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Audiologia
Clínica
2 Fonoaudiologia Prática
Deficiência Auditiva 3
1
Deficiência Auditiva
CLASSIFICAÇÃO
As perdas de audição podem ser classificadas segundo a sua
localização topográfica (condutivas, sensorioneurais, mistas, cen-
trais e funcionais) ou conforme sua expressão clínica (hipoacusia,
disacusia, surdez e anacusia).
FIGURA 1.1 – Corte das três orelhas (externa, média e interna) com a limitação topográfica das lesões
fundamentais: condutivas, sensoriais e neurais.
6 Fonoaudiologia Prática
DEFINIÇÕES
É fundamental o conhecimento adequado dos termos empre-
gados para exprimir as várias formas de deficiência auditiva, a fim
de evitar confusões, especialmente numa área onde a maioria dos
termos é de conceituação recente e em função do emprego de
novas técnicas de semiologia. Foi HALLOWELL DAVIS, em seu livro
HEARING AND DEAFNESS, quem procurou definir de modo correto
estes termos.
Hipoacusia
A hipoacusia expressa uma diminuição na sensitividade da
audição. Há uma diminuição dos limiares auditivos sem, no
entanto, expressar qualquer alteração da qualidade da audição.
Assim sendo, na hipoacusia o paciente escuta menos os sons
menos intensos, mas, com o aumento da intensidade da fonte
sonora, ele poderá escutar de modo bastante adequado. As
perdas de audição relativas à hipoacusia são expressas em
decibels, nas curvas audiométricas. Para DAVIS a hipoacusia se
inicia quando a perda de audição é maior que 27 dB NA na média
das freqüências da fala e vai até 92 dB NA.
Disacusia
A disacusia expressa um defeito na audição. Defeito este que
não pode ser expresso em decibels. Nela, as alterações da
discriminação auditiva são as responsáveis pela qualidade da
audição. Nestes pacientes, mesmo que se aumente a intensidade
Deficiência Auditiva 7
Surdez
A palavra surdez tem sido empregada para designar qual-
quer tipo de perda de audição, parcial ou total. Recentemente,
a surdez adquiriu novo significado. Surdo é um termo muito forte
e depreciativo da condição do indivíduo, daí a tendência atual
em utilizar “deficiência auditiva” em seu lugar. Concordamos
com D AVIS, quando procura dar à palavra surdez uma definição
mais precisa. Em inglês deafness tinha o mesmo significado que
surdez, sendo substituída mais recentemente por hard of hearing,
e deafness passou a significar perda de audição profunda, isto
é, quando a média das três freqüências da fala é maior que 93
dB NA.
Surdez significa audição socialmente incapacitante. O surdo
é incapaz de desenvolver a linguagem oral, evidentemente por-
que não a ouve. Os limiares auditivos destes pacientes são de tal
forma elevados, que não conseguem escutar o som de modo
adequado. Escutam ruídos, mas não sons. As perdas de audição
são maiores que 93 dB nas freqüências de 500, 1.000 e 2.000 Hz
(como sugere DAVIS).
Anacusia
Literalmente significa falta, ausência de audição. É diferente
de surdez, onde há resíduos auditivos. Na anacusia, o comprome-
timento do aparelho auditivo é de tal ordem que não há nenhuma
audição.
AVALIAÇÃO DA AUDIÇÃO
A avaliação da função auditiva pode ser feita através de vários
testes que nos informam sobre a sua origem, localização, qualida-
de, evolução, prognóstico, etc. Os testes mais empregados são os
8 Fonoaudiologia Prática
• Diapasões.
• Audiometria tonal.
• Discriminação auditiva.
• Imitanciometria.
• Audiometria automática de Békésy.
• Teste de Fowler.
• Teste SISI.
• Teste tone decay.
• Audiometria de tronco cerebral.
• Eletrococleografia.
• Emissão otoacústica.
Zumbidos
Nas deficiências auditivas condutivas, os pacientes podem
apresentar queixa de zumbidos. Costumam compará-los com
ruídos de tonalidade grave como cachoeira ou ruído das ondas do
mar. Nas sensorioneurais relatam como sendo semelhante a uma
cigarra ou um apito, etc.
Falar baixo
Os condutivos, quando bilaterais, costumam falar baixo. Eles
escutam bem a própria voz (têm audição pela via óssea conservada)
e, quando falam, baixam propositadamente a voz, pois a escutam
por via óssea e não podem controlar seu volume de modo adequado.
Deficiência Auditiva 9
Paracusias
Muitos pacientes apresentam alguns fenômenos interes-
santes, denominados de paracusia. Isto é, em presença de
ruído ambiental escutam melhor que em ambientes silenciosos.
No ruído, as pessoas tendem a aumentar o volume de sua voz,
ultrapassando os limiares da perda auditiva e assim os deficien-
tes auditivos escutam melhor, constituindo a denominada
paracusia de Willis. Quando mastigam, pelo fato de escutarem
o ruído da mastigação, os hipoacúsicos escutam pior. Esta é
denominada paracusia de Weber.
Rinne negativo
Aos testes de diapasão apresentam Rinne negativo na orelha
comprometida, ou em ambas quando bilateral. Quando unilate-
rais, o Weber lateraliza para o lado pior e quando bilaterais o
Weber é central. O teste de Schwabach é prolongado na orelha
condutiva e o Friedreich é mais ouvido no trago.
Discriminação
Como assinala DAVIS, a discriminação nas orelhas condutivas
é sempre 100% e quando houver algum comprometimento da
discriminação haverá sempre algum componente sensorioneural.
Perda máxima de 60 dB NA
O gap máximo que poderá ser encontrado é de 60 dB NA. O
encontro de diferenciais maiores entre as vias aérea e óssea,
certamente correrá por conta de algum erro na execução da
audiometria tonal.
• Critérios de certeza
Os seguintes achados são considerados como critérios de
certeza para o diagnóstico de uma hipoacusia:
Sensorioneurais
Características gerais
Voz alta (quando bilateral) é uma característica importante,
pois nos condutivos bilaterais a tendência é inversa. Quanto maior
a perda auditiva, maior a tendência de elevar o volume da voz.
Esta apresenta-se distorcida nas perdas mais severas, pela
impossibilidade do paciente ouvir a própria voz. Em crianças,
quando a deficiência surge após o aprendizado, a tendência é a
progressiva redução da qualidade vocal, enquanto que, quando
pré-aprendizado, a tendência é de não haver desenvolvimento da
palavra falada.
O zumbido é de tonalidade mais aguda, comparado a uma
cigarra ou um apito intermitente ou não e que se acentua no
silêncio, especialmente à noite, dificultando o sono. O próprio
zumbido pode dificultar o entendimento da palavra, agravando
ainda mais o problema. Não costuma responder à terapia habi-
tualmente empregada e tem uma tendência a diminuir com o
tempo (muitos pacientes se habituam e acabam por ignorá-lo).
Há ausência de gap, ao contrário das condutivas. A curva
aérea tende a acompanhar a via óssea, quer nos graves ou nos
Deficiência Auditiva 17
Características
Quando a perda de audição apresenta características
condutivas e sensorioneurais, diz-se que é mista. Pode se iniciar
como condutiva, como na otosclerose, otites crônicas e evoluir
com características sensorioneurais causadas pela mesma etio-
logia inicial ou por outra causa associada. O inverso é muito difícil
de acontecer, isto é, iniciar como sensorioneural e evoluir com
características condutivas.
Deficiência Auditiva 23
Características
As emissões otoacúticas podem ser encontradas com am-
plitudes dentro da normalidade, e no teste de BERA não encon-
tramos respostas.
Limiares auditivos normais – Os limiares audiométricos,
quando possível de ser obtidos, estarão nos limites da normalidade.
Discriminação muito ruim – A complexidade da comunicação
verbal faz com que as maiores dificuldades estejam na inteligibili-
dade das palavras, na impossibilidade da codificação da linguagem
e da imagem auditiva. Estes pacientes não interpretam mensagens
complexas, podendo, no entanto, obedecer ordens simples.
Comprometimentos neurológicos – São muito significati-
vos, impedindo uma adequada avaliação destes pacientes. Nesta
24 Fonoaudiologia Prática
Características
Sendo funcionais e não havendo lesão orgânica, os testes
objetivos revelam-se absolutamente normais. Os problemas emo-
cionais, como ansiedade neurótica, conflitos de personalidade e
histeria, costumam ser causas freqüentes. Pacientes que simulam
perdas de audição, com determinadas finalidades, também podem
aqui ser englobados. Costumam ser de início súbito, apresentando
flutuações da audição com curvas audiométricas inconsistentes.
Diagnóstico instrumental – O diagnóstico destas deficiências
auditivas só poderá ser feito utilizando-se testes especiais (Stenger),
ou mesmo métodos objetivos como imitanciometria, eletrococleo-
grafia, audiometria de tronco cerebral e emissões otoacústicas.
Leitura recomendada
DAVIS, H. & SILVERMAN, S. R. – Hearing and Deafness . 4ª ed. New
York, Holt, Rinehart & Wilson, 1978.
DELK, J. – Comprehensive Dictionary of Audiology. Iowa, The Hearing
Aid Journal, 1974.
HUNGRIA, H. – Otorrinolaringologia. 6ª ed. Rio de Janeiro, Guanabara
Koogan, 1991.
KEITH, R. W. & PENSAK, M. L. – Central auditory function in clinical
audiology. Otol. Clin. N. Amer., 24:2, 1991.
LOPES FILHO, O. et al. – The early diagnosis of a glomic tumor in the
middle ear by means of acoustic impedance. Imp. News Letter,
1(5):1972.
LOPES FILHO, O. et al. – Produtos de distorção das emissões
otoacústicas. Rev. Bras. Otorrinol. , 61(6):485-494, 1995.
LOPES FILHO, O. et al. – O estudo comparativo entre a emissões
otoacústicas transitórias e produtos de distorção em recém nasci-
dos de berçário. Caderno de Otorrinolaringologia. A Folha Médica,
112 (Supl.1): p. 85, 1996.
LOPES FILHO, O. et al. – Emissões otoacústicas transitórias e produtos
de distorção na avaliação da audição em recém-nascidos com
poucas horas de vida. Rev. Bras. ORL, 62(3):220-228, 1996.
PORTMANN, M. & PORTMANN, C. – Audiometria Clínica. Toray-
Mason, Barcelona, 1967.
RINTELMANN, W. F. et al . – Pseudohypacusis in clinical audiology. Otol.
Clin. N. Amer., 24:2, 1991.
SATALOFF, J. – Hearing Loss. Philadelphia, J. B. Lipincot Co., 1966.
Perda Auditiva de Origem Genética 25
2
Perda Auditiva de Origem
Genética
Lídio Granato
Carla Franchi Pinto
Maristela de Queiróz Ribeiro
I
1 2
II
1 2 3 4 5
III
1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 12 13 14 15
IV ?
1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 12 13 14 15 16 17 18 19 20 21 22 23 24 25 26 27 28
FIGURA 2.1 – Heredograma de uma genealogia hipotética (cortesia do Prof. Dr. BERNARDO BEIGUELMAN).
Perda Auditiva de Origem Genética 27
Anomalias cromossômicas
O cariótipo, ou seja, a constituição cromossômica de um
indivíduo normal é constituído de 23 pares de cromossomos (cada
par formado por um cromossomo de origem materna e outro de
origem paterna). Vinte e dois pares de cromossomos são seme-
lhantes em ambos os sexos e são chamados autossomos. O par
restante constitui os cromossomos sexuais . Os cromossomos
foram convencionalmente reunidos em 7 grupos (de A até G) de
acordo com o seu tamanho e com a posição de sua constrição
28
1 2 3 4 5
6 7 8 9 10 11 12 X
13 14 15 16 17 18
19 20 21 22 Y
FIGURA 2.2 – Cariótipo com bandamento G de um homem normal (46,XY) (cortesia do Serviço do Prof.
Dr. WALTER PINTO JÚNIOR).
Perda Auditiva de Origem Genética 29
1 2 3 4 5
6 7 8 9 10 11 12 X
13 14 15 16 17 18
19 20 21 22
FIGURA 2.3 – Cariótipo com bandamento G de uma mulher normal (46,XX) (cortesia do Serviço do Prof.
Dr. WALTER PINTO JÚNIOR).
1 2 3 4 5
6 7 8 9 10 11 12 X
13 14 15 16 17 18
19 20 21 22
A
14 14⁄21 21
1 2 3 4
FIGURA 2.5 – Esquema representativo da gametogênese de um indivíduo com cariótipo 45,XX ou XY,
t(Dq21q) e do resultado da união dos gametas desse indivíduo com os de um indivíduo normal. A)
Cromossomos das gônias. B) Cromossomos dos gametas. C) Cromossomos dos zigotos. 1. Com
cariótipo normal. 2. Com a translocação robertsoniana. 3. Com a trissomia funcional do cromossomo
21, que determina a síndrome de Down. 4. Com monossomia do cromossomo 21 que, em geral,
determina inviabilidade (cortesia do Prof. Dr. BERNARDO BEIGUELMAN).
Perda Auditiva de Origem Genética 31
II
III
2 2 2
IV
FIGURA 2.6 – Heredograma de uma genealogia com padrão de herança autossômica dominante
(cortesia do Prof. Dr. BERNARDO BEIGUELMAN).
II
III
II 2 2
III 9 2 2
IV 4 4 2 5 2 2 6 2
FIGURA 2.7 – Heredogramas de duas genealogias com padrão de herança autossômica recessiva
(cortesia do Prof. Dr. BERNARDO BEIGUELMAN).
34
I
1 2
II
1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 12
III 2 2 2
1 2 3 6 7 8 11 12 13 14 15 16 19 20 21 22
4-5 9-10 17-18
FIGURA 2.8 – Heredograma de uma genealogia com padrão de herança dominante ligada ao X. As
mulheres portadoras apresentam quadro clínico mais brando (cortesia do Prof. Dr. BERNARDO
BEIGUELMAN).
II
III 3
IV
2 2 3 2 2
V
FIGURA 2.9 – Heredograma de uma genealogia com padrão de herança recessiva ligada ao X (cortesia
do Prof. Dr. BERNARDO BEIGUELMAN).
Congênita
A maior parte dessas perdas são de natureza sensorioneural,
decorrentes de alterações estruturais e(ou) funcionais do ouvido
interno, de forma que apenas o estudo histopatológico é capaz de
identificar o local da lesão primária que compromete a parte óssea
ou membranosa do labirinto, mas podem resultar de alterações
dos centros corticais cerebrais.
Vários estudos da Biologia Molecular têm analisado famílias de
deficientes auditivos na tentativa de identificar a localização dos
genes responsáveis pela perda auditiva. A identificação desses
genes e de seus produtos permitirá maior compreensão da fisiologia
e da fisiopatologia da audição, além de possibilitar o diagnóstico pré-
natal da deficiência auditiva, um tratamento específico para cada
tipo de deficiência e, futuramente, a terapia gênica.
STEEL & BOCK (1983), baseando-se em modelos animais,
propuseram uma classificação das deficiências auditivas genéti-
cas congênitas em três categorias: morfogenéticas, neuroepite-
liais e cocleossaculares.
As alterações da morfogênese incluem defeito ósseo e
membranoso do ouvido interno. As alterações do labirinto
Perda Auditiva de Origem Genética 37
Tardia
Enquanto as deficiências auditivas congênitas de etiologia
genética são resultantes de fenômenos de aplasia, aquelas que
aparecem após o nascimento apresentam degeneração progres-
siva do órgão de Corti, que já estava totalmente desenvolvido.
As principais deficiências auditivas isoladas tardias são doen-
ça sensorioneural progressiva familial, otosclerose e presbiacusia.
A doença sensorioneural progressiva familial, por apresentar
início insidioso, exige maiores cuidados na anamnese e valoriza-
ção dos antecedentes familiais para que o clínico afaste uma série
de diagnósticos diferenciais. Essa anomalia acomete crianças na
pré-puberdade ou adolescentes e progride, com gravidade, na
idade adulta. Freqüentemente essa doença é confundida com a
otosclerose coclear, guardando com ela muitas semelhanças.
Segundo PAPARELLA (1973), o estudo do osso temporal mostra
ausência do órgão de Corti e degeneração do gânglio espiral,
ambas alterações na porção basal da espira coclear, além de
degeneração irregular da estria vascular.
Na espécie humana, a incidência de perda da audição aumen-
ta progressivamente após os 55 anos de idade, pela interação de
fatores genéticos e ambientais. CAMP e cols. (1995) estudando
uma família alemã, na qual a deficiência auditiva com início em
altas freqüências tinha padrão dominante, concluíram que ela
deve ter sido causada por um gene localizado no cromossomo 7.
Antes de finalizar este tópico, parece-nos oportuno tecer
algumas considerações sobre genocópias e fenocópias. Genes
diferentes que determinam heredopatias aparentemente idênti-
cas são chamados genocópias. Exemplo clássico é o que ocorre
com a deficiência auditiva de etiologia autossômica recessiva.
Alguns casais de deficientes auditivos, pertencentes a famílias
diferentes, geram todos os filhos com audição normal, ao invés de
todos deficientes, como era de se esperar. A explicação plausível
é que, nesse caso, a deficiência auditiva do cônjuge feminino foi
determinada por um gene autossômico (a ) diferente daquele que,
em homozigose, produziu a deficiência auditiva no cônjuge mas-
culino (b). Assim, o cônjuge feminino tem constituição genotípica
aaBB, e o cônjuge masculino, AAbb. Dessa união, todos os filhos
serão duplos heterozigotos (AaBb) e, portanto, portadores dos
genes da deficiência auditiva, porém nenhum será afetado.
Perda Auditiva de Origem Genética 39
Síndrome de Waardenburg
É uma anomalia com padrão de herança autossômica domi-
nante, cujos genes mutantes responsáveis já foram localizados,
permitindo o diagnóstico pré-natal para casais de risco. Esses
genes apresentam alta penetrância e expressividade variável, o
que quer dizer que, quando presentes, os genes mutantes quase
sempre se manifestam, porém, a intensidade do quadro clínico
entre seus portadores é muito variável. Essa anomalia apresenta
três formas clínicas. No Tipo I (Fig. 2.10), os pacientes apresen-
tam deficiência auditiva sensorioneural uni ou bilateral, epicanto,
deslocamento lateral do canto interno dos olhos, heterocromia ou
bicromia de íris, faixa branca no cabelo, que pode aparecer com
qualquer idade, e alteração da pigmentação da pele (cerca de
A B
A B
Síndrome de Klippel-Feil
A fusão de vértebras cervicais é o único sinal constante
dessa anomalia e determina, clinicamente, pescoço curto com
limitação da movimentação e implantação baixa de cabelos na
nuca (Fig. 2.13). As fusões vertebrais podem ocorrer também
na coluna torácica e lombar, além de serem freqüentes hemivér-
tebras e spina bifida. Malformação de vias urinárias, agenesia
renal unilateral, hipospadia, alterações oculares, fenda palati-
na, anomalias do ouvido médio e atresia do conduto auditivo
externo são achados comuns. A perda auditiva, quando presen-
te, é do tipo sensorioneural, condutiva ou mista.
Vários casos foram descritos como tendo ocorrência esporá-
dica, porém o estudo de famílias mostrou que a síndrome de
Klippel-Feil pode manifestar-se com padrão de herança autossô-
mica dominante ou recessiva. Por essa razão, o estudo minucioso
42
A B
FIGURA 2.13 – Síndrome de Klippel-Feil. A) Pescoço curto devido à fusão das vértebras cervicais. B)
Pescoço curto, anomalia de ouvido externo e pavilhão.
Síndrome de Duane
Caracteriza-se pela alteração da movimentação ocular, com
dificuldade para aduzir ou abduzir os olhos, estreitamento da
fenda palpebral e retração do globo ocular à adução do olho.
Outros achados incluem torcicolo, costela cervical e a perda
auditiva condutiva (Fig. 2.14).
A maioria dos casos parece ser esporádica, sendo que apenas
5 a 10% apresentam recorrência familial. Quando associada à
síndrome de Klippel-Feil e na presença de deficiência auditiva, o
padrão de herança é autossômica dominante.
A B
FIGURA 2.14 – Síndrome de Duane. Pálpebra estreita, estrabismo com inabilidade para abduzir os
olhos. A) Antes da cirurgia para correção do estrabismo e da timpanotomia exploradora. B) Correção
do estrabismo e recuperação da perda condutiva da audição com fechamento do gap aéreo-ósseo.
Perda Auditiva de Origem Genética 43
A B
FIGURA 2.15 – Síndrome de Treacher Collins. A) Fenda palpebral antimongolóide com defeito na
pálpebra inferior, hipoplasia da mandíbula e do zigomático. B) Agenesia do conduto auditivo externo.
Ouvido interno normal.
A B C
Síndrome de Usher
É uma anomalia autossômica recessiva que se caracteriza por
retinite pigmentosa associada a deficiência auditiva congênita
sensorioneural grave (Fig. 2.19).
De acordo com GORLIN e cols. (1979), a síndrome de Usher
pode ser classificada clinicamente em quatro subgrupos:
Tipo I – Ausência de função vestibular, deficiência auditiva
congênita profunda e início da retinose pigmentar aos 10 anos de
idade. Constitui quase 90% dos casos.
Tipo II – Função vestibular normal ou diminuída, queda da
audição em altas freqüências e retinose pigmentar de início na
adolescência ou por volta dos 20 anos. Constitui quase 10% dos
casos.
Tipo III – Disfunção vestibular, perda progressiva da audição,
retinose pigmentar iniciando na puberdade ou após décadas. É
responsável por 1% dos casos.
Tipo IV – Único com padrão de herança recessiva ligada ao
sexo, sendo o fenótipo semelhante ao Tipo II.
A síndrome de Usher determina perda progressiva da visão,
de forma que, até o final da segunda ou terceira década de vida,
estão completamente cegos. Por essa razão, os pacientes devem
ser orientados e treinados para que estejam adaptados antes da
perda completa da visão.
46
Síndrome de Hurler
Também conhecida como mucopolissacaridose tipo I, é um
erro inato do metabolismo, de etiologia autossômica recessiva,
na qual o defeito primário é a deficiência de uma enzima
lisossômica, a alfa-L-iduronidase, responsável pela degradação
dos glicosaminoglicanos, sulfato de heparan e sulfato de
dermatan. O quadro clínico resulta do acúmulo de mucopolissa-
carídeos nos tecidos. Os pacientes apresentam face progressi-
vamente grosseira, macrocefalia, lábios grossos, macroglossia,
dentes afastados, cabelos grossos, abdome proeminente, ore-
lha de implantação baixa, hipertelorismo, prega epicântica,
turvação da córnea, hepatoesplenomegalia, baixa estatura e
involução do desenvolvimento neuropsicomotor (Fig. 2.20). A
mucosa do ouvido médio apresenta células grandes esponjo-
sas, chamadas células gargóilicas, que se coram pelo PAS. O
diagnóstico pré-natal é possível por intermédio da dosagem da
alfa-L -iduronidase em cultura de amniócitos.
Síndrome de Hunter
É conhecida como mucopolissacaridose tipo II, causada pela
deficiência da sulfatase de iduronato, com excesso de sulfato de
dermatan e sulfato de heparan. O quadro clínico é semelhante ao
descrito para a síndrome de Hurler, diferindo apenas pela ausência
de opacidade de córneas, por apresentar uma evolução mais lenta
e pelo padrão de herança recessiva ligado ao sexo, comprometendo
apenas indivíduos do sexo masculino (Fig. 2.21).
Síndrome de Alport
A síndrome de Alport é responsável por 1% das perdas auditivas
hereditárias (Fig. 2.22), caracterizando-se pela associação de perda
auditiva sensorioneural e glomerulonefrite. A deficiência auditiva é
bilateral e simétrica, desenvolve-se nos primeiros anos de vida e
afeta principalmente as freqüências mais agudas. As provas calóri-
cas mostram hipofunção vestibular. Histologicamente, há degene-
ração do órgão de Corti e da estria vascular.
A nefrite é progressiva, com hematúria e proteinúria que se
iniciam na primeira ou segunda década de vida.
Alterações oculares, como lenticone, esferofaquia e catarata
estão presentes em 15% dos pacientes.
Na maioria das famílias com a síndrome de Alport, o padrão de
herança é dominante ligado ao X, e por essa razão, as mulheres
Síndrome de Goldenhar
Trata-se de uma associação de malformações que resultam de
defeitos na morfogênese do primeiro e segundo arcos branquiais,
freqüentemente associados a anomalias oculares e vertebrais. Os
pacientes apresentam hipoplasia da região malar e maxilar, assime-
tria facial, macrostomia, microtia, apêndices pré-auriculares, ano-
malia do ouvido médio, podendo haver deficiência auditiva do tipo
condutivo, diminuição da secreção da parótida, hemivértebras,
dermóide epibulbar, além de malformações cardíacas e genituriná-
rias (Fig. 2.23). A deficiência mental está presente em cerca de 13%
dos casos. Ocasionalmente, pode haver malformação do ouvido
interno com deficiência auditiva do tipo sensorioneural. A etiologia
é desconhecida, sendo a maioria dos casos esporádica. O risco de
recorrência da anomalia para parentes em primeiro grau do afetado
é aproximadamente 2%. Raros casos foram descritos compatíveis
com herança autossômica dominante.
Síndrome de Möbius
A síndrome de Möbius é caracterizada por paralisia do VI e do
VII pares cranianos, com conseqüente amimia. Pode haver para-
lisia de outros pares de nervos cranianos, além de estrabismo,
micrognatia e deformidades do pavilhão auricular e do conduto
auditivo externo (Fig. 2.24). Essa síndrome tem ocorrência fami-
lial, sendo que, em algumas genealogias, é compatível com
padrão de herança autossômica dominante. Quando associada a
malformação reducional de membros, é conhecida como seqüên-
cia de Möbius e tem ocorrência esporádica. Acredita-se que seja
decorrente de fenômenos isquêmicos ocorridos no feto.
Perda Auditiva de Origem Genética 49
A B
FIGURA 2.24 – Síndrome de Möbius. A) Diplegia facial. B) Deformidade de pavilhão.
1 2 3 4 5
6 7 8 9 10 11 12 X
13 14 15 16 17 18
19 20 21 22
A B
FIGURA 2.26 – Síndrome de Down (trissomia do 21). A) Fenda palpebral oblíqua para cima, hipotonia
e dismorfismos característicos da síndrome. B) Cariótipo de uma mulher com síndrome de Down,
47,XX,+21.
A B
1 2 3 4 5
6 7 8 9 10 11 12 X
13 14 15 16 17 18
19 20 21 22
C
FIGURA 2.27 – Síndrome de Edwards (trissomia do 18). A) Criança com microcefalia, implantação baixa
do pavilhão auricular, fendas palpebrais curtas, microstomia. B) Dedo “em gatilho”. C) Cariótipo de uma
mulher com síndrome de Edwards, 47,XX+18.
52
A C
1 2 3 4 5
6 7 8 9 10 11 12 X
13 14 15 16 17 18
19 20 21 22
B D
FIGURA 2.28 – Síndrome de Patau (trissomia do 13). A) Recém-nascido com fenda palatina e labial,
com proeminência da pré-maxila. B) Múltiplas anomalias incluindo micrognatia. C) Microftalmia. D)
Cariótipo de uma mulher com síndrome de Patau, 47,XX,+13.
Perda Auditiva de Origem Genética 53
De cromossomos sexuais
Síndrome de Turner
A síndrome de Turner (45,X) caracteriza-se pela monossomia
do cromossomo X na ausência de cromossomo Y. Cabe ressaltar
que a monossomia do cromossomo Y, na ausência de cromossomo
X, é incompatível com a vida. Os pacientes freqüentemente apre-
sentam ao nascimento sinais sugestivos dessa alteração, como
baixa estatura, linfedema transitório de pés e mãos, fendas palpe-
brais antimongolóides, orelhas discretamente rotadas para trás,
pele redundante na nuca, implantação baixa de cabelos na nuca e
aumento da distância intermamilar. Muitas vezes, o linfedema pode
ser observado durante a gestação pela detecção ultra-sonográfica
do higroma cístico, que corresponde à pele redundante na nuca
observada após o nascimento. Essa pele redundante dá origem,
posteriormente, às pregas pterigonucais (pescoço alado). As mal-
formações internas principais são as gônadas disgenéticas, que
apresentam folículos durante a vida embrionária, mas sofrem
hipoplasia, dando origem a ovários vestigiais. Além dessas, podem
ocorrer malformações renais, como rins em ferradura e duplicação
ou separação do bacinete e malformações cardiovasculares, sobre-
tudo coarctação da aorta, que corresponde a 70% das cardiopatias
na síndrome de Turner. Cerca de 50% das pacientes apresentam
deficiência auditiva de percepção. Essas pacientes são mais susce-
tíveis à tireoidite, hipertensão arterial e diabetes mellitus, devendo
ser acompanhadas periodicamente. A inteligência costuma ser
normal, porém, problemas psicológicos decorrentes do fenótipo são
comumente relatados.
Apesar da síndrome de Turner apresentar um quadro clínico
compatível com a vida, existe seleção natural muito grande
contra os fetos portadores da anomalia, sendo muito elevada a
freqüência da síndrome de Turner (18%) em material de aborto.
GRAVHOLT e cols. (1996) em um estudo realizado na Dinamarca
entre 1970 e 1993 observaram uma freqüência de síndrome de
Turner de 32/100.000 nascimentos, enquanto entre fetos do
sexo feminino, cujas mães se submeteram à amniocentese no
segundo trimestre de gestação para detecção do cariótipo fetal,
essa freqüência foi de 176/100.000, e de 392/100.000 quando
o estudo foi realizado em mães que se submeteram à punção
das vilosidades coriônicas no primeiro trimestre de gravidez.
Geralmente o cromossomo X é de origem materna, o que
significa que a falta de disjunção ocorre durante a meiose II
paterna. Em geral, as aberrações de cromossomos sexuais não
têm associação com a idade materna avançada, excetuando-se
quando ocorrem na meiose I materna.
54
1 2 3 4 5
6 7 8 9 10 11 12 X
13 14 15 16 17 18
19 20 21 22
A B
FIGURA 2.29 – Síndrome de Turner. A) Baixa estatura, fenda palpebral oblíqua para baixo, orelhas
rotadas para trás, B) Cariótipo de uma paciente com síndrome de Turner, 45,X.
TRATAMENTO
Inicialmente, deve-se buscar o diagnóstico precoce da deficiência
auditiva e defini-la como sendo de origem genética. O tratamento
dependerá do tipo de perda, e deve ser iniciado o mais breve possível.
A grande maioria das deficiências auditivas é do tipo sensorio-
neural e, portanto, o tratamento deve ser direcionado através da
protetização e acompanhamento fonoterápico.
Quando a perda for do tipo condutiva ou mista, com um
componente condutivo com bom intervalo aéreo-ósseo, pode-se
protetizar num primeiro tempo, em se tratando de crianças, para
num segundo tempo, em época oportuna, submetê-las à cirurgia
funcional. Esta conduta é aconselhável em alguns casos, como
nas síndromes de Treacher Collins, Duane ou van der Hoeve.
Naquelas síndromes com perda auditiva bilateral associada a
malformação do conduto auditivo externo e ouvido médio, porém
com o ouvido interno normal, há necessidade de corrigir um dos
lados, ou pelo menos tornar pérvio o conduto auditivo externo para
a protetização. Essa cirurgia costuma oferecer melhor resultado
quando a criança é operada por volta dos 5 anos de idade.
ORIENTAÇÃO FAMILIAR
Feito o diagnóstico de deficiência auditiva, o clínico deverá
realizar uma anamnese bem direcionada aos antecedentes pes-
soais e familiais, além de caracterizar com o máximo de precisão,
o tipo de deficiência e as características da perda auditiva. Deverá,
ainda, pesquisar outras malformações e caracterizá-las bem. No
caso das deficiências de etiologia genética, o otorrinolaringolo-
gista deverá fazer um estudo criterioso dos genitores do afetado,
inclusive com audiometria, que será muito útil para concluir a
respeito do padrão de herança.
Cabe ainda ao otorrinolaringologista orientar os pacientes e
seus familiares sobre a possibilidade de recorrência da anomalia
em outros descendentes e encaminhar a família ao geneticista
para uma avaliação e aconselhamento genético.
O aconselhamento genético pode ser definido como um proces-
so de comunicação sobre o risco de ocorrência ou recorrência
familial de anomalias genéticas, com a finalidade de fornecer a
indivíduos ou famílias ampla compreensão de todas as implicações
relacionadas às doenças genéticas em discussão, as opções que a
medicina atual oferece para a terapêutica ou para a diminuição dos
riscos de ocorrência ou recorrência da doença genética em questão
e eventual apoio psicoterapêutico (BEIGUELMAN, 1982).
O objetivo principal do aconselhamento genético é o bem-estar
do paciente e da família que está procurando o aconselhador. Ao
contrário dos princípios eugênicos, os do aconselhamento genético
visam, pois, primordialmente, à defesa dos interesses dos indiví-
duos e das famílias, e não os da sociedade (BEIGUELMAN, 1982).
56
AGRADECIMENTO
Prof. Dr. BERNARDO BEIGUELMAN , pela revisão do capítulo.
Leitura recomendada
ARNOS, K.S.; ISRAEL, J.; DEVLIN, L.; WILSON, M.P. – Genetics
counseling for the deaf. Otolaryngol. Clin. North Am., 25:953-971,
1992.
BEIGUELMAN, B. – Citogenética Humana . 1ª ed. Guanabara Koogan,
Rio de Janeiro, 1982.
Perda Auditiva de Origem Genética 57
3
Noções Básicas sobre
Acústica, Psicoacústica e
Calibração
INTRODUÇÃO
Violino 1,0
Piano 1,0
FIGURA 3.1 – Representação esquemática de três ondas sonoras: forma de onda e espectro de
amplitude.
62 Fonoaudiologia Prática
+
Amplitude
Amplitude
A outra dimensão da onda sonora é a chamada amplitude (A)
que é a medida do afastamento ou deslocamento horizontal das
partículas materiais de sua posição de equilíbrio. A amplitude
pode ser instantânea, quando é medida em um tempo ou ângulo
(A) (P-P)
Pico máximo Pico a pico
Pressão sonora instantânea em Pa
B
4
A
2
0
A
–2
–4
B
90 180 270 360
θ em graus
FIGURA 3.3 – Representação de dois movimentos ondulatórios de mesma freqüência com diferentes
amplitudes.
Noções Básicas sobre Acústica, Psicoacústica e Calibração 63
+
Amplitude
–
FIGURA 3.4 – Representação grá-
0,0005 0,001 0,0005 0,002 fica de uma onda senoidal (tom
Tempo (s) puro).
Onda complexa
Uma onda complexa pode ser definida como sendo qualquer
onda sonora composta de uma série de senóides simples que
podem diferir em amplitude, freqüência ou fase. A voz humana e
o som produzido por instrumentos musicais constituem alguns
exemplos de sons complexos, ou seja, constituídos por mais de
uma freqüência (Fig. 3.5).
“O grau de complexidade de uma onda sonora complexa
depende do número de ondas senoidais combinadas, bem como
dos valores dimensionais específicos de amplitude, freqüência e
fase dos componentes senoidais”. Este teorema foi primeiramen-
te proposto por um matemático francês que viveu na época de
Napoleão I, chamado JOSEPH FOURIER. A série de ondas senoidais
que combinadas formam a onda complexa é conhecida como
série de Fourier, em homenagem a este matemático. Desta série
deriva um processo denominado análise de Fourier que significa
que qualquer forma de onda complexa, pode ser decomposta ou
λ
Deslocamento (cm)
2
λ
1 5
0
0 5 10
λ
3
Distância (cm)
Onda periódica
Quando a onda sonora se repete a iguais intervalos de tempo
ela é conhecida como onda periódica, isto é, as características do
ciclo da onda são duplicadas exatamente nos demais ciclos.
De acordo com o teorema de Fourier, qualquer onda complexa
consiste de um número de ondas senoidais simples somadas.
Entretanto, para que uma onda complexa seja periódica, seus
componentes senoidais não podem ser selecionados ao acaso.
Ao invés disso, precisam obedecer a um requisito matemático
chamado de relação harmônica.
O termo relação harmônica quer dizer que as freqüências de
todas as senóides que compõem a série devem ser múltiplas integrais
(números inteiros) da freqüência senoidal de mais baixa freqüência da
série. Todas as senóides incluídas na série harmônica são chamadas
de harmônicos. Estes, por sua vez, são numerados, consecutiva-
mente, a partir da freqüência mais baixa da série – freqüência
fundamental (f0) conhecida como primeiro harmônico de f1, f2, f3....
até a mais alta, ou até o último componente da série harmônica.
Assim, para compreendermos melhor o conceito de timbre,
suponhamos agora que a nota musical lá, cuja freqüência predomi-
nante e fundamental é de 440 Hz, seja tocada em um instrumento
como o violão e, ao mesmo tempo, ao piano e no diapasão. Certa-
mente, ao ouvi-las, não teremos maiores dificuldades em diferenciá-
las, pois apesar de sabermos que se trata da mesma nota musical,
a quantidade e a qualidade dos harmônicos irão variar em função
das características físicas de cada fonte sonora (RUSSO, 1993).
Onda aperiódica
A principal característica distintiva das ondas periódicas com-
plexas é a sua regularidade no tempo ou periodicidade. Elas se
repetem indefinidamente. A onda aperiódica, contudo, é uma se-
gunda categoria de forma de onda e seu nome deriva exatamente
da falta de periodicidade. Assim, é muito difícil e quase impossível
prever a forma da onda num intervalo de tempo a partir do conhe-
cimento de suas características durante outro intervalo de tempo de
igual duração. O movimento vibratório de uma onda aperiódica é, ao
acaso, aleatório e, por esta razão, imprevisível.
As ondas aperiódicas são encontradas diariamente e exem-
plos familiares são os ruídos produzidos por aviões, automóveis,
cachoeiras e, até mesmo, alguns sons de fala, principalmente os
sons sibilantes são caracterizados por movimentos vibratórios
aleatórios, isto é, aperiódicos (RUSSO, 1993).
66 Fonoaudiologia Prática
I
NIS =10 log
I0
Noções Básicas sobre Acústica, Psicoacústica e Calibração 69
P
NPS1 = 20 log
P0
Psicoacústica
Durante toda a vida o homem recebe uma corrente contínua
de informações sonoras que são captadas por seus ouvidos,
classificadas e arquivadas na memória de seu cérebro. Desde o
batimento cardíaco no peito de nossas mães, a cantiga de ninar,
a música preferida, até um grito de socorro, a buzina de um carro,
o disparo de um canhão, a decolagem de um avião a jato... nada
escapa ao sensível ouvido humano, considerado como uma das
mais perfeitas obras de engenharia da qual somos dotados.
Dependendo do indivíduo, os sons podem provocar as mais
diversas reações físicas e emocionais: sustos, risos, lágrimas,
sensações de prazer ou desprazer, participação e segurança
vitais, as quais compartilhamos com os nossos semelhantes,
principalmente por intermédio da linguagem falada, adquirida
basicamente através da audição. Como se fosse um radar, nossa
audição estende-se em todas as direções e a grandes distâncias,
fornecendo-nos informações sobre a localização e a distância que
nos encontramos da fonte sonora, constituindo, assim, um meca-
nismo de defesa e alerta extremamente importante para nossa
70 Fonoaudiologia Prática
Duração
Os indivíduos diferem extraordinariamente nas suas habilida-
des para julgar intervalos de tempo em segundos, minutos ou dias.
A duração está relacionada à habilidade em detectarmos diferen-
ças nos estímulos sonoros em função do tempo. Podemos detec-
tar diferenças de cerca de 10 milionésimos de segundo de
intervalo de tempo entre os estímulos sonoros que atingem
nossas orelhas, graças à audição estereofônica. Com apenas um
ouvido podemos detectar mudanças temporais da ordem de 1
milionésimo de segundo, percebendo a ordem de dois eventos
sonoros distintos, separados por apenas 1/50 de segundo
(BOOTHROYD, 1986).
STEVENS & D AVIS revelaram que o ouvido humano muito
aguçado pode detectar uma diferença no tempo de duas notas
musicais da ordem de 0,01 segundos. Por outro lado, ouvidos
menos sensíveis podem requerer 0,10 ou 0,20 segundos para
perceberem a diferença.
140
Nível de pressão sonora (dB) Ref. 2.10 –5 N/m 2
130 130
120 120
110 110
100
90
80 80
70 70
60 60
50 50
40 40
30 30
20 20
Limiar da 10
10
Audibilidade
0 Fone
FIGURA 3.6 – Curvas de igual audibilidade ou isofônicas (FLETCHER & MUNSON, 1933).
Timbre
Na natureza pode ser encontrada uma infinita série de
variedades na qualidade de um tom e, ainda é possível desco-
brir neles uma base fundamental e relativamente simples para
sua classificação e descrição. O que torna possível a distinção
entre a mesma nota musical executada em instrumentos dife-
rentes depende da qualidade e da quantidade de harmônicos
presentes na onda sonora complexa, modificados pela sensa-
ção de freqüência absoluta e pela intensidade total, é definido
Noções Básicas sobre Acústica, Psicoacústica e Calibração 73
Pascal dB (NPS)
Dor
200 140
Intolerância
Desconforto
20 120
2 100
Área dos sons audíveis
Sons audíveis
0,2 80
Sons inaudíveis
0,02 60
Área da fala
0,002 40
200µ 20
Zonas de limiar
20µ 0
A IMPORTÂNCIA DA CALIBRAÇÃO
Por que calibrar?
A calibração é um processo que visa controlar as características
de freqüência, intensidade e tempo e verificar o funcionamento dos
equipamentos utilizados em Audiologia. Ela é necessária para
assegurar que um audiômetro produza um tom puro em um nível e
freqüência específicos e que este sinal esteja presente somente no
transdutor ao qual foi direcionado, estando livre de distorção ou
interferência de ruído indesejável (WILBER, 1994).
Equipamentos calibrados com a freqüência exigida podem
contribuir para aumentar a confiabilidade do fonoaudiólogo nos
resultados dos testes audiométricos realizados, uma vez que a
calibração periódica determina se o equipamento está de acordo
com os padrões apropriados para cada um dos instrumentos ou se
sofreram alterações com o tempo de uso.
Processo de calibração
O primeiro passo para aprender como verificar o funciona-
mento e calibrar o equipamento é a leitura do manual de instru-
ções que o acompanha. Algumas vezes os resultados dos testes
por si mesmos revelam a necessidade de calibração do instru-
mento. É preferível assumir que o problema é do equipamento
antes de atribuí-lo ao paciente sob teste.
Inicialmente, é recomendável que o fonoaudiólogo faça a
calibração biológica do audiômetro, verificando com o uso de seu
próprio ouvido, a saída do sinal acústico nos diferentes transduto-
res: fones, alto-falantes e vibrador ósseo.
76 Fonoaudiologia Prática
SUMÁRIO
Este capítulo procurou fornecer as noções básicas da Acústi-
ca Física e da Psicoacústica e sua importância para a Audiologia,
uma vez que constituem a pedra fundamental sobre a qual esta
ciência foi edificada. Aspectos acústicos da onda sonora, tais
como: suas características, atributos físicos mensuráveis, bem
como aspectos psicoacústicos da percepção auditiva e a determi-
nação do nível de audição foram aqui enfatizados.
Finalmente, o capítulo ressaltou a responsabilidade do audiolo-
gista na verificação da saída do equipamento de teste usado na
avaliação audiológica. Mesmo que alguns dos problemas possam
ser detectados por ouvidos humanos treinados e mais sensíveis,
isto não é suficiente para garantir a precisão necessária para
assegurar o funcionamento adequado dos instrumentos. Desse
modo, verificações eletroacústicas periódicas são imprescindíveis
uma vez que os resultados obtidos nos testes espelham, dentre
outros, o funcionamento dos equipamentos utilizados na avaliação
audiológica rotineira.
Leitura recomendada
AMERICAN STANDARDS ASSOCIATION – American standards
specification for audiometers for general diagnostic purposes: ASHA
Z, 24:5, 1951.
AMERICAN NATIONAL STANDARDS INSTITUTE – Specification for
audiometers. ANSI, S3:6, New York, 1969.
AMERICAN SPEECH AND HEARING ASSOCIATION – Commitee on
audiometric evaluation. Guidelines for audiometric symbols. Rockville,
ASHA, 17(5):260-264, 1974.
AMERICAN NATIONAL STANDARDS INSTITUTE – Methods for ma-
nual pure-tone threshold audiometry. ANSI, S3:21, New York, 1978
e R-1986.
AMERICAN NATIONAL STANDARDS INSTITUTE – Specifications for
instruments to measure aural acoustic impedance and admittance –
ANSI, S3:39, New York, 1987.
AMERICAN SPEECH-LANGUAGE-HEARING ASSOCIATION –
Commitee on audiometric evaluation. Guidelines for audiometric
symbols. Rockville, ASHA, 30(12):39-42, 1988.
AMERICAN NATIONAL STANDARDS INSTITUTE – Specification for
audiometer. ANSI, S3:6, New York, 1989.
AMERICAN NATIONAL STANDARDS INSTITUTE – Maximum
permissible ambient noise for audiometric testing – ANSI, S3:1, New
York, 1991.
AMERICAN NATIONAL STANDARDS INSTITUTE – Standard reference
zero for the calibration of pure-tone bone-conduction audiometers.
ANSI, S3:43, New York, 1992.
82 Fonoaudiologia Prática
4
Testes Básicos de Avaliação
Auditiva
DIAPASÕES
O exame audiométrico deve ser sempre precedido por uma
detalhada avaliação “acumétrica” pelo otorrinolaringologista, uti-
lizando-se dos diapasões. Cabe ao especialista a avaliação
prévia, de modo a ter uma idéia a respeito da audição de seu
paciente, qual o grau de perda (leve, moderada ou severa) e qual
tipo de perda (sensorioneural ou condutiva). Poderia parecer
extemporâneo recomendar o emprego destes testes numa época
em que dispomos de testes sofisticados como a audiometria tonal,
a audiometria de respostas evocadas (audiometria de tronco
cerebral, eletrococleografia) e mesmo a imitanciometria. No en-
tanto, há ainda um grande número de otorrinolaringologistas que
não dispõe de um audiômetro em seu consultório, ou mesmo em
84 Fonoaudiologia Prática
Teste de Weber
Neste teste verifica-se em que orelha o paciente escuta melhor
o diapasão quando encostado na fronte (ou na região da raiz do nariz
ou junto aos dentes incisivos). Antes de fazer este teste, deve-se
verificar em que orelha ele tem melhor audição pela via aérea.
Nos casos em que a audição é normal ou existe perda igual em
ambas as orelhas, ele dirá que escuta apenas no local em que o
diapasão foi colocado (na fronte); diz-se que o Weber foi central.
Quando o paciente escuta melhor o diapasão na mesma
orelha em que tem melhor audição, diz-se que o Weber lateraliza
para o lado melhor e é característico de lesão sensorioneural no
lado comprometido. Se, no entanto, o Weber lateralizar para o
lado em que o paciente escuta pior, diz-se que a perda de audição
na orelha comprometida é de condução.
Teste de Rinne
O teste de Rinne permite comparar a audição pela via aérea
e pela via óssea de uma orelha. O diapasão (em indivíduos com
audição normal) pode ser ouvido pela via aérea pelo dobro do
tempo em que é ouvido pela via óssea. O diapasão é colocado
a vibrar (cada especialista tem sua maneira para isto) e é posto
pela sua base na região retroauricular, na parte mais saliente da
mastóide (via óssea) e em seguida seus arcos são colocados
defronte ao meato acústico externo a mais ou menos 2 cm deste
(via aérea), evitando-se tocar a pele do paciente. Os arcos do
diapasão não devem estar paralelos ao plano do pavilhão da
orelha e sim perpendicular a ele. Quando apresentado parale-
lamente ao pavilhão, pequenos movimentos de lateralidade
podem determinar o aparecimento de uma “zona muda” em que
nenhum som é ouvido (experimente em sua orelha, movendo os
arcos do diapasão quando colocados paralelamente ao pavi-
lhão auditivo).
Quando o paciente escuta mais forte pela via aérea do que
pela via óssea, diz-se que o Rinne é positivo, se o paciente escuta
apenas pela via aérea diz-se que é positivo patológico. O Rinne
positivo costuma ser compatível com audição normal ou com
perdas sensorioneurais moderadas e o Rinne positivo patológico
com perdas mais severas.
Quando o paciente escuta melhor pela via óssea do que pela
aérea, diz-se que o Rinne é negativo. Eventualmente o paciente
poderá ouvir apenas pela via óssea, o que caracteriza o Rinne
negativo patológico. Esta eventualidade deve ser analisada com
Estágio 1 Estágio 2
Tom ouvido mais tempo pela via aérea = Rinne positivo: indica perda perceptiva
Tom ouvido mais tempo pela via óssea = Rinne negativo: indica perda condutiva
Teste de Schwabach
O teste é realizado colocando-se a base do diapasão sobre a
mastóide do paciente e do examinador de modo alternado.
Poderá ocorrer que o paciente escute o diapasão por um tempo
menor que o examinador (o que caracteriza o Schwabach encur-
tado) ou que o examinador escute-o por um tempo menor que o
paciente (Schwabach prolongado).
Este teste permite comparar a audição pela via óssea do
examinador com a do paciente. Considerando-se que o examina-
dor tenha audição normal, diz-se que o Schwabach é prolongado
quando a audição pela via óssea do paciente for mais prolongada
que a do examinador, e nestes casos será interpretado como
perda de audição condutiva. Quando for percebido por um tempo
menor (Schwabach encurtado) será interpretado como sendo
uma perda sensorioneural. Quando igual para ambos diz-se que
sua audição é normal ou muito próxima do normal.
Teste de Friedreich
Este teste permite confirmar se o paciente tem uma perda
predominantemente sensorioneural ou condutiva. O diapasão é
colocado (por sua base) inicialmente na mastóide e em seguida
sobre o trago, comprimindo-o sobre a abertura do meato acústico
externo de modo a fazer deste um tubo fechado. Isto fará com que
o som seja amplificado pela camada aérea da orelha externa. Em
pacientes sem deficiência de audição ou perdas sensorioneurais,
o diapasão será melhor escutado quando for colocado nesta
última posição e, quando a perda for condutiva, será mais audível
88 Fonoaudiologia Prática
Mascaramento
Em certas situações, pode se tornar necessário o emprego de
um ruído mascarante na orelha oposta à que estamos testando
com os diapasões. Durante muitos anos utilizou-se o mascarador
de Barany, que hoje não está mais disponível no mercado.
Qualquer tipo de ruído feito próximo à orelha a ser mascarada
poderá ser eficiente. Recomenda-se que seja feito ruído próximo
à orelha com um pedaço de papel celofane ou de cigarros. Não se
deve tentar mascarar a orelha oposta colocando as mãos como
uma concha com o objetivo de vedar a orelha. Esta manobra
poderá favorecer a transmissão pela via óssea e confundir ainda
mais o exame. Neste mesmo capítulo será tratado o assunto do
mascaramento na audiometria tonal e justificados com maior rigor
as suas necessidades e cuidados.
Embora a grande maioria dos pacientes responda com bas-
tante precisão aos testes com diapasão, sempre haverá um grupo
de pacientes “difíceis” e com os quais não serão obtidas respostas
confiáveis.
AUDIOMETRIA TONAL
Embora existam inúmeros exames cujos resultados permitem
fazer afirmações precisas sobre a audição do indivíduo, a audio-
metria tonal é o teste mais freqüentemente usado para a avaliação
da função auditiva. Resultados de outros testes são geralmente
interpretados em conjunto com a audiometria de tom puro.
A finalidade da audiometria tonal é a determinação da menor
quantidade de energia acústica audível – o limiar auditivo. Observa-
ções na clínica diária e estudos experimentais mostram que quando
se procura estabelecer a menor quantidade de energia sonora que
provoca uma sensação auditiva, existe uma intensidade que ora
provoca resposta, ora não. Desta forma, limiar de audibilidade de um
estímulo sonoro deve ser definido como a menor intensidade sonora
para a qual o paciente responde a 50% das apresentações.
Para um estudo adequado do estado do sistema auditivo é
preciso o conhecimento dos limiares por via aérea e via óssea, que
são os meios possíveis de transmissão da energia sonora para a
cóclea. Através da via aérea, a energia sonora entra pelo meato
acústico externo e é transferida mecanicamente pelo sistema de
transmissão da orelha média para a cóclea, enquanto a energia
sonora conduzida por via óssea estimula diretamente a cóclea
através da vibração dos ossos do crânio, sem depender pratica-
mente da orelha externa e das estruturas da orelha média. Desta
forma, a análise dos limiares obtidos por estas duas vias fornece
informações sobre o tipo e grau da deficiência auditiva.
Testes Básicos de Avaliação Auditiva 89
a) Método ascendente
Neste método a pesquisa do limiar é feita partindo-se da
inaudibilidade para a audibilidade. Após a obtenção da primeira
resposta, o estímulo é diminuído em 10 dB e aumentado de 5 em
5 dB até o paciente apresentar novamente uma resposta. É
considerado como limiar a menor intensidade para a qual o
paciente responda, pelo menos 50% das vezes, quando o estímu-
lo for apresentado de maneira ascendente. Este método é reco-
mendado pela ASHA (1978) e é baseado nas recomendações de
CARHART & JERGER (1959).
b) Método descendente
Neste método a pesquisa do limiar é realizada partindo-se da
intensidade maior para a menor. O estímulo inicial deve ser apresen-
tado numa intensidade audível, porém não muito intenso para não
provocar desconforto. Recomenda-se 30 a 40 d BNA para indivíduos
com audição aparentemente normal e 70 d BNA para indivíduos com
90 Fonoaudiologia Prática
c) Método descendente-ascendente
Neste método o limiar é pesquisado através da combinação das
duas técnicas anteriores. Inicia-se o teste sempre através da apre-
sentação de um som audível. É considerado limiar a intensidade em
que se obtiver resposta em 50% das vezes, independentemente se
a apresentação do som for ascendente ou descendente.
Seja qual for o método adotado, é importante muita habilidade
e rapidez na obtenção dos resultados para se evitar cansaço ou
distração por parte do paciente, especialmente os que apresen-
tam comprometimento físico, mental ou neurológico, uma vez que
se trata de um exame que exige muita atenção e concentração.
Instruções ao paciente
Num primeiro contato, o avaliador deve demonstrar interesse
pelo problema do paciente, através de perguntas sobre seus sinto-
mas (“qual a orelha melhor ?” “qual a orelha que prefere quando usa
o telefone ?” “sons intensos incomodam ?” “ tem zumbido?”), as
quais, além de fornecerem dados importantes para o conhecimento
do caso, colaboram para diminuir a ansiedade que geralmente
antecede qualquer testagem. O audiologista deve aproveitar este
diálogo, modificando a intensidade de voz, alternando presença e
ausência de pistas visuais, observando a qualidade da voz e articu-
lação da fala do paciente. Estas observações auxiliam na escolha do
FIGURA 4.7 – Dois tipos de fones usualmente empregados. O da direita tem um abafador de ruído e pode
ser útil quando a cabine não é muito eficaz.
92 Fonoaudiologia Prática
Audiograma
Os limiares determinados pela audiometria tonal são coloca-
dos em um gráfico adotado universalmente denominado audio-
grama. Ele expressa, na abscissa, as freqüências sonora em Hz,
variando de 250 a 8.000 Hz, dispostas de forma logarítmica, ou
seja, as freqüências são apresentadas em intervalos regulares.
94 Fonoaudiologia Prática
0
10
20
30
40
50
60
70
80
90
100
110 FIGURA 4.9 – Audiograma com via aérea e
via óssea.
Mascaramento
Durante a realização da audiometria tonal, quando houver assi-
metria entre os limiares auditivos de uma orelha a outra, podem
ocorrer situações em que as respostas encontradas não representem
a audição real da orelha pior, mas sim respostas da orelha contrala-
teral. Isto ocorre quando o estímulo apresentado à orelha pior é de tal
intensidade que é percebido pela orelha melhor, antes mesmo de
atingir o limiar da orelha testada. Esta situação é denominada
lateralização (ou audição contralateral) e aparece no audiograma
como um traçado semelhante à curva audiométrica da orelha melhor,
porém num nível de intensidade mais elevado (curva sombra).
Um som, quando apresentado a uma orelha, pode atingir a
orelha oposta, mas perde uma certa quantidade de energia. Esta
perda de energia é denominada atenuação interaural.
Um som intenso, quando apresentado por via aérea a uma
orelha, pode estimular a cóclea da orelha contralateral por via aérea
ou por via óssea. Estudos realizados por CHAIKLIN (1967) demonstra-
ram que a lateralização (ou audição contralateral) de um som
apresentado por via aérea se processa por via óssea antes de ocorrer
por via aérea, isto é, a atenuação interaural para a transmissão do
som por via óssea (através dos ossos do crânio) é menor do que a
atenuação interaural por via aérea (ao redor da cabeça). Quando o
som é apresentado por via aérea a uma orelha, o fone pode transmitir
uma certa energia, como vibração, através dos ossos do crânio, para
a cóclea da outra orelha, com uma atenuação interaural que varia de
40 a 85 dB. Esta grande variação de intensidade foi observada em
estudos realizados por alguns autores (LIDÉN, NILSSON, ANDERSON,
1959; CHAIKLIN, 1967; COLES & PRIEDE, 1970; SMITH & MARKIDES,
1981) e é decorrente do tipo de fone utilizado, da freqüência testada
e de variações anatômicas individuais.
Um som, mesmo de fraca intensidade, quando apresentado
através do vibrador ósseo colocado em qualquer ponto do crânio,
estimula ambas as cócleas simultaneamente o que torna a atenua-
ção interaural por via óssea praticamente igual a zero dB.
Desta forma, sempre que houver possibilidade de ocorrer uma
lateralização do som, devemos utilizar o mascaramento que é a
elevação artificial dos limiares da orelha não-testada, para que
esta não interfira nas respostas da orelha que se quer testar.
0
10
20
30
40
50
60
70
80
90
100
Intensidade de mascaramento
Quando se trata de excluir uma orelha para testar a outra,
poder-se-ia pensar que o ideal fosse a utilização do máximo de
ruído disponível no aparelho para evitar qualquer participação
da orelha não-testada. Entretanto, não se pode esquecer que o
fenômeno da lateralização ocorre com qualquer som apresen-
tado por via aérea com a mesma atenuação interaural. Conse-
qüentemente, o ruído mascarante pode cruzar o crânio da
mesma forma que o tom puro, atingir a orelha que está sendo
testada, e, erroneamente, elevar seus limiares. Este fenômeno
é denominado supermascaramento.
Portanto, ao se considerar a quantidade de mascaramento
que deve ser empregada, é importante conhecer qual o mínimo e
o máximo de ruído mascarante que pode ser utilizado, isto é, qual
a intensidade de ruído que efetivamente começa a mascarar a
orelha não-testada e a intensidade onde o ruído passa a
supermascarar a orelha testada.
Vários métodos e fórmulas foram descritos para a determina-
ção da quantidade de mascaramento a ser utilizada. No entanto,
a técnica introduzida por HOOD, também conhecida como método
do plateau, tem sido a preferida pela maioria dos audiologistas
devido a sua eficácia e facilidade de entendimento.
Nesta técnica, o limiar é obtido inicialmente sem mascara-
mento. O ruído mascarante é então apresentado numa intensi-
dade de 10 dB acima do limiar da orelha não-testada,
pesquisando-se novamente o limiar. Aumentos sucessivos de
mascaramento são apresentados, em passos de 10 em 10 dB,
com redeterminação do limiar em cada nível de ruído mascarante.
A finalidade é encontrar um limiar na orelha testada que não
sofra modificações com os incrementos de ruído mascarante na
orelha não-testada. A seguir, são apresentados alguns exem-
plos para melhor demonstrar esta técnica:
Exemplo 3 (supermascaramento)
Orelha direita Orelha esquerda
via aérea 0 dB 40 dB (sem mascaramento)
via óssea 0 dB 0 dB (com mascaramento)
Ruído mascarante (NB) Reteste do limiar
10 dB 50 dB
20 dB 60 dB
30 dB 60 dB
40 dB 60 dB
50 dB 70 dB
60 dB 80 dB
70 dB 90 dB
AUDIOMETRIA VOCAL
A comprensão da fala é um dos requisitos fundamentais
para a eficiência da comunicação. Desta forma, a avaliação da
capacidade auditiva de um indivíduo não pode ser restrita
apenas à sua habilidade para captar os tons puros. Mesmo
sendo enormemente influenciada pela configuração do audio-
grama (nível de perda, graves x agudos, etc.), a compreensão
da fala nem sempre pode ser presumida somente pelos limiares
tonais, o que torna a audiometria vocal um instrumento clínico
indispensável.
Os testes básicos para esta avaliação são: limiar de recepção
de fala e índice de reconhecimento de fala.
30
40
50
60
70
80
90
100
110
FIGURA 4.11
10
20
30
40
50
60
70
80
90
100
110 FIGURA 4.12 – Audiograma – Deficiência
auditiva condutiva.
0
10
20
30
40
50
60
70
80
90
100
110 FIGURA 4.13 – Audiograma – Deficiên-
cia auditiva sensorioneural.
0
10
20
30
40
50
60
70
80
90
100
Leitura recomendada
ALMEIDA, K.; RUSSO, I.C.P.; SANTOS, T.M. – A aplicação do masca-
ramento em Audiologia. São Paulo, Ed. Lovise Ltda, 1995.
AMERICAN ACADEMY OTOLARYNGOLOGY & HEAD NECK
SURGERY – Clinical Auditory Evaluation , 1981.
108 Fonoaudiologia Prática
5
Avaliação do Processamento
Auditivo Central
CONCEITUAÇÃO
Processamento auditivo central é o termo utilizado para se
referir à série de processos que envolvem predominantemente
as estruturas do sistema nervoso central: vias auditivas e córtex.
A desordem do processamento auditivo central é um distúrbio da
audição no qual há um impedimento da habilidade de analisar e/
ou interpretar padrões sonoros. O processamento auditivo, se-
gundo PHILIPS (1995), envolve a detecção de eventos acústicos;
capacidade de discriminá-los quanto ao local, espectro, amplitu-
de, tempo; habilidade para agrupar componentes do sinal acús-
110 Fonoaudiologia Prática
(OD + OE)
IR = × 100
24
116 Fonoaudiologia Prática
Total –4 a 5 6 a 15 16 a 35 36 a 100
Orelha –6 a 10 11 a 20 21 a 40 41 a 100
Condição –9 a 15 16 a 25 26 a 45 46 a 100
CLASSIFICAÇÃO DA DESORDEM DO
PROCESSAMENTO AUDITIVO CENTRAL E TERAPIA
FONOAUDIOLÓGICA
A fonoterapia deverá realizar o treinamento auditivo verbal
envolvendo as habilidades auditivas de atenção seletiva, localiza-
ção, memória, fala e linguagem, desenvolvendo estratégias de
seqüencialização sonora, figura-fundo auditivo, monitoração au-
ditiva da produção de fala, ampliação do vocabulário (treino do
léxico); melhorar o conhecimento das regras da língua (treino da
sintaxe); discriminação auditiva, associação fonema-grafema. Ao
se preparar um plano de fonoterapia, o objetivo é o de criar
condições para que o indivíduo possa se reorganizar quanto aos
aspectos envolvidos na comunicação no que se refere à utilização
dos fonemas e regras da língua. Para cada tipo de distúrbio do
processamento auditivo central, alguns aspectos deverão ser
predominantemente treinados.
Nos distúrbios do processamento auditivo central classifica-
dos como:
Avaliação do Processamento Auditivo Central 123
COMENTÁRIO FINAL
Acredita-se que a classificação da Desordem do Processamen-
to Auditivo Central auxilia a compreensão dos problemas que um
indivíduo possa apresentar no que se refere ao seu sistema de lin-
guagem. Além disso, possibilita o planejamento de estratégias que
podem ser utilizadas no processo de reabilitação fonoaudiológica.
Cabe, neste momento, pesquisar mais amplamente estas ques-
tões para que se possa rever a metodologia tradicional de reabilita-
ção fonoaudiológica, objetivando uma fonoaudiologia cada vez
melhor. Além disso, acredita-se que a ampliação do conhecimento
da importância e dos processos envolvidos na audição poderá levar
a uma atuação em fonoaudiologia educacional, visando à melhora
da comunicação entre pais e filhos, professores e alunos.
Leitura recomendada
ALMEIDA, C.I.R. & CAETANO, M.H.U. – Logoaudiometria utilizando
sentenças sintéticas. Rev. Bras. Otorrinolaringol., 54:68-72, 1988.
ALMEIDA, C.I.R.; CAMPOS, M.I.; ALMEIDA, R.R. – Logoaudiometria
pediátrica (PSI). Pediatric speech intelligibity test. Rev. Bras.
Otorrinolaringol., 54:73-76, 1988.
AQUINO, A.M.C.M.; ALMEIDA, C.I.R.; OLIVEIRA, J.A.A. – Teste de
identificação de sentenças sintéticas (SSI) em português com men-
sagem competitiva: uma padronização. Rev. Bras. Otorrinolaringol.,
59(3):160-163, 1993.
AQUINO, A.M.C.M.; OLIVEIRA, J.A.A.; AQUINO, T.J.M.; ALMEIDA,
C.I.R. – Audição Central (1): nas lesões supratentoriais das vias
auditivas. Rev. Bras. Otorrinolaringol., 61(5):349-356, 1995.
BOCCA, E.; CALEARO, C.; CASSINARI, V. – A new method for testing
in temporal lobe tumors. Acta Otolaryngol., 44:219-221, 1954.
BORGES, A.C.L.C. – Teste de escuta diótica de dissílabos alternados,
SSW em português. In: PEREIRA, L.D. & SCHOCHAT, E. op. cit.
CÂMARA, C.; IORIO, M.C.M.; PEREIRA, L.D. – Análise dos índices
percentuais de reconhecimento de fala filtrada e não sensibilizada
em crianças com audição normal e sem queixa de escolaridade.
Acta AWHO, 14(4):184-189, 1995.
CRUZ, P. & PEREIRA, L.D. – Comparação do desempenho das habili-
dades auditivas e de linguagem em crianças com queixa de dificul-
dade de aprendizagem. Acta AWHO, 15(1):21-26, 1996.
124 Fonoaudiologia Prática
6
Testes Audiológicos para a
Identificação de Alterações
Cocleares e Retrococleares
INTRODUÇÃO
FIGURA 6.1 – Corte transversal ligeiramente esquemático através de uma espira da cóclea. (PUTZ, R.
& PABST, R. Cabeça e pescoço e extremidade superior. Sobotta. Atlas de Anatomia Humana. Vol. 1.
Rio de Janeiro, Guanabara Koogan, 1995.)
130 Fonoaudiologia Prática
OD OE
dB dB
0 0
10 10
20 20
30 30
40 40
50 50
60 60
70 70
80 80
90 90
100 100
FIGURA 6.2 – Gráfico exemplificando o fenômeno do recrutamento.
FIGURA 6.4 – Audiograma de disacusia sensorio- FIGURA 6.5 – Audiograma de disacusia sensorio-
neural leve bilateral, mostrando assimetria discre- neural descendente assimétrica de um indivíduo
ta em um indivíduo apresentando neurinoma do apresentando neurinoma do acústico do lado
acústico do lado direito. direito.
Audiometria vocal
A bateria vocal básica inclui a medida do limiar de recepção de
fala (speech reception threshold – SRT), o índice de reconheci-
mento de fala (IRF) e a curva de inteligibilidade (PI-PB – perfor-
mance/intensity with phonetically balanced words).
Como rotina são usados o SRT e o IRF, sendo a curva PI-PB
um teste de escolha para complementação da investigação inicial.
O SRT representa o limiar para materiais de fala e não tem
valor diagnóstico, entretanto, sua contribuição está na confirma-
ção dos limiares tonais, sendo precioso naqueles casos de
respostas assistemáticas ou duvidosas.
O IRF é determinado pela habilidade de identificar corretamente
palavras monossilábicas. Indivíduos normais podem reconhecer
palavras facilmente, quando apresentadas em intensidade onde
possam ser ouvidas claramente. O IRF normal, ou seja, um reconhe-
cimento de fala normal é esperado entre 88 e 100% de identificação
correta, quando apresentadas a 40 dB NS (GATES & CHAKERES,
Testes Audiológicos para a Identificação de Alterações Cocleares e Retrococleares 135
FIGURA 6.6 – Audiogramas com resultados tonais de disacusia sensorioneural mostrando diferentes
resultados de IRF. A) Um caso de um senhor de 74 anos de idade, com diagnóstico audiológico de
presbiacusia neural. B) Uma senhora de 61 anos de idade, com hipótese diagnóstica de otosclerose
coclear. C) Um caso de neurinoma do acústico à esquerda. D) Um caso de neurinoma do acústico à
esquerda. OD = ( ) ; OE = ( ).
136 Fonoaudiologia Prática
Audiometria tonal
250 500 1000 2000 4000 8000 Hz
dB SRT IRF
0
10 OD: 55 dB OD: 85 dB = 12%
20 OE: 20 dB OE: 50 dB = 100%
30
40
50
60
70
80 FIGURA 6.7 – Resultado audiológico de um pa-
90 ciente portador de neurinoma do lado direito,
100 mostrando desproporcionalidade entre a porcen-
tagem de IRF e a média tonal (PTA).
Testes Audiológicos para a Identificação de Alterações Cocleares e Retrococleares 137
Audiometria tonal
250 500 1000 2000 4000 8000 Hz
dB
0
10
20
30
40
50
60
70
80
90
100
SRT IRF
Imitanciometria
A imitância acústica é um teste que fornece informações obje-
tivas e eficientes sobre a integridade funcional do sistema auditivo,
através da timpanometria e da pesquisa do reflexo estapediano. Tem
sido largamente aplicada na avaliação de lesões do ouvido interno,
do VIII par e do ângulo pontocerebelar (NORTHERN & ROUSH, 1985).
A timpanometria é utilizada para a avaliação das condições do
ouvido médio. Portanto, não discutiremos sua interpretação.
Entretanto, é necessário lembrar que a análise dos limiares do
reflexo estapediano tem relação direta com a integridade do
sistema tímpano-ossicular. O exame otológico cuidadoso, asso-
ciado a timpanometria normal e ausência de gap aéreo-ósseo,
permitirá a validade da pesquisa das vias aferente e eferente do
reflexo estapediano. Caso contrário, a ausência do mesmo será
atribuída a alterações do ouvido médio que impediram sua capta-
ção, e não de alteração em outras estruturas.
Testes Audiológicos para a Identificação de Alterações Cocleares e Retrococleares 139
Timpanometria Timpanometria
8 8
7 7
6 6
5 5
4 4
3 3
2 2
1 1
– 400 – 300 – 200 – 100 0 +100 +200 daPa – 400 – 300 – 200 – 100 0 +100 +200 daPa
A B
FIGURA 6.10 – Resultado audiológico mostrando a presença de alteração coclear pela presença de
recrutamento de Metz. A) Um indivíduo apresentando meningioma do lado direito. B) Um indivíduo
apresentando neurinoma do acústico do lado direito. OD = ( ) ; OE = ( ).
140 Fonoaudiologia Prática
Timpanometria Timpanometria
8 8
7 7
6 6
5 5
4 4
3 3
2 2
1 1
–400 –300 –200 –100 0 +100 +200 daPa –400 –300 –200 –100 0 +100 +200 daPa
OD 110 100 90 90 OD ↓ ↓ ↓ ↓
OE ↓ ↓ ↓ ↓ OE 80 85 80 80
A B
Reflex: Decay Left CONTRA TDH39 Reflex: Decay Left CONTRA TDH39
Speed: Fast Speed: Fast
500 Hz 95 dB 500 Hz 110 dB
+ 150 + 150
ul 12s ul 12s
–150 –150
Reflex: Decay Right CONTRA TDH39 Reflex: Decay Right CONTRA TDH39
Speed: Fast 1000 Hz 90 dB Speed: Fast 1000 Hz 110 dB
+150 +150
ul 12s ul 12s
–150 –150
A B
Audiometria tonal
250 500 1000 2000 4000 8000 Hz
dB
SRT IRF 0
10
OD: 10 dB OD: 50 dB = 100% 20
OE: NPE OE: 110 dB = 0% 30
40
50
60
FIGURA 6.13 – Resultado audiométrico mostrando 70
a limitação da pesquisa de outros sinais audiológi- 80
cos devido à presença de disacusia sensorioneural 90
severa, em um paciente portador de neurinoma do 100
lado esquerdo. NPE = não pode ser estabelecido.
CONCLUSÃO
Hoje sabemos que os testes básicos como audiometria tonal
limiar, índice de reconhecimento de fala e imitância acústica
podem trazer informações suficientes quanto a presença ou não
de envolvimento retrococlear, evitando a aplicação de uma bateria
exaustiva e contraproducente.
As alterações assimétricas diante de uma perda auditiva
sensorioneural tanto na audiometria tonal, audiometria vocal ou
medida do reflexo estapediano, serão os sinais que levantarão
hipóteses diagnósticas, conduzindo a escolha apropriada de
testes audiológicos complementares. Na avaliação comple-
mentar, a utilização de testes em intensidades fortes como a
pesquisa do fenômeno de rollover e do declínio do reflexo
estapediano mostraram-se como os melhores testes nesta
investigação. Essa escolha está em concordância com JERGER
(1987), onde ele afirma que a lição mais importante que a prática
pode nos dar é de que os melhores sinais de envolvimento
retrococlear são dados em intensidades fortes.
Testes Audiológicos para a Identificação de Alterações Cocleares e Retrococleares 145
Timpanometria Timpanometria
8 8
7 7
6 6
5 5
4 4
3 3
2 2
1 1
0 0
–200 0 +200 –200 0 +200
Leitura recomendada*
BRUNT, M.A. – Tests of cochlear function. In: KATZ, J. Handbook of
Clinical Audiology. 4ª ed. Baltimore, Williams & Wilkins, 1994.
CLEMIS, J.D. & MASTRICOLA, P.G. – Special audiometric test battery in
121 proved acoustic tumors. Arch Otolaryngol., 102:654-656, 1976.
DALLOS, P. – The active cochea. J. Neuroscience., 12(12):4575-4585,
1992.
GANANÇA, F.F.; MATSUHAMA, C.; TESTA, J.R.G.; MUNHOZ, M.S.L.;
FUKUDA, Y.; GANANÇA, M.M.; MANGABEIRA ALBERNAZ, P.L. –
Schwannoma vestibular: sintomas e sinais típicos e atípicos. Acta
AWHO, 8(1):33-38, 1994.
GATES, G.A. & CHAKERES, D.W. – Interpretation of Diagnostic Tests
for Acoustic Neuroma. American Academy of Otolaryngology-Head
and Neck Surgery. Rochester, 1988.
