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A criança e a cidade: a importância da (re)conciliação com a autonomia

Chapter · January 2014

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Frederico Lopes Carlos Neto


Faculty of Human Kinetics, University of Lisbon University of Lisbon
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A Criança e a Cidade: a importância da (re) conciliação com
a autonomia

Introdução

As transformações operadas na sociedade contemporânea exprimem-se num quadro de


globalização nas esferas económicas, políticas, sociais, culturais e tecnológicas. É neste
contexto de características e manifestações societais que a segunda modernidade se
configura e se afirma (Beck & Willms, 2003; Naves, 2010) e é, também, neste novo
paradigma sociológico que as crianças vivem, reproduzem e recriam os seus mundos
sociais, culturais, funcionais e lúdicos. “As ideias e representações sociais sobre as
crianças, bem como as suas condições de existência, estão a sofrer transformações
significativas em homologia com as mudanças que ocorrem na estruturação do espaço-
tempo das vidas quotidianas, na estrutura familiar, na escola, nos mass-media, e no
espaço público.” (Sarmento, 2002). É sobre esta dimensão das alterações na estrutura das
rotinas diárias das crianças, mais concretamente nos domínios da autonomia, mobilidade
e jogo no espaço público da cidade que nos focamos neste capítulo.

Tomaremos como referência a relação da criança com o espaço físico da sua cidade pois,
de acordo com o último relatório da UNICEF sobre o estado mundial da infância, a
experiência da infância ocorre, cada vez com mais frequência, no meio urbano. De acordo
com a mesma fonte, mais de metade da população mundial, mais de 1000 milhões de
crianças, vivem atualmente em grandes e pequenas cidades.

Os elementos e recursos físicos existentes na cidade possibilitam um conjunto de


interações de caráter funcional, social, psicológico e cognitivo. Neste sentido, pode olhar-
se para o desenvolvimento e comportamento motor da criança no espaço urbano como
via privilegiada e indispensável do estabelecimento de interatividades multi-
dimensionais.

A relação dos indivíduos com o espaço físico tem sido menosprezada ao nível das
políticas públicas para a infância. A cidade, enquanto elemento mediador e facilitador de
interações terá que ser observada, refletida e modificada a partir das percepções e
experiências dos seus cidadãos, enquanto atores em movimento no espaço urbano. É
necessário portanto que ocorra uma renovação paradigmática ao nível das políticas para
a infância e para a juventude de forma a que as cidades e as sociedades sejam mais justas,
mais inclusivas e mais democráticas. Tal transformação é essencial para reajustar
diferentes domínios do desenvolvimento entre os quais, naturalmente, o desenvolvimento
motor.

Conceções teóricas sobre a interação indivíduo-ambiente físico

Psicologia Ecológica

A psicologia ambiental teve um papel determinante, ao longo do século XX, no estudo


do comportamento humano influenciado pelo ambiente físico. A partir desta corrente da
psicologia surgiram outras correntes que foram inovando e complexificando o
conhecimento produzido sobre a interacção homem-ambiente e ambiente-homem. Na
década de cinquenta, Barker e Wright (1951) estabeleceram os fundamentos da psicologia
ambiental e o quadro teórico da psicologia ecológica é definido mais tarde por Barker
(1963), quando ao observar directamente crianças, apresenta as unidades ecológicas-
“behavioral-settings”. Estas unidades são descritas como cenários ou espaços
comportamentais, onde o ambiente físico e o comportamento são estudados como uma
unidade só. Barker (1963) defendeu que estas unidades têm uma estrutura, encontrando-
se localizadas no tempo e no espaço, sendo compostas por entidades e acontecimentos
(pessoas, objectos, comportamentos); os seus limites são identificáveis e os seus
componentes arranjados de uma maneira funcional, como parte de um todo. Quando
Barker (1968) estuda as rotinas diárias de pessoas em contexto natural, a psicologia
ecológica reafirma a sua autonomia, contextualizando-se mais no âmbito da sociologia e
da ecologia. O comportamento e a modificação do comportamento no tempo (o
desenvolvimento) passam a ser enquadrados não numa simples relação entre estímulo e
organismo, não como uma decorrência puramente maturacional, mas como uma
transformação que ocorre num contexto, ao qual está indissociavelmente ligada.

Paradigma Bioecológico de Bronfenbrenner


No ambiente vão existir múltiplos cenários, os quais vão implicar diferentes influências
e diferentes interações. É a partir desta assunção que Bronfenbrenner (1989) constrói o
seu modelo de ecologia do desenvolvimento humano, através de um estudo científico
sobre a acomodação progressiva, entre o conhecimento humano e as características, em
mudança, dos cenários imediatos onde vive a pessoa em desenvolvimento.
Bronfenbrenner (1979) ressalva que o contributo mais relevante para o desenvolvimento
não é a apenas a condição física real e objetiva do ambiente, mas a forma como ele é
percebido e como é modificado pelo sujeito. O desenvolvimento humano representa uma
entidade dinâmica, em crescimento e em interação mútua, ou seja, o ser humano vai-se
desenvolvendo através das reestruturações que provoca no ambiente, ao mesmo tempo,
que este influencia o ser humano. Esta interação mútua gera um processo de acomodação
mútuo, bidirecional e recíproco.

O paradigma bioecológico proposto por Bronfenbrenner (1989) tem na sua composição


quatro elementos fundamentais: a pessoa, o processo, o contexto e o tempo. Na pessoa
estão contidas as propriedades que se constituem como as disposições (por exemplo, a
curiosidade, a iniciativa, ou a responsabilidade seletiva), os recursos (características como
a morfologia, as limitações impostas por doenças, etc.) e as demandas (características
individuais que não são necessariamente boas nem más, mas que predispõem para certas
preferências de interação ambiental). O processo em si implica as mudanças e as
continuidades. O contexto é composto pelo microssistema, mesossistema, exossistema e
macrossistema, os quais têm as seguintes especificidades:
 O microssistema é composto pelas características físicas, sociais e simbólicas do
ambiente em que as ações ocorrem. São exemplos: o ambiente de casa, a escola,
ou o local de trabalho.
 O mesossistema abrange dois ou mais microssistemas e reflecte o ambiente diário
da criança (ex. interações entre a família, a casa e a escola. O mesossistema tem a
ver com as inter-relações entre contextos e aos efeitos sinérgicos que daí
decorrem. Estas interacções são muito importantes em momentos de transição, já
que um dos sistemas muda enquanto os outros persistem mas exigem adaptação.
É o caso, por exemplo, do início da escolaridade.
 O exossistema está para além do indivíduo, refere-se ao sistema em que o
indivíduo não é necessariamente parte integrante, mas que afeta a sua vida. Por
exemplo, a vida de uma criança é afetada pelo que acontece no local de trabalho
dos pais ou por decisões macroeconómicas do estado.
 O macrossistema é o nível mais abrangente e é apresentado como modelo que
prevalece em cada cultura ou estrutura social e que integra e afecta os micro, meso
e exossistemas.
Bronfenbrenner associou o tempo ao modelo depois de ter formulado o modelo inicial,
tendo sido denominado de cronossistema. O cronossistema inclui a dimensão temporal e
sequencial dos acontecimentos que se sucedem ao longo da vida, realçando certos
períodos críticos e as interacções entre eventos que ocorrem em qualquer um dos
sistemas. Em seguida, apresentamos na figura 1 uma representação gráfica do modelo
bioecológico do desenvolvimento humano proposto por Bronfenbrenner (1989).

Figura 1- Modelo bioecológico do desenvolvimento humano de Bronfenbrenner

O modelo bioecológico de Bronfenbrenner tem a virtude de integrar as condições


específicas do organismo, em processos proximais que decorrem num certo contexto, e
que se situam cronologicamente. Conhecidas as dimensões de análise e o seu modo de
interação, o desenvolvimento pode ser melhor compreendido se as variáveis associadas a
cada dimensão de análise puderem ser operacionalizadas. O modelo valoriza os processos
interativos proximais entre certo organismo e certo contexto e a transição entre
microssistemas que decorre intensamente durante a infância e adolescência e que coloca
problemas específicos e revela soluções únicas.

Psicologia Percetiva Ecológica: o conceito de affordance

A Psicologia Percetiva Ecológica está marcada pelos trabalhos desenvolvidos por Gibson
(1979) no sentido de compreender quais as informações disponíveis ao sujeito que são
verdadeiramente percebidas e que contribuem para a regulação do comportamento. No
conceito da psicologia perceptiva ecológica, a percepção é um fim orientado, o que
significa que não pode estar separada da atividade intencional à qual está ligada. A relação
do sujeito-ambiente é imediata e baseia-se na atividade prática. A mobilidade do ator e a
natureza da perceção estão indissociavelmente ligados, sendo a mobilidade ou ação a
forma de um organismo perceber a relação de reciprocidade entre organismo e contexto
físico e social (Gunther, 2003).

