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Até o fim do século XVI, o que desempenhou papel construtor no saber da cultura ocidental,
foi a semelhança. Ela que organizou o jogo dos símbolos, permitiu o conhecimento das coisas
visíveis e invisíveis, guiou a arte de representá-las. O mundo enrolava-se sobre si mesmo, a
pintura imitava o espaço, a representação (do saber ou em festa) se dava como repetição (sua
maneira de anunciar, formular seu direito de falar).
No século XVI a trama semântica da semelhança é muito rica, sendo quatro articulações ao
saber da semelhança seguramente essenciais.
Primeiro, a convenientia. São “convenientes” as coisas que, se aproximando uma das outras, se
tocam, se misturam, se conectam. Desse modo, comunica-se o movimento, as influências, as
paixões e as propriedades. Nessa articulação das coisas, aparece uma semelhança, do lugar
que natureza colocou as coisas, da semelhança das propriedades, no continente natural que é
o mundo. Seguido a isso, nasce por permuta novas semelhanças, um regime comum se impõe
com a semelhança em destaque, já que é o efeito visível da proximidade. A semelhança impõe
vizinhanças que asseguram semelhanças.
A similitude pode ser uma mesma forma separada de si pelo peso da matéria ou pela distância
dos lugares. A emulação é apresentada de inicio como um simples reflexo, longíquo; que
percorre em silêncio os espaços do mundo. A distancia que ela transpõe não é anulada pela
metáfora, permanece aberta para a visibilidade. É neste duelo que as duas figuras afrontadas
se apossam uma da outra. O semelhante envolve o semelhante, que o cerca, e que pode ser
novamente envolvido por um poder de prosseguir ao infinito. Os elos da emulação não
formam uma cadeia como os elementos da conveniência, que eram círculos concêntricos,
refletidos e rivais.
Tanto essa reversibilidade como esta polivalência conferem à analogia um campo universal de
aplicação. Por ela, todas as figuras do mundo podem se aproximar. Nesse espaço existe um
ponto privilegiado: o homem, é saturado de analogias (podendo encontrar seu ponto de apoio
dependendo de cada um), e passando por ele, as relações se invertem sem se alterar. “O seu
rosto está para o seu corpo como a face do céu está para o éter”(pg 38). O corpo de um
homem é sempre a metade possível de um atlas universal.
O que sabemos das figuras da semelhança recorre ao que sabiam no século XVI, onde
dispusera sobre as coisas. Tanto que a precisão só constitui anatomia comparada para um
olhar dos conhecimentos no século XIX.
O espaço das analogias é no fundo, um espaço de irradiação. Onde por todos os lados, o
homem é envolvido, e transmite as semelhanças que recebe do mundo. Ele é o centro onde as
relações vêm se apoiar e são novamente refletidas.
A simpatia é compensada pela sua figura gêmea, a antipatia. Esta mantem as coisas em seu
isolamento e impede a assimilação.
A identidade das coisas, o fato de que possam assemelhar-se a outras e aproximar-se delas,
sem contudo desaparecer, preservando sua singularidade, é o contrabalançar constante da
simpatia e da antipatia que o garante. Explica que as coisas cresçam, se desenvolvam, se
misturem, desapareçam, morram, mas se reencontrem, em algum espaço e em algum tempo.
O elemento do fogo (quente e seco) tem antipatia pela água (fria e úmida). O ar quente é
úmido, a terra fria é seca, eis a antipatia. Para conciliá-los, o ar foi colocado entre o fogo e a
água, a água entre a terra e o ar. Os quatro corpos (água, ar, fogo, terra) sejam simples e
tenham suas qualidades distintas, o Criador ordenou que de elementos misturados seriam
compostos os corpos elementares, por isso as discordâncias e concordâncias.
A simpatia-antipatia, o movimento e a dispersão dão lugar a todas as formas da semelhança.
Através do jogo da simpatia e da antipatia, o mundo permanece idêntico; as semelhanças
continuam a ser o que são e a se assemelharem. O mesmo persiste o mesmo, trancafiado
sobre si.
II. As assinalações
O sistema não é fechado. Convenientia, aemulatio, analogia e simpatia nos dizem de que
modo o mundo deve se dobrar sobre si mesmo, se duplicar, os caminhos da similitude e por
onde passam,mas não onde ela está e nem como a vemos. Para saber o poder que algumas
plantas tem de cura, foi preciso que o segredo fosse desvendado. É preciso que as similitudes
submersas estejam assinaladas na superfície das coisas; é necessário uma marca visível das
analogias invisíveis.