HART, M.J. & LILLEHEI, K.O. – Management of posterior cranial fossa
meningiomas. Ann. Otol. Rhinol. Laryngol., 104:105-116, 1995.
HIRSCH, A. & ANDERSON, H. – Audiologic test results in 96 patients’
with tumours affecting the eighth nerve. Acta Otolaryngol., (Suppl.)
369:1-26, 1980.
HOMBERGEN, G.C.J.H. – Audiometry: cochlear versus retrocochlear
pathology. Adv. Oto-rhino-laryng., 34:39-46, 1984.
HUDSPETH, A.J. – How the ear’s works work. Nature, 341:397-404, 1989.
JERGER, J. & JERGER, S. – Audiological comparison of cochlear and
eight nerve disorders. Ann. Otol., 83:275-285, 1974.
JERGER, J. & JERGER, S. – Auditory Disorders. Boston, Little Brown
Co., 1981.
7
Perda Auditiva Funcional
Sintomas comportamentais
A entrevista que precede qualquer exame audiológico deve
ser um bom momento para observar a atitude geral do sujeito a ser
examinado. Perguntas detalhadas sobre o problema do paciente
são sempre de grande valor e o examinador deve ser perspicaz
para poder detectar pistas discretas que o paciente pode apre-
sentar.
Durante esta anamnese é importante conhecer a história
pregressa relativa à relação empregado-empregador, quando e
como surgiu o problema em questão, como o sujeito se encontra
atualmente. É importante observar como são as respostas e se
são seguidas de informações adicionais, como se o paciente
tentasse convencer o examinador da veracidade de suas queixas:
NRE = índice de erros por não responder; OS = resposta para uma sílaba; SL =
resposta com uma palavra que consta da lista; TE = total de erros.
Avaliação: índices de 86 ou mais são considerados positivos; 85 ou menos são
considerados negativos.
158 Fonoaudiologia Prática
Procedimentos especiais
Teste de Lombard
Baseado no princípio de que uma pessoa monitora sua voz
a partir do feedback acústico, ou seja, a partir do que consegue
ouvir do que produz, L OMBARD elaborou o seguinte procedi-
mento:
O paciente é colocado na cabina acústica com os fones sobre
os ouvidos, e é solicitado a ler em voz alta, um trecho de um livro.
Ao começar a fazê-lo, introduz-se nos fones ruído mascarante de
banda larga que vai sendo aumentado progressivamente. Ao
mesmo tempo, através de um microfone e de um medidor de
volume, controla-se a mudança na intensidade da voz do exami-
nado. Se o aumento da voz ocorre ao mesmo tempo que o
aumento da intensidade do ruído acontece, é porque o sujeito sob
teste está sofrendo os efeitos do ruído e perdendo sua capacidade
de automonitorar sua produção vocal.
Teste de Doerfler-Stewart
Consiste em observar a alteração que se produz na
inteligibilidade da palavra, quando se mistura a voz com o ruído.
O princípio do teste está na dificuldade que indivíduos com
audição normal têm em manter respostas supraliminares consis-
tentes quando em presença de ruído competitivo ipsilateral,
porém o que chama mais a atenção é o fato de que portadores de
perdas auditivas funcionais costumam apresentar dificuldades
maiores que os indivíduos normais. Exageram sua dificuldade.
Neste procedimento, determina-se em primeiro lugar a curva
logoaudiométrica do examinado sem ruído competitivo, em segui-
da, a mesma curva é obtida, porém com ruído de banda larga
homolateral ao ouvido onde as palavras estão sendo apresenta-
das. O simulador, tão logo o ruído é apresentado (às vezes abaixo
do nível de audição apresentado na audiometria), mostra queda
na sua habilidade de repetir o sinal de fala introduzido.
Em trabalho publicado por VENTRY & CHAIKLIN (1965), os
autores referiram que o teste de Doerfler-Stewart (teste D-S)
identificou incorretamente 50% do grupo com perda auditiva
orgânica como funcional e 58% do grupo com perda auditiva
funcional como orgânica. M ENZEL (1960) encontrou resultados
indicadores de perda funcional em 58% dos pacientes testados
(n = 83).
O teste D-S deve ser considerado um teste de triagem, e se os
resultados são positivos, este paciente deve ser submetido a
outras avaliações com outros procedimentos.
Perda Auditiva Funcional 161
QUADRO 7.2 – Sugestão de estória para realização do teste de voz alternada. (Adap-
tada de MARTIN – Pseudohypoacusis. In: KATZ, J. Handbook of Clinical Audiology. 4ª
ed. Cap. 36, 1994. p. 560.)
Ouvido ruim Ambos ouvidos Ouvido bom
1. Lyons aproximava-se na floresta
silenciosa e perigosamente
de sua presa
2. carregando seu rifle Seu instinto animal e anos de experiência
confiantemente.
3. reforçados pela inteligência deixaram-no confiante através da caminhada.
educada
4. Jim Lyons era há muito reconhecido como o mais esperto caçador
da floresta.
5. Exceto por aqueles que vivem sobre quatro patas Lyons nunca voltou para casa
insatisfeito
6. ou com as mãos vazias. Os veados eram sua presa devido à sua carne suculenta
preferida
7. e sua bela pele.
Teste de Stenger
É um dos testes mais antigos para a identificação de perdas
auditivas funcionais. Foi inicialmente elaborado por STENGER
(1907) para ser usado com um par de diapasões, cujas freqüên-
cias sejam idênticas.
O teste de Stenger se baseia nos princípios de que: 1.
quando um som com diferença de intensidade de 5 a 10 dB é
apresentado simultaneamente aos dois ouvidos de um indiví-
duo com audição normal, este sujeito é capaz de localizar qual
o lado em que o som foi apresentado mais forte; 2. quando o
mesmo procedimento é realizado em um paciente com perda
auditiva unilateral, ele referirá como, mais forte, o lado em que
tem sua audição preservada.
5 25
10 50
20 75
28 88
32 92
40 100
Perda Auditiva Funcional 163
0
10
20
30
40 traçado para som
mcontínuo
50 traçado para som
60 mintermitente
70
80
90
100
110
125 250 500 1k 2k 4k 8k Hz
FIGURA 7.1 – Traçados obtidos à audiometria automática de Békésy – classificados como (Tipo V) por
JERGER & HERER, 1961.
Prova de Carhart
CARHART (1945) elaborou este procedimento que permite ob-
servar a relação entre a perda auditiva para tom puro e a perda
auditiva para fala. Tal relação tem mostrado que a perda auditiva
para tom é igual à perda para fala, com uma margem de diferença
de até 5 dB.
Perda Auditiva Funcional 165
Audiometria tonal
Hz .25 .5 1K 2K 3K 4K 6K 8K LRF IRF MONO DIS
OD 20 20 15 15 10 10 10 15 15 dB 55 dB 100% 100%
FIGURA 7.2 – Nesta figura pode-se visualizar a discrepância entre os resultados obtidos à audiometria
tonal e a medida do reflexo acústico contralateral.
Emissões otoacústicas
Segundo NORTON & STOVER (1994), emissões otoacústicas
são os sons gerados dentro de uma cóclea normal que podem ser
registrados no conduto auditivo externo. KEMP (1978) foi o primei-
ro pesquisador a registrar e medir as emissões otoacústicas.
Acredita-se que as emissões otoacústicas refletem a atividade de
mecanismos biológicos ativos que existem dentro da cóclea,
responsáveis pela sua extrema sensitividade em relação à fre-
qüência e intensidade do estímulo.
Existem dois tipos de otoemissões: 1. a espontânea, que
ocorre na ausência de estimulação externa e; 2. a evocada, ocorre
durante ou após estimulação acústica externa.
Por ser uma técnica não invasiva e por serem muito sensíveis
ao estado da cóclea, as emissões otoacústicas evocadas são um
instrumento muito valioso na clínica audiológica. Tem sido de-
monstrado que sujeitos, com audição periférica normal, apresen-
tam, na maior parte dos casos, registros de emissão otoacústica
com alta reprodutibilidade e baixa distorção, e que pacientes
portadores de perda auditiva periférica coclear têm seus registros
alterados ou ausentes.
168 Fonoaudiologia Prática
CONCLUSÃO
A audiologia clínica dos últimos 20 anos trouxe muitas
novidades tecnológicas que facilitaram a vida dos examinado-
res que atuam na área da perícia médica, onde avaliam simula-
dores voluntários ou involuntários que examinam pacientes com
distúrbios psicológicos, perceptuais, com deficiências neuroló-
gicas e/ou sensoriais associadas.
O desenvolvimento de procedimentos tais como: audiometria
de tronco cerebral, pesquisa da emissão otoacústica e pesquisa
do reflexo acústico permitiram ao fonoaudiólogo concluir com
mais segurança e confiança se determinado paciente é ou não
portador de pseudo-hipoacusia.
A observação cuidadosa do comportamento, das atitudes, da
qualidade da voz, da fala, da linguagem oral e corporal do paciente
podem fornecer pistas importantes para que o examinador venha
a suspeitar de audição normal, quando a queixa é de dificuldade
parcial ou total para ouvir.
Leitura recomendada
AZZI, A. – Le prove per svelare la simulazione di sordita. Riv. Audiologia
Prat., 5-6:23-55, 1952.
CAMPBELL, R. – Na index of pseudo-discrimination loss. J. Speech
Hearing Res., 8:77-84, 1965.
DOBIE, R. – Physiological techniques used in assessment of the auditory
system. In: KEITH, R. Audiology for the Physician. Baltimore, Williams
and Wilkins Co.(5), 1980.
FOURNIER, J. – The detection of auditory malingering. Trans. Beltone
Inst. Hear. Res., 8, 1958.
HOPKINSON, N.T. – Speech tests for pseudohypoacusis. In: KATZ, J.
Handbook of Clinical Audiology . 2ª ed. Baltimore, Williams and
Wilkins, 1978. pp. 291-303.
JERGER, J. & HERER, G. – An unexpected dividend in Békésy audiometry.
J. Speech Hearing Disorders, 26:390-391, 1961.
JERGER, J.; BURNEY, I.; MAULDIN, L.; CRUMP, B. – Predicting hearing
loss from the acoustic reflex. J. Speech Hear. Disord., 39:11-22,
1974.
170 Fonoaudiologia Prática
8
Imitância Acústica:
Aplicações Clínicas
Timpanometria
Timpanometria é o método utilizado para a avaliação da
mobilidade da membrana do tímpano e das condições funcionais
da orelha média. É realizada medindo-se a capacidade que tem a
membrana de refletir um som introduzido no meato acústico
externo, em resposta a graduais modificações de pressão no
mesmo conduto.
JERGER, estudando mais de 400 pacientes, determinou três
tipos fundamentais de curvas timpanométricas, conforme a afec-
ção encontrada na orelha média:
a) A curva A é caracterizada por um pico máximo ao redor de
0 (zero) decaPascal de pressão, e foi encontrada em indivíduos
normais ou em portadores de otosclerose.
b) Na curva do Tipo B não existe aquele pico de máxima
complacência e a curva se mostra inalterável, mesmo que as
variações de pressão no meato acústico externo sejam grandes.
Estas foram encontradas em pacientes portadores de otite média
secretória.
c) O terceiro tipo foi denominado de C e seu ponto mais alto,
isto é, de máxima complacência, estava deslocado para pressões
muito negativas, em torno de –100 daPa. Foi encontrado em
pacientes portadores de malfuncionamento tubário.
O mesmo JERGER e cols., após a realização de mais de mil
timpanometrias em pacientes com vários tipos de alterações da
orelha média e com membrana do tímpano normal, descrevem
duas outras curvas classificadas dentro do Tipo A:
• Uma delas, a denominada de Ar (curva de rigidez) mostra-
se achatada, porém seu perfil é semelhante ao da curva A,
que passou a ser denominada An. Esse tipo Ar foi achado
em pacientes com otosclerose, timpanosclerose ou com
membranas timpânicas espessas.
178 Fonoaudiologia Prática
1
2
3
4
5
6
7
8
9 FIGURA 8.3 – Timpanograma Tipo A. Encontrado
10 em pacientes com orelha média normal.
1
2
FIGURA 8.4 – Timpanograma Tipo B. Encontrado
3 em pacientes portadores de otite média secretória
4
com fluido na orelha média. Esta curva também
5
6 poderá ser observada em pacientes com peque-
7 nas perfurações da membrana do tímpano com
8
9 tuba auditiva obstruída ou ainda em otuloses,
10 porém sem valor diagnóstico.
1
2
3
4 FIGURA 8.5 – Timpanograma Tipo C. É encontra-
5
6 do em pacientes com disfunção da tuba auditiva.
7 Semelhante ao Tipo A, porém com o ponto de
8
9 maior complacência deslocado para o lado de
10 pressões negativas.
1
2
3
4
5
6
7
8
9
FIGURA 8.6 – Timpanograma Tipo Ar. Encontrado
10 em pacientes portadores de otosclerose.
1
2
3
4
5
6 FIGURA 8.7 – Timpanograma Tipo Ad. É encontra-
7 do em pacientes portadores de hipoacusia condu-
8
9 tiva causada por disjunção traumática da cadeia
10 ossicular.
Imitância Acústica: Aplicações Clínicas 179
Complacência estática
A expressão complacência estática é usada em contraste com
a da medida de complacência dinâmica, exemplificada pela
timpanometria e pesquisa do reflexo do músculo do estribo.
Usando a ponte eletroacústica, é medida no ponto de máxima
complacência do timpanograma. No caso de uma orelha normal
este ponto deverá ser encontrado próximo da pressão zero daPa,
podendo ser ligeiramente negativo.
–80 2
–60 4
–40 10
–20 10
Zero 55
+20 16
+40 2
FIGURA 8.8 – Medida das pressões encontra- +60
das na orelha média num grupo de pacientes
0 20 40 60 80
normais. Notar a variação de pressões des-
de negativas a positivas observadas naque- Pacientes %
les pacientes.
180 Fonoaudiologia Prática
Normais
Otite média secretória
Sensorioneurais
60% Otosclerose
50%
40%
30%
20%
10%
0,1
0,2
0,3
0,4
0,5
0,6
0,7
0,8
0,9
1,0
1,1
1,2
1,3
1,4
1,5
1,6
1,7
1,8
1,9
2,0
FIGURA 8.9 – Curva de distribuição das freqüências das complacências encontradas em pacientes com
orelhas médias normais, portadores de disacusias sensorioneurais, otosclerose e otite média secretória.
Imitância Acústica: Aplicações Clínicas 181
Segundos Normal
Flexão →
Otosclerose
On Off
1,5s Tempo
+200
daPa
+100
+200
daPa
+100
Pressão
residual
FIGURA 8.12 – Prova de função tubária em um 0
paciente com obstrução parcial da tuba audi-
tiva. Deglutições
+200 Pressão
residual
daPa
+100
0
FIGURA 8.13 – Prova de função tubária em um
paciente com obstrução da tuba auditiva. Deglutições
0
Caso Data
Segundos Tempo
1
Examinador
RF
2 2
3 3
4 4
R
Segundos
5 5
6 6
7 7
SR
FIGURA 8.14 – Registro das modificações da imitância em um paciente com tuba auditiva muito
permeável: RF = em respiração forçada; R = em respiração normal; SR = paciente sem respirar, não
há modificação da imitância da orelha.
250 500 1K 2K 4K 8K Hz
10
E.B.A. = completo
20
I.S.I. = 100%
30
40
50
60
70
80
FIGURA 8.15 – Níveis do reflexo do músculo
90 R R do estribo em um paciente que apresenta o
R R
100 fenômeno do “recrutamento”. Há uma acen-
110 tuada redução dos valores diferenciais entre
os níveis tonais e para o reflexo (recrutamen-
dB NA Doença de Ménière to de Metz).
Imitância Acústica: Aplicações Clínicas 185
IMITANCIOMETRIA NO DIAGNÓSTICO
OTONEUROLÓGICO
GREISEN e cols. descreveram dois casos de pacientes porta-
dores de tumor do tronco cerebral, nos quais não se conseguiu
obter o reflexo do músculo do estribo (contralateral), embora a
audição de ambos estivesse dentro dos limites da normalidade. A
despeito de apresentarem níveis normais e de não haver paralisia
facial, o reflexo contralateral se encontrava abolido em ambas
%
100
% Normal
100
50
50
0
0
0 5 10 15 20 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 12
Segundos Segundos
1.000 Hz intensidade 100 dB 100 Hz intensidade 100 dB
FIGURA 8.16 – Registro da contração do músculo FIGURA 8.17 – O mesmo registro num paciente
do estribo. Observar que o músculo permanece com afecção retrococlear (neural). Há uma acen-
contraído durante o tempo do estímulo sonoro tuada queda da contração (> 50%) após 5s de
(100 dB NA a 1.000 Hz). estímulo sonoro (100 dB NA a 1.000 Hz).
186 Fonoaudiologia Prática
Ltp = Lrb
Normal Sensorioneural
LD LDA
Nível Tom
Tom
puro
puro
Limiar para
ruído branco
N M
FIGURA 8.19 – Diferenças entre os níveis para o reflexo do músculo do estribo para um tom puro e para
o ruído branco em paciente com audição normal e com disacusia sensorioneural (adaptado de
JERGER).
190 Fonoaudiologia Prática
TABELA 8.1
Categoria Nível auditivo predito
Normal perdas menores de 20 dB (NA)*
Suave a moderada perdas entre 20 e 49 dB (NA)*
Severa perdas entre 50 e 84 dB (NA)*
Profunda perdas maiores de 85 dB (NA)*
* Média das freqüências 500, 1.000 e 2.000 Hz.
disacusia prevista = D – E + F
TABELA 8.2
Valor do DP Valor de Lrb Nível predito
20 ou mais qualquer normal
15 a 19 90 dB ou menos normal
15 a 19 mais de 90 dB suave a moderada
10 a 14 qualquer suave a moderada
menos que 10 100 dB ou menos suave a moderada
menos que 10 mais de 100 dB severa
ausência de reflexos qualquer profunda
Nota – Adaptada de JERGER.
Nossos resultados
Estudamos um grupo de 82 orelhas, sendo 47 com audição
normal e 35 portadores de deficiência auditiva sensorioneural.
Em nossos estudos tivemos um acerto de 76,8% na predição
dos níveis auditivos e um erro moderado de 21,9%. A Tabela 8.3
oferece em detalhes os resultados de nosso estudo.
Se considerarmos a simplicidade do método da imitancio-
metria e seus resultados na predição da audição do nível
auditivo, verificamos o horizonte que nos abre na possibilidade
da avaliação da audição, principalmente em crianças pequenas
com deficiências auditivas. Em nenhum caso de perda severa
ou profunda foi feita predição de audição normal, assim como o
inverso também foi verdadeiro. Se associarmos os dados obti-
dos por este método com as informações conseguidas da
anamnese, exame físico e outros dados obtidos por métodos
convencionais, poderemos valorizá-lo dentro de uma correta
interpretação. A precisão do método é surpreendentemente
boa, pois raros foram os erros graves (1,3%). Esta técnica é
especialmente útil na confirmação de audição normal em crian-
ças que, tendo sido submetidas a fatores determinantes de
lesão do aparelho auditivo na gestação, parto ou ainda nos
primeiros meses de vida, trazem sérias preocupações à família
quanto à possibilidade da existência de uma deficiência auditi-
va. Embora pareça ser difícil e demorado, pelos cálculos neces-
sários, o método é simples e pode ser realizado em menos de
10min. Algumas vezes e principalmente em crianças pequenas,
é necessária uma sedação que não prejudica os resultados,
como já havíamos estudado em trabalho anterior. É óbvio que
os resultados não podem ser considerados isoladamente, sem
uma avaliação global, como também o resultado de uma audio-
metria de tronco cerebral ou eletrococleografia (que são muito
mais precisos) não podem ser aceitos em separado.
A predição obtida pela imitanciometria deve fazer parte de
um conjunto de dados na avaliação global do paciente com
TABELA 8.3
Nível previsto
Nível medido Normal Suave a Severo Profundo
moderado
Normal 41 (87,2%) 6 (12,7%) — —
Suave a 9 (36%) 15 (60%) 1 (4%) —
moderado
Severo — 1 (16,6%) 5 (83,3%) —
Profundo — 1 (25%) — 3 (75%)
Imitância Acústica: Aplicações Clínicas 193
Ipsilateral
Diagonal
Contralateral
Ipsilateral
L invertido
Contralateral
Ipsilateral
Vertical
Contralateral
Ipsilateral
Normal
Contralateral
FIGURA 8.20 – Padrões de respostas que podem ser
Ipsilateral obtidas através do reflexo ipsilateral combinado com
o contralateral.
Configuração horizontal
A configuração horizontal é aquela obtida quando não encon-
tramos os reflexos contralaterais em ambas orelhas.
Contralateral
Ipsilateral
Configuração diagonal
Neste tipo de configuração, os reflexos estão ausentes quan-
do a orelha lesada é a orelha eferente (isto é, orelha oposta no
estímulo contralateral e orelha comprometida no ipsilateral).
Contralateral
Ipsilateral
Configuração em L invertido
Na configuração em L invertido, o reflexo encontra-se ausente
em ambos estímulos contralaterais e ausente na orelha lesada,
quando do estímulo ipsilateral.
Contralateral
Ipsilateral
Configuração vertical
Neste tipo de configuração, o reflexo encontra-se ausente
quando a orelha lesada é a eferente (no estímulo contralateral e
ipsilateral).
Imitância Acústica: Aplicações Clínicas 197
Contralateral
Ipsilateral
Configuração normal
Na considerada normal, todos os reflexos estão presentes,
quer no estímulo contra, quer no ipsilateral.
Contralateral
Ipsilateral
Contralateral
Sonda e Fone dir. Sonda e fone esq.
Diagonal
Num paciente com uma lesão sensorioneural não-recrutante
numa orelha (por exemplo, um schwannona vestibular) ou ainda
com uma lesão sensorioneural com perdas maiores que 85 dB NA,
encontraremos o reflexo contralateral quando a orelha normal for
estimulada e o ipsilateral apenas na orelha normal.
A configuração é diagonal e só poderá ser obtida nestes dois
tipos de lesões.
Fone dir. (aferente) Fone esq. (aferente)
Sonda dir. (eferente) Sonda esq. (eferente)
Contralateral
Sonda e Fone dir. Sonda e fone esq.
L invertido
Um paciente portador de uma deficiência auditiva condutiva
unilateral, por exemplo, do lado esquerdo, e com orelha direita
normal teria a seguinte configuração (desde que sua perda
auditiva do lado comprometido seja maior que 45 dB NA) ausência
de reflexos em ambas orelhas no contralateral (na aferente
esquerda por falta de nível auditivo para desencadear o reflexo e
na aferente direita pela presença de uma lesão condutiva na
eferente esquerda). Quando da pesquisa do ipsilateral, haverá o
encontro de reflexo normal na orelha direita (a normal) e ausência
na esquerda (pelos dois fatores, falta de nível e presença de uma
lesão na orelha média). Este paciente teria uma configuração
denominada de L invertido. Este tipo de configuração só poderá
ser encontrada em um paciente com uma lesão condutiva unila-
teral com perda maior que 45 dB NA.
Fone dir. (aferente) Fone esq. (aferente)
Sonda dir. (eferente) Sonda esq. (eferente)
Contralateral
Sonda e Fone dir. Sonda e fone esq.
Vertical
Se um paciente tiver uma perda condutiva leve (menor que 45
dB NA) em um das orelhas, a pesquisa dos reflexos mostrará o
seguinte quadro:
Fone dir. (aferente) Fone esq. (aferente)
Sonda dir. (eferente) Sonda esq. (eferente)
Contralateral
Normal
Será configuração normal quando o reflexo for encontrado em
ambas orelhas, quer no estímulo contra quer no ipsilateral. Este
achado será possível em pacientes normais ou naqueles com
perdas sensorioneurais recrutantes uni ou bilaterais, menores
que 85 dB NA.
Fone dir. (aferente) Fone esq. (aferente)
Sonda dir. (eferente) Sonda esq. (eferente)
Contralateral
Sonda e Fone dir. Sonda e fone esq.
Resumo e interpretação
Configuração Interpretação
Horizontal Apenas em lesões do tronco cerebral
Diagonal Lesão sensorioneural
retrococlear unilateral
Lesão sensorioneural coclear
unilateral com perdas maiores
que 85 dB NA
L invertido Lesão condutiva unilateral
(perdas maiores que 45 dB NA)
Vertical Lesão condutiva unilateral
leve (menor que 45 dB NA)
Paralisia facial supra-estapediana
200 Fonoaudiologia Prática
Leitura recomendada
ANDERSON, H. et al. – The early detection of acoustic tumours by the
stapedius reflex test. In: WOLTENHOLME, G.E. & KNIGHT, J.
Sensorial Hearing Loss. London, J.A. Churchil, 1970.
FELDMAN, A.S. & WILBER, L.A. – Acoustic Impedance & Admittance.
The Measurement of the Middle Ear Function. Baltimore, The Williams
& Wilkins Co., 1976.
HOLMQUIST, J. – Eustachian tube function assessed with tympanometry.
Acta Otolaryng., 68:501-508, 1969.
JERGER, J. et al. – Studies in impedance audiometry. Arch. Otolaryng.,
96:513-523, 1972.
JERGER, J. et al. – Handbook of Clinical Impedance Audiometry. New
York, American Eletromedical Co., 1975.
KIRIKAE, I. – The structure and function of the middle ear. Tesis
University. Tokyo Press, 1960.
KLOCKHOFF, I. – Middle ear reflex in man. Acta Otolaryng., Suppl. 162,
1961.
LOPES FILHO, O. – Contribuição ao Estudo Clínico da Imitância Acús-
tica. Tese Universidade de São Paulo, 1972.
LOPES FILHO, O. – The early diagnosis of a glomic tumor in the middle-ear
by means of acustic impedance. Impedance New letter, 1:1-5, 1972.
LOPES FILHO, O. – Da imitância acústica do ouvido médio e do
diagnóstico otológico. Rev. Brasil. O.R.L., 39:66-76, 1973.
LOPES FILHO, O. – Estudo clínico da atividade dos músculos do ouvido
médio, pelo método da imitância acústica. Rev. Brasil. O.R.L.,
41:111-140, 1975.
LOPES FILHO, O. – Método objetivo no diagnóstico otológico. Atual em
Otol. e Fon., 2:113-126, 1973.
LOPES FILHO, O. – Predição do nível auditivo por meio da impedancio-
metria. Rev. Brasil, O. R. L., 41:238-246, 1975.
LOPES FILHO, O. & CAMPOS, C.A.H. – Estudo clínico de alterações na
imitância do ouvido médio em pacientes com hipertensão intracra-
niana. Rev. Bras. O.R.L., 43:154-160, 1977.
LOPES FILHO, O. et al. – O reflexo ipsilateral em impedanciometria.
Rev. Brasil O.R.L., 44:54-64, 1978.
METZ, O. – The acoustic impedance measured on normal and pathological
ears. Acta Otolaryng., Suppl., 63, 1946.
Audiometria Eletrofisiológica 201
9
Audiometria
Eletrofisiológica
INTRODUÇÃO
A audiometria de respostas elétricas (Electric Response
Audiometry – ERA) é o conjunto de métodos que avaliam a
atividade eletrobiológica ao longo do sistema auditivo, da orelha
interna ao córtex cerebral. Atualmente ela apresenta grande
interesse, pelo seu emprego em Audiologia, como exame comple-
mentar em diversas situações da audiologia clínica.
Os primeiros potenciais evocados auditivos no ser humano
foram captados e reconhecidos como respostas a estímulos
acústicos em 1939, por DAVIS. Estas respostas, denominadas na
época de “complexo K”, de origem provável no córtex cerebral,
eram modificações do traçado do eletroencefalograma, que ocor-
riam de forma inespecífica a uma série de estímulos sensoriais,
tais como à luz e ao som. Em 1945, LEMPERT e cols. obtiveram com
sucesso potenciais sensoriais do ouvido interno no transcurso de
cirurgias otológicas e com eletrodo implantado diretamente na
janela redonda. Nesta época, a análise dos potenciais era feita por
superposição de imagem fotográfica e a diminuta amplitude dos
mesmos impediu uma aplicação clínica imediata dos potenciais
gerados pelo sistema auditivo.
Na década de 60, com a introdução de promediadores desti-
nados a evidenciar as respostas do sistema auditivo, através da
extração das respostas eletrobiológicas e do ruído de fundo, a
ERA adquiriu grande desenvolvimento.
202
Da orelha interna
Do ponto de vista fisiológico, o ducto espiral da cóclea é
dividido em dois compartimentos, pela membrana basilar: a esca-
la vestibular e o ducto coclear de um lado e a escala timpânica de
outro. A escala vestibular e ducto coclear são separados pela
membrana de Reissner, delgada e flexível, e sua função pode ser
considerada desprezível considerando as propriedades acústicas
da onda de propagação na orelha interna.
A membrana basilar, que separa o ducto coclear da escala
timpânica e aonde se situa o órgão de Corti, é muito importante do
ponto de vista fisiológico. Ela é espessa, estreita e rígida na espira
basal, tornando-se fina, larga e flexível na espira apical da cóclea.
Quando a orelha interna é estimulada acusticamente, via janela
oval, ocorre ao longo da membrana basilar um movimento
sinusoidal que progride da espira basal à espira apical da cóclea,
denominado de onda de propagação coclear. A amplitude da onda
Audiometria Eletrofisiológica 203
3
2
1
OP IHC
NF FIGURA 9.2 – Microscopia eletrônica de
SN
varredura (SEM) do órgão de Corti, de-
TC monstrando as células ciliadas internas
NP
(IHC), as células ciliadas externas (1/2/3),
a célula do pilar (OP), feixes de fibras
neurais (NF), o espaço de Nuel, o túnel
BM de Corti (TC) e a membrana basilar (BM).
Nas setas os estereocílios das células
ciliadas.
Audiometria Eletrofisiológica 205
, 0,6
mm
OHC
Potenciais sinápticos
Outra forma de atividade neuronal são os potenciais pós-
sinápticos oriundos dos dendritos e dos corpos celulares da
substância cinzenta do SNC. Os potenciais sinápticos represen-
tam a atividade de integração entre os diversos núcleos do
206
POTENCIAIS AUDITIVOS
Potenciais cocleares
Eletrococleografia (ECochG)
A ECochG caracteriza-se por avaliar o receptor periférico da
audição, a orelha interna e nervo coclear, sendo a resposta mais
característica o potencial de ação global do nervo coclear.
O eletrodo de captação, usualmente empregado, é um eletrodo
transtimpânico, com formato de uma agulha, que se insere ao nível
Audiometria Eletrofisiológica 207
5
2
4
3
dB NA dB NA
110 1 µV
110 1 µV
100
100
90
90
80
80
70
1 µV
60 70 1 µV
50 60
40
50
30
40
20
15
1 µV Sem estímulo 1 µV
Sem estímulo
Tempo
Tempo (ms)
0 10 0 10 (ms)
Estímulo Estímulo
FIGURA 9.6 – Respostas ECochG normal, com FIGURA 9.8 – Respostas de ECochG recrutante,
limiar eletrofisiológico a 15 dB NA. com limiar eletrofisiológico a 40 dB NA. Notar a
pequena variação dos valores da latência, das
altas intensidades ao limiar eletrofisiológico.
dB NA dB NA
110
1 µV 110
1 µV
100 100
90
90
80
80
70
1 µV
70
60
60
50
50 40
30
40
Sem estímulo 1 µV
Tempo (ms)
0 10
Sem estímulo 1 µV Estímulo
Tempo
F IGURA 9.9 – Respostas de ECochG dissocia-
0 10 (ms)
Estímulo
da, com limiar eletrofisiológico a 50 dB NA.
Notar o potencial com duplo pico negativo e a
FIGURA 9.7 – Respostas de ECochG condutiva, latência extremamente prolongada ao limiar
com limiar eletrofisiológico a 40 dB NA. eletrofisiológico.
Audiometria Eletrofisiológica 209
PS
Normal
PA
PS
hidropisia endolinfática
PS > 30% PA
PA
FIGURA 9.10 – Potencial de ação largo na hidropisia FIGURA 9.11 – Potencial de ação anormal. Notar a
endolinfática. Notar a amplitude do potencial de morfologia larga e a presença do pico positivo
somação significativa (amplitude relativa maior precoce.
que 30%), negativo e precedendo o potencial de
ação.
V
III
IV
I
II
VI
VII
I III V
BSER normal
I III
DA neural
I III V
0 5 10
Esclerose múltipla
SN10
20 dB
40 dB
60 dB
P2
P1
4 µV
N1
N2
Indicações em adultos
A deficiência auditiva sensorioneural apresenta, em muitas
ocasiões, um sério desafio para a definição do topodiagnóstico
correto. Em audiologia clínica, estas são situações em que a
ECochG e a BSER são muito úteis, principalmente pela observa-
ção da velocidade de condução central.
A ECochG avalia principalmente a orelha interna e o nervo
coclear; os potenciais do nervo coclear podem ser estudados
principalmente nas curvas de entrada/saída da latência. As for-
mas das curvas de entrada/saída da latência, associadas à
variação morfológica do potencial de ação, permitem estabelecer
as quatro curvas básicas da ECochG: 1. normal; 2. condutiva; 3.
recrutante; e 4. dissociada. A morfologia do potencial de ação
permite, em certas circunstâncias, o diagnóstico da deficiência
auditiva. Os potenciais de ação largos, caracterizados pela super-
posição de um potencial de somação negativo a um potencial de
ação normal, são característicos de hidropisia endolinfática e,
portanto, de uma deficiência auditiva sensorial; os potenciais de
ação largos, com morfologia bizarra, são característicos de lesão
neural ao nível do nervo coclear. A ECochG pode ser particular-
mente útil para a obtenção do potencial de ação de nervo coclear,
a P:I da BSER nas situações em que pela BSER não foi possível
a obtenção dos potenciais, particularmente da P:I.
As deficiências auditivas sensorioneurais com velocidade de
condução central atestada pela BSER normais são compatíveis
com lesões predominantemente sensoriais; por outro lado, defi-
ciências auditivas com velocidades de condução central altera-
das, atestadas pelo aumento significativo da latência interpico P:I-
V, são compatíveis com lesões neurais e/ou centrais.
Como foi comentado, a velocidade de condução central de P:I-
V é em média de 4ms às estimulações ao redor de 60 a 80 dB NA;
aumento de P:I-V (acima de 4,5ms) à custa de P:I-III indica lesões
neurais e/ou de tronco encefálico baixo: aumento de P:I-V à custa
de P:III-V é sugestivo de lesão de tronco encefálico alto, pela
BSER.
Alterações na morfologia da BSER também são sugestivas de
lesões neurais; a ausência de todas as ondas; a ausência de P:III
e/ou P:V são as alterações morfológicas mais comumente encon-
tradas.
A associação dos dois exames permite alta sensibilidade e
especificidade no topodiagnóstico das deficiências auditivas sen-
sorioneurais.
216
Indicações em crianças
A ERA tem se revelado um exame extremamente útil na
avaliação audiológica da população pediátrica, permitindo deter-
minar a natureza da deficiência auditiva e a predição do limiar
auditivo. Especificamente, a ECochG e a BSER sempre devem
ser consideradas em conjunto com a avaliação audiológica con-
vencional; a avaliação isolada de tais testes pode incorrer em
erros diagnósticos, em determinadas situações.
A ECochG permite a avaliação mais precisa do limiar eletro-
fisiológico, por ser um teste monoaural, por avaliar o fenômeno do
recrutamento coclear e pela proximidade dos geradores dos
potenciais com os eletrodos. Deve ser utilizada nos casos de
indicação de aparelhos de amplificação sonora individual, tendo
em vista a orelha mais adequada para a protetização, e a escolha
adequada das características eletroacústicas da prótese auditiva
a ser selecionada.
A BSER permite uma avaliação mais ampla do sistema
auditivo, da orelha interna ao tronco encefálico. Além de poder ser
utilizada para a predição do limiar psicoacústico, tendo em vista
uma possível adaptação de aparelho de amplificação sonora
individual, permite a detecção de anormalidades ao nível de
tronco encefálico, por imaturidade, lesões degenerativas e/ou
tumorais ao nível do SNC. Especificamente, ao neonato de alto
risco, é nosso pensamento que, para a detecção de provável
deficiência auditiva, deve ser estabelecido um programa de teste
tipo Passa/Falha, a ser aplicado a cada quadrimestre até os 12
meses de idade. Deve ser salientado que neonatos de alto risco
Audiometria Eletrofisiológica 217
RN de 30 semanas
Pré-exsangüíneo OD-L= 80 dB
I V
III
OE-L=?
Pós-exsangüíneo OD-L= 40 dB
I III
0 10 20
V OE-L= 40 dB
I III FIGURA 9.18 – Respostas pela BSER em
um neonato com hiperbilirrubinemia mode-
rada/severa (bilirrubina indireta em 20
mg/dl), pré e pós-exsangüineotransfusão.
Notar a melhora acentuada das respostas
80 dB NA - 20 est./s –20ms após correção dos níveis de bilirrubina.
Leitura recomendada
DAVIS, H. – Principles of electric response audiometry. Ann. Otol.,
Rhinol. & Laryngol ., 28(Suppl):95, 1976.
HALL III, J.W. – Handbook of Auditory Evoked Response. Massachussets,
Alyn & Bacon, 1992. 871 p.
HYDE, M.L. – Objective tests of hearing – Auditory evoked potentials. In:
Adult Audiology. Otolaryngology. 5ª ed. Scott-Brown’s London,
Butterworths, 1987. pp. 272-297.
KEIDEL, W.D. & NEFF, W.D. – Handbook of Sensory Physiology. Vol. 3.
Berlin, Springer-Verlag, 1976. 811 p.
OWEN, J.H. & DAVIS, H. – Evoked Potential Testing – Clinical Applications.
New York, Grune & Stratton, Inc., 1985. 259 p.
RUTH, R.A. & LAMBERT, P.A. – Auditory evoked potentials. In:
Otolaryngol. Clin. of North Amer., 24(2):349-370, 1991.
Deficiência Auditiva 1
Emissões Otoacústicas 221
10
Emissões Otoacústicas
INTRODUÇÃO
CURSOR (dB,Hz)
Freq.: 69,9 NF: 3 dB 0
Level: 2 dB SPL
FIGURA 10.1 – Esta figura representa a tela do monitor de vídeo com as informações que são fornecidas
pelo exame, no caso mostrando um paciente com emissões espontâneas bem significativas. No
quadro principal, o maior, temos então um espectro que relaciona a amplitude da emissão nas diversas
freqüências. Notar a presença de dois picos, sendo o maior e mais significativo em torno de 1.621, 2
Hz com uma amplitude de 4 dB NPS e um menor de 0 dB NPS na freqüência de 1.328,8 Hz; resultados
que podem ser lidos no quadro menor acima e à esquerda.
SYSTEM PARAMETERS
Max Frq. : 5000 Hz 20
Gain (A) : 57 dB
Prg. Swp : 1000
Acc. Swp : 251 10
Rej. Swp : 235
CURSOR (dB,Hz) 0
Freq.: 1.551,3 NF: –4 dB
Level: –4 dB SPL
FIGURA 10.2 – Representação da tela do analisador num caso onde não encontramos emissões
espontâneas.
226 Fonoaudiologia Prática
CURSOR
0,00 mS
A&B
Pa
F1: Start
F2:
F3: L/R A+B
F4: Subj.
F5: Save
F6: Load
F7: Adj. A–B
F8:
F9: Setup
F10: Prnt.
PgUp: ▲▲ 0 5 10 15 mS
PgDn: ▼▼
SYSTEM PARAMETER c
f2/f1 : 1,22 dB DP-GRAM
f0 : 500 Hz SPL
f1 : 452 Hz 50
f2 : 553 Hz
2*f1–f2 : 351 Hz 40
2*f2–f1 : 654 Hz 30
f1 Level : 70 dB SPL
f2 Level : 70 dB SPL 20
Gain (A) : 30 dB
Acc.Swp : 200 (200) 10
Rej.Swp : 31 SD3 0
CURSOR (dB,Hz) –10
Freq.: 654,9 NF: –16 dB
Level: 8 θ: 184 Dg –20
SYSTEM PARAMETERS c
f2/f1 : 1,22 DP-GRAM
f0 : 1006 Hz dB
f1 : 910 Hz SPL
f2 : 1112 Hz 50
2*f1–f2 : 708 Hz 40
2*f2–f1 : 1314 Hz
f1 Level : 70 dB SPL 30
f2 Level : 70 dB SPL
Gain (A) : 27 dB 20
Acc.Swp : 0 (200) 10
Rej.Swp : 0 SD3
0
CURSOR (dB,Hz)
Freq.: NF: –21 dB –10
Level: –17 θ: 24 Dg –20
F1: Start F6: Load –30
F2: F7: DP-Rec.
F3: L/R F8: D-Mode▲ –40
F4: Subject F9: Setup
F5: Save F10: Pr. Scr
–50
250 [Hz] 500 750 1k 1k5 2k 3k 4k 6k 8k
↔
SYSTEM PARAMETERS c
f2/f1 : 1,22 dB INPUT/OUTPUT GRAPH
f0 : 1006 Hz SPL
f1 : 910 Hz 40
f2 : 1112 Hz
2*f1–f2 : 708 Hz 30
2*f2–f1 : 1314 Hz 20
f1 Level : 40 dB SPL
f2 Level : 40 dB SPL 10
Gain (A) : 21 dB
Acc.Swp : 10 (100) 0
Rej.Swp : 9 SD3 –10
CURSOR (dB,Hz) –20
Freq.: NF: dB
Level: θ: Dg –30
FIGURA 10.6 – Como nos exemplos anteriores, temos a faixa de normalidade (faixa sombreada) e as
amplitudes das respostas representadas pelos círculos e também no quadro superior à direita. Neste
caso, o “limiar” das EOAPD na freqüência de 1.006 Hz (f0) foi de 40 dB NPS.
SYSTEM PARAMETERS c
f2/f1 : 1,22 dB AMPLITUDE SPECTRUM
f0 : 1006 Hz SPL
f1 : 910 Hz
70
f2 : 1112 Hz
2*f1–f2 : 708 Hz 16 60
2*f2–f1 : 1314 Hz 10
f1 Level : 70 dB SPL
50
f2 Level : 70 dB SPL 40
Gain (A) : 21 dB
Acc.Swp : 10 ( 100) 30
Rej.Swp : 9 SD3 20
CURSOR (dB,Hz) 10
Freq.: 705,7 NF: –1 dB
Level: 16 θ: 42 Dg 0
F1: Start F6: Load –10
F2: DP 1-2 F7: Mark IO
F3: L/R F8: D-Mode▲
–20
F4: Subject F9: Setup –30
F5: Save F10: Pr. Scr 0,0 0,5 1,0 1,5 2,0 kHz 2,5
↔
FIGURA 10.7 – Nesta figura temos o espectro relacionando freqüência e amplitude. Nele podemos
observar dois grandes picos que seriam os estímulos que estão sendo apresentados (f1 = 910 kHz e
f2 = 1.112 kHz). Ao lado destes picos encontramos dois outros menores (708 kHz = 2(f2-f1) no valor
de 16 dB NPS e 1.314 kHz = 2(f1-f2) no valor de 10 dB NPS), porém de menor amplitude que
representam as EOAPD nesta freqüência e intensidade.
Emissões Otoacústicas 235
Leitura recomendada
BONFILS, P. – Spontaneous otoacoustic emissions clinical interest.
Laryngoscope, 99:752-756, 1989.
CERANIC, B.J.; PRASHER, D.K.; LUXON, L.M. – Tinnitus and otoacoustic
emissions. Clin Otolaryngol ., 20:192-200, 1995.
LONSBURY-MARTIN, B.L.; CUTLER, W.M.; MARTIN, G.K. – Evidence
for the influence of aging on distortion – product otoacoustic emissions
in humans”. J. Acoust. Soc. Am., 89(4):1749-1759, 1991.
LONSBURY-MARTIN, B.L.; MARTIN, G.K.; PROBST, R.; COATS, A.C.–
Acoustic distortion product in rabbit ear canal. I. Basic features and
physiological vulnerability. Hear. Res., 28:173-189, 1987.
LOPES FILHO, O. & CARLOS, R.C. – Produtos de distorção das
emissões otoacústicas. Revista Brasileira de Medicina ORL, 3(5):
224-237, 1996.
LOPES FILHO, O. & CARLOS, R.C. – Emissões otoacústicas transitó-
rias e produtos de distorção na avaliação de audição em recém-
nascidos. Arquivos Médicos Hosp. Albert Einstein, 1(3):78-83, 1996.
LOPES FILHO, O.; CARLOS, R.C.; REDONDO, M.C. – Produtos de
Distorção das Emissões Otoacústicas. Rev. Bras. ORL, 61(6): 485-
494, 1995.
LOPES FILHO, O. et al. – Emissões otoacústicas. Produtos de distorção
na hidropisia endolinfática aguda. Caderno de Otorrinolaringologia.
A Folha Médica, 112 (Suppl. 1): 87, 1996.
LOPES FILHO, O. et al. – Emissões otoacústicas transitórias e produtos
de distorção na avaliação de audição em recém-nascidos com
poucas horas de vida. Rev. Bras. ORL, 62(3):220-228,1996.
MARTIN, G.K.; PROBST, R.; LONSBURY-MARTIN, B.L. – Otoacoustic
emission in human ears: normative findings. Ear Hear., 11:106-120,
1990.
McFADDEN, D. & PLATTSMIER, H.S. – Aspirin abolishes spontaneous
otoacoustic emissions. J. Acoust. Soc. Am., 76:443-448, 1984.
OWENS, J.J.; McCOY, M.J.; LONSBURY-MARTIN, B.L.; MARTIN, G.K.
– Otoacoustic emissions in children with normal ears, middle ear
dysfunction, and ventilating tubes. Am. J. Otol., 14(1):34-40, 1993.
PROBST, R.; COATS, A.C.; MARTIN, G.K.; LONSBURY-MARTIN, B.L.
– Spontaneous, “click” and tone burst – evoked otoacoustic emissions
from normal ear. Hearing Research ., 21:261-275, 1986.
STRICKLAND, A.E.; BURNS, F.M.; TUBIS, A. – “Incidence of
Spontaneous Otoacoustic Emissions in Children and Infants”. J.
Acoust. Soc. Am., 78:931-935, 1985.
TYLER, R.S. & CONRAD-ARMES, D. – Spontaneous acoustic cochlear
emissions and sensorineural tinnitus. British Journal of Audiology,
16:193-194, 1982.
ZUREK, P.M. – Spontaneous narrow band acoustic signals emitted by
human ears. J. Acoust. Soc. Am., 69:514-523, 1981.
ZUREK, P.M.; CLARK, W.W.; KIM, D.O. – The behavior of acoustic
distortion products in the ear canals of chinchillas with normal or
damaged ears. J. Acoust. Soc. Am., 72:774-780, 1982.
Deficiência Auditiva 1
Avaliação Audiológica no Primeiro Ano de Vida 239
11
Avaliação Audiológica no
Primeiro Ano de Vida
3 – 5 meses
Nº = 51 – T = 24/PT = 27
5 – 7 meses
Nº = 58 – T = 27/PT = 31
7 – 9 meses
Nº = 56 – T = 28/PT = 28
9 – 11 meses Freqüência
Nº = 60 – T = 37/PT = 23 de ocorrência
Termo Pré-termo
(%) (%)
11 – 13 meses
Nº = 50 – T = 28/PT = 22
Recém-nascido a 3 meses
• Procedimento
A criança, em estado de sono leve, é colocada deitada, livre de
cobertas para facilitar a observação das respostas corporais.
Os estímulos sonoros de 70 a 80 dB NPS (guizo e sino) são
acionados em ordem crescente de intensidade,no plano lateral
à direita e à esquerda, com 10 a 20s de duração, à distância de
20 cm do pavilhão auricular. Espera-se observar respostas de
atenção . Quando a criança estiver em alerta, verificar a ocorrên-
cia de resposta de orientação ao som, acionando o estímulo por
20s, estando a criança na posição facilitadora (com apoio de
cabeça). A resposta de orientação ao som aparece em 50 a 70%
dos neonatos, sendo que há decréscimo de resposta com o
aumento da idade (MUIR & FIELD, 1979; FIELD e cols, 1980;
COSTA, 1993; C OSTA e cols., 1993).
248 Fonoaudiologia Prática
• Resultados
Respostas observadas por AZEVEDO (1993) em 50 crianças
nascidas a termo sem intercorrências de até 3 meses de idade:
Idade Crianças Sobressalto Atenção RCP
(meses) (nº) (%) (%) (%)
0–1 16 56,3 25 100 Habituação
1–2 21 33,3 38 100 2º
2–3 13 23 76,9 100 estímulo
De 3 a 6 meses
• Procedimento
Criança em alerta, recostada ou sentada no colo da mãe, com
brinquedo pouco atrativo à frente para distrair sua atenção.
Estímulos sonoros de 60 a 70 dB NPS são acionados em
ordem crescente de intensidade, no plano lateral, à direita e à
esquerda, com 2s de duração, à distância de 20 cm do pavilhão
auricular. Espera-se observar, nas crianças de 3 meses, respos-
tas de atenção e nas crianças de 4 e 5 meses respostas de procura
da fonte e localização.
Pesquisa do reflexo cocleopalpebral com estímulos de 90 a
100 dB NPS (black-black e agogô), que deve estar presente.
• Resultados
Respostas observadas por AZEVEDO (1993) em 37 crianças
nascidas a termo e sem intercorrências de 3 a 6 meses:
Avaliação Audiológica no Primeiro Ano de Vida 249
De 6 a 9 meses
• Procedimento
Criança em alerta, sentada no colo da mãe com brinquedo
pouco atrativo distraindo-a.
Estímulos sonoros de 50 a 60 dB NPS (guizo único) são
acionados em ordem crescente de intensidade, no plano lateral,
à direita e à esquerda, e 20 cm abaixo e acima do pavilhão
auricular. Espera-se observar respostas de localização (direita e
esquerda) e localização indireta para baixo e para cima.
Pesquisa do reflexo cocleopalpebral com estímulo sonoro de
100 dB NPS (agogô), que deve estar presente.
• Resultados
Respostas observadas por AZEVEDO (1993) em 42 crianças
nascidas a termo sem intercorrências:
De 9 a 13 meses
• Procedimento
Criança em alerta, sentada no colo da mãe com brinquedo
pouco atrativo em sua frente.
Estímulos sonoros de 40 a 50 dB NPS (guizo único com
aumento da distância) são acionados em ordem crescente de
intensidade, no plano lateral, à direita e à esquerda, abaixo e
acima do pavilhão auricular. Espera-se observar respostas de
localização à direita e à esquerda, direta para baixo e indireta para
cima. A partir dos 12 meses pode-se encontrar a localização direta
para cima.
Pesquisa do reflexo cocleopalpebral com estímulo sonoro de
100 dB NPS (agogô), o qual deve estar presente.
• Resultados
Respostas observadas por AZEVEDO (1993) em 64 crianças
nascidas a termo e sem intercorrências:
TABELA 11.2 – Resumo das respostas a sons de crianças de baixo e alto risco
(AZEVEDO, 1993).
Idade Estímulos acústicos Respostas
meses (NPS)
Termo Pré-termo
Recém-nascido – 3 70 – 80 dB Atenção Atenção
Orientação
90 – 100 dB Sobressalto Sobressalto
RCP RCP
3–6 60 – 70 dB Atenção (3 meses) Atenção
Procura fonte Procura fonte
local. (5 meses) *
90 – 100 dB RCP RCP
Sobressalto
6–9 50 – 60 dB Local. lateral Local. lateral
Indireta baixo Indireta baixo
Indireta cima *
100 dB RCP RCP
9 – 13 40 – 50 dB Local. lateral Local. lateral
Direta baixo Direta baixo
Indireta cima Indireta cima
100 dB RCP RCP
* Diferença estatisticamente significante.
T ABELA 11.3 – Audiometria com reforço visual: níveis mínimos de resposta espera-
dos por faixa etária (AZEVEDO, 1993).
Idade (meses) Nível mínimo de resposta (dB NA)
3–6 60 – 80
6–9 40 – 60
9 – 13 20 – 40
Leitura recomendada
AMERICAN SPEECH – LANGUAGE – HEARING ASSOCIATION:
Guidelines for the audiologic assessment of children from birth
through 36 months of age. Asha, 33(Suppl. 5):37-43, 1991.
AZEVEDO, M. F. – Avaliação e acompanhamento audiológico de neona-
tos de risco. Acta Awho, 10(3):107-116, 1991a.
Avaliação Audiológica no Primeiro Ano de Vida 261
12
Avaliação da Audição na
Criança
Katia Rabinovich
INTRODUÇÃO
DESENVOLVIMENTO NORMAL DO
COMPORTAMENTO AUDITIVO
Antes do examinador iniciar a avaliação audiológica da crian-
ça é essencial que se tenha um bom conhecimento e experiência
na observação das respostas comportamentais a estímulos sono-
ros apresentados em crianças com desenvolvimento normal da
função auditiva. Também, durante a avaliação deve-se observar
o desenvolvimento motor, mental, de fala e linguagem, sempre
levando-se em consideração o nível de maturação da criança.
NORTHERN & DOWNS (1985) descreveram o desenvolvimento
normal do comportamento auditivo em crianças de 13 a 24 meses
da seguinte forma:
Procedimentos
1. Avaliação instrumental.
2. Observação do reflexo cocleopalpebral.
3. Reação à voz.
4. Técnicas de condicionamento operante – reforço visual.
Avaliação da Audição na Criança 269
1. Avaliação instrumental
Para avaliarmos crianças pequenas (entre 6 meses e 2 anos
de idade), crianças difíceis e/ou com outros comprometimentos,
em que não se consegue o condicionamento, podemos utilizar
sons não-calibrados (ambientais e instrumentais). Este tipo de
testagem também vai ajudar na avaliação auditiva, seleção de
aparelhos auditivos e no trabalho de estimulação auditiva em
crianças com deficiência auditiva.
DOWNS (1978) estabelece uma relação entre os limiares
auditivos e os espectros dos sons apresentados na testagem de
indivíduo, concluindo que é possível prever quais as faixas de
freqüências mais comprometidas; desde que estes sons não
tenham um espectro muito amplo. Alguns destes sons têm
características muito semelhantes, isto é, abrangem as mes-
mas faixas de freqüências e atingem as maiores intensidades
aproximadamente nas mesmas áreas, o que torna redundante
o uso dos mesmos instrumentos na avaliação. Os instrumentos
apresentam faixa de freqüência de banda muito larga quando
comparados aos sons calibrados (tons puros e ruído de banda
estreita – narrow band ).
O uso de sons não-calibrados é um procedimento de fácil
realização, rápido e de baixo custo, pois não requer aparelha-
gem sofisticada. Têm sido indicados como estímulos sonoros
muito eficientes na obtenção de respostas comportamentais
(OLIVEIRA e cols.).
Em nosso trabalho realizado atualmente no Setor de Audiolo-
gia Clínica do Departamento de Otorrinolaringologia da Irmanda-
de da Santa Casa de São Paulo utilizamos instrumentos musicais
(Fig. 12.2) com características acústicas diferentes entre si, em
que foram medidas suas faixas de freqüências e intensidades por
um aparelho de medição sonora (decibelímetro) na própria sala de
avaliação, acusticamente tratada.
Intensidade em dB Intensidade em dB
80 90
70 80
60 70
60
50
50
40
40
30
30
20 20
10 10
0 0
1.250 2.500 3.150 8.000 10.000 16.000 20.000 800 1.250 5.000 8.000 10.000 20.000
Percussão forte Freqüência em Hz Freqüência em Hz
Percussão forte
FIGURA 12.4 – Espectograma do instrumento guizo. FIGURA 12.5 – Espectograma do instrumento sino.
Intensidade em dB Intensidade em dB
100 80
90 70
80 60
70
50
60
50 40
40 30
30 20
20
10
10
0 0
1.250 2.500 3.150 6.300 20.000 800 1.250 1.600 5.000 8.000 10.000 20.000
Percussão forte Freqüência em Hz Percussão forte Freqüência em Hz
FIGURA 12.6 – Espectograma do instrumento cla- FIGURA 12.7 – Espectograma do instrumento reco-
ve-de-rumba. reco.
272 Fonoaudiologia Prática
Intensidade em dB Intensidade em dB
90 90
80 80
70 70
60 60
50 50
40 40
30 30
20 20
10 10
0 0
250 800 1.600 6.300 16.000 20.000 800 1.500 3.150 6.000 10.000 20.000
Freqüência em Hz Freqüência em Hz
Percussão forte Percussão forte
Intensidade em dB Intensidade em dB
100 100
90 90
80 80
70 70
60 60
50 50
40 40
30 30
20 20
10 10
0 0
1.000 1.250 2.500 5.000 8.000 20.000 125 1.600 6.300 8.000 20.000
Percussão forte Freqüência em Hz Freqüência em Hz
Percussão forte
Intensidade em dB Intensidade em dB
120 120
100 100
80 80
60 60
40 40
20 20
0 0
200 400 800 3.500 5.000 20.000 125 250 400 800 6.300 12.500
Percussão forte Freqüência em Hz Percussão forte Freqüência em Hz
3. Reação à voz
A avaliação é feita com o examinador atrás da criança, sendo
chamada pelo nome, oferecendo um brinquedo ou fazendo algu-
ma pergunta de seu interesse.
A testagem da reação à voz é iniciada com voz sussurrada
variando a intensidade até a criança reagir.
Além da obtenção da intensidade de reação à voz, também
se observa se a criança é capaz de compreender e obedecer
ordens simples, e em que intensidade isto ocorre, ou se faz
necessário o uso de gestos para se comunicar.
FIGURA 12.14 – Técnica de SUZUKI & OGIBA sendo realizada em uma criança de
2 anos de idade.
Avaliação da Audição na Criança 275
Procedimentos
1. Técnica do peep-show.
2. Audiometria lúdica ou condicionada.
3. Uso de mascaramento.
4. Testes de fala.
1. Técnica do peep-show
DIX & HALLPIKE (1947) elaboraram esta técnica como exemplo
de audiometria lúdica, para crianças de 2 a 6 anos de idade,
baseando-se no princípio de condicionamento de Pavlov. Para
obtenção das respostas desejadas, a criança tem de associar
Avaliação da Audição na Criança 277
3. Uso de mascaramento
O uso de mascaramento na audiometria de crianças é tão
necessário quanto na audiometria de adultos e impede que a orelha
não-testada responda pela orelha testada (HODGSON, 1985).
Com crianças pequenas, ao se usar o ruído, deve-se contar
uma estória para que a atividade tenha um significado concreto,
e com crianças maiores pode-se realizar o uso do ruído como nos
adultos.
Em muitos casos, às vezes, não se consegue usar o masca-
ramento, sendo assim, o exame deve ser interpretado de acordo
com o caso e os dados obtidos.
4. Testes de fala
Muitos autores relatam que do ponto de vista funcional, a
medida mais importante da audição de uma criança é a habilidade
de ouvir, compreender e discriminar a fala (HODGSON, 1985;
BELLMANN, 1987; DOWNS, 1991).
280 Fonoaudiologia Prática
Procedimentos
a) Limiar de recepção da fala (LRF).
b) Limiar de detecção da fala (LDF).
c) Índice de reconhecimento da fala (IRF ou discriminação
auditiva).
Leitura recomendada
BELLMAN, S. – Testing and screening of hearing. In: KERR, A.G. Scott-
Brown’s Otolaryngology. 5ª ed. Vol. 3, Butterworth, 1987.
DIX, M. & HALLPIKE, C. – The peep show: a new technique for pure tone
audiometry in young children. Br. Med. J., 2:719, 1947.
FULTON, R.; GORZUCKI, P.; HULL, W. – Hearing assessment with
young children. J. Speech Hear. Dis., 40:397, 1975.
HODGSON, W.R. – Tests of hearing. In: MARTIN, F.N. Pediatric
Audiology. Prentice-Hall, 1978.
HODGSON, W.R. – Testing infants and young children. In: KATZ, J.
Handbook of Clinical Audiology. 3ª ed. Baltimore, Williams & Wilkins,
1985.
HOVERSTEIN, G. & MONCUR, J. – Stimuli and intensity factors in
testing infants. J. Speech Hear. Res., 12:687-702, 1969.
LIDÉN, G. & KANKKUNEN, A. – Visual reinforcement audiometry. Acta
Oto-laryngologica, 67:281-292, 1969.
LOPES FILHO, O. & RABINOVICH, K. – Avaliação da audição na
criança. In: OTACILIO & CAMPOS. Tratado de Otorinolaringologia.
1ª ed. Roca, São Paulo, 1994.
MARTIN, F.N. & COOMBES, S. – A tangibly reinforced speech reception
threshold procedure for use with small children. J. Speech Hear. Dis.,
41:333-338, 1976.
Avaliação da Audição na Criança 283
Audiologia
Educacional
286 Fonoaudiologia Prática
Anamnese 287
13
Anamnese
FORMAS DE ENTREVISTA
Pode-se conduzir a entrevista de forma diretiva e não diretiva. Na
primeira hipótese, as respostas objetivas vêm de perguntas também
objetivas. Já na segunda, há mudanças na forma, mas não no
conteúdo, pois são feitas questões mais amplas, deixando o paciente
ou pais à vontade para suas próprias colocações, o que já permite
maior aproximação do profissional. Na prática, essas duas formas de
entrevista podem e devem coexistir, pois quando não há uma
imposição seqüencial de questões ou tópicos, o paciente/pais discor-
rem sobre o “problema” com base nas informações que já possuem,
e suas necessidades emergenciais surgem com mais facilidade,
sendo possível a condução da entrevista. O paciente tem liberdade
para expor seus problemas reais, incluindo sentimentos em relação
a eles. Cabe ao profis-sional perceber o que é essencial entre
informação, orientação ou escuta. De qualquer forma, uma anamne-
se é sempre uma investigação para melhor conhecimento do pacien-
te, além de um momento que estabelece relação entre as partes.
Sendo assim, nada mais natural que transcorram perguntas e
respostas. Uma pergunta sempre induz ao diálogo e tem a finalidade
de descobrir algo. Geralmente provoca uma resposta, o que leva
também à reflexão, à colocação de sentimentos ou ponto de vista.
A principal vantagem de se fazer perguntas numa anamnese
é centrar a conversação no paciente. O modo como essa pergunta
é feita é que faz toda a diferença. Atrás de uma pergunta está o
conhecimento teórico do profissional, seu estilo pessoal, expecta-
tivas, forma de interação e vivência. O estado emocional deste
também pode influenciar na reação do paciente, e portanto, na
interpretação de suas respostas.
290 Fonoaudiologia Prática
APRESENTAÇÃO DE UM CASO
M.R. procurou o pediatra da filha M.G. (4 anos) porque esta
estava com febre muito alta, foi diagnosticada amigdalite aguda e
após tratamento com antibiótico o quadro regrediu. Nada mais foi
investigado, pois a queixa naquele momento era visível e se
resolvera com medicamento. Neste meio tempo, os pais resolve-
ram então assumir algumas dificuldades apresentadas pela filha:
falava pouco e muitas vezes de modo enrolado (sic).
Diante deste novo dado, o pediatra encaminhou-a para o
especialista que realizou uma série de exames diagnosticando uma
deficiência auditiva sensorineural moderadamente severa bilateral.
Imediatamente os pais realizaram uma campanha para a compra do
aparelho auditivo e em seguida vieram as terapias fonoaudiológicas.
As observações da fonoaudióloga foram se somando a um
questionamento constante com relação à “história da queixa da
deficiência auditiva” e o próprio desenvolvimento da mesma. Os
pais, por sua vez, relataram outros fatos que os perturbavam,
ocorridos no mesmo período da febre: “um tombo da grade do berço,
encontrando-a chorando; e um pouco depois estava no colo de uma
tia e sofreu um ataque de um cachorro (dogue alemão) e chorou sem
voz”. Estes eram os medos que assombravam a mãe ao tentar
aceitar a deficiência auditiva na rotina familiar.
Ainda que com certa timidez, os pais mencionavam cenas do
cotidiano quando a criança reagia mesmo sem o aparelho de
amplificação ao barulho do molho de chaves do pai, quando este
chegava em casa; fatos que fizeram com que o pai realizasse uma
série de imagens em vídeo da criança em situações rotineiras do
tipo: aniversário da criança e da prima, cenas de férias, na
tentativa de reunir dados e questionar sobre o diagnóstico. Rea-
lizada uma investigação aprofundada do caso, reunindo as obser-
vações da terapeuta ao relato dos pais, novos exames foram
realizados, chegando assim a um novo diagnóstico: Dispraxia
motora dos órgãos fonoarticulatórios. O aparelho auditivo foi
retirado e a criança vem apresentando uma melhora significativa
e os pais a confiança desejada.
Evidentemente, o que foi exposto não se trata de uma cena
comum. A idade da criança na época do primeiro diagnóstico (1
ano e 9 meses) poderia levantar dúvidas e a própria doença
causar dubiedade. Foram necessárias investigação minuciosa,
observações pertinentes e oportunidade para a família expor suas
Anamnese 295
▲
▲
▲
▲
Vínculo ▲
▲
▲
▲
Coleta de dados ▲
▲
▲ ▲
Troca de informações
▲
▲
▲
Conhecimento adquirido
▲
Hipóteses diagnósticas
▲
▲
Encaminhamentos
necessários
▲
Acomodação dos fatos
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Uma ocorrência sócio-patológica provoca instabilidade no
sistema em que estiver inserida. Trabalhar com o paciente requer
a inclusão de seus familiares como membros ativos no processo,
contribuindo com informações e incentivos.
A anamnese tem a função de levantar dados da história
clínica, circunstancial, relações pessoais e interpessoais.
O interesse voltado ao estudo da natureza e significado do que
traz o paciente ao profissional deverá ocorrer através de uma troca
entre ambos. O primeiro deverá abster-se de tirar vantagens e
296 Fonoaudiologia Prática
Leitura recomendada
BLEGER, J. – Psicologia da Conduta. Porto Alegre, Artes Médicas, 1984.
CLARK, J.G. – Understanding, building, and maintaining relationships
with patients in effective counseling. In: Audiology. New Jersey
Simon & Schuster Company, 1994. pp. 18-37.
EHRLICH, C.H. – Anamnese da criança. In: Tratado de Audiologia
Clínica. 3ª ed. São Paulo. Editora Manole, 1989. pp. 617-630.
LUDKE, M. & ANDRÉ, M.E.D.A. – Pesquisa em Educação: Abordagens
Qualitativas. São Paulo, EPU, 1986.
MARTIN, F.N. – Conveying diagnostic information. In: Effective Counseling
in Audiology. New Jersey. Simon & Schuster Company, 1994. pp.
38-61.
TOMM, K. – Entrevistamento interativo. Parte III. Pretendendo Fazer
Questões, Lineares, Circulares, Estratégicas ou Reflexivas. Revista
Family Process, 1988. pp. 1- 9.
WEILER, M.C.C.R. – A primeira entrevista na clínica fonoaudiológica:
um estudo preliminar. Tese de Mestrado. PUC, São Paulo, 1992.
Importância do Diagnóstico Precoce na Deficiência Auditiva 297
14
Importância do Diagnóstico
Precoce na Deficiência
Auditiva
INTRODUÇÃO
Este capítulo tem como objetivo servir de guia de orientação
para os profissionais da área de fonoaudiologia que têm contato
com crianças e pais, onde haja suspeita ou confirmação de uma
Deficiência Auditiva.
Os deficientes auditivos e os profissionais que trabalham
nesta área sabem da importância deste déficit sensorial no
comportamento do indivíduo. O ouvido é o órgão que possibilita
uma das nobres funções superiores do homem que é a comunica-
ção.
A criança com deficiência auditiva, pela impossibilidade de se
comunicar, pode tornar-se um indivíduo introvertido, com proble-
mas de origem nervosa, e acaba isolando-se do mundo que a
rodeia por não compreender e não ser compreendida. É essencial
que a criança, ao nascer, tenha audição normal para a aquisição
da fala durante seu desenvolvimento. A integridade periférica e
central do sistema auditivo é essencial para a aquisição da
linguagem verbal e para seu desenvolvimento (ZARNOCK &
NORTHERN, 1988).
Observando uma criança pequena em fase de aquisição de
suas funções, podemos nos maravilhar ao perceber que é através
da linguagem que ela consegue organizar o seu universo, enten-
der o mundo que a rodeia, compreender o outro, transmitir e
298 Fonoaudiologia Prática
Mudanças históricas
As variáveis que afetam a eficácia dos estudos em identifica-
ção precoce de perdas auditivas e o início de programas de
reabilitação, também precoces, são numerosas e complexas:
Importância do Diagnóstico Precoce na Deficiência Auditiva 299
DEFINIÇÃO
O PEATC é o registro das respostas elétricas desencadeadas
por um estímulo sonoro ao longo da via auditiva até o tronco
cerebral. É também chamado de respostas de latências curtas e
rápidas, pois analisam o complexo de 5 a 7 ondas que ocorrem nos
10ms após a apresentação do estímulo. As respostas podem ser
consideradas de campo distante, pois os eletrodos estão coloca-
dos longe da origem de seus geradores. Os eletrodos de superfí-
cie captam o EEG, os artefatos e os PEATC. Essas respostas vão
para um pré-amplificador e são filtradas e ampliadas em uma
ordem de mil vezes. As respostas obtidas são promediadas por
meio de técnica específica que elimina os artefatos e soma as
respostas, sendo observadas em forma de registro no monitor.
302 Fonoaudiologia Prática
tudo o que faz com seu filho na rotina dos primeiros meses de vida:
amamentação, troca de fralda, banho, adormecer, acordar, des-
coberta do ambiente, contato com os primeiros brinquedos, e sons
da casa, dor, etc.
O bebê por sua vez, produz sons, chora e murmura de forma
distinta quando tem fome, está desconfortável, tem dor, tem sono
ou quando acorda. A mãe identificando cada um destes sons
atende o bebê.
Porém, para que este processo ocorra normalmente, o bebê
necessita ouvir a voz materna, o que ocorre já na segunda
semana de vida (MAUK & B EHRNS, 1993), os bebês identificam
e reconhecem a voz materna, até gravada ou distorcida, neste
período.
Esta voz tem o poder de antecipar a presença materna, saciar
fome, sede e significa ainda aconchego e segurança.
Imagine um bebezinho que acorda, chora de fome e pelos
sons produzidos pela mãe na casa e sua voz, quando vai se
aproximando do bebê, este já se acalma e pára de chorar, mesmo
antes de vê-la. E, a mãe pode se afastar do quarto e o bebê se
tranqüiliza, pois sabe que ela vai e volta e percebe todas as
marcas maternas sonoras pelo ambiente.
O bebê vai crescendo, cada dia compreende mais e mais do
que é dito por sua mãe e desta forma mãe/bebê irão construindo
a linguagem no dia-a-dia.
Aos 6 meses, o bebê percebe que ouve sua própria voz, tem
prazer em produzir sons e ouvi-los. É o início do uso do feedback
acústico-articulatório que vai marcar o início do balbucio. Balbucio
este que vai se diferenciando, tornando-se mais e mais rico,
silábico até ao redor dos 12 meses, este ser tão pequeno, por ter
compreendido a linguagem materna e pelo fato de se ouvir vai
iniciar a produção de suas primeiras palavras.
Este processo fantástico do desenvolvimento da criança ou-
vinte não vai ocorrer da mesma forma com a criança deficiente
auditiva.
A mãe vai agir da mesma maneira, pois na maioria das vezes
não sabe, que seu bebê ao nascer não ouve. E este por não
perceber os sons da mãe, suas marcas no ambiente e sua voz, só
tem a sensação de ter a mãe, quando esta está no seu campo
visual. Não antecipa a presença materna e quando esta se afasta,
não tem a noção de que a mãe voltará. É uma criança que vai
demorar um tempo maior para incorporar a “mãe interna”, que é
um pré-requisito importante para o início da formação da identida-
de (DILORETTO).
Várias pesquisas foram feitas estudando-se o comportamento
destas crianças deficientes auditivas. E os relatos dos pais coin-
cidem com os estudos que mostram que estes bebês, por terem
a mãe só quando é possível vê-la, têm uma sensação de descon-
tinuidade materna e quando a mãe se ausenta, de abandono
precoce. São bebês classificados em dois grupos: os que choram
306 Fonoaudiologia Prática
CONCLUSÃO
Cabe, para concluir uma citação de VYGOTSKY (1934) que
afirmou ser a unidade básica do pensamento verbal o significado
de uma palavra. “Uma palavra sem significado é um som vazio.
Significado é um ato do pensamento semântico. Assim sendo, a
falta de tudo isto constitui um mundo vazio.”
E citando os próprios pais: em mais de 50% dos casos, nos
primeiros contatos, a frase que comumente ouvimos possui a
seguinte mensagem:
• a deficiência auditiva é invisível e a prótese auditiva torna-a
tão visível...
Anos mais tarde, essa mensagem se transforma:
• o que torna os nossos filhos diferentes das outras crianças
da mesma faixa etária é a defasagem no desenvolvimento
da linguagem e inadequação social e educacional, causa-
das pela dificuldade na comunicação.
308 Fonoaudiologia Prática
Muito ainda tem que ser feito para que mais e mais crianças
sejam diagnosticadas num período ideal, diminuindo a defasa-
gem de desenvolvimento entre crianças deficientes auditivas e
ouvintes de mesma faixa etária.
Somos responsáveis pela preocupação e divulgação do que
pode ser feito (ROSLYNG-J ENSEN, 1995).
Para finalizar:
“Qualquer coisa que façamos, é necessário ter em mente, que
quando testamos e tratamos uma criança pequena com deficiên-
cia auditiva, nós também estamos lidando com os pais, seus
sonhos por seu filho e, mais além, o que fazemos tem um impacto
que transcende tempo e lugar. São as crianças e suas famílias que
precisam viver com as conseqüências de nossas ações precoces”
(ROSS MARK, 1992).
Leitura recomendada
BERG, F.S. – O foco da educação da criança deficiente auditiva. In:
BERG, F.S. & FLETCHER, S.G. The Hard of Hearing Child. New
York, Grune & Straton, 1970. pp. 13-26.
CHAPCHAP, M.J. – Detecção Precoce da Deficiência Auditiva. In:
SEGRE, C.A.M.; ARNELLINI, P.A.; MARINO, W.T. RN. 4ª ed. São
Paulo, Sarvier Editora de Livros Médicos Ltda., 1995. pp. 564-567.
CHAPCHAP, M.J. – Potencial evocado auditivo de tronco cerebral (PEATC)
e das emissões otoacústicas evocadas (EOAE) em Unidade Neonatal.
In: TURQUIN DE ANDRADE, C.R. Fonoaudiologia em Berçário Nor-
mal e de Risco. Vol. I. São Paulo, Editora Lovise, 1996. pp. 171-183.
