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Souza
PSICANÁLISE
INFORMAÇÕES BÁSICAS
SOBRE A
FORMAÇÃO E PROFISSÃO
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Dados Internacionais de Catalogação na Publicação
CIP – Brasil – Catalogação na Fonte
___________________________________________________________
Inclui índice
1. Psicologia 2. Educação. I. Souza, Amilton Messias II. Título.
CDD: 131
ISBN 978-85-68029-89-3
EDITORA KOINONIA
Rua Lindolfo de Azevedo, 1793 - Jd. América
Belo Horizonte - MG - CEP 30421-428
TEL: (31) 3657-5799
www.editorakoinonia.com.br
Conceituação
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O conceito de inconsciente fora usado por Leibniz 200 anos
antes de Freud, também sendo usado por Hegel para construir
sua dialética hegeliana.
A originalidade do conceito de Inconsciente introduzido por
Freud deve-se à proposição de uma realidade psíquica, caracte-
rística dos processos inconscientes. É preciso diferenciar incons-
ciente, sem consciência, de Inconsciente, conforme elaborado
por Freud, que diz respeito a uma instância psíquica basilar na
constituição da personalidade.
Muitos colocam a questão de como observar o Inconsciente.
Se a Freud se deve o mérito do termo “inconsciente”, pode-se
perguntar como foi possível a ele, Freud, ter tido acesso a seu
inconsciente para poder ter tido a oportunidade de verificar seu
mecanismo, já que não é justamente o inconsciente que dá as co-
ordenadas da ação do homem na sua vida diária. É nesse sentido
que Freud formulou a expressão Psicopatologia da vida cotidia-
na. Como observá-la senão pelos efeitos inconscientes?
A pergunta por uma causa ou origem pode ser respondida
com uma reflexão sobre a eficácia do inconsciente, eficácia que
se dá em um processo temporal que não é cronológico, mas lógi-
co. Não é possível abordar diretamente o Inconsciente, o conhe-
cemos somente por suas formações: atos falhos, sonhos, chistes
e sintomas.
Outro ponto a ser levado em conta sobre o inconsciente é
que ele introduz na dimensão da consciência uma opacidade. Isto
indica um modelo no qual a consciência aparece, não como insti-
tuidora de significatividade, mas sim como receptora de toda sig-
nificação desde o inconsciente. Pode-se perguntar: de que modo
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o inconsciente poderia estar informado sobre os progressos da
investigação psicanalítica a menos que fosse, precisamente, uma
consciência?
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lise, a importância da ética e o seu papel nos dias de hoje. Além de
articular a Psicanálise à ciência e à arte, traz à luz conceitos de dese-
jo, objeto, fantasia e outros. Um dos temas abordados pelo livro é
a dificuldade em se procurar um tratamento psicanalítico. Acredito
que isso se dê por conta da propagação errônea que se faz dela.
Em função disso antes de se chegar a um tratamento psicanalítico
o sujeito procura se haver com o vazio que sente se utilizando de
toda a sorte de terapias e consumos e se iludindo quando na reali-
dade esse vazio não pode ser extirpado, mas sim apenas vivenciado
e compreendido.
Muito cedo o homem compreendeu que a religião não seria
suficiente para suprir todas as necessidades do sujeito, haja vista
que somos sujeitos únicos e particulares. Se antes da religião o
homem era guiado pela razão então o seu norte passa a ser a
emoção. Passa-se a perceber o quanto as atitudes do homem são
carregadas de afeto. Essa mudança da visão de homem é que deu
margem ao surgimento da psicanálise. Ela veio ressaltar que o Eu
não é senão uma fachada do próprio sujeito que somos. O que
realmente somos escapa às possibilidades do Eu.
A psicanálise irá tratar a doença da qual os sintomas emer-
gem. Irá tornar claro de que modo o inconsciente opera sobre es-
ses sintomas e de que forma esse sintoma está inconscientemente
trazendo satisfação. O espaço em que a psicanálise irá atuar será
na maneira em que o sujeito se relaciona com esse sintoma.
Para que a análise surta efeito é preciso que haja comprometi-
mento do sujeito para com o tratamento, é preciso que esteja envol-
vido o “desejo” dele de compreender como ele opera sobre os sin-
tomas. Levando-se em conta que somos todos “sujeitos desejantes”
é preciso entender qual o desejo que nos move e o que nos censura.
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O desejo, na psicanálise, nos remete a uma falta, a percepção
de uma “coisa” que supostamente teria nos salvado do desampa-
ro. A essa “coisa” Lacan deu o nome de “objeto a”. Na verdade
essa coisa nunca existiu, mas serve como um objetivo que perse-
guimos com a “fantasia” de que nos tornaríamos seres completos
caso a encontrássemos. Na tentativa de suprir essa falta de “um
objeto” o sujeito, que é sujeito do desejo puro, desliza de objeto
em objeto, de roupa em roupa, de disco em disco, de doce em
doce, de significante em significante...
Na análise o sujeito irá se constituir através da confrontação
com os seus limites. E, uma das confrontações decisivas para
essa delimitação de sujeito é a lei da castração. Então, nesse caso,
a função da análise não é de aconselhamento ou avaliações e sim
a do encontro desse sujeito com o real, o acolhimento e a com-
preensão da sua imperfeição, já que as visões opostas de mundo
como o bem e o mal, o bonito e o feio, o sagrado e o profano,
são uma constante afirmação da vida.
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A segunda delas é através do caminho oposto: Você está en-
frentando problemas emocionais, fobias, dificuldade de relacio-
namentos, ansiedades, outras neuroses, etc, etc. Então, você pro-
cura um psicanalista e começa um trabalho de análise que pode
levar desde vários a muitos anos.
Durante esse tempo todo, você é como que “desprograma-
do” de suas vivências infantis inadequadas e “reprogramado”
com uma nova visão, mais abrangente da vida e sobre você mes-
mo. Neste caso, você não precisa mais de uma “análise didáti-
ca”, uma vez que fez uma análise para valer e, a essa altura do
campeonato, sabe tanto quanto o seu analista, a chamada técnica
psicanalítica.
E DEPOIS?
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Psicanálise I (em nível básico)
Psicanálise II (em nível avançado)
Psicanálise III ( em nível profundo)
Psiquiatria
Psicopatologia
Psicofarmacologia
Neurofisiologia
Interpretação de Sonhos
Hipnoterapia
Sexologia
Não é fácil ser um psicanalista. É preciso muito estudo, muita
dedicação, persistência e um forte desejo, que em Psicanálise, é
conhecido como “desejo de psicanalista”.
Quem é o Psicanalista?
É um profissional que pratica a Psicanálise em consultórios,
clínicas, empregando metodologia exclusiva ao bom exercício da
profissão, quais sejam, as técnicas e meios eficazes da psicanálise
no tratamento das psiconeuroses. Para atingir plenamente seus
objetivos, o psicanalista deve ser uma pessoa com sólida for-
mação humanitária, visto que a profissão requer uma acentuada
cumplicidade entre analista e seu paciente.
Ministério do Trabalho - Os psicanalistas têm sua profissão
classificada na CBO (Classificação Brasileira de Ocupações) no
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Ministério do Trabalho - Portaria nº 397/TEM de 09/10/2002,
sob o nº 2515.50, podendo exercer sua profissão em todo o Ter-
ritório Nacional.
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No ambiente do Consultório Psicanalítico Freudiano deve
existir o “Divã” que para o Psicanalista Freudiano representa o
“Altar Sagrado da Psiquê da Alma ou do Inconsciente Humano”.
É no Divã que o individuo se torna “sujeito” da sua própria
história e vida, é sujeito falante de sua história e através da sua
fala, suas queixas e vai revelando a si o seu inconsciente pela as-
sociação livre de ídéias momento quando inicia sua travessia do
sintoma pela fala.
A psicanálise atua no tratamento ou na prevenção de distúr-
bios psíquicos de natureza “abstrata” “inorgânica” do mundo do
“inconsciente” na análise utiliza-se da associação livre de idéias e
também interpretação de sonhos segundo a ciência psicanalítica.
A psicanálise leva o “analisado” ao melhor “Conhecimento
de Si Mesmo” através da técnica freudiana da “Associação livre
de Idéias” com expressão da palavra, com libertação da fala, a
expressão do conteúdo intrapsíquico do “Inconsciente” vai gra-
dativamente promover equilibrio e qualidade de vida psíquica,
segundo a ciência psicanalítica.
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2º) Perturbações sexuais: masoquismo, sadismo, questões se-
xuais, impotência, insatisfação sexual, inibição, frigidez e outras
de causas (inorgânicas).
3º) Perturbações psicossomáticas de origem psíquica: gaguei-
ra, tiques, enurese, enxaquecas, algias, asma, dispepsias, paralisias
e diversas moléstias de pele, como eczemas e similares.
4º) Determinadas psicoses de ordem funcional, i. e., não pro-
vocadas por consumo ou dependência química, lesões cerebrais
por acidentes, motivos genéticos ou orgânicos, mas por conflitos
intrapsíquicos ou traumas no incosnciente.
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dades em geral. Desta forma compreende-se que a psicanálise
é uma atividade autônoma e independente, sendo praticada por
diversas profissionais interessados nos conhecimentos deste mé-
todo terapêutico.
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Sociedade. No entanto, há sociedades que não emitem sequer
uma comprovação de conclusão de curso. Nossa Escola cumpre
a risca essa necessidade.
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“um médico pode ser tão ignorante em matéria de psicanálise
quanto um leigo em medicina”, assim sendo, um médico pode
ser também Psicanalista; um Psicólogo pode ser também Psica-
nalista; um Pedagogo pode ser também Psicanalista etc, mas um
Psicanalista não precisa ser nada além de Psicanalista para poder
exercer a Psicanálise.
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da profissão, o psicanalista não está isento de reparar (indenizar)
os danos decorrentes do mau exercício de sua atividade.
É a psicanálise uma atividade profissional livre, que pode ser
exercida por qualquer cidadão, ou consiste em profissão regula-
mentada?
A psicanálise é uma profissão livre, que pode ser exercida por
qualquer cidadão, desde que esta possua conhecimentos técnicos
ou habilitação profissional suficientes ao seu desempenho.
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Existe um Conselho Federal de Psicanálise, bem como
Conselhos Regionais, a exemplo do Conselho Federal de
Medicina e do Conselho Federal de Psicologia?
Não, pois a atividade de psicanálise não é regulamentada por
lei, logo inexistentes os órgãos incumbidos de seu controle e fis-
calização. Os Conselhos Federais e Regionais, como o de Medi-
cina ou de Psicologia, são autarquias públicas federais, órgãos da
administração pública indireta da união. possuem poder de polí-
cia e agem em nome do interesse público. sua esfera de atuação
emana da vontade estatal e seus atos decorrem do poder de im-
pério que administração pública possui e impõe à toda sociedade.
Os atos praticados por tais entidades são unilaterais, imperativos,
e coercitivos, além de gozarem da presunção de legitimidade, tais
quais os demais atos perpetrados pela administração pública.
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pações e suas atribuições e não profissões em si (uma ocupação
passa a ser profissão quando é regulamentada e legalizada em
nível federal e estadual).
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as pessoas que estão realmente interessadas em fazer um trata-
mento psíquico. Só que esse hábito muitas vezes exclui alguns pa-
cientes que precisam saber primeiro o preço e depois escolhem
se vão ou não.
Quando se escolhe um analista pelo preço, escolhe-se muito
mal. Até porque o que produz uma análise é a transferência do
paciente para com seu analista e isso não é determinado pelo
preço as sessões. Transferência foi um termo criado por Freud
para significar a relação terapêutica, uma relação que não está
sustentada por sentimentos que se tem pelo analista, mas sim por
desejos infantis e inconscientes do analisante que são dirigidos
ao analista.
Será que o “preço” que a pessoa paga por carregar o seu so-
frimento não é muito maior do que o preço da sessão? Sigmund
Freud já dizia que a estupidez e a neurose são muito mais caro
do que o tratamento. Há quem prefira passar a vida inteira com
o seu sintoma, sofrimento do que gastar para melhorar, prefere -
se gastar comprando mais e mais objetos de satisfação imediata
e momentânea e quando a sessão do analista essa é muito cara.
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Como funciona uma análise?
A psicanálise é uma outra possibilidade de olhar o ser huma-
no.
Um homem, uma mulher, são seres que podem ser vistos
e pensados sob vários prismas: orgânico, psicológico, espiritual,
antropológico, social, psicanalítico...
Como a psicanálise trata, ajuda, cura e entende o sujeito? É
importante destacar que a vivência de uma análise é algo singu-
lar, ou seja, cada sujeito experimenta e encontra uma parte de si
“desconhecida”. Nesse sentido, não há como definir o que é uma
análise e sim o que a psicanálise privilegia, cavoca, trata e nos
transmite. podemos falar do que é a psicanálise.
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fato, não sabemos do outro, não tiramos sofrimento de ninguém.
Apenas ajudamos. Mas como? Como a psicanálise ajuda então?
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Mas, que amor é esse? Jacques Lacan, psicanalista francês, coloca:
“Amar, é dar o que não se tem”. Ou seja, amar, é dar a falta. Co-
meçamos a entrar no terreno de como a psicanálise Presupõe o
ser humano.
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idéia é que, o modo como nos relacionamos com nosso desejo,
diz muito das nossas possibilidades de vida e de sofrimento.
Vejamos exemplos destas possibilidades:
- As depressões, podem ser uma saída covarde perante o de-
sejo.
- O pânico/angústia pode encobrir a fixidez de cenas traumá-
ticas ou desvelar a desproteção do desamparo fundamental ou....
- A angústia pode paralisar o sujeito, deixá-lo ansioso, per-
dido, irresponsável por seu desejo. Pode também fazer o sujeito
produzir e avançar em sua análise.
- Uma mãe colada em seu filho, pode desencadear uma crise
existencial ou surtos na medida em que o filho se separa dela e
vai para o mundo. Nesse sentido, a criança tamponava seu desejo.
Como ilusóriamente não havia falta (já que filho e mãe se com-
pletavam), não havia desejo.