“Com efeito, ela não é composta de porções justapostas – algumas idênticas, outras diferentes
– ela é, por inteiro, uma similitude que se vê ou que não se vê. Seria, pois, sem critério, e não
houvesse nela – ou acima ou ao lado – um elemento de decisão que transformasse sua
duvidosa cintilação em clara certeza.”(pg 42)
Não há semelhança sem assinalação. O saber das similitudes funda-se na súmula de suas
assinalações e na sua decifração. O sistema das assinalações inverte a relação do visível com o
invisível.
Se não houvesse uma assinalação, uma marca e como que uma palavra dizendo que alguma
coisa é boa para as doenças dos olhos, ou da cabeça, sem falarmos da simpatia. O sinal da
afinidade, e o que a torna visível, é simplesmente a analogia; a cifra da simpatia reside na
proporção. São as simpatias e as emulações que assinalam as analogias.
As semelhanças exigem uma assinalação, pois nenhuma dentre elas poderia. Existindo
também uma similitude vizinha e de outro tipo que serve para reconhecer a primeira, e é
patenteada por uma terceira. Toda semelhança recebe uma assinalação; sendo apenas uma
forma intermediária da mesma semelhança. A assinalação e o que ela designa são exatamente
da mesma natureza; apenas a lei da distribuição a que obedecem é diferente; a repartição é a
mesma.
No saber do século XVI, a semelhança é o que há de mais universal; mais visível, mas que
determina a forma do conhecimento e a riqueza de seu conteúdo.
É necessário evitar inverter as relações. A ideia do microcosmo é “importante” e uma das mais
frequentes no século XVI. Se em contrapartida, se interroga o saber do século XVI no nível que
o tornou possível, as relações de macrocosmo e microcosmo aparecem como um simples
efeito de superfície. Não foi porque se acreditava em tais relações que se passou a buscar
todas as analogias do mundo. Numa época onde signos e semelhanças se enrolavam
reciprocamente, era necessario que se pensasse na relação do microcosmo com o
macrocosmo como a garantia desse saber e o termo de sua expansão.
Graças à mesma necessidade, esse saber devia acolher ao mesmo tempo e no mesmo plano,
magia e erudição. Os conhecimentos do século XVI eram constituídos por uma mistura instável
de saber racional, de noções derivadas das práticas da magia e toda uma herança cultural,
cujos poderes de autoridades e redescoberta de textos antigos havia multiplicado. A ciência
dessa época aparece dotada de uma estrutura frágil. De fato, não é um insuficiência de
estrutura que sofre o saber do século XVI, pois as configurações que definem seu espaço são
meticulosas. É esse rigor que impõe a relação com a magia e com a erudição. O mundo é
coberto de signos para decifrá-los, que revelam semelhanças e afinidades, e são similitude. “Ir
da marca visível ao que se diz através dela e, sem ela, permaneceria palavra muda, adormecida
nas coisas.”(pg 48)
Divinatio e Eruditio são uma mesma hermenêutica. Uma faz a natureza falar e a outra restitui
vida as linguagens adormecidas. Os antigos são tesouros de signos ligados por similitude àquilo
que eles podem designar. A única diferença é que se trata de um tesouro de segundo grau, a
verdade é que é tão arcaica quanto a instituição de Deus.
Entre as marcas e as palavras há por toda parte um mesmo jogo, o do signo e do similar, e é
por isso que o verbo e a natureza podem se entrecruzar ao infinito, formando um texto único
para quem sabe ler.
No século XVI a linguagem real não é um conjunto de signos independentes, onde a verdade
singular existiria. É antes disso, massa que se mistura aqui e ali com as figuras do mundo, onde
todas juntas formam uma rede que desempenha o papel de conteúdo ou de signo, de segredo
ou indicação. A linguagem não é um sistema arbitrário, está depositado no mundo, porque as
palavras se propõe aos homens como coisas a decifrar. A linguagem deve ser estudada como
coisa da natureza, já que faz parte das similitudes e assinalações.
A linguagem não é que é porque tem um sentido, para os gramáticos do séculos XVII e XVIII o
conteúdo representativo dava fio condutor para suas analises. As palavras são formadas por
sílabas e letras, porque virtudes são depositadas e se aproximam e desassociam, exatamente
como no mundo as marcas se opõem ou se atraem umas as outras. Enquanto a gramática é
composta por palavras e frases de todos os dias. A linguagem está a meio caminho entre as
figuras visíveis da natureza e as conveniências secretas dos discursos fechados.