DiLORETTO, O.D.M. – Supervisor Clínico na Área de Desenvolvimento
e Psiquiatria Infantil, 1974-1979.
DOWNS, M.P. – Return to the Basic of Infant Screening. Department of
Otolaringology. University of Colorado Medical Center, Denver, 1979.
JOINT COMMITTEE ON INFANT HEARING – Position statement.
Audiology Today, 6(6):1994.
MAUK, W.G. & BEHRNS, R.T. – Conter – Histórico, político e tecnológico
associado com a identificação precoce de perdas auditivas. In:
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Publishers, Inc., 1993. pp. 1-17.
NATIONAL INSTITUTE OF CHILD HEALTH, U.S.A., 1993.
NORTHERN, J.L. & DOWNS, M.P. – Hearing in Children. Baltimore,
Williams and Wilkins, 1991.
NORTHERN, J.L. Ph.D. & HAYES, D., Ph.D. – Universal Screening for
Infant Hearing Impairment: Necessary, Beneficial and Justifiable in
Audiology Today. Vol. 6, nº 2. May/June, 1994.
OLIVEIRA, VASCONCELLOS e OLIVEIRA – Diagnóstico precoce da
deficiência auditiva na criança. Temas de Pediatria nº 46 – Nestlé,
Serviço de Informação Científica, 1990.
ROSLYNG-JENSEN, A.M.A. – Estudo Catamnéstico do Desenvolvi-
mento Lingüístico e Emocional da Criança Deficiente Auditiva,
Comparado com o da Criança Ouvinte. São Paulo, 1995. [Tese de
Mestrado – Universidade Federal de São Paulo-EPM]
Importância do Diagnóstico Precoce na Deficiência Auditiva 309
15
Reabilitação Aural: a Clínica
Fonoaudiológica e o
Deficiente Auditivo
INTRODUÇÃO
Para melhor compreender a reabilitação aural na perspectiva
da terapia fonoaudiológica, é interessante lembrar de sua origem
na Educação Especial. No passado, na tentativa de organizar
procedimentos pedagógicos que resultassem no aprendizado
acadêmico, religioso ou de outra natureza, alguns educadores
fizeram propostas que tinham como finalidade ultrapassar em
alguma medida a barreira da ausência ou precariedade da lingua-
gem oral imposta pela surdez. Surgem então os chamados
métodos orais, bem como os gestuais. Convém lembrar que
essas propostas datam de uma época em que ainda não se
contava com a tecnologia para diagnóstico, nem tampouco com
recursos de amplificação do som.
Se, anteriormente, se contava apenas com outros sentidos,
principalmente a visão para o acesso à linguagem oral, atualmen-
te, para muitos indivíduos, a amplificação e, mais recentemente,
o implante coclear, possibilitam que a audição seja o canal
principal para acessá-la.
A reabilitação da criança surda esteve tradicionalmente sob a
responsabilidade da educação especial. Seus objetivos incluem,
além do desenvolvimento acadêmico dos alunos com deficiência
de audição, o desenvolvimento da linguagem, quer seja oral ou
gestual. Desta forma, na maior parte dos países, o trabalho com
312 Fonoaudiologia Prática
PROCESSO TERAPÊUTICO
Diagnóstico
Em se tratando de crianças muito pequenas, é preciso ter em
mente que os limiares audiométricos podem não ficar totalmente
definidos a partir dos primeiros exames realizados. É de extrema
importância que elas sejam submetidas a avaliações eletrofisioló-
gicas, além dos outros exames que compõem a bateria de testes
audiológicos. A observação das mudanças de comportamento da
criança frente ao estímulo sonoro, com e sem amplificação, auxilia
na identificação dos resíduos auditivos presentes. É conveniente
observar que muitas crianças poderão não apresentar respostas
auditivas numa avaliação inicial, o que, no entanto, não significa
ausência de resíduo auditivo.
Poderiam ser necessárias inúmeras sessões de avaliação
para se observar respostas auditivas de crianças muito pequenas.
Neste sentido, é nossa opinião, que o conhecimento do compor-
tamento auditivo pode ser complementado no processo terapêu-
tico: terapia e uso de amplificação fazem parte do processo
diagnóstico. A prática clínica mostra que experiências auditivas
podem ser determinantes para que a criança volte sua atenção
para o som. É claro que o diagnóstico audiológico deve ser
criterioso, no entanto, é imprescindível, que o processo terapêu-
tico seja iniciado o mais cedo possível.
Portanto, a natureza da perda auditiva da criança, ou melhor
dizendo, suas possibilidades auditivas, irão melhor se configurando
a partir do momento em que a detecção do som esteja garantida pelo
uso de amplificação adequada, favorecendo o “e vir a dar atenção
ao som”, em função de um enfoque terapêutico que esteja voltado
também para os aspectos perceptuais auditivos.
Algumas crianças, cujos resultados da avaliação audiológi-
ca inicial apontavam para perdas auditivas profundas, podem
surpreender em relação ao aproveitamento do resíduo auditivo;
quer este funcione apenas como um importante vínculo com o
ambiente, quebrando barreiras para a aproximação da família
316 Fonoaudiologia Prática
Uso da amplificação
Embora o tema seleção de aparelhos não seja assunto deste
capítulo, gostaríamos de fazer algumas considerações a respeito
de sua adaptação, uma vez que acreditamos que tal processo
esteja extremamente relacionado à atitude da família frente à
criança e frente à surdez.
Quanto à escolha do aparelho de amplificação sonora, esta
deve se basear em todos os dados provenientes dos exames
realizados, da história e de observações dos comportamentos
apresentados diante das experiências com amplificação.
Para algumas crianças, mais tarde, em processo de desenvol-
vimento de linguagem oral, a informação auditiva pode não ser a
única ou a principal pista. Isto se deve a fatores que vão desde as
características da perda auditiva, até aspectos de ordem relacional,
além da habilidade de integração de outras pistas sensoriais.
Entretanto, nos momentos iniciais de trabalho, principalmente
quando a criança é ainda muito pequena, o significado do uso da
audição, a partir do som amplificado, pode ter uma conotação que
vai além do sensório. O aparelho de amplificação sonora pode
passar a representar muito mais do que o auxílio auditivo imediato
que ele possa oferecer à criança. Pode ser, para uma determinada
família, a concretização da surdez através dele denunciada. Isto
pode interferir no processo de adaptação, mas, por outro lado, vai
permitir que esses conteúdos de caráter emocional sejam de
alguma forma trazidos pela família e possam ir sendo reconheci-
dos pelo terapeuta.
Para outras famílias, o aparelho poderá representar uma
possibilidade de atingir a criança. Poderá encobrir também, um
“não conformismo” com a condição de surdez e a busca de
caminhos que modifiquem, ou pelo menos minimizem, essa
condição. Poderá, quem sabe, dar uma “ilusão de audição”. O fato
é que esses aspectos, e mesmo outros, deverão ir sendo com-
preendidos pelo terapeuta e, dentro do possível, apontados para
a família, no sentido de ajudá-los em seus relacionamentos, uma
vez que dificuldades aparecem nessas situações.
Assim, a inclusão da adaptação do aparelho no processo
terapêutico dá condições ao terapeuta tanto para intervir junto à
família, quanto para “descobrir” o som com a criança.
Reabilitação Aural: a Clínica Fonoaudiológica e o Deficiente Auditivo 317
Audiograma
Na análise do audiograma deve-se levar em conta as caracte-
rísticas acústicas da fala em relação aos limiares auditivos da
criança com amplificação.
O princípio proposto por LING (1989) de se analisar o audiogra-
ma da criança a partir das pistas acústicas disponíveis a ela e, não
a partir do que ela não ouve, nos parece bastante apropriado.
Trata-se de olhar, não aquilo que falta, e sim, o que existe em
termos de audição, que poderá ser utilizado por cada criança de
maneira muito diversa.
O conceito de campo dinâmico de audição deve ser utilizado.
Entende-se por campo dinâmico de audição a área compreendida
entre o limiar de detecção e o limiar de desconforto. O objetivo é
colocar dentro do campo dinâmico de audição da criança o maior
número possível de informações acústicas da fala com o auxílio de
amplificação.
Outro tipo de análise pode ser feita, sobrepondo-se os
limiares de detecção com amplificação ao espectro de fala. A
partir disto, podemos fazer considerações sobre quais aspec-
tos acústicos da fala são detectados, e que tipo de ajustes
devem ser feitos no sistema de amplificação. Embora esta
medida seja de grande valia para que o terapeuta certifique-se
de que a criança está recebendo a melhor amplificação possí-
vel, ela não é o suficientemente sensível para fazer previsões
exatas sobre as habilidades perceptuais auditivas que a crian-
ça irá desenvolver.
AUDIÇÃO E LINGUAGEM
Um bebê, quando nasce, tem seu mecanismo auditivo total-
mente formado, e poderá detectar todos os sons que sejam
audíveis para o ser humano. Para que estes sons e, mais
particularmente, a voz da mãe, sejam identificados pela criança,
é preciso que esta os experiencie em diferentes situações. Expe-
riências essas que não são puramente auditivas, mas são acom-
panhadas das sensações advindas de seus primeiros relaciona-
mentos. As experiências com o som vão tendo lugar e este, como
um dos objetos do mundo, vai sendo revestido de significados.
Assim, se inicialmente um ruído do ambiente faz a criança
interromper o seu choro, será provavelmente a voz da mãe que,
num outro momento, poderá acalmá-la, já que, pela audição, pode
inclusive antecipar sua presença.
Um bebê portador de uma deficiência auditiva, ainda não
suspeitada pela família, poderá interagir de forma comunicativa
independentemente da falta do sentido auditivo. É comum encon-
trar no relato de mães, quando falam dos primeiros meses de vida
da criança, referências a “algo de diferente” no comportamento de
seu bebê sem, no entanto, ter conseguido identificar a deficiência
de audição. Entretanto, a privação sensorial, mesmo que não
esteja permeando as relações da mãe e criança, pode significar
para a última, diferença de oportunidades quanto ao conhecimen-
to do mundo e aquisição de linguagem.
No caso de crianças surdas, filhas de pais surdos fluentes em
língua de sinais, os efeitos da privação sensorial não se fazem
sentir de maneira tão forte, uma vez que não implicará num déficit
de linguagem, já que interagem, desde o nascimento, com um
interloculor competente na língua de sinais.
Com certeza, o maior impacto da deficiência de audição
recai sobre filhos de pais ouvintes, devido principalmente, às
diferenças de “status” lingüístico (MEADOW, 1981). Estas crian-
ças apresentarão alterações de linguagem e requerem interven-
ção terapêutica.
A maior parte das crianças surdas, aproximadamente 95%,
são filhas de pais ouvintes. A maioria dessas famílias não teve, ou
teve muito pouca experiência com pessoas surdas. Na sua
maioria, também não fizeram reflexões aprofundadas sobre a
natureza do desenvolvimento da linguagem e podem fazer hipó-
teses equivocadas sobre a relação deste com a perda de audição.
Também não é incomum que façam associações entre o “não
ouvir e o não falar” com dificuldades de ordem intelectual. Assim
sendo, as mais diferentes representações de surdez podem ser
esperadas. É claro que a representação que os pais fazem de sua
criança, agora surda, poderá de alguma maneira influenciar no
desenvolvimento da linguagem. Na literatura sobre reabilitação
aural, o papel dos pais é bastante valorizado e encontramos
autores que sugerem orientações específicas a serem dadas aos
Reabilitação Aural: a Clínica Fonoaudiológica e o Deficiente Auditivo 321
TERAPIA
Passaremos a discutir o processo terapêutico, quanto às
diferentes formas de atendimento fonoaudiológico propostas para
a criança deficiente auditiva, nas quais flexibilidade tem sido a
tônica. O esquema de atendimento fonoaudiológico mais freqüen-
te (duas sessões individuais semanais), algumas vezes, limita a
ação do terapeuta junto à criança deficiente auditiva e, por isso,
temos procurado criar outras opções.
322 Fonoaudiologia Prática
Leitura recomendada
BOOTHROYD, A. – Hearing Impairments in Young Children. N.J.,
Englewood Cliffs, Prentice Hall, Inc., 1982.
ESTABROOKS, W. – Auditory-verbal Therapy for Parents and
Professionals. Washington, D.C., Alexander Graham Bell Association
for the Deaf, 1994.
EWING, A.W.G. – Educational Guidance and the Deaf Child. 2ª ed.
Manchester, University Press, 1963.
GREGORY, S. & HARTLEY, G. – Constructing Deafness. London, Pinter
Publishers Ltda., 1991.
LING, D. – Foundation of Spoken Language for Hearings Impaired
Children. Washington, Alexander Graham Bell Association for the
Deaf, 1989.
MENDES, B. de C. A. – Oficina de Leitura com um Grupo de Adolescen-
tes Surdos: Uma Proposta Fonoaudiológica. Dissertação de Mestrado
PUCSP, 1994.
NOVAES, B.C; PUPO, A.C.; BALIEIRO, C.R.; FICKER, L.B.; SPRENGER,
A. – Sistema de amplificação com transmissão com F.M. na deficiên-
cia auditiva: influência do ruído ambiental. Revista Distúrbios da
Comunicação. Vol. 5, nº 2, 1993.
PLANT, G. – Profound Deafness and Speech Comunication. San Diego,
California, Singular Publishing Group, 1995.
POLLACK, D. – Educational Audiology for the Limited Hearing Infant and
Preschooler. 2ª ed. Illinois, Charles C. Thomas Publisher, 1985.
RUSSO, I. C. P. & BEHLAU, M. – Percepção de Fala: Análise do
Português Brasileiro. São Paulo, Ed. Lovise Ltda., 1993.
Deficiência Auditiva 1
História e Educação: o Surdo, a Oralidade e o Uso de Sinais 327
16
História e Educação: o
Surdo, a Oralidade e o Uso
de Sinais
INTRODUÇÃO
A educação do surdo só pode ser compreendida a partir de
uma perspectiva mais ampla que abranja a sua história e que
mostre quais as fundamentações teóricas, filosóficas, políticas
e ideológicas que a embasaram desde o seu início. Nosso
espaço aqui é pequeno para podermos nos aprofundar nestes
aspectos, mas tentaremos, ainda que de uma forma resumida,
abordar a história e as suas conseqüências na educação do
surdo. Para tanto, lançaremos mão dos seguintes autores: PAUL
C. HIGGINS, autor de O UTSIDERS IN A HEARING WORLD (1990),
CARLOS SKLIAR com seu trabalho L A HISTORIA DE LOS SORDOS:
UNA CRONOLOGÍA DE MALOS ENTENDIDOS Y DE MALAS INTENCIONES
(1996) e H ARLAN LANE em seu livro WHEN THE MIND H EARS. A
HISTORY OF THE D EAF (1989). Num segundo momento estare-
mos discutindo alguns conceitos básicos que dizem respeito a
este trabalho. Passaremos então a relatar o status atual da
educação do surdo com Sinais e, finalmente, uma vez que o
objetivo maior deste texto é mostrar como se dá o trabalho com
surdos e qual é o papel da fonoaudiologia neste campo, expli-
citaremos a forma pela qual entendemos este papel.
328 Fonoaudiologia Prática
cido como Instituto de Paris. O seu grande mérito foi ter reconhe-
cido que os surdos possuíam uma língua que servia para propó-
sitos comunicativos que ele usou para o ensino de surdos. Ele
considerava esta língua sem gramática e sem utilidade (na sua
forma normalmente usada pelos surdos) para o ensino da língua
escrita. Para poder adaptá-la a seus objetivos, ele construiu um
sistema baseado na Língua de Sinais, criando outros Sinais para
as palavras francesas que não eram representadas pela Língua
de Sinais e terminações que marcavam a gramática da língua oral
(que são representados na Língua de Sinais ou por sua caracte-
rística espacial ou por outras formas). Ele deu a este sistema o
nome de Sinais Metódicos. Através desta forma modificada da
Língua de Sinais ele ensinava os surdos a ler e a escrever
qualquer texto de forma gramaticalmente correta.
Para ele o treinamento da fala tomava tempo demais dos
alunos, tempo este que deveria ser gasto na educação. Além disto
considerava que, mesmo para aqueles que poderiam aprender a
falar, isto seria de pouca utilidade, considerando-se o tempo
despendido e a utilidade real que seria esta fala. Por esta razão ele
foi muito criticado por outros educadores de surdos, tanto na
época como posteriormente. Para estes outros educadores a
oralização deveria ser o objetivo principal do trabalho educativo do
surdo, por questões ainda de sua humanização, de inserção na
sociedade de ouvintes ou outras não tão claras e objetivamente
colocadas. Veremos, no momento em que nos referirmos ao
Congresso de Milão e à implantação definitiva do oralismo no
mundo, que razões foram estas.
O ABEÉ DE l’EPÉE é criticado nos dias de hoje por não ter
considerado a Língua de Sinais uma língua passível de ser
utilizada para o ensino da leitura e escrita, desde que modificada
para este fim. O importante, entretanto, foi o fato dele tê-la
reconhecido como uma língua, ter considerado os surdos como
humanos, apesar de não falarem, e ter propiciado a estes indiví-
duos um grande desenvolvimento onde eles puderam demonstrar
as suas habilidades em diversos campos, antes dominados
apenas pelos ouvintes. Foi a época de ouro para os surdos.
controle total das salas e não se sujeitar a dividir o seu papel com
um professor surdo. É a não-valorização do surdo enquanto
elemento capaz de educar e decidir, tanto sobre a sua própria
vida, como com relação à vida daqueles sobre sua tutela. Uma das
conseqüências do Congresso de Milão foi a demissão dos profes-
sores surdos e a sua eliminação como educadores. Era a forma de
impedir que eles pudessem ter qualquer tipo de força e de
poderem se organizar para qualquer tipo de manifestação ou
proposta que fosse contra o oralismo.
Segundo BERNARD MOTTEZ (1975), o Congresso de Milão
transformou a fala de uma forma de comunicação para a finalidade
da educação. Poderíamos acrescentar que para uma finalidade da
educação com objetivos de sujeição de uma classe minoritária à
maioria e aos seus desejos de equalização a qualquer custo,
inclusive da própria singularidade do surdo.
Para SKLIAR (op. cit., 1996), a Itália aprovou o oralismo para
facilitar o projeto geral de alfabetização do país, eliminando um
fator de desvio lingüístico (Língua de Sinais), uma vez que eles
procuravam uma unidade nacional e lingüística. As ciências
humanas e pedagógicas aprovaram porque o oralismo respeitava
a concepção filosófica aristotélica em que o mundo de idéias,
abstrações e da razão é representado pela palavra, enquanto o
mundo do concreto e do material o é pelos Sinais. Outro fator
importante para SKLIAR foi a força do clero, que num primeiro
momento rejeitou o oralismo como representante do poderio
alemão, mas que depois percebeu-o como uma força importante
por motivações espirituais e confessionais (e de controle).
Vamos, portanto, verificando que existem fatores filosóficos,
ideológicos e políticos que realmente interferem no modo de uma
sociedade se comportar. Isto é válido quando falamos do passado
e, também, do presente. Obviamente é mais fácil verificarmos a
ação destes fatores numa retrospectiva do que no momento em
que eles acontecem. Quando somos nós que estamos envolvidos
em determinado processo ou somos os seus personagens, os
comportamentos ficam sujeitos a julgamentos, que acreditamos
que sejam pessoais, mas que na verdade refletem uma estrutura
superior a nós. Por esta razão é que devemos sempre ter em
mente o que é melhor para os surdos (neste caso), não nos
esquecendo que estamos a serviço deles e não eles ao nosso.
Comunicação total
Na década de 60, a insatisfação com os resultados do trabalho
de reabilitação dos surdos numa linha oralista era muito grande nos
EUA. Novos conhecimentos teóricos e a realização de pesquisas
levaram a questionar o trabalho feito até aquele momento, pois este
não levava ao desenvolvimento esperado de fala, leitura orofacial,
desenvolvimento de linguagem e habilidades de leitura.
Estas pesquisas baseavam-se em comparações de filhos
surdos de pais ouvintes (FSPO) com filhos surdos de pais surdos
(FSPS). Os FSPS eram expostos à Língua de Sinais desde o
nascimento e normalmente colocados em escolas oralistas. Os
resultados mostraram que eles tinham melhor desempenho aca-
340 Fonoaudiologia Prática
PAPEL DO FONOAUDIÓLOGO
Com relação ao trabalho fonoaudiológico com indivíduos
surdos com a utilização de Sinais ou Língua de Sinais, existem
formas diferentes de atuação, referenciadas pela formação e
História e Educação: o Surdo, a Oralidade e o Uso de Sinais 349
Abordagem bimodal
Como vimos anteriormente, na abordagem bimodal, a fala é
acompanhada de Sinais, tornando-a visível para o surdo. Os
aspectos relacionados à audição (indicação e adaptação de
aparelhos de amplificação sonora, aproveitamento de restos
auditivos) e treinamento de fala e leitura orofacial são realizados
de forma paralela, com o objetivo de fazer com que o surdo
desenvolva estas habilidades.
Como já vimos, a forma de trabalho vai refletir a visão que
o fonoaudiólogo tem do surdo. Queremos dizer com isto que o
profissional pode entender o seu trabalho como um treinamento
específico, técnico, ou como parte de um todo, relacionado a
características específicas de cada indivíduo.
No primeiro caso, ele pode não ter domínio da língua sinalizada
(ou com Sinais) a que a criança está sendo exposta, ou até ter, mas
o seu objetivo é realizar um treinamento por etapas, que obviamen-
te depende da sua visão teórica de aquisição de linguagem, fala e
habilidades auditivas. O objetivo maior é fazer com que o surdo
desenvolva a oralidade, sendo os Sinais um apoio que pode ou não
ser utilizado. Existem profissionais que acreditam que a ênfase
muito grande nos Sinais levará a criança a não desenvolver seus
potenciais auditivos e a fala, e daí não se valem dos Sinais na
terapia fonoaudiológica. A criança é treinada, então, para apresen-
tar respostas frente a estímulos auditivos ou a responder através
da repetição aos estímulos apresentados. A situação, muitas
vezes, não é contextualizada, ou quando o é, exige obrigatoria-
mente uma resposta-padrão da criança. A preocupação, neste
caso, é com uma performance isolada das habilidades trabalhadas
no contexto da linguagem oral.
Não consideramos que esta seja uma forma adequada de
trabalho, por ver o surdo como um indivíduo separado em duas
partes: a fala ou sua linguagem oral e a sua comunicação por
Sinais. Normalmente, nestes casos, o primeiro aspecto é valoriza-
do em detrimento do segundo. Em primeiro lugar, acreditamos ser
impossível dividir estes dois aspectos em qualquer indivíduo, eles
estão interligados, mesmo quando as modalidades de expressão
são tão diversas. O surdo fala a partir das representações internas
que tem de mundo, construídas através da linguagem. Não é
apenas um aspecto articulatório as ser trabalhado. Realizar esta
separação não tem fundamentação do ponto de vista teórico e
pode levar o surdo a sentir a sua forma de comunicação, através
de Sinais, como de “segunda categoria”. Ele pode também rejeitar
esta “oralidade”, negando-a como uma forma de comunicação
350 Fonoaudiologia Prática
Bilingüismo
Temos que considerar o trabalho do fonoaudiólogo no
Bilingüismo, tendo como base o referencial teórico e os trabalhos
realizados em outros países, uma vez que as propostas no Brasil
estão ainda em fase inicial.
Neste sentido, é importante observar que a proposta do
Bilingüismo é educacional, social e cultural, independente da manei-
ra como concebe a segunda língua a ser adquirida pelo surdo (como
veremos a seguir). Assim, o papel do professor, dos pedagogos e
dos lingüistas é muito maior do que o do fonoaudiólogo. Nada
impede que um fonoaudiólogo atue nos aspectos pedagógicos,
educacionais, lingüísticos e sociais, dentro da escola, mas o seu
trabalho clínico se torna muito mais restrito, uma vez que o ambiente
escolar é o que vai ser responsável pelo desenvolvimento global do
surdo. Portanto, este trabalho deve ser realizado numa equipe que
partilhe dos mesmos pressupostos teóricos.
Certamente há um espaço para o fonoaudiólogo, na clínica,
voltado para o desenvolvimento das habilidades orais. Vejamos
qual é este e em que circunstâncias pode ser realizado.
Muitas das colocações anteriores, que explicitam a forma do
fonoaudiólogo encarar o trabalho com Sinais no Bimodalismo, são
igualmente válidas para o Bilingüismo.
Entretanto, neste trabalho, existem outros condicionantes para
a atuação fonoaudiológica. A fundamentação teórica do Bilingüismo
pode levar a duas formas de implantação. As duas coincidem no que
tange à primeira língua a ser adquirida pela criança (Língua de
Sinais), mas diferem quanto à segunda. Para uma, a segunda língua
é a oral e para outra é a escrita. Esta última é uma visão mais radical,
que considera que o aprendizado da fala é muito demorado e não
compensa o trabalho despendido em relação aos resultados alcan-
História e Educação: o Surdo, a Oralidade e o Uso de Sinais 353
CONCLUSÃO
Através de uma breve revisão histórica da educação dos
surdos tentamos mostrar os caminhos que esta percorreu, os
obstáculos que lhes foram impostos na manutenção da sua
comunidade, da sua língua e da sua cultura. Desde o início
desta história os princípios filosóficos, políticos, sociais, ideoló-
gicos e os interesses pessoais regeram os rumos desta educa-
ção e o destino dos surdos. Estamos atualmente em outro
momento, com os mesmos princípios atuando, ainda que de
forma diferente.
Enquanto profissionais que trabalham com surdos, temos que
estar conscientes da presença destes determinantes e escolher
uma forma de atuação que esteja de acordo com o que acredita-
mos. As nossas crenças são determinadas por princípios sociais
que estão acima de nós, mas somos livres para escolher aqueles
que nos fazem sentido e através deles delimitarmos nossa condu-
ta enquanto profissionais.
O que trouxemos neste capítulo reflete o nosso ponto de vista,
baseado nos princípios nos quais acreditamos. Existem outros,
que se baseiam em outras concepções de mundo e de indivíduos,
nos quais os profissionais que os defendem mostram outras
formas de atuação. A nossa compreensão do surdo não é a única.
Se a defendemos é porque acreditamos que ela contempla
aspectos lingüísticos, sociais, educacionais, e principalmente, o
respeito pela diferença.
O uso de Sinais na educação do surdo, a importância da
Língua de Sinais e da cultura do surdo, o movimento surdo, tudo
isto faz parte de um momento em que as minorias reivindicam a
sua cidadania e os seus direitos. A educação do surdo também é
um movimento político de grandes proporções para quem é surdo.
A grande questão é: estamos ou não envolvidos neste processo?
Na verdade estamos, e o problema se relaciona a outras ques-
tões: De que lado estamos? Por que? Como? Somente a resposta
a estas questões pode fazer com que possamos realizar bem o
nosso trabalho.
O nosso lado está definido. Esta definição veio através de
estudos, pesquisas, vivências, trabalho, pensamentos, análises e
questionamentos. Passamos os nossos conhecimentos, tentan-
do fundamentá-los e informar aos profissionais que existem estes
pontos de vista. Cabe agora a cada um realizar o seu próprio
processo e descobrir como vai conduzir seu trabalho.
Leitura recomendada
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356 Fonoaudiologia Prática
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História e Educação: o Surdo, a Oralidade e o Uso de Sinais 357
17
Escolas e Escolhas:
Processo Educacional dos
Surdos
Kathryn M. P. Harrison
Ana Claudia B. Lodi
Maria Cecília de Moura
INTRODUÇÃO
Bimodalismo
O Bimodalismo surgiu na década de 60 nos EUA como decor-
rência do desenvolvimento de pesquisas sobre a Língua de Sinais
(STOKOE, 1960) e de constatações sobre o melhor desenvolvimento
acadêmico de crianças surdas filhas de surdos, se comparadas aos
seus pares, filhos de ouvintes (MOORES, 1978). Entretanto, por trás
364 Fonoaudiologia Prática
Bilingüismo
A proposta educacional Bilíngüe, como o próprio nome diz,
pressupõe que os surdos desenvolvam competência em duas
línguas: a Língua de Sinais e a língua utilizada pela comunidade
majoritária ouvinte. Desta forma, como exposto no Capítulo 16,
não pode ser considerada como uma abordagem ou método
terapêutico/educacional. É fundamentalmente uma “postura” que
concebe os indivíduos surdos de uma forma distinta das discuti-
das até o momento neste texto, ou seja, enquanto indivíduos
diferentes (porque não ouvem), com as mesmas capacidades e
potencialidades que qualquer indivíduo ouvinte, pertencentes a
uma comunidade minoritária e usuários da Língua de Sinais. A
diferença destes indivíduos é, então, lingüística, ou seja, em sua
forma primeira de comunicação.
366 Fonoaudiologia Prática
por sua vez, poderá adquirir uma língua sem dificuldades, língua
esta utilizada e aceita socialmente e por seus pais. A própria
convivência da criança com adultos iguais a ela fará com que ela
possa ter modelos positivos para fazer as identificações necessá-
rias à sua constituição, podendo, portanto, construir sua identida-
de, constituindo-se como sujeito inteiro em sua diferença.
Estes princípios básicos, aqui brevemente discutidos, subja-
centes ao modelo Bilíngüe de educação, carregam em si uma
postura de respeito humano aos indivíduos portadores de surdez,
ou seja, demonstram que a diferença destes indivíduos pode ser
aceita, não sendo necessário, desta forma, “normalizá-los”. Assim
sendo, a única escolha educacional coerente dentro desta postu-
ra é a da escola especial.
Esta escola contará, em seu corpo docente, com indivíduos
surdos e ouvintes, sendo que todos eles deverão ser fluentes em
Língua de Sinais. Como já discutido anteriormente, será, então,
com base nesta língua que os conteúdos pedagógicos serão
apresentados às crianças, assim como ocorrerá o desenvolvi-
mento da leitura e escrita.
A língua escrita é apresentada desde cedo às crianças em sua
forma narrativa, ou seja, através de contos e de estórias infantis
(BOUVET, 1990; DAVIES, 1994). Estes, por sua vez, terão, inicial-
mente, seu significado e conteúdos apresentados e discutidos em
Língua de Sinais para posterior apresentação em sua forma
escrita. Como ocorre na educação da criança ouvinte, o tempo
individual das crianças quanto à maturidade para o desenvolvi-
mento nesta nova língua é respeitado pois, para que possam
dominar e desenvolver seus conhecimentos, deverão aprender as
diferenças estruturais entre a Língua de Sinais e a escrita.
SÁNCHEZ e cols. (1991), ao propor os fundamentos de uma
proposta educativa Bilíngüe para os indivíduos surdos na Venezuela,
descreve que esta deve contemplar os seguintes objetivos:
AS ESCOLHAS
Escola comum
Há várias denominações para as escolas de crianças ouvintes
(com audição normal), que cumprem o programa oficial determi-
nado pelas Secretarias de Educação dos Estados e Municípios:
escola comum, escola regular, escola normal.
Neste texto optamos por utilizar o termo escola comum para
nos referirmos às escolas que seguem este currículo e atendem
à população em geral, sejam elas municipais, estaduais ou
particulares.
Como já vimos anteriormente, a escola comum é uma das
escolhas possíveis quando se pensa na educação da criança
surda, sendo a opção preferencial para os que baseiam seu
trabalho no método aural-oral, mas podendo também ser uma
opção para os profissionais que trabalham numa linha bimodal.
Acreditamos que se deva levar em conta uma série de fatores,
sempre pensando sobre o que seria o melhor para cada criança
surda em idade escolar. Como em todas as escolhas feitas, há
pontos positivos e negativos a serem considerados, tentaremos
falar um pouco sobre cada um deles e das condições necessárias
para que esta escolha tenha os resultados esperados.
Um dos aspectos considerado positivo e bastante menciona-
do se refere à possibilidade da criança surda estar em contato com
crianças que ouvem e falam e, portanto, bons modelos para a
leitura oro-facial e a aquisição de vocabulário cotidiano. Ao
mesmo tempo, terá de se comunicar oralmente com elas, caso
queira ser entendida, o que fará com que tente melhorar sua
articulação e utilizar o vocabulário aprendido. Todo o ambiente da
criança será falante e ouvinte, o que pode vir a favorecer suas
relações na vida posterior à escola.
Escolas e Escolhas: Processo Educacional dos Surdos 369
Classe especial
Classes especiais são classes inseridas dentro de uma escola
comum, que atendem crianças com algum tipo de dificuldade para
acompanhar a classe regular. Esta dificuldade pode ser decorren-
te de problemas de aprendizado em geral, de problemas visuais
graves, perda auditiva acentuada, deficiência mental, ou outros
casos sem diagnóstico preciso.
A idéia surgiu pela primeira vez em 1911, no então Instituto
Nacional de Surdos Mudos, atual Instituto Nacional de Educação
de Surdos (INES), no Rio de Janeiro, com o planejamento de
abertura de um curso normal para professores de surdos. Como
o número de crianças surdas que chegavam ao Instituto aumen-
tava, era necessário que houvesse professores que pudessem
ser formados no país, pois todos os anteriores tiveram sua
formação realizada na Europa, principalmente na França, às
custas do governo.
Nesta época, já havia cursos para professores de surdos nos
EUA, no Uruguai e na Argentina, e se pensava em seguir o mesmo
currículo de formação destes países.
Houve um estudo que fez a primeira previsão demográfica
da população surda no país, e se constatou que esse número
seria grande num futuro próximo, inviabilizando que todos
fossem atendidos pelo Instituto. Além disso, esta população
estaria dispersa por todo o território nacional, e a construção de
escolas especiais em todos os grandes municípios seria muito
onerosa. Então se fez a opção de se formar professores de
surdos, não só para trabalharem no INES, mas para poderem
retornar a seus estados natais e lá abrirem classes especiais
inseridas em escolas comuns, tanto na rede pública como na
particular.
O princípio, portanto, era de que esta opção seria a ideal, por
ser econômica para o governo e colocar a criança surda em
contato com crianças ouvintes para o aprendizado da linguagem
falada (RIBEIRO, 1942).
As primeiras turmas foram formadas em 1951, comparáveis
ao atual segundo grau, o que permitiria a entrada das alunas na
faculdade posteriormente, se assim o desejassem. Alguns esta-
dos custearam a estada de professoras para fazerem este curso
no INES, para depois retornarem e desenvolverem suas funções
junto às escolas comuns (DÓRIA, 1958).
Hoje, o curso de formação de professores de surdos é um
curso superior, sendo uma habilitação do curso de pedagogia
(EDAC – Educação dos Distúrbios da Áudio-Comunicação).
Em São Paulo, existem dois tipos de classes especiais: as
classes inseridas na rede estadual de ensino e as inseridas em
escolas comuns particulares. Na rede municipal o que existe
são escolas especiais para deficientes auditivos, as EMEDAS
(Escolas Municipais de Educação de Deficientes Auditivos).
374 Fonoaudiologia Prática
Escola especial
As escolas especiais surgiram em nosso país, em decorrência
da grande demanda de crianças e adolescentes com necessida-
des especiais e de experiências de deficientes de famílias ilustres
que estudaram no exterior e procuraram trazer para seus colegas
brasileiros a mesma possibilidade.
A primeira escola especial que se conhece foi o Instituto de
Ensino para Cegos, aberto em 1854, no Rio de Janeiro, por
iniciativa de ÁLVARES DE AZEVEDO, cego que estudou em Paris e
retornou ao Brasil em 1851.
Da mesma forma, teve início a educação especial dos surdos,
a partir da chegada à capital do império, em 1855, de um professor
surdo, o Sr. HUET, advindo do Instituto de Paris (para maiores
referências sobre o Instituto de Paris, ver Capítulo 16). Ele
pretendeu abrir um Instituto para Surdos no Brasil nos mesmos
moldes do francês, e apresentou um programa de ensino ao
Imperador em 1856.
Em 1857 é aprovada a abertura do Instituto Nacional de
Surdos Mudos, atual Instituto Nacional de Educação de Surdos –
INES – no Rio de Janeiro, sob direção de HUET. Não há referência
explícita ao método utilizado por HUET, mas acredita-se que tenha
sido o mesmo utilizado naquela época pelo Instituto de Paris,
fundado pelo ABBÉ DE l’EPÉE (ver Capítulo 16 para maiores
Escolas e Escolhas: Processo Educacional dos Surdos 377
tos possíveis, assim como não lhe é privado o direito de ter uma
língua e poder desenvolver-se nela.
ESCOLA IDEAL
Nesta seção, discorreremos sobre o que imaginamos ser uma
escola ideal para crianças e adolescentes surdos. Falar no ideal
significa expor uma idéia na qual se projetam os desejos não
possíveis de se realizar no momento em que se pensa ou escreve.
Significa falar de um lugar melhor e diferenciado de onde se está
(que obviamente não é o ideal). Significa falar em Utopia, de um
momento visionário, em que a realidade entra como contraponto.
Na verdade, nosso projeto de escola ideal não é inviável. Já
existe em países nórdicos, há aproximadamente 15 anos. Nossa
idealização se configura ao pensarmos na dura realidade educa-
cional brasileira. Isto porque, em nosso país, grande parte da
população não tem acesso a uma educação digna, que faça de
nossas crianças adultos cientes de seus direitos e deveres,
cidadãos atuantes e críticos frente a preconceitos, enfim, sujeitos
de suas histórias. Tal situação pode ser estendida à saúde, à
cultura, ao lazer e a várias outras questões importantes de que se
possa lembrar.
É, então, frente a esta realidade, que a nossa proposta se
torna utópica. Mas frente ao status da surdez e do indivíduo surdo
em nosso país, ela pode parecer visionária.
Desde o início deste capítulo trouxemos dados de pesquisas
e estudos de vários países do mundo, com o objetivo de informar
o leitor sobre as questões relativas à educação do surdo no Brasil
e no exterior. Falamos de concepções, abordagens, métodos, que
dão sustentação aos trabalhos realizados. Analisamos as vanta-
gens e desvantagens de cada um, os problemas que podem
decorrer destas concepções, porque acreditamos que aí se en-
contra um ponto vital da nossa proposta de escola ideal: a escola
Bilíngüe.
Na verdade, o primeiro passo para a construção da escola
ideal para crianças e adolescentes surdos começa antes da pré-
escola. Começa na família, quando ela percebe que há algo
diferente com seu filho, e que esta diferença é a surdez. A partir
da constatação de que a criança é surda, muitos sentimentos e
mudanças acontecerão na família (HARRISON, 1994). Os profis-
sionais procurados neste momento terão um papel importante no
rumo destas mudanças e na forma da família olhar esta criança
surda.
A compreensão da importância do papel da linguagem para o
desenvolvimento do indivíduo, e de que a surdez não impede sua
capacidade lingüística desde que numa modalidade em que a
criança não tenha nenhuma restrição em percebê-la, faz com que
a família comece a perceber aquela criança como um futuro ser
lingüístico e, portanto, plenamente humano. Esta concepção de
394 Fonoaudiologia Prática
CONCLUSÃO
Esperamos, com este capítulo, ter contribuído para trazer aos
leitores uma série de reflexões e considerações sobre a educação
do surdo tanto em nosso país como fora dele. Optamos por expor
as várias vertentes teóricas e práticas mais estudadas atualmente
e, ao final, explicitar nossa opinião frente a estas linhas conceptuais.
Esta opção não teve a intenção de ditar uma fórmula a ser seguida,
Escolas e Escolhas: Processo Educacional dos Surdos 399
Leitura recomendada
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LODI, A.C.B. – Leitura e Escrita em Crianças Surdas: Um Estudo das
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sertação de Mestrado apresentada no Programa de Estudos Pós-
graduados em Distúrbios da Comunicação da Pontifícia Universida-
de Católica de São Paulo, 1996.
MARZOLA, A.C. – A Palavra e o Som. Efeitos da Surdez Precoce no
Psiquismo de Dois Sujeitos: Uma Compreensão Psicanalítica. Dis-
sertação de Mestrado apresentada no Programa de Estudos Pós-
graduados em Psicologia Clínica da Pontifícia Universidade Católica
de São Paulo, 1996.
400 Fonoaudiologia Prática
18
Reabilitação e Implante
Coclear
FIGURA 18.1 – Sistema de implante coclear multicanal Nucleus. A) Dispositivo interno: 1. feixe de
eletrodos; 2. receptor-estimulador. B) Dispositivo externo: 3. microfone; 4. antena transmissora; 5. fios;
6. processador de fala; 7. ímã.
404 Fonoaudiologia Prática
Adultos
Até o momento, 31 adultos receberam o implante coclear
multicanal no CPA. A experiência com esses pacientes tem
demonstrado que o mais importante é fazer com que consigam
decodificar o sinal da fala por meio do sistema do implante coclear.
Reabilitação e Implante Coclear 407
Crianças
Até o momento, 29 crianças foram implantadas, sendo 7 pós-
linguais e 22 pré-linguais.
As crianças pós-linguais se comportam de maneira semelhan-
te à dos adultos. O que difere e que solicita uma maior atenção é
o fato de ainda estarem em desenvolvimento e não terem,
portanto, uma competência própria e responsabilidade para faze-
rem a monitoração da audição e da linguagem oral. Assim sendo,
é importante um cuidado especial, por parte de pais e terapeutas,
em manterem o sistema de implante coclear sempre em boas
condições de funcionamento e prosseguirem o processo terapêu-
tico até o momento em que a própria criança e a família tenham
condições de automonitoramento.
A tônica do processo de reabilitação e habilitação com crian-
ças implantadas (pós ou pré-linguais) é o trabalho efetivo junto à
família. Observa-se que, quando a família é mais disponível e
aberta às características da criança, abraçando o processo tera-
pêutico, esse processo apresenta resultados mais rápidos e de
melhor qualidade.
Se considerarmos que, na maior parte do tempo, a vida da
criança está diretamente ligada à sua família, é fundamental
que os pais percebam o quanto atuam como modelo de comu-
nicação para a criança. Cabe ao terapeuta conscientizá-los e
conduzi-los para que as atitudes de comunicação utilizadas
junto à criança realmente se convertam para um modelo efeti-
vo. São os pais as pessoas mais próximas à criança e, portanto,
capazes de modificar o seu comportamento. Para tanto, neces-
sitam estar aptos a escolher atividades, estratégias e compor-
tamento que possam favorecer a qualidade da interação com a
criança (nos aspectos verbal ou não-verbal), possibilitando
410 Fonoaudiologia Prática
Leitura recomendada
BALKANY, T.; HODGERS, A.V.; LUNTZ, M. – Update on cochlear
implantation. Otolaryngologic Clinics of North America , 29(2):277-
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SANDERS, D.A. – Aural Reabilitation. Englewod Cliff, Prentice Hall,
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Família e Fonoaudiologia: o Aprendizado da Escuta 415
19
Família e Fonoaudiologia:
o Aprendizado da Escuta
ORIGEM DA FAMÍLIA
Um breve histórico da origem da família ocidental mostrará a
passagem do anonimato materno à harmonia de um estilo familiar
moderno. Nos primeiros anos o importante para as crianças é a
confiança no amor dos pais, conquistada devido à necessidade de
maior privacidade entre os membros desta família. A importância do
amor entendido como sentimento afetivo foi valorizada há alguns
séculos, quando as relações interpessoais representavam papéis e
funções nos diferentes grupos.
416 Fonoaudiologia Prática
Estilos
Direcionador – Indivíduo que faz o seu caminho através de
seus dogmas; parece saber o que quer da vida. Caracteriza-se por
expor e controlar seus sentimentos.
Suas forças: determinado; meticuloso; decidido e eficiente.
Suas fraquezas: controlador; teimoso; dominador e impessoal.
Expressivo – Indivíduo que enfatiza mais os relacionamentos
do que as tarefas; geralmente confia mais em suas intuições do
que em informações objetivas. Comportamento caracterizado por
exposição e emoção.
Suas forças: entusiástico; pessoal; dramático e ativo.
Suas fraquezas: opinante; excitado; atacante e promocional.
Amigável – À semelhança dos sujeitos expressivos, expõem
abertamente seus sentimentos, porém com menos agressão e
mais segurança. Parece interessado em estabelecer relaciona-
mentos e seu comportamento pode ser caracterizado de três
formas: cordato, emotivo e questionador.
Suas forças: cooperativo; confiável e pessoal.
Suas fraquezas: tímido; evasivo; emocional e conformado.
Analítico – Aquele que pergunta e controla; hábil em controlar
suas emoções e reunir informações para que possa examinar um
assunto sob todos os aspectos.
Suas forças: trabalhador; persistente; preciso e sistemático.
Suas fraquezas: reservado; esquivo; exigente e impessoal.
aa
profissional.
A
C
50
45
40
35
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Fonoaudiologia Prática
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S1
S1
S1
Ruptura de expectativas
VERNON (1977) afirma que a não confirmação do diagnóstico
tem duas sérias conseqüências: a) retarda a reabilitação, passan-
do do período fundamental para o desenvolvimento psicológico e
educacional da criança; b) provoca confusão, ansiedade, temor,
ira e sentimento de culpa nos pais.
O momento em que os pais recebem a confirmação do
diagnóstico é muito traumatizante. Os pais sofrem muito, mas
geralmente não têm a oportunidade de contar com alguém para
ouvir o seu sofrimento (DIB, 1989).
A confirmação do diagnóstico gera um grande impacto no
sistema familiar, causando ruptura de expectativas, alterações
no relacionamento afetivo, social e de linguagem da família com
a criança. É importante ressaltar que a maneira como o diagnós-
tico é transmitido influencia diretamente o processo de aceita-
ção da deficiência auditiva (SCHMAMAN, 1980). É preciso reco-
nhecer que este é um momento ambivalente para a família.
424 Fonoaudiologia Prática
Variáveis condicionantes
Respostas
Resultado
FIGURA 19.2
428 Fonoaudiologia Prática
aquilo que sente está certo; os pais não precisam fazer nada além
de ouvi-las sem preconceito e com muito carinho.
O desafio está na tentativa de acentuar os aspectos positivos
das relações entre irmãos, assim como em promover uma ligação
saudável, encorajando-os a ter sua individualidade e a se sentirem
bem. Seu papel e suas necessidades são tão importantes quanto os
de qualquer outra criança da família.
• Suporte clínico – A disponibilidade de serviços de atendi-
mento clínico, a qualidade destes serviços e a gama de informa-
ções recebidas influenciarão o senso de controle e conseqüente-
mente o grau de ação construtiva que esses pais irão atingir.
Exemplo: Quando não há programa de atendimento apropria-
do próximo à moradia da família, a percepção da surdez pode ser
vista como algo desorganizador (MITCHELL, 1981; LUTERMAN,
1984).
• Incapacidade (surdez em si) – Tipo e grau de perda, idade,
causa, época da suspeita e do diagnóstico da surdez afetam a
percepção do evento, as respostas e os efeitos.
Exemplo: Embora a maioria dos pais sinta a surdez como um
diagnóstico devastador (MITCHELL, 1981), aqueles que ficaram
suspeitando por um longo período podem se sentir aliviados
quando é fornecido um diagnóstico aos problemas apresentados
por seu filho (L UTERMAN, 1984; MITCHELL, 1981).
Todas estas variáveis têm um impacto significativo na percep-
ção parental sobre a deficiência auditiva da criança; é preciso que
o terapeuta compreenda e busque a inter-relação destas para que
consiga realizar uma análise mais complexa da situação.
O longo processo
Um dos objetivos do trabalho de reabilitação é fazer com
que os pais percebam que seu filho surdo é, em primeiro lugar,
uma criança e um interlocutor capaz, que necessita interagir
para poder crescer e se desenvolver. Uma das tarefas do
fonoaudiólogo é prover a criança e sua família de estratégias
para que ocorra uma comunicação efetiva nas situações do
cotidiano.
Faz-se necessário oferecer subsídios informativos e apoio
emocional para a conquista de uma harmonia familiar, possibili-
tando sucesso terapêutico e aceitação social.
O avanço da tecnologia na área auditiva foi intenso e isso faz
com que o profissional deposite extrema confiança no valor dos
aparelhos auditivos e da estimulação auditiva. Esta confiança
normalmente é passada para os pais, mas não existe uma
previsão de quando os resultados serão alcançados. Por esta
razão será de grande ajuda criar uma estrutura de expectativa
baseada nas possibilidades e conquistas alcançadas, sendo a
criança o seu próprio modelo de referência.
É fundamental que pais e profissionais estejam cientes da
gangorra emocional de frustração, medo, raiva, negação, reco-
nhecimento e adaptação na qual as famílias vivem.
Importante também se mostra o silêncio clínico; saber quando
calar requer a mesma sensibilidade necessária para interpor o
comentário apropriado.
Aceitar os sentimentos de uma pessoa, independente de
quem seja, é imprescindível para o estabelecimento de uma
relação saudável consigo mesmo e com aquele que se ama,
especialmente seu filho.
Famílias inteiras podem aprender muito sobre si mesmas
enquanto indivíduos e unidade familiar. Entre os vários desafios
que enfrentam, estão a descoberta e a busca de recursos
internos.
Família e Fonoaudiologia: o Aprendizado da Escuta 435
Leitura recomendada
AIRÉS, P. – História Social da Criança e da Família. 2ª ed. Rio de Janeiro,
Editora Guanabara, 1981.
ATKINS, D.V. – Family involvement and counseling in serving children
who are hearing impaired. In: HULL, R.H. Aural Rehabilitation. 2ª ed.
San Diego, Singular Publishing Group, Inc., 1992. pp. 61-67
BOOTHOYD, A. – Hearing Impairments in Young Children. New Jersey,
Englewood Cliffs, Prentice-Hall, Inc., 1982.
BUSCAGLIA, L.F. – Os Deficientes e seus Pais – Um Desafio ao
Aconselhamento. 2ª ed. Rio de Janeiro, Editora Record, 1993.
CLARK, J.G. – Understanding, building and maintaining relationships
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GODINEAU, D. – Filhas da liberdade e cidadãs revolucionárias. In:
DUBY, G. & PERROT, M. História das Mulheres – O Século XIX. Vol.
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436 Fonoaudiologia Prática
20
Aparelhos Auditivos
D
C
E F
FIGURA 20.1 – Tipos de próteses auditivas. A) Prótese auditiva convencional; B) prótese auditiva em
haste de óculos; C) prótese auditiva retroauricular; D) prótese auditiva intra-auricular; E) prótese
auditiva intracanal; F) prótese auditiva microcanal.
Prótese intra-auricular
Estas próteses auditivas ocupam parte do meato acústico
externo e do pavilhão auricular. Se ocuparem totalmente a concha
440 Fonoaudiologia Prática
Prótese intracanal
As próteses deste tipo localizam-se inteiramente dentro do
meato acústico externo. Atualmente existem próteses deste
tipo ditas intracanais “convencionais” e próteses microcanais,
as quais ocupam somente a parte mais interna do meato
acústico externo, não preenchendo sua abertura. Se uma pró-
tese deste tipo for colocada em um ponto muito profundo do
meato, diz-se que ela é peritimpânica.
Ganho acústico
Um indivíduo que tem dificuldade em escutar sons de baixa
intensidade precisa que estes sons sejam amplificados, conforme
já foi dito. Quanto maior a perda de audição, maior será a
amplificação necessária. A quantidade de amplificação fornecida
por uma prótese auditiva é o seu ganho acústico.
Tecnicamente, o ganho acústico é a diferença em decibels entre
o som que sai e o som que entra na prótese auditiva. Desta forma,
para uma prótese auditiva com 40 dB de ganho, um som ambiente
de 60 dB será fornecido ao usuário com uma intensidade de 100 dB.
O ganho acústico deve ser sempre expresso em decibels.
O ganho de uma prótese deve ser fornecido pelo fabricante na
ficha técnica que acompanha a mesma. Entretanto, nenhuma
prótese auditiva tem um ganho acústico perfeitamente igual em
todas as freqüências e existem controles que permitem modificar
este ganho.
Assim, o ganho pode vir descrito como um valor único, represen-
tando toda a faixa de freqüências através de uma média ou de
uma única freqüência considerada representativa. Idealmente, po-
rém, o ganho deve ser analisado através de um gráfico, onde o valor
de ganho em cada freqüência possa ser verificado (Fig. 20.2).
O ganho acústico fornecido por uma prótese auditiva para um
determinado indivíduo também pode ser verificado diretamente
através de medidas específicas. Quando o ganho de uma prótese
é definido em termos da diferença dos limiares de audibilidade em
campo livre com e sem a prótese auditiva, dá-se a este valor o
nome de ganho funcional (COSTA e cols., 1993).
Por outro lado, determinados equipamentos permitem verifi-
car qual a pressão sonora que está sendo liberada pela prótese no
meato acústico externo do indivíduo. Quando o ganho acústico da
prótese é definido em termos da pressão sonora em um ponto da
orelha do usuário com a prótese e o nível de pressão sonora neste
mesmo ponto sem a prótese, dá-se a este valor o nome de ganho
de inserção.
Em alguns casos, o ganho funcional e o ganho de inserção se
equivalem, enquanto que em outros não, dependendo das possi-
bilidades de aproveitamento da amplificação por parte do indiví-
duo. Entretanto, tanto o ganho funcional como o ganho de inser-
ção dificilmente equivalem aos valores de ganho acústico forne-
cido nas fichas técnicas, uma vez que este último é determinado
através de métodos e equipamentos artificiais.
Resposta de freqüências
Conforme foi comentado anteriormente, quanto maior o grau
de perda auditiva, maior a amplificação necessária. Entretanto, a
Aparelho Auditivo 443
Ganho dB
60
50
40
30
20
A 10
50 100 200 500 1.000 2.000 5.000 10.000 Hz
Ganho dB
60
50
40
30
N H
20
B 10
50 100 200 500 1.000 2.000 5.000 10.000 Hz
Saída dB (NPS)
130
120
110
100
90
C 80
50 100 200 500 1.000 2.000 5.000 10.000 Hz
FIGURA 20.2 – A) Gráficos de ganho; B) resposta de freqüências; C) saída máxima de uma prótese
auditiva fictícia.
Saída máxima
Todos os indivíduos, normais ou com perdas de audição,
possuem um limite a partir do qual qualquer som mais forte se
torna desconfortável. Este limite é chamado nível de desconforto.
Nos indivíduos com perdas auditivas, particularmente aqueles
com perdas neurossensoriais, o nível de desconforto não se altera
na mesma proporção que o limiar de audibilidade, fazendo com
que os sons muito intensos sejam tão desconfortáveis para os
mesmos quanto são para indivíduos normais (em um fenômeno
conhecido como recrutamento).
Assim, uma prótese auditiva não pode amplificar indefinida-
mente os sons, sob pena de estes sons se tornarem insuportáveis.
Do mesmo modo, todos os aparelhos sonoros possuem limita-
ções inerentes à sua construção que limitam a intensidade máxi-
ma que os mesmos conseguem reproduzir.
Assim, a saída máxima de uma prótese auditiva é o maior nível
de pressão sonora que ela deve ou é capaz de produzir. Nova-
mente, a saída máxima é um dado que costuma ser fornecido em
uma freqüência em particular ou através de um gráfico em função
da freqüência nas fichas técnicas (Fig. 20.2).
Se a saída máxima de uma prótese auditiva não for adequada,
pode impedir a utilização da prótese ou, ainda, gerar um desloca-
mento temporário ou mesmo permanente, dos limiares de audibi-
lidade. Um fato importante na análise da saída máxima é o fato de
o nível de pressão sonora gerado em uma cavidade (como o
formado entre a ponta do molde auricular e a membrana timpâni-
ca) ser dependente do tamanho desta cavidade.
Os níveis de saída máxima fornecidos em fichas técnicas
costumam ser medidos em cavidade de 1,26 ou 2 ml conforme a
norma utilizada para a confecção da ficha técnica. Em uma
criança, porém, o volume residual existente entre a ponta do
molde e a membrana timpânica pode ser igual ou inferior a 0,5 ml,
o que aumentaria em muito a pressão sonora existente na
cavidade em relação ao descrito na ficha técnica. Este fato exige
um cuidado adicional na análise da saída máxima desejada ou
obtida em uma criança pequena, para que se evitem danos.
Aparelho Auditivo 445
Distorção
Considera-se distorção qualquer alteração, devida exclusiva-
mente ao sistema de amplificação, na onda sonora. Esta alteração
pode ser desejada, como no caso das variações na resposta de
freqüências importantes para a adaptação da prótese, mas tam-
bém pode ser indesejada, como quando a onda é modificada de
uma forma desnecessária ou prejudicial.
Normalmente, as distorções não desejadas geram uma dimi-
nuição na qualidade de som do aparelho, sendo que as distorções
mais graves podem até mesmo afetar a inteligibilidade. Em algum
grau, toda prótese auditiva tem distorção, mas quanto menor esta
for, mais “limpo” será o som da prótese.
Realimentação acústica
A realimentação acústica é um processo que ocorre quando o
som liberado pelo receptor é captado novamente pelo microfone
da prótese auditiva, gerando um “apito” audível tanto para o
usuário da prótese (em alguns casos) como para aqueles que
estão ao seu redor. Este mesmo fenômeno é conhecido popular-
mente como “microfonia”.
Este problema é especialmente grave para aqueles indivíduos
com perdas auditivas importantes, que necessitam de grandes
valores de ganho e, normalmente, os maiores problemas com
realimentação acústica ocorrem com próteses auditivas com
ênfase nas altas freqüências (POLLACK, 1988). Entretanto, com
técnicas adequadas, estes problemas podem ser resolvidos na
maior parte dos casos.
A realimentação acústica também se inicia freqüentemente
por deterioração do molde auricular ou, no caso das crianças, pelo
crescimento da orelha externa. Nestes casos, a dificuldade pode
ser facilmente solucionada com a troca do molde por um novo.
Fichas técnicas
Um ponto importante na análise das características eletroa-
cústicas de uma prótese auditiva é saber como os dados constan-
tes nas fichas técnicas foram obtidos. Existem vários modos de se
verificar estas características e várias normas que regulam a
construção das fichas técnicas.
Todas as características eletroacústicas de uma prótese au-
ditiva podem ser medidas da mesma forma: com os controles
446 Fonoaudiologia Prática
Controle
Microfone Amplificador de Filtro Amplificador Receptor
volume
Conversor Conversor
analógico/digital digital/analógico
Sistema de amplificação
Microfone Receptor
Programador Memória
Microfone
Qualquer sistema que transforme um tipo de energia em
outro é denominado transdutor. O microfone, que converte o
sinal acústico do ambiente em um sinal elétrico equivalente, é
portanto denominado transdutor de entrada da prótese audi-
tiva.
Existem vários materiais possíveis para a confecção de micro-
fones (carbono, cristal, cerâmica) e vários deles foram utilizados
em aparelhos auditivos. Atualmente, entretanto, praticamente só
é utilizado o microfone de eletreto, um material sintético com
propriedades elétricas especiais.
Este tipo de microfone tem sido utilizado em função de suas
vantagens, tais como uma resposta de freqüências plana e ampla,
pouca sensibilidade a vibrações, impacto e variações de tempe-
ratura e, ainda, pequena possibilidade de interferência por parte
dos outros componentes da prótese.
Os microfones podem apresentar características especiais no
que diz respeito à sensibilidade à direção da fonte sonora e à
resposta de freqüências transmitida. Quanto à sensibilidade à
direção da fonte sonora, os microfones podem ser omnidirecionais
ou direcionais.
Os microfones omnidirecionais captam da mesma forma os
sons vindos de qualquer direção, sendo atualmente os mais
utilizados. Podem ser reconhecidos pela existência de uma única
abertura para a entrada do som.
Já os microfones direcionais captam melhor os sons frontais
até um ângulo de 45° e, em função de suas características,
atenuam a resposta de baixa freqüência da prótese auditiva. Este
tipo de microfone pode ser reconhecido por suas duas entradas de
som: a dianteira, comum, e uma segunda abertura na parte de trás
da prótese.
Além dos microfones direcionais, algumas outras construções
especiais de microfones permitem que os mesmos sejam mais
sensíveis a determinada região de freqüências. Com isto, os
microfones podem alterar de forma efetiva a resposta de freqüên-
cias da prótese.
Assim os microfones podem ter uma resposta semelhante
para todas as freqüências, sendo chamados de microfones de
resposta plana. Se, por outro lado, apresentarem uma sensibilida-
de menor para as baixas freqüências, têm-se os microfones em
rampa ou meia-rampa.
450 Fonoaudiologia Prática
Amplificador
O amplificador é o sistema que tem a função de aumentar
a intensidade do sinal elétrico gerado pelo microfone. É o
principal responsável pelas características de ganho da próte-
se auditiva.
Os sistemas amplificadores atuais são componentes monta-
dos em circuitos integrados, o que permite uma alta complexidade
em um espaço muito reduzido, como pedem as próteses auditivas
mais modernas.
Uma prótese auditiva normalmente não possui apenas um
amplificador, mas vários estágios de amplificação (na realidade
uma seqüência de amplificadores). O tipo do último amplificador
do conjunto (STAAB & LYBARGER, 1994) identifica algumas ca-
racterísticas da prótese auditiva. Os amplificadores usados em
próteses auditivas dividem-se em Classe A, Classe B – push-pull,
Classe D ou, mais recentemente, Classe H.
O amplificador Classe A é normalmente usado em próteses
auditivas de pequeno ganho e saída máxima reduzida. Apresen-
ta um nível importante de distorção quando usado em altas
intensidades de saída e possui um consumo de pilha bastante
grande.
O amplificador Classe B – push-pull, por sua vez, é caracte-
rizado pela baixa distorção, sendo capaz de fornecer um maior
ganho, melhor resposta de freqüências e maior saída máxima,
com menor consumo de pilha, do que o amplificador Classe A.
Sua grande desvantagem é o espaço necessário na prótese
para sua construção.
Já os amplificadores Classe D e Classe H (KRAUSS, BOSTIAN
& RAAB , 1980) são amplificadores de alta eficiência que também
fornecem uma melhor resposta de freqüências, maior ganho e
maior saída máxima, com menor consumo de pilha, do que o
amplificador Classe A. Sua principal vantagem em relação ao
Classe B – push-pull é, porém, o fato de serem pequenos o
suficiente para permitir que próteses como as intracanais incorpo-
rem os benefícios anteriormente descritos.
Receptor
O receptor é o componente da prótese auditiva que tem a
função de retransformar o sinal elétrico amplificado em sinal
acústico. Sendo assim, tal qual o microfone, é um transdutor, no
caso o transdutor de saída, da prótese auditiva.
Todos os receptores utilizados em próteses auditivas são
magnéticos, embora o tipo varie conforme seja um receptor
interno (em próteses retroauriculares e intra-aurais) ou externo
(em próteses auditivas convencionais).
Até pouco tempo atrás, os receptores eram os grande
limitadores da resposta de freqüências (especialmente de alta
freqüência) dos aparelhos auditivos. Entretanto, os receptores
Aparelho Auditivo 451
Pilha
A pilha não é exatamente um componente da prótese auditiva,
mas a fonte de energia necessária para o sistema funcionar. Uma
pilha é, conceitualmente, um reservatório de energia química que
pode ser convertida em energia elétrica quando desejado. Nor-
malmente, a pilha é constituída por dois metais diferentes (eletro-
dos) imersos em um meio químico (eletrólito).
Os diferentes tipos de próteses auditivas utilizam tipos
diferentes de pilhas. Normalmente, as próteses auditivas con-
vencionais utilizam pilhas alcalinas comuns do tipo AA ou AAA.
Já as próteses retroauriculares e intra-aurais necessitam de
pilhas especiais.
Estas pilhas especiais são pilhas em forma de botão de
diversos tamanhos, sendo que cada prótese deve usar a pilha
de um tamanho (com conseqüentes características de volta-
gem e corrente) específico. Assim, temos a pilha 675, 13, 312,
10-A e 5, entre outras, da maior para a menor. De uma forma
geral, quanto menor a pilha, menor a sua capacidade.
A grande vantagem das pilhas especiais usadas em próteses
auditivas é o fato de elas manterem uma tensão (entre 1,3 V e 1,5 V)
praticamente constante durante toda sua vida útil. Isto evita que a
saída e o ganho da prótese diminuam progressivamente, conforme
a pilha se desgasta.
A duração das pilhas de prótese auditiva varia conforme o tipo
de amplificador usado. Já foi comentado que o amplificador
Classe A tem um consumo relativamente alto em relação aos
demais tipos de amplificadores. Isto acontece porque, neste tipo
de amplificador, o consumo é constante, não importando se há ou
não som entrando na prótese. Os amplificadores Classe B – push-
pull, Classe D e Classe H, por sua vez, não consomem em locais
silenciosos, sendo o Classe D ainda mais econômico, neste
aspecto, do que o Classe B – push-pull (KILLION, 1993).
A maioria das pilhas especiais utilizadas em próteses atual-
mente é do tipo zinco-ar ou mercúrio. As pilhas de zinco-ar são
as mais usadas, pois têm custo menor e maior durabilidade que
as de mercúrio. Possuem pequenos orifícios que permitem a
entrada de ar após a retirada de um selo de segurança, o que faz
com que comecem a funcionar. Seu inconveniente é, após a
entrada de ar, não ser mais possível evitar o desgaste, mesmo
sem uso.
As pilhas de zinco-ar, entretanto, podem não responder ade-
quadamente quando próteses auditivas de grande ganho encon-
452 Fonoaudiologia Prática
Sistemas alternativos
Entradas alternativas
Em algumas situações pode ser desejado que o som não entre
através do microfone, mas seja captado diretamente de um
sistema específico para melhor aproveitamento. Este é o caso
típico do telefone e de alguns sistemas de áudio usados tanto para
recreação como na educação.
A bobina de indução eletromagnética ou bobina telefônica é
um sistema que capta as variações de um campo eletromagnético
exterior e as converte em um sinal elétrico equivalente, que pode
ser processado normalmente pela prótese auditiva.
Este sistema é importante no uso do telefone para alguns
indivíduos, e também permite utilizar os chamados circuitos de
indução eletromagnética em salas de aula, conferências e deter-
minadas salas de espetáculo.
Algumas próteses auditivas também possuem encaixes para
a adaptação de fios que trazem sinais elétricos gerados por outros
equipamentos de áudio, chamados de entrada direta de áudio.
Estes sinais são então processados normalmente pela prótese
auditiva.
A grande vantagem tanto da bobina telefônica como da
entrada direta de áudio é a redução da interferência do ruído
ambiente, fazendo com que o som de interesse chegue “limpo” ao
usuário. São importantes também na utilização de certos sistemas
educacionais, tais como o FM e determinadas formas de amplifi-
cação coletiva em salas de aula.
Vibrador ósseo
O vibrador ósseo é um dispositivo com a função de transfor-
mar o sinal elétrico da prótese auditiva em estímulo para o usuário,
tal como o receptor. Mas, diferente deste, ao invés de transformar
o sinal elétrico em sinal sonoro, ele o transforma em vibrações,
transmitindo o som ao indivíduo por condução óssea.
Este tipo de sistema tem usos específicos, conforme já foi
comentado, e restritos. Seus principais problemas dizem respeito
à fragilidade do vibrador, muito sensível a impactos, conforto
reduzido e, principalmente, à limitação importante na resposta de
freqüências.
Aparelho Auditivo 453
Sistemas de programação
As próteses auditivas digitalmente programáveis permitem
que o processamento do sinal acústico seja controlado digital-
mente. Isto pressupõe a existência de componentes específicos,
tanto dentro como fora da prótese.
Para permitir o funcionamento deste tipo de prótese auditiva,
além de todo circuito normal da prótese, é necessário basicamen-
te um sistema controlador e um sistema de memória. A memória
permite que os dados utilizados pelo controlador para regular os
parâmetros de amplificação sejam disponíveis e modificáveis
sempre que necessário. Uma unidade de programação, geral-
mente externa à prótese, possibilita o ajuste do controlador
conforme as necessidades do usuário.
Controle de volume
O controle de volume ou potenciômetro é um resistor variável
que regula a quantidade de amplificação fornecida. Dessa forma,
o controle de volume determina o ganho da prótese auditiva.
Normalmente, quanto mais baixa a posição do controle de volu-
me, menor o ganho da prótese; quando o controle está na sua
posição máxima, todo o ganho possível ao amplificador é liberado.
Assim, o controle de volume sempre reduz o ganho nominal da
prótese auditiva (porque este ganho costuma ser medido com o
controle de volume na posição máxima ou quase máxima), nunca
o aumenta.
A principal função do controle de volume colocado em uma
posição de fácil acesso ao usuário é permitir ao indivíduo ajustar
a intensidade em que o mesmo está recebendo o som, adaptando-
se aos diferentes ambientes acústicos. Por este motivo, recomen-
da-se que uma prótese auditiva nunca seja usada com o controle
de volume em uma posição máxima ou mínima, pois isto impediria
o referido ajuste.
A quantidade de redução do ganho obtida por um controle de
volume em determinada posição não é um dado que se possa
estimar. Algumas próteses apresentam uma relação mais ou
menos proporcional entre a rotação do controle de volume e a
redução do ganho, enquanto outras apresentam discrepâncias
relativamente grandes entre as duas coisas (MENEGOTTO, IORIO &
BORGES, 1993). Desta forma, o ideal é que sejam tomadas
454 Fonoaudiologia Prática
Controle de tonalidade
Conforme já foi comentado, é necessário que a resposta de
freqüências da prótese auditiva seja adaptada à configuração da
perda auditiva do usuário da prótese. Entretanto, existem inúme-
ras configurações de audiograma, sendo improvável encontrar
duas exatamente iguais. Seria impraticável ter-se uma prótese
auditiva para cada configuração possível de audiograma. Assim,
o controle de tonalidade tem a função de alterar a resposta de
freqüências da prótese auditiva, permitindo um ajuste mais parti-
cularizado da mesma.
O controle de tonalidade atua filtrando regiões de freqüên-
cia, de forma que haja um destaque para os sons graves e/ou
agudos. Quando é desejada uma ênfase nos sons agudos, é
usado um filtro passa-alto, que reduz a amplificação das baixas
freqüências. Para uma ênfase em sons graves, é usado um filtro
passa-baixo, que reduz a amplificação das altas freqüências.
Um filtro atua reduzindo a amplificação da faixa de freqüências
escolhida em uma determinada proporção, a partir de uma cha-
mada freqüência de corte. A freqüência de corte é a freqüência a
partir da qual a amplificação começa a ser atenuada (no caso dos
filtros passa-baixo, as freqüências menores que a freqüência de
corte serão atenuadas, o inverso acontecendo no caso dos filtros
passa-alto). A proporção de atenuação é dada sempre em decibels
por oitava (dB/oitava). Assim, quanto maior a proporção, maior
será o corte da região de freqüências escolhida.
Existem basicamente dois tipos de controles de tonalidade: os
controles de tonalidade passivos e os controles de tonalidade
ativos. Os primeiros atuam através de filtros simples, fornecendo
uma menor capacidade de redução em dB/oitava. Já os controles
de tonalidade ativos utilizam um sistema de realimentação que
permite uma maior atenuação.
Os controles de tonalidade habitualmente se localizam em
chaves internas específicas dentro da prótese, normalmente com
Aparelho Auditivo 455
Controle de saída
Conforme já foi referido, é importante que a prótese auditiva jamais
se torne desconfortável ao seu usuário. Assim, um parâmetro muito
importante na adaptação da mesma é o controle da saída máxima.
Existem basicamente dois modos de se realizar este controle:
através do corte dos picos de intensidade ou através da compres-
são. A compressão, como é uma forma de processamento auto-
mático de sinal, será discutida adiante.
O modo mais tradicional de se efetuar o controle de saída
máxima da prótese auditiva é através do corte dos picos de
intensidade (peak clipping). Todos os equipamentos sonoros
possuem um limite máximo para a intensidade que conseguem
reproduzir. Os sons mais intensos que este valor, simplesmente
são “cortados” para que se encaixem dentro do limite. Isto é
conhecido como nível de saturação do equipamento (Fig. 20.6).
O mesmo ocorre com as próteses auditivas. Quando os sons
atingem o limite de saturação, eles têm seus picos de intensidade
simplesmente eliminados, enquanto os sons menos intensos são
reproduzidos normalmente. Este modo de amplificação é denomi-
nado amplificação linear , pois a pressão sonora de saída da
prótese aumenta na mesma medida que a pressão de entrada até
que o nível de saturação seja atingido.
entrada
▲ ▲ ▲
compressão
saída
limiar de desconforto
corte de picos
saída
FIGURA 20.6 – Comparação entre a limitação
de intensidade da onda sonora realizada por
um sistema de compressão e por um sistema
de corte de picos. limiar de desconforto
456 Fonoaudiologia Prática
Compressão
A compressão é um mecanismo de processamento automá-
tico de sinal que ajusta automaticamente o nível de saída da
prótese auditiva em função do nível de sinal presente dentro do
aparelho. Isto gera um tipo de amplificação chamada de não-
linear, porque a saída da prótese não aumenta de forma idêntica
à entrada (LETOWSKI, 1993).
No Brasil os sistemas de compressão são muitas vezes
denominados AGC (automatic gain control) mas, na realidade, o
AGC é apenas um dos tipos de compressão existentes.
Qualquer sistema de compressão funciona basicamente atra-
vés do monitoramento do nível de sinal em um ponto do circuito da
prótese auditiva (ver Fig. 20.3). A partir do nível deste sinal, o
sistema faz ajustes no ganho acústico, de forma a que a saída
máxima não ultrapasse um nível preestabelecido (Fig. 20.6).
Assim, o ganho da prótese auditiva com este tipo de sistema
altera-se conforme o nível de sinal acústico do ambiente. O modo
como estas alterações são feitas em função dos níveis de pressão
sonora de entrada no aparelho são descritas através das caracte-
rísticas estáticas da compressão. Estas características costumam
ser demonstradas em um gráfico contendo os níveis de entrada no
Aparelho Auditivo 457
130
120
Nível de saturação
110
saída
Valores de saída em dB NPS
100
Limiar de
compressão (50 dB) entrada
90
80
70
60
50
40
30
0 10 20 30 40 50 60 70 80 90 100 110
Leitura recomendada
ANSI – AMERICAN NATIONAL STANDARD INSTITUTE – American
National Standard for an Occluded Ear Simulator. ANSI S3.25-1979.
New York, 1979.
ANSI – AMERICAN NATIONAL STANDARD INSTITUTE – Specification
of Hearing Aid Characteristics. ANSI S3.22-1987. New York, 1987.
COSTA, M.J.; COUTO, C.M.; IORIO, M.C.M.; BORGES, A.C.L.C. –
Estudo comparativo entre métodos de avaliação do desempenho
de próteses auditivas em indivíduos com disacusia neurossensorial
de graus severo e profundo. Saúde (Santa Maria), 19(1-2):81-89,
1993.