Exemplo de sofrimentos e sintomas não faltam, porém, cada
um sabe bem aonde o calo aperta.
Nem todos precisam de uma análise. Somente aqueles que
sofrem, se angustiam, deliram, surtam. Mesmo que não tenham
questões, uma análise pode servir para a construção de um cara-
ter forte.
No Brasil, o exercício da psicanálise se dá de acordo com o
artigo 5º, inciso II e XIII da Constituição Federal. Acrescenta-se
ainda: o parecer do Conselho Federal de medicina, processo Con-
sulta 4.048/97 de 11/02/1998, o parecer 309/88 da Coordena-
doria de Identificação Profissional do ministério Público Federal
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e da procuradoria da República, do Distrito Federal e Aviso nº:
257/57 de 06/06/1957, do Ministério da Saúde, este último como
marco histórico da psicanálise no Brasil. Os cursos de formação,
Especialização ou Pós-graduação em psicanálise são Cursos Livres
oferecidos por instituições Psicanalíticas. Não se enquadram como
Graduação ou Pós-Graduação Lato Sensu. A formação em Psica-
nálise é de caráter Livre no Brasil, porém, é reconhecido e ampa-
rado pela Portaria 397 de 09/10/2002 do Ministério do trabalho
e Emprego-CBO(Código Brasileiro de Ocupações) nº: 2515-50 e
Aviso 257/57 do Ministério da Saúde; Decreto Federal 2208 de
17/04/97, Portaria 397 do Ministério do Trabalho.
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A PRÁTICA DA PSICANÁLISE COMO PROFISSÃO LIVRE E SUA
FORMAÇÃO NO BRASIL
A Constituição Federal, em seu art. 153, § 23, dispõe: “É livre
o exercício de qualquer trabalho, ofício ou profissão, observadas
as condições de capacidade que a lei estabelecer.”.
Liberdade de Trabalho:
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Dr. Francisco Bruno Neto São Paulo, SP Advogado, Profes-
sor Universitário, Assessor Parlamentar.
Lei da associação
Psicanalista:
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O uso de doutor como título acadêmico, no entanto, come-
çou nas universidades medievais (Bolonha, Salamanca, Oxford,
Cambridge, Sorbonne, Coimbra, Upsala) para designar os que
tinham conquistado a autorização para lecionar. Esse direito se
limitava, primeiro, à sua própria universidade, mas foi estendido,
mais tarde, a qualquer outra (com as indefectíveis rivalidades e
picuinhas que duram até hoje). Primeiro houve os doutores em
Direito (“doctores legum”), depois em Direito Canônico (“doc-
tores decretorum”) e, já no séc. XIII, em Medicina, Gramática,
Lógica e Filosofia. No séc. XV, Oxford e Cambridge começaram
a conferir também o doutorado em Música.
Os antigos doutorados em Direito e Medicina certamente
explicam o uso popular, tanto no Brasil como em Portugal, do
tratamento de doutor para os médicos e advogados. Outro res-
quício medieval é o título de Doutor “Honoris Causa” (“por mo-
tivo honorífico”), concedido a qualquer personalidade que uma
determinada Instituição, que queira homenagear, tenha ou não
formação acadêmica.
Independentemente do sentido acadêmico (que implica a de-
fesa de uma tese de doutoramento), uma indiscutível aura de res-
peito e deferência cerca o vocábulo doutor, como podemos ver
nos reflexos que deixa no vocábulo douto, que indica o erudito, o
sábio, o profundo especialista em determinada área.
Por outro lado, o pedantismo e a atitude aristocrática de al-
guns doutores explicam também por que chamamos de “tom
doutoral” aquele tom sentencioso, muitas vezes pedante, de
quem pensa que está dando lições de sabedoria.
Portanto, quando me dirijo a um médico ou a um advogado,
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não posso dizer “O que o senhor pensa disso, médico Fulano?”,
ou “Gostaríamos que participasse das negociações, advogado
Beltrano”. Nestes casos, o vocábulo doutor, usado mais como
forma de tratamento, passa a ter um valor inestimável.
Autor: Dr.Cláudio Moreno – Advogado
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Sendo assim, é uma profissão livre, reconhecida pelo Minis-
tério do Trabalho e Emprego (CBO - código 2515.50), amparada
pelo Decreto nº. 2.208 de 17/04/1997, que estabelecem Diretri-
zes e Bases da Educação Nacional e pela Constituição Federal
nos artigos 5º incisos II e XIII.
Comentário Jurídico:
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Formação:
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Todas as pessoas que não possuam lesões orgânicas mentais
graves; podem ser analisáveis desde que possam verbalizar e fa-
zer sua livre associação de idéias livre e que estejam isentas de
delírios e surtos psicóticos graves.
Psicanálise trata das neuroses e conflitos psíquicos humanos
e não de lesões cerebrais ou mentais objeto da neurologia e psi-
quiatria médica.
Psicanálise só é Contra-indicada para quem não que conhe-
cer a si mesmo, ou não quer mudar nada.
Psicanálise só não é indicada para quem não quer mudar
nada, e nem conhecer nada a respeito dos seus conteúdos do
inconsciente.
Fazer análise psicanalítica é ter coragem para fazer uma tra-
vessia de ida e volta ao nosso céu ou inferno sem querer aqui dar
uma conotação religiosa ao termo, Psicanalisar-se é descobrir-se
a si mesmo.
Fazer análise nos ensina como melhor lidar com as neuroses
e aflições humanas.
A psicanálise pode ser uma via verdadeira de libertação do
humano no mais humano que pode residir dentro de cada um
de nós. Já disse uma colega que o trabalho da cura psicanalítica
consiste em tornar possível o advento da palavra no lugar do sin-
toma, o ser humano fisicamente é um mamífero e psiquicamente,
é um ser de filiação lingüística e portando de adoção.
O psicanalista trabalha com o ouvir, sem julgo, críticas, castigos
ou punições severas, sejam elas culturais, religiosas, familiares que
morem no inconsciente humano ou faça parte do seu cotidiano.
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O psicanalista é o maior de todos os ouvidos do inconsciente
humano, ele ouve o que ninguém mais quase sabe ou aprendeu
a ouvir ele vê o que somos ensinados a não ver; por questões de
formação familiar, cultural, religiosa e nossa convicção de vida.
A máxima freudiana é a associação livre de idéias; mas a in-
terpretação dos sonhos durante o transcorrer das sessões é muito
importante e é nisso que o analisado vai elaborando com seu
Psicanalista uma travessia de confiança e libertação das suas neu-
roses e aflições humanas conhecidas e desconhecidas.
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3ª) As presentes normas comunicadas para os devidos fins ao
Serviço Nacional de Fiscalização da Medicina regularão o assun-
to até que lei especial estatua a respeito.”
Muito embora o Sr. Ministro não tivesse competência cons-
titucional para dispor sobre o exercício da profissão, visto que só
a lei pode estatuir sobre a matéria, o aludido aviso constituiu um
marco importante na história da Psicanálise em nosso País.
Primeiro, porque reconheceu que a profissão do médico não
abrange a do psicanalista.
Segundo, porque admitiu que a Psicanálise pode ser exercida
por elementos não diplomados em medicina, desde que possuam
formação psicanalítica.
Em contrapartida, tal aviso merece a crítica de ter condicio-
nado o exercício da profissão, no Brasil, à formação psicanalítica
reconhecida pela Associação Psicanalítica Internacional - uma
entidade estrangeira, de direito privado e, portanto, sem nenhu-
ma eficácia legal em nosso País.
Comentário: Aceitar a subordinação do exercício profissio-
nal a uma entidade estrangeira é não só uma irregularidade cons-
titucional, como um atentado à soberania nacional e a liberdade
de trabalho.
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Parecer CFM
EMENTA:
Psicanálise. A atividade exclusiva de psicanálise não caracte-
riza exercício da medicina. A titulação médico-psicanalista não
tem amparo legal, não sendo portanto permitido a sua utilização.
O consulante solicita resposta oficial deste Egrégio Conselho
Federal de Medicina acerca da atividade de psicanalista, pontuan-
do questões das quais adianta saber as respostas, mas as deseja
receber de forma oficial.
O interessado anexa informações objetivas e clara a respeito
de assunto, fazendo-nos entender que domina ampla e profunda-
mente a matéria para a qual, no entanto, solicita a nossa posição.
A parte o interessa não revelado do consulante pelo pronun-
ciamento deste Conselho, passamos a manifestar o nosso enten-
dimento sobre a atividade psicanalítica.
CONSULTA - A atividade de psicanalista é exclusiva de mé-
dico ou psicólogos? Não ou sim e porquê?
Resposta:
Não. A atividade psicanalítica é independente de cursos re-
gulares acadêmicos, sendo os seus profissionais formados pelas
sociedades psicanalíticas e analistas didatas. Apesar de manter in-
terfaces com várias profissões pela utilização de conhecimento
científico e filosófico comuns a diversas áreas do conhecimento,
não se limita a especialidades de nenhum delas, constituindo-se
em uma atividade autônoma e independente.
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- Existem Conselhos (Federais ou Regionais de psicanálise)
Não ou sim e por quê?
Resposta:
Não. Os Conselhos são autarquias federais criadas por lei,
com as atribuições de supervisionar eticamente, disciplinar e
julgar os atos inerentes e exclusivos das profissões liberais de
formação acadêmica reconhecida oficialmente no país; estando
a atividade psicanalítica à parte desta conceituação. Não se lhe
aplica a vinculação a Conselhos.
- Um médico ou um psicólogo que também seja psicanalista
está exercendo a medicina ou a psicologia ao atuar exclusivamen-
te como psicanalista? Não ou sim e por quê?
Resposta:
Não. Não sendo a psicanálise reconhecida como especialida-
de médica e não utilizando a sua prática atos médicos são cabí-
veis a sua caracterização como exercício da medicina e, tampou-
co, pode o médico intitular-se médicopsicanalista.
Este é o parecer, S.M.J
Brasília, 16 de novembro de 1997
Rubens dos Santos Silva
Cons. Relator.
Parecer aprovado: Sessão Plenária 11/02/97
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Comentário:
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CÂMARA FEDERAL DOS DEPUTADOS –
BRASÍLIA-DF
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O deputado Fernando Coruja (PPS-SC) é autor de projeto
de lei (2686/07) que busca disciplinar a regulamentação de pro-
fissões.
Ele argumenta que a Constituição já garante o livre exercício
das atividades profissionais lícitas.
Segundo Coruja, a regulamentação de uma profissão deve
levar em conta somente o interesse público.
“Não se pode regulamentar apenas para proteger o grupo
que exerce a profissão”.
Imagine se regulamentassem a atividade de pediatra, e só esse
especialista pudesse atender crianças.
Haveria um prejuízo enorme para a população porque, como
não tem pediatra para atender todo mundo, a regulamentação
prejudicaria a própria população.
Por isso, é preciso disciplinar essa regulamentação de profis-
sões.”
Legislação específica
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O especialista acrescenta que o mais importante é que todos
os trabalhadores tenham a mesma proteção. “A lei só terá sentido
se aquela profissão tiver realmente um caráter muito específico”,
afirma.
Autor: Agência Câmara
Conclusão Preliminar
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A psicanálise portanto é um processo de “re-construção” de
nós mesmos, escolhendo caminhos que muitas vezes estavam fe-
chados, e com isso abrindo caminho para a mudança de nosso
futuro.
É importante entender e frisar que como toda terapia da fala,
o desejo do paciente pela mudança é a força motora do processo,
e que sem esse nada pode acontecer.
A psicanálise numa única frase é a investigação do incons-
ciente.
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A formação do psicanalista se assenta naquilo que Freud cha-
mou de “tripé da psicanálise”: o psicanalista precisa ter um sólido
conhecimento teórico, estar em constante análise pessoal e su-
pervisão de seus casos clínicos.
A formação de um psicanalista é continuada e pode deman-
dar muitos anos de dedicação, de análise pessoal, até algum tem-
po atrás geralmente demandava mais de cinco anos de análise
pessoal devido ao domínio de algumas instituições.
É importante a constante supervisão. Assim a Psicanálise é
uma formação que jamais está completa: quanto mais experiente
for o psicanalista, mais ele sabe da importância de manter-se fir-
me no “tripé psicanalítico”.
Outras escolas psicanalíticas surgiram do berço freudiano, al-
gumas acrescentando, outras alterando, mas nenhuma rompendo
com a obra de Freud.
Mas esse fato não se dá por uma idolatria a obra de Freud,
mas por sua qualidade, que atravessa o tempo e até hoje, concei-
tos como inconsciente são utilizados, ainda que com variações,
são à base da psicanálise.
Esse, aliás, é um dos critérios para se diferenciar se uma tera-
pia é ou não psicanálise - se a terapia tem suas bases na obra de
Freud.
As principais contribuições que seguiram a Freud foram fei-
tas pelas seguintes escolas:
Melanie Klein - a partir de seus estudos com crianças, Klein
fundamentou a psicanálise infantil, que até hoje permanece a
mesma, com pequenas contribuições de outros autores. Klein
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também contribuiu para o melhor entendimento do psiquismo
de recém nascidos, ampliando o campo de atuação da psicanálise,
permitindo o tratamento de psicóticos.
D. Winnicot - a partir de seus trabalhos em pediatria, Win-
nicot contribuiu para aprofundamento do entendimento sobre o
psiquismo da criança, em especial a importância que o ambiente
e seus processos de maturação nesse desenvolvimento.
Lacan - Importantes contribuições foram feitas por esse psi-
canalista, que a partir de uma releitura da obra de Freud, aliada a
uma instigante mistura com
Hegel e Heidegger, reformulou muitos dos fundamentos
do mestre, como por exemplo, a constituição como uma estru-
tura de linguagem. O seu trabalho aprofundou o entendimento e
o tratamento da mente psicótica. Existem vários outros autores
que contribuíram de forma tanto quanto significativa como por
exemplo W. Bion, M. Mahler entre outros.
O Psicanalista:
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dúvidas persistentes, abulias, fobias, obsessões, neurastenias, de-
pressões, neuroses de fracasso, etc.