Na primeira forma dada de linguagem por Deus, era um signo totalmente transparente e certo
já que eram semelhantes. Os nomes eram depositados sobre aquilo que os designavam,
através da similitude. Posteriormente em Babel, as línguas foram separadas uma das outras e
se tornaram incompatíveis. Todas as línguas que conhecemos, só é falada agora com base
nessa similitude perdida e o espaço por ela deixado vazio.
Mesmo a linguagem não se assemelhando as coisas que ela nomeia, ela não está separada do
mundo, já que está presente se manifestando e se enunciando. Os primeiros nomes se
assemelhavam as coisas que Deus colocara a serviço de Adão, pois o espaço em que se
desdobram e a imbricação liberam o signo do mundo salvo. Exemplo do latim, linguagem da
igreja, que se expandiu pelo globo terrestre, fazendo com que as linguagens do mundo fosse
conjunto da imagem da verdade.
As línguas estão cm o mundo numa relação mais de analogia que de significação. Onde o valor
do signo se sobrepõem através da escrita e da palavra.
A Escrita em primeiro lugar, conserva a memória dispersada e tenta retomar os poderes desde
muito tempo adormecidos. O ciência dos fenômenos sobrenaturais do século XVI é um
fenômeno de escrita, não de fala.
No século XVI a escrita era vista em duas formas, a de não distinção entre o que se vê e o que
se lê com o cruzamento da linguagem ao infinito, e inversamente, da dissociação imediata de
toda linguagem que desdobra a repetição do comentário.
Buffon diz: “Que se julgue, a partir disso, que porção de história natural se pode encontrar em
toda essa miscilânea de escrita”.(pg56)
Quando se tem de fazer a historia de um animal, é preciso recolher tudo que foi visto e ouvido,
tudo o que foi contado pela natureza ou pelos homens, pela linguagem do mundo, das
tradições dos poetas; Conhecer um animal, ou uma planta, ou uma coisa qualquer da terra, é
recolher toda a espessa camada dos signos que puderam ter sido depositados neles ou sobre
eles.
O saber é se referir a linguagem, numa planície uniforme das palavras e das coisas.
Característica do saber é interpretação. Comentário da Escritura, dos antigos, relatos dos
viajantes, lendas, existindo possibilidade de falar sobre.
O comentário se assemelha ao que ele comenta e que jamais pode enunciar, porque a
semelhança não pode ser conhecida por si mesmo. Assim nesse jogo infinito encontra-se a
relação de microcosmo e macrocosmo, com comentários infinitos acerca da escrita, que um
dia a interpretação revelará por inteiro.
V. O ser da linguagem
Desde o estoicismo, o sistema dos signos no mundo ocidental fora ternário, era através da
“conjuntura”. A partir do século XVII, em contrapartida, a composição se deu de forma binária,
com um significado. No Renascimento, a organização é muito mais complexa, ternária, com
domínio formal. Os três elementos distintos dessa distribuição se resolvem numa figura única.
A partir do século XVII se perguntavam como um signo pode estar ligado àquilo que ele
significa. A linguagem não será nada mais que um caso particular da representação ou da
significação. Desaparece a camada uniforme onde se cruzavam infinitamente o visto e o lido.
As coisas e as palavras vão se separar. “O discurso terá realmente por tarefa dizer o que é, mas
não será nada mais que o que ele diz”.(pg 59)
Nos seculos XVII e XVIII a propria existência da linguagem, foi dissolvida para representação,
toda linguagem valia como discurso. A arte da linguagem era uma maneira de “fazer signo”, ao
mesmo tempo que significava nomear e demonstrar com outros nomes.
CAPÍTULO V – Classificar
As histórias das ideias ou das ciências, incluem o século XVII e XVIII, atribuindo certo numero
de causas e varias manifestações essenciais. O lado das origens ou dos motivos, colocam os
novos privilégios de observação (invenção do telescópio), com prestígio das ciências físicas,
que forneciam um modelo de racionalidade.
Até o século XVII, essas ciências novas da vida foram assinaladas pelos historiados, onde todo
o século XVIII, os temas vitalistas teriam reassumido seu privilégio, formulando uma teoria
unitária com soluções diferentes: possibilidade de classificar os seres vivos, diversidade rica,
processo da geração, desenvolvimento específico dos germens, análise dos funcionamentos.
