Michelangelo viveu no final do Renascimento e transição para o Maneirismo, uma época de intensos conflitos. Ele absorveu as lições do Renascimento inicial que colocou o ser humano no centro baseado na tradição clássica. Suas obras mais maduras refletem a estética maneirista com distorção das proporções e drama em resposta aos tumultos da época.
Michelangelo viveu no final do Renascimento e transição para o Maneirismo, uma época de intensos conflitos. Ele absorveu as lições do Renascimento inicial que colocou o ser humano no centro baseado na tradição clássica. Suas obras mais maduras refletem a estética maneirista com distorção das proporções e drama em resposta aos tumultos da época.
Michelangelo viveu no final do Renascimento e transição para o Maneirismo, uma época de intensos conflitos. Ele absorveu as lições do Renascimento inicial que colocou o ser humano no centro baseado na tradição clássica. Suas obras mais maduras refletem a estética maneirista com distorção das proporções e drama em resposta aos tumultos da época.
Michelangelo viveu ao longo da última fase do Renascimento e na transição para o
Maneirismo, uma época de intensos conflitos sociais e profundas mudanças na vida cultural. Quando jovem, absorveu as lições do primeiro Renascimento, que estabelecera uma série de cânones técnicos e estéticos para a representação artística. Esses cânones haviam sido estabelecidos sobre uma forte tendência de recuperação na arte e na cultura da tradição clássica da Antiguidade, que se desenvolvia desde séculos antes a partir de uma série de descobertas de textos de filósofos e outros escritores antigos, especialmente neoplatônicos helenistas e oradores, poetas, políticos e historiadores romanos, e de peças de arqueologia. Com essa quantidade de novas informações, no século XV se consolidou o que se chamou de Humanismo, uma síntese eclética dessas fontes pagãs com o pensamento cristão, incorporando ainda elementos das tradições árabes, orientais e egípcias, bem como outros oriundos da magia, das tradições religiosas esotéricas, da mitologia clássica e da astrologia. O resultado foi a colocação do ser humano novamente no centro do universo, enfatizando sua nobreza, sua beleza, sua liberdade, os poderes de seu intelecto e sua natureza divina. Na arte foi criado um sistema de proporções ideais para a arquitetura e para a representação do corpo e se cristalizou o sistema da perspectiva para a definição da representação bidimensional. O Renascimento associou ainda o idealismo clássico com um intenso interesse pelo estudo científico do mundo natural, produzindo uma arte que era uma generalização universal mas capaz de se deter no particular para descrever caracteres individuais. Ao mesmo tempo, era uma arte de índole ética, pois se considerava possuir uma função social da qual não podia escapar, e almejava sobretudo a cura das almas e a instrução do público para a condução da vida pelos caminhos da virtude. Michelangelo passou sua juventude em Florença quando ela estava no auge de seu prestígio político, econômico e principalmente cultural, sendo uma referência não só para a Itália mas para boa parte da Europa. Pouco depois, em torno de 1500, Roma tomou-lhe a dianteira em todos esses aspectos, onde os papas fortaleceram seu poder temporal enfraquecido, invocaram para Roma a posição de cabeça do mundo e herdeira do Império Romano, e proclamaram a universalidade de sua autoridade religiosa. Foi a fase chamada de Alta Renascença, quando as ideias artísticas clássicas a respeito de harmonia, equilíbrio, moderação, dignidade, proporção e fidelidade à natureza se tornaram especialmente influentes. Nesta mesma altura, Michelangelo atingia sua primeira maturidade artística e já trabalhava para os papas em Roma, produzindo obras que espelham perfeitamente essas concepções. Entretanto, a Itália já estava sob a mira de grandes potências estrangeiras, e começou a ser invadida em vários pontos. Em 1527 Florença foi posta sob sítio e Roma foi vítima de um terrível saque por tropas do Sacro Império, enquanto na mesma época no norte da Europa os Protestantes conseguiam a sua separação da Igreja romana com severas críticas à doutrina e aos abusos e corrupção do clero. A autoridade papal sofreu sério abalo, o poder político italiano no panorama internacional caiu de imediato, e na Itália se instaurou um clima sociocultural de incerteza, tensão e medo. A reação da Igreja foi lançar nos anos seguintes a Contra- Reforma, estabelecendo uma nova formulação para a doutrina e novas regras para a arte sacra, onde se tornou uma praxe a censura prévia com uma orientação claramente propagandística. Como descreveu Argan, nesse período a religião já não era uma revelação inconteste de verdades eternas, mas uma