(2º.) Perturbações sexuais: masoquismo, sadismo, homos-
sexualismo, impotência, insatisfação sexual, inibição, frigidez e
outras.
(3º.) Perturbações somáticas de origem psíquica: gagueira,
enurese, enxaquecas, asma, dispepsias, paralisias e diversas mo-
léstias de pele, como eczemas e similares.
(4º .) Determinadas psicoses de ordem funcional, i.e., não
provocadas por motivos orgânicos, mas por um conflito intrap-
síquico.
PSICANÁLISE
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2) Uma psicoterapia baseada nesse método. É a chamada
talking cure, porque o tratamento se desenvolve no plano dialé-
tico-interpretativo, visando à reeducação afetiva do paciente por
intermédio da conscientização dos motivos que determinaram os
sintomas neuróticos.
3) Um conjunto de teorias e normas em que são sistematiza-
dos os dados introduzidos pelo método psicanalítico. Tais teorias
têm valiosa aplicação na pedagogia, na religião, nas artes, no di-
reito e na criminologia, na higiene mental e na própria filosofia.
Conclusões:
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- como no Brasil ocorre com algumas profissões - ou ser passível
de uma espécie de “regulamentação ética” a cargo de entidades
profissionais.
No Brasil, não há legislação a respeito do exercício da Psi-
canálise. Antes mesmo de se estabelecer regras legais torna-se
necessário resolver uma questão prévia: é uma profissão ou uma
especialidade de profissão já regulamentada?
A ninguém ocorre “regulamentar” as profissões do psiquia-
tra, ginecologista ou ortopedista ou as de psicólogo clínico, psi-
cólogo do trabalho ou psicólogo escolar pois é amplamente sabi-
do que tais áreas de conhecimento e prática assistencial não são
profissões, mas sim especialidades de uma atividade profissional,
a Medicina ou a Psicologia, estas sim regulamentadas.
Os Conselhos Federais de Medicina e de Psicologia baixaram
resoluções em que são listadas especialidade por eles reconheci-
das, listas estas que são periodicamente revistas conforme a evo-
lução técnico-científica.
São três os caminhos que se delineiam de acordo com este
pensamento:
1. Não regulamentar e deixar que cada um se intitule psica-
nalista conforme seus próprios critérios de formação. É o que
ocorre com muitas profissões, para as quais não há curso supe-
rior ou mesmo técnico.
2. Regulamentar a profissão de psicanalista estabelecendo cri-
térios e parâmetros para sua formação, bem como estatuindo as
normas de seu exercício.
3. Os Conselhos Federais de Medicina e de Psicologia inclu-
írem a Psicanálise nas respectivas listas de especialidades. Outros
- 53 -
conselhos profissionais poderiam também adotar esta medida,
como, por exemplo, o Conselho Federal de Assistentes Sociais.
Duas questões devem ficar bem esclarecidas: o que se regula-
menta, seja profissão ou especialidade, é o exercício assistencial,
o atendimento pessoal em Psicanálise, a Psicanálise Clínica. No
caso de regulamentação de especialidade por conselho profissio-
nal, seria inevitável o confronto jurídico, eis que os conselhos não
elaboram leis ou decretos de obrigação geral.
- 54 -
Como antes fora dito, não existe diploma legal, no Brasil, que
discipline o ensino e o exercício da Psicanálise. Porém a Psicaná-
lise não é ilegal e nem entanto Proibida. O único ato normativo
baixado até hoje é o Aviso Ministerial* n° 257, de 06/06/97,
do Ministério da Saúde, que especificou algumas normas sobre a
matéria. * (Mas sem poder Jurídico)
Assim: admite a existência de psicanalistas (não médicos),
mas exige uma formação psicanalítica reconhecida pela Associa-
ção Psicanalítica Internacional; as instituições psicanalíticas de-
veriam ser credenciadas pela Associação Psicanalítica Internacio-
nal; os clientes destes psicanalistas deveriam ter indicação escrita
de um médico que por eles ficaria responsável.
Este documento está eivado de irregularidades e imprecisões
legais, a saber: ( Aviso Ministerial * n° 257. *)
1. Um ato ministerial não tem competência constitucional
pata dispor sobre o exercício de profissão.
2. Subordina instituições brasileiras e uma formação profis-
sional a ser exercida em território nacional a uma entidade estran-
geira de direito privado e, portanto, sem nenhuma eficácia legal e
constitucional no Brasil.
3. Não diz em que consiste esta formação psicanalítica.
4. Subordina tais profissionais aos médicos mas não especi-
fica como isto se dará e como os médicos poderão ser responsá-
veis por pacientes que não serão seus.
- 56 -
(Cópia) do Aviso Ministerial n. 257 – 1957
* MINISTÉRIO DA SAÚDE
Brasília-DF, 06 de junho de 1957.
Baixado pelo então Ministro da Saúde, Maurício de Medei-
ros, tal aviso especificou as seguintes normas:
“1º) É lícito a centros de estudos, bem como a qualquer ins-
tituto ou centro igualmente credenciado pela Associação Psi-
canalítica Internacional contratar os serviços especializados de
psicanalistas leigos, cuja formação psicanalítica tenha sido reco-
nhecida pela Associação.
2º) Esses psicanalistas leigos poderão exercer suas especiali-
dades em todas as suas aplicações , dentro ou fora do instituto
que os contrate, desde que os clientes que se ocupam lhes sejam
enviados por indicação escrita de médico diplomado sob cuja
responsabilidade ficarão.
3º) As presentes normas comunicadas para os devidos fins
ao Serviço Nacional de Fiscalização da Medicina regularão o as-
sunto até que lei especial estatua a respeito”.
Muito embora o Sr. Ministro não tivesse competência cons-
titucional para dispor sobre o exercício da profissão, visto que só
a lei pode estatuir sobre a matéria, o aludido aviso constituiu um
marco importante na história da psicanálise em nosso país. Pri-
meiro, porque reconheceu que a profissão do médico não abran-
ge a do psicanalista. Segundo, porque admitiu que a psicanálise
pode ser exercida por elementos não diplomados em medicina,
desde que possuam formação psicanalítica.
- 57 -
Em contrapartida, tal aviso merece a crítica de ter con-
dicionado o exercício da profissão, no Brasil, a formação psica-
nalítica reconhecida pela Associação Psicanalítica Internacional
- uma entidade estrangeira, de direito privado e, portanto, sem
nenhuma eficácia legal em nosso país. Até porque, aceitar a su-
bordinação do exercício profissional a uma entidade estrangeira
é não só uma irregularidade, como um atentado à soberania na-
cional... Melhor teria feito o Sr. Ministro se tivesse especificado
normas para o funcionamento de um curso de psicanálise.
- 58 -
CBO 2515-50
Psicanalista
Sinônimos do CBO
Descrição Sumária
- 59 -
cação; diagnosticam e avaliam distúrbios emocionais e mentais
e deadaptação social, elucidando conflitos e questões e acom-
panhando o(s) paciente(s)durante o processo de tratamento ou
cura; investigam os fatores inconscientes docomportamento
individual e grupal, tornando-os conscientes; desenvolvem pes-
quisasexperimentais, teóricas e clínicas e coordenam equipes e
atividades de área e afins.
Formação e Experiência
- 60 -
pervisão. têm como localde trabalho ambientes fechados ou, no
caso dos neuropsicólogos e psicólogos jurídicos,pode ser a céu
aberto. os psicólogos clínicos, sociais e os psicanalistas, eventu-
almente.
Fonte: mtecbo.gov.br
- 62 -
em todo o território nacional”. Em outras palavras, A SPOB há
muitos anos vem pleiteando o direito de ser a ÚNICA instituição
autorizada a ministrar a psicanalise no Brasil. As suas conferên-
cias e a formação psicanalítica tem dado lugar a muitos debates,
discussões e preocupações há muitos anos.
Feitos estes esclarecimentos acima, quero agora tecer minha
veemente crítica e contestação não à decisão do desembargador
federal Luciano Tolentino Amaral, do TRF da 1.ª Região, mas à
sua fala, quando ele afirma que a psicanálise “... é uma especiali-
dade da área da psicologia”, e continua afirmando “... conforme
prevê a Lei nº 4.119/62”. São estas declarações do desembarga-
dor que quero aqui contestar e criticar veementemente. E pos-
so faze-lo ex-cátedra, pois, sou psicanalista desde 1984, exerço a
Psicanálise na clínica diuturnamente desde a mesma época, sou
pesquisador da Psicanálise e professor de Psicanálise em cursos
de formação, de graduações e de pós-graduações em diversas
instituições. Como se pode ver, conheço a ciência-arte de Freud
profundamente.
Sempre que necessitamos discutir uma determinada questão,
seja ela qual for, e, sobretudo, quando temos de afirmar um po-
sicionamento sobre essa questão, é imprescindível que tenhamos
conhecimento de causa sobre isso. E ter conhecimento de causa
é ter ciência da história e dos princípios das coisas e das causas,
conforme ensina a metafísica de Aristóteles. E não foi isto que
restou demonstrado nas infelizes declarações do senhor desem-
bargador.
Data vênia, sua excelência demonstrou profunda ignorância
sobre a história da Psicanálise e, associado a isto, demonstrou
também enorme incompetência no que tange à prática da her-
- 63 -
menêutica jurídica, pois, a sua interpretação da Lei nº 4.119/62
foi infeliz e engenhosa, constituiu, aliás, uma afronta à própria lei.
Li detidamente a referida Lei, que regulamentou a profissão
de psicólogo e não encontrei no seu texto parte alguma definindo
a psicanálise como uma especialidade ou função da psicologia.
De igual modo, também li a Lei nº5.766/71, que criou o Conse-
lho Federal e os Conselhos Regionais de Psicologia e definiu as
funções de normatização e de regulação da atividade profissio-
nal destes conselhos, e esta lei, por seu turno, também não faz
qualquer menção à psicanálise como sendo uma especialidade ou
campo da psicologia.
Mas, afinal o que diz essa lei? A Lei nº 4.119/62, dispõe sobre
os cursos de formação em Psicologia e regulamenta a profissão
de Psicólogo, e no seu Art. 13 define as competências dos forma-
dos e suas funções privativas, conforme vemos a seguir:
Art. 13 - Ao portador do diploma de psicólogo é conferido
o direito de ensinar Psicologia nos vários cursos de que trata esta
lei, observadas as exigências legais específicas, e a exercer a pro-
fissão de Psicólogo.
§ 1º- Constitui função privativa do Psicólogo a utilização de
métodos e técnicas psicológicas com os seguintes objetivos:
a) diagnóstico psicológico;
b) orientação e seleção profissional;
c) orientação psicopedagógica;
d) solução de problemas de ajustamento.
§ 2º- É da competência do Psicólogo a colaboração em as-
suntos psicológicos ligados a outras ciências.
- 64 -
Como podemos ver, as declarações do desembargador em
pauta não encontram fulcro ou apoio na lei que ele citou no pro-
cesso por ele relatado, que resultou na sentença exarada pela 7ª
Turma do TRF, contra aquela instituição apelante, divulgada pela
internet. Aquela sociedade psicanalítica objeto da sentença, por
suas condutas absurdas, antiéticas e criminosas, mereceu ser ba-
nida do cenário psicanalítico brasileiro. Agora dizer que a psica-
nálise é uma especialidade da área da psicologia é revelar total e
absurda ignorância acerca da história da ciência de Freud, é fazer
uma exegese cega e imprudente da lei, somente interessante a
algumas instituições nacionais e outras internacionais imbuídas
de intensões feudais e monopolizadoras sobre a psicanálise, cujas
instituições causariam grande decepção ao pai da Psicanálise, se
fosse vivo hoje.
Considero ser oportuno lembrar aqui que Freud, o criador e
pai da Psicanálise, era médico, mas ele não condicionou a Psica-
nálise somente privativa de médicos ou de psicólogos. Se tivesse
que ser assim, Anna Freud não teria sido aceita como membro
da Sociedade Psicanalítica de Viena em 1922, e eleita diretora do
Instituto Psicanalítica daquela Sociedade em 1925. Anna Freud
não era médica nem psicóloga. Em 1927, Melanie Klein foi acei-
ta como membro da Sociedade Britânica de Psicanálise. Melanie
Klein não era médica nem psicóloga. Contudo, Anna Freud e
Melanie Klein se tornaram figuras expoentes da Psicanálise em
razão de suas teorias e estudos na área de Psicanálise Infantil,
cujos estudos e teorias constituem importantíssimas referencias
até hoje. Portanto, a Psicanálise nasceu para ser uma profissão
livre e laica, e não para ser feudo ou monopólio de ninguém nem
de conselho algum. E, se algum dia isso vier acontecer, a partir
daí a Psicanálise poderá ser qualquer coisa, menos Psicanálise.
- 65 -
Parecer do Conselho Federal de Medicina
- 66 -
Prezado Senhor,
Em resposta a sua solicitação, informamos que:
A Psicanálise é uma modalidade de atendimento terapêutico,
que é exercida por profissionais psicólogos, psiquiatras e outros
que recebem formação específica das Sociedades de Psicanálise
ou cursos de especialização neste sentido.
Como atividade autônoma não é profissão regulamentada. O
Conselho Regional de Psicologia tem competência para fiscalizar
o exercício profissional do psicólogo, incluindo-se no caso a prá-
tica da psicanálise.
Se o profissional que se diz psicanalista não é psicólogo re-
gistrado no CRP-SP não temos competência para exercer a fis-
calização. Caberia no caso, investigar junto ao CRM ou mesmo
junto à Sociedade de Psicanálise, qual o vínculo ou a formação
do profissional referido.
Sendo o que havia para o momento, subscrevemo-nos.
Atenciosamente,
Comissão de Orientação.
- 67 -
papel de estabelecer os critérios que considerem adequadas para
o exercício da atividade. Na verdade, o Parecer CREMERJ no.