Na atividade prática do sujeito (que ocorre uma integração organismo-ambiente), as


possibilidades do organismo vão depender, por um lado, das características de quem as
percebe e, por outro, do significado que o ambiente tem para o sujeito, e que é dado
através das possibilidades de ação que este oferece. A estas possibilidades, Gibson (1979,
pp.127) vai chamar de “affordances” do ambiente: “What it (environment) “offers” the
animal, what it “provides” or “furnishers”, either for good or ill”. Para Gibson, quando
um sujeito percebe superfícies, objetos e animais na sua interação com o ambiente, ele
percebe affordances. As affordances são percebidas através da ação ao mesmo tempo que
o sistema percetivo capta informações necessárias para a interação animal-ambiente
(Gibson, 1979). Neste sentido, e para cada tipologia animal, existe um conjunto de
affordances que se especificam individualmente por referência às características
individuais e ao próprio processo de exploração das possibilidades do meio. O conceito
de “affordance” torna-se assim central no seio da psicologia perceptiva ecológica., sendo
a percepção o resultado da captação de affordances, podendo estas serem diretamente
percebidas, o que significa, que durante o ato perceptivo, não são as características ou
propriedades estritamente físicas do ambiente que são captadas, mas sim as suas
possibilidades de ação: o sujeito não perceciona qualidades métricas de objetos, espaços,
superfícies, mas as affordances que objetos, espaços e superfícies oferecem. Nesse
sentido, percebe um comportamento por associação a uma condição e não a condição em
sentido puro.

A ação é indispensável para permitir a construção do conhecimento do mundo já que o


mesmo decorre dessa mesma ação. Nesse sentido, o domínio progressivo da ação ao longo
do desenvolvimento alarga a própria possibilidade de perceção, já que novas
possibilidades de ação revelam novas affordances, num ciclo permanente contínuo e
interminável. A ação alarga o conhecimento sobre o contexto que a suporta e sobre a
própria ação (Clark & Uzzell, 2002). Este tipo de conhecimento está disponível desde
muito cedo e modifica-se muito rapidamente durante a infância.

As affordances estão também dependentes das experiências que os sujeitos operam nos
contextos sociais, culturais e físicos, orientadas por um processo contínuo de
temporalidade e espacialidade, numa interatividade de perceções e ações. Para Kyttä
(2003), as affordances expressam a possibilidade do meio ambiente estimular os
organismos nos processos da perceção, bem como, a capacidade do sujeito em perceber
o que está disponível no ambiente, e providenciam um conceito psicológico relevante
para analisar a evolução da relação criança-ambiente (Kyttä, 2002). Neste sentido,
poderemos inferir que o conhecimento que as crianças adquirem e geram nas suas
interações com os seus pares, ambientes e adultos resultam da realização das affordances
e da qualidade destas. As crianças, ao perceberem as affordances no ambiente, descobrem
esse ambiente como interessante, causador de desafios e como um espaço de aventura e
de exploração. Isto desencadeia novas interações e a procura de novas affordances.

Affordances multi-dimensionais

As affordances não são todas funcionais, podem também ser de caráter social, ou
emocional (Kyttä, Broberg, & Kahila, 2012). As crianças, na sua interação com o
ambiente físico, posicionam-se e atuam perante este através de um conjunto de
affordances multi-dimensionais. Lim e Barton (2010) concluíram que as crianças, através
de um envolvimento contextualizado com os lugares que lhes são significativos,
conseguem ler estes lugares de forma profunda e rica, em camadas de funcionalidades e
de significados, as quais lhes oferecem affordances sociais e psicológicas adicionais. As
relações afectivas que as crianças estabelecem com os vários contextos para além de
promoverem affordances psicológicas e emocionais, desencadeiam, também, affordances
cognitivas e sociais que possibilitam o desenvolvimento do sentido de lugar das crianças
(Chatterjee, 2005).

Independência de mobilidade das crianças

A independência de mobilidade das crianças e jovens pode ser definida como a “liberdade
das crianças para se deslocarem na sua vizinhança ou cidade sem a supervisão adulta”
(Tranter, 1994), permitindo que estas explorem e aprendam autonomamente o seu
ambiente físico, dando-lhes tempo e uma progressiva liberdade de movimento (Bjorklid
& Nordstrom, 2004). A independência de mobilidade é essencial para assegurar um
controlo do envolvimento próximo, para permitir o domínio espacial e a navegação em
ambientes mais alargados, e, também, para oferecer o espaço necessário ao pleno
desenvolvimento das competências motoras, cognitivas e sociais. O enquadramento
teórico proporcionado pela psicologia ecológica de Gibson e pela bioecologia de
Bronfenbrenner funde-se no conceito de independência de mobilidade.

Estudos passados e presentes confirmam uma larga redução da independência de


mobilidade das crianças, na Europa, inclusive, em Portugal (Cordovil, Lopes, & Neto,
2012a; Fyhri, Hjorthol, Mackett, Fotel, & Kyttä, 2011; M Hillman, Adam, & Whitelegg,
1990; Shaw et al., 2012). Esta situação é alarmante uma vez que a independência de
mobilidade, de uma forma geral, possibilita o desenvolvimento de competências motoras,
proporciona aumento de atividade física, influencia positivamente o desenvolvimento das
competências sociais e cognitivas e promove o desenvolvimento de vínculos emocionais
com o ambiente natural (B. Brown, Mackett, Gong, Kitazawa, & Paskins, 2008). Por
outro lado, uma restrição da independência de mobilidade na infância contribui para a
perpetuação da obesidade, sedentarismo e iliteracia motora das crianças e dos jovens. Este
quadro é agravado pelos efeitos crescentes da nova dimensão digital e eletrónica nas
rotinas de vida das crianças e jovens, pelos comportamentos securitários por parte dos
pais e pela sociedade civil, e pelos constrangimentos físicos associados aos processos de
expansão urbana das cidades (que têm muito frequentemente o automóvel como cerne
das preocupações ao nível do planeamento urbano) que oferecem possibilidades
reduzidas ou insuficientes às crianças e jovens ao nível de contacto, exploração, jogo,
desafio e aventura. Em Portugal, tal como já foi referido, a independência de mobilidade
das crianças e dos jovens aponta para uma baixa autonomia e uma reduzida capacidade
de exploração do ambiente físico e espacial (Cordovil, Lopes, & Neto, 2012b; Lopes et
al., 2011; Moreno, 2009; Neto & Marques, 2004). A independência de mobilidade das
crianças pode ser medida através de um conjunto licenças parentais relativas à deslocação
autónoma das crianças no seu espaço físico, ou seja, sem a supervisão parental. Estas
licenças parentais são as seguintes: i) a criança atravessar sozinha estradas principais; ii)
a criança ir sozinha a outros locais que não a escola (dentro de uma distância que pode
ser realizada a pé); iii) a criança realizar sozinha o trajeto de escola para casa; iv) a criança
sair sozinha depois do escurecer; v) a criança andar sozinha de transportes públicos; vi) a
criança andar de bicicleta sozinha em estradas principais (Cordovil et al., 2012b; M
Hillman et al., 1990; Kyttä, 2004; Shaw et al., 2012). Nas figuras 2 e 3 seguintes estão
apresentadas, respetivamente, o grau de independência de mobilidade das crianças
portuguesas (Cordovil et al., 2012b) e o ranking internacional de Portugal em termos de
independência de mobilidade de crianças1.

Figura 2- Licenças de Independência de Mobilidade de Crianças por faixa etária em


Portugal Continental.

1
Dados provenientes de um estudo não publicado intitulado “Children’s Independent Mobility-16
Country International Comparison” (Policy Studies Institute).
Figura 3- Ranking internacional de Independência de Mobilidade de Crianças.

A independência que a criança mostra face ao envolvimento espacial e social é uma das
características da sua identidade social e influencia o desenvolvimento da criança,
inclusive a prática do jogo. Neto (2006) diz que as referências de identidade social do
corpo, na infância, são construídas também pelo equilíbrio entre ação do corpo no espaço
físico e a riqueza interativa no espaço habitacional, na rua, na escola e na cidade.