CUDAHY, E. & KATES, J. – Measuring the performance of modern
hearing aids. In: STUDEBAKER, G.A. & HOCHBERG, I. Acoustical
460 Fonoaudiologia Prática
21
O Processo de Seleção e
Adaptação de Aparelhos de
Amplificação Sonora
Katia de Almeida
Considerações pré-seleção
São muitos os fatores individuais que devem ser considera-
dos, quando selecionamos aparelhos de amplificação para um
determinado indivíduo: o grau e a simetria da perda de audição, a
configuração audiométrica, o crescimento da sensação de
intensidade, as habilidades de reconhecimento de fala e, no caso
dos adultos, a motivação para o uso da amplificação.
A informação audiológica forma a base para que se inicie o
processo de seleção da amplificação. Portanto, é fundamental
que os resultados dos testes que compõem a avaliação audioló-
gica básica (audiometria tonal liminar, testes logoaudiométricos e
imitanciometria) estejam disponíveis. Além destes testes, pode
ser necessária a inclusão de outros, como a pesquisa do limiar de
desconforto que deve nortear a determinação dos níveis de saída
máxima do aparelho de amplificação.
Os resultados da audiometria de tons puros são fundamentais
uma vez que descrevem o tipo, o grau e a configuração da perda
de audição. Os resultados dos testes logoaudiométricos auxiliam
na determinação da faixa dinâmica da audição.
A faixa dinâmica da audição é a faixa em decibel compreen-
dida entre os limiares para tons puros ou para fala e o ponto onde
o estímulo (fala ou tons puros) torna-se desconfortavelmente
intenso. No processo de seleção da amplificação o estabeleci-
mento da faixa dinâmica de audição é importante porque repre-
senta a área-alvo da amplificação, isto é, os limites mínimo e
máximo da amplificação. Vale ressaltar que para os indivíduos
portadores de perdas de audição neurossensoriais, que consti-
tuem a maioria da população candidata ao uso da amplificação, a
faixa dinâmica é significativamente reduzida.
466 Fonoaudiologia Prática
3. Molde auricular
O sucesso na adaptação de um aparelho de amplificação
pressupõe o uso de um molde auricular adequado à orelha do seu
usuário, de acordo com as suas necessidades audiológicas e
características eletroacústicas do aparelho selecionado, garan-
tindo plenamente os benefícios da amplificação (TAGUCHI &
ALMEIDA, 1996).
Sabemos que a confecção de determinados tipos de apare-
lhos depende de um molde específico, cujo objetivo é melhorar o
seu desempenho eletroacústico. Além disso, vários estudos de-
monstraram que o molde auricular, quando adaptado à orelha,
pode modificar, intencionalmente ou não, as características da
amplificação do sistema em uso. Portanto, os testes com apare-
lhos de amplificação devem sempre ser realizados utilizando-se
um molde auricular adequado ao tipo de aparelho e confecciona-
do individualmente para cada caso. Modificações acústicas de-
vem ser feitas quando necessário, uma vez que têm como
finalidade incrementar o ganho acústico em determinadas bandas
de freqüências, promovendo melhor inteligibilidade de fala, facili-
tando o processo de adaptação do usuário e tornando a amplifi-
cação mais natural.
Ganho acústico
O princípio subjacente em qualquer estratégia para selecionar
e adaptar um aparelho para o deficiente auditivo é assegurar
uma amplificação que melhore o reconhecimento dos sons da
fala, com boa qualidade sonora e sem causar desconforto ao seu
usuário. Para realizar esta tarefa, a resposta de ganho por fre-
qüências do aparelho deve ser moldada de modo a compensar a
perda de audição existente.
Durante muitos anos foi utilizado o procedimento comparativo
(CARHART,1946), cujo princípio era a comparação do desempe-
nho entre vários aparelhos experimentados. Este método selecio-
nava como melhor aparelho, aquele que proporcionasse: 1. o
melhor limiar de recepção de fala; 2. o melhor índice de reconhe-
cimento de fala em ambiente silencioso; 3. a maior área dinâmica
de audição; e 4. melhor índice de reconhecimento de fala na
presença de ruído competitivo. O procedimento comparativo foi
muito aplicado até o aparecimento dos métodos prescritivos, que
têm sido hoje os preferencialmente utilizados no processo de
seleção de aparelhos de amplificação.
Vários são os métodos prescritivos em uso clínico e todos são
baseados na amplificação seletiva que, de maneira simples, pode
ser definida como sendo a manipulação da resposta de freqüência
para obter um desempenho ideal por parte do paciente. Em outras
palavras, o ganho ou a amplificação deve ser maior onde a perda
auditiva é maior. Através da utilização destes métodos é possível
prescrever, para cada freqüência, o ganho necessário para atingir
um determinado limiar de audibilidade. Posteriormente, realiza-se
uma avaliação para verificar se a prescrição efetivamente permitiu
que a resposta esperada fosse alcançada (IÓRIO, 1996).
Dentre os inúmeros procedimentos prescritivos existentes,
alguns utilizam os limiares de audibilidade como base para o
cálculo de ganho acústico necessário para amplificar os sons,
especialmente os da fala. Outros especificam que os sinais de fala
devem ser seletivamente amplificados em níveis confortáveis de
audição, a partir de medidas supraliminares de maior conforto e de
desconforto.
É importante ressaltar que nenhum destes métodos é perfeito,
sendo impossível prever com precisão as necessidades audioló-
474 Fonoaudiologia Prática
Freqüência Fórmulas
250 1⁄ L.A. – 10
2
500 1⁄ L.A. – 05
2
1.000 1⁄ L.A.
2
2.000 1⁄ L.A.
2
3.000 1⁄ L.A.
2
4.000 1⁄ L.A.
2
Freqüência Fórmulas
250 1⁄ L.A. + 1⁄ (L.A. – 65) – 10
2 2
500 1⁄ L.A. + 1⁄ (L.A. – 65) – 05
2 2
1.000 1⁄ L.A. + 1⁄ (L.A. – 65)
2 2
2.000 1⁄ L.A. + 1⁄ (L.A. – 65)
2 2
3.000 1⁄ L.A. + 1⁄ (L.A. – 65)
2 2
4.000 1⁄ L.A. + 1⁄ (L.A. – 65)
2 2
Freqüência Fórmulas
250 1⁄ L.A. – 5
3
500 1⁄ L.A. – 3
3
1.000 1⁄ L.A.
3
2.000 1⁄ L.A.
3
3.000 1⁄ L.A.
3
4.000 1⁄ L.A.
3
6.000 1⁄ L.A. – 5
3
Método de Berger
BERGER (1976) descreveu um método para o cálculo do ganho
acústico baseado na regra de meio-ganho. Este método passou por
diversas revisões, tendo sido a última publicada por BERGER, HAGBERG,
RANE (1990). Estes autores também estabeleceram fatores de
correção para adaptações binaurais (subtraindo 3 dB do ganho por
freqüência), para perdas condutivas (somando 20% do diferencial
aéreo-ósseo) e para moldes abertos. Além de prescrever o ganho,
este método determinava o nível de saída máximo do aparelho de
amplificação. Este era estabelecido em função do nível de descon-
forto do paciente, medido com estímulos pulsáteis em dB NA e depois
convertido em dB NPS. Os autores recomendaram também o uso do
controle automático de ganho (AGC) quando a área dinâmica de
audição fosse menor do que a considerada apropriada para a fala
amplificada. Assim sendo, eram necessárias equações específicas
para determinar o ganho para perdas auditivas neurossensoriais,
adaptação monoaural e para os diferentes tipos de aparelhos. As
equações foram as seguintes:
Freqüência Fórmulas
250 X + 0,31 (L.A. 0250) – 17
500 X + 0,31 (L.A. 0500) – 08
750 X + 0,31 (L.A. 0750) – 03
1.000 X + 0,31 (L.A. 1000) + 01
1.500 X + 0,31 (L.A. 1500) + 01
2.000 X + 0,31 (L.A. 2000) – 01
3.000 X + 0,31 (L.A. 3000) – 02
4.000 X + 0,31 (L.A. 4000) – 02
6.000 X + 0,31 (L.A. 6000) – 02
X = 0,05 (L.A. 500 + L.A. 1000 + L.A. 2000)
Saída máxima
A seleção da saída máxima é crucial para o ajustamento e
adaptação adequada do deficiente auditivo ao uso da amplificação.
Quando a saída máxima estiver excedendo o limiar de desconforto,
o usuário do aparelho de amplificação poderá: 1. alterar constante-
mente o controle de volume para ajustá-lo aos diferentes níveis de
entrada sonora; 2. utilizá-lo apenas em ambientes silenciosos onde
os níveis de entrada sejam menos intensos; 3. simplesmente deixar
o controle de volume em uma posição fixa onde o ganho acústico
acrescido dos níveis de entrada não exceda o seu limiar de descon-
forto, evitando a manipulação constante; e 4. deixar de usar o
aparelho (HAWKINS, 1984).
A premissa na seleção dos níveis de saída máxima é que o
usuário de um aparelho de amplificação não vivencie o desconfor-
O Processo de Seleção e Adaptação de Aparelhos de Amplificação Sonora 479
2. Mensurações in situ
Avaliação do ganho acústico
Sem dúvida alguma, o desenvolvimento dos equipamentos
com microfone-sonda foi o mais importante avanço ocorrido nos
últimos anos na área de adaptação de aparelhos de amplificação,
uma vez que fornecem informações essenciais durante o proces-
so de seleção, permitindo mais precisão nos ajustes e na avalia-
ção das características da amplificação recebida pelo indivíduo
deficiente auditivo.
A mensuração in situ que mais atenção recebe durante o
processo de adaptação do aparelho é a resposta de inserção. É
definida como a curva de resposta em freqüências resultante da
diferença entre a resposta sem e com aparelho, em decibels,
obtidas no mesmo ponto no meato acústico externo. Represen-
ta o ganho fornecido por um aparelho quando inserido na orelha
do indivíduo.Se estivermos nos referindo ao ganho em apenas
uma freqüência, o termo empregado é ganho de inserção, que
é uma resposta eletroacústica, objetiva e considerada como
equivalente ao ganho funcional.
Uma das principais aplicações da resposta de inserção é
verificar se o ganho acústico desejado foi obtido. A maioria dos
equipamentos é capaz de calcular o ganho acústico do aparelho,
desde que sejam fornecidos os limiares tonais do paciente e
escolhido o método prescritivo desejado. Dessa forma, pode-se
observar no monitor a curva de ganho prescrito e compará-la com
aquela obtida com o aparelho (COSTA, COUTO, ALMEIDA, 1996).
Os equipamentos com microfone-sonda são extremamente
versáteis e sua utilização deve ir muito além do que simples-
mente determinar a resposta de inserção. Quando bem-utiliza-
dos, permitem o registro do desempenho de qualquer tipo de
aparelho de amplificação, bem como de quaisquer circuitos
especiais presentes, os quais não poderiam ser avaliados por
outros meios.
484 Fonoaudiologia Prática
nário PHAB. Para cada item são dadas duas respostas, uma sem e
outra com o aparelho, avaliando desta forma o desempenho do
indivíduo em cada situação de vida diária com e sem aparelho.
• Abbreviated Profile of Hearing Aid Benefit (APHAB)
COX & ALEXANDER (1995) desenvolveram, a partir do questio-
nário PHAB, um modelo reduzido com o objetivo de utilizá-lo como
instrumento clínico. O APHAB apresenta 24 itens distribuídos em
quatro subescalas: facilidade de comunicação, reverberação,
ruído ambiental e desconforto para sons. As três primeiras
subescalas destinam-se a avaliar a inteligibilidade da fala em
várias situações de vida diária, enquanto a quarta quantifica as
reações negativas aos sons ambientais.
RADINI (1994) desenvolveu o primeiro questionário adaptado
ao português brasileiro, com o objetivo de pesquisar o grau de
satisfação do usuário de aparelhos analógicos e digitalmente
programáveis em diversas situações de vida diária. Este instru-
mento foi elaborado a partir da combinação de dois questionários
– HAPI e SHAPI. O questionário possui quatro partes: 1. dados de
identificação; 2. FASE A – 32 situações quanto ao desempenho
dos aparelhos em diversas situações (em casa, no carro, na rua
e locais diversos), com seis opções de resposta; 3. FASE B – 10
itens referentes às queixas dos usuários quanto ao desempenho
dos aparelhos de amplificação (desconforto a sons intensos,
qualidade sonora, amplificação insuficiente, dificuldades na com-
preensão de fala, tamanho inadequado, problemas de realimen-
tação acústica constante); e 4. FASE C – 8 itens resumindo o
desempenho dos aparelhos em várias situações (compreensão
de fala no silêncio, com ruído de fundo; reconhecimento de sons
ambientais; qualidade sonora; ruídos internos do aparelho; apre-
ciação de música; qualidade da voz do usuário e avaliação geral).
Dessa forma, os questionários de auto-avaliação, assim como
as medidas do ganho funcional, ganho de inserção e testes de
reconhecimento de fala, devem ser utilizados conjuntamente
pelos profissionais com o objetivo de avaliar o desempenho de
indivíduos usuários de aparelhos de amplificação, verificando sua
adequação nas inúmeras situações de vida diária e permitindo a
identificação de possíveis modificações que se façam necessá-
rias em suas regulagens (MATAS & IÓRIO, 1996).
Leitura recomendada
ALFORD, B.R. & JERGER, J. – Audiology and otolaringology – a
continuing partnership. Arch.Otolaryngol., 103:249-250, 1977.
ALMEIDA, K. – Mensurações de próteses auditivas in situ e no acoplador
de 2.0 ml. Tese de Mestrado – Escola Paulista de Medicina, São
Paulo, 1993.
ALMEIDA, K. – A seleção e a verificação da saída máxima. In: ALMEIDA,
K. & IÓRIO, M.C.M. Próteses Auditivas: Considerações Teóricas e
Aplicações Clínicas. São Paulo, Editora Lovise, 1996. pp.101-108.
BENTLER, R.A. – Amplification for the hearing-impaired child. In:
ALPINER, J. & McCARTHY P.A. Rehabilitative Audiology: Children
and Adults. Baltimore, Williams & Wilkins, 1993. pp.72-105.
BERGER, K.W. – Prescription of hearing aids. J. Audiol. Soc., 2:71-78, 1976.
BERGER, K.W.; HAGBERG, E.N.; RANE, R.L. – La Adaptación de
Prótesis Auditivas – Fundamentos, Método y Resultados. 2ª ed.
Alicante, Laem, 1990. 60 p.
BYRNE, D. & DILLON, H. – The National Acoustic Laboratories (NAL)
new procedure for selecting the gain and frequency response of a
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BYRNE, D.; PARKINSON, A.; NEWALL, P. – Hearing aid gain and
frequency response requirements for the severely/profoundly hearing
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BYRNE, D. & TONISSON, W. – Selecting the gain of hearing aids for
persons with sensorineural hearing impairments. Scand. Audiol.,
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CAMPOS, C.A.H.; RUSSO, I.C.P.; ALMEIDA, K. – Indicação, seleção e
adaptação de próteses auditivas: princípios gerais. In: ALMEIDA, K.
& IÓRIO, M.C.M. Próteses Auditivas: Considerações Teóricas e
Aplicações Clínicas . São Paulo, Editora Lovise, 1996. pp. 35-46.
O Processo de Seleção e Adaptação de Aparelhos de Amplificação Sonora 495
22
Moldes Auriculares
INTRODUÇÃO
ORELHA EXTERNA
Por orelha externa compreende-se o pavilhão auricular e o
meato acústico externo (MAE).
O pavilhão serve para coletar as vibrações aéreas que cons-
tituem as ondas sonoras, e o meato dirige-se do fundo do pavilhão
para dentro, conduzindo as vibrações que são transmitidas à
membrana timpânica.
A superfície lateral da orelha é irregularmente côncava, com
numerosas eminências e depressões.
As estruturas anatômicas do pavilhão auricular são: hélice,
tubérculo auricular, anti-hélice, fossa triangular, fossa escafóide,
concha auricular, cimba da concha, trago, antitrago, incisura
intertrágica e lóbulo (Fig. 22.1).
Moldes Auriculares 499
Fossa escafóide
Fossa triangular
Tubérculo da orelha
Cimba da concha
Hélice Concha
Trago
Anti-hélice
Incisura intertrágica
Antitrago
Lóbulo
REALIZAÇÃO DE PRÉ-MOLDAGEM
O ponto de partida para a boa impressão de um molde
auricular é a inspeção criteriosa das condições da orelha externa.
Essa avaliação mostra, basicamente, o diâmetro e comprimento
do canal, direção das curvas, presença de pêlos e cerúmen ou de
problemas que inviabilizam a pré-moldagem.
Na presença de qualquer anomalia no MAE, o paciente deve
ser encaminhado ao médico otorrinolaringologista.
O ideal é que esta inspeção seja feita com um otoscópio e
não com uma lanterna especial para o ouvido com ponta de
acrílico. Observe-se que tal procedimento não consiste numa
otoscopia.
Na certeza de um meato acústico externo sadio, inicia-se o
processo de pré-moldagem, que deve ser previamente explicado ao
paciente, colocando-se um tampão ou bloqueador da massa a ser
introduzida no canal (Fig. 22.2A). No adulto, deve-se horizontalizar
o canal tracionando-se o pavilhão auditivo para cima e para trás,
enquanto na criança a tração deve ser para baixo, para a colocação
do tampão. Esse tampão, também chamado de oto-block pode ser
feito com algodão ou espuma e geralmente é preso no centro por um
fio resistente e higiênico, tal como o fio dental.
O tamanho do bloqueador a ser feito individualmente é deter-
minado pela inspeção prévia do diâmetro do canal.
A inserção do tampão é feita com auxílio de uma pinça,
seguida de uma lanterna (ear light). O local exato para sua
colocação é o início da segunda curva do MAE em se tratando de
molde para aparelhos retroauriculares ou intracanais.
No caso de aparelhos peritimpânicos e microcanais, a locali-
zação é mais profunda, devendo definir toda a segunda curva. Tal
procedimento merece atenção especial.
Após a colocação do tampão, é importante nova inspeção do
canal para garantir que todo o diâmetro foi bloqueado, evitando
que a massa atinja a membrana timpânica causando um acidente.
Em nível prático, observa-se maior aceitação dos pacien-
tes quando o tampão é feito de espuma densa. A bucha de
algodão, quando muito comprimida, parece desconfortável à
introdução.
Realizada a perfeita vedação do canal, parte-se para a inser-
ção da massa que pode ser feita segundo três técnicas: a manual,
com seringa, e mista.
A técnica manual consiste na manipulação da massa à base
de silicone e catalisador, e inserção da mesma forma. Com esta
técnica, observa-se maior dificuldade para a penetração do mate-
rial e pouca fidelidade das curvas.
Moldes Auriculares 501
A B
C D
E F
A B
C D
E F
FIGURA 22.3 – A) Molde direto. B) Molde invisível concha. C) Molde invisível duplo. D) Molde invisível
simples. E) Molde passarinho. F) Molde canal.
MOLDES ESPECIAIS
A B
C D
FIGURA 22.4 – A) Molde tampão para natação. B) Molde para estetoscópio. C) Molde para colabamento
de canal. D) Molde protetor de ruído.
APARELHOS MICROCANAIS
Graças a estudos dirigidos à redução do efeito de oclusão,
surgiram as próteses completamente no canal (CIC). Neste tipo
de adaptação, a ponta da caixa ou cápsula do aparelho fica muito
próxima da membrana timpânica, isto é, além da segunda curva
do MAE, na porção óssea.
As vantagens desses aparelhos referem-se à maior aceitação
estética, redução do efeito de oclusão e menor requisição de
ganho e saída, pois a curva de ressonância natural do ouvido não
é perdida pela inserção de um molde como geralmente ocorre nos
demais tipos de próteses.
As condições clínicas para a realização da pré-moldagem são
as mesmas já referidas anteriormente, ou seja, um MAE livre de
corpos estranhos e absolutamente saudável.
A colocação do tampão requer um cuidado especial, pois deve
ultrapassar a segunda curva, atingindo a porção óssea do MAE.
O tampão de algodão pode ser lubrificado com vaselina líquida ou
glicerina para tornar menos incômodo ao paciente a sua inserção.
O profissional deve ser bastante experiente e considerar que
reações como dor, ardor, hiperemia e até sangramento podem
ocorrer em função da pele delgada dessa porção do meato.
O material utilizado para este procedimento também difere da
massa à base de silicone usada habitualmente com catalisador
Moldes Auriculares 507
Materiais
Os materiais utilizados mais habitualmente para a confecção
são o acrílico rígido ou flexível e o silicone.
O nome científico do acrílico rígido é metacrilato de metil que
pode ser termo-polimerizável ou autopolimerizável. O acrílico
termopolimerizável é considerado totalmente antialérgico, pois é
cozido a 100°C por algumas horas consecutivas. É mais resisten-
te, não sofre alterações de cor com o tempo e é comercialmente
mais caro. O acrílico autopolimerizável não é cozido a altas
temperaturas e, por isto, não é totalmente antialérgico, sofrendo
alteração de cor com o tempo. Pode ocorrer de um paciente
desenvolver alergia ao molde após algum tempo de uso, cuja
explicação é o fato de não ter havido total polimerização do
produto.
Para pacientes com indicação de moldes macios, por diferen-
tes razões, existe o acrílico flexível ou metacrilato de etil. Este
tipo de molde não é hipoalergênico, pode sofrer alteração de cor
e textura, requerendo trocas em menor espaço de tempo. Com o
advento do silicone, o acrílico flexível perdeu sua aplicabilidade.
O silicone é o mais novo material disponível no mercado. É
bastante resistente e macio. Não apresenta alteração de cor e textura
com o tempo. Pode ser usado em todos os tipos de perdas auditivas
e admite diferentes modificações estéticas. Sua grande limitação
refere-se a modificações acústicas além de não permitir a fixação de
arruela no caso de molde direto. É considerado hipoalergênico e é
comercialmente mais caro que os outros materiais.
Para a seleção do tipo de material a ser usado na confecção
de um molde, alguns fatores devem ser considerados. O tipo de
deficiência auditiva associado à idade do paciente são de grande
importância. Quanto maior for a perda do indivíduo, mais oclusivo
deve ser o molde. Em geral, crianças pequenas e idosos, nestes
casos, se beneficiam com moldes de silicone, que são mais
aderentes à pele, e mais suaves na colocação. Em deficiências
auditivas de leves a moderadas que necessitem de modificações
508 Fonoaudiologia Prática
MODIFICAÇÕES ACÚSTICAS
A indicação de uma prótese auditiva tem como objetivo
principal tornar os sons ambientais, e especialmente os de fala,
audíveis ao usuário. Os indivíduos portadores de deficiência
auditiva estão sempre requerendo modificações nas característi-
cas de suas próteses, a fim de usá-las mais confortável e eficien-
temente. Estas mudanças podem ser realizadas através dos
controles internos das próteses, porém nem sempre são suficien-
tes para atender às necessidades do paciente.
Estudos têm mostrado que a amplificação das altas freqüên-
cias é fundamental para maior inteligibilidade dos sons de fala.
Há também necessidade de minimizar as baixas freqüências
porque a amplificação dos sons de fala de baixas freqüências e
de ruídos ambientais tem interferido na percepção de consoan-
tes de freqüências altas pelo fenômeno do mascaramento
(DANAHER e cols., 1975).
O desenvolvimento tecnológico tem possibilitado, também,
modificações nos próprios moldes auriculares que permitem en-
fatizar determinada faixa de freqüência.
As modificações acústicas nos moldes determinam mudan-
ças nas respostas dos sons amplificados pelas próteses. Estas
modificações são possíveis com o uso de ventilação, dampers ou
filtros acústicos e efeito corneta, sendo que cada uma delas atua
em determinada faixa de freqüência (Fig. 22.5A).
As próteses atuais, com faixa de freqüência ampla, permitem
que estas modificações possam ser usadas em conjunto ou
individualmente. Tais alterações nem sempre trazem mudanças
mensuráveis na resposta de freqüência da prótese, porém os
usuários referem melhora na qualidade do som. São comuns
queixas dos pacientes concernentes à sensação de plenitude
a b c
Ventilação
A ventilação consiste na abertura de um segundo canal no
molde, diferente do canal de condução do som amplificado pela
prótese auditiva, que estabelece uma comunicação entre o am-
biente e espaço do MAE não preenchido pelo molde.
A ventilação foi criada por GROSSMAN em 1942, tendo sido o
primeiro método a ser utilizado como modificação acústica nos
moldes. Faz com que os sons graves, por refletirem com maior
facilidade, escapem através dela. Isto ocorre porque a massa
acústica, produzida dentro da abertura da ventilação, oferece maior
oposição ao fluxo de energia para altas freqüências. A ventilação é
normalmente indicada para pacientes com preservação da audição
em freqüências baixas. Tecnicamente, pode ser feita em paralelo ou
diagonalmente ao canal de condução do som, ou ainda, em forma
de canaleta externa ao canal do molde (Fig. 22.5B).
A ventilação em paralelo não intersecciona o canal de condução
do som, sendo tão longa quanto este. A imitância desta ventilação
é grande devido à massa acústica e reduz o escape das altas
freqüências. A ventilação em diagonal intersecciona o canal de
condução do som sendo seu comprimento e diâmetro importantes,
e sua imitância variável em função do ponto de intersecção com o
canal de condução do som. Com o uso da ventilação em diagonal,
pode ocorrer escape da energia das altas freqüências com maior
facilidade. Devido a esta característica, a ventilação em paralelo é
mais efetiva. Muitas vezes, determinados aspectos anatômicos
obrigam o uso de ventilação em diagonal, devendo ser a inter-
secção, nestes casos, o mais próximo possível da ponta do molde,
o que aumenta a impedância da ventilação assegurando perda
mínima de energia nas altas freqüências (LEAVITT, 1986).
A ventilação externa é usada quando o MAE estreito não permite
a ventilação em paralelo. Neste caso, faz-se uma canaleta na porção
inferior do molde, em toda a sua extensão. Este tipo de ventilação é
bastante empregado nas próteses intra-auriculares e intracanais, pois
minimiza-se a possibilidade de realimentação acústica.
a b c
100
90
80
70
60
FIGURA 22.5 – C) Efeito da ventilação no
fenômeno de oclusão. Molde fechado ___,
50 ventilação de 1mm - - - - -, 2 mm -.-.-, 3 mm
0,025 0,500 0,125 0,250 0,500 1 2 4 KHz -..-..-, sem molde.....
Moldes Auriculares 511
• select-a-vent – SAV;
• positive venting valve – PVV;
• variable venting valve – VVV.
a b c d
db
a
b
130 c
d
e
120
110
100
e
100 200 500 1.000 2.000 5.000 10.000
Freqüência (Hz)
FIGURA 22.5 – E) Diferentes posições dos filtros acústicos nos moldes auriculares.
Moldes Auriculares 513
Efeito corneta
Outra forma de também produzir mudanças na resposta de
freqüência de uma prótese auditiva inclui variação de diâmetro
e comprimento do tubo plástico e redução ou aumento do
molde. Quanto menor o diâmetro do tubo plástico, menos ganho
nas altas freqüências é alcançado. Uma forma de compensar
esta perda é utilizar um tubo cujo diâmetro interno aumente
gradativamente da concha para a ponta do molde, em forma de
corneta. Aumentando-se ou diminuindo-se o diâmetro do tubo
nos 10 mm finais do molde, há uma mudança considerável nas
respostas para as altas freqüências.
O tubo plástico de um molde padrão tem diâmetro aproximado
de 2 mm. O aumento deste diâmetro para 4 mm nos últimos 10 mm
do molde enfatiza a resposta das altas freqüências, enquanto sua
redução para 1 mm atenua estas freqüências. São empregados,
respectivamente os termos horn e reverse horn para descrever
estas duas situações (MCHUGH & MORGAN, 1988) (Fig. 22.5F).
Som Som
Horn Reverse horn
FIGURA 22.5 – F) Transmissão sonora na corneta e na corneta invertida.
2 mm
4 mm
2 mm
4 mm
4 mm
19 mm 11 mm
11 mm
Belled canal
G H I
FIGURA 22.5 – G) Dimensões do Libby horn (BERGENSTOFF, 1985). H) Bakke horn (BERGENSTOFF,
1985). I) Canal em forma de boca-de-sino.
Leitura recomendada
BERGENSTOFF, H. – Earmold design and its effect on real ear insertion
gain. Hear. Instrum., 34(9):46-49, 1985.
COURTOIS, J. ; JOHANSEN, E. A.; LARSEN, B.V.; CHRISTENSEN, P.;
BEILIN, J. – Open Molds. In: JENSEN, J.H. Hearing Aid Fittings.
516 Fonoaudiologia Prática
23
Mensurações In Situ
INTRODUÇÃO
HISTÓRICO
O acoplador de 2,0 ml (ou acoplador 2 cc) desenvolvido por
ROMANOW em 1942, foi o primeiro passo em direção ao desenvol-
vimento das mensurações in situ. ROMANOW relatou que, para
expressar quantitativamente o desempenho de um aparelho
auditivo, é necessário especificar um referencial ao qual o seu
desempenho possa ser comparado, bem como o método para
efetuar tais comparações. Desta forma, como um mecanismo de
fácil fabricação, o acoplador teria a função de padronizar as
mensurações das características eletroacústicas dos aparelhos
auditivos. Não deveria simular uma orelha externa, e sim ser um
mecanismo no qual as medidas das características eletroacústicas
dos aparelhos auditivos poderiam ser obtidas, funcionando como
um padrão consistente para controle de qualidade, comparação
de aparelhos e troca de dados técnicos entre diferentes fábricas.
Em 1946, WEINER & R OSS utilizaram os primeiros microfones-
sonda e mediram o nível de pressão sonora em diferentes
posições do meato acústico externo para uma faixa em freqüência
de 200 a 5.000 Hz. Neste estudo, concluíram que a orelha externa
age como um amplificador natural, pois observaram que o nível
de pressão sonora na membrana timpânica é maior que o nível de
Mensurações In Situ 519
TERMINOLOGIAS, PROCEDIMENTOS E
APLICAÇÕES CLÍNICAS
Há uma série de mensurações in situ que podem ser realiza-
das para a adaptação do aparelho auditivo. Serão descritos os
sete procedimentos mais utilizados e algumas de suas aplicações
clínicas empregando uma terminologia que, embora seja a mais
aceita e mais utilizada, ainda não está padronizada. Os termos
escolhidos para a tradução da terminologia americana seguem a
proposta de COSTA e cols. (1996).
Procedimento
A posição do tubo-sonda e o nível do sinal de teste merecem
atenção especial para a realização deste procedimento.
O primeiro passo é a colocação do tubo-sonda no MAE, de
maneira adequada, já que a REUR obtida de forma incorreta pode
522 Fonoaudiologia Prática
dB
140
130
120
110
100
90
80
70
60
50
40
125 250 500 1k 2k 4k 8k Hz
Aplicações clínicas
Devido a características anatômicas particulares, os indiví-
duos têm diferentes valores de REUR. Quando é inserido o molde
auricular, o volume residual e o diâmetro da abertura para a
entrada sonora no MAE diminuem, fazendo com que a amplifica-
ção natural seja perdida ou modificada. O resultado é que os
valores obtidos na orelha com aparelho auditivo irão variar de um
indivíduo para outro.
O primeiro e mais comum uso clínico da REUR é servir como
valor de referência para determinar a resposta de inserção (REIR)
ou o ganho de inserção (REIG). Desta forma, a resposta de
freqüência do aparelho auditivo deve compensar de maneira
adequada a perda de inserção provocada pelo molde. É importan-
te levar em consideração os valores da REUR a fim de selecionar
as características eletroacústicas necessárias para atingir o gan-
ho desejado. Compensação excessiva ou inadequada da perda
de inserção pode resultar em picos ou vales na curva da resposta
Mensurações In Situ 523
Procedimento
Após a REUR ser realizada, o aparelho deve ser colocado
desligado na orelha, com o cuidado do tubo-sonda permanecer
no mesmo local do meato acústico externo. O sinal de entrada
é então apresentado em campo livre, utilizando o mesmo tipo
de sinal e mesmo nível de intensidade utilizados na avaliação
da REUR.
A maneira utilizada para demonstrar a REOR no monitor é
variável de acordo com o equipamento utilizado. Alguns mode-
los permitem equalizar a REUR, sendo o zero a linha de
referência. Desta forma, não é mostrada a REOR, mas a
diferença entre a resposta de ressonância (REUR) e a resposta
de oclusão (REOR) (Fig. 23.2A). Outros equipamentos exigem
que as medidas da REOR sejam realizadas em uma escala
absoluta e a área que estiver abaixo do nível de entrada vai
representar a REOR (Fig. 23.2B).
dB dB
90 140
80 130
70 120
60 110
50 100 REUR
40 90
30 80
20 70
REOR
10 60
0 50
-10 40
Hz 125 250 500 1k 2k 4k 8k Hz
125 250 500 1k 2k 4k 8k
A B
FIGURA 23.2 – A) Exemplo de curva de resposta resultante da diferença entre REUR e REOR. B)
Exemplo de curva de resposta de ressonância na orelha externa (REUR) e de resposta de oclusão
(REOR).
524 Fonoaudiologia Prática
Aplicações clínicas
A diferença entre REUR e REOR fornece uma estimativa da
perda de inserção, determinando qual é o efeito que a colocação do
molde auricular exerce na REUR do paciente. É importante realizar
a REOR isoladamente no momento da adaptação do aparelho
auditivo para melhor definição das características da amplificação e
modificações no molde para o indivíduo em questão.
Pode ser utilizada como uma medida indireta do efeito de
oclusão. Geralmente, quanto mais a REOR estiver abaixo da
REUR, maior será o efeito de oclusão. Desta forma, é possível
determinar o tamanho adequado da ventilação (combinada com a
resposta de inserção).
Procedimento
Levando em consideração que a REAR é normalmente con-
duzida logo após a REUR, o tubo-sonda já está no meato acústico
externo. O aparelho auditivo deve, então, ser colocado tomando-
se o cuidado para que o tubo-sonda não se desloque. Se não for
utilizada esta seqüência, o tubo-sonda deve ser colocado segun-
do os parâmetros já citados na REUR.
Após a colocação do aparelho na orelha, deve-se estar atento
ao nível de intensidade do sinal de entrada e a posição do controle
de volume do aparelho auditivo.
dB
140
130
120
110
100
90
80
70
60
50
40
125 250 500 1k 2k 4k 8k Hz
FIGURA 23.3 – Exemplo de curva de resposta com aparelho auditivo na orelha externa (REAR).
Mensurações In Situ 525
Aplicações clínicas
Embora a resposta de inserção (REIR) seja atualmente o
método mais conhecido para verificar o desempenho do aparelho
auditivo, a REAR provavelmente será, brevemente, o método
escolhido para determinar a qualidade da adaptação do aparelho
auditivo. Em alguns casos, a REAR é a mais útil a fim de solucionar
queixas do paciente em relação ao desempenho do aparelho
auditivo. Ela detecta picos inadequados na curva de resposta em
freqüência, os quais causam desconforto ao usuário ou queda na
qualidade sonora. Se estes picos ocorrerem próximos ao pico da
REUR, não serão observados na resposta de inserção.
O uso mais comum da REAR é servir como referência para o
cálculo da resposta de inserção (REUR é subtraída da REAR para
obter os valores da resposta de inserção). Por esta razão, muitos
equipamentos fazem este cálculo automaticamente e não apre-
sentam a REAR.
A REAR também é a mensuração mais adequada para
avaliar distorção intermodulada e circuitos especiais, tais como
microfone direcional, compressão ou circuito de processamento
de sinal.
Outra aplicação clínica importante da REAR é medir a saída
máxima do aparelho auditivo na orelha do usuário. Quando
utilizada desta forma, o termo correto é resposta de saturação na
orelha externa (RESR), descrita a seguir.
dB
140
130
120
110
100
90
80
70
60
50
40
125 250 500 1k 2k 4k 8k Hz
Procedimento
O procedimento é basicamente o mesmo utilizado na REAR,
exceto que neste caso é essencial assegurar que o aparelho
auditivo deva operar no seu nível máximo de saída (saturação). Para
isto, o nível do sinal de entrada deve ser 90 dB NPS e o controle de
volume deve ser posicionado logo abaixo do ponto de realimentação
acústica. A fim de evitar desconforto e/ou como medida de seguran-
ça, há um outro procedimento para realização do RESR. Utilizando
níveis de intensidades menores, pode-se obter a resposta desejada
através de um fator de correção individual, em relação ao acoplador
2 cc, que será descrito na RECD (diferença entre os valores do
acoplador e da orelha externa).
Convém lembrar que, segundo MUELLER & BRIGHT (1994), se
os limiares de desconforto foram obtidos e se o aparelho auditivo
adequado foi selecionado (com a saída máxima regulada adequa-
damente), então um sinal de 90 dB NPS não deverá causar
desconforto ao usuário.
Aplicações clínicas
Sabe-se que um aparelho auditivo com valores de saída máxima
excessivos pode causar desconforto e, em alguns casos, rejeição ao
seu uso mesmo que o ganho acústico seja, por outro lado, a saída
máxima regulada aleatoriamente em níveis desnecessariamente
reduzidos, a faixa dinâmica pode ser restringida, levando a distorções
que podem comprometer a inteligibilidade dos sinais de fala.
Mensurações In Situ 527
dB
90
80
70
60
50
40
30
20
10
0
-10
125 250 500 1k 2k 4k 8k Hz
dB
140
130 REAR
120
110
100 REIR
90
80
70 REUR
60
50
40
125 250 500 1k 2k 4k 8k Hz
FIGURA 23.6 – Exemplos de curvas de respostas obtidas na orelha externa: resposta de ressonância
(REUR) e resposta com aparelho auditivo (REAR). Desta forma REAR – REUR = REIR.
Procedimento
Depois de efetuada a equalização do campo livre e calibração
do tubo-sonda, a medida subseqüente é a REUR. Com o
cuidado de não tirar o tubo-sonda do local, o aparelho é coloca-
do ligado na orelha do paciente. O nível de sinal de entrada e o
tipo de sinal deve ser o mesmo utilizado na REUR. A posição do
tubo-sonda não é tão crítica, desde que seja a mesma utilizada
na REUR.
Todos os equipamentos calculam automaticamente a diferen-
ça entre as medidas com e sem aparelho auditivo. Em alguns,
podem-se observar as curvas REUR e REAR separadamente,
antes do cálculo.
Aplicações clínicas
O propósito principal da REIR é verificar se o ganho pre-
determinado pelo método prescritivo escolhido (“regras de gan-
ho”) foi alcançado. A maioria dos equipamentos calcula o ganho
necessário de acordo com os limiares tonais do indivíduo.
Esta mensuração é considerada equivalente ao ganho funcio-
nal (avaliação comportamental, resultante da diferença entre os
limiares tonais em campo livre, com e sem aparelho auditivo).
Para MUELLER (1992), a REIR apresenta várias vantagens em
relação ao ganho funcional:
• As informações são obtidas por toda a faixa de freqüência e
não apenas a intervalos de uma oitava ou meia-oitava.
Mensurações In Situ 529
Procedimento
O primeiro passo para a obtenção da RECD é realizar a REAR,
evitando a saturação do aparelho auditivo ou o acionamento da
compressão. Desta forma, um nível de sinal de entrada de 60 dB
NPS é suficiente. O controle de volume é colocado, na maioria das
vezes, na posição de uso.
Após a realização da REAR, o aparelho auditivo deve ser
retirado da orelha e a resposta no acoplador deve ser obtida com
o mesmo sinal de entrada e sem modificar a posição do controle
de volume.
A RECD é a subtração dos valores da REAR e do acoplador 2 cc.
Aplicações clínicas
A RECD é utilizada como um fator de correção individual. Uma
aplicação fundamental seria na seleção de um aparelho auditivo
apropriado baseado em informações do acoplador 2 cc. A fim de
saber qual será a resposta na orelha externa (REAR) de um
aparelho auditivo cujas características eletroacústicas foram
mensuradas no acoplador 2 cc, somam-se os valores da RECD
aos valores do acoplador 2 cc.
Outra aplicação importante seria a determinação da saída
máxima do aparelho auditivo, quando o usuário apresentou descon-
forto na RESR, com um sinal de entrada de 90 dB NPS. Realiza-se
a curva da SSPL90 no acoplador e soma-se a ela a RECD.
530 Fonoaudiologia Prática
Ambiente de teste
O teste pode ser realizado dentro ou fora de um ambiente
acusticamente tratado. A melhor utilização seria em uma sala
acusticamente tratada, pois pode-se garantir baixo nível de ruído,
poucas superfícies refletoras e pequeno tempo de reverberação,
porém se o espaço não for suficiente em salas acusticamente
tratadas, o próprio equipamento pode se tornar uma superfície
refletora.
Salas não-tratadas acusticamente podem ser utilizadas se
forem tomadas medidas a fim de haver a mesma validade e a
mesma confiabilidade. HAWKINS & MUELLER (1992) listam as
seguintes condições para a realização dos testes em salas
reverberantes:
Posicionamento do paciente
O posicionamento do paciente interfere na realização das
mensurações na medida em que diferentes níveis de pressão
sonora serão obtidos no meato acústico externo dependendo da
localização a ser utilizada. Deve-se considerar como pontos
importantes a distância em relação ao alto-falante e o ângulo de
incidência da fonte sonora.
Quanto ao ângulo de incidência da fonte sonora em relação ao
alto-falante, existem opiniões diversas mas, de maneira geral,
considera-se o 0 ou 45° azimute. Utilizando o 0°, o alto-falante
permanece exatamente em frente ao paciente durante toda a
testagem. Utilizando 45°, o alto-falante deve ser movido para o
lado da orelha testada.
Para a distância do paciente em relação ao alto-falante, a
maioria dos fabricantes recomenda entre 0,5 a 1 m.
COSTA e cols. (1996) referem que a distância de 1 m é a mais
utilizada, pois proporciona conforto ao paciente, precisão nas
medidas e, além do que, é uma distância que se aproxima de uma
situação de conversação normal. Sugerem também, que o pa-
ciente seja posicionado a 0° azimute, quando possível, no centro
da sala, com os braços ao longo do corpo, as mãos apoiadas nas
coxas, as pernas não devem estar cruzadas e os cabelos, quando
forem compridos, devem ser presos.
Utilização do tubo-sonda
Calibração da sonda
Dependendo do equipamento que está sendo utilizado, é
necessária a calibração do tubo-sonda de silicone. A extensão do
tubo de silicone é considerada parte do microfone, portanto os
efeitos acústicos da passagem do som pelo tubo devem ser
levados em consideração. O propósito desta calibração é fazer
com que o tubo-sonda se torne acusticamente desprezível. Desta
forma a mensuração será registrada como se o próprio microfone
estivesse próximo à membrana timpânica.
Mensurações In Situ 533
Posicionamento do tubo-sonda
A localização do tubo-sonda no meato acústico externo é um
dos aspectos mais importantes para garantir medidas precisas
com microfone-sonda. A posição inicialmente utilizada deve ser
mantida sem alterações até o final do teste.
A profundidade de inserção é particularmente importante para a
determinação de medidas absolutas, como a REUR e REAR. As
respostas nas freqüências altas são diretamente relacionadas à
distância entre a sonda e a membrana timpânica. Quanto mais
próxima a sonda estiver da membrana timpânica, mais precisa será
a mensuração nestas freqüências. Na REIG, por ser medida relati-
va, a localização da sonda não é tão importante quanto a necessi-
534 Fonoaudiologia Prática
dade que ela permaneça no mesmo local tanto para a REUR quanto
para a REAR (já que REIG = REAR – REUR).
Existe uma variedade de métodos para a colocação do tubo-
sonda numa profundidade adequada. Alguns profissionais prefe-
rem determinar medidas fixas de acordo com o comprimento
médio do meato acústico externo, variando este parâmetro para
adultos ou crianças. Outros utilizam pontos de referência como o
tragus ou a entrada do meato acústico externo até a ponta do
molde. O anel marcador no tubo-sonda, facilita a utilização destes
procedimentos.
De maneira geral, HAWKINS & MUELLER (1992) colocam duas
considerações básicas para a utilização na prática clínica: 1.
colocar o tubo-sonda o mais próximo possível da membrana
timpânica tendo a medida de 5 mm da membrana como o ideal; e
2. que o tubo se estenda no mínimo 5 mm da ponta do molde. É
comum e efetivo usar o molde como guia para a inserção do tubo-
sonda (Fig. 23.8).
Considerando então que normalmente a avaliação de desem-
penho do aparelho auditivo envolve a utilização de várias medi-
das, é coerente procurar satisfazer tanto o critério de profundidade
quanto de localização constante.
O bom senso deve estar sempre presente na avaliação de
cada caso em particular. O cuidado na colocação da sonda em
crianças é fundamental, pois a forma com que isto será feito
poderá possibilitar, dar prosseguimento ou dar fim ao teste que se
pretende realizar. Este aspecto será discutido posteriormente.
A
B
C
FIGURA 23.8 – Utilização do molde como guia para medida de inserção do tubo-sonda. A) Anel
marcador; B) tubo-sonda; C) microfone-referência.
Mensurações In Situ 535
Sinal de teste
Tipo de sinal
Alguns equipamentos com microfone-sonda possuem vários
tipos de sinais: tom puro, ruídos de banda estreita, ruídos de
banda larga, tons modulados e ruídos de espectro de fala. A
escolha do estímulo sonoro dependerá de qual mensuração o
profissional está querendo obter. Existem várias pesquisas em
relação a qual sinal seria o mais adequado para cada mensura-
ção, porém não existem padronizações e sim algumas recomen-
dações.
De forma geral, tons modulados e ruídos de banda larga,
normalmente são os mais escolhidos, pois suas características
permitem a utilização em um maior número de procedimentos.
É importante ressaltar que, se as mensurações forem efetuadas
em seqüência, deve-se manter o mesmo tipo de sinal para todas as
avaliações. Do contrário, os valores não serão confiáveis.
Nível do sinal
O nível de sinal escolhido vai depender da mensuração que
será realizada. A maioria dos equipamentos disponíveis no mer-
cado podem emitir sinais de 50 a 90 dB NPS.
A escolha do nível do sinal de entrada para registro da REAR
não tem grande importância se este valor for suficientemente forte
para estar acima do ruído ambiental e suficientemente fraco para
prevenir o desconforto do paciente. HAWKINS & MUELLER (1992)
referem 60 e 70 dB NPS como níveis adequados para abranger os
dois critérios.
Para alguns procedimentos como REIR ou RESR, o nível
do sinal é importante. Desde que o objetivo seja registrar o nível de
536 Fonoaudiologia Prática
OUTRAS APLICAÇÕES
Além das aplicações mais comuns realizadas pelas mensu-
rações in situ, o desempenho de adaptações CROS e BICROS,
circuitos especiais do aparelho auditivo (microfone direcional, circui-
to de compressão e processamento automático de sinal), e equipa-
Mensurações In Situ 539
CONSIDERAÇÕES FINAIS
As mensurações in situ, realizadas com equipamentos com-
putadorizados de microfone-sonda, trouxeram a possibilidade de
avaliação de vários parâmetros importantes para a adequada
seleção e adaptação de aparelho auditivo.
É um método rápido, objetivo, que produz respostas por toda
a faixa de freqüências e que, se bem-utilizado, proporciona maior
precisão nos ajustes e avaliação das características da ampli-
ficação.
Já que pesquisas comprovam sua confiabilidade e validade,
pode e deve ser usado na prática clínica desde que se esteja
atento aos conceitos e adequada realização dos procedimentos,
evitando assim artefatos e resultados inválidos.
Embora o desenvolvimento das mensurações in situ tenha
colaborado para aprimorar o processo de seleção e adaptação do
aparelho auditivo, é difícil avaliar os benefícios de um procedimen-
to de avaliação sobre outro. Desta forma, nenhum método de
avaliação pode ser interpretado como melhor do que qualquer
outro.
É necessário ainda ressaltar que, mesmo sendo instrumento
de grande valor, as mensurações in situ apenas fornecem a
informação de qual o nível de pressão sonora que se está obtendo
com a amplificação, no meato acústico externo próximo à mem-
brana timpânica. A utilização que o paciente irá fazer deste
estímulo acústico, dependerá de fatores inerentes à patologia,
fatores ambientais e emocionais e também de características e
possibilidades individuais. Assim, a observação do paciente e
todo o processo de acompanhamento e reabilitação além de
outras formas de avaliação, têm seu papel fundamental.
540 Fonoaudiologia Prática
Leitura recomendada
ALMEIDA, K. – Estudo das mensurações in situ na orelha externa:
fundamentos teóricos e aplicações clínicas. Monografia do Curso de
Especialização em Distúrbios da Comunicação – Escola Paulista de
Medicina, São Paulo, 1989.
BAMFORD, J.M. & WETWOOD, G.F.S. – Probe-tube microphone
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mensurações in situ na avaliação do desempenho das próteses
auditivas. In: ALMEIDA, K. & IORIO, M.C.M. Próteses Auditivas:
Fundamentos Teóricos & Aplicações Clínicas. São Paulo, Editora
Lovise,1996. pp. 141-160.
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Probe Microfone Measurments: Hearing Aids Selection and
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HAWKINS, D. B.; NORTHERN, J. L. Probe Microfone Measurements:
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MUELLER, H.G.; HAWKINS, D. B.; NORTHERN, J.L. – Probe Microphone
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NAUTON, R.F. – The effect of hearing aid use upon the user’s residual
hearing. Laringoscope, 67:569-576, 1957.
Mensurações In Situ 541
ROSS, M.; LERMAN, J.; CONN, S. – Hearing aid usage and its effect
upon residual hearing. Arch. Otolaryngol., 86:639-644, 1967.
SKADEGARD, H.J. – Real ear measurement – A professional tool.
Hearing Instruments, 38:4, 1987.
VALENTE, M.; VALENTE, M.; GOEBEL, J. – Realibility and intersubject
variability of the real ear unaided response. Ear and Hearing,
12(3):216-220, 1991.
Deficiência Auditiva 1
Tecnologia Computadorizada Aplicada a Aparelhos de Amplificação Sonora Individuais 543
24
Tecnologia Computadorizada
Aplicada a Aparelhos de
Amplificação Sonora
Individuais
30
20
LI - 40
10
LI - 65
0
– 10 LI - 90
– 20
125 25 5 1 2 4 8kHz
Freqüência (kHz)
FIGURA 24.1 – Exemplo de circuito WDRC – ganhos diferentes para sinais de entrada diferentes (40,
65 e 90 dB NPS).
A B
FIGURA 24.2 – A) À esquerda um aparelho microcanal e (B) à direita um aparelho peritimpânico, ambos
posicionados no meato acústico externo. O fio de nylon preso ao face-plate (parte externa dos
aparelhos) facilita a colocação e permite a retirada.
Entrada Amplificador
MIC Pré-AMP Filtro Filtro Receptor
KEMAR KEMAR
VG VG
dB 1 dB 2
40 40
20 20
0 0
-20 -20
70 70
50 50
KEMAR KEMAR
VG VG
dB 3 dB 4
40 40
20 20
0 0
-20 -20
70 70
50 50
FIGURA 24.6 – Exemplo de aparelho auditivo multicanal e multiprograma. Cada canal pode ter ganhos
e limiares de compressão diferentes para cada faixa, além das várias curvas de resposta serem
utilizadas para situações acústicas determinadas (neste caso: 1. fala no silêncio; 2. fala no carro; 3. fala
no supermercado; 4. música).
552 Fonoaudiologia Prática
Tec.
digital
Tecnologia
programável
Tecnologia
miniaturizada
Tecnologia avançada
Tecnologia standard
FIGURA 24.7 – A pirâmide da tecnologia inicialmente descrita por MIMS, modificada por LIBBY (1994),
agora recebe mais um degrau – a tecnologia “totalmente digital”.
NOAH™ is here!
© DG 1992
NOAH™ …
One standard for integrated hearing care software
FIGURA 24.9 – O desenho sugestivo mostra o caráter de integração do NOAH.
Tecnologia Computadorizada Aplicada a Aparelhos de Amplificação Sonora Individuais 555
IMPRESSÃO
As opções de impressão incluem o relatório do paciente ou o que
está atualmente na tela a partir de qualquer ponto do programa. O
relatório pode ser padrão, consistindo de uma ou duas páginas
sobre dados gerais, informações básicas audiológicas e da adapta-
ção de aparelhos, ou extenso, com dados completos de três ou
quatro páginas. Algumas empresas oferecem um resumo simples
de seu próprio programa, cujo conteúdo pode ser manipulado. A
versão 2.0 introduz a alternativa de carregar para fora do programa,
como para o editor de texto por exemplo, as informações sobre o
paciente, os aparelhos e controle remoto (ROBERTSON, 1996).
Até recentemente não existia nenhum software padrão que
fizesse a tecnologia computadorizada compatível com toda a indús-
tria de aparelhos auditivos. A criação do NOAH foi feita primariamen-
te para possibilitar que os múltiplos softwares e unidades programáveis
trocassem informações e funcionassem como um único sistema
integrado. Hoje ele faz muito mais que isso – transformou-se em uma
plataforma que reúne os aparelhos auditivos, equipamentos audio-
lógicos e outras ferramentas disponíveis para o trabalho na área de
audiologia. Atualmente 44 empresas no mundo inteiro estão
compromissadas a dar suporte para o “padrão” NOAH. Estas empre-
sas ou já lançaram, ou estão em vias de lançar, produtos compatíveis
com NOAH, principalmente aparelhos auditivos, equipamentos e
programas clínicos específicos (RADCLIFFE, 1996).
Várias firmas de aparelhos têm seus módulos correntemente
em uso e cada uma delas recebe um nome peculiar, relacionado
ou não com a empresa a qual pertence. Alguns deles são:
1. COMPASS (v 1.11) – Este módulo comporta a linha completa
de aparelhos auditivos WIDEX programáveis e analógicos. A linha
“completamente digital” da empresa ainda está sendo utilizada
através de unidade exclusiva, porém em breve poderá ser acessada
pelo COMPASS. A primeira parte do programa oferece dados
técnicos, gráficos, ilustrações e um texto provendo informação geral
FIGURA 24.12 – A tela do NOAH mostra os módulos de diferentes empresas contendo o banco de dados
de seus aparelhos auditivos.
Tecnologia Computadorizada Aplicada a Aparelhos de Amplificação Sonora Individuais 559
23/09/96 S
Session Date Name
23/09/96 09/09/42
Patient File Date Birthdate
80 MCL 80 MCL
100 100
UCL UCL
120 120
LF 35 LF 25
None None
Hook Hook
None None
HF (G) 55 HF (G) 55
Earmold Earmold
2.3 mm 2.3 mm
Vent Vent
HF (P) 55 HF (P) 55
Leitura recomendada
BERLIN, C.; HOOD, L.; HURLEY, A.; HAN WEN, M. – Hearing aids: only
for hearing impaired patients with abnormal otoacustic emissions. In:
BERLIN, C. Hair Cells and Hearing Aids. San Diego, Singular
Publishing Group, 1996. pp. 99-113.
BLASCA, W. – O Aproveitamento da Audição através do Uso de AASI
Digitalmente Programável. Dissertação de Mestrado pela Pontifícia
Universidade Católica de São Paulo, 1994.
CHASIN, M. – The acoustic advantages of CIC hearing aids. The Hearing
Journal, 47(11):13-17, 1994.
Tecnologia Computadorizada Aplicada a Aparelhos de Amplificação Sonora Individuais 565
25
Acessórios para Deficientes
Auditivos
INTRODUÇÃO
A necessidade diária de uma pessoa deficiente auditiva não se
restringe única e exclusivamente a escutar em situações espe-
ciais ou em ambientes acusticamente controlados.
Devemos pensar que o portador de uma deficiência auditiva
deve aproximar-se o máximo possível da vida normal, e para tanto
quando propomos o processo de aparelhamento, devemos con-
siderar a vida do indivíduo como um todo, levantando os aspectos
possíveis não só no que concerne à sua perda ou etiologia, mas
também às suas expectativas e condições de vida. Desta forma,
estaremos fornecendo ao paciente todas as condições para que
dentro de suas dificuldades, consiga a reabilitação esperada por
todos que dela participam, pais, parentes, amigos, profissionais e
o próprio paciente.
Conectores telefônicos
O uso do telefone é com certeza, nos dias de hoje, um dos
principais meios de ligação com o mundo, e tem sido um fator de
decisão acerca de qual tipo de aparelho, ou até, opção de uso ou
não, tamanha a importância que o telefone tem na vida do
paciente.
Mais comumente, o paciente tem usado o aparelho conectado
ao telefone através da entrada T, ou seja, o microfone não recebe
estímulos (desconectado), e a única entrada de som será a gerada
e captada por indução magnética; o usuário escutará sem interfe-
rências o que está sendo falado ao telefone.
Esta seria uma solução definitiva se todos os aparelhos
possuíssem bobina de indução magnética ou se esta amplificação
fosse efetiva para todas as perdas auditivas em termos de
qualidade e quantidade.
Então, alguns pacientes têm que lançar mão de recursos
diferentes para melhor uso. O mais comum é a sobreposição do
fone do telefone ao microfone da prótese usando-a normalmente
na posição M. Embora não sendo uma forma recomendada pelos
fabricantes, muitos pacientes se beneficiam da amplificação des-
ta forma. A não-recomendação deste tipo de uso é de fácil
entendimento, a possibilidade de microfonia na adaptação supra
é bastante grande, além de o paciente, em cada acionamento
telefônico, ter que procurar a melhor posição para que consiga
escutar de forma satisfatória sem microfonia.
A microfonia neste caso se dá pela proximidade de fonte e
microfone; sempre que esta situação é criada o fenômeno de
feedback acústico ocorre, porém há como evitar esta situação,
quando o indivíduo insiste nesta forma de uso – uma espécie de
argola de espuma (ear pad), que afasta a fonte do aparelho a uma
distância suficiente para diminuir significativamente a possibilida-
de da microfonia ou feedback acústico.
Mas há alguma outra forma de melhorar significativamente o
uso do aparelho em relação ao telefone?
Acessórios para Deficientes Auditivos 571
1 2
M T
Amplificadores de áudio
Estes têm a finalidade de amplificar o som emitido pelo
telefone, acrescendo intensidade sonora, auxiliando no uso por
pessoas que porventura tenham perda pequena que cause dificul-
dade para entendimento nesta situação. Este tipo de aparelho não
necessita de acoplamento ao aparelho auditivo, embora algumas
pessoas ainda assim associem-no ao microfone deste, incremen-
tando ainda mais o sinal sonoro que se deseja ouvir.
Outra categoria de adaptadores já necessitam de um aparelho
auditivo para seu uso, são os amplificadores de corrente de
indução magnética. Estes amplificadores têm a capacidade de
aumentar significativamente a corrente de indução que é gerada
pelo fone do telefone, e tal aumento faz com que o paciente
572 Fonoaudiologia Prática
Amplificadores de linha
A vantagem deste tipo de amplificador é o menor custo de
aquisição, e, seu funcionamento é bastante semelhante a outros
Modelo K
Modelo G
A
Para o telefone
Transformador
de potência
Amplificador
B C Para o fone
A B
FIGURA 25.6 – Equipamento de teledatilografia com (A) impressão gráfica; com (B) display gráfico.
Acessórios para Deficientes Auditivos 575
Acessórios de manutenção
Para as pessoas que trabalham diariamente com a prótese
auditiva, muitas são as queixas em termos de umidade, proble-
576 Fonoaudiologia Prática
A B
C D
mas com quedas ou sujeira. Tais dificuldades também têm que ser
consideradas por nós audiologistas e se possível encaminhadas,
resolvidas ou minimizadas. Oferecer algumas sugestões para o
leitor é a intenção, porém, a cada novo encontro de profissionais,
mais opções surgem e a reciclagem é de muita importância para
o bom atendimento que vai ser oferecido.
Umidade
Uma das primeiras orientações que o paciente recebe quando
da implantação de um aparelho auditivo é a de evitar o contato
com água ou qualquer líquido, direta ou indiretamente com o corpo
deste ou circuito do mesmo.
E por que tal medida deve ser tomada?
O circuito de amplificação é bastante sensível à umidade e
se este for exposto à mesma, regularmente ou demasiadamen-
te, com certeza criar-se-ão condições para corrosão do circuito,
e a função de amplificação estará comprometida. E, mesmo ao
ser retirado o aparelho, a ação da umidade continua, ainda que
fora do pavilhão.
Para sanar esta ação há um desumidificador (dri-aid), com-
posto de um pote com material altamente absorvente e que pode
atuar durante toda a noite, e, pela manhã, toda a umidade que agia
dentro da prótese foi retirada.
A prótese auditiva é colocada dentro do pote e mantida neste
por longas horas.
Acessórios para Deficientes Auditivos 577
Sistemas de infravermelho
O sistema de condução infravermelha é constituído de uma
unidade emissora que tem por finalidade transformar o som em luz
(fazendo aqui a função de um transdutor-transformador de ener-
gia) e uma segunda unidade, a receptora, que tem a capacidade
de receber esta energia transformada e retransformá-la em ener-
gia sonora, traduzindo os impulsos luminosos em som novamen-
te. Algumas são as particularidades deste tipo de conexão:
Direcionabilidade – Como se trata de um facho de luz, esta
se propaga em linha reta e portanto o posicionamento do indivíduo
que faz uso do sistema deve ser em frente o emissor, pois pode
não haver a devida captação do estímulo sonoro.
Sensibilidade – Como se trata de um facho luminoso, outro
tipo de energia luminosa pode interferir nesta transmissão.
Aplicabilidade – Todo o ambiente de ensino pode receber
este modo de transmissão, tomando-se os cuidados de colocação
do pessoal em posição ideal para recepção.
Acessórios para Deficientes Auditivos 581
Caixa acústica
Transmissor
infravermelho
Amplificador
misto
▼ Indivíduos
com perda
▼ ▼ ▼
auditiva
Ouvintes normais
Caixa acústica
Amplificador
d c
Indivíduos com
deficiência auditiva Ouvintes normais
A B
FIGURA 25.12 – A) Circuito de indução magnética em uso. B) Circuito de indução magnética: a = fio;
b = amplificador; c = microfone; d = área de escuta.
582 Fonoaudiologia Prática
A B
CONCLUSÃO
Pudemos observar claramente, no decorrer de todo o capítulo,
que só o aparelho auditivo sem o auxílio de alguns acessórios pode
não suprir todas as necessidades do paciente, que por vezes,
inabilita ou restringe o uso em muitas situações. Embora alguns
destes sistemas tenham inconvenientes, é o usuário que determina-
rá quais suas prioridades e qual o sistema que melhor lhe convém.
Não podemos restringir a vida do usuário a algumas situações
sociais controladas, é de muita valia a ampliação do universo da
pessoa portadora de uma deficiência de audição. E o profissional
deve estar sempre atualizado e atento no sentido de se manter por
dentro de todas as modificações e novos equipamentos que irão
surgir com o passar do tempo e evolução da tecnologia.
Garantindo ao paciente a melhor condição de aprendizado, de
condição comunicativa individual ou coletiva, garantindo percep-
ção dos sinais sonoros de alerta e chamados telefônicos, sentire-
mos que proporcionamos ao usuário a maior e melhor condição de
uso possível de seu aparelho auditivo.
Leitura recomendada
BEAULAC, D.A; PEHRINGER, J.L.; SHOUGH, L.F. – Assistive listening
devices: available options. In: COMPTON, C.L. Seminars in Hearing.
Vol 10, nº 1, 1989. pp. 11-30.
BESS, F.H. & SINCLAIR, S. – Sistemas de amplificação usados na
educação. In: Tratado de Audiologia Clínica. São Paulo, Editora
Manole Ltda. 1989. pp. 986-1000.
BONALDI, L.V. & ALMEIDA, K. – Equipamentos e sistemas auxiliares
para o deficiente auditivo. In: ALMEIDA, K. & IORIO, M.C.M. Próte-
ses Auditivas:Fundamentos Teóricos & Aplicações Clínicas. Editora
Lovise, 1996. pp. 205-217.
HODGSON, W.R. – Special cases of hearing aid assessment. In:
HODGSON, W.R. Hearing Aid Assessment and Use in Audiologic
Habilitation. 1986. pp. 208-214.
JENSEMA, C.J. & COMPTON, C.L. – Television for the hearing
impaired In: COMPTON, C.L. Seminars in Hearing Vol. 10, nº 1,
1989. pp. 57-66.
Acessórios para Deficientes Auditivos 585
26
Aconselhamento em
Audiologia
INTRODUÇÃO
ACONSELHAMENTO: DEFINIÇÕES E
DIRETRIZES BÁSICAS
Segundo HODGSON (1989), aconselhamento em audiologia
pode ser definido como o fornecimento de informações, explica-
ções e apoio para guiar as opções, atitudes ou comportamentos
dos indivíduos deficientes auditivos. Destina-se fundamental-
mente a capacitar o indivíduo a encontrar soluções para suas
dificuldades.
Não existem teorias ou metodologias elaboradas especifica-
mente para o aconselhamento no processo de reabilitação audi-
tiva. Existem, inúmeras abordagens que são também utilizadas
em outras áreas da saúde.
De uma maneira geral, o aconselhamento inclui aprendiza-
gem, embora através de formas ou mecanismos diversos. Procu-
ra-se ajudar o indivíduo a aprender a pensar, sentir ou comportar-
se de maneira diferente. Assim, dentro de uma estrutura didática
e simplista, pode ser dividido em dois aspectos que visam:
• severidade da deficiência;
• idade do aparecimento e progressão da perda auditiva;
• idade atual;
• interesse pessoal;
• intenção de usar aparelho auditivo;
• atitude do usuário sobre o uso da amplificação;
• atitudes dos membros da família e conhecidos sobre o
usuário de aparelho auditivo e o uso do aparelho auditivo;
• experiência prévia e conhecimento sobre aparelhos auditi-
vos;
• complexidade do sistema de amplificação utilizado;
• inteligência e habilidades de linguagem;
• existência de reabilitação prévia;
• presença de outros comprometimentos, tais como deficiên-
cia visual, retardo mental, distúrbios psiquiátricas ou artrites
nas mãos.
O PAPEL DO FONOAUDIÓLOGO
Em diversas áreas da fonoaudiologia é inquestionável a
importância do papel do profissional que atua na orientação e
aconselhamento do paciente e sua família, e sua prática já está
estruturada na rotina clínica.
A tarefa do aconselhamento, como parte específica do pro-
cesso de seleção e adaptação do aparelho auditivo, vem se
estabelecendo gradualmente e de forma cada vez mais clara e
definida, embora há muito tempo faça parte de programas de
reabilitação. CARHART em 1946 já descrevia procedimentos de
seleção de aparelhos auditivos usados com militares durante a
Segunda Guerra Mundial que incluíam atividades designadas
para familiarizar adultos com o uso do aparelho auditivo.
A preocupação do profissional deve ser a de propiciar ao
paciente a superação de suas dificuldades durante todo o proces-
so de reabilitação. Não se pode segmentar a atuação realizando
apenas parte deste processo. Desde sua formação enquanto
estudante, até sua atuação clínica como profissional competente,
o fonoaudiólogo deve assumir o aconselhamento, como parte de
sua função, de maneira consciente e responsável.
O deficiente auditivo precisa da ajuda de um profissional
especializado para auxiliá-lo nos problemas de comunicação e
reações emocionais causadas pela perda da função auditiva
normal.
ERDMAN (1993) cita que os fonoaudiólogos são os profissio-
nais mais adequados para o aconselhamento de pessoas defi-
cientes auditivas e seus familiares, devido a compreensão da
deficiência auditiva e os problemas associados a ela.
Segundo SANDERS (1988) e ERDMAN (1993), os fonoau-
diólogos relutam em aceitar este papel ou sentem-se pouco
confortáveis com esta responsabilidade. Tal comportamento
pode ser justificado pelo medo ou insegurança de não saber o
que dizer ou como lidar com as reações dos pacientes. Além
disto a falta de uma metodologia específica para o aconselha-
mento do deficiente auditivo em particular pode colaborar para
acentuar esta dificuldade.
Aconselhamento em Audiologia 591
ACEITAÇÃO E MOTIVAÇÃO
Aceitação e motivação são dois aspectos intimamente relacio-
nados e fundamentais que devem ser levados em conta durante
o aconselhamento. A aceitação da perda auditiva e do uso da
amplificação, assim como a motivação para buscar ajuda e fazer
uso do aparelho auditivo, não só influenciam o trabalho a ser
realizado, como devem ser diretamente incluídos como objetivos
a serem alcançados.
Enquanto o fonoaudiólogo tem a clara noção do benefício
proporcionado pelo uso do aparelho auditivo, a maioria dos
indivíduos com deficiência auditiva simplesmente não aceita a
perda da audição ou podem sequer admitir que o uso da amplifi-
cação seja uma solução lógica ao seu problema. Aparelhos de
amplificação raramente são vistos pelos indivíduos como a melhor
forma de se lidar com a sua deficiência auditiva, mesmo que eles
proporcionem uma comunicação mais fácil (GARSTECKI, 1994). Os
motivos para tamanha rejeição são muitos e podem variar desde
razões estéticas, emocionais ou econômicas.
Muitas vezes é difícil para o indivíduo perceber ou assumir a
sua deficiência auditiva, pois a diminuição da audição pode ter se
instalado de forma suave, onde muitos sons vão, gradativamente,
deixando de ser ouvidos e outros passam a ser ouvidos numa
intensidade bem menor. Desta maneira, as pessoas vão se
acostumando a essa nova forma de ouvir. É muito comum que
sejam os familiares ou amigos próximos os primeiros a percebe-
rem, denunciarem ou sofrerem com essa diminuição da audição.
592 Fonoaudiologia Prática
INDIVÍDUOS IDOSOS
O processo de envelhecimento traz consigo uma série de
mudanças físicas, psicológicas e sociais. Apesar de haver ca-
racterísticas comuns a esses indivíduos, é preciso saber reconhe-
cer e respeitar as particularidades de cada sujeito como se ele
fosse único. O profissional que lida com esta população tem que
estar familiarizado e consciente dessas mudanças, suas influên-
cias e conseqüências.
A diminuição da audição é uma dessas conseqüências.
Segundo KASTEN (1992), alguns idosos aceitam passivamente
a deficiência auditiva, encarando-a simplesmente como um dos
muitos outros problemas que os acometem, e muito freqüente-
mente é deixada para um segundo plano de preocupações, já
que teria pouca importância se comparado com outros proble-
Aconselhamento em Audiologia 595
ORIENTAÇÕES BÁSICAS
O indivíduo deficiente auditivo candidato ao uso de aparelho
auditivo deverá ter noções básicas, claras e precisas quanto ao
seu problema de audição, sobre as possibilidades, limitações e
uso de amplificação, assim como da importância de sua co-
responsabilidade no sucesso de sua reabilitação. Deverá também
ser orientado quanto aos cuidados básicos necessários para o
uso e aproveitamento efetivo da amplificação.
O aparelho auditivo
É sempre conveniente perguntar ao indivíduo deficiente audi-
tivo se ele sabe o que é ou se já viu um aparelho auditivo antes.
Assim pode-se não só entender o grau de seu desconhecimento,
como também responder à sua fantasia ou expectativa. Aparelhos
auditivos são para alguns equipamentos barulhentos, incômodos
e ineficientes. Para outros, são a solução para os seus problemas,
pois acham que vão ter sua audição normal restabelecida. Não se
deve iludir o paciente na tentativa de motivá-lo e sim fornecer
informações realistas, mostrando benefícios e também limita-
ções. É fundamental adequar a linguagem e a abrangência das
explicações de acordo com cada indivíduo.
Não é necessário usar terminologia técnica, mas em linhas
gerais, o indivíduo precisa saber o que é um aparelho auditivo,
seus componentes e funções básicas. Deverá ser orientado
quanto aos modelos existentes e possíveis de uso para o seu
caso, discutir suas vantagens, desvantagens e indicação clínica.
Um dado importante, será o de esclarecer que o aparelho
auditivo é apenas uma ajuda externa e, desde que corretamente
indicado, não influenciará ou modificará a perda auditiva. Em
outras palavras, ele não tem função de cura nem será responsável
pela estabilização ou piora da audição. Além disto, embora o
aparelho auditivo seja uma grande ajuda, não significa que ele
possa proporcionar ao indivíduo “ouvir com a naturalidade de
antes”.
Desta forma, o aparelho auditivo tem por função básica
amplificar os sons para que eles possam ser ouvidos de forma
confortável pelos indivíduos deficientes auditivos sem ter a pre-
tensão de substituir o desempenho e função natural do ouvido.
Ao aumentar a intensidade original do sons de fala haverá,
indiretamente, uma facilidade maior para a sua inteligibilidade. No
entanto, isto não significa corrigir os problemas associados à
diminuição da habilidade na discriminação auditiva característi-
cas de determinadas patologias da audição.
É prudente esclarecer ao indivíduo que, apesar dos aparelhos
auditivos serem todos muito parecidos externamente, existe gran-
de diferença interna nos seus componentes, que existem ainda
regulagens para adaptar a problemas determinados e que o seu
desempenho vai variar dependendo do ambiente em que é
utilizado. São muitos os problemas e dificuldades comuns relata-
dos e enfrentados na vida diária pelos usuários de aparelho
auditivo: compreensão da fala em ambientes ruidoso ou com mais
de um interlocutor, uso de telefone, grande distância da fonte
sonora, ambientes amplos e com acústica inadequada, entre
outras.
Em todo caso, é preciso explicar com clareza a natureza e
extensão do seu problema, dando uma estimativa do aproveita-
mento auditivo e do benefício esperado com o uso do aparelho
600 Fonoaudiologia Prática
Cuidados e manutenção
Com o aparelho auditivo
A durabilidade de um aparelho auditivo depende, como qual-
quer outro aparelho eletrônico, dos cuidados diários de manuten-
ção. Segundo SHIMON (1992), a vida útil desses aparelhos deveria
ser, em média, de 5 anos.
Cabe aqui ressaltar que a necessidade de mudança de
aparelho auditivo não depende somente de sua vida útil. O
indivíduo deficiente auditivo deve ser orientado de que trocas
poderão ser necessárias caso surjam mudanças no grau, configu-
ração da perda auditiva, ou por novos achados audiológicos.
Neste caso, poderá ser colocada em questão a eficiência do
aparelho auditivo em uso e ser determinada a sua troca, mesmo
que esteja em condições técnicas satisfatórias.
Para a manutenção de um padrão e qualidade de uso, as
recomendações mínimas são as seguintes:
• guardá-lo sempre em local apropriado;
• não expô-lo desnecessariamente à poeira, umidade ou calor
excessivos;
• não usar sprays ou produtos químicos;
• limpá-lo diariamente com um lenço ou pano seco;
• evitar quedas ou batidas;
• não molhá-lo;
• usar somente pilhas adequadas ao tipo e modelo de apare-
lho e, quando fora de uso por tempo prolongado, retirar a
pilha;
• solicitar limpeza e revisões técnicas periodicamente.
