
herança jacente? O systema colonial foi só aberta de credito e debito de negociantes. Se nos
estabelecido por ajuste das potencias que tinhão apertos em que se achão as nossas finanças, se
colonias na America franqueasse
154 Sessão em 25 de Agosto de 1823

já a todos os credores a cobrança de suas dividas, a para não facilitarmos os meios para a cobrança de
tumultuaria invasão causaria descredito terrivel ao taes dividas a beneficio dos credores, que além de
thesouro, e seria inutil a requisitoria pela se remirem de suas necessidades podem, á
impossibilidade da satisfação. Quando o nosso proporção de suas forças, soccorrer o estado?
banco sentio grande abalo pela remoção da côrte á Seremos por ventura mais zelosos dos direitos dos
Portugal, falliria sem remedio, se pagasse nossos inimigos que do nosso?
pontualmente todas as suas letras emittidas. A Sr. presidente, em uma e em outra hypothese
economia, que adoptou os modicos pagamentos, digo que é justo e necessario que se facilitem os
salvou o seu credito; e nem por isso se póde dizer meios de se dar a cada um o que é seu, com salva-
que faltou voluntariamente á fé publica. guarda do direito dos devedores, prestada fiança
A necessidade não tem lei, e fórça idonea: o contrario é opposto á justiça e repugnante
temporariamente a dispensa das leis. Isso aconteceu á equidade. Demais o dinheiro pertencente aos
até no banco de Inglaterra no furor da guerra representantes das pessoas finadas, ou existe ou
passada, quando o capital pecuniario se achava não: se no primeiro caso, pague-se aos credores,
estagnado nos cofres dos particulares pela paralysia como fica dito; se no segundo, facilite-se o meio de
do commercio, ou sahida para as operações irem recebendo segundo permittirem as
militares. Foi então impossivel pagar as suas notas circumstancias actuaes, sem que jámais obste a lei;
em moeda metallica, e o parlamento dispensou a lei sendo certo que para occorrer ás necessidades do
fundamental do estabelecimento, com o que se estado ninguem deve estranhar que o governo tenha
salvou o estado. lançado mão desse dinheiro aliás pertencente a
No governo britannico, onde todo o dinheiro particulares, successores dos fallecidos.
publico é com tanta exactidão fiscalisado nas suas Muito se tem dito sobre a necessidade da
applicações, todavia concede o parlamentar ao citação para por este modo se denegar a
ministerio um voto de credito, de grande quantia, e effectividade da cobrança, mas, Sr. presidente, não
esta, no fim da dita guerra, chegou a cinco ou seis será licito argumentar com identidade de razão para
milhões esterlinos, de que nem o mesmo ministerio é se obter igualdade de disposição? Acaso ignora-se,
obrigado a dar conta ordinaria publica. Tal é o bom que segundo a nossa legislação por vezes se
systema de um estado constitucional, onde se sabe dispensa este acto? Não é de direito sabido, que
dar e conservar a justa confiança nos seus para se proceder a partilhas devem ser citados todos
servidores nacionaes. Porque entre nós não se dará os interessados, mas se um estiver ausente por
ao thesouro algum respiro, bem que com transictorio modo que não possa ser citado, não se procede a
sacrificio dos credores dos defuntos e ausentes? ellas, ficando-lhe salvo o seu direito? Porque razão
Não digo isto para impugnar absolutamente o pois não poderá admittir-se a mesma legislação a
projecto de lei, pois estou persuadido que talvez o respeito dos ausentes, quando tenhão que oppôr á
dito juizo mereça extincção ou, ao menos radical e cobrança do dinheiro recebido pelo credor debaixo
reverendissima reforma. de fiança? A provisão de 54 não dispensa esta
O SR. TEIXEIRA VASCONCELLOS: – Apezar citação na propria pessoa para o pagamento de 100$
de se terem expendido mui justas razões, para que a 200$? Não será justo que pelos mesmos principios
se não supprima este projecto de lei, direi mais o que fique ella ampliada para o todo da divida?
me occorrer. Este projecto não é só relativo aos Ouvi dizer que não havia razão de se
representantes dos defuntos e ausentes, elle chamarem nossos inimigos os ausentes, que se
comprehende tambem aquelles que por motivo achão em Portugal, e que a nação brazileira deve ser
politico da independencia deste imperio se passarão generosa. Respondo: ninguem ignora o estado
para Portugal deixando bens que se achão presente em que nos achamos com Portugal; é
sequestrados: ora, estes, bem como os successores verdade que o sangue se não quer rogado, porém
dos finados nelle habitantes, se devem considerar na prevalecerá este adagio no seu devido tempo, e
presente quadra nossos inimigos; e sendo uns e quanto á generosidade, nunca esta deve ter lugar em
outros devedores, é de razão e justiça, que por seus bens alheios e contra os principios da caridade bem
bens sejão indemnisados os credores subditos deste ordenada. Ouvi tambem a um illustre deputado
imperio; aliás serão elles de melhor direito, que estes argumentar contra a paridade que fiz da assignação
tendo titulos authenticos, como sejão algumas de 10 dias: parece-me que, ou não me entendeu, ou
escripturas publicas, que são de fé provada ou ainda se enganou, porque é sabido que nesta acção
creditos na conformidade do alvará que lhes dá a summaria tem lugar a fiança que presta o vencedor
mesma força e validade. proseguindo-se na causa depois de recebidos os
Sabemos que existem predios urbanos e embargos: trouxe pois este lugar da ordenação para
rusticos, sabemos que ha dinheiro pertencente a demonstrar que havendo caso em que o autor
estes devedores; que razão pois póde haver recebe debaixo de fiança aquella quantia que o réo
lhe disputa, assim
Sessão em 25 de Agosto de 1823 155

tambem se póde considerar o credor, que prestando credores recebel-os soffreria um choque perigoso,
fiança póde soffrer opposição do devedor, a quem que é preciso evitar, ainda á custa de alguns
fica salvo o direito de o chamar a juizo, e convencel- sacrificios, e apontou em abono do que disse o
o, sem principio de prejuizo pela salva-guarda da exemplo do banco de Londres.
fiança. Como não vejo semelhança entre os dous
Voto portanto pelo presente projecto, pela sua casos escuso combater este argumento, e só direi
necessidade e até pela honra desta assembléa, que que isto ainda são effeitos da ladroeira portugueza
deve dar um testemunho que satisfaça ao publico, que felizmente não ha de continuar entre nós. O que
mostrando-se assim digna da confiança que lhe não posso porém deixar passar, pois o ouvi com
mereceu. assombro, é a proposição para mim nova que o
O SR. ANDRADA MACHADO: – Eu votei que governo tem em certos casos dominio na
não passasse este projecto e continúo nisso; quero propriedade do cidadão; não, Sr. presidente, nenhum
que se remetta tudo á commissão de onde emanou, governo do mundo tem direito na propriedade ou
afim de propôr uma nova peça. Um iIlustre bens de individuo algum; nunca póde valer-se de
preopinante julga que não é chegada a hora das dinheiros alheios; se o faz obra sem direito algum,
reformas; eu creio que é, sem embargo das razões viola as leis do fiel depositario, é um salteador, um
que apresentou... Disse tambem que assim como tyranno.
tinhamos a respeito da extincção das mesas de Eu creio que o illustre preopinante quereria
inspecção, entendido que se devia ouvir o tribunal da dizer que é do dever de todo o cidadão contribuir, e
junta do commercio, deveriamos tambem a respeito que o governo tem direito de receber; mas isto deve
deste projecto ouvir o tribunal da mesa da ser proporcionado aos meios de cada um; porque a
consciencia e ordens. obrigação de contribuir suppõe sempre o direito de
Sr. presidente, não vejo a identidade dos dous cada um o fazer como póde; ora, no nosso caso,
casos; quizemos ouvir a junta do commercio porque além de ir o peso só cahir sobre os credores,
nesse tribunal existião materias proprias que podião succedia que não erão ouvidos para verem, segundo
dirigir a commissão; existião queixas dos povos e os seus meios, o que podião dar na proporção da
consultas a esse respeito; ora na mesa da precisão do estado, o que faz uma grande differença.
consciencia e ordens não existe nada sobre a Demais, Sr. presidente, quando o estado se acha na
materia deste projecto; todavia não terei duvida em necessidade de fazer face a grandes despezas e não
que á commissão se diga que ouça esses senhores tem thesouro de reserva para as occasiões de
da mesa da consciencia e ordens; mas então urgencia, ou augmenta as contribuições ou recorre a
marque-se-lhes tempo para a resposta, porque se emprestimos; mas querer que o peso só caia sobre
deixarmos isso ao seu arbitrio não responderáõ uma classe de cidadãos e que os mais se fiquem
nestes tres annos; eu conheço quanto estes rindo, isso não; se carece abra um emprestimo; mas
senhores são aferrados ás suas praticas velhas; são nunca de modo algum se autorise o governo a dar
muito pegajosos; não largão nem á quinta facada. em ladrão; pois não seria outra cousa, recebendo em
Disse mais o illustre deputado que assim como deposito os bens alheios e não os querendo restituir.
a historia se não deve escrever logo depois dos O SR. SILVA LISBOA: – (Não o ouvio o
acontecimentos nella referidos, assim nós pela luta tachygrapho.)
em que estamos com a nação de que esta foi ramo, O SR. TEIXEIRA VASCONCELLOS: – Eu
nos deveriamos abster de legislar sem passar algum tanto respeito o direito de propriedade dos credores,
tempo para se obrar sem animosidade. que sou eu mesmo que os estou defendendo; nunca
O nobre preopinante sabe muito bem que disse que o governo devia agora considerar-se
grande differença ha de um a outro caso. A historia, autorisado para dispôr dos bens como seus; outro é
Sr. presidente, tem de pintar os caracteres das o meu modo de pensar, eu me explico. Antes da
figuras que nella representão, elogiar seus installação da assembléa todos os poderes estavão
conhecimentos e expôr seus crimes, e póde por isso reunidos em uma só pessoa; e então quem duvida
a pintura ser infiel e a descripção inexacta, ou por que pelo chamado dominio eminente e absoluto, era
odio ou por amor; mas o nosso caso é todo licito ao imperante dispôr desses bens pela maneira
differente; as pessoas não apparecem, não tratamos e fórma que bem lhe parecesse?
só de leis sem nos importarem os successos... E’ doutrina muito antiga e apoiada por
Serviu-se por ultimo o nobre deputado de um escriptores da primeira ordem que a salvação do
argumento que me obriga apezar de respeitar muito estado é a lei suprema; e por isso não se deve
as suas luzes a declarar que me pareceu um tanto estranhar a minha expressão affirmando que o
immoral. imperante tinha direito para lançar mão desse
Disse que tendo o thesouro tres milhões dinheiro pertencente a ausentes
destes bens, se por uma lei pudessem os
156 Sessão em 25 de Agosto de 1823

segundo a praxe fazia-se remessa delle para o erario luzitanas, e a nossa independencia não póde tardar
e na falta de pessoas legitimas para o receberem a ser reconhecida; uma vez que os brasileiros
applicava-se para captivos; mas como por este modo levantarão o pendão sagrado da sua independencia
(subsistindo esta legislação) ficão prejudicados os hão de triumphar com elle. E que forças se podem
credores, sejão elles esses captivos para receberem esperar de Portugal? Pelas que vierão á Bahia se
o que se lhes deve, substituindo aquelles o lugar mostra a fraqueza em que se acha aquelle reino.
destes. Portanto não se póde applicar ao Brazil o que
O SR. ANDRADA MACHADO: – Requeiro a se disse da lnglaterra, porque a salvação publica não
ordem; não admitto a comparação de subditos do exige semelhante remedio; e o que devemos fazer é
imperio com captivos; ainda que julgue que esta obrar com equidade attendendo aos direitos de
expressão sahio impensadamente. todos; e como é geral o patriotismo nos brazileiros,
O SR. TEIXEIRA DE VASCONCELLOS: – se fôr preciso, acudiráõ com seus bens e vidas á
Esta duvida não tem lugar; e o que eu disse não defeza da patria; mas por ora não nos achamos
póde ter outra intelligencia que não seja a de nessas apertadas circumstancias.
applicar-se este dinheiro a muitas pessoas a quem é O SR. FRANÇA: – Eu levanto-me meramente
tão preciso como a propria liberdade. para fazer uma observação sobre o que disse o
O SR. MONTESUMA: – Eu já não pretendia honrado membro o Sr. Lisboa. Não é exacto o que
fallar nesta materia. Ao principio fui de voto que não avançou respeito ao pagamento dos herdeiros ab-
passasse o projecto, mas depois que apparecerão as intestado; não ha herdeiros a todas as heranças
emendas do Sr. Vergueiro e outras mais, mudei de arrecadadas pelo thesouro; pelo que, quando mesmo
opinião. Hoje apparece uma indicação para que se houvesse elle de pagar o que tem recebido não
mande fazer novo projecto para se extinguir o juizo desembolsaria nunca senão uma parte mui diminuta
dos ausentes. dos fundos arrecadados; não chegaria isso nem a
Sr. presidente, este tribunal deve na verdade tresentos contos, e mesmo que pagasse tres milhões
acabar, mas nem por isso vejo que se siga que o não era tudo a um tempo; quanto mais que
projecto não deva passar, ficando assim privada a presentemente não póde haver credores a
nação do remedio de que necessita; nem posso semelhante quantia porque só ha a pagar aos que
persuadir-me que a assembléa em tres discussões existem no imperio, que julgo serão muito poucos:
não tenha visto o que convém á nação. Eu conheço pois a maior parte dos herdeiros estão fóra do
que devemos examinar tudo com muita imperio ou em Portugal, sugeito ao sequestro da sua
circumspecção para que a lei appareça baseada em propriedade aqui remanescente, com o que vem a
principios de justiça, pois quando estes faltão nunca ficar o dinheiro no mesmo thesouro; e outros já não
da medida adoptada podem resultar bens para a existem; pelo que o thesouro nada tem a pagar
nação... Não posso porém conformar-me com o que porque não ha esses herdeiros. E muitos finados ha
disse o nobre preopinante offerecendo o exemplo da que não têm parentes que os succedão em suas
Inglaterra para que tomemos della lição. Não posso heranças ab-intestado, como são por exemplo os
convir de fórma alguma em que os credores que filhos de pais incognitos. Do que tudo se conclue que
devem ser pagos pelo juizo dos ausentes sejão o thesouro pouco tem a pagar dessas quantias
obrigados a sacrificar suas fortunas para a patria arrecadadas, e isso mesmo mui lenta e
sem serem ouvidos; todos devemos concorrer com o progressivamente: donde não procede a duvida
que nos fôr possivel porém pelos meios legaes; pratica que apontou o mesmo illustre preopinante.
consulta-se a vontade de cada um para vêr se póde O SR. CARVALHO E MELLO: – Eu não
ou não contribuir e com quanto, para que não conste devera mais fallar sobre a materia deste projecto,
nunca que se fórça ou constrange a que se dê o que nem o pretendia fazer, por ter em outras occasiões
não póde talvez dar-se, sem se faltar á necessaria dito o que me occorreu por julgar que elle continha
sustentação das familias. Dêsse tudo, senhores, injustiça e desnecessidade. Receiava mesmo
para as urgencias do estado, mas voluntariamente, parecer importuno e repetir o que já estava dito, e
sem que haja a menor sombra de que se exige talvez de sobejo. Delibero-me porém ainda hoje a
forçadamente, porque isto é sempre uma manifesta fazer poucas e pequenas reflexões sobre a materia
injustiça. em geral, e em particular sobre aquella parte em que
Se a nação precisa, se está em crise perigosa, se trata dos dinheiros sequestrados.
tomem-se medidas proprias, abra-se um emprestimo Para nos convencermos de que este projecto
ou proponha-se alguma medida que satisfaça os fins, não póde passar, é argumento incontrastavel o
mas não se tire por força ao credor o que tem direito achar-se demasiadamente sobrecarregado de
de cobrar, e cuja falta o póde reduzir á indigencia e emendas e modificações. A difficuldade da materia,
miseria. Além disto, o estado actual das cousas do que mais evidente se tornou pela necessidade
Brazil não é tão temeroso como o querem pintar. A
meu vêr está já extincto o receio de invasão de
forças
Sessão em 25 de Agosto de 1823 157

das referidas emendas, é manifesta, porque que nem pela segurança da arrecadação, nem por
combinando-se as mesmas emendas que já estar o dinheiro estagnado e fóra da circulação, póde
passarão e se vencerão em diversos artigos, achar- ter lugar o que neste projecto se pretendeu
se-ha um todo sem connexão nem claresa, e até estabelecer. E' pois a minha opinião, que tem sido
appareceráõ vencidas algumas proposições que são sempre a mesma, que este projecto não passe, e
consequencias de outras que não passarão, e que, quando muito vá de novo á commissão de
teremos o desgosto de ver renhidas e porfiosas legislação não só o mesmo projecto, mas tudo
discussões frustradas, e perdido todo o tempo que quanto se tem dito, para que se forme um novo, o
nellas se gastou. Eu ouso affirmar, e sem qual contenha disposições mais justas e adaptaveis
temeridade, que na commissão da redacção das leis, é materia em questão, sobre novas indagações e
combinando-se o que foi vencido nos diversos informação do competente tribunal da mesa da
artigos, por mais trabalho que nisto se ponha, consciencia e ordens; e então appareceráõ
apparecerá um monstro que em vez de estabelecer proposições mais justas e uteis, tendo por base a
doutrina clara, regular e util, apresentará conclusões justiça e utilidade.
sem nexo, discordantes e até contradictorias. O Sr. Presidente declarou adiada a discussão
E que se podia esperar das multiplicadas por ter dado a hora da leitura de propostas.
emendas, distincções e modificações, que as O Sr. Secretario França deu conta de uma
difficuldades ponderadas por mim e outros illustres extensa representação da camara da villa de
collegas, trouxerão e produzirão? Acaso podião ser Baependy pedindo providencias sobre mui variados
luminosas e conforme aos principios da legislação objectos.
universal, que são sempre assentados em justiça e Foi remettido ás commissões de legislação e
utilidade geral, as doutrinas que mui de proposito e de commercio.
por necessidade se propuzerão? Nenhuma outra O Sr. Secretario Costa Aguiar leu uma
cousa podia de certo ser o resultado, senão o que ha felicitação da camara da villa do Rio Grande de S.
de a commissão da redacção apresentar, com o Pedro do Sul. – Foi recebida com particular agrado.
desgosto de que o vencido não póde passar por O SR. ANDRADA MACHADO: – Sr.
maneira alguma como projecto de lei, que ha de presidente, na semana passada decidio esta
regular o verdadeiro modo do pagamento das dividas assembléa que se apresentassem redigidas as leis
a que erão obrigados alguns fallecidos. que têm passada: mas foi-se a semana toda,
Eu quizera antes que outro fosse o producto entramos em outra, e nada apparece; portanto
dos nossos trabalhos, nem sou tão caprichoso e requeiro que se recommende a apresentação das
amigo das minhas opiniões que folgue do triumpho ditas leis.
dellas. Mas pela evidencia dos principios com que O SR. RODRIGUES VELLOSO: – Eu tenho
combati desde o principio este projecto, esperava aqui uma que vou ler; é sobre a fórma da
que não pudesse ir ávante. Não posso comtudo promulgação das leis.
deixar ainda em silencio quanto se diz sobre a A assembléa geral constituinte, e legislativa
necessidade e utilidade do mesmo projecto, pela do imperio do Brazil decreta provisoriamente:
parte que diz respeito aos sequestros feitos nos Art. 1º De todo o projecto de lei uma vez
dinheiros das heranças dos ausentes. reduzido a decreto e lido na assembléa, far-se-hão
A mesma injustiça que mostrei haver em se dous autographos assignados pelo presidente e os
pagarem dividas aos credores das heranças dos dous primeiros secretarios os quaes serão
ausentes sem audiencia dos Iegitimos herdeiros, apresentados ao imperador por uma deputação de
existe, quer esteja o producto das arrecadações nos sete membros, nomeada pelo presidente.
cofres dos ausentes, quer em sequestros, porque é Art. 2º Hum dos autographos será remettido
só a differença do lugar em que estiver depositado, e depois de assignado pelo imperador, ao archivo da
o uso que o estado pretender fazer do producto dos assembléa e o outro será promulgado na fórma do
mesmos sequestros não tem embaraço algum art. 4º.
porque esteja ou não pago algum credor, pois que se Art. 3º Os decretos da presente assembléa
fôr necessario ao thesouro publico despender serão promulgados sem dependencia da sancção
semelhantes dinheiros por necessidade urgente, imperial.
tanto o póde fazer existindo em um como em outro Art. 4º. A promulgação será concebida nos
cofre, porque com este uso contrahe a obrigação de termos seguintes: D. Pedro I, por graça de Deus e
o pagar a quem se mostrar com o competente titulo. unanime acclamação dos povos, imperador
A todo o tempo que se legitimar qualquer constitucional, e perpetuo defensor do Brazil, a todos
credor, virá pedir o seu pagamento ao thesouro, bem os nossos fieis subditos saude.
como o iria pedir a qualquer outro cofre onde
estivesse depositado. Salta pois aos olhos
158 Sessão em 25 de Agosto de 1823

A assembléa geral constituinte e legislativa do venha que eu a redijo mesmo aqui, pois não tem
imperio do Brazil tem decretado o seguinte (a letra nada que fazer; a que tem mais alguma cousa, e
do decreto). Mandamos portanto a todas as não é muito, é a das sociedades secretas; a outra
autoridades civis, militares e ecclesiasticas, que do Sr. Pereira da Cunha, não tem muito que redigir.
cumprão, e fação cumprir o referido decreto em Portanto a commissão redija as que puder no tempo
todas as suas partes, e ao chanceller-mór do prefixo na indicação, e estejão ou não todas
imperio, que o faça publicar na chancellaria, passar promptas levão-se as que o estiverem, porque tudo
por ella, e registrar nos livros da mesma o mais é vergonhoso.
chancellaria, a que tocar, remettendo os exemplares O SR. MONTESUMA: – Eu pedi a palavra
delle a todos os lugares á que se costumão antes do Sr. Andrada Machado ter fallado, e por
remetter, e ficando o original ahi até que se isso pouco accrescentarei. Eu cuido que o fim que
estabeleça o archivo publico, para onde devem ser teve o illustre preopinante nesta indicação foi o não
remettidos taes diplomas. ir unicamente um decreto que consta só das
Paço da assembléa, 19 de Agosto de 1823. – formalidades da promulgação; isto na verdade só
Antonio Rodrigues Velloso de Oliveira. – José serve para estar a gastar tempo, com idas de
Teixeira da Fonseca Vasconcellos. – João Antonio deputações, portanto eu votarei pela indicação, mas
Rodrigues de Carvalho. – José Antonio da Silva que se accrescente conforme o que disse o Sr.
Maia. – D. Nuno Eugenio de Locio e Seilbitz. – Antonio Carlos, que se acaso não estiverem nos
Bernardo José da Gama. – Estevão Ribeiro de oito dias redigidos todos os decretos vão os que se
Rezende. acharem a esse tempo promptos.
O Sr. Presidente propoz á assembléa se Esta hoje apresentada é necessario que
estava conforme ao vencido. – Decidiu-se que sim. appareça; uma lei tal como esta em que houve tão
O SR. RODRIGUES DE CARVALHO: – grande debate, e sobre a qual se tem dito tanta
Como a fórma da publicação das leis se acha já cousa, e até affirmado que de proposito se tem
estabelecida por este decreto, parece-me justo que demorado, deve já publicar-se, para que se
as commissões encarregadas da redacção dos que terminem essas injustas suspeitas, bem que eu
têm sido approvados os apresentem dentro de oito esteja capacitado que a commissão não se
dias, pois me parece sufficiente praso para a demorou de proposito. Voto pois pela indicação com
conclusão destes trabalhos. Eu fiz para este fim a este accrescentamento.
seguinte: O SR. FRANÇA: – Para que havemos agora
estar a tratar de mandar uma leisinha de
INDICAÇÃO formalidades? Sr. presidente, eu voto pela
indicação, não vá esta lei sem as outras, porque por
Proponho que os Srs. deputados das causa das outras é que se fez esta que não tem
differentes commissões que têm projectos de leis já objecto algum senão a publicação das outras, e
vencidos para os redigir, os apresentem no espaço portanto não deve ir sem ellas.
de oito dias para serem remettidos com o decreto O SR. RIBEIRO DE ANDRADA: – Eu voto
da promulgação. – O deputado Rodrigues de pela indicação com a clausula de irem no tempo
Carvalho. prefixo de oito dias as leis que estiverem redigidas:
O SR. ANDRADA MACHADO: – Eu creio não é essencial que vão todas; á proporção que
que excepto a commissão de legislação nenhuma vierem redigidas assim se irão remettendo. Sou
outra tem decretos vencidos, para redigir; mas porém de parecer que não vá esta lei só sem ir
desejaria saber se com effeito os ha em outros; acompanhada de outras leis; e como algumas dellas
porque já é tempo de os apresentar. têm mui facil redacção, podem sem inconveniente
O SR. MAIA: – Na commissão de legislação apromptar-se; tal é a lei dos procuradores de
não ha mais que um, e não se deve criminar a provincia, a do illustre deputado o Sr. Pereira da
commissão de descuidada, porque nada póde fazer Cunha, e ainda talvez outras de que me não
sem a remessa dos papeis necessarios. recordo. Por consequencia digo que no tempo
O SR. ANDRADA MACHADO: – Então não prefixo de oito dias a commissão encarregada da
posso deixar de dizer que os Srs. secretarios têm redacção das leis apresente as que tiver promptas,
sido descuidados porque as ordens derão-se e para que vá com ellas esta das formalidades da
devem ser executadas. Quanto á indicação digo que publicação. Nestes termos voto pela indicação.
não me opponho a ella: mas quero que se O SR. ANDRADA MACHADO: – Pois eu digo
accrescente que no fim dos oito dias hão de vir as mais; eu quero que, ou venhão ou não venhão,
que se acharem redigidas, pois se acaso não sempre esta vá a Sua Magestade; e por isso faço á
estiverem todas promptas fiquem para ao depois. indicação o seguinte additamento:
E' mais que tempo de se apromptarem, Comtanto que não apparecendo leis algumas
principalmente não tendo algumas nada que redigir;
a da extincção do conselho de estado
Sessão em 25 de Agosto de 1823 159

redigidas além da que agora se apresenta, sempre O SR. FRANÇA: – Eu não sei por que razão
esta vá. – Andrada Machado. se ha de estar aqui increpando a secretaria, e as
O SR. CARNEIRO DA CUNHA: – E’ commissões.
indispensavel a prompta remessa destas leis a Sua Se a assembléa todas as vezes que tiver
Magestade e além das razões geraes eu direi que a precisão de qualquer trabalho o declarar de urgencia,
minha provincia está pagando a um procurador nesta nunca haverá falta; o secretario está encarregado de
côrte sem necessidade alguma de seus serviços ao todo o que se faz, que na verdade é excessivo, e não
mesmo tempo que não tem meios para pagar as póde acudir a tudo por falta de tempo; mas
suas despezas ordinarias; o decreto para a extincção declarando-se urgente altera-se a marcha ordinaria e
do conselho de estado já está vencido e a sua acode-se ao mais preciso; fóra disto segue-se a
redacção é facillima, eu peço pois que vá com os ordem dos trabalhos, e não vejo motivo para
outros; e voto pela indicação, mas para que no termo increpações.
de oito dias vão os que estiverem promptos. O Sr. Presidente propoz á votação a proposta
O SR. MAIA: – Parece-me que esta restricção do Sr. Rodrigues de Carvalho. – Foi approvada.
de oito dias, além de escusada é muito injuriosa a Propoz depois o additamento do Sr. Andrada
qualquer das commissões. Machado. – Foi regeitado.
Se a assembléa pretende os decretos não tem O SR. ANDRADA MACHADO: – Eu quando
mais que ordenar que elles appareção; os que faltão votei pela indicação foi na persuasão que se
é porque ainda não sahirão da secretaria. Não se dê approvava com a condição que propuz.
deste modo a entender que a commissão não O SR. CARNEIRO DA CUNHA: – Tambem eu
cumpre os seus deveres. votei a favor della por entender o mesmo.
O SR. MONTESUMA: – Que sempre está O SR. ANDRADA MACHADO: – Desta vez
comprehendida em alguma falta, não ha duvida; apanharão-me, mas eu terei o cuidado de evitar o
porque esses mesmos que dizem que lá têm, logo os laço em outra occasião.
deveria ter apresentado, e elles ainda não Passou-se á indicação do Sr. Montesuma
apparecerão; portanto não está isenta de culpa. sobre os balanços do cofre da intendencia da policia,
Emquanto ao prazo dos oito dias não vejo que que ficára adiada na sessão antecedente em que
em marcal-o se offenda á commissão; não faz mais a fôra proposta.
assembléa do que determinar o tempo em que O SR. RIBEIRO DE REZENDE: – Sr.
entende que deve estar feito este trabalho, por presidente, eu não estava presente nesta augusta
querer quanto antes salvar a sua dignidade; não sei assembléa na ultima sessão em que se tratou deste
que por outro fim se tomasse esta medida, que é assumpto, e por isso exporei hoje os meus
aliás necessaria, e com a qual se não devem sentimentos.
seguramente dar por injuriados os illustres membros Desejoso de que a assembléa fosse inteirada
da commissão. do estado actual da repartição da intendencia geral
O SR. RODRIGUES DE CARVALHO: – Eu da policia, para que até conhecesse que não estava
sou membro della, e bem que não goste de culpar no pé em que devia existir, apressei-me a mandar
ninguem, sempre direi que o projecto das sociedades fazer balanços, que fiz distribuir pelos Srs. deputados
secretas mandou-o o official-maior da secretaria; os para que assim fosse patente a todos a marcha da
outros não sei onde estão. Creio que ao Sr. mesma repartição desde o dia em que entrei para
secretario é que competia o mandal-os; isto não se ella; e em prova da minha boa fé, até em
fez; e não sei como agora se pretende increpar a consequencia do mesmo balanço suspendi o
commissão de legislação, quando ella não tem culpa thesoureiro do exercicio de suas funcções.
alguma. Se ha falta é da parte de quem compete Eu conheço, Sr. presidente, ha muito tempo,
remetter. E porque é isto? Porque ninguem se quer que esta repartição não tem um regimento que
incommodar. Quando se diz ao Sr. secretario que regule a autoridade do seu chefe, nem tambem a sua
elle deve mandar, este diz que deve ser o official- administração, e quando servi nella em outro tempo,
maior, e afinal lá ficão os papeis sem destino. O na qualidade de ajudante do intendente, fiz todos os
certo é que o das sociedades secretas mandou-o o esforços para remediar alguns inconvenientes que se
official-maior, de sua propria curiosidade, sem que offerecião, e arranjar as cousas de uma maneira
tivesse ordem para isso. satisfactoria, mas não me foi possivel ultimar os
O SR. ANDRADA MACHADO: – Eu não sei meus desejos.
se forão ou não, mas devião ter ido; e esse mesmo Logo que entrei nella novamente lisongeei-me,
das sociedades secretas, que ha muito lá está, devia visto achar-se a assembléa felizmente installada, de
ter apparecido; ora, isto não póde deixar de dar uma que ella faria o possivel para remediar todos os
idéa de que a commissão tem sido descuidada. males que se achão nesta repartição, para a qual é
necessario olhar, se é que ella deve continuar a
existir; não fallo de
160 Sessão em 25 de Agosto de 1823

regular as attribuições do intendente geral da policia, se fazem por ordem immediata do imperador.
fallo sómente do que faz objecto da indicação do Sr. Para esses quinze ou dezesete recebi uma
Montesuma. portaria da secretaria de estado dos negocios da
Eu sei que este nobre deputado na sessão justiça, em que se ordenou que lhe acudisse com
antecedente notou algumas despezas que se achão 400 réis diarios; e reflectindo eu que na relação erão
nos balanços como pouco legalisadas; uma das que comprehendidos alguns militares, que talvez
apontou foi a de um conto de réis que apparece no vencessem soldo, e desejando economisar o cofre
balanço como despendido em diversos objectos a da policia, representei e tive em resposta que devia
cargo da intendencia, podendo-se por isso talvez continuar esses 400 réis por dia a estes militares,
entender que se gastarão para fins occultos de porque não vencião nada pelo thesouro publico.
espionagem. Os presos de galés em que tambem se falla
Eu não sei se teve ou não essa applicação; e no balanço, fazem serviços necessarios, que outros
quando dei o balanço e examinei a receita e trabalhadores, se não fossem elles, virião fazer, e
despeza, fiz na verdade alguma reflexão sobre esta não pelos 100 réis diarios que com cada um dos
parcella, que não achei documentada; mas vi depois ditos presos se despendem; economisando-se assim
que estava autorisada por uma portaria do meu gastos maiores do thesouro nacional, e tanto que
honrado antecessor, que se referio nella a uma continuadamente se pedem destes presos á policia
ordem de Sua Magestade Imperial; e devo para limpezas e outros muitos trabalhos, e pelo
accrescentar que muitas das despezas feitas pela menos se occupão nisto sessenta a setenta homens;
intendencia têm sido sempre unicamente autorisadas ainda ha pouco forão pedidos vinte cinco, por um
por ordens, ou do Sr. D. João VI em outro tempo, ou officio do ministro da marinha, para certo serviço no
do nosso Imperador; taes despezas erão depois arsenal. Ha, pois, necessidade de sustentar os taes
presentes a Sua Magestade, que conhecendo o presos, pela economia apontada, e porque, muitas
interesse dellas punha por um decreto o intendente vezes mesmo, pagando-se mais a homens de fóra
da policia a salvo de toda a responsabilidade. não apparecem, já porque o serviço é feito em
Eu espero que despezas desta natureza não estradas distantes, para onde os senhores não
sejão mais necessarias; mas até agora Sua querem que seus escravos se afastem, já por outros
Magestade que as autorisou é porque as achou muitos motivos; ficando por isso evidente que tal
precisas; estavamos em tempos muito arriscados, e despeza é mui bem feita, além de o ser com
era indispensavel activa vigilancia. Não póde, legalidade, como succede com quaesquer outras,
portanto, increpar-se por isso o illustre collega que pois nunca se abona despeza alguma de qualquer
acabou de intendente, porque obrou autorisado por natureza que seja sem ser cabalmente legalisada.
quem o podia autorisar Além destes presos ha outros que tambem a
Quanto ás outras parcellas que apparecem, e policia sustenta: são os pretos que vêm remettidos
que forão igualmente notadas pelo nobre deputado o de fóra. Logo que chegão se manda publicar pelo
Sr. Montesuma, direi tambem alguma cousa. Fallou Diario a sua chegada; mas emquanto não
nas despezas feitas com presos como lançadas com apparecem seus senhores estão comendo do cofre
pouca clareza; eu vou dar os esclarecimentos da policia; e esta, aproveitando-se delles para algum
necessarios. serviço publico, paga a menos braços de fóra; e
Antigamente, no tempo do antigo governo, depois quando os senhores apparecem pagão 100
sempre a policia tinha immensidade de presos que réis por cada um dia que os escravos forão
se demoravão dous e tres mezes por correcção e sustentados.
outros muitos motivos; mas hoje não é assim, são Quanto aos pretos minas, em que tambem
mui poucos os presos de policia, porque se tem tocou o Sr. Montesuma, passarei a dizer o que ha.
adoptado o methodo de não condemnar ninguem; Quando aqui chegou uma embarcação
prende-se, por exemplo, um homem achado com apresada com escravos minas, e que se julgarão
uma faca, ou em qualquer desordem, o livres, forão dados condicionalmente a varias
commandante da guarda da policia o remette pessoas por dez annos, e o nobre deputado que está
immediatamente ao ministro criminal do bairro; este presente, e que então servia o lugar de intendente
lhe fórma a culpa, e a policia fica fóra disto; e os que geral de policia, lembrou-se mui acertadamente que
vêm remettidos de fóra, que são diariamente oito, devia ficar a policia com quarenta destes pretos, pela
dez ou doze, vão logo igualmente para as varas utilidade de os empregar nos trabalhos do passeio
criminaes. publico, illuminação da cidade e outros serviços
A policia limita-se hoje a vigiar sobre a como os de estradas, para os quaes não se achão
segurança publica unicamente.
Estes presos de que falla a relação não são
presos de policia, são da natureza de quinze ou
dezesete vindos de Pernambuco, que se achavão ha
pouco, ou que ainda se achão presos; e as despezas
feitas com elles, sempre
Sessão em 26 de Agosto de 1823 161

com facilidade escravos jornaleiros, e quando se SESSÃO EM 26 DE AGOSTO DE 1823.