Para que a história natural aparecesse, foi preciso que a História se tornasse Natural. O que
existia no século XVI e até meados do século XVII eram histórias inextrincável e perfeitamente
unitário daquilo que se vê das coisas. Fazer a história de uma planta ou animal era tanto dizer
quais são seus elementos ou seus órgãos, as virtudes, semelhanças, as lendas e as historias
com que se misturou, os medicamentos, alimentos que fornece, o que os antigos relatam dele,
o que os viajantes dele podem dizer. “A historia de um ser vivo era esse ser mesmo, no interior
de toda a rede semântica que o ligava ao mundo”(pg143)
A divisão, tão evidente para nós, entre o que vemos (observação), o que os outros observam (o
documento), e transmitiam (a fábula) não existia. Devido a razão dos signos fazerem parte das
coisas, ao passo que no século XVII eles se tornam modos da representação.
A história natural encontra seu lugar na distancia (silenciosa) entre as coisas e as palavras. A
história natural é o espaço aberto na representação por uma análise que se antecipa à
possibilidade de nomear.
Segundo Lineu, após Jonston propõe a história natural é muito característica. Todo o capitulo
referente a um animal qualquer deve ter nome, teoria, gênero, espécie, atributos, usos e
Litteraria.
A velha palavra história muda então de valor e reencontra talvez uma de suas significações
arcaicas. No pensamento grego, ele vê e narra a partir de seu olhar, e só no limiar da idade
clássica que retomou esse papel. A idade clássica confere a história, que antes era feita pelo
historiados através da compilação dos documentos e dos signos, o sentido de pousar pela
primeira vez um olhar minucioso (Renascimento) sobre as coisas e de transcrever. Dessa
forma, a primeira história que se constitui é da natureza, sendo documentos os espaços claros
onde as coisas s justapõem: herbários, coleções, jardins. O que mudou, foi o espaço em que
podem ser vistos e donde podem ser descritos.
Nos fins do século XVIII a importância metodológica que assumiram esses espaços “naturais”
para a constituição de todo um ambiente de história fez com que no século XIX a possibilidade
renovada de falar sobre palavras. E falar sobre elas não mais no estilo do comentário, mas um
modo positivo, tão objetivo quando o da história natural.
III. A estrutura
A história natural não é nada mais que a nomeação do visível. A história natural não se tornou
possível porque se olhou melhor e mais de perto. O campo da visibilidade onde a observação
vai assumir seus poderes não passa do resíduo dessas exclusões, que dá o acolhimento define
a condição de possibilidade da história natural e do aparecimento de seus objetos filtrados:
linhas, superfícies, formas, relevos.
Os instrumentos de óptica foram utilizados sobretudo para resolver os problemas da geração,
para descobrir de que modo as formas, disposições, características dos indivíduos adultos e de
sua especie podem transmitir-se através das idades, conservando sua rigorosa identidade. O
microscópio foi requerido para resolver problemas que o domínio da visão levantava. “O uso
do microscópio fundou-se numa relação não-instrumental entre as coisas e os olhos.”(pg147)
“Como dizia Lineu, toda nota deve ser tirada do número, da figura, da proporção, da
situação.”(pg148). Podendo estabelecer no afrontamento entre linguagem e as coisas uma
forma que exclui toda incerteza.
Cada parte visivelmente distinta de uma planta ou animal é descrita por esses quatro valores,
onde os botânicos denominam sua estrutura. “Por estrutura das partes das plantas, entende-
se a composição e a reunião das peças que formam seu corpo.”(Tournefort. Éléments de
botanique, p.558).
As formas e disposições devem ser descritas por outros procedimentos: identificação a formas
geométricas, analogias de “maior evidencia”(Lineu. Philosophie botanique, parágrafo 229)
Buffon e Lineu estabelecem o mesmo crivo, o seu olhar ocupa sobre as coisas a mesma
superfície de contato; os mesmos vão negros configuram o invisível, as mesmas plagas, claras e
distintas, oferecem-se às palavras.(pg150)
Nos séculos XVII e XVIII podia dizer que o conhecimento das plantas devia realmente ter
primazia sobre o dos animais.
IV. O caráter
Para que a história natural se torne linguagem é preciso que a descrição se torne “nome
comum”. Relatos de monstros são imaginário do principio da Historia Natural. É preciso
designar muito precisamente todos os seres naturais e situa-los ao mesmo tempo num sistema
de identidades e diferenças que os aproxima e os distingue dos outros.
A historia natural deve assegurar, num só movimento, uma designação certa e uma derivação
controlada. A teoria do caráter deve identificar os valores designativos e o espaço onde ocorre
a sua derivação.
O método é uma outra técnica para resolver o mesmo problema, consistindo em deduzi-lo
progressivamente. O caráter que distingue cada espécie ou cada gênero é o único traço
mencionado sobre o fundo das identidades silenciosas.