Com o tempo, o paciente irá familiarizar-se com as caracterís-
ticas de funcionamento normal e deverá aprender a verificar
diariamente o funcionamento de seu aparelho auditivo.
602 Fonoaudiologia Prática
Com o molde
O molde deverá ser refeito periodicamente, sempre que
surgirem sinais de desgaste, deterioração do material ou modifi-
cações no pavilhão auricular, causando em geral retroalimentação.
No caso de aparelhos tipo retroauricular, é preciso orientar
quanto à importância da integridade, transparência e flexibilidade
do tubinho plástico, e que portanto, na ocorrência de qualquer
modificação de suas características deverá ser trocado. Quanto à
limpeza diária e/ou periódica do molde propriamente dito, deverá
ser limpo diariamente com um lenço de papel para ser retirado o
excesso de gordura e cerúmen nele depositado. Além disso, deve
ser lavado periodicamente com água e sabão neutro, tomando-se
o cuidado de secá-lo totalmente interna e externamente.
Os aparelhos intra-auricular ou intracanal são montados den-
tro do próprio molde, por isso não podem ser lavados. No caso de
acúmulo de cerúmen no orifício de saída do som, a limpeza deverá
proceder segundo a indicação do fabricante ou realizada pelo
técnico especializado.
Em nenhum caso deve-se passar produtos químicos, de
limpeza ou desinfetantes.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Leitura recomendada
BOÈCHAT, E.M. – Ouvir Sob o Prisma da Estratégia. Tese de Mestrado
– Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, 1992.
CLARK, J.G. – Understanding, building, and maintaining relationships
with patients. In: GEER, C.J. & McCARTHY, P.A. Rehabilitative
Audiology: Children and Adults. 2ª ed. Baltimore, Williams & Wilkins,
1993. pp. 18-37.
ERDMAN, S.A. – Counseling hearing impaired adults. In: ALPINER, J.G.
& McCARTHY, P.A. Rehabilitative Audiology: Children and Adults.
2ª ed. Baltimore, Williams & Wilkins, 1993. pp. 374-413.
GARSTECKI, D.C. – Hearing aid acceptance in adults. In: GEER, C.J. &
MARTIN, F.N. Effective Counseling in Audiology: Perspectives and
Practice. Englewood Clifts, Prentice Hall, 1994. pp. 210-245.
604 Fonoaudiologia Prática
Terapia
Fonoaudiológica
606 Fonoaudiologia Prática
Avaliação e Terapia de Voz 607
27
Avaliação e Terapia de Voz
1. Disfonias funcionais.
2. Disfonias organofuncionais.
3. Disfonias orgânicas.
1. Disfonias funcionais
As disfonias funcionais são, por excelência, o campo de
domínio do fonoaudiólogo, onde se tem mais condição de atuação
e reabilitação do paciente, dependendo quase que exclusivamen-
te do trabalho vocal realizado. As disfonias funcionais represen-
tam, na verdade, disfonias do comportamento vocal, ou seja, no
processo de emissão vocal que decorre do próprio uso da voz, isto
é, da “função de fonação”.
A compreensão de que essas disfonias dependem do compor-
tamento vocal do paciente nos remete ao conceito de que a voz é
um comportamento adquirido como qualquer outro e, portanto,
passível de novas regras de aprendizagem.
Embora a fonação seja uma função neurofisiológica inata, a
voz é o resultado de vida de cada indivíduo e grande parte desse
processo é realizado por imitação de padrões e por desejo de
comunicação.
Portanto, as disfonias funcionais são as alterações no proces-
so de emissão vocal que decorrem do uso da própria voz, isto é,
da função de fonação da laringe.
A disfonia funcional por uso incorreto da voz é geralmente
favorecida pela falta de conhecimento sobre a produção vocal,
pela ausência de noções básicas sobre a voz e as possibilidades
do aparelho fonador – o que pode levar o indivíduo a selecionar
ajustes motores impróprios a uma produção normal de voz.
Convém lembrar que, noções, tais como inspirar antes de falar,
articular corretamente e com a boca aberta, não competir com
ruído de fundo e usar roupas confortáveis, principalmente na
região do pescoço e do tórax, são conhecimentos muito simples
de nossa parte, mas o paciente não é um especialista em
comunicação e necessita ser suficientemente orientado.
Falar é um atributo natural de nossa espécie, e o uso incorreto
representa simples desvios do processo básico de produção
natural da voz. As alterações mais encontradas abrangem os
níveis respiratório, glótico e ressonantal.
As disfonias funcionais devido às inadaptações vocais têm
recebido de nosso grupo uma atenção bastante especial, pois são
de difícil enquadramento, considerando-se que uma laringe nor-
mal, simétrica e estável, tanto na função respiratória quanto na
610 Fonoaudiologia Prática
FIGURA 27.1 – Imagem de laringe simétrica, onde se observa que a metade direita da laringe é
aproximadamente a imagem especular da metade esquerda.
Avaliação e Terapia de Voz 611
FIGURA 27.2 – Imagem de assimetria laríngea, onde se observa que as hemilaringes são diferentes
entre si, o que revela uma inadaptação vocal.
2. Disfonias organofuncionais
Na maioria dos casos, uma disfonia organofuncional é uma
disfonia funcional diagnosticada tardiamente, ou por atraso na
busca da solução do problema pelo próprio paciente ou pelo
não-reconhecimento da potencialidade de se desenvolver uma
lesão secundária. O objetivo primário do tratamento é promover
a reabsorção da lesão, corrigindo o desvio funcional, do momen-
to em que se reconhece como causa primária a alteração no
comportamento vocal. Nesta categoria é essencial a integração
ORL-FONO, porque em determinados casos deve-se definir a
conduta cirúrgica e é básica a troca de informações entre esses
profissionais.
Existe uma lista extensa de critérios que podem ser conside-
rados para auxiliar a definir essa conduta, sendo que o primeiro é,
sem dúvida, como está configurada a equipe de atendimento ao
paciente.
Existe uma série de lesões que podem ser consideradas
como decorrentes do uso inadequado ou abusivo da voz, dentre
as quais a mais comum é o chamado nódulo vocal.
O nódulo vocal se apresenta como uma lesão de massa em
ambas as pregas vocais (lesão nodular) de aparência simétrica
ou não, de relevo edematoso ou puntiforme, que geralmente
Avaliação e Terapia de Voz 613
FIGURA 27.3 – Imagem da laringe. Nódulos bilaterais de pregas vocais com fenda glótica.
614 Fonoaudiologia Prática
3. Disfonias orgânicas
Não existe tradição de atendimento fonoaudiológico no campo
das disfonias orgânicas, porém, é cada vez mais aceito o benefício
que dele resulta. Tais disfonias não advêm do comportamento vocal
em si, mas são o resultado de alterações independentes do uso da
voz, porém, com conseqüência direta sobre essa. Assim, tanto as
alterações vocais devido a quadros inflamatórios ou infecciosos
agudos, como gripes e laringites, como às alterações vocais por
carcinoma da laringe ou doenças neurológicas, como a doença de
Parkinson e a esclerose lateral amiotrófica são disfonias orgânicas.
As alterações vocais após cirurgias da laringe, as chamadas disfonias
do pós-operatório, são também disfonias orgânicas.
Desta forma, por exemplo, uma vez terminado o tratamento
médico para uma lesão orgânica, como uma leucoplasia, podem
permanecer alterações nas estruturas do trato vocal ou mesmo
nas funções musculares que exigem um processo de reabilitação.
616 Fonoaudiologia Prática
FIGURA 27.6 – Imagem da laringe após laringectomia parcial para remoção de carcinoma. Observe que
a fonte sonora deslocou-se da região glótica para a região supraglótica, através de constrição ântero-
posterior, com aproximação das cartilagens aritenóideas e da epiglote.
AVALIAÇÃO FONOAUDIOLÓGICA
A avaliação fonoaudiológica constitui-se da obtenção da his-
tória do distúrbio vocal e da avaliação do comportamento vocal
propriamente dita, que pode empregar métodos subjetivos ou
objetivos.
618 Fonoaudiologia Prática
Identificação
A avaliação de voz necessita antes de tudo, como em qualquer
prontuário clínico, de identificação pessoal. Nela ressaltamos,
além das informações demográficas básicas, a importância da
profissão e da ocorrência de outra atividade secundária em que se
empregue a voz.
Avaliação e Terapia de Voz 619
Queixa e duração
A queixa é o motivo da consulta. É por ela que a entrevista
inicia-se e muitas vezes, é ela que encerra grande parte das
informações necessárias. Ela revela o grau de conscientização do
paciente sobre sua alteração e expressa a habilidade em organi-
zar verbalmente a informação sobre a dificuldade atual e o tempo
de sua evolução. O clínico deve investigar não apenas o início da
queixa, mas como a disfonia se comporta, os principais sinais e
sintomas, consistência ou variabilidade desses sintomas e trata-
mentos anteriormente efetuados.
Hábitos
A investigação dos hábitos inadequados concentra-se em
dois aspectos distintos: os agressores externos, como o tabagis-
mo, o etilismo, o uso de drogas e as condições ambientais de uso
da voz e os agressores do próprio comportamento vocal – o abuso
e o mau uso de voz que possam levar ao fonotrauma.
Os hábitos vocais perniciosos apresentam-se sob diferen-
tes formas e raramente o paciente terá apenas um tipo de abuso ou
mau uso vocal. É mais freqüente haver uma combinação, ou seja,
o paciente que grita também fala excessivamente e com alta
velocidade. O grau de influência desses fatores sobre a voz é
bastante individual e deve ser pesquisado detalhadamente.
Investigação complementar
Na investigação complementar procura-se levantar uma série
de alterações que podem ter influenciado no estabelecimento do
quadro e podem estar contribuindo para a manutenção ou a
recorrência da disfonia. As principais alterações dizem respeito a
distúrbios alérgicos, faríngicos, bucais, nasais, otológicos, pulmo-
nares, digestivos, hormonais e neurovegetativos.
Antecedentes pessoais
Aqui são investigados estados mórbidos e tratamentos clíni-
cos ou cirúrgicos realizados anteriormente, quer estejam ou não
relacionados diretamente ao quadro vocal atual.
620 Fonoaudiologia Prática
Antecedentes familiares
A pesquisa dos antecedentes familiares pesquisa a ocorrên-
cia de distúrbios vocais em outros membros da família, podendo
evidenciar quadros familiares de inadaptações fônicas, altera-
ções estruturais mínimas ou malformações congênitas que fazem
com que membros de uma mesma família tenham um tipo de voz
semelhante. Outros distúrbios de comunicação na família (como
deficiência auditiva, por exemplo) também devem ser pesquisa-
dos, pois podem ser fatores desencadeantes do quadro vocal
apresentado pelo paciente.
Tratamentos anteriores
Não apenas os tipos de tratamentos já efetuados, mas tam-
bém os resultados obtidos devem ser investigados. No caso de
tratamentos fonaoudiológicos anteriormente realizados, pesqui-
sa-se a linha de trabalho, o tempo de tratamento, a motivação do
paciente e também os resultados obtidos.
Tipo de voz
O tipo de voz relaciona-se ao ajustes motores laríngeos e
ressonantais utilizados habitualmente pelo falante. Existem mais
de cinqüenta tipos de voz descritos na literatura (SONNINEN &
HURME, 1992), muitos dos quais são ambíguos ou imprecisos. Na
622 Fonoaudiologia Prática
Voz rouca
A voz rouca é a mais comum alteração vocal. É uma qualidade
vocal do tipo ruidosa, com altura e intensidade diminuídas e com
maior presença de ruído no sinal sonoro. Este tipo de voz está
geralmente relacionado a lesões orgânicas da laringe nas quais
há alteração do padrão vibratório da mucosa das pregas vocais,
como nódulos, pólipos, edemas ou mesmo neoplasias. É também
a voz típica da gripe.
Voz soprosa
Na voz soprosa há a presença de ar não-sonorizado durante a
emissão, representado por um ruído audível à fonação. Esta quali-
dade vocal está relacionada a disfonias hipocinéticas, quadros de
fadiga vocal, a certas inadaptações fônicas ou ainda a casos
neurológicos de paralisia vocal, miastenia gravis ou parkinsonismo.
Voz áspera
A voz áspera caracteriza-se por uma emissão rude e desagra-
dável, com grande esforço à fonação. Representa a rigidez da mucosa
das pregas vocais, comum em leucoplasias e retrações cicatriciais,
ou ainda em alterações estruturais mínimas do tipo sulco-estria.
Voz comprimida
É uma voz tensa e desagradável, caracterizada por vibração
restrita da mucosa das pregas vocais e contração exagerada do
vestíbulo laríngeo, tanto mediana como ântero-posterior.
Voz bitonal
A voz bitonal é caracterizada por dois diferentes sons com
qualidade vocal, altura e intensidade diversas. Ocorre em condi-
ções de diferença de nível, tensão ou tamanho entre as pregas
vocais, comuns nas paralisias do nervo laríngeo inferior, bem
como em irregularidades da mucosa da prega vocal, como a
depressão criada pelo sulco-estria.
Sistema de ressonância
O sistema de ressonância é o conjunto de elementos do
aparelho fonador que moldam e projetam o som no espaço. Este
conjunto de elementos é formado pelas caixas de ressonância, a
saber: pulmões, laringe, faringe, cavidade da boca, cavidade
nasal e seios paranasais.
Quando há equilíbrio da distribuição da ressonância nas
diferentes caixas de ressonância, diz-se que há uma voz de
ressonância difusa. Quando há o predomínio de determinada
Avaliação e Terapia de Voz 623
Características da emissão
Além do tipo de voz e da ressonância, é necessário analisar
determinados aspectos da emissão, como o ataque vocal, o pitch
e a loudness.
O ataque vocal corresponde ao disparo inicial do som laríngeo,
havendo três opções: ataque vocal isocrônico; ataque vocal aspirado
e ataque vocal brusco. O ataque vocal isocrônico, também chamado
suave ou normal, ocorre quando não há nem tensão nem perda de ar
excessivas, havendo uma sincronia entre o disparo de vibração das
pregas vocais e o início da expiração do ar. O ataque vocal brusco
corresponde a uma forte adução das pregas vocais em toda a sua
extensão, gerando o aumento da pressão aérea subglótica e o
afastamento brusco das pregas vocais ao início da emissão. O ataque
vocal brusco é uma característica freqüente nas disfonias
hiperfuncionais. O ataque vocal aspirado ocorre por uma coaptação
insuficiente das pregas vocais, com conseqüente escape de ar ao
início da fonação. Este tipo de ataque é comum às disfonias
hipofuncionais, como nos casos de paralisia de prega vocal e aos
casos de fendas hiperfuncionais fusiformes com retração de mucosa.
Pitch é o termo utilizado para o correlato psicoacústico da
freqüência fundamental. A freqüência fundamental é o parâmetro
acústico quantitativo que relaciona o número de ciclos glóticos
vibratórios por unidade de tempo – no caso, segundos. Quanto
maior a freqüência fundamental, ou seja, quanto mais ciclos
vibratórios por segundo, mais aguda é a voz; quanto menor a
freqüência fundamental, mais grave é a voz. Para a análise
perceptiva auditiva, faz-se uma avaliação qualitativa, consideran-
do-se o pitch adequado ao falante e à circunstância de comunica-
ção ou elevado ou ainda agravado.
Loudness é o correlato psicoacústico do parâmetro acústico
quantitativo de intensidade da voz. A intensidade da voz é o nível
de pressão sonora medida em valores numéricos de decibels. A
loudness é a avaliação qualitativa deste parâmetro, podendo uma
voz ter loudness adequada, reduzida ou elevada para o falante ou
para a situação de comunicação.
122,5 0%
0,4 Time (s) 2,9 0,4 Time (s) 2,9
Jitter (%) = 0,17 Mean F0 (Hz) = 124,52 Mean Period (ms) = 8,03
Shimmer (%) = 2,16 S.D. F0 (Hz) = 0,65 S.D. Period (ms) = 0,04
HNR (dB) = 24,42 Max. F0 (Hz) = 126,36 Mean Amp. (%) = 77,35
SNR (dB) = 24,44 Min. F0 (Hz) = 122,50 S.D. Amp. (%) = 9,21
NNE (dB) = –3,99 Mode F0 (Hz) = 124,53 F0 Tremor (Hz) = 2,96
(Glottal Noise) (Habitual Pitch) Amp Tremor (Hz) = 1,00
Comparison
–10
FIGURA 27.7 – Análise acústica de paciente com disfonia funcional por técnica incorreta (programa
computadorizado Dr. Speech Sciences, da TIGER ELETRONICS , de Seattle, EUA). Observe os parâme-
tros obtidos da análise da voz do paciente (em preto), sendo que os alterados apresentam valores que
vão além dos limites das barras brancas.
Avaliação e Terapia de Voz 627
pode trazer mais vantagens que outras, o que deve ser conside-
rado pelo terapeuta. A partir deste trabalho, BEHLAU & PONTES
(1995a) organizaram, para cada uma das filosofias de reabilitação
vocal, o foco da linha terapêutica em questão, sua premissa
básica, as vantagens e as possíveis críticas às orientações
propostas, apresentado a seguir.
Vantagens
• Eliminada a causa da disfonia, as chances de recidiva são
praticamente inexistentes.
• O paciente sente-se confortável porque vivencia o seu
tratamento embasado na eliminação da gênese do distúrbio.
Críticas
• Nem sempre pode-se eliminar ou até mesmo identificar a
causa de uma disfonia e mesmo assim há recursos para se
tratar o paciente.
• A relação causa-efeito não é necessariamente direta e
única.
• Muitas disfonias apresentam causa já inoperante, porém a
voz continua alterada por fixação funcional dos ajustes
motores inadequados.
Críticas
• Exige conhecimento profundo e amplo de diversas áreas
relacionadas à voz, comunicação, psicologia e medicina.
• Os terapeutas pouco experientes podem se sentir perdidos
ou com poucas condições de uma atuação satisfatória.
• O paciente pode se sentir bombardeado de procedimentos
pelas tentativas do terapeuta nas diversas facetas do pro-
blema.
• Questões peculiares a um caso podem ser colocadas num
segundo plano.
Sons facilitadores
O treinamento vocal propriamente dito utiliza uma série de
facilitadores da emissão, os chamados sons facilitadores, também
chamados de sons de apoio da emissão (BEHLAU & PONTES, 1990b).
Esses sons têm como objetivo propiciar um melhor equilíbrio funcio-
nal da produção vocal. Assim, para se chegar à normalização da
fonação, um mesmo som de apoio poderá ser utilizado tanto numa
disfonia hipercinética – que constitui a maioria dos quadros clínicos,
em média 85% das disfonias, – como num quadro hipocinético.
Apesar da emissão dos sons de apoio, por definição, propiciar uma
produção vocal equilibrada, para alguns pacientes certos sons não
funcionam desta forma, provocando ainda mais desequilíbrios e
tensões. Assim, devem ser realizadas provas terapêuticas que vão
dirigir a escolha das abordagens a serem utilizadas.
Avaliação e Terapia de Voz 635
Sons nasais
• Procedimento básico
sons “m”, “n” ou “nh” contínuos, sustentados, modulados
ou em escalas
• Efeitos esperados
suavização da emissão
redução do foco de ressonância laringofaríngeo
dissipação da energia sonora no trato vocal
aumenta os tempos máximos de fonação sem esforço
auxilia o monitoramento da voz
• Aplicação principal
universal da voz
laringe isométrica (fenda triangular médio-posterior)
nódulos vocais
Sons fricativos
• Procedimento básico
sons “f”, “s” ou “x” contínuos (ou seus correspondentes
sonoros)
ou em passagem de sonoridade, de som surdo para
sonoro, por exemplo, “s..” -> “z..” ou “x..” -> “j..”
• Efeitos esperados
direção de fluxo aéreo para o ambiente
dissociação entre a intensidade e o esforço laríngeo,
usando-se os sons sonoros
suavização do ataque vocal
aumento dos tempos máximos de fonação sem esforço
• Aplicação principal
pós-operatório imediato de lesões de massa
coordenação pneumofônica
Sons vibrantes
• Procedimento básico
vibração de língua: “rrr....” ou “trrrr....”, ou vibração de
lábios: “brrr....”, sustentadas, moduladas ou em escalas
musicais
• Efeitos esperados
mobilização da mucosa
redução do esforço fonatório
aquecimento vocal
• Aplicação principal
universal da voz
laringites agudas, gripes ou resfriados
nódulos
edema de Reinke
cicatrizes na mucosa
sulco vocal
636 Fonoaudiologia Prática
Sons plosivos
• Procedimento básico
emissão repetida de “p”, “t” ou “k” ou seus sonoros,
associados a vogais
• Efeitos esperados
coaptação das pregas vocais
clareza da emissão
• Aplicação principal
disfonias hipocinéticas
Parkinson
paralisia unilateral de prega vocal
pós-laringectomias parciais
Som basal
• Procedimento básico
emissão contínua em registro pulsátil, com “a” sustentado,
ou sílaba “lá” repetidas vezes
emissão na expiração ou inspiração, som produzido se-
melhante a “motor de barco”
• Efeitos esperados
grande contração do músculo tiroaritenóideo
relaxamento do músculo cricotireóideo
mobilização e relaxamento da mucosa
melhor coaptação glótica
fonação confortável após o exercício
• Aplicação principal
nódulos vocais
fadiga vocal
fenda triangular médio-posterior
fonação desconfortável
Sons hiperagudos
• Procedimento básico
emissão contínua em falsete
associar um sopro à emissão de um som hiperagudo, se
necessário
• Efeitos esperados
relaxamento do músculo tiroaritenóideo
contração do músculo cricotireóideo
emissão mais equilibrada em registro modal, após o exer-
cício
• Aplicação principal
disfonia vestibular
constrição medial do vestíbulo
paralisia unilateral de prega vocal
edema de Reinke
Avaliação e Terapia de Voz 637
• Efeitos esperados
redução da hipercontração da musculatura da cintura
escapular
• Aplicação principal
disfonias por tensão muscular
fenda triangular médio-posterior
hipertonicidade secundária a quadro orgânico de base
• Aplicação principal
disfonia por tensão muscular
falsete mutacional, de conversão ou paralítico
fendas diversas
• Efeitos esperados
suavização da emissão
eliminação da interferência das pregas vestibulares
subida da ressonância
• Aplicação principal
fonação vestibular
disfonias por tensão muscular
• Procedimento básico de emissão com cabeça e tronco para
baixo
dobrar o tronco (de pé ou sentado), emitir o som facilitador
selecionado enquanto se sobe o tronco
• Efeitos esperados
mucosa vibrando a favor da força da gravidade
dispersão de energia no trato vocal
afastamento das pregas vestibulares
• Aplicação principal
ressonância laringofaríngea
edema de Reinke
disfonia por pregas vestibulares
• Efeitos esperados
suavização de ataques vocais
redução da compressão medial das pregas vocais
aumento do tempo máximo de fonação
• Aplicação principal
disfonias por tensão muscular
nódulos de pregas vocais
disfonias hipercinéticas
remoção de compensações negativas nas paralisias
laríngeas
Técnica do bocejo
• Procedimento básico
inspirar profundamente e imitar um bocejo, com língua
baixa e anteriorizada, sonorizando-o com uma vogal
aberta
aproveitar também os bocejos naturais
642 Fonoaudiologia Prática
• Efeitos esperados
reduz ataques vocais bruscos
amplia o trato vocal
auxilia na projeção vocal
abaixa a laringe
amplia a faringe
sintoniza fonte e filtros de ressonância
• Aplicação principal
travamento articulatório
disfonias com foco ressonantal faríngeo ou laringofaríngeo
nódulos vocais
disfonia por tensão muscular
disfonia por pregas vestibulares
Método mastigatório
• Procedimento básico
mastigar ativamente, com a boca aberta e movimentos
amplos dos lábios, da língua e das bochechas, emitindo-
se uma grande variedade de sons, evitando-se um
monótono “iam iam iam...”
• Efeitos esperados
universal da voz
equilíbrio da qualidade vocal
redução de constrições inadequadas
aquecimento vocal
aumento de resistência vocal
• Aplicação principal
disfonias por tensão muscular
foco ressonantal baixo
aquecimento vocal
Avaliação e Terapia de Voz 643
• Efeitos esperados
efeito Lombard
supressão do monitoramento auditivo sobre a voz
aumento de monitoramento proprioceptivo
• Aplicação principal
diagnóstico diferencial entre psicogênicas e neurológicas
disfonias a afonias de conversão
disfonias hipocinéticas
controle de competição sonora em vozes profissionais
• Efeitos esperados
formação de um esquema corporal vocal
conscientização da emissão correta e incorreta da voz
• Aplicação principal
vozes profissionais
disfonias por técnica vocal deficiente
uso de voz em ambientes inóspitos
Técnica de sobrearticulação
• Procedimento básico
exagerar os movimentos fonoarticulatórios, com ampla
excursão muscular e grande abertura de boca
• Efeitos esperados
redução da hipertonicidade laríngea
maior volume e projeção vocal
aumento da precisão articulatória
• Aplicação principal
vozes profissionais
disfonias neurológicas (disartrias hipocinéticas, por exem-
plo, Parkinson)
maior volume e projeção
hipernasalidade
Fonação inspiratória
• Procedimento básico
esvaziar os pulmões e inspirar enquanto se emite a vogal
“i”, prolongada, seguida por vogal relaxada: “ihn”
inspiratório (oral ou nasal) “ah” relaxado
• Efeitos esperados
aproximação das pregas vocais
afastamento das pregas vestibulares
• Aplicação principal
fendas por paralisias e paresias das PPVV
fonação com pregas vestibulares
fonação ariepiglótica
remoção de disfonia psicogênica
alterações da muda vocal
Fonação sussurrada
• Procedimento básico
emissão de seqüências articulatórias, seqüências auto-
máticas e leitura de texto em voz sussurrada
Avaliação e Terapia de Voz 647
• Efeitos esperados
aproximação forçada da região anterior das pregas
vocais
• Aplicação principal
fechamento de fendas anteriores
granulomas e lesões de comissura posterior
Escalas musicais
• Procedimento básico
escalas, glissandos ascendentes e descendentes,
vocalises com sons facilitadores
escalas em stacatto
• Efeitos esperados
alongamento e encurtamento das PPVV
• Aplicação principal
fendas fusiformes
fendas triangulares em toda extensão
disfonias hipocinéticas
Técnicas de empuxe
• Procedimento básico
socos no ar, com os punhos cerrados e emissão de sílabas
com consoantes oclusivas sonoras
empurrar ou levantar pesos, associado à emissão sonora
mãos em gancho e emissão de vogais sustentadas
• Efeitos esperados
aproximação das estruturas laríngeas
socos no ar – aproximação inclui pregas vestibulares
mãos em gancho – adução mais firme das pregas vocais
na linha média
• Aplicação principal
paralisia unilateral de prega vocal
disfonias hipocinéticas
648 Fonoaudiologia Prática
FIGURA 27.8 – Imagem da laringe. Disfonia organofuncional, com nódulos vocais bilaterais, em uma
paciente infantil, em posição respiratória e fonatória.
Avaliação e Terapia de Voz 649
Exame otorrinolaringológico
O exame otorrinolaringológico específico para a avaliação da
laringe foi feito através da telelaringoscopia, com anestesia tópica,
e revelou a presença de nódulos vocais bilaterais, grandes, com
fenda triangular médio-posterior e constrição ântero-posterior à
fonação, configurando uma disfonia organofuncional. Demais
regiões: n.d.n.
Conduta do caso
O tratamento de eleição dessa paciente é a reabilitação vocal
cujo objetivo imediato é o uso saudável da voz e uma comunica-
ção mais efetiva. A terapia visa à redução dos nódulos e ao
fechamento da fenda glótica associado à retirada de mecanismos
compensatórios negativos. A modificação de gesto motor negati-
vo e o aprendizado de um novo comportamento vocal procura
também prevenir recidivas posteriores. Os exercícios foram sele-
cionados durante o processo terapêutico após prova terapêutica
positiva com cada um deles.
Os principais tópicos do planejamento terapêutico incluíram:
• Orientação sobre a produção da voz e higiene vocal, onde
procuramos informar o paciente sobre os mecanismos en-
volvidos na fonação, assim como cuidados básicos que
deveriam ser tomados.
• Orientação aos pais com o objetivo de incorporá-los ao
processo terapêutico, a partir de sua contribuição em casa
no que diz respeito à higiene vocal e realização dos exercí-
cios fonoaudiológicos juntamente com a paciente; procurou-
650 Fonoaudiologia Prática
Evolução terapêutica
A paciente apresentou boa evolução durante o processo tera-
pêutico, com melhora global da qualidade vocal e evidente redução
da soprosidade e eliminação das quebras de sonoridade, o que
indica melhor aproximação das pregas vocais durante a fonação. Os
tempos máximos de fonação dobraram (8s) e a relação s/z reduziu
a 1,4, o que reflete uma maior eficiência glótica. A paciente mostrou
boa colaboração durante o tratamento, mostrando ter desenvolvido
maior conscientização vocal, com redução dos abusos vocais. A
ressonância mostrou-se mais equilibrada e os ataques vocais
suaves, o que propiciou a reabsorção dos nódulos.
A paciente obteve melhora significativa da qualidade vocal,
não tendo sido necessária a remoção cirúrgica dos nódulos. O
processo total de reabilitação durou 7 meses.
Exame otorrinolaringológico
O exame otorrinolaringológico específico para a avaliação da
laringe foi realizado através da telelaringoscopia onde se diagnos-
ticou paralisia unilateral de prega vocal direita, em posição inter-
mediária, com fechamento glótico insuficiente, configurando uma
disfonia orgânica. A avaliação estroboscópica mostrou padrão
652 Fonoaudiologia Prática
Conduta do caso
O paciente foi inicialmente encaminhado à reabilitação vocal,
com o objetivo imediato de uso de uma voz menos disfônica na
vigência da paralisia, enquanto se busca uma compensação
funcional. A terapia procura compensar a paralisia através de
exercícios que propiciem uma emissão vocal mais equilibrada,
através de melhor coaptação glótica, redução do fluxo de ar
excessivo e aumentando-se a eficiência glótica.
Os principais tópicos do planejamento terapêuticos incluíram:
• Exercícios de coaptação glótica, com objetivo de promover
uma compensação da prega vocal sadia, que aproxima-se da
prega vocal paralisada, podendo gerar um mecanismo muito
próximo da normalidade. A técnica de deglutição incompleta
sonorizada foi a que apresentou os melhores resultados.
• Exercícios de flexibilidade vocal, com variação de freqüên-
cia e intensidade, para melhorar a biomecânica laríngea.
• Exercícios vibratórios a fim de estimular a vibração da túnica
mucosa e aumentar sua excursão lateral, o que contribui
para uma melhor coaptação das pregas vocais, além de
melhorar a qualidade vocal produzida.
• Exercícios de sobrearticulação e projeção vocal, com o
objetivo de aproveitar ao máximo as cavidades de ressonân-
cia para a obtenção de uma emissão mais eficiente, com o
menor esforço glótico possível.
• Redução da síndrome de tensão musculoesquelética, com
o objetivo de reduzir a tensão da musculatura extrínseca e
permitir que a laringe permaneça mais solta e relaxada, o
que facilita uma emissão mais eficiente.
• Melhor equilíbrio ressonantal a fim de facilitar a projeção
vocal e reduzir o esforço laríngeo.
Evolução terapêutica
O paciente passou a apresentar uma qualidade vocal ainda
rouca, embora com menos soprosidade, o que diminui a fadiga
vocal significativamente, havendo, portanto, melhoria na relação
s/z e conseqüente aumento da eficiência glótica. O padrão
articulatório mostrou-se mais definido, o que facilitou a projeção
vocal e melhorou a inteligibilidade da fala. Houve redução da
hipertonia cervical e melhora da coordenação pneumofonoar-
ticulatória, o que propiciou uma emissão mais eficiente.
O tempo de terapia fonoaudiológica foi de, aproximadamente,
quatro meses, com a compensação da paralisia pela prega vocal
sadia. O dado mais importante referido pelo paciente foi a redução
da fadiga vocal, possibilitando o retorno às suas atividades profis-
sionais.
Avaliação e Terapia de Voz 653
Exame otorrinolaringológico
O exame otorrinolaringológico específico da laringe foi realiza-
do através de telelaringoscopia e evidenciou uma inadaptação
vocal, com presença de microdiafragma laríngeo e fenda fusiforme
à fonação, configurando um quadro de disfonia funcional por
inadaptação vocal. A mucosa mostrou reduzida vibração de sua
túnica, à estroboscopia. Demais regiões: n.d.n.
654 Fonoaudiologia Prática
LRN – Telelaringoscopia
LRN – Pré-fono
LRN – Pós-fono
FIGURA 27.10 – Imagens da laringe. Disfonia funcional por inadaptação vocal, com microdiafragma
laríngeo e fenda fusiforme, pré e pós-reabilitação vocal. Observe na imagem superior, durante a
respiração, a presença do microdiafragma laríngeo; na imagem do meio observe a grande fenda glótica
à fonação e na imagem inferior perceba a maior aproximação das pregas vocais, com a conseqüente
redução da fenda glótica, após a reabilitação vocal.
Avaliação e Terapia de Voz 655
Conduta fonoaudiológica
A conduta do caso foi reabilitação vocal, com o objetivo de
melhoria da qualidade vocal e redução da freqüência fundamental
da voz através de exercícios que propiciem um aumento da
vibração de onda de mucosa, redução da fenda glótica e conse-
qüente aumento da eficiência vocal. A redução de mecanismos
compensatórios negativos, uma orientação completa e profunda
sobre o uso profissional da voz as possíveis limitações do paciente
foram também trabalhados em terapia.
Os principais tópicos do planejamento terapêutico incluíram:
• Orientação sobre o uso profissional da voz e higiene vocal.
Procuramos esclarecer ao paciente o mecanismo normal de
produção da voz, assim como identificar e reduzir possíveis
hábitos vocais que possam contribuir para uma piora do
quadro apresentado.
• O trabalho de orientação abordou a limitação vocal que o
paciente apresenta em função do diagnóstico médico.
• Exercícios vibratórios foram enfatizados a fim de ampliar a
vibração da túnica mucosa, na tentativa de reduzir a fenda glótica,
gerando uma qualidade vocal mais estável e menos soprosa.
• Técnica do /b:/ prolongado para abaixar a laringe no pesco-
ço, melhorar a coaptação das pregas vocais e reduzir a
freqüência fundamental.
• Hidratoterapia, ou seja, ingestão de cerca de 2 litros diários
de água foi altamente recomendado.
• Exercícios de ressonância foram realizados a fim de melho-
rar a eficiência glótica e reduzir tanto o esforço quanto a
tensão cervical.
• Exercícios de associação corpo-voz para melhorar a emis-
são global da voz.
Evolução terapêutica
O paciente apresentou melhora evidente da qualidade vocal, o
que pode ser observado na análise do traçado espectrográfico, o que
indica uma emissão menos soprosa, mais eficiente, estável e durável
(Fig. 27.11). O aumento nos tempos máximos de fonação de 8 para
14 segundos, e uma relação s/z mais próxima a 1 (relação s/z = 1,3)
também contribuíram para o melhor ajuste vocal. A freqüência
fundamental reduziu para 160 Hz, quase que no limite da emissão
masculina. Houve também melhora do padrão articulatório e um
melhor equilíbrio ressonantal, o que contribuiu para uma tonicidade
mais adequada das estruturas envolvidas. O melhor equilíbrio adqui-
rido mostrou-se também bastante evidente na avaliação laringológica.
O paciente obteve, assim, maior satisfação com sua voz, contribuindo,
inclusive, para um melhor rendimento profissional.
Apesar da melhora obtida na qualidade vocal, com maior
estabilidade e facilidade à emissão, não houve eliminação com-
pleta da disfonia. O período de reabilitação foi de cerca de 8
656 Fonoaudiologia Prática
FIGURA 27.11 – Traçado espectrográfico do paciente do Caso 3 (Fig. 27.10), pré e pós-reabilitação
vocal, onde se evidencia a melhoria obtida através de maior estabilidade no traçado espectrográfico
(programa computadorizado SOUNDSCOPE, da G.W. INSTRUMENTS, de Boston, EUA).
Avaliação e Terapia de Voz 657
COMENTÁRIO FINAL
Todo o indivíduo que vai se submeter a um processo de
reabilitação vocal, ou mesmo a um trabalho de desenvolvimen-
to de voz falada ou cantada profissional, deveria passar por
uma avaliação fonoaudiológica e otorrinolaringológica deta-
lhada.
Os dados desta avaliação não devem ser considerados
como uma realidade estática, mas sim, como um subsídio para
o tratamento, no caso de um paciente com disfonia, ou para o
controle da anatomofisiologia, no caso de indivíduos normais
que serão submetidos a um processo de transformação vocal
para a fala ou para o canto profissionais. Nem sempre os dados
permitem ter um diagnóstico preciso, o que dará maiores subsí-
dios ao atendimento fonoaudiológico, porém, pode-se trabalhar
nos casos de dúvida diagnóstica e até mesmo de ausência de
diagnóstico formado, desde que se compreenda a atuação
exploratória como um procedimento excepcional e de curta
duração e que, muitas vezes, apresenta finalidade diagnóstica
e de avaliação do próprio caso.
Além disso, quando o tratamento proposto é a reabilitação
vocal, é importante procurar oferecer ao paciente um atendi-
mento abrangente que inclua a orientação, a psicodinâmica e o
treinamento vocal. Quando consideramos o treinamento vocal
como trabalho direto e o trabalho de base (representado pela
orientação e pela psicodinâmica) como indireto, não escalonamos
a importância de um sobre o outro e sim, identificamos como
direto aquele trabalho que atua sobre o indivíduo, na relação
psicossocial no momento e situação da comunicação. Acredita-
mos que ambos os trabalhos devem ser realizados no tratamen-
to das disfonias, pois o treinamento vocal por si só não garante
ao indivíduo o uso automatizado do ajuste motor conseguido
durante os exercícios. Da mesma forma, o trabalho de funda-
mento sozinho não leva à mudança do comportamento vocal.
Acreditamos, no entanto, que a associação de orientação,
psicodinâmica e treinamento vocais oferece as melhores condi-
ções para a transferência do comportamento em terapia para a
vida diária.
Muitos pacientes terão alta fonoaudiológica com uma voz
que pode ser considerada normal, outros com a melhor voz
possível e, ainda outros indivíduos terão sua produção vocal
sob controle, porém, serão passíveis a episódios de disfonia,
seja por traços de personalidade ou questões idiossincrási-
cas, seja por aspectos anatomofuncionais; nessa última situa-
ção, ensinar o paciente a lidar com sua própria voz e a
melhorar sua produção vocal, mesmo nas situações de disfonia,
pode ser o grande objetivo da atuação fonoaudiológica.
658 Fonoaudiologia Prática
Leitura recomendada
ARONSON, A.E. – Clinical Voice Disorders. 3ª ed. New York, Thième-
Stratton, 1990.
BEHLAU, M. – Considerações sobre a análise acústica em laboratórios
computadorizados de voz. In: ARAÚJO, R.B.; PRACOWNIK, A.;
SOARES, L. Fonoaudiologia Atual. Rio de Janeiro, Revinter, 1996.
pp. 93-115.
BEHLAU, M. & PONTES, P.A. – Avaliação Global de Voz. São Paulo,
EPPM, 1990a.
BEHLAU, M. & PONTES, P. – Princípios de Reabilitação Vocal nas
Disfonias. 2ª ed. São Paulo, EPPM, 1990b.
BEHLAU, M. & PONTES, P. – Avaliação e Tratamento das Disfonias.
São Paulo, Lovise, 1995a. 312pp.
BEHLAU, M. & PONTES, P. – Disfonias psicogênicas. In: FERREIRA,
L.P. Um Pouco de Nós Sobre Voz . Barueri, Pró-Fono, 1992.
BEHLAU, M. & PONTES, P. – Proposta de índice de disfonia a partir de
escala perceptual. In: ANAIS do 3º Congresso Brasileiro de
Laringologia e Voz e 1º Encontro Brasileiro de Canto. Rio de Janeiro,
1995b. 36pp.
BERNSTEIN, L. & BERNSTEIN, R.S. – Interviewing, a Guide for Health
Professionals. East Norwalk, Appleton – Langue, 1985.
BOONE, D. & McFARLANE, S. – The Voice and Voice Therapy. 4ª ed.
Englewood Cliffs, Prentice Hall, 1988.
CASPER, J.K.; BREWER, D.W.; COLTON, R.H. – Variations in normal
human laryngeal anatomy and phisiology as viewed fiberscopically.
J. Voice, 1:180-185, 1987.
COLTON, R.H. & CASPER, J.K.- Understanding Voice Problems. A
Physiological Perspective for Diagnosis and Treatment. Baltimore,
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FEX, S. – Perceptual evaluation. J. Voice, 6:155-158, 1992.
ISSHIKI, N.; OKAMURA, M.; TANABE, M.; MORIMOTO, M. – Differential
diagnosis of hoarseness. Folia Phoniatr. (Basel), 21:9-23, 1969.
SONNINEN, A. & HURME, P. – On terminology of voice research. J.
Voice, 6:188-193, 1992.
STEMPLE, J.C. – Principles of voice therapy. In: STEMPLE, J. Voice
Therapy. Clinical Studies. St. Louis, Mosby, 1993. pp. 1-7.
ZIEMER, R. – Mitologia pessoal e padrões de comunicação. Dist.
Comunic., 6:1-5, 1993.
Trabalho Corporal no Atendimento ao Disfônico 659
28
Trabalho Corporal no
Atendimento ao Disfônico
INTRODUÇÃO
a) A voz é som
A observação tem mostrado que o som vocal acontece em
função de uma vibração das pregas vocais, proveniente de uma
ação comandada ou não pelo sujeito. Esta ação implica um
movimento de energia. Entende-se o conceito de energia como:
“ 1. maneira como se exerce uma força; 2. vigor; 3. Aristóteles:
o exercício da atividade em oposição à potência da atividade; 4.
propriedade de um sistema que lhe permite realizar trabalho.
Pode ter várias formas: calorífica, cinética, elétrica, eletromag-
nética, mecânica, potencial, química, radiante; transformáveis
umas nas outras, e cada uma capaz de provocar fenômenos
bem determinados e característicos nos sistemas físicos. A
energia não pode ser criada, apenas transformada” (AURÉLIO ,
1986, p. 650).
Fazendo-se uma comparação da voz com a música, pode-se
notar as semelhanças ao descrevê-las: qualidade-timbre, tons-
altura, ritmo, extensão, entonação-melodia, ressonâncias, ata-
ques e intensidade. A voz é a música no ser humano.
Para se obter uma música de boa qualidade faz-se necessá-
rio um instrumento de boa constituição-construção e afinado,
além de um músico com ouvido bem desenvolvido para tocá-lo.
E para se obter uma voz de boa qualidade, o que é necessário?
É fundamental um instrumento, isto é, um corpo com vitalidade e
flexibilidade, um falante com um “ouvido” bem desenvolvido e uma
postura (interna) para conduzir os sons com determinação e poder,
atendendo às suas necessidades e/ou desejos. Sem essas condi-
ções, pode-se dizer que há uma disfonia funcional, onde o indivíduo
está submetido a fatores diversos, que impedem a plena utilização
do seu potencial vocal.
662 Fonoaudiologia Prática
c) A disfonia é um sintoma
É um resultado. É fim de um processo. Assim como qualquer
sintoma foi a solução “encontrada” pelo corpo para dar conta de
uma dinâmica, que de certa forma não pôde ser percebida, tratada
ou cuidada. Que dinâmica é esta?
Assim como a neurose é um sintoma de uma série de conflitos
inconscientes, a disfonia essencialmente é um sintoma de uma
série de bloqueios energéticos. O que se pretende, então, não é
tratar de um resultado, propondo-se um outro resultado. Conti-
nuando com a comparação, seria como pedir a um neurótico que
deixe de se comportar de uma maneira para se comportar de outra
(NOGUEIRA , Supervisão Clínica). Isto pode ter eficiência, apresen-
tar alterações rápidas, mas não se harmonizam com a natureza
do fenômeno. Pretende-se que a terapia fonoaudiológica vá além
da correção de padrões corporais e fonatórios inadequados e
busque uma profundidade maior em sua interferência, procurando
transformar a estrutura e a dinâmica destes padrões. Deve-se
lembrar que as defesas psíquicas e as “defesas-corporais-
sintomas” visam preservar a vida e, portanto, não podem ser
tratadas simplesmente como inadequações ou comportamentos
passíveis de mudança consciente, bastando vontade.
Realizado o diagnóstico, volta-se a atenção para a dissolução
dos impedimentos possíveis (ao nível do corpo e da percepção
corporal) e o despertar da vontade do indivíduo de comandar
novamente esta força inata, a voz, para suas necessidades. A
imagem de um cavaleiro que aprende a dominar um cavalo pode
aqui ser utilizada.
Outra comparação que pode ser feita para favorecer a com-
preensão é visualizar a figura de um maestro regendo uma
orquestra. Se o maestro (indivíduo) não souber conduzir com
precisão e determinação, a orquestra (sons) se perde. É assim
que se vêem as distorções da voz: perde-se a altura, a ressonân-
cia, a intensidade e o indivíduo fica submetido aos fatores que não
pode controlar.
O fonoaudiólogo não se ocupando apenas com o resultado
mas com o processo de redescoberta do paciente, pode se libertar
da necessidade de estabelecer regras e condutas que interferem
diretamente no problema; assim ocupa-se em estabelecer um
clima de tranqüilidade diante dos “erros” no comportamento e
produção vocal, confiando que mudanças possam ocorrer natu-
ralmente, à medida que se vão conhecendo os fatores envolvidos
no processo.
664 Fonoaudiologia Prática
O que é energia?
O prólogo do livro de GERDA BOYESEN, na obra “Entre Psiquê
e Soma” (1985), traz um pensamento que expressa uma verdade:
“Antes da fotografia Kirlian e as descobertas científicas russas
sobre a Energia Bioplasmática, eu não teria ousado apresentar
este livro ao público ou utilizar o conceito de “Energia”. A “energia
vital” hoje é um conceito científico e é o tema central deste livro”
(p.18).
666 Fonoaudiologia Prática
Níveis de energia
A energia é a força motriz e primordial. Ela se organiza em
níveis de densificação da matéria viva, numa escala que inclui
do mais sutil (energético) ao mais denso (somático). Existem no
organismo humano cinco níveis diferentes, estabelecidos con-
forme as funções que desempenham.
670 Fonoaudiologia Prática
1. Do-in
O Do-in é uma técnica oriental de automassagem. “Presume-
se que o Do-in tenha surgido há cinco mil anos, na China, durante
o reinado de Huang Ti, o lendário Imperador Amarelo, considera-
do o pai da Acupuntura e o formulador de toda a Medicina
Chinesa” (LANGRE, 1995, p.7).
Para se compreender a proposta de trabalho de automassagem
e massagem de Do-in, é preciso esclarecer:
Trabalho Corporal no Atendimento ao Disfônico 671
O uso do Do-in
Não se pretende utilizar o Do-in como técnica diagnóstica de
sintomas e nem curativa. O propósito de incluir a automassagem
na terapia é aumentar a vitalidade do paciente, através da prática
diária de ativar os pontos, possibilitando um fluxo de energia mais
eficaz até os órgãos e impulsionando a circulação de energia que
está ou poderá estar estagnada na região subcutânea do corpo.
De acordo com a minha experiência, os disfônicos apresen-
tam, geralmente, um excesso de energia estagnada nos meridianos
ligados aos órgãos que tem a função de controle, tanto emocional
como físico, isto é, nos meridianos do Pulmão e do Intestino
Grosso e da Vesícula Biliar e Fígado.
A presença de pontos doloridos ao longo dos meridianos
revela excesso de energia e a pressão, contínua e profunda, com
a polpa dos polegares, pode dissipar (sedar) a energia. Quando
existe alguma deficiência energética, é necessário tonificar o
ponto, aplicando-se pressões superficiais, rápidas, leves e repe-
tidas com as pontas dos dedos (LANGRE, 1995).
Utiliza-se a técnica de automassagem, composta de uma
série de movimentos da mão sobre o corpo, numa certa seqüên-
672 Fonoaudiologia Prática
2. Shiatsu e alongamento
O shiatsu é uma massagem de origem japonesa, que se
realiza através da pressão (atsu) com a polpa dos dedos (shi ),
especialmente dos polegares e da região tenar e hipotenar das
mãos, sobre os músculos ao longo do corpo. No shiatsu procura-
se “seduzir” o corpo do paciente ao relaxamento (PRADIPTO,
1986).
A aplicação da pressão à superfície do corpo, de uma maneira
gradual e rítmica, tem como objetivo relaxar os músculos e torná-
los flexíveis. Durante e/ou depois de sua aplicação podem surgir
descargas emocionais, de uma forma natural, de acordo com a
condição do indivíduo. Para que o shiatsu seja eficaz não é
necessário e nem é objetivo provocar descargas emocionais. Elas
podem ou não acontecer.
Ao fazer um toque de shiatsu não se está consciente da pele
e músculos, mas da energia ali contida. Tal percepção é um
desenvolvimento de quem pratica esta técnica. O efeito do shiatsu
está ao nível muscular e subcutâneo. Observa-se, também, um
efeito ao nível do metabolismo celular, pois a tensão e a fadiga
impedem que a nutrição das fibras musculares se dê de maneira
satisfatória.
O alongamento, como o próprio nome expressa, se refere ao
ato de estender os músculos numa certa medida, favorecendo o
aumento da flexibilidade e elasticidade. A função do músculo é
propiciar o movimento dos ossos e do ser humano como um todo
Trabalho Corporal no Atendimento ao Disfônico 673
3. Exercícios psicocalistênicos
Psicocalistenia significa relaxamento psíquico. A série de
exercícios, proposta por M. LUIZA A. SIMÕES, na prática de seus
cursos, tem como propósito levar o indivíduo a um relaxamento
psicofísico, associando movimentos corporais com movimentos
respiratórios. É utilizada em trabalhos de sensibilização em gru-
pos, na área principalmente da psicologia.
Utiliza-se esta série de exercícios, adaptados para a terapia de
voz, com o objetivo de despertar no indivíduo a percepção e a
consciência corporal, no que se refere ao ato da respiração.
Mostra-se ao paciente, através da experiência, que respirar não é
simplesmente colocar o ar para dentro e para fora dos pulmões
(ventilar). Esse é o primeiro contato que o paciente tem com o
“trabalho” com a respiração. Nos exercícios, dá-se ênfase ao
trabalho com as articulações, principalmente a dos ombros, que
retêm grande quantidade de energia e que impedem os movimen-
tos naturais dos braços.
Nesta abordagem, não se trabalha a respiração de uma
maneira isolada, mas sempre associada a movimentos com o
corpo, isto é, estabelece-se a relação: respiração-movimento
corporal. Cuida-se para que o exercício não seja realizado como
ginástica, sendo que o que vai diferir é o despertar da consciência
do paciente ao movimento respiratório.
Pretende-se que o paciente perceba como acontece sua
respiração, toda a tensão envolvida e que impede que o movimen-
to respiratório seja lento e tranqüilo. O principal objetivo é desen-
volver no paciente a habilidade de perceber e soltar o corpo,
“deixando-se levar” pelo ar. Orienta-se que o ar “deve” levar o
movimento corporal e não que ele seja levado pelo sujeito com
Trabalho Corporal no Atendimento ao Disfônico 675
4. Tai-chi-chuan
A experiência com a prática de tai-chi-chuan mostra que a sua
filosofia e objetivo casam, perfeitamente, com um dos objetivos da
terapia de voz: a percepção do ato de respirar e a associação
deste ao movimento do corpo. A respiração profunda, tranqüila,
provoca um aumento na capacidade vital e é determinante princi-
pal da emissão vocal.
“Tai” significa homem centrado (integrado); “chi”, extremos, os
pólos, ou a eterna luta do homem entre o pensamento (céu) e a
ação (terra); “chuan”, forma, punho, uma mão, a arte de lutar.
Pode-se dizer que tai-chi-chuan, significa a seqüência de movi-
mentos usados para a defesa, ou ainda, o desenvolvimento de
atitudes e atos que contribuem para que o homem conviva e se
defenda (num sentido positivo, de preservação) na dinâmica da
vida (HUANG, 1979). Pretende-se desenvolver no indivíduo uma
atitude de aceitação do limite, para superá-lo.
Citar-se-ão alguns aspectos importantes do tai-chi (não do tai-
chi-chuan, pois a proposta de luta, “chuan”, não está incluída
nesta abordagem) considerados por HUANG (1979):
a) Enfatiza um sistema respiratório contínuo e circular; isto
significa que não paramos de expirar para podermos inspirar e
vice-versa. A expiração é o começo da inspiração e a esta segue-
se, sem interferência, uma nova expiração. Diferentemente de
outros exercícios, o que vale não é a contagem ou correção dos
mesmos, mas que se desenvolva a atenção do indivíduo à
dinâmica do movimento como um todo.
b) Envolve a perspectiva da aceitação, da tolerância, do
incluir, e não a rejeição e divisão, tão comuns em nossas atitudes
mentais, expressadas no corpo através de tensões excessivas.
676 Fonoaudiologia Prática
5. Massagem integrativa
A massagem integrativa, desenvolvida pela Profª AGNES
GEÖCZE, refere-se à técnica que envolve um trabalho minucioso
ao nível muscular, utilizando-se de manobras específicas.
A massagem integrativa, como o próprio nome sugere, busca
desenvolver no indivíduo a consciência do corpo como uma
unidade, um conjunto. Proporciona um relaxamento profundo e
também promove uma movimentação dos líquidos do corpo
evitando que a estase se instale. Dependendo da habilidade do
terapeuta, o indivíduo poderá vivenciar um contato mais natural
com a vida emocional.
Na prática clínica, os pacientes têm demonstrado preferên-
cia por essa técnica, pois elimina ou diminui as dores muscula-
res que apresentam, e também, por ser uma experiência
gratificadora e que leva a um intenso relaxamento. Pode-se
associar a massagem ao shiatsu, à reflexologia, à drenagem
linfática trazendo benefícios quantitativos e qualitativos à emis-
são vocal.
O que se pretende é utilizar o recurso poderoso da massagem
na terapia, durante um certo tempo, se esta for selecionada como a
mais indicada técnica corporal para o paciente, com o objetivo de
“afrouxar” a couraça muscular, como citado anteriormente. Muitas
vezes, o paciente percebe os benefícios e até pede indicação de
massagista, que poderá contribuir paralelamente à terapia de voz.
Utiliza-se a massagem, dentro do processo terapêutico, com
critérios e limites, pois o meu “olhar” fonoaudiológico, que tem
como meta recuperar a voz, não deve se perder.
Todo trabalho com o corpo deve ter um sentido interno para
quem o faz, não podendo ser realizado ancorado num sentimento
de dever e obrigação, o que estaria em total desarmonia com a
proposta do trabalho.
A massagem é um toque que envolve os aspectos da sensua-
lidade e sexualidade e, portanto, se torna intimista e sensorial. As
mãos vão se moldando ao corpo da outra pessoa. Qualquer
indivíduo que se dispõe a trabalhar com massagem necessita
compreender a própria sexualidade e não reprimi-la, mas ser
capaz de aceitar seus sentimentos sexuais e se relacionar com
eles harmonicamente. Caso contrário não se sentirá livre física e
psicologicamente para exercer uma massagem (PRADIPTO , 1986).
As principais manobras utilizadas na massagem são: desliza-
mentos; massagens circulares com os dedos; amassamentos;
pressões fortes e suaves com mãos, punhos e dedos; torção nos
músculos; alongamentos; movimentos nas articulações; puxamentos;
rolamentos e manobras de drenagem (DOWING, 1987).
As áreas são divididas em: cabeça e pescoço; tórax e estôma-
go; abdômen; braços e mãos; pernas e pés; nádegas e costas.
Elas podem ser trabalhadas associadas ou isoladas, conforme o
comprometimento do paciente observado na avaliação corporal.
678 Fonoaudiologia Prática
6. Técnicas de relaxamento
Segundo SANDÖR (1974, p. 4): “O relaxamento é um método
de recondicionamento psicofisiológico. Há muitas técnicas exis-
tentes e hoje são bastante utilizadas na área da psicoterapia,
fonoaudiologia, medicina e várias especialidades como terapia
ocupacional, fisioterapia, pedagogia, assistência social, nas belas
artes, teatro, esportes, e na vida religiosa.” É uma prática que se
ancora no fenômeno tensão- descontração. “O relaxamento propi-
cia a libertação de energias até então amarradas, retidas ou não
usadas” (SANTIS, 1974, p.19).
Considerando que o relaxamento é um recondicionamento
psicofisiológico, as possíveis transformações que ocorrem, como
conseqüência do uso das técnicas, possibilitam ao paciente um
contato mais próximo com os conteúdos mentais (sonhos, dese-
jos, fantasias, conflitos, etc.). Durante a terapia, muitas vezes, o
paciente busca a compreensão destes conteúdos e é importante
que o fonoaudiólogo tenha uma atitude acolhedora, não-inter-
pretativa ou repressora, aproveitando a oportunidade para lhe
apontar que são aspectos relacionados à vida interna e que
necessitam ser esclarecidos de maneira lenta e trabalhosa, po-
dendo ser auxiliado por um psicanalista ou psicólogo. Pode-se
abrir um espaço rico para a autopercepção. As técnicas devem,
portanto, ser utilizadas com muito critério e observação das
reações positivas e negativas do paciente.
Na prática clínica, as técnicas de relaxamento que mais têm
apresentado resultados no atendimento de disfônicos, têm sido
Calatonia e Treinamento Autógeno de Schultz. Ambas são utiliza-
das freqüentemente em psicoterapias de orientação Junguiana.
Tanto a Calatonia como o Treinamento Autógeno requerem a
colaboração do paciente, no sentido de um “treino” fora da sessão
terapêutica. Sabe-se o quanto isto é difícil na maioria dos casos,
onde as questões práticas da vida tomam um lugar prioritário.
Com o tempo, o paciente poderá assumir a responsabilidade de
participar ativamente do seu processo.
Calatonia
Calatonia significa tono descontraído, soltura, deixar-se ir
(SANDÖR, 1974). É uma técnica, geralmente aprendida pelo fo-
noaudiólogo em sua formação. A sua aplicação se faz utilizando
toques extremamente sutis, monótonos, tendo a duração de 3min
Trabalho Corporal no Atendimento ao Disfônico 679
cada um, podendo ser realizados na área dos pés e das mãos. Na
região dos pés, aplicam-se os toques na polpa dos dedos, na sola
dos pés, no calcanhar e na convergência tendinosa do tríceps
sural da região posterior da perna.
A experiência tem mostrado que com o trabalho na área dos
pés obtêm-se melhores resultados, principalmente quando asso-
ciado à música suave durante a aplicação, favorecendo bastante
o relaxamento e a interiorização.
Indica-se a calatonia aos pacientes que já estejam em proces-
so terapêutico, pois sendo uma técnica bastante monótona, pode
despertar muita ansiedade. Não se pode deixar de reconhecer
que é uma técnica monótona também para o terapeuta e havendo
intolerância ao silêncio, à lentidão, não é recomendada uma vez
que a ansiedade do terapeuta pode interferir na sua aplicação.
7. Outras técnicas
Além dessas técnicas descritas, pode-se utilizar outras, a
saber: Tui-Ná (massagem chinesa), Técnica da Polaridade, ma-
nobras básicas de Quiropatia, Reflexologia Podal, Drenagem
linfática e exercícios de Kum-Nyê.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
“No amor, há muito pouco descanso.”
(GEOFFREY CANCER)
Pretende-se que este trabalho seja uma contribuição ao
fonoaudiólogo e profissionais afins, quanto à ampliação da com-
preensão dos fatores envolvidos na produção vocal.
Espera-se que o fonoaudiólogo possa atuar de maneira mais
tranqüila e confiante no que se refere à aplicação das técnicas
corporais que conheça ou que possa vir a conhecer, sabendo que
não são apenas elas, mas o modo de aplicá-las que é o determi-
nante da eficácia do trabalho.
As relações entre o corpo-mente e a voz quando considera-
das de maneira cuidadosa, podem contribuir para diminuir as
rescidivas.
É importante frisar que a medida que a percepção e condição
corporal vão se desenvolvendo associadas ao desenvolvimento
da percepção auditiva, pode-se criar um feedback muito efetivo,
como nos distúrbios articulatórios, onde o paciente, mesmo em
momentos de muito estresse poderá utilizar os seus recursos,
pois a vivência consciente auxilia neste processo.
O fonoaudiólogo não se confunde com o massagista, o psicote-
rapeuta corporal ou o professor de tai-chi; utiliza-se destas técnicas
sempre atento para a sua meta. O que é necessário é desenvolver
um “olho” para ver o corpo, avaliar e determinar a técnica ou técnicas
a serem utilizadas com cada paciente, por quanto tempo, e também
encaminhar quando for necessário a terapeutas específicos.
A quantidade de técnicas é útil dado o fato de que os bloqueios
energéticos podem estar nos vários níveis, requerendo uma técnica
específica.
Deseja-se enfatizar que a experiência deverá ser sempre a
nossa mestra e que o espírito investigador sempre seja alimentado.
Compreender o ser humano em suas inúmeras formas de
expressão não é tarefa fácil; exige muita dedicação.
RESUMO
A autora, inicialmente, descreve como a busca de uma com-
preensão mais ampla sobre a voz se fez necessária na sua prática
fonoaudiológica.
Trabalho Corporal no Atendimento ao Disfônico 681
Leitura recomendada
AMARAL, S. – Chi-kun. São Paulo, Summus, 1984.
ANDERSON, B. – Alongue-se. São Paulo, Summus, 1983.
BASTOS, S.R.C. – O Livro do Shiatsu. São Paulo, Ground, 1982.
BOYESEN, G. – Cadernos de Psicologia Biodinâmica. nos 1,2 e 3, São
Paulo, Summus, 1983.
BOYESEN, G. – Entre Psiquê e Soma. São Paulo, Summus, 1985.
CANÇADO, J. – Do-In Para Crianças. São Paulo, Ground, 1990.
CZECHOROWSKI, H. – Massagens. Lisboa, Editora Presença, 1981.
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682 Fonoaudiologia Prática
29
Avaliação e Terapia de
Voz nas Disfonias
Neurológicas
INTRODUÇÃO
REVISÃO
O termo “disartria” originou-se do grego “dys” + “arthroun”, que
significa “a inabilidade para articular distintamente”. Na fonoau-
diologia, “disartria” é definida como “um grupo de distúrbios da fala
resultante de uma lesão no mecanismo neurológico (central e/ou
periférica) que regula os movimentos da fala, caracterizado por
lentidão, fraqueza, imprecisão e/ou incoordenação” (YORKSTON e
cols., 1988).
A revisão dos distúrbios laríngeos fonatórios observados nas
disfonias neurológicas será baseada nos estudos realizados por
DARLEY e cols., em 1975, na Mayo Clinic, nos quais foram avaliadas
características perceptuais da fala em grupos de indivíduos
disártricos. Concomitantemente, será considerada a adaptação
feita por ARONSON, em 1980, sobre o estudo feito anteriormente. Tal
opção deve-se ao fato de serem estudos clássicos e por ainda
serem usados nos dias de hoje como base no diagnóstico diferencial
clínico entre as disartrias.
Não será possível, neste trabalho, fazer uma revisão de todos
os tipos de disartrias, como por exemplo, as disartrias congênitas.
A disfonia espástica e a paralisia periférica de pregas vocais
também não serão incluídas. Tais distúrbios foram revistos com
detalhes em outros estudos (ARONSON , 1980; PRATER & SWIFT,
1984; YORKSTON e cols., 1988).
As características perceptuais e físicas das disfonias neuroló-
gicas serão apresentadas a seguir:
Disartria flácida
Normalmente observada em pacientes que apresentam o qua-
dro neurológico denominado paralisia bulbar, com lesões no neurô-
nio motor periférico, afetando os nervos cranianos (V, VII, IX, X, XII).
Como o assunto discutido neste capítulo refere-se à voz, serão
comentadas apenas as lesões do nervo vago, que afetam vários
órgãos importantes na produção da fala, incluindo véu, faringe e
músculos laríngeos intrínsecos (ARONSON, 1980; PRATER & SWIFT,
1984). As lesões podem ser unilaterais ou bilaterais.
As principais características perceptuais na disartria flácida,
relacionadas à produção da voz são: qualidade vocal soprosa,
rouquidão, loudness (sensação psicofísica relacionada à intensida-
de) reduzida, pitch (sensação psicofísica relacionada à freqüência)
grave, tosse fraca, hipernasalidade, vocal fry (voz com uso do
registro em freqüência mais grave da tessitura do P, ou próxima da
mesma) em alguns casos.
A disartria flácida é comumente observada nos distúrbios
devido a trauma craniano, distúrbios vasculares, miastenia
grave, síndrome Guillain-Barré, esclerose lateral amiotrófica
(ELA) com predomínio de forma flácida, e esclerose múltipla
(YORKSTON e cols., 1988).
Avaliação e Terapia de Voz nas Disfonias Neurológicas 685
Disartria hipocinética
Comumente observada no parkinsonismo, é um distúrbio do
sistema extrapiramidal, geralmente progressivo e degenerativo.
A clássica descrição da fala destes pacientes consiste em
loudness reduzida, voz monótona, qualidade vocal rouca ou
aspirada, pitch grave, imprecisão articulatória, redução na tessitura
da voz falada e alterações de fluência (RAMIG & GOULD, 1986;
HARADA, 1987; BEHLAU & HARADA, 1988; SMITH & RAMIG, 1994;
DROMEY e cols., 1995); incoordenação laríngea.
Distúrbios da fonação são comuns, podendo ocorrer em
porcentagens elevadas, chegando a 89% dos pacientes
parkinsonianos.
O aspecto físico das pregas vocais pode parecer normal em
sua aparência (ARONSON, 1980), mas a adução incompleta é um
dado comumente observado (RAMIG & GOULD, 1986; BEHLAU &
HARADA, 1988).
HARTMAN & ABBS (1988) relatam que similarmente, a disartria
hipocinética pode ser observada na disartria mista de atrofia de
múltiplos sistemas (síndrome de Shy-Drager); síndrome neurológica
associada a distúrbio hepático (doença de Wilson); paralisia
supranuclear progressiva (síndrome de Steele-Richardson-Olszewski).
Disartria hipercinética
Coréia
Distúrbio neuromotor caracterizado por movimentos rápidos,
desordenados e amplos, causados por lesões no gânglio basal.
Diferentes formas de coréia incluem:
686 Fonoaudiologia Prática
Distonia
O termo refere-se à manutenção persistente de postura devi-
do ao tônus muscular exagerado, o qual piora com o estresse,
varia com mudanças na postura e desaparece durante o sono.
Quando manifestada na idade adulta, parece haver uma tendên-
cia em ser focal, como por exemplo, torcicolo espasmódico
(G RIFFITHS & BOUGH, 1989).
Observam-se ritmo lento, mudanças na qualidade vocal es-
trangulada-rouca, soprosidade, excesso de variação de loudness,
quebras de voz na fala espontânea, monoloudness, monopitch,
falta de tonicidade.
ARONSON (1980) refere que estudos dos aspectos físicos não
têm sido estudados com detalhes. GRIFFITHS & BOUGH (1989)
observaram hiperadução de pregas vocais.
Mioclonia palatofaringolaríngea
Mioclonia é um distúrbio de movimento abrupto e de curta
duração; é uma forma de tremor lento, resultando em movimentos
Avaliação e Terapia de Voz nas Disfonias Neurológicas 687
Disartria atáxica
O cerebelo é freqüentemente considerado o modulador dos
movimentos iniciados em outras partes do Sistema Nervoso
Central e também exerce influência no tônus muscular (HARTMAN,
1984; GRIFFTHS & BOUGH, 1989).
As características perceptuais envolvem qualidade vocal ás-
pera, monopitch, monoloudness, entoação monótona ou excessi-
va, excesso de loudness assistemático, tremor vocal.
As características físicas parecem normais na estrutura e
função (ARONSON, 1980) ou pode-se observar hipotonia da mus-
culatura laríngea (G RIFFITHS & BOUGH, 1989).
Disartria mista
Lesões envolvendo múltiplas áreas do Sistema Nervoso Pe-
riférico e/ou Central podem resultar em vários graus e tipos de
disartria (HARTMAN, 1984; SMITH & RAMIG, 1994).
Doença de Wilson
Degeneração hepatolenticular, ocasionada por erros no meta-
bolismo do cobre, de natureza hereditária.
Observa-se a disartria espástica-atáxica-hipocinética envol-
vendo lesões degenerativas no corpo estriado, cerebelo, substân-
cia negra e o próprio córtex cerebral.
As características fonatórias incluem aspereza, qualidade
tensa-estrangulada, pitch grave, hipernasalidade, monopitch e
monoloudness.
Síndrome de Shy-Drager
Distúrbio neurológico progressivo, apresentando como sin-
toma primário hipotensão ortostática (vertigem, fraqueza e
distúrbios de visão ou consciência ).
HARTMAN (1984) refere que a disartria é caracterizada como
disartria espástica-atáxica- hipocinética ou disartria flácida-atáxica-
hipocinética, variando de acordo com a localização da área da
lesão no paciente.
HIROSE & JOSHITA (1987) relataram que é comum observar no
exame laringológico, redução no movimento de abdução das
pregas vocais, associado à inspiração ruidosa.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Neste capítulo foram descritos aspectos fonoaudiológicos dos
distúrbios neurológicos da laringe.
A terapia de voz para pacientes que apresentam disfonias
neurológicas deve ser intensiva, vigilante e coordenada com
outras formas de tratamento. Os tratamentos neurofarmacológico
ou neurocirúrgico são designados para tratar o distúrbio neuroló-
gico e podem interferir na performance da fala e fonação. Os
tratamentos laríngeo, fonocirúrgico ou comportamental são desig-
nados para tratar diretamente a disfunção na fonação e melhorar
a voz. O trabalho multiprofissional, ou seja, o trabalho integrado do
fonoaudiólogo, neurologista e otorrinolaringologista propiciará ao
paciente com distúrbio neurológico da laringe a maximização de
uma comunicação inteligível.
O sistema laríngeo pode ser considerado como o microcosmo
de todo o mecanismo da fala (NETSELL & ROSENBEK, 1986),
podendo os distúrbios da fonação serem relatados como sintoma
inicial de vários distúrbios neurológicos (como na doença de
Parkinson, por exemplo). Portanto, a avaliação da fonação deve
ser considerada como um pré-requisito para que possa contribuir
ao máximo no sucesso do tratamento.
Avaliação e Terapia de Voz nas Disfonias Neurológicas 695
Leitura recomendada
ARONSON, A.E. – Clinical Voice Disorders . New York, Thiéme, 1980.
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1988.
Deficiência Auditiva 1
Disfonia Infantil 697
30
Disfonia Infantil
INTRODUÇÃO
A necessidade de intervenção terapêutica em crianças que
apresentam alterações vocais, ainda hoje é tema de controvér-
sias. Com freqüência debate-se o grau de prejuízo que a
disfonia pode acarretar na vida de um jovem e também a
validade de se esperar que com o desenvolvimento da criança,
a alteração vocal regrida espontaneamente.
Sabemos através da experiência clínica que as alterações de
voz na infância podem interferir de modo bastante negativo no
desempenho social ou mesmo no desenvolvimento afetivo-emo-
cional de qualquer criança. Como isso pode ocorrer?
Eis alguns exemplos:
“Eu fico muito chateada todas as vezes que me confundem
com meu irmão quando atendo o telefone. Minha voz é rouca,
grave e feia... Eu adoro cantar, mas não consigo!”
Essa é a queixa de uma menina de 10 anos de idade que
estuda numa escola onde música e canto são atividades extrema-
mente valorizadas. Ela já havia comentado com os pais sobre a
sua dificuldade, mas nada foi feito até que a professora de canto
notasse a alteração.
O exame laringológico revelou cisto vocal unilateral e reação
contralateral na prega vocal oposta ao cisto. A criança evoluiu bem
com a fonoterapia, não sendo necessária a cirurgia. Muito ajudou-
a o seu conhecimento musical.
698 Fonoaudiologia Prática
Sistema de ressonância
Crianças com alteração vocal freqüentemente apresentam
desequilíbrio do sistema de ressonância, caracterizado por con-
centração excessiva da energia sonora em alguma região espe-
cífica do aparelho fonador.
702 Fonoaudiologia Prática
Ataque vocal
A avaliação do ataque vocal ou do modo como a criança inicia
a fonação, ocorre durante a conversação espontânea e também
na repetição de palavras e sentenças iniciadas por vogais. Crian-
ças pequenas podem ser solicitadas a nomear figuras que iniciam
por vogais, enquanto se avaliam em suas emissões os ataques
vocais suaves, bruscos ou aspirados.
É importante notar que o ataque vocal pode variar dependendo
da intenção da mensagem e da situação de comunicação em que
a criança se encontra. Em momentos de grande euforia e excitação
é provável que predominem os inícios bruscos, enquanto em
situações de susto ou medo, prevalecem os inícios aspirados.
O ataque vocal brusco ocorre na maioria das emissões de
crianças com característica vocal hipertônica, assim como em
crianças agressivas ou de temperamento autoritário.
A observação de ataques vocais aspirados, sugere adução
insuficiente das pregas vocais, com expiração de ar antecedendo
o início da vibração das pregas vocais.
704 Fonoaudiologia Prática
Articulação
A articulação dos sons da fala refere-se aos diferentes ajustes
motores entre os órgãos envolvidos na produção dos sons, assim
como ao encadeamento destes na fala.
Pode-se avaliar as zonas articulatórias dos sons da fala,
pedindo-se à criança que repita uma lista de palavras ou nomeie
uma série de figuras que possuam todos os sons do português. Na
presença de um distúrbio articulatório observado na fala da
criança, deve-se identificá-lo cuidadosamente, pois não raras
vezes, tal alteração acarreta um desequilíbrio na dinâmica fonatória
devido a ajustes motores compensatórios, esforço muscular e
tensão.
O tipo articulatório pode variar entre normal, indiferenciado,
travado e exagerado. Entre as crianças disfônicas, nota-se o
predomínio do tipo articulatório travado, seguido pelo tipo
indiferenciado.
Velocidade de fala
A velocidade de fala pode ser avaliada como sendo normal,
rápida ou lenta enquanto se observa a criança em várias situações
de comunicação.
Para se obter o número de palavras por minuto (ppm), deve-
se retirar uma amostra de 60s de gravação da fala encadeada da
criança e contar o número de palavras emitidas (WILSON, 1987).
No estudo realizado por SEYMOUR (1975), foram julgadas
extremamente lentas as crianças que apresentaram média de 58
ppm; velocidade normal com média de 119 ppm e extremamente
rápidas, crianças com média de 188 ppm.