84/00, trata-se de uma consulta solicitada por vários indagando
sobre o posicionamento do CREMERJ a respeito do exercício
profissional da Psicanálise. CREMERJ - CONSELHO REGIO-
NAL DE MEDICINA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO
- 68 -
VI. No preenchimento da Carteira de Trabalho e Previdência
Social - CTPS no campo relativo ao contrato de trabalho;
VII. Nas atividades e programas do Ministério do Trabalho e
Emprego, quando for o caso;
Art. 3º - O Departamento de Emprego e Salário -DES da
Secretaria de Políticas Públicas de Emprego deste Ministério
baixará as normas necessárias à regulamentação da utilização da
Classificação Brasileira de Ocupações (CBO).
Parágrafo único. Caberá à Coordenação de Identificação e
Registro Profissional, por intermédio da Divisão da Classificação
Brasileira de Ocupações, atualizar a Classificação Brasileira de
Ocupações - CBO procedendo às revisões técnicas necessárias
com base na experiência de seu uso.
Art. 4º - Os efeitos de uniformização pretendida pela Clas-
sificação Brasileira de Ocupações (CBO) são de ordem adminis-
trativa e não se estendem às relações de emprego, não havendo
obrigações decorrentes da mudança da nomenclatura do cargo
exercido pelo empregado.
Art. 5º - Autorizar a publicação da Classificação Brasileira de
Ocupação - CBO, determinando que o uso da nova nomenclatu-
ra nos documentos oficiais a que aludem os itens I, II, III e V, do
artigo 2º, será obrigatória a partir de janeiro de 2003.
Art. 6º - Fica revogada a Portaria nº 1.334, de 21 de dezem-
bro de 1994.
Art. 7º - Esta Portaria entra em vigor na data de sua publi-
cação.
PAULO JOBIM FILHO
Ministro de Estado do Trabalho e Emprego
- 69 -
VEJA AQUI QUAIS SÃO AS ÁREAS DE COMPETÊN-
CIA DA PSICANÁLISE
- 70 -
• Acompanhar indivíduos, grupos e instituições.
Acompanhar impactos em intervenções, acompanhar o de-
senvolvimento e a evolução do caso, acompanhar o desenvolvi-
mento de profissionais sem formação e especialização acompa-
nhar resultados de projetos, particular de audiências.
• Educar indivíduos, grupos e instituições.
Estudar caso em grupo, apresentarem estudos de caso, mi-
nistrar aulas, supervisionar profissionais da área e de áreas afins,
realizar trabalhar para desenvolvimento de competência e habili-
dades profissionais, formar psicanalistas, desenvolver cursos para
grupos específicos, confeccionar manual educativo, desenvolvi-
mento de aspectos cognitivos, acompanhar resultados de curas,
treinamento.
• Desenvolver pesquisas experimentais, teóricos e clínicas.
Investigar o psiquismo humano, investigar o comportamento
individual e grupal e institucional, definir o problema e objetivos,
pesquisar bibliografias, definir metodologia de ação, estabelecer
parâmetros de pesquisas, construir instrumentos de pesquisas,
coletar dados, organizar dados, copiar dados, fazer leitura de da-
dos, integrar produtos de estudos de caso.
• Coordenar equipes de atividade de áreas afins.
Planejar as atividades da equipe, programar atividades gerais,
programar atividades da equipe, distribuir tarefas a equipe, traba-
lhar a dinâmica da equipe, monitorar atividades das equipes, pre-
parar reuniões, coordenar reuniões, coordenar grupos de estudos,
organizar eventos, avaliar propostas e projetos, avaliar e executar
as ações.
- 71 -
• Participar de atividades para consenso e divulgação pro-
fissional.
Participar de palestras, debates, entrevistas, seminários, sim-
pósio, participar de reuniões científicas (Congressos, etc.), publi-
car artigos, ensaios de livros científicos, participar de comissões
técnicas, participar de conselhos municipais, estaduais e federais,
participar de entidades de classe, participar de evento junto aos
meios de comunicação, divulgar práticas do psicólogo e do psi-
canalista, fornecer subsídios ás estratégicas organizacionais, for-
necer subsídios á formação de políticas organizacionais, buscar
parceiras, ética e organizacional.
• Realizar tarefas administrativas
Redigir pareceres, redigir relatório, agenciar atendimentos, re-
ceber pessoas, organizar prontuários, criar cadastros, redigir ofí-
cios, memorandos e despachos, compor reuniões administrativas
técnicas, fazer levantamento estático, comprar material técnico,
prestar contas.
• Demonstrar competências pessoais
Manter sigilo, cultivar a ética, demonstrar ciência sobre o có-
digo de ética profissional, demonstrar ciência sobre a legislação
pertinente, demonstrar bom senso, respeitar os limites de atu-
ação, demonstrar continência (acolhedor), demonstrar interesse
pela pessoa, ser humano, ouvir ativamente (saber ouvir), man-
ter atualizado contornar situações adversas, respeitar valores e
crenças dos clientes, demonstrar capacidade de observação, de-
monstrar habilidade de questionar, amar a verdade, demonstrar
autonomia de pensamento, demonstrar espírito crítico, respeitar
os limites do cliente e tomar decisões em situação de pressão.
- 72 -
Descrição Sumária
Estudam, pesquisam e avaliam o desenvolvimento emo-
cional e os processos mentais e sociais de indivíduos, grupos e
instituições, com a finalidade de análise, tratamento, orientação
e educação; diagnosticam e avaliam os distúrbios emocionais e
mentais e de adaptação social elucidando conflitos e questões e
acompanhamento o paciente durante o processo de tratamento
ou cura; investigam os fatores inconscientes; desenvolvem pes-
quisas experimentais, teóricas e clínicas que coordenam equipes
e atividades de áreas afins.
- 73 -
Anexo
O cuidado das almas: psicanálise, terapia e religião
- 76 -
so científico e como método para se cuidar de almas”. O padre,
o pastor, é aqui o “cuidador de almas”, o que implicava em dizer
que essa função dizia respeito a uma prática terapêutica. Pfister
ataca frontalmente o catolicismo, o qual, “com sua moral dualista
é uma religião do máximo recalcamento da vida pulsional natural
no sentido daabsoluta sublimação, ou seja, como negação das
funções pulsionais primárias”. Por sua vez, Martin Schian, teó-
logo evangélico, em 1922, ao se indagar sobre “as bases de uma
teologia prática”, critica com veemência a posição de Pfister. Para
ele, “a análise psíquica é um empreendimento espinhoso”, cujos
resultados são “incertos”. Mas, como era de se esperar, a maior
de todas as críticas se dirige ao papel atribuído à sexualidade, de
tal modo que o que há de “arbitrário e fantasioso” na psicanálise,
inviabiliza inteiramente sua utilização pelo “cuidador de almas”.
Essas duas posições divergentes demarcam um debate intenso,
que será interrompido durante a ditatura hitlerista.
Os dois discursos de Pio XII acima mencionados retomam
essas questões. O primeiro discurso se refere à psicanálise no
interior do tema do congresso, a propósito da “histopatologia
do sistema nervoso”, no qual se discutia os grandes avanços, na
época, das pesquisas no campo do que se chama hoje de “neuro-
ciências”. Pio XII, como Schian, rechaça completamente o papel
da sexualidade retomando a antiga crítica ao “pansexualismo”
de Freud: “Há uma lei da pureza e da intocabilidade pessoal, do
respeito pessoal dos homens e dos cristãos por si mesmos, que
proíbe sua troca e seu desaparecimento nas representações sexu-
ais e no mundo afetivo. O ‘interesse’ médico, psicoterapêutico,
encontra aqui um limite ético”. Posição contundente, dura, que
rechaça inteiramente a psicanálise e que, por meio dela, apon-
ta um “limite ético” que deve se estender a todo campo médi-
- 77 -
co, terapêutico, para além da psicanálise, qual seja, o “interesse”
da ciência não pode ser superior às determinações da natureza
humana, tal como a religião cristã o entende. Não por acaso, a
questão desse “limite ético” é mencionada no interior da questão
da sexualidade. Assim, em 1952, a Igreja Católica reiterava sua
doutrina acerca da sexualidade humana, subsumida a uma “lei da
pureza e da intocabilidade pessoal”, que a psicanálise certamente
subverte.
Essa subsunção da natureza humana a uma doutrina teológi-
ca é retomada explicitamente por Pio XII no discurso do ano se-
guinte. Segundo ele, “O que torna um homem humano é, sobre-
tudo, a alma (die Seele), a forma essencial de sua natureza. Dela
parte, em última instância, toda vida humana. Nela se enraízam
todo dinamismo psíquico (allesseelischenDynamismen) até mes-
mo sua própria estrutura e suas leis orgânicas”. Mais adiante, sua
refutação da psicanálise continua: “Esse dinamismo pode estar
na alma, nohomem, mas ele não é de todo modo a alma, não é o
homem (…) Que esse dinamismo impulsiona a uma determinada
atividade, isso não quer dizer, necessariamente, que esta atividade
é extraída dele”. Assim sendo, se faz absolutamente necessário
distinguir Seele como “alma” e como “psíquico”, evitar a ambi-
guidade e a confusão entre esses dois termos, que Freud acabara
por produzir. A única possibilidade de ampliar o significado de
Seele para psíquico, a única possibilidade que temos de falar em
“dinamismo psíquico” é tornar o psíquico subordinado à alma
como a “forma essencial” da natureza humana.
Pio XII está no outro extremo da esperança do pastor Pfister,
que sempre prezou a amizade com Freud e acreditou na poten-
cialidade crítica da psicanálise, inclusive na esfera religiosa. En-
- 78 -
quanto Pfister ainda sonhava com a possibilidade de uma recon-
ciliação entre psicanálise e religião, estabelecendo uma sinonímia
entre ambas por meio do “cuidado com a alma/o psíquico”, por
uma ação terapêutica semelhante, Pio XII rechaçava completa-
mente essa posição. Enquanto Pfister criticava o catolicismo pelo
papel de “recalcamento” das pulsões primárias (leia-se sexuali-
dade), reiterando a relação entre sentimento de culpa e neurose,
Pio XII restaurava a hierarquia entre alma e psíquico e retirava as
pulsões do campo da natureza humana, ao afirmar no segundo
discurso que “o caminho para superar a culpa se localiza fora do
puro psicológico: ele está como Cristo o sabia, no arrependimen-
to e na absolvição sacramental pelo padre”. Se é ainda possível
pensar que ação do padre pode se constituir numa espécie de
terapia, ela não pode abandonar os estritos limites dos princípios
próprios às religiões cristãs, mesmo quando o padre envia seus
“penitentes” ao médico: “Não é raro hoje – continua Pio XII,
finalizando seu argumento – que em certos casos patológicos, o
padre envie seus penitentes ao médico”. Mas este não é o caso
quando se trata de culpa e sentimento de culpa por uma falta,
por um pecado. Neste caso, “é o médico que deveria devolver
seus pacientes a Deus ou àquele que tem o poder de, no lugar
de Deus, diminuir sua própria culpa”. A culpa, o sentimento de
culpa, por conseguinte, não é considerado um âmbito para trata-
mento por médicos, psicólogos ou psicanalistas, mas exclusiva-
mente pela igreja. Se essa posição dá razão a Freud e a Nietzsche
que identificam o surgimento da religião a partir do sentimento
de culpa, por outro lado, a posição da igreja é não apenas a de va-
lorizar o sentimento de culpa, mas também de delimitá-lo como
sendo um âmbito que lhe é próprio e exclusivo.
É evidente que Pio XII confunde psicanálise, psicologia e
medicina. Para o seu argumento, qual seja, para a estrita deli-
- 79 -
mitação do que compete à igreja e ao padre e do que compete
às formas de terapia e à ciência, uma diferenciação entre essas
práticas não é importante. Pelo contrário, é necessário mostrar,
ao mesmo tempo, que existem duas formas diferentes de “trata-
mento” e mesmo de “cura” ou de abrandamento da culpa, que
não coincidem necessariamente e que deve se estabelecer, agora
necessariamente, uma hierarquia entre elas, de tal modo, que a
culpa resultante do pecado só encontre refrigério naquele que
pode falar em nome de Deus. Há a prática religiosa, no caso a
católica e as práticas ditas científicas. Dentre estas, a psicanálise é
certamente a que incorre no maior pecado, pois pretende atribuir
não à alma, mas ao dinamismo psíquico regido pelas “pulsões
primárias”, o cerne de toda possível natureza humana.
Entre 1952, 1953 e os dias atuais muita coisa mudou. Mas,
sabemos que grande parte da igreja católica continua conside-
rando alguns temas que envolvem diretamente a sexualidade
ainda como tabus, tais como a homossexualidade, o aborto, o
sexo antes do casamento, as formas diferenciadas dos arranjos
familiares, a emancipação feminina, o uso de contraceptivos e de
preservativos. O que significa dizer que os discursos de Pio XII
continuam legitimados e suas palavras ainda ecoam em diver-
sos posicionamentos oficiais da Igreja Católica. Por outro lado,
assiste-se a um crescente processo de midiatização das práticas
religiosas e, ao mesmo tempo, da reaproximação entre religião e
práticas terapêuticas, seja nas igrejas pentecostais, seja no movi-
mento carismático católico, estudados principalmente pelos an-
tropólogos e nos quais ressurgem práticas antigas, tradicionais.
Se pensarmos na cultura brasileira, essas práticas remontam à
pajelança indígena, ao catolicismo popular introduzido pelos co-
lonizadores, aos cultos afro-brasileiros, à presença do espiritismo,
- 80 -
dentre outros. Por outro lado, existem sítios na internet dedica-
dos à “psicanálise cristã”, nos quais a psicanálise é inteiramente
desfigurada e rebaixada à condição de autoajuda espiritual. Du-
rante a visita do atual papa ao Brasil, no ano passado, suas de-
clarações surpreendentes sobre temas tabus, em especial sobre o
homossexualismo, parecem apontar para um sopro de renovação
por vir na igreja católica. Não era para menos: empenhada que
foi em expulsar as “pulsões primárias” da “natureza humana”, a
igreja católica descuidou-se delas, julgou-as exorcizadas, subesti-
mou a sua força e quando se deu conta, essa instituição milenar
precisou enfrentar o escândalo da pedofilia e dos abusos sexuais
cometidos por padres. Mais recentemente, tornaram-se comuns,
na mídia, as denúncias de abuso sexual e de estupro por parte de
pastores de outras religiões. Nesse caso, não há como não dar
razão a Freud, quando diz que o retorno do recalcado é muito
mais violento do que o recalque que o produziu. As pulsões, por
sua vez, parecem resistir a qualquer forma de exorcismo. Elas
parecem mesmo coisa do demo! Saravá!
