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A primeira foi KLAXON. Gra camente a mais bela das revistas do


Modernismo, com seus tipos decorativos, sua numeração graúda e o
choque visual de suas capas e contracapas: o enorme “A” vertical
vertebralizando as palavras.

Espantosamente frágil, ingênua, amadorística. Um primeiro toque-


de-reunir modernista, no ambiente hostil da época, após a bravura da
Semana. Mas também um salve-se-quem-puder modernoso, onde a maior
parte naufraga em ondas subfuturistas ou pós-impressionistas – ressaca
internacional de arte moderna.

Os melhores poemas de KLAXON estão na quarta-capa: os anúncios


espaciais Coma Lacta, Guaraná Espumante e os criativos pseudo-anúncios
de Pantosopho, Panteromnium & Cia, proprietários da Grande Fábrica
Internacional de Sonetos, Madrigais, Baladas e Quadrinhas. Dentro, há os
poemas prometedores de Luis Aranha. Os de Mário de Andrade, ainda
incipientes, cheios de tiques, retóricos. De Oswald, nem há colaboração
poética. Um trecho de A Estrela de Absinto e algumas notas, “Escolas &
Idéias”, esboço ainda imaturo da linguagem dos manifestos posteriores. O
resto – que fazer? – era o resto. Guilherme. Menotti. Serge Milliet.
Colaboração internacional do 2.° ou 3.° time europeu: Nicolas Bauduin,
Guillermo de Torre, Antonio Ferro e uns franceses, belgas e italianos que
ninguém sabe mais quem são. Escassez de matéria-prima num terreno
movediço onde, entre outras ervas, até poema de Plínio Salgado dava.
Ruim, é claro.

Confusão teórica. O “Balanço de Fim de Século” de Rubens Borba de


Moraes (no n.° 4) mistura, numa mesma salada, cubistas, dadaístas,
futuristas, unanimistas, bolchevistas e espíritas. Critica impressionista (e
indulgente). De uma resenha de Mário sobre A Mulher que Pecou de
Menotti: “Mais um livro do nosso admirável colaborador. ( … ) o novo livro
fi
de Menotti del Picchia assim julgamos: Dos melhores da literatura
brasileira. ( … ) A gura de Nora é uma gura humana. Move-se como
poucas outras da cção nacional. ( … ) Como língua: virilidade, expressão,
beleza. Imagens luxuriantes. Repetições. Adjetivação sugestiva. Descrições
magní cas. Poesia. ( … ) Menotti del Picchia é um artista.”

Um modernismo mitigado, tolerante, não isento de compromissos


com a linguagem convencional e com os valores da tradição. “Sabe o que é
para nós ser futurista? É ser kláxico”, já ironizava Oswald. O manifesto do
1.° número prometia. Mas de que adiantava Mário de Andrade preferir
Perola White a Sarah Bernhardt, se ele continuava perdendo tempo com
Guiomar Novaes (“É meu dever explicar porque considero a senhorinha
Novaes uma pianista romântica.”)?

Claro que os nossos modernistas da primeira hora – considerado o


contexto desinformado e provinciano – podem ser olhados com maior
brandura. Mas se estou enfatizando, com crueza, aspectos negativos da
produção modernista no primeiro e signi cativo periódico dos moços da
Semana de 22, é exatamente para que se possa entender a posição crítica
que, em relação aos seus próprios companheiros, assumirão, mais adiante,
Oswald e os “antropófagos” mais radicais.
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