Observa-se que crianças com alteração vocal apresentam
velocidade de fala rápida, o que gera excessiva sobrecarga do
aparelho fonador e também compromete a inteligibilidade da
fala.
Disfonia Infantil 707
Orientação familiar
Primeiramente é importante esclarecer os pais sobre o meca-
nismo de produção da voz, as características peculiares da laringe
infantil e o distúrbio vocal que a criança apresenta. Aconselha-se
o emprego de terminologia simples porém correta, sem exagero
em detalhes técnicos. O ideal é informar e satisfazer a curiosidade
Disfonia Infantil 709
Conscientização da criança
O procedimento de conscientização geralmente tem seu início
com um esclarecimento à criança sobre o motivo de seu encami-
nhamento e indicação para a terapia.
De forma simples, explica-se o mecanismo da fonação e
também a alteração vocal apresentada pela criança, empregan-
do-se exemplos, conceitos e terminologia adequada, a fim de
evitar que a mesma crie falsas idéias sobre o assunto. Prefere-se
o emprego do termo nódulo vocal, ao invés de calo ou carocinho,
o adjetivo rouca, ao invés de feia e o verbo machucar ao invés de
estragar.
Em alguns casos é aconselhável transmitir essas explicações
sob a forma de pequenas estórias, adaptadas ao grau de compre-
ensão e maturidade da criança. Os desenhos realizados com a
própria criança para ilustrar tais estórias ajudam a fixar os concei-
tos já apresentados.
O terapeuta deve sempre demonstrar seu empenho e dispo-
sição em ajudar a criança a superar a alteração vocal, e também
reforçar que para isso, há necessidade de colaboração e partici-
pação da mesma.
Com relação aos abusos vocais, julga-se necessário esclare-
cer e orientar a criança sobre os danos que eles podem causar à
voz, porém demonstrando compreensão pois, muitos desses
comportamentos fazem parte do cotidiano da criança.
O menino não deve se sentir culpado porque gritou no jogo ou
numa competição na escola, mas deve saber que falar habitual-
mente aos berros representa uma séria barreira ao processo de
comunicação interpessoal.
A menina por sua vez, não precisa esconder que cantou por
horas, acompanhando o seu toca-fitas e dançando como se fosse
uma artista famosa. No entanto é necessário esclarecer que sua
voz ainda não alcança todas as notas musicais de determinadas
canções de sucesso.
As estórias também costumam ser valiosas estratégias para
se abordar exemplos de abusos vocais e nessa área, a criativida-
de do terapeuta representa uma ótima fonte de recursos.
Para se conscientizar a criança mais velha, pode-se utilizar o
mesmo material empregado na orientação aos pais e também um
questionário que o/a jovem deverá responder com o terapeuta
contendo perguntas básicas sobre o mecanismo de produção
vocal, higiene vocal e exemplos de alterações. É muito importante
se averiguar o que o/a jovem sente em relação a atual condição
de sua voz e como reage frente aos comentários (WILSON, 1987).
Costuma-se ainda, discutir com os jovens o processo
interpessoal de comunicação que envolve a percepção do outro,
da situação, do ambiente e também dos aspectos não-verbais,
como os gestos, postura, expressão facial, contato visual, pausa
e silêncio.
Disfonia Infantil 711
Treinamento vocal
O treinamento vocal tem por objetivo a obtenção de um padrão
de fonação adequado através de procedimentos terapêuticos que
estimulam por via auditiva, visual e proprioceptiva, o monitora-
mento vocal da criança, tornando-o mais concreto e motivante.
ANDREWS (1986) propõe que a primeira etapa do treinamento
vocal, vise ensinar a criança a identificar características vocais
específicas, realizadas por outra pessoa e somente numa segun-
da fase, deve-se solicitar à criança que identifique e descreva o
que ela própria produziu.
WILSON (1987) salienta que o treinamento auditivo é a chave
para se obter sucesso com a terapia de voz em crianças. Enfatiza
a importância de se realizar com a criança disfônica, atividades de
reconhecimento e discriminação dos parâmetros vocais, a princí-
pio com diferenças marcantes e depois com diferenças discretas.
Nota-se na prática que inicialmente é útil trabalhar os diferen-
tes atributos sonoros, como intensidade, altura e duração, através
de instrumentos musicais e posteriormente nas emissões do
terapeuta. Com as crianças pequenas, empregam-se fitas com
gravações de diversas vozes de pessoas, animais, sons ambien-
tais e domésticos para se estimular a percepção e discriminação
das mesmas.
O treinamento auditivo pode ser considerado como prepara-
tório para a fase de produção vocal, mas não deve se estender
muito, a não ser que a criança demonstre ter dificuldade nas
tarefas propostas.
Quanto ao treinamento vocal propriamente dito, diversas
abordagens podem ser utilizadas porém, deve-se ter em mente
que os exercícios enfocam um determinado parâmetro vocal,
enquanto a voz representa uma totalidade. A forma ordenada de
se apresentar a prática terapêutica é portanto, apenas um recurso
didático (BEHLAU & PONTES, 1995).
A escolha acertada de sons facilitadores que aumentam as
chances da criança em obter a emissão mais adequada e
producente é muito importante, principalmente na etapa inicial do
tratamento.
Quando se propõe um trabalho de respiração com a criança
disfônica, normalmente se associa a expiração à emissão de
sons, tendo-se por objetivo a coordenação pneumofônica.
Recomenda-se a produção dos sons facilitadores fricativos
surdos, fricativos sonoros e vibrantes, enquanto a criança realiza
exercícios respiratórios associados a gestos, desenhos ou mes-
mo durante o relaxamento específico cervical. Deve-se estar
atento para que não ocorra esforço excessivo nas emissões.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
O sucesso da terapia de voz com crianças depende de
diversos fatores e quando existem limitações anatômicas que são
permanentes e irreversíveis, como malformações congênitas ou
distúrbios neurológicos, a fonação da criança será a resultante da
melhor adaptação e compensação possível.
A terapia de voz para crianças é um tema extremamente
vasto, pois permite ao fonoaudiólogo, aproveitar as inúmeras
situações oferecidas pela própria criança, sendo portanto uma
contínua descoberta de novas possibilidades.
Acredita-se que com o avanço da tecnologia já presente em
nossos dias, logo serão incorporados à rotina terapêutica, os
recursos computadorizados, especialmente voltados para a ree-
ducação vocal em crianças.
Leitura recomendada
ANDREWS, M.L. – Voice Therapy for Children . New York, Longman,
1986.
ANDREWS, M.L. – Manual of Voice Treatment: Pediatrics Through
Geriatrics. San Diego, Singular, 1995.
BEHLAU, M.S. & PONTES,P.A. – Avaliação e Tratamento das Disfonias.
São Paulo, Lovise, 1995.
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Prentice-Hall, 1983.
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Physiological Perspective for Diagnosis and Treatment. Baltimore,
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MINUCHIN, S.; FISHMAN, J. – Técnicas de Terapia Familiar. Porto
Alegre, Artes Médicas, 1990.
716 Fonoaudiologia Prática
31
Atendimento em Grupo ao
Disfônico
Wanderlene Anelli
Leitura recomendada
BION, W.R – Experiências com Grupos. 2ª ed., EDUSP, São Paulo,
1975.
BLEGER, J. – Grupos operativos no ensino. In: Temas de Psicologia.
Entrevista e Grupos. 2ª ed., Ed. Martins Fontes, 1985.
BLEGER, J. – O grupo como instituição e o grupo nas instituições. In:
Temas de Psicologia Entrevista e Grupos. 2ª ed., Ed. Martins Fontes,
1985.
LUTERMAN, D. – The parents in the Group. In: Couseling Parents of
Hearing Impaired Children. D. Ed., 1979.
32
Voz Profissional
Atuação Fonoaudiológica no
Trabalho com Cantores
Alcione Ramos Campiotto
INTRODUÇÃO
AVALIAÇÃO
Toda avaliação fonoaudiológica começa com uma anamnese
completa e não deve ser diferente no caso do atendimento a
cantores, profissionais ou não, que podem tanto apresentar
queixa da voz falada ou cantada, como simplesmente querer
desenvolver mais suas potencialidades vocais.
Do mesmo modo, também essa anamnese pode começar
pela caracterização da queixa quanto a sua descrição, desenvol-
vimento, duração, sinais e sintomas associados.
Perguntaremos em seguida sobre outras queixas, saúde
geral e resultados de exames anteriormente realizados, lem-
brando que tais indivíduos deverão sempre ser encaminhados
para avaliação otorrinolaringológica, caso ainda não tenham
passado por uma.
Atuação Fonoaudiológica no Trabalho com Cantores 725
EXAME CLÍNICO
A avaliação dos profissionais da voz deveria ter início, à
medida do possível e de acordo com a necessidade verificada
na história pregressa, com uma avaliação médica global
enfocando possíveis distúrbios endócrinos, digestivos ou mes-
mo neurológicos.
Atuação Fonoaudiológica no Trabalho com Cantores 729
TERAPIA/DESENVOLVIMENTO VOCAL
Pelo valor que demos, durante a anamnese, ao detalhamento
em relação à rotina de atividade vocal e física do cliente que nos
procura para um trabalho com o canto, é possível antecipar que
consideramos um dos objetivos principais e iniciais desse traba-
lho, as orientações no que se refere a noções de anatomia e
fisiologia da voz e do canto; hábitos vocais nocivos (gritar, falar em
ambiente ruidoso, pigarrear, etc.); saúde vocal (fatores prejudi-
ciais à voz e/ou trato vocal: cigarro, álcool, drogas, ar condiciona-
do, alguns medicamentos, como os anti-histamínicos, distúrbios
hormonais, etc.), entre outras.
Na realidade, o termo orientação aqui empregado passa a
designar toda a assessoria técnica que o fonoaudiólogo pode
realizar com relação a dicas quanto aos exercícios fisiologicamen-
te mais convenientes para o aquecimento e desaquecimento
vocais; utilização de vestuário adequado que não impeça ou limite
os movimentos costodiafragmáticos durante a respiração; hábitos
vocais saudáveis; programação das apresentações quanto ao
número e duração dos intervalos; importância da hidratação;
possibilidade do uso de paliativos como vaporização; e tudo o
mais que se vislumbre como área de desinformação ou prejuízo,
a partir dos dados colhidos em anamnese.
No entanto, o trabalho fonoaudiológico com esta população
não deve jamais se limitar a uma lista de “pode” e “não pode”,
como às vezes costumamos observar. Muito mais importante do
Atuação Fonoaudiológica no Trabalho com Cantores 731
Leitura recomendada
CANCIAN, P. & CAMPIOTTO, A. R. – A voz cantada na muda vocal. Rev.
Pró-fono, 7(2), 1995.
CLEVELAND, T.F. – A clearer view of singing voice: 25 years of progress.
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terapêutico a cantores na Santa Casa de São Paulo. Trabalho
Realizado no Setor de Terapia Fonoaudiológica – Departamento de
Otorrinolaringologia da Santa Casa de Misericórdia de São Paulo,
1996.
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res. 2º Anais do 2º Congresso Internacional de Fonoaudiologia, 2º
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res. In: FERREIRA, L.P. Voz Profissional: o Profissional da Voz . São
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multiprofissional. In: MARCHESAN, I.Q. Tópicos em Fonoaudiologia
II. São Paulo, Lovise, 1995.
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res atendidos na Santa Casa de São Paulo – 1990 a 1995. Anais do
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VENNARD, W. – SINGING – The Mechanism and The Technic. New
York, Carl Fischer, 1967.
734 Fonoaudiologia Prática
Atuação Fonoaudiológica no
Teatro – da Leitura à Partitura
Lucia Helena Gayotto
Suely Sula Master
Pascoal da Conceição
Ensaios de mesa
Os ensaios de mesa são assim chamados porque normalmen-
te acontecem com os atores em torno de uma mesa ou em roda,
onde, normalmente, não há nenhuma movimentação, embora
algumas vezes seja necessário movimentar-se para dar maior
clareza ao que está sendo falado. Nestes ensaios ocorrem, a
princípio, leituras do texto por inteiro, ao final, atores, diretor e o
conjunto do grupo que vai participar da montagem, discutem os
vários aspectos do que foi visto.
Podem ser feitas várias leituras de mesa e várias discussões.
Essas discussões abordam, ainda, inúmeros aspectos dos inte-
resses de cada um dos artistas envolvidos, por exemplo, o
figurino, o cenário, a iluminação, a preparação vocal, a prepara-
ção corporal, mas basicamente, estas devem coincidir com o
sentido que o diretor quer dar ao trabalho, o que quer expressar
o autor e os atores que representarão o texto. O próximo passo é
a análise das situações propostas aos personagens, envolvendo
múltiplos elementos, como a sua psicologia, a sua história pesso-
al, suas intenções , seus anseios, os porquês, as certezas, ou seja,
sua trajetória durante a peça que por fim deverá revelar uma
faceta de sua humanidade: na vida, no amor, na dor, no ódio, na
ambição, no trabalho, na família.
Participar deste momento, como preparador vocal, é rico e
instigante, pois aí se efetua o conhecimento, na prática da
montagem, de cada ator com seu personagem. Estas são as
primeiras vezes que os atores se ouvem e contracenam, expe-
rimentando as dinâmicas e ritmos do texto a ser falado. Para o
fonoaudiólogo que vai preparar a voz do elenco, esta etapa dá
dicas dos recursos vocais dos atores (intensidade, freqüência,
articulação, ressonância, respiração, velocidade, duração, rit-
mo, projeção, entonação, ênfase e pausas), e esboça as primei-
ras necessidades vocais dos personagens. Perceber os recur-
sos vocais é neste momento um trabalho semelhante a uma
avaliação de voz: depois de ouvir algumas vezes as leituras de
mesa, já é possível saber das facilidades e dificuldades da voz
de cada ator e, portanto, traçar um plano de treinamento vocal.
A compreensão das primeiras exigências vocais do persona-
gem dá início ao trabalho de construção da sua voz, que será
experimentada na emissão do ator e percebida na escuta do
preparador vocal, do diretor e do próprio ator.
O personagem H AMLET, por exemplo, da peça clássica de
WILLIAM SHAKESPEARE , com frases conhecidíssimas como:
736 Fonoaudiologia Prática
* GAYOTTO (1997), uma das autoras do presente texto, desenvolveu esta noção
nesta obra referida.
Atuação Fonoaudiológica no Teatro – da Leitura à Partitura 737
Espaço cênico
Depois da primeira etapa com as leituras, agora o ator encon-
tra-se com o espaço cênico, onde toda a encenação irá acontecer.
O termo espaço é aqui usado em vez do comumente termo palco,
porque a encenação pode ocorrer em outros lugares além do
palco. Por vezes, mesmo dentro do espaço físico do teatro, as
montagens nem sempre se restringem ao palco.
Da mesma forma, à voz cabe “abraçar” este espaço, atingindo
várias direções e, para isso, tendo que ser trabalhada na percep-
ção do teatro como um todo. BEUTTENMÜLLER (1974), ao trabalhar
com o conhecimento do espaço pelo ator, ressalta a importância
da percepção visual e diz: “Ele tem que, antes de tudo, tomar
posse do espaço cênico através da visão”. É fundamental obser-
var a arquitetura do teatro, com suas formas, e os materiais
usados na construção, tais como: madeira, cimento, vidro, teci-
dos, mármore, acústicos ou não.
Tomando como exemplo alguns teatros, em suas disposições
entre palco e platéia, temos:
1. Palco italiano: tem o palco no fundo, de frente para a platéia.
Palco
Platéia
Platéia
Palco
738 Fonoaudiologia Prática
Os ensaios
Nesta fase, que compreende o longo período dos ensaios, o
ritmo das descobertas é mais intenso e também afloram, por outro
lado, as crises de impotência, de criatividade, de tédio, desejo de
desistir, desafios que o ator terá pela frente até alcançar a
740 Fonoaudiologia Prática
lenta
▲
3.não ser ênfase no sintagma com curva melódica descen-
dente e força articulatória
Ensaios individuais
Algumas vezes é necessária uma dedicação especial a determi-
nado ator e suas dificuldades com seu personagem. Durante o
processo de criação, o ator pode entrar por caminhos às vezes
* Esta pequena partitura foi criada para o presente texto, apenas com o intuito
de ilustrar um exemplo de interpretação desta fala. Para melhor compreensão
da partitura vocal , seus recursos e suas análises, consultar GAYOTTO (1997).
742 Fonoaudiologia Prática
Partitura vocal
Com os treinamentos vocais permeando todas estas etapas
do processo criativo, tem-se por fim, uma partitura vocal resultan-
te, na qual os recursos vocais estão combinados às característi-
cas cênicas do personagem: suas situações, objetivos, intenções
e ações físicas. A partitura é a referência vocal que liga os estádios
dos treinamentos e as etapas de criação do espetáculo, desde a
primeira leitura, passando pelos ensaios de mesa, o contato com
o espaço cênico, até os ensaios coletivos e individuais. Mesmo
assim, há ocasiões em que, até depois de estar sendo apresen-
tada a peça, volta-se ao trabalho de mesa para que determinada
cena possa ser melhorada, ou porque algum ator será substituído
e retomam-se os ensaios com o ator que chega.
O trabalho do fonoaudiólogo com as ações vocais, desenha-
das na partitura, dá contribuições técnicas e interpretativas à voz
dos atores. Portanto, pode atuar também como uma espécie de
direção vocal do espetáculo, trabalhando, ao mesmo tempo, as
necessidades vocais básicas para o espaço cênico, a saúde vocal
do ator e a construção vocal dos personagens.
Neste contexto, o preparador vocal se ocupa da voz tendo a
técnica e a criatividade como duas companheiras inseparáveis.
Pode acompanhar o elenco mesmo depois do espetáculo estar
em cartaz, na manutenção das vozes e, eventualmente, na
constante reelaboração da voz do personagem – bons diretores e
atores parecem estar sempre inquietos e, portanto, continuam
somando novas referências interpretativas que irão, certamente,
modificar as interpretações das falas e suas partituras vocais.
Atuação Fonoaudiológica no Teatro – da Leitura à Partitura 743
“O resto é silêncio.”
O trabalho foi ensaiado e o espetáculo está pronto.
Está? Não! Agora o desafio será manter fresco e vivo o texto como
na primeira vez. E esse desafio ocorrerá, dependendo do sucesso da
peça, durante meses, algumas vezes, anos. Como fazer? Será que
o tédio de um ator, ao interpretar um personagem inúmeras vezes já
representado, é sentido pela platéia? Sem vacilar, podemos afirmar
com toda certeza que sim. O teatro é comunicação ao vivo; uma
interpretação requentada faz bocejar tanto o ator como qualquer um
que esteja presente num espetáculo assim. O trabalho de criação é
ininterrupto, não tem fim, não há o que já foi conseguido, o que foi feito
ontem já não “existe” mais. Em Hamlet, deverá ser sempre pela
primeira vez que o ator receberá a notícia da morte do pai, do
casamento da mãe e da usurpação do trono pelo tio.
“O resto é silêncio” é a última fala do personagem HAMLET antes
de morrer, nessa grande tragédia de WILLIAM SHAKESPEARE. Con-
tam as fofocas de teatro que esta fala foi um “caco”, uma improvisa-
ção acrescentada ao texto pelo ator que fazia HAMLET, provavel-
mente porque ele se julgava convencido de ter interpretado tanto e
tão bem as suas cenas, que não valia a pena o público se preocupar
em ouvir, no futuro, mais que silêncio. Tudo já havia sido dito.
Porém, o texto de SHAKESPEARE não termina aí e muitas cenas
ainda acontecem. Homem de teatro, o “bardo”, sabia com certeza
que as coisas se aperfeiçoam, se redescobrem, morrem, vivem,
num infinito ciclo de descobertas.
Leitura recomendada
BARBA, E. – Além da Ilhas Flutuantes. Trad. Luis Otávio Burnier. São
Paulo – Campinas, Hucitec – Editora da Unicamp, 1991.
BERRY, C. – Voice and the Actor. New York, Macmillan Publishing
Company, 1973.
BEUTTENMÜLLER, M.G. & LAPORT, N. – Expressão Vocal e Expres-
são Corporal. Rio de Janeiro, Forense Universitária, 1974. p. 23.
GAYOTTO, L.H. – Voz do Ator, a Partitura da Ação. São Paulo, Summus
(no prelo), 1997.
HARVEY, P.L.; ARONSON, D.B.; COLEMAN, R.F. – Objective evaluation
of actors voices: Normative data on the trained theatrical voice. In:
21th THE VOICE FOUNDATION SYMPOSIUM,U.S.A. Oral
Apresentation. The Voice Foundation, 1992.
RUSSO, I. & BEHLAU, M. – Percepção da Fala: Análise Acústica do
Português Brasileiro. São Paulo, Ed. Lovise, 1993. p. 10.
STANISLAVSKI, C. – A Construção da Personagem. Trad. Pontes de Paula
Lima. 4ª.ed. Rio de Janeiro, Civilização Brasileira, 1986. 326 pp.
744 Fonoaudiologia Prática
Fonoaudiologia do Trabalho e o
Telemarketing
Eudosia Acuña Quinteiro
Leitura recomendada
QUINTEIRO, E.A. – O Poder da Voz e da Fala no Telemarketing:
Treinamento Vocal para Teleoperadores. São Paulo, Summus Edi-
torial, 1995.
Atuação Fonoaudiológica com
Locutores de Rádio
Iára Bittante de Oliveira
INTRODUÇÃO
Não há como negar o crescimento da área de atuação do
fonoaudiólogo junto a adultos e crianças, que utilizam a voz
profissionalmente.
Dentro deste campo, o locutor de rádio é um dos profissionais
que pode se beneficiar muito da ajuda de um fonoaudiólogo. Basta
considerarmos que na comunicação radiofônica não há imagem
visual. Ao contrário, essa imagem é fantasiada pelos ouvintes de
rádio, principalmente a partir das características vocais do locutor.
É delegada à voz a função de veicular emoções. São canaliza-
das para a voz e a fala todas as possibilidades de comunicação,
quando esta acontece por intermédio do rádio.
Pensando assim, o fonoaudiólogo que resolver atuar nesta
área, além de gostar muito do que irá fazer, deverá estar sempre
muito atento aos detalhes da produção da voz e fala deste
profissional. Pequenas alterações podem desviar o sentido da-
quela comunicação.
Neste trabalho são combinadas técnicas de aprimoramento
vocal com espontaneidade de comunicação, sem interferir no
estilo individual de cada locutor, respeitando-se os diversos tipos
de locução.
Torna-se evidente, a necessidade de se conhecer caracterís-
ticas e necessidades deste profissional, identificando ainda quais
os riscos que ele possui de desenvolver uma desordem de voz,
por conta das condições do uso profissional desta.
É necessário, portanto, estar atento às tendências aos abusos
e mau uso vocais, por parte do locutor de rádio, decorrentes de seu
tipo de demanda vocal (OLIVEIRA, 1995). Uma locução esportiva
pode ilustrar com clareza esta situação. Basta imaginar que
nestes casos, há pelo menos 90min de fala acelerada, pratica-
mente ininterrupta, a intensidade da voz variando entre 50 e 80 dB
(em momentos de grito de gol), com uso de extensa gama tonal e
variação de entoação. Para tornar a situação mais difícil, muitas
vezes ainda, o trabalho é desenvolvido em presença de ruído, sob
intenso calor, ou mesmo no ar condicionado.
Estando o fonoaudiólogo informado sobre a realidade deste
profissional, além de desenvolver o aprimoramento da comu-
752 Fonoaudiologia Prática
CONHECENDO O LOCUTOR
Sem dúvida alguma, a entrevista com o profissional é de
extrema importância. Aqui iremos saber sobre seu nível de
escolaridade, área de atuação no rádio: esportiva (narração
futebolística, repórter de campo, comentarista esportivo), locu-
ção de notícias, jornalismo, reportagem externa, comerciais,
área artística, humorística e outros. Neste sentido é importante
saber ainda, se o locutor trabalha em estação de transmissão de
AM (Amplitude Modulada) ou FM (Freqüência Modulada). Isto
porque os estilos de locução variam em função das caracterís-
ticas do público-alvo, nível sócio-cultural, idade, etc. e, conse-
qüentemente, os locutores variam seus estilos de comunicação,
emprego da voz, forma de falar, pronúncia, ritmo, articulação,
etc. (OLIVEIRA , 1995).
São pesquisados também, o tempo de atuação no rádio,
dados quanto aos cuidados com a voz, conhecimentos que este
profissional possui sobre profilaxia vocal e outras atividades
desenvolvidas pelo locutor. Muitas vezes, eles desenvolvem
atuações paralelas, que também exigem um alto nível de produ-
ção vocal como no caso do canto ou trabalho com vendas e isto
irá influenciar no desempenho da voz.
São levantados ainda, aspectos relacionados à saúde geral e
vocal, hábitos quanto a álcool e fumo, hidratação e alimentação
(qualidade e horários das refeições), exercícios físicos, descanso
e lazer.
Com relação à produção vocal propriamente dita, sugerimos
coletar amostras de voz, tanto de fala espontânea como simu-
lando uma situação de radiodifusão, emitindo uma notícia,
fazendo um comentário e lendo. Esta amostra é gravada em fita
cassete para comparações futuras, de preferência realizada
com microfone, através de gravação feita diretamente da mesa
de som, para se evitar interferências ou ruídos que atrapalhem
a análise.
Aspectos básicos de uma avaliação de voz devem ser
realizados, contando-se com a possibilidade do surgimento de
indivíduos com alterações vocais importantes, os quais deverão
ser encaminhados para exames e condutas necessárias.
Atuação Fonoaudiológica com Locutores de Rádio 753
Postura na locução
Com relação à postura, achamos que o locutor deve ser
orientado de forma global. Desde a posição para dormir, dando
preferência àquelas que facilitam a respiração nasal, para que se
evite o ressecamento da mucosa laríngea, principalmente para os
locutores que trabalham logo pela manhã, até a adequação da
postura ao falar. Para que a orientação seja eficiente, é necessário
que o fonoaudiólogo conheça esta área e não invada outros
756 Fonoaudiologia Prática
Coordenação pneumofonoarticulatória
Os princípios básicos da coordenação pneumofônica são
trabalhados com os locutores e não serão abordados aqui. Cha-
mamos a atenção para a necessidade de haver um tempo de
fonação compatível com as necessidades de locução. Para isto,
enfatizamos exercícios que propiciem aumento do tempo de
fonação sempre coordenados com a articulação, pois respiração,
coordenação fonação-respiração e articulação fazem parte de
uma mesma unidade funcional (BEHLAU & PONTES, 1995). Esse
dinamismo deve ser percebido pelo locutor, portanto, são propos-
tos exercícios com esta finalidade. São escolhidos frases e textos
com ocorrência de grupos consonantais, arquifonema /r/ para
serem lidos em voz alta ao grupo ou ao fonoaudiólogo e gravados
em fita cassete para que o locutor perceba suas falhas e acertos.
Os exercícios são feitos em diferentes volumes, com e sem
microfone e em diferentes velocidades, dando-se preferência a
ritmos acelerados, contando-se que estes são os mais utilizados
nas locuções e também os mais difíceis de serem realizados. Os
primeiros ensaios de variação de entoação já são experimentados
aqui. O locutor é alertado para perceber as diferentes quantidades
de ar, que estão implícitas nestas tarefas.
Atenção especial é dada aos movimentos de mandíbula, que
devem ser amplos e relaxados, o que chamamos de “ mandíbula a
favor da gravidade” para que ele perceba que a amplitude de
Atuação Fonoaudiológica com Locutores de Rádio 759
CONCLUSÕES
Nossa intenção neste capítulo foi passar uma forma de atua-
ção que permita não só um trabalho com locutor, mas também
acreditamos que muito do que foi apresentado possa ser útil em
outras áreas da voz profissional.
Torna-se fascinante o trabalho nesta área, pelo fato de arte e
ciência necessitarem caminhar juntas. Saber valorizar nuances e
buscar perfeição é da arte, propor técnicas para levar as estrutu-
ras da fonação a atingirem o que se busca, com bases em
conhecimentos anatomofisiológicos, bem como saber prevenir a
saúde vocal do usuário da voz profissional, é ciência.
Entender esses dois caminhos entrelaçados é Fonoaudiolo-
gia, uma ciência com uma boa dose de paixão.
Agradecimento
Ao Prof. Dr. Otacilio de C. Lopes Filho, pelo convite de participação neste livro.
É sempre muito bom dispor de um espaço como esse, para expor nossas
experiências e as reflexões que delas emergem.
Leitura recomendada
ANDREWS, M.L. – Manual of Voice Treatment Pediatrics Through
Geriatrics. San Diego, Singular Publishing Group, 1995.
BEHLAU, M.& PONTES, P. – Avaliação e Tratamento das Disfonias. São
Paulo, Lovise, 1995.
COUTO, H.A – Ergonomia Aplicada ao Trabalho. Belo Horizonte, Ergo,
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FERREIRA, L.P.& FREIRE, R. – Técnicas de Impostação e Comunica-
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Deficiência Auditiva 1
Avaliando e Tratando o Sistema Estomatognático 763
33
Avaliando e Tratando o
Sistema Estomatognático
ANAMNESE
O que usar? Roteiros prontos? Folhas em branco? Perguntas
semidirigidas? Ou será que é melhor deixar os pais falarem sem
perguntarmos nada? Temos visto que os jovens fonoaudiólogos
se perdem inicialmente a respeito do que usar ao estarem pela
primeira vez com um paciente. Não é importante que um questio-
nário formal exista. Na verdade, tanto faz a forma como iremos
abordar a família para descobrir o que queremos saber. Se vamos
dirigi-los ou simplesmente deixar que contem livremente o que
Avaliando e Tratando o Sistema Estomatognático 765
Segunda Parte
A partir desta primeira coleta de dados, iremos dirigir nossas
questões de acordo com a queixa apresentada na primeira parte.
Temos observado que as questões das anamneses são direcio-
nadas basicamente na busca de causas para o problema.
Estaremos em busca das causas por três diferentes razões:
1. Para saber se a causa ainda está presente, o que dificultaria
a solução do caso. Exemplo: mordida aberta anterior com sucção
de dedo.
2. Se a causa for genética há necessidade de orientação
médica, principalmente para o caso de novas gestações. Exem-
plo: síndromes.
3. Para conhecer as possíveis razões que teriam levado
àquele problema, embora a causa, propriamente dita, não
esteja mais presente. Isto nos fornece elementos para o plane-
jamento de futuros programas de prevenção e orientação.
Exemplo: uso de mamadeira por longo prazo com furo aumen-
tado.
As questões específicas em casos de motricidade oral serão
sobre:
Desenvolvimento global
Partir da idade atual e retornar ao passado, caso seja neces-
sário. Quando partimos do momento atual é mais fácil para os pais
ou para o próprio paciente relatar, com precisão, o que queremos
saber. Podemos, a partir do relato deles, perguntar se sempre foi
assim ou se antes existiam estas ou outras dificuldades, e em que
nível.
Avaliando e Tratando o Sistema Estomatognático 767
Alimentação
Perguntar como se comporta, desde a infância, em relação
às características dos alimentos que come: consistência, varie-
dade, textura e quantidade. Não deixar de investigar o que a
família pensa sobre este assunto e como ela própria se alimen-
ta, de uma maneira geral. Devemos nos lembrar que muito do
que aprendemos em relação a alimentos, como causa de
problemas ligados à motricidade oral, são mudanças de toda
uma sociedade em relação aos seus hábitos alimentares. Isto
gera conflitos quando pretendemos orientar os pais sobre estes
aspectos, uma vez que toda a família pode estar se alimentando
da mesma maneira que a criança em questão.
Escolaridade
Perguntar sobre as escolas que freqüentou. No caso de
mudanças, porque elas ocorreram. Como tem sido seu aproveita-
mento. Quais são as exigências por parte dos pais. Quais são as
disciplinas nas quais a criança tem melhores rendimentos e quais
as que são piores. Obter dados gerais sobre a escolarização
podem nos dar dois tipos de informação: primeiro, sobre as
capacidades de aprendizagem da criança e, em segundo lugar, o
nível de interesse, concentração e atenção do futuro paciente. Às
vezes, temos à nossa frente uma criança extremamente inteligen-
te, mas ligada apenas em jogos de vídeo game, entendendo que
o resto é perda de tempo. Isto pode significar que seu interesse na
terapia será baixo, dificultando sobremaneira o andamento do
tratamento.
Sono
Perguntas sobre o sono também são importantes em casos de
motricidade oral. Se roncam, babam, levam água para o quarto e
bebem durante a noite, se acordam com a boca seca e se têm
apnéia noturna, são dados que nos levam a conhecer melhor a
parte respiratória. Posições adotadas para dormir também são de
fundamental interesse para verificarmos possíveis interferências
no crescimento ou na má-oclusão.
768 Fonoaudiologia Prática
Questões finais
A pergunta final sempre deverá retornar para a queixa inicial.
De modo geral, devemos encerrar perguntando se há alguma
coisa a mais que o paciente e/ou os pais gostariam de nos
informar. Se existem outras colocações que não foram feitas
durante a queixa inicial e que poderiam ser feitas neste momento,
caso os pais acreditem tenham importância para o caso. Deixá-los
falar livremente neste momento pode nos dar uma outra visão da
queixa inicial ou sabermos o que, de fato, eles esperam do
tratamento.
Terminada a anamnese devemos dar início ao exame. Duran-
te o exame podemos estar retomando as questões respondidas
na anamnese. Ao examinarmos podemos observar que determi-
nada informação não corresponde ao que estamos vendo e, por
isto, devemos voltar a fazer perguntas sobre o que não está
fazendo sentido. Às vezes, percebemos, durante o exame, que
faltou perguntar algo essencial. Outras vezes, os próprios pais, ou
o paciente, lembram-se de alguma informação que lhes parece
pertinente frente ao que estamos examinando. Esta é a razão pela
qual devemos entender que anamnese e exame não devem ser
separados e devem vir seqüencialmente. Mesmo assim, sabemos
que muitas questões não serão discutidas naquele momento pois
ficam esquecidas ou, simplesmente, não há, ainda, um vínculo
para que sejam ditas. Este é um motivo pelo qual sempre apare-
cem novas informações durante as sessões seguintes, na medida
em que os pais e/ou o paciente adquirem confiança no terapeuta.
Estes processos de colher dados e examinar, no sentido de
compreender o problema, não se esgotam no primeiro encontro.
Na verdade, até o último dia estaremos fazendo novas considera-
ções sobre o caso. É absolutamente dinâmico e interligado o
processo de avaliação e tratamento.
Respiração
Os seres humanos nascem respirando pelo nariz e, a não ser
que ocorram impedimentos mecânicos ou fisiológicos assim con-
tinuará até a morte. Isto significa que ao encontrarmos um pacien-
te com respiração bucal devemos buscar compreender por que
ele não está realizando esta função de forma normal. Devemos
nos lembrar que, a maior parte das vezes, a respiração não é
puramente bucal, mas sim mista, isto é, dá-se pelo nariz e pela
boca. As causas mais freqüentes de uma respiração inadequada
referem-se a problemas mecânicos. Estes problemas podem
estar na nasofaringe (adenóide), na orofaringe (amígdalas), ou no
próprio nariz, como um desvio de septo ou mais comumente, as
hipertrofias de conchas que impedem ou diminuem a entrada do
ar. Para conhecermos de forma correta qual a razão da respiração
estar ocorrendo por via inadequada, uma consulta ao otorrino-
laringologista é fundamental sendo que a mesma deve acontecer
antes de iniciarmos nosso tratamento. Caso o médico nos informe
que, do ponto de vista clínico, não existem problemas, devemos
ainda considerar se o paciente tem possibilidade de oclusão labial
para que a respiração possa ocorrer pelo nariz. Se existir uma
774 Fonoaudiologia Prática
Mastigação
Para avaliarmos esta função precisamos, em primeiro lugar,
conhecer os dentes e como eles se relacionam. A oclusão e a
tipologia facial determinam a força e o modo de mastigar. Em
segundo lugar, vamos pesquisar, com bastante detalhamento, os
hábitos alimentares, não só do paciente mas, principalmente, de
sua família. Hábito alimentar não é só o que se come. É necessário
saber o como, o quando, o tempo disponível, valores que se dão
para a alimentação, dinheiro que se investe nisto, etc... Normal-
mente, o problema alimentar não é só do paciente mas é da
família, ou do meio no qual aquele indivíduo vive. Como prova
específica, pode-se utilizar, em todas as avaliações, um mesmo
alimento para que se possa criar um padrão de exame. O pão
francês é uma boa opção pois é fácil de encontrar e, praticamente,
todos o comem.
Filmar o exame também é aconselhável para que seja possí-
vel fazer comparações posteriores com maior objetividade. Lem-
brar que os limites de mastigação impostos pela oclusão só serão
resolvidos após o tratamento da oclusão. Como prova específica
podemos sugerir que o paciente coma o pão normalmente, como
está acostumado. Após duas ou três dentadas, perguntamos
onde está mastigando melhor, ou seja, qual é o lado de preferên-
cia mastigatória e por que prefere este lado. Caso o paciente não
saiba identificar, devemos sugerir-lhe que coma mais alguns
pedaços para observar como ele sente a mastigação acontecen-
do. Em seguida, devemos pedir que mastigue apenas de um lado
e observe relatando, em seguida, como foi. Depois repetimos a
mesma prova, usando o outro lado da boca. Por fim, sugerimos
que volte a mastigar como o faz normalmente.
Lembrar que, após cada prova, devemos pedir ao próprio
paciente que descreva como se sentiu, se foi fácil e quais foram as
dificuldades encontradas. Esta forma de avaliar faz com que possa-
mos ter a nossa visão e também a do próprio paciente sobre como
está se processando sua função mastigatória. Mesmo que o pacien-
te não saiba nada, ou só tenha uma visão parcial daquilo que ocorre,
isto não é importante. Agindo desta maneira podemos saber o que
o paciente percebe e já o estaremos ajudando a ficar mais atento,
deste momento para a frente, em relação à sua mastigação.
Avaliando e Tratando o Sistema Estomatognático 775
Deglutição
Esta função dá continuidade ao processo de mastigação e,
como tal, não pode e nem deve ser avaliada em separado da
mesma. Ao observarmos a mastigação também observaremos o
paciente deglutindo, pois esta seqüência é natural. Nada mais
lógico do que olharmos, ao mesmo tempo, as duas funções.
Assim, como não vamos pedir para que o paciente faça um bolo
alimentar e nos mostre antes de deglutir, não pediremos que abra
os lábios a fim de olharmos dentro da sua boca enquanto deglute.
Estas duas formas de avaliar levam a atipias alterando, evidente-
mente, o processo natural.
Seria bastante interessante que os terapeutas fizessem as
provas neles próprios e em pessoas normais para avaliar a
eficácia e os resultados de tais procedimentos, antes de aplicá-los
ao paciente. Normalmente, vamos mastigando e engolindo. Não
fazemos um único e grande bolo de tudo o que está sendo
mastigado para então deglutir. Quando isto ocorre, tendemos a
realizar um movimento de cabeça para trás, na tentativa de
aumentar o espaço orofaríngeo para que todo o alimento possa
passar de uma só vez. Isto acaba sendo classificado como
“deglutição atípica”, quando na verdade, foi algo que provocamos
ao pedirmos uma forma de deglutição que é antinatural.
Assim como esta atipia, muitas outras são provocadas pelos
examinadores. Até o dentista, quando pede para que o paciente
degluta com os lábios entreabertos, numa posição em que o
corpo está reclinado dificultando a deglutição, também causa
uma atipia. Sugiro ao leitor atento experimentar deglutir nessas
circunstâncias, não se esquecendo de um babador. Sabemos
que os sujeitos Classe II de Angle, com grandes desproporções
maxilomandibulares, deglutem com os lábios separados e,
mesmo assim, procuram fazer um selamento compensatório
que é o do lábio inferior com os dentes superiores. O selamento
anterior é necessário para manter uma pressão negativa no
interior da boca e todas as pessoas procuram obtê-la de alguma
maneira.
Às vezes, vamos ter, de fato, a projeção anterior da língua no
momento da deglutição. Ao invés de apenas apontar tal fato
tentaremos compreender suas razões. Pode haver uma mordida
aberta anterior; podem existir amígdalas hipertrofiadas, trazendo
776 Fonoaudiologia Prática
Fala
Avaliar a fala, em geral, requer procedimentos mais simples.
Podemos verificar como o paciente fala e que tipos de trocas
apresenta, apenas conversando com ele. Em geral, os pais
sabem quais os fonemas que os filhos omitem ou trocam. Muitas
vezes, já na anamnese, podemos ficar conhecendo, com certa
margem de segurança, quais são os problemas de fala existentes.
No entanto, para uma avaliação mais precisa é importante não só
sabermos quais são as trocas ou omissões mas, mais uma vez,
tentar compreender a razão destas trocas e quais as possibilida-
des de correção. Com muita freqüência encontramos problemas
de fala que fazem parte de problemas de linguagem. Infelizmente,
muitas vezes, acabamos simplificando e realizando análises
somente parciais, reduzindo problemas de desenvolvimento de
linguagem em meras trocas ou omissões de fonemas. As distor-
ções por sua vez, podem estar relacionadas a problemas de
forma, ou seja, a características anatômicas das estruturas que
produzem fala.
TERAPIA
O grande momento chegou. Muito provavelmente alguns de
vocês, meus caros colegas, vieram direto a esta parte do capítulo
sem ter lido as demais páginas que antecederam este ponto. É
uma pena. Talvez seja por isto que a fonoaudiologia tem caminha-
do tão lentamente. Buscamos, durante muitos anos, soluções
prontas e isto não nos leva a raciocinar. Porém, se me enganei e
você já leu o restante, já percebeu que não há uma regra única,
nem para avaliar e, muito menos, para a terapia. Podemos falar,
talvez, de princípios terapêuticos e também pensarmos no que
inviabilizaria a terapia. Após a avaliação, isto é, a anamnese e o
exame, indicaremos, outros profissionais e/ou exames, caso
sejam necessários, para um melhor diagnóstico. Antes da família
deixar nossa sala, já neste primeiro encontro, devemos dar a eles,
e ao paciente, um prognóstico e um tempo aproximado de terapia.
Sempre que vamos ao médico procuramos saber qual remédio
Avaliando e Tratando o Sistema Estomatognático 777
Respiração
Após o exame otorrinolaringológico poderemos iniciar nosso
trabalho. Caso o paciente tenha apenas um hábito de respirar
inadequadamente, a terapia será mais tranqüila do que nos casos
com pacientes alérgicos. Mesmo que o paciente tenha um impe-
dimento mecânico, como hipertrofia de adenóide, será válido
trabalharmos com ele pois as tentativas seguidas de respiração,
via nariz, podem ajudar na desobstrução ou mesmo no tratamento
médico.
778 Fonoaudiologia Prática
Mastigação
Pacientes com a oclusão normal
Devemos ensinar, basicamente, uma mastigação com os
lábios ocluídos, utilizando os dois lados da boca, alternadamente,
para a trituração dos alimentos. A quantidade de comida colocada
na boca também é importante. Muita comida não permite uma
mastigação eficiente. A velocidade também deve ser controlada.
Não devemos trabalhar forçando a ingestão de alimentos que o
paciente não aprecia. A alimentação deve ser algo prazeroso. Não
há necessidade de iniciar com alimentos pastosos para depois
passar para sólidos, a não ser em pacientes muito pequenos ou
com alterações neurológicas. Conversar com os pais sobre hábi-
tos alimentares e formas de alimentação também é fundamental,
uma vez que o paciente está conosco poucas horas por dia.
Devemos trabalhar com exercícios de força, quando houver
necessidade, solicitando que os mesmos sejam realizados uma
vez por dia, durante alguns minutos. É mais importante a realiza-
ção diária, com pouco tempo de duração, porém sistemática, do
que por um tempo prolongado, mas que não seja realizada
rotineiramente.
Avaliando e Tratando o Sistema Estomatognático 779
Deglutição
Observamos que: quando o paciente pode respirar pelo
nariz; quando tem uma boa oclusão; quando mantém os lábios
ocluídos; quando o espaço interno é compatível com o tamanho
da língua e, quando ele mastiga adequadamente, também pode
deglutir corretamente. Os demais pacientes, que não apresen-
tam tais características, terão que adaptar seu modo de deglutir
às condições existentes. No paciente que, apesar das boas
condições de forma e de respiração, deglute com projeção
anterior, devemos verificar a postura da língua e corporal, o
tônus, os hábitos alimentares e modificá-los, caso seja neces-
sário. Em geral, após adequarmos postura, tônus, e respiração
o paciente já consegue deglutir melhor. Os exercícios para
aumentar a força da língua e para melhorar a propriocepção são
fundamentais para a obtenção de um melhor posicionamento da
língua dentro da cavidade oral. De maneira geral, o trabalho com
a deglutição propriamente dita é o menos importante, pois ao
darmos condições anatômicas e havendo melhora das demais
funções, naturalmente a língua se posiciona e funciona adequa-
damente.
O trabalho com alterações da motricidade oral é vasto e exige,
de maneira geral, que o diagnóstico tenha sido bem feito. Quando
está claro para ambos, paciente e terapeuta, quais são os limites
possíveis e a importância do trabalho a ser realizado, o investi-
mento de todos é maior e os resultados mais favoráveis.
Leitura recomendada
BIANCHINI, E.M.G. – A Cefalometria nas Alterações Miofuncionais
Orais: Diagnóstico e Tratamento Fonoaudiológico. Pró-Fono Depar-
tamento Editorial, 1993.
780 Fonoaudiologia Prática
34
Cirurgia Ortognática e
Fonoaudiologia
INTRODUÇÃO
A cirurgia ortognática é um ramo da cirurgia, que trata dos
pacientes portadores de deformidades dentofaciais, objetivando
restabelecer a função mastigatória e proporcionar uma melhor
harmonia facial.
Para cumprir estes objetivos ela é completada por outra
especialidade odontológica que é a Ortodontia.
É Importante considerar que estes pacientes são operados
em nível hospitalar e na grande maioria das vezes sob anestesia
geral.
Exame da face
Este exame é realizado com o paciente de pé e olhando para
a frente.
A princípio observamos se existe harmonia entre os terços
superior, médio e inferior da face; se existe simetria entre os lados
782 Fonoaudiologia Prática
Avaliação radiográfica
A radiografia que nos auxilia muito, e que deve ser solicitada
rotineiramente, em cirurgia ortognática é a panorâmica, pois
através da mesma observaremos: a textura óssea, presença ou
não de dentes inclusos e processos patológicos.
Estudos cefalométricos
Os estudos antropométricos são realizados através de radio-
grafia cefalométrica de perfil, onde devem estar bem-evidencia-
das as estruturas ósseas, dentárias e os tecidos moles.
Existem diversas análises cefalométricas difundidas por todo
o mundo, aqui discutiremos alguns aspectos da análise cefalo-
métrica de Steiner (Fig. 34.1).
S
SNA 82°
SNB 80°
B
SNA = 82° ± 2
SNB = 80° ± 2
ANB = 02° ± 2 FIGURA 34.1 – Análise cefalométrica de Steiner.
Cirurgia Ortognática e Fonoaudiologia 783
Ortodontia
Uma vez realizado o diagnóstico da deformidade, e constata-
da a presença de alterações das arcadas dentárias, o paciente é
encaminhado para o ortodontista, afim de realizar um tratamento
visando um melhor posicionamento e nivelamentos dos dentes
nas arcadas.
A finalidade deste tratamento ortodôntico pré-operatório é,
primeiro, para que o paciente possa ter a correção das giroversões
e maus posicionamentos dentários e, segundo, para que imedi-
atamente após a cirurgia possa se conseguir uma boa oclusão
dentária, devolvendo assim a função mastigatória ao paciente,
e também uma melhor estabilidade da cirurgia, evitando com
isto as recidivas.
Avaliação fonoaudiológica
Dentro da cirurgia ortognática a fonoaudiologia exerce um
importante papel no diagnóstico e tratamento dos distúrbios e
alterações de postura da língua e lábios, o que é uma constante
nos pacientes portadores de deformidades dentofaciais.
A orientação e tratamento prévio à cirurgia auxilia em muito na
prevenção das recidivas.
784 Fonoaudiologia Prática
Avanço mandibular
Esta mesma técnica é utilizada para avanços mandibulares.
Quando a mandíbula se encontra retroposicionada, é feita a
osteotomia sagital e ao invés de recuar, como no prognatismo,
se faz o avanço da porção anterior. É interessante anotar que há
um estiramento muscular importante nestes casos e que se for
de mais de 10 mm está indicada a miotomia dos depressores da
mandíbula, digástrico, genióideo principalmente. Nestes casos,
também pode-se proceder a osteossíntese entre os fragmentos
ósseos com parafusos a fim de evitar o bloqueio maxilomandi-
bular.
A
B
FIGURA 34.6 – A) Microgenia, pontilhado na área de osteotomia no mento. B) Após o avanço do mento.
Cirurgia Ortognática e Fonoaudiologia 787
A B
FIGURA 34.7 – A) Macrogenia, pontilhado na área de osteotomia. B) Após o recuo do mento.
2. Maxilares
Deformidades maxilares são comuns em nosso meio,
principalmente devido à presença da mistura racial. Deve-se
ter em conta que para o diagnóstico da deformidade há
necessidade do exame clínico e radiográfico, pois, muitas
vezes uma deformidade que aparentemente está localizada
na mandíbula na realidade ocorre devido a um mau desenvol-
vimento da maxila.
São várias as alterações que podem ocorrer na maxila,
tanto no plano ântero-posterior, quanto no vertical, quanto no
transversal, e todas são passíveis de tratamento ortodôntico-
cirúrgico.
Infecção
É bastante rara a presença de infecção nas osteotomias para
correção das deformidades dentofaciais.
Normalmente durante estas intervenções, iniciamos antibio-
ticoterapia profilática com 1g de cefalosporina EV antes da cirur-
gia e a cada 6h por um período de 72h.
Necrose pulpar
É um acidente raro de acontecer, mas pode ocorrer se não
for respeitado o comprimento dos dentes localizados na região das
osteotomias.
Toda osteotomia deve se localizar no mínimo 5 mm distante dos
ápices dentários, para preservar a vitalidade óssea, e em conseqüên-
cia o feixe vasculonervoso da polpa do dente.
Necrose óssea
É um acidente bastante grave que poderá ocorrer se não
forem observados os princípios básicos que são: cuidadosa
manipulação dos tecidos, respeito às estruturas que permitirão a
revascularização e desinserção mínima dos tecidos moles das
estruturas osteotomizadas.
A B
C
FIGURA 34.10 – Paciente com deformidade dentofacial. A) Frente; B) perfil; C) intra-oral – mordida
aberta anterior.
790 Fonoaudiologia Prática
FIGURA 34.13 – Montagem dos modelos em FIGURA 34.14 – Intra-oral – oclusão após o trata-
articulador semi-ajustável. “Cirurgia nos modelos”. mento ortodôntico-cirúrgico na mandíbula e na
maxila.
A B
FIGURA 34.15 – Paciente de perfil pós-operatório. A) Perfil. B) Frente.
Cirurgia Ortognática e Fonoaudiologia 791
Anamnese
A entrevista inicial dos pacientes indicados para uma Cirurgia
Ortognática deve enfocar, principalmente, os dados relativos às
principais funções do sistema estomatognático, ou seja, respiração,
mastigação, deglutição e fala, além de pesquisar sinais e sintomas de
desordens temporomandibulares (DTM), enfocando as possíveis
adaptações e/ou alterações e seu grau de severidade e delimitando
o grau de consciência do indivíduo quanto a estas alterações. É de
grande importância também, detectar a presença de hábitos
parafuncionais que ocorram, tais como: onicofagia, bruxismo, sucção
digital (presente em boa parte dos casos de mordida aberta anterior
dentária e/ou esqueletal, mesmo em indivíduos adultos), etc.
Convém lembrar que, por habitualmente se tratarem de pa-
cientes adultos ou jovens adultos de pelo menos 16 anos, não há
a necessidade de detalhar todo o desenvolvimento psicomotor do
paciente, nem mesmo o desenvolvimento do processo de alimen-
tação (aleitamento materno, introdução da mamadeira, dos ali-
mentos pastosos e sólidos, e assim por diante), uma vez que o
importante é determinar hábitos nocivos, tanto de alimentação,
quanto parafuncionais, que tenham participação atual sobre todo
o sistema estomatognático.
É muito importante que se aproveite este primeiro contato
para se observar questões posturais quanto à cabeça em
relação ao pescoço, este em relação aos ombros e assim por
diante, bem como em relação à posição em repouso de lábios
e língua, e mesmo vícios de articulação ou hábitos (mordiscar os
lábios ou bochechas, passar a língua sobre o lábio, interpor o
lábio inferior entre as arcadas, etc.).
Quanto à fala
Questiona-se o paciente quanto à presença de dificuldades ou
impedimentos na articulação dos fonemas/sons. Observamos
que, embora sejam muito comuns as alterações articulatórias,
principalmente as distorções relacionadas ao ponto articulatório
dos fonemas, em pacientes portadores de deformidades
dentofaciais, geralmente tais alterações não são conscientes no
paciente, até mesmo por não serem acusticamente perceptíveis
para um ouvido menos treinado, a não ser no caso do sigmatismo
(ceceio) frontal e/ou lateral moderado ou severo.
Não podemos esquecer, ainda, de anotar os dados referentes
à Saúde Geral do paciente, bem como aos Antecedentes Pes-
soais e Familiares (relativos à deformidade apresentada) e trata-
mentos ortodônticos, fonoaudiológicos, medicamentosos e/ou
cirúrgicos realizados, que são de suma importância para a com-
preensão global de cada caso. Muitas vezes encontramos um
paciente que já consultou diversos profissionais em diferentes
áreas (ortodontistas, primeira e principalmente, bem como cirur-
giões plásticos e bucomaxilofaciais ou fonoaudiólogos) antes de
optar pelo diagnóstico e condutas atuais, à procura de uma
solução para o seu problema. Desse modo, consideramos impor-
tante que se conheça, ainda, o caminho percorrido pelo paciente
até chegar à consulta fonoaudiológica. Esses dados podem
contribuir de maneira preciosa para que possamos compreender
a motivação do paciente quanto à cirurgia além de seu nível de
ansiedade, desenvolvimento afetivo, dedicação, sua confiança na
equipe atual, etc.
Exame
O exame fonoaudiológico baseia-se, fundamentalmente, na
observação do indivíduo do ponto de vista estático – aspectos da
anatomia, morfologia e postura das estruturas orofaciais – e,
principalmente, dinâmicos, isto é, durante a realização das dife-
rentes atividades funcionais. O objetivo é detectar desequilíbrios
importantes que possam interferir negativamente na cirurgia (D’
AGOSTINO, 1987 e 1988), sendo os dados obtidos, em sua maioria,
de caráter subjetivo e, portanto, qualitativos e não quantitativos. É,
no entanto, importante estabelecer alguns parâmetros mensurá-
veis para uma comparação efetiva entre os resultados pré e pós-
cirúrgicos (ALTMANN, 1987).
De um modo geral, a avaliação destes pacientes segue os
preceitos já discutidos, no capítulo anterior, da avaliação habitual
do sistema estomatognático.
796 Fonoaudiologia Prática
Devem-se considerar:
Simetria e proporção facial: a) ântero-posterior: posição da
maxila em relação à mandíbula; b ) craniocaudal: relação entre
terços superior, médio e inferior da face; c) látero-lateral: assime-
tria de hemifaces, cuja presença, quando relacionada aos tecidos
moles, pode indicar a presença de uma mastigação unilateral,
salvo os casos de atrofias hemicraniofaciais.
Postura de cabeça e ombros
A posição fisiológica da mandíbula em repouso depende da
posição da cabeça, assim como mudanças na posição da cabeça
também produzem mudanças na posição da língua na cavidade
oral (SCHWARZ, 1928). Além disso, a duração da fase de mascagem
do músculo masseter mostrou-se reduzida quando a cabeça
estava flexionada para frente e aumentada quando flexionada
para trás, assim como a atividade integrada máxima da EMG
(eletromiografia) mostrou-se diminuída para o músculo masseter
quando a cabeça estava fletida para frente em estudo realizado
por WINNBERG & PANCHERZ (1983).
Exame dos órgãos fonoarticulatórios (lábios, língua, freios
labiais e lingual, bochechas, palato mole e duro, arcos dentários):
quanto aos seus aspectos anatomomorfológicos; além da inspe-
ção da orofaringe com relação à presença de amígdalas
hipertróficas.
A mobilidade de lábios, língua, bochechas, palato mole e
mandíbula é avaliada pedindo-se ao paciente para executar, ou
reproduzir a partir de modelo, tanto movimentos simples quanto
seqüencializados. Nos casos destes pacientes, a serem subme-
tidos à uma cirurgia ortognática, não é comum que se apresentem
problemas significativos nessa área, a não ser na presença de um
freio lingual muito anteriorizado, por exemplo, prejudicando a
movimentação da língua.
Nos casos onde existam dúvidas quanto à integridade do
fechamento velofaríngeo, na presença de uma hipernasalidade
leve ou mesmo discreta, por exemplo, deve-se realizar uma
avaliação minuciosa de tal esfíncter por meio de endoscopia
flexível (nasofaringolaringoscopia), preferencialmente. Tal proce-
dimento é particularmente importante nas programações de avan-
ço maxilar, principalmente na presença de fissuras palatinas.
Devem-se sempre relacionar os dados obtidos durante a
avaliação da morfologia e força muscular à tipologia facial obser-
vada, segundo seu perfil ósseo e com relação aos tecidos moles.
Relacionamos, ainda, o tipo facial ao tipo de mordida e de oclusão
apresentadas, do mesmo modo que anotamos a presença de
agenesias de elementos dentários, falhas por extrações, altera-
ções de implantação dentária, diástemas, desvios da linha média,
o estado de conservação dos dentes, etc.
Ainda com relação à intervenção da forma na função, quanto
ao tamanho e conformação do palato duro, se ogival pode estar
relacionado à presença de uma respiração de modo oral e, por
Cirurgia Ortognática e Fonoaudiologia 797
Leitura recomendada
ALTMANN, E.B.C. – Avaliação miofuncional nas deformidades
maxilomandibulares. In: PSILLAKIS, J. M.; ZANINI, A.S.; MÉLEGA,
M.J.; COSTA, A.E.; CRUZ, L.R. Cirurgia Craniomaxilofacial –
Osteotomias Estéticas da Face . Rio de Janeiro, MEDSI, 1987. pp.
325-331.
ALTMANN, E.B.C.; D’AGOSTINO, L.; PSILLAKIS, J.M. – Tratamento
fonoaudiológico nas deformidades maxilomandibulares. In:
PSILLAKIS, J.M.; ZANINI, A.S.; MÉLEGA, M.J.; COSTA, A.E.;
CRUZ, L. R. Cirurgia Craniomaxilofacial – Osteotomias Estéticas da
Face. Rio de Janeiro, MEDSI, 1987.
BELL, W.H. – Modern Practice in Orthognathic and Reconstructive
Surgery. Vol 3. Philadelphia, W.B. Saunders, 1992. pp. 2110 – 2169.
BIANCHINI, E.M.G. – Desproporções maxilomandibulares: atuação
fonoaudiológica com pacientes submetidos à cirurgia ortognática.
In: MARCHESAN, I. Q.; BOLAFFI, C.; GOMES, I.C.D.; ZORZI, J. L.
Tópicos em Fonoaudiologia 1995. Vol. II. São Paulo, Lovise, 1995.
BRADLEY, R.M. – Fisiologia Oral Básica. São Paulo. Panamericana,
1981.
CALDWELL, J.B. & LETTERMAN, G.S. – Vertical osteotomy in the
mandibular rami for correction of prognathism. J. Oral Surg., 12:185,
1954.
D’AGOSTINO, L. – Características fonoaudiológicas nas deformidades
maxilomandibulares. In: PSILLAKIS, J.M.; ZANINI, A.S.; MÉLEGA,
M.J.; COSTA, A.E.; CRUZ, L. R. Cirurgia Craniomaxilofacial –
Osteotomias Estéticas da Face . Rio de Janeiro, MEDSI, 1987. pp.
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________________ – Princípios de fonoaudiologia nas deformidades
craniofaciais. In: MÉLEGA, M.J.; ZANINI, A.S.; PSILLAKIS, J.M.
Cirurgia Plástica Reparadora e Estética. Rio de Janeiro, MEDSI,
1988. pp. 307-319.
DALPONT, G. – Retromolar osteotomy for correction of prognathism.
J.Oral Surg., 19:42,1961.
EPKER, B.N. & WOLFORD, L.M. – DentoFacial Deformities Surgical –
Orthodontic Correction. St. Louis, C.V. Mosby, 1980. 477pp.
EPKER, B.N.; STELLA, J.P.; FISH, L.C. – DentoFacial Deformities. St.
Louis, C.V. Mosby, 1996.
JUNQUEIRA, P. & CAMPIOTTO, A.R. – A investigação da mastigação
em indivíduos portadores de classe III de Angle. Pró-fono. Rev. At.
Cient., 4(2): 1992.
KABAN, L. – Pediatric Oral and Maxillofacial Surgery. W.B. Saunders
Company, 1990.
KÖHLER, N.R.W.; KÖHLER, G.I.; KÖHLER, J.F. – Anomalias
morfofuncionais da face: uma introdução à visão etiológica e tera-
pêutica multidisciplinar. In: Tópicos em Fonoaudiologia II . São
Paulo, Lovise, 1995, pp. 93-127.
804 Fonoaudiologia Prática
35
Desordens
Temporomandibulares
Nicolas Tenorio-Cabezas
ANATOMIA DA ARTICULAÇÃO
TEMPOROMANDIBULAR
A articulação temporomandibular (ATM) está localizada entre
a região distal e superior terminal da mandíbula e a região inferior
e lateral do osso temporal, sendo limitada posteriormente pela
espinha pós-glenóide, a região escamosa do temporal, o conduto
auditivo externo e a região posterior da fossa mandibular, anterior-
mente pelo tubérculo articular, medialmente pela espinha do
esfenóide, lateralmente pela parede lateral externa da fossa
mandibular e o músculo masseter, superiormente pelo osso
temporal e arco zigomático.
É importante enfatizar que a oclusão dentária influencia nota-
velmente a posição e movimentos das estruturas internas da
cápsula articular, o disco interarticular é ajustado entre as super-
fícies articulares e serve para compensar as irregularidades
destas superfícies articulares, adaptando-se perfeitamente sobre
as superfícies recíprocas contrárias.
COMPONENTES ARTICULARES
A ATM é um elemento do aparelho estomatognático, constituin-
do um sistema dinâmico. As características anatômicas e funcio-
nais serão analisadas em conjunto com as morfológicas, que as
classificam como articulação ou diartrose, sendo seu mecanismo
funcional baseado nos princípios de uma articulação côncavo-
convexa, na qual, em cada articulação, existem duas articulações,
806 Fonoaudiologia Prática
1 9 7
6
3
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6 13
5
6
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16
4
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15
Côndilo mandibular
O côndilo da mandíbula é composto pela cabeça e pescoço;
a cabeça é de forma ovóide, convexa muito mais no sentido
ântero-posterior e menos em sentido mediolateral e com conve-
xidade aumentando ao redor do pólo medial; a parte superior do
côndilo é a superfície que articula junto à ATM, apresentando o
eixo perpendicular ao ramo da mandíbula. Numa vista lateral, o
Desordens Temporomandibulares 807
Fossa mandibular
É composta inteiramente pela porção escamosa do osso
temporal, localizada na face inferior do osso temporal, anterior
aos elementos do tímpano do complexo temporal, sendo, na
parte posterior, côncava tanto no sentido lateral quanto ântero-
posterior. Sua parte anterior apresenta uma eminência articular
convexa.
Do ponto de vista funcional, a parte côncava da fossa mandi-
bular não constitui um componente funcional da mesma, servindo
apenas como receptor para o côndilo, quando se aproxima a
mandíbula da maxila; a parte superior está constituída pela
superfície côncava superior do disco e o côndilo da mandíbula. Ao
relacionar as superfícies articulares tanto da eminência articular
quanto do côndilo mandibular, estas apresentam as superfícies
articulares convexas e, portanto, há uma relação incongruente
que torna necessária a existência do disco que passa a ser a
compensação funcional desta incongruência.
A fossa mandibular encontra-se localizada abaixo e na frente
do meato acústico externo, é limitada, no meio, pela fissura
escamotimpânica e atrás pelo tubérculo pós-glenóide do osso
temporal que forma o limite posterior da fossa mandibular. A
porção timpânica do osso temporal encontra-se atrás da ATM, e
com o tubérculo pós-glenóide evita-se um deslocamento posterior
que traumatizaria esta área.
Eminência articular
A eminência articular é o côndilo do osso temporal que forma
o limite anterior da fossa mandibular, convexa no sentido ântero-
posterior; sua superfície anterior apresenta uma inclinação suave
que tem continuidade com a raiz média do arco zigomático; sendo
o côndilo e o disco articular movimentados para frente da eminên-
cia articular, quando se realiza a abertura bucal normal, esta
posição é considerada fisiológica.
808 Fonoaudiologia Prática
Disco articular
O disco articular é uma placa de forma ovalada, com perfil em
S itálico nos cortes sagitais. O disco separa a ATM em dois
compartimentos, que além de dividir em duas cavidades por
intermédio das superfícies bicôncavas, estas são recíprocas e
congruentes nos dois compartimentos, de tal modo que, funcio-
nalmente, tanto o côndilo como a eminência articular do osso
temporal encontram-se em contato, não entre si, mas contra a
superfície oposta do disco. A porção central é mais delgada do que
as margens, onde o tecido fibroso é mais denso; a porção central
do disco tem de 1 a 2 mm de espessura e está localizada entre as
superfícies articulares que suportam pressão; esta porção do
disco é avascular e não está inervada.
Pela parte medial e lateral, o disco se insere dentro das
margens laterais rugosas do côndilo. Nesse sentido, o disco e a
cápsula estão separadamente unidos medial e lateralmente em
inserções independentes da cápsula, o que permite que o disco se
movimente com o côndilo (RAYNE, 1987; OKENSON , 1991).
Na parte posterior, o disco está conectado à cápsula por um
coxim esponjoso retrodiscal que se curva abaixo e ao lado do
côndilo, apresentando uma área de tecido frouxo ricamente
vascularizado denominado “zona retrodiscal”. Nesta área, o disco
se une à cápsula fibrosa que envolve a articulação. Ele está
formado por uma camada inferior e superior de feixes alargados
de tecido conjuntivo, denominada “zona bilaminar”; as camadas
emergem e divergem do disco para o fuso com a cápsula articular
acima e abaixo. O estrato superior ou lâmina superior liga-se ao
processo pós-glenóide e sua borda medial é o verdadeiro limite
posterior da articulação. Esta lâmina é fixada por fibras elásticas
que exercem um efeito retrátil no disco, sob certas condições; a
lâmina inferior curva-se inferiormente ao lado do côndilo, unindo-
se à cápsula no limite inferior do espaço articular, no colo condilar.
Pela frente, o disco encontra-se em conexão com a cápsula, onde
o feixe superior do músculo pterigóide lateral se insere, através da
cápsula na parte média do bordo anterior do disco (WILKINSON,
1988; CARPENTIER e cols. 1988; WILKINSON & CHANG, 1989; DEO
e cols., 1988); outros autores não compartilham esta opinião,
acreditam que só em alguns pode-se encontrar uma verdadeira
inserção (YUNG e cols., 1990; LOUGHNER e cols., 1996).
O disco é estabilizado pelos ligamentos ao côndilo, de tal
forma que este fique fixo em posição, evitando que se movimente
para trás e para acima, quando a mandíbula exerce uma grande
pressão.
Cápsula articular
É uma membrana fibrosa e fina que envolve a ATM; insere-se
no osso temporal nos limites médio e lateral da fossa mandibular
e na frente, até a eminência articular, e atrás, aparece na super-
Desordens Temporomandibulares 809
Ligamentos
1. O ligamento temporomandibular é um ligamento denomina-
do colateral, e apresenta suas fibras orientadas de tal maneira,
que nos movimentos da articulação estas fibras não são distendidas
ou relaxadas o que indica que os ligamentos da ATM não restrin-
gem o movimento normal da mandíbula e, por isso, não são
necessários para o funcionamento da articulação. Embora acre-
dite-se que este ligamento limite os movimentos retrusivos da
mandíbula, protegendo os tecidos da região posterior da ATM.
2. O ligamento esfenomandibular é um resquício da cartilagem
de Meckel; eleva-se a partir da espinha angular do osso esfenóide
e da fissura petrotimpânica e depois corre em direção posterior e
externamente até inserir-se na língua da mandíbula; este ligamento
é passivo durante os movimentos da mandíbula, mantendo relativa-
mente a mesma intensidade de tensão durante a abertura e o
fechamento da boca.
3. O ligamento estilomandibular é uma densa concentração
localizada na fáscia cervical; estendendo-se a partir do processo
estilóide para o ângulo mandibular, cobrindo a superfície externa
do processo e do ligamento estilóide e ligando-se ao osso na parte
posterior do ângulo mandibular, difundindo-se anteriormente como
ampla lâmina fascial cobrindo a superfície interna do músculo
pterigóide medial; o ligamento estilomandibular está frouxo quan-
do as arcadas estão fechadas ou quando a mandíbula está em
repouso e relaxa-se notoriamente quando a boca está aberta,
porque o ângulo da mandíbula oscila para cima e para trás e ao
mesmo tempo o côndilo desliza para baixo e para frente.
Membrana sinovial
A membrana sinovial é uma fina camada muito vascularizada
de tecido conjuntivo, que reveste as superfícies da ATM, não
suporta pressão e não é funcionante; esta membrana é especial-
mente abundante nos setores mais vascularizados e inervados
das superfícies superior e inferior da zona retrodiscal, sempre se
apresentando nas regiões periféricas à área funcional.
Estes tecidos produzem o líquido sinovial, que é um dialisado
dos vasos sangüíneos; é formado principalmente de uma
proteoglicana que contém ácido hialurônico e um complexo de
mucopolissacarídeos que reforçam as proteoglicanas dentro de
um dialisado plasmático, dando as características de lubrifican-
te e deslizante ao líquido sinovial. A quantidade de líquido
sinovial aumenta quando a articulação encontra-se sob maior
810 Fonoaudiologia Prática
DESORDENS TEMPOROMANDIBULARES
As desordens temporomandibulares (DTM) são caracteriza-
das como doenças que envolvem vários problemas clínicos,
comprometendo os músculos da mastigação; a ATM e estruturas
orofaciais associadas são as principais causas de dor de origem
não-dental na região orofacial.
O sintoma mais comumente encontrado é a dor nos músculos
da mastigação, na região pré-auricular e na ATM. Também
apresentam estalos articulares e dificuldade de abertura bucal.
Apresentamos a seguir os principais diagnósticos de acordo
com a American Academy of Oral Pain (1993).
Desordens internas
Deslocamentos do disco
Deslocamento do disco com redução – O disco está deslo-
cado da sua posição entre o côndilo e a eminência para uma
posição anterior e medial ou lateral, mas redução em abertura
total, geralmente resultando em um ruído.
A) Terapia inicial
1. Descanso articular por redução do uso da mandíbula por
dieta mole e limitação de movimentos.
2. Aplicação de bolsas de calor ou gelo.
3. Medicação analgésica e drogas antiinflamatórias não este-
róides (AINE) quando necessárias.
4. Explicação detalhada das desordens aos pacientes, com
linguagem clara e simples.
Concomitantemente é realizada uma conscientização dos
hábitos parafuncionais para se conseguir uma modificação do
comportamento:
1. Educar o paciente para evitar hábitos de apertar os dentes e de
manter tensão muscular nos músculos orofaciais e da mastigação.
2. Ensinar ao paciente exercícios de conscientização de
postura de ombros, cabeça, mandíbula e língua.
3. Realizar consulta psicológica para detectar e reduzir estresse.
4. Indicar tratamento para conseguir o relaxamento.
D) Condições inflamatórias
a) Artralgia
• Sinovite.
Tratamento
1. Se a origem da dor é duvidosa, realizar bloqueio anestésico.
2. Dor intracapsular é tratada como osteoartrite, incluindo
terapia inicial e placa estabilizadora.
3. Se a dor for refratária a isto e persistente, considerar
artrocentese.
• Injúria traumática.
• Capsulite.
Tratamento
1. Tratar com terapia inicial incluindo drogas antiinflamatórias
não-esteróides.
2. Terapia física na fase aguda e também como suporte.
3. Seqüelas pós-traumáticas são tratadas de acordo com o
diagnóstico: estalido, travamento, alterações oclusais ou até,
em alguns casos, anquilose articular.
4. Deslocamento condilar demonstrado radiograficamente
deve ser reduzido manualmente, às vezes com sedação endo-
venosa.
5. Estiramento traumático de ligamentos e músculos são
tratados com terapia inicial e física para aliviar sintomas agudos.
a) Dor miofascial
Tratamento
1. Terapia inicial por 14 a 21 dias, no mínimo.
2. Medicação antiinflamatória não-esteróide para controlar o
edema e inflamação.
3. Assim que inflamação e dor cessarem, instituir exercícios de
mandíbula e língua para obter coordenação, força, comprimento
e postura muscular.
4. Havendo hábitos de apertar e ranger dentes, devemos
indicar o uso de placa estabilizadora nas primeiras 6 a 8 semanas
(exceto durante a alimentação), para relaxar, estabilizar e prote-
ger estruturas e reduzir atividade muscular noturna. Ajustar a pla-
ca para obter contatos em relação cêntrica e habitual e deso-
clusão anterior. Paciente não deve morder a placa, pois ela não
tem por finalidade repor ou realinhar a mandíbula. O não uso da
placa para comer previne má-oclusão induzida pela mesma.
5. Alguns pacientes podem se queixar de oclusão instável repe-
tida e consistente, o que pode ser corrigido com ajuste oclusal, porém
somente após a resolução dos sintomas mantida por algum tempo.
6. Se problemas oclusais extensos existem, pode ser necessá-
rio tratamento ortodôntico, prótese ou cirurgia ortognática, porém
sua indicação não deve ser diferente daquela de pacientes normais.
7. Na suspeita de tensão muscular orofacial, dar ênfase ao
treinamento de postura correta e relaxamento de mandíbula e
língua. Se há travamento reflexo ou trismo são indicados exercí-
cios de estiramento.
8. Se há dor miofascial generalizada, usar vapor de gelo,
massagem, injeção anestésica (procaína) em trigger points, se-
guidos de estiramento dos músculos envolvidos. Concomitante-
mente, exercícios caseiros e relaxamento devem ser instituídos.
9. Se a dor persistir por mais de 3 a 4 semanas, checar o
cumprimento dos exercícios caseiros, pois muitas vezes não são
executados regular ou corretamente.