Ernani Chaves
é professor da Faculdade de Filosofia da Universidade Federal do Pará. Autor de
Foucault e a psicanálise (Ed. Autêntica, reedição no prelo).
- 81 -
Anexo II
Sigmund Freud (1856 - 1939) Fundador da Psicanálise
- 82 -
além do judaísmo e da judeidade. Talvez ela também tenha de-
sempenhado um papel em sua aprendizagem da sexualidade.
Freud nasceu em uma família de abastados comerciantes ju-
deus. Sempre se destaca a complexidade das relações intrafami-
liares. Seu pai, Jakob Freud, que exercia o ofício de comerciante
de lã e têxteis, casou-se, pela primeira vez, aos 17 anos e teve dois
filhos (Emmanuel e Philippe). Viúvo, casa-se novamente com
Amália Nathanson, de 20 anos, idade do segundo filho de Jakob.
Freud será o mais velho dos oito filhos do segundo casamento
de seu pai, e seu companheiro preferido de brinquedos foi seu
sobrinho, que tinha um ano a mais do que ele. Do casamento de
Jacob e Amália nasceram os seguintes irmãos de Freud: Julius,
Anna, Débora (Rosa), Marie (Mitzi), Adolfine (Dolfi), Pauline
(Paula) e Alexander.
Quando tinha 3 anos, em outubro de 1859, Jacob e a famí-
lia deixaram Freiberg, onde seus negócios não prosperavam em
virtude da introdução do maquinismo e do desenvolvimento da
industrialização o que provocou uma queda dos rendimentos
familiares . Instalou-se então em Leipzig, esperando encontrar
nessa cidade melhores condições para o comércio de têxteis.
Para Freud, essa partida permanecerá sempre dolorosa. Merece
ser lembrado um ponto que ele próprio menciona: o amor sem
desfalecimentos que sua mãe sempre lhe votou, ao qual atribui
a confiança e a segurança que demonstrou em todas as circuns-
tâncias.
Por sua vez, Emanuel e Philipp emigraram para Manchester.
Um ano depois, não tendo conseguido modificar sua má situa-
ção econômica, Jacob decidiu estabelecer-se em Leopoldstrasse,
o bairro judeu de Viena. Entre 1865 e 1873, o jovem Sigmund
- 83 -
freqüentou o Realgymnasium e depois o Obergymnasium, onde
ficou conhecendo Eduard Silberstein, com quem manteve sua
primeira grande correspondência intelectual, notadamente a res-
peito de Franz Brentano. Nessa época, apaixonou-se por Gisela
Fluss, filha de um negociante amigo do seu pai. Mais tarde, fez
amizade com Heinrich Braun (1854-1927), que despertaria seu
interesse pela política e depois se orientaria para o socialismo.
Foi um aluno muito bom em seus estudos secundários, e foi
sem uma vocação especial que no outono de 1873, Freud come-
çou seu estudo de medicina. Devem se destacar duas coisas, uma
ambição precocemente formulada e reconhecida e “o desejo de
contribuir com alguma coisa, durante sua vida, para o conheci-
mento da humanidade” (“Psicologia dos Estudantes”,1914). Sua
curiosidade, “que visava mais às questões humanas do que às
coisas da natureza” (“Um Estudo Autobiográfico” [Selbstdars-
tellung],1925) leva-o a acompanhar, ao mesmo tempo, durante
três anos, as conferências de F. Brentano, várias delas dedicadas
a Aristóteles. Em 1880, publicou a tradução de vários textos de
J.S.Mill: “Sobre a emancipação da mulher”, “Platão”, “A questão
operária”, “O socialismo”.
Em setembro de 1886, depois de um noivado de vários anos,
desposa Martha Bernays, com quem terá cinco filhos. Em 1883,
é nomeado docente-privado (que equivale, na França, ao título
de mestre conferencista) e professor honorário em 1902. Apesar
de todos os tipos de hostilidade e dificuldades, Freud sempre se
recusará a abandonar Viena. Foi somente pela pressão de seus
alunos e amigos e depois do “Anschluss” de março de 1938 que
irá finalmente se decidir, dois meses mais tarde, a partir para Lon-
dres.
- 84 -
Apaixonou-se pela ciência positiva, e principalmente pela
biologia darwiniana (que serviria de modelo para todos os seus
trabalhos). Em 1874, pensou em ir a Berlim, para freqüentar os
cursos de Hermann von Helmholtz. Um ano depois, com o estí-
mulo de Carl Claus, seu professor de zoologia, obteve uma bolsa
de estudos que lhe permitiu ir a Trieste estudar a vida das enguias
(machos) de rio. Sua primeira publicação data de 1877: “Sobre
a Origem das Raízes Nervosas Posteriores da Medula Espinhal
dos Amoceta” (Petromyzon planeli), enquanto a última, referen-
te às Paralisias cerebrais infantis, de 1897, esse texto mostra que
Freud trabalhava na elaboração de uma teoria do funcionamento
específico das células nervosas (os futuros neurônios), como se
veria em seu “Projeto para uma psicologia científica” de 1895.
Durante esses 20 anos, pode-se reunir 40 artigos (fisiologia e aná-
tomo-histologia do sistema nervoso).
Freud entrou no Instituto de Fisiologia, dirigido por E.Brü-
cke, após três anos de estudos médicos, em 1876. Depois dessa
experiência, Freud passou do instinto de zoologia para o de fisio-
logia, tornando-se aluno de Ernst Wilhelm von Brucke, eminente
representante da escola antivitalista fundada por Helmholtz. Foi
nesse instituto, onde ficou seis anos, que fez amizade com Josef
Breuer. Entre 1879 e 1880, forçado a uma licença para cumprir
o serviço militar, enganava o tédio traduzindo quatro ensaios de
John Stuart Mill (1806-1873), sob a direção de Theodor Gom-
perz (1832-1912), escritor e helenista austríaco, responsável pela
publicação alemã das obras completas desse filósofo inglês, teó-
rico do liberalismo político.
O trabalho de Freud sobre a afasia (Uma concepção da afa-
sia, estudo crítico[Zur Auffassung der Aphasien], 1891) perma-
- 85 -
necerá na sombra, embora ofereça a mais aprofundada e notável
elaboração da afasiologia da época. Suas esperanças de notorie-
dade tampouco foram satisfeitas por seus trabalhos sobre a coca-
ína, publicados de 1884 a 1887. Havia descoberto as proprieda-
des analgésicas dessa substância, negligenciando as propriedades
anestésicas, que seriam utilizadas com sucesso por K.Koller. A
lembrança desse fracasso vai ser um dos elementos que origina-
ram a elaboração de um sonho de Freud, a “monografia botâni-
ca”.
Freud se encontrava, no início da década de 1880, na posição
de pesquisador em neurofisiologia e de autor de trabalhos de va-
lor, mas que não lhe permitia, por falta de assegurar a subsistên-
cia de uma família. Apesar de suas reticências, a única oferecida
era abrir um consultório de neurologista na cidade, o que fez,
de forma surpreendente, no domingo de Páscoa, 25 de abril de
1886.
Em 1882, depois de obter seu diploma, ficou noivo de Martha
Bernays (Martha Freud), que se tornaria sua mulher. Por razões
financeiras, renunciou então à carreira de pesquisador e decidiu
tornar-se clínico. Nos três anos seguintes, trabalhou no Hospi-
tal Geral de Viena, primeiro no serviço de Hermann Nothnagel,
depois no de Theodor Meynert. Ali, ficou conhecendo Nathan
Weiss (1851-1883), e quando esse novo amigo se suicidou por
enforcamento, Freud ficou transtornado. “Sua vida, escreveu a
Martha, parece ter sido a de um personagem de romance, e sua
morte uma catástrofe inevitável.”
Pensando em tornar-se célebre e libertar-se da pobreza para
poder se casar, acreditava ter descoberto as virtudes da cocaína e
administrou-a a seu amigo Ernst von Fleischl-Marxow, que sofria
- 86 -
de uma doença incurável. Não percebia a dependência induzida
pela droga e ignorava tudo sobre sua ação anestesiante, que seria
descoberta por Carl Koller.
Em 1885, nomeado “Privatdozent” de neurologia, Freud ob-
teve uma bolsa de estudos graças à qual pudera realizar um de
seus sonhos, ir a Paris. Queria muito encontrar-se com Jean Mar-
tin Charcot, cujas experiências sobre a histeria o fascinavam. Foi
assim que teve um encontro determinante, na Salpêtrière, com
Charcot. Deve-se observar que Charcot não se mostrou interes-
sado nem pelos cortes histológicos que Freud lhe levou, como
prova de seus trabalhos, nem pelo relato do tratamento de Anna
O., cujos elementos clínicos principais seu amigo J. Breuer lhe
tinha comunicado, a partir de 1882. Charcot quase não se interes-
sava pela terapêutica, preocupando-se em descrever e classificar
os fenômenos para tentar explica-los de forma racional.
Essa primeira permanência na França marcou o início da
grande aventura científica que o levaria à invenção da psicanálise.
No Teatro Saint-Martin, Freud assistiu maravilhado à represen-
tação de uma peça de Victorien Sardou, interpretada por Sarah
Bernhardt: “Nunca uma atriz me surpreendeu tanto; eu estava
pronto a acreditar em tudo o que ela dizia.” Depois de Paris, foi a
Berlim, onde fez os cursos do pediatra Adolf Baginsky.
De volta a Viena, instalou-se como médico particular, abrin-
do um consultório na Rathausstrasse. Freud também trabalhava,
três tardes por semana, como neurologista na Clínica Steindlgas-
se, primeiro instituto público de pediatria, dirigido pelo profes-
sor Max Kassowitz (1842-1913). Em setembro de 1886, casou-se
com Martha, e no dia 15 de outubro fez uma conferência sobre a
histeria masculina na Sociedade dos Médicos, onde teve uma aco-
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lhida glacial, não em razão de suas teses (etiológicas), como diria
depois, mas porque atribuía a Charcot a paternidade de noções
que já eram conhecidas pelos médicos vienenses.
Em 1887, um mês depois do nascimento de sua filha Ma-
thilde (Hollitscher), Freud ficou conhecendo Wilhelm Fliess, bri-
lhante médico judeu berlinense, que fazia amplas pesquisas sobre
a fisiologia e a bissexualidade. Era o início de uma longa amizade
e de uma soberba correspondência íntima e científica. Apesar de
várias tentativas, Fliess não conseguiria curar Freud de sua paixão
pelo fumo: “Comecei a fumar aos 24 anos, escreveu em 1929,
primeiro cigarros, e logo exclusivamente charutos [...]. Penso que
devo ao charuto um grande aumento da minha capacidade de
trabalho e um melhor autocontrole.”
Freud começa a utilizar os meios de que dispunha, a eletro-
terapia de W.H. Erb, a hipnose e a sugestão. As dificuldades en-
contradas levam-no a se ligar a A.A. Liébault e H. M. Bernheim,
em Nancy, durante o verão de 1889. Traduz, aliás, as obras deste
último para o alemão. Encontra nelas a confirmação das reservas
e decepções que ele próprio sentia por tais métodos.
Em setembro de 1891, Freud mudou-se para um apartamen-
to situado no número 19 da rua Berggasse. Ficou ali até seu exílio
em 1938, cercado por seus seis filhos (Mathilde, Mrtin, Oliver, Er-
nst, Sophie Halberstadt, Anna) e de sua cunhada Minna Bernays.
Como clínico, tratava essencialmente de mulheres da burguesia
vienense, qualificadas como “doentes dos nervos” e sofrendo de
distúrbios histéricos. Abandonando o niilismo terapêutico, tão
comum nos meios médicos vienenses da época, procurou, ante
de tudo, curar e tratar de suas pacientes, aliviando os seus sofri-
mentos psíquicos. Durante um ano, utilizou os métodos terapêu-
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ticos aceitos na época: massagens, hidroterapia, eletroterpia. Mas
logo constatou que esses tratamentos não tinham nenhum efeito.
Assim começou a utilizar a hipnose, inspirando-se nos métodos
de sugestão de Hippolyte Bernheim, a quem fez uma visita por
ocasião do primeiro congresso internacional de hipnotismo, que
se realizou em Paris em 1889. Em 1891, publicou uma monogra-
fia, “Contribuição à concepção das afasias”, na qual se baseava
nas teorias de Hughlings Jackson para propor uma abordagem
funcional, e não mais apenas neurofisiológica, dos distúrbios de
linguagem. A doutrina das “localizações cerebrais” era substitu-
ída pelo associacionismo, que abria caminho para a definição de
um “aparelho psíquico” tal como se encontraria na metapsico-
logia: ele faz sua primeira formulação em 1896 e estabelece seus
fundamentos no capítulo VII da “Interpretação dos Sonhos”.
Em 1890, consegue convencer seu amigo Breuer a escrever
com ele uma obra sobre a histeria. Seu trabalho em comum dará
lugar à publicação, em 1893, de “Sobre o mecanismo psíquico
dos fenômenos histéricos: comunicação preliminar”, que irá
abrir caminho para “Estudos sobre a histeria”; já se encontra nele
a idéia freudiana de defesa, para proteger o sujeito de uma re-
presentação “insuportável” ou “incompatível”. No mesmo ano,
em um texto intitulado “Algumas Considerações para um Estudo
Comparativo das Paralisias Motoras Orgânicas e Histéricas”, pu-
blicado em francês em “Archives neurologiques”, Freud afirma
que “a histeria se comporta, nessas paralisias e outras manifes-
tações, como se a anatomia não existisse, ou como se ela não
tomasse disso nenhum conhecimento”.