A experiência de apropriação do espaço por parte de um indivíduo é um processo


intrínseco ao seu desenvolvimento e à conquista progressiva da sua autonomia e
maturação. À medida que as competências cognitivas, sociais, motoras, físicas e
psicológicas vão evoluindo, as possibilidades de ação do ser humano no contexto físico
tornam-se mais diversas e complexas. Todavia, não estamos perante um processo causa-
efeito unidirecional, uma vez que a relação inversa também ocorre. É nos períodos da
infância e da adolescência que este tipo de experiências espaciais ganha uma maior
relevância do ponto de vista do desenvolvimento físico, motor, emocional e cognitivo.

Jogo
O ato de brincar, o jogo (“play”) é a linguagem universal da infância pois é através do
jogo que as crianças se entendem umas às outras e fazem sentido do mundo que as rodeia.
O jogo é um processo livremente escolhido, pessoalmente dirigido e intrinsecamente
motivado. O jogo é pré-consciente e pré-verbal e surge de estruturas biológicas
ancestrais que existiram antes da nossa consciência ou da nossa habilidade para falar
(S. Brown & Vaughan, 2010, pág. 15). Brincar é antes de tudo, um “estado mental”,
apesar de também poder ser considerado como uma atividade. S. Brown & Vaughan
(2010, pág. 17) identificam sete propriedades inerentes ao jogo que o distinguem de outras
atividades e que reforçam esta ideia de jogo como “estado mental”:
 Aparentemente desprovido de finalidade, ou seja, realizado pelo seu próprio
gozo.
 Voluntário, isto é, não é obrigatório ou imposto pelo dever.
 Atração inerente, pois é divertido, excitante e provoca uma boa sensação.
 Liberdade de tempo, isto é, quando os indivíduos se encontram totalmente
engajados no jogo, perdem a noção da passagem do tempo, o que é bastante
frequente no caso das crianças;
 Diminuição da consciência do self, as pessoas quando entrosadas no jogo
desfocam a sua atenção sob si próprias e sob as suas preocupações, uma vez
que estão focadas no prazer e sentido do ato lúdico;
 Potencial de improvisação, ou seja, as estratégias, comportamentos e decisões
tomadas enquanto se brinca são flexíveis e criativas, incluem elementos
aparentemente irrelevantes, ou pouco prováveis, bem como, uma recriação das
funcionalidades e simbolismos de equipamentos e de recursos disponíveis no
ambiente para brincar, a improvisação resulta da serendipidade e
imprevisibilidade associada ao jogo;
 Desejo de continuidade, o prazer da experiência sentido no jogo conduz a um
desejo de perpetuação da atividade lúdica.

O jogo não é só comum aos humanos, sendo observado na maior parte dos mamíferos e
até em alguns répteis (Burghardt, 1998). Do ponto de vista filogenético, o jogo tem um
caráter ancestral, sendo anterior à própria cultura, e um papel basilar na construção das
atividades humanas em sociedade (Huizinga, 1950). As correntes evolucionista e
etologista defendem que o jogo é um mecanismo adaptativo de sobrevivência e que
possibilita uma transição adequado e competente entre o período juvenil e a idade adulta.
De um ponto de vista ontogenético, a espécie humana é caracterizada por um lento
crescimento do cérebro, uma infância prolongada (o qual é marcado por uma imaturidade
cognitiva) que possibilita uma adaptação futura a um vasto espectro de circunstâncias e
desenvolvimento de habilidade e resiliência, necessárias para ultrapassar com sucesso as
condições e situações adversas. Pellegrini, Dupuis, & Smith (2007) defendem que durante
este período de imaturidade cognitiva, o jogo torna-se particularmente importante, pois,
através deste, é possível à criança desenvolver novas estratégias e comportamentos como
resposta às novidades ambientais, com custos biológicos mínimos, e que irão, por sua
vez, influenciar processos de desenvolvimento e de evolução futuros. O jogo como
mecanismo de desenvolvimento de competências que serão necessárias na idade adulta,
existe nas crianças e nos animais, mas não nos adultos, sendo denominado por Sutton-
Smith (2001) de “progress rhetoric”. Este autor define sete retóricas de jogo que se
constituem como narrativas de interesse para as crianças e que são colocadas num
contexto dentro de um sistema de valores alargados. Estes valores contextuais são gerados
simbolicamente no âmbito dos sistemas sociais, educacionais, políticos e religiosos,
através dos quais os significados das culturas nas quais vivemos são construídos. Para
além, da retórica progressiva, este autor sugere o jogo como retórica do destino, retórica
do poder, retórica da identidade, retórica do imaginário, retórica do self e retórica
frívola.

Apesar desta visão do jogo como mecanismo adaptativo que promove benefícios
deferidos, existem autores que chamam a atenção para algumas características inerentes
ao jogo da criança, sugerindo uma visão deste que apenas remete para o prazer e alegria
no ato de brincar, ou seja, o jogo apenas pelo jogo em si mesmo, como comportamento
primário. O principal argumento que apresentam é o de que apesar de muitas vezes o jogo
representar situações e comportamentos adultos, como se em fase de preparação e de
experimentação, o jogo em si realizado é muito diferente da realidade: os movimentos
físicos, as vozes e linguagens são exageradas, incompletas ou na ordem errada; as linhas
das histórias tornam-se imprevisíveis, aleatórias ou fantásticas, os comportamentos
convencionais são invertidos ou subvertidos, as regras do jogo são modificadas para que
o jogo continue; cria-se um mundo onde por aquele momento as crianças estão em
controlo, onde as crianças deliberadamente procuram incerteza de forma a poderem
triunfar sobre esta, ou se não, não importa, pois trata-se só de um jogo (IPA, 2009). Desta
forma, as crianças desenvolvem um repertório de respostas flexíveis, em vez de respostas
definitivas a situações que elas criam e encontram, o que reforça a visão do jogo como
atividade primária lúdico-prazerosa, característica das vivências infantis.
No nosso entendimento, o jogo é para a criança um ato de comportamento livre e
prazeroso, orientado por uma motivação intrínseca numa continuidade de sentido e
intencionalidade lúdicos que possibilita a exploração e descoberta do mundo. O jogo é
para a criança o modo privilegiado de se relacionar com o meio que a rodeia e com os
outros. Contudo, somos forçados a concordar com S. Brown & Vaughan (2010), quando
referem que o jogo é antes de tudo um “estado da mente”, bastando para tal reinvocar as
propriedades associadas ao jogo, anteriormente referidas por estes autores. O estado
emocional disponível para se brincar pode ser proporcionado pela própria atividade lúdica
ou terá que ser incorporado pelo sujeito para que o jogo se manifeste. Consideramos,
também, o jogo como mecanismo de adaptação essencial para a sobrevivência e que
possibilita o desenvolvimento de uma progressiva autonomia e independência da criança
face ao seu envolvimento. Deste modo, o jogo pode ser encarado como um processo de
autoprotecção que oferece a possibilidade de aumentar as capacidades adaptativas e a
resiliência. Alguns autores defendem que experiência do jogo produz efeitos na
arquitectura do cérebro, particularmente nos sistemas relacionados com a emoção,
motivação e recompensa, o que, por sua vez, conduz a mais brincadeira. O cérebro molda
o jogo, assim como o jogo molda o cérebro (IPA, 2009). Numa perspetiva sociológica,
entedemos o jogo como uma linguagem fundamental para a criança poder construir
historicamente, socialmente e culturalmente a sua infância, nomeadamente, na sua
interação e negociação entre pares, mas também entre crianças e o mundo adulto.

Independentemente de qualquer das assunções anteriores relativas ao valor do jogo


enquanto comportamento, existe um claro consenso de que este é fundamental para a
saúde e bem-estar das crianças. Durante o jogo, as crianças apropriam-se dos aspetos das
suas vidas diárias e viram-nos ao contrário, rearranjando os seus mundos para os tornarem
menos assustadores ou menos aborrecidos. Nos jogos de perseguição as crianças são
fisicamente activas, elas estão a cooperar umas com as outras para manterem o jogo
através do cumprimento das regras. No entanto, o que é valorizado pelas crianças, a razão
pela qual elas estão motivadas em se envolverem nesse jogo é excitação da perseguição:
é uma questão emocional. As regras do jogo providenciam um enquadramento dentro do
qual os jogadores sabem que “isto é brincadeira”; isto providencia um lugar seguro onde
as emoções podem ser experienciadas sem as consequências que podem trazer no “mundo
real”. Por um momento, a realidade é suspensa e o optimismo reina (IPA, 2009).