encontrão alguns são muitas vezes de grandes
distancias, como de duas e tres leguas, e é preciso PRESIDENCIA DO SR. BISPO CAPELLÃO-MÓR.
então sustental-os com vencimento de grandes
jornaes. Reunidos os Srs. deputados pelas 10 horas da
Por esta reconhecida utilidade se tomarão e se manhã, fez-se a chamada e acharão-se presentes
conservão estes pretos minas, não se podendo 68, faltando os Srs. Andrada Machado, Martins
considerar senão como muito bem empregada a Bastos, Accioli, Andrada e Silva, Ferreira Nobre,
despeza que com elles se faz. Carneiro da Cunha, Almeida e Albuquerque, Ribeiro
Disse mais o illustre deputado o Sr. de Andrada e Ferreira de Araujo.
Montesuma, que a repartição não tinha contadoria, O Sr. Presidente declarou aberta a sessão e
nem quem fiscalizasse cousa alguma. lida a acta da antecedente foi approvada.
Sr. presidente, se em outro tempo, Foi remettida á mesa a seguinte declaração de
principalmente logo que o Sr. D. João VI estabeleceu voto:
no Brazil a intendencia da policia, se tivesse tratado Declaro que na sessão do dia 25 votei pela
disto com attenção, seguramente se teria feito um indicação do Sr. Andrada Machado, em que
regimento; porém não se cuidou de cousa alguma, e pretendia que não havendo outras leis redigidas no
até hoje as arrecadações são feitas da mesma tempo aprazado, se remettesse sempre a lei do
fórma. formulario para a promulgação.
Eu tenho servido muito nesta repartição, e Paço da assembléa, 26 de Agosto de 1823. –
bem conheço a necessidade de se crear uma Luiz Ignacio de Andrade e Lima. – Carneiro da
contadoria, porque esta e a thesouraria estão Cunha. – Fortuna.
confundidas na secretaria da policia, com mil O Sr. Secretario Costa Aguiar participou ter
inconvenientes do serviço. Isto mesmo foi recebido as seguintes felicitações:
reconhecido pelo meu honrado antecessor, o Sr. 1ª Do governo provisorio da provincia do Rio-
Antonio Luiz, que chegou a representar sobre este Grande do Norte. – Foi recebida com particular
objecto, e havendo já um decreto datado de 17 de agrado.
Março de 1821, que mandava crear a thesouraria e 2ª Da camara da villa de Baependy, offerecida
contadoria, não sei que inconveniente teve esta pelo seu representante João da Cruz da Silva
providencia que se não poz em execução. Guimarães, que se achava á porta do salão. – Foi
O certo é que eu já fallei a Sua Magestade recebida com particular agrado; e dous Srs.
Imperial, e lhe disse que era muito necessario crear secretarios sahirão a cumprimentar o dito deputado
esta contadoria, porque da fórma em que as cousas da camara, na fórma do estylo.
se achão é grande a confusão. 3ª Da camara da villa da Campanha da
Da minha parte tenho feito quanto posso para Princeza, offerecida pelo seu representante José
remediar estes males; os meus honrados Antonio de Almeida, que igualmente se achava á
antecessores fizerão o mesmo; e observando-se o porta do salão. – Praticou-se o mesmo que com a
decreto que ainda está sem execução parece-me antecedente.
que fica tudo em ordem, e cessaráõ os escrupulos Deu o mesmo Sr. secretario conta de dous
do illustre deputado o Sr. Montesuma e de todos officios:
aquelles que se interessão pela boa marcha daquella 1º Do Sr. deputado pela provincia de
repartição, de que estou á testa. Pernambuco Manoel Maria Carneiro da Cunha
E' quanto tenho a dizer. dando as razões porque não podia vir
Declarou-se adiada a discussão por dar a immediatamente tomar assento no congresso. –
hora. Ficou a assembléa inteirada.
O Sr. Presidente assignou para a ordem do 2º Do Sr. deputado pela provincia de Goyaz
dia: Joaquim Alves de Oliveira participando que por
1º A continuação da 3ª discussão do projecto impedimento phisico estava impossibilitado de tomar
sobre fazenda de ausentes. assento na assembléa. – Foi remettido á commissão
2º A nomeação da commissão especial para a de poderes.
redacção das leis. Participou tambem que estava sobre a mesa o
3º Regimento da assembléa. diploma do Sr. Henriques de Rezende que se exigira
Levantou-se a sessão ás 2 horas da tarde. – da camara de Olinda. – Mandou-se guardar no
Manoel José de Souza França, secretario. archivo.
E por ultimo deu conta de uma representação
de varios habitantes e lavradores do Ceará,
mandada á mesa pelo Sr. Costa Barros. – Foi
remettida á commissão de agricultura e commercio.
Comparecerão então na sala os Srs. Ribeiro
162 Sessão em 26 de Agosto de 1823

de Andrada e Almeida e Albuquerque e tomarão os que fórma hoje a sessão de 66 e não sei porque os
seus assentos. doze que talvez estão na sala immediata não têm
Passou-se á ordem do dia que era a direito a votar, uma vez que comparecerão, muito
continuação da 3ª discussão do projecto sobre mais tratando-se da approvação ou rejeição de um
fazenda de ausentes. projecto de lei que nos deve merecer a maior
Depois de fallarem vazios Srs. deputados circumspecção.
(cujos discursos se não transcreverão por se não Eis-aqui porque tambem sou de voto que se
entender o tachygrapho Silva) julgou-se a materia devem chamar.
discutida. Fizerão-se mais algumas refIexões e por fim
Compareceu a este tempo na sala o Sr. Accioli decidiu-se que ficava adiada a discussão do artigo,
e tomou assento. em consequencia do empate da votação, na fórma
O Sr. Presidente propôz então a assembléa: do regimento.
1º Se o projecto se regeitava de todo. – Venceu-se 3º Se o adiamento do artigo 1º prejudicava a
que não. continuação da votação sobre os outros. – Venceu-
2º Se a assembléa approvava o art. 1º. – Ficou se que não.
empatada a votação com 27 votos pró e 27 contra. 4º Se o art. 2º se approvava tal qual, sem
O SR. VERGUEIRO: – Parecia-me justo que relação ás emendas respectivas. – Venceu-se que
se chamassem os Srs. deputados que estão lá não.
dentro, pois creio que uma vez que vierão á 5º Se a assembléa supprimia a clausula –
assembléa devem comparecer na votação; talvez a subditos deste imperio – conforme a emenda do Sr.
sua ausencia désse causa ao empate. Teixeira Vasconcellos. – Venceu-se que sim.
O SR. COSTA AGUIAR: – A votação está 6.º Se approvava o art. 1º da emenda do Sr.
regular; estão presentes 54 Srs. deputados e com 46 Vergueiro. – Não se approvou.
já a votação é valiosa. Eu não posso entender outra 7.º Se approvava o art. 2º da mesma emenda.
cousa. – Foi approvado.
O SR. ARAUJO LIMA: – Nunca digamos que 8.º Se approvava o art. 3º da dita emenda. –
a votação está nulla; é um erro que não deve Foi approvado.
espalhar-se; 46 Srs. deputados fazem casa e 9º Se approvava a 1ª parte do art. 4º da
representão a nação, e portanto a votação está mesma emenda, até as palavras – cousa vencida. –
valida, na conformidade do regimento que é a lei que Foi approvada.
nos rege. 10. Se approvava a 2ª parte do dito artigo que
O SR. MONTESUMA: – O illustre deputado respeita ao rendimento a juro da lei. – Não se
não disse cousa alguma de novo; todos nós approvou.
sabemos o que se tem vencido a este respeito, mas 11. Se a obrigação da fiança devia durar por 5
trata-se de saber se é bem applicada neste caso a annos. – Venceu-se que não.
determinação do regimento. 12. Se devia durar 3 annos. – Venceu-se que
Pela chamada sabe-se que vierão mais Srs. sim.
deputados do que estão agora no salão e até alguns 13. Se passava a doutrina do art. 5º da dita
que fallárão na discussão não se achão presentes; emenda. – Venceu-se que não.
parece-me pois que é de razão chamarem-se, 14. Se estava prejudicado o art. 6º pelo
porque fazem hoje parte da representação e até vencimento do anterior. – Decidio-se que sim.
julgo que sem elles não é valiosa a votação. (A' 15. Se approvava o art. 7º da dita emenda.
ordem, á ordem.) Venceu-se que não.
O SR. COSTA AGUIAR: – Eu não sei como 16. Se approvava o art. 3º do projecto até ás
isto ainda é objecto de questão. A assembléa já palavras – arrecadação do juizo – Venceu-se que
decidiu que havia sessão com 46 Srs. deputados, não.
logo, a votação que se faz com este numero 17. Se approvava a 2ª parte até á palavra –
necessariamente ha de ser valiosa, se isto é assim sequestrados. – Venceu-se que não.
como ha de deixar de sêl-o com 54? 18. Se o resto do artigo estava prejudicado. –
Confesso que não vejo razão para duvidar da Decidio-se que sim.
validade da votação, a não ser por vontade de 19. Se approvava o art. 4º sem relação ás
argumentar. emendas. – Venceu-se que não.
O SR. CARNEIRO DE CAMPOS: – Quando 20. Se approvava a 1ª parte do artigo com
nós decidimos que houvesse sessão com 46 Srs. suas emendas. – Venceu-se que não.
deputados, o numero dos reunidos era muito menor; 21. Se approvava a 2ª com suas emendas. –
e além disto, se não tivessem vindo mais senhores Venceu-se que não.
hoje á assembléa, nada dizia, mas eu vejo pela 22. Se approvava a emenda do Sr. Rocha
chamada do Sr. secretario Franco relativa ás fianças. – Venceu-se que não.
23. Se passava o artigo addicional do Sr. Maia
para se appellarem ex-officio as
Sessão em 27 de Agosto de 1823 163

sentenças para a mesa da consciencia. – Não RESOLUÇÕES DA ASSEMBLÉA


passou.
24. Se os tres annos concedidos para PARA MANOEL JACINTHO NOGUEIRA DA GAMA
desoneração das fianças, se concedião como praso
aos herdeiros para embargarem as sentenças. – Illm. e Exm. Sr. – A assembléa geral
Venceu-se que não. constituinte e legislativa do imperio do Brazil,
25. Se approvava o art. 5.º do projecto. – approvando o parecer da commissão de fazenda
Decidio-se que não. sobre o requerimento de Francisco Duarte Nunes,
O Sr. Secretario Costa Aguiar pedio a palavra fiel pagador do thesouro publico, que pedio ser
para ler o seguinte officio do ministro dos negocios aposentado com o ordenado por inteiro e alguma
da fazenda. providencia para pagar a divida de seis contos e
Illm. e Exm. Sr. – Manda Sua Magestade o oitocentos mil réis que contrahio para preencher o
Imperador que se remetta a V. Ex., para ser presente alcance de igual quantia em que achou o seu cofre
á assembléa geral constituinte e legislativa, a em um dos balanços semestraes do mesmo
consulta inclusa do conselho da fazenda para que a thesouro: resolveu não obstante ser indeferivel o
mesma assembléa haja de resolver o que lhe requerimento em ambas as partes por não se fundar
parecer sobre o requerimento dos negociantes desta em lei, autorisar o governo para aposentar o
praça em que pedem a derogação do decreto de 11 supplicante com o ordenado que lhe parecer justo,
de Dezembro do anno passado na parte relativa ao em attenção aos seus bons e longos serviços, e a
sequestro sobre os bens dos habitantes de Angola. sua avançada idade que o impossibilita de continuar
Deus guarde a V. Ex. – Palacio do Rio de no exercicio do seu emprego. O que V. Ex. levará ao
Janeiro, 25 de Agosto de 1823. – Manoel Jacintho conhecimento de S. M. Imperial. – Deus guarde a V.
Nogueira da Gama. – Sr. José Ricardo da Costa Ex. Paço da assembléa, em 26 de Agosto de 1823. –
Aguiar de Andrada. José Ricardo da Costa Aguiar de Andrada.
Foi remettido á commissão de legislação.
Leu depois outro do ministro dos negocios do SESSÃO EM 27 DE AGOSTO DE 1823.
imperio concebido nos termos seguintes:
Illm. e Exm. Sr. – De ordem de Sua PRESIDENCIA DO SR. BISPO CAPELLÃO-MÓR.
Magestade o Imperador remetto a V. Ex. para ter
presente á augusta assembléa geral constituinte e Reunidos os Srs. deputados pelas 10 horas da
legislativa do imperio do Brazil o officio incluso da manhã, fez-se a chamada e acharão-se presentes
camara da villa de S. João d'el-rei em que pede, a 68, faltando com causa os Srs. Andrada Machado,
bem dos seus habitantes, uma reducção nos Rocha Franco, Gama, Andrada e Silva, Ferreira
impostos que se pagão no grande numero de Nobre, Carneiro da Cunha, Andrade Lima, Ribeiro de
passagens daquelle destricto, por depender este Andrada e Ferreira de Araujo.
objecto da decisão da mesma assembléa. O Sr. Presidente declarou aberta a sessão, e
Deus guarde a V. Ex. – Palacio do Rio de lida a acta da antecedente foi approvada; fazendo-se
Janeiro, 25 de Agosto de 1823. – José Joaquim nella a declaração que pediu o Sr. Costa Barros de
Carneiro de Campos. – Sr. José Ricardo da Costa ter sido elle quem apresentára a representação de
Aguiar de Andrada. varios habitantes e lavradores do Ceará, cuja
Foi remettido á commissão de fazenda. declaração faltava na acta.
Passou-se á 2ª parte da ordem do dia que era O Sr. Secretario Costa Aguiar deu conta de
a nomeação da commissão da redacção das leis. uma felicitação da camara da villa do Rio Pardo,
O Sr. Presidente propoz se a commissão se dirigida por Antonio Vieira da Soledade, que fôra
comporia de tres membros e decidindo-se que não, procurador da provincia de S. Pedro. – Foi recebida
propoz o numero de cinco e foi approvado. com particular agrado.
Procedeu-se á eleição e sahirão eleitos os Srs. O SR. SOUZA MELLO: – Sr. presidente,
Maciel da Costa com 42 votos; Miguel Calmon com levanto-me para declarar que uma carta que hontem
34; Francisco Carneiro com 33; Carvalho e Mello recebi, com data de 10 de Julho proximo passado,
com 29; Silva Lisboa com 22. do governador das armas da provincia das Alagôas,
O Sr. Presidente assignou para a ordem do me diz que aquelle militar me tem encarregado por
dia: 1º A discussão do art. 1º do projecto sobre mais de uma vez de apresentar a esta augusta
fazenda de ausentes, adiado por empate de votação. assembléa suas felicitações e votos de respeito e
2º O projecto sobre a creação de duas universidades adhesão; e como não tenho recebido taes cartas e
no imperio. desejo que eu e elle não sejamos censurados nos
nossos deveres, assim o participo, e envio á mesa
uma nota escripta que requeiro seja inserida na acta,
para que conste,
164 Sessão em 27 de Agosto de 1823

emquanto a dita autoridade renova seus referidos da necessidade da fundação de algumas


votos. universidades no imperio: este desejo geral dos
brazileiros é de tanta justiça, que ninguem
DECLARAÇÃO licitamente poderá censural-o.
Parecia pois que tratando-se de um tal
Como por uma carta do governador das armas objecto, nada se poderia oppôr contra o projecto, que
da provincia das Alagôas Joaquim Marianno de a illustre commissão apresenta; entretanto eu não
Oliveira Bello, com data de 10 do passado, elle me posso deixar de me declarar contra elle: darei as
participa ter por mais de uma vez encarregado-me a minhas razões; duas são principaes, a 1ª porque o
felicitação e puros votos de adhesão que elle projecto não corresponde ao seu fim: a 2ª porque
protesta a esta augusta assembléa, e á não apresenta alguma base, em que nas nossas
independencia do Brazil, e eu não tenho recebido discussões possamos firmar-nos para não
taes papeis ou cartas, requeiro que em boa fé se perdermos o nosso trabalho. Que o projecto não
receba com particular agrado, ou na fórma do estylo, corresponde ao seu fim, demonstra-o a sua simples
este annuncio, emquanto a referida autoridade o leitura. (Leu.)
ratifica. Paço da assembléa, 27 de Agosto de 1823. – Contém o projecto uma promessa, ou uma
O deputado, José de Souza Mello. esperança de que hão de haver duas universidades;
O SR. COSTA AGUIAR: – Eu julgo que tendo que estas hão de ter estatutos; e que em tempo
dito o nobre deputado nesta assembléa, como acaba competente se designaráõ os fundos precisos.
de fazer, que não recebeu taes papeis, está salva a Ora, quem não vê que neste projecto nada se
sua reputação, sem que seja preciso fazer-se estabelece que possa fazer realisar a fundação (não
menção na acta, onde creio que não tem lugar digo já de alguma universidade) mas de qualquer
semelhante declaração. outro estabelecimento litterario?
O SR. CALDAS: – Parece-me que já se Nada é mais facil do que prometter fortunas
apresentou aqui uma felicitação do governador das para algum dia; mas que proveito nos vem destas
armas da provincia das Alagôas, e que foi recebida promessas? O que nós queremos, e de que
com particular agrado. precisamos é de vantagens reaes: se temos
O SR. SOUZA MELLO: – E' certo que o necessidade de estabelecimentos scientificos, não
sobredito governador já aqui veio assignado nos devemos contentar com planos de semelhante
conjunctamente em uma felicitação do governo civil natureza: pela fórma em que é concebido o projecto,
da provincia; mas como elle o quer fazer tambem por podia a illustre commissão prometter-nos logo tantas
si só, como me participa, eis o motivo porque trato universidades quantas são as provincias do imperio.
desta materia; pois ainda que a nota que offerece Eu disse que o projecto, não apresenta
não seja inserida na acta, ha de constar do Diario alguma base, em que nos possamos firmar nas
que isto aqui se passou, e tenho conseguido o meu nossas discussões, para não perdermos o nosso
fim. trabalho; demonstrei já que elle nada nos offerece de
O Sr. Presidente propoz, se devia inserir-se na positivo: sendo assim, como poderemos discorrer
acta a declaração que requerera o illustre deputado. sobre planos aereos, sem gastarmos o nosso tempo
– Decidiu-se que não. inutilmente?
Passou-se á ordem do dia, e entrou em A unica cousa que parece se poderá realisar
discussão o art. 1º do projecto sobre fazenda de segundo o plano apresentado é o curso juridico em
ausentes, que ficára adiado por empate de votação S. Paulo; mas se ainda não ha fundos destinados, se
na sessão antecedente. ainda não ha mestres, como nessa universidade
Por não haver quem pedisse a palavra, foi ideal de S. Paulo se ha de ir estudar o curso juridico?
posto á votação, e ficou supprimido. E que razão haverá para ser em S. Paulo que se vá
Propoz então o Sr. presidente se o projecto se estudar o curso de direito? Eu creio que a pretender-
sanccionava, ou se devia ir primeiro á commissão da se que esta, sciencia seja (o que eu não supponho,
redacção das leis, attenta a confusão das emendas. nos termos em que ella se ensina) a primeira á que
– Decidiu-se que fosse á commissão. deva ter attenção o governo, em nenhuma parte
Passou-se á 2ª parte da ordem do dia, que era póde ella ensinar-se já, com mais facilidade do que
a 1ª discussão do projecto sobre a fundação de duas aqui na côrte, onde a concurrencia de maior numero
universidades no Brazil. de jurisconsultos habilita a abertura do curso desde
O SR. ALMEIDA ALBUQUERQUE: – Sr. já; o que não acontecerá assim em outra qualquer
presidente, convencido da necessidade que ha, de provincia. Não digo que fique sendo na côrte que se
que as luzes se propaguem entre nós, e que o ensinem para o futuro as faculdades juridicas; nem
cidadão brazileiro tenha, sem dependencia de sou de opinião que a universidade se estabeleça
recorrer a paizes estrangeiros, todos os meios de aqui; mas sustento que só aqui é que póde abrir-se
adquirir quaesquer conhecimentos scientificos, não desde já um curso juridico, e não em outra alguma
posso deixar de me convencer tambem
Sessão em 27 de Agosto de 1823 165

parte. A’ vista do que tenho dito concluo que, não para o ensino dos estudos menores, tivesse lugar o
apresentando o projecto algum plano que se possa estabelecimento de collegios e universidades onde
realisar, deve voltar á commissão, para que se ensinassem as sciencias maiores, mas, porque
proponha os meios de fazer effectiva a creação de ainda se hão de apresentar os planos ainda se hão
uma, ou mais universidades, tendo em vista os de formar as commissões para exame dellas, ainda
fundos indispensaveis, os mestres que se devem se ha de approvar um; e ainda se ha de esperar pelo
convidar fóra do imperio; n'uma palavra, tudo que aproveitamento dos mancebos, que pelo methodo
faça effectiva a fundação dos estabelecimentos, que desse plano hão de ser ensinados, é justo e
pretendemos; effectividade que se não consegue summamente necessario, que desde já se
com simples promessas. estabeleção universidades, nas quaes possão
O SR. FRANÇA: – Eu entendo não ser aprender os mancebos que pela fórma actual dos
urgente a creação de duas universidades desde já. estudos estiverem em circumstancias de dedicar-se
E' mister attender-se ao estado das nossas rendas, e aos maiores. Não é necessario dizer a necessidade
ao muito em que se ellas devem applicar, para em que estamos de taes estabelecimentos: não os
economisarmos de conformidade a creação de temos, e até agora era preciso aos nossos
novos estabelecimentos de publica manutenção. concidadãos atravessar os mares, e á custa de
Demos impulso á obra que o tempo aperfeiçoará despezas e outros sacrificios ir aprender á
com progressivo augmento de faculdades. Se universidade de Coimbra.
cortarmos largo, se queremos fazer tudo de uma vez, Nós todos sabemos, que apezar do que
o resultado ha de ser não fazermos nada. alguns têm dito sobre os defeitos destes corpos
Convém pois tratar por ora da creação de uma scientificos, são elles estabelecidos em todos os
só universidade: e para esse effeito aproveitar os paizes cultos; que nelles forão e vão aprender os
elementos existentes que houverem em qualquer homens celebres de todas as nações; que nessa
parte onde por melhor se haja de julgar o seu mesma unica de Portugal se formarão os antigos que
assento; unindo em corpo academico as cadeiras de nos precederão, e os que actualmente exercem os
ensino que houverem já creadas, e algumas rendas, empregos mais distinctos do estado; e que pela
ou consignações publicas, cuja applicação se possa luminosa reforma instituida pelo celebre rei D. José I,
converter á este ramo de administração. Nem é se apurarão os conhecimentos das faculdades que
mister que desde logo se creem todas as cadeiras. nella se ensinão com approvação e admiração de
As sciencias em razão de methodo se ensinão por toda a Europa.
secções, cujos conhecimentos têm dependencia uns Quando nós emprehendemos o grande e
dos outros; e primeiro hão de ter exercicio umas magnifico estabelecimento e consolidação deste
cadeiras do que outras, cujas lições dependão de imperio, que fará época assignalada na historia dos
conhecimentos que se ensinão nas primeiras. Tudo grandes acontecimentos politicos; não nos devemos
isto cumpre attender-se para de tudo se tirar o esquecer de lançar logo os alicerces da sua
partido conveniente. prosperidade futura, instituindo este monumento
O SR. CARVALHO E MELLO: – Sr. indelevel de sabedoria, do qual sahiráõ homens
presidente, no projecto, que se apresenta hoje á abalisados nas sciencias para encherem os lugares
nossa discussão estão incluidas materias de summa e empregos do estado.
importancia, e do maior interesse publico. Depois de E na verdade, Sr. presidente, um paiz tão
proporem seus illustres autores, um programma para dilatado, tão cheio de riquezas, e que com o andar
se obter um plano de educação e instrucção publica, dos tempos crescerá em povoação, ha mister que
no qual se estabeleção principios e regras afim de nelle se estabeleção duas universidades, uma na
conseguir que por ensino regular, e como por cidade de S. Paulo e outra em Pernambuco.
degráos possão os mancebos brazileiros adquirir os A situação destas duas cidades está
conhecimentos necessarios e uteis, lembrarão-se do mostrando que ellas são as mais aptas para isto. A’
estabelecimento de duas universidades, e porque de S. Paulo concorreráõ todos os habitantes das
estas não podem logo que forem decretadas, provincias mais chegadas ao sul, e á de Pernambuco
começarem no seu exercicio, lembrarão logo a os que estão mais para o norte.
providencia de instituir um curso juridico na São ambas situadas em clima sadio,
universidade de S. Paulo. abundantes em viveres, vizinhas a portos
E' claro que o fim politico destas commodos, e por isso accessiveis por jornadas de
determinações foi prevenir desde já a necessidade mar e terra; e ainda que pareça, que pela grande
em que estamos de taes estabelecimentos, para extenção deste paiz ficão para algumas provincias
termos cidadãos habeis para os empregos do em grandes distancias, comtudo, no estado actual
estado. Porquanto parecia natural, que só depois de não se póde nem devem estabelecer mais, porque
approvado aquelle plano, que mais judicioso nem a povoação é tanta, que exija maior numero de
parecesse universidades, nem a falta de mestres e de cabedaes
para as suas despezas permitte maior numero. Muito
custará
166 Sessão em 27 de Agosto de 1823

provêl-as de mestres sabios e abalisados, e natural, publico e das gentes, de politica e economia
determinar a sufficiente renda para a sua politica; e que os homens que se destinão para
manutenção. semelhante carreira na Europa vão por via de regra
Os autores deste projecto julgarão que os estudal-os ás universidades.
mestres lhes dessem estatutos proprios, começando Os inglezes e os allemães o fazem, e os das
a regerem-se pelos da universidade de Coimbra. Mui mais nações; e os francezes até estabelecerão aulas
acertado é, que assim se execute; e sou de parecer proprias para um curso diplomatico. Os que fizerem
que os referidos mestres têm mais que cortar dos os estatutos proprios para as faculdades juridicas,
taes estatutos, do que innovar e accrescentar. cortando a muita extenção e profundidade com que
Forão seus autores muito sabios, e mais ha os autores dos estatutos da universidade de Coimbra
que notar nelles de sobejo de erudicção e doutrina sobrecarregarão com profunda erudicção os estudos
do que em mingua de cabedal. Pasmoso foi por de direito natural, publico e das gentes, terão de
certo, que na época de tal instituição, em que accrescentar cadeiras de politica, economia politica,
Portugal carecia de todas as luzes, digamol-o sem e direito maritimo, e amestrados assim os jovens
vergonha, maiormente de conhecimentos estudantes, far-se-hão habeis para nos empregos
phiIosophico-juridicos, de direito publico universal e diplomaticos defenderem os nossos direitos e
ecclesiastico, e das gentes, e de quasi todas as interesses, e entabolarem negociações firmadas
sciencias naturaes, apparecessem homens dotados sobre os reciprocos direitos e utilidade das nações.
de tanto saber, que apresentassem taes estatutos Sendo de accordo com os ditos honrados
dignos por certo dos maiores elogios. collegas sobre os estabelecimentos expostos, não
Devem portanto, quando começarem os convenho em que este curso juridico se vá
estudos nas universidades erigidas, e emquanto não estabelecer na cidade de S. Paulo, parecendo-me
apresentarem os mestres os estatutos proprios antes acertado que seja nesta côrte. São
regerem-se pelos sobreditos da universidade de principalmente duas as razões, que me levão a esta
Coimbra. A muitos occorrerá, que se não deve tratar opinião; a primeira é a de que prosperaráõ muito
já de estabelecer universidades sem primeiro se melhor aqui os estudos, pela presença do governo,
chamarem e ajuntarem os mestres, e cuidar-se no cuja inspecção muito póde aproveitar, para que um
estabelecimento das rendas, porque sem isto é como estabelecimento novo siga regularmente o seu
inutil legislar sobre a fundação das mesmas andamento, ministrando os soccorros necessarios, e
universidades: mas quem não vê que levando com mão regular os mestres para que não
incompatibilidade ha em determinar previamente afrouxem no cuidado de dirigir os seus discipulos.
estes estabelecimentos? Eu cuido que antes é Mais copia de livros apparece nesta côrte pela
necessario fazel-o; porque só assim se póde tratar abundancia do mercado; mais pureza ha na
de ambas as cousas acima apontadas, nem linguagem; mas polidas são as maneiras dos
inconveniente algum se segue, pois que ficão então habitantes, o que tudo influe para o progresso de
os povos mais ao alcance de que taes uma mais civilisada instrucção. A segunda, e por
estabelecimentos não estão só em mente, mas já ventura a mais poderosa, é que havendo nesta côrte
decididos e approvados; e prestar-se-hão por um curso philosophico e mathematico, e outro
ventura de melhor grado a alguns donativos. medico-cirurgico, e havendo aulas de theologia no
Não sou porém de opinião, que só com elles seminario, faltava para completar uma universidade
se pretendão formar as rendas necessarias. Um tal o curso juridico. Creado este nesta capital, e
estabelecimento é de interesse geral, e por nomeando-se um como director commum de todos
conseguinte das rendas publicas devem sahir as estes estabelecimentos litterarios, é já uma
despezas, nem jámais se póde pensar que os universidade para ir subsistindo, emquanto as duas
brazileiros recusem sustentar á sua custa um creadas não se poem em exercicio.
estabelecimento tão necessario, como util e Póde esta mesmo transplantar-se para algum
brilhante. Previrão igualmente muito bem os mesmos dos lugares em que as outras se vão crear: assim se
sabios autores do projecto, que emquanto se não transladarão em Portugal de Evora para Lisboa e
arranjavão as universidades, e se punhão em estado para Coimbra; e talvez persista para o futuro ainda
de continuar o ensino publico, convinha desde logo além das outras. Verdade é que nas côrtes ha mais
estabelecer um curso juridico, pela necessidade em distracção dos estudos pela occurrencia de mais
que estamos de homens letrados e habeis neste prazeres e diversões, e que ha mais carestia nos
genero de saber. viveres, o que faz pezada a existencia nella dos
Ninguem ignora quão necessarios são, não só habitantes das outras provincias.
para encherem os lugares de advogados e Mas a primeira objecção compensa-se com a
magistrados, mas tambem para os de diplomacia. polidez da linguagem e costumes, e a segunda
Todos sabem que para estes empregos é mister ter
grande cópia de estudos de direito
Sessão em 27 de Agosto de 1823 167

evita-se com a creação das universidades nas no coração de todos, e a qual apparece aqui redigida
provincias designadas, e remediar-se-hão de todo pela sábia commissão.
com a trasladação de que acima fallei, se algum dia Taxou-se o projecto de extemporaneo, e fallo
houver lugar. em seus fins oh! senhores, serão de pouca monta os
Seja porém qual fôr, Sr. presidente, o destino proveitos immediatos de não ser daqui a pouco
do lugar, cortemos por todos os embaraços; não nos inevitavel ao joven brazileiro atravessar o Atlantico
prendamos com futuros estorvos, que, ou não para ir a duas mil e tantas leguas estudar as
existiráõ, ou o tempo mostrará os meios de acabar sciencias, lutando com difficuldades e riscos,
com elles; lancemos mão á obra que tão vantajosa soffrendo privações no meio de um povo mal
se nos antolha; satisfaçamos aos nossos primarios affeiçoado? Não será esta a crise favoravel para
deveres de promover a instrucção nacional por todos melhorar a condição de uma porção escolhida da
os meios possiveis, e vamos por cima de todos estes grande familia brazileira, que geme e suspira em
tropeços procurar a gloria, que nos ha de acabar por Coimbra, como se colhe da carta com que instrui a
termos alçado esta grande parte do edificio social. minha moção? Se sanccionarmos este decreto,
O Sr. Muniz Tavares fallando em geral sobre a como confio, conseguiremos em breve uma diffusão
importancia do projecto de que resultaria o grande de luzes e conhecimentos uteis, e portanto mais
bem de ter o povo do Brazil no seu proprio paiz todos rapida civilisação, melhores costumes, pelo accesso
os meios de adquirir os conhecimentos de todas as mais facil, pela proximidade das fontes de instrucção,
sciencias, observou que estabelecendo-se por elle se desenvolveráõ talentos, que alias se terião
duas universidades, uma em S. Paulo e outra em enervado e embrutecido e os capitaes, que levados e
Olinda, e determinando-se desde já um curso juridico espalhados ao longe, ião aviventar os estranhos,
em S. Paulo, por igual razão se devia ordenar que animaráõ agora a nossa propria industria, á vista de
houvesse outro em Olinda, facilitando-se assim aos tão decididas vantagens ouso avançar que se devem
filhos das provincias do norte as mesmas vantagens banir desconfianças de que falhem meios para erigir
que vinhão a gosar os das provincias do sul. tão interessante obra: outros preopinantes já têm
Lembrou tambem que quanto aos fundos respondido victoriosamente.
precisos para o estabelecimento estava persuadido Notou-se de impropriedade o assento das
que não faltavão em Pernambuco, pois ás côrtes de duas universidades: quanto ao da cidade de S. Paulo
Portugal tinha sido apresentado o plano de uma (pois que com a minha idéa concordou a illustre
academia que correspondia a uma universidade, e commissão) não me allucinou de certo o natural
se mostrára que bastava para as despezas della o pendor para a capital de uma provincia, na qual me
subsidio litterario da provincia; e que emfim ainda honro de haver tido o berço; considerei
que occorresse algumas difficuldades contra o principalmente a salubridade e amenidade do seu
projecto, não se devia desacoroçoar, pois com o clima, sua feliz posição, a abundancia e barateza de
tempo se vencerião, e as vantagens que se seguirião todas as precisões e commodos da vida: o Tieté vale
de se adoptar serião immensas, tanto pela facilidade bem o Mondego de outro hemispherio.
de se adquirirem conhecimentos uteis, como pelo Estranhou-se altamente a singularidade e
melhoramento dos costumes. preferencia de um curso juridico: não só assim o
O SR. FERNANDES PINHEIRO: – Eu não exige a maior necessidade de formados nessa
teria a louca vaidade de pedir a palavra para faculdade para os empregos da ordem judiciaria,
sustentar as vantagens deste projecto; melhor do mas porque a legislação é sem duvida o primeiro, e
que eu as alcança esta illustrada assembléa, e é mais importante dos conhecimentos humanos,
disto uma prova o enthusiasmo, e geral acclamação, aquelle que tem por objecto ensinar ao homem seus
com que elle tem passado por todos os transitos da direitos, e a norma de seus deveres.
lei: nem para inculcar a necessidade carregarei de Quero persuadir-me que na ultima parte do art.
negro o quadro da ignorancia á que nos havia 4º a commissão implicitamente deixou latitude para
condemnado o governo velho: sobre elle recahirá a creação das duas cadeiras de direito publico
pena que em uma antiga republica da Grecia constitucional, e de economia politica, que eu
dispensava os filhos do menor reconhecimento para indiquei: a primeira será de uma grande utilidade
com os pais negligentes da sua educação. para o desenvolvimento do systema representativo,
Por agora só me limitarei á responder aos que adoptamos; a sciencia da divisão e da balança
reparos com que acabo de o ouvir impugnar, e de dos poderes é inteiramente nova; o genio de
envolta irão algumas das razões, que por ventura me Montesquieu apenas o entrevio apezar de se dizer
excitarão á tomar o passo, e a expressar por uma que elle tinha buscado, e achado os direitos perdidos
indicação aquillo que estava do homem: cumpre generalisar o estado da segunda,
por que já não interessa, como outr’ora, só á certa
classe privilegiada; hoje todos devem
168 Sessão em 27 de Agosto de 1823