O exame das especies encontradas revela a existência de grandes “famílias”, isto é, de amplos
grupos nos quais as espécies e os gêneros tem um número considerável de identidades.
Admitem-se as grandes família que são evidentemente reconhecidas e cujas primeiras
descrições definiram os traços gerais. São esses traços comuns que estabelecem a encontrar
um gênero ou espécie.
O conhecimento de cada espécie poderá ser facilmente adquirido a partir desta caracterização
geral: “Dividiremos cada um dos 3 reinos em várias famílias que reunirão todos os seres que
têm entre si relações evidentes, passaremos em revista todos os caracteres gerais e
particulares dos seres contidos nessas famílias”, dessa maneira “poderemos estar seguros de
reportar todos esses seres às suas famílias naturais, é assim que, começando pela fuinha e
pelo lobo, pelo cão e pelo urso, conheceremos suficientemente o leão, o tigre, a hiena, que
são animais da mesma família”(ADANSON. Cours d’histoire naturelle, 1772 (edição de 1845),
p.17)
No século XVI, a identidade das plantas e dos animais era assegurada pela marca positiva de
quem eram portadores: por exemplo, o que distinguia as diversas espécies de aves não eram
as diferenças que havia entre elas, mas o fato de que esta caçava de noite, aquela vivia sobre a
água, outra se alimentava de carne viva.
A partir do século XVII, não pode mais haver signos senão na análise das representações
segundo as identidades e as diferenças. Conhecer aquilo que pertence propriamente a um
individuo é ter diante de si a classificação ou a possibilidade de classificar o conjunto dos
outros.
Método e sistema são apenas as duas maneiras de definir as identidades pela rede geral das
diferenças. A classificação, como problema fundamental da historia natural, alojou-se entre
uma teoria da marca uma teoria do organismo.
V. O contínuo e a catástrofe
Para a história natural, essas analogias da imaginação não podem valer como garantias, sendo
preciso que a historia natural encontre o meio de contornar a dúvida radical que a ameaça
assim como a qualquer linguagem. Deve haver continuidade na natureza.
No sistema, um signo gera outro, onde o mundo é simplesmente o que vemos (não existe na
natureza nada mais que indivíduos, e que os gêneros, ordens e classes, só existem na nossa
imaginação).
A mistura da natureza é tão inteligível, que parece ser multiplicada nas leis da natureza. Onde
o ouro se mescla com o metal, com a pedra e com a terra. Essa imbricação é resultado de uma
série cronológica de acontecimentos. Primeiro no espaço onde as especies vivas se alojam
(mares e continentes, superfície do globo), afetando os seres vivos de maneira secundária. “O
que ela poe em questão é o mundo como lugar dos seres e não os seres enquanto têm a
propriedade de serem vivos.”(pg 164)
Como o tempo jamais é concebido como principio de desenvolvimento para os seres vivos na
sua organização interna, e sim como revolução no espaço em que vivem, o evolucionismo ou
transformismo no pensamento clássico não pode ocorrer.
Os monstros não são de uma “natureza” distinta da das próprias espécies. Ele garante no
tempo e para nosso saber teórico uma continuidade que os dilúvios, os vulcões e os
continentes desmoronados confundem no espaço para nossa experiencia cotidiana.
O monstro e o fóssil desempenham papel muito preciso nessa configuração. O monstro faz
parecer a diferença e o fóssil é uma forma longíqua da identidade. O monstro e o fóssil são
projeção em retrospectiva dessas diferenças e identidades, que definem para a taxinomia, a
estrutura e depois o caráter. “O monstro narra, como em caricatura, a gênese das diferenças e
o fóssil lembra, na incerteza de suas semelhanças, as primeiras obstinações da
identidade.”(pg172)
Conceito de a priori = aquilo que, numa dada época, recorta na experiência um campo de
saber possível, define o modo de ser dos objetos que aí aparecem, arma o olhar cotidiano de
poderes teóricos e define as condições em que se pode sustentar sobre as coisas um discurso
reconhecido como verdadeiro.
No século XVIII a priori histórico foi as pesquisas ou os debates sobre a existência dos generos,
a estabilidade das especies, a transmissão dos caracteres através das gerações, sendo a
existência de uma história natural. A história natural na idade clássica, não corresponde à pura
e simples descoberta de um novo objeto de curiosidade, e sim, uma série de operações
complexas que introduzem num conjunto de representações, a possibilidade de uma ordme
constante.
“Com efeito, até o fim do século XVIII, a vida não existe. Apenas existem seres vivos. Podendo
se falar da vida somente como de um caráter.”(pg175)