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Beleza do Sorriso

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Capítulo
01

Capítulo
HENRIQUE DE CASTRO E SOUZA PIRES
ROGÉRIO LUIZ MARCONDES
JHONATAN HENRIQUE BOCUTTI
01

RESINA TERMICAMENTE MODIFICADA


POSSIBILIDADES E APLICAÇÕES

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Beleza do Sorriso

Resumo

Restaurar - o significado desta palavra nunca mudou, mas a maneira como este
ato é realizado já passou por inúmeras transformações. Na Odontologia, restau-
rar significa devolver saúde, forma e função a um elemento dental, de maneira
que não altere e/ou recupere suas características estéticas.

Desde a introdução dos princípios adesivos por Buonocore1, em 1955, a Odon-


tologia restauradora passa por uma contínua evolução. Devido a isso diversos
materiais, técnicas e pesquisas científicas foram desenvolvidas, possibilitando o
emprego de uma Odontologia mais segura, previsível e conservadora.

Com certeza, toda essa evolução não irá parar por aqui; há muito a ser desenvol-
vido, aprimorado e descoberto. Talvez um dia existam materiais ou técnicas rege-
nerativas com capacidade de reproduzir os tecidos dentais, assim seria possível
restaurar de maneira ”perfeita” o elemento dental comprometido.

Neste capítulo iremos abordar uma técnica restauradora que utiliza um


material amplamente empregado na Odontologia atual, a resina composta,
com o objetivo de cimentar restaurações cerâmicas livres de metal e con-
feccionar restaurações de preenchimento. A técnica apresentada será a da
Resina Termicamente Modificada (RTM).

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Capítulo
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Introdução

Buonocore, através do princípio de condicionamento dos tecidos dentais1, deu


início à caminhada adesiva. Desde então, os horizontes da Odontologia restau-
radora foram vastamente ampliados. Graças a este conceito, é possível manter
dois materiais, de natureza igual ou distinta, unidos, aderindo à superfície de
contato de cada um2.

Atualmente, existem 2 tipos de restaurações adesivas: as restaurações di-


retas e as restaurações indiretas, sendo a direta realizada com resina com-
posta, em uma única sessão. Já a técnica de restauração indireta pode ser
realizada com resina composta ou cerâmica e, necessariamente, serão ne-
cessárias 2 etapas clínicas para que a restauração seja confeccionada fora
da boca e posteriormente cimentada sobre o remanescente dental.

A seleção do material que irá unir o trabalho protético ao dente deve ser bas-
tante criteriosa, levando em consideração os seguintes aspectos: material em
que a restauração foi confecionada, capacidade de condicionamento, potencial
adesivo, espessura, assim como sua capacidade de transmissão de luz. Deve-
mos nos preocupar também com o tipo de substrato no qual a restauração será
aderida, com a capacidade do fotopolimerizador que será utilizado e, sempre
muito importante, com a experiência do operador.

Tudo isso visando ter sucesso durante a etapa mais criteriosa de uma restaura-
ção indireta, a cimentação. Se este procedimento for realizado de maneira erra-
da, toda a restauração estará comprometida e a longevidade do tratamento será
bastante duvidosa3.

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Hoje existem algumas alternativas para cimentar restaurações indiretas. Dentre


elas, os cimentos resinosos tipo flow e os cimentos auto-adesivos são os mais
utilizados. Mas não são as únicas, a resina composta micro-híbrida, utilizada
nas restaurações do dia a dia de qualquer consultório, também pode ser em-
pregada como agente cimentante. Para tanto é necessário alterar sua fluidez e
viscosidade. Este processo pode ser realizado facilmente por meio de calor. A
resina deve ser aquecida, até atingir uma temperatura entre 60 a 68 graus Cel-
sius, assim ela estará em um estado de fluidez e viscosidade que permite sua
utilização em camadas extremamente finas4-6.

Há uma procura por métodos alternativos de cimentação devido às compro-


vações científicas e clínicas de que o material resinoso, exposto ao meio bucal,
sempre estará sujeito a absorção de água, degradação superficial e ao desgaste
mecânico7-9, que são fatores que levam à formação de espaços (gaps) na inter-
face dente–restauração, micro-infiltrações e, consequentemente, à descoloração
marginal. Ou seja, problemas com a integridade do tratamento em longo prazo.

Estas situações estão diretamente relacionadas às seguintes características de


cada material resinoso: tipo e tamanho das partículas de carga, quantidade de
matriz orgânica, grau de conversão de monômeros em polímeros e grau de po-
rosidade10-14. Outros fatores determinantes para o sucesso em longo prazo das
restaurações indiretas são: adaptação marginal da peça e espessura do filme
de cimento15-18. Todos os procedimentos realizados durante a execução de uma
prótese devem ter como objetivo otimizar a adaptação da restauração o que,
consequentemente, irá proporcionar uma passividade na instalação da peça e
diminuir a espessura do cimento.

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Por esses motivos, procuramos pelo material que possui as melhores proprieda-
des e com o potencial de aumentar a longevidade dos trabalhos protéticos.