saber, como as riquezas são produzidas, faz agora como ao depois; mas era necessario então
distribuidas, e consumidas na sociedade. Portanto determinar donde havião vir as sommas necessarias
voto, e peço, que com reparos minuciosos não se para a sua sustentação, e qual seria o methodo de
paralyse este projecto de decreto. ensino que devia seguir-se.
O SR. MONTESUMA: – Uma das primeiras Finalmente, Sr. presidente, para se fazerem as
cousas de que precisa uma nação para ser feliz é cousas em regra, deve apparecer esse plano geral
certamente a igualdade da diffusão das luzes entre de educação, que tão preciso se julgou que, para
ella, e por consequencia se eu fôra chamado para ter animar os genios, já se prometteu um premio a quem
parte na redacção deste projecto certamente me apresentasse o melhor. Fallarei agora sobre um dos
oppunha á sua doutrina. Não se pense porém que artigos do projecto. A commissão fallou em um
nego a necessidade de illustração nos brazileiros: collegio em S. Paulo para o estudo de jurisprudencia;
antes porque a conheço é que me opponho ao longe de me oppôr a que haja um só collegio já disse
estabelecimento de duas universidades, e approvaria que desejava mais, porém não sei porque a cidade
antes o estabelecimento de alguns collegios; antes de S. Paulo deva merecer semelhante preferencia.
dous, quatro, ou seis collegios do que duas Não sei porque aqui sempre se anda com S. Paulo
universidades. para cá, e S. Paulo para lá, em nada aqui se falla
Talvez parecerá isto novo, Sr. presidente, que não venha S. Paulo.
porém não é; muito maior interesse se tira dos Se acaso se julgasse que devia haver um só
colIegios do que das universidades. Eu ouço dizer collegio (bem que eu penso que tal idéa não
que a nação não está preparada para ter duas passará) quereria perguntar se era a S. Paulo que se
universidades e comtudo decreta-se a sua fundação! deveria conceder, e conforme a resposta eu faria ver
Tem-se fallado muito do atraso da educação primaria que a conceder-se um só collegio não devia ser em
da mocidade, da falta de mestres, e de outras muitas S. Paulo, mas na Bahia, não pelo que vulgarmente
cousas que tendem a mostrar que ainda não se diz, de cada um puxar a brasa para a sua
podemos ter duas universidades; pois se a nação sardinha; não é por eu ser bahiano, não é o espirito
ainda não está preparada, se ainda as suas rendas do amor da patria quem me obriga a dizer que o
publicas não estão tão florescentes que possão lugar do collegio não deveria ser na cidade de S.
sustentar duas universidades, que necessitão Paulo, mas o amor da minha nação em geral, o bem
grandes sommas não só para a sustentação de commum de todos os meus concidadãos; pois
mestres, mas para outras muitas cousas, como são ficando muito distante das provincias de
livrarias, musêos, instrumentos, etc., que tudo custa Pernambuco, Ceará, Piauhy, Maranhão, etc., torna
grande cabedal, como se assenta que as devemos quasi impossivel aos habitantes daquelIes lugares o
estabelecer? Estabeleça antes a commissão, dous, aproveitarem-se das sciencias que alli se ensinarem;
quatro, ou seis collegios, e deixemo-nos por ora de ao mesmo passo que todo o mundo vê que na Bahia
universidades. Quanto a mim é evidente que o § 4º é fica como um centro commum do nosso imperio
que deveria ser a base de um projecto, deixando o 1º tanto para o norte como para o sul, além de offerecer
para depois se tratar da sua doutrina com muita pela qualidade do seu commercio muitas facilidades
circumspecção. Precisa-se de instrucção publica; de transportes de qualquer parte para alli; o que não
pois destinem-se em geral aos brazileiros diversos sucede para S. Paulo.
collegios onde possão instruir-se, e não se faça este Por exemplo, das provincias do Maranhão e
bem só a S. Paulo, negando-se ás outras provincias: Pará, como ha de vir um estudante para S. Paulo? A
a utilidade destes estabelecimentos é muito maior. viagem é muito difficil e trabalhosa, e muito mais facil
O meu parecer pois será, não que o presente lhe seria ir a Portugal ou a outro qualquer reino
projecto seja regeitado, porque isso seria deshonra europeu do que vir para S. Paulo. Por consequencia
para esta assembléa de quem se espera toda a não posso crer que a commissão entenda o contrario
attenção ao plano de educação geral, porém, que do que levo exposto, uma vez que se tem em vista o
volte á commissão, e que esta torne a apresentar um divulgarem-se com promptidão e sem grandes
projecto que seja completo, tomando em incommodos os conhecimentos entre nós. Se a
consideração os meios de sustentação destes commissão julga necessario já o estabelecimento do
estabelecimentos. Uma cousa depende collegio pela falta que ha de homens para os
essencialmente da outra, sem isto nem devia fallar- empregos da ordem judiciaria, deve julgar tambem
se em universidades, e eu quizera, Sr. presidente, necessario o estabelecel-o no centro do imperio,
que em todas as nossas deliberações onde todos possão concorrer com muito mais
procedessemos com ordem, e por isso desejava que facilidade do que ao lugar que se tem inculcado.
o plano geral de educação precedesse a isto; é Eu quizera, torno a dizer, que a commissão
verdade que a commissão póde salvar-se em dizer estabelecesse diversos collegios; porém a haver um
que este estabelecimento deve ser decretado só deve ser no lugar por mim indicado, porque
necessariamente, e que tanto
Sessão em 27 de Agosto de 1823 169

para a Bahia se póde ir de qualquer parte mais luzes nos paizes remotos, para que a nação tenha
commodamente do que para S. Paulo. Por filhos dignos della é indispensavel facilitar-lhes todos
consequencia, ou a commissão ha de concordar os meios delles adquirirem conhecimentos; sem o
commigo para que em cada uma das provincias que os homens pouco ou nada são: eu creio que
maiores em que ha impostos para estabelecimentos nisto todos somos concordes; fallando pois neste
litterarios se estabeleça um collegio, ou ha de sentido latissimo ninguem poderá dizer que um
tambem convir commigo em que a ser só um, este projecto sobre fundação de universidades no Brazil,
se não abra em S. Paulo, mas na Bahia. E se a seja inutil; mas eu quizera que se não confundisse a
commissão quer procurar um lugar ainda mais necessidade de se tomarem medidas a qualquer
central parece-me que o achará na provincia de respeito com as mesmas medidas.
Minas Geraes. (Apoiado.) E’ muito mais facil, Sr. Que cousa mais vaga do que dizer – haverá
presidente, ir de Pernambuco ou Bahia, a Minas tantas universidades: em tempo proprio far-se-ha
Geraes, do que a S. Paulo; as estradas são mais isto, ou aquillo, etc.? Por isso disse que o projecto
conhecidas, é uma provincia central, e abastecida de em discussão não preenche os fins: elle apresenta
todos os misteres para a vida, e até merece mais mais o desejo que tiverão os seus nobres autores, de
esta attenção do que S. Paulo, não só pela grandeza fazer um projecto, do que um projecto já feito: é o
de sua população e territorio, mas peIo superior mesmo que se pretendessemos ter um grande
interesse, e vantagem que todos tirão em se dirigir palacio, sem termos dispostos os materiaes, sem
alli, antes do que a S. Paulo. termos obreiros, e mesmo sem lhe havermos feito o
Portanto não voto, nem posso votar por fórma risco: a nossa boa vontade, a nossa imaginação é só
nenhuma por um collegio singular em S. Paulo se o que tinhamos; mas com isto, de certo, não
acaso o querem ahi então estabeleça-se tambem na faziamos o nosso edificio; do mesmo modo com o
Bahia, Pernambuco, e em todas aquellas provincias projecto apresentado digo que nunca veremos a
onde se exigem subsidios para estabelecimentos fundação nem de uma só universidade.
litterarios; e se fôr vencido que só uma provincia A unica cousa que apparece de mais positivo
tenha esse collegio, então a commissão deve propôr no projecto é que um curso juridico se vá desde já
que se abra na Bahia. estabelecer na universidade de S. Paulo: mas onde é
Ninguem creia, Sr. presidente, ainda o repito, que está essa universidade? Que dos fundos para
que o motivo porque lembro a provincia da Bahia ella? Que dos mestres? Que das razões que ha para
seja o de eu ser bahiano; é necessario que se ser alli que se vá estudar o curso juridico?
destrua esta prevenção e desterre de uma vez a E que pressa ha de se abrir um curso de
suspeita de que o amor da minha provincia é quem direito primeiro que o de outras sciencias mais uteis,
me faz fallar desta maneira, fallo assim a bem da e mais necessarias?
verdade que se pretende escurecer, e com perfeito Mas, prescindindo de todas as difficuldades,
conhecimento de causa. Se desse curso juridico ha digo que não é por meio do actual projecto que nós
necessidade em S. Paulo não deve essa formaremos os estabelecimentos litterarios, a que
necessidade satisfazer-se com o incommodo de nos propomos: é portanto a minha opinião que o
todas as provincias do norte, sem haver motivo projecto volte á mesma, ou a outra commissão para
algum justo para semelhante preferencia ou que ella proponha os meios de se realisar a
singularidade. fundação de uma, ou de mais universidades
O collegio deve estabelecer-se no local que (conforme fôr possivel) designando-se os fundos, e
offerecer as melhores commodidades ao maior rendas necessarias para ellas; facilitando-se os
numero dos nossos concidadãos, e por isso nenhum meios de obtermos os mestres, que tanto nos faltão;
outro lugar é mais adequado do que a provincia da n’uma palavra, tudo o que é preciso para as lições,
Bahia. Voto pois que o projecto volte á commissão, e tanto theoricas, como praticas dos alumnos. Em
que a commissão o reforme segundo as idéas quanto isto se não fizer, debalde estaremos aqui a
expendidas. disputar em cousas que se não hão de realisar.
Este é o meu parecer exprimido sem O SR. GOMIDE: – A instrucção publica, e
prevenção alguma, e com aquella franqueza de que diffusão de luzes é o primeiro dever dos governos.
deve usar-se neste augusto recinto. Todas as virtudes civicas e moraes das nações se
O SR. ALMEIDA E ALBUQUERQUE: – Sr. desenvolvem na razão de suas luzes.
presidente, nesta primeira discussão trata-se Nada de bom e de grande, senão por acaso,
simplesmente da utilidade em geral do projecto, de se póde esperar da indole, instincto, propensão
cujo exame nos occupamos, e eu reconheço que é natural, boas intenções, etc., faltando
da primeira necessidade cuidar nos conhecimentos; e a barbaria dos seculos gothicos, e
estabelecimentos de educação. A creação de uma dos subsequentes antes da restauração da
ou mais universidades na nossa terra é na verdade philosophia, prova exuberantemente esta asserção.
uma das cousas porque mais deve attender o
governo, é preciso tirar os brazileiros da penosa
necessidade de irem mendigar as
170 Sessão em 27 de Agosto de 1823

Todos os actos humanos são decisões da na provincia de Minas-Geraes, na villa Nova da


vontade, e esta se decide depois de combinações, Rainha do Caeté. – Gomide.
reflexões, e raciocinios seguidos; como se poderáõ Foi apoiado.
pois esperar acções illustres e virtuosas, deduzidas O Sr. Araujo Lima mostrou a necessidade de
de juizos falsos, e de principios errados? propôr meios de sustentar os estabelecimentos que
Eis-aqui porque a commissão, da qual tenho a se pretendião crear, e a vantagem de haver em
honra de ser membro, julgou urgente a creação de Pernambuco um curso juridico como se havia
universidades. lembrado para S. Paulo evitando-se porém o estudo
Uma universidade é como um armazem de do direito romano com tanta demasia ensinado em
conhecimentos, donde cada um tira os proprios ao Coimbra, e ajuntando-lhe outro philosophico em cada
estado e carreira á que se destina. uma das duas provincias. No fim do seu discurso
Dalli se colhem os elementos de todas as (em que não se entendeu o tachygrapho Victorino)
sciencias, e de todas as artes. mandou á mesa as seguintes:
Um paiz, sirvo-me das expressões de Ganilk,
avança tanto mais rapidamente em riqueza, EMENDAS
população e poder, quanto as classes illuminadas, as
profissões liberaes, e as artes occupão maior Ao § 4º Haverá nas cidades de Olinda e de S.
departamento na sua distribuição. E’ portanto Paulo um curso juridico e outro philosophico. –
indispensavel, e de urgente necessidade o Araujo Lima.
estabelecimento de universidades. Objecta-se falta Proponho que a commissão estabeleça os
de fundos. ordenados para os mestres, e os fundos para as
Nunca faltaráõ fundos para semelhantes despezas. – Araujo Lima.
fundações á nação que aspira elevar-se a uma Forão apoiadas.
representação magestosa. O avaro mais isolado e O SR. SILVA LISBOA: – Sr. presidente,
egoista não achará pesada a contribuição exigida depois de tanta discussão, e sendo a materia vasta,
para a instrucção publica, e posso informar que antes de fallar, tenho de pedir não só paciencia, mas
muitos cidadãos generosos da minha provincia e indulgencia á esta augusta assembléa.
comarca se dispoem a prestar generosos donativos E’ reconhecida a urgencia do estabelecimento
para tão interessantes estabelecimentos. Todavia fui de uma universidade no Brazil; mas o numero, e o
de voto na commissão, que, procedendo por ora com local são objectos de duvida. A minha opinião é, que
economia, e progredindo á par dos meios, por ora ella deve ser unica, e nesta côrte; quando o
propuzessemos só uma universidade, e que esta imperio tiver maior população e opulencia, deveráõ
devia ser no centro; pois difundindo-se a luz haver mais universidades nas outras provincias onde
scientifica como a phisica em uma esphera luminosa se acharem melhores proporções.
para todos os lados, não haveria melhor posição que Por isso impugno a proposta da commissão.
a central para um só candelabro em uma camara Nella só vejo esplendidos projectos de duas
espaçosa. universidades, uma em S. Paulo, e outra em
Instei com a maior população e riqueza, com a Pernambuco, para futuro indefinido, mas, para assim
salubridade, e fertilidade da provincia de Minas, mas dizer, terminando em particularidade, ou mera
fui convencido a subscrever o projecto das duas collegiada de um curso juridico em S. Paulo. Isso
universidades indicadas nelle. Portanto agora, traz obvias parcialidades, que darão ciume ás outras
addindo ao referido projecto, indico que se crêe mais provincias.
uma universidade na provincia de Minas Geraes, a Muito respeito os membros da commissão;
mais populosa deste imperio: e marco a aprazivel mas não dissimularei, que, ao lêr a proposta,
villa de Caeté como local adequado; o que comtudo occorreu-me a ordem do invasor de Portugal Junot. –
não proponho tão afincadamente, que não ceda por Hajão Camões, fação-se estradas, abrão-se canaes.
qualquer outro, comtanto que seja em uma das cinco – Sr. presidente: a nossa primeira, mais urgente
comarcas da provincia. Havendo meios, como estou necessidade é a defeza; depois virá a instrucção
certo que haverão, para duas, não faltaráõ para a superior do imperio. Bem diz o economista sagrado –
terceira, collocada na mais populosa, e o sabio vem no tempo do descanço. – Contentemo-
progressivamente mais rica, das nossas provincias, nos actualmente com o pouco praticavel, e não com
como tem dito e demonstrado o Sr. Montesuma. o muito magnifico, que se não possa logo facilmente
O Mesmo Sr. Deputado mandou á mesa o realizar.
seguinte: Se consultasse o coração, preferiria a S.
Paulo, pelos seus grandes engenhos, e serviços ao
ADDITAMENTO Brazil, e até por ser essa provincia a que deu
nascimento ao insigne Alexandre de Gusmão, e já
Ao § 1º Haverá tambem uma universidade ter sido indicada essa cidade pelo
Sessão em 27 de Agosto de 1823 171

meu amigo o Sr. deputado Fernandes Pinheiro nos se tenta multiplicar universidades, para haver
seus excellentes annaes do Rio Grande. superabundancia de doutores desproporcionados
Sei que essa é mui corrente opinião, aos empregos necessarios do estado, o que é uma
allegando-se a bondade do clima, fertilidade da terra, das causas, porque actualmente a vaidade e
e barateza do passadio. O inglez Southey na sua ambição tanto accusão aos governos?
historia do Brazil refere esta opinião, accrescentando Esta côrte já é uma das mais sadias partes do
a razão de que, sendo o ar frio, os livros não são Brazil, pelo progresso das bemfeitorias publicas, e
atacados dos vermes e insectos. culturas circumvisinhas. Parece conter grandes
Todavia, attendendo á historia da fundação principios vitaes, que resistem aos defeitos do local.
das principaes universidades da Europa e America, Nenhuma cidade tem mais constante
não posso conformar-me á tal opinião; pois que ellas abundancia, e facilidade de edificações: já tem dous
especialmente se achão nas côrtes, ou nas grandes seminarios para dar accommodações de equidade
estancias maritimas. aos estudantes. Pela liberdade de commercio, e
As actuaes circumstancias tambem justificão, posição geographica especialmente nas monções,
e até necessitão, o estabelecimento da universidade em breve viagem podem vir os alumnos dos portos
nesta côrte. Oxford a mais antiga universidade da maritimos do norte e sul: as correspondencias e
Europa, foi fundada pelo grande rei da Inglaterra assistencias são mais promptas: até podem em
Alfredo, quando era a capital do reino, e se acha só a ferias visitar suas patrias. O porto de Santos jámais
duas leguas de Londres, que tambem foi depois a será tão frequentado, como o do Rio de Janeiro, para
séde de grandes estabelecimentos litterarios. dar iguaes facilidades.
Edimburgo é tambem universidade maritima, e foi Este emporio é tão singular, que o lord
fundada quando era côrte dos reis da Escocia. As Amersh, quando aqui tocou na passagem da sua
côrtes de Pariz Vienna, Berlim, Petersbourgo, têm embaixada á China, na obra que della publicou
universidades. Na America do Norte a primeira disse, que tendo ido até o mar amarello, nunca vira
universidade foi na sua metropole, Philadelphia. O cousa tão celestial como o porto do Rio de Janeiro. A
Mexico, capital desse imperio, tem uma viagem por terra a S. Paulo é detrimentosa: a
universidade, que, segundo refere o padre Vieira, lhe importação de livros e instrumentos é difficil.
dedicou umas conclusões magnas de theologia, Apezar da natural riqueza do paiz e de rios
quando em Portugal era calumniado, e opprimido. navegaveis, é bem sabido, que, pela trasbordação
E’ não só natural, mas até mais economico, de alguns, a cidade tem por mezes molestias
que em taes situações se facilitem os meios de endemicas, e as grandes cachoeiras de outros quasi
litteratura, vida e urbanidade, até pela maior impossibilitão a communicação entre si, e com os
confluencia de estrangeiros. Talvez Evora e portos; o que muito diminuirá sempre as vantagens
Coimbra, por serem universidades no interior de do seu commercio interno e externo, e
Portugal, pouco contribuirão para o progresso do consequentemente o progresso da sua riqueza.
espirito humano. Isto foi dito pelo seu patricio ex-ministro das
Ao contrario, os estudos de Lisboa, que tanto finanças ha pouco neste congresso; e o Sr. Velloso
promoveu o infante D. Henrique, e até dando tambem o nota em sua obra.
palestra em seu paço aos nacionaes e estrangeiros, Nem se deve esperar a continuação da
especialmente os instruidos em cosmographia, barateza dos viveres e edificios, havendo
occasionarão o formarem-se varões insignes em concurrencia de estudantes de tão vasto circulo
letras, armas, nautica, politica, e descobrirem-se as dessa provincia, e das limitrophes.
incognitas partes do mundo. Nesta côrte do Rio de Tanto mais que tal barateza é de consideração
Janeiro já estão os alicerces de um grande mui subalterna em taes estabelecimento; e sendo tão
estabelecimento litterario. Temos, por assim dizer, obvia, jámais fez peso em tantos fundadores das
bom casco de navio. universidades, que, na maior parte, originarão nas
Vê-se já o edificio levantado, bem que ainda côrtes antigas e modernas. Essa mesma vantagem
em miniatura, com aulas das sciencias maiores, da se minora pela carestia dos outros artigos de
academia da marinha, medicina, com bibliotheca, e importação.
typographia publica, jardim botanico, e de plantas E' hoje quasi geralmente reconhecido por
exoticas e museu. estadistas praticos, que não convém facilitar
Nos conventos, e no seminario do bispo demasiado a todas as classes os estudos superiores,
diocesano se ensinão theologia, instituições afim de que entre sómente a justa proporção dos
canonicas, etc.: só faltão os estudos de direito para servidores do estado, segundo a demanda do paiz: e
um curso juridico, que o thesouro póde pagar sem para que tambem dêm garantias ao publico, como
grave encargo. Eis pois já uma universidade quasi pertencentes á certas familias remediadas, e de
formada. consideraveis posses. Aliás os supranumerarios
Ao contrario, nas outras provincias, excepto a baratearáõ, ou não
Bahia, é preciso crear quasi tudo. A que proposito,
precipitando-se as épocas dos melhoramentos,
172 Sessão em 27 de Agosto de 1823

terão seu justo preço, como em todos os generos que reputava corpos de massa densa com força de
que entrão no mercado. inercia para resistir ao progresso das sciencias,
E' tambem notado por grandes mestres em perpetuando doutrinas antiquadas e crassos erros,
politica, que nas côrtes, os estudos publicos tomão o quando aliás já as luzes correntes, e as sociedades
caracter necessario de cortezania e profundidade, litterarias particulares têm apurado as verdades e
por se apresentar maior numero de combinações, progredido em conhecimentos, o que tambem é
mais desafferro de parcialidades locaes, maior seguido por Smith; da primeira ordem, que só virão o
conhecimento dos homens e dos negocios do lado escuro e não o claro de taes estabelecimentos
mundo, mais affecto ao governo estabelecido. (o que tambem procedeu por acharem enthronisado
Infelizmente têm havido nas provincias o despotismo litterario de seculos da escola
partidos dissidentes da causa do imperio aristotelica e da erronea economia politica das
constitucional. Importa pois, que os que devem influir praças, camaras e gabinetes), é incontestavel que
nas classes menos instruidas, venhão fazer estudos elles mesmos e os maiores mestres das sciencias,
e firmar o espirito do nosso systema na Roma se formarão em universidades, e que a emulação
Americana. Assim praticou o celebre summo dos estudantes com a obrigação de ouvir as lições e
pontifice Leão X., na restauração das letras da fazerem os mais exercicios e exames academicos,
christandade creando mais de cem cadeiras das muito contribue para a solida instrucção e bons
sciencias, segundo convinha (como disse) na capital habitos.
do mundo catholico. Ouvi dizer que não convém E' experimentado, que os que não fizerão
universidade nas grandes cidades, porque ahi ha estudos regulados nas universidades, ainda que
grande distracção para os estudos. sejão mui estudiosos, e provectos em qualquer ramo
E porque não occorreu esta razão (torno a litterario, sempre em toda vida sentem um vazio, que
dizer) aos fundadores e governos das mais letradas nada suppre; salvas as honorificas raras excepções
nações da Europa e America? de pessoas de extraordinario talento, que são como
Insistindo-se nesta razão irião os estudiosos as estrellas da primeira grandeza.
para Cartuxa, Trappa, Tebaida, emfim para o matto. E como poderáõ os particulares aprender as
Que comparação tem a universidade de sciencias physicas sem os gabinetes, muzêos,
Tolosa com a de Pariz? laboratorios, observatorios, theatros anatomicos,
E’ de summa importancia actualmente a etc.; que só o governo póde fornecer? Ouvi
universidade na côrte; porque além de que pela desattender aos estudos de direito civil dos romanos;
regra da escriptura – o olho do rei dissipa todo o mal, mas sempre deverá haver quem estude a não facil
– o imperador honrando com a sua presença as sciencia de jurisprudencia civil e patria, para
aulas e os actos dos exames na universidade, não haverem juizes de direito, ainda que aliás a
só excitará a energia dos jovens, mas tambem terá a constituição estabeleça juizes de facto, instituição
opportunidade de conhecer os mais distinctos difficil de tomar raiz no Brasil; e nem será maravilha,
candidatos para as magistraturas, e mais visto que Bonaparte disse, que nunca se
repartições. Muito se faz notavel o paragrapho do naturalisaria essa instituição de Inglaterra na França.
projecto, em que se omitte a creação de um reitor, e Sr. presidente, ainda que no direito romano se ache
se designa sómente um vice-reitor do corpo dos um montão de leis e regras indigestas, e erradas,
lentes. comtudo o facto é, que a civilisação da Europa
Isto não é favoravel á subordinação dos moderna se deve, em grande parte, á achada das
estudantes que só são bem ordenados, vendo pandectas, perdidas pela invasão dos barbaros; e
autoridade superior de alta dignidade. Quando estive que continuarão barbaros os paizes em que nem se
em Coimbra, e o bispo conde-reitor veio á Lisboa ao instituirão universidades, nem se ensinou por ellas.
acto da acclamação da Sra. D. Maria I, não obstante Apoio o additamento que o nobre membro o Sr.
ficar vice-reitor o lente de prima de theologia, foi tal a Ferreira França fez de se incorparem á nossa
desordem, que quasi pareceu resurgido o antigo e universidade tambem as artes. Sem duvida é
famoso – rancho da carqueja. Ouvi tratar com genuina a lembrança, que me não tinha occorrido.
desdem as universidades, e o velho estylo das cartas Sem ellas (diz o economista sagrado) não se edifica
academicas, como titulos de litteratura que nada a cidade. Deve-se crer ao perito na sua arte.
significão, estranhando-se de algum modo que tanto Assim se removerá o schisma com que até
se requeirão para os empregos do estado. Um nobre agora, por vaidade e injustiça, se separavão as
membro o Sr. Mello assaz mostrou, que essa sciencias e bellas letras das artes, não sendo aliás
opinião, bem que de alguns mestres escriptores, não cada arte mais do que uma sciencia pratica, em que
é fundada. nas operações mechanicas mais ajuizadas se
Eu tambem direi, que supposto o grande proporcionão meios á fins, para immediato uso e
Bacon no seu orgão das sciencias primeiro fizesse proveito da vida. Até por esta razão a primeira
essa censura contra as universidades, universidade do Brazil deve
Sessão em 27 de Agosto de 1823 173

ser nesta côrte. Rogo aos Srs. collegas, que vão ao publica em universidades e collegios, reservando-se
muzeu, onde, entre as suas collecções uteis e ricas, para depois a questão do seu numero, local,
acharáõ em miniatura todas as artes primitivas, com estatutos e dotação; como porém se tenhão já
os seus respectivos instrumentos. avançado muitas proposições a taes respeitos, seja-
Todos sentiráõ o que eu senti quando as vi: me tambem permittido o dizer alguma cousa.
parecia achar-me no centro da sociedade civil. A' Concordo perfeitamente com todos os illustres
vista destes moldes, se convence, que tudo quanto deputados que têm mostrado com tanta erudição a
se acha de magnifico na industria humana, não é absoluta necessidade da publica instrucção:
mais do que o effeito do progresso e refinamento ninguem a poderá negar; não quizera porém, que
das artes, cada vez mais e mais mostrando os por um momento se retardasse um tão grande
prodigios da divisão e perfeição do trabalho, que beneficio decrete-se quanto antes o estabelecimento
aliás não só o vulgo, mas os que se reputão doutos, de universidades e de collegios em geral, quantos
anathematisão com o labeo de – luxo. Ahi vê-se, se julgarem necessarios para a facil e commoda
que as obras das mãos dos homens só manifestão a instrucção dos subditos do imperio, cujos
imitação da infinita variedade das obras da natureza, estabelecimentos se irão para o futuro e
isto é, da infinita sabedoria e bondade de seu autor, successivamente coordenando nos lugares que se
que, bem se diz nas sagradas letras, parece que reconhecerem mais apropriados; mas desde já
brincou na terra para delicia dos homens – Ludens principie-se pela prompta creação de uma
in orbe terrarum, tudo variando em fórmas, côres, universidade nesta côrte onde já temos quasi todos
figuras etc., até nas baleias, como vi na Bahia minha os elementos necessarios para a sua composição.
patria. Além das aulas de primeiras letras temos as
Os inglezes que hoje tanto sobresahem nas de grammatica latina, de theorica, de philosophia
sciencias, se presão de ainda serem mais eminentes racional e moral, de grego, de francez, de inglez e
nas artes, regosijando-se de serem todos elles os de desenho; temos uma academia militar e outra de
mais instruidos praticos, talvez hoje excedendo aos marinha em que se ensinão todos os ramos das
francezes, que até Juvenal disse terem sido os seus mathematicas puras e das suas applicações á arte
mestres na eloquencia: Gallia causidicos docuit da guerra e da marinha: temos aulas da zoologia,
facunda britannos. mineralogia, botanica, phisica e chimica: temos uma
Emfim o Sr. D. João VI havia destinado academia medico-cirurgica e hospitaes para os
estabelecer nesta côrte um collegio das artes e um exercicios praticos: temos uma muito importante
instituto polytechnico, e até mandado vir com a livraria publica, além das dos particulares e dos
pensão de 1:400$ a um bem conhecido sabio regulares, temos um rico muzeu, em que se
francez Mr. Le Breton, que foi secretario da classe encontrão os productos dos tres reinos da natureza
das artes do instituto nacional da França. e uma importantissima collecção de modelos de
O nobre membro o Sr. Montesuma é de machinas: temos instrumentos astronomicos e por
opinião que a universidade deve ser estabelecida na consequencia a possibilidade de fazerem como já se
Bahia. Eu tambem sinto o pendor á patria. Ella no fazem observações astronomicas: temos um bom
governo de el-rei já havia pedido uma universidade, gabinete de machinas phisicas e uma collecção de
offerecendo o fundo de 80:000$. mineraes arranjados pelo systema de Werner: temos
Mas, ainda que o seu porto é de varias leguas aulas de moral, de theologia e de direito canonico
de abertura, e, como diz um escriptor inglez, póde nos collegios dos regulares e dos episcopaes: que
conter a marinha de todo o mundo sem confusão; nos falta portanto?
todavia considero preferivel esta côrte, como tendo Falta-nos sómente um curso juridico em que
já as opportunidades precisas. se ensine a indispensavel sciencia da legislação em
Assim, entendo ser mais conforme á politica e geral e em particular, addicionando-se-lhe as tão
á economia nas actuaes circumstancias do imperio. necessarias cadeiras de economia politica, de
O SR. NOGUEIRA DA GAMA: – Tudo o que estatistica, de diplomacia e de agricultura.
se tem dito sobre a necessidade de universidades e Em nenhum outro lugar do imperio se reunem
collegios para a instrucção da mocidade brazileira é tantos e tão bons elementos, que tornão
da ultima evidencia: portanto pouco me demorarei e summamente facil o começo dos trabalhos de uma
farei algumas reflexões tendentes a aplanar universidade; até o edificio para as aulas das
difficuldades que se possão offerecer á prompta differentes faculdades se póde reputar já prompto ou
execução de um projecto sem duvida da mais dependente de pequena despeza.
transcendente vantagem para a nação brazileira. Não obstão as razões por alguns dados para
Não entrarei na questão do numero e local desviar o ensino publico das capitaes, em que ha de
das universidades e collegios: por agora parece que continuo muitos e variados motivos de distracção
sómente em geral se devia tratar da urgente e para a mocidade; outras vantagens de maior monta
absoluta necessidade da instrucção se apresentão para o progresso das
174 Sessão em 27 de Agosto de 1823