De um modo geral, pode-se dizer que existem quatro grandes tipos de jogo:
 Jogo simbólico ou imaginário- Este jogo está relacionado com a interação entre
a criança e os sons à sua volta e os sons da linguagem e a própria linguagem. Está
também relacionado com a forma (desenhos, pinturas, acompanhados de
verbalizações e de diálogos) que a criança usa para expressar a sua linguagem e o
conteúdo da sua imaginação(Gauntlett et al., 2011). Neste tipo de jogo, podemos
também incluir o jogo de faz de conta e o sociodramático, na medida em que estes
resultam a partir de histórias criadas pelas crianças que oscilam entre o real e a
fantasia (S. Brown & Vaughan, 2010).
 Jogo social- Este tipo de jogo está relacionado com uma característica
fundamental do ser humano, a sociabilidade, ou seja, a interação com o outro. De
acordo com Hughes (1996), neste tipo de jogo as regras e os critérios para o
compromisso e interação social podem ser reveladas, exploradas e alteradas.
Segundo o mesmo autor, jogo social poderá ser qualquer situação de interação
social, na qual todos os sujeitos criam uma expectativa de que têm que obedecer
a regras ou protocolos.
 Jogo com objetos- Este tipo de jogo está relacionado com a curiosidade de
manipular objetos e com a própria manipulação dos mesmos, iniciando-se a partir
do momento que os bebés conseguem tocar e agarrar os objetos (colheres,
mordedores, etc) e ganhando complexidade à medida que as competências de
manipulação se aperfeiçoam (S. Brown & Vaughan, 2010; Gauntlett et al., 2011).
O jogo com objetos permite o desenvolvimento da motricidade fina e está
relacionado com o jogo simbólico, o faz de conta e o jogo sociodramático
(Gauntlett et al., 2011). Os jogos de construção estão também incluídos neste
grupo.
 Jogo de atividade física- Este tipo de jogo está intimamente relacionado com o
movimento do corpo e a atividade motora. Segundo S. Brown & Vaughan, (2010),
os bebés começam a brincar desde muito cedo para se aperceberem do seu corpo
e o seu programa de jogo inicia-se dentro do útero. Pellegrini & Smith (1998)
referem que o jogo de atividade física inicia-se na primeira infância e começa a
declinar a partir da adolescência; inclui as estereotipias rítmicas, o jogo de
exercício e o rough and tumble, sendo que cada um destes atinge o seu pico em
idades diferentes e suas tendências podem ser representadas em forma de um U
invertido. S. Brown & Vaughan (2010) frisam a importância do movimento,
destacando que este é primitivo (do ponto de vista filogenético) e que acompanha
todos os elementos do jogo, e que o movimento estrutura o conhecimento do
mundo, do espaço e do tempo, tal como a relação que estabelecemos com os
outros. Voltaremos ao jogo de atividade física com particular atenção, mais à
frente no capítulo.

O jogo promove o desenvolvimento comportamental, cognitivo, social, psicológico e


neuronal, contribuindo para a saúde e bem-estar da criança e dos adultos (S. Brown &
Vaughan, 2010; Gauntlett et al., 2011; IPA, 2009):
 O Jogo como fonte de prazer e de diversão- Está documentado que estas
sensações estão associadas a mais respostas flexíveis e abertas a situações e com
a eficiente resolução de problemas, auto-controlo, capacidade de pensar no futuro
e cautela em situações perigosas. O jogo funciona, também, como um regulador
emocional, uma vez que oferece um contexto seguro onde as crianças podem
experimentar emoções primárias como a alegria, a raiva, o medo, a tristeza, o
choque e a angústia sem, no entanto, sofrerem as consequências reais destas. A
forma como as crianças respondem ao stresse está ligada à regulação das emoções.
Durante o jogo, as crianças podem enfrentar stresse moderado e temporário, sobre
o qual sentem um elemento de controlo. Isto traz benefícios e tem um papel na
construção de resiliência a tipos de stresse mais nocivos (IPA, 2009).
 O Jogo como mediador e facilitador de interação social e emocional- Dentro
de um ambiente apoiado, o jogo torna-se num meio importante de estabelecer
vinculações entre a criança e adulto e entre amizades de pares. As culturas de jogo
das crianças surgem dentro das amizades entre os pares e estas assumem um papel
importante na geração de prazer e de estados emocionais positivos, regulação
emocional e resposta ao stresse moderado, particularmente através das maneiras
nas quais as crianças têm que lutar contra as experiências negativas, difíceis e
algumas vezes dolorosas.
 O Jogo como mediador da relação criança-espaço- Através do jogo a criança
estabelece vinculações aos seus pares, e adultos mas também com os lugares. O
jogo é situado num tempo e num espaço, e através disto a criança ganha um
sentido de familiaridade, intimidade e vinculação. O jogo cria uma amizade
recíproca com o lugar, fazendo com que a criança se preocupe com e trate do
ambiente local que possibilita esse mesmo jogo. O jogo possibilita que a criança
desenvolva com o lugar sentimentos, afectos, familiaridade e intimidade. A
criança vai-se vinculando aos lugares de jogo à medida que vai estabelecendo as
affordances, que como já foi explicado, vão dando origem a novas affordances.
Este processo de descoberta e de realização de affordances vai desencadear as
sensações de prazer e de bem-estar, o que por sua vez, irá reforçar o sentimento
de pertença das crianças aos espaços; possibilitando, desse modo, o
estabelecimento de experiências e vínculos emocionais com os lugares, afetando
as suas preferências espaciais.
 O jogo como estimulador neuronal- De acordo com S. Brown & Vaughan,
2010; Gauntlett et al. (2011) existem dados científicos que referem a existência
de uma correlação entre a quantidade de jogo e o desenvolvimento do córtex pré-
frontal, sendo esta uma zona do cérebro responsável por grande parte da alta-
cognição (discriminar informação relevante de irrelevante, monitorizar os nossos
comportamentos e o dos outros, planear o futuro, aprender com os erros). O
envolvimento ativo no jogo contribui positivamente para que o cérebro se adapte
às novas informações, de forma a produzir um sentido sobre estas, ou seja, tal
como o cérebro esculpa o jogo, o jogo também esculpa o cérebro; isto torna-se
possível pois, durante o jogo, o ser humano tem possibilidade de experimentar
novos papéis e imaginar e simular realidades, sem colocar em risco o seu bem-
estar físico e ou emocional (S. Brown & Vaughan, 2010). Estes autores referem
que o período máximo de jogo em cada espécie está relacionado com a taxa e o
tamanho de crescimento do cerebelo. Esta estrutura do cérebro está relacionada
com a coordenação e controle motor e, também, com funções cognitivas como a
atenção, o processamento da linguagem, a sensação de ritmo musical, entre outras.
A partir da teoria de Gerald Edelman, que defende que as experiências percetuais
estão codificadas dentro do cérebro em mapas dispersos, cada um dos quais se
constitui numa rede complexa de neurónios interconectados, S. Brown &
Vaughan (2010) defendem que a vitalidade, interconexão, riqueza e dinâmica
destes mapas são potenciados e moldados pelos estados internos decorrentes do
jogo.
 O jogo como instrumento de resiliência- A essência profundamente biológica
do jogo, o seu papel como mecanismo adaptativo e o prazer associado à sua prática
permitem à criança: descobrir e explorar a realidade de forma criativa e flexível;
criar, testar e otimizar estratégias cognitivas de resolução de problemas;
estabelecer ligações afetivas com pessoas e lugares; e lidar com o imprevisível,
exercitar e melhorar a sua resiliência.

Jogo de Atividade Física

O jogo da criança na infância e no início da adolescência é caracterizado por uma forte


componente motora e física que advém de uma predisposição biológica para tal associada
à necessidade de adaptação a um ambiente em constante evolução. Os adultos,
nomeadamente, os professores, educadores e pais têm dificuldade em lidar com este
“estado físico de jogo”, acompanhado por um acréscimo de dispêndio de energia e uma
necessidade intrínseca de exercício de movimento e de atividade motora lúdicos, que,
frequentemente, provocam desorganização estrutural espacial externa, enquanto,
paradoxalmente, contribuem para uma flexibilização e estruturação interna de respostas
e estratégias de descoberta e de exploração do mundo exterior. Este tipo de jogo é
denominado de Jogo de Atividade Física e alguns exemplos concretos serão o pontapear
(no caso os bebés), as perseguições (apanhadas), as escondidas, o trepar e a luta.

Pellegrini e Smith (1998) referem-se ao jogo de atividade física (physical play) nas suas
funções biológicas e sociais e identificam o seu perfil temporal no desenvolvimento
humano, incluídos os factores da idade e do género. Para estes autores, o jogo de atividade
física começa na primeira infância, aumentado durante toda a infância, declina na
adolescência e desaparece na idade adulta. O jogo de atividade física reflecte três tipos de
jogo, cada um numa fase distinta e possivelmente com funções diferentes associadas a
cada tipo.