Recentemente, diversos estudos mostraram os efeitos positivos na utilização da


RTM e como seu uso pode aumentar a longevidade das restaurações indiretas.
A resina, quando aquecida a uma temperatura de 55 a 68 graus Celsius, pode
ser utilizada em espessuras extremamente finas devido à diminuição de sua vis-
cosidade e ao aumento de fluidez4-6. Além de excitar os monômeros resinosos,
proporcionando um aumento no seu grau de conversão em polímeros, permitindo
a polimerização em maior profundidade, com menor necessidade de intensidade
de luz e com menos tempo de fotoativação4-6,19-24. Desta maneira é possível uti-
lizar a resina composta para cimentar laminados cerâmicos, coroas cerâmicas,
inlays/onlays cerâmicas, todos os tipos de restauração em resina composta e
qualquer material passível de ser aderido.

Sendo assim, a RTM tornou-se uma opção frente aos cimentos resinosos. Quando
comparamos as resina compostas com os cimentos adesivos, apesar de os dois
materiais possuírem características químicas semelhantes, observamos uma me-
lhor organização estrutural, melhores propriedades mecânicas e ópticas nas resi-
nas compostas, em razão da maior quantidade de porção inorgânica presente, com
partículas de carga presentes em maior número, sendo essas mais uniformes e re-
gulares. Isso proporciona melhores propriedades mecânicas, ainda mais quando a
resina é aquecida e sua conversão monomérica aumenta. Desta maneira, a dureza
superficial, o módulo de resistência flexural, a resistência à fratura, a resistência á
tração e a resistência ao desgaste superficial aumentam, elevando suas proprie-
dades a um nível incapaz de ser atingido por qualquer tipo de cimento resinoso20-28.

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Clinicamente, a utilização da RTM como agente cimentante apresenta uma série


de vantagens e benefícios quando comparada a outras técnicas de cimentação;
entre elas as mais relevantes são:

ƒƒ Aumenta o grau de conversão monomérica.

ƒƒ Aumento da dureza superficial do material cimentante.

ƒƒ Redução da degradação marginal e de micro-infiltrações.

ƒƒ Redução da pigmentação nas margens restauradoras.

ƒƒ Capacidade de polimerizar em maiores profundidades e com menos inten-


sidade de luz.

ƒƒ Redução do tempo de polimerização.

ƒƒ Compatibilidade com todos os sistemas adesivos.

ƒƒ Facilidade na instalação e adaptação do artefato restaurador.

ƒƒ Estabilidade da peça em posição, durante seu manuseio.

ƒƒ Facilidade para remover os excessos de cimento antes de polimerizar.

ƒƒ Diminui os gastos com diversos tipos de cimentos resinosos.

Esta técnica possui também uma grande aplicabilidade para confecção de res-
taurações diretas e núcleos de preenchimento. Seu aumento de fluidez permite
uma adaptação excelente com o substrato e o aumento de suas propriedades
mecânicas e de polimerização permitem a confecção de uma restauração com
ótimas características e com um tempo menor de polimerização. Sua utilização
deve ser sempre incremental, com incrementos de no máximo 2 mm, evitando a
união de 2 paredes opostas e respeitando o Fator C de cada cavidade.

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Cuidados e desvantagens

Esta técnica não pode ser utilizada para cimentação de próteses com infraes-
trutura em metal pois a RTM necessita de luz para polimerizar. É necessário
o investimento no aparelho termomodificador. A polimerização do material é
extremamente fácil de acontecer com a luz do refletor, portanto, não deve ser
usada iluminação direta sobre a área de trabalho. Sempre que uma nova técnica
é aplicada no dia a dia de qualquer ser humano é necessário passar por uma
curva de aprendizado até dominá-la.

Aplicação clínica

Para utilizar a técnica da RTM, inicialmente, é necessário selecionar uma resi-


na composta. Todas as resinas modificam seu estado com o calor, porém as
que apresentam melhores condições de trabalho são as micro-híbridas,
de preferência a Z100 (3M ESPE, EUA), a Point4 (Kerr,
EUA) e a Esthet-X (Dentsply, EUA). Para aumentar a
temperatura destes materiais, de maneira homo-
gênea, é necessário um equipamento que troque
calor com a resina e o mais utilizado atualmente
é o CalSet (AdDent, EUA) (Figura 01).

01. Aparelho termo-modificador para


resina composta CalSet (AdDent, EUA).

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Para a resina ser aquecida, ela deve ser introduzida em cômpules para que
através de um aplicador, do tipo Centrix (Centrix, EUA) ou Comax (AdDent,
EUA), sua aplicação seja facilitada (Figuras 02A-E3). O aparelho termo-mo-
dificador CalSet possui três temperaturas: 37, 54 e 68 graus Celsius. A tem-
peratura de 68 graus Celsius é a mais indicada pois garante uma mudança
suficiente na viscosidade e fluidez da resina composta, proporcionando um
bom tempo de trabalho intra-oral. O tempo necessário para resina ficar ter-
mo-modificada é de 10 a 15 minutos.

O condicionamento do remanescente dental deve seguir os procedimentos


adesivos convencionais, de acordo com o sistema adesivo de preferência, as-
sim como as próteses, que devem ser condicionadas de acordo com o material
que foram confeccionadas.