sciencias e sua cultura nas côrtes e grandes Evangelista de Faria Lobato, sem estarem ainda
capitaes, já pela mais facil propagação das luzes em substituidos, o mesmo Sr. deputado supplente venha
consequencia da frequente communicação com tomar assento nesta assembléa até que cesse a
homens instruidos e civilisados, quer nacionaes, quer ausencia dos proprietarios.
estrangeiros; já pela brevidade com que se recebem Paço da assembléa, 22 de Agosto de 1823. –
as noticias de todas as descobertas e invenções Estevão Ribeiro de Rezende. – Antonio Carlos
uteis nas artes e sciencias; já pela abundancia de Ribeiro de Andrada Machado e Silva. – Manoel
livros e de jornaes litterarios que só muito Jacintho Nogueira da Gama.
vagarosamente e á custa de grande despeza, Foi approvado.
chegão ao interior do paiz ou aos lugares de Por não haver mais pareceres, seguiu-se a
pequena povoação; já finalmente pela polidez e discussão da indicação do Sr. Montesuma offerecida
desembaraço que se adquire com a residencia nas na sessão de 23 do corrente e que ficára adiada na
grandes capitaes e muito principalmente pelo de 25.
vivificador orvalho que sobre as artes e sciencias de O SR. MONTESUMA: – Sr. presidente,
qualquer natureza lança a presença do chefe da quando eu propuz a minha indicação só tive por
nação. motivo a necessidade de sabermos em que se
Não nos devemos prender com a falta de gastão os dinheiros publicos; mas a decisão da
estatutos e de rendas proprias para semelhantes materia ficou adiada por dar a hora.
estabelecimentos: trabalhe-se naquelles e busquem- Na sessão seguinte um illustre deputado
se estas com assiduidade; no emtanto lance-se mão contrariou as minhas reflexões produzindo alguns
dos estatutos da universidade de Coimbra e argumentos; antes de tudo desejo tirar-me de uma
emquanto se não melhorarem as rendas publicas do duvida e vem a ser, se o intendente geral da policia
imperio, como é de esperar, para que se possão entra na ordem dos empregados que podem dar
multiplicar as universidades e collegios em numero nesta assembléa informações sobre os objectos da
sufficiente para a instrucção facil e commoda da repartição de que se achão incumbidos, quando a
mocidade brazileira, estabeleça-se ao menos quanto assembléa deliberou que o nobre membro fosse ao
antes, uma universidade nesta côrte e se principie mesmo tempo deputado e intendente, julgo que lhe
assim a dar meios para a instrucção dos brazileiros não conferiu tambem a faculdade de responder
no seu proprio paiz, livrando-se da penosa dentro deste congresso; cuido que este emprego é
necessidade de atravessar os mares para irem secundario e que lhe não toca aquella prerogativa de
adquirir ao longe e á custa de grandissimos que gozão os agentes do poder executivo.
incommodos e despezas que nem todos podem Eu propuz que se pedissem informações ao
fazer, a instrucção que lhes falta no seu paiz natal. governo; cá nos entenderemos com o governo; elle
O pequeno augmento de despezas que se nos responderá depois de exigir das autoridades
deverá fazer com o tal estabelecimento nesta côrte, respectivas a informação que julgar precisa.
para o qual já temos a maior parte dos elementos Se o illustre deputado fallou como tal nada
necessarios, não nos deve embaraçar; e uma vez tenho que dizer; mas pareceu na verdade, quando
decretada a creação de universidades e collegios respondeu ás minhas observações, fallar mais como
litterarios, quantos forem necessarios segundo a autoridade informante do que como membro deste
extenção, riqueza, povoação e distancia das congresso, e isto, como já disse, não póde admittir-
provincias, irá o governo successivamente cuidando se, porque só lhe compete entender-se com o
da sua effectiva organisação segundo o plano que se governo e nunca directamente com esta assembléa.
adoptar, nomeando os professores e supprindo suas Direi agora alguma cousa sobre o que
despezas pela massa geral da renda publica, que expendeu o mesmo nobre deputado respondendo ás
não póde ter mais util applicação. minhas reflexões.
O Sr. Presidente declarou adiada a discussão A respeito de presos disse em geral que a
por ser chegada a hora da leitura dos pareceres. policia tinha poucos e que os das galés erão
O Sr. Ribeiro de Rezende, como relator da precisos; mas fiquei na mesma duvida sobre o seu
commissão de poderes, leu o seguinte: numero e sobre o fim com que se fazem despezas
com os chamados presos da ilha das Cobras, e
PARECER portanto de nada me serviu a sua longa resposta a
este respeito.
A commissão de poderes, examinando o Sobre o artigo – despeza em diversos objectos
diploma do Sr. José de Abreu e Silva, deputado á cargo da intendência – disse que estes gastos
supplente pela provincia de Minas Geraes, o acha estavão autorisados; que erão necessarios pelos
legal por se achar conforme com a acta geral e com perigos dos tempos; e que esperava que em breve
o decreto e instrucções de 3 e 19 de Junho de 1822; acabarião; porém ficámos como d’antes sem se
e é de parecer que visto acharem-se ausentes dous saber que objectos são esses de tanto
deputados proprietarios, os Srs. Lucas Antonio
Monteiro de Barros e João
Sessão em 27 de Agosto de 1823 175

segredo; assim como não sabemos quaes são os fim perguntou o mesmo illustre deputado se eu tinha
serviços extraordinarios que a intendencia paga com fallado sobre esta materia como deputado ou como
gratificações. Não me póde passar pela idéa um só intendente.
motivo para dar á policia gratificações, porque o Creio que assim como posso fallar sobre
gratificar não me parece que seja da sua attribuição. qualquer outro objecto, me é permittido fallar neste,
No meio deste mysterio grita então o publico – relativo ao cargo que occupo; se alguma differença
estas despezas são feitas com espiões. ha não póde ser mais que a de poder esclarecer
Eu não sei se ha com effeito espionagem; mas melhor á assembléa sobre esta materia por se tratar
se está em uso esta abominavel medida, será da repartição em que sirvo.
preciso que a assembléa tome isto em consideração. Para nada occultar ao publico é que fiz
Se ha espionagem fechemos todas as portas, não se proceder ao balanço, que o imprimi e fiz distribuir;
passêe de noite nem se converse; pois quando se por elle se vê que as despezas não têm sido mal
dão ouvidos a semelhante gente ninguem está livre feitas: ao menos eu estou persuadido que não tenho
de sahir culpado pelo que disser qualquer desses gastado mal um vintem, e na mesma persuasão
homens indignos. estou a respeito dos meus antecessores naquelle
Conclúo pois que de tudo quanto disse o lugar.
nobre deputado nada serve para nos illustrar; Não pretendo encobrir nada e nem receio que
estamos ignorando as mesmas cousas que as contas appareção: entrei com honra para o lugar
ignoravamos antes do seu discurso, e está portanto de intendente e quero sahir delle tambem com honra.
em pé a necessidade da minha indicação. O SR. CARVALHO E MELLO: – Na presente
Eu nada tenho com o actual intendente, nem indicação que se discute trata-se de mandar ao
em cousa alguma o crimino, antes o considero muito governo, que expeça ordem ao intendente geral da
digno; ataco unicamente o methodo de apresentar as policia, para que apresente um esclarecimento das
contas daquella repartição em publico; conservando contas que publicou, principalmente da pequena
mysteriosa a applicação das quantias despendidas. parcella que se não declara em que se despendeu.
Insisto por isso, que se approve a minha O nobre membro, que a propoz, estabeleceu o
indicação, á qual pretendo accrescentar depois das principio que nenhuma despeza publica se podia
palavras – especificação e fìscalisação – as fazer sem que constasse a esta assembléa em que
seguintes: – de cada uma das parcellas dos ditos fôra feita. O principio é em geral verdadeiro, porque
balanços. deve saber-se nesta augusta assembléa em que se
Queira V. Ex. mandar-m’a para eu fazer o despendem os dinheiros publicos, mas esta regra
sobredito additamento. (Assim se fez.) geraI tem alguma excepção não só em pequenas
O SR. FRANÇA: – Sr. presidente, eu me parcellas, mas em algumas das que têm algum
opponho a que passe a indicação, sem que deixe de destino particular.
louvar o nobre zelo do illustre deputado que a fez, Sempre que se trata do lugar de intendente
porque tenho para mim que dahi nenhum proveito se geral da policia, principalmente nos governos
segue agora á causa publica. liberaes, causa assombro e estranhesa a existencia
A intendencia da poIicia é uma repartição de um magistrado que não tem um regimento
subalterna e agente do poder executivo. O governo é especial, ou para melhor dizer, que tem tão grande
pois quem entende ou deve entender e fiscalisar no jurisdicção no alvará pelo qual foi creado, em que se
bem ou mal que as consignações ou rendas della se diz, que tem illimitada jurisdicção, e que não dá
gastão. aggravo das suas decisões. Ou este magistrado não
Se ha malversações na sua administração e deve existir, ou existindo, deve ter toda a larguesa e
todavia o governo as consente ou não fiscalisa, o amplidão que é propria daquelle emprego, e sem a
remedio desse mal não o posso eu descobrir senão qual não póde ser exercitado. Até o anno de 1760
na effectiva responsabilidade dos ministros: e esta Portugal regeu-se sem este emprego: os
depende do effectivo cumprimento de uma lei magistrados criminaes cumprião com parte das
regulamentar que nos falta. Tempo virá em que ella attribuições que hoje lhes são inherentes. O regedor
tenha effeito; e tudo andará a bom caminho. Por das justiças era o superior á quem se recorria dos
agora não passaráõ de bons desejos essas referidos subalternos. Naquella época se creou este
diligencias de informações. magistrado, unindo-se-lhe a policia ordinaria e o que
O SR. RIBEIRO DE REZENDE: – Levanto-me se chama alta policia, á maneira do que se praticava
para dizer pouco e com o sangue frio de um homem em outras nações.
de bem e não com o calor immoderado do nobre Em consequencia desta creação lhe ficarão
deputado o Sr. Montesuma. competindo as jurisdicções de uma e outra policia,
Quando respondi ás suas observações só tive sendo comprehendidos na primeira os pontos
em vista pôr esta assembléa ao facto da verdade, principaes della, que são, segurança, limpeza
mostrando que o dinheiro que se havia despendido
não tinha sido mal gasto; nem sei a que
176 Sessão em 27 de Agosto de 1823

e bom mercado, a que elle satisfaz por meio dos não tendo um regimento peculiar, está sugeita ás
magistrados criminaes que lhe são subalternos. Na regras geraes da publica administração, pela qual
outra parte da alta policia está comprehendido tudo deve responder o respectivo ministro de estado, que
quanto póde concorrer para segurança do governo e approvar suas despezas sem o cunho da legalidade.
salvação do estado. Por tão importante autoridade é Se esta conta fôra exigida officialmente por esta
esta magistratura odiosa e principalmente o será em assembléa para saber o seu estado, haveria lugar
todo o governo livre, em que estão estabelecidas as para este exame, encarregando esta tarefa a uma
garantias dos direitos individuaes do cidadão. Mas commissão para dar-lhe por lei a direcção que mais
toda esta doutrina é mais apropriada e tem lugar nos conviesse.
governos já firmes e estabelecidos, e em que não ha Quando tive a honra de succeder neste
precisão ainda de cautelas antecipadas. emprego ao conselheiro Paulo Fernandes Vianna
Nesta supposição, nem nós estamos ainda em tratei de balancear o cofre desta repartição para
estado de prescindir deste magistrado, nem elle foi resalvar minha responsabilidade segundo a nova
supprimido, nem as suas funcções coarctadas: fórma de governo representativo que então se
portanto está elle em circumstancias de dever fazer proclamou, fazendo constar pela imprensa o seu
da sua parte quanto fôr necessario para bem de resultado; o que se continuou a praticar contra os
firmar a segurança publica; e para prevenir o que lhe erros antigos de segredo inviolavel no manejo dos
póde obstar é necessario pôr os meios, no que de negocios publicos, especialmente no que era relativo
força deve fazer algumas despezas. O actual e os á fazenda nacional, donde nascerão os abusos que
que o precederão são reputados homens de credito são patentes. Demais, estabeleci um cofre de tres
e honra, e por este ponto de vista devem ser olhados chaves, paguei quasi toda a divida antiga, e regulei o
como incapazes de concussões e desvios dos methodo que se devia guardar na sua receita e
dinheiros publicos, acreditando-se que as despezas despeza; methodo que meus dignos successores
que fizerão, maiormente as pequenas, forão feitas a têm seguido, e aperfeiçoado.
bem da causa publica, ainda que não apresentem Eu não fui encarregado de glosar contas
uma especifica clareza de cada uma dellas em preteritas, nem havia alguma coisa que fazer a tal
particular, e mas quando algumas dellas não respeito; o meu exercicio principiava naquelle
poderião presentar-se ao publico, porque offenderião momento, e isso fixava minha attenção para não
o fim porque forão feitas. Ha além disto algumas, dispôr dos rendimentos deste cofre senão para os
mesmo das que pertencem á primeira classe de fins a que legalmente estavão destinados; tanto mais
baixa policia, que por serem demasiadamente que o Senhor rei D. João VI declarou por um honroso
miudas vão incluidas em outras, e não e póde decreto que aquelle magistrado tendo merecido sua
apresentar dellas especifica clareza. completa confiança o servira muito a seu contento, e
Em taes circumstancias considero eu a de que satisfação e que os rendimentos da policia forão
se trata: nenhuma outra cousa se faria pedindo applicados, conforme suas ordens, dando-lhe por
esclarecimento dellas ao governo, mais do que consequencia uma plena quitação de toda sua
desacreditar o magistrado por tão pequeno motivo, administração.
ao mesmo tempo que da natureza do seu emprego é Entretanto o de que se não póde duvidar é,
o confiar-se nelle em cousas ainda de maior porte. que sendo este lugar occupado desde o anno de
Emfim, Sr. presidente, quando se julgar conveniente 1808 até 26 de Fevereiro de 1821 pelo conselheiro
extinguir este lugar, extinga-se; mas emquanto Paulo Fernandes Vianna, elle se prestou com o
existe, e não se julga inutil ou prejudicial, deve ter maior zelo no serviço publico, empregando as rendas
toda a consideração da parte do governo, a quem deste cofre em beneficio do estado como era seu
incumbe não desacreditar empregado algum sem dever, não só executando as ordens que de S. M. F.
culpa legalmente justificada. É, á vista disto, e do immediatamente recebia para mesadas a diversas
mais que por brevidade omitto, evidente, que esta pessoas, illuminações e festejos em occasiões de
indicação deve ser desapprovada por injusta e regosijo publico, e outras despezas extraordinarias
desnecessaria. para certos destinos até em paizes estrangeiros, mas
O SR. PEREIRA DA CUNHA: – Entro com principalmente mandando edificar pontes, fazer
violencia nesta materia, assim como fui constrangido calçadas e atterros, e outras muitas obras de
a occupar o lugar de intendente, direi todavia duas interesse geral, que são outros tantos testemunhos
palavras em abono da justiça, e defeza das do seu cuidado, e vigilancia, pois bem sabido é que
arguições que se pretendem fazer a esta repartição. na cidade nova, e mais suburbios desta capital todos
Principio por notar que este impresso foi offerecido a os edificios e arruamentos se fizerão depois que S.
esta illustre assembléa, mais por obsequio do M. F. assentou nesta côrte a séde da monarchia;
honrado ministro que agora serve, do que por assim como é constante que a maior parte das
alguma ordem que para isso recebesse, visto que a estradas visinhas erão intransitaveis, especialmente
contabilidade do cofre da policia, no tempo das chuvas, com aguas estagnadas, e
lameiros até dentro da cidade, como acontecia no
campo de Sant’Anna, e largo
Sessão em 28 de Agosto de 1823 177

do Rocio, que são hoje duas excellentes praças; como deputado á mesma assembléa pela provincia
sendo tudo até o presente feito á custa da policia. de Minas-Geraes – Deus guarde a V. S. Paço da
Muito embora se tomem para o futuro medidas assembléa, em 27 de Agosto de 1823. – José
adequadas para se despenderem estas rendas Ricardo da Costa Aguiar de Andrada.
debaixo de um systema bem organisado; e quanto a
mim seria muito proprio, e conducente que ellas SESSÃO EM 28 DE AGOSTO DE 1823.
entrassem para o cofre do illustre senado desta
cidade afim de serem bem desempenhados seus PRESIDENCIA DO SR. BlSPO CAPELLÃO-MÓR.
deveres nos objectos de economia municipal que
estão a seu cargo, dispensado o intendente destes Reunidos os Srs. deputados pelas 10 horas da
minuciosos artigos; ficando-lhe assaz com que se manhã, fez-se a chamada, e acharão-se presentes
entretenha no seu officio, empregando sua vigilancia 64, faltando com causa os Srs. Andrada Machado,
e actividade em tudo que pertence á segurança do Gomide, Xavier de Carvalho, Andrada e Silva,
estado. Pinheiro de Oliveira, Duarte Silva, Carneiro de
O SR. MONTESUMA: – Os illustres Campos, Ferreira Nobre, Nogueira da Gama, Velloso
preopinantes que acabárão de fallar taxárão o meu Soares, Ribeiro de Andrada, Rodrigues da Costa,
discurso de pouco decoroso sustentando a minha Ferreira de Araujo.
indicação. Se por ella se entende que eu quiz atacar O Sr. Presidente declarou aberta a sessão, e
o intendente geral da policia, declaro desde já que leu-se a acta da antecedente.
não foi essa nunca a minha tenção; para isso seria O SR. VERGUEIRO: – Vejo na acta uma
preciso que eu fizesse delle máo conceito, e ao declaração que creio não ter lugar pelo que decidio a
contrario me merece mui boa opinião. O que propuz assembléa. Quando o Sr. Souza Mello requereu que
só tem por fim o fazer que o balanço saia como deve se inserisse na acta o que julgava necessario para
sahir, emendando-se a mão. O publico deve saber fazer constar que não recebera a felicitação do
em que se gastão as rendas da nação; e hoje olha- governador das armas das Alagôas resolveu-se que
se para as contas das differentes repartições com não se fizesse menção na acta, e portanto entendo
muita curiosidade; até servem de matar o tempo aos que o que diz respeito a este negocio devia ser
ociosos que tudo perguntão e tudo querem saber. omittido.
Além disto a franqueza é o melhor meio de O SR. COSTA AGUIAR: – Na acta não ha
adquirir a boa opinião publica; e se cada um gosta de falta de exactidão, porque nada mais se fez do que
ver como as cousas vão e como não vão, servirá até referir o que se passou; o que se decidio foi que não
a minha indicação para que o mesmo intendente se inserisse na acta a declaração que o Sr. Souza
conserve o credito que merece, mostrando, pela Mello mandou á mesa, e esta resolução está
individuação das applicações das quantias indicadas executada.
nos balanços, que não houve malversação, e que Consultou-se a assembléa e foi approvada a
tudo teve o destino respectivo com utilidade do acta.
estado. Nada portanto disse contra o actual O Sr. Presidente annunciou que estava á porta
intendente; nem eu quiz nunca applicar á pessoa do salão o Sr. José de Abreu e Silva, deputado
delle o que tem de odioso a jurisdicção annexa ao substituto pela provincia de Minas-Geraes, e sendo
seu emprego, assaz attestada por muitas e repetidas introduzido na fórma do estylo prestou juramento e
violencias. Creio ter satisfeito com esta explicação. tomou lugar na assembléa.
Julgando-se discutida a materia, propôz o Sr. O Sr. Costa Aguiar deu conta das
presidente a indicação; e foi regeitada. participações de molestia dos Srs. Ferreira de Araujo
O Sr. Presidente assignou para a ordem do e Ferreira Nobre. – Ficou a assembléa inteirada.
dia: 1º A continuação da primeira discussão do Passou-se á ordem do dia, que era a
projecto para a fundação de duas universidades; 2º continuação da 1ª discussão do projecto para a
A competencia da materia da proposta do Sr. creação de duas universidades no Brazil, com as
Carneiro da Cunha sobre o córte do páo-brasil: 3º emendas offerecidas pelos Srs. Gomide e Araujo
Regimento da assembléa. Lima na sessão antecedente.
Levantou-se a sessão ás 2 horas da tarde. – O SR. SILVA LISBOA: – Sr. presidente, na
Manoel José de Souza França, secretario. sessão de hontem o honrado membro o Sr. Lima
notou com menos apreço a recommendação que fiz
RESOLUÇÕES DA ASSEMBLÉA do direito romano no curso juridico da projectada
universidade, arguindo que se, como eu disse, as
PARA JOSÉ DE ABREU E SILVA Pandectas, sendo achadas, contribuirão muito para a
civilisação da Europa, depois da invasão dos
A assembléa geral constituinte e legislativa do barbaros, tambem concorrerão para as desordens
imperio do Brasil manda participar a V. S. que deve dos governos, e que a Inglaterra as não adoptou.
quanto antes, vir tomar assento neste augusto Respondo que os povos da Inglaterra estão, em
congresso, e ter parte nos seus trabalhos varios objectos,
178 Sessão em 28 de Agosto de 1823

separados do mundo pela sua situação, como já De facto, ainda hoje se notão os monumentos
disse Virgilio – Penitus divisos orbe britannos. de grandeza e sabedoria do governo romano; os
O seu governo, que muito respeita os vestigios das estradas que se achão em varios
antepassados, adoptou o direito consuetudinario do estados cultos, o as magnificas obras de tantos
paiz, derivado dos seus ultimos conquistadores; e generos, que se admirão no paiz classico da Italia,
tendo estabelecido o systema mixto, regeitou o sendo instructivas até as ruinas, pois com ellas se
chamado direito imperial, porque no codigo se firmou despertarão e reviverão as sciencias e artes, bem
a regra despotica – Quod principi placuit, legis habet que fosse dos seculos dos seus despoticos
vigorem. – O povo não reconhece a lei – quero imperadores.
porque quero –, e só aquella que se considera ser Não é de razão prescindir do estudo das leis
expressão da vontade geral, declarada pelos da antiguidade, onde se achão restos de forças
representantes da nação em parlamento. Todavia os vitaes da civilisação promovida pelos romanos, que
seus jurisconsultos não deixão de consultar as até conquistarão o Egypto, onde, pelo seu systema
Pandectas, como as fontes da jurisprudencia civil. conservador, inda ora se notão as pyramides, e
O seu moderno institutario Blackston cita as obras que têm affrontado os seculos.
leis dos romanos, ainda que mais sobriamente do Os francezes, que no fim do seu seculo
que os escriptores dos outros paizes. passado invadirão o Egypto, tiverão em vista os
Os seus mesmos autores sobre jurisprudencia exames dos monumentos sobre as leis, letras e artes
commercial se referem ás leis, onde se achão as do paiz.
bases das decisões sobre letras de risco e avarias Uma razão mui ponderosa me occorre demais
que vêm nos titulos do Nautico Fanore, e Ad Legem para a preferencia da universidade nesta côrte, e é,
Rhodiam de Jactu. para que se conserve a pureza e pronuncia da lingua
O insigne Burke diz, nas suas celebradas portugueza, que, segundo diz Camões, com pouca
Reflexões contra a revolução da França, em que corrupção crê que é latina. Sempre em todas as
tambem entre os seus mil desatinos, se affectou nações se fallou melhor o idioma nacional nas
desprezar inteiramente o direito romano, só côrtes. Nas provincias ha dialectos, com seus
inculcando os seus doutores do Palais Royal, falsos particulares defeitos; o Brazil os tem em cada uma,
Direitos do Homem, que « não obstante o indigesto que é quasi impossivel subjugar, ainda pelos mais
das Pandectas, ahi se vê a colligida razão dos doutos do paiz.
seculos, a arte de applicar os originaes principios de É reconhecido que o dialecto de S. Paulo é o
justiça á infinita multiplicidade dos negocios mais notavel. A mocidade do Brazil, fazendo ahi os
humanos: o seu tribunal não deve ser usurpado pela seus-estudos, contrahiria pronuncia mui
arrogancia e philaucia dos que não experimentarão desagradavel.
outra sabedoria mais que a sua propria.» Demosthenes, sendo perguntado qual era a
O famoso Gibbon, na historia da decadencia primeira prenda do orador, respondeu, a pronuncia; a
do imperio romano, faz um admiravel summario da segunda, a pronuncia; a terceira, a pronuncia.
legislação e politica do imperio romano; nem é Quintiliano diz, que por mais sabio e eloquente
possivel prescindir do estudo das leis de um povo, que seja o orador, desagradará tendo má pronuncia:
que durou, em varias fórmas de governo, por mais Verum pronunciatio cuncta corrumpit. A Tito Livio
de quatorze seculos, e que ainda depois de sempre se notou o dialecto da Patavinidade; a
destruidos, regerão a tantos paizes. Os francezes, Theophrasto a affectação do atticismo; a Robertson,
depois de tornarem aos seus sentidos, as o dialecto escossez, e a Burke o idiotismo irlandez.
reverencião no seu novo codigo civil, onde se Quanto ao que se ponderou a favor do
encontra o fundo do direito romano, e as estabelecimento da universidade na Bahia, a
dissertações dos sabios que confessão as deverem haver duas, apoio a esse respeito a opinião
excellencias das leis romanas, relativamente aos do Sr. Montesuma, por ser a primeira metropole do
contractos, propriedades, etc. Esse codigo com suas Brazil, e a que, depois desta côrte, tem mais
dissertações está traduzido no idioma inglez. estudos: consta que della se tem expedido mais
Não recommendei excessos em estudos do estudantes para Coimbra, com a protecção do conde
direito romano, taes como ordenão os estatutos de dos Arcos, quando foi governador da Bahia, o qual
Coimbra, onde se determinarão sete cadeiras de tal foi depois tão indigna, injusta e ingratamente
direito. Talvez em lugar de algumas, bastaria uma de maltratado pela cabala anti-brasilica.
exposição do dito codigo francez, notando o O Mesmo Sr. Deputado mandou para a mesa
professor judicioso as suas aberrações, como o uma emenda, mas por não estar conforme ao
declarar o casamento um contracto civil, o que é regimento foi restituida ao seu illustre autor para
gravissimo erro, por dessagrar o matrimonio, ou accommodar a doutrina á cada um dos artigos do
sociedade conjugal, que o nosso Salvador projecto.
especialmente honrou, como sendo um meio de O SR. ARAUJO LIMA: – O regimento dá-me
legitima propagação da especie humana.
Sessão em 28 de Agosto de 1823 179

direito a entrar no debate para responder ao Sr. continuamos não sei quando terá fim a discussão. Peço
deputado Lisboa. por isso a V. Ex. a observancia do regimento.
O honrado membro fez-me a honra de fazer (Fallarão tambem os Srs. Muniz Tavares e
algumas observações sobre o que disse hontem a Carneiro da Cunha, mas não se entendeu o
respeito do direito romano, e deu a entender que eu tachygrapho Silva.)
tinha em despreso aquella legislação; é por isso que eu O SR. MONTESUMA: – Quando hontem opinei
direi alguma cousa. que voltasse o projecto á commissão tive em vista o
Hontem, Sr. presidente, eu confessei a sabedoria prevenir que elle tivesse a mesma sorte que outros
dos autores daquelle direito, e seus commentadores, projectos, que por serem pouco exactos têm soffrido um
mas accrescentarei que elle não fez mais do que sem numero de emendas, e se achão confusos e talvez
assegurar a escravidão dos povos, assim dos mesmos contradictorios em algumas partes. Com as que por ora
romanos, para quem se inventarão aquellas distincções ha, e provavelmente se offereceráõ hoje, tem a
e aquella jurisprudencia formularia como dos povos que commissão bases para de novo trabalhar, tomando em
ao depois o abraçarão, pelos principios alli enunciados; consideração a maneira de regular esses cursos
e disse, e torno a dizer, que aquelle direito juntamente juridicos, fundos para despezas, e methodo geral de
com o das decretaes estragárão a igreja e o estado. ensino. Se não fôr assim acontecer-lhe-ha o mesmo
Sr. presidente, o honrado membro apresenta que a dos ausentes.
uma massa tal de conhecimentos, que facilmente Entretanto visto ter-me levantado para fallar
esmagará aquelles que, como eu, se lhe offerecerem sempre direi que não posso accommodar-me com a
em campo; porém eu servir-me-hei das armas de opinião do Sr. Lisboa, sobre a fundação de uma
David; aquelle heróe, não podendo braço a braço entrar universidade nesta côrte, são muitas as razões que me
em luta com o gigante, valeu-se de uma pedra para o determinão a pensar assim, mas como este não é o
ferir mortalmente: eu usarei da mesma arte e verei se lugar proprio para as expender eu me reservo para a 2ª
posso repellir o ataque do honrado membro, entretanto discussão, e ahi exporei o meu parecer; por ora só digo
que não posso apresentar-me em campo na presença que para não admittir tal fundação nesta côrte é para
de tão grande athleta; e como farei? Recorrendo ao seu mim de sobejo a influencia que terião os senhores do
modo de argumentar. governo para tudo se dirigir alli pela sua vontade e
Disse o honrado membro que os inglezes arbitrio.
rejeitarão a legislação romana, porque se alli sustenta O SR. PEREIRA DA CUNHA: – Desnecessario
que quod Principi placuit, legis habet vigorem. me parece reproduzir os argumentos e razões, que
É verdadeira a causa que aponta o honrado devem sustentar a materia que faz a base essencial
membro; aquelle principio e outros fizerão que os deste projecto. Esta illustre assembléa animada dos
inglezes, sempre ciosos de sua liberdade, rejeitassem nobres sentimentos que lhe inspira o amor da patria,
um direito tão proprio para plantar a escravidão; mas não podia deixar de considerar como indispensavel a
isto não destróe o que avancei, e é que talvez a esta fundação de universidades, e collegios neste vasto
rejeição devão elles a sua liberdade, porque não sendo imperio para se diffundirem os conhecimentos, e se
admittido nas escolas aquelle direito, não teve elle animarem as artes e sciencias, sem as quaes se não
occasião de calar nos animos dos inglezes, e por isso póde obter aqueIle gráo de civilisação que faz a
de corromper o amor da liberdade. O honrado membro prosperidade geral das nações.
apontou a causa, em que eu concordo, mas não Resta pois proporcionar os meios precisos para
destruiu o effeito, que, é preciso dizer, não se deve a tão importante empreza, ponderar-lhe as difficuldades e
ella só; e se se quizer dizer que aquella rejeição já remover tudo o que puder oppôr-se á sua mais prompta
prova o amor da liberdade que tinhão os inglezes, não execução. Sendo porém absolutamente impossivel
se me poderá negar que ella o firmou, ou pelo menos estabelecer neste momento todas as instituições que
apartou da Inglaterra uma cousa que o poderia destruir. exige o nosso immenso territorio, fundando-se
O SR. VERGUEIRO: – Estamos na 1ª discussão universidades em differentes provincias para
em que, segundo o regimento, se trata só da vantagem commodidade de seus habitantes, é de summa
ou inconveniencia do projecto; mas já perdemos um necessidade erigir ao menos uma que faça menos
dia, e o de hoje leva o mesmo caminho. difficultosa a sua frequencia, e apresente melhores
O Sr. Lisboa a quem muito respeito, não tem proporções para facilitar o seu desempenho.
feito mais que dissertações sobre o direito romano e Em nenhuma parte do Brazil (ouso affirmar)
sobre a pronuncia dos oradores; ora, isto, Sr. occorrem mais favoraveis requisitos para com tanta
presidente, é ir muito fóra da ordem, porque nos promptidão se executar este plano, do que no sitio de
devemos limitar sómente á consideração de ser ou não Belém, districto da villa da Cachoeira, aonde existia um
util o projecto; se assim seminario dos proscriptos jesuitas, ou em outra
qualquer das ricas villas do

OBS: As páginas seguintes: 180 e 181 estão mutiladas.


182 Sessão em 28 de Agosto de 1823

utilidade nos offerece de presente, quando as nossas hospitaes onde sufficientemente se pratique a clinica
circumstancias instão porque se metta em quasi todas as variedades de doenças;
immediatamente em acção este assumpto, ao menos abundancia de sujeitos acondicionados para regerem
por uma maneira provisoria, emquanto outras as cadeiras de direito que de mais se houverem de
medidas mais morosas se não tomão, convenientes crear: finalmente até se nos offerece o partido das
á um systema regular de todas as doutrinas que dotações que desfructão o seminario episcopal de S.
deve comprehender uma perfeita universidade, que o José, e o dos orphãos de S. Joaquim, nos quaes se
não seja só no nome. Na universidade de Coimbra póde encorporar por ventura o novo estabelecimento
temos grande numero de estudantes brazileiros que de uma universidade, coadunando todos os
depois da nossa independencia têm a maior elementos em um systema de classes subordinadas
necessidade de voltar á patria; e talvez o não têm já á inspecção de um reitor e mais officiaes
feito, por não terem aqui onde completem os cursos academicos, a cujo corpo se dê esse nome com
dos seus estudos juridicos, que os habilitão para estatutos proprios, que satisfação por ora a
entrar na carreira da magistratura: eis-aqui entre necessidade dos tempos, e adquira pelo correr do
outros, um motivo que nos deve tambem apressar tempo maior extenção e perfeição; as quaes
para estabelecermos cadeiras desta faculdade, facilidades todas não descubro eu reunidas em tão
segundo o methodo de ensino recebido naquella grande numero nas outras provincias.
universidade; ainda que para o futuro se haja este de Tem-se dito que Olinda tem muitos destes
melhorar, e reformar em outro systema. elementos que igualmente se podem aproveitar.
Eu vejo que se trata no projecto de numero de Convenho que se aproveitem na mesma direcção; o
universidades, e de lugares adoptados para ellas; e que importa é que alguma cousa se faça já a este
que defere ainda o seu effectivo estabelecimento respeito; e o melhor seria que fosse aqui debaixo das
para depois. As primeiras questões são inuteis; a nossas vistas, das quaes deve receber a obra o
ultima deve ser corrigida. São inuteis as primeiras melhor impulso. Sou portanto de voto e requeiro que
duas questões, porque entendo que se devem crear volte o projecto á commissão para se redigir o seu
pelo correr do tempo tantos estabelecimentos contexto sobre estas bases que tenho expendido,
litterarios desta natureza quantos exigirem as embora se haja de promover uma ou mais
necessidades dos povos derramados sobre um universidades. Mando á mesa para este fim a
grande territorio qual é o nosso, logo que se seguinte:
proporcionem os meios praticos para isso; pois não
concebo, nem possa conceber nenhuma razão PROPOSTA
sufficiente porque haja de vir o cidadão de Piauhy,
por exemplo, buscar instrucção das sciencias Requeiro que volte o projecto á illustre
maiores á provincia de S. Paulo. Todos têm direito commissão com todas as emendas apoiadas, para
aos commodos publicos de geral utilidade que a se refundir o mesmo projecto de maneira que se
sociedade deve manter, e entrão neste numero as ponha logo em pratica uma ou mais universidades,
escolas maiores que se devem dar aos cidadãos na aproveitando-se nos locaes em que se ellas
propria provincia, uma vez que esta as possa houverem de estabelecer os elementos que
sustentar, que é toda a difficuldade da empreza: e houverem de ensino publico e dolacio, e se
posto este principio de igualdade de direitos, o ponto continuará então a discussão. – O deputado, França.
importante da questão fica reduzido á pergunta: onde Foi apoiada.
estabeleceremos desde já, um corpo academico O SR. COSTA BARROS: – Sr. presidente,
mais ou menos perfeito, em que provisoriamente se não ha muito tempo, ou para melhor dizer, não ha
vão instruindo os nossos concidadãos, supprindo-se- muitos dias que nós com lagrimas nos olhos
lhes a extemporanea falta de uma universidade, que pediamos aulas de primeiras letras para algumas
d'além mar tinhamos em Coimbra? A maior provincias, donde se póde colligir o estado em que
facilmente de reunião dos elementos proprios para ainda nos achamos: e como procuramos já de
um tal estabelecimento é que nos deve decidir a presente estabelecer universidades onde não ha
esse respeito; e cuido que nenhum lugar do Brazil mestres de primeiras letras? Sr. presidente, eu
póde encher tanto á mão essa indicação como o Rio sempre desconfio de quem me promette muito; e não
de Janeiro. tendo nós ainda um bom collegio não sei como nos
Aqui temos já creadas, e em effectivo exercicio mettemos já a ter duas universidades logo de
mantidas pelo estado varias aulas, onde se ensinão pancada! Parecia-me mais asisado que cuidassemos
as linguas latina, grega, franceza e ingleza, a logica, de estabelecer uma (se é possivel) e depois de
rhetorica, a as mathematicas; além destas ha fundada esta cuidar da outra, porque não podemos
tambem cadeiras concernentes ao estudo da ter já as commodidades e meios que havemos de ter
medicina e cirurgia; temos uma copiosa livraria para o futuro. Quanto á escolha do local inclino-me a
publica, um muzeu, jardim botanico, que se prefira a Bahia como ponto mais central do
Brazil, e por algumas razões particulares.
Sessão em 28 de Agosto de 1823 183