A primeira fase é a das “estereotipias rítmicas” (rhythmic stereotypes), que se manifesta


através de movimentos grosseiros, sem atribuição de intencionalidade, consistindo em
balanços corporais e movimentos amplos com as pernas e braços. Estes comportamentos
estão associados a uma fase de exploração sensório-motora que se manifesta ao longo do
primeiro ano de vida.

A segunda fase corresponde ao “jogo de exercício” (exercise play), que integra um


momento de grande exaltação motora e física, caracterizada por experiências envolvendo
movimentos vigorosos de corrida, saltos e manipulações. Estas brincadeiras ocorrem,
normalmente, em formas de jogo livre nos espaços de recreio e trazem consigo um grande
significado social e biológico. Pode desenvolver-se de forma solitária, com adultos ou
com os pares. O jogo de exercício começa adquirir os seus contornos no final do primeiro
ano de vida e atinge o seu máximo durante os anos pré-escolares e escolares.

A terceira fase é o “jogo de luta e perseguição” (rough-and-tumble) decorrendo dos 6 aos


14 anos e que se manifesta por comportamentos vigorosos como lutar, chutar, deitar ao
chão e cair. Este tipo de jogo passa, normalmente, por atividades de contacto físico
estabelecidas com os pares e que expressam agilidade, desordem, corridas de perseguição,
confrontos, arremesso de objectos, entre outros. É uma fase muito importante do ponto
de vista biológico e social, nomeadamente no desenvolvimento de determinados rituais
que marcam a passagem para a adolescência e em termos das funções sociais de
dominância e de codificação de estados emocionais. O pico de desenvolvimento do jogo
de luta e perseguição atinge-se por volta dos 8 a 10 anos e desaparece progressivamente
durante a adolescência. Segundo S. Brown & Vaughan (2010), no caso dos rapazes, o
jogo de luta envolve pontapear e esmurrar levemente, ou sem contacto; adoção de
movimentos ritmados das mãos e de empurrões leves; presença de ombros curvados e da
boca aberta; contextualizados num ambiente de brincadeira e no qual as crianças estão a
sorrir, sendo que, por vezes, a criança fisicamente mais dominante, propositadamente,
deixar-se vencer pela menos dominante. No caso das raparigas, o jogo de luta e de
perseguição físico é menos frequente do que no caso dos rapazes (D. F. Bjorklund &
Pellegrini, 2002; S. Brown & Vaughan, 2010; Pellegrini & Smith, 1998). Contudo, as
raparigas envolvem-se frequentemente neste tipo de jogo, com a particularidade que este
tem uma forte componente psicológica caracterizada por role-playing, boatos, gozo ou
exclusão de pares. Em ambos os casos (rapazes e raparigas), se estivermos perante uma
situação de jogo de luta e de perseguição, no final do confronto, a amizade entre pares
mantém-se (S. Brown & Vaughan, 2010). Estes mesmos autores referem ainda que o jogo
de luta e de perseguição pode continuar na fase adulta através de formas verbais
relacionadas com o gozo, o humor e a ironia, enquadrados numa dimensão humana de
relacionamento positivo, que têm como objetivo a vinculação social e afetiva.

O jogo de atividade física caracteriza-se por apresentar uma componente de grande vigor
físico, sugerindo o exercício das funções imediatas durante a infância, com benefícios
deferidos para a maturidade, e com consequências nos domínios físico, cognitivo e social
(Neto, 2001; Pellegrini & Smith, 1998). Este jogo pode envolver atividade simbólica e
jogos com regras, a atividade pode ser solitária ou social, distinguindo-se das
características comportamentais do contexto de brincadeira, com moderada ou vigorosa
atividade física (Pellegrini & Smith, 1998).

Um bom exemplo da confluência de diferentes tipos de atividade lúdica, que têm como
denominador comum o Jogo de Atividade Física, é-nos trazido por Fjørtoft (2004). Esta
investigadora realizou um estudo num ambiente natural de uma área florestal, com
elevada diversidade topográfica e vegetação, na Noruega. Os resultados mostraram que
uma floresta pode transformar-se num contexto muito rico para o desenvolvimento de
uma grande variedade de atividades lúdicas. A autora caracterizou três sub-tipos de jogo
de atividade física, os jogos funcionais, os jogos simbólicos e os jogos de construção. Os
jogos funcionais foram considerados jogos amplos e caracterizavam-se pelas atividades
de corrida, subir a árvores, saltar rochas; jogos de perseguição e de esconderijo e
aconteciam Os jogos simbólicos e de construção decorriam em habitat de densa vegetação
onde se construíam esconderijos e cabanas, cada árvore funcionava como um habitat para
um jogo simbólico ou de construção. Este último possibilitava ainda formas de
aprendizagem diversa sobre o planeamento, escolha e recolha de materiais necessários
para o desenrolar do jogo. Os resultados desta investigação permitem-nos concluir
positivamente sobre os efeitos adaptativos ao ambiente físico e social por intermédio do
Jogo de Atividade Física.
S. Brown & Vaughan (2010) constatam sobre a dimensão simbólica do jogo de atividade
física, particularmente, no caso do jogo de luta e de perseguição, ao mencionarem o “jogo
do super-herói”. Neste tipo de brincadeira, influenciada pelas personagens televisivas, as
crianças encarnam os “bons e os maus da fita”, construindo narrativas de ação que são
simultaneamente motoras (fisicamente vigorosas) e simbólicas (o faz de conta). No nosso
entendimento, isto possibilita às crianças experimentarem diferentes papéis sociais,
exercitarem a sua moral e tomarem posições sobre valores como a justiça, o bem e o mal.
Outro aspeto importante que decorre deste tipo de jogo (físico e social) é a possibilidade
das crianças realizarem aprendizagens sociais por elas próprias e com os seus pares.

De seguida, apresentamos os benefícios do Jogo de Atividade Física para a criança,


segundo a perspetiva de diversos autores:
 O Jogo de Atividade Física resulta de pressões seletivas evolutivas, que prepara a
criança para o inesperado e para a sobrevivência, possibilitando o
desenvolvimento de capacidades adaptativas a situações motoras, cognitivas,
sociais e emocionais (Neto & Marques, 2007).
 Byers (1998) sugere que o Jogo de Atividade Física estimula o cerebelo de alguns
mamíferos (não humanos), uma vez que concluiu que é nos períodos de maior
jogo que se verificou o maior crescimento desta estrutura cerebral. A hipótese
colocada é a de que existe um período crítico no desenvolvimento (localizado na
curva de U invertido), no qual a função do jogo de atividade física prende-se com
a modificação no desenvolvimento de uma porção do cérebro que está envolvido
com o controlo da motricidade fina. Mais recentemente, S. Brown & Vaughan
(2010), reforçam a importância do cerebelo, referindo que nos períodos de maior
desenvolvimento, esta estrutura cerebral contribui continuamente para a destreza
humana motora e cognitiva, ambas fundamentais para a emergência da linguagem.
 O jogo de exercício está relacionado com o desenvolvimento global do corpo e
com coordenação olho-mão (Gauntlett et al., 2011), sendo também importante no
treino de força e de endurance (Gauntlett et al., 2011; Pellegrini & Smith, 1998).
O jogo de luta e de perseguição surge como um mecanismo através do qual as
crianças aprendem a controlar a agressividade; possibilita o desenvolvimento de
competências emocionais e sociais e o entendimento dos estados emocionais; e
contribui para o desenvolvimento de vínculos emocionais fortes entre as crianças
e os seus pais (Gauntlett et al., 2011). Estes mesmos autores consideram que
dentro do jogo de atividade física, existe ainda uma sub-categoria denominada
“jogo de motricidade fina”. Esta passa por um conjunto de atividades,
frequentemente solitárias (coser, recortar, construir, etc) e que promovem o
desenvolvimento da concentração e da perseverança.
 O jogo de atividade física possibilita que as crianças e outros animais jovens
aprendam sobre o seu ambiente físico e social (Pellegrini & Smith, 1998). Estes
autores referem que o jogo de atividade física tem funções ao nível do
desenvolvimento das crianças, uma vez que a privação de oportunidades para este
tipo de jogo provoca a sua compensação. Este tipo de jogo locomotor está
associado com a cognição espacial das crianças, sugerindo a sua importância na
recolha de informação ambiental (D. F. Bjorklund & Pellegrini, 2002).
 Pellegrini & Smith (1998) propõem que as formas de jogo de atividade física
(estereotipias rítmicas, jogo de exercício e jogos de luta e de perseguição) têm
uma função primária em termos de benefícios imediatos no desenvolvimento
humano, ao contrário de outras teorias que se focam nos benefícios deferidos do
jogo (a longo prazo) no desenvolvimento humano. Desse modo, concluem que as
estereotipias rítmicas melhoram, no imediato, o controlo de padrões motores
específicos por parte do bebé; o jogo de exercício, tal como já foi referido
anteriormente, promove, no imediato, o treino da força e do endurance e poderá
trazer benefícios cognitivos acidentais para as crianças, na realização de tarefas
escolares exigentes, após um período de intervalo de natureza motora e lúdica; o
jogo de perseguição e de luta é caracterizado por uma componente social distintiva
e serve primariamente para o estabelecimento e manutenção de relações de
dominância em grupos de pares, especialmente de rapazes pré-adolescentes (a
dominância em termos de relações de filiação, hierarquia e estatuto social no
grupo). D. F. Bjorklund & Pellegrini (2002) e Pellegrini & Smith (1998)
concluem, partir de vários estudos, que este tipo de relações de dominância é
estabelecido usando uma combinação de estratégias agressivo-lúdicas (jogos de
luta) e de estratégias de índole cooperativa e de filiação. O jogo de perseguição e
de luta poderá providenciar uma forma de avaliar a força dos outros, para assim
se poder escolher a melhor estratégia na competição pela dominância (Pellegrini
& Smith, 1998).
 Para S. Brown & Vaughan (2010), a partir de estudos e de intervenções realizados
por Joe Foster (conceção de espaços de jogo de recreio que promovem o contacto
com o ambiente natural, o jogo de exploração e o jogo de atividade física),
ressaltam que o jogo de luta e de perseguição providencia uma importante e
necessária base para uma socialização cooperante bem-sucedida (pág. 90).
Ainda segundo os autores anteriores, o jogo de luta e de perseguição possibilita a
descoberta recíproca dos limites pessoais de cada interveniente, e, quando o
confronto termina, as crianças tornam-se mais próximas e mais livres no seu jogo.
De acordo com Pellegrini (1992), a dimensão de flexibilidade do jogo de luta e de
perseguição está relacionado com a filiação e com a resolução de problemas
sociais.