A aplicação da resina pré-aquecida pode ser realizada tanto na superfície da


peça protética quanto sobre o substrato dental. A escolha depende do tipo da
restauração, do eixo de inserção e da experiência do profissional. A instalação
do artefato restaurador deve ser realizada com cuidado e com leves movimen-
tos vibratórios, até que esteja totalmente adaptada no preparo. Os excessos de
resina irão escoar pelas bordas e serão facilmente removidos com o auxílio de
um pincel ou de uma espátula. Após a remoção dos excessos presentes nas
margens da restauração, a fotopolimerização deve ser realizada por 60 a 80
segundos em cada face, de preferência com um aparelho LED.

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02. A-E Cômpule cinza para o Sistema


Centrix (Centrix, EUA) (A). A resina deve
ser inserida dentro da cômpule (B,C). A
cômpule deve ser fechada com o êm-
bolo (D). Pistola CoMax (AdDent – EUA)
utilizada para aplicar a resina termica-
mente modificada (E).

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Casos clínicos

Caso clínico I: Utilização da RTM para cimentação de laminados cerâmicos

Paciente do sexo masculino, 27 anos de idade, procurou atendimento odontológi-


co devido a um trauma sofrido no elemento 21 (Figuras 03A,B). O planejamento
foi realizar uma faceta personalizada em cerâmica feldspática.

Após o atendimento emergencial (Figuras 03C,D), foram realizadas moldagens


para o enceramento diagnóstico (Figura 03E). Com base neste enceramento, o
preparo do remanescente dental foi confeccionado (Figuras 03F,G).

03. A-G Documentação fotográfica


inicial, vista do sorriso, elemento 21
fraturado (A). Documentação foto-
gráfica inicial, vista inicial interna (B).
Fragmento dental fraturado (C). Trata-
mento emergencial, colagem do frag-
mento (D). Enceramento diagnóstico
(E). Preparo realizado de acordo com
o enceramento diagnóstico (F,G). Mu-
ralha sagital (F). Muralha palatina (G).

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C D

F G

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Como se tratava de um dente vital e fraturado, todo o cuidado com a integri-


dade pulpar foi necessário. Para tanto, o selamento imediato da dentina foi
realizado com OptiBond FL (Kerr, EUA) (Figura 04A-F) e uma pequena proteção

A B

C D

E F

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pulpar na borda incisal foi realizada com ionômero de vidro (Maxxion R, FGM,
Brasil). O preparo foi polido e as margens em esmalte delimitadas para realizar
a moldagem (Figura 04G,H).

04. A-H Selamento Imediato da Denti-


na (SID). Aplicação do ácido fosfórico
sobre a dentina, por 15 segundos (A,B).
Aplicação de clorexidina a 2% (FGM,
Brasil) (C). Aplicação do primer, sis-
tema adesivo OptiBond FL (Kerr, EUA)
(D). Aplicação do adesivo do sistema
utilizado (E). Fotopolimerização por
60 segundos (F). Delimitação das mar-
gens, remoção do adesivo polimeriza-
do sobre o esmalte (G). Polimento do
preparo previamente à moldagem (H).

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Beleza do Sorriso

A restauração cerâmica foi confeccionada com a cerâmica feldspática Crea-


tion CC (Creation Willi Geller) sobre refratário, seguindo a técnica de 2 queimas
(Figuras 05A-E)29.

Após a remoção do provisório, a peça foi provada. Neste caso, foi realizado
um teste de cor com o try-in (Vitique, DMG, EUA) (Figuras 06A-C) para, então,
realizar a cimentação.

A B

C D

05. A-E Confecção da restauração cerâmica, seguindo a técnica de duas queimas. Primeira queima (A). Segunda queima (B). Texturização (C). Aplicação do glaze (D).
Laminado cerâmico finalizado e adaptado sobre o modelo sólido (E).

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06. A-C Restauração provisória, con-


feccionada com Protemp 4 (3M ESPE,
EUA) (A). Remanescente após a remo-
ção da restauração prévia (B). Prova
da cerâmica; neste caso foi utilizado o
try-in Bleach (Vitique, DMG, EUA) (C).

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Inicialmente o preparo foi limpo, em seguida os tecidos dentais condicionados


e o sistema adesivo de 3 passos OptiBondFL (Kerr, EUA) foi aplicado, mas não
polimerizado (Figuras 07A-H).

A B

C D

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07. A-H Preparo para cimentação.


Isolamento absoluto modificado (A).
Limpeza do remanescente com ultras-
som (B). Profilaxia com micro escova
de Robson embebida de pedra pomes
com clorexidina a 2% (C). Condiciona-
mento dos tecidos dentais com ácido
fosfórico a 37% (Condac 37, FGM,
Brasil) (D,E). Aplicação da clorexidina
a 2%(FGM, Brasil) (F). Aplicação do
primer do sistema adesivo OptiBond
FL (Kerr, EUA) (G). Aplicação do adesi-
vo do sistema OptiBond FL (H).

033
ISBN 978-85-60842-61-2

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