Os “Estudos sobre a histeria”, obra comum de Breuer e
Freud, são publicados em junho de 1895. A obra comporta, além
- 89 -
da Comunicação Preliminar, cinco observações de doentes: a pri-
meira – de Anna O (Bertha Pappenheim) – é redigida por Breuer
e é nela que se encontra a expressão tão feliz “Talking Cure”,
proposta por Anna O; as quatro seguintes devem-se a Freud. A
obra conclui com um texto teórico de Breuer e um outro sobre
a psicoterapia da histeria, de Freud, onde se pode ver o início do
que irá separar os dois autores no ano seguinte.
Em “L’ Hérédité et l’Étiologie dês Névroses”, publicado em
francês, em 1896, na “Revue neurologique”, Freud de fato afir-
ma: “Experiência de passividade sexual antes antes da puberda-
de; é essa, pois, a etiologia específica da histeria”. No artigo, é
empregado pela primeira vez o termo “psicanálise”. Foi também
durante esses anos que a reflexão de Freud sobre a súbita in-
terrupção feita for Breuer no tratamento de Anna O levou-o a
conceber a transferência.
Finalmente, deve-se assinalar a redação, em poucas semanas,
no final de 1895, de “Projeto para uma Psicologia Científica”
(Entwurf einer Psychologie), que Freud nunca irá publicar e que
constitui, no começo, sua última tentativa de apoiar a psicologia
sobre os dados mais recentes da neurofisiologia.
Trabalhando ao lado de Breuer, Freud abandonou progressi-
vamente a hipnose pela catarse, inventou o método da associação
livre, e enfim a psico-análise. Essa palavra foi empregada pela
primeira vez em 1896, e sua invenção foi atribuída a Breuer. Em
1897, com um relatório favorável de Nothnagel e de Richard von
Krafft-Ebing, o nome de Freud foi proposto para receber o pres-
tigioso título de professor extraordinário. Sua nomeação foi rati-
ficada pelo imperador Francisco-José no dia 5 de março de 1902.
- 90 -
Ao contrário de muitos intelectuais vienenses marcados pelo
“ódio de si judeu”, Freud, judeu infiel e incrédulo, hostil a todos
os rituais e à religião, nunca negaria sua judeidade. Como enfati-
zou Manès Sperber, ele continuaria sendo “um judeu consciente,
que não dissimulava a ninguém sua origem, proclamando-a, ao
contrário, com dignidade e freqüentemente com orgulho. Muitas
vezes, afirmou que detestava Viena e que se sentia como que
libertado a cada vez que se afastava dessa cidade, onde crescera
e à qual ficaria ligado, entretanto, por laços indestrutíveis. Sua
consciência da identidade judaica permaneceria assim, pois sua
origem nunca foi para ele uma fonte de sentimentos de inferio-
ridade, embora ela lhe causasse problemas e dificuldades suple-
mentares, principalmente em sua vida profissional”.
Sua posição doutrinária está centrada na teoria do núcleo
patogênico, constituído na infância, por ocasião de um trauma
sexual real, decorrente da sedução por um adulto. O sintoma é a
conseqüência do recalcamento das representações insuportáveis
que constituem esse núcleo, e o tratamento consiste em trazer a
consciência os elementos, como se extrai um “corpo estranho” ,
sendo a conseqüência do levantamento do recalque o desapare-
cimento do sintoma.
Durante alguns dos anos que antecederam a publicação de
“A interpretação de sonhos”, Freud introduz na nosografia, à
qual não é indiferente, alguma entidade nova. Descreve a neuro-
se de angústia, separando-a da categoria bastante heteróclita da
neurastenia. Isola, pela primeira vez, a neurose obsessiva (alem.
Zwangsneurose) e propõe o conceito de psiconeurose de defesa,
no qual é integrada a paranóia.
Porém, sua principal tarefa é a auto-análise, termo que irá
empregar por pouco tempo. Eis o que diz sobre isto, na car-
- 91 -
ta a W.Fliess, de 14 de novembro de 1887: “Minha auto-análi-
se continua sempre em projeto, agora compreendi o motivo. É
porque não posso analisar a mim mesmo a não ser me servindo
de conhecimentos adquiridos objetivamente (como para um es-
tranho). Uma verdadeira auto-análise é realmente impossível, de
outro modo não haveria mais doença”.
No âmbito de sua amizade com Fliess, ocorreram vários
acontecimentos maiores na vida de Freud: sua auto-análise, um
intercâmbio de caso (Emma Eckstein), a publicação de um pri-
meiro grande livro, “Estudos sobre a histeria”, no qual são rela-
tadas várias histórias de mulheres (Bertha Pappenheim, Fanny
Moser, Aurélia Öhm, Anna von Lieben, Lucy, Elisabeth von R.,
Mathilde H., Rosalie H.), e enfim o abandono da teoria da se-
dução segundo a qual toda neurose se explicaria por um trauma
real. Essa renúncia, fundamental para a história da psicanálise,
ocorreu em 21 de setembro de 1897. Freud comunicou-a a Flies-
se em tom enfático, em uma carta que se tornaria célebre: “Não
acredito mais na minha Neurótica.”
O encontro com Fliess remonta a 1887. Freud começa a
analisar sistematicamente seus sonhos, a partir de julho de 1895.
Tudo se passa como se Freud, sem antes se dar conta disso, tives-
se utilizado Fliess como intérprete, para efetuar sua própria análi-
se. Seu pai morreu em 23 de outubro de 1896. Poder-se-ia pensar
que tal acontecimento não foi estranho à descoberta do comple-
xo de Édipo, do qual se encontra, um ano mais tarde, na carta a
Fliess de 15 de outubro de 1897, a seguinte primeira formulação
esquemática: “Acorreu-me ao espírito uma única idéia, de valor
geral. Encontrei em mim, como em todo lugar, sentimentos de
amor para com minha mãe e de ciúme para com meu pai, senti-
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mentos que são, acho eu, comuns a todas as crianças pequenas,
mesmo quando seu aparecimento não é tão precoce como nas
crianças que se tornaram histéricas (de uma forma análoga à da
romantização original nos paranóicos, heróis e fundadores de re-
ligiões). Se isso for assim, pode-se compreender, apesar de todas
as objeções racionais que se opõem à hipótese de uma fatalidade
inexorável, o efeito percebido em ‘Édipo rei’. Também se pode
compreender por que todos os dramas mais recentes do desti-
no deveriam acabar miseravelmente...mas a lenda grega percebeu
uma compulsão que todos reconhecem, pois todos a”. sentiram.
Cada ouvinte foi, um dia, em germe, em imaginação, um Édipo,
e espanta-se diante da realização de seu sonho, transportado para
a realidade, estremecendo conforme o tamanho do recalcamento
que separa seu estado infantil de seu estado atual”.
Começou então a elaborar sua doutrina da fantasia, conce-
bendo em seguida uma nova teoria do sonho e do inconsciente
, centrada no recalcamento e no complexo de Édipo. Seu inte-
resse pela tragédia de Sófocles foi contemporâneo de sua paixão
por Hamlet. Freud era um grande leitor de literatura inglesa, ali-
mentando-se especialmente da obra de Shakespeare: “Uma idéia
atravessou o meu espírito, escreveu a Fliess em 1897, de que o
conflito edipiano encenado em ‘Édipo rei’ de Sófocles poderia
estar também no cerne de Hamlet. Não acredito em uma inten-
ção consciente de Shakespeare, mas, antes, que um acontecimen-
to real levou o poeta a escrever esse drama, tendo seu próprio
inconsciente lhe permitido compreender o inconsciente do seu
herói.” A ruptura definitiva com Fliess ocorrerá em 1902.
Depois de 1926, e a despeito de uma longa discussão com
James Strachey, Freud acabaria cedendo à crença segundo a qual
- 93 -
Shakespeare não era o autor de sua obra. Aliás, esse tema do des-
locamento da atribuição de uma paternidade ou de uma identi-
dade se encontraria por várias vezes em sua obra, principalmente
em “Moisés e o monoteísmo”, na qual fez de Moisés um egípcio.
Da nova teoria do inconsciente nasceria um segundo gran-
de livro, publicado em novembro de 1899, “A Interpretação dos
Sonhos” (Die Traumdeutung), no qual é relatado o sonho da
“Injeção de Irmã”, ocorrido quando Freud estava em Bellevue,
em julho de 1895, em um pequeno castelo na floresta vienense:
“Você acredita, (escreveu a Fliess no dia 12 de julho de 1900),
que haverá um dia nesta casa uma placa de mármore com esta
inscrição: Foi nesta casa que, em 24 de julho de 1895, o minis-
tério do sonho foi revelado ao doutor Sigmund Freud? Até ago-
ra, tenho pouca esperança.” O postulado inicial introduz uma
ruptura radical com todos os discursos anteriores. O absurdo, a
incongruência dos sonhos não é um acidente de ordem mecâni-
ca; o sonho tem um sentido, esse sentido está escondido e não
decorre das figuras utilizadas pelo sonho, mas de um conjunto de
elementos pertencentes ao próprio sonhador, fazendo com que a
descoberta do sentido oculto dependa das “associações” produ-
zidas pelo sujeito. Exclui-se, portanto, que esse sentido possa ser
determinado sem a colaboração do sonhador.
Aquilo com que estamos lidando é um texto; sem dúvida, o
sonho é constituído principalmente de imagens, mas o acesso a
elas só pode ser obtido pela narrativa do sonhador, que constitui
seu “conteúdo manifesto”, que é preciso decifrar, como Cham-
pollion fez com os hieróglifos egípcios, para descobrir seu “con-
teúdo latente”. O sonho é constituído como os “restos diurnos”,
aos quais são transferidos os investimentos afetados pelas repre-
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sentações de desejo. O sonho, ao mesmo tempo em que protege
o sono, assegura, de uma forma camuflada, uma certa “realização
de desejo”. A elaboração do sonho é feita por técnicas especiais,
estranhas ao pensamento consciente, a condensação (um mesmo
elemento representava vários pensamentos do sonho) e o des-
locamento (um elemento do sonho é colocado no lugar de um
pensamento latente).
Resultam dessa concepção do sonho uma estrutura parti-
cular do aparelho psíquico, que foi objeto do sétimo e último
capítulo. Mais do que a divisão em três instâncias, consciente,
pré-consciente e inconsciente, que especifica o que se chama de
primeira tópica, convém conservar a idéia de uma divisão do psi-
quismo em dois tipos de instâncias, obedecendo a leis diferen-
tes e separadas por uma fronteira que só pode ser ultrapassada
em determinadas condições, consciente-pré-consciente, por um
lado, inconsciente, por outro. Esse corte é radical e irredutível,
nunca poderá haver “síntese”, mas apenas “tendência à síntese”.
O sentimento próprio ao eu da unidade que constitui nosso men-
tal não é mais do que uma ilusão. Um aparelho desse tipo torna
problemática a apreensão da realidade, que deve ser constituída
pelo sujeito. A posição de Freud, aqui, é a mesma expressa no
“Projeto”: “O inconsciente é o próprio psíquico e sua realidade
essencial. Sua natureza íntima nos é tão desconhecida como a
realidade do mundo exterior, e a consciência nos ensina sobre ela
de uma maneira tão incompleta como nossos órgãos dos senti-
dos sobre o mundo exterior”.
Para Freud, o sonho se encontra em uma espécie de encru-
zilhada entre o normal e o patológico, e as conclusões concer-
nentes ao sonho serão consideradas por ele como válidas para
explicar os estados neuróticos.
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“A psicopatologia da vida cotidiana” (Zur Psychopathologie
dês Alltagslebens) é publicado no ano seguinte, em 1901. Ela
começa, por exemplo, com um esquecimento de nome, o de Sig-
norelli, análise já publicada por Freud em 1898; o esquecimento
associa, em sua determinação, tanto com motivos sexuais como
a idéia de morte. A obra reúne toda uma série de pequenos aci-
dentes, aos quais quase não se dá, via de regra, nenhuma atenção,
como os esquecimentos de palavras, as “lembranças encobrido-
ras”, os lapsos da palavra ou escrita, os erros de leitura e escrita,
os equívocos, os atos falhos, etc.
Esses fatos podem ser considerados como manifestações do
inconsciente, nas seguintes três condições: 1.não deve ultrapassar
um certo limite fixado por nosso juízo, isto é, aquilo que chama-
mos de “os limites do ato normal”; 2.devem ter caráter de um
distúrbio momentâneo; 3.não podem ser caracterizados assim a
não ser que os motivos nos escapem e que fiquemos reduzidos a
invocar o “acaso” ou a “falta de atenção”.
“Ao colocar os atos falhos na mesma categoria das manifes-
tações das psiconeuroses, damos um sentido e uma base a duas
afirmativas que ouve repetir com freqüência, a saber, que entre
o estado nervoso normal e o funcionamento nervoso anormal,
não existe um limite claro e marcado (...). Todos os fenômenos
em questão, sem nenhuma exceção, permitem que se chegue aos
materiais psíquicos reprimidos incompletamente e que, embora
recalcados pela consciência, não perderam toda a possibilidade
de se manifestar e se exprimir”.
O terceiro texto, “Os chistes e sua relação com o incons-
ciente” (Der Witz und seine Beziehung zum Unbewuften), é pu-
blicado em 1905. Diante desse material logo e difícil, alguns se
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perguntaram por que Freud tinha julgado necessário acumular
uma quantidade tão grande de exemplos, com uma classifica-
ção complicada. Sem dúvida, porque suas teses eram difíceis de
pôr em evidência. Eis as principais. “O espírito reside apenas na
expressão verbal”. Os mecanismos são os mesmos do sonho, a
condensação e o deslocamento. O prazer que o espírito engendra
está ligado à técnica e à tendência satisfeita, hostil ou obscena.
