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A vida amorosa de Michelangelo

Michelangelo nunca se casou e hoje é praticamente um consenso que tenha sido


homossexual, a despeito da negação de seus primeiros biógrafos. Tem sido aventado que
o artista teve casos amorosos concretos com vários jovens, como Cecchino dei Bracci,
para quem desenhou o túmulo, e Giovanni da Pistoia, que conheceu enquanto trabalhava
no teto da Capela Sistina, e para quem escreveu alguns sonetos. Mas nenhuma prova
concludente se encontrou nessa direção, e é bastante possível que o próprio
Michelangelo, refreando seus sentimentos e necessidades, tenha fugido de uma
consumação carnal. Vários fatores podem ser considerados para tornar a hipótese
plausível. Em sua juventude em Florença ficara profundamente impressionado com a
pregação de renúncia ao mundo de Girolamo Savonarola, e expressou sua admiração por
ele ao longo de toda a vida. Em segundo lugar se considere a influência da visão
humanista-neoplatônica de sua época sobre o amor, outro elemento relevante em seu
universo pessoal, que falava do corpo como o cárcere terreno, e ainda que aceitasse o
amor entre homens e até o estimulasse, não aprovava o contato físico, lançando a
vivência do sentimento num plano espiritual. Além disso, a opinião pública sobre a
homossexualidade no século XVI era bastante negativa; em Florença os homossexuais
podiam ser castrados ou condenados à morte. O que transparece fortemente de suas
poesias é o perene conflito entre o impulso ao amor terreno e ao amor divino, que, como
ele mesmo disse, "o mantinha dividido em duas metades", e segundo Harmon, pelo que
se sabe sobre sua vida, não há como excluir nenhum dos opostos no estudo de sua
personalidade e de sua forma de amar. Ao mesmo tempo em que reiteradas vezes falou
do amor dirigido a pessoas como a força dinâmica que o capacitava à transcendência —
"o amor nos urge e desperta, dá penas às nossas asas, e a partir daquele primeiro
estágio, com o qual a alma não se satisfaz, ela pode voar e subir ao seu Criador" — em
outros momentos declarava seu desejo de intimidade física, querendo "abraçar meu tão
desejado, meu tão doce senhor, com meus braços indignos", ou imaginando ser um
bicho-da-seda para tecer uma túnica preciosa "envolvendo seu belo peito com prazer”.
Condivi registrou que "muitas vezes ouvi Michelangelo discursar a respeito do amor, mas
jamais o ouvi falar qualquer coisa diferente do amor platônico". Dizem Ryan e Ellis,
invocando mais outros autores, que a maioria dos historiadores modernos reconhece a
inclinação homoerótica de Michelangelo, mas a questão de se isso o levou a uma vida
sexualmente ativa permanece uma incógnita.

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