No tempo do Sr. D. João VI, projectou-se indispensavel que haja onde elles vão adquirir as
fundar alli uma universidade, e para a instituir luzes necessárias.
offerecião-se muitos contos de réis: ora, isto é Eu estou, Sr. presidente, tão persuadido da
alguma cousa... Eu estou pela opinião do Sr. Pereira boa vontade dos brazileiros a respeito de um tal
da Cunha para que se estabeleça uma universidade estabelecimento que julgo que aberta uma
no Maranhão, e outra na Bahia, e tambem voto por subscripção para este fim ella seria preenchida
uma terceira em S. Paulo; mas isto para o futuro; promptamente, pois todos conhecem a precisão e
para agora sou de parecer que se funde uma na utilidade. Adoptemos portanto a opinião do Sr. Silva
Bahia e ficaremos já bem servidos. E’ este um dos Lisboa que eu tenho por melhor; contentemo-nos
maiores bens que podemos dar ao Brasil; e estou com uma e feita aqui, servindo-nos por ora dos
certo que no dia em que se decretar uma estatutos de Coimbra; e depois cuidaremos da outra,
universidade será inexplicavel o jubilo dos que nos promette a commissão, em tempo
brazileiros, e muito grande a nossa gloria. O Sr. competente... Mettamos mãos á obra; abra-se a
França prefere o Rio de Janeiro para assento da subscripção, e não nos faltaráõ meios; no
universidade por existirem á reunidos aqui muitos enthusiasmo que deve produzir nos povos a idéa de
elementos precisos: eu não sigo esta opinião, o ver neste novo imperio uma universidade todos
silencio é sempre mais proprio para o estudo, e no contribuiráõ á porfia para se realisar este bem.
retiro se apura o philosopho; e por isso os grandes Estimaria que hoje mesmo começassemos a tratar
estabelecimentos litterarios devem fundar-se em desta importante materia.
partes onde não haja o estrepito nem a confusão da O SR. TEIXEIRA DE GOUVÊA: – Como vejo
côrte. que muitos Srs. deputados têm votado a favor da
Demais a existencia desses elementos não é fundação de uma só universidade, e póde ser que
para mim razão sufficiente para se preferir o Rio de passe esta opinião, proponho nessa hypothese a
Janeiro; os mestres, por exemplo, de que fallou o seguinte:
nobre deputado, se a universidade se estabelecesse
na Bahia, para la ião; a utilidade publica é que EMENDA
regula, e se esta os chamasse para a Bahia, o
patriotismo os levaria, sem necessidade de Proponho que a haver uma unica universidade
constrangimento. Voto portanto que se funde já uma no sul que esta se estabeleça na cidade de
universidade na Bahia, e que para o futuro se trate Marianna. – Teixeira de Gouvêa. – Foi apoiada
de estabelecer outras no Maranhão e em S. Paulo. O SR. CARNEIRO DA CUNHA: – Sr.
O SR. ALENCAR: – BeIlos discursos tenho presidente, levanto-me para fallar a favor do projecto,
ouvido dos illustres deputados que têm fallado, mas não posso de nenhum modo accommodar-me
pretendendo cada um que se deve estabelecer a com a opinião dos illustres deputados os Srs. Silva
universidade na provincia que lhe parece. Entendo Lisboa e Alencar, relativamente a ser instituida a
que o Sr. França é o que tem seguido melhor o ponto universidade no Rio de Janeiro. Parece-me evidente
da questão, porque realmente do que se trata é se a impossibilidade de haver nesta côrte uma
deve ou não haver universidades. E' inquestionavel o universidade, onde o luxo desmedido, e variados
proveito da sua fundação, e por isso eu julgava que divertimentos devem necessariamente ter grande
até sem debate passaria á segunda discussão; mas influencia nos animos dos estudantes, incitando-os a
não tem sido assim; e largamente se tem tratado de fazer despezas para gozar delles, ao mesmo tempo
particularidades como é o demonstrar qual seja o que as mesadas se limitão apenas ás quantias
lugar mais proprio para um tal estabelecimento. necessarias para os gastos de sua subsistencia, e
Nós precisamos de uma sem demora; e esta compra de livros. Além disto, faltão aqui muitas
me parece que deve instituir-se aqui no Rio de commodidades que se achão em outras provincias
Janeiro, porque attentas as nossas pequenas forças do imperio, e que são indispensaveis; os viveres são
pecuniarias para tão grandes despezas, convém caros, e a renda das casas muito subida; ora, se na
escolher o lugar onde se encontrem mais materiaes universidade de Coimbra, onde as casas são de mui
reunidos para a obra para com mais facilidade e modico preço, e tudo barato, assim mesmo quasi
presteza se levantar. Precisamos, Sr. presidente, de que não chegão as mesadas, como chegaráõ nesta
uma universidade, e já, como de pão para a boca; côrte. Demais, senhores, devemos considerar as
temos mui poucos bachareis para os lugares de localidades para a instituição de duas universidades
magistratura, e além disso estão chegando de porque uma só, pela grande extenção do imperio,
Coimbra os estudantes que se recolhem á sua patria, não preencheria o fim que nos propomos, por ficar
e é preciso que haja onde elles completem os seus muito distante de algumas provincias, devendo todas
cursos que lá começarão; temos igualmente ellas gosar dos mesmos commodos.
necessidade de homens capazes para os empregos Tenho ouvido, fallando sobre localidades, uns
publicos, e até para entrarem nesta augusta preferirem Pernambuco, outros terem por
assembléa, e é
184 Sessão em 28 de Agosto de 1823

melhor a Bahia, e finalmente o Rio de Janeiro; e as edificios proprios, para fazer uma universidade, e ser
razões da preferencia consistem nas vantagens que a cidade tão pequena que nem os estudantes
se tirão dos collegios já estabelecidos, do augmento acharião casas para viver.
que em geral alli se nota a respeito das mais Portanto, tendo pesado todas estas razões, e
provincias, e de seus maiores rendimentos, do que conhecendo, que não é praticavel o estabelecer-se a
resulta mais facilidade de adquirir livros, mestres, e universidade nem em S. Paulo, nem na Bahia, nem
todo o necessario. Cada um que tem fallado tem em Pernambuco, e muito menos no Rio de Janeiro,
supposto na provincia em que lhe parece que deve digo que preferiria a Parahyba. Ella não é a minha
fundar-se a universidade, todas estas vantagens patria, porque nasci em Pernambuco; mas se sou
reunidas, e tem tirado por consequencia que alli se deputado da Parahyba, tambem o sou de toda a
deve instituir. Quanto aos rendimentos, devo dizer, nação.
que as rendas para a universidade não devem sahir A Parahyba offerece muitas vantagens, que
só da provincia onde ella fôr instituida, mas sim de não encontro nas provincias que já citei; clima
toda a massa da nação, porque a nação toda tira moderado abundancia de viveres, todas as
utilidade deste estabelecimento, que não pertence commodidades necessarias para a subsistencia, e
privativamente á provincia onde se institue; e assim nenhuma distração ou divertimentos.
como todas as provincias concorrem para as O povo da Parahyba é um povo simples, de
despezas da côrte, (porque só o rendimento do Rio costumes ainda mui singelos, onde não ha theatro,
de Janeiro não chega) hão de tambem concorrer nem dissipação de qualidade alguma. Tem além
para esse fim; nem póde ser privada nenhuma dellas disto grandes edificios que podem servir, tanto para
dos bens que resultão de um tão interessante e util o estabelecimento do collegio, como para habitação
estabelecimento por ter mais ou menos rendimentos. dos estudantes.
Vejamos agora os commodos que pódem achar na Para o norte seguramente não ha uma só
Bahia, ou Pernambuco, os pais de familias que provincia que tenha um tão bello edificio como o
mandão seus filhos á universidade. convento de S. Francisco da cidade da Parahyba,
A Bahia é uma cidade grande, de muito luxo, e que tem uma grande cerca, e todos os commodos
que tem, com pouca differença, todos os necessarios; é um edificio immenso, e só precisa de
estabelecimentos desta côrte; os alugeis das casas alguns reparos. Além deste convento ha o de S.
são carissimos, e tambem os viveres. Pernambuco Pedro onde existem dous frades, e outro do Carmo
faz alguma differença, porém não deixa de ter alguns que os frades já não querem habitar.
destes inconvenientes, pois ainda que não é tudo tão Eis um paiz bello para se estabelecer uma
caro, nem ha tantos divertimentos, como no Rio de universidade, no caso de se admittir que deve ser
Janeiro e Bahia, sempre ha alli distracções muito uma só, porque fica mais perto do resto das
prejudiciaes ao adiantamento dos estudantes, como provincias do norte.
succede aos do collegio de Olinda. Eu acho que de nenhum modo se deve
O creador deste collegio, com os estudantes, desfazer nas que são pobres, porque se os povos da
lhe tinhão respeito, por suas luzes e virtudes ainda Bahia têm maior riqueza, se os pais de familias são
os continha, e reinava nelle a melhor ordem possivel; mais abastados não têm por isso direito a serem
mas logo que morreu, mudou inteiramente, e póde- favorecidos com a instituição da universidade na sua
se dizer que os mestres se pagão debalde, porque provincia; pelo contrario, penso que lhe não toca esta
os estudantes não perdem nenhuma quinta-feira de preferencia, porque têm mais meios de pagar os
ir ao Recife, para jogos, theatro e outros transportes; e as mais despezas que fizerem seus
divertimentos. filhos. Demais, tendo a Bahia os collegios
Ora, se isto acontece com os estudantes deste necessarios para os estudos preparatorios podem os
collegio, o que não será quando se instituir a estudantes, depois de terem estudado nestes
universidade? Não vi ainda nenhum dos Srs. collegios, ir para a universidade sómente para tomar
deputados ponderar este inconveniente, quando eu o gráo de doutor, e por isso não ficão de modo
acho que uma das cousas muito essenciaes, para o nenhum privados de se applicarem na sua provincia
estabelecimento de uma universidade é o procurar aos estudos.
um lugar accommodado, e que não tenha distração, A' vista, pois, do que tenho expendido, e
ou a menor possivel; de outro modo póde attendendo a que a universidade estabelecida na
estabelecer-se uma universidade mas não preenche Parahyba fica mais proxima do Maranhão, Pará, etc.,
os seus importantes fins. Talvez, olhando o objecto voto que alli se funde, persuadido que em nenhum
sómente por este lado, eu preferisse S. Paulo ao Rio outro local se reunem tão importantes vantagens.
de Janeiro, porque não offerece tantos meios de O SR. ARAUJO VIANNA: – Sr. presidente, eu
dissipação, e até é mais proprio para o estudo, por me levanto para fallar a favor da ordem; se eu
ser frio; mas tem outro inconveniente, que é não ter quizesse fallar fóra della, tambem mostraria que
devia estabelecer-se uma universidade em S. Paulo,
provando contra o que se acaba de
Sessão em 28 de Agosto de 1823 185

dizer, as grandes vantagens que resultarião da Praza a Deus que se consiga o termos ao
escolha daquelle local. Mas a discussão não versa menos uma universidade!
sobre o lugar onde se devem estabelecer as Se isto fizermos, temos feito um serviço
universidades, nem sobre o numero dellas; versa inestimavel, muito principalmente se a houver sem
unicamente sobre a utilidade ou inutilidade do demora. Eu já me contento com uma só, assim vá
projecto; e são tão claras as vantagens que resultão ávante o projecto.
da adopção deste projecto, que julgo inteiramente Por não haver quem pedisse a palavra, propoz
desnecessario cansar a assembléa com uma materia o Sr. presidente:
em que toda ella está perfeitamente de accordo. 1º Se tinha lugar o requerimento do Sr.
Quem negará o grande bem de poder a nossa França. – Venceu-se que não.
mocidade instruir-se no seu proprio paiz, quando 2º Se a materia estava sufficientemente
antigamente só o podia fazer indo a Portugal, que discutida. – Venceu-se que sim.
demais a mais é hoje, depois de feita a separação, 3º Se passava o projecto á 2ª discussão. –
um reino estrangeiro e inimigo? Venceu-se tambem que sim.
Se, pois, esta utilidade, além de muitas outras Seguiu-se a segunda parte da ordem do dia,
já mostradas são a todos evidentes, não sei porque isto é, a discussão da competencia da materia da
nos demoramos com esta discussão, quando aliás proposta do Sr. Carneiro da Cunha sobre o córte do
me parece a materia mais que sufficientemente páo-brazil. (Veja-se a sessão de 28 de Junho.)
debatida. (Apoiados.) O SR. CARNEIRO DA CUNHA: – Sr.
O SR. DIAS: – Aqui desgraçadamente quasi presidente, eu já expendi algumas razões, posto que
nada póde passar, porque a multiplicidade das não sufficientes, para mostrar o quanto era urgente
emendas e divergencia de opiniões, deitão tudo do tomar algumas medidas sobre este ramo tão
avêsso, e por isso muito duvido que vá ávante este importante, que a natureza concedeu ao nosso paiz
projecto. natal, e de que tirou o nome este riquissimo imperio.
Mão inimiga, mas occulta, destróe todos os A diminuição deste genero é o resultado da
projectos, por melhores que sejão; sempre um máo má administração antiga, que deu o terreno a um
genio apparece, sem que se saiba de onde vem, individuo, e concedeu a outro individuo o poder de
para desarranjar tudo. tirar do terreno daquelle o páo-brazil, e destruir tudo.
Muito boa esperança concebemos quando E’ esta a causa principal, porque ninguem quererá
appareceu o projecto sobre o tribunal dos defuntos e ter em seu terreno um só tronco de páo-brasil, antes
ausentes; promettiamo-nos destruir este tribunal todos conspiraráõ para o destruir, para se livrarem
onde se apurão tantos roubos; mas talvez nada se de uma cousa que longe de dar lucros causa
verifique porque o projecto nunca mais apparecerá, e prejuizos enormes, e impede o poder-se agriculturar
ficaráõ os ladrões com as unhas afiladas, para irem a terra. Eu fallo por experiencia propria... Por causa
lançando mão de tudo quanto puderem. disto uma provincia como a Parahyba, que tinha
Eu fallo pelo que a experiencia nos tem immenso matto virgem, todo elle de páo-brasil, hoje
mostrado; e por isso digo que mão occulta pretende não tem já, senão uma porção muito pequena. Era
que esta assembléa não faça cousa alguma, até que tal a abundancia que havia de páo-brasil, que
os seus inimigos consigão que ella se dissolva. (A' antigamente até delle se fazião as casas.
ordem, á ordem.) Ora, é desgraça que isto esteja tão
Eu não faço mais que dizer uma verdade abandonado, tanto na Parahyba como em
provada pela pratica; e se assim fallo é pelo desejo Pernambuco e Alagôas.
que tenho de que vá ávante este projecto, ao mesmo Onde existe ainda grande porção de páo-
tempo que julgo que á vista das emendas que já se brazil, é no Rio Grande, que se extinguirá do mesmo
apresentão na primeira discussão, e das que se modo, se não se tomarem providencias. Eis o estado
projectão para a segunda, isto se vai precipitando em do páo-brazil, esta é a causa porque pedi que se
um labyrintho de Creta. E' por isso da maior tomassem providencias.
necessidade que vá á commissão, para que tendo Eu deixo este negocio á consideração da
em vista as emendas apresentadas, algumas das assembléa, mas peço que, attendendo-se ao
quaes não deixão de ser judiciosas, redija o projecto proposto, se julgue urgente e digno de
do melhor modo possivel; aliás se isto não toma contemplação, para se mandar á commissão de
alguma fórma, o mesmo Sr. secretario não saberá o fazenda, para o redigir a um projecto que satisfaça
que ha de fazer com tantas emendas, nem ninguem quanto fôr possivel o fim a que nos propômos, e
se entenderá com ellas. Portanto, voto que vá á promova do melhor modo possivel o interesse e bem
commissão; e votarei sempre que passe porque é do estado.
indispensavel o estabelecimento de que trata. Temo, porém, que alguns Srs. deputados, que
quando se apresenta um projecto, logo se
186 Sessão em 28 de Agosto de 1823

levantão para o contrariar, e que apezar da incommodo? Não se apressaria a desfazer-se delle,
contemplação que lhes merece tudo quanto é a favor reduzindo a carvão todo quanto páo-Brazil ahi
da patria, estão sempre promptos a mostrar que não houvesse, para mais não ser inquietado na sua
ha urgencia, para que se não tire uma só pedra fazenda? Certamente que sim. Pois é justamente,
desse edificio gothico, desse simulacro de governo lhe respondi eu, o que ha de acontecer com todos os
que existia para bem de poucos e mal de muitos; proprietarios de terras.
cujos sequazes pescavão quanto querião, e repartião A arrematação do córte vai interessal-os,
com quem bem lhes parecia fazendo todos infallivelmente a todos, em deitar abaixo e reduzir a
desgraçados. carvão os mais ricos madeiros do páo-brazil, que por
Não será ainda tempo, depois de dous annos seculos têm occupado as suas respectivas terras, já
que os povos do Brasil esperão anciosos pelas que delles nenhum proveito tirão senão inquietação
reformas, de remediar tantos abusos e males? Não em seu domicilio: e como o podem fazer occulta e
será tempo ainda de tomar alguma medida, quando impunemente, em poucos annos viremos a ficar
por ella se vai fazer com que o estado tenha maiores privados de uma riqueza natural, de que o bom
meios de poder augmentar suas forças, de que tem senso e politica do governo deveria antes promover
necessidade, e até de promover a instituição da o augmento e regeneração.
universidade, de que estamos actualmente tratando? Por outra parte, dizia eu, que necessidade tem
Eu julgo, Sr. presidente, que é urgentissimo, e que o governo de tomar o córte por sua conta? Não é
deve cuidar-se deste negocio quanto antes, e assim melhor que deixe á industria e interesse dos
espero que o considere esta assembléa. particulares esse mister; e que só se contente com o
O SR. FRANÇA: – Voto contra a urgencia monopolio ou estanco da compra e venda do
deste projecto. O zelo do seu illustre autor pela vegetal, que é a unica operação productiva de
causa publica é assaz conhecido; mas todavia não interesse? Ha de o governo por contracto ou por
temos necessidade da lei, que no mesmo projecto se conta haver o córte a melhor mercado, do que se elle
nos apresenta, para remediarmos um mal que só se generalisára? Certamente que não. E por
resulta de um abuso, que á disposição do governo argumento computemos que, de trato successivo e
está o evitar, mudando o máo methodo com que até diario, andão muitos lenhadores e matteiros
agora se tem fornecido do córte do páo-brazil para occupados no córte de madeiros, em geral para
as especulações do seu monopolio, que constitue combustivel e construcção, tanto civil como naval; e
uma das rendas nacionaes. que se acaso se dividir o preço actual dessa madeira
Para isso é assaz e sobejo que se manifeste que cortão pelos quintaes que ella pesa, de certo
ao mesmo governo o vexame que soffrem os povos teremos em resultado, que o contractador do córte
neste ramo de administração, pelo modo com que do páo-brazil, qualquer que elle seja, não empreitará
está em pratica actualmente; e que um pouco mais a sua mão de obra por menos preço. Segue-se, pois,
de consideração com os mesmos povos ha muito que facilitando-se a todas as pessoas que se
teria feito cessar. applicão ao córte de madeiras o especial do páo-
Ha poucos annos que o ministerio do antigo brazil, se fará disso um ramo de industria, em que se
governo de que sahimos, pretendeu entender neste interessem os mesmos proprietarios das mattas pelo
mal; mas o remedio de que se lembrou não sei se lucro vantajoso que póde reportar de vender á
era peior que o mesmo mal, que vinha a ser: fazenda publica um madeiro que elles reputarão
rematar-se o córte deste rico vegetal a um só sujeito como patrimonio seu, e que terão interesse em não
que o fornecesse por preço certo de quintaes á decepar pelo tronco.
fazenda publica. Conclúo, portanto, que a attender-se á materia
Bom meio me parece este para de uma vez se do projecto, seja como indicação para se officiar ao
extinguir este manancial de riqueza que a terra governo sómente ao dito respeito, afim de evitar a
expontaneamente nos produz, e disso em poucas queixa dos povos.
palavras convenci eu a um conselheiro do conselho O SR. MUNIZ TAVARES: – Sr. presidente, eu
da fazenda, onde se o negocio fôra consultar. conheço quanto é necessaria esta indicação.
Perguntava-me este que pensava eu do E' innegavel que um dos mais ricos productos
expediente da arrematação do córte do páo-brazil, e do nosso sólo, qual é o páo-brazil, é
eu em resposta lhe tornei esta pergunta: – Se V. S. desgraçadamente o que mais se estraga. O viajante
tivera uma fazenda de lavoura, onde por ventura que passa pelas provincias que o produzem, admira-
houvesse esse vegetal, e visse alli entrar vinte ou se de vêr todos os dias os machados empregados
mais homens, armados de machados, a decepar-lhe em derrubar arvores tão preciosas.
os mattos della a titulo de o cortar, e extrahir, dar-se- Os proprietarios com quem tenho fallado longe
hia por contente? Não se indignaria contra a sorte, de se opporem á esta destruição, são os primeiros
que em suas terras fizera apparecer este principio do que concorrem para isso; porque, querem vêr-se
seu livres de um tal inimigo.
Sessão em 28 de Agosto de 1823 187

E' preciso pois, tomar medidas mui serias homem que não está sujeito a responsabilidade
para fazer cessar este mal, que em pouco tempo alguma.
fará com que não haja mais páo-brazil neste Disse mais o illustre deputado que podendo
imperio. os proprietarios embaraçar que se córte o páo nas
Portanto, voto que deve ir á commissão para suas terras e não lhe fazendo conta vendel-o pela
que examine o negocio e se decida se deve indicar- taxa, faltará no mercado e cahirá este ramo de
se ao governo que obre desta ou daquella maneira, riqueza publica.
porque acho ser materia da nossa competencia. Eu estou certo que isto nunca succederá;
O SR. HENRIQUES DE REZENDE: – Sr. uma vez que tenhão o direito de o vender á fazenda
presidente, julgo a materia em si mesma muito por um preço certo e razoavel, não hão de deixar de
urgente; mas creio que a indicação ou projecto, se aproveitar deste meio de adquirir; e assim lucrará
como lhe quizerem chamar, do Sr. Carneiro da a fazenda publica e tambem o proprietario...
Cunha, não só não consegue o fim proposto, mas Quando a fazenda precisar, por exemplo, de
até traz maior prejuizo. 200 quintaes diz aos proprietarios que os
E' certo que o proprietario vendo suas terras apromptem e haverão muitos que o quererão
e mattos invadidos por qualquer, procura vender, sem ser necessario forçal-os.
desembaraçar-se do páo-brazil destruindo-o, para O que é preciso é impedir o mal de poder um
evitar semelhantes invasões nas suas terras; e já homem entrar e destruir uma plantação para cortar
em muitas partes elle vai faltando, porque os páo; em se providenciando isto os mesmos
roçados do algodão vão derribando tudo. proprietarios hão de consentir que se vá cortar.
Vem pois o nobre autor da indicação a deixar Estou persuadido até que uma vez evitado aquelle
aos proprietarios das terras o direito de cortal-o e mal, não só se ha de mandar cortar pelo lucro que
vendel-o no lugar competente, para assim o se tira, mas que até se ha de plantar, porque na
interessar na conservação e propagação do páo- verdade póde dizer-se com razão que é a arvore
brazil. Mas isso nada aproveita, uma vez que se lhe das patacas do Brazil; mas continuando a pratica
impõe a taxa. antiga, não só se não aproveitaráõ seus donos, mas
O mal tem outra raiz que é o monopolio sobre até extinguiráõ o que considerão causa de muitos
a compra e venda do dito páo; emquanto elle não prejuizos... Não fallo nisto por interesse proprio, os
fôr abolido o mal é o mesmo, porque o preço não terrenos que possuo não têm páo-brazil, fallo
convirá nunca e o proprietario nenhum interesse porque desejo vêr promovido um importante ramo
terá em conservar o genero. de commercio que tanto póde augmentar as rendas
Cumpre pois abolir o monopolio; mas eu não da nação.
sei se neste sentido a indicação será urgente, por Julgando-se afinal discutida a materia e posta
isso que o páo-brazil tem um destino certo e uma á votação venceu-se que fosse remettida a
applicação marcada, que viria com isso a ter algum indicação ás commissões reunidas de minas e
transtorno. fazenda, para a redigir em projecto de lei, indicando
E' portanto a minha opinião, que se remetta á as providencias mais adaptadas.
commissão competente para propôr sobre isso as Como era chegada a hora da leitura dos
medidas que julgar justas, visto que a idéa proposta pareceres de commissões, leu o Sr. barão de Santo
pelo nobre deputado não remedêa nada, antes traz Amaro os quatro seguintes pareceres:
maior prejuizo; porque por um lado o proprietario
autorisado para o cortar não consentirá mais que Primeiro
alguem o córte; por outro lado não achando conta
no negocio assim taxado, deixa de cortal-o e vem a As commissões de constituição e estatistica
faltar no mercado proprio; porque os que morarem tomando em consideração a representação de
mais perto do mercado não serão tentados pelo Thomaz Antonio da Costa Alcamim Ferreira, em que
preço de duzentos réis a arroba por cada legua. pede a creação de uma nova provincia, da qual seja
Não sou tambem da opinião de que não é capital o arraial de Carinhanha, para commodidade
precisa medida legislativa; é precisa, porque todo dos povos que morão nas vizinhanças do Rio de S.
este negocio do páo-brazil anda regulado por leis. Francisco, desmembrando-se para ella porções das
O SR. CARNEIRO DA CUNHA: – Eu provincias da Bahia, Pernambuco e Minas-Geraes:
concordo que não preenche os fins em parte do que e outrosim as duas representações, uma da camara
disse o nobre preopinante mas não em toda a sua da Campanha da Princeza, pedindo que o seu
extenção. termo seja erigido em comarca, separando-se da de
Disse que não impedia o monopolio e que é S. João de El-Rei; e outra da camara da villa de
indispensavel cortar-se; assim é; mas impede o Santa Maria de Baependy, pedindo o mesmo com a
grande mal de ser tirado o páo-brazil por um clausula de ser a nova comarca composta do seu
termo, do da villa Precitada e do de S. Carlos de
Jacuhy: são de parecer que
188 Sessão em 28 de Agosto de 1823

semelhantes pretenções não podem ter lugar, organisação das secretarias de estado para então se
emquanto pela constituição não forem determinadas e deve reservar a decisão deste requerimento.
sanccionadas as divisões e subdivisões politicas do Paço da assembléa, 25 de Agosto de 1823. –
territorio do imperio. Martim Francisco Ribeiro de Andrada. – Barão de
Paço da assembléa, 26 de Agosto de 1823. – Santo Amaro. – Manoel Jacintho Nogueira da Gama. –
Manoel Jacintho Nogueira da Gama. – Martim José Arouche de Toledo Rendon. – José de Rezende
Francisco Ribeiro de Andrada. – Pedro de Araujo Lima. Costa.
– José Ricardo da Costa Aguiar de Andrada. – Barão Por haver quem fallasse contra elle, ficou
de Santo Amaro. – Francisco Muniz Tavares. – adiado.
Antonio Luiz Pereira da Cunha. – Manoel Ferreira da O Sr. Rodrigues Velloso, como relator da
Camara. commissão de legislação, leu tambem os seguintes
Foi approvado. pareceres:

Segundo Primeiro

A commissão de fazenda, tomando em A commissão de legislação tendo em vista o


consideração o requerimento do chefe de esquadra requerimento de João José Martins Pamplona, preso
Antonio Joaquim dos Reis Portugal, em que pede uma na fortaleza da Barra-Grande de Santos, em que
pensão de seiscentos mil réis, com sobrevivencia á supplica ser admittido a justificar-se para ser solto,
sua mulher e filha, em remuneração dos seus serviços declarando-se-lhe a culpa para entrar no livramento; e
abonados pelos documentos juntos: é de parecer, que combinando-o com a informação dada pelo ministro
o deferimento de semelhante pretenção não compete a secretario de estado dos negocios da justiça: é de
esta assembléa, por haver lei que regula a parecer que deve o supplicante esperar o resultado
recompensa de taes serviços prestados ao estado. das diligencias judiciaes, a que se tem mandado
Paço da assembléa, 25 de Agosto de 1823. – proceder por ordens repetidas ao juiz de fóra de
Barão de Santo Amaro. – Manoel Jacintho Nogueira da Santos, tendo sido a ultima de 18 de Julho proximo
Gama. – Martim Francisco Ribeiro de Andrada. – José passado, acompanhada de papeis necessarios para as
Arouche de Toledo Rendon. – José de Rezende Costa. ditas diligencias.
Foi approvado. Paço da assembléa, 28 de Agosto de 1823. –
Antonio Rodrigues Velloso de Oliveira. – Bernardo
Terceiro José da Gama. – João Antonio Rodrigues de Carvalho.
– José Teixeira da Fonseca Vasconcellos. – D. Nuno
A commissão de fazenda para interpôr o seu Eugenio de Locio. – Estevão Ribeiro de Rezende. –
parecer sobre a maneira de se pôr em execução o José Antonio da Silva Maia.
decreto de 16 de Abril de 1821, que deu nova reforma Por haver quem fallasse contra elle, ficou
á arrecadação dos dizimos; precisa que se exija da adiado.
repartição do thesouro publico todos os papeis que
puderem dar a illustração necessaria sobre este Segundo
negocio.
Paço da assembléa, 26 de Agosto de 1823. – A commissão de legislação tendo visto o
Barão de Santo Amaro. – José Arouche de Toledo requerimento de José Antonio Alves Rodrigues, que
Rendon. – Martim Francisco Ribeiro de Andrada. – recorre á esta augusta assembléa, por lhe ter sido
José de Rezende Costa. – Manoel Jacintho Nogueira indeferida por Sua Magestade Imperial a queixa que
da Gama. fez do juiz de fóra e camara da villa de Santo Antonio
Foi approvado. de Sá, procurando remedio ás violencias contra elle
praticadas: precisa que o governo remetta, para serem
Quarto presentes á mesma commissão, a queixa do
supplicante com as diligencias a que se procedeu e as
A commissão de fazenda examinando o mais informações que forem necessarias para melhor
requerimento dos officiaes das secretarias de estado intelligencia do negocio.
dos negocios do imperio e da justiça sobre as causas Paço da assembléa, 28 de Agosto de 1823. –
que têm occasionado a perda e grande diminuição dos Antonio Rodrigues Velloso de Oliveira. – Bernardo
seus emolumentos que fazião a principal parte da sua José da Gama. – D. Nuno Eugenio de Locio. – João
subsistencia, por isso que os seus ordenados são Antonio Rodrigues de Carvalho. – Estevão Ribeiro de
unicamente de 400$000: é de parecer: Rezende. – José Antonio da Silva Maia.
1º. Que os supplicantes estão em Foi approvado.
circumstancias de serem attendidos.
2º Que dependendo porém qualquer Terceiro
deliberação a este respeito das reformas e futura
A commissão de legislação vendo o
requerimento
Sessão em 28 de Agosto de 1823 189

dos moradores do termo da villa de Santo Antonio só para fazer uma pequena alteração. O rei de
de Sá, que requerem a extincção do contracto do Portugal por ser pai do Sr. D. Pedro I, não deixa de
vêr naquelle termo: é de parecer que devem os ser um rei estranho; e por isso entendo que não tem
supplicantes esperar pelas reformas geraes que hão lugar o chamar-se-lhe no contexto da lei o Sr. D.
de comprehender a economia das camaras; e João VI.
entretanto podem e devem recorrer aos meios O SR. COSTA AGUIAR: – Isto é contra a
legaes quando se verifiquem os vexames de que se ordem. A primeira cousa que nos deve occupar é
queixão praticados pelos rendeiros, ou seus jurados ver se está redigido na conformidade do que se
e mais officiaes. venceu; e depois se algum Sr. deputado tiver
Paço da assembléa, 26 de Agosto de 1823. – emenda a propôr póde propôl-a, mas por escripto,
Antonio Rodrigues Velloso de Oliveira. – José para ser apoiada; porém alterar o projecto por este
Teixeira da Fonseca Vasconcellos. – José Antonio modo não é permittido, por ser contra o que ordena
da Silva Maia. – D. Nuno Eugenio de Locio. – João o regimento.
Antonio Rodrigues de Carvalho. – Estevão Ribeiro O SR. MUNIZ TAVARES: – Parece-me
de Rezende. – Bernardo José da Gama. desnecessaria neste caso a formalidade de reduzir
Por haver quem fallasse contra elle, ficou a escripto esta pequena alteração: então nada se
adiado. poderá indicar sem ser por escripto, o que
Leu tambem uma requisição da mesma seguramente nos ha de fazer perder muito tempo.
commissão para se exigirem com urgencia do O SR. MONTESUMA: – Eu quero apoiar a
governo informações sobre o requerimento de emenda; mas sigo o que diz o Sr. Aguiar; venha por
Pantaleão Moreira Mosso, testamenteiro de Antonio escripto para a assembléa decidir.
Ignacio Brandão, a favor de tres escravos do O SR. ARAUJO LIMA: – Sr. presidente, nós
fallecido, para se supprir a nullidade que houvera no devemos seguir restrictamente o que nos manda o
testamento pela falta da assignatura de uma regimento: ora, se este diz expressamente que
testemunha. qualquer alteração que lembrar deve ser proposta
Decidiu-se que se pedissem. por escripto, como queremos ir nesta, contra o que
O Mesmo Sr. Deputado leu igualmente, por está estabelecido? Que importa que ella seja
parte da mesma commissão, o projecto já redigido pequena e que não influa na substancia da materia?
sobre a confirmação da legislação existente e O regimento não distingue; nós não podemos
concebido nos seguintes termos: distinguir; e assim se evitão muitas duvidas.
A assembléa geral constituinte e legislativa O SR. CARNEIRO DA CUNHA: – Eu mando
do imperio do Brazil, decreta: á mesa a minha emenda que é concebida nestes
Art. 1º As ordenações, leis, regimentos, termos:
alvarás, decretos e resoluções promulgadas pelos Em lugar de – o Sr. D. João VI – o rei de
reis de Portugal e pelas quaes o Brazil se Portugal. – Paço da assembléa, 28 de Agosto de
governava até o dia 25 de Abril de 1821, em que o 1823. – Carneiro da Cunha.
Sr. D. João VI rei de Portugal e Algarves se Foi apoiada.
ausentou desta côrte; e todas as que forão O SR. HENRIQUES DE REZENDE: – Sr.
promulgadas daquella data em diante pelo Sr. D. presidente, ainda que somos hoje uma nação nova,
Pedro de Alcantara como regente do Brazil, e estamos separados daquella a que já
emquanto reino e como imperador constitucional pertencemos, comtudo sempre nos devemos
delle, desde que se erigio em imperio, ficão em lembrar que uma nação nobre em todo o caso trata
inteiro vigor, na parte em que não tiverem sido com decencia os que por algum tempo a
revogadas, para por ellas se regularem os negocios governarão. Esta lei chama o Sr. D. João VI rei de
do interior deste imperio, emquanto se não Portugal a um que ainda vive, e que nos governou,
organisar um novo codigo, ou não forem embora o seu governo fosse melhor ou peior, e de
especialmente alteradas. cujas leis nos vamos agora autorisar; e eu não vejo
Art. 2º. Todos os decretos publicados pelas nesta expressão mais que uma demonstração de
côrtes de Portugal, que vão especificados na tabella respeito e acatamento por aquelle que actualmente
junta, ficão igualmente valiosos, emquanto não nos governa, e que delle é filho.
forem expressamente revogados. Isto é mera sombra que nada influe; porque
Paço da assembléa, 27 de Agosto de 1823. todos os brazileiros sabem que pela declaração da
Antonio Rodrigues Velloso de Oliveira. – Bernardo nossa independencia nada mais temos com
José da Gama. – José Teixeira da Fonseca Portugal nem com a dynastia de Bragança, porque
Vasconcellos. – José Antonio da Silva Maia. – João a nossa casa reinante começa com o actual
Antonio Rodrigues de Carvalho. – Estevão Ribeiro imperador, sem que aquella dynastia possa nunca
de Rezende. – D. Nuno Eugenio de Locio. aspirar ao throno deste imperio.
O SR. CARNEIRO DA CUNHA: – Peço a
palavra
190 Sessão em 28 de Agosto de 1823