Porém, um terceiro ocupa sobretudo nele um papel principal, e é
isso o que o distingue do cômico. “O espírito em geral precisa da
intervenção de três personagens: aquele que faz a palavra, aque-
le que se diverte com a verve hostil ou sexual e, enfim, aquele
no qual é realizada a intenção do espírito, que é a de produzir
prazer”. Finalmente: “Só é espirituoso aquilo que é aceito como
tal”. Compreende-se então a dificuldade para traduzir a palavra
alemã “Witz”, que não tem equivalente em francês, mas também
a dificuldade de seu manejo em alemão, por aquilo que acaba de
ser lembrado e pela diversidade dos exemplos utilizados, histórias
engraçadas, chistes, trocadilhos, etc. A especificidade do “Witz”
explica a atenção que Freud tem em distingui-lo do cômico, dis-
tinção assim resumida: “O espírito é, por assim dizer, para o cô-
mico, a contribuição que lhe vem do domínio do inconsciente”.
No mesmo ano, surgem os “Três ensaios sobre a teoria da se-
xualidade” (Drei Abhandlungen zur Sexualtheorie), onde é afir-
mada e ilustrada a importância da sexualidade infantil e proposto
um esquema da evolução da libido, por suas fases caracterizadas
pela sucessiva dominância das zonas erógenas bucal, anal e ge-
nital. Nesse texto a criança, em relação à sexualidade, é definida
como um “perverso polimorfo”, e a neurose é situada como “o
negativo da perversão”.
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Mais ou menos entre 1905 e 1918, irão se suceder um gran-
de número de textos referentes à técnica e, para ilustra-la, apre-
sentações de casos clínicos. Entre estes últimos estão as “Cinco
psicanálises”:
Em 1905, “Fragmento da análise de um caso de histeria”:
observação de uma paciente chamada Dora, centrada em dois so-
nhos principais, cujo trabalho de interpretação ocupa sua maior
parte.
Em 1909, “Análise de uma fobia em um menino de cinco
anos” (o pequeno Hans): Freud verifica a exatidão das “reconsti-
tuições” efetuadas no adulto.
Também em 1909, “Notas sobre um caso de neurose obses-
siva” (O Homem dos Ratos): a análise é dominada por um voto
inconsciente de morte, e Freud se espanta ao verificar, “ainda
mais” em um obsessivo, as descobertas feitas no estudo da his-
teria.
Em 1911, “Notas psicanalíticas sobre um relato autobiográfi-
co de um caso de paranóia” (Dementia paranoides) (o presidente
Schreber): a particularidade dessa análise se prende ao fato de
que Freud nunca encontrou o paciente, contentando-se em tra-
balhar com as “Memórias” nas quais este descrevera sua doença,
dando a elas um interesse científico.
Finalmente, em 1918, “História de uma neurose infantil” (O
Homem dos Lobos): a observação foi para Freud de particular
importância. Ela fornecia a prova da existência, na criança, de
uma neurose perfeitamente constituída, seja ela aparente ou não,
nada mais sendo a do adulto do que uma exteriorização e repe-
tição da neurose infantil; ela demonstrou a importância dos mo-
- 98 -
tivos libidinais e a ausência de aspirações culturais, ao contrário
de C. Jung; ela forneceu uma exata ilustração da constituição do
fantasma e do lugar da cena primitiva.
Em 1902, com Alfred Adler, Wilhelm Stekel, Max Kahane
(1866-1923) e Rudolf Reitler (1865-1917), fundou a Sociedade
Psicológica das Quartas-Feiras, primeiro círculo da história do
freudismo. Durante os anos que se seguiram, muitas personalida-
des do mundo vienense se juntaram ao grupo: Paul Federn, Otto
Rank, Fritz Wittels, Isidor Sadger. Foi durante essas reuniões que
se elaborou a idéia de uma possível aplicação da psicanálise a
todas as áreas do saber: literatura, antropologia, história, etc. O
próprio Freud defendeu a noção de psicanálise aplicada, publi-
cando uma fantasia literária: “Delírios e sonhos na Gradiva de
Jensen (1907)”.
Em 1907 e 1908, o círculo dos primeiros discípulos freudia-
nos se ampliou ainda mais, com a adesão à psicanálise de Hanns
Sachs, Sandor Ferenczi, Karl Abraham, Ernest Jones, Abraham
Arden Brill e Max Eitingon.
Durante o primeiro quarto do século, a doutrina freudiana se
implantou em vários países: Grã-Bretanha, Hungria, Alemanha,
costa leste dos Estados Unidos. Na Suíça produziu-se um acon-
tecimento maior na história do movimento psicanalítico : Eugen
Bleuler, médico-chefe da clínica do Hospital Burghölzli de Zuri-
que, começou a aplicar o método psicanalítico ao tratamento das
psicoses, inventando ao mesmo tempo a noção de esquizofrenia.
Uma nova “terra prometida” se abriu assim à doutrina freudiana:
ela podia a partir de então investir o saber psiquiátrico e tentar
dar uma solução para o enigma da loucura humana.
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No dia 3 de março de 1907, Carl Gustav Jung, aluno e as-
sistente de Bleuler, foi a Viena para conhecer Freud. Depois de
várias horas de conversa, ficou encantado com esse novo mestre.
Seria o primeiro discípulo não-judeu de Freud.
Em 1909, a convite de Grandville Stanley Hall, Freud foi, em
companhia de Jung e de Ferenczi, à Clark University de Worces-
ter, em Massachusetts, para dar cinco conferências, que seriam
reunidas sob o título de “Cinco lições de psicanálise”. Apesar de
um encontro produtivo com James Jackson Putnam e de um su-
cesso considerável, Freud não gostou do continente americano.
Durante toda a vida, desconfiaria do espírito pragmático e puri-
tado desse país que acolhia suas idéias com entusiasmo ingênuo
e desconcertante.
Temendo o anti-semitismo e que a psicanálise fosse assimila-
da a uma “ciência-judaica”, Freud decidiu “desjudalizá-la”, pon-
do Jung à frente, como presidente, do movimento. Depois de um
primeiro congresso, que reuniu em Salzburgo em 1908 todas as
sociedades locais, criou com Ferenczi, em Nuremberg, em 1910,
uma associação internacional, a Sociedade Psicanalítica de Viena
“Internationale Psychoanalytische Vereinigung” (IPV). Em 1933,
a sigla alemã seria abandonada. A IPV se tornaria então a Asso-
ciação Internacional de Psicanálise “International Psychoanalyti-
cal Association” (IPA).
Entre 1909 e 1913, Freud publicou mais duas obras: “Leonar-
do da Vinci e uma lembrança da sua infância” (1910) e “Totem e
tabu” (1912-1913). A partir de 1910, a expansão do movimento
se traduziu por dissidências, tendo como motivo simultaneamen-
te quer elas pessoais e questões teóricas e técnicas. Às rivalidades
narcísicas se acrescentaram críticas sobre a duração dos trata-
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mentos, a questão da transferência e da contratransferência, o
lugar da sexualidade e a definição da noção de inconsciente.
Inicialmente, está a questão do pai, tratada com uma excep-
cional amplidão, em “Totem e tabu”, e retomada a partir de um
exemplo particular, em “Moisés e o monoteísmo” (1932-1938).
Ela constitui um dos pontos mais difíceis da doutrina de Freud,
devido ao polimorfismo da função paterna em sua obra. Mais
tarde, foi o conceito de narcisismo que foi objeto do grande ar-
tigo em 1914, “Sobre o narcisismo: uma introdução”, necessária
para levantar as dificuldades encontradas na análise de Schreber
e tentar explicar as psicoses, mas também para esboçar uma teo-
ria do eu. “O estranho” (Das Unheimliche), publicado em 1919,
refere-se especialmente à problemática da castração. Porém, a
maior alteração decorreu da conceitualização do automatismo de
repetição e do instinto de morte, que são o assunto de “Além do
princípio de prazer” (Jenseits dês Lustprinzips, 1920). A teoria
do eu e da identificação serão os temas centrais de “Psicologia de
grupo e análise do ego” (Massenpsychologie umd Ich-Analyse,
1921).
Finalmente, “A Negativa” (Die Verneinung, 1925) irá subli-
nhar a primazia da palavra, na experiência psicanalítica, ao mes-
mo tempo em que define um modo particular de presentificação
do inconsciente.
Freud nunca deixou de tentar reunir, em uma visão que cha-
ma de metapsicologia, as descobertas que sua técnica permitiu e
as elaborações que nunca deixaram de acompanhar sua prática,
mesmo afirmando que esse esforço não deveria ser interpretado
como uma tentativa de constituição de uma nova “visão do mun-
do” (Weltanschauung).
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Certos remanejamentos valem como correções de posições
anteriores. Este é o caso da teoria do fantasma que, por volta de
1910, irá substituir a primeira teoria traumática da sedução pre-
coce (Leonardo da Vinci e uma lembrança de sua infância, 1907;
Formulações sobre os dois princípios do funcionamento mental,
1911; “O Homem dos Lobos”, 1918).
Esse também foi o caso do masoquismo, considerado, num
primeiro momento, como uma inversão do sadismo. As teses de
“Além do princípio do prazer” permitirão a concepção de um
masoquismo primário, que Freud será levado a tornar equivalen-
te, em “O problema econômico do masoquismo” (1925), ao ins-
tinto de morte e ao sentimento de culpa irredutível e inexplicado,
revelado por certas análises.
De forma sem dúvida arbitrária, pode-se classificar, nos re-
manejamentos tornados necessários devido ao desgaste dos ter-
mos (embora muitos outros motivos o justifiquem), a introdu-
ção da segunda tópica, constituída pela três instâncias, isso, eu
e supereu (O ego e o id [Das Ich und das Es], 1923), as novas
considerações sobre a angústia, como sinal de perigo (Inibições,
sintomas e ansiedade/angústia [Hemmung, Symptom und An-
gst], 1926) e, finalmente, o último texto, inacabado, “A divisão
do ego no processo de defesa (Die Ichspaltung im Abwehvor-
gang, 1938), no qual Freud anuncia que, apesar das aparências, o
que irá dizer, referindo-se à observação do artigo de 1927, sobre
o fetichismo, também era então totalmente novo. E, de fato, as
formulações nele propostas apresentem-se como um esboço de
uma remodelagem de toda a economia de sua doutrina.”
Na obra de Freud, dois textos possuem, aparentemente, um
estatuto um tanto especial. São eles “O futuro de uma ilusão”
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(Die Zukunft einer Illusion), publicado em 1927, que examina a
questão da religião, e “O mal-estar na civilização” (Das Unbeha-
gen in der Kultur, 1929), dedicado ao problema da felicidade,
considerada pro Freud inatingível, e às exigências exorbitantes da
organização social ao sujeito humano.
De fato, trata-se da consideração de fenômenos sociais, à luz
da experiência psicanalítica. Na realidade, como sempre acontece
com Freud, o ângulo escolhido para tratar de qualquer questão
serve-lhe, antes de tudo, para dar esclarecimentos ou indicações
sobre aspectos importantes da experiência. Isso ocorre, em “O
Futuro”, com a questão do pai e a de Deus, como seu corolário;
em “O mal-estar”, a maldade fundamental do ser humano e a
constatação paradoxal de que quanto mais o sujeito satisfaz os
imperativos morais, os do supereu, mais este se mostra exigente.
Em 1911, Adler e Stekel se separaram do grupo freudiano.
Dois anos depois, Jung e Freud romperam todas as suas relações.
Não suportando desvios em relação à sua doutrina, Freud pu-
blicou, às vésperas da Primeira Guerra Mundial, um verdadeiro
panfleto, “A história do movimento psicanalítico”, no qual de-
nunciou as traições de Jung e Adler. Depois, criou um Comitê Se-
creto, composto de seus melhores paladinos, aos quais distribuiu
um anel de fidelidade.
Longe de evitar as dissidências, essa iniciativa levou a novas
querelas. Apoiados por Jones, os berlinenses (Abraham e Eitin-
gon) preconizava a ortodoxia institucional, enquanto os austro-
-húngaros (Rank e Ferenczi) se interessavam mais pelas inova-
ções técnicas. Uma nova dissidência marcou ainda a história
desse primeiro freudismo: a de Wilhelm Reich.
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Por volta de 1930, o fenômeno da dissidência deu lugar às
cisões, característica da transformação da psicanálise em um
movimento de massa. A partir daí eram os grupos que se en-
frentavam, não mais os discípulos ou os pioneiros em rivalidade
com o mestre. Isolado em Viena, mas célebre no mundo inteiro,
Freud prosseguiu sua obra, sem conseguir controlar a política de
seu movimento. Entre 1919 e 1933, a IPA se transformou em
uma verdadeira máquina burocrática, com a responsabilidade de
resolver todos os problemas técnicos relativos à formação dos
psicanalistas.
No fim da Primeira Guerra Mundial, a discussão sobre o ca-
ráter traumático das afecções psíquicas foi relançada, com o apa-
recimento das neuroses de guerra. Freud foi então confrontado
com seu velho rival Julius Wagner Jauregg, acusado de ter sub-
metido soldados julgados simuladores a inúteis tratamentos elé-
tricos. Nesse debate, Freud interveio de maneira magistral para
demonstrar a superioridade da psicanálise sobre todos os outros
métodos.
Com o desmoronamento do império austro-húngaro, Berlim
se tornou a capital do freudismo, como provou a criação do Ber-
liner Psychoanalytisches Institut (BPI), e as numerosas atividades
do instituto de Frankfurt em torno de Otto Fenichel e da “es-
querda freudiana”. Enquanto os americanos afluíam a Viena para
se formar no divã do mestre, este analisava a própria filha, Anna
Freud. Esta não tardaria a tornar-se chefe de escola e opor-se
a Melanie Klein, sua principal rival no campo da psicanálise de
crianças. Nesse aspecto, a oposição entre a escola vienense, que
se desenvolveu na IPA a partir de 1924 e que girava em torno da
questão da sexualidade feminina, mostrou o lugar cada vez mais
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importante das mulheres no movimento psicanalítico. No centro
dessa polêmica, Freud manteve sua teoria da libido única e do
falocentrismo, sem com isso mostrar-se misógino. Ligado em sua
vida particular a uma concepção burguesa da família patriarcal,
adotava todavia, em suas amizades com mulheres intelectuais,
uma atitude perfeitamente cortês, moderna e igualitária. Por sua
doutrina e por sua condição de terapeuta, desempenhou um pa-
pel na emancipação feminina.