No ponto seguinte, continuaremos a tecer algumas considerações relacionadas com o


jogo de atividade física, que julgamos serem importantes para o contextualizar em termos
da infância vivida atualmente pelas crianças e para sublinhar a importância deste passar
a ser uma preocupação séria e concreta em termos da construção de políticas públicas
para a infância. Sobre este último aspeto, gostaríamos já de sugerir que a promoção do
jogo de atividade física na vida da cidade e da escola, deveria ser uma preocupação
prioritária dos decisores políticos e da comunidade em geral, no desenho de estratégias e
de iniciativas que possibilitem a exploração motora ativa da criança em relação ao seu
território espacial significativo. Neste seguimento, recordamos Neto (2001), ao referir
que a promoção do jogo de atividade física deveria constituir-se como um indicador
decisivo de qualidade de vida dos centros urbanos.

Um contra-senso evolutivo

As crianças passam cada vez mais tempo no contexto de escola, estando sujeitas a uma
carga horária escolar mais alargada, a um currículo hiper-estruturado e formalizado,
centrado em aprendizagens cognitivas orientadas precocemente para uma excessiva
competição académica. Os modelos escolares atuais e vigentes em Portugal, que se
reproduzem na esmagadora maioria dos jardins-de-infância e escolas de 1º ciclo,
reservam pouco, ou quase nenhum espaço para as aprendizagens espontâneas e criativas
geradas a partir das experiências e interações das crianças com o envolvimento exterior
físico, ora em contexto de jogo, ora em contexto estruturado, o que pode representar um
“contra-senso evolutivo”. Nestas idades, a atividade da criança é caracterizada por uma
forte componente lúdica com expressão física e motora dotadas de uma intencionalidade
própria no processo de desenvolvimento e aprendizagem (adaptação biológica e social).
Os níveis altos de atividade física presentes no Jogo de Atividade Física devem-se a
necessidades biológicas e a dinâmicas físicas, sociais e cognitivas de adaptação ao
ambiente.
A perspetiva da Psicologia Evolucionista
Para melhor sustentarmos a ideia do “contra-senso evolutivo” ao nível da adaptação
biológica e social presente nos modelos de educação vigentes é necessário referir o
entendimento sobre o desenvolvimento humano aos olhos da Psicologia Evolucionista.
Nesta perspetiva os organismos adaptam-se e desenvolvem-se, através da seleção natural
e através das suas transações com o envolvimento. Os organismos afetam o seu
envolvimento, escolhendo e “mobilando os seus nichos”, e reciprocamente os
envolvimentos afetam o organismo, alterando os comportamentos de forma a preencher
as demandas específicas de um dado contexto (Bjorklund & Pellegrini, 2002). Estes
autores referem o trabalho de Gilbert Gottlieb relativo ao conceito de “epigenesis” como
construto basilar da abordagem de desenvolvimento evolucionista. A “epigenesis” é a
“emergência de novas estruturas e funções durante o curso do desenvolvimento (Gottlieb,
1991), refletindo um relacionamento bidirecional nos seio de todos os níveis de fatores
experienciais e biológicos, de tal forma que a atividade genética influencia e é
influenciada pela maturação estrutural, que por sua vez está relacionada bi-
direcionalmente com a função e a atividade (Gottlieb, 2000).

O desenvolvimento individual surge de complexas interações que ocorrem em níveis


múltiplos e que expressam diferentes atividades consoante os sistemas associados a esses
níveis. Os níveis múltiplos podem ser: genético, neuronal, comportamental e ambiental,
que engloba o envolvimento físico, social e cultural. Para além do património genético,
os organismos herdam também ambientes internos e externos, e é dentro destes ambientes
que os genes são expressados e os fenótipos derivados. Desse modo, o que evolui são os
sistemas de desenvolvimento que incluem genes mas também os ambientes variados e
interacionais nos quais os genes existem (D. F. Bjorklund & Pellegrini, 2002).
Neste sentido, podemos sugerir que as funções e atividades desenvolvidas pelas crianças
num determinado envolvimento físico, cultural e social serão o resultado das expressões
interativas genéticas, neuronais, comportamentais e ambientais que vão ocorrendo,
mediadas por processos de transação internos e externos de forma a dar resposta aos
desafios adaptativos específicos de fases específicas do seu ciclo de vida. No paradigma
evolucionista de desenvolvimento, todo o comportamento, incluindo o comportamento
motor, deve ser visto tendo em conta o seu valor adaptativo num tempo específico do
desenvolvimento ontogenético e filogenético. Em termos ontogénicos, os diferentes
comportamentos ou características de um animal podem ser selecionados em diferentes
momentos do desenvolvimento.

A perspetiva evolucionista do desenvolvimento ontogenético engloba duas tomadas de


posição relativas ao propósito da própria adaptação e evolução do ser humano, que
embora sendo opostas se complementam. Se por um lado, consagra que determinadas
características dos comportamentos das crianças servem de preparação para a vida adulta,
por outro lado, contemplam que muitos destes aspetos da infância evoluíram para um
propósito de valor adaptativo para esse tempo específico no desenvolvimento (Bjorklund,
1997). O desenvolvimento é retratado como um processo adaptativo sequencial em
direção à vida adulta e à maturidade, pasando pelas infâncias e adolescência. O processo
é visto não apenas como um meio para atingir um fim, através de uma preparação em
cada fase para a vida adulta, mas, também, como cada uma dessas fases deve servir para
que as crianças se adaptem ao seu envolvimento imediato, ou “nicho” desenvolvimental
(Bjorklund, Periss, & Causey, 2009). Este prolongado período de imaturidade,
característico da espécie humana, acarreta grandes custos biológicos ao nível da
dependência prolongada, manutenção e cuidado das crianças, limitando o número de
descendentes, aumentando a possibilidade da prevalência de situações que ponham em
risco, a saúde, bem-estar, segurança e sobrevivência do ente dependente (fome, risco de
predação e de doença); aumentando a possibilidade de um ser morrer antes de se
reproduzir (adiamento da maturação sexual). Contudo, de acordo com a biologia, se a
uma determinada característica está associada grandes custos e se esta se continua a
expressar, significa que grandes benefícios são também expectáveis; pois se assim não
acontecesse, essa característica teria sido excluída do processo ontogenético através da
seleção natural (Bjorklund et al., 2009).