Demais, senhores, esta lei foi discutida, e venceu-se Pamplona. Este negocio não póde soffrer demora
da fórma que se acha redigida, portanto não tem pela sua natureza, pois não conheço nenhum mais
lugar a emenda, e deve ficar a lei como se acha. importante que a liberdade do cidadão.
O SR. CARNEIRO DA CUNHA: – Embora Tendo-se feito algumas breves reflexões, o
sejão sombras, como diz o nobre deputado; eu mesmo Sr. deputado mandou á mesa a seguinte:
nunca por minha parte hei de consentir que elIas
fiquem. Sejamos coherentes, e mostremos nestas INDICAÇÃO
mesmas pequenas cousas, que nem esperanças
nem sombras, ha de se renovar a união. Proponho que os dous pareceres adiados
Sr. presidente! Nós não reconhecemos por sejão objecto da ordem do dia de amanhã, attenta
nosso monarcha senão o Sr. D. Pedro I, todos os sua antiguidade e materia. – O deputado
mais são estrangeiros para nós, e o rei de Portugal o Montesuma.
é tanto como qualquer outro soberano da Europa; O SR. FRANÇA: – Ao menos o do preso
portanto não deve haver distincção. Diz o illustre Pamplona acho que deve entrar na ordem do dia
preopinante que elle nos governou, e que até agora pela importancia da materia; não é justo que se deixe
revalidamos as suas leis. Não ha duvida, governou- de acudir a um cidadão opprimido e sem apoio.
nos, mas o que foi já não é. Tambem nós fomos O Sr. Presidente propoz á votação a
portuguezes, e hoje somos brazileiros; e o Brazil que indicação, e venceu-se que se desse para a ordem
foi parte da monarchia portugueza é hoje livre e do dia o parecer adiado sobre o preso Pamplona.
independente. Por não haver mais quem pedisse a palavra
Além disto, nós por ventura não tratamos para ler pareceres ou indicações, passou-se ao
assim os mais reis da Europa? Em que se lhe falta regimento da assembléa.
ao decoro quando se diz o rei de Portugal, ou S. M. Art. 154. As commissões nomearáõ para cada
Fidelissima? Não dizemos nós do mesmo modo S. negocio um secretario e um relator, o qual em acto
M. Catholica, ou Christianissima? Não posso vêr de assembléa exporá o parecer da commissão sem
nisto falta de decencia; e por isso entendo que que por isso fiquem os outros membros privados de
sómente do nosso imperador devemos dizer o Sr. D. poderem fallar sobre este objecto.
Pedro, e de mais ninguem. Foi approvado.
O Sr. Rodrigues de Carvalho pedio então a Art. 155. As alterações lembradas pelas
palavra e offereceu a seguinte alteração: commissões seguiráõ o mesmo processo que as
Proponho que se emende na fórma seguinte: – outras (art. 158 e seguintes).
Por S. M. Fidelissima actual rei de Portugal e Foi approvado.
Algarves. – O deputado Rodrigues de Carvalho. Art. 156. Qualquer deputado que não fôr
Foi approvada. membro de commissão, póde mandar-lhe os
O SR. VERGUEIRO: – Sr. presidente, o que apontamentos ou memorias que julgar convenientes
me parece é que este projecto não está ainda nos aos negocios que nellas se tratem.
termos de ser sanccionado, porque falta a tabella Foi approvado.
das leis que se ha de imprimir, para se examinar Art. 157. Feita a installação com a presença do
quaes são as que devem ter execução entre nós; e imperador, é o primeiro trabalho a moção de graças
por isso proponho que se reserve o sanccional-o e sua discussão, cujo resultado será apresentado por
para quando se approvar a dita tabella. uma deputação a S. M. Imperial.
O Sr. Presidente julgando discutida a materia O Sr. Montesuma pedio a palavra e mandou á
propoz a emenda do Sr. Rodrigues de Carvalho. – mesa a emenda seguinte:
Foi apoiada. Proponho a suppressão das palavras – e sua
Perguntou depois se na conformidade do que discussão. – O deputado Montesuma.
propuzera o Sr. Vergueiro, se reservava a decisão Não foi apoiada.
final para depois da approvação da tabella das leis. – O SR. MUNIZ TAVARES: – Pela fórma que o
Decidio-se que sim. artigo está concebido parece concluir-se que se o
O SR. MONTESUMA: – Como estamos na imperador não vier á assembléa não tem lugar o voto
hora das indicações requeiro que se me mande dar de graças; mas como talvez não seja esta a
papel para fazer uma indicação. Eu quizera que se intelligencia que lhe dão os illustres autores do
dessem para ordem do dia de amanhã os dous projecto, bom seria explicar-se isto, porque me não
pareceres adiados, e muito principalmente o que parece muito claro.
trata do requerimento do preso O SR. PEREIRA DA CUNHA: – (Não se
ouvio.)
O SR. FRANÇA: – Póde V. Ex. propôr á
assembléa se ha de haver voto de graças quer o
imperador venha, quer não venha ao congresso.
Sessão em 29 de Agosto de 1823 191

Fez-se a proposta, e decidio-se que houvesse O SR. CARNEIRO DA CUNHA: – Este


em qualquer dos casos o voto de graças, e passou negocio é da competencia do governo; nem precisa
assim o artigo, salva a redacção. ir a commissão alguma para dar parecer sobre elle,
O Sr. Presidente assignou para a ordem do pois é da maior necessidade que se retirem estas
dia: tropas o mais depressa que fôr possivel, e é o
1º. O parecer adiado sobre o preso Pamplona. governo quem o deve fazer; quanto mais tempo se
2º. A eleição da commissão de minas e bosques. 3º. demorarem mais gasto estão fazendo á nação.
O projecto de lei sobre a fórma de passar cartas aos Portanto retirem-se já; vão para a sua patria, nós não
alumnos da academia medico-cirurgica. precisamos cá de homens que estiverão com as
Levantou-se a sessão ás 2 horas da tarde. – armas na mão contra nós, nem podemos viver com
Manoel José de Souza França, secretario. elles.
O SR. MUNIZ TAVARES: – Pois eu julgo que
SESSÃO EM 29 DE AGOSTO DE 1823. deve ir á commissão para examinar se este negocio
pertence á assembléa ou ao governo; o que me
PRESlDENCIA DO SR. BISPO CAPELLÃO-MÓR. parece é que deve dar o seu voto com muita
urgencia porque na verdade esta tropa esta fazendo
Reunidos os Srs. deputados pelas 10 horas da despezas que cumpre sem demora evitar.
manhã, fez-se a chamada e acharão-se presentes O SR. NOGUEIRA DA GAMA: – Se parecer
69, faltando com causa os Srs. Andrada Machado, urgente á assembléa a decisão deste negocio, e
Gomide, Rocha Franco, Gondim, Andrada e Silva, assentar que deve ir ás commissões de guerra e
Ferreira Nobre, Ribeiro de Andrada, Rodrigues da fazenda, como me parece, podem os membros
Costa e Araujo Lima. destas commissões retirar-se para darem hoje
O Sr. Presidente declarou aberta a sessão e mesmo o seu parecer.
lida a acta da antecedente foi approvada. Depois de algumas reflexões decidio-se que
O Sr. Secretario Costa Aguiar deu conta de fosse remettido com urgencia as commissões de
duas felicitações dirigidas á assembléa, uma pela fazenda e guerra.
villa de Guaranhus, e outra da camara da cidade da O Mesmo Sr. Deputado leu tambem o seguinte
Fortaleza da provincia do Ceará. – Forão ambas officio do ministro de estado dos negocios do
recebidas com particular agrado. imperio:
Deu tambem conta de outra do cidadão Illm. e Exm. Sr. – Tendo S. M. o Imperador
Francisco Manoel Martins Ramos com a qual determinado por portaria de 16 do corrente mez que
offerecia 60 exemplares do manifesto publicado em o intendente geral da policia procedesse ás
sua propria justificação. – Foi recebida a felicitação necessarias averiguações, afim de se conhecer se
com agrado, e se mandarão distribuir os exemplares José Fernandes Barbosa, que ora se acha na cidade
do manifesto. do Porto, é, ou não, suspeito á causa do Brazil, e
Leu depois o seguinte officio do ministro de que informasse do seu resultado, para que a
estado dos negocios da guerra: assembléa geral constituinte e legislativa pudesse
Illm. e Exm. Sr. – Sendo presente a. S. M. o deliberar com justiça sobre a prorogação, que elle
Imperador, que nas provincias da Bahia e pedio de mais seis mezes, além do prazo
Pernambuco se achão mais de 1,500 homens das estabelecido na proclamação de 8 de Janeiro deste
tropas luzitanas, além de mais de 100 mulheres e anno, por não lhe ser possiveI regressar para o
crianças, sómente em Pernambuco, aprisionados Brazil dentro do mencionado prazo; como V. Ex. me
pela nossa esquadra; e representando os governos participou no seu officio de 12 do corrente; de ordem
daquellas provincias sobre o destino que lhes de Sua Magestade Imperial remetto á V. Ex. a
deveráõ dar; manda-me o mesmo augusto senhor, inclusa informação do intendente geral da policia
que eu me dirija a V. Ex., para que faça chegar este sobre aquelle objecto, e o summario de
objecto ao conhecimento da assembléa geral testemunhas, que a acompanha, para que sendo
constituinte e legislativa do imperio do Brazil afim de presentes na mesma augusta assembléa, possa esta
que, julgando-o proprio de suas deliberações, as deliberar o que fôr conveniente.
mande communicar ao governo, o qual não julga Deus guarde a V. Ex. Paço, em 27 de Agosto
conveniente tomar sobre sua responsabilidade, nem de 1823. – José Joaquim Carneiro de Campos. – Sr.
a grande despeza exigida para o regresso daquella José Ricardo da Costa Aguiar de Andrada.
tropa, nem os inconvenientes que possão acontecer Foi remettido á commissão de constituição.
com a sua conservação dentro do imperio. Passou-se á ordem do dia, e entrou em
Deus guarde a V. Ex. Paço, em 29 de Agosto discussão o parecer da commissão de legislação
de 1823. – João Vieira de Carvalho. – Sr. José sobre o requerimento de João José Martins
Ricardo da Costa Aguiar. Pamplona, que ficára adiado na sessão antecedente.
192 Sessão em 29 de Agosto de 1823

O SR. MONTESUMA: – Eu já tinha pedido uma emenda que me parece fundada em justiça, e
hontem a palavra para fallar contra este parecer, que que é concebida nos termos seguintes:
versa sobre o requerimento desse miseravel que jaz
ha 8 mezes preso sem culpa formada. Parece-me EMENDA
que a commissão deveria tratar desta demora, e
todavia nem uma só palavra diz a este respeito. Proponho que se diga ao governo que faça
Desde Dezembro do anno passado até 28 de punir exempIarmente as autoridades que, violando
Abril nada se fez, porque só no dia 29 é que os as leis, têm feito o supplicante soffrer tão longa
papeis chegarão á secretaria da justiça, demorados prisão; e ao mesmo tempo determine que o réo seja
até alli na dos negocios do imperio, e tendo o remettido para esta côrte, esteja ou não terminado o
ministerio da justiça notado falta de papeis entre os processo; e neste ultimo caso terá esta côrte por
que se lhe remetterão pedio-os, e forão-lhe enviados homenagem até ultima decisão judicial. – O
da repartição da fazenda no dia 2 de Junho, deputado Montesuma.
expedindo-se a 10 as ordens precisas ao juiz de fóra Foi apoiada.
de Santos, que forão repetidas a 18 do mez O SR. CARVALHO E MELLO: – O parecer da
passado, sem que o tal juiz de fóra tenha feito cousa commissão de legislação é conforme ás regras da
alguma, desde 10 de Junho até hoje. justiça. O requerimento do preso, que se acha em
Eu quizera, Sr. presidente, conhecer a razão Santos contém a queixa da prisão sem elle ter
de tanta demora; porque ha de este miseravel soffrer delicto, e sem culpa formada, e da demora que tem
tantos mezes de prisão sem saber por que? havido em ter sido julgado.
Eu não entro na indagação se elle é ou não E’ principio innegavel, e seguido por todas as
criminoso, fallo sómente do modo com que se nações civilisadas, que ninguem deve ser preso
procede com este homem em menoscabo das leis de antes de culpa formada, salvo em flagrante, e em
que elle espera protecção; e julgo que a commissão certos delictos mais graves, immediatamente
não devia passar isto em silencio, antes sobre esta offensivos da segurança publica. E' elle desde o
parte do requerimento eu quizera que tivesse berço da monarchia portugueza estabelecido nos
declarado que o governo devia castigar quem tivesse diversos codigos della.
feito soffrer a esse desgraçado tanta injustiça. Nas mesmas côrtes de Portugal se
Para que os direitos do cidadão sejão estabeleceu como regra, reservando-se para
respeitados é que nós aqui estamos, pois do gozo declarar, como depois o fizerão, quaes erão os casos
delles depende a segurança e felicidade nacional. em que podia ter lugar a prisão antes de culpa
Vejo pelo requerimento do preso que dirigindo formada. No principio houve diversa legislação, não
suas supplicas ao governo teve por despacho que se estendendo a mais do que aos crimes cuja pena
esperasse pela decisão da justiça; é verdade que o era a de dez annos de degredo para a Africa,
poder executivo nada podia dizer sem o julgado do segundo o decretado na reformação da justiça, e
poder judiciario; mas isto não destróe a negligencia depois se chegou por um alvará de 1758 aos da
manifesta com que se tem procedido neste negocio; pena de 8 annos do referido degredo.
e é justo que a nação conheça que a assembléa não O motivo foi a necessidade de não ficarem
é indifferente a isto, porque está constituida garante impunes delictos de maior gravidade, fugindo os réos
da liberdade individual. antes da culpa formada; e regulando-se os
Accrescento ainda que não devemos ser legisladores pela segurança pessoal do cidadão; e
menos generosos do que as côrtes de Lisbôa; e bem pela necessidade e utilidade publica de não ficarem
se sabe o que praticárão com o brigadeiro Manoel impunes os crimes, estabelecerão estas regras que
Pedro. na verdade se entenderão a mais do que cumpria.
Eu não conheço Pamplona, nem sei quem é; é Mas não póde dizer-se absolutamente, que
europêo, mas isto não me importa; é um desgraçado houvesse descuido de estabelecer as garantias
que está preso ha 8 mezes sem saber a causa da necessarias á liberdade individual do cidadão.
sua prisão; e ao homem opprimido, seja quem fôr, Havião as cartas de seguro, monumento precioso da
sempre defenderei com todas as minhas forças. Ora, antiguidade, para se livrarem seguros em certos
isto mesmo queria eu que fizesse a commissão, crimes os réos que escapavão á prisão decretada
porque sem responsabilidade dos empregados pela pronuncia, e havião ainda para os já presos os
publicos não póde haver liberdade; mas como ella o alvarás de fiança.
não fez quero eu fazel-o, e por isso farei ao parecer Contra esta primordial regra não se póde dizer
ter sido preso o queixoso; porque se não sabe ainda,
se o crime de que o arguirão era ou não
comprehendido naquelles em que a prisão é
determinada antes de culpa, pela sua gravidade; e
quanto a não estar já formada, e até já sentenciado,
posto que appareça á primeira vista a irregularidade
de injustiça, todavia
Sessão em 29 de Agosto de 1823 193

á vista das circumstancias do caso, nem se póde recurso de exigir indemnisação dos damnos e injuria
affirmal-o, nem já arguir ou castigar o juiz de fóra de do juiz que tão criminosamente o conservou prezo e
Santos pelo ter retido sem culpa formada, nem lhe demorou o processo. Os criminalistas mais
havel-o julgado. philosophos, que disputarão sobre o modo de
Eu posso, Sr. presidente, dizer o que ha reparar os damnos do que foi vexado pelo poder
acontecido nesta materia, por terem vindo á minha judiciario, não descobrirão outro senão o da
mão estes papeis, na qualidade de juiz da alfandega. indemnisação á custa do infractor, e toda e qualquer
A embarcação em que vinha este queixoso, foi restituição da honra offendida.
apprehendida por se dizer que levava mantimentos Esta é a base da responsabilidade dos juizes;
aos nossos inimigos existentes na Bahia; e chegada e se entre nós não está ainda decretada a fórma de
a Santos foi, como devia, demorada e se acharão se fazer effectiva, como se fez em Lisboa por um
nella documentos e papeis, que arguião este alvará muito circumstanciado, se entre nós ainda não
queixoso de principios sinistros á nossa justa causa. ha esta legislação, ha comtudo as acções ordinarias,
Nestas extraordinarias circumstancias, o juiz pelas quaes é licito a qualquer offendido intentar em
deu logo parte, remetteu os papeis e pedio juizo o que a este respeito lhe convier.
instrucções para se haver naquelle caso, sobre que Muitas vezes mesmo nas sentenças se
não tinha regras geraes ou instrucções particulares; decretão penas aos juizes, como é determinado por
costumão assim haver-se os prudentes magistrados, leis; e portanto é o quanto nesta materia póde ser
que não querem errar. deferido á supplica que neste augusto recinto
Vierão estes papeis á secretaria da fazenda apresentou o prezo.
pela qual se me ordenou que mandasse fazer Eu não me atrevo a dizer que elle seja
sequestro á embarcação remettida a este porto; e remettido á esta côrte. O juiz que lhe formou a culpa
feita por mim esta diligencia, constou-me depois que tem a obrigação de o remetter com ella, se o achar
se mandou remetter á secretaria da justiça os comprehendido em alguns dos delictos em que
referidos papeis, pela qual se deveria expedir as expressamente se determina que o remettão com as
competentes ordens. devassas ás cadêas das relações dos districtos.
Sei que alguma demora houve nestas Não sabemos em que classe de crimes se
expedições; mas de força haveria demoras, por acha indiciado este homem; nem elle pede ser
causa destes passos, pelos vagares com que se transferido, e não devemos alterar a lei que ordena
remettem de uma a outras secretarias, e pelas que todos sejão julgados no fôro do delicto, salvos os
viagens do mar. Consta-nos que afinal se mandou exceptuados. Restringindo-me pois ao necessario
julgar este homem, formando-se processo com os deferimento desta supplica, acho mui conforme á
documentos que havia, e é natural que a esta hora razão e á justiça o parecer da commissão,
esteja este negocio concluido e acabado pelos meios accrescentando sómente que se recommende ao
ordinarios. governo, que vigie sobre as autoridades para que se
Será portanto desnecessaria qualquer outra não desvairem dos seus deveres, e para que
providencia, que seria extemporanea, e talvez mal respondão pelas infracções que fizerem á liberdade
apropriada. Eu não duvido que afinal possa ser individual, e aos mais direitos dos cidadãos.
julgado livre e absoluto este réo, e até que fosse O SR. VERGUEIRO: – Tambem sou de
injustamente prezo: mas é isto uma desgraça filha parecer que se deve recommendar ao governo que
dos tempos, e das extraordinarias circumstancias em faça verificar a responsabilidade da autoridade que é
que nos achamos; não póde porém isto ser culpada nesta prisão arbitraria que está soffrendo
verificado sem que por legal sentença se decida esta este homem sem se lhe formar processo. Os
materia. magistrados fazem quanto lhes parecem e os
Por outra maneira seria o juizo precipitado e tribunaes supremos não os castigão; na minha
muito mais se já pretendessemos castigar a provincia são muitas as victimas das arbitrariedades
autoridade que foi causa pelo menos da demora e da dos magistrados, feito sem que os tribunaes os
falta da formação de culpa. Sabemos nós já corrijão.
cabalmente, que esta autoridade se houve Ha pouco eu tive na mão o processo de um
criminosamente e pelo menos com descuido e homem, feito sem as precisas formalidades, e com a
desleixo? Temos já certeza legal de que é este pronuncia mais espantosa que tenho visto; e todavia
homem absolvido? Não poderá ter sido arguido e até o tribunal da supplicação contentou-se de declarar
convencido de crime de alta monta, de que que estava mal pronunciado; eis-aqui a vigilancia dos
apparecião vislumbres nas cartas e papeis? Não o tribunaes na correcção dos magistrados, quando tão
podemos affirmar por certo. necessario é fazel-os entrar nos seus deveres. Sr.
Que resta, pois? Esperar a decisão do presidente, se nós não exigirmos a responsabilidade
processo que já foi ordenado, como consta da
informação do ministro da justiça, e no caso de
verificar-se a culpa das autoridades que offenderão a
lei, tem o mesmo denominado réo o
194 Sessão em 29 de Agosto de 1823

dos magistrados, não temos nada feito (apoiado, os verdadeiros termos dellas; tem-se fallado nesta
apoiado), e podemos contar com o despotismo do em responsabilidade, mas não se tem marcado
poder judiciario que é talvez o peior. quem póde ser responsavel no negocio de que se
É necessario excitar a attenção do governo trata.
sobre esta materia para que se emendem esses Na minha opinião o juiz de fóra de Santos tem
continuos abuzos, e se exija a observancia da lei, tanta culpa nisto como eu, porque o caso é este. O
ficando por ella responsavel o magistrado. (Não se navio veio a Pernambuco, e indagando fóra o que
ouvio o resto.) havia na cidade reconheceu que não lhe convinha
O Mesmo Sr. Deputado mandou á mesa a entrar, e dirigio-se a Santos; chegando alli participou-
seguinte: se isto ao governador e este vendo que o navio
trazia bandeira portugueza julgou que o devia
EMENDA apresar; e assim o fez prendendo tambem este
homem; os papeis que se achárão vierão remettidos
Que se recommende ao governo que faça á secretaria de estado dos negocios do imperio, e ahi
verificar a responsabilidade das autoridades estiverão demorados até que forão para a da justiça;
judiciarias, ou de quaesquer outras, pela prisão ora, em nada disto vejo comprehendido o juiz de
arbitraria ou retenção arbitraria, no caso de se fóra... O primeiro passo dado pelo governador de
verificar. – Vergueiro. Santos tambem me não parece injusto; vio uma
O SR. HENRIQUES DE REZENDE: – Sr. embarcação com bandeira portugueza, e trazendo a
presidente, muitas vezes me tenho visto embaraçado seu bordo um sobrinho do ministro de estado, sem
sem saber como hei de dar o meu voto. Porque, saber ao que vinha, entendeu que devia lançar mão
apenas apparece aqui um homem carregado de de tudo, e pegou nos papeis e remetteu-os para a
oppressões e de injustiças, procurando nesta secretaria de estado. Portanto se ha falta é do
assembléa o remedio a seus males, logo atraz se ministro de estado que demorou os papeis.
apressa a velha chicana com taes subterfugios, que Tambem ouço fallar em se fazer effectiva a
eu me não sei deliberar, e o infeliz em risco de ficar responsabilidade, mas eu não vejo onde está a lei
sem recurso. que a marca... (No resto não se entendeu o
Eu desejo sempre dar o meu voto em regra, tachygrapho Victorino.)
mas como não entendo de jurisprudencia, fico O SR. VERGUEIRO: – Eu não quizera que na
embaraçado. Aqui já appareceu um caso identico, assembléa passasse o principio de que por não
uns poucos de officiaes apprehendidos na colonia do haver lei que marque e faça effectiva a
Sacramento estavão, havia muitos mezes, prezos responsabilidade, ninguem é responsavel pelo mal
sem serem julgados, requererão á assembléa, e ella que faz; se não ha ainda lei expressa sobre isto,
determinou que fossem elles sentenciados segundo temos os principios geraes de justiça e utilidade que
os papeis existentes. supprem bem aquella falta, para que não aconteça
O presente caso é tal qual: por isso a minha que as autoridades fação todo o mal que quizerem
opinião é que se diga ao governo que a exemplo sem temor de responsabilidade; um semelhante
daquelles, mande sentenciar este réo segundo os principio não convém que passe neste congresso, e
papeis existentes. Quanto ás autoridade eu estou sempre me opporei a elle.
convencido que ellas são como as parreiras, que se O SR. SILVA LISBOA: – Sr. presidente, voto
não são podadas, não produzem nada. pelo parecer da commissão, e não posso assentir ás
E' necessario fazer nestes senhores um emendas propostas por alguns Srs. deputados, ainda
exemplo, do contrario nunca deixaráõ os seus máos menos pelas razões do Sr. Montesuma, o qual muito
habitos. Parecendo-me fundado em justiça o que se fundou, em que esta augusta assembléa não
acabo de expôr, eu mando á mesa a seguinte: devia mostrar menos humanidade e generosidade
que as côrtes de Lisboa, que tiverão pouco tempo
EMENDA prezo ao brigadeiro Manoel Pedro, remettido por
Madeira, e lhe mandarão dar passaporte para esta
Diga-se ao governo que mande sentenciar côrte, não obstante ter estado á frente das tropas
este réo segundo os papeis existentes, e com patrioticas da Bahia; e que as mesmas côrtes
urgencia, assim como se praticou com os militares praticarão iguaes liberalidades com outros prezos.
presos na colonia do Sacramento. E entretanto faça Sr. presidente, tenho coração de carne e
punir ás autoridades que se acharem sangue para compaixão dos infelizes. Mas quanto se
comprehendidas nessa detenção arbitraria. – disse sobre a justiça de achar cada prezo pelas
Henriques de Rezende. autoridades subalternas e superiores, prompto
Foi apoiada. remedio e desaggravo, e de razão nos tempos e
O SR. RODRIGUES DE CARVALHO: – Como casos ordinarios. Tudo vai bem
membro da commissão quero dizer alguma cousa
sobre a materia. A maior parte das questões
embaração-se por se não conhecerem
Sessão em 29 de Agosto de 1823 195

quando o navio forte navega com vento largo, e mar que se lhe contrastem exemplos das côrtes de
de bonança. Portugal.
Mas, em convulsões de estado, em que periga O SR. CARNEIRO DA CUNHA: – Sr.
a vida e liberdade de todos, a segurança publica presidente, eu não digo que seja culpado neste caso
necessita excepções, e reclama maiores cautelas, o juiz de fóra, nem quero apontar ninguem como tal;
ainda que se arrisque o innocente a ser victima de mas no que não posso convir é em não se fazer
graves suspeitas. O juiz de fóra de Santos vio-se effectiva a responsabilidade por não haver regra que
perplexo; e isto mesmo aconteceria a jurisconsulto a marque.
que tivesse cem leguas de direito, com a vinda de Por este principio nenhuma autoridade poderá
um passageiro, sobrinho de Pamplona, figurão nas ser criminada, e todas continuaráõ na sua marcha
côrtes, em uma embarcação, que tocou á antiga fazendo quantas injustiças lhe parecerem;
Pernambuco, o fóco do jacobinismo, e surgio em quando nada me parece mais justo nem mais santo
Santos, onde a nova ordem de cousas havia do que applicar remedio a tão graves males. Ha de
começado com a matança de cidadãos. saber-se, senhores, que um ministro não cumpre a
Póde-se bem dizer, como na comedia de lei, que vende a justiça, que absolve uns por dinheiro
Goldoni, – que foi tal homem buscar á bordo do e crimina outros por inimisades, e não se lhe ha de
chavéco? Elle ainda agora na sua petição, tão dar remedio? Não posso conformar-me.
succinta, e de suspeito laconismo, não diz ao que foi, Tambem é para mim maravilhoso o que ouvi
como era natural, nem a quem era dirigido, como ao honrado membro que fallou contra os que
todos praticão. advogarão a causa desse preso, advogando ao
O juiz deu parte ao ministro dos negocios do mesmo tempo a da justiça e da humanidade; nem
imperio, o qual, supposto ora esteja fóra da posso conciliar o que já tem dito dos portuguezes
administração, incontestavelmente se mostrou no com a opinião que hoje enuncia. Umas vezes os
seu ministerio ter promovido com ardor a causa do defende attribuindo o que obrarão na causa do Brazil
Brazil. No publico a idéa corrente foi, que o forasteiro ao seu exaltado patriotismo, e lembrando em abono
era espião, que talvez fosse explorar o disto o que se conta dos judeus de Hollanda que
desguarnecido da terra, para se effectuar de mandão vir terra de Portugal para se enterrarem com
improviso algum golpe de mão de invasores sobre S. ella por serem oriundos daquelle reino, outras vezes
Paulo. Era necessario tempo para averiguações: só nos falla em perigos de que se arrecêa por ser
distancias, e occupações do ministro verosimilmente este homem portuguez, desculpando assim o que se
retardarão a defeza e sentença do prezo. tem obrado contra elle.
Como pois será justo o rigor contra as Sr. presidente, embora seja portuguez, ou seja
autoridades que intervierão em negocio tão mouro, seja quem quer que fôr, dirigindo-se a nós
melindroso? Por este expediente o imperio ficará deve ser attendida a sua queixa, e é da nossa
sem zelosos fiscaes; os juizes soltaráõ réos de obrigação fazer que se observe com elle o que a
estado, só por falta de cumprida prova; e entretanto justiça manda. Igualmente não posso deixar sem
todas as classes ficaráõ á mercê dos inimigos, que resposta o que disse de Pernambuco tratando
farão tramas os mais insidiosos e occultos, que se aquella provincia de fóco do jacobinismo.
não poderáõ provar no tempo e modo das leis, que Se em 1817 os pernambucanos, essa porção
forão feitas para o curso ordinario da justiça. briosa do Brazil, levantou o grito da liberdade, foi
Não se attribua á generosidade e humanidade porque esse rei de Portugal, tinha aberrado dos seus
das côrtes a soltura do brigadeiro Manoel Pedro, deveres, e abandonado os principios com que os
mas sim á evidencia da devassa, que da Bahia lhes seus primeiros predecessores sabião dirigir os
foi remettida pelo governo provisorio, e onde se portuguezes, e que estreitavão a união de subditos
demonstrou, que Madeira fôra o agressor no ataque com o monarcha, e em taes circumstancias os povos
das tropas. tinhão o direito de reassumir seus poderes
As côrtes com machiavellica politica affectarão delegados. Se a empreza foi desgraçada, todos
justiça para com o dito brigadeiro, e outros prezos: sabem que se deve procurar a causa desse máo
ellas até levantarião altares á quem não exito na falta de unidade, que não podia ainda existir
correspondeu á popularidade, não fazendo por não estar generalisada a opinião que hoje reina.
resistencia ao invasor; o que occasionou apoderar-se Não posso pois consentir que por um tal facto
Madeira do commando das armas, e entrar na posse se vitupere um povo generoso, amante por extremo
do trem de artilharia de excellentes parques, e da sua liberdade, e que em todos os tempos se tem
muitas mil espingardas, da casa da polvora, e das distinguido, ou pelejando nas terras da sua propria
fortalezas da cidade; do que resultarão tantas provincia, ou nas de outras provincias do imperio. Se
miserias. O governo imperial tem manifestado aos tem vacillado ás vezes sobre a sinceridade de
seus inimigos grandes generosidades e não carece algumas medidas,
de
196 Sessão em 29 de Agosto de 1823

talvez tenhão dado causa a isto diversos escriptos que não era inconsequente, aqui só direi: não póde
que têm apparecido, entre eIIes a reclamação n. 14 qualquer emendar o passado erro com o seu
do nobre preopinante. posterior acerto? – Esta falla foi interrompida por
O SR. HENRIQUES DE REZENDE: – Se eu simultaneas vozes de varios deputados, ao que o Sr.
entendesse que o nobre deputado, que precedeu ao Silva Lisboa disse. – Tenho peito triplicado para
que acaba de fallar, dizia o que disse do seu proprio resistir á rapaziada. (A’ ordem á ordem, bradou o Sr.
coração, eu não deixaria de responder porque era presidente, e alguns deputados). – Já me caIlo,
então do meu dever resalvar a honra da minha tendo muito a dizer.
provincia e dos meus constituintes, mas eu entendo O SR. MONTESUMA: – (Não se entendeu o
que elle alludio á opinião que os portuguezes tachygrapho Possidonio.)
formavão da minha provincia, que foi a primeira que Julgou-se a materia discutida, e propoz o Sr.
attrahio o seu odio, e que portanto o nobre deputado presidente:
só referio os ditos de outros, por isso deixei passar, Se o parecer da commissão se approvava. –
aliás teria faltado á minha honra e ao meu dever. Não foi approvado.
Neste sentido julgo ter desaffrontado o Passou-se então á emenda do Sr.
discurso do nobre deputado da intelligencia que lhe Montesuma, e propondo a 1ª parte até ás palavras –
deu o Sr. Carneiro da Cunha. Eu entendi outra tão longa prisão, – não foi approvada. Propoz a 2ª
cousa: um de nós está enganado. até ás palavras – terminado o processo, – e foi
(Fallarão também os Srs. Alencar e approvada. Propoz-se finalmente a 3ª, e foi
Montesuma, mas não se entendeu o tachygrapho igualmente approvada.
Possidonio.) Passou-se depois á emenda do Sr. Vergueiro,
O SR. SILVA LISBOA: – Os diques da e julgando-se que não estava prejudicada pela do Sr.
eloquencia do Sr. Montesuma transbordarão, e não Montesuma, foi posta á votação e approvada em
acho outro remedio que deixar passar a torrente, todas as suas partes.
abaixando a cabeça. Quanto ao que notarão outros Propoz-se finalmente a emenda do Sr.
Srs. deputados contra mim, só replico, que nada Henriques de Rezende dividida em duas partes. A 1ª
disse contra as pessoas de honra de Pernambuco; até as palavras – colonia do Sacramento, – foi
sempre confessarei os heroicos feitos dos regeitada, a 2ª julgou-se prejudicada pela do Sr.
pernambucanos na historia do Brazil, quando Vergueiro.
ostentarão lealdade a seu principe natural, e valentia Seguio-se a 2ª parte da ordem do dia, isto é, a
em exterminar invasores. nomeação dos membros da commissão de minas e
Porém disse de transena, que o parente de bosques.
Pamplona tinha, sem saber-se pelo que, tocado á O Sr. Gouvêa requereu que se declarasse se
Pernambuco, fóco do jacobinismo, o que digo é para esta commissão se dispensava que se votasse
infelizmente verdade pelos recentes factos notorios; nos membros da commissão de constituição.
e bastaria para o provar a revolução de 1817, onde O Sr. Presidente propoz á assembléa. –
tanta gente se complicou com o fallido caixeiro Venceu-se que sim.
Martins, que se fez acclamar principe da liberdade, o Perguntou depois de quantos membros
que, perdôe-se-me dizer, foi borrão na provincia. (O constaria a commissão, resolveu-se que fosse de
orador foi chamado á ordem pelo Sr. presidente e cinco.
alguns deputados.) Estou na ordem, Sr. presidente. Procedeu-se á votação, e sahirão eleitos os
A proposta ordem do dia foi, se se devia approvar o Srs. Andrada e Silva com 61 votos. – Camara com
parecer da commissão á respeito do preso em 61. – Ribeiro de Andrada com 44. – Silveira
Santos: eu votei que sim, e impugnei as razões da Mendonça com 32. – Ferreira França com 24.
contraria opinião do Sr. Montesuma, e entre as O Sr. Costa Barros pedio a palavra para ler em
razões que me parecerão escusar a arguida demora nome das commissões reunidas de guerra e fazenda
da prizão, foi a grave suspeita, que resultava da o parecer que nesta mesma sessão se exigira com
arribada embarcação, em que veio o dito passageiro urgencia.
á Pernambuco, então agitado de partidos, que
manifestavão idéas jacobinicas, e dissidencia da PARECER
unidade central do governo imperial.
Quanto á arguição que um dos Srs. deputados As commissões de guerra e de fazenda
me fez de ser inconsequente nos meus escriptos, tomando em consideração o officio do ministro e
basta replicar-lhes, que, até em volumes in folio se secretario de estado dos negocios da guerra sobre o
têm feito concordatas da Biblia, e – concordia destino que se deverá dar ás tropas lusitanas que se
discordantium canonum. Foi notado á Fox o gastar a achão apresadas nas provincias da Bahia e de
metade de suas fallas em convencer Pernambuco são de parecer, que não sendo
praticavel a regra geral do direito das gentes a
respeito dos prisioneiros de guerra
Sessão em 29 de Agosto de 1823 197