Desordens Temporomandibulares 819
b) Miosite
Tratamento
1. Terapia inicial com bolsa de gelo.
2. Medicação antiinflamatória não-esteróide.
3. Terapia física (ultra-som, TENS).
4. É contraproducente a placa oclusal, a não ser em evidente
presença de bruxismo.
c) Espasmo
Tratamento
1. Aplicar gelo e estirar o músculo nos limites suportáveis.
2. Medicação relaxante muscular.
3. Placa estabilizadora.
4. Terapia de modificação de comportamento.
5. Terapia física de mobilização para restabelecer comprimen-
to muscular e diminuir atividade. Programa de exercícios.
6. Bloqueio anestésico e estiramento passivo do músculo, se
necessário.
Agradecimentos
À Cirurgiã Dentista Francine Ribeiro de Arruda pela revisão bibliográfica e
correção do texto.
Leitura recomendada
ASH, C.M. & PINTO, O.F. – The temporomandibular joint and the middle
ear: structural and functional correlates for aural symptoms associated
with temporomandibular joint dysfunction. Int. J. Prosthodont., 4:51-57,
1991.
BARROS, J.J. – Estudos morfológicos do disco da articulação
temporomandibular no homem, em diferentes grupos etários e seu
possível significado etiológico e clínico. Tese de Doutorado apresen-
tada à Faculdade de Odontologia da USP, 1973.
BARROS, J.J. & RODE, S.M. – Tratamento das Disfunções
Craniomandibulares – ATM. São Paulo, Livraria Santos, 1995.
371pp.
BLAUSTEIN, D.I. & HEFFEZ, L.B. – Artroscopic Atlas of the Temporo-
mandibular Joint. Philadelphia, Lea & Febiger, 1990. 117pp.
CARPENTIER, P.; YUNG, J.P.; MARGUELLES-BONNET, R.;
MEUNISSIER, M. – Insertions of the lateral pterigoid muscle: an
anatomic study of the human temporomandibular joint. J. Oral
Maxillofac. Surg., 46:477-482, 1988.
DEO, P.C.; YUNG, J.P.; MARGUELLES-BONNET, R.; MEUNISSIER,
M. – Insertions of the lateral pterygoid muscle: an anatomic study of
820 Fonoaudiologia Prática
36
Atuação Fonoaudiológica na
Desordem
Temporomandibular
Wanderlene Anelli
Questiona-se quanto:
• saúde geral/sono;
• tensão corporal;
• hábitos parafuncionais e de postura da mandíbula;
• funções estomatognáticas;
• dentes/próteses dentárias/tratamento ortodôntico;
• voz;
• psicodinâmica, incluindo satisfação pessoal e motivação no
ambiente de trabalho, social e familiar.
É necessário verificar se o paciente já fez algum tratamento
com relação à queixa apresentada.
É de grande importância ouvir o paciente no que ele tiver a
necessidade de falar, esclarecer, questionar. Porque muito do que
ele tem a dizer normalmente está diretamente relacionado à dor
que ele sente e é o motivo pelo qual ele procura os profissionais
que o tratam e neste momento o fonoaudiólogo.
A avaliação clínica fonoaudiológica deve iniciar observando-
se a postura corporal do indivíduo, principalmente quanto à coluna
vertebral, ombros, posição da cabeça em repouso, assimetrias
entre os lados do corpo. Observar a tonicidade muscular geral do
corpo, atendo-se à região cervical e pescoço.
Observar a face, verificando se há assimetria entre as hemifaces
e as porções superior, média e inferior. Constatar o tipo facial
(mesofacial, dólicofacial, braquifacial) do paciente é importante
para verificarmos a adaptação feita pelos órgãos fonoarticulatórios
(OFA) no repouso e nas funções estomatognáticas.
Na avaliação, devem-se verificar a morfologia, tonicidade e
mobilidade dos OFAs.
Leitura recomendada
BARROS, J.J. – Mioterapia na Síndrome de Dor e Disfunção da Articu-
lação Temporomandibular in Cirurgia e Traumatologia Buco Maxilo
Facial. São Paulo, 1993.
CORREIA, F.A.S. – Aspectos fonoaudiológicos da ATM. In: BARROS, J.J.
& RODE, S.M. Tratamento das Disfunções Craniomandibulares –
ATM. Editora Santos, 1995.
FELÍCIO, C.M. – Fonoaudiologia nas Distúrbios Temporomandibulares.
São Paulo, Pancast Editora, 1994.
LOPES, M.G.P. & RODE,S.M. – Meios fisioterápicos no tratamento das
disfunções da ATM. In: BARROS, J.J. & RODE, S.M. Tratamento
das Disfunções Craniomandibulares – ATM. São Paulo, Editora
Santos,1995.
MOLINA, O.F. – Disfunção da ATM in Fisiopatologia Craniomandibular.
São Paulo, Pancast Editora, 1989.
MOLINA, O.F. – Função e Distribuição da Musculatura do Aparelho
Estomatognático in Fisiopatologia Craniomandibular. São Paulo,
Pancast Editora, 1989.
MOLINA, O.F. – Modalidades de Tratamento in Fisiopatologia
Craniomandibular. São Paulo, Pancast Editora, 1989.
PORTNOI, A.G. – Estresse e distúrbios craniomandibulares. In: BAR-
ROS, J.J. & RODE, S.M. Tratamento das Disfunções Craniomandi-
bulares – ATM. Editora Santos, São Paulo, 1995.
Fissuras Labiopalatinas e Insuficiência Velofaríngea 829
37
Fissuras Labiopalatinas e
Insuficiência Velofaríngea
Lídia D’Agostino
Liliane Pereira Machado
Rejane Aparecida de Lima
A B
C D
E F
FIGURA 37.1 – A) Fissura pré-forame incompleta unilateral esquerda. B) Fissura pré-forame completa
unilateral esquerda. C) Fissura pós-forame completa. D) Fissura pós-forame incompleta. E) Fissura
transforame unilateral esquerda. F) Fissura transforame bilateral.
A B
FIGURA 37.2 – A) Fissura pré-forame cicatricial de Keith. B) Observa-se durante a protrusão labial,
depressão na cicatriz.
A B
FIGURA 37.4 – A) Fissura submucosa, nota-se zona translúcida mediana no palato. B) Visão
nasolaringoscópica de fissura submucosa oculta, nota-se depressão na superfície do véu palatino.
Fissuras Labiopalatinas e Insuficiência Velofaríngea 833
Fissura submucosa
Na fissura submucosa ocorre a clássica tríade, associada à
voz de qualidade predominantemente nasal:
• Úvula bífida.
• Diástase da musculatura velar, observando-se uma zona
translúcida mediana.
• Chanfradura na borda posterior do palato (palpável com o
dedo).
ATUAÇÃO INTERDISCIPLINAR
A reabilitação completa dos pacientes portadores de fissuras
labiopalatinas constitui a meta principal de todo o tratamento
realizado em equipe (Fig. 37.5). O tratamento não é exclusiva-
mente cirúrgico, mas sim interdisciplinar, no qual todas as áreas
se complementam. Cada profissional faz sua avaliação específi-
ca, estabelece o seu seguimento pré e pós-cirúrgico dentro do
Fissuras Labiopalatinas e Insuficiência Velofaríngea 835
Equipe interdisciplinar:
Cirurgia plástica
Genética
Pediatria
Otorrinolaringologia
Ortodontia e ortopedia funcional dos maxilares
Nutrição
Fonoaudiologia
Saúde mental
Serviço social
Outros
Cirurgia plástica
Nutrição Genética
Otorrino Outros
Fonoaudiologia
Cirurgia plástica
O cirurgião plástico faz a avaliação do tipo de fissura, planeja a
cronologia do seu tratamento e realiza a cirurgia. É fundamental que
o cirurgião conheça a fundo as alterações anatômicas específicas
das fissuras labiopalatinas, a fim de restaurar a anatomia e propor-
cionar o equilíbrio muscular, restabelecendo as funções alteradas e
promovendo um crescimento facial adequado, possibilitando assim
a correção funcional a ser realizada pelo fonoaudiólogo.
A cronologia e a técnica cirúrgica eleita variam segundo cada
cirurgião. A maioria dos cirurgiões realiza a queiloplastia, correção
cirúrgica dos lábios, por volta dos 3 meses de idade. Nesta época,
a criança já atingiu o peso adequado, cerca de 6 kg, e a região
labial apresenta dimensões anatômicas favoráveis para serem
manipuladas cirurgicamente. Cuidados especiais devem ser to-
836 Fonoaudiologia Prática
Genética
O geneticista avalia o caso para determinar possíveis causas
e orienta a família quanto ao risco de repetição da patologia. Nos
casos de fissuras labiopalatinas associadas a síndromes, o
diagnóstico detalhado é importante no planejamento cirúrgico e
demais tratamentos. Por exemplo, na Trissomia 13 (síndrome de
Patau) há importante cardiopatia; na síndrome velocardiofacial há
risco de secção da artéria carótida durante a faringoplastia devido
à presença de ectopia da carótida.
O aconselhamento genético oferece à família a opção de gerar
ou não outros filhos mediante o conhecimento do risco de repeti-
ção da patologia.
Pediatria
O pediatra avalia o desenvolvimento ponderoestatural e as
condições gerais da criança, verificando se há queixa quanto a
dificuldades constantes de deglutição comprometendo o estado
nutricional, que pode ser um problema isolado próprio da fissura,
decorrente de distúrbios transitórios normais da infância ou patolo-
gias que requerem conhecimentos de áreas específicas como
neurologia, pneumologia gastroenterologia e otorrinolaringologia.
Fissuras Labiopalatinas e Insuficiência Velofaríngea 837
Otorrinolaringologia
O otorrinolaringologista realiza o diagnóstico, o acompanha-
mento e a conduta nos casos de infecções e alterações auditivas,
de vias aéreas superiores, de faringe e de laringe.
Os indivíduos portadores de malformações craniofaciais são
de risco para o desenvolvimento de perdas auditivas de acordo
com o Joint Committee on Infant Hearing (1994). MACHADO e cols.
(1995) identificaram cerca de 76% de achados imitanciométricos
sugestivos de alteração condutiva em indivíduos portadores de
fissuras palatinas nas idades de 2 meses a 12 anos, independen-
temente da correção cirúrgica do palato.
A atresia parcial de coanas é outra malformação associada
às fissuras labiopalatinas, principalmente nos quadros
sindrômicos, considerada um fator determinante de dificuldade
de respiração no recém-nascido e que requer o acompanha-
mento otorrinolaringológico.
Ortodontia e odontopediatria
A seqüela óssea das fissuras labiopalatinas determina altera-
ções importantes no crescimento dos processos alveolares e das
arcadas dentárias, interferindo no crescimento facial, caracteriza-
do por hipoplasia maxilar. A intervenção da ortopedia funcional
pré e pós-cirúrgica são de fundamental importância para direcio-
nar o crescimento dos segmentos alveolares e propiciar correção
ortodôntica (Fig. 37.6A e B; e Fig. 37.7A e B).
A B
FIGURA 37.6 – A) Fissura transforame bilateral com protrusão da pré-maxila. B) Fissura transforame
unilateral muito larga, com úlcera de contato na mucosa do vômer causada pelo bico da mamadeira.
Indicação de uso de placa palatina pré-cirúrgica em ambos os casos.
838 Fonoaudiologia Prática
A B
FIGURA 37.7 – A) Placa palatina – ortopedia pré-cirúrgica. B) Bebê com a placa palatina. (Fotos cedidas
pela Profª. Drª. Márcia André. Disciplina de Prótese Buco-maxilo-facial da Faculdade de Odontologia
da Universidade de São Paulo/FOUSP.)
Nutrição
Os pacientes portadores de fissuras labiopalatinas freqüen-
temente apresentam carência nutricional por falta de informa-
ção da família em relação ao valor nutritivo dos alimentos e
medo de alimentar a criança frente às dificuldades de alimenta-
ção por via oral. O nutricionista, em conjunto com o pediatra e
o fonoaudiólogo, orienta a mãe principalmente nos casos em
que a presença de anemia e baixo peso impossibilitam a cirurgia
dentro da cronologia eleita.
Fonoaudiologia
O fonoaudiólogo tem atuação efetiva dentro da equipe no
diagnóstico e no acompanhamento pré e pós-cirúrgico, com
intervenções adequadas a cada fase do seu desenvolvimento e
planejamento cirúrgico.
Serviço social
O assistente social faz o estudo sócio-econômico da família,
da dinâmica familiar, do ambiente e das condições de moradia
para detectar possíveis fatores que interfiram no tratamento
proposto pela equipe e estabelece meios para viabilizá-lo.
ATUAÇÃO FONOAUDIOLÓGICA
Recém-nascido
Quando o primeiro atendimento é realizado no berçário, a
atuação deve ser o mais delicada possível, pois uma malformação
na face do recém-nascido é muito difícil de ser aceita pelos pais
e familiares. O sentimento de rejeição está presente e deve ser
encarado, neste momento, como normal, pois a mãe não espera
nove meses por uma criança com problemas, devendo ser auxi-
liada na elaboração da rejeição e na criação de vínculos positivos
com o recém-nascido para poder colaborar efetivamente no
tratamento. É um momento delicado, no qual o vínculo mãe-filho
não está formado e dele dependem funções vitais da criança,
como a amamentação. Este fato nos traz a questão quanto à
dificuldade maior do aleitamento materno ser da criança ou da
mãe em aceitar amamentar um bebê malformado.
O aleitamento materno é um fator importante e necessário para
a formação da imunidade contra infecções respiratórias e otites
médias, entre outras doenças infectocontagiosas, além de propiciar
o adequado desenvolvimento da face e a maturação do sistema
motor oral.
Anamnese
Na anamnese devem constar informações quanto a:
• intercorrências e uso de medicamentos na gestação;
• condições do nascimento;
• intercorrências no parto;
• antecedentes familiares;
• estado emocional da mãe.
Avaliação
Na avaliação do recém-nascido devem-se considerar:
• classificação das características da malformação, no caso
de síndromes; não se conhecendo a classificação, devem-
se descrever as características da malformação como por
exemplo: lábio em formato de gaivota, implantação baixa de
orelha, face assimétrica, fácies atípica;
• reflexos neuromotores;
• condições morfofuncionais dos órgãos fonoarticulatórios;
• condições de alimentação por via oral: relação entre a força
da sucção e o fluxo do leite.
840 Fonoaudiologia Prática
Alimentação
O ideal é o aleitamento materno, mas diante da dificuldade da
criança na alimentação ou da mãe em lidar com a situação,
freqüentemente é adotada a mamadeira. O uso da sonda naso-
gástrica fica restrito a casos especiais como na seqüência de
Pierre Robin nos primeiros dias de vida ou cardiopatias, para se
evitar situações de estresse e esforço e conseqüente perda de
peso e risco de vida.
A postura de alimentação deverá ser totalmente vertical, para
impedir o refluxo nasal e aspiração broncopulmonar.
Quanto ao bico preconiza-se o tipo ortodôntico por ter o
bulbo mais curto, o que propicia a anteriorização da língua.
Normalmente, a língua encontra-se inserida na fenda e, portan-
to, posteriorizada. Contudo, algumas crianças têm dificuldade
de adaptação a este formato de bico, ocorrendo perda significa-
tiva de peso. Nestes casos, temos que ser maleáveis tentando
outros formatos, partindo do princípio de que o bico bom é
aquele no qual a criança consegue sugar. O furo tem que ser
adequado à força de sucção do bebê, com o fluxo de leite
próximo ao gotejar constante, permitindo que a criança se
alimente com ritmo e coordenação da sucção, deglutição e
respiração, mantendo-se sempre o bico cheio de leite evitando-
se assim a ingestão excessiva de ar.
Alguns sinais nos fazem suspeitar de incoordenação de
sucção e de deglutição como a contração e o rubor da região
Fissuras Labiopalatinas e Insuficiência Velofaríngea 841
Fonoaudiólogo
Paciente Família
842 Fonoaudiologia Prática
0 a 3 anos de idade
O acompanhamento nessa fase é mensal, com avaliação do
desenvolvimento global da criança, incluindo orientações à mãe
quanto aos aspectos:
• motor
• auditivo
• cognitivo
• lingüístico
• nutricional
Desenvolvimento cognitivo-motor
O desenvolvimento cognitivo-motor está relacionado ao da
fala, devendo ser valorizado, explicando-se à mãe cada fase do
desenvolvimento na qual o bebê se encontra e orientando-a
quanto a atividades de estimulação. PEREIRA (1995) constatou
que geralmente estas crianças desenvolvem-se hipoativas,
manipuladoras, com contato pobre, dificuldades de vivenciar
situações novas, inseguras e dependentes, introvertidas e emoci-
onalmente imaturas, apresentando conseqüentemente dificulda-
des na área psicomotora.
O desenvolvimento cognitivo motor adequado e a capacidade
de manter a atenção e a concentração em atividades dirigidas são
fatores fundamentais para a realização do processo terapêutico
em torno dos 3 anos de idade.
O desempenho da criança é avaliado nos retornos mensais.
Caso não se encontre dentro dos padrões normais de desenvol-
vimento, deve-se procurar a etiologia orgânica ou funcional,
muitas vezes com um circunstancial agravante e realizar os
devidos encaminhamentos.
Fissuras Labiopalatinas e Insuficiência Velofaríngea 843
Função auditiva
O fonoaudiólogo e a família devem ficar atentos para detectar
possíveis sinais de alterações auditivas. Recomenda-se avalia-
ção audiológica periódica a cada 6 meses através da realização
de audiometria e imitanciometria. A otite média secretora é a
causa mais freqüente das alterações auditivas.
PROCEDIMENTOS FONOAUDIOLÓGICOS NO
PÓS-CIRÚRGICO DAS FISSURAS LABIOPALATINAS
Os cuidados pós-operatórios imediatos envolvem a alimenta-
ção, que deve ser reiniciada tão logo a criança esteja acordada da
anestesia, mantendo dieta líquida e em temperatura ambiente,
844 Fonoaudiologia Prática
Palato mole
• Extensão em relação à parede posterior da faringe.
• Presença de fístulas, cicatrizes hipertróficas ou deiscências.
• Mobilidade do véu palatino e medialização das paredes
laterais da faringe através do reflexo de vômito ou choro em
crianças menores e através da emissão das vogais susten-
tadas /a/ ou /e/ em crianças maiores e adultos.
Palato duro
• Aspecto da cicatriz cirúrgica.
• Presença de fístulas ou deiscências.
• Presença de atresia.
Fatores orgânicos
• Resultado anatomofuncional do tratamento cirúrgico.
• Insuficiência velofaríngea.
• Fatores individuais, como cicatrização.
• Alterações dentárias e oclusais.
• Distúrbios da audição, periférico e/ou central.
• Distúrbios respiratórios.
• Outros comprometimentos.
Fatores funcionais
• Manutenção de padrões neuromusculares aprendidos in-
corretamente.
846 Fonoaudiologia Prática
Fatores circunstanciais
• Desenvolvimento afetivo-emocional.
• Atitudes inadequadas dos pais por superproteção ou aban-
dono.
• Meio ambiente pouco estimulador, principalmente no que se
refere à comunicação e estimulação sonora.
• Orientação inadequada dos profissionais da saúde.
Orgânicas
• Desproporção palatofaríngea congênita constituída por pa-
lato curto congênito, faringomegalia ou associação de ambos.
• Desproporção palatofaríngea adquirida decorrente de ade-
noidectomia.
• Alterações anatômicas dos músculos do palato e do anel
velofaríngeo.
• Paresia ou paralisia palatina, central ou periférica.
Funcionais
• Deficiência mental.
• Deficiência auditiva.
MÚSCULOS PALATOFARÍNGEOS
Os músculos da região da faringe nasal são:
• músculo tensor do véu palatino;
• músculo elevador do véu palatino;
• músculo da úvula (par)
• músculo palatofaríngeo
• músculo constritor superior da faringe;
• músculo palatoglosso.
850 Fonoaudiologia Prática
Músculo palatofaríngeo
Tensiona a parede lateral faríngea superior e medialmente,
estreitando a orofaringe. Sem função nos sons nasais.
Músculo palatoglosso
Movimenta o véu palatino para baixo e para frente.
Ressonância
0. Ressonância normal.
1. Ressonância normal, levemente nasal mas aceitável.
2. Ressonância predominantemente nasal com necessidade
de tratamento.
3. Ressonância severamente nasal com necessidade urgente
de tratamento.
4. Fala ininteligível devido à hipernasalidade.
Articulação
0. Sem articulação glótica (articulação normal).
1. Articulação com enfraquecimento de fonemas.
2. Articulação com pontos corretos e/ou com omissões e
discreta co-articulação glótica.
3. Substituição glótica ocasional e co-articulação considerá-
vel.
4. Substituições glóticas na maioria dos sons plosivos e
fricativos.
Conduta
• Sem insuficiência velofaríngea e com distúrbio articulatório
→ terapia fonoaudiológica.
Lábios
• Cicatrizes hipertróficas, prejudicando a mobilidade: protru-
são, distensão e oclusão labial (Fig. 37.8B).
• Deiscências por infecção ou uso inadequado das técnicas
cirúrgicas (Fig. 37.8C).
Fissuras Labiopalatinas e Insuficiência Velofaríngea 855
A B
Palato anterior
A presença de fístulas e deiscências da mucosa do palato
anterior não prejudicam a voz, porém podem proporcionar escape
nasal de líquidos durante a alimentação. A correção cirúrgica é
realizada após tratamento ortopédico-ortodôntico para expansão
palatina quando há colapso das lâminas, provocado pela retração
cicatricial da mucosa. A intervenção cirúrgica antes do procedi-
mento de separação das lâminas palatinas poderá ser inútil pois,
com a expansão, há risco de recidiva da fístula. O palato anterior
atrésico dificulta a postura lingual em repouso, na articulação dos
fonemas linguoalveolares, assim como, a adequada coaptação
no ato da deglutição (Fig. 37.9).
856 Fonoaudiologia Prática
Palato posterior
As seqüelas do palato posterior, fístulas ou cicatrizes, são
significativas no que diz respeito à fonação, sendo a gravidade
proporcional à dimensão da seqüela.
Fístulas
As fístulas assintomáticas com menos de 5 mm provocam o
escape de líquidos mas não afetam a voz, porém, as maiores
que 5 mm, consideradas sintomáticas, provocam escape de
líquidos, de alimentos e escape nasal durante a emissão fonoarti-
culatória (Fig. 37.10 A e B). A correção das fístulas deve ser feita
posteriormente à terapia fonoarticulatória. No processo tera-
pêutico, não há preocupação com o escape nasal e sim com a
correção fonoarticulatória. Uma vez corrigida a articulação,
realiza-se a avaliação da função velofaríngea através da
nasolaringoscopia. Detectando-se a insuficiência velofaríngea,
o cirurgião plástico realiza a correção da fístula e da insuficiên-
cia velofaríngea num único tempo cirúrgico. Quanto a menos
A B
Cicatrizes
As cicatrizes hipertróficas (Fig. 37.11) são seqüelas que
podem ser decorrentes de grandes descolamentos periostais,
manuseio agressivo dos instrumentos cirúrgicos, falta de domínio
da técnica cirúrgica ou infecções no pós-operatório.
Na avaliação clínica, observa-se hipertrofia da cicatriz cirúrgi-
ca ou mau direcionamento das fibras musculares. Em alguns
casos, na avaliação nasolaringoscópica observa-se boa mobilida-
de das paredes laterais e posterior da faringe, mas o véu palatino
não se aproxima para participar do fechamento velofaríngeo,
limitado pela presença da cicatriz. O palato posterior pode, em
casos mais graves, apresentar-se sem mobilidade devido à perda
de substância por infecção ou necrose por lesão arterial, podendo
ocorrer a perda total desta estrutura.
Seqüela óssea
A B
FIGURA 37.12 – A) Deformidade ântero-posterior. B) Alteração da oclusão dentária.
DEFORMIDADES NASAIS
Na fissura labiopalatina unilateral, a asa do nariz do lado
fissurado apresenta uma inclinação caudal e o lado são, mais
cranial, o que leva a desvio do septo cartilaginoso, horizontalização
e estreitamento da narina fissurada, causando obstrução nasal e
alteração na respiração.
Na fissura labiopalatina bilateral, não observamos desvio do
septo cartilaginoso, uma vez que o mesmo não está implantado
sobre nenhuma das lâminas palatinas, porém a columela é curta, o
que leva a uma horizontalização e estreitamento das narinas,
provocando obstrução nasal e alteração na respiração (Fig. 37.13).
Na avaliação nasolaringoscópica, estas alterações devem ser
consideradas pelo profissional que realiza o exame.
A B
FIGURA 37.13 – A) Deformidade nasal na fissura unilateral. B) Deformidade nasal na fissura bilateral.
Fissuras Labiopalatinas e Insuficiência Velofaríngea 859
Leitura recomendada
AMERICAN ACADEMY OF PEDIATRICS: JOINT COMMITTEE ON
INFANT HEARING – Position statement. Audiology Today, 6(6):6-9,
1994.
BZOCH, K.R. – Communicative Disorders Related to Cleft Lip and
Palate. Boston, Little Brown, 1979.
CAPELOZZA, L.F.; MIRANDA, E.; ALVARES, A.L.G.; ROSSATTO, G.;
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vigentes na epidemiologia das fissuras labiopalatinas. Rev. Bras.
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CARDIM, V.L.N. – Deformidades congênitas craniomaxilofaciais. In:
VELAR, J. Cirurgia Plástica na Infância. Vol 1. São Paulo, Hipócra-
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FONSECA, E.P. & RESENDE, J.R.V. – Incidência das malformações do
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MACHADO, L.P. – Análise comparativa da constrição da região da
faringe nasal em registro modal e basal. Monografia – Especializa-
ção – UNIFESP/EPM. São Paulo, 1996.
860 Fonoaudiologia Prática
38
Atuação Fonoaudiológica
nos Distúrbios Articulatórios
INTRODUÇÃO
FISIOLOGIA DA FALA
Graças ao sistema nervoso central, as estruturas dos siste-
mas respiratório e digestivo puderam associar-se e produzir a fala.
Para WEST (1971) a fala é uma função da respiração, que se
deve às mudanças neurofisiológicas dos reflexos laríngeos, que
podem ocasionar significados discriminatórios (exemplos no por-
tuguês: faca vs. vaca, casa vs. caça, etc.).
A musculatura da articulação recebe impulsos voluntários dos
nervos cranianos: hipoglosso (XII par), glossofaríngeo (IX par) e
plexo faríngeo – glossofaríngeo, vago e acessório (IX, X e XI
pares).
Sabe-se que a menor unidade com significado na linguagem
é a palavra. Para seu reconhecimento, inicialmente a pessoa
recebe os estímulos auditivo, tátil, visual, proprioceptivo e poste-
riormente estes estímulos são levados ao lobo parietal do hemis-
fério esquerdo onde se dá o “reconhecimento consciente” (WEST,
1971). Se a situação exige que a pessoa fale a palavra, então os
estímulos saem do lobo parietal e vão para córtex motor esquerdo
do lobo frontal, e na área de Broca, a palavra torna-se consciente
através da fala. Neste momento, as células motoras especiais da
fissura de Rolando (borda posterior do lobo frontal esquerdo) são
acionadas levando o estímulo para o corpo caloso e transferindo-
o para o hemisfério direito. A partir do momento em que é iniciado
o processo de emissão da palavra, sensações na área são
recebidas. Estas vêm pelas vias auditiva e proprioceptiva. Estas
sensações iniciam os próximos movimentos envolvendo os sons
que deverão ser emitidos, formando portanto as palavras.
Atuação Fonoaudiológica nos Distúrbios Articulatórios 863
SEGMENTOS p b t d k g f v s z s z c j m n ñ R r l λ y w
TRAÇOS
SOANTE – – – – – – – – – – – – – – + + + + + + + + +
SILÁBICO – – – – – – – – – – – – – – – – – – – – – – –
CONSONANTAL + + + + + + + + + + + + + + + + + + + + + – –
CONTÍNUO – – – – – – + + + + + + – – – – + + + + + + +
MET. RETARD. – – – – – – + +
NASAL – – – – – – – – – – – – – – + + + – – – – – –
LATERAL – – – – – – – – – – – – – – – – – – – + + – –
ANTERIOR + + + + – – + + + + – – – – + + – – + + – – –
CORONAL – – + + – – – – + + + + + + – + – – + + + – –
ALTO – – – – + + – – – – + + + + – – + + – – + + +
POSTERIOR – – – – + + – – – – – – – – – – – + – – – – +
SONORO – + – + – + – + – + – + – + + + + + + + + + +
ESTRIDENTE – – – – – – + + + + + + + + – – – – – – – – –
Matriz dos segmentos consonantais do português, segundo o modelo de traços distintivos de CHOMSKY & HALLE
(1968).
DESENVOLVIMENTO DA FALA
Como já foi citado anteriormente, o aprendizado das pala-
vras dá-se devido a uma série de sensações que são substi-
tuídas por palavras. SAUSSURE (1972) chama de signo lingüístico
aquilo que une um conceito a uma imagem acústica. Este não
é o som puramente físico, mas a “impressão psíquica” (p. 80)
desse som.
No processo de aquisição de linguagem, a criança é exposta
ao seu meio ambiente e gradativamente vai depreendendo e
emitindo os sons desta língua, que constituirão a sua fala. Entre-
tanto, nem sempre esse processo ocorre de forma adequada.
O desenvolvimento da fala, segundo PERKINS (1971), é um
produto do desenvolvimento vocal e articulatório, mas principal-
mente do desenvolvimento lingüístico. A motivação para falar é
um aspecto que de forma alguma pode-se esquecer: além do
treino da habilidade para a emissão dos fonemas, a criança
precisa saber o que quer dizer, quais as palavras que devem ser
usadas. Este processo atende especificamente a necessidade de
expressar idéias.
Quando a criança torna-se capaz de selecionar os sons de sua
língua, também as palavras passam a ser escolhidas corretamen-
te, através de escolhas gramaticais e semânticas. Há a seleção
sintática que realizará a formação das frases com conteúdo
significativo. Neste momento, porém, ainda há uma dificuldade: a
inteligibilidade. Nem sempre a criança tem habilidade para a
realização do fonema. Houve o desenvolvimento fonológico ade-
quado, mas que às vezes apresenta certos contrastes com a
produção articulatória.
O que se verifica é que, embora a criança consiga depreender
os fonemas e as características que os diferenciam uns dos
outros, ela ainda não é capaz de produzir estas diferenças na sua
totalidade. Os ajustes motores necessários para tal produção
ainda não são efetivos.
Imagina-se que inicialmente a criança apenas ouça uma série
de ruídos que com o tempo são distinguidos pela melodia,
evidenciando a entonação. Este procedimento favorece a com-
preensão da fala.
Os mecanismos biológicos que determinam a fala são altamen-
te especializados. A aerodinâmica do trato vocal, por exemplo,
permite um melhor controle do pitch e da qualidade dos fonemas.
Além disso, a mobilidade da língua, lábios e palato permite a
acuidade de movimentos, fazendo com que seja relativamente fácil
emitir sons em cadeia. O ajuste laríngeo para a emissão das vogais
é primordial, sendo necessária uma maturação das estruturas, que
ocorre durante o desenvolvimento da criança, a partir do choro.
Alguns fatores podem interferir no processo da articulação dos
fonemas. Segundo SPINELLI e cols. (1984), existem fatores aferen-
tes e eferentes que agem diretamente na produção articulatória.
866 Fonoaudiologia Prática
DESVIOS DA FALA
Para PERKINS (1971) a aquisição dos fonemas dá-se até os 7
anos mais ou menos. Para ele, a memória é imprescindível na
aquisição da fala principalmente para o armazenamento das
informações adquiridas durante todo o desenvolvimento, já que a
fala e a linguagem são aprendidas.
MILISEN (1971) observou que os primeiros estudos sobre as
alterações de fala deram-se por volta da década de 40. O que
provocava muito questionamento e investigação era o fato da fala
ser um processo dinâmico, impossível de se estabelecer padrões
imutáveis. Um mesmo indivíduo pode falar de mil maneiras
diferentes a cada momento, dependendo de seu desejo. Um
mesmo som pode ser modificado pela mesma pessoa desde o seu
nascimento até a sua morte. A variabilidade aumenta, tornando
portanto as situações mais difíceis, em termos de previsão de
como um som será emitido.
Por ser a fala um meio de comunicação, ela envolve o falante
e o ouvinte. No caso de desvios da fala, tanto o falante como seu
interlocutor atuam de forma diferente, interferindo na comunica-
ção. Esta interferência pode ser incômoda e desagradável.
Toda e qualquer ação comunicativa exige atenção. No caso
dos distúrbios, esta atenção desloca o seu foco mais para a forma
como o falante fala, do que para aquilo que ele quer expressar.
Esta situação pode em pouco tempo, por exemplo num diálogo,
criar uma situação embaraçosa e até de rejeição. Cabe lembrar
agora, que há um índice de aceitabilidade, que fará com que a
situação acima descrita seja mais ou menos aceita pelo interlocutor
e pelo falante, que também pode se sentir constrangido pelo seu
defeito. Pode-se depreender portanto, que, a medida para se dizer
se um indivíduo é ou não portador de um distúrbio mais ou menos
grave passa a ser relativa à resposta de um ou de ambos à
situação de comunicação. Segundo VAN RIPER (1972), este fator
de aceitabilidade é muito mais tolerado nas crianças pequenas do
que nas maiores. Espera-se que crianças pequenas falem errado,
mas não se admite que crianças em idade escolar façam o
mesmo.
IRWIN (1946) estudando o comportamento verbal de crianças,
comprovou que a freqüência de produção de sons aumenta até os
30 meses de idade. Nesta época a criança já é capaz de apresen-
tar um comportamento muito parecido com o do adulto. Entretan-
to, existem variações individuais bastante grandes, tanto de
quantidade de fonemas como da ordem de manifestação.
As variações de fala encontradas nas crianças indicam que
um atraso na produção dos fonemas, bem como a redução de
variedade de produção podem constituir um dado de observação
importante para se diagnosticar uma alteração de fala.
Sabe-se que os meninos são mais lentos para adquirir a fala
e apresentam alterações mais freqüentemente do que as meni-
Atuação Fonoaudiológica nos Distúrbios Articulatórios 869
TERAPIA
A partir dos dados obtidos da anamnese e avaliação de
linguagem (embora neste texto tenha-se dado maior ênfase à
avaliação da fala, não se deve esquecer que a linguagem, como
um todo, deve ser analisada) pode-se determinar o plano a ser
executado em terapia.
Desde que se tenha certeza do tipo de alteração de que a
criança é portadora, pode-se estabelecer a conduta necessária.
Naqueles casos em que o paciente apresenta uma alteração
articulatória de origem fonética, é necessário verificar que compo-
Atuação Fonoaudiológica nos Distúrbios Articulatórios 873
Leitura recomendada
ADAMS, A.M. & GATHERCOLE, S.E. – Phonological working memory
and speech production in preschool children. J. Speech Hear. Res.,
38:403-414, 1995.
BARRET, B.A. & HANSON, M.L. – Oral Myofunctional Disorders. St.
Louis, Mosby Company, 1974.
BLOOMER, H.H. – Speech defects associated with dental malocclusions and
related abnormalities. In: TRAVIS, L.E. Handbook of Speech Pathology
and Audiology. New Jersey, Prentice-Hall, Inc., Englewood Cliffs, 1971.
CABRAL, L.S. – Introdução à Lingüística . Porto Alegre, Globo, 1973.
EDWARDS, M.L. – Selection criteria for developing therapy goals. J.
Child. Comm. Dis., 7:36-45,1983.
ERLICH, A. – Speech therapy for tongue thrust correction. Dent. Assist.,
36:22-23, 1967.
FERRAZ, M.C.A. – Terapia miofuncional nos tratamentos oro-faciais. J.
Bras. Reab. Vocal, 3:11-14,1980.
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GUEDES, Z.C.F.; WECKX, L.L.M.; JUSTINO, D.A.F.; WECKX, L.Y. –
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113,1990.
876 Fonoaudiologia Prática
39
Distúrbios de Linguagem em
Crianças Pequenas
Considerações sobre o Desenvolvimento, Avaliação e
Terapia da Linguagem
INTRODUÇÃO
noção pode ser vista quando ela começa a procurar objetos que
desapareceram de seu campo de percepção. Anteriormente à
construção da noção de objeto, toda vez que pessoas ou objetos
deixavam de ser vistos, tocados ou ouvidos, é como se tivessem
deixado também de existir. Porém, nesta fase, os comporta-
mentos da criança, principalmente no sentido de procurar pelos
objetos desaparecidos, revelam que agora, para ela, o mundo
continua existindo, independente dela estar vendo as coisas ou
não.
Nesta fase, a capacidade de imitar também mostra um grande
desenvolvimento. As crianças começam a se interessar por mo-
delos novos, isto é, sons e movimentos que elas ainda não sabiam
produzir. Começam a se interessar também por imitar movimen-
tos que não são visíveis no próprio corpo, como os que envolvem
movimentos na região da face: abrir e fechar a boca, pôr a língua
para fora, segurar a orelha, tocar o dedo no nariz e assim por
diante. O interesse pelas coisas novas vindas dos outros ajuda a
criança a fazer correspondências entre o próprio corpo e o corpo
dos outros e a descobrir possibilidades de expressão que serão
empregadas com fins de comunicação.
Brinquedo simbólico
No que diz respeito ao modo de brincar, a novidade é que,
agora, a criança passa a usar os objetos simbolicamente. Os
brinquedos são utilizados para representar situações vividas
rotineiramente pela criança, como é o caso do dormir, do alimen-
tar-se, do banho: ela faz de conta que está preparando comida
usando uma panelinha e uma colherinha; esfrega uma esponja no
próprio corpo como se estivesse tomando banho; encosta sua
cabeça numa miniatura de cama como se fosse dormir e assim por
diante.
Condutas simbólicas
4. Sistematização da aplicação em outros
5. Seqüências de ações simbólicas
6. Uso de símbolos
• Esquemas simbólicos
Estas condutas marcam o aparecimento de um simbolismo,
ainda elementar, no brincar infantil. Corresponde à reprodução
fictícia, pela criança, daquelas ações que são rotina em sua vida. A
criança faz de conta que come, que toma banho, que dorme, etc.
Todo o simbolismo está ainda centrado no próprio corpo da criança.
• Uso de símbolos
A criança começa a usar substitutos simbólicos dos objetos
criados por ela mesma. Ela se mostra capaz de transformar um
objeto no representante de outro. Ao invés de ficar limitada a usar
miniaturas como símbolos dos objetos reais, a criança cria, ela
mesma, novos símbolos. Por exemplo, pondo seus bonecos para
deitar em miniaturas de camas, constata que um deles ficou sem
cama. Para resolver tal problema, recorre, por exemplo, a uma
peça de bloco de construção retangular e a utiliza como se fosse
a cama faltante para deitar seu boneco. É também comum
observar, neste ponto, o uso das palavras para simbolizar objetos
ausentes. Por exemplo, pegando um boneco a criança diz “vai
tomá banho” e, com sua mão, faz o gesto de abrir uma torneira
dizendo “ligá chuveru” .
Imitação
Quanto à imitação, ao invés de limitar-se a imitar aquilo que
está presenciando diretamente, ou seja, modelos perceptíveis,
a criança começa também a imitar pessoas ou situações ausen-
tes, isto é, coisas que já ocorreram e que, para serem imitadas,
dependem de uma possibilidade de evocação. Desta forma, por
exemplo, tendo presenciado uma cena qualquer pela manhã e,
sem tê-la reproduzido nesta situação, só vem a imitar a mesma
cena pela noite, parecendo evocar, via imitação, o fato já
passado.
888 Fonoaudiologia Prática
Comunicação simbólica
Também a comunicação não-verbal começa a incorporar
atitudes simbólicas.
Gestos simbólicos, que representam ações ou objetos, são
incorporados às formas mais elementares de comunicação não-
verbal, até então limitadas a gestos indicativos. A criança pode,
por exemplo, solicitar algo para tomar fazendo o gesto de beber,
pode solicitar uma boneca fazendo o gesto de ninar e assim por
diante.
O surgimento das condutas simbólicas por volta dos 2 anos
de idade marca o término do período sensoriomotor e o início de
uma nova etapa de desenvolvimento denominada período re-
presentativo que, como o próprio nome sugere, é marcado pela
capacidade que a criança vai adquirindo de lidar com realidades
ausentes.
LINGUAGEM
cognição interação
social
comunicação
pré-verbal
• capacidades cognitivas;
• habilidades sociais;
• níveis de comunicação.
Situação de avaliação
Primeiramente, o fonoaudiólogo pode oferecer os brinquedos
para que a criança os manipule. Sem assumir uma atitude diretiva,
890 Fonoaudiologia Prática
DISTÚRBIOS DE LINGUAGEM
A denominação “distúrbios de linguagem” diz respeito a com-
prometimentos no curso evolutivo da aquisição da linguagem. Os
distúrbios que mais comumente afetam o desenvolvimento da
criança pequena são os chamados “retardos de aquisição da
linguagem”.
Crianças apresentando condições evolutivas favoráveis ten-
dem a adquirir linguagem no decorrer do segundo ano de vida,
entre 1 e 2 anos de idade. Algumas crianças já começam a ensaiar
as primeiras palavras por volta do primeiro aniversário. Outras
começam mais tarde.
Podemos observar, portanto, diferenças quanto à época em
que as crianças começam a utilizar a linguagem. Há uma série de
fatores que podem ser apontados como determinantes de tais
diferenças: ritmo de desenvolvimento de cada um, estimulação
em geral e mais especificamente, de linguagem, condições emo-
cionais e maturidade social, hereditariedade, doenças e outros
fatores que possam afetar o tempo de aquisição.
Um dos parâmetros que podem ser utilizados para a caracte-
rização dos retardos de linguagem diz respeito à idade. Crianças
que chegam à faixa etária dos 2 anos sem terem adquirido
linguagem merecem uma atenção especial, pois podem estar
894 Fonoaudiologia Prática
Imitação
• dificuldades maiores, em geral, para imitar sons e movimen-
tos não-visíveis no próprio corpo;
• dificuldades para imitar ações com os objetos;
• não conseguem imitar modelos ausentes.
Distúrbios de Linguagem em Crianças Pequenas 895
Imitação
• dificuldades para imitar sons em geral e movimentos não
visíveis no próprio corpo;
• imitação de modelos ausentes ocorrendo de forma elemen-
tar, pouco precisa;
• maior facilidade para imitar ações sobre objetos.
896 Fonoaudiologia Prática
Imitação
• podem não apresentar dificuldades para reproduzir movi-
mentos não-visíveis no próprio corpo;
• em geral, não apresentam dificuldades para reproduzir
ações realizadas com objetos;
• podem não apresentar problemas para imitar modelos au-
sentes;
• tendem a apresentar maior dificuldade, ou até mesmo
desinteresse, na imitação de sons e palavras.
Habilidades interativas/sociais
• algumas crianças podem apresentar dificuldades para orga-
nizar comportamentos comunicativos intencionais;
• algumas crianças tendem a atuar diretamente sobre o meio,
buscando a interação com os outros de modo pouco siste-
mático;
• a função dos comportamentos comunicativos tende a ser
principalmente regulatória;
• tendem a apresentar pouca habilidade para garantir a aten-
ção conjunta e desenvolver atividades com outros.
ATENÇÃO
• Quando as necessidades das crianças são atendidas sem
ser preciso qualquer esforço de comunicação por parte
delas, ou quando o ambiente está estruturado para que
consigam diretamente tudo o que pretendem, encontramos
situações pouco favoráveis para que elas iniciem comunica-
ção e compreendam suas funções.
• Crianças com dificuldades de linguagem têm, em geral,
pouca iniciativa e desistem com facilidade quando surge
algum obstáculo às suas tentativas de ação. Quando
terapeutas e pais respondem prontamente a tais tentativas
podem estar dando-lhes mais confiança e aumentando sua
iniciativa na medida em que elas sentem que podem se
comunicar.
IMPORTANTE
• Aprender a observar e dar sentido aos comportamentos das
crianças é um dos pontos fundamentais de uma proposta
terapêutica.
• Aprender a observar e analisar os próprios comportamentos
ao interagir com as crianças é um segundo ponto-chave do
trabalho fonoaudiológico.
• O fonoaudiólogo deve ser preparado adequadamente a fim
de promover estratégias favoráveis para o desenvolvimento
das capacidades comunicativas de crianças com problemas
de linguagem. Curiosamente, as atitudes inadequadas que
comumente observamos nos pais ao interagirem com seus
filhos com dificuldades de comunicação também podemos
Distúrbios de Linguagem em Crianças Pequenas 901
EVITAR
• Tomar sistematicamente a iniciativa da comunicação.
• Ficar testando as capacidades das crianças com ordens e
perguntas.
• Ficar dirigindo a ação da criança dizendo como ela deve agir
ou proceder.
• Interromper os silêncios que correspondem ao tempo de es-
pera que se deve dar para que a criança tome a iniciativa da
comunicação.
• Ficar falando no lugar da criança.
• Falar em excesso sem dar tempo para a criança responder
ou tomar a iniciativa.
• Muitas das crianças que já atingiram níveis simbólicos de
comunicação podem até ser capazes de responder pergun-
tas ou seguir instruções mas, em geral, não são capazes de
usar a linguagem para fins de comunicação espontânea.
Não é este o objetivo da terapia fonoaudiológica.
• Situações desfavoráveis para uma comunicação eficaz têm
por efeito afastar a criança da linguagem. Quando não tem
oportunidades para iniciar comunicação, ou quando seus
esforços para conseguir a interação não têm efeito, a criança
não tem oportunidades de experimentar suas capacidades
de comunicar.
Leitura recomendada
CANTWELL, D. & BAKER, L. – Developmental Speech and Language
Disorders. Guilford Press, 1987.
Distúrbios de Linguagem em Crianças Pequenas 905
40
Diagnóstico e Terapia dos
Distúrbios do Aprendizado
da Leitura e Escrita
DIAGNÓSTICO
Concepção de distúrbio
Em relação ao aprendizado da leitura e da escrita, a necessi-
dade de um processo diagnóstico é determinada pela existência
de sintomas e sinais de alterações que comprometam, num
sentido estrito, a forma, e, num sentido amplo, a funcionalidade da
comunicação gráfica.
O rumo deste diagnóstico será determinado a partir da
concepção que se tem de distúrbio. Assim, de maneira simplista,
pode restringir-se a comprovação da presença de trocas
grafêmicas, tão conhecidas e freqüentes, e da posterior determi-
nação da causa e da natureza das mesmas. Entretanto, sem que
se ignore a presença destes sintomas clássicos, a partir da
consideração das dimensões biológica, cognitiva e social da
aprendizagem, o diagnóstico pode seguir caminhos mais reflexi-
vos, ocupando-se em verificar o real valor simbólico que a leitura
e a escrita assumem no momento em que afloram as alterações
que motivaram o processo.
As controvérsias diagnósticas foram geradas a partir das
diferentes concepções de distúrbio de leitura e escrita.
Os primeiros relatos literários sobre o assunto tiveram seu
início em meados do século XIX, época em que os transtornos da
linguagem foram relacionados aos comprometimentos do hemis-
fério cerebral esquerdo. Nesta época, em função das inúmeras
descrições das alterações da linguagem em afásicos, as dificulda-
des de leitura e escrita apareciam vinculadas à presença de
alterações orgânicas, sendo encontradas em diversos trabalhos
literários com a denominação de alexia, dislexia e cegueira verbal.
No início do século XX, uma série de estudos fazem referên-
cias a um novo quadro clínico, dissociado dos quadros afásicos,
que a princípio denominou-se cegueira verbal congênita. Somen-
te após a 1ª Grande Guerra, surgia a convicção da existência de
perturbações do aprendizado acadêmico. Sob o ponto de vista
tradicional, estes distúrbios específicos de aprendizagem foram
rotulados como dislexias, disgrafias e discalculias.
Posteriormente, a dislexia foi considerada como constitucio-
nal ou genética, sendo denominada dislexia específica de evolu-
ção. A dislexia também esteve relacionada a algumas das chama-
das síndromes psicomotoras, pelo fato de muitas vezes encon-
trar-se associada a alterações comportamentais como hiperativi-
dade e perseveração.
Na tentativa de descaracterizar um quadro sindrômico, partin-
do ainda de uma visão organicista, muitos autores convencidos da
complexidade do problema adotaram um termo mais amplo –
distúrbio de aprendizagem – no qual a dislexia pode ser incluída.
Dentro deste prisma, JOHNSON & MYKLEBUST observaram diferen-
ças nas manifestações do distúrbio, encontrando crianças com
Diagnóstico e Terapia dos Distúrbios do Aprendizado da Leitura e Escrita 909
Manifestação do distúrbio
Levando-se em conta as condições internas e externas de
aprendizagem e a partir das considerações iniciais do que deve-
mos conceber como distúrbio, a análise pormenorizada das
manifestações do mesmo torna-se indispensável para um diagnós-
tico seguro. O aprendizado da leitura e da escrita está vinculado
a um conjunto de fatores, adotando como princípios o domínio da
linguagem e a capacidade de simbolização.
A aquisição de cada sistema de símbolos pressupõe uma
capacidade para integrar experiências e perceber suas representa-
ções não-verbais de maneira a diferenciá-las por meio de um ou outro
símbolo, e a partir de então atribuir-lhes significado e memorizá-los.
Uma reflexão sobre a complexidade deste processo possibi-
lita a compreensão da aquisição de um código gráfico pela
criança. Justifica inclusive a determinação de sintomas comuns
que caracterizam os quadros sindrômicos anteriormente descri-
tos. Já que o desenvolvimento da linguagem é o ponto de partida
para a simbolização, qualquer interferência em seu caminho
poderá representar uma ameaça para o aprendizado do código
gráfico. É por essa razão que as manifestações de alterações nos
aspectos cognitivos da linguagem têm sido tão valorizadas.
Para determinarmos “o quê”, “quando” e “quanto” temos de
distúrbio, precisamos entender que as freqüentes alterações
de esquema corporal, localização espacial, temporal e lateralidade
citadas na literatura especializada no assunto são manifestações
de alterações no processo de desenvolvimento da linguagem e
como conseqüência, também do aprendizado específico da leitu-
ra e da escrita. Sem perder de vista que estes aspectos da
linguagem são de fundamental importância na avaliação, e muitas
vezes, o ponto de partida para tratamento, não podemos ignorar
que a suspeita de um distúrbio do aprendizado baseia-se nos
parâmetros de uma leitura-escrita ideal, cuja organização seja
determinada pela perfeição da forma e do conteúdo gráfico.
No que concerne à leitura, o respeito à forma estará represen-
tado por uma adequada decodificação dos símbolos gráficos em
seqüência, respeitando-se o ritmo determinado pelos sinais de
pontuação. A compreensão do significado do conjunto dos ele-
mentos decodificados determina a adequação do conteúdo.
Já em relação à escrita, a adequação da forma diz respeito à
emissão gráfica de palavras, respeitando-se a relação entre os
fonemas da língua e sua representação grafêmica de acordo com
Diagnóstico e Terapia dos Distúrbios do Aprendizado da Leitura e Escrita 913
Anamnese
Toda anamnese tem por objetivo a coleta de instrumentos
gerais a partir da queixa, para posterior investigação e análise dos
dados relevantes no processo de pesquisa diagnóstica.
No caso especial dos distúrbios do aprendizado da leitura e da
escrita, temos que ser muito mais cuidadosos em relação a alguns
detalhes que possam parecer irrelevantes na pesquisa das de-
mais patologias da linguagem. Um dos pontos mais importantes
é o motivo da procura do fonoaudiólogo.
No caso de uma suposta alteração no aprendizado da leitura
e escrita, o que leva o paciente ou seus familiares a procurarem
um diagnóstico e conseqüente tratamento fonoaudiológico?
O motivo da procura nos dá uma idéia do objetivo do queixoso
e traduz suas expectativas quanto ao tratamento. Este aspecto
deve ser considerado na medida em que o paciente coloca o
problema como seu ou imposto por outrem.
Muito comuns são as situações em que o paciente é encaminha-
do pela escola, e a família só decide pela procura de um atendimento
por temor a represálias. Este é um ponto de grande importância,
tanto para o diagnóstico como para o estabelecimento de um
prognóstico, pois a falta de clareza na colocação da queixa sugere
baixas expectativas e pouca colaboração no tratamento, uma vez
que o paciente não enxerga o quadro como um problema.
Assim, desde o contato inicial, faz-se necessário um esclare-
cimento das correlações entre a queixa trazida pelo paciente e os
possíveis comprometimentos a serem pesquisados, assim como
devem ser esclarecidos todos os procedimentos do processo
diagnóstico, destacando-se seus objetivos.
Considerando que as crianças com distúrbios do aprendizado
têm uma baixa auto-estima em função de seus fracassos escolares,
916 Fonoaudiologia Prática
Campos de interesse Direcionar a escolha das estratégias de avaliação Informações da anamnese e conversa espon-
• Idade tânea
• Sexo
• Atividades de lazer
• Atividades de vida diária
Motor • Movimentação geral: observação da qualidade Movimentos espontâneos
e quantidade dos movimentos intencionais e
não intencionais considerando postura, equi-
líbrio, coordenação e ritmo
• Motricidade fina: observação da postura e qua- Desenho e emissões gráficas espontâneas
lidade dos movimentos de pulso, mão e dedos
no ato da escrita
Cognitivo • Orientação do corpo no espaço: observação do Movimentos espontâneos: esbarra em obje-
conhecimento de direção, tamanhos e posi- tos? caminha na direção correta?
ções
• Percepção das posições do corpo em relação às Reprodução de movimentos corporais, jogos
demais pessoas a aos objetos: observação que envolvam relações espaciais: colocar
do conhecimento de direção, tamanhos e objetos em caixas, trilhas, labirintos, blocos
posições lógicos, etc.
• Orientação e seqüência temporal: observação Conversa espontânea, seqüêncialização de fi-
das noções temporais guras; relatos do dia-a-dia; contar histórias a
partir de figuras
• Orientação da lateralidade: observação da mão Movimentação espontânea ao pegar objetos,
preferencial e qualidade do movimento. amarrar sapatos, apontar lápis, escrever, etc.
Sensorial auditivo • Percepção Identificação ou reprodução de sons produzi-
• Discriminação dos pelo ambiente, pelo corpo, pela natureza
• Memória Identificação ou reprodução de diferenças de
• Análise-síntese altura, intensidade, duração, ritmo
• Figura-fundo Memória para sons não-verbais e verbais
Formar palavras a partir da emissão de sílabas
Figura-fundo não-verbal e verbal
Localização do estímulo auditivo: direita, es-
querda, atrás, na frente
Discriminação de fonemas ou sílabas diferen-
tes e parecidas
Reconhecimento de palavras parecidas
Sensorial visual • Percepção Percepção de detalhes em figuras
• Discriminação Discriminação de símbolos gráficos iguais, pa-
• Memória recidos e diferentes
• Análise-síntese Memória para estímulos visuais: três estímulos
• Figura-fundo Quebra-cabeça
Identificação de determinado elemento em fi-
gura
TERAPIA
A partir do diagnóstico de um distúrbio do aprendizado da
leitura e da escrita, o primeiro ponto a ser considerado é a conduta
frente aos achados da avaliação.
A razão que motivou o processo diagnóstico deve ser
retomada, relacionando-a às eventuais alterações encontra-
das, devendo ser explicitadas aos familiares e ao paciente,
associadas às possíveis causas do distúrbio. A partir de então
a busca de uma melhor conduta frente ao problema deve ser
adotada.
No caso da constatação da necessidade de um atendimento
fonoaudiológico, o primeiro aspecto a ser considerado e a motiva-
ção para a escrita, que só ocorre na medida em que a mesma
assuma um significado para o paciente. Essa motivação é repre-
sentada por uma necessidade real de se comunicar por meio do
código gráfico, e, para que isto ocorra a escrita deve se tornar
parte integrante de sua vida no fornecimento de informações;
deve deixar de ser somente uma obrigação escolar, fornecendo
elementos comunicativos essenciais.
Dependendo da natureza das alterações, e, seguindo a linha
de raciocínio da avaliação de linguagem, forneceremos alguns
objetivos terapêuticos para o distúrbio do aprendizado da leitura
e da escrita, levando o princípio da motivação.
Atividades motoras
Motricidade geral
1. Consciência global do corpo: andar, correr, saltar, rodar,
etc.
2. Equilíbrio estático e dinâmico: ficar parado, ficar num pé só.
3. Dissociação de movimentos: reproduzir uma série de posi-
ções de braços, pernas, mãos.
4. Jogos mímicos.
Atividades cognitivas
1. Espaciais: andar em cima de espaços demarcados, entrar
e sair de compartimentos de diferentes tamanhos, passar
por baixo ou por cima de obstáculos, mudar a direção ou o
sentido dos movimentos corporais, colocar objetos de
diferentes tamanhos em recipientes, imitação de movimen-
tos corporais globais ou de membros superiores e inferio-
res seguindo uma seqüência;
2. Temporais: reproduzir diferentes ritmos, criar ritmos,
seqüencializar figuras, seqüencializar fatos a partir da
apresentação de uma história.
3. Lateralidade: traçar linhas dividindo objetos simétricos verifi-
cando sua igualdade e a relação lado direito e esquerdo, traçar
linhas dividindo figuras do corpo humano, movimentar mem-
bros superiores ou inferiores direito e esquerdo de maneira
alternada, mudar de posição (frente e costas) enquanto movi-
menta membros superiores e inferiores.
Atividades de audibilização
A) Identificação e discriminação auditiva
1. Localização auditiva: estímulos não-verbais e verbais em
todas as posições: na frente, atrás, do lado direito, do lado
esquerdo.
2. Identificação e discriminação de sons referentes à altura
tonal e intensidade.
3. Discriminação de vozes conhecidas.
4. Identificação de sons ambientais e associações com sua
fonte.
5. Discriminação entre sons ambientais iguais, parecidos e
diferentes.
6. Discriminação entre sons da fala iguais, parecidos e dife-
rentes.
7. Reconhecimento e discriminação de sons consonantais
específicos.
8. Exercícios de rimas com palavras.
C) Percepção discriminativa
Altura, intensidade, duração, ritmo.
1. Não-verbal – som isolado, pares, trios e combinações entre
matizes.
2. Verbal – vogais, sílabas com fonemas parecidos, logatomas,
pares mínimos.
D) Percepção analítico-sintética
1. Não-verbal – seqüências de 3 a 4 estímulos a serem
sintetizados num todo.
2. Verbal – recompor palavras fragmentadas por sílabas, ou
frases fragmentadas por palavras. A partir destas (sílabas
ou palavras), formar novas palavras ou frases.
E) Percepção figura-fundo
Não-verbal e verbal com ruído de fundo.
F) Memória
1. Não-verbal – 2 a 4 estímulos.
2. Verbal – séries de palavras simples com aumento de
complexidade.
Aumento de ordens contidas em uma mesma mensa-
gem verbal.
Completar detalhes omitidos na segunda versão de uma
história.
Reconhecer palavras que integrem outras, por exemplo,
soldado.
Atividades de visualização
1. Identificação de diferenças em figuras.
2. Identificação de detalhes em figuras.
3. Discriminação de palavras com grafias iguais, parecidas e
diferentes.
4. Discriminação de grafemas iguais, parecidos e diferentes.
5. Memória para seqüência de estímulos visuais: gestos,
figuras, palavras.
6. Análise-síntese visual: recortar figura em 2 ou 4 partes e
depois montá-la; quebra-cabeça; caça-palavras.
7. Discriminar figura-fundo visual.
6. Opostos.
7. Categorias.
8. Funções.
9. Suposições.
10. Palavras com vários significados.
11. Derivados das palavras.
C) Atividades ortográficas
Mais uma vez, a estimulação deve seguir os princípios da
motivação. Antes da formalização desse trabalho, a criança
deve ter consciência de que o mais importante é o conteúdo de
sua comunicação gráfica. A correção da forma deve basear -
se na escrita produzida a partir da necessidade de comunica-
ção gráfica, determinada pelos diferentes contextos terapêu-
ticos.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Algumas das colocações feitas neste capítulo tiveram
como objetivo fornecer subsídios para uma reflexão sobre
as condutas frente aos distúrbios do aprendizado da leitura
e da escrita e, acima de tudo, despertar o interesse para a
busca de soluções mais efetivas para o seu diagnóstico e
tratamento.
De maneira alguma houve a pretensão de esgotar o assunto.
Espera-se contudo que, as colocações ora feitas, possam servir
de motivação para a procura de novos caminhos fonoaudiológi-
cos, através de pesquisas e estudos mais aprofundados dos
aspectos aqui levantados.
924 Fonoaudiologia Prática
Leitura recomendada
CONDEMARIN, M. & CHADWICCK, M. – A Escrita Criativa e Formal.
Porto Alegre, Artes Médicas, 1987.
FERREIRO, M. & TEBEROSKY, A. – Psicogênese da Língua Escri-
ta . 3ª ed. Porto Alegre, Artes Médicas, 1990.
JOHNSON, D.J. & MYKLEBUST, H.R. – Distúrbios de Aprendiza-
gem . 2ª ed. São Paulo, Pioneira, 1987.
LE BOULCH, J. – Educação Psicomotora. 2ª ed. Porto Alegre, Artes
Médicas, 1988.
PAIN, S. – Diagnóstico e Tratamento dos Problemas de Aprendizagem.
Porto Alegre, Artes Médicas, 1985.
SCHRAGER, O.L. – Lengua, Lenguage y Escolaridad. Buenos Aires,
Panamericana, 1985.
VIGOTSKII, L.S.; LURIA, A. R.; LEONTIEV, A. N. – Linguagem, Desen-
volvimento e Aprendizagem. São Paulo, Ícone, 1988.
A Metáfora da Dislexia 925
41
A Metáfora da Dislexia
INTRODUÇÃO
O primeiro objetivo deste trabalho será revisitar historicamen-
te a literatura sobre a dislexia.* Iniciaremos com seu nascimento
no campo médico, ocasionado pela necessidade de nomear a
perda da capacidade de dar sentido a símbolos verbais escritos ou
impressos, em alguns pacientes com afasia – perda de linguagem
– após a ocorrência de acidente vascular cerebral. O termo
dislexia foi sugerido primeiramente pelo professor BERLIN DE
STUTTGART, em 1887, mas acredita-se que a perda da habilidade
para ler já tinha sido identificada muito antes pelo médico JOHAN
SCHMIDT (1640–1690). A literatura médica reconhece KUSSMAUL
(1877) como o primeiro (e possivelmente o único) a isolar a
inabilidade para leitura como uma entidade nosológica autônoma,
denominando-a cegueira verbal. Para este autor é possível,
embora raro, encontrar-se dificuldades para a leitura sem nenhum
comprometimento correlato em nível de visão, intelecto ou lingua-
gem. No entanto, seu pioneirismo não parece ter conquistado
seguidores já que a maioria dos médicos continuou a concebê-la
como uma doença ligada ao funcionamento cerebral e ao desempe-
nho lingüístico. Um cirurgião ocular chamado JAMES HINSHELWOOD,
O LETRAMENTO
Quem primeiro vai verticalizar a discussão sobre letramento
é TFOUNI (1988 e 1995). Para a autora, letramento e alfabetiza-
ção são processos de aquisição de um sistema escrito que
diferem entre si pelo fato do segundo pertencer ao âmbito do
A Metáfora da Dislexia 931
* Grifo nosso.
932 Fonoaudiologia Prática
* Utilizaremos este termo como forma de nos referir a toda e qualquer dita
dificuldade de leitura ou de escrita.
** Cabe salientar que EMILIA FERREIRO esteve várias vezes em São Paulo para
dar palestras a professores da rede municipal de ensino e ainda que, vários
de seus seguidores ministraram cursos para professores da rede particular e
da rede pública. Não temos dados oficiais sobre esse assunto.
934 Fonoaudiologia Prática
* Dá-se o nome de par mínimo aos fonemas que se opõem por um único traço,
no caso, o de sonoridade. Assim, subentende-se aí também os pares /d/ e /t/,
/g/ e /k/, /v/ e /f/, /z/ e /s/, / / e / /.
936 Fonoaudiologia Prática
O que fazer?
Esta é a pergunta que os educadores geralmente fazem ao
perceber o ponto de vista aqui defendido e entender que, em
última instância, cabe à escola resolver questões que são de sua
responsabilidade. Se a escola não for responsável pelo processo
de alfabetização, quem o será? Se esta tarefa não for entendida
como sua, que papel caberá à escola nesse processo? Na
realidade, a resposta a essa pergunta não deve remeter à expec-
tativa de orientação quanto ao conteúdo de uma disciplina. Se
para a escola alfabetizar for ensinar letras, sílabas, combinação
destas em palavras e de palavras em sentenças, então não há o
que discutir. No entanto, se outro for o ponto de vista adotado – a
alfabetização enquanto uma das faces do letramento – tornar o
sujeito letrado é emergí-lo em situações onde a escrita é
contextualizadamente necessária. A partir deste olhar o que
realmente importa é a possibilidade de reconhecer o erro como
indiciador do efeito do funcionamento do texto escrito sobre a
criança. Interpretar o texto infantil é uma forma de se escutar a
criança, de ouvir o que ela tem a dizer sobre este objeto que a
domina e que nós, ilusoriamente, acreditamos que possa ser
dominado.
Salientaremos alguns pontos deste percurso. Resgatar a
função social da escrita é o ponto de partida. Isso pode ser feito
basicamente através da presença significada de portadores de
textos na situação escolar. Sinalizar o ambiente à mesma maneira
que qualquer edifício público, colocar avisos no quadro, ler os
jornais, fazer anotações (no diário, na agenda, no caderno),
propor a escrita de cartas, bilhetes e convites, cantar à vista da
letra da música entre outras tantas atividades que o professor/
terapeuta pode criar e que objetivam colocar a escrita/leitura em
circulação são o passo seguinte. Propor atividades como a já
tradicional brincadeira do faz-de-conta em que a escrita aparece
sob as mais variadas formas – da lista de compras, do cheque, da
nota fiscal, da lição, da receita médica ou da receita de bolo – e não
dispensar a atividade de contar histórias em que as crianças
acompanham as leituras de livros infantis e sugerem formas de
dar continuidade à história ou de mudar seu final, ou ainda de
contar uma outra história, dão sentido ao percurso da relação da
criança com a escrita.
Finalmente, podemos dizer que os efeitos da mudança de
perspectiva – olhar a escrita como lugar de funcionamento da
língua e da criança – são aqueles evidenciados em crianças que
se alfabetizam fora da escola, ou seja, que aprendem a ler e
A Metáfora da Dislexia 937
Leitura recomendada
ABAURRE, M.B.M – Indícios das primeiras operações de reelaboração
nos textos infantis. vol. 1. Anais do XII Seminário de Gel, 1993.
ABAURRE, M.B.M. – Lingüística e pedagogia. In: SCOZ, E. et al.
Psicopedagogia – O Caráter Interdisciplinar na Formação e Atuação
Profissional. Porto Alegre, Ed. Artes Médicas, 1987.
ABAURRE, M.B.M – O estudos lingüísticos e a aquisição da escrita.
Anais do 2º Encontro Nacional sobre Aquisição da Linguagem.
Ceaal, R.S., 1991.
DE LEMOS, C.T.G. Prefácio. In: KATO, M. A Concepção da Escrita pela
Criança. Campinas, São Paulo, Pontes Editores, 1988.
REGO, L.B – O Desenvolvimento da língua escrita pela criança: uma
perspectiva sócio-funcional. In: SCOZ, E. et al. Psicopedagogia – O
Caráter Interdisciplinar na Formação e Atuação Profissional. Porto
Alegre, Ed. Artes Médicas, 1987.
TFOUNI, L.V. – Adultos não Alfabetizados: O Avesso do Avesso.
Campinas, Pontes Editores, 1988.
TFOUNI, L.V. – Letramento e Alfabetização. São Paulo, Ed. Cortez,
1995.
Deficiência Auditiva 1
Avaliação e Terapia dos Distúrbios Neurológicos da Linguagem e Fala 939
42
Avaliação e Terapia dos
Distúrbios Neurológicos da
Linguagem e Fala
AFASIA
Muitas são as definições encontradas para este distúrbio e
elas são, de certa forma, coincidentes. Entre elas, citamos a
definição dada por COUDRY (1988)1 e a de LAPOINTE (1977)2:
Observações
As manifestações até então descritas são estruturais e estão
restritas às palavras e frases. Deve-se observar suas ocorrências,
mas, para se fazer uma avaliação, faz-se necessário também
avaliar o nível discursivo.
A nomenclatura apresentada a seguir foi única e exclusiva-
mente escolhida, entre as muitas outras possíveis, por ser a mais
comum e utilizada.
Afasias emissivas
Fazem parte deste grupo as afasias cujo déficit de expressão
é maior do que o déficit de compreensão.
Afasia de Broca
É a afasia de expressão mais comumente encontrada. Carac-
teriza-se por ser do tipo não-fluente, sendo que a expressão oral
pode estar comprometida em diversos graus. Na fase aguda, o
paciente pode apresentar supressão de fala e de escrita ou
estereotipia. As estereotipias são freqüentes e podem se manter;
podemos ainda encontrar parafasias fonéticas e/ou fonêmicas,
942 Fonoaudiologia Prática
Afasia de condução
É uma afasia fluente, caracterizada por parafasias fonêmicas,
podendo ainda aparecer anomias ou parafasias semânticas
durante a fala. O discurso pode aparecer truncado, com hesita-
ções e autocorreções. A característica marcante deste tipo de
afasia são os erros encontrados na prova de repetição, em que
a emissão mostra-se muito mais prejudicada do que a fala
espontânea.
Na escrita espontânea e no ditado podem aparecer paragrafias
literais e grafêmicas, no entanto, o paciente pode apresentar bom
desempenho na cópia. Na leitura em voz alta, o paciente apresen-
ta melhor desempenho do que nas provas de repetição.
A alteração de compreensão, similar à que se encontra nas
afasias de Broca típicas – normal ou com alterações leves – fazem
supor que a afasia de condução pode ser a evolução de uma
afasia de Wernicke.
Afasias receptivas
Fazem parte deste grupo as afasias, cujo déficit de compreen-
são é maior do que o déficit de expressão.
Afasia de Wernicke
É a afasia de compreensão mais grave, definida por um
conjunto de características bastante específicas. A compreensão
oral encontra-se gravemente comprometida. A expressão é mar-
cada por discurso fluente e abundante, fala logorréica e jargo-
nafásica e pela grande presença de neologismos. A fala apresen-
Avaliação e Terapia dos Distúrbios Neurológicos da Linguagem e Fala 943
Afasia amnéstica/anômica
É uma afasia fluente, caracterizada basicamente por altera-
ções semânticas como as parafasias semânticas, perífrases e
anomias, estando o acesso lexical prejudicado. Como a anomia é
uma manifestação freqüente em muitas afasias, esta afasia mui-
tas vezes é a evolução de outro tipo, mais comumente, das afasias
de Wernicke ou transcortical sensorial, sendo esta a justificativa
de pertencer a este conjunto de afasias, uma vez que a compreen-
são oral está preservada ou apenas levemente comprometida
(para conteúdos mais complexos). Na escrita podem aparecer as
mesmas falhas encontradas no discurso oral, e a leitura geralmen-
te está preservada.
Formas mistas
Afasia transcortical mista
É uma afasia que se caracteriza pela repetição preservada,
estando tanto a emissão quanto a compreensão severamente
comprometidas. A fala é caracterizada por estereotipias e há
supressão da escrita. Cabe ressaltar que embora a repetição
esteja preservada, ela ocorre com falhas, ou seja, ela não é tão
boa quanto nos quadros de afasia transcortical motora ou sensorial.
Afasia mista
São os quadros de afasia que apresentam características de
vários dos quadros descritos, sem se restringir a nenhum deles.
Na verdade, as afasias mistas são muito comuns.
944 Fonoaudiologia Prática
Afasia global
É a afasia mais grave, caracterizada por comprometimento
severo da emissão e da compreensão oral e gráfica. Geralmente,
o paciente apresenta mutismo na emissão oral ou ela está restrita
a estereotipias e automatismos. Há supressão da emissão gráfi-
ca. Existe uma variedade de formas clínicas; quando a compreen-
são melhora muito, mas não chega a ficar tão boa quanto a
esperada para uma afasia de Broca, temos a afasia motora mista.
No entanto, muitos dos casos evoluem para uma afasia de Broca.
Afasias subcorticais
As afasias subcorticais foram recentemente descritas e só
puderam ser melhor estudadas com o advento da neuroimagem
que propiciou melhor compreensão dos quadros numa tentativa
de maior correlação anatomoclínica. Assimetria funcional seme-
lhante à observada na corticalidade é encontrada em nível
subcortical, ou seja, alguns aspectos da linguagem e da memória
verbal se relacionam predominantemente ao hemisfério esquer-
do, enquanto outros aspectos da linguagem, bem como as capa-
cidades construtivas, visuoespaciais, de atenção e memória vi-
suais, com o hemisfério direito. É importante ressaltar que as
afasias subcorticais são extremamente variáveis tanto quanto à
variedade de sintomas encontrados dentro de um mesmo quadro,
quanto aos graus de severidade. PUEL e cols. (1984) descreveram
25 casos de lesões subcorticais e tentaram verificar as correla-
ções anatomoclínicas nestes casos. Dentre estes 25 pacientes, 4
apresentavam apenas disartria; 9 apresentavam formas clássicas
de afasia (2 apresentavam afasia global, 3 apresentavam afasia
de Broca, 3 apresentavam afasia de Wernicke e 1 apresentava
afasia de condução); os outros 12 pacientes apresentavam for-
mas mistas de afasia, sendo 10 casos muito atípicos. Esses 10
casos muito atípicos também apresentavam as mais variadas
lesões subcorticais. CROSSON (1985) apresentou um modelo,
segundo o qual a linguagem depende das estruturas corticais e
das subcorticais que interagem num processo dinâmico. As estru-
turas subcorticais mais importantes neste processamento seriam
o tálamo, o gânglio basal, o pálido e o caudado. Através deste
modelo, o autor consegue explicar porque poderíamos encontrar
afasias clássicas (como no estudo acima citado) em lesões
subcorticais e também casos atípicos, uma vez que se trata de um
circuito de processamento da linguagem extremamente comple-
xo. M ENDONÇA (1994) nos apresenta a afasia talâmica, a afasia
dos gânglios da base caudado, putamen e cápsula interna:
Afasia talâmica
As afasias talâmicas geralmente são atípicas e, dentre os
quadros subcorticais, costumam ser as mais transitórias. Elas
Avaliação e Terapia dos Distúrbios Neurológicos da Linguagem e Fala 945
Avaliação
O fenômeno da perda da fala decorrente de uma lesão
cerebral é muito antigo e praticamente a totalidade dos sintomas
de afasia foram descritos muito antes do século XX. Durante as
três décadas anteriores à histórica contribuição de BROCA, já
havia interesse e controvérsia crescente quanto aos mecanismos
de desordens orgânicas da fala.