Imaturidade Cognitiva, Jogo e Adaptação

Neste seguimento, por um lado, sugerimos que a imaturidade comportamental, cognitiva,


social e motora da criança presente nos períodos de desenvolvimento até à adolescência,
expressada através do jogo, da atividade física e do comportamento motor, compreende
funções e nichos de negociação de possibilidades de ação e de interação físicas, sociais,
simbólicas, lúdicas e neuronais por parte da criança no seu envolvimento; sendo estas
mediadas por uma dimensão sociológica, temporal, histórica e cultural. É a partir destes
processos transacionais que a criança se adapta ao seu contexto presente, aquilo a que
Bjorklund e colaboradores (2009) designam por “adaptação ontogenética”.
Por outro lado, estas adaptações presentes na infância são fundamentais para o
desenvolvimento de futuras competências multidimensionais enquanto adultos funcionais
e equilibrados, ou seja, têm a função de servir como preparação para a vida adulta
(Bjorklund & Pellegrini, 2002) e, como tal, apresentam-se como ”adaptações deferidas”
(Bjorklund et al., 2009).
O jogo durante o período da imaturidade é especialmente importante nos processos de
desenvolvimento e de evolução, uma vez que abre oportunidade para se desenvolverem
novas estratégias e comportamentos com custos mínimos (ao nível da relação custo-
benefício de ordem biológica explicada anteriormente). Estas estratégias, por sua vez,
podem influenciar os processos de evolução (Pellegrini et al., 2007).

Os seres humanos, ao contrário das outras espécies animais, prolongam o brincar e a


curiosidade pela idade adulta o que revela a necessidade do contacto com a novidade,
resultando numa aprendizagem continuada e numa flexibilidade comportamental
(Bjorklund et al., 2009). Este facto reforça ainda mais a importância do jogo enquanto
elemento adaptativo circunstancial e deferido na vida do ser humano.

As culturas de pares da infância e o jogo de atividade física

De forma a salientar a relação entre as culturas de pares infantis e jogo de atividade física,
será fundamental compreender o percurso de desenvolvimento infantil aos olhos da
Sociologia da Infância, nomeadamente, no que concerne o papel das culturas de pares no
desenvolvimento social infantil, e perceber que o jogo de atividade física é um elemento
funcional, social e simbólico das próprias culturas de infância.

A criança deve passar por um período preparatório na infância antes de se tornar um


adulto competente, mas o desenvolvimento social infantil não deve ser visto unicamente
como a internalização isolada dos conhecimentos e das habilidades de adultos pela
criança. Corsaro (2011) propõe o “modelo de teia global” para o desenvolvimento social
infantil, o qual apresentamos em seguida:
Figura 2- Modelo de teia global do desenvolvimento infantil de Corsaro (2011)

 No eixo, ou centro da teia encontra-se a família de origem, a partir da qual as


crianças começam a participar numa série de culturas de pares. Nas sociedades
modernas, esta interação (mesmo em idades precoces) também ocorre em outros
locais institucionais, com outras crianças e outros adultos que estão fora do
domínio familiar.
 A partir do eixo central estão contempladas várias espirais que se vão alargando
à medida que se afastam do centro. Podem ser consideradas quatro espirais que
representam quatro culturas de pares distintas (pré-escola; pré-adolescência;
adolescência e idade adulta), as quais são criadas por diferentes gerações de
crianças de uma determinada sociedade.
 A perpassar as espirais existem raios que se traduzem pelos diferentes campos
institucionais que fazem parte do quotidiano (campos educacionais, familiares,
comunitários, económicos, culturais, religiosos, políticos, ocupacionais, etc).
 As culturas de pares diferem nos campos institucionais nos quais são tecidas, e
são resultado de produções coletivas inovadoras e criativas. As teias ou espirais
representam as culturas de pares que são coletivamente tecidas sobre o quadro de
conhecimentos culturais e instituições, aos quais a criança pertence e
simultaneamente ajuda a edificar.
 As culturas de pares não são fases pelas quais cada criança passa. As culturas de
pares são produzidas e participadas pelas próprias crianças enquanto atores
dialogantes com o mundo adulto. Estas produções colectivas culturais são
incorporadas nas experiências que elas tecem com outras pessoas, ao longo da sua
vida. Nesse sentido, as experiências infantis nas culturas de pares não são
abandonadas com a maturidade e com o desenvolvimento individual. As culturas
de pares infantis contribuem, por sua vez, para a reprodução e alteração da
sociedade e da cultura mais ampla dos adultos. As crianças transformam as
informações do mundo adulto para darem resposta às suas próprias preocupações.
 A integração das crianças nas suas culturas é feita de forma reprodutiva e coletiva
e não de forma linear e individual, isto é, as crianças não se limitam a imitar ou a
internalizar o mundo em torno delas, mas esforçam-se para interpretar ou dar
sentido à sua cultura, produzindo coletivamente os seus próprios mundos e as suas
culturas de pares.

Este processo de apropriação, reinvenção e reprodução é denominado por Corsaro de


reprodução interpretativa, e substitui o de socialização, o qual, para este autor, apresenta
uma conotação individualista e progressista.
A este propósito, Sarmento (2003) defende que a compreensão das culturas da infância
só poderá ser feita na conjugação da análise da produção das formas culturais para a
infância com a recepção efectiva dessas formas pelas crianças (pág. 7). As formas
culturais criadas e dirigidas pelos adultos para as crianças visam, por um lado, todos os
artefactos relacionados com a cultura escolar, e por outro, o conjunto de dispositivos
culturais, orientados pelo mercado e configuradores da indústria cultural para a infância,
desde os brinquedos, literatura infantil, jogos de vídeo, internet, até aos serviços variados
de férias, de tempos livres, de aniversário, entre muitos outros. O mesmo autor considera
as crianças como criadores culturais, chamando a atenção para as formas culturais
autónomas geradas pelas crianças nas suas interacções e nas interacções com os adultos
e com a natureza (pág. 7). Os jogos infantis surgem como uma destas formas culturais
fruídas e criadas pelas crianças e são hoje um património preservado e transmitido pelas
crianças, numa comunicação intergeracional que escapa em larga medida à intervenção
adulta (pág. 7).
As culturas das crianças são essencialmente culturas de pares, como já foi dito
anteriormente, sendo o jogo de atividade livre uma forma privilegiada das crianças
estabelecerem vinculações entre os seus pares e com os lugares físicos onde brincam. A
natureza interativa do brincar das crianças é um dos elementos fundacionais das culturas
da infância. O brincar surge como condição essencial para a aprendizagem, incluindo,
desde logo, a aprendizagem da sociabilidade. Sutton-Smith (1986, pág. 26) frisa a
importância do brincar com os outros, não brincar com objetos.

A ludicidade integrada nas culturas da infância, através da manifestação do jogo de


atividade física de entre outras formas de jogo, representa um processo fundamental e
crucial de interação das crianças com o envolvimento e de negociação dos nichos
específicos transacionais de infância, dado o seu caráter livre, adultamente desestruturado
e especificamente adaptado às linguagens motoras e simbólicas das crianças. Os
contextos físico, social e cultural interagem com os ambientes das crianças e vão
influenciar a sua habilidade para jogar. Ao mesmo tempo, as significações e a ação
intencional que a própria criança faz do jogo, junto com a interatividade que estabelece
com os seus pares e com o ambiente onde está inserida, vão, também, determinar a
construção motora, social e cognitiva que ela faz do jogo.

Contextos de mobilidade e de jogo: A Cidade como um espaço de jogo.

Os contextos nos quais as crianças brincam são muito variados uma vez que as crianças
brincam em qualquer lugar possível: ruas e vizinhanças das suas casas, parques, jardins,
espaços de jogo, recreios escolares, centros de cuidados, contextos comerciais e virtuais
de jogo. Todos estes contextos têm características próprias que podem influenciar as
atividades de jogo (Meire, 2007) e, neste sentido, sendo possível jogar em todos os
contextos, os jogos não são necessariamente os mesmos.

Num estudo recente, Weston (2010) refere que a razão primária pela qual as cidades
devem ser construídas de forma que os adolescentes e pré-adolescentes se possam
deslocar com independência é a de que as áreas do cérebro responsáveis pela perceção e
análise espacial estão a ser desenvolvidas. Na verdade, há muito que se sabe que a
atividade conduzida pelo próprio animal tem um efeito maturacional e desenvolvimental
diferente do que resulta da pura acumulação passiva de experiência (Held & Hein, 1963).
A forma como é planeado o espaço físico da vizinhança próxima pode influenciar a
competência da criança de idades mais baixas para brincar sozinha no exterior da casa
(Churchman, 2003).