pelas circumstancias actuaes do imperio, é forçoso RESOLUÇÕES DA ASSEMBLÉA


tomar a deliberação de fazer partir quanto antes para
Portugal as ditas tropas apresadas, ou juntas, ou em PARA CAETANO PINTO DE MIRANDA
separado, e para se executar esta deliberação são MONTENEGRO
outrosim de parecer as mesmas commissões, que se
autorise o governo para fazer as despezas Illm. e Exm. Sr. – A assembléa geral
necessarias com esta expedição, encarregando-o de constituinte e legislativa do imperio do Brazil, sendo-
as legalisar pelo modo mais conveniente para que lhe presente o parecer da commissão de legislação
em tempo competente se exija o seu pagamento do sobre o requerimento constante da cópia inclusa de
governo de Portugal. Pantaleão Moreira Mosso, testamenteiro de Antonio
Paço da assembléa, 29 de Agosto de 1823. – Ignacio Brandão, que pede seja supprida a nullidade
José de Rezende Costa. – Manoel Jacintho Nogueira que houve no testamento pela falta da assignatura
da Gama. – José Arouche de Toledo Rendon. – de uma testemunha, afim de que por este
Barão de Santo Amaro. – Pedro José da Costa supprimento se possa fazer effectiva a liberdade
Barros. conferida pelo testador a tres escravos, a quem tem
O Sr. Cruz Gouvêa discorrendo sobre o servido de obstaculo a arguida nullidade no juizo da
parecer lembrou que sendo mandadas estas tropas provedoria da comarca do Rio das Velhas; manda
para Portugal talvez alli fossem ajudar o partido participar ao governo que precisa que lhe sejão com
opposto á liberdade, quando lhe parecia conveniente urgencia transmittidas as necessarias informações
não influir para tal acontecimento. (E' quanto se pôde sobre este objecto. O que V. Ex. levará ao
colligir do que escreveu o tachygrapho João Estevão conhecimento de Sua Magestade Imperial. – Deus
da Cruz.) guarde a V. Ex. Paço da assembléa, em 29 de
O SR. MONTESUMA: – Diz o parecer da Agosto de 1823. – José Ricardo da Costa Aguiar de
commissão que saião as tropas do imperio e que vão Andrada.
para Portugal; e que a este fim se dê autoridade ao
governo para fazer as despezas. O Sr. Cruz Gouvêa PARA O MESMO
lembrou que estas tropas podem ir coadjuvar a
causa do rei com desfavor da liberdade que nós Illm. e Exm. Sr. – A assembléa geral
deveriamos auxiliar, se pudessemos, em todos os constituinte e legislativa do imperio do Brazil, sendo-
paizes, para que o mundo conhecesse como lhe presente o parecer da commissão de legislação
pensamos a respeito de liberdade, e além disto não sobre o requerimento de José Antonio Alves
sabemos como a Santa Alliança olharia para esta Rodrigues que expondo haver-lhe sido indeferida por
remessa de tropas. Creio que á vista desta Sua Magestade Imperial a queixa que fez do juiz de
observação e da necessidade de fazer sahir do fóra, e camara da villa de Santo Antonio de Sá, pede
nosso paiz semelhante gente, convirá achar um meio remedio ás violencias contra elle praticadas; manda
de a pôr fóra sem resultar aquelle inconveniente, e participar ao governo, que precisa que lhe sejão
sem que nos possão fazer mal. Eu até estimaria que remettidas as queixas do supplicante com as
pudessemos fazer a favor da liberdade portugueza o diligencias a que se procedeu, e as mais
que fez Buenos-Ayres offerecendo os seus milhões á informações que forem necessarias para melhor
Hespanha para sustentar alli a causa da liberdade, intelligencia do negocio. O que V. Ex. levará ao
mas como não podemos, ao menos não lhe reconhecimento de Sua Magestade Imperial. – Deus
mandemos para lá tropas que podem ir apoiar o guarde a V. Ex. Paço da assembléa, em 29 de
partido do rei contra o da constituição. Agosto de 1823. – José Ricardo da Costa Aguiar de
Portanto como não devem ficar no imperio, Andrada.
nem, segundo o que entendo, ir para Portugal,
proponho um meio termo que é mandal-as para a PARA MANOEL JACINTHO NOGUEIRA DA GAMA
costa d'Africa, de onde nos não podem fazer mal. A
segurança do Brazil exige esta medida. Illm. e Exm. Sr. – A assembléa geral
Ficou adiada a discussão por dar a hora. constituinte e legislativa do imperio do Brazil, sendo-
O Sr. Presidente assignou para a ordem do lhe presente o parecer da commissão de fazenda
dia: 1º A continuação da discussão do parecer sobre sobre a maneira de se pôr em execução o decreto de
o destino dos prisioneiros portuguezes. 2º A 3ª 16 de Abril de 1821, que deu nova fórma á
discussão do projecto de lei sobre o modo de passar arrecadação dos dizimos,: manda participar ao
cartas aos alumnos da academia medico-cirurgica. governo que precisa que do thesouro publico lhe
3º. Regimento da assembléa. sejão remettidos todos os papeis que puderem dar a
Levantou-se a sessão ás 2 horas da tarde. – illustração necessaria sobre este negocio. O que V.
Manoel José de Souza França, secretario. Ex. levará ao conhecimento de Sua Magestade
Imperial. Deus guarde a V. Ex. Paço da assembléa,
em 29 de Agosto de 1823. – José Ricardo da Costa
Aguiar de Andrada.
198 Sessão em 30 de Agosto de 1823

SESSÃO EM 30 DE AGOSTO DE 1823. para qualquer emprego, que exije mór applicação, e
muito mais para a tactica das assembléas, e para as
PRESIDENCIA DO SR. BISPO CAPELLÃO-MÓR. funcções legislativas, que requerem estudos,
qualidades e virtudes, que não são communs, e que
Reunidos os Srs. deputados pelas 10 horas da eu não tenho; comtudo em um corpo numeroso de
manhã, fez-se a chamada e acharão-se presentes deputados escolhidos em todas as partes do imperio,
69, faltando com causa os Srs. Pereira da Cunha, e de uma consideração superior, a maioridade das
Andrada Machado, Araujo Gondim, Andrada e Silva, luzes servirá de supprimento ás que me faltão, e á
Ferreira Nobre, Silveira Mendonça, Ribeiro de escassez dos meus talentos; e attendendo aos
Andrada, Rodrigues da Costa e Araujo Lima. dictames da prudencia, e da probidade, e tendo por
O Sr. Presidente declarou aberta a sessão, e guias os mais abalisados publicistas, espero não
lida a acta da antecedente foi approvada. desorientar-me do verdadeiro rumo.
O Sr. Secretario Costa Aguiar leu as tres Para a minha vinda, e para o meu regresso,
seguintes participações dos deputados por Minas todos sabem que me determinarão considerações
Geraes João Evangelista de Faria, Lucas Antonio bem differentes das que têm por objecto a minha
Monteiro de Barros e Francisco Pereira de Santa pessoa, e os meus particulares interesses; os da
Appollonia. patria estão em primeiro lugar, e devem preferir a
Illm. e Exm. Sr. – Accuso recebido o officio de tudo; em serviço da mesma submetto-me ao
16 de Maio do corrente anno em que V. Ex. me chamamento legal, e desde já vou tratar dos arranjos
participa ter a assembléa geral, constituinte e necessarios ao meu embarque. O que V. Ex. terá a
legislativa do imperio do Brazil resolvido, que eu vá bondade de participar ao augusto congresso.
quanto antes tomar assento nesse augusto Deus guarde a V. Ex. Recife de Pernambuco,
congresso, e ter parte nos seus gloriosos trabalhos 10 de Agosto de 1823. – lllm. e Exm. Sr. José
como deputado da provincia de Minas Geraes. No Joaquim Carneiro de Campos. – Lucas Antonio
que por certo sem me acobardar á desproporção de Monteiro de Barros.
minhas forças, teria eu sido mui pontual, desde que Ficou a assembléa inteirada.
(em fins de Março) me chegou pelo Diario do lllm. e Exm. Sr. – A officiosa participação, com
Governo a noticia de tão honrosa commissão: e se que a bondade de V. Ex. me assegura ter sido
m'o não tornasse impraticavel o perigo da navegação dispensado de comparecer no augusto seio da
infestada então do inimigo, e depois o da vida em assembléa geral e constituinte do Brazil, e continuar
que estiverão dous filhos meus atacados de febres o supplente que já teve assento, conforme o parecer
em occasião de embarcar no brigue Flôr do da commissão dos poderes; me leva agradecido a
Guadiana, que me offerecera o governo desta accusar a recepção do dito officio e pedir a V. Ex. a
provincia, e eu havia soffregamente aceitado apesar graça de significar no augusto recinto o meu devido
do extremo aperto de tantos passageiros. Posso reconhecimento e sem prolongar o diz como das
todavia segurar a V. Ex. que fica já apalavrada uma minhas expressões me aproveito desta
sumaca, em que depois de continuas, e inuteis opportunidade para me offerecer no serviço de V.
diligencias, me força a partir a minha impaciencia de EX. a quem o céo guarde, e prospere felizmente.
mais demoras; não se me pondo por diante a sua Imperial cidade do Ouro Preto, a 20 de Agosto de
insufficiencia, e a contra monção, e outros 1823. – lllm. e Exm. Sr. José Ricardo da Costa
incommodos domesticos. Aguiar de Andrada. – Francisco Pereira de Santa
Queira V. Ex. fazer-me a honra de assim o Appollonia.
levar á presença do soberano congresso com as Ficou a assembléa inteirada.
protestações do meu profundo respeito, e fiel Leu mais o mesmo Sr. secretario a
obediencia. participação de molestia do Sr. Araujo Gondim. –
Deus guarde a V. Ex. por muitos annos. Ficou igualmente a assembléa inteirada.
Recife, 7 de Agosto de 1823. – Illm. e Exm. Sr. Passou-se á ordem dia que era a continuação
secretario da assembléa constituinte e legislativa do da discussão do parecer das commissões de guerra
Brazil, José Joaquim Carneiro de Campos, ou a e fazenda sobre o destino das tropas portuguezas
quem suas vezes fizer. – João Evangelista de Faria. prisioneiras levadas á Bahia e Pernambuco.
Ficou a assembléa inteirada. O SR. COSTA BARROS: – O parecer da
Tenho presente a participação de V. Ex. para commissão tendo em vista que segundo as leis da
ir tomar assento no augusto congresso, como guerra ou haviamos reter estes prisioneiros para os
deputado pela provincia de Minas Geraes. Depois de trocar por outros havendo-os, ou remettel-os á custa
trinta e tres annos de serviço publico em lugares de do estado a que pertencem, decidio-se pela segunda
letras, nas ilhas dos Açores, Pernambuco, Bahia, Rio parte, não só porque não nos convinha tel-os entre
de Janeiro e Minas Geraes, fallecem-me já as forças nós pelas circumstancias
de espirito, e corpo
Sessão em 30 de Agosto de 1823 199

actuaes por não termos embarcações a proposito e para o seu paiz natal como diz a commissão. (No
fortalezas que lhes servisse de deposito; como, e foi resto não se entendeu o tachygrapho Pedro
a mais forte razão, por ser a primeira medida Affonso.)
totalmente opposta ao espirito geral das provincias O SR. MUNIZ TAVARES: – O objecto de que
que não querem absolutamente possuir um soldado se trata é de summa importancia. Versa o parecer da
lusitano. Emquanto á reflexão do Sr. Montesuma a commissão sobre o destino que devem ter essas
respeito do modo porque a Santa Alliança encararia barbaras tropas portuguezas hoje prisioneiras, e que
esta emissão tomando-a como determinada a ha pouco despresarão com altivez as condições que
proteger um partido em Portugal, respondo que nada se lhe propuzerão para a sua evacuação.
nos deve importar os juizos da Santa Alliança porque Occupamo-nos agora de remover para fóra do
nenhum direito tem ella de intrometter-se em nossos imperio esses inimigos depois que praticárão os mais
negocios, e pouco ou nenhum cuidado nos deve isso horrorosos attentados e fugirão vergonhosamente;
dar; por essa mesma razão pelo que toca á pois o conserval-os entre nós seria o mesmo que
lembrança do mesmo senhor de mandarmos esta deixar ficar uma hydra para nos tragar.
tropa para a costa d'Africa temporariamente, julgo Nós queremos removel-os com humanidade
que não só nenhum direito temos para o fazer, como porque cahirão em nosso poder, e só merecem hoje
que até é barbaro degradarmos aquelles homens só compaixão. Comtudo o meio que aponta a
porque fizerão a sua obrigação. commissão não me parece acertado; ainda me
Sr. presidente, esta tropa foi mandada para o lembro que as tropas que sahirão de Pernambuco
Brazil pela autoridade a quem ella devia obedecer, para Lisboa, apenas lá chegarão se offerecerão para
desempenhou os seus deveres, e nós devemos voltar e forão com effeito as que vierão á Bahia; além
desempenhar os nossos: no numero das terras disto o governo não póde com tanta despeza, bem
d’Africa apontadas pelo mesmo senhor, entrou Serra basta as que já se têm feito com embarques de
Leôa; creio que o illustre deputado não se lembrou tropas, devendo tambem attender-se a que pelos
que ella é possessão ingleza. prejuizos que tem soffrido o nosso commercio, têm
O SR. MONTESUMA: – Eu não quero fallar diminuido as rendas publicas. Como porém esta
ainda sobre a materia; quero propôr primeiro a minha tropa não póde ficar entre nós segue-se determinar o
emenda para vêr se é apoiada, e então direi o que lugar para onde ella possa ir com o menor dispendio
entender. Eu vou lel-a. nosso. Não sigo a opinião do Sr. Montesuma que
lembrou a costa d'Africa, mas parece-me que
EMENDA commodamente poderião passar-se para as ilhas de
Cabo Verde, cuja viagem não é tão longa como a de
Proponho: 1º Que as tropas luzitanas Portugal, e de onde o governo portuguez os póde
apresadas pelo lord Cochrane saião para fóra do mandar buscar se quizer.
continente do imperio do Brazil. Entendo que deste modo se evitão os
2º Que não vão para Portugal, e sim para inconvenientes apontados, e que não se falta á
aquelles dos portos da costa d'Africa que melhor humanidade; elles mesmos estimaráõ estar fóra de
convier, sendo por elles divididos, e nunca Portugal; quando eu lá estive observei que a maior
mandados para um logar só. Paço da assembléa, 30 parte desta gente desejava sahir dalli para Angola,
de Agosto. – O deputado Montesuma. Cabo Verde, e outros dominios portuguezes, por
Foi apoiada em ambas as partes. pensarem que lhes iria melhor por lá do que na sua
O SR. MIGUEL CALMON: – Prescindindo da propria terra. Sou pois de opinião que vão para Cabo
questão que se tem suscitado sobre o receio de que Verde, apartando-me por isso do parecer da
as tropas daqui mandadas para Portugal se vão unir commissão.
ao partido do rei ou ao constitucional, a cujo fim se O SR. DUARTE SILVA: – Sr. presidente, não
tem lembrado subscripções a favor de liberaes, e me levando para fallar sobre o parecer da nobre
outros factos, limito-me a fallar sobre o parecer da commissão; depois de ter sido elucidada a materia
commissão que acho fundado em principios de por tão sabios oradores que poderia eu dizer? Pedi a
justiça e de politica. E' indispensavel que nos palavra para propôr um additamento. E’ sabido que
devemos desfazer destes 1,500 homens nossos em todos os tempos as nações belligerantes têm
inimigos. Embora se diga que os melhores colonos feito generosa entrega dos prisioneiros; umas vezes
são soldados affeitos aos trabalhos da guerra, e se com condições, outras sem ellas. Se não
apontem exemplos disto, eu sempre direi que impuzermos condição alguma a estas tropas para
admitta o Brazil os estrangeiros para augmento de regressarem ao seu paiz, podem voltar a fazer-nos
sua população, mas não estes portuguezes: estes guerra; e eu não quizera que estes
não podem ser bons colonos porque são nossos
inimigos, e já derramarão o nosso sangue; taes
homens não podem existir entre nós; mande-mol-os
200 Sessão em 30 de Agosto de 1823

hospedes tornassem ás nossas praias. Offereço perigoso conserval-os, porque são inimigos de
pois um additamento que julgo preciso, e que vou coração, e poderião concorrer para revoluções
mandar á mesa. intestinas; e muito convém olhar para a opinião
publica actualmente reinante nas provincias, onde
ADDITAMENTO ninguem por via de regra vê com olhos indifferentes
estes homens, porque são portuguezes, e porque
Prestando juramento de não tomarem armas são soldados, que nestas provincias fizerão a
contra a nação brazileira. – O deputado Duarte guerra e tingirão as mãos, as espadas e as
Silva. bayonetas com sangue brazileiro.
Foi apoiado. Póde tambem dizer-se, que elles seguirão as
O SR. GOMIDE: – Os nossos inimigos forão ordens dos seus commandantes e estes as d'el-rei
arrojados nas nossas praias. Corramos sobre elles. de Portugal, que por ventura se persuadão que não
Sangremol-os e bebamos-lhes o sangue. fazião guerra por nos não reconhecer potencia
Dilaceremol-os, e banqueêtemo-nos com as suas independente, e que por conseguinte falhão para
carnes. Sallemos em orgias ao redor das fogueiras, com elles as regras de direito das gentes sobre
e deixemos no montão dos ossos o monumento da prisioneiros. Poderia occorrer, que conservando-se
nossa vingança aos nossos netos. Ah! Sr. estes homens, e dispersando-os por todo o solo
presidente, somos ainda tupynambás ou habitantes brazileiro se lhes ganhavão mil seiscentos colonos e
do Brazil? Não. Os brazileiros, estamos nos cultivadores, e ganhava este todo o producto dos
constituindo em uma nação grande e civilisada. O seus braços, e poupavamos a grande despeza que
que é máu em moral, não póde ser approvado em se ha de fazer com a sua retirada.
politica; esta não é mais que a moral universal, que Mas todas estas considerações cedem á dura
dirige o todo, ou uma collecção mais ou menos necessidade de os enviar quanto antes, para nos
extensiva da especie humana. forrarmos aos perigos que já referi e ao desgosto
Os Srs. Calmon e Duarte Silva me das provincias; nem a despeza que com isto se fizer
prevenirão. Sr. presidente, o parecer da illustre póde afastar-nos deste parecer. Em materia de
commissão é sabio, prudente, politico e congruente administração, toda a theoria consiste em não se
com os principios da razão, da humanidade e da fazerem despezas superfluas; mas esta é tão ligada
justiça. Os nossos conterraneos anglo-americanos com a causa publica, e com o interesse deste
no celebre batalha de Saraloga ganharão mais no imperio, que não póde ser considerada senão como
credito de humanidade, e moderação em todas as necessaria e util. Nem póde obstar que sejão agora
côrtes da Europa, e mesmo no parlamento remettidos, podendo ser sacrificados ao furor do
britannico, do que na gloria de suas armas, novo partido, como lembrou um illustre deputado.
aprisionando o exercito inteiro com o general Em caso de tanto aperto não nos devemos
Burgoyne. O universo tem os olhos sobre nós. importar com o que se ha de fazer na caza alheia;
Sigamos exactamente o parecer da commissão, e pois que é principio de direito das gentes, que
attrahiremos á pró da nossa causa os suffragios e nenhuma nação se deve entrometter nos negocios
as bençãos de todo o mundo. A crueldade, e a internos da outra. Sigamos pois este partido, que
vingança são as paixões dominantes nas almas além de util e glorioso, sendo um exemplo de
pequenas. A philantropia e o cosmopolitismo são o generosidade, que existirá na historia do futuro, por
apanagio das almas grandes. havermos generosamente enviado para o seu paiz e
O SR. CARVALHO MELLO: – Sr. presidente, á nossa custa os nossos proprios inimigos.
a materia é de grande importancia, e digna de toda A lembrança do illustre deputado, que propôz
a ponderação. As regras do direito das gentes, e por que fossem mandados para a costa d'Africa, é de
todos os escriptores delle abraçadas, são, que os certo inadmissivel, porque era sobre injusto, um
prisioneiros de guerra sejão bem tratados e procedimento indecoroso, obrigando-os a serem
guardados até serem remettidos por convenções desgraçados e sacrificados á fome, desesperação,
particulares antes dos ultimos tratados definitivos de e á morte. Não desacreditemos, Sr. presidente, as
paz ou quando estes se fazem, em que, por via de vistas sabias do governo deste imperio: ostentemos
regra, se estipula a entrega reciproca. generosidade e humanidade; sejamos em tudo
Nós fizemos prisioneiros os soldados de grandes; formemos assim o caracter da nação,
Portugal, que ora estão em Pernambuco e Bahia e demos a conhecer aos nossos inimigos e á Europa
seguirão a causa daquelle reino. Segundo o inteira a justiça de nossas acções, e conheça o
costume praticado, e o que eu disse ser preceito do mundo por este e outros actos, que a nação
direito das gentes, deverião ser guardados até que brazileira é grande e generosa.
por negociações se houvesse de remetter á nossa O SR. SILVA LISBOA: – Sr. presidente, a
custa, ou de Portugal, segundo se ajustasse.
Persuado-me, porém, que não devemos esperar
para esse tempo. É
Sessão em 30 de Agosto de 1823 201

honra brasileira está empenhada na presente Portugal; porque sempre era vantagem livrar-se o
discussão, por isso me levanto para declarar que me paiz da presença dos inimigos, e dar tempo para a
conformo ao parecer da commissão, que entendo ser organisação das forças; afim de futura resistencia á
fundado na opinião publica, e prudencia; e a nova invasão. O Brazil é mais que parelha á Portugal
impugnar a emenda, ou, o quer que é, do Sr. para guerra defensiva.
Montesuma, que propõe se remettão as tropas Não tem razão de temer, que elle torne a
luzitanas prizioneiras para os portos d’Africa ou ilhas expedir-Ihe esse ou maior numero de tropas, que ora
do Cabo-Verde e não para Portugal, pelas razões de se achão prizioneiras. Ainda mesmo as não temeria,
que politica dicta destruir as forças de inimigo, e se ellas quizessem em novo juramento entrar no
porque as noticias proximas poem em duvida, se serviço brazileiro, ou, sendo desarmadas, entrarem
essas tropas irão reforçar, ou o partido de el-rei de nos trabalhos economicos do paiz. (Apoiado,
Portugal, ou o partido dos constitucionaes; e apoiado.) Não me rejo por idéas do vulgo, sim por
finalmente porque, qualquer que seja o partido maximas de estado que aprendi nos classicos da
vencedor, o governo portuguez ha de sempre querer que hoje alguns reputão velha litteratura da Grecia, e
dominar, e monopolizar o Brazil: como fez ha tres Roma, que formou os Socrates e Demosthenes, os
seculos. Catões e Regulos, para exemplo da genuina virtude
Sinto dizer, tal opinião me parece a cousa patriotica. Themistocles, dando um conselho em
mais iniqua, deshumana, atroz, e impolitica; muito segredo á Aristides sobre o methodo facil de destruir
mais por constar officialmente haver nas tropas os inimigos, aquelle grande director do estado o não
prisioneiras mais de cem mulheres e crianças. O communicou ao povo, dizendo – que o conselho era
governo de Pernambuco obrou bem em esperar as util, mas não honesto.– Tito Livio louvou a Romulo,
ordens do governo imperial; e este obrou com fundador de tão grande imperio, porque ostentára o
sabedoria remettendo a decisão á esta augusta verdadeiro liberalismo politico de incorporar os
assembléa, manifestando o seu constante desejo de vencidos com os vencedores, fazendo que no
harmonia com os representantes da nação. No Diario mesmo dia Roma visse inimigos e cidadãos.
do Governo se transcreveu o officio do lord Cochrane Toco esta especie delicada, porque o Sr.
ao dito governo, recommendando tratamento de Montesuma disse com emphase, e reticencia, que
humanidade as tropas que fez prisioneiras. bem se sabia a razão porque não convinha a demora
Esta recommendação convém ser executada das tropas lusitanas no Brazil. Nisto allude elle á
com primor, bem que não era necessaria, visto o rumores do vulgo; mas não póde caber no espirito
magnanimo caracter do nosso imperador, e do povo desta assembléa, que no generoso animo de S. M. o
brazileiro. Como pois se póde ouvir com serenidade Imperador, entrassem a este respeito principios
o ter-se hontem tanto fallado em humanidade, e sinistros. Sim, convém expedir para Portugal as
generosidade, com lingua de uma doçura excedente tropas prizioneiras lusitanas, por dever ser este o
ao mel, a respeito da demora da prizão do parente nosso direito publico; e porque já assim o ordenou o
de Pamplona, um dos figurões da farça imperador, e se executou nesta côrte, e em
revolucionaria de Portugal, tão suspeito de espião no Pernambuco. Convém que o imperio nascente
porto de Santos, indo explorar o desguarnecido da ostente a magnanimidade do imperio romano, que
terra para preparar algum golpe de mão, como o era – debellar os soberbos, e perdoar aos
publico presumio; e agora propôr-se neste conselho submissos. É cousa horrorosa, que se opine remetter
nacional a deshumanidade, e tyrannia de se as tropas prizioneiras para a Africa.
arrojarem 1,500 homens á climas inhospitaes, Isto excita a horrida lembrança da sentença da
expondo-os aos horrores da fome, e da miseria? Sr. relação da Bahia, que, não achando em alguns réos
presidente, a sorte da guerra é incerta: Maranhão e a prova juridica de conjurados na rebellião de escura
Pará ainda estão sob o jugo lusitano: é impolitico, gente no fim do seculo passado, todavia os
sobre deshumano, reduzir os homens á condemnou a serem lançados nas praias barbaras
desesperação. da Africa, onde alguns dos réos forão empalados
As tropas que alli se achão, farão os esforços pelos cafres. Ainda que os prisioneiros lusitanos
de heroicidade que a historia mostra dos povos tivessem praticado cruezas na injusta guerra que nos
valerosos, quando souberem que não têm esperança fizerão na Bahia, comtudo a humanidade brazileira
de salvação, ainda rendidos. Ninguem de honra não póde sustentar a phantasia de os ver acabar em
insulta a prostrados. Quando os francezes forão desesperação, á fome e miseria, em paizes
vencidos na batalha de Vimeiro, fez-se a convenção inhospitaes, como já disse.
de Cintra, em que os nossos alliados os inglezes se Não posso ouvir neste augusto congresso
obrigarão a levar por mar os inimigos á França; e palavras de cobardia, como se os habitantes do
assim se executou, não obstante as declamações de
que taes tropas tornarião contra
202 Sessão em 30 de Agosto de 1823

Brazil estremecessem de mil e quinhentos soldados estas tropas para Portugal, e que são tiradas das
de Portugal, como se estes constituissem um circumstancias em que se acha actualmente aquelle
exercito de Hercules, e gigantes, ou se reino dividido em partidos, não me parecem
apresentassem qual a phalange Macedonia dos destituidas de fundamento, e tanto que sem ellas eu
Argyraspidas que se figuravão immortaes. Só votaria sem hesitar pelo parecer da commissão; mas
attendemos á sensibilidade das nossas mulheres, á vista do que póde resultar se as mandarmos para
que não podem sem indignação ver as cataduras lá, inclino-me para a opinião do Sr. Muniz Tavares,
dos verdugos do Brazil. Nestas mesmas não falta porque me parece arrazoada sem se faltar á
coragem varonil: na Bahia houve mais de uma humanidade. O Sr. Lisboa que tão compadecido se
heroina semelhante á Joanna d'Arco: é notorio que mostra destes lusitanos que derramárão o sangue
no Reconcavo, innumeraveis mulheres ardião em dos brasileiros não sei como se compadeceu tão
patriotismo, fazendo e embalando cartuxos de pouco de um prezo em cujo favor se fallou nesta
polvora, concorrendo com o seu contingente para o assembléa por estar recluzo muitos mezes sem
feliz exito da guerra. Os soldados lusitanos (a quem culpa formada; todavia nada disse em seu favor, e
não contesto o valor) entrincheirados até os dentes, tudo guardou para defeza dos que commetterão
nunca se animarão senão em medrosas sortidas de horriveis attentados, profanando conventos,
pequenas distancias sahir das linhas da prostituindo virgens, e praticando quanto lembrou ao
circumvallação: portanto não tememos a nenhuns, seu furor e depravação.
sejão mil e quinhentos, ou cento e cincoenta mil. Eu bem sei que elles hoje não são já esses
Podemos dizer – venha todo o Portugal; basta o inimigos poderosos, e sou de parecer que se obre a
nosso páo-ferro para desancar, e desqueixar os seu respeito com generosidade; mas devemos
invasores. (Apoiado, apoiado.) O nosso grande ponto conciliar esta com o que exigem as circumstancias já
é sustentar o muro de bronze, a muralha da China, ponderadas por alguns dos illustres preopinantes. E'
que assegura a nossa independencia de Portugal. O por isso que voto que vão para as ilhas de Cabo-
autor da natureza fez chegar a grande época da Verde ou para outras, e não para Portugal, até pelo
separação, pelas multiplicadas injustiças da risco de podermos indo para aquelle reino, sacrificar
metropole: os seus governos nos têm offendido além os vasos e a gente.
dos limites do perdão; só espiritos vis se podem O SR. HENRIQUES DE REZENDE: – Se esse
submetter ao despotismo metropolitano (apoiado, lance de generosidade pudesse ter lugar sem
apoiado) renunciando á defeza que nos deu a comprometter a nossa propria segurança, eu de bom
mesma natureza, fazendo o Brazil de uma peça grado conviria que elles fossem espalhados pelas
inteiriça, circumvallado do Atlantico, tendo por provincias afim de promover a população mas está
sentinella os maiores gigantes d’agoa, ou rios do de um lado a generosidade, do outro: a nossa
mundo, o Amazonas e o Prata. segurança, que sem duvida deve ter a preferencia.
Bem podemos dizer – opposuit natura. – Deve-se portanto fazer sahir do Brazil essa tropa
Deixemos, senhores, o systema de irritação: os prizioneira Mas de nenhum modo posso convir na
americano do norte, depois do reconhecimento da opinião de alguns senhores que sejão mandados
sua independencia receberão os inglezes, seus para os portos d'Africa, porque isso seria
encarniçados inimigos, e até os preferirão no summamente injurioso ao caracter, e honra
commercio contra as apparencias de que, por brazileira; e uma infracção do direito das gentes.
gratidão, favorecerião aos francezes. Emfim, Dizem que mandando-os para Portugal, elles se
permitta-me esta augusta assembléa recordar aqui o poderião bandear com o rei contra os
conselho do grande e humano politico da Europa, o constitucionaes, cuja boa fortuna tanto desejamos,
presidente de Montesquieu, o nosso commum ou se bandearião com os constitucionaes contra o
mestre, que bem diz no seu espirito das leis – rei; e então um dos dous partidos necessariamente
quando em um estado ha muitas causas de odio, a se queixaria de nós. Mas o que temos nós com o que
religião deve dar muitos meios de reconciliação. – succede lá em Portugal?
Esta he a minha opinião e, como disse no principio, Não queremos no Brazil gente tão perigosa,
voto pelo parecer da illustre commissão. havemos de mandal-os, ou para Portugal, ou para
O SR. CARNEIRO DA CUNHA: – Eu creio Angola, como querem outros senhores; no primeiro
estar já fóra de duvida que a assembléa reconhece a caso queixa-se um dos partidos, no segundo
necessidade de sahir deste imperio a tropa compromette-se a honra brazileira.
portugueza prizioneira, resta portanto saber o lugar Nesta collisão devemos salvar a nossa
para onde se ha de enviar; e para decidir este ponto reputação. Não nos devemos por esse medo ingerir
julgo indispensavel seguir os principios do direito das em os negocios de uma nação estranha; vão-se
gentes e o que dicta a humanidade até a embora esses soldados; mandemol-os para Portugal,
generosidade. deixemol-os na sua liberdade e independencia; se
As razões que se têm allegado para não quizerem unir-se ao rei que se unão
mandar
Sessão em 30 de Agosto de 1823 203

se se quizerem unir aos liberaes muito embora, nós nosso verdadeiro caracter: conheção, pois, todas as
nada temos com isto. Agora se quizermos ajudar os nações a falsidade de nossos inimigos, e saibão que
constitucionaes, cujos principios são analogos aos os brazileiros são uma nação livre, generosa,
nossos, e fazer a guerra a um rei que tem o arrojo de intrepida e civilisada.
se intitular nosso senhor, e que teve a ousadia de O SR. RODRIGUES DE CARVALHO: – Trata-
querer solapar a fidelidade da minha provincia, para se de dar destino ás tropas portuguezas prisioneiras,
separal-a da communhão brasilica (e então para e ouço dizer que não se devem mandar para
que? Para sujeitar-se a um poder absoluto, e para Portugal: 1º, porque podem voltar para o Brazil; 2º,
ministrar bestas que puxem o carro do rei de porque as despezas do seu transporte para aquelle
Portugal), então faça-se pelo Brazil uma subscripção reino são maiores; concluindo-se daqui que devem ir
e eu concorro com metade da minha diaria por um para Angola ou Cabo Verde, onde se não verifica
mez. Mas as tropas já para Portugal, e voto pelo nenhum daquelles dous inconvenientes.
parecer com o additamento do Sr. Duarte Silva. Eu quizera que tambem se ponderasse que os
O SR. COSTA BARROS: – Sr. presidente, povos de Angola se têm mostrado inclinados a unir-
trata-se de tomar uma das medidas: ou deixar entre se ao Brazil, e que seria pagar-lhes mal o mandar-
nós aquella tropa, ao que todos se oppoem, ou lhes para Iá esta expedição que vai peiorar as suas
envial-a. Suscita-se a duvida se convirá fazel-o agora circumstancias; e que se reparasse que a despeza
por se achar PortugaI dividido em dous partidos, e eu deve ser maior para a costa d'Africa, pela
digo que por essa mesma razão lhes é melhor serem circumstancia de se pagar a torna-viagem, o que não
enviados. Ou elles são constitucionaes ou realistas, succede para Portugal; accrescendo demais que
de qualquer modo lá se podem declarar; e não ainda que fossem maiores as do transporte para
querendo abraçar o partido constitucional, por isso Portugal, devia preferir-se um gasto de que ha de
mesmo que é liberal este partido, o que lhes póde haver indemnisação ao de que não póde haver
succeder e ficarem lá prisioneiros dos nenhuma. Quanto ao receio de que voltem a fazer-
constitucionaes; e antes o sejão então em seu paiz nos guerra, se nos queremos livrar com mais razão
do que em terra estranha; e se não são delle, seria melhor mandal-os para Bengala ou
constitucionaes, então com mais forte razão não Macáo...
devem viver entre nós. Emfim, nada me parece mais judicioso do que
Demais, despotico tem sido o rei para o parecer da commissão, ao qual entendo que não
comnosco, e despoticas têm sido para comnosco ha precisão de ajuntar o additamento do Sr. Duarte
igualmente as côrtes de Portugal; ambos são nossos Silva, porque esta clausula é em regra geral das que
inimigos, e portanto não se poderá dizer que sempre se impoem em taes circumstancias.
favorecemos um partido. O SR. VERGUEIRO: – O illustre preopinante
Agora responderei ao illustre deputado o Sr. preveniu-me apontando o que ha de impolitico na
Silva Lisboa que se lembrou de avançar a emenda do Sr. Montesuma.
proposição de que lhe parecia esta medida filha do Allegou-se como razão para não mandar esta
medo que tinhamos de 1,500 lusitanos: muito mal me tropa para Portugal o estar aquelle reino dividido em
parece, Sr. presidente, que e illustre deputado partidos, e não se attende a que mandando-a para
soltasse aqui expressões do semelhante natureza: o Angola vamos prejudicar o partido que nos é
medo é palavra que já não apparece nos nossos favoravel.
diccionarios; nem Pernambuco, nem a Bahia, que Se alguns portos ha, dos pertencentes á
por tantas vezes têm dado decididas provas do seu monarchia portugueza, que fação conta ao Brazil,
valor contra seu inimigos, podem ou devem receiar são os da costa d’Africa, pelo commercio da
1,500 homens; fossem elles 10,000, fossem 100,000 escravatura emquanto durar, pois não póde acabar
o valor innegavel dos nossos guerreiros, secundado já; e, portanto, mandar esta gente para lá é o mesmo
pela justiça da nossa causa, lhes faria sentir, como que obrar contra os nossos interesses.
por vezes o têm feito, quão pouco susto lhes Teme-se que ella fique entre nós, teme-se que
causava maior que fosse o numero de seus inimigos; vá para Portugal, e não se teme que indo para a
nem sombras de medo entrou no parecer da costa d'Africa nos prive da união de quem tem
commissão; antes ella obrando um verdadeiro acto mostrado querer ligar-se ao Brazil!
de generosidade procurou por este meio desmentir a Tambem tenho ouvido fallar em humanidade;
falsa idéa que os lusitanos quizerão dar do nosso mas eu creio que nós estamos aqui para fazer o que
caracter. a justiça manda; não digo que sejamos deshumanos,
Os lusitanos, Sr. presidente, disserão á face a justiça não é incompativel com a humanidade, mas
de todo o universo que nós eramos hordas de não nos levemos demasiadamente do sentimento de
barbaros e estupidos, e é á face de todo o mundo compaixão; esta pertence mais á santa casa da
que a commissão com este procedimento os misericordia.
pretende desmentir, apresentando-lhe o
204 Sessão em 30 de Agosto de 1823

