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FENÔMENOS

DE TRASPORTE

Cezar Augusto Schadeck


Propriedades dos fluidos
Objetivos de aprendizagem
Ao final deste texto, você deve apresentar os seguintes aprendizados:

 Caracterizar densidade, gravidade específica (densidade relativa) e


volume específico.
 Comparar fluido newtoniano e fluido não-newtoniano.
 Diferenciar viscosidade cinemática de viscosidade dinâmica.

Introdução
Ao estudar o comportamento de um fluido, é muito importante conhecer
as suas propriedades. Os fluidos tendem a escoar quando sofrem algum
tipo de interação mecânica, e os sólidos tendem a se deformar. Assim, um
fluido é uma substância que se deforma continuamente sob aplicação de
uma tensão de cisalhamento de qualquer que seja a sua magnitude. Por
isso, líquidos, gases e vapor são formas ou fases que os fluidos podem
assumir. Ainda comparando os fluidos com os sólidos, sabe-se que a
relação entre a tensão aplicada e sua deformação correspondente é
chamada de constante de rigidez (ou módulo de elasticidade) de um
sólido. Já para um fluido, a constante de proporcionalidade entre tensão
aplicada e deformação é chamada de viscosidade.
A maioria dos fluidos não possui forma própria, ou seja, eles assumem
a forma do recipiente no qual estão contidos. Dessa forma, é muito
importante que o volume ocupado por um fluido, que acaba sendo seu
próprio volume, seja conhecido. A propriedade que relaciona a massa e
o volume de uma substância é chamada de densidade.
Neste capítulo, você aprenderá a caracterizar densidade, gravidade
específica (densidade relativa) e volume específico, comparar fluidos
newtonianos e não-newtonianos, bem como diferenciar entre viscosi-
dades cinemática e dinâmica. Além disso, propriedades como densidade
e viscosidade de um fluido serão apresentadas.
2 Propriedades dos fluidos

Densidade e volume específico


Macroscopicamente, a matéria é uniformemente distribuída ao longo de uma
região, segundo a hipótese do contínuo (MORAN; SHAPIRO, 2009). Matéria
é tudo aquilo que possui massa e ocupa determinado lugar no espaço, e massa
é uma dimensão fundamental, sendo definida, na mecânica, como a medida
da inércia de um corpo. Assim, a massa específica, ρ, de um corpo pode ser
definida pela equação 1:

(1)

em que V é o volume do que se está analisando, V’ é o menor volume no qual


existe um valor definido para essa razão e m é a massa do corpo.
A massa específica ou massa local de um corpo, comumente chamada de
densidade, é uma propriedade que pode variar em um sistema e está, portanto,
associada a determinado volume e massa de um corpo, conforme mostrado
na equação 2.

(2)

A relação estabelecida para massa específica, de um modo geral, é dada


pela relação entre a massa de um corpo e o volume que ele ocupa em de-
terminado ponto no espaço. De forma simplificada, na equação 3, a massa
específica é definida para volume constante, e sua unidade no SI é kg/m³.
Muitas vezes, a densidade, ou massa específica, de uma substância depende
de duas outras propriedades intensivas: a temperatura e a pressão. A densidade
de um gás qualquer, por exemplo, é diretamente proporcional à sua pressão
e inversamente proporcional à sua temperatura. Já a densidade de líquidos e
sólidos varia muito com sua temperatura e pouco com a pressão (MORAN;
SHAPIRO, 2009).

(3)
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O inverso da massa específica é o volume específico, v, ou seja, o volume por


unidade de massa, de acordo com a equação 4, e que pode variar ponto a ponto.

(4)

A unidade no SI para volume específico é o m³/kg.


A densidade de uma substância pode também ser apresentada de forma rela-
tiva, ou seja, comparada à uma densidade muito conhecida, como, por exemplo,
a densidade da água, que, a 1 atm, varia de 998 kg/m³ a 20ºC até 975 kg/m³ a
75°C (Quadro 1). Quando essa comparação entre densidades é feita, chamamos
a grandeza de densidade relativa, ou gravidade relativa. A densidade relativa
é, então, definida, com base na equação 5, como a razão da densidade de uma
substância qualquer pela densidade de uma substância padrão a uma certa tem-
peratura especificada.

(5)

Para a densidade relativa, DR, na equação 5, tem-se que:


ρ = densidade de uma substância qualquer;
ρH O = densidade de uma substância padrão (normalmente a água).
2

A densidade da água quando comparada a 4°C equivale a ρH O = 1.000 kg/m³.