A cidade foi no passado, e devia ser recuperada no presente e repensada no futuro, como
um espaço de jogo, de encontro, de convívio, de partilha de dinâmicas sociais e culturais,
um espaço de passeio e de liberdade. Contudo, as atividades lúdicas de rua e de
exploração natural tendem a desaparecer, pela influência crescente dos jogos virtuais e de
atividades estruturadas e ofertas de entretenimento e de jogo provenientes dos recursos
eletrónicos (Neto, 2006). O jogo de atividade física e motora na criança e adolescente é
um problema essencial das sociedades contemporâneas ou pós-industriais, nas quais o
uso do espaço e dos equipamentos para jogo e tempo livre deve ser reconsiderado, de
acordo com as mudanças e razões de mobilidade da população de meios urbanos, vilas
ou aldeias (Neto & Marques, 2004).

É neste seguimento que consideramos ser necessário pensar na cidade de acordo com as
percepções, comportamentos e interatividades que as crianças e os jovens geram no
espaço urbano. Assim, será crucial escutar as crianças e jovens através de processos de
participação infantil. Iniciativas como o The Children’s City Project (Tonucci & Rissotto,
2001) confirmam a capacidade das crianças e jovens em identificarem os problemas da
cidade e apontarem soluções que são muitas vezes inovadoras, inclusivas e úteis para toda
a população. Esta escuta ativa das crianças e jovens irá possibilitar repensar as
características e os recursos existentes no ambiente físico, de forma que este se torne
convidativo, desafiante, lúdico, interativo e inclusivo.

Através da mobilidade, do jogo e da exploração espacial da cidade, os espaços


constituem-se progressivamente como lugares, à medida que a criança vai adquirindo
autonomia e aprofundando a sua experiência com o lugar. Segundo Tuan (1983), o espaço
como ente mais abstrato vai-se transformando em lugar à medida que é experimentado e
praticado no quotidiano. Neste sentido, os espaços terão de ser dotados de características
e de propriedades significativas funcionais que desencadeiam nas crianças e jovens
affordances desafiantes.
Neste sentido, recriamos o que Newstead (2007) refere quanto jogo no espaço de recreio
e no contexto da cidade: o jogo e a interatividade física na cidade deverão possibilitar
oportunidades para as crianças e jovens se reintegrarem a elas próprias e para serem elas
próprias. Para que isto aconteça as crianças terão que libertar o excesso de energia;
escapar para outras realidades; criar e partilhar experiências com outros; explorar e testar
fronteiras; experimentar um largo espectro de emoções; assumir riscos físicos e
emocionais; testar abordagens criativas aos problemas e experimentar diferentes maneiras
de se aproximarem do mundo que as rodeiam.

Um outro problema que se coloca nas cidades é a questão da exposição das crianças aos
riscos. Atualmente, as crianças estão cada vez mais vulneráveis e menos expostas a riscos.
Mayer Hillman (2006) afirma que a criança precisa de adquirir competências de
segurança rodoviária e correr riscos, de forma a que numa primeira instância aprenda a
lidar com esses riscos, com situações inesperadas, encontrar os limites pessoais e públicos
e perceber quando deve exercer cautela. Neste seguimento, temos a convicção que os
espaços para as crianças brincarem devem comportar características e elementos físicos
que sejam desafiadores das suas capacidades e que proporcionem experiências de prazer
e de risco.

Consideramos, porém, que o aspeto da segurança no espaço público não deve ser
menosprezado. Todos os cidadãos têm o direito de usufruir do espaço público em
condições de liberdade e de segurança, pelo que os municípios devem desenvolver
estratégias e medidas que de facto garantam a segurança dos cidadãos. Todavia, não se
deve confundir segurança com ambiente altamente securitário, controlador e invasor da
privacidade, pois a concepção excessivamente restritiva tem um efeito perverso uma vez
que diaboliza as questões da (in)segurança e afasta os cidadãos dos espaços públicos. A
segurança deverá ser assegurada, com o compromisso de não retirar do ambiente físico
da cidade, as características e elementos associados ao risco como oportunidade de
aprendizagem.

Gill (2007) propõe que a sociedade precisa de abraçar uma filosofia de resiliência, isto é,
a afirmação da capacidade da criança para recuperar de efeitos adversos, sejam estes
acidentes ou lesões, fracasso, conflito, abuso, negligência, ou, até mesmo, tragédia.
Resiliência significa, então, encontrar maneiras de funcionar num mundo onde coisas más
acontecem, conjugadas com o esforço para atingir novos objetivos, e com a possibilidade
de funcionar e de se adaptar perante a adversidade.

O risco deverá ser uma componente essencial do jogo, uma vez que o enfrentar de novas
dificuldades e a sua superação alargam a satisfação da aprendizagem, o que por sua vez
leva o organismo à produção de prazer, consolidando os níveis atingidos e encorajando o
esforço para o investimento em novos objetivos. É crucial reafirmar as crianças, os jovens
e toda a população enquanto exploradores urbanos na cidade, para que esta seja o lugar
onde todos podem usufruir e brincar num gigante Playground físico, simbólico e social.
O incremento da independência de mobilidade das crianças e jovens e esta visão
“playgroundiana” da cidade, enquanto espaço de aventura e de desafio são, no nosso
ponto de vista, fundamentais para um futuro mais criativo, inovador, empreendedor,
sustentável e mais democrático.

Políticas públicas para a infância: a reconciliação da cidade com as crianças e os


jovens
A falta de contacto e de interação entre a criança e a cidade, através da redução da
independência de mobilidade e de autonomia, condiciona e limita as oportunidades para
o jogo e as interatividades físicas ocorrerem. Neste quadro, a diversidade de affordances
diminui, o que por sua vez afeta o desenvolvimento da resiliência da criança e da sua
capacidade adaptativa biológica, motora, social, cognitiva e psicológica. A reduzida
independência de mobilidade na infância e na adolescência e a falta de oportunidades de
jogo nos espaços urbanos constitui-se como um problema de saúde pública, ao nível da
obesidade, sedentarismo e da iliteracia motora. Ao mesmo tempo, esta exclusão do corpo
em movimento e exploração do espaço público contribui para o alheamento simbólico
dos cidadãos relativamente aos assuntos da sua cidade, reduz os níveis de participação
pública dos indivíduos nas decisões relativas ao planeamento e organização dos espaços,
contribui para o aumento da insegurança no espaço público, reforçando tomadas de
decisões securitárias para o salvaguardar, promove a exclusão social e a guetificação dos
espaços, reduz as possibilidades de encontro e partilha inter-geracional, e enfraquece o
tónus democrático e os próprios processos de cidadania.

A resposta para estes dilemas terá que advir da construção e implementação de políticas
públicas para a infância e para a adolescência que tenham como preocupação a dimensão
relacional criança-espaço físico e cujo horizonte seja a reconciliação da cidade com as
crianças e jovens e vice-versa. Estas políticas têm que conceber as crianças e jovens como
atores sociais, integrando-os em processo de recolha de dados sobre a perceção e
realização de possibilidades de ação no espaço físico urbano, e ouvindo-as nos próprios
processos de planeamento urbano em conjunto com os profissionais e técnicos.

O jogo e a Convenção dos Direitos da Criança

O artigo 31 da Convenção sobre os Direitos da Criança, para além de contemplar o direito


ao brincar, manifesta, também, a ideia de que os adultos devem assegurar as condições
necessárias para que a criança possa efetivamente brincar. O jogo das crianças pertence
às crianças e, como tal, os adultos devem ter cuidado para não destruírem os lugares
próprios das crianças para o jogo através de planeamentos insensíveis às perspetivas
infantis, ou através da criação de lugares e de programas que segregam as crianças e
determinam e controlam abusivamente os seus jogos. Os princípios pelos quais os adultos
se devem reger ao promoverem qualquer iniciativa ou intervenção de jogo passam por ter
em conta as características do jogo permitindo suficiente flexibilidade, imprevisibilidade
e segurança para que as crianças possam brincar livremente. Os benefícios do jogo e que
já foram mencionados anteriormente, advêm da imprevisibilidade, espontaneidade e
criatividade intrínsecas ao ato de brincar, contextualizado nas especificidades das culturas
lúdicas infantis.

Como previsto no artigo 31 da CDC os adultos têm de assegurar que os ambientes físicos
e sociais nos quais as crianças vivem, apoiam e suportam o jogo. Faltar a este
compromisso significa desqualificar a experiência da infância e, ao mesmo tempo
hipotecar e comprometer o bem-estar, desenvolvimento e a própria sobrevivência das
crianças. Nesse sentido, o jogo e o brincar devem ser valorizados como parte integrante
do ser criança, que é um ator competente, interativo e capaz de construir significados,
ações e intenções do mundo e da realidade, distintos dos produzidos pelos adultos.

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