Mande-se, pois, sahir esta tropa para fóra do , pois mandando-se estas tropas para Portugal ha de
imperio, porque esta é certamente a vontade da suppôr-se que as mandamos para protegerem algum
nação, e fique á disposição do governo o transportal- partido, e desta suspeita não nos póde livrar a
a para onde julgar conveniente; eu não receio a sua discussão. Demais, este negocio veio do governo e o
volta, não é por ella que se ha de destruir o nosso governo tem laços de parentesco com o de Portugal,
systema. e talvez se presuma que isto são cousas tratadas
Quanto aos negocios de Portugal, sobre os entre o gabinete da Boa Vista e o de Lisboa; quanto
quaes póde ter influencia a chegada desta tropa, a mim estou certo que taes laços nada, influem, mas
digo que ao Brazil nada importão os negocios de póde isto servir de pretexto para assoalhar suspeitas
Portugal; se os portuguezes querem ser escravos de que se mandão já estas tropas para auxilio de
embora o sejão, se preferem o governo liberal partido.
esforcem-se para o sustentar. O peior é vir tudo cahir na assembléa, quando
O systema americano nada tem de commum o governo podia dar o destino que lhe parecesse a
com o da Europa; este novo mundo não só está estas tropas, como já tem feito em outras occasiões;
separado do antigo pelo mar, mas pelos interesses. nem sei porque o não fez, nem com que fim veio
O exemplo da America Hespanhola consultar a assembléa. Porém o negocio está em
offerecendo soccorros á Hespanha contra a França é deliberação e é preciso decidil-o, o que desejo é que
de facto glorioso, é um nobre procedimento, mas nós a decisão se faça com toda a circumspecção, e
não estamos nas mesmas circumstancias; a olhando-se o negocio por todas as faces.
differença de situação é bem manifesta. Se a minha emenda não fôr approvada
A' vista, pois, do que se tem expendido julgo adopte-se outra; e se a assembléa assentar que ha
que nada podemos fazer mais acertado do que outro lugar melhor que a costa d’Africa, eu convirei,
seguir o parecer da commissão. em que vão para esse. Comtanto que não fiquem no
O Sr. Dias pediu a palavra e mandou para a Brazil e que não vão para Portugal, votarei a favor do
mesa a seguinte: que se propuzer. (O tachygrapho declarou que não
pôde acompanhar mais o orador pela velocidade
EMENDA com que fallava.)
O SR. LOPES DA GAMA: – Se para dar o
Proponho, por addição ao parecer da meu voto sobre esta materia eu consultasse só a
commissão, que se franquêe aos prisioneiros o minha razão, nenhuma duvida teria em declarar que
seguirem para Portugal em navios estrangeiros, e o melhor partido a tomar seria o de espalhar esta
que os officiaes superiores ou subalternos saquem gente em justa promoção por todo o Brazil, de cuja
letras para serem pagas pelo governo portuguez, e o medida seguramente nenhum mal nos proviria; mas
governo brazileiro garanta essas letras com a é necessario attender á opinião publica que nem
condição de voltarem os prisioneiros sendo soffre bem a sua demora; e nestes termos o melhor
recambiadas as letras. – O deputado Custodio Dias. modo de sahir deste embaraço é seguir o parecer da
Não foi apoiada. commissão, e mandar já os prisioneiros para
O SR. MONTESUMA: – Desde que ouvi ler o Portugal.
officio do ministro da guerra sobre esta materia A emenda do Sr. Montesuma não vem a ser
entendi que o negocio era de grande ponderação, e nada menos que uma sentença de degredo para
por isso me admirei que a commissão (perdoem-me homens que fizerão bem a sua obrigação.
os seus illustres membros) désse o seu parecer tanto Pareceu ao nobre deputado que devia tomar-
a furta-passo; digo a furta-passo porque sahirão se expediente por duas razões; 1ª, porque podião
daqui para o fazer e logo entrarão com elle feito; e se estas tropas augmentar algum dos partidos em
não estou illudido houve nisto alguma precipitação; Portugal: 2ª, porque podião voltar a fazer-nos guerra.
não se pensou o que era preciso em negocio de Quanto á 1ª, respondo: a nação portugueza é
tanta monta procedeu-se como se o objecto fosse o hoje tão estrangeira para nós como a ingleza; ora,
dar alguma gratificação. Comtudo, diz-se que é supponhamos que havia agora uma revolução em
fundado em principios de humanidade, vota-se a Inglaterra, e que succedia tambem chegarem aqui
favor delle, e aos que o não seguem dá-se a algumas embarcações com tropa daquella nação,
entender que têm coração de féra, que querem impediriamos nós que ella fosse para Inglaterra para
saciar sua raivosa vingança bebendo o sangue dos que não augmentasse algum dos partidos? Creio
prisioneiros; pela minha parte sempre declaro que que ninguem dirá que isto se pudesse fazer; pois o
não têm lugar no meu coração semelhantes mesmo digo da tropa portugueza cuja influencia nos
sentimentos. negocios de Portugal nos deve ser indiferente.
Se propuz a minha emenda foi para salvar a Quanto á 2ª, isto é, ao receio de nos poderem
nossa reputação de interpretações sinistras, que
terão lugar seguindo-se o parecer da commissão
Sessão em 30 de Agosto de 1823 205

vir fazer guerra, digo que tambem não merece Entro pois na questão principal.
attenção; estou bem persuadido que se Portugal se Eu vi que nas Alagôas o povo heroicamente
determinar a fazer-nos guerra não deixa de pôr em depoz a tropa lusitana e outros funccionarios
execução o projecto por não ter lá esta gente; 1,500 portuguezes e os fizerão embarcar para Portugal; e
homens de mais ou de menos não influem para que em que tempo? Quando Portugal se achava no calor
uma nação se decida a fazer ou não a guerra á da sua maior indignação para empecer a separação
outra. Emfim, taes razões não podem destruir o e independencia do Brazil; vi tambem que em
parecer da commissão; nem convém demoras na Pernambuco se praticou denodadamente o mesmo e
decisão porque a tropa não deve estar encarcerada no mesmo tempo; vi que na Parahyba e outras
a bordo das embarcações com mulheres e crianças, provincias do norte se decidirão da mesma maneira,
e fazendo uma despeza muito consideravel; por isso sendo sempre concordes em remetter para Portugal
voto pelo parecer para que se ponha em execução. aquellas tropas lusitanas expellidas.
O SR. SOUZA MELLO: – Levanto-me para Vimos todos que quando no Rio de Janeiro os
falar nesta materia, não porque a questão dependa batalhões lusitanos commandados pelo general
dos meus argumentos, depois do que se tem dito Jorge d’Avilêz forão obrigados a embarcar, forão
pelos illustres preopinantes, que tão dignamente têm enviados em direitura para o porto de Lisboa; e em
fallado; mas levanto-me, porque a casa sujeito toca que tempo, senhores? No mesmo tempo em que
muito de perto ao procedimento anterior, e actual de Portugal preparava expedições contra o Brazil e
meus constituintes e do Brazil em geral; entretanto carecia de forças para engrossal-as
não me farão peso algum as duas reflexões que Se o Brazil pois nos tempos mais arriscados
agora fez no seu discurso o Sr. Montesuma, a saber, mostrou ao mundo que não temia as forças de
sobre a pressa com que a commissão deu o seu Portugal, restituindo-Ih'as, e sendo generoso com as
parecer neste negocio de tanta consideração, tropas que expelIia como inimigos, agora que tem
entretanto para o gabinete e sahindo logo com elle completado o seu triumpho devemos ser coherentes
prompto; e sobre a remessa do mesmo negocio á e não nos devemos deslisar do brio e generosidade
assembléa pelo governo, quando debaixo das brazileira, embora possão regressar contra nós
attribuições deste estava o decidir a questão e essas tropas, pois que serão vivamente batidas,
expedir as convenientes ordens, segundo as leis como têm sido todas.
existentes; o que tudo faz com que elle nobre Além disto, Sr. presidente, é necessario
preopinante chame a attenção da assembléa, como reflectir que sendo enviadas estas tropas para
para descobrir delicadeza nestes dous actos. diversos portos da Africa se póde dar azo em politica
E' com effeito certo que nenhum peso me a que directa ou indirectamente se diga que assim
fazem estas duas reflexões; emquanto á primeira, forão remettidos a degredo os soldados lusitanos
porque a commissão procedeu com tanta brevidade que forão nossos prisioneiros de guerra e que como
em consequencia da especial deliberação da taes não gozarão do direito privativo; o que não é
assembléa, a qual á vista do negocio e de sua muito honroso ao grande caracter brazileiro, que eu
natureza, determinou que a commissão désse o seu devo defender. Portanto levantei-me para fallar nesta
parecer com urgencia, e que immediatamente se materia por ser coherente com o procedimento de
retirasse a esse trabalho, como succedeu; e tanto meus constituintes e do Brazil; e approvando o
assim, que hontem mesmo, apenas appareceu o parecer da commissão voto que a remessa das
parecer, se começou discutir com urgencia, e sendo tropas lusitanas seja quanto antes e para Portugal,
adiado pela hora, se deu na ordem do dia para hoje: como está no dito parecer.
emquanto á segunda reflexão, é bastantemente O SR. HENRIQUES DE REZENDE: – Ouvi
evidente, que essas tropas apresadas não estão nas dizer que se tinha censurado o ter a minha provincia
circumstancias de serem tratadas pelo direito das expellido os batalhões de Portugal?
gentes e da guerra na consideração de prisioneiros; Pois saibão todos que ella está decidida a
porque o actual estado politico do Brazil não póde expulsar o batalhão n. 1, n. 2, até n. 1,500 e quantos
soffrer essa marcha ou essa retenção; portanto se o lá forem, agaste-se quem se agastar.
governo tinha á ultrapassar os termos ordinarios e Tornando ao objecto, digo que para nos
estabelecidos, por accommodar o negocio ás desembaraçarmos desses inimigos não devemos
circumstancias e mesmo se tinha a fazer com isso lançal-os sobre os outros.
despezas extraordinarias, nada era mais natural do Talvez que os habitantes de Angola se queirão
que remetter a questão á assembléa e com isso unir a nós e ainda não tenhão podido por causa do
cingiu-se com muita pureza ao estado actual das partido europeu que lá ha: como pois havemos-lhes
cousas. mandar mais inimigos?
Isto seria tyrannia.
Consta mesmo que elles se querem unir ao
206 Sessão em 30 de Agosto de 1823

Brazil, e é do nosso interesse; porque qualquer que de Figueiredo e D. Manoela Adelaide Moreira, filhas
seja a resolução que o Brazil tome sobre o do fallecido conselheiro Manoel Moreira de
commercio de escravatura, isso não se fará agora e Figueiredo, em que pedião os meios ordenados, com
mesmo é preciso que se faça com economia. que fôra aposentado seu pai, em remuneração de
Portanto para lá não os devemos mandar. seus serviços: de ordem de S. M. o Imperador
Agora se querem que sejão espalhados por remetto á V. Ex. a mencionada consulta, para que
todas as provincias, bem sei que elles não podem sendo presente na augusta assembléa geral
fazer muito mal: mas eu não sei qual é a opinião constituinte e legislativa do imperio do Brazil, possa
dellas: quanto á minha provincia, desde já digo que esta deliberar sobre aquelle objecto o que fôr
para lá nenhum: dou a razão. Sr. presidente, ha conveniente.
annos que aquella provincia soffre trabalhos com Deus guarde a V. Ex. – Palacio do Rio de
esta gente: puzerão-n'os fóra e os remetterão para Janeiro, em 29 de Agosto de 1823. – José Joaquim
Portugal; de lá tornarão a vir para a Bahia e Carneiro de Campos. – Sr. José Ricardo da Costa
derramaráo o sangue brazileiro: já para o fim fugirão Aguiar de Andrada.
e o mais é que alguns aqui estão empregados. Foi remettido á commissão de fazenda.
Alguns escriptores têm tido o desaccordo de Illm. e Exm. Sr. – Havendo a junta do
publicar que o imperador deu com a constituição de commercio, agricultura, fabricas e navegação dirigido
Portugal por terra: outros escrevem que por á augusta presença de S. M. o Imperador, como lhe
Inglaterra se mandou dar cento e tantos mil cruzados foi determinado por portaria da secretaria de estado
ou cento e tantos contos para o conde de Amarante: dos negocios do imperio, de 19 do corrente mez, as
são falsidades e calumnias; mas o certo é que andão consultas originaes a que se tem procedido sobre os
escriptas e um povo desconfiado pega em tudo. requerimentos de João Gonçalves Duarte Pereira e
Demais chegou á Pernambuco noticia que outros commerciantes desta praça, credores do
tinha ido abaixo a constituição de Portugal: chega a fallecido José Teixeira Mello, com as datas de 21 de
proclamação e portaria d’el-rei mandando que a Julho de 1821, 3 de Agosto de 1822, 1º. de Fevereiro
provincia se reunisse; e os europeus não e 6 de Maio do corrente anno; e por cujas resoluções
escarmentados do muito que têm padecido, forão indeferidos os suplicantes; negando-se-Ihes a
começárão a remexer-se, de sorte que foi preciso prorogação que pedirão na administração dos bens
que se apresentasse o reprehensivel batalhão ligeiro; daquelle fallecido a beneficio do seu embolso: de
mas emfim foi preciso. ordem de S. M. o Imperador remetto á V. Ex. as
Além disso o lord Cochrane manda para alli mencionadas consultas; para que sendo presentes
1,200 soldados prisioneiros e todos armados e na augusta assembléa geral constituinte e legislativa
municiados, recommendando ao governador que os deste imperio, possa esta deliberar sobre aquelle
fizesse desembarcar porque precisava dos vasos. objecto o que fôr conveniente.
Eis-aqui o povo gritando – traição do lord, traição do Deus guarde a V. Ex. – Paço, em 29 de
lord. Agosto de 1823. – José Joaquim Carneiro Campos.
Sr. presidente, a provincia de Pernambuco tem – Sr. José Ricardo da Costa Aguiar de Andrada.
soffrido muito: mandem-se os prisioneiros para onde Foi remettido á commissão de legislação.
quizerem, menos para a minha provincia: declaro em Illm. e Exm. Sr. – Havendo a junta do
nome della que lá não os querem. commercio, agricultura, fabricas e navegação dirigido
Julgou-se afinal discutida a materia e á augusta presença de S. M. o Imperador, como lhe
propondo o Sr. presidente o parecer á votação foi foi determinado por portaria da secretaria de estado
approvado, ficando por isso rejeitadas as emendas. dos negocios do imperio, de 30 de Julho proximo
Propoz depois o additamento do Sr. Duarte – passado, em virtude do officio de V. Ex. de 26 dito,
Foi approvado. as cópias das consultas a que se tem procedido e
O Sr. Secretario Costa Aguiar leu os seguintes que alli existião sobre materia de registros, com as
officios do ministro dos negocios do imperio: datas de 22 de Março e 29 de Julho de 1817, visto
Illm. e Exm. Sr. – Havendo a junta do terem baixado as consultas originaes, sem serem
commercio, agricultura, fabricas e navegação dirigido resolvidas com o destino de se proceder á nova
á augusta presença de S. M. o Imperador, como lhe consulta e formar-se um plano geral sobre aquelle
foi determinado por portaria da secretaria de estado objecto: de ordem de S. M. o Imperador remetto á V.
dos negocios do imperio, de 19 do corrente mez, em Ex. as mencionadas copias para que sendo
virtude do officio de V. Ex. de 18 dito, a consulta presentes á assembléa, geral constituinte e
resolvida sobre o requerimento de D. Henriqueta legislativa deste imperio possa esta deliberar o que
Emilia Moreira lhe parecer justo.
Deus guarde a V. Ex. – Palacio do Rio de
Janeiro, em 29 de Agosto de 1823. – José
Sessão em 30 de Agosto de 1823 207

Joaquim Carneiro de Campos. – Sr. José Ricardo da da entrada das tropas do Ceará e Piauhy nos pontos
Costa Aguiar de Andrada. que guarnecião; sendo de esperar que brevemente
Foi remettido á commissão de fazenda. se declare e triumphe o enthusiasmo patriotico por
Illm. e Exm. Sr. – Havendo a junta do toda a provincia: o mesmo augusto senhor
commercio, agricultura, fabricas e navegação dirigido congratulando-se por tão satisfactorias noticias me
á augusta presença de S. M. o Imperador, como lhe ordena que assim o participe á V. Ex., para que,
foi determinado por portaria da secretaria de estado levando-as ao conhecimento da augusta assembléa
dos negocios do imperio, de 12 do corrente mez, em geral constituinte e legislativa do imperio do Brazil,
virtude do officio de V. Ex. de 6 dito, duas consultas lhe seja constante a actividade com que se acha
já resolvidas á que se mandou proceder e que se felizmente progredindo a causa nacional.
achavão naquelle tribunal sobre colonisação, Deus guarde a V. Ex. – Palacio do Rio de
civilisação e catechisação dos indigenas do Brazil, Janeiro, em 30 de Agosto de 1823. – José Joaquim
com as datas de 8 de Agosto de 1812 e 19 de Carneiro de Campos. – Sr. José Ricardo da Costa
Outubro de 1819: de ordem de S. M. o Imperador Aguiar de Andrada.
remetto á V. Ex. as mencionadas consultas para que, O SR. MONTESUMA: – Eu não sei se sou
sendo presentes na augusta assembléa geral perluxo no que vou a dizer, mas parece-me que esta
constituinte e Legislativa deste imperio, possa esta augusta assembléa não decahia nada da sua
deliberar sobre aquelle objecto o que lhe parecer dignidade em officiar pelo seu secretario ao ministro
conveniente. de estado, como em resposta á este officio,
Deus guarde a V. Ex. – Palacio do Rio de congratulando-se com o governo por tão boa noticia.
Janeiro, em 29 de Agosto de 1823. – José Joaquim Não vejo nisto inconveniente e por isso o proponho á
Carneiro de Campos. – Sr. José Ricardo da Costa consideração da assembléa.
Aguiar de Andrada. O SR. COSTA AGUIAR: – Não me opponho a
Foi remettido á commissão de colonisação e que se faça; mas devo dizer que a pratica é
catechisação dos indios. receberem-se taes noticias com muito especial
Illm. e Exm. Sr. – De ordem de S. M. o agrado; quando ha motivo para congratulação da
Imperador remetto á V. Ex. para ser presente na assembléa com o governo dirige-se uma deputação
augusta assembléa geral constituinte e legislativa á Sua Magestade, porque é esta a fórma digna de
deste imperio as duas consultas inclusas da junta do expressar seus sentimentos.
commercio, agricultura, fabricas e navegação, com O SR. MONTESUMA: – Creio que não póde
as datas de 23 e 26 do corrente mez, nas quaes em haver estylo para noticias desta natureza, porque a
cumprimento das ordens que lhe forão expedidas sua participação é extraordinaria e o estylo fórma-se
pela secretaria de estado dos negocios do imperio, da repetição de actos. Portanto o que se diz não vem
por portaria de 31 de Julho proximo passado a para o caso que é muito particular; lembrei-me de se
mesma junta dá a necessaria informação sobre o expedir officio por ser mais simples sem o apparato
estado actual dos estudos da aula do commercio, de uma deputação.
estabelecida nesta côrte. Decidio-se que ficava a assembléa inteirada, e
Deus guarde a V. Ex. – Palacio do Rio de que recebia a noticia com muito especial agrado.
Janeiro, em 29 de Agosto de 1823. – José Joaquim Chegada a hora da leitura dos pareceres leu o
Carneiro de Campos. – Sr. José Ricardo da Costa Sr. Ribeiro de Rezende, por parte da commissão de
Aguiar de Andrada. poderes, o seguinte:
Foi remettido á commissão de instrucção
publica. PARECER
Illm. e Exm. Sr. – Havendo S. M. o Imperador,
por officio do governo provisorio do Ceará e do juiz Tendo a commissão dos poderes de dar de
de fóra da villa da Parnahyba, recebido a fausta novo o seu parecer sobre a instante supplica que
noticia de se achar a provincia do Piauhy dirige á augusta assembléa o Sr. Joaquim Alves de
inteiramente livre da oppressão de seus inimigos, os Oliveira deputado nomeado pela provincia de Goyaz
quaes pelo denodado esforço daquelles fieis para ser isento de vir tomar assento neste recinto
habitantes e pela generosa cooperação dos da pelas molestias que padece, e que na falta de
provincia do Ceará forão combatidos e de todo professores, dous peritos juramentados declarão em
frustradas as suas perversas tentativas, ficando por um auto de exame ser o mal de engasgar-se quando
tão gloriosas acções firmada alli a independencia e come, um encalhe, e um enfarte no figado, uma
reunida a mesma provincia á integridade do imperio; empigem gallica por toda a região do umbigo, e rins,
e constando igualmente á S M. Imperial que muitas com effusão de materias, e uma grande resicação,
povoações centraes da provincia do Maranhão cujas molestias e impedimento physicos
abraçárão já o systema da independencia por
occasião
208 Sessão em 30 de Agosto de 1823

comprova tambem por meio de uma justificação, e se admittão encontro a respeito de seus debitos.
duas attestações do governador do bispado, e do Dito de 10 do dito mez e anno declarando os
reverendo vigario da freguezia da Meia Ponte: E' de bachareis formados em leis ou em canones
parecer que lhe seja concedida a escuso que pede, e habilitados para os lugares de magistratura, sem
que seja chamado o immediato em votos o Sr. dependencia de leitura.
Antonio José Teixeira de Carvalho, expedindo-se as Dito de 11 de Maio do mesmo anno fixando a
necessárias participações. determinação vaga do alvará de 7 de Janeiro de
Paço da assembléa, 29 de Agosto de 1823. – 1750 relativamente ás roupas, e camas, e outras
Estevão Ribeiro de Rezende. – Manoel Jacintho cousas que se dão aos ministros, a titulo de
Nogueira da Gama. aposentadoria, indo em correição ou diligencia.
Foi approvado. Dito de 17 do mesmo mez e anno extinguindo
O Sr. Carvalho e Mello leu tambem, por parte os juizos de commissões.
da commissão da redacção das leis, o projecto já Dito da mesma data abolindo o estylo das
redigido para a revogação do decreto que creou o tenções em latim.
conselho dos procuradores de provincia. Dito de 25 do mesmo mez e anno abolindo os
privilegios de aposentadoria, assim activa, como
DECRETO passiva, fóra dos casos expressos no mesmo
decreto.
A assembléa geral constituinte e legislativa do Dito de 29 do mesmo mez e anno para se não
imperio do Brazil decreta: assignar com rubricas.
Art. 1º Fica revogado o decreto de 16 de Dito de 9 de Junho facilitando aos devedores
Fevereiro de 1822 que creou o conselho de fiscaes, inculpavelmente impossibilitados de pagar, o
procuradores de provincia. poderem pagar por prestações, ou letras sem
Art. 2º Os cidadãos, que dignamente vencimento de juro.
desempenharão esta commissão, Ievão comsigo as Dito de 28 do dito mez e anno, permittindo a
graças da nação, e seus serviços ficão registrados qualquer o ter escola aberta de primeiras letras, sem
na memoria da patria agradecida. dependencia de exame, ou de alguma licença.
Art. 3º Procuradores das provincias, são Carta de lei de 5 de Julho do mesmo anno
unicamente os seus respectivos deputados em o extinguindo todas as taxas, e condemnações
numero que a constituição determinar. provenientes dellas.
Art. 4º Emquanto a constituição não decretar a Dita de 14 do dito mez e anno declarando o
existencia de um conselho do imperador, são tão decreto de 17 de Maio, que extinguio os juizos de
sómente conselheiros de estado os ministros e commissões.
secretarios de estado, os quaes serão responsaveis Dita de 23 de Agosto do dito anno para se
na fórma das leis. distribuirem por duas secretarias os negocios, que
Paço da assembléa, 29 de Agosto de 1823. – corrião pela secretaria dos negocios do reino.
Luiz José de Carvalho e Mello. – João Severiano Dita de 21 de Outubro do dito anno para que
Maciel da Costa. – Miguel Calmon du Pin e Almeida. os secretarios de estado venção a ordenado de
– Francisco Carneiro de Campos. – José da Silva 4:800$000.
Lisboa. Dita de 12 de Novembro do mesmo anno
Feita a leitura perguntou o Sr. presidente: extinguindo todas as devassas geraes, que a lei
1º Se estava conforme ao vencido. – Decidio- incumbe a certos julgadores.
se que sim. Dita de 19 do mesmo mez e anno, mandando
2º Se a assembléa sanccionava o decreto. – executar o decreto das côrtes que restitue aos
Decidio-se que sim. clerigos e regulares secularisados aquelles direitos
O Mesmo Sr. Deputado leu igualmente, por civicos que são compativeis com o seu estado.
parte da commissão especial, a tabella das leis, que Dita de 28 de Dezembro do mesmo anno
devem ter execução no Brazil, na conformidade do admittindo nas alfandegas as fazendas da Asia
projecto de decreto de 27 de Agosto apresentado na manufacturadas com côres, sejão tecidas, pintadas,
sessão de 28. ou estampas, sem dependencia de virem
despachadas pelas alfandegas de Gôa, Dio e
TABELLA Damão, ou de quaesquer outros portos, além da
Cabo da Boa Esperança.
Decreto de 12 de Março de 1821 extinguindo Dita de 19 de Dezembro do dito anno
todos os ordenados, pensões, gratificações, propinas mandando executar o decreto das côrtes que
e outras quaesquer despezas, que não se acharem determina que os juizes que assignarem por
estabelecidas por lei, ou decreto. vencidos os accordãos possão declarar essa
Dito de 25 do mesmo mez e anno circumstancia.
determinando que aos credores do thesouro publico
Sessão em 30 de Agosto de 1823 209

Paço da assembléa, 30 de Agosto de 1823. – o não propunha; e tanto que se me fosse permittido
Luiz José de Carvalho e Mello. – Francisco Carneiro retiral-o antes da sancção eu pediria licença para o
de Campos. – Manoel Caetano de Almeida e fazer. Quando o offereci a esta assembléa, o fim
Albuquerque. principal que tive em vista foi o bom desempenho
Decidio-se que se imprimisse para ser das funcções de deputado, para o qual concorre o
examinada pelos Srs. deputados. não ter outras que ao mesmo tempo o occupem. Um
Leu-se depois, por parte da commissão de additamento do Sr. Andrada Machado mancou o
legislação, outro projecto tambem já redigido, e projecto e delle procede a antinomia com que sahio
concebido nos termos seguintes: da redacção; como elle está nunca eu darei voto
para a sua sancção.
DECRETO O SR. FRANÇA: – Sr. presidente, tem o
illustre deputado sobeja razão no que diz; e por
A assembléa geral constituinte e legislativa do honra da assembléa entendo que, ou deve ella
Brazil decreta o seguinte: corrigir uma saliente antonomia que eu considero no
Art. 1º Os deputados á assembléa constituinte contexto do art. 4º do decreto combinado com o que
não poderáõ exercer qualquer outro emprego vai disposto no art. 1º; ou que aliás não deve
durante o tempo da sua deputação. sanccionar tal decreto: pois segundo já eu aqui
Art. 2º Não poderáõ outrosim pedir, ou aceitar disse, e não cessarei de repetir, não se precisa nova
graças, e empregos alguns, para, si, ou para outra lei para que se não consintão exercicios de
qualquer pessoa. empregos accumulados, porque ha muito que são
Art. 3º Poderáõ porém aceitar aquelles prohibidos entre nós; e os representantes da nação
empregos, que lhes competirem por lei na sua devendo ser os primeiros e mais exactos
respectiva carreira; e neste caso, ou no de terem observadores das leis existentes, não havia mister
sido promovidos antes da deputação, ainda que não de direito novo para se reputarem comprehendidos
tenhão tomado posse, não serão prejudicados na na disposição dellas.
sua antiguidade. Mas finalmente julgou-se a proposito fazer-se
Art. 4º Exceptuão-se do art 1º os actuaes uma lei regulamentar para elles em particular, e
ministros e secretarios de estado, o intendente geral decretou-se em these que os deputados á
da policia, e aquelles que ora exercem outros assembléa constituinte não poderáõ exercer
empregos não incompativeis. qualquer outro emprego durante o tempo da sua
Paço da assembléa, 29 de Agosto de 1823. – deputação, com excepção sómente dos ministros de
Antonio Rodrigues Velloso de Oliveira. – José estado, e intendente geral da policia actuaes (porque
Teixeira da Fonseca Vasconcellos. – José Antonio tinha a assembléa dispensado pouco antes com elles
da Silva Maia. – João Antonio Rodrigues de ao dito respeito). Ora, se acaso se accrescenta,
Carvalho. – D. Nuno Eugenio de Locio. – Estevão como por emenda do projecto original, e se
Ribeiro de Rezende. – Bernardo José da Gama. sancciona o additamento: – áquelles que ora
O SR. PRESIDENTE: – Por se terem exercem outros empregos não incompativeis – temos
suscitado algumas duvidas se não sanccionou este destruida por esta ampliação toda a doutrina do
projecto quando se ultimou a 3ª discussão; se algum projecto, que se contém na these do art. 1º: e temos
dos senhores quer hoje fallar sobre elle póde fazel-o. demais necessidade de um juiz que julgue em
O SR. HENRIQUES DE REZENDE: – Sr. hypothese dessa compatibilidade ou
presidente, é de absoluta necessidade que se incompatibilidade de exercicio; que eu não sei quem
supprima o art. 1º deste projecto, apezar de se ter haja de ser: de sorte que leva a lei logo á sua
vencido; e foi por isso que se requereu que a nascença o subscripto da sua reprovação, ou da sua
sancção ficasse para depois da redacção. O art. 1º inexecução.
diz que nenhum Sr. deputado poderá exercer algum Além de que a lei não tira aos senhores
outro emprego durante a deputação; o art. 4º diz que deputados os empregos de administração publica
são exceptuados os actuaes ministros de estado, e que têm, ou no exercicio do poder executivo, ou do
os que occupão empregos actualmente. Ora, isto judiciario: suspende-lhe sómente o exercicio
sem duvida destróe toda a disposição do art. 1º e por emquanto estão empregados na legislatura; o que
isso digo que deve principiar esta lei do art. 2º por exige a natureza do emprego. Voto pois que a
diante; o qual ordena que nenhum Sr. deputado sanccionar-se o decreto seja com correcção desta
possa procurar para si nem aceitar empregos antinomia, que torna a lei nulla.
durante o tempo de sua deputação, nem para O SR. CARNEIRO DA CUNHA: – Quando o
alguma outra pessoa. Sr. Andrada Machado propoz este additamento
O SR. ARAUJO VIANNA: – Eu tenho o nunca eu pensei que elle passasse; mas enganei-
desgosto de ser o autor deste projecto; e se antevira me; e firme nos meus principios declarei
a desgraçada sorte que elle havia ter certamente
210 Sessão em 30 de Agosto de 1823

o meu voto na sessão seguinte. Ao mesmo illustre apresentado pelo Sr. Rodrigues Velloso por parte da
autor do additamento eu disse que elle tinha commissão de legislação; mas como tinha dado a
destruido o projecto. Todos os deputados que vêm hora ficou na pasta do Sr. secretario.
para aqui das outras provincias largão por isso os O Sr. Presidente assignou para a ordem do
empregos que lá exercem, de sorte que desta dia: 1º A continuação da discussão sobre a sancção
clausula só se aproveitavão exclusivamente os do do decreto para não poderem exercer outros
Rio de Janeiro; ora, isto é um absurdo manifesto, empregos os deputados da presente assembléa: 2º
que não podia admittir-se, ainda que não houvesse, A 3ª discussão do projecto sobre o modo de passar
como ha, a clara antinomia entre o art. 4º e o 1º. Se cartas aos alumnos da academia medico-cirurgica:
ainda ha remedio é preciso dal-o, para que não 3º Regimento da assembléa.
appareça uma lei em si mesma contradictoria. Levantou-se a sessão ás 2 horas da tarde. –
Ficou adiada a discussão por ter dado a hora. Manoel José de Souza França, secretario.
O Sr. Costa Aguiar participou que ainda havia
outro projecto já redigido, e que fôra

Você também pode gostar