2
Pelo fato de se tratar de uma comparação entre densidades, a densidade
relativa é uma grandeza adimensional. O Quadro 1 apresenta valores da
densidade relativa de algumas substâncias apresentadas à temperatura de 0°C.
As substâncias que possuem DR menor que 1 são substâncias mais leves
que a água e, portanto, quando colocadas em um recipiente de volume qualquer
contendo água, flutuarão.
O peso específico, y, mostrado na equação 6, representa o peso por unidade
de volume de uma substância e possui unidade de medida no SI, o N/m³.

γ = ρg (6)

Na equação 6, g corresponde à aceleração da gravidade local.


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Quadro 1. Densidade relativa de algumas substâncias a 20°C

Substância DR

Água 1

Óleo Meriam 0,827

Benzeno 0,879

Mercúrio 13,55

Aço 7,83

Gelo (0°C) 0,917

Madeira Balsa 0,14

Gasolina 0,72

Glicerina 1,26

Fonte: Adaptado de Fox et al. (2018).

Frequentemente, a densidade é apresentada pelas unidades g/cm³, ou no


sistema inglês, lb/ft³. E, em determinadas aplicações, as propriedades vistas
podem ser apresentadas em base molar, em substituição à base mássica. Por
exemplo, o volume específico embase molar é dado por:

(7)

em que M é o peso molecular de uma substância, em kg/kmol, no SI.


Quando expresso em base molar, é comum que a representação de volume
específico venha acompanhada de uma barra, , conforme apresentado na
equação 7. A unidade de volume específico em base molar, no SI, é o m³/kmol.

Viscosidade, fluidos newtonianos


e não-newtonianos
A ciência que estuda a deformação, o fluxo da matéria e a viscosidade é cha-
mada reologia. A viscosidade é uma propriedade que confere resistência à
deformação por cisalhamento, impedindo o movimento de um fluido; é o atrito
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dos fluidos. As tensões de cisalhamento surgem em decorrência do escoamento


viscoso em um fluido, e, devido a essas tensões, os fluidos experimentam uma
taxa de deformação (FOX et al., 2018).
Observe o comportamento de um elemento fluido na Figura 1. As duas
placas planas e paralelas estão em repouso em um determinado tempo, t, e,
entre elas, escoa um fluido. Logo em seguida, um elemento de força, dF, é
aplicado de forma constante para a direita sobre a placa, arrastando-a através
do fluido a uma velocidade dV. Surgem tensões devido ao cisalhamento relativo
da placa ao fluido, definidas pela equação 8:

(8)

em que dAy é a área de contato do fluido com a placa na da direção do eixo y,


dFx é a força exercida pela placa sobre o fluido na direção do eixo x e τyx é a
tensão de cisalhamento da placa sobre o fluido. Quando não há movimento,
não há tensão de cisalhamento agindo em um fluido.
A deformação do fluido ocorre das posições AC para A’C e de BD para B’D,
em um intervalo de tempo qualquer, e são devidas à tensão de cisalhamento da
placa. Veja a Figura 1.

Figura 1. Elemento fluido com aplicação de força sobre uma placa plana.

A taxa de deformação do fluido é dada em função da sua velocidade pela


relação , fazendo o fluido escoar. Os fluidos em que a taxa de deformação
é diretamente proporcional à tensão de cisalhamento τyx são conhecidos
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como fluidos newtonianos, e, quando a taxa de deformação não é pro-


porcional à tensão de cisalhamento do fluido τyx, são chamados de fluidos
não-newtonianos e possuem viscosidade variável, conforme a velocidade é
alterada (BRUNETTI; 2008).

Viscosidade dinâmica e viscosidade cinemática


A viscosidade dinâmica, ou viscosidade absoluta, é o coeficiente de propor-
cionalidade entre a tensão de cisalhamento e o gradiente de velocidade (taxa
de deformação). Seu significado físico é a propriedade do fluido da qual ele
oferece resistência às tensões de cisalhamento. Já a viscosidade cinemática
é uma combinação da viscosidade dinâmica com a densidade de um fluido.
A constante de proporcionalidade entre tensão de cisalhamento e taxa de defor-
mação de um fluido, chamada de viscosidade absoluta, μ, de um fluido, é definida
pela lei de Newton da viscosidade, de acordo com equação 9 (BRUNETTI; 2008).

(9)

Quando se deseja obter deformação elástica – ou recuperável – em um sólido, basta


aplicar sobre ele tensões normais (tração ou compressão) ou de cisalhamento. Em
fluidos, quando são aplicadas tensões de cisalhamento, também ocorrem deformações,
por isso eles são chamados de viscosos, ao passo que os sólidos são chamados de
elásticos. O comportamento viscoelástico é atribuído a materiais combinados com
características de um sólido e um fluido (FOX et al., 2018).

A relação entre viscosidade absoluta, μ, e densidade, ρ, é chamada de


viscosidade cinemática, v, dada pela equação 10. Os escoamentos nos quais
as variações de densidade são desprezíveis são denominados escoamentos
incompressíveis. Se houver variação na densidade, o escoamento é tido como
compressível. (FOX et al., 2018).

(10)
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No sistema SI, a unidade de viscosidade é o μ [Pa ∙ s], pascal vezes segundo,


ou, ainda, o quilograma por metro vezes segundo kg/(m ∙ s).
Os fluidos mais comuns, como água, gasolina e ar, são newtonianos em con-
dições normais. Quanto mais difícil for agitar um fluido, maior será a sua visco-
sidade. Por exemplo, é muito mais difícil agitar óleo de cozinha no interior de um
recipiente do que agitar água. Portanto, o óleo de cozinha é mais viscoso do que a
água. Entretanto, a viscosidade cinemática, por ser relacionada à densidade de um
fluido, tem como unidade o stoke (1 stoke = 1 m²/s), no SI. O Quadro 2 apresenta
valores de viscosidade absoluta de alguns fluidos a uma temperatura conhecida.

Quadro 2. Viscosidade absoluta em função da temperatura

Coeficiente de
Substância Temperatura [°C]
viscosidade [Pa ∙ s]

Água 20 0,001

Água 100 0,28 × 10 -3

Sangue 37 0,003 a 0,004

Plasma 37 0,0015

Ar 20 0,018 × 10 -3

Glicerina 30 0,612

Fonte: Adaptado de Fiolhais et al. (2017).

Veja o que dizem Fox et al. (2018):

Dois exemplos comuns de fluidos não newtonianos são o creme dental e


a tinta. A tinta é bastante ‘espessa’ no interior da lata, mas torna-se ‘fina’
quando espalhada por um pincel. O creme dental comporta-se como um fluido
quando espremido do tubo. Contudo, o creme não escorre por si só quando
a tampa é removida. Há um limite de tensão abaixo do qual o creme dental
comporta-se como um sólido. Nossa definição de fluido é válida apenas para
materiais cuja tensão limítrofe é igual a zero. Os fluidos não newtonianos
são geralmente classificados como tendo comportamento independente ou
dependente do tempo.
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Uma placa plana tem velocidade constante de 0,3 m/s. A placa está posta sobre uma
superfície contendo um fluido com viscosidade igual a 0,0065 g/cm ∙ s. A distância
entre a placa e a superfície é de 0,3 mm, que corresponde à espessura preenchida
pelo fluido. Pede-se calcular:
a) a viscosidade do líquido em N ∙ s/m2;
b) a tensão de cisalhamento na placa superior em Pa.

Solução:
a) A viscosidade foi dada em g/cm ∙ s, basta fazer as conversões para a unidade desejada:

b) Aplicando a equação 9, para velocidade constante, temos:

Como todas as unidades já estavam no SI, exceto a distância entre a placa e a super-
fície, foi necessário converter 0,3 mm para metros (0,0003 metro).
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BRUNETTI, F. Mecânica dos fluidos. 2. ed. São Paulo: Pearson Prentice Hall, 2008.
FIOLHAIS, C. et. al. Novo 12 F: física 12° ano – Manual. Alfragide: Textos Editores, 2017.
FOX, R. W. et al. Introdução à mecânica dos fluidos. 9. ed. São Paulo: LTC, 2018.
MORAN, M. J.; SHAPIRO, H. N. Princípios de termodinâmica para engenharia. 6. ed. São
Paulo: LTC, 2009.

Leitura recomendada
ÇENGEL, Y. A.; BOLES, M. A. Termodinâmica. 7. ed. Porto Alegre: AMGH, 2017.
HALLIDAY, D.; RESNICK, R.; WALKER, J. Fundamentos de física: mecânica. 9. ed. São Paulo:
LTC, 2012.
IBM. Unidades de medida e fatores de conversão. [201-?]. Disponível em: https://www.
ibm.com/support/knowledgecenter/pt-br/SSLKT6_7.6.0.9/com.ibm.mbs.doc/mbs_
common/c_measurement_units_conversion_factors.html. Acesso em: 25 fev. 2019.
POTTER, M. C.; SOMERTON, C. W. Termodinâmica para engenheiros. 3. ed. Porto Alegre:
Bookman, 2017.

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