Nos anos 1920, Freud publicou três obras fundamentais,
através das quais definiu sua segunda tópica e remanejou inteira-
mente sua teoria do inconsciente e do dualismo pulsional: “Mais-
-além do princípio do prazer” (1920), “`Psicologia das massas e
análise do eu” (1921), “O eu e o isso” (1923). Esse movimento
de reformulação conceitual já começara em 1914, quando da pu-
blicação de um artigo dedicado à questão do narcisismo. Confir-
mou-se, em 1915, com a elaboração de uma metapsicologia e a
publicação de um ensaio sobre a guerra e a morte, no qual Freud
sublinhava a necessidade para o sujeito de “organizar-se em vista
da morte, a fim de melhor suportar a vida”. Dessa reformulação,
centrada na dialética da vida e da morte e em uma acentuação da
oposição entre o eu e o isso, nasceriam as diferentes correntes do
freudismo moderno: kleinismo, Ego Psychology, Self Psycholo-
gy, lacanismo, annafreudismo, Independentes.
Para postular a existência de uma pulsão de morte, Freud
revalorizou duas figuras da mitologia grega: Eros e Tânatos. Essa
revisão da doutrina original se produziu em um momento em
que a sociedade vienense, já preocupada com a sua própria morte
desde o fim do século, se confrontava com a negação absoluta
de sua identidade: a Áustria dessa época, como enfatizou Stefan
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Zweig, era, no mapa da Europa, apenas “uma luz crepuscular”,
uma “sombra cinzenta, difusa e sem vida, da antiga monarquia
imperial”.
Em fevereiro de 1923, Freud descobriu, do lado direito de
seu palato, um pequeno tumor, que devia ser logo extirpado. Em
um primeiro tempo, Felix Deutsch, seu médico, lhe ocultou a
natureza maligna desse tumor. Freud se indispôs com ele. Seis
meses depois, Hans Pichler, cirurgião vienense, procedeu a uma
intervenção radical: a ablação dos maxilares e da parte direita
do palato. Trinta e uma operções seriam feitas posteriormente,
sob a supervisão de Max Schur. Freud foi obrigado a suportar
uma prótese, que ele chamava de “monstro”. “Com seu palato
artificial, escreveu Zweig, ele tinha visivelmente dificuldade para
falar [...]. Mas não abandonava seus interlocutores. Sua alma de
aço tinha a ambição particular de provar a seus amigos que sua
vontade era mais forte que os tormentos mesquinhos que o seu
corpo lhe infligia [...]. Era um combate terrível, e cada vez mais
sublime à medida que se estendia. Cada vez que eu o via, a morte
jogava mais distintamente sua sombra sobre seu rosto [...]. Um
dia, quando de uma de minhas últimas visitas, levei comigo Sal-
vador Dali, a meu ver o pintor mais talentoso da jovem geração,
que devotava a Freud uma veneração extraordinária. Enquanto
eu falava, ele desenhou um esboço. Nunca tive coragem de mos-
trá-lo a Freud, pois Dali, em sua clarividência, já representara o
trabalho da morte.”
A doença não impedia Freud de prosseguir com suas ativida-
des, mas o mantinha afastado das questões do movimento psica-
nalítico, e foi Jones quem presidiu os destinos da IPA a partir de
1934, data na qual Max Eitingon foi obrigado a deixar a Alemanha.
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Apaixonado por telepatia, Freud não hesitou em se dedicar,
com Ferenczi, entre 1921 e 1933, a experiências ditas “ocultas”,
que iam contra a política jonesiana, que visava dar à psicanálise
uma base racional, científica e médica. Em 1926, depois de um
processo intentado contra Theodor Reik, tomou vigorosamente
a defesa dos psicanalistas não-médicos, publicando “A questão da
análise leiga”. No ano seguinte, deflagrou com seu amigo Oskar
Pfister uma polêmica ao publicar “O futuro de uma ilusão”, obra
na qual comparava a religião a uma neurose. Enfim, em 1930,
com “O mal-estar na cultura”, questionava a capacidade das so-
ciedades democráticas modernas de dominar as pulsões destruti-
vas que levam os homens à sua perda. Dois anos depois, em um
intercâmbio com Albert Einstein (1879-1955), enfatizou que o
desenvolvimento da cultura era sempre uma maneira de traba-
lhar contra a guerra. Entre 1929 e 1939, manteve uma crônica
de seus encontros (Kürzeste Chronik, Crônica brevíssima), que
seria publicada por Michael Molnar em Londres, em 1992. Cada
vez mais pessimista quanto ao futuro da humanidade, Freud não
tinha nenhuma ilusão sobre a maneira como o nazismo tratava
os judeus e a psicanálise: “Como homem verdadeiramente hu-
mano, escreveu Zweig, ele estava profundamente abalado, mas o
pensador não se surpreendia absolutamente com a espantosa ir-
rupção da bestialidade.” Entretanto, no dia seguinte ao incêndio
do Reichstag, decidiu com Eitingon manter a existência do BPI.
Embora não aprovasse a política de “salvamento” da psicanálise,
preconizada por Jones, cometeu o erro de privilegiar a luta contra
os dissidentes (Reich e os adlerianos), ao invés de recusar qual-
quer compromisso com Matthias Heinrich Göring, o que teria
levado à suspensão de todas as atividades psicanalíticas, logo que
Hitler chegou ao poder.
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Mas em março de 1938, no momento da invasão da Áustria
pelas tropas alemãs, Richard Sterba agiu em sentido contrário,
decidindo recusar a política de Jones e não criar em Viena um
instituto “arianizado” como o de Göring, em Berlim. Tomou-se
então a decisão de dissolver a Wiener Psychoanalytische Verei-
nigung (WPV) e transportá-la “para onde Freud fosse morar”.
Graças à intervenção do diplomata americano William Bullitt
(1891-1967) e a um resgate pago por Marie Bonaparte, Freud
pôde deixar Viena com sua família. No momento de partir, foi
obrigado a assinar uma declaração na qual afirmava que nem ele
nem seus próximos haviam sido importunados pelos funcioná-
rios do Partido Nacional-Socialista. Em Londres, instalou-se em
uma bela casa em Maresfield Gardes 20, futuro Freud Museum.
Ali, redigiu sua última obra, “Moisés e o monoteísmo”. Nunca
saberia do destino dado pelos nazistas às suas quatro irmãs, ex-
terminadas em campos de concentração.
No começo do mês de setembro de 1939, escutava o rádio
todos os dias. Aos seus familiares, que lhe perguntavam se aquela
seria a última guerra, respondia: “Será minha última guerra.” Ini-
ciou então a leitura de “Peau de chagrin” de Honoré de Balzac
(1799-1850): “É exatamente disso que preciso, disse, este livro
fala de definhamento e de morte por inanição.” Em 21 de setem-
bro, pegou a mão de Max Schur e lembrou o primeiro encontro
dos dois: “Você prometeu não me abandonar quando chegasse a
hora. Agora é só uma tortura sem sentido.” Depois, acrescentou:
“Fale com Anna; se ela achar que está bem, vamos acabar com
isso.” Consultada, Anna quis adiar o instante fatal, mas Schur in-
sistiu e ela aceitou a decisão. Por três vezes, ela deu a Freud uma
injeção de três centigramas de morfina. Em 23 de setembro, às
três horas da manhã, depois de dois dias de coma, Freud morreu
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tranqüilamente: “Foi a sublime conclusão de uma vida sublime,
escreveu Zweig, uma morte memorável em meio à hecatombe,
daquela época mortífera. E quando nós, seus amigos, enterra-
mos seu caixão, sabíamos que confiávamos à terra inglesa o que
a nossa pátria tinha de melhor.” As cinzas de Freud repousam no
crematório de Golders Green.
Centenas de obras foram escritas no mundo sobre Freud e
algumas dezenas de biografias lhe foram consagradas, de Fritz
Wittels a Peter Gay, passando por Lou Andréas Salomé, Thomas
Mann, Siegfried Bernfld, Ernest Jones, Ola Andersson, Henri F.
Ellenberger, Max Schur, Kurt Eissler, Didier Anzieu, Carl Schor-
ske. Sua obra, traduzida em cerca de 30 línguas, é composta de
24 livros propriamente ditos (dos quais dois em colaboração, um
com Josef Breuer, outro com William Bullitt) e de 123 artigos.
Freud também escreveu prefácios, necrológios, intervenções di-
versas em congressos e contribuições para enciclopédias.
Acredita-se geralmente que a psicanálise renovou o interesse
tradicionalmente atribuído aos eventos da existência para com-
preender ou interpretar o comportamento e as obras dos ho-
mens excepcionais. Isso não é verdade, e Freud, sobre isso, é
categórico: “Quem quiser se tornar biógrafo deve se comprome-
ter com a mentira, a dissimulação, a hipocrisia e até mesmo com
a dissimulação de sua incompreensão, pois a verdade biográfica
não é acessível e, se o fosse, não serviria de nada” (carta a A.
Zweig, de 31 de maio de 1936).
Kurt Eissler avaliou em 15 mil o número de cartas escritas por
Freud e em cerca de 10 mil as que estão depositadas na Biblioteca
do Congresso, em Washington ou seja uma perda de aproxima-
damente cinco mil peças. O historiador alemão Gerhard Fichtner
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propôs outras cifras. Segundo ele, Freud teria escrito cerca de 20
mil cartas. Dez mil teriam sido destruídas ou perdidas, cinco mil
estão conservadas e cinco mil ainda poderiam ser encontradas no
século XXI, ou seja dez mil no total. Observe-se que Freud des-
truiu ou perdeu uma parte das cartas que seus correspondentes
lhe enviaram, particularmente as de Wilhelm Fliess.
Três mil e duzentas cartas de Freud foram publicadas, entre
as quais as dirigidas a Eduard Silberstein, Wilhelm Fliess, Lou
Andréas-Salomé, Ernest Jones, Carl Gustav Jung, Sandor Fe-
renczi, Romain Rolland, Arnold Zweig, Stefan Zweig, Edoardo
Weiss, Oska Pfister (expurgadas), Karl Abraham (expurgadas).
Duas edições completas da obra de Freud em alemão foram
realizadas: uma durante sua vida, os “Gesammelte Schriften”, a
outra depois em sua morte, as “Gesammelte Werke (GW)”, pu-
blicadas primeiro em Londres, depois em Frankfurt. As GW se
tornaram, universalmente, a edição de referência. Foram com-
pletadas por dois outros volumes, um “Índice” e um volume de
suplementos (Nachtragsband), realizado por Ângela Richards e
Ilse Grubrich-Simitis. A estes se acrescentam uma edição dita de
estudos, a Studienausgabe, elaborada por Alexander Mitscherlich
e composta de um seleção de textos. Apesar de todos os esforços
de Mitscerlich e de Ilse Grubrich-Simitis, nenhuma edição dita
crítica das GW (notas, comentários, apresentações, etc.) foi pu-
blicada na Alemanha.
A edição inglesa, realizada por James Strachey sob o título
“Standard Edition of the Complete Psychological Works of Sig-
mund Freud (SE)”, é a única edição crítica da obra de Freud. É
por isso que, mais ainda do que as “Gesammelte Werke”, é uma
obra de referência no mundo inteiro.
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Em razão da oposição dos herdeiros nenhum dos textos de
Freud anterior ao ano de 1886 foi integrado às diversas obras
completas. Ora, durante esse período, dito pré-psicanalítico, que
se estendeu de 1877 a 1886, Freud publicou 21 artigos sobre te-
mas diversos: neurologia, medicina, histologia, cocaína, etc. Es-
ses artigos foram recenseados em 1973 por Roger Dufresne.
Em 1967, Jean Laplanche e Jean-Bertrand Pontalis isolaram
cerca de 90 conceitos estritamente freudianos no interior de um
vocabulário psicanalítico composto de 430 termos. Esses concei-
tos foram objeto de múltiplas revisões, efetuadas pelos grandes
teóricos e clínicos do freudismo: Sandor Ferenczi, Melanie Klein,
Jacques Lacan, Donald Woods Winnicott, Heinz Kohut, etc.
Observe-se que Freud publicou cinco grandes casos clíni-
cos, que foram comentados ou revistos por seus sucessores: Ida
Bauer (Dora), Herbert Graf (O Pequeno Hans), Ernst Lanzer (O
Homem dos Ratos), Daniel Paul Schreber, Serguei Constantino-
vitch Pankejeff (O Homem dos Lobos). Segundo o quadro das
filiações estabelecido por Ernst Falzeder em 1994, Freud formou
na análise didática mais de 60 práticos, na maioria alemães, au-
tríacos, ingleses, húngaros, neerlandeses, americanos, suíços, aos
quais se acrescentam os pacientes cuja identidade se ignora.
Foi talvez Stefan Zweig, em 1942, quem redigiu um dos re-
latos mais realistas de Freud: “Não se podia imaginar um indi-
víduo de espírito mais intrépido. Freud ousava a cada instante
expressar o que pensava, mesmo quando sabia que inquietava
e perturbava com suas declarações claras e inexoráveis; nunca
procurava tornar sua posição menos difícil através da menor con-
cessão, mesmo de pura forma. Estou convencido de que Freud
poderia ter exposto, sem encontrar resistência por parte da uni-
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versidade, quatro quintos de suas teorias, se estivesse disposto a
vesti-las prudentemente, a dizer “erótico” em vez de “sexualida-
de”, “Eros” em vez de “libido” e a não ir sempre até o fundo das
coisas, mas limitar-se a sugeri-las. Mas, desde que se tratasse de
seu ensino e da verdade, ficava intransigente; quanto mais firme
era a resistência, tanto mais ele se afirmava em sua resolução.
Quando procuro um símbolo da coragem moral- o único hero-
ísmo no mundo que não exige vítimas – vejo sempre diante de
mim o belo rosto de Freud, com sua clareza viril, com seus olhos
sombrios de olhar reto e viril”.
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