busca individual; a ciência já não se estabelecia sobre a autoridade dos antigos, mas sobre a livre pesquisa; a política mudava sua base de uma noção de hierarquia emanada de Deus para se lançar na procura de um equilíbrio sempre provisório entre forças contrastantes; a História, como experiência já vivida, perdera seu valor determinante, o que contava então era a experiência de cada um no presente, e a arte deixava para trás os cânones abstratos e coletivos para mergulhar no mundo do julgamento individual, da investigação do próprio processo criativo e da materialidade da obra. Desta forma, os seus cerca de quarenta ou cinquenta últimos anos, a maior parte da carreira de Michelangelo, transcorreram nesse ambiente agitado, e seu estilo dessa fase deve ser caracterizado como maneirista, exibindo traços típicos desta escola que ele mesmo ajudou a fundar, quais sejam: uma marcada reação ao equilíbrio e harmonia do classicismo e à idealização da Alta Renascença, a distorção das proporções do corpo, uma tendência à estilização de feições, ao exagero e ao drama, o uso de uma paleta de cores pouco naturais, a anulação da perspectiva de ponto central com a criação de uma sensação de vários planos simultâneos, arbitrários e irracionais de espaço, e a preferência por formas espiraladas, contorcidas e bizarras, e por composições apinhadas de personagens. Michelangelo se distinguiu da estética renascentista abandonando a crença de que a Beleza é produzida por uma relação matemática de proporções entre as partes do todo, e confiava antes nos sentidos. Dizia que é mais necessário ter um compasso no olho do que nas mãos, pois as mãos produzem a obra, mas quem a julga é o olho. Não se sentia obrigado a seguir leis estéticas apriorísticas dizendo que o artista não devia ser guiado senão pela ideia que concebera, e considerava possível definir outras proporções igualmente aceitáveis e belas. Sua insistência na sua própria autonomia criativa e na expressão de sua visão pessoal o tornou o primeiro artista do ocidente a ter príncipes e papas a seus pés, decretando por si mesmo como a obra deveria ser realizada, ao contrário da prática anterior à sua geração, quando o artista era um simples artesão obediente à vontade de seus patronos. Isso era tanto um reconhecimento de sua própria capacidade como uma resposta à cultura da época que glorificava a fama pessoal. Compartilhava com os renascentistas e com seus outros contemporâneos o amor pela arte da Antiguidade, mas na sua época os modelos disponíveis eram em sua grande maioria produto do Helenismo ou da era romana, que não são propriamente idealistas e trabalham mais o lado dramático, dinâmico e emotivo da representação. Também foi estimulado nessa direção pela descoberta de uma importante obra helenista, o Grupo de Laocoonte, que causou uma sensação em toda a intelectualidade romana em sua exibição pública no Vaticano em 1508. Michelangelo: Escravo moribundo, 1513–1515. Museu do Louvre, Paris Apesar de sua inclinação para os modelos romanos e helenistas, Michelangelo aparece como um grande idealista, um herdeiro direto do universalismo da arte do Alto Classicismo grego. O artista não estava mais interessado na observação da natureza além do necessário para criar um protótipo de forma que ignorava o particular e era aplicável indiscriminadamente para todos os sujeitos. Nada em sua arte é específico além da forma geral do corpo humano, e o transformou em algo cuja potência vem causando admiração desde quando o plasmou em imagem. Na mesma tradição alto-clássica, procurou expressar as virtudes heróicas da alma através de corpos poderosos cuja beleza é apoteótica e ideal, e não humana, porém inevitavelmente filtrando o idealismo antigo através da sua eclética interpretação pelo Humanismo renascentista, onde o trágico e o patético também tinham um lugar. Como observou Weinberger, não representou a sua geração, mas uma geração de gigantes vivendo fora do tempo, e os edifícios que ergueu parecem ter-se destinado a esta raça. Mesmo suas obras pequenas têm uma feição monumental. Não caracterizou trajes ou fisionomias de sua época, não produziu retratos além de uns poucos desenhos, suas figuras não estão engajadas em atividades comuns, não aparecem utensílios do cotidiano, nem móveis, nem arquiteturas da época; não parecem afetadas pelas estações, pela paisagem em torno. Quando há alguma paisagem, é surpreendentemente desértica, é apenas um espaço convencional e abstrato onde distribuiu seus personagens sobre-humanos. Não teve outros alicerces para sua arte senão o corpo humano, o amor pela sua beleza e uma ideia de sublime magnificada ao extremo — certa vez buscando mármores em Carrara desejou transformar uma montanha inteira em uma estátua de um gigante.