No século XX, a grande quantidade de ex-combatentes com
lesões cerebrais e problemas de fala/linguagem que sobreviveu à
Segunda Grande Guerra Mundial obrigou a sociedade do pós-
guerra a organizar atividades para a reabilitação dos lesados,
principalmente as vítimas de traumatismos cranianos e baleados,
ocupando os afásicos, um lugar preponderante. Uma resposta
imediata à circunstância do pós-guerra foi a publicação de um
vasto número de tratados sobre a afasia e sua avaliação.
946 Fonoaudiologia Prática
Prognóstico
A maioria dos pacientes afásicos mostra uma melhora espontâ-
nea nos meses subseqüentes à lesão. O período de recuperação
espontânea aparece de forma variada na literatura, mas a maioria
dos autores reconhece este período entre os 3 e os 6 primeiros
meses. Uma das questões que sempre esteve presente quando se
tratou da reabilitação da afasia é o quanto esta recuperação pode
ser influenciada de modo positivo pela terapia fonoaudiológica.
BASSO (1993) realizou uma revisão da literatura sobre os
fatores de prognóstico relativos à recuperação, os efeitos do
tratamento e os padrões de recuperação em grupos de pacientes
e em pacientes considerados individualmente. Em seu estudo,
considerou apenas as variáveis experimentais, uma vez que
existem muitos fatores que interferem no prognóstico do paciente,
mas que não são quantificáveis, como ocorre com a motivação,
por exemplo, que é um fator importantíssimo quando se fala em
reabilitação, mas que não pode ser considerado cientificamente.
Assim, a autora dividiu essas variáveis em dois grupos, a saber:
fatores individuais como a idade, o sexo e a preferência manual;
e fatores neurológicos como a etiologia, localização e tamanho da
lesão, a severidade e o tipo da afasia. O “efeito da terapia” foi
considerado separadamente. A autora concluiu que os fatores
individuais têm um pequeno papel na recuperação das afasias,
sendo mais relevantes a gravidade inicial do problema, que está
relacionada à extensão e à localização da lesão, e a reabilitação.
A terapia não modifica o perfil da recuperação espontânea, mas
a torna possível em um número de pacientes que não apresentaria
nenhuma melhora e ainda acelera a recuperação espontânea dos
pacientes em acompanhamento.
Terapia
A preocupação em se criar métodos de reabilitação para o
paciente cérebro-lesado ocupou lugar preponderante a partir da
década de 40. Uma revisão das metodologias usadas na terapia
das afasias permite observar diferentes pressupostos teóricos
que explicam o problema e se propõe a “solucioná-lo”.
948 Fonoaudiologia Prática
Escolas terapêuticas
Segundo HORI (1991); PEÑA-CASANOVA; BERTRAN-SERRA &
MANERO (1995), constituem-se em:
1. Escola didática
Presente no final do século passado e no início deste século,
esta escola terapêutica não se fundamenta em nenhum princípio
teórico. A linguagem é “reensinada” usando-se métodos de ensi-
no tradicionais.
5. Escola pragmática
O objetivo desta escola é melhorar a atuação do paciente em
sua vida cotidiana, sendo a preocupação com a comunicação
mais importante do que a própria linguagem.
Os princípios terapêuticos básicos desta escola são:
• Contextualizar ao máximo as atividades realizadas em tera-
pia, através de um estudo minuncioso do meio social e da
dinâmica intra e extrapessoal do paciente.
• Melhor utilização possível das capacidades mantidas intactas.
6. Escola neoclássica
Está baseada nos modelos funcionais clássicos sobre a
linguagem e também prevê a manutenção das habilidades intactas.
É representada pelo grupo de estudiosos de Boston.
7. Escola neurolingüística
É uma escola que se baseia em teorias lingüísticas e se
propõe a criar uma proposta teórica psicolingüística da afasia, a
fim de aumentar a eficácia da terapia. Desenvolveu-se amplamen-
te na Alemanha e na França.
DISARTRIA
Definição – “Articulação imperfeita” da fala causada por uma
lesão no sistema nervoso central ou periférico. As disartrias são
caracterizadas por fraqueza, incoordenação ou paralisia do apa-
relho fonador.
Características
• Existem diversos tipos de disartrias.
• A característica comum a todas elas é a imprecisão na
articulação das consoantes.
• São características principais: monoaltura, monointen-
sidade, qualidade ruidosa e velocidade lenta (exceto em
Parkinson).
Tipos de disartria
Disartria espástica
Características – Voz áspera, com esforço, tensa-estrangu-
lada, monotonia, articulação imprecisa das consoantes e
hipernasalidade.
Disartria flácida
Foi o primeiro tipo de disartria descrita. Tem por característi-
cas: voz soprosa, monoaltura, articulação imprecisa das consoan-
tes e hipernasalidade.
952 Fonoaudiologia Prática
Disartria atáxica
Características – Voz áspera, com esforço, tensa-estrangu-
lada, interrupção articulatória irregular, acentuação excessiva,
mas sem diferenciação da sílaba tônica ou do elemento frasal
mais importante.
Disartria hipocinética
Características – Voz monótona, com monoaltura e
monointensidade, acentuação reduzida e articulação imprecisa
das consoantes.
Disartria hipercinética
Características – Voz áspera, monoaltura, interrupção articula-
tória irregular e articulação imprecisa/distorcida das vogais.
Desordens extrapiramidais
• Parkinsonismo (gânglio basal – substância negra) – Disar-
tria hipocinética.
São características desta patologia: hipocinesia, rigidez mus-
cular e tremor involuntário.
O paciente apresenta voz trêmula, com monoaltura e
monointensidade, dificuldades de deglutição/disfagia e mímica
facial inexpressiva (“máscara”).
Desordens cerebelares
• Síndrome de Arnold-Chiari (congênita – bulbo/cerebelo) –
Disartria atáxica.
A disartria nesta doença caracteriza-se por aspereza.
Terapia
Antes de iniciarmos a intervenção terapêutica é fundamental
conhecermos a etiologia da disartria, pois, como vimos, algumas
aparecem como manifestação de doenças degenerativas do Siste-
ma Nervoso e neste caso, a terapia tem objetivos diferentes.
HALPERN (1986) sugeriu seis fatores que influenciam o trata-
mento de pacientes disártricos. Esses fatores são:
1. Estado neurológico e história – Lesões subcorticais
bilaterais, doenças degenerativas e disartrias que apresentam
disfagias associadas tendem a apresentar pior prognóstico.
2. Idade – Crianças geralmente apresentam melhor prognós-
tico do que os adultos e, pacientes muito idosos apresentam um
pior prognóstico.
3. “Ajustes automáticos” – Em resposta à lesão, alguns pacien-
tes desenvolvem mecanismos compensatórios que podem melhorar
ou prejudicar a articulação. Os ajustes, no entanto, podem facilitar a
articulação de pacientes que apresentam prognóstico ruim.
4. Tratamento multidisciplinar – A intervenção multidiscipli-
nar favorece a recuperação do paciente.
5. Personalidade e inteligência do sujeito – O otimismo e a
motivação com o tratamento são pontos importantes que favore-
954 Fonoaudiologia Prática
APRAXIA
“É uma desordem da articulação, que resulta da perda,
causada por uma lesão cerebral, da capacidade de organizar o
posicionamento da musculatura da fala e de seqüencializar os
movimentos na produção espontânea de fonemas ou de uma
seqüência de fonemas; porém esta dificuldade não é acompa-
nhada por fraqueza ou lentidão significantes, ou incoordenação
destes músculos nos movimentos reflexos ou automáticos”
(JOHNS & DARLEY, 1970).
Principais características
01. Os erros de articulação aumentam proporcionalmente à
complexidade do ajuste motor que a articulação exige. Assim, as
vogais são articuladas mais facilmente do que as consoantes
simples que, por sua vez, são melhor articuladas do que os grupos
consonantais. A zona de articulação do fonema é outro ponto que
deve ser considerado, sendo os fonemas palatais e dentais mais
suscetíveis a erros do que outros fonemas (LAPOINTE & JOHNS,
1975). A repetição de fonemas é mais fácil de pontos anteriores
para posteriores do que o inverso, ou seja, é mais fácil repetir -pa-
ta-ca do que ca-ta-pa.
02. Consoantes iniciais tendem a ser freqüentemente pior
articuladas do que as consoantes em outras posições.
03. Leituras repetidas de um mesmo material permitiram
verificar que os pacientes apráxicos podem reincidir nos erros e,
em alguns casos, observou-se menor número de erros em leituras
sucessivas, no entanto, sem mudanças significantes.
04. Freqüência do fonema: fonemas que aparecem com
freqüência elevada na língua tendem a ser melhor articulados do
que os que aparecem menos freqüentemente.
05. Tipos de erros: aparecem inúmeros erros fonêmicos,
incluindo- se omissões, adições, repetições e, principalmente,
substituições.
06. Em relação aos aspectos seqüenciais, uma análise dos
erros destes pacientes revela três tipos fundamentais: antecipa-
ção, reiteração e “ metástase” (inversão de fonemas).
07. Os pacientes apráxicos apresentam uma acentuada discre-
pância entre a performance na fala automática e a fala espontânea,
sendo boa na primeira e extremamente prejudicada na segunda.
08. A repetição se apresenta pior do que a fala espontânea,
além de apresentar maior tempo de latência.
956 Fonoaudiologia Prática
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Este capítulo teve por objetivo esboçar questões como avalia-
ção/diagnóstico e terapia/reabilitação nos quadros de Afasia,
Disartria e Apraxia em sujeitos adultos, vítimas de lesões cere-
brais. Este “esboço” se propôs apenas a levantar questionamentos
e reflexões sobre o atendimento a estes pacientes, bem como,
através de uma visão geral, nortear o estudo destes quadros
complexos que, no atendimento fonoaudiológico, se apresentam
com suas múltiplas facetas.
Leitura recomendada
BASSO, A. – Fatores de prognóstico em afasia. In: RODRIGUES, N. &
MANSUR, L. L. Temas em Neuropsicologia. São Paulo, 1993. pp. 63-77.
COUDRY, M.I.H. – Diário de Narciso. Discurso e Afasia. 1ª ed. São
Paulo, Martins Fontes, 1988.
CROSSON, B. – Subcortical functions in language: a working model.
Brain and Lang., 25:257-292, 1985.
DABUL, B. & BOLLIER, B. – Therapeutic approaches to apraxia. J.
Speech. Hear. Dis., 41:268-276, 1976.
DELGADO, A.P.; CARAMELLI, P.; MANSUR, L.L.; JAREMA, G;
LECOURS, A.R. – Estudo longitudinal em caso de afasia progressi-
va primária. Neuropsych Latina, 1(1):9-17, 1995.
GLEASON, J.B.; GOODGLASS, H.; GREEN, E.; ACKERMAN, N.; HIDE,
M.R. – The retrieval of sintax in Broca’s aphasia. Brain and Lang.,
2:551-471, 1975.
GOODGLASS, H. & KAPLAN, E. – Evaluation de La Afasia y de
Transtornos Similares. 1ª ed. Buenos Aires, Editorial Médica Pana-
mericana, 1974.
HALPERN, H. – Therapy for agnosia, apraxia and dysartria. In: CHAPEY,
R. Language Intervention Strategies in Adult Aphasia. 2ª ed. Williams
& Wilkins, Baltimore, 1986.
958 Fonoaudiologia Prática
43
Alterações de Linguagem
Associadas a Distúrbios
Emocionais
DESENVOLVIMENTO DE LINGUAGEM E O
DESENVOLVIMENTO EMOCIONAL
As perspectivas pragmáticas (AUSTIN, 1962; SEARLE, 1981) a
respeito da linguagem determinaram a inclusão de elementos
sociais e contextuais em todos os estudos de linguagem e
especialmente na investigação de seu desenvolvimento. Nesse
sentido, são essenciais os trabalhos de HALLIDAY (1978), CAMAIONI
(1980 e 1986), SCHIEFFELIN (1983) e BATES (1976 e 1979), entre
outros.
A mãe ocupa papel central no desenvolvimento da linguagem
da criança, enquanto seu primeiro interlocutor, responsável pela
inclusão da criança no mundo lingüístico, que não se distingue do
mundo social. Temos aqui o primeiro ponto de contato entre as
teorias sobre o desenvolvimento de linguagem e as que abordam
o desenvolvimento emocional, especialmente a psicanálise. Tam-
bém sob os pontos de vista psicanalíticos (freudianos, kleinianos
ou lacanianos) a mãe é o primeiro “objeto de amor” da criança, seu
interlocutor preferencial, o grande responsável pelos primeiros
passos de seu desenvolvimento egóico.
As idéias propostas por BATES, especialmente a noção de
heterocronia, são muito úteis para essa discussão. É essencial
que estejam claras as relações de interdependência e interferên-
cia que se estabelecem entre as diversas áreas do desenvolvi-
mento. Propõe-se a noção de pré-requisito como uma estrutura
que fornece o substrato necessário para a estrutura de um outro
sistema. Desta forma, os pré-requisitos para a linguagem não
podem ser estabelecidos em termos de manifestações comporta-
mentais ou da performance em tarefas como permanência de
objetos, uso de instrumentos, interação social ou qualquer outra.
As relações estruturais entre as habilidades lingüísticas e não
lingüísticas estão no nível da organização subjacente que permite
que essas manifestações de desenvolvimento ocorram.
É claro que o termo permite estabelecer uma relação de
causalidade muito diferente das noções de causa e efeito geral-
mente envolvidas nas discussões que abordam os pré-requisitos
Alterações de Linguagem Associadas a Distúrbios Emocionais 961
DISTÚRBIOS EMOCIONAIS
Este é um termo amplo e pouco específico, que é utilizado
neste trabalho para fazer referência ao que se supõe que sejam
alterações do desenvolvimento ou da organização afetiva da
criança.
962
Leitura recomendada
AMERICAN PSYCHIATRIC ASSOCIATION – Manual de Diagnóstico e
Estatística de Distúrbios Mentais – DSM III-R. São Paulo, Editora
Manole, 1989. pp. 51-53.
ANZIEU, D.; GIBELLO, B.; GORI, R. et al. – Psicanálise e Linguagem –
do Corpo à Fala. Lisboa, Moraes, 1977.
AUSTIN, J.L. – Quando Dizer é Fazer – Palavras e Ação, Tradução de
Danilo Marcondes de Souza Filho do original em inglês How to do
Things with Words (1962), Porto Alegre, Artes Médicas, 1990.
BATES, E. – Language and Context: the Acquisition of Pragmatics. New
York, New York Academic Press, 1976. pp. 1-41.
BATES, E. – On the evolution and development of symbols. In: BATES,
E.; BENIGNI, L.; BRETHERTON, A.;CAMAIONI, L.; VOLTERRA, V.
The Emergence of Simbols: Cognition and Communication in Infancy.
Cap. II. New York Academic Press, 1979. pp. 38-52.
CAMAIONI, L. – La Prima Infanzia. Milano, il Mulino,1980.
CAMAIONI,L.; VOLTERRA, V.; BATES, E. – La Comunicazione nel
Primo Anno di Vita. Torino, Boringhieri, 1986.
FERNANDES, F.D.M. – Aspectos Funcionais da Comunicação de Crian-
ças com Síndrome Autística. Tese de Doutorado, FFLCH-USP,
1995.
FERNANDES, F.D.M. – Autismo Infantil: Repensando o Enfoque
Fonoaudiológico. São Paulo, Editora Lovise, 1996.
FERNANDES, F.D.M.; PASTORELLO, L.; SCHEUER, C. – A Fonoau-
diologia em Distúrbios Psiquiátricos da Infância . São Paulo, Editora
Lovise, 1996.
FREUD, S. – Artigos Sobre a Técnica e Outros Trabalhos. Edição
Standard Brasileira, Vol. XII. Trad. José Octávio de Aguiar Abreu,
Rio de Janeiro, Imago ed., 1969. p. 149.
HALLIDAY, M.A.K. – Language as Social Semiotic – The Social
Interpretation of Language and Meaning. Maryland, University Park
Press, 1978.
HERRERO, E. – O Processo Terapêutico Fonoaudiológico de uma
Criança Atendida em Hospital-Dia. Tese de Mestrado em Distúrbios
da Comunicação, PUC-SP, 1995.
KANNER, L. – Child Psychiatry . 3ª ed. Illinois, Charles C. Thomas
Publisher, 1957.
KLEIN, M. – Psicanálise da Criança. 1ª ed. (1932). São Paulo, Mestre
Jou, 1975.
LANG, J.L. – Nas Fronteiras da Psicose Infantil . Rio de Janeiro, Editora
Zahar, 1979.
MAHLER, M. – As Psicoses Infantis e Outros Estudos. 1º ed. (1979).
Porto Alegre, Artes Médicas, 1983.
MANONI, M. – A Criança Retardada e a Mãe. 1ª ed. (1964). São Paulo,
Martins Fontes, 1988.
PASTORELLO, L.M. – Linguagem e Análise do Diálogo entre Adultos e
Adolescentes com Síndrome de Asperger. Tese de Mestrado em
Semiótica e Lingüística Geral, FFLCH-USP, 1996.
970
44
Gagueira
Silvia Friedman
INTRODUÇÃO
GAGUEIRA NATURAL
A partir do contexto acima delineado, parece importante
trabalhar, em primeiro lugar, a noção da gagueira com um
fenômeno natural, para, em função dela, formar conceitos cien-
tíficos que norteiam os procedimentos e a postura clínica voltados
para a avaliação e a terapia fonoaudiológicas tanto do falar fluente
como do gaguejado.
A manifestação da gagueira, tomada em sentido amplo, pode
ser entendida como algo natural à produção de fala das pessoas,
em qualquer período da vida (infantil ou adulta). Tanto é assim que
os lingüistas, quando definem fluência, explicam que se trata de
uma produção de fala em que, normalmente, ocorrem diferentes
tipos de interrupções como hesitações, prolongamentos, repeti-
ções e pequenos bloqueios, dependendo dos estados subjetivos
do sujeito que fala e das condições em que se dá a comunicação.
A gagueira é uma condição natural ao ato de falar devido a,
pelo menos, três tipos de determinações: as motoras, as cogniti-
vas e as emocionais. Para entender essas determinações é
necessário examiná-las em separado, considerando, entretanto,
que elas podem agir separadamente ou simultaneamente e sem-
Gagueira 973
Avaliação e terapia
A concepção que se tem sobre os fenômenos é fundamental
para definir a forma de avaliá-los e de tratá-los. Assim, coerente-
mente com o que se disse até aqui a respeito da gagueira natural,
para poder avaliá-la, é importante, em primeiro lugar, que o
terapeuta desenvolva sua escuta para os diferentes padrões de
fala e fluência dos indivíduos, nas diferentes faixas etárias,
incluindo nisso uma análise crítica de seu próprio padrão, para
familiarizar-se com a realidade e abandonar as idealizações. Isto
visa formar uma capacidade de observação da fala não-influenciada
pelos falsos dogmas sobre a fluência e a gagueira, para que não
se reproduzam os falsos conceitos que o senso comum e os ideais
Gagueira 977
GAGUEIRA-SOFRIMENTO
O que dissemos até aqui sobre a gagueira natural, abre o
caminho para o que temos a dizer sobre a gagueira-sofrimento. A
primeira consideração é que a concepção de gagueira natural e os
procedimentos delineados evitam que se desencadeie o desen-
volvimento da gagueira-sofrimento ou, se desencadeado, possa
ser revertido o mais prontamente possível. A reversão do proces-
so se deve justamente ao fato de que a gagueira-sofrimento se
inicia pela não-aceitação do padrão de fala. Essa não-aceitação
Gagueira 981
Avaliação e terapia
Como se pode depreender de tudo quanto foi dito até aqui, a
avaliação da gagueira está centrada na análise e compreensão das
relações de reciprocidade entre quatro aspectos que dizem respeito
à história de vida do indivíduo designado como gago: seus conteú-
dos subjetivos sobre a fala; os conteúdos subjetivos dos outros que
para ele são significativos, sobre sua fala; as características das
relações de comunicação que vivencia e ao padrão de fala que
apresenta. Por intermédio da escuta da história de vida do indivíduo,
que está articulada à daqueles que o cercam, apreendem-se as
Gagueira 983
partir daí, que seria muito melhor se ela deixasse de lado esse
trabalho de procurar gagueira em palavras que ainda nem sequer
falou.
Alcançado o novo ponto de vista, investe-se numa postura
de auto-observação. Por intermédio da auto-observação o pa-
ciente passa a perceber, no dia-a-dia, quanto ele costuma prever
suas quebras, e quanto os seus momentos de gagueira estão
ligados a essa previsão. Isso aprofunda o novo ponto de vista, ou
seja, a compreensão da gagueira, bem como a possibilidade de
aceitá-la como conseqüência lógica de um padrão peculiar do seu
modo de pensar e sentir-se numa dada situação.
Paralelamente a esse trabalho, desenvolve-se, por meio de
técnicas de abordagem corporal, a sensibilidade para o próprio
corpo. Esse desenvolvimento visa, primeiramente, fazer com que
o paciente sinta sua efetiva capacidade de fala. Sinta e perceba
que todos os sons que aparecem gaguejados aparecem também
sem gagueira. Sinta, enfim, que o comportamento de gaguejar, ao
contrário do que ele imaginava, não representa uma incapacidade
na sua habilidade de falar, mas sim um estado que sua fala pode
assumir sob certas condições que ele está começando a reconhe-
cer. Isto dá suporte e facilita o desenvolvimento da capacidade de
auto-observação crítica. Alcançado esse ponto, o trabalho com a
sensibilidade corporal prossegue, ainda, para o reconhecimento
dos padrões motores da sua gagueira e para o desenvolvimento
da capacidade de gaguejar de propósito.
Para chegar a tudo isso é importante descrever e vivenciar
com o paciente todos os detalhes que compõem a habilidade de
fala. A respiração e a capacidade de respirar na porção baixa,
média e alta. A produção da voz. A produção de cada fonema. A
percepção de que se pode interferir na respiração, no padrão
vocal, no modo mais ou menos preciso de articular cada fonema,
na velocidade da articulação, na entoação. A percepção de que
não se pode interferir com a seqüência de produção dos fonemas
que vão compondo as palavras e as frases, adivinhando as falhas,
porque essa produção é automatizada e era, justamente, o ponto
no qual ele acreditava poder interferir. Para isso, por intermédio
das técnicas pertinentes, pode-se levar o paciente a estados de
relaxamento físico e mental profundos, preferencialmente na
posição sentada, para nesse estado propor-lhe fala automática
(seqüências de números, meses, dias da semana); nomeações
de cores, lugares, objetos, conforme aparecem em sua mente;
relato da característica de lugares que conhece e/ou que cria em
sua imaginação e finalmente relatos de eventos de sua vida.
Com crianças dificilmente se poderá usar a técnica de
relaxamento anteriomente descrita. Se relaxamento é necessá-
rio, a técnica do toque, da massagem, pode ser mais interessan-
te. E, de uma forma lúdica, pode-se vivenciar momentos de fala
automática e espontânea que a levem a perceber-se um falante
competente.
Gagueira 989
para falar bem, como parte da gagueira e não como solução viável
para ela. Com o auxílio dos progressos na vivência corporal pode
então observar como se constituem muscularmente esses rituais
e perceber que, efetivamente, a fala fluente produzida em nada
depende de sua existência. A auto-observação dos rituais dentro
de um contexto em que o indivíduo sabe que eles são parte da
manutenção da gagueira, aliada às vivências que lhe permitem
sentir-se bom falante, promove uma gradativa desativação des-
ses rituais porque acabam perdendo a sua função.
A gagueira voluntária, que já mencionamos anteriormente,
também é bastante eficiente para desfazer os rituais e devolver o
indivíduo ao seu estado fluente. Os rituais e tudo o mais que for
identificado como parte da gagueira serão usados de forma
proposital, sendo aconselhável imitar uma forma de gagueira de
cada vez, até que a pessoa se familiarize e possa imitar várias
formas, caso existam, em um mesmo período de fala. Este
comportamento reverte todo o esquema da gagueira-sofrimento,
porque ao produzir gagueira de um modo voluntário, suprime-se
a emoção negativa e o contexto de tentar falar bem a ela
associadas; ao mesmo tempo, ao produzir gagueira voluntária o
paciente está aceitando a gagueira. Com isso, o sujeito de vítima
passa a ver-se como autor da gagueira e pode passar a sentir
domínio sobre ela. Para trabalhar com isso, porém, as mesmas
condições acima delineadas são necessárias: aceitar a gagueira
e ter vivências corporais da fluência e da gagueira.
Resta dizer que todo o trabalho de observação das relações
de comunicação, de auto-observação dos sentimentos e dos
pensamentos ligados à gagueira; a vivência corporal da fluência
e da gagueira e a gagueira voluntária não se realizam apenas na
sessão de terapia, mas são também planejadas na forma de
pequenas tarefas, passíveis de serem realizadas no dia-a-dia do
paciente, em algum momento de sua fala. Assim, por exemplo, se
prescreve ao paciente a auto-observação da antecipação dizendo
que, a partir dos novos conhecimentos por ele alcançados ele
certamente perceberá, em vários momentos de sua fala durante
a semana, que tal fenômeno está acontecendo. Outro exemplo:
combina-se com o paciente que ele dará telefonemas anônimos
gaguejando de propósito para observar os seus sentimentos e as
reações dos que atendem ao telefone. Análises complementares
sobre o processo terapêutico aqui delineado poderão ser encon-
tradas em FRIEDMAN (1994) & FRIEDMAN (em PASSOS, 1996).
REVISÃO DA LITERATURA
Embora a gagueira continue a ser um tema controvertido no
panorama dos conhecimentos sobre a produção da fala humana,
poucas pesquisas têm sido realizadas a seu respeito, em nosso
meio científico-acadêmico, nos últimos 10 anos. A maior parte das
publicações que tem chegado até nós são de origem norte-
992
Leitura recomendada
BANDLER & GRINDER – Sapos em Principes. São Paulo, Summus
Editorial, 1982.
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Deficiência Auditiva 1
Trabalho Fonoaudiológico em Berçário 1001
45
Trabalho Fonoaudiológico
em Berçário
Cláudia Xavier
INTRODUÇÃO
FUNCIONAMENTO DO RECÉM-NASCIDO
O funcionamento do recém-nascido deve ser sempre conside-
rado para que este não seja sobrecarregado durante a interven-
ção e mesmo no sentido de orientar pais e demais profissionais
para que consigam um contato mais efetivo com o bebê.
ALS (1986) fala bem detalhadamente sobre o modelo de
organização e desenvolvimento do comportamento do bebê
(Fig. 45.1).
Neste modelo é colocado que o desenvolvimento ocorre a
partir da concepção, até que após o nascimento é possível para
o bebê de termo normal, apresentar coordenação entre sucção/
respiração/deglutição, ficar em alerta por algum tempo, entrar em
contato com o ambiente e regular os estímulos externos de acordo
com a sua disponibilidade.
Com 4 semanas após a concepção, já existe movimento de
contorção do feto. Entre a 2ª e 8ª semanas, o feto já adquire
postura de flexão.
No período embrionário, com 9 semanas e meia, o feto já
abre e fecha a boca. De 9 a 12 semanas já realiza movimentos
isolados de cabeça e membros. Com aproximadamente 11
semanas inicia a deglutição. De 13 a 16 semanas apresenta
abertura e movimentação de olhos. Com aproximadamente 17
semanas inicia sucção. De 17 a 20 semanas apresenta coorde-
nação de movimentos de mão a face. É a partir deste momento
Trabalho Fonoaudiológico em Berçário 1005
Atenção/Interação
Estados
Motor
Autônomo
Ambiente Organismo
Semana/ comportamento
Social mais 47 – 52 Brincadeira com objetos
amplo 42 – 46 Reciprocidade social
37 – 41 Estado de alerta
32 – 36 Movimentos rápidos de olhos/movi-
mentos respiratórios coordenados
Familiares 28 – 31 Movimentos complexos, sucção digital
Ambiente 25 – 27 Movimento respiratório fetal
extra-uterino 21 – 24 Movimentos rápidos de olhos
17 – 20 Movimentos coordenados de mão à
face
13 – 16 Abertura e movimentos de olhos
Familiares 09 – 12 Movimentos isolados de cabeça e
Ambiente membros
intra-uterino 02 – 8 Postura em flexão
04 Movimentos de contorção
Concepção
• Período pré-natal
Deglutição e sucção já ocorrem.
• Período pós-natal
O desenvolvimento da alimentação consiste na maturação e
integração de todos os componentes necessários para a alimen-
tação normal.
1008
Reflexos primitivos
Bebês normais nascem com reflexos que são básicos para
sua sobrevivência (reflexo de Moro, de Marcha, tônico cervical
assimétrico e depois o simétrico, preensão palmar, de mordida, de
vômito, entre outros). A maioria destes reflexos são assimilados
na medida em que o bebê desenvolve mais controle de seu corpo
e ambiente. Crianças com alterações neurológicas podem conti-
nuar a exibir estes reflexos além do período normalmente esperado.
A persistência destes reflexos interfere no desenvolvimento
da criança em todas as áreas, incluindo alimentação e deglutição.
Respiração
A respiração é nasal até aproximadamente os 3 meses de vida.
A epiglote contata o palato mole. A respiração não é sincronizada e
flutua entre respiração abdominal e torácica superior.
Durante a respiração observam-se depressão da cavidade
torácica e expansão do abdômen. Depressão do esterno pode
ocorrer. O diafragma é puxado sem ocorrer outro controle muscu-
lar ativo para contrabalançar a ação.
Fala e linguagem
Ocorre produção de vogais abertas durante episódios de
choro e sons vegetativos durante a alimentação.
No final deste período ocorre a diferenciação do choro.
1010
Respiração
Aos 6 meses o bebê vai apresentar mais respiração torácica.
Fica mais tempo numa posição ereta e está desenvolvendo
controle da musculatura abdominal.
Fala e linguagem
Aos 6 meses existe variação das expressões faciais. O bebê
já dá risadas e o choro torna-se significativamente diferenciado.
Há maior estabilidade de mandíbula.
Ocorre a produção de vogais mais sustenidas e menos
nasalizadas e algumas combinações de consoante/vogal. O bebê
começa a imitar alguns sons. Ocorre o início do balbucio.
Pode ocorrer a erupção do primeiro dente.
ATUAÇÃO FONOAUDIOLÓGICA
Em vários centros hospitalares atualmente, o médico encami-
nha para avaliação fonoaudiológica, bebês com dificuldades de
alimentação. O encaminhamento pode também não ser feito, no
caso do médico não acreditar na possibilidade de alimentação por
via oral. Ou o encaminhamento pode ser tardio, sob o ponto de
vista do desenvolvimento motor oral e global e não só da alimen-
tação por via oral (MORRIS & KLEIN, 1987; ARVEDSON & BRODSKY,
1993; XAVIER & BASTIVANJI, 1994).
Muitas vezes o encaminhamento é tardio por não haver um
fonoaudiólogo atuando na rotina do hospital, onde neste caso ele
já estaria triando os bebês quanto à necessidade de um trabalho
específico desde o momento em que existe a necessidade e que
o quadro clínico do bebê permite.
Dentro de uma abordagem mais global, a alimentação é conse-
qüência e não o objetivo do trabalho em si. Ao bebê ou à criança é
dada a possibilidade do uso apropriado da boca, exploração dos
sistemas respiratórios e fonatórios, posicionamentos mais compa-
tíveis com suas necessidades e maior contato com os pais tentando
proporcionar situações de interação mais efetivas.
O ideal seria que fosse feito o encaminhamento o mais rápido
possível, nos seguintes casos:
• incoordenação de sucção e deglutição;
• utilização de sonda gástrica;
• sucção fraca;
• falhas respiratórias e/ou durante a alimentação;
• reflexo de vômito exagerado e episódios de tosse durante
alimentação;
1012
AVALIAÇÃO E CONDUTA
A avaliação deve ocorrer no momento regular de alimentação
do bebê. Como etapa inicial deve-se:
• questionar e pesquisar sobre a história familiar, dados da
gestação, ambiente;
• ler o prontuário e discutir dúvidas com a equipe;
• observar presença de sonda nasogástrica, orogástrica, gas-
trostomia ou outras;
• observar a face do bebê (simetria, características estrutu-
rais);
• observar tono, postura global e musculatura facial;
• expressões faciais;
• estado de comportamento do bebê durante a avaliação.
Palpação
• palpar ao redor da boca, mandíbula e bochechas;
• verificar as estruturas intra-orais (observar palato, posicio-
namento, tono e mobilidade de língua);
• observar reações e reflexos que ocorrem.
Reflexos
• observar reflexo de procura, de sucção, vômito, mordida
fásica e preensão palmar e deglutição.
1. Volume de leite / BC
2. Horário de início da mamada
3. Prontidão para a mamada
4. Tono
5. Estado de consciência no início da mamada
6. Postura no início da mamada
7. Sucção
8. Grau de força de sucção
9. Variação no ritmo de sucção
10. Movimentação de língua
11. Refluxo
12. Variação na força de sucção
Sinais de estresse
13. Escape de leite
14. Variação de tono global
15. Alteração respiratória
16. Outros sinais
17. Adormece durante a mamada
18. Horário do final da mamada
19. Tempo que permanece sugando
Eficiência
20. Ml/minutos
21. Tempo total de alimentação
Conduta
• Iniciar SNN
• Continuar SNN
• Iniciar VO
• Quantidade por VO
• Suspender VO
• Observações
Realização da SNN
O bebê deve ser posicionado em decúbito lateral, com inclina-
ção e suporte necessário para que fique estável nesta posição.
Deve-se tentar promover uma posição de flexão que facilitará a
performance de sucção e desenvolvimento global do bebê. A SNN
pode ser iniciada quando o bebê ainda se encontra na isolete,
desde que sejam respeitados os critérios citados anteriormente
(Fig. 45.2).
O bebê é tocado, acariciado antes de receber o leite por
gavagem. São realizados toques em todo o corpo e na face. É
posicionado e lhe é oferecido o dedo mínimo envolvido por luva, bico
de chupeta ou bico de mamadeira para iniciar seu aprendizado
enquanto recebe o alimento pela sonda. O ideal é que a SNN seja
realizada com a utilização de dedo de luva, para melhor avaliação
dos movimentos e tono de língua do bebê. Pode-se molhar o dedo
de luva com solução glicosada ou leite, com a finalidade de promo-
ver mais estímulo e propriocepção para o bebê.
Esta experiência tem se mostrado bastante importante para a
evolução de bebês hospitalizados. O bebê vai evoluindo gradati-
FIGURA 45.2 – Recém-nascido prematuro durante situação de SNN. Recebe leite por sonda nasogástrica
enquanto é estimulado com dedo de luva com um pouco de leite para aumentar a propriocepção.
Encontra-se em decúbito lateral direito, leve inclinação do colchão e apoio nas costas para conseguir
permanecer nesta posição. Já direciona os membros em direção à linha média, mas o tono ainda é
alterado. Não consegue ainda ficar com olhos abertos durante toda a mamada.
Trabalho Fonoaudiológico em Berçário 1017
Controvérsias
Existem diversas opiniões em relação aos tipos de sondas
utilizadas (Fig. 45.4). É de comum acordo que a sonda nasogástrica
e a orogástrica tendem a prejudicar toda a mucosa por onde elas
passam e também o desenvolvimento motor oral do bebê quando
utilizada por tempo prolongado. Muitos serviços optam pela sonda
orogástrica inicialmente na medida em que grande parte dos
1018
ALTA HOSPITALAR
A alta hospitalar deve ocorrer no momento em que o bebê
encontra-se com o padrão adequado de alimentação e a mãe
orientada e tranqüila com relação a esta situação.
A mamada precisa ser neste momento funcional, ou seja, o
bebê deve ser eficiente, não demorar demais para adquirir a
quantidade de leite necessária para ele, além de apresentar
padrão adequado de sucção, deglutição, respiração e postura.
A mãe já deve ter vivenciado várias situações de alimentação
com seu bebê e já deve poder reconhecer possíveis sinais de
estresse e desorganização do bebê para evitá-los ou para interrom-
per a mamada se estes surgirem em casa. Orientações específicas
relacionadas ao funcionamento individual do bebê devem ser da-
das. A mãe deve estar com prática nas técnicas de amamentação
vivenciadas no berçário para poder transformar esta situação que
inicialmente gerou tensão, em algo prazeroso para ela e seu bebê.
Seria fundamental que estes bebês considerados de “risco”
fossem acompanhados após a hospitalização também em nível
fonoaudiológico para um melhor conhecimento quanto ao seu
desenvolvimento e também para a detecção precoce de crianças
que necessitam de intervenção mais direta ou orientação a pais no
decorrer do acompanhamento. Várias pesquisas mostram como
seqüelas destes bebês considerados de “risco”, as alterações
globais de desenvolvimento, como atraso motor relevante, paralisia
cerebral, deficiência auditiva; também mostram como seqüelas
menos evidentes, as alterações de fala, linguagem, desenvolvimen-
to cognitivo, dificuldades de aprendizagem, problemas comporta-
mentais, entre outros (ANDRADA, 1989; AZEVEDO, 1993; BASSETTO,
1994; XAVIER & CARDINALLI, 1995; XAVIER, TAQUES; ALVES, 1996).
É de extrema importância que programas preventivos,
educativos e de intervenção não só na fase hospitalar assim como
no seguimento destes bebês denominados de “risco” se desenvol-
vam. Este período inicial é básico para a qualidade de saúde e
desenvolvimento em todas as outras fases da vida. Cabe ao
fonoaudiólogo investir nesta formação e atuação, além de
conscientizar outros profissionais e a população em geral, quanto
a esta nova possibilidade de atuação.
Leitura recomendada
ALS, H. – A synactive model of neonatal behavioral organization. In:
SWEENEY, J.K. The High-Risk Neonate: Developmental Therapy
Perspectives. New York, Hawort Press, 1986.
Trabalho Fonoaudiológico em Berçário 1021
Reabilitação
Fonoaudiológica nos
Casos Oncológicos de
Cabeça e Pescoço
1026
Atendimento Fonoaudiológico nas Laringectomias Parciais 1027
46
Atendimento
Fonoaudiológico nas
Laringectomias Parciais
Mara Behlau
Maria Inês Gonçalves
INTRODUÇÃO
Cordectomia
A cordectomia representa a ressecção de uma prega vocal,
com margem no pericôndrio interno, com ou sem aritenoidectomia
(Fig. 46.1).
A voz resultante melhora a médio prazo, quando se forma uma
fibrose no local da prega ressecada, chamada em alguns textos de
“neocorda”, que passará a atuar como muro de apoio da prega vocal
remanescente. Podemos, por vezes, observar vibração da mucosa
da cicatriz pós-ressecção, quando há condições para a ocorrência
Laringectomia frontolateral
Para a realização de uma laringectomia frontolateral ocorre a
ressecção da quilha da cartilagem tireóidea, mais a exérese
subpericondrial de uma prega vocal, com ou sem aritenoidectomia
e com margem no pericôndrio interno (Fig. 46.3).
O resultado vocal depende da reconstrução empregada, que
produzirá uma nova anatomofisiologia. De modo geral, a voz
perde em harmônicos e em intensidade, com uma qualidade
global áspera ou rouca. A voz resultante tende a ser áspera
quando não é realizada a aritenoidectomia e a área submetida à
ressecção transforma-se em um tecido enrijecido, que passa a ser
estirado pela aritenóide. Por outro lado, quando é realizada a
aritenoidectomia, ocorre um colabamento dos tecidos remanes-
centes, e a quantidade de massa colocada em vibração produz
uma voz de qualidade rouca. Convém lembrar que vozes de
Atendimento Fonoaudiológico nas Laringectomias Parciais 1031
Hemilaringectomia
Na hemilaringectomia ocorre a ressecção de uma lâmina da
cartilagem tireóidea, com a quilha da mesma, juntamente com o
pericôndrio externo, incluindo ou não a borda posterior dessa
cartilagem, com a inserção do músculo constritor inferior da faringe.
Nas estruturas ressecadas, estão incluídas a comissura anterior,
toda uma prega vocal, com ou sem uma cartilagem aritenóidea, o
ventrículo, a prega vestibular e o terço anterior da prega vocal
contralateral, com margem no pericôndrio externo (Fig. 46.4).
O resultado vocal é freqüentemente melhor que nas laringecto-
mias frontolaterais, devido ao motivo já apresentado anteriormente:
a tendência ao colabamento das estruturas da laringe e a vibração
em bloco produzem uma voz disfônica, porém, bem aceita social-
mente. Do momento em que a maioria desses pacientes pertence ao
sexo masculino, a voz rouca de freqüência grave permite a correta
identificação do sexo do falante através das características acústicas
de sua emissão. A voz áspera, resultado da sonorização do ar por
ativação dos tecidos cicatriciais rígidos, além de ser desagradável
tende a ser aguda, inaceitável para os falantes homens.
1032
Hemilaringectomia ampliada
Por sua vez, a hemilaringectomia ampliada corresponde a
uma ampliação da hemilaringectomia, com ressecção da subglote
anterior e cricoidectomia parcial e/ou pecíolo da epiglote e/ou loja
pré-epiglótica e/ou prega vocal contralateral até o processo vocal,
respeitando sua cartilagem aritenóidea e com margem no pericôn-
drio externo (Fig. 46.5).
O resultado vocal é semelhante ao anterior, mas geralmente
observa-se uma intensidade mais reduzida, o que implica menor
potência e projeção vocais, dificultando a comunicação em locais
ruidosos. Nesses casos, as tentativas de elevar a intensidade
podem resultar em fadiga fonatória, cansaço físico e tontura
devido à hiperventilação.
FIGURA 46.7 – Caso 1 – Paciente submetido à laringectomia parcial frontolateral, reconstruído por
retalho bipediculado de músculo esterno-hióideo (BAILEY, 1965). Imagem à esquerda durante a
respiração e imagem à direita durante a fonação. Observe que a fonação é realizada na região
supraglótica, através da aproximação de ambas as cartilagens aritenóideas e da epiglote. A fonte
sonora é eficiente e a qualidade vocal resultante é discretamente tensa (BEHLAU e cols., 1994).
Atendimento Fonoaudiológico nas Laringectomias Parciais 1039
FIGURA 46.8 – Caso 2 – Paciente submetido à hemilaringectomia, reconstruído por retalho miocutâneo
bipediculado de platisma (BRASIL e cols., 1991). Imagem à esquerda durante a respiração e imagem
à direita durante a fonação. Observe que a fonação é realizada na região glótica, através da
aproximação de prega vocal remanescente à esquerda, contra retalho de reconstrução à direita, região
esbranquiçada. A fonte sonora é eficiente e a qualidade vocal resultante é discretamente rouca
(BEHLAU e cols., 1994).
FIGURA 46.9 – Caso 3 – Paciente submetido à laringectomia vertical subtotal, reconstruído por retalho
de pele regional (CONLEY, 1975). Imagem à esquerda durante a respiração e imagem à direita durante
a fonação. Observe que a fonação é realizada com a tentativa de aproximação das estruturas
remanescentes e do retalho de pele, porém, permanece grande fenda fonatória. A fonte sonora não
é eficiente e a qualidade vocal resultante é rouca severa e soprosa extrema (BEHLAU e cols., 1994).
1040
aperiódico, quando percebe que vai aspirar, o que pode gerar uma
voz de qualidade tensa, estrangulada ou áspera (DOYLE, 1994).
Tal comportamento é de natureza compensatória e, portanto, não
deve ser tratado diretamente, mas sim a base da alteração, ou
seja, a aspiração.
É comum que nos casos de laringectomias horizontais supra-
glóticas os cirurgiões utilizem a técnica de elevação e anteriorização
da laringe, o que favorecerá o contato da língua com a própria
laringe. Tal recurso auxilia na proteção das vias aéreas, na
abertura da região pós-cricóidea e na passagem do bolo pelo
esôfago, procurando minimizar a desvantagem anatômica gerada
pela própria ressecção.
COMENTÁRIO FINAL
Em um tempo onde questões relacionadas à qualidade de
vida têm sido foco de reflexões profundas, a reabilitação do
indivíduo submetido à cirurgia parcial da laringe reveste-se de
extrema importância. As questões psicológicas relacionadas à
própria doença, o carcinoma, merecem por si só uma atenção
especial da equipe de saúde. A sensação de perda de controle
da própria vida talvez seja a marca mais lesiva do impacto desse
diagnóstico; porém, aspectos menores sobre a qualidade da voz
propriamente dita, da respiração e da deglutição podem atingir
proporções desastrosas em certos indivíduos, principalmente
nos que dependem de sua comunicação para a sobrevivência.
O esclarecimento da população leiga deveria ser prioridade
governamental, mas em nossa realidade ainda depende do
esforço individual dos profissionais envolvidos no atendimento
desse paciente. O tempo deve ser um aliado positivo e, neste
sentido, a reabilitação deve ser direta, eficaz e rápida. Todos os
esforços no desenvolvimento da contribuição fonoaudiológica
devem ser bem-vindos e apoiados pela comunidade científico-
acadêmica. A iniciativa dos editores deste livro, de incluir um
capítulo sobre laringectomias parciais num manual básico de
fonoaudiologia revela essa consciência, o que nos faz extrema-
mente gratas a eles.
Leitura recomendada
ALONSO, J.M. – Conservative surgery of the cancer of the larynx. Trans.
Amer. Acad. Ophthalm. Otolaryngol., 51:633-642, 1947.
Atendimento Fonoaudiológico nas Laringectomias Parciais 1049
47
Laringectomias Quase-totais
– Reabilitação
Fonoaudiológica
INTRODUÇÃO
Por muitos anos a laringectomia total era a única forma de
tratamento para o câncer avançado da laringe. Muito tem sido feito
para se compreender melhor o comportamento biológico do
câncer e, desta forma, a medicina tem tentado buscar novas
formas de tratamento menos mutiladoras.
Há uma grande preocupação em se realizar cirurgias mais
conservadoras, possibilitando melhor prognóstico funcional, mas
sem comprometer a erradicação do tumor. SHAH & SOO (1989)
citam que a preservação da voz é importante, mas não se deve
enfatizá-la em detrimento da cura do câncer.
O avanço dos equipamentos endoscópicos contribuiu para a
detecção e diagnóstico dos tumores laríngeos, possibilitando
melhor estadiamento e, conseqüentemente, indicações cirúrgi-
cas mais precisas e seguras.
Na década de 50 surgiram as cirurgias conservadoras da
laringe, denominadas laringectomias parciais horizontais e verti-
cais; tais técnicas eram melhor sistematizadas e baseadas, em
sua grande maioria, em antigas técnicas anteriormente descritas
(PINTO, 1989).
OGURA, no início da década de 70, descreveu a laringectomia
denominada quase-total (near-total), mas foi PEARSON (1981)
quem a popularizou.
1052
CONSIDERAÇÕES CIRÚRGICAS
O termo laringectomia quase-total refere-se a uma ressecção
quase total da laringe. Preserva-se apenas uma faixa estreita que
conecta a via aérea e a faringe através da aritenóide não-
comprometida (PEARSON, 1981).
Essa operação é uma alternativa para a laringectomia total
quando uma pequena porção da laringe está livre do tumor. Sua
indicação deve ser precisa e não deve comprometer o critério
oncológico da cirurgia.
Esse procedimento cirúrgico é indicado para tumores larín-
geos incluindo lesões glóticas com fixação de prega vocal, lesões
subglóticas e supraglóticas extensas, em que não seja possível a
realização da laringectomia parcial (Fig. 47.1). Pode também ser
realizada para tumores de seio piriforme, desde que a região da
cartilagem cricóide e a região cricofaríngea estejam livres do
tumor (PEARSON, 1981). A laringectomia quase-total é contra-
Laringectomias Quase-totais – Reabilitação Fonoaudiológica 1053
Faringe
▼
Tumor
▼
Local do shunt
▼
Traquéia
▼
FIGURA 47.1 – Visão da laringe com tumor.
Prega vocal
▼
Linha de ressecção
Aritenóide
▼
Cricóide
▼
Shunt
▼
traqueofaríngeo
Cânula
▼
Esôfago
▼
Traquéia
▼
REABILITAÇÃO FONOAUDIOLÓGICA
A reabilitação fonoaudiológica nos casos de laringectomia
quase-total pode ser dividida em duas fases: 1. orientação pré-
operatória; e 2. reabilitação fonoaudiológica propriamente dita.
Orientação pré-operatória
A reabilitação fonoaudiológica deve ter início no período pré-
operatório. Esse primeiro contato com o paciente é importante
para que se estabeleçam os vínculos terapêutico e de confiança,
essenciais para a reabilitação. Além disso, é possível se identificar
o estado emocional do indivíduo, o que auxilia o fonoaudiólogo a
selecionar a melhor abordagem terapêutica.
Laringectomias Quase-totais – Reabilitação Fonoaudiológica 1055
Leitura recomendada
ANDRADE, R.P.; BRASIL, O.O.C.; BEHLAU,M.; PONTES, P.A.; GON-
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Laringectomia Total –
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1078
49
Tumores de Cavidade Oral e
Orofaringe – Atuação
Fonoaudiológica
INTRODUÇÃO
A atuação do fonoaudiólogo nos casos de câncer de cabeça
e pescoço, até há pouco tempo, era a reabilitação vocal do
laringectomizado total. Atualmente esse quadro vem mudando,
ainda que lentamente.
A preocupação com a qualidade de vida e a melhor forma de
reabilitação dos pacientes com ressecções da cavidade oral e
orofaringe têm despertado o interesse tanto dos cirurgiões de
cabeça e pescoço como dos fonoaudiólogos para uma atuação
em conjunto.
De acordo com CASPER & COLTON (1993), o tratamento
oncológico requer o mais alto nível técnico dos muitos profissio-
nais da área da saúde, que devem trabalhar como uma equipe
coordenada durante todo o processo.
O fonoaudiólogo, juntamente com os outros membros da
equipe, deve decidir qual a melhor conduta a ser tomada, pensan-
do na reabilitação e no prognóstico dos pacientes.
A atuação fonoaudiológica deve ter um contexto mais amplo,
não apenas de reabilitar os comprometimentos estéticos e funcio-
nais, mas também de ajudar e de incentivar os pacientes a se
reintegrarem socialmente, reassumirem as atividades que exerci-
am antes, quando possível, e aceitarem as limitações decorrentes
da intervenção cirúrgica. Além disso, deve informar e conscienti-
1080
CONSIDERAÇÕES GERAIS
A cavidade oral é uma localização bastante freqüente de
neoplasias malignas. Nos países subdesenvolvidos, que concen-
tram dois terços dos casos que ocorrem no mundo, essa é a
terceira localização mais comum.
Este tipo de câncer ocorre mais no sexo masculino, em uma
proporção de aproximadamente 5:1, sendo os indivíduos acima
dos 40 anos os mais freqüentemente acometidos.
A ocorrência desta neoplasia está intimamente relacionada, na
maioria dos casos, à condição sócio-econômica mais baixa.
Dentre os fatores relacionados à gênese destas neoplasias,
o tabagismo tem papel de destaque. Sabe-se que entre a
população de fumantes a incidência de câncer de cavidade oral
e orofaringe é significantemente mais elevada que entre não-
fumantes. A Índia é o país onde a ocorrência de câncer nestas
regiões é a mais elevada no mundo. Tal achado se explica pelo
hábito bastante difundido naquele país de se mascar tabaco.
O etilismo é outro hábito que tem influência na gênese destas
neoplasias. A análise dos casos mostra que mais de 90% dos
pacientes são fumantes e/ou etilistas, sendo a associação destes
hábitos, o achado mais freqüente.
1
2
8
5 9
5
7 3
2
1
FIGURA 49.1 – Esquema mostra sub-regiões de cavidade oral e orofaringe. 1= Lábios; 2= gengivas
superior e inferior; 3= língua; 4= assoalho da boca; 5= mucosa bucal; 6= palato duro; 7= área
retromolar; 8= palato mole; 9= úvula.
Tumores de Cavidade Oral e Orofaringe – Atuação Fonoaudiológica 1081
Anatomia
A cavidade oral é anatomicamente definida como uma região
delimitada anteriormente pela transição entre o vermelhão dos
lábios e a pele e posteriormente pelos pilares amigdalianos. A
orofaringe compreende a região que se estende do palato mole e
úvula à base de língua e valécula. Desta forma, temos dentro
destes limites as seguintes sub-regiões anatômicas que com-
põem a cavidade oral e a orofaringe: lábios; gengivas superior e
inferior; língua; assoalho de boca; mucosa bucal; palato duro; área
retromolar; palato mole; úvula (Fig. 49.1).
Tipos de lesões
Existem três tipos básicos de lesões neoplásicas malignas
na cavidade oral e orofaringe: vegetantes, infiltrativas e ulcera-
das, sendo que mais comumente ocorrem combinações destas.
Temos, portanto, tumores que podem assumir aspecto úlcero-
vegetante ou úlcero-infiltrativo (Fig. 49.2 A, B e C). Sabe-se que
as formas predominantemente vegetantes tendem a ter uma
evolução mais lenta e um prognóstico mais favorável em relação
às lesões predominantemente infiltrativas, que mais rapida-
mente acometem as estruturas profundas da cavidade oral e
orofaringe.
A B C
FIGURA 49.2 – A) Lesão úlcero-vegetante de língua. B) Lesão úlcero-infiltrativo de assoalho de boca.
C) Lesão vegetante de língua e assoalho de boca.
Diagnóstico
A dor e a presença de uma “ferida” na boca são os sintomas mais
freqüentes do câncer de cavidade oral e orofaringe. Sempre que
estas queixas estiverem presentes, o exame minucioso de todas as
sub-regiões se impõe. Devido ao fácil acesso ao exame físico, o
diagnóstico pode ser feito com relativa facilidade e, frente a alguma
lesão presente, a biópsia é obrigatória. Outros sintomas e sinais
como dificuldade para abertura de boca (trismo) ou sangramentos,
podem estar presentes nos casos mais avançados.
1082
Tratamento
O tratamento dos pacientes portadores de câncer de cavi-
dade oral e orofaringe deve necessariamente envolver diversos
profissionais. Cirurgiões, radioterapeutas, quimioterapeutas, on-
cologistas clínicos, fonoaudiólogos, psicólogos, nutricionistas e
dentistas devem compor uma equipe coordenada para que os
resultados sejam atingidos.
A principal forma de tratamento para estes pacientes é a
cirurgia acompanhada ou não de radioterapia. Diversos esque-
mas de tratamento podem ser utilizados, sendo a cirurgia seguida
de radioterapia, a modalidade empregada na maioria dos casos.
A quimioterapia também pode ser utilizada em alguns casos,
porém esta modalidade terapêutica até o momento não consegue
promover isoladamente um tratamento efetivo, sendo usada
sempre em associação com as outras formas já citadas.
Os procedimentos cirúrgicos realizados variam de acordo com
o estágio da doença. Assim, lesões precoces podem ser tratadas
com ressecções menores que praticamente não produzem com-
prometimentos funcionais, enquanto lesões avançadas deman-
dam a utilização de técnicas cirúrgicas agressivas que acarretam
em seqüelas estéticas e funcionais significativas.
Dentre as sub-regiões citadas, as mais freqüentemente aco-
metidas são a língua e o assoalho de boca. Assim, as cirurgias
mais realizadas são as glossectomias e as pelvectomias. Ressec-
ções combinadas de diversas sub-regiões também podem ser
utilizadas como forma de tratamento.
As ressecções localizadas são quase sempre reconstruídas por
meio da utilização de suturas simples com as estruturas remanes-
centes, enquanto as ressecções extensas necessitam de retalhos
para a sua reconstrução, levando a maior dificuldade na reabilitação.
Tumores de lábios
Tumores malignos dos lábios (Figs. 49.4 e 49.5), particular-
mente os de lábio inferior, são de fundamental importância entre
os tumores de cabeça e pescoço devido à sua alta incidência e alta
curabilidade, pois são tumores bem-diferenciados ao exame
histológico e de fácil acesso para o seu diagnóstico (OIIVEIRA &
MIRANDA, 1989).
Os tumores de lábio inferior são mais freqüentes, por esta
região estar mais exposta aos raios solares.
1084
FIGURA 49.8 – Esquema mostra lesão anterior da FIGURA 49.9 – Esquema mostra lesão lateral da
língua e área ressecada – glossectomia anterior. língua e área ressecada – hemiglossectomia.
FIGURA 49.10 – Esquema mostra lesão posterior FIGURA 49.11 – Esquema mostra lesão nos dois
da língua e área ressecada – glossectomia terços posteriores da língua e área ressecada –
posterior. glossectomia total.
1086
Glossectomia parcial
Cirurgias do terço anterior da língua podem prejudicar mais a
fala, a mastigação e a higiene oral. Quando a ressecção é do terço
posterior, a deglutição estará mais prejudicada. Nas ressecções
de hemilíngua, os pacientes não apresentam grandes alterações
de fala e deglutição pela facilidade de compensação com a parte
restante da língua. Essas alterações podem ser discreta distorção
articulatória e acúmulo de alimento na cavidade oral do lado
ressecado.
Em ressecções de língua menores que 50%, o comprometi-
mento de fala e deglutição está relacionado ao tipo de reconstru-
ção; já nas maiores que 50%, a extensão e a reconstrução
determinam a habilidade funcional (LOGEMANN, 1983).
Glossectomias menores que 50% podem apresentar altera-
ções mínimas de fala e de deglutição, normalmente no pós-
operatório imediato, sendo de fácil adaptação. Segundo
L OGEMANN (1983), a alteração de deglutição ocorre devido ao
edema, o que pode ocasionar uma pequena dificuldade no
disparo do reflexo.
Já nas ressecções maiores que 50%, os comprometimentos
funcionais são mais importantes e a reabilitação vai depender de
diversos fatores, como a extensão da cirurgia, tipo e aspecto da
reconstrução, grau de mobilidade da língua remanescente, pre-
sença ou ausência dos dentes.
As alterações nas glossectomias maiores que 50% geralmen-
te são:
Articulação prejudicada
Ocorre pela dificuldade de contato da porção remanescente
da língua com o alvéolo e palato para a produção dos fonemas
consonantais linguodentais, linguoalveolares, linguopalatais e
velares. As vogais também se encontram alteradas, principalmen-
te as que requerem uma posição superior ou anterior da língua,
devido à freqüência do segundo formante ser afetada pelo grau e
lugar de constrição dentro da cavidade oral. Alguns pacientes
usam a faringe, a epiglote, um resíduo qualquer de língua rema-
nescente ou um retalho de língua moldado e movimentos da
mandíbula (rebaixamento/elevação ou protrusão/retração), como
modo de compensação, a fim de produzir a acústica apropriada
(CASPER & COLTON, 1993).
Ressonância alterada
Segundo CASPER & COLTON (1993), a ressonância depende
do formato, tamanho e tonicidade do trato vocal. Como resultado
de cirurgias orais ablativas, podem ocorrer alterações em todos os
três aspectos.
Glossectomia total
Nas glossectomias totais, os comprometimentos mais seve-
ros são:
Articulação alterada
Todas as vogais e consoantes, exceto as bilabiais e
labiodentais, estão comprometidas. Porém, este não é um fator
limitante à comunicação, já que glossectomizados totais conse-
guem se expressar de forma inteligível sem utilizar outros recur-
sos, como o apoio gráfico, gestual ou a ajuda dos familiares
(TIWARI e cols. 1993).
Tumores de mandíbula
A ressecção de pequena porção da mandíbula não acarreta
problemas funcionais ou quando estes ocorrem, são mínimos,
como a dificuldade em mastigar do lado ressecado. Já os tumores
mais extensos, que podem envolver outras estruturas, como a
língua, comprometem a fala e a deglutição.
A exérese da mandíbula é chamada de mandibulectomia,
podendo ser do tipo marginal ou segmentar.
Na mandibulectomia marginal (Fig. 49.12), é ressecada uma
parte do corpo da mandíbula no sentido longitudinal. A
mandibulectomia segmentar (Figs. 49.13 e 49.14) compreende a
ressecção de um segmento vertical da mandíbula.
A mandibulectomia marginal não acarreta déficits funcionais
importantes. Quando associada à glossectomia parcial, resulta
geralmente em uma imprecisão articulatória, dificuldades de mas-
tigação e propulsão do bolo alimentar do lado ressecado. Tais
Tumores de palato
Os tumores de palato (Figs. 49.15A, B e C) podem estar
localizados apenas em palato duro ou mole ou mesmo acometer
1090
A B C
FIGURA 49.15 – A) Esquema mostra lesão de palato duro e área de ressecção. B) Esquema mostra
lesão de palato mole e área de ressecção. C) Esquema mostra lesão extensa de palato e área de
ressecção.
ORIENTAÇÃO PRÉ-OPERATÓRIA
A orientação pré-operatória para os tumores de cavidade oral
e orofaringe deve ser realizada com o paciente e seus familiares,
em especial o cônjuge, para que haja um maior grau de entendi-
mento sobre a cirurgia e uma melhor participação de todos no
processo de reabilitação. Seus objetivos são:
1. Estabelecer o vínculo terapeuta/paciente/família
Ao realizar a orientação pré-operatória, o fonoaudiólogo, o
paciente e sua família têm a chance de estabelerem vínculos
numa situação de comunicação mais favorável (BEHLAU & ZIEMER,
1989).
Quando a explicação for completa e os pacientes puderem
expressar seus sentimentos e esclarecer suas dúvidas em rela-
ção à cirurgia e à reabilitação, o fonoaudiólogo estará transmitindo
parte da confiança necessária a este processo. A ansiedade pode
ser reduzida se eles souberem, antes da cirurgia, que um profis-
sional especializado estará disponível para tratar suas dificulda-
des (GROHER,1996).
2. Conscientizar os pacientes do tipo de cirurgia e suas
conseqüências
Inicialmente, deve-se saber o que os pacientes conhecem
sobre a cirurgia e a partir daí, reforçar ou complementar tais
informações. É muito importante que essas informações sejam
dadas de forma clara, respeitando o nível sócio-cultural e o
interesse do paciente.
Nessas orientações devem constar esclarecimentos sobre o
local e extensão da lesão, o tipo de cirurgia e reconstrução a
serem realizados, assim como as possíveis alterações de fala e
deglutição decorrentes. Convém lembrar que as cirurgias de
cavidade oral e orofaringe podem causar desde mínimas até
grandes alterações, e por isso os esclarecimentos sobre estas
devem ser dados de acordo com o padrão característico de cada
cirurgia.
Os pacientes devem estar cientes de que, no pós-operatório
imediato, permanecerão temporariamente com uma sonda naso-
enteral para alimentação. Isso dependerá do processo cicatricial,
que se dá num período de 10 a 15 dias, associado ao sucesso na
reintrodução da alimentação por via oral. Cirurgias mais extensas
(por exemplo, glossectomia total), ou que envolvem a retirada de
mais que uma estrutura (por exemplo, retromolar ampliada),
requerem um tempo maior de permanência da sonda devido à
disfagia comumente presente.
Tumores de Cavidade Oral e Orofaringe – Atuação Fonoaudiológica 1093
ORIENTAÇÃO PÓS-OPERATÓRIA
Segundo DOYLE (1994), a orientação pós-operatória deve
enfocar as mudanças decorrentes da cirurgia e a habilidade dos
pacientes em se adaptarem a essas mudanças.
Neste momento, deve-se retomar com os pacientes e seus
familiares alguns pontos essenciais sobre a reabilitação. Na
maioria dos casos, eles esquecem as orientações dadas no
pré-operatório devido ao grau de ansiedade e estresse, que faz
com que eles não assimilem todas as informações.
Na primeira consulta pós-operatória, além de orientar os
pacientes, será necessária uma reavaliação da morfofisiologia
das estruturas remanescentes para entender melhor os novos
mecanismos de fala e deglutição utilizados. A sensibilidade intra
e extra-oral também deve ser avaliada, pois auxilia na propriocep-
ção, importante para um desempenho satisfatório destas funções.
Na avaliação de fala é importante verificar o quadro fonêmico,
o tipo articulatório e a velocidade de fala.
Na avaliação da deglutição é necessário observar a habilidade
de deglutição espontânea de saliva e realizar testes com alimentos,
variando quantidades e consistências. Deve-se estar atento a:
• introdução do alimento em cavidade oral;
• preparação do bolo (mastigação);
• movimento de propulsão do bolo alimentar;
• tempo de disparo do reflexo da deglutição;
• presença de resíduos alimentares em sulcos, língua, as-
soalho de boca, palato e pilares;
• movimentação vertical de laringe durante a deglutição;
• presença de tosse antes, durante ou após a deglutição e;
• qualidade vocal do paciente após a deglutição.
A partir das respostas obtidas com esta avaliação, pode-se
traçar um plano de terapia específico para cada paciente e
cirurgia.
TERAPIA
O sucesso da reabilitação está relacionado à motivação dos
pacientes, à sua própria capacidade de adaptação, à habilidade
da equipe de reabilitação assim como aos aspectos referentes à
cirurgia (CASPER & COLTON, 1993).
O conhecimento exato das estruturas ressecadas e o tipo de
reconstrução realizado é fundamental para determinar o plane-
jamento terapêutico e o possível prognóstico. Quanto mais
extensa for a cirurgia e mais estruturas envolver, pior será o
prognóstico.
O fonoaudiólogo deve reconhecer e aceitar as limitações
funcionais decorrentes da cirurgia, tentando ajudar os pacientes
a conviverem com suas dificuldades.
Tumores de Cavidade Oral e Orofaringe – Atuação Fonoaudiológica 1095
Ressecção de lábios
Na ressecção completa dos lábios, a terapia deve objetivar a
contenção salivar e alimentar e a melhora da articulação.
Para a contenção salivar e alimentar, os pacientes devem ser
orientados a deglutir com mais freqüência e tentar manter um
adequado vedamento labial, conseguido por meio de postura com-
pensatória de mandíbula. Exercícios de sensibilidade, com mate-
riais de diferentes temperaturas e texturas, aplicados com variação
de velocidade, direção e força, podem ajudar os pacientes a
conseguirem perceber o escape da saliva e do alimento.
A melhora da articulação pode ser conseguida por meio de
emissões dos fonemas plosivos com maior pressão, exercícios
de sobrearticulação e diminuição do ritmo e velocidade da fala.
Ressecção de língua
Glossectomia parcial
Glossectomia total
Para este tipo de cirurgia, o essencial é desenvolver movimen-
tos compensatórios com as estruturas remanescentes, a fim de
minimizar as alterações de articulação e deglutição.
Como forma de adaptação da fala, os pacientes são orienta-
dos a encostar o lábio inferior atrás dos dentes ou alvéolo superior
para produzir os fonemas /t, d, n/, ou mesmo estirar os lábios para
aproximar auditivamente as fricativas /s, z/, entre outras compen-
sações. Os pacientes, na tentativa de se adaptarem a essas
compensações, podem acabar desenvolvendo outras que sejam
satisfatórias.
Exercícios de sobrearticulação e diminuição do ritmo e veloci-
dade de fala ajudam a diminuir a hipernasalidade, melhorar a
precisão articulatória e tornar a fala mais inteligível.
Os exercícios de tônus e mobilidade da musculatura perioral são
importantes na terapia de disfagia, pois auxiliam na manutenção do
selamento labial e contenção de saliva e alimentos e evitam acúmu-
lo de resíduos alimentares em sulcos laterais e anteriores.
Devido ao atraso no disparo do reflexo da deglutição, pela falta
de contato do dorso da língua com os pilares palatoglosso, estes
devem ser estimulados termicamente com material gelado. Para
isso, realizam-se toques repetidos nos pilares, com espelho
laríngeo 0.0 embebido em gelo.
Além disso, manobras como a deglutição supraglótica, de-
glutição “dura”, múltiplas deglutições e empuxo podem ser
ensinadas aos pacientes, a fim de que eles sejam capazes de
proteger suas vias aéreas para deglutição. A realização de
exercícios com escalas de variação de tons graves e agudos
favorece a elevação laríngea e, conseqüentemente, o relaxa-
mento do esfíncter cricofaríngeo.
Para auxiliar a passagem de alimento para a faringe, pode
utilizar-se uma postura de cabeça levemente inclinada para trás,
facilitando a descida do alimento, e posteriormente para baixo
evitando assim a aspiração. 0 treino destas manobras pode não
utilizar alimento inicialmente e à medida que os pacientes estiverem
aptos a realizá-las, este começa a ser introduzido.
Geralmente, inicia-se por alimentos nas consistências líquida
ou líquida-engrossada, que facilitam o trânsito da cavidade oral
para a faringe. À medida que já houver um controle muscular
maior e uma adaptação às manobras ensinadas, procura-se
passar para alimentos pastosos. O simples posicionamento des-
tes alimentos mais posteriormente na cavidade oral ajuda a
eliminar as primeiras fases da deglutição. Alimentos sólidos são
praticamente impossíveis de serem introduzidos devido às limita-
ções anatômicas e funcionais presentes.
Tumores de Cavidade Oral e Orofaringe – Atuação Fonoaudiológica 1099
Ressecção de mandíbula
Nas mandibulectomias segmentares deve-se realizar exercí-
cios de abertura e fechamento de boca, tentando evitar desvios da
mandíbula, a fim de obter melhor selamento labial, diminuição do
defeito facial e mastigação mais adequada.
Massagens tonificadoras e exercícios isométricos e de mobi-
lidade de outras estruturas adjacentes (lábios, língua e boche-
chas) também ajudam a obter uma articulação mais precisa.
É importante ressaltar que nas mandibulectomias segmenta-
res sem reconstrução, o prognóstico funcional é limitado.
Ressecção de palato
Quando a ressecção do véu palatino é parcial, devem ser
realizados exercícios de mobilidade desta região, como estimula-
ção térmica gelada, emissão de fonemas plosivos-velares e fonação
sussurrada. Esses exercícios promovem a melhora do fechamento
velofaríngeo, diminuindo o refluxo nasal de alimentos, principalmen-
te líquidos, e a hipernasalidade. Exercícios de sobrearticulação
também auxiliam no aumento da oralidade das emissões.
Quando a prótese de palato é indicada, a terapia fonoaudiológi-
ca será necessária nos casos em que os pacientes apresentarem
articulação travada e ressonância nasal no pós-operatório, melho-
rando com os exercícios de sobrearticulação.
Leitura recomendada
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Tumores de Cavidade Oral e Orofaringe – Atuação Fonoaudiológica 1101
Índice Remissivo
G L
Gama tonal, 704 Laboratório vocal, 624
Gametogênese de um indivíduo, 30 f Laringe
Ganho funcional, 482 artificial, 1066, 1068, 1073
Genealogia(s) simétrica, 610 f
com padrão de herança, 32 f, 33 f, 35 f tipo cachimbo, 1067
hipotética, 26 f Laringectomia
Gestos indicativos, 888 parcial, 1028, 1029, 1033, 1035, 1044, 1045
Glossectomias, 1082, 1085, 1087, 1096 quase-total, 1044, 1051, 1059
Gnosia auditiva, 111 total, 1051, 1056, 1059
Laringoscopia, 723
H indireta, 691, 698
Lei de Fechner-Weber, 66
Hábitos parafuncionais, 792
Lesão
Hemotímpano, 13
cerebral, 939
Herança monogênica
coclear, 184
autossômica, 31, 32
de cápsula interna, 945
dominante, 34 de pálido, 945
recessiva, 35 de putamen, 945
Hereditariedade, 764 Letramento, 930
Heredograma, 26 Ligamento
Hidropisia endolinfática, 4, 21, 235 esfenomandibular, 809
Higiene vocal, 726 estilomandibular, 809
Hiperadução, 689 temporomandibular, 809
Hipernasalidade, 796 Limiar
Hipoacusia, 9 auditivo, 89
Hipoadução, 689 de detecção da fala, 281
de recepção da fala, 101, 155, 280
I Língua de sinais, 329
Imitação, 887, 903 Loudness, 623, 684, 705, 729 (ver também
condutas imitativas, 886 intensidade)
de novos sons, 885 Luxação recidivante, 817
vocal e motora, 891 M
Imitância acústica, 138, 165, 171
em recém-nascidos, 256 Macrogenia, 787
orelha média, 173 Malformação da orelha externa, 10 f, 11 f
Imitanciometria no diagnóstico Mandibulectomia, 1088, 1091
otológico, 179 Mascaramento, 88, 95
otoneurológico, 185 de crianças, 279
Implante coclear efetividade, 96, 105
multicanal, 401 na audiometria, 99
reabilitação de paciente, 406 tonal, 97, 98
seleção de pacientes, 405 vocal, 104
Inadaptações vocais, 610 Massagem
Incoordenação fonatória, 690 de origem japonesa, 672
integrativa, 677
Índice de reconhecimento da fala, 103, 281
Mastigação, 774, 792
Insuficiência velofaríngea, 829, 848
Membrana do tímpano, 14
Inteligência, Formação da, 883
Membrana sinovial, 809
Intensidade
Meningioma, 132
sonora, 66 Meningites, 22
vocal, 705 (ver também loudness) Mensurações
Interação, 880, 901 in situ, 483, 517
Interrupções, 972 microfone-sonda , 483, 517
J Métodos
de aspiração, inalação ou sucção do
Jargonografia, 941 ar, 1065
1108
Teste(s) Treinamento
da voz alternada, Weber, 161 autógeno, 679
de diapasão, 5 vocal, 632, 711
de Doerfler-Stewart, 160 Tremor vocal essencial, 686
de escuta monótica e diótica, 117 Triagem auditiva, 235, 240, 241
de fala, 279 Tubérculo articular, 805
com ruído branco, 113 Tumores
filtrada e de fusão binaural, 114 da área retromolar, 1090
de Fowler, 143 de cavidade oral e orofaringe, 1079
de Friedreich, 87 de lábios, 1083
de Lee-Azzi, 159 de língua, 1085
de Lombard, 159 de mandíbula, 1088
de reconhecimento de fala, 485 de palato, 1089
de Rinne, 86 de seio piriforme, 1052
de Schwabach, 87 glômicos da orelha média, 187
de Stenger, 162 laríngeos, 1052
diótico, 115, 116 na orelha média, 13
do feedback acústico, 159
V
SISI, 144
SSW, 118, 120 Vocal fry, 690
Timpanosclerose, 13 Voz
Tipologia facial, 796 bitonal, 622
Tipos cantada, 730
de sondas, 1018 f classificação, 729
de voz, 621 esofágica, 1063
Tone decay test, 142 traqueoesofágica, 1072
Trabalho profissional, 723
corporal, 662 tipo de, 621
multiprofissional, 694 tom médio, 729
Translocação equilibrada entre os
Z
cromossomos, 30 f
Trauma(s) Zona
acústico, 19 bilaminar, 808
cranianos, 21 